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SciELO Books / SciELO Livros / SciELO Libros JOSE, J. Angola: independência, conflito e normalização. In: MACEDO, JR., org. Desvendando a história da África [online]. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. Diversidades series, pp. 159-179. ISBN 978-85-386-0383-2. Available from: doi: 10.7476/9788538603832. Also available in ePUB from: http://books.scielo.org/id/yf4cf/epub/macedo-9788538603832.epub. All the contents of this work, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International license. Todo o conteúdo deste trabalho, exceto quando houver ressalva, é publicado sob a licença Creative Commons Atribição 4.0. Todo el contenido de esta obra, excepto donde se indique lo contrario, está bajo licencia de la licencia Creative Commons Reconocimento 4.0. 12 - Angola independência, conflito e normalização Joveta Jose

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  • SciELO Books / SciELO Livros / SciELO Libros JOSE, J. Angola: independncia, conflito e normalizao. In: MACEDO, JR., org. Desvendando a histria da frica [online]. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. Diversidades series, pp. 159-179. ISBN 978-85-386-0383-2. Available from: doi: 10.7476/9788538603832. Also available in ePUB from: http://books.scielo.org/id/yf4cf/epub/macedo-9788538603832.epub.

    All the contents of this work, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International license.

    Todo o contedo deste trabalho, exceto quando houver ressalva, publicado sob a licena Creative Commons Atribio 4.0.

    Todo el contenido de esta obra, excepto donde se indique lo contrario, est bajo licencia de la licencia Creative Commons Reconocimento 4.0.

    12 - Angola independncia, conflito e normalizao

    Joveta Jose

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    12ANGOLA: INDEPENDNCIA,

    CONFLITO E NORMALIZAO

    Joveta Jose

    talvez demasiado pretensioso e ousado escrever um texto destanatureza, Angola: Independncia, Conflito e Normalizao, no somente porcausa da intensidade das evolues e dos retrocessos das condiessociais e econmicas em Angola, mas tambm porque talvez no te-nha ainda decorrido o tempo necessrio para uma compreenso his-trica das transformaes que se operaram no pas.

    Para o presidente de Angola, os problemas que este pas enfrentadesde a delimitao das suas fronteiras em 1885 at os dias atuais sobastante complexos. Para ele:

    Muitos dos nossos problemas tm a idade de Angola e so complexos, outros,de carter polticos, tm a idade da independncia e tambm so complexos.Os primeiros relacionam-se com a construo da nao angolana nos limitesdas fronteiras definidas na conferncia de Berlim em 1885 e por outros acor-dos entre as potncias coloniais. Eles so tratados e equacionados sistematica-mente com base na legislao fundamental do Estado e do princpio livre aceite,ou pelo menos consentido... Os outros so decorrentes de vrias conexes queinterligam pessoas e interesses angolanos e estrangeiros numa teia de esque-mas, mecanismos e instrumentos em que se distinguem duas categorias: naci-onalistas e agentes de neocolonialismo (Santos, 2000, p. 7).

    So vrias questes enfrentadas que vo desde a estabilizaoda economia, pacificao dos espritos marcados por longo perodode guerra civil; encontrar caminhos da democracia acompanhada dereformas sociais para diminuir o estado de pobreza que tem assola-do todo o pas; melhorar as ms condies de habitao, sanitrias eambientais. Dentre todas essas dificuldades, a maior delas estava eminstituir um ponto final na guerra civil que durou vinte e sete anos eque reduziu a capacidade de resoluo de variveis estruturais, e o pas

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    seguiu sua trajetria histrica marcada por longos retrocessos e nfi-mos avanos na sua afirmao como pas soberano.

    Perodo Pr-Coloniale a Resistncia Colonizao

    Quando, em 1482, os primeiros portugueses chegaram s cos-tas dos territrios que seriam mais tarde a ptria angolana, conduzi-dos por capito Diogo Co, j existiam formaes econmico-sociaisde classes fortemente organizadas, como, por exemplo, o reino doCongo com os seus principais tributrios ou reinos submetidos: Lo-ango, Kakongo, Bata, Ngoyo, Ndongo, Reino da Lunda, com os vi-zinhos Luba e Kazembe; a zona onde existia ainda a formao eco-nmico-social do Comunismo Primitivo como as tribos do sul, osbosquimanos que desconheciam a agricultura e a pastorcia. O reinodo Congo e o reino da Lunda foram os principais centros de forma-o econmico-social, dominando o modo de produo escravagis-ta, em que o principal trabalho produtivo era feito por escravos, aopasso que os principais beneficirios desses produtos eram a aristo-cracia, dona dos escravos, e os chefes administrativos das provnciase dos distritos. Os principais reinos eram Ndongo, Congo, Estadoslivres da Kissama, Matamba e Kassanje.

    A princpio, os portugueses estabeleceram relaes cordiais comas autoridades locais e conseguiram, atravs delas, introduzir o cristi-anismo, chegando a alteraes de nomes e localidades, como, porexemplo: Nzinga Nkuvu teve o nome alterado para D. Joo I; Mben-da a Nzinga D. Afonso I; Nkanga a Mbemba D. Pedro I; Nkudi aMpudi D. Diogo I; Mbemba a Nzinga D. Afonso II; Nempazu aNimi D. lvaro II, etc. Gradualmente, os portugueses foram cap-tando as populaes nativas e efetuando a ocupao do territrio pormeio de uma colonizao a princpio representada, exclusivamente,por missionrios catlicos e por comerciantes.

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    Assim, durante pelo menos cinco dezenas de anos que durou essafase, os portugueses mantiveram as relaes pacficas que haviam esta-belecido logo no incio. As investidas militares comearam com o gover-nador Paulo Dias de Novais nos anos 1560-1574, atravs de uma intensaatividade que se traduziu por uma ocupao de carcter acentuadamentemilitar, ao mesmo tempo em que continuou a ao assimiladora pelospadres jesutas, os quais estavam encarregados de civilizar pela cristiani-zao dos povos nativos. Paulo Dias de Novais chegou a ser preso e fei-to escravo pelo rei Ngola Kiluanje no reino do Ndongo durante seis anos.Ao fim desse perodo, Ngola Kiluanje mandou Novais e um embaixa-dor do rei a Portugal para solicitar ajuda de Portugal na luta contra osreinos vizinhos, assim como pretendia fazer comrcio pacfico com Por-tugal. Em 1575, Novais chegou de novo na Baa de Luanda, construiuuma igreja e deu incio povoao de Luanda.

    Os portugueses perderam uma considervel parte de Angolapara os holandeses, inclusive Luanda o porto para embarcar os es-cravos que iam para o Brasil. Os colonizadores portugueses lutaramde 1641 a 1648 para a recuperao de Luanda desalojando os invaso-res holandeses. Em socorro aos portugueses, o Brasil reuniu naviose homens em 1648 partindo de Recife rumo a Luanda, uma missomilitar para libertar a provncia ultramarina das mos dos holande-ses. O reduto de Massagano resistiu a todos os ataques dos holande-ses aos portugueses at a chegada das foras expedidas do Brasil. Odomnio holands em Angola durou oito anos. O desenvolvimentodas manufaturas nas Amricas levou os portugueses a implementar acompra de nativos cativos dos reis e transform-los em escravos e aconvencer as autoridades a guerrearem-se entre si para obter maisescravos destinados ao trabalho forado nas Amricas e em suas co-lnias de So Tom e Brasil.

    As campanhas militares deste tempo e a ocupao colonial noconseguiram acabar com a resistncia progressista do povo angola-no. A independncia do Brasil em 1822 veio a trazer muitas compli-caes poltica portuguesa em Angola, pois os brasileiros j pensa-

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    vam em juntar Angola na Federao antes da independncia, paracontinuar a receber escravos ou fazer de Angola um mercado paraprodutos brasileiros. Os ricos usineiros do Brasil naquela poca noqueriam que Portugal fosse intermedirio da venda do acar emAngola, assim como estavam interessados em industrializar o Brasil semelhana dos pases da Europa. As classes ricas da colnia deAngola estavam divididas porque o capital angolano era ainda fracocomparado ao do Brasil. Alguns angolanos das classes ricas queriamque Angola fosse independente, como o Brasil; outros queriam queAngola continuasse ligada a Portugal e aqueles que economicamenteestavam ligados ao Brasil queriam a independncia, mas que entrassena federao com o Brasil.

    Essa animosidade provocou cada vez mais revoltas, protestos,manifestaes em Luanda e Benguela1 (que eram pontos de litoral maisimportantes) contra Portugal ou, ento, contra o Brasil. O povo an-golano no ficava quieto e calado por ter sido dominado pelos colo-nialistas portugueses. Todas as ocasies eram aproveitadas para ten-tar a libertao. Mas as condies no estavam ainda maduras parauma revolta nacional, e a revolta mais conhecida do planalto a deMutu Ya Kevela em 1902, dentre as vrias manifestaes. de se re-alar que o avano portugus foi devido desunio que conseguiramcriar entre os angolanos.

    Os interesses para ocupar a frica no estavam confinados ape-nas para os portugueses. Inglaterra, Frana, Alemanha, Blgica faziamcomrcio com a frica e aqui procuravam o ouro, marfim e escra-vos. Angola no era uma colnia de ocupao, mas uma praa comer-cial na poca.

    Em 1884, os pases imperialistas j tinham ocupado grande par-te de frica, mas havia ainda reas de conflito, principalmente asreas sob o domnio dos portugueses. O aumento desses conflitos

    1 Luanda e Benguela passaram pela mo dos holandeses e Benguela, at pela dos franceses,em 1705.

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    fez com que os Estados imperialistas de todo o mundo convocas-sem a famosa Conferncia de Berlim em 1884-1885 para dividir africa entre eles. Entre os pontos importantes da conferncia, de-finia-se que s podia ter territrios coloniais quem os ocupasse comtropas, a obrigao de respeitar os tratados de protectorados comos soberanos africanos, o fim da escravatura e a adoo de medidasde civilizar os nativos.

    No entanto, s cerca de 1900 que os portugueses consegui-ram controlar toda a extenso do vasto territrio, que constitui hojea Repblica de Angola. Mas, mesmo depois de 1900, os angolanoscontinuaram a resistir ao domnio portugus.

    A populao de Angola, que em 1940 era de 3.738.010 ha-bitantes, elevou-se a 4.145.184 em 1950. Esses nmeros revelam-nos que a populao total sofreu um aumento de cerca de 11%no decurso do decnio e que, individualmente, o maior crescimen-to correspondeu aos brancos, que representou 78,9%2, porquePortugal criou incentivos para a emigrao dos portugueses paraAngola. Nessa poca, o sistema de ensino oficial em Angola sub-dividia-se em dois setores distintos: um para nativos e outro parabrancos e assimilados (filhos de famlias de cor negra, mas civili-zadas), mas essa distino era apenas em funo de grau de de-senvolvimento mental e social.

    Fundamentalmente, havia dois graus de ensino em Angola, isto, o Primrio e o Secundrio. O ensino primrio era rudimentar, gerale complementar, enquanto que o ensino secundrio era liceal, tc-nico, profissional e magistrio primrio. O ensino primrio era des-tinado a crianas nativas em grau atrasado de civilizao, sendo exer-cido oficialmente pelas misses catlicas portuguesas. Inclua umaclasse preparatria e trs classes ascendentes, cada uma correspon-dendo a um ano escolar. O ensino geral e elementar era destinado a

    2 Informaes extradas do livro organizado pela Direco dos Servios de Economia. An-gola: Provncia de Portugal em frica. Luanda: Grfica de Publicaes Unidade, 1953, p. 40.

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    brancos e assimilados que compreendiam de trs a quatro anos es-colares e terminavam com exames na 3 e 4 classes (sries).

    A Luta pela Libertao Colonial

    Em 1953, nasceu o primeiro partido poltico nacionalista PLUA(Partido da Luta Unida dos Africanos de Angola) , que lanou o ma-nifesto que convidava os angolanos a se organizarem clandestinamen-te. Alguns dirigentes do PLUA e de outras organizaes clandestinascriaram o MPLA (Movimento Popular de Libertao de Angola), em10 de dezembro de 1956, que possua ampla representao em territ-rio angolano e tinha ntidas diretrizes e orientaes ideolgicas marxistas.Alm do MPLA, surgiram outros movimentos para a independnciade Angola, como o MINA (Movimento para Independncia Nacionalde Angola), a UPNA (Unio das Populaes do Norte de Angola),transformado depois em UPA (Unio das Populaes de Angola), eoutras organizaes regionais ou de tendncias reformistas.

    Algumas das organizaes regionais evoluram para foras organi-zadas de libertao de Angola. o caso da FNLA (Frente Nacional paraa Libertao de Angola), fundada em 1962 na regio Norte, como des-dobramento da UPA, e a UNITA (Unio Nacional para IndependnciaTotal de Angola), surgida em 1966 como uma dissidncia da FNLA, li-derada por Jonas Savimbi, com a FALA (Foras Armadas de Libertaode Angola) na regio Sul, alm do MPLA, movimento hegemnico re-presentado proporcionalmente em todo o territrio angolano com aFAPLA (Foras Armadas Populares de Libertao de Angola).

    Em 4 de fevereiro de 1961, foram atacadas as cadeias de Luan-da com participao de jovens e trabalhadores da capital enquadra-dos por militantes do MPLA, para libertar os presos polticos. Assim,tem incio a luta armada pela independncia nacional. As riquezasnaturais presentes no pas, principalmente a opulncia de jazidas depetrleo e diamantes, contriburam para acirrar as disputas entre os

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    movimentos pela independncia, como tambm despertaram a co-bia e o interesse internacional no conflito angolano. Os movimen-tos pela libertao receberam apoios financeiros, blicos e humanosda comunidade internacional. Assim, o MPLA, com sua orientaosocialista, recebeu apoio da antiga Unio Sovitica, de Cuba e de ou-tros pases do ex-Pacto de Varsvia. A FNLA recebeu apoios dos EUAe do Zaire (atual Repblica Democrtica do Congo). A UNITA re-cebeu apoio da frica do Sul no perodo do Apartheid e dos EUA.

    No perodo de 1962 a 1975, Angola atravessou um surto de cres-cimento econmico que se acelerou a partir de 1968. O PIB cresceuem termos reais taxa mdia anual de cerca de 4% entre 1953 e 1963,subindo para 7% entre 1963 a 1973. Nesse ano, o hipermercado Pode Acar (capitais brasileiros) inaugurava em Luanda, a capital deAngola, uma das lojas mais modernas do mundo.

    A luta travada pelos trs movimentos contra a dominao portu-guesa em Angola forou Portugal a negociar e a assinar com os movi-mentos o conhecido Acordo de Alvor, em janeiro de 1975, no qual esta-belecia a constituio do governo de transio composto pelos membrosdo MPLA, FNLA, UNITA e representantes do governo portugus, queiriam transferir o poder para os movimentos de libertao e marcaram aindependncia para 11 de novembro daquele ano. As divergncias entreos movimentos se aprofundaram, e o MPLA, que possua o maior apoiopopular e militar, saiu da frgil aliana e, no dia marcado, proclamou uni-lateralmente a independncia de Angola em Luanda. O Brasil foi o pri-meiro pas a reconhecer a legitimidade do governo do MPLA.

    Independncia e a Primeira Guerra Civil

    Com a Revoluo dos Cravos (25 de abril de 1974), que derru-bou a ditadura de SalazarMarcelo Caetano, Portugal inflectiu para aesquerda e tratou de retirar suas tropas de Angola, aceitando que aantiga colnia se tornasse independente, com ascenso ao poder de

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    movimentos revolucionrios que, atravs da guerrilha, lutavam haviavrios anos para emancipar o pas.

    O Brasil reconheceu estrategicamente os movimentos de liber-tao, principalmente o MPLA, que era hegemnico em todo o terri-trio angolano, evitando que Angola ficasse inteiramente merc daex-Unio Sovitica e de Cuba, em uma regio considerada como parteda rea de fronteira e influncia. Esse raciocnio levou o governoErnesto Geisel (1974-1979) a reconhecer, juntamente com Cuba e ex-Unio Sovitica, o MPLA sob a liderana de Dr. Antonio AgostinhoNeto, que disputava o poder com a FNLA, de Holden Roberto, sus-tentada pelos EUA e pela Repblica do Zaire (hoje Repblica Demo-crtica do Congo) e da UNITA, de Jonas Malheiro Savimbi, com apoioda frica do Sul. Informes do Itamaraty indicavam que o MPLA, comdomnio na capital Luanda e nas mais importantes cidades do pas,tinha todas as condies para se consolidar no poder (O Estado de SoPaulo, 28/02/1976, p. 10). Alm do mais, era o nico dos trs movi-mentos de libertao que possua compromissos com a cultura do pas,sem se definir, nitidamente, como comunista, devido ao carcter re-ligioso e regional de sua composio. O reconhecimento imediato per-mitiu dissipar as desconfianas dos angolanos, mantendo a misso emLuanda e defender seus interesses no pas.

    O governo Geisel no teve realmente alternativa seno reconhe-cer e apoiar o regime revolucionrio do MPLA que se instalou em An-gola, a fim de defender e consolidar os crescentes interesses econmi-cos e geopolticos do Brasil na regio sul da frica. A solidariedade comPortugal, cuja poltica, sob Salazar, visava a manter as colnias, princi-palmente Angola, como provncia ultramarina, levantara contra o Bra-sil no continente africano desconfiana e hostilidade, alimentada maisainda pelo carcter fortemente conservador do regime autoritrio.

    Solucionada a questo da independncia, Angola ficou mer-gulhada na primeira guerra civil desde o final de 1975 a 1991, deri-vada do conflito entre os diferentes projetos de governo defendi-dos pelos movimentos de libertao. A FNLA se dissolveu como

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    grupo armado, mas a UNITA abraou a defesa do capitalismo como apoio dos EUA e da frica do Sul do regime do Apartheid, rece-ando as possveis influncias que a vitria do movimento de esquer-da do MPLA, de maioria negra, poderia causar na regio Austral dafrica. Tal conflito civil motivou a elaborao e a realizao dasmisses de paz da ONU em Angola em 1988, coincidentemente nomomento de trmino da Guerra Fria em escala mundial, com a des-mobilizao da bipolaridade e do acirrado conflito ideolgico nasrelaes internacionais.

    As origens da guerra civil em Angola residiram em diversos fa-tores, entre os quais cabe mencionar: 1) os projetos diferentes para ofuturo governo de Angola no imaginrio dos movimentos de liber-tao nacional; 2) o grande montante de recursos minerais, principal-mente diamantes e petrleo existentes no territrio angolano, que,alm de atiarem a cobia e os interesses internacionais, em si mes-mas sediavam o conflito; 3) a interveno de pases como ex-URSS,Cuba, EUA, Zaire, frica do Sul e outros atores internacionais, es-pecialmente no auge da Guerra Fria, os quais polarizaram mais aindaas disputas internas pelo controle do governo de Angola; 4) a postu-ra tendenciosa de Portugal na elaborao e aplicao do modelo degoverno de transio de colnia para a independncia atravs doAcordo de Alvor, cujos signatrios foram o governo portugus, oMPLA, a UNITA e a FNLA que influenciaram de forma decisiva oagravamento das disputas no pas.

    De 1960 at o fim do conflito bipolar, em 1989, os blocos lide-rados pelos EUA, o capitalista, e pela ex-Unio Sovitica, o socialis-ta, incentivaram e influenciaram de forma determinante a evoluodo conflito angolano em suas diversas fases, da luta anticolonial paraa independncia, passando da guerra civil tentativa de pacificao eresoluo do conflito. O interesse despertado por Angola em ambasas potncias durante a Guerra Fria encontra justificativa se so leva-das em conta as riquezas minerais considerveis no subsolo de An-gola, a localizao estratgica de Angola na regio do Atlntico Sul,

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    que derivou, sobretudo, a considerao geopoltica e geoestratgicade Angola tanto pelos EUA como pela ex-Unio Sovitica.

    Outros pases que intervieram no conflito angolano seguiram,de maneira geral, as diretrizes e orientaes de poltica externa de umaou outra entre as duas superpotncias. Terminada a Guerra Fria, EUA,Rssia e Portugal compem a Troika de observadores e participantesativos nas negociaes de paz e monitoradores da execuo dos acor-dos de paz em Angola, desde 1990.

    Levando em considerao a ntima ligao existente entre a di-menso regional e internacional do conflito, as potncias mundiaisincentivaram, apoiando posies opostas. Por isso, a primeira tenta-tiva de buscar a soluo para o conflito consistiu em uma negociaoconjunta, sugerida pelos EUA e conhecida como a poltica de linkage,a qual consistia no estabelecimento de vnculos de dependncia paraa resoluo de problemas relacionados, como, por exemplo, a retira-da das tropas cubanas de Angola.

    Acordos e Misses de Paz da ONUe a Segunda Guerra Civil

    Na primeira tentativa, a negociao conjunta envolveu os princi-pais e os imediatamente implicados na disputa: Angola, Cuba, fricado Sul e Nambia com a observao dos EUA e da URSS, cujos resul-tados originaram a proposta de resoluo do conflito, expressa nosAcordos de Nova Iorque, assinados na sede das Naes Unidas entreAngola, Cuba e frica do Sul em 22 de dezembro de 1988, e bilateralentre Angola e Cuba, que previa a retirada simultnea das tropas cuba-nas e sul-africanas de Angola, assim como conferia a independncia daNambia. Nasceu desses Acordos a UNAVEM I (Misso de Verifica-o das Naes Unidas em Angola), sob proposta do Secretrio-Geralda ONU para fiscalizar a retirada dos cubanos. A UNAVEM I foi amisso de manuteno da paz bem-sucedida, expressa na rapidez e agi-

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    lidade com que os Acordos de Nova Iorque foram cumpridos. Em 21de maro de 1990, a Nambia proclamou a independncia com a vit-ria da SWAPO (South-West Africa Peoples Organization) nas eleiesrealizadas em novembro do ano anterior e, em 26 de maio de 1991, aretirada das tropas cubanas foi completada.

    Em 31 de maio de 1991, depois de muitos meses de negociaoentre representantes do governo angolano MPLA e da UNITA sob a mediao da Troika de observadores, so assinados os Acor-dos de Bicesse em Portugal, e a ONU convidada a fiscalizar os Acor-dos com a criao da UNAVEM II. Rubricaram os Acordos de Pazde Angola: Jos Eduardo dos Santos (presidente de Angola); JonasMalheiro Savimbi (lder da UNITA); Cavaco da Silva (Primeiro-Mi-nistro portugus); Peres Cuellar (Secretrio-Geral das Naes Uni-das); James Baker (secretrio pela poltica externa dos EUA), Alexan-dre Brassmertnykh (secretrio para poltica externa da URSS) e Jo-weri Musevini (presidente da Organizao da Unidade Africana OUA). Os acordos de Bicesse estabeleciam o cessar-fogo, a unifica-o das tropas da UNITA e do governo em um exrcito nico e arealizao de eleies gerais, com ampla liberdade partidria. AUNITA e a FNLA registraram-se como partidos. Savimbi foi recebi-do em Luanda no Palcio de Futungo de Belas pelo presidente JosEduardo dos Santos, sucessor de Agostinho Neto (primeiro presiden-te de Angola, falecido em 1979).

    A UNAVEM II tinha como objetivo primordial de seu manda-to a superviso e a implementao dos Acordos de Bicesse, incluin-do a superviso das eleies para o executivo e o legislativo do pas eque ocorreriam nos dias 29-30 de setembro de 1992. A ONU deudestaque s eleies de 1992 refletidas em uma srie de expectativascom relao ao acontecimento, sobretudo com a possibilidade deunificao nacional e pacificao efetiva de Angola. Mas, essas expec-tativas no se confirmaram. A UNITA contestou os resultados daseleies de setembro de 1992, embora estudos efetuados pela ONUe com participao de observadores independentes considerarem que

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    as eleies foram justas e legtimas, e que a incidncia de pequenasfraudes eleitorais se deu nas reas controladas pela UNITA, onde apropaganda poltica de grupos opositores foi proibida e tentou-seimpedir o voto contra a UNITA. Com o resultado das eleies, oMPLA tornou-se governo legtimo de Angola, e a UNITA reagiu aessa situao, retomando a guerra civil com toda a fora. A segundaguerra civil de Angola iniciou em 30 de outubro de 1992 aps a di-vulgao do resultado das eleies.

    Nessas primeiras eleies multipartidrias realizadas em Ango-la, o MPLA obteve 53,7% dos votos vlidos e a UNITA 34,1%, con-quistando 70 cadeiras no parlamento. O candidato presidencial doMPLA, Jos Eduardo dos Santos, obteve 49,57% dos votos e Savim-bi, 40,07%. Portanto, havia a necessidade de realizao de um segun-do turno. Mas a UNITA no aceitou o resultado das urnas, alegandofraude, embora os observadores internacionais, inclusive da ONU, quehaviam monitorado as eleies, considerassem terem sido livres e jus-tas. Em outubro, antes do segundo turno, a UNITA arregimentou suastropas e tentou derrubar o governo a partir da capital. Luanda ama-nheceu em polvorosa no dia 30 de outubro de 1992, com violentosconfrontos que duraram quase uma semana e deixaram um saldo dequase mil mortos. A UNITA foi expulsa da capital e instalou seu quar-tel-general na provncia do Huambo. A essa altura, o regime socialis-ta angolano havia sido substitudo gradualmente pela economia demercado, com abertura ao capital estrangeiro e pluripartidarismo, oMuro de Berlim tinha cado e a Unio Sovitica se desfacelava. Onacionalismo anticomunista de Savimbi j no obtinha ressonncianem nos Estados Unidos.

    A atuao da UNAVEM II no se encerra com o fracasso doresultado das eleies divulgadas em outubro de 1992, cuja carac-terstica foi quem ganha leva tudo. Ao contrrio, a ONU reco-nhece o retorno do conflito blico em Angola e promove exten-ses desta misso atravs de resolues do Conselho de Seguran-a. Durante o seu mandato, a UNAVEM II foi demasiadamente

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    complacente com a UNITA, mesmo quando este grupo insistiaem violar os Acordos de Bicesse, pouca obedincia s resoluese sanes aprovadas pela ONU. O imobilismo da ONU em regu-lar o conflito angolano derivou do seu Conselho de Segurana,composto pelas grandes potncias do cenrio poltico internacio-nal, e que, durante o perodo de 1989 a 1994, verificava-se um for-talecimento dos EUA e a retrao da Rssia devido ao fim daGuerra Fria. Os dois pases envolveram-se profundamente na guer-ra civil de Angola, e seus interesses continuavam ntidos nesse pas,influenciando sobremaneira a ao da comunidade internacionalpara o fim do conflito. Os EUA viam na paz uma via para a UNI-TA chegar ao poder com custos polticos e financeiros mnimos,enquanto que, para os outros pases envolvidos no conflito, o en-volvimento dos EUA era uma garantia suficiente com que se de-senrolariam os acontecimentos em Angola.

    O fim da Guerra Fria, a descoberta de reservas de petrleo con-siderveis na costa angolana, o estatuto legal depois das eleies de1992 e as perspectivas de negcios levaram os EUA, totais apoia-dores da UNITA at as eleies, a reconhecerem finalmente o go-verno de Angola em 1993, abrindo caminho para as sanes contraa UNITA por parte da ONU, o que implicou naturalmente em umagradual inverso das foras polticas, diplomticas e militares emfavor do governo legtimo de Angola.

    A UNAVEM II concluda em 1995 com uma percepo ntidade uma empreitada mal-sucedida, mas no encerrada. Em substituio,foi criada a UNAVEM III, como resultado da assinatura das negocia-es do Protocolo de Lusaka em 20 de novembro de 1994, cujo objeti-vo era auxiliar o governo angolano e a UNITA na consolidao do pro-jeto de reconciliao nacional, por meio do respeito pelo resultado daseleies efetuadas em 1992 e pela busca de uma modalidade de partici-pao nas instncias do poder da parte derrotada nas eleies. Os pri-meiros problemas com o Protocolo de Lusaka e para sua implementa-o pela UNAVEM III comearam com a ausncia de Jonas Savimbi

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    no ato da assinatura dos acordos, deixando um sentimento generaliza-do de descaso por parte da UNITA e sua conseqente debilitao.

    De fato, o Conselho de Segurana da ONU reconheceu em v-rias resolues a UNITA como a promotora dos maiores obstculos concretizao do Protocolo de Lusaka, bem como ressaltou os esfor-os positivos do governo de Angola na criao do GURN (Governoda Unidade e Reconciliao Nacional). O lder da UNITA, Jonas Sa-vimbi, mais uma vez no compareceu na posse do GURN governode coalizo nacional, agindo de forma semelhante quando da assinatu-ra do Protocolo de Lusaka, reduzindo estrategicamente a legitimidadedesta nova administrao do governo e, conseqentemente, restringindoas chances de sucesso da reunificao do pas.

    Com a inaugurao do GURN, a UNAVEM III encerra as suasatividades em junho de 1997. Durante o planejamento e a elabora-o da UNAVEM III, buscou-se superar as dificuldades que levaramao insucesso da UNAVEM II, mas continuaram o imobilismo e a re-lutncia do Conselho de Segurana em inibir efetivamente a violaodos acordos, notadamente por parte da UNITA. No Conselho de Se-gurana da ONU, houve uma excessiva confiana na boa-vontadecooperativa de partes historicamente opostas (MPLA e UNITA), notomando medidas eficazes e enrgicas necessrias para controlar oconflito angolano.

    A misso da UNAVEM III foi substituda pela MONUA (Missode Observao das Naes Unidas em Angola) em 30 de junho de 1997.Seu mandato consistia em prestar auxlio s partes envolvidas no confli-to na busca da consolidao da paz e reconciliao nacional, em uma ten-tativa de estabelecer um ambiente favorvel e duradouro de estabilidade,desenvolvimento democrtico e reabilitao do pas, monitorando o cli-ma poltico com a retirada gradual dos funcionrios da ONU, na medidaem que a extenso e presena da administrao estatal pelo pas e a neu-tralidade da polcia (incluindo a incorporao de membros da UNITA)fossem verificadas. A MONUA, dessa forma, foi projetada para ser a l-tima das operaes das Naes Unidas em Angola.

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    A misso da MONUA sai frustrada pelo tom nas resolues doConselho de Segurana, reconhecendo que a situao de Angola re-presenta um perigo para a comunidade internacional. Seus represen-tantes apelam para que todos os pases-membros da ONU evitemtaxativamente qualquer tipo de comrcio com a UNITA, especialmen-te no caso de diamantes, que monitorem e bloqueiem quaisquer flu-xos financeiros ligados UNITA e a movimentao dos seus mem-bros, incluindo o fechamento de suas representaes. Antes de en-cerrar a MONUA, o Conselho de Segurana lamenta veementemen-te o abate de duas aeronaves a servio da ONU em Angola na regiocontrolada pela UNITA. Em janeiro de 1999, o presidente de Ango-la, Jos Eduardo dos Santos, declara que a presena da ONU emAngola no era mais necessria, o que levou a encerrar as atividadesda MONUA em 26 de fevereiro de 1999 com a retirada do seu pes-soal e estabelecido apenas um escritrio das Naes Unidas semmandato e metas especficas.

    O Fim do Conflito, a Normalizao e o Relanamento da Economia

    A guerra civil em Angola, durante os vinte e sete anos, deixoumilhares de mortos, mutilados, refugiados e milhes de deslocadosinternos, alm de minas terrestres. Com o fim das misses militaresda ONU, o governo de Angola cessou qualquer tipo de negociaoou entendimento com a UNITA, e as duas partes se engajaram in-tensamente na guerra civil, sem trguas at 2002. Com a morte emcombate de Jonas Savimbi, lder da UNITA, em 22 de fevereiro de2002, foram criadas condies para uma certa margem de manobrana resoluo definitiva do conflito angolano.

    Agindo de uma forma considerada sensata, o governo de An-gola no declarou uma vitria do MPLA nem do governo angolano,mas aproveitou as circunstncias para estabelecer um acordo entre

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    as partes beligerantes, com vantagens mtuas, seja para o governo,com a pacificao do territrio, seja para UNITA. Evitando sriosriscos de sua dissoluo e fragilidade para continuar a guerra, conse-gue-se finalmente a paz definitiva. Na seqncia desses acontecimen-tos, o governo de Angola declarou unilateralmente um cessar-fogo einiciou uma srie de contatos com as lideranas da UNITA, os quaisevoluram para as negociaes de paz efetiva, culminando na assina-tura do Memorando de Entendimento do Luena em 4 de abril de 2002.

    Com o fim da guerra civil angolana, a UNITA reunificou-se (nomomento da crise e sob o efeito das sanes impostas pela ONUdepois dos Acordos de Lusaka, surgiu dissidncia de muitos mem-bros que fundaram a chamada UNITA-Renovada, reconhecida pelaONU e pelo governo de Angola) como partido poltico e reabilitou-se, participando da vida poltica de Angola. No cenrio poltico, aprincipal pauta das discusses passou a ser o planejamento e a exe-cuo das eleies gerais que vm sendo adiadas desde 2006, justa-mente com objetivos de melhorar as infra-estruturas que permitamacesso a todo o territrio nacional, a consolidao da paz, a reconci-liao nacional, evitando-se durante esse perodo qualquer descuidoque possa pr em risco as estratgias reguladoras do pas.

    Diviso Poltico-Administrativa,Hidrografia e Clima

    Angola fica situado na costa da frica Austral ao sul do Equa-dor, nas latitudes 4o 22 e 18o 02 e as longitudes 11o 41 e 24o 05,possuindo um extenso territrio com 1.246.700 km, inclui 7270km do enclave de Cabinda e uma fronteira martima de 1.650 km.Tem suas fronteiras limitadas ao norte pelas Repblicas do Con-go (Brazzaville e Democrtica), a leste pela Repblica Democr-tica do Congo e Zmbia, no sul pela Repblica da Nambia e aoeste pelo Oceano Atlntico.

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    Angola tem hoje 18 provncias (Estados): Uige, Zaire, Lunda-Norte, Lunda-Sul, Malanje, Luanda, Benguela, Huambo, Hula, Ca-binda, Moxico, Kuanza-Norte, Kuanza-Sul, Bengo, Namibe, Quan-do-Cubango, Cunene e Bi. Mais de 75% da populao pertence aogrupo tnico banto, que abrange os grupos etno-lingsticos quicon-go, quimbundo, umbundo, lunda-quioco, ganguela, nhaneca-humbe,herer, ambs e xindonga. Todos esses grupos se dividem em subgru-pos de lnguas, mas o portugus a lngua oficial. Do ponto de vistareligioso, professam-se crenas africanas tradicionais, para alm decristianismo (protestantes e catlicos) e de religies mistas entre astradicionais e o cristianismo.

    A superfcie de todo o territrio angolano, para se ter umaidia mais perfeita da sua grandiosidade, 14 vezes maior quePortugal ou, ainda, 96% das reas reunidas da Espanha, Frana eItlia. Ao observar-se o mapa fsico de Angola, nota-se a existn-cia de uma densa rede hidrogrfica e orla martima. Seus rios noso todos navegveis, limitando-se a pequenos trechos nos quaisisso possvel.

    Os rios maiores so: Rio Zaire: navegvel em 150 km, tem umcaudal de setenta mil metros cbicos por segundo (70.000m/s), clas-sificando-se, por isso, logo aps o Rio Amazonas, que tem oitenta milmetros cbicos por segundo (80.000m/s) e que o rio mais cauda-loso do mundo; Rio Dande: navegvel em 60 km; Rio Bengo: nave-gvel em 196 km; Rio Kuanza: navegvel em 258 km, o maior riodos que possuem a bacia hidrogrfica inteiramente situada em An-gola, totalizando seu percurso em aproximadamente mil quilmetros;Rio Cunene: navegvel em 190 km, sendo, em extenso, o segundomaior rio de Angola com percurso de 945 km.

    Dos desnveis bruscos do solo de Angola, resultam, na forma-o freqente de correntezas e cataratas nos cursos de grande partede seus rios, constituindo apreciveis fontes de energia em potenciale motivos da atrao turstica pelas belezas, por vezes surpreenden-tes de quedas, como as de Calandula, na Provncia de Malanje.

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    Em relao ao clima de Angola, dentro da classificao geralsitua-se nas zonas climtica equatorial e tropical (quentes e hmi-das). A sua sucesso rpida de altitudes, como as zonas do litoral,subplanlticas e planlticas, determinante nos climas locais, regio-nais com caractersticas diferenciadas. No entanto, dois outros fa-tores, como a latitude e a corrente fria de Benguela, resultam aindauma maior diversidade de climas. Todavia, pela ao conjunta dosfatores de ordem litosfrica, geogrfica e hidrosfrica, os vrios ele-mentos do clima diferem acentuadamente do litoral ao planalto e,at, do litoral norte para o litoral sul, registrando-se, em muitos ca-sos, desvios profundos das caractersticas de tais zonas. Angola temapenas duas estaes: 1) tempo do Cacimbo ou inverno, isto , pocano-chuvosa, que vai de maio a setembro; 2) tempo das chuvas ouvero, que se estende de outubro a abril, com temperaturas anuaisque variam de (-4,5 C) no inverno a (40,5 C) no vero, em algu-mas regies como Tchivinguiro e Chienge, todas na provncia daHula, respectivamente.

    Angola possui vastos recursos florestais concentrados, funda-mentalmente na provncia de Cabinda, na floresta de Maiombe, ondepredominam madeiras de expressivo valor econmico, tais como pau-preto, bano, sndalo africano, pau-raro e pau-ferro. O pas possuinumerosos recursos minerais, destacando-se pelo seu aproveitamen-to econmico o petrleo, os diamantes, o ferro, o mangans, o co-bre, os mrmores, e minerais raros. As principais bacias petrolferasem explorao situam-se junto costa nas provncias de Cabinda,Zaire, no norte, com uma produo total no pas, atualmente, de quase2.000.000 de barris de petrleo bruto por dia. A rea diamantfera daLunda-Norte considerada das mais importantes do mundo. A fau-na bastante rica e diversificada, destacando-se a presena da palan-ca negra gigante (nome cientfico: hippotragus niger Varianni), localiza-da no Parque Nacional de Cangandala-Malanje, espcie bastante rarada fauna angolana, atual smbolo da principal transportadora areaangola, a TAAG (Transportes Areos de Angola Angola Airlines).

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    Relaes Econmicascom o Brasil

    As relaes econmicas entre Brasil e Angola marcam o in-cio das relaes afro-brasileiras, quando para o Brasil foram trazi-dos os primeiros africanos na condio de escravos para trabalharnas lavouras de cana-de-acar. O trfico de escravos foi a base dointercmbio comercial por cerca de 470 anos. Sem os escravos, ocomrcio Brasil-frica seria praticamente inexistente e, por conse-guinte, outra seria a histria do Brasil. Angola participou ativamen-te da formao do povo brasileiro. Alm dos escravos, outros pro-dutos compunham a pauta das exportaes angolanas para o Bra-sil, tais como: ouro em p, marfim, leo de amendoim, cera brancae amarela, azeite de dend, etc. Em contrapartida, o Brasil exporta-va produtos como: aguardente, acar, tabaco e outros, reexporta-va produtos europeus e asiticos (tecidos, lenos, vinho, manteiga,etc.). A funo do Brasil nessas trocas era garantir a permannciade Portugal em Angola, aproveitando seus colonos e, com isso, ga-rantindo tambm o controle do principal centro abastecedor demo-de-obra para o Brasil.

    A independncia brasileira em 1822 abriu uma perspectiva defortalecimento das relaes atravs da proposta de anexao de An-gola pelo Brasil (Unio Brasil-Angola), a qual se daria mediante oapoio brasileiro aos movimentos rebeldes em Luanda e Benguelacontra a Coroa portuguesa. Na verdade, esses movimentos repre-sentavam interesses dos negociantes de escravos, os quais viam napossibilidade da Unio Brasil-Angola uma forma de assegurar a con-tinuidade do trfico, visto que entre Brasil e Inglaterra no havia sidofirmado nenhum acordo, ao contrrio de Portugal que, em 1836,assinou acordo com ingleses, pondo fim ao trfico de escravos. Noentanto, pressionado pelos ingleses, o Brasil assinou um acordo comPortugal, no qual se comprometia em no incorporar ao seu imp-rio as colnias portuguesas.

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    Terminado o trfico em 1850 no Brasil, as relaes entraram emdeclnio. Vrios fatores contriburam, entre eles a insero definitivade Angola, assim como das demais colnias africanas, no circuito ca-pitalista, aps a Conferncia de Berlim, em 1885: Angola passou deexportadora de braos escravos para exportadora de matrias-primasagrcola e mineral. Isso provocou uma mudana qualitativa nas rela-es Brasil-Angola, as quais perderam o carcter de complementari-dade e tornaram-se concorrenciais, assim permanecendo at a inde-pendncia de Angola. Como economia primria exportadora, con-corria com alguns produtos brasileiros, principalmente o caf, de queAngola era um dos principais produtores mundiais.

    Consideraes Finais

    A populao atual de Angola de cerca de 16.000.000 de habi-tantes. A mdia da densidade populacional muito baixa, cerca de 8habitantes por km. A cidade de Luanda abriga mais de 4.000.000 dehabitantes, mas ela foi projetada para 600 mil habitantes.

    Hoje, com a paz definitiva, Angola passa por um profundoprocesso de restaurao estrutural, com forte cooperao e recur-sos aportados pelo governo chins, reorganizando e reconstitu-indo a sua esfera poltica, a sociedade e economia. A regio dafrica Austral est com boa estabilidade poltica graas ao fim deconflitos de Angola, ao amadurecimento da democracia racial nafrica do Sul, e na Nambia, aos progressos da democracia emMoambique e ao fim tambm da guerra civil na Repblica De-mocrtica do Congo.

    Nos ltimos quatro anos, Angola cresce economicamente a rit-mo de 20,5% em 2005 com picos de 26% em 2006 e projeo de 29%para 2008, porque os investidores nacionais e estrangeiros reconhe-cem que o curso trilhado para a consolidao da paz efetivamenteseguro, e irreversvel.

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    Angola o maior parceiro comercial da China na frica, supe-rando a frica do Sul. Em 2005, os negcios foram de U$ 7.000.000.000;em 2006, foram de U$ 9.300.000.000, estimando-se para 2008U$ 10.000.000.000. A China importou 18,2% equivalente a 94.000.000de barris de petrleo de Angola, do total das importaes chinesas depetrleo.

    Referncias

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