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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
ROSEANE DO SOCORRO GOMES BARBOSA
A prática de Ensino Religioso não confessional: Uma análise
da perspectiva e do conteúdo da revista Diálogo à luz do
modelo das Ciências da Religião
MESTRADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
SÃO PAULO
2012
ii
ROSEANE DO SOCORRO GOMES BARBOSA
A prática de Ensino Religioso não confessional: Uma análise
da perspectiva e do conteúdo da revista Diálogo à luz do
modelo das Ciências da Religião
MESTRADO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universi-dade Católica de São Paulo, como exi-gência parcial para obtenção do título de MESTRE em Ciências da Religião, sob a orientação do Prof. Dr. Afonso Maria Ligorio Soares.
São Paulo 2012
iii
BANCA EXAMINADORA
____________________________________
____________________________________
____________________________________
iv
Em memória do meu irmão Roberto Gomes Barbosa,
que ajudou a me educar e a quem aprendi a amar como um verdadeiro pai.
Deixou-nos em janeiro de 2012.
v
AGRADECIMENTOS
A Deus primeiramente, por todas as graças concedidas neste tempo intenso de
estudos e trabalho.
À minha família, que, juntos, vivemos nestes dois anos a dor, a partida e o amor.
Ao professor Afonso Maria Ligorio Soares, pela amizade e companheirismo na
orientação desta pesquisa.
A Capes, pelo auxílio de bolsa que muito contribuiu para o desenvolvimento deste
trabalho.
A Andreia Bisuli, secretária do Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências
da Religião, por sua dedicação e atenção.
A todos os professores do curso, em especial Ênio Brito e Fernando Londoño, com
os quais pude aprender e conviver em sala de aula.
Ao professor Edin Sued Abumanssur, que me acompanhou durante o estágio do-
cente, por sua amizade e apoio em um dos momentos mais difíceis de minha vida.
Aos professores Sérgio Junqueira e João Décio Passos, por sua colaboração em
minha banca de qualificação e ajuda no “ajuste” do foco desta pesquisa.
Aos meus colegas de curso, com os quais compartilhei um pouco da minha vida e
dos meus trabalhos.
À Congregação das Irmãs Paulinas na pessoa de Irmã Eide de Bortoli, que me
ofereceu a oportunidade de fazer este estudo, e a todas as irmãs do governo
provincial anterior e atual.
Às minhas irmãs de comunidade, às quais sou muito grata: Ivani, Maria de Lourdes,
Belmira, Ana Paula, Maria do Carmo, Patrícia, Maura, Aparecida, Idalina, Ana
Gleicy, Fabíola, Maria Luíza, Verônica, Therezinha e Maria Inês.
À minha amiga e irmã de muitos carnavais, Maria Goretti de Oliveira, que colaborou
não só com a revisão textual desta pesquisa, mas, sobretudo no diálogo e na
partilha de vida.
À amiga de caminhada Tatiana Boulhosa, que gentilmente me ajudou com a língua
inglesa.
O grande risco que se corre, ao nomear as pessoas em uma lista, é se esquecer de
mencionar alguém; por isso, a minha sincera gratidão a todas as pessoas que,
mesmo sem tê-las mencionado aqui, contribuíram comigo no estudo, no trabalho,
nas partilhas de vida, na dor e na alegria. Muito obrigada!
vi
RESUMO
No processo de desenvolvimento do Ensino Religioso, encontra-
mos diferentes posições, tanto no que diz respeito à sua legitimidade, quanto
à aplicação de seus conteúdos. Muitas críticas são direcionadas ao Ensino
Religioso, e o modelo por elas questionado é o confessional. Contudo, há
diferentes formas de apresentar o conteúdo, como o faz a revista Diálogo, que
se tornou um referencial em sua categoria, por preconizar a própria legislação
referente ao Ensino Religioso.
A presente dissertação objetiva analisar a perspectiva de Ensino
Religioso presente no conteúdo da Diálogo à luz do modelo das Ciências da
Religião, a fim de estabelecer um diálogo com alguns críticos contrários ao
Ensino Religioso e a revista, e dessa forma evidenciar que é possível estudar a
religião no ambiente escolar sem a perspectiva confessional, principal alvo de
crítica.
O conteúdo do Ensino Religioso passou por significativas mudanças
ao longo do caminho. Tributária dessa evolução, a revista Diálogo oferece uma
abordagem que, ao contrário do que é apontado pelos críticos do Ensino
Religioso, apresenta as religiões em seus diferentes aspectos, respeitando o
pluralismo religioso existente no Brasil. Ampara esta pesquisa, além da
consulta à própria revista e à legislação brasileira em vigor, o referencial teórico
de autores como João Décio Passos e Sérgio Junqueira, entre outros.
A análise da revista Diálogo evidencia que suas abordagens tratam
dos temas na perspectiva das diferentes áreas de conhecimento e que a visão
de Ensino Religioso presente na revista é aquela baseada no modelo das
Ciências da Religião. Desse modo a dissertação se opõe à ideia de alguns
críticos de que o Ensino Religioso é sempre confessional.
Palavras-chave: Revista Diálogo, Ensino Religioso, Legislação, Parâmetros
Curriculares, Ciências da Religião.
vii
ABSTRACT
In the process of developing Religious Education as a subject, there
have been different positions regarding its legitimacy, its application and its
contents. Even though Religious Education as a subject receives severe
criticism, what is questioned is the confessional model. However, there are
different ways to present the content, as seen in Revista Diálogo, which has
become a reference in its category, since it defends the legislation that refers to
Religious Education in itself.
This thesis aims at analyzing how is it that Religious Education presents
itself in the content of Revista Diálogo in light of the Religious Studies model, to
establish a dialogue with some critics opposed to Religious Education and the
magazine, and thereby show that it is possible to study religion in the school
environment without the confessional perspective, the main target of criticism.
The content of the Religious Education curriculum has undergone
significant changes along the way. Among other factors that contributed to this
change, one must point to Diálogo, whose approach - unlike what has been said
by critics - presents religion in its different aspects, respecting religious
pluralism, as it exists in Brazil. Given our main thematic reference, besides
several issues of Revista Diálogo in itself, the Brazilian legislation, and
theoretical referential from authors such as João Décio Passos, and Sérgio
Junqueira, and other such texts complement our work.
The analysis of Revista Diálogo shows that its
approaches address the issues from the perspective of different areas of
knowledge and that the Religious Education therein present is the same as
that proposed as a model by the Religious Studies. Thus the dissertation
opposes the idea of some critics that Religious Education is always
confessional.
Key-words: Revista Diálogo, Religious Education, Legislation, Curricular
Parameters, Religious Studies.
viii
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 1
CAPÍTULO I: O ENSINO RELIGIOSO E SUAS AMBIVALÊNCIAS NA TESSITURA BRASILEIRA .... 9
1. ENSINO RELIGIOSO: UM OBJETO MARCADO PELAS AMBIVALÊNCIAS .......................................... 10
1.1. As fases ou modelos de Ensino Religioso na educação brasileira ......................... 13
1.2. Ensino Religioso e Estado laico ............................................................................ 17
2. O ENSINO RELIGIOSO NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ................................................................ 19
2.1. O Ensino Religioso nas constituições do Brasil ..................................................... 20
2.2. O Ensino Religioso nas Leis de Diretrizes e Bases ................................................. 21
3. A PROPOSTA DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS................................................... 24
4. AS CONTROVÉRSIAS ACERCA DO CONTEÚDO DO ENSINO RELIGIOSO ......................................... 27
4.1. O ambiente do Ensino Religioso na proposta de Carlos Roberto Jamil Cury ......... 28
4.2. O Ensino Religioso e a formação moral das gerações segundo José Vaidergorn ... 31
4.3. O substrato do Ensino Religioso segundo Emerson Giumbelli .............................. 33
CAPÍTULO II: O ENSINO RELIGIOSO NA LINGUAGEM DE UMA REVISTA ............................. 39
1. A CONTRIBUIÇÃO DA CNBB PARA A CRIAÇÃO DA DIÁLOGO .................................................... 40
2. A GÊNESE DA DIÁLOGO – REVISTA DE ENSINO RELIGIOSO ...................................................... 42
2.1. O sonho de uma revista de Ensino Religioso torna-se realidade .......................... 45
2.2. Uma nova etapa para a revista Diálogo ............................................................... 51
3. O MODELO DAS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO PRESENTE NA DIÁLOGO .............................................. 54
4. AS TEMÁTICAS ABORDADAS ENTRE 1995 E 2010 ................................................................. 56
4.1. Os cinco eixos temáticos e seus parâmetros para a revista Diálogo ..................... 57
4.2. Os temas de capa ................................................................................................ 58
4.3. Os enfoques principais das chamadas de capa .................................................... 60
CAPÍTULO III: O DIÁLOGO ENTRE A CRÍTICA EPISTEMOLÓGICA E A REVISTA DIÁLOGO À
LUZ DAS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO ........................................................................................ 63
1. AS PROBLEMÁTICAS DO ENSINO RELIGIOSO NA CRÍTICA EPISTEMOLÓGICA ................................. 64
1.1. A crítica ao “lugar” do Ensino Religioso ............................................................... 64
ix
1.2. A crítica ao Ensino Religioso como herança da ditadura ...................................... 66
1.3. A crítica ao cristianismo como substrato do Ensino Religioso .............................. 67
2. AS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO COMO FUNDAMENTO TEÓRICO DO ENSINO RELIGIOSO............................ 69
3. REVISITANDO OS 15 ANOS DE PUBLICAÇÃO ......................................................................... 72
4. IDENTIFICAÇÃO DOS ARTICULISTAS..................................................................................... 73
4.1. Grau acadêmico e áreas de conhecimento .......................................................... 74
4.2. Áreas de conhecimento e Religião ...................................................................... 78
4.3. Articulistas docentes por área de conhecimento ................................................. 81
5. ANÁLISE DE TEXTOS SELECIONADOS ................................................................................... 83
5.1. Edição n. 6: A violência e as religiões, contribuições para a paz ........................... 84
5.2. Edição n. 18: Ritos e celebrações no contexto da vida ......................................... 87
5.3. Edição n. 24: Nossas raízes indígenas .................................................................. 90
5.4. Edição n. 31: Pluralismo e diversidade humana ................................................... 93
5.5. Edição n. 49: História e cultura Afro-Brasileira na escola ..................................... 96
5.6. Edição n. 58: O sagrado na pessoa e na sociedade ............................................ 100
CONCLUSÃO .................................................................................................................... 105
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 112
x
LISTA DE SIGLAS
ASSINTEC – Associação Interconfessional de Educação de Curitiba
CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CEDES – Centro de Estudos Educação e Sociedade
CEP – Comissão Episcopal de Planejamento
CIER – Conselho de Igrejas para a Educação Religiosa
CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CNE – Conselho Nacional de Educação
ENER – Encontros Nacionais de Ensino Religioso
FONAPER – Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso
GRERE – Grupo de Reflexão para o Ensino Religioso
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC – Ministério da Educação e Cultura
OSPB – Organização Social e Política do Brasil
PCNER – Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso
PUC – Pontifícia Universidade Católica
UNESCO – União das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
xi
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Capa da revista Diálogo n. 0 ............................................................. 47
Figura 2: Capa da revista Diálogo n. 25 ........................................................... 48
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Esquematização de Sérgio Junqueira .......................................... 15
Tabela 2: Esquematização de João Décio Passos ...................................... 16
Tabela 3: Grau de formação X Editoria ........................................................ 76
Tabela 4: Área de conhecimento X Grau acadêmico ................................... 77
Tabela 5: Religiões ...................................................................................... 79
Tabela 6: Áreas de conhecimento X Religião .............................................. 80
Tabela 7: Docentes X Áreas de conhecimento ............................................ 82
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Percentual de publicação por Eixo Temático ............................... 59
Gráfico 2: Enfoque dos temas de capas ...................................................... 60
Gráfico 3: Artigos X Editorias ....................................................................... 75
Gráfico 4: Grau acadêmico dos articulistas .................................................. 76
Gráfico 5: Principais áreas X Editoria ........................................................... 78
Gráfico 6: Tradições religiosas ..................................................................... 80
Gráfico 7: Docentes X Não docentes ........................................................... 82
1 Introdução
INTRODUÇÃO
O interesse no estudo do Ensino Religioso surgiu quando fui
convidada para ser diretora de redação da revista Diálogo. Sentia a ne-
cessidade de compreender melhor o conteúdo apresentado na revista, uma
vez que eu me tornaria a responsável por aprovar suas temáticas, assim
como acompanhar toda a produção textual dos artigos e das seções que a
compõem. Sou graduada em Teologia, entretanto, o conhecimento que tinha
sobre o Ensino Religioso, antes de assumir o trabalho na redação da revista
Diálogo, era insuficiente para coordenar uma publicação específica e ao
mesmo tempo especializada. Por isso, optei pelo mestrado em Ciências da
Religião.
Iniciou-se assim esta pesquisa, que tem por objetivo fazer uma
análise do Ensino Religioso presente no conteúdo da revista Diálogo, à luz
do modelo das Ciências da Religião, e assim estabelecer, um diálogo com
alguns críticos contrários ao Ensino Religioso escolar. A revista é uma
referência em sua categoria, pois sua primeira publicação antecede a san-
ção da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) n. 9.475/97,
segundo a qual se estabeleceu no artigo 33 que:
O Ensino Religioso é parte integrante da formação básica do cidadão, e, embora seja de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.
A revista Diálogo, que preconizou a legislação voltada para a di-
versidade e a pluralidade religiosa, pode ser considerada como a realização
de um desejo dos professores que se reuniram no 10º Encontro Nacional
para professores de Ensino Religioso (Ener), realizado no ano de 1994, na
cidade de Fortaleza (CE), do qual participaram aproximadamente 180
2 A prática de Ensino Religioso não confessional
professores de 23 estados do Brasil. O encontro teve como tema central: O
Fenômeno Religioso na pós-modernidade: mudanças socioculturais,
manifestações religiosas e o diálogo inter-religioso. Entre as propostas
apresentadas pelos participantes, no encerramento do encontro, constava a
iniciativa de se criar uma revista de Ensino Religioso direcionada para a
formação do professor dessa disciplina e, ao mesmo tempo, tal revista seria
um meio de comunicação, troca de experiências e informações entre os
professores das várias regiões do País.
Desde a sua primeira edição, a revista Diálogo buscou compre-
ender que o Ensino Religioso é um componente curricular, que visa a ajudar
a formar no cidadão um novo ethos aberto ao respeito e à diversidade social,
política e religiosa presentes no Brasil. É interessante ressaltar que o Ensino
Religioso sempre esteve presente na educação brasileira, desde a coloniza-
ção até os dias atuais. E, ao longo do processo de desenvolvimento do Bra-
sil, o Ensino Religioso também passou por significativas mudanças.
Com o respaldo da legislação foi se delineando a natureza do En-
sino Religioso, inicialmente compreendido como o elemento religioso no âm-
bito escolar. A mudança inicia-se com a LDB n. 9.475/97, a partir da qual se
passa a compreender que o Ensino Religioso não está vinculado aos conte-
údos doutrinários de nenhuma religião, pois a sua presença na escola tem
por finalidade o estudo da religião enquanto Fenômeno Religioso.
A discussão acerca do Ensino Religioso como componente esco-
lar é um tema polêmico, pois, em seu processo de desenvolvimento e
escolarização na educação brasileira, encontramos diferentes posições tanto
no que diz respeito à sua legitimidade como componente curricular, quanto
aos modelos de ensino aplicados: confessional, inter-religioso e
fenomenológico ou das Ciências da Religião.
Ao longo do caminho, surgiram diferentes posicionamentos, tanto
a favor, quanto contra, à presença do Ensino Religioso nas escolas públicas.
Várias pessoas e entidades, civis e religiosas, manifestaram-se favoráveis à
permanência desse componente curricular, entre as quais merecem
destaque o Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso (Fonaper) e a
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Também tem se
3 Introdução
manifestado contra a legitimidade do Ensino Religioso, muitos
pesquisadores, dentre eles, Carlos Roberto Jamil Cury, Emerson Giumbelli,
José Vaidergorn. Esses pesquisadores afirmam que o Ensino Religioso
deve-se restringir ao âmbito das Igrejas e não da escola, pois neste
componente curricular o estudo das religiões tem como pressuposto um
único substrato. Além disso, também há uma compreensão de que o Ensino
Religioso seria um resquício da ditadura. Tais críticas necessitam de
respostas adequadas, pois o não esclarecimento das mesmas ocasionará
uma compreensão errônea da situação do Ensino Religioso.
Em nossa pesquisa, analisamos a presença do modelo de Ensino
Religioso das Ciências da Religião nas abordagens da revista Diálogo, a fim
de responder aos críticos contrários ao Ensino Religioso. Desejamos
estabelecer um diálogo com alguns críticos, evidenciando que o estudo das
religiões no ambiente escolar pode ter uma perspectiva não confessional,
assim como é no modelo das Ciências da Religião.
Almejamos, portanto, neste estudo analisar as críticas apontadas
pelos pesquisadores mencionados, a fim de evidenciar a sua problemática,
bem como as possíveis fragilidades desses argumentos. Buscaremos
responder a tais argumentos com a análise de um modelo de Ensino Religi-
oso à luz das Ciências da Religião nas abordagens da revista Diálogo, evi-
denciando que há outras possibilidades no desenvolvimento do conteúdo do
Ensino Religioso, além do modelo confessional.
Em relação às publicações da revista Diálogo, evidentemente não
será possível analisar todas as edições ao longo de seus 17 anos. Além do
mais, não é conveniente incluir a minha editoria na análise, pois assim se
tornaria difícil, nesta pesquisa, separar o meu envolvimento afetivo e profis-
sional com a revista. Desse modo, optamos por analisar apenas o período
que corresponde a gestão da primeira e da segunda editora de redação, ou
seja, de outubro de 1995 a agosto de 2010.
Na apresentação da crítica epistemológica do Ensino Religioso,
utilizaremos os seguintes textos: “A religião nos limites da simples educação:
Notas sobre livros didáticos e orientações curriculares de Ensino Religioso”,
de Emerson Giumbelli, “Ensino Religioso na escola pública: O retorno de
4 A prática de Ensino Religioso não confessional
uma polêmica recorrente”, de Carlos Roberto Jamil Cury, e “Ensino
Religioso, uma herança do autoritarismo”, de José Vaidergon, conforme
indicação nas referências bibliográficas.
O Ensino Religioso nem sempre foi um tema de consenso, no que
diz respeito à sua permanência como componente curricular. E no decorrer
desse processo é possível identificar dois posicionamentos bem definidos,
um a favor, e outro contrário ao Ensino Religioso, os quais promoveram
muitas discussões a respeito do tema. Neste trabalho no qual refletimos
acerca do desenvolvimento do Ensino Religioso, das críticas contrárias e de
como responder, cientificamente, a estas críticas à permanência desse
componente curricular, levantamos as seguintes questões:
1) Quais as mudanças observáveis na concepção de Ensino
Religioso que permitem justificar a sua permanência no currículo escolar,
não obstante as posições contrárias a este ensino?
2) De que modo a revista Diálogo e o modelo de Ensino Religioso
presente nas suas abordagens contribuíram para o desenvolvimento deste
ensino e como se constata isso no conteúdo da revista?
3) Ao considerarmos as críticas ao Ensino Religioso, no que diz
respeito a seu conteúdo, seria possível por meio da revista Diálogo
evidenciar a aplicação de outro modelo de abordagem da religião que não
seja o confessional?
É longa a caminhada do Ensino Religioso escolar no contexto
brasileiro. E as reflexões que surgiram sobre esse tema sempre foram cerca-
das de certa complexidade, por se tratar de duas instituições, escola e reli-
gião, que no contexto atual, segundo alguns pesquisadores, não deveriam
estar juntas. Podemos falar de religião em diferentes perspectivas, seja em
termos doutrinários, seja no campo científico; entretanto, a abordagem deve
se adequar ao ambiente no qual se está tratando da religião.
No âmbito da sala de aula, o estudo das religiões, através do
Ensino Religioso, passou por significativas mudanças, pois o seu conteúdo
passou a ser interpretado não mais como a introdução da abordagem de
uma religião no âmbito escolar e adquiriu o status de um estudo das
religiões. Muitos elementos, certamente, contribuíram para essa mudança,
5 Introdução
que é resultado de uma longa caminhada. Os modelos mais antigos de
Ensino Religioso, contudo, não desapareceram totalmente, mas coexistem
com o atual em vigor.
A publicação da revista Diálogo, cujas abordagens se apresentam
a partir das diferentes áreas de conhecimento, contribuiu com o desenvolvi-
mento do Ensino Religioso à luz do modelo das Ciências da Religião,
evidenciando que é possível estudar as tradições religiosas sem o apelativo
confessional.
A crítica ao Ensino Religioso não se dirige a ele como um todo,
pois há diferentes modos de aplicar o seu conteúdo. Desse modo, a nossa
hipótese central propõe que na leitura do conteúdo da revista Diálogo, sob a
perspectiva das Ciências da Religião, é possível dar uma resposta à crítica
da epistemologia do Ensino Religioso. O conteúdo da revista apresenta às
religiões, em seus diferentes aspectos, na perspectiva do pluralismo religi-
oso, como sendo uma publicação de uma editora confessional.
A nossa análise da perspectiva e do conteúdo da revista Diálogo
à luz do modelo das Ciências da Religião propõe os seguintes objetivos:
1. Apresentar a crítica à epistemologia do Ensino Religioso e veri-
ficar a problemática que se encontra por trás da questão, a fim de a ela
buscar resposta através das abordagens da revista Diálogo, as quais
entendemos estar em consonância com as Ciências da Religião e com a
proposta dos Parâmetros Curriculares do Ensino Religioso (PCNER);
2. Evidenciar que o Ensino Religioso escolar é o estudo das
religiões em seus aspectos antropológico, social e cultural, cuja base
epistemológica são as Ciências da Religião;
3. Analisar as abordagens da revista Diálogo e o modelo de En-
sino Religioso por ela apresentado, checando se ela oferece aos leitores-
professores um conteúdo de qualidade e que corresponda à legislação e aos
parâmetros curriculares para o Ensino Religioso.
Nosso ponto de partida é primeiramente a legislação brasileira,
uma vez que esta é o parâmetro que regula a proposta de Ensino Religioso.
As Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9.394/96 e n.
9.475/97, no artigo 33, modificaram a proposta de um Ensino Religioso
6 A prática de Ensino Religioso não confessional
confessional e/ou interconfessional, para um ensino que respeite a
diversidade cultural religiosa do Brasil, proibindo quaisquer formas de prose-
litismo por parte dos docentes.
Com respeito às mudanças ocorridas nos modelos de Ensino
Religioso, trabalharemos principalmente com as seguintes obras:
- Ensino Religioso, construção de proposta, de João Décio Pas-
sos, que apresenta de forma esquemática os “modelos” de Ensino Religioso
aplicados no Brasil. Trata-se de um elemento bastante importante para a
compreensão das críticas ao Ensino Religioso, pois é preciso ter claro qual
“modelo” de ensino se está contestando;
- A caminhada do Ensino Religioso na CNBB, que é um docu-
mento mimeografado, no qual se narra o papel da Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil na caminhada do Ensino Religioso como elemento constitu-
tivo da formação do cidadão brasileiro;
- O processo de escolarização do Ensino Religioso no Brasil, tese
de doutorado de Sérgio Junqueira, o qual faz uma sistematização analítica
do longo processo de escolarização do Ensino Religioso no Brasil.
A fonte primária da pesquisa é, evidentemente, a Diálogo –
Revista de Ensino Religioso, de modo específico às edições números 6, 18,
24, 31, 49 e 58, das quais analisaremos as abordagens.
A natureza dessa pesquisa é de caráter bibliográfico, com base
analítica e documental. O itinerário percorrido fundamenta-se no auxílio de
leituras, análises e reflexões realizadas a partir da bibliografia levantada
sobre o tema, as quais possibilitaram nossa análise da revista.
Servimo-nos também de entrevista com as duas primeiras
diretoras de Redação da revista Diálogo, a fim de reconstituir a criação e o
desenvolvimento dessa publicação, bem como perceber as semelhanças e
diferenças nas editorias. Ainda no que diz respeito à coleta de dados, para
identificar os articulistas que escreveram na revista Diálogo, utilizamos o
mailing da revista para entrar em contato com os articulistas e obter o maior
número de informações acerca do grau e área de formação, religião e
atuação docente.
7 Introdução
Para a análise do conteúdo da revista Diálogo, optamos por sele-
cionar as edições por meio de sorteio, a fim de garantir a imparcialidade na
escolha dos textos e manter a integridade da análise. Os critérios usados no
sorteio seguiram essa regra: duas revistas de 1995 a 2000; duas de 2001 a
2005; e duas de 2006 a 2010. Os intervalos de cinco anos possibilitaram que
a análise das revistas fosse proporcional ao tempo de cada editoria.
Desse modo, obtivemos as seguintes edições entre 1995 e 2000:
a n. 6, maio de 1997, A violência e as religiões, contribuições para a paz; e a
n. 18, maio de 2000, Ritos e celebrações no contexto da vida. De 2001 a
2005: a n. 24, outubro de 2001, Nossas raízes indígenas; e a n. 31 agosto
de 2003, Pluralismo e diversidade humana, somos todos iguais, porém dife-
rentes. E entre 2006 e 2010: a n. 49, fevereiro de 2008, História e cultura
Afro-Brasileira na escola; e a n. 58, maio de 2010, O sagrado na pessoa e
na sociedade.
Estabelecemos as seguintes categorias para a análise das revis-
tas selecionadas: articulista e artigo. Nessas categorias buscamos responder
às seguintes questões: Quem escreve? Qual o seu grau e área de for-
mação? Qual é a abordagem do texto? A qual eixo temático proposto pelo
PCNER ele se aplica? Essas categorias têm por objetivo nos ajudar a per-
ceber qual o modelo de Ensino Religioso presente na revista Diálogo.
Os resultados da pesquisa serão apresentados em três capítulos.
No primeiro capítulo, O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura
brasileira, traçamos um panorama histórico e atual do Ensino Religioso no
Brasil, evidenciando as suas ambivalências no ambiente escolar, bem como
o que afirma a legislação acerca do Ensino Religioso. Destacamos também
contribuições do Fonaper na formulação dos PCNER, e três argumentos de
crítica à epistemologia do Ensino Religioso.
No segundo capítulo, O Ensino Religioso na linguagem de uma
revista, reconstituímos o contexto histórico no qual nasceu a Diálogo, e
apresentamos seu perfil editorial e seus objetivos, bem como sua trajetória
ao longo dos 17 anos de publicação.
No terceiro capítulo, O diálogo entre a crítica epistemológica e a
revista Diálogo à luz das Ciências da Religião, à luz de análise das edições
8 A prática de Ensino Religioso não confessional
selecionadas da revista, retomamos os argumentos dos críticos e
apontamos algumas respostas à problemática por eles levantadas.
Evidenciamos as Ciências da Religião como base epistemológica do Ensino
Religioso, bem como das abordagens da Diálogo.
A título de conclusão, apontamos alguns desafios e perspectivas
que surgem para a revista Diálogo. Poderíamos ter incluído esse item no
final do capítulo três, entretanto, considerando que a história do Ensino Reli-
gioso e a criação da revista caminham juntas, acreditamos que os mesmos
desafios e perspectivas se aplicam, tanto à revista, quanto à disciplina de
Ensino Religioso.
9 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
CAPÍTULO I
O ENSINO RELIGIOSO E SUAS AMBIVALÊNCIAS NA
TESSITURA BRASILEIRA
Nesse capítulo, abordaremos a questão que envolve o Ensino Re-
ligioso escolar no contexto atual do Brasil. No âmbito escolar, esta disciplina
não é estranha, pois ela sempre fez parte da educação brasileira, inicial-
mente como o elemento de religião na escola, e atualmente como o estudo
das religiões enquanto manifestações culturais.
As reflexões tecidas sobre o Ensino Religioso fizeram emergir a
compreensão de que ele é distinto da catequese. Tal distinção, na tessitura
atual é consensual, pelo menos no que diz respeito à legislação, mas nem
sempre a natureza do Ensino Religioso foi tão clara assim, tanto para os
professores, quanto para os legisladores, que foram amadurecendo
paulatinamente a sua reflexão sobre este tema.
Evidenciaremos quanto a legislação contribuiu para a perma-
nência do Ensino Religioso no currículo escolar. Entretanto, algumas lacu-
nas ainda estão presentes na mesma legislação, o que possibilita a pre-
sença de possíveis entraves para o pleno desenvolvimento do Ensino Reli-
gioso escolar. Entre as principais lacunas, a mais latente é a ausência de um
parâmetro curricular nacional para o Ensino Religioso que seja válido em
todo o território nacional, de modo que garanta maior uniformidade na forma
e no conteúdo dessa disciplina.
Buscaremos elucidar que muitos professores se empenharam no
encargo de apresentar ao Ministério da Educação propostas curriculares.
Entre estas, a mais relevante por se aproximar das exigências das leis que
10 A prática de Ensino Religioso não confessional
regem a educação foi apresentada pelo Fórum Nacional Permanente de
Ensino Religioso.
Por fim, introduziremos alguns pontos referentes à crítica ao En-
sino Religioso escolar. Trabalharemos especificamente com alguns autores
mais relevantes para a nossa pesquisa, entre eles: Carlos Roberto Jamil
Cury, José Vaidergorn e Emerson Giumbelli. É importante ressaltar que no
terceiro e último capítulos deste trabalho, pontuaremos alguns elementos da
crítica, a fim de verificarmos se estes também dizem respeito ao conteúdo
da Diálogo – Revista de Ensino Religioso.
1. Ensino Religioso: um objeto marcado pelas ambivalências
A discussão acerca do Ensino Religioso escolar no contexto bra-
sileiro atual é muito latente. Podemos identificar claramente dois posiciona-
mentos que fazem emergir uma série de questões a favor e também contra
esse componente curricular, cujo objeto de estudo é a religião. Esta constitui
um termo bastante complexo de se definir, pois, segundo Greschat, não há
uma definição universal de religião, e sim uma polissemia de sentido, de
modo que este pode variar conforme o que o interlocutor tem em mente1.
Essa discussão é delicada e ao mesmo tempo complexa, pois se
trata de um elemento que compõe a formação do cidadão e que não goza
das mesmas condições que os demais componentes curriculares. Como
entender a natureza de um ensino que é obrigatório para a escola e faculta-
tivo quanto à adesão do aluno?2 O que se pode entender por religioso no
âmbito da escola? Como definir o conteúdo de uma disciplina que trata de
uma categoria tão complexa como é a religião? As indagações que surgem
são muitas, e todas necessitariam de uma resposta; entretanto não temos a
pretensão de responder a todas as questões que surgem. Vamos nos ater a
1 Cf. GRESCHAT, H. O que é ciência da religião. 2006.
2 Cf. BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9.475/97.
11 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
algumas das questões que emergem e se relacionam especificamente ao
nosso estudo.
É interessante ressaltar que o Ensino Religioso não é um ele-
mento estranho como componente da educação; pelo contrário, ele sempre
esteve presente na educação brasileira, e, segundo Oliveira, desde o pe-
ríodo da colonização, quando “coube aos representantes eclesiásticos da
Companhia de Jesus, por delegação da Coroa Portuguesa, a ‘educação’ dos
habitantes do território em processo de conquista, pelo exercício da cate-
quese e instrução”3, a educação religiosa passou a integrar a educação e
permanece até os dias atuais como parte integrante da formação do cidadão
brasileiro. É, sobretudo, no processo de escolarização do Ensino Religioso4
que se destaca a sua ambivalência, pois este ora foi um elemento da religião
no âmbito escolar, ora foi considerado área de conhecimento independente
de uma religião específica5. Para Cortella, não devemos confundir educação
religiosa com Ensino Religioso, pois estes subentendem processos de soci-
alização diferentes6.
Quando no Brasil o assunto é Ensino Religioso, logo vem à mente
o catolicismo7. E tal associação não é equivocada, pois, uma vez que a
3 OLIVEIRA, L. B., Formação de docentes para O Ensino Religioso: Perspectivas e impulsos
a partir da ética social de Martinho Lutero, p. 30. 4 Este tema é amplamente estudado por Sérgio Junqueira que, em sua tese de doutorado O
processo de escolarização do Ensino Religioso no Brasil, perfaz detalhadamente todo o caminho do Ensino Religioso na educação brasileira, desde o período do Império até a legislação atual da República do Brasil. 5 Cabe esclarecer que Ensino Religioso e educação da religiosidade, muitas vezes são
termos entendidos como intercambiáveis. O que é um grande equívoco, pois o primeiro concentra-se no Fenômeno Religioso abarcando os aspectos históricos, sociais e culturais das diferentes religiões, enquanto que a educação religiosa se fundamenta na sistematização, ou melhor na transmissão de valores e crença, de uma determinada Igreja. Desse modo, não cabe falar de um Ensino Religioso cristão, budista, islâmico ou de qualquer outra tradição religiosa, pois no ambiente escolar não se ensina religião “A” ou “B”. Contudo, é possível falar de uma educação religiosa que qualquer tradição religiosa pode e deve legitimamente oferecer aos seus adeptos, os seus ensinamentos de fé, porém dentro de seus próprios espaços. 6 CORTELLA, M. S., Educação, Ensino Religioso e formação docente. In: SENA, L. Ensino
Religioso e formação docente, p. 11-20. 2006. 7 Wolfgang Gruen afirma que, numa linguagem filosófica, o catolicismo é uma chave
indispensável de interpretação da cultura brasileira, que ele chama de “espaço hermenêutico”, pois a interpretação que o catolicismo provoca não é a mesma no protestante, espírita ou católico, contudo, é inevitável que todos eles se deparem com o
12 A prática de Ensino Religioso não confessional
Igreja Católica sempre foi a primeira postuladora da presença do Ensino
Religioso nos documentos oficiais do Brasil, é natural que o velho fantasma
da cristandade volte a assombrar o pensamento das pessoas contrárias ao
Ensino Religioso como componente curricular8 e preocupadas com a
educação brasileira. Entretanto, a própria Igreja Católica no Brasil, por meio
do Grupo de Estudos e Reflexão do Ensino Religioso Escolar (Grere), ligado
à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), também repensou a
sua compreensão sobre o Ensino Religioso, passando este a ser entendido
como algo distinto da catequese. Atenta às mudanças que vinham ocorrendo
na educação, na legislação e na organização do Ensino Religioso em cada
estado, a CNBB buscou perceber que tal ensino se ligava mais à “educação
integral, como disciplina do currículo escolar, do que ao universo da cate-
quese, entendida como educação da fé, numa comunidade eclesial”9.
A CNBB representada pelo Grere, foi responsável pela articulação
dos Encontros Nacionais para Coordenadores de Ensino Religioso nos
estados e regionais da CNBB. A partir de 1984, a CNBB promoveu encon-
tros realizados a cada dois anos, o que possibilitou a reflexão e a articula-
ção, em todo o Brasil, de professores e pessoas interessados na discussão
sobre o Ensino Religioso. Esses encontros foram importantes, tanto na tra-
jetória de instalação do Fonaper, em 1997, quanto para a criação da Diálogo
– Revista de Ensino Religioso, surgida a partir desses encontros10. Outra
atuação importante da CNBB, em prol do Ensino Religioso como
componente curricular, aconteceu junto à Assembleia Constituinte que
catolicismo ao interpretar a própria realidade. Cf. GRUEN, W., O Ensino Religioso na escola, p.111-112. 8 Prova desse atual assombro é o acordo assinado em 2008 entre o Vaticano e o Brasil.
Entretanto, não vamos entrar no mérito dessa questão, pois este é um tema que merece ser discutido com profundidade e não é objetivo desta pesquisa levantar a discussão. 9 CNBB, A caminhada do Ensino Religioso na CNBB, mimeo, p.12-13.
10 A trajetória dos Ener é importante para a nossa pesquisa, pois ele antecede a criação da
revista Diálogo, cuja ideia primária se originou nas conclusões do 10º Ener. Por hora, não vamos nos deter nesse tema, pois o mesmo será mais desenvolvido no 2º capítulo deste trabalho. A respeito do Fonaper, voltaremos a este tema quando tratarmos dos Parâmetros Curriculares, mais à frente neste mesmo capítulo.
13 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
elaborou e votou a Constituição do Brasil, em 198811, em cujo pronuncia-
mento a CNBB afirma:
Não é função nossa, como Pastores, apresentar pormeno-res técnicos para a formulação da Constituição. Mas como membros da sociedade brasileira e de uma instituição que, fundada na mensagem e na obra de Jesus Cristo, tem nesta mesma sociedade presença significativa, não podemos dei-xar de dar nossa contribuição para o grande debate nacio-nal que ora se aprofunda. Temos consciência de que nosso desejo de contribuir para uma sociedade justa e fraterna passa agora por um esforço de explicação das exigências cristãs de uma nova ordem constitucional
12.
O Ensino Religioso escolar reconhecido como área de conheci-
mento13 pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), por meio da Resolu-
ção 02/98, em seu artigo 3º, item IV, em 1988, ainda causa opiniões diver-
gentes tanto em relação à sua liceidade, quanto à natureza de seus conteú-
dos, pois, para esse componente curricular, os professores não dispõem de
parâmetros curriculares oficiais, isto é, do Ministério da Educação e Cultura,
o que concederia ao Ensino Religioso um conteúdo programático e unifi-
cado, de modo que de norte a sul do Brasil haveria consenso e entendi-
mento acerca dessa disciplina.
1.1. As fases ou modelos de Ensino Religioso na educação brasileira
Como já afirmamos, no cenário da educação brasileira no que diz
respeito ao Ensino Religioso, temos de um lado o posicionamento favorável
e de outro o eminentemente contra à permanência deste componente
curricular14. Aqueles que são contrários ao Ensino Religioso escolar
11
CNBB, op. cit., p.15-16. 12
O Ensino Religioso em pronunciamentos da CNBB disponível em http://www.cnbb.org.br/ensinoreligioso/ercnbb.php acessado em 12/02/2012, às 18:40 horas. 13
MENEGHETTI, R. G. K., Comentário ao documento. In: SENA, L., Ensino Religioso e formação docente; Ciências da Religião e Ensino Religioso em diálogo, p. 137-143. 14
Viviane Cristina Cândido em sua pesquisa de mestrado classifica os diferentes posicionamentos em três grupos: a CNBB, o Fonaper e o Grupo do Não. Neste último,
14 A prática de Ensino Religioso não confessional
argumentam ele apresenta um enfoque confessional que o torna uma
ameaça ao pluralismo religioso existente no Brasil15. Essa divergência de
opinião, em certo sentido, é positiva, pois contribui para uma reflexão mais
profunda acerca do Ensino Religioso que, segundo a própria CNBB,
reconheceu em um de seus documentos, “não é mais de domínio desta ou
daquela Igreja. É de domínio da sociedade, é dos educadores, enquanto
profissionais deste ensino16”.
É preciso considerar que as opiniões, favoráveis ou contra o En-
sino Religioso escolar, se formaram ou mesmo se consolidaram dentro de
um processo aparentemente17 evolutivo, que se iniciou efetivamente, em
termos legais e educacionais no Brasil Império, e continuou durante todo o
período republicano.
Ao revisitar o longo processo de desenvolvimento da educação no
Brasil, é possível perceber que o Ensino Religioso também passou por
grandes e significativas transformações, de modo a delinear diferentes com-
preensões sobre a natureza de seu conteúdo a partir da legislação, como
evidencia a síntese da tabela a seguir sistematizada por Sérgio Junqueira
em sua tese de doutorado18.
Cândido tem como referência o grupo que se manifestou contra a implantação do Ensino Religioso no estado de São Paulo, em 2001. Cf. CÂNDIDO, V. C., O Ensino Religioso em suas fontes. Uma contribuição para a epistemologia do Ensino Religioso, 2004. Entretanto, tal classificação pode ser estendida a todos os que direta ou indiretamente se posicionam contra o Ensino Religioso escolar. 15
Em entrevista à revista IstoÉ, edição 2164 de 4 maio de 2011, a antropóloga Débora Diniz afirma que frente ao Ensino Religioso, “a liberdade religiosa está ameaçada no País e a justiça religiosa também”. 16
CNBB, op. cit., p.34. 17
Sérgio Junqueira em sua tese de doutorado apresenta o processo “evolutivo” na concepção do Ensino Religioso escolar no Brasil em três propostas. Cf. JUNQUEIRA, S. R. A., O processo de escolarização do Ensino Religioso no Brasil, 2000. Há pesquisadores que defendem o número de quatro, mas, em nossa pesquisa, optamos em nos referir a três propostas. 18
É importante destacar que esse esquema é fruto de muitas reflexões acerca do Ensino Religioso, porém Junqueira em sua tese de doutorado sistematiza tanto a legislação, quanto as aplicações pelas quais o Ensino Religioso passou.
15 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
Tabela 1: Esquematização de Sérgio Junqueira
Lei n. Proposta Perspectiva Referencial
4.024/61 Confessional Uma confissão religiosa (católica)
A doutrina católica
5.692/71 Interconfessional Diferentes confissões cristãs
O que há em comum no cristianismo
9.475/97 Fenomenológica Fenômeno Religioso As ciências humanas (fenomenologia, antropologia entre outras)
João Décio Passos também sistematizou essas diferentes
concepções de Ensino Religioso e as classificou sob a categoria de
“modelos” de ensino19. Passos afirma que tal classificação pretende “captar
e remeter para as concepções e práticas concretas dessa disciplina”20.
Entende-se, grosso modo, a proposta de Passos da seguinte
forma: o primeiro modelo é o catequético, que tem como pano de fundo o
proselitismo, isto é, o ensinamento de uma determinada doutrina. É o mo-
delo mais antigo e se relaciona ao contexto em que a religião era hegemô-
nica na sociedade. O segundo modelo é o teológico, que segue uma pers-
pectiva ecumênica e cujo objetivo é promover o diálogo entre as religiões
cristãs e se fundamenta numa sociedade plural e secularizada com bases
antropológicas. E, por fim, tem-se o modelo das Ciências da Religião, que
também é chamado por outros autores de fenomenológico. Esse modelo não
está vinculado a nenhuma religião específica, e sua abordagem segue uma
perspectiva antropológica e sociocultural, que recebe das Ciências da Reli-
gião o seu referencial teórico e metodológico para o estudo e o ensino da
religião21.
Para chegar a esses modelos, Passos os analisa a partir de oito
aspectos que oferecem uma visão sinótica e comparativa dos mesmos. Os
pontos escolhidos por Passos para a leitura paralela são: cosmovisão, con-
texto político, fonte, método, afinidade, objetivo, responsabilidade e riscos.
Postos os três modelos lado a lado é possível perceber claramente suas
principais diferenças e objetivos, o que favorece uma visão sistêmica dos
mesmos que aqui reproduzimos e adaptamos para melhor visualizar o es-
19
Cf. PASSOS, J. D., Ensino Religioso, construção de uma proposta, 2007. 20
Ibid., p. 52. 21
Ibid., p. 50-68.
16 A prática de Ensino Religioso não confessional
quema proposto. E destacamos os riscos que cada um dos modelos, possi-
velmente, pode representar ao Ensino Religioso.
Tabela 2: Esquematização de João Décio Passos
Aspectos Modelo
Catequético Modelo
Teológico Modelo das
Ciências da Religião
Cosmovisão Unirreligiosa Plurirreligiosa Transreligiosa
Contexto político Aliança Igreja-
Estado Sociedade secularizada Sociedade secularizada
Fonte Conteúdos doutrinais
Antropologia, teologia do pluralismo
Ciências da Religião
Método Doutrinação Indução Indução Afinidade Escola tradicional Escola nova Epistemologia atual
Objetivo Expansão das
Igrejas Formação religiosa dos
cristãos Educação do cidadão
Responsabilidade Confissões religiosas
Confissões religiosas Comunidade científica e do
Estado
Riscos Proselitismo e intolerância
Catequese disfarçada
Neutralidade científica
Toda área de conhecimento apresenta riscos, pois nenhuma ciên-
cia ou conhecimento é neutro. Podemos afirmar que o Ensino Religioso não
é neutro, e nem o deve ser, assim como também não deve ser tendencioso
seguindo por uma linha confessional. A sua relevância “advém da importân-
cia social da religião como um dado humano que se mostra nas múltiplas
dimensões humanas (social, cultural, política, psicológica etc.), nas ações
humanas e nas instituições sociais de ontem e de hoje22.” O Ensino Religi-
oso “tem que estar inserido na nossa realidade, na experiência social do
aluno23,” de modo a conduzi-lo “à ação e ao engajamento que ocorrem num
fluxo de valorações e opções que envolvem o indivíduo e a sociedade24”.
É nesse sentido que se afirma a não neutralidade do Ensino Reli-
gioso. Nesse componente curricular há um telos, que é fazer com que o
educando se engaje não numa comunidade de fé, e sim na sociedade, de
um modo mais participativo e consciente de seus valores, direitos e deveres.
22
PASSOS, J. D., Ensino Religioso, construção de uma proposta, p.94. 23
GRUEN, W., O Ensino Religioso na escola, p. 119. 24
PASSOS, J. D., op. cit., p.77.
17 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
1.2. Ensino Religioso e Estado laico
Muitas pessoas e entidades civis trabalharam para a compreen-
são da natureza e do conteúdo do Ensino Religioso, que sempre foi alvo de
críticas por parte de membros da sociedade, bem como por pesquisadores
da área da educação, que afirmam haver certa contradição entre Ensino Re-
ligioso escolar e a laicidade do Estado brasileiro, como afirma a antropóloga,
Débora Diniz:
É possível afirmar que o Brasil é um país laico. A laicidade deve ser entendida como um dispositivo político que orga-niza as instituições básicas do Estado, tais como as cortes, os hospitais e as escolas públicas, e regula seus funciona-mentos quanto à separação entre a ordem secular e os va-lores religiosos. Não há religião oficial no País, e as liberda-des de consciências e de crença são garantias constitucio-nais, que protegem o direito de expressão tanto dos crentes religiosos quanto dos agnósticos
25.
De fato o Brasil é um Estado laico e soberano, que não está
subjugado a nenhuma religião. Embora hoje não seja possível afirmar que o
Brasil seja um país católico, não se pode negar a influência do catolicismo
na formação e na cultura do povo brasileiro. E, atualmente, em alguns
setores da sociedade, ainda é claramente visível a influência da Igreja
Católica, sobretudo, no que diz respeito à moral e à ética. Entretanto, na
história do Brasil, a matriz católica, que ignorou as tradições dos indígenas
que aqui habitavam, não pôde fazer o mesmo com outras tradições que
foram chegando ao País.
Quer por vontade própria ou não, o catolicismo foi cedendo es-
paço para outras tradições religiosas trazidas pelos imigrantes que
chegaram ao Brasil. A começar com os povos africanos traficados para o
trabalho escravo, que trouxeram, entre as suas tradições, as religiosidades
de diferentes nações africanas, e mesmo não sendo possível realizar seus
cultos, os mantiveram ocultos ou sincretizados ao catolicismo. E, assim, po-
demos perceber que a mesma experiência de não liberdade religiosa plena
25
DINIZ, D., Ensino Religioso e laicidade no Brasil, p.12.
18 A prática de Ensino Religioso não confessional
foi vivida por outros grupos que chegaram ao País, por exemplo, os judeus,
que trouxeram o judaísmo; os alemães com o luteranismo; os norte-ameri-
canos com o pentecostalismo; os japoneses com as religiões orientais entre
outras religiões. A aceitação, ou melhor, a liberdade em aderir a uma religião
que não fosse o catolicismo é algo muito recente, como afirma Sérgio
Junqueira, pois:
Até a Proclamação da República, as religiões afro-brasileiras, os judeus e os protestantes não só estavam proibidos de manifestar publicamente suas crenças e práti-cas, mas também tinham seus direitos sociais e políticos restringidos
26.
O contexto das religiões no Brasil é bastante plural, o que eviden-
cia não só um clima de tolerância, mas de diversidade e liberdade religiosas,
assim como assegura a Constituição brasileira no artigo 5º, inciso VI, “é
inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre
exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos
locais de culto e suas liturgias27.” É no uso deste argumento que as pessoas
desfavoráveis ao Ensino Religioso escolar discutem a inviabilidade desse
componente curricular. Há, também, outro argumento bastante relevante que
é o da laicidade do Estado brasileiro28.
É importante considerar que o Brasil é um Estado laico, entretanto
ele ainda se encontra em processo de secularização29. O Estado brasileiro é
considerado laico no sentido de se legitimar sem recorrer à religião, pois,
“uma religião única não é mais necessária. Surge, portanto, uma grande va-
riedade de religiões, e a definição por uma ou outra entre múltiplas possibili-
26
JUNQUEIRA, S. R. A., O processo de escolarização do Ensino Religioso no Brasil, p. 34. 27
Cf. BRASIL, Constituição do Brasil, 1988. 28
Cf. DINIZ, D., Ensino Religioso e laicidade no Brasil, 2010. 29
Um fato que comprova a não secularização do Brasil foi o posicionamento de alguns bispos da Igreja Católica nas eleições de 2010. Ao aconselharem os católicos a não votarem na candidata, a presidência do Partido dos Trabalhadores que se dizia favorável ao aborto, foi determinante para fazer com que as eleições passassem para o segundo turno, além de provocar mudanças no discurso da candidata, conforme foi noticiado pela mídia na época. http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,polemica-do-aborto-faz-bispos-racharem,625886,0.htm acesso em 20/02/2012. http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/para-abafar-polemica-do-aborto-dilma-vai-pregar-defesa-da-vida-na-tv acesso em 20/02/2012.
19 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
dades se torna uma questão de opção pessoal”30. Nesse sentido, “a educa-
ção civil e leiga para a cidadania não pode ignorar as religiões, pela sua forte
presença e função social”31, pois, no Brasil, a religião é um elemento que
constitui a sociedade e a cultura desde a sua origem, de modo que questões
religiosas são capazes de motivar ações políticas pessoais e coletivas.32
No contexto da educação brasileira, o Ensino Religioso deve estar
pautado sobre a diversidade e a pluralidade religiosa, como veremos mais
adiante. Todavia, destacamos que o papel do Ensino Religioso na escola se
constitui no estudo da religião como área do conhecimento, assim como
geografia, matemática, história e tantas outras. Tal ensino, segundo Passos,
“não significa transferir conhecimento religioso, mas assumir a religião como
um dado a ser conhecido como parte da apreensão da realidade, da
formação do sujeito e da responsabilidade para com a sociedade”.33
2. O Ensino Religioso na legislação brasileira
O Ensino Religioso previsto pela legislação brasileira é conside-
rado parte integrante da formação para a cidadania. Nesse ponto da pes-
quisa, vamos analisar o que afirma a legislação, tanto a Constituição da Re-
pública Federativa do Brasil, quanto a LDB da Educação nacional. O objetivo
é destacar o que na legislação contribui para o desempenho do Ensino
Religioso e ao mesmo tempo o que ainda é falho nos termos da lei e se
torna um entrave para que esse componente curricular possa ser desenvol-
vido em conformidade com o que prevê as suas normatizações.
30
JUNQUEIRA, S. R. A., O processo de escolarização do Ensino Religioso no Brasil, p. 35. 31
PASSOS, J. D., Ensino Religioso, construção de uma proposta, p. 110. 32
Ibid., p. 94. 33
Ibid., p.124.
20 A prática de Ensino Religioso não confessional
2.1. O Ensino Religioso nas constituições do Brasil
O Ensino Religioso como componente curricular entrou na Cons-
tituição brasileira de 1934, como afirma em seu artigo 153:
O Ensino Religioso será de frequência facultativa e minis-trado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou responsáveis e constituirá matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secun-dárias, profissionais e normais
34.
Alguns pontos merecem ser destacados nesta afirmação.
Primeiro, é quanto à facultatividade do Ensino Religioso. Segundo, o
conteúdo do Ensino Religioso deve ser ministrado de acordo com a
confissão religiosa do aluno ou dos pais. E, por fim, a inclusão do Ensino
Religioso como uma matéria dos horários normais da escola. Esses pontos
nos remetem para algumas questões: Se o Ensino Religioso é facultativo,
então não é necessário. Se não é necessário, qual sua função na escola?
Como determinar a confissão religiosa dos conteúdos numa sala de aula
com alunos pertencentes a diferentes tradições religiosas? Ao compor a
grade curricular, o Ensino Religioso não goza dos mesmos “direitos” que os
demais componentes curriculares?
A inserção do Ensino Religioso na Constituição de 1934 institu-
cionalizou dois entraves que o acompanharão em todos os documentos sub-
sequentes: o fato de ser facultativo e a sua presença nos horários normais
da escola. Em 1946, o artigo 168, inciso V, trata da seguinte forma:
O Ensino Religioso constitui disciplina dos horários das es-colas oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado de acordo com a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante legal ou res-ponsável
35.
E em 1988, artigo 210, parágrafo 1º, reafirmou que “o Ensino
Religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais
34
Cf. BRASIL, Constituição Federal, 1934. 35
Cf. BRASIL, Constituição Federal, 1946.
21 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
das escolas públicas de ensino fundamental”. A partir dessa afirmação con-
clui-se que o Ensino Religioso é parte de uma educação sistemática e for-
mal36.
Observa-se nas constituições que o aluno poderá optar ou não
pelas aulas de Ensino Religioso; contudo, não se deixa claro o que propor
ao aluno que optar por não assistir a essas aulas. Outra limitação que
permanece é a dicotomia que há entre matrícula facultativa e a
obrigatoriedade de se incluir o Ensino Religioso nos horários normais da
escola.
2.2. O Ensino Religioso nas Leis de Diretrizes e Bases
Direcionando o foco especificamente para a legislação que rege a
educação, cabe aqui apresentar brevemente as afirmações da LDB no que
tange ao Ensino Religioso nas escolas públicas.
O processo de regulamentação do Ensino Religioso sempre foi
marcado pela ambivalência da natureza de seus conteúdos, seja na legisla-
ção brasileira, seja nos interesses das diferentes instituições que fomenta-
ram e sustentaram a luta pela permanência do Ensino Religioso no âmbito
escolar. Não obstante os interesses particulares, buscou-se regulamentar o
Ensino Religioso, como podemos observar no texto da LDB de 1961
LEI n. 4.024 de 1961 - Art. 97 - O Ensino Religioso constitui disciplina dos horários das escolas oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado sem ônus para os poderes pú-blicos, de acordo com a confissão religiosa do aluno, mani-festada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante le-gal ou responsável. § 1º A formação de classe para o Ensino Religioso inde-pende de número mínimo de alunos.
36
BORTOLETO, J.; MENEGUETTI, R., O Ensino Religioso e a legislação da educação no Brasil: desafios e perspectivas. In: POZZER, A., et alii. Diversidade religiosa e Ensino Religioso no Brasil: memórias, propostas e desafios, p. 70.
22 A prática de Ensino Religioso não confessional
§ 2º O registro dos professores de Ensino Religioso será re-
alizado perante a autoridade religiosa respectiva.
A LDB n. 4024/61 confirma o que já havia sido promulgado na
Constituição de 1946 e acrescenta dois novos pontos: a formação da classe
que não depende do número de alunos, o que poderia ser uma dificuldade
devido à facultatividade do Ensino Religioso; e a questão do registro dos
professores, que fica sob a tutela da autoridade religiosa. Fica evidente que
na LDB ainda se concebe o Ensino Religioso como elemento religioso pre-
sente no âmbito escolar. Já em 1971, ao tratar do Ensino Religioso, a LDB
5692, em seu artigo 7º, não toca em nenhum dos itens acima e estende a
sua presença no 1º e 2º graus37. Em 1996, no texto da LDB 9394, volta a
restringir o Ensino Religioso apenas ao Ensino Fundamental e deixa
entrever em sua afirmação certa ambivalência com relação ao conteúdo,
pois este pode ser confessional ou interconfessional.
LEI n. 9.394 de 1996 - Art. 33. O Ensino Religioso, de matrí-cula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as prefe-rências manifestadas pelos alunos ou por seus responsá-veis, em caráter: I - confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu responsável, ministrado por professores ou ori-entadores religiosos preparados e credenciados pelas res-pectivas Igrejas ou entidades religiosas; II - interconfessional, resultante de acordo entre as diversas
entidades religiosas, que se responsabilizarão pela elabora-
ção do respectivo programa.
Apesar de todos os esforços, já mencionados anteriormente, em
prol de um Ensino Religioso não restrito a uma determinada religião, a reda-
ção do artigo 33 ainda deixou margem para que se compreenda essa disci-
plina como o elemento da religião no espaço escolar. É somente na redação
do referido artigo, em 1997, que se chega à compreensão de que o Ensino
Religioso não deve estar vinculado a nenhuma religião.
Lei n. 9.475 de 1997 - Art. 33. O Ensino Religioso, de matrí-cula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das es-colas públicas de ensino fundamental, assegurado o res-
37
Cf. BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no 5692/71.
23 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
peito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedi-mentos para a definição dos conteúdos do Ensino Religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constitu-
ída pelas diferentes denominações religiosas, para a defini-
ção dos conteúdos do Ensino Religioso.
É somente em 1998 que o Ensino Religioso escolar é reconhecido
como área de conhecimento38 pelo Conselho Nacional de Educação (CNE),
por meio da Resolução 02/98, em seu artigo 3º, item IV; todavia, esse com-
ponente curricular ainda causa questionamentos em relação à sua liceidade,
à natureza de seus conteúdos, e também em relação a quem compete for-
mar e habilitar os profissionais para ministrar essa disciplina.
Entre outros entraves, no que afirma a legislação, encontra-se a
necessidade de se consultar uma entidade “constituída por diferentes deno-
minações religiosas”, para definir o conteúdo do Ensino Religioso. Por não
especificar o que se entende por “denominação religiosa”, a lei deixa uma
abertura para que as Igrejas, indiretamente, possam incluir o aspecto con-
fessional conforme os interesses de tais instituições que estejam por trás
das associações. Pode-se concluir que, nos termos da lei, persiste uma
compreensão de que a natureza do Ensino Religioso é de domínio das ins-
tituições religiosas.
38
Cf. MENEGHETTI, R., Comentários ao documento. In: SENA, L., Ensino Religioso e formação docente; Ciências da Religião e Ensino Religioso em diálogo, p. 139. É interessante ressaltar que não é conveniente considerar o Ensino Religioso como área de conhecimento, pois como tal dele decorreria uma ou mais aplicabilidade, tal como acontece com a matemática, a geografia ou letras, cuja uma das aplicações é o ensino. Nesse sentido, é mais apropriado pensar o Ensino Religioso como uma transposição didática das Ciências da Religião, da qual o ensino seria uma das possíveis formas de aplicação.
24 A prática de Ensino Religioso não confessional
3. A proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais
Na ausência de Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino
Religioso, alguns estados criaram os seus próprios regimentos. Contudo,
tais normatizações variaram conforme o estado. No intuito de consolidar o
Ensino Religioso em todo o país, o Fonaper, em 1996, “mediante amplo
processo de reflexão sobre os fundamentos históricos, epistemológicos e
didáticos39”, entregou ao MEC uma proposta dos PCNER, publicada pela
Editora Ave Maria em 1997.
O Fonaper, fundado em 26 de setembro 1995, na cidade de Flo-
rianópolis, em Santa Catarina, por ocasião dos 25 anos do Ensino Religioso
ecumênico nesse estado40, se autodefine como:
Uma associação civil de direito privado, de âmbito nacional, sem vínculo político-partidário, confessional e sindical, sem fins econômicos, que congrega, conforme seu estatuto, pessoas jurídicas e pessoas naturais identificadas com o Ensino Religioso, sem discriminação de qualquer natu-reza
41.
Ao longo de uma trajetória de 17 anos, o Fonaper promoveu
cursos de aperfeiçoamento para os profissionais do Ensino Religioso; arti-
culou 1142 seminários de formação de professores em parceria com diversas
instituições de Ensino Superior; organizou seis43 congressos, nos quais se
reuniram professores e pesquisadores de várias regiões do Brasil.
Indubitavelmente, a maior e a mais significativa contribuição do
Fonaper com o Ensino Religioso se exprime nos PCNER, cujo fundamento
se encontra na leitura antropológica do Fenômeno Religioso. O
conhecimento deste se dá por meio de perguntas fundamentais que o ser
39
FONAPER, Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso, p. 7. 40
FIGUEIREDO, A. P., Primeiros passos do Fonaper: um sonho que se tornou realidade em tempos de novos projetos educacionais. In: POZZER, A., et alii. Diversidade religiosa e Ensino Religioso no Brasil: memórias, propostas e desafios, p.19. 41
Disponível em http://www.fonaper.com.br/apresentacao.php acessado em 28/02/2012. 42
Disponível em http://www.fonaper.com.br/album.php?id=28 acessado em 28/02/2012 . 43
Disponível em http://www.fonaper.com.br/album.php?id=34 acessado em 28/02/2012.
25 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
humano se faz a respeito de sua existência: Quem sou? De onde vim? Para
onde vou? Qual o sentido da morte? As respostas a estas questões geram
um conhecimento que, por sua vez, sendo um “produto” do pensamento
humano, o seu estudo não pode ser negado44 a ninguém e por nenhuma
instância da sociedade.
Todo conhecimento humano torna-se patrimônio da hu-manidade. A sua utilização, porém, depende de condições sociais e econômicas, bem como das finalidades para as quais são utilizados. Nem todo o conhecimento é de inte-resse de todos. Um conhecimento político ou religioso pode não interessar a um grupo, mas, uma vez produzido, é pa-trimônio humano e, como tal, deve estar disponível. O conhecimento religioso é um conhecimento disponível e, por isso, a escola não pode recusar-se a socializá-lo
45.
Às perguntas feitas pelo ser humano, cada religião busca dar res-
postas, que, embora sejam argumentadas de formas diferentes pelas
religiões, estas respostas compartilham elementos comuns46, o que
possibilitou sua estruturação em temas gerais que os PCNER propõem
como critério de organização e seleção dos conteúdos para o Ensino
Religioso. Chega-se assim à proposta dos cinco eixos temáticos: Culturas e
Tradições Religiosas; Escrituras Sagradas e/ou Tradições Orais; Teologias;
Ritos e Ethos47. A estrutura que agrupa o estudo das religiões em eixos
temáticos também é proposta pelos PCNER como elementos que devem
compor a formação do professor de Ensino Religioso, a fim de que este
tenha uma formação adequada para lidar com esse componente curricular48.
Essa estruturação contida nos PCNER visa aos seguintes
objetivos a partir da diversidade cultural e religiosa presentes na sociedade
brasileira:
Proporcionar o conhecimento dos elementos básicos que compõem o Fenômeno Religioso, a partir das experiências religiosas percebidas no contexto do educando;
44
FONAPER, Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso, p. 35. 45
Ibid., p. 35. 46
Ibid., p. 49. 47
Ibid., p. 49-50. 48
Ibid., p. 46-47.
26 A prática de Ensino Religioso não confessional
Subsidiar o educando na formulação do questionamento existencial, em profundidade, para dar sua resposta devida-mente informado;
Analisar o papel das tradições religiosas na estruturação e manutenção das diferentes culturas e manifestações socioculturais;
Facilitar a compreensão do significado das afirmações e verdades de fé das tradições religiosas;
Refletir o sentido da atitude moral, como consequência do Fenômeno Religioso e expressão da consciência e da resposta pessoal e comunitária do ser humano;
Possibilitar esclarecimentos sobre o direito à diferença na
construção de estruturas religiosas que têm na liberdade o
seu valor inalienável49
.
Os critérios acima foram estabelecidos com o objetivo de possibi-
litar aos educandos o conhecimento da diversidade religiosa, visando a
formá-los para os valores essenciais ao convívio em sociedade, além de
oferecer-lhes informações que os ajudem a analisar o papel das tradições
religiosas nas diferentes culturas50. Uma vez que “cada cultura tem, em sua
estruturação e manutenção, o substrato religioso que a caracteriza51”, o
dado religioso se torna quase indissociável do aspecto cultural. Entretanto, o
estudo da religião, no âmbito escolar, não é uma proposta de adesão a
vivência de princípios religiosos52, e sim o conhecimento das religiões que
promovam o respeito às diferentes crenças53.
A proposta contida nos PCNER se mostra bastante coerente com
a legislação, embora, como toda proposta, ela também apresente limitações,
como, por exemplo, a suposição de que todas as religiões possam ser en-
quadradas nos eixos temáticos, ou mesmo, ao pressupor que a relação com
o transcendente seja comum a todas as tradições religiosas.
49
FONAPER, Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso, p. 43-44. 50
Ibid., p. 59. 51
Ibid., p. 32. 52
Ibid., p. 35. 53
Ibid., p. 33.
27 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
4. As controvérsias acerca do conteúdo do Ensino Religioso
A discussão sobre o Ensino Religioso escolar é bastante delicada
e complexa, pois, por um lado, como foi apresentado neste trabalho, muitos
estudos e reflexões54 contribuíram para que o Ensino Religioso se
desenvolvesse e se firmasse como parte integrante da formação do cidadão
brasileiro. Por outro lado, concomitantemente a esse processo, vários
pesquisadores desenvolveram estudos a respeito da inviabilidade ou mesmo
do verdadeiro papel do Ensino Religioso. Compete, neste ponto da nossa
pesquisa, apresentar o lado não favorável ao Ensino Religioso como
componente curricular55.
Por questões metodológicas e tendo em vista os objetivos desta
pesquisa, deteremo-nos em apontar apenas alguns elementos de crítica, a
fim de evidenciar que esses têm em vista o mesmo alvo, isto é, a questão da
confessionalidade.
Para a discussão deste estudo, tomamos as reflexões de três
pesquisadores: Carlos Roberto Jamil Cury, José Vaidergorn e Emerson
Giumbelli. Embora estes pesquisadores não sejam especialistas em Ensino
Religioso, compreendemos que suas críticas são pontuais; no entanto, não
deixam de ter relevância frente à discussão acerca desse componente curri-
cular, exigindo assim uma contra-argumentação apropriada e plausível.
54
Podemos citar como referência, além do Fonaper, as reflexões do Grere, ligado a CNBB, e que promoveu os Encontros Nacionais de professores de Ensino Religioso. 55
É interessante ressaltar que há muitos outros pesquisadores, bem como entidades que se manifestaram contra o Ensino Religioso escolar. Recordamos também que recentemente a Associação Amicus Curiae entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.439, junto à Procuradoria Geral da República, solicitando a “correta” interpretação de dois trechos do artigo 33 da LDB n. 9.394/96, assim como a inconstitucionalidade do artigo 11 do decreto 7.107/10, que regulamenta o acordo entre o Brasil e o Vaticano.
28 A prática de Ensino Religioso não confessional
4.1. O ambiente do Ensino Religioso na proposta de Carlos Roberto
Jamil Cury
A partir da modernidade, segundo alguns estudiosos, a religião
adquire um novo status, ela deixa a esfera pública e se torna uma realidade
de foro privado56, de modo que o poder temporal se desvincula da religião e
o Estado adquire sua autonomia denominando-se laico, ou seja, não assume
nenhuma religião como estatal. Entretanto, a laicidade não se contrapõe à
religião, pois o fato de não haver uma religião oficial não implica que o Es-
tado seja a-religioso57, isto é, que negue o direito aos seus cidadãos de
professarem publicamente uma fé em particular.
O Brasil é um país laico, e a Carta Magna assegura a liberdade
religiosa e considera crime a violação de qualquer espaço religioso, como
afirmam os incisos VI, VII e VIII do artigo 5º, da Constituição de 1988:
VI - É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias; VII - É assegurada, nos termos da lei, a prestação de assis-tência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva; VIII – Ninguém será privado de direitos por motivo de crença
religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as
invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e
recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei58
;
Conforme a lei, tornam-se legítimos a qualquer movimento, seja
ele de cunho religioso ou filosófico, o recrutamento de fiéis, a manifestação
pública de suas convicções e o ensinamento de seus princípios religiosos
e/ou filosóficos em seus próprios locais. Para Carlos Roberto Jamil Cury, tais
disposições legais já seriam suficientes para que as religiões se
manifestassem publicamente, de modo que não haveria necessidade de
56
MONTES, M. L., As figuras do sagrado entre o público e o privado. In: NOVAIS, F; SCHWARCZ, L., História da vida privada no Brasil, 1998. 57
CURY, C. R. J., Ensino Religioso na escola pública: O retorno de uma polêmica recorrente. Revista brasileira de educação, n. 27, set/out/nov/dez 2004, p. 183. 58
Cf. BRASIL, Constituição Federal, 1988.
29 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
inserir no âmbito escolar o Ensino Religioso. Entretanto, vale lembrar que
quando se trata de Ensino Religioso escolar não se pode limitá-lo ao
ensinamento de doutrinas59 ou a um meio de recrutamento de fiéis. Pois,
como já mencionamos anteriormente neste trabalho, a ambivalência do
Ensino Religioso se encontra especificamente no fato de poder ser
compreendido como uma área de conhecimento ou como doutrinação60.
Cury não está equivocado ao afirmar que o Ensino Religioso en-
trou na Constituição de 1934 por interesse do Estado em obter o apoio da
Igreja, bem como esta também nutria o seu desejo de voltar a ter em mãos
certo “domínio” sobre a sociedade. Entretanto, interesses políticos sempre
estão por detrás de muitas iniciativas políticas, quer envolvam as Igrejas ou
não. Contudo, reduzir o Ensino Religioso a um mero jogo de interesses polí-
ticos entre Igrejas e Estado é privá-lo de sua condição de um conhecimento
humano produzido61. Vale lembrar que o mesmo interesse político também
se faz presente em outras instâncias da sociedade.
Numa tentativa de solucionar a contradição que surge entre a
laicidade do Estado e a obrigatoriedade facultativa do Ensino Religioso es-
colar, Cury propõe que este se mantenha no âmbito das Igrejas, ou seja,
dentro de seus espaços particulares. Desse modo, não haveria inconstitu-
cionalidade, uma vez que é vedado ao Estado, em qualquer uma de suas
instâncias, “estabelecer cultos religiosos ou Igrejas, subvencioná-los, emba-
raçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes re-
lações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colabora-
ção de interesse público”62.
59
A própria LDB 9.475/97 considera esse ensinamento no âmbito escolar como proselitismo e o proíbe veementemente. Em seu passado não muito distante, o Ensino Religioso apresentava essa característica, contudo, hoje temos em vigor uma proposta bem diferente e contrária ao proselitismo de qualquer tradição religiosa ou sistema filosófico de vida. 60
Aplicado às escolas dos sistemas públicos, podemos falar de um Ensino Religioso com base no estudo fenomenológico. Enquanto às escolas particulares, estas muitas vezes se orientam pelo ensino confessional. Embora não exista nenhuma obrigação, no que diz respeito ao cumprimento da legislação, por parte das escolas particulares, cabe a estas o critério de optar pelo modelo de Ensino Religioso que mais lhe aprouver. 61
FONAPER, Parâmetros Curriculares Nacionais, p. 35. 62
BRASIL, Constituição Federal, 1988 art. 19.
30 A prática de Ensino Religioso não confessional
Segundo Cury, a afirmação de que o Ensino Religioso é parte in-
tegrante da formação supõe que todos devam receber esta formação, que-
rendo ou não, seja o cidadão religioso ou ateu, agnóstico ou indiferente.
Para ele, tal afirmação fere o direito à diferença e à liberdade religiosa. En-
tretanto, a mesma afirmação pode ser aplicada ao ensino de ciências, onde
não se pressupõe a crença dos educandos e tampouco se pergunta se estes
querem ou não aprender uma ou outra teoria. E, no entanto, não se vê em
tal fato uma violação do direito à diferença e à liberdade religiosa do aluno,
pois o que está em questão é o seu aprendizado e não questões de fé.
Outro elemento relevante que Cury aponta é o fato de o Ensino
Religioso ser facultativo.
O caráter facultativo de qualquer coisa implica o livre-arbítrio da pessoa responsável por realizar ou deixar de realizar algo que lhe é proposto. Faculdade implica, pois, a possi-bilidade de poder fazer ou não, de agir ou não como algo inerente ao direito subjetivo da pessoa. Para que o caráter facultativo seja efetivo e a possibilidade de escolha se exerça como tal, é necessário que, dentro de um espaço re-grado como o é o das instituições escolares, haja a oportu-nidade de opção entre o Ensino Religioso e outra atividade pedagógica igualmente significativa para tantos quantos que não fizerem a escolha pelo primeiro. Não se configura como opção a inatividade, a dispensa ou as situações de aparta-mento em locais que gerem constrangimento
63.
Para Cury, o caráter facultativo se configura como estratagema
para salvaguardar o princípio da laicidade do Estado64, de modo a não cau-
sar uma incompatibilidade do Ensino Religioso. Nesse caso, segundo Cury,
resolve-se o problema restringindo a educação religiosa aos espaços pró-
prios das igrejas. Pois um Ensino Religioso dado nas Igrejas não impediria a
existência de um ensino extraescolar mais pleno de sentido, pois:
A ausência de Ensino Religioso nas escolas não impede que a cultura religiosa (caridade), ministrada nos seus espaços próprios, se expanda para “um serviço desinteressado, humanamente desinteressado, ainda que inspirado na ideia de que o serviço é uma boa obra, que merecerá a glória do Senhor” e, nesse sentido, se aproxime
63
CURY, C. R. J., Ensino Religioso na escola pública: O retorno de uma polêmica recorrente. Revista brasileira de educação, n. 27, set/out/nov/dez, 2004, p. 189. 64
Ibid., p. 186.
31 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
do senso de justiça da caridade laica que não pode “prometer nada, senão a satisfação da consciência”
65.
Uma vez que, segundo Cury, a liberdade religiosa é assegurada
pela legislação e as próprias Igrejas dispõem de recursos próprios para
exercerem a sua prática de culto e de doutrinação, não se faz necessário o
ensino da cultura religiosa na escola. No entanto, podemos pontuar que a
cultura religiosa não se reduz à prática da caridade, que é um elemento reli-
gioso, mas não o único. E mesmo que se queira estabelecer uma diferencia-
ção entre caridade cristã e leiga, para esta seria mais conveniente falar de
valores humanos universais e não de caridade, pois ao contrário desta, os
valores universais independem de religião, e podem ser praticados indepen-
dentemente de qualquer esfera religiosa.
4.2. O Ensino Religioso e a formação moral das gerações segundo José
Vaidergorn
Ao tratar do Ensino Religioso, José Vaidergorn é muito contun-
dente, pois, segundo ele, essa é uma forma de retorno do antigo desejo da
religião de se sobrepor ao Estado e à sociedade. Segundo Vaidergorn, a
Igreja nunca deixou de atuar sobre o Estado, de modo que,
É possível traçar uma linha de continuidade desde a Repú-blica Velha, que passa pelo período da ditadura getulista, pelo interregno democrático de 1945 a 1964, pela imposição da infame Educação Moral e Cívica na ditadura militar, até chegar à concorrência religiosa nas escolas públicas em pleno regime democrático
66.
Ao ver o Ensino Religioso nessa perspectiva, Vaidergorn o põe
numa linha de continuidade com o período do regime da ditadura, caracteri-
65
BOBBIO, N.; VIROLI, M., Diálogo em torno da República: os grandes temas da política e da cidadania. Apud, CURY, C. R. J. Ensino Religioso na escola pública: O retorno de uma polêmica recorrente. Revista brasileira de educação, n. 27, set/out/nov/dez, 2004, p. 190. 66
VAIDERGORN, J., Ensino Religioso, uma herança do autoritarismo. CEDES, vol. 28, set/dez, 2008, p. 407.
32 A prática de Ensino Religioso não confessional
zando-o como uma “herança” do autoritarismo. Quando em 1934, a Consti-
tuição do Brasil propôs a inclusão de disciplinas no currículo escolar, a fim
de assegurar a formação de uma “boa cidadania”, tais como a Educação
Moral e Cívica, a Organização Social e Política do Brasil (OSPB), também
incluiu o Ensino Religioso. Entretanto, é importante observar que o fato de
entrar em vigor na Constituição, junto com essas disciplinas, não significa
que estas compartilhem do mesmo objetivo ou intencionalidade. Tal fato se
evidencia no fim da ditadura em que se restabelece a democracia no Brasil,
e uma nova Constituição, em 1988, foi aprovada, assim como um novo plano
nacional de educação, e neste o Ensino Religioso foi mantido no currículo,
pois:
A inserção do Ensino Religioso no contexto global da edu-cação, na perspectiva dos educadores favoráveis a essa in-serção, visava tornar as relações do saber mais solidárias e participativas, ajudando a descobrir instrumentos eficazes para a compreensão e ação transformadora da realidade social, através dos valores fundamentais da vida. Ao mesmo tempo, tinha por objetivo contribuir com o caráter democrá-tico que a sociedade brasileira que começava a incorporar, na medida em que suas diferenças e pluralidades culturais pudessem ser manifestadas e legitimadas em espaços de relações com o conhecimento, como é a escola
67.
Como já foi mencionado, não se pode negar o fato de que a in-
serção do Ensino Religioso na Constituição de 1934 tinha como pano de
fundo o interesse político do Estado em obter o apoio da Igreja Católica, a
qual buscava a “restauração católica da sociedade brasileira”68. Contudo, a
presença do Ensino Religioso no currículo escolar atual do Brasil não é fruto
apenas dos esforços da Igreja. No contexto nacional, muitos movimentos
surgiram, a fim de refletir acerca do Ensino Religioso como parte integrante
da formação cidadã. Além da Igreja Católica, professores e políticos discuti-
ram amplamente sobre vários aspectos dessa disciplina.
Segundo Vaidergorn, o Ensino Religioso “é um campo aberto de
disputa que invade e transcende a vida privada e pretende impor um molde
de sociedade de base confessional”; entretanto é necessário considerar que
67
JUNQUEIRA, S. R. A., O processo de escolarização do Ensino Religioso no Brasil, p. 37. 68
Ibid., p. 25.
33 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
quando se faz alguma afirmação sobre o Ensino Religioso é preciso especi-
ficar a qual modelo se está fazendo referência, pois este componente curri-
cular, desde as suas origens, sempre se apresentou com um conteúdo hete-
rogêneo. Em virtude da heterogeneidade que marcou essa disciplina, pode-
mos falar em Ensinos Religiosos, pois, como apresentamos, existem diferen-
tes propostas ou modelos69 segundo os quais o Ensino Religioso foi apli-
cado, e entre estes o modelo confessional é um, mas não o único.
4.3. O substrato do Ensino Religioso segundo Emerson Giumbelli
Em seu artigo “A religião nos limites da simples educação: Notas
sobre livros didáticos e orientações curriculares de Ensino Religioso”70,
Emerson Giumbelli analisa algumas orientações curriculares “oficiais” e tam-
bém alguns livros didáticos de Ensino Religioso, a fim de extrair desses o
que se define como religião. Giumbelli pretende, a partir dessa definição,
compreender a relação entre o que há de comum e também de específico
nas tradições religiosas e como isso se equaciona no Ensino Religioso. Para
realizar a sua análise, ele se inspira nas obras de dois autores71 americanos
que realizaram um trabalho semelhante no contexto americano.
É importante pontuar que Giumbelli, ao buscar identificar no mate-
rial selecionado para a sua análise o que estes definem por religião, tem
como referência a concepção extraída de Russel McCutcheon, segundo o
qual a religião se aproxima mais de uma categoria analítica72, ou seja, ela é
69
Como já foi apresentado segundo a teoria de João Décio Passos na tese de Sérgio Junqueira Ensino Religioso, construção de uma proposta. 70
Cf. GIUMBELLI, E., A religião nos limites da simples educação: Notas sobre livros didáticos e orientações curriculares de Ensino Religioso. Revista de Antropologia, v. 53 n. 1, 2010. 71
MCCUTCHEON, R., Manufacturing religion: The discourse on sui generis religion and the politics of nostalgia. 1997. BAYER, P. Conceptions of Religion: On Distinguishing Scientific, Theological, and ‘Official’ Meanings. 2003. 72
MCCUTCHEON, R., Manufacturing religion: the discourse on sui generis religion and the politics of nostalgia. Apud, GIUMBELLI, E., art. cit., p. 43.
34 A prática de Ensino Religioso não confessional
uma dimensão entre outras do ser humano. E sendo uma dimensão do ser
humano, faz parte da experiência humana.
De Peter Bayer, Giumbelli toma como pressuposto a ideia de que
a religião não se restringe apenas aos contextos científico e teológico. A reli-
gião também se encontra em outros domínios de sociedade, tais como o ju-
rídico, o midiático e o educacional73. De certa forma, esse argumento torna
válida a presença do Ensino Religioso escolar. Nesses diferentes domínios,
o conceito de religião é variável, de modo que é preciso considerar as dife-
rentes perspectivas com as quais esse conceito é apresentado.
Voltando-se para o contexto brasileiro, Giumbelli problematiza o
tema a partir do artigo 33 da LDB n. 9.475/97, que assegura a presença do
Ensino Religioso nas escolas públicas e ressalta a diversidade cultural e
religiosa do Brasil, vedando o proselitismo. Quanto a essa exigência,
Giumbelli afirma que:
Podemos entender isso [a exigência da diversidade] como a abertura de um domínio conquistado e explorado secular-mente pela Igreja Católica no Brasil em direção a uma com-posição que fosse mais representativa da mencionada “di-versidade cultural e religiosa”. Nesse sentido é que se pode ler a indicação, na mesma lei, de que “os sistemas de en-sino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes de-nominações religiosas, para a definição dos conteúdos do Ensino Religioso
74.
A desvinculação entre o Ensino Religioso e a Igreja Católica é
muito importante para o Ensino Religioso se firmar no âmbito escolar como
uma área de conhecimento e não como um elemento religioso75. Entretanto,
o conteúdo do Ensino Religioso ainda carece de uma normatização que ga-
ranta a unicidade de currículo e a homogeneidade de conteúdo em todo o
território nacional. Nesse sentido, muitos movimentos se organizaram a fim
73
BAYER, P., Conceptions of Religion: On Distinguishing Scientific, Theological, and ‘Official’ Meanings. Apud, GIUMBELLI, E., A religião nos limites da simples educação: Notas sobre livros didáticos e orientações curriculares de Ensino Religioso. Revista de Antropologia, v. 53 n. 1, 2010, p. 45. 74
Ibid., p. 40. 75
Cf. JUNQUEIRA, S. R. A., O processo de escolarização do Ensino Religioso no Brasil, 2000.
35 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
de assegurar um estatuto de cientificidade ao Ensino Religioso, assim como
nas demais disciplinas.
Entre tantos esforços, Giumbelli destaca a iniciativa do Fonaper,
que propõe a compatibilidade entre laicidade e Ensino Religioso na escola
pública a partir de uma perspectiva do conhecimento religioso. Giumbelli
ressalta que o objeto de conhecimento do Ensino Religioso, na proposta do
Fonaper, seria o transcendente, entendido como o ponto para o qual as reli-
giões, grosso modo, convergem. Todavia, cada religião busca oferecer, a
seu modo, respostas às perguntas que o ser humano faz a si mesmo acerca
de sua origem e existência. Giumbelli destaca na proposta do Fonaper:
O núcleo parece ser a ideia de “mensagem do transcen-dente”, a partir da qual várias “tradições” têm origem. Essa mensagem é expressa em textos ou narrativas orais e se caracteriza como teologia, compreendendo “mitos, crenças e doutrinas”, além de concepções sobre a “vida além morte”, bem como “rituais”, “símbolos” e “experiências” reli-giosas. Quanto ao ethos, ele cobriria a dimensão ética, na forma de limites e de valores capazes de orientar o com-portamento e o agir
76.
A ideia-força dessa proposta, segundo Giumbelli, está em sua
pretensão de abordar a diversidade religiosa no viés do fenômeno e não do
religioso, buscando evitar leituras particulares. Para Giumbelli, tal pretensão
se apresenta como algo utópico, pois é impossível tratar de todas as
religiões, devido à abrangência do tema e de seus diferentes aspectos.
Todavia, não obstante essa limitação, não se pode esquecer que esta é uma
entre tantas outras propostas; contudo, é a que mais se aproxima de um
denominador comum sobre o conteúdo do Ensino Religioso, pois na
ausência de uma diretriz, por parte do MEC, os estados elaboraram as suas
próprias legislações tendo como base a proposta do Fonaper.
Giumbelli divide a sua análise em dois planos: o primeiro se cir-
cunscreve ao âmbito das categorias, conceitos e concepções, isto é, uma
“meta-teoria” que os documentos apresentam ao tratar da religião. O se-
76
GIUMBELLI, E. A religião nos limites da simples educação: Notas sobre livros didáticos e orientações curriculares de Ensino Religioso. In: Revista de Antropologia, 53 n. 1, 2010, p. 42.
36 A prática de Ensino Religioso não confessional
gundo plano é o das atividades desenvolvidas em sala de aula. Nos
diferentes textos analisados, Giumbelli identifica uma variedade de
definições relacionadas à religião; entre elas se encontram as ideias de
transcendente, sagrado, cultura e símbolo. Essa diversidade de definições
encontrada nos documentos, segundo Giumbelli, é muito tênue, pois ainda
que existam variações de termos nos documentos, sempre restará um
mesmo substrato que estaria na base das abordagens, uma vez que,
Jamais se rompe com a noção de que a religião é uma rea-lidade, senão autônoma, passível de autonomização, tra-tando-se de uma dimensão fundamental e irredutível. Por mais diversificação que sofra, algo de comum e substantivo sempre restaria
77.
A conclusão a que Giumbelli chega é que a definição de religião
nos documentos por ele analisados é na verdade um “campo minado”, pois
se apresenta em meio a muitas tensões, nas quais a ideia de religião
encontra-se na fronteira,
Entre o privilégio ao conhecido ou ao desconhecido, entre a busca de informação e o cultivo de uma vivência, entre imersão ou destacamento da religião em outras dimensões, entre a religião como englobante ou englobada pela cul-tura
78.
Segundo Giumbelli, a definição de religião oscila entre ser uma
parte, quando se refere a categorias, tais como espaço, festas, ritos etc., e
ser o todo, ao relacionar-se com a cultura de modo geral. Oscilante também
é o domínio no qual a religião se circunscreve, isto é, ora teológico, em
acepções particularistas ou não, ora científico. Desse modo, afirma
Giumbelli, resta ao Ensino Religioso o desafio de articular os diferentes do-
mínios e definições que envolvem a religião.
É interessante ressaltar que o próprio Giumbelli reconhece que
sua análise em relação ao material selecionado “não tem qualquer estatuto
de representatividade em relação ao universo a que pertencem; além disso,
outros tipos de fontes deveriam ser contemplados para se atingir mais
amplamente a dimensão dos conteúdos curriculares do Ensino Religioso no
77
Ibid., p. 67. 78
Idem.
37 Capítulo I: O Ensino Religioso e suas ambivalências na tessitura brasileira
Brasil”79. Desse modo, é possível encontrar, entre os outros materiais
voltados para o Ensino Religioso, algum que escape ao modelo confessional
criticado por Giumbelli, e apresente outra perspectiva como, por exemplo, a
das Ciências da Religião80.
A contextualização do Ensino Religioso no cenário da educação
brasileira nos faz perceber que o terreno sobre o qual o Ensino Religioso
busca se sedimentar ainda se encontra em “acomodação”. O terreno é ins-
tável, pois muitas questões que ainda necessitam ser refletidas e
amadurecidas, tanto no que diz respeito à legislação, quanto à definição de
um conteúdo programático que sirva de base para o território brasileiro.
No caminho percorrido desde a inserção do Ensino Religioso na
Constituição de 1934 até a promulgação da LDB n. 9.475/97, houve um
grande empenho, por parte de pesquisadores e associações, a fim de que o
Ensino Religioso se consolidasse como componente curricular. Entre os mo-
vimentos que assumiram essa causa, podemos destacar o Fonaper, através
dos PCNER, que, ao serem apresentados ao MEC, se mostraram bastante
coerentes com as exigências da legislação; contudo, não foi assumido por
este órgão como uma norma nacional.
Na falta de normas provenientes dos órgãos responsáveis pela
educação, o Ensino Religioso foi-se desenvolvendo sem uma uniformidade
tanto no que diz respeito à forma do seu conteúdo, apresentado ora como
catequético ou ecumênico, ora voltado para o pluralismo religioso existente
na cultura brasileira. Essa ambivalência do Ensino Religioso gerou algumas
controvérsias sobre a sua função na escola, bem como sobre qual seria o
âmbito adequado para este ensino, e, sobretudo, a respeito do substrato que
sustenta o Ensino Religioso.
79
GIUMBELLI, E. A religião nos limites da simples educação: Notas sobre livros didáticos e orientações curriculares de Ensino Religioso. In: Revista de Antropologia, 53 n
o1, 2010, p. 48
80 Voltaremos à esta discussão com os três autores no capítulo III, no qual buscaremos
responder aos seus principais argumentos, evidenciando que é possível abordar o tema das religiões sem a conotação confessional.
38 A prática de Ensino Religioso não confessional
Paralelamente ao processo de afirmação que contou com o apoio
de muitos professores e entidades a favor do Ensino Religioso escolar, al-
gumas pessoas também se posicionaram contrárias à permanência do En-
sino Religioso no currículo da educação brasileira; tem-se ainda a participa-
ção de outros movimentos que se articularam, a fim de contribuir com a re-
flexão e também oferecer um suporte, no que diz respeito ao conteúdo do
Ensino Religioso e aos professores dessa disciplina. Como, por exemplo, a
revista Diálogo, cujo perfil editorial, bem como a sua filosofia e todo o seu
desenvolvimento, iremos apresentar no segundo capítulo deste trabalho.
39 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
CAPÍTULO II
O ENSINO RELIGIOSO NA LINGUAGEM DE UMA REVISTA
O capítulo anterior nos contextualizou no caminho percorrido pelo
Ensino Religioso no Brasil. Constatamos que os diferentes modos de conce-
ber o seu conteúdo sempre esteve marcado pelo seu caráter ambivalente,
sendo concebido ora como catequese, ora como estudo do Fenômeno
Religioso. De tal ambivalência originaram-se diferentes posicionamentos em
relação à presença do Ensino Religioso no âmbito escolar.
Consonante com a trajetória do Ensino Religioso, nasceu a revista
Diálogo, cuja história apresentaremos neste capítulo. A ideia da revista
surgiu em resposta à solicitação dos professores que participaram do 10º
Ener, realizado em agosto de 1994, na cidade de Fortaleza (CE), os quais
manifestaram o desejo de ter uma revista que fosse um meio de
comunicação, formação e troca de experiência entre eles. Em atenção a
esse desejo, a Paulinas Editora lançou em setembro de 1995 o primeiro
número da Diálogo – Revista de Ensino Religioso. E, desde o seu
lançamento, a revista buscou contribuir para o desenvolvimento do Ensino
Religioso, através de suas abordagens à luz das diversas áreas do
conhecimento e em particular das Ciências da Religião.
Este capítulo também buscará contextualizar a criação da
Diálogo, bem como o seu desenvolvimento entre os anos de 1995 e 2010,
período correspondente ao tempo delimitado para o nosso estudo. E dado o
fato de não termos encontrado fontes bibliográficas suficientes para recom-
por esse período, valemo-nos de entrevistas com as duas primeiras diretoras
de Redação da revista.
40 A prática de Ensino Religioso não confessional
Por fim, apresentamos sumariamente uma análise acerca dos te-
mas estampados nas capas de 60 edições, a fim de verificarmos a conso-
nância entre os temas gerais e seus enfoques com os PCNER e as Ciências
da Religião.
1. A contribuição da CNBB para a criação da Diálogo
Com a promulgação da LDB n. 5.692, em 1971, na qual se reco-
menda o Ensino Religioso para o 1º e 2º graus, o Setor Educação da CNBB
buscou oferecer às escolas católicas orientações acerca deste tema81, por
meio de cursos, seminários e Encontros Nacionais de Professores de Ensino
Religioso (ENER). Como afirma Junqueira,
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, desde sua origem, preocupou-se com o Ensino Religioso e inicialmente o considerava idêntico à catequese [...]. Por isso ocorreram esforços conjugados no aprimoramento da catequese, para que houvesse claro conhecimento dos objetivos da forma-ção religiosa
82.
No início, para a CNBB, não havia distinção entre este e a cate-
quese Ensino Religioso83, a começar pela própria estruturação dentro dessa
instituição. Até 1990, as reflexões da CNBB sobre o Ensino Religioso esta-
vam vinculadas à Dimensão Bíblico-Catequética, e somente após essa data
ele passou a integrar o Setor Educação84. E, em 1995, o Ensino Religioso se
desmembrou do Setor Educação, constituindo um setor específico, porém,
mantendo estreita relação com o antigo setor, e vinculado à Dimensão
Sociotransformadora.
Devido ao acúmulo de trabalhos, a CNBB decidiu desmem-brar o Ensino Religioso do Setor Educação constituindo-o,
81
SENA, L., Sonhando juntos. Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 39, agosto de 2005, p. 45. 82
JUNQUEIRA, S. R. A., O processo de escolarização do Ensino Religioso no Brasil, p. 73-74. 83
CNBB, A caminhada do Ensino Religioso na CNBB, p. 12, mimeo. 84
Idem.
41 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
assim, em Setor específico, mantendo, porém, por razões óbvias, ligação com o Setor Educação. Não é possível en-tender o Ensino Religioso fora do contexto da Educação
85.
Constituído como um setor específico, o Ensino Religioso contou
com uma assessoria própria, sob a responsabilidade de Dom Aloysio José
Leal Penna, membro da Comissão Episcopal de Pastoral. E, em 1985, a
CNBB organizou um Grupo de Reflexão Nacional para o Ensino Religioso
(Grere), a fim de refletir acerca da “dimensão pedagógica do Ensino
Religioso e o aprofundamento da distinção e complementaridade entre
Ensino Religioso e catequese”86. Segundo Figueiredo, que compunha a pri-
meira equipe do Grere,
A criação deste grupo teve duas razões importantes. A pri-meira razão está relacionada com os interesses da própria Igreja Católica, quando foi publicado, em 1983, o Código de Direito Canônico, que inclui os cânones 804 e 805. Estes tratam da responsabilidade da Igreja para com o Ensino Re-ligioso ministrado em qualquer escola, incluindo as do sis-tema público. Em um período em que a disciplina, no Brasil, chamava a atenção, o Setor de Catequese da CNBB, vol-tando-se para a questão – naquele momento – do Ensino Religioso ensinado nas escolas públicas, decidiu regula-mentar os cânones 804 e 805, com a intenção de prestar um serviço à sociedade. Os assessores de catequese da CNBB, em comum acordo com o bispo responsável pelo Setor Educação e também da Catequese, decidiram criar um grupo composto por educadores(as) com experiência em Ensino Religioso
87.
O Grere teve uma participação muito intensa nas reflexões que
antecederam a Assembleia Constituinte de 1988, a fim de que esta incluísse
o Ensino Religioso na Carta Magna promulgada no referido ano.
O grupo [Grere] tinha como função – além da reflexão sobre a dimensão pedagógica do Ensino Religioso, a busca da definição de sua identidade, distinta da catequese, e a reali-zação dos Ener – acompanhar os debates na Assembleia Nacional Constituinte no que se referia à garantia do Ensino Religioso na Carta Magna e nas legislações posteriores. Desde a elaboração do anteprojeto da Nova Constituição
85
CNBB, A caminhada do Ensino Religioso na CNBB, p. 12. (mimeo). 86
Ibid., p. 15. 87
Usamos uma tradução livre do texto de FIGUEIREDO, A. P., Fuentes antropológicas y sociológicas de la educación religiosa, p. 366-367.
42 A prática de Ensino Religioso não confessional
até a sua promulgação, em 1988, o Grere teve presença atuante nesse contexto em prol do Ensino Religioso
88.
A partir de sua criação, o Grere tornou-se o responsável pela ar-
ticulação e organização dos Ener. “Dos 12 Ener realizados, de 1974 a 1998,
oito deles tiveram a liderança do Grere, tanto na organização como na
coordenação, auxiliados pelos próprios coordenadores estaduais de Ensino
Religioso em todo o Brasil”89.
O Grere, através dos Ener – Encontros Nacionais de Professores de Ensino Religioso – que se realizava a cada dois anos, com a participação significativa de professores de ER da maioria dos Estados do Brasil, teve um papel im-portante na reflexão que levaria a uma nova proposta de ER distinto da catequese e que encontrou sua expressão na Lei 9.475/97, que alterou o artigo 33 da LDB de 1996
90.
Entre os membros desse grupo de reflexão e estudo da CNBB
estava Luzia Sena, membro da Congregação das Irmãs Paulinas. Por meio
dela foi enviada à Paulinas Editora, por Dom Aloysio Leal Penna, uma soli-
citação de publicação do que viria a se constituir a Diálogo – Revista de
Ensino Religioso.
2. A gênese da Diálogo – Revista de Ensino Religioso
Como mencionamos no capítulo I deste trabalho, os Ener exer-
ceram grande importância na caminhada do Ensino Religioso no Brasil e
também na criação da revista Diálogo.
Em agosto de 1994, em Fortaleza (CE), realizou-se o 10º Ener – com a participação de 180 professores de 23 esta-dos – tendo como tema central: O Fenômeno Religioso na pós-modernidade: Mudanças socioculturais, manifestações religiosas e o diálogo inter-religioso. Nas propostas de en-cerramento do encontro, os professores manifestaram o de-sejo e a urgência de se criar uma revista de Ensino
88
Luzia Maria Sena de Oliveira em entrevista respondida via e-mail em 2 de julho de 2012. 89
FIGUEIREDO, A. P. A., Fuentes antropológicas y sociológicas de la educación religiosa, p.373. 90
SENA, L., Entrevista 2/7/2012.
43 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
Religioso que os ajudasse na formação profissional especí-fica e fosse, ao mesmo tempo, um elo de comunicação, in-tercâmbio de experiências e informações entre os professo-res de várias regiões do País
91.
A Diálogo – Revista de Ensino Religioso resultou dos esforços de
muitas pessoas que acreditaram na força do Ensino Religioso. E entre as
pessoas que impulsionaram a criação da revista está Dom Aloysio Leal
Penna, “bispo então responsável pelo Setor de Educação da CNBB, que,
catalizando os anseios dos professores, procurou viabilizar a proposta da
revista”92.
Em 26 de abril de 1995, Dom Aloysio escreve à Irmã Élide Pulita,
então Provincial das Irmãs Paulinas no Brasil, e agradece formalmente à
Paulinas Editora a criação da revista de Ensino Religioso.
Prezada Irmã Élide Pulita DD. Provincial das Irmãs Paulinas Quero, por escrito, manifestar os meus agradecimentos e alegria pela resolução das Irmãs Paulinas, de criarem a “Revista de Ensino Religioso”. Como a Senhora me falou por telefone, foi um presente de Páscoa para mim, que ve-nho lutando, há dois anos, para a criação desta revista. Comunico também que, na reunião de ontem, dia 25.04.95, da Presidência e CEP da CNBB, informei sobre esta resolu-ção das Paulinas. A iniciativa foi aplaudida por todos. A re-vista será, certamente, um veículo de formação, informação, troca de experiências, resenhas bibliográficas etc. para mi-lhares de professores que atingem milhões de crianças e adolescentes das nossas escolas públicas e particulares do Brasil. Certamente, os fundadores das Famílias Paulinas, o apóstolo dos MCS Pe. Tiago Alberione e a Beata Tecla Merlo, intercederão junto de Deus pelo êxito da “Revista de Ensino Religioso”. Que Deus abençoe o vasto e cada vez mais atual apostolado com os MCS das senhoras no Brasil
e no mundo93.
É interessante ressaltar que, embora a CNBB tenha incentivado a
criação de uma revista de Ensino Religioso, e a Paulinas Editora tenha
atendido à solicitação que a CNBB lhe fez para que assumisse a publicação
de tal revista, esta nunca manteve nenhum vínculo com a CNBB, como
afirma Luzia Sena:
91
SENA, L., Sonhando juntos. Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 39, p. 46. 92
DIÁLOGO – REVISTA DE ENSINO RELIGIOSO, n. 0, p. 1. 93
Esse texto foi publicado na seção Cartas, da Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 0, p. 5.
44 A prática de Ensino Religioso não confessional
Um sintético esboço estrutural da revista, elaborado pelo professor Francisco Catão, membro do Grere, foi apre-sentado e aprovado pelo bispo responsável pelo Ensino Religioso na CNBB (Dom Aloysio Leal Penna) em reunião do Grere, em São Paulo, em 17 de outubro de 1994. A partir de então, ficou sob a total responsabilidade de Paulinas, através da editora/diretora responsável a execução do projeto e a sua continuidade
94.
Mesmo não estando vinculada, em termo institucional, à CNBB, é
inegável que o incentivo e o apoio recebidos, sobretudo do Setor de Educa-
ção e Ensino Religioso, foram imprescindíveis para a Diálogo – Revista de
Ensino Religioso em seus primeiros anos de vida. A revista gozava de boa
aceitação inclusive por parte do sucessor de Dom Aloysio Pena na liderança
do Setor Educação, Dom Irineu Danelon, cujas palavras foram registradas
na seção Cartas da edição n. 0
Como bispo responsável pelo Ensino Religioso no Brasil, fico muito feliz e imensamente grato por esta oportuna iniciativa: a publicação de Diálogo – Revista de Ensino Religioso. Fazia falta algo assim. [...] Penso que esta revista poderá favorecer o intercâmbio entre as diversas regiões do Brasil, bem como com outros organismos e pastorais dentro de uma proposta orgânica e interdisciplinar, colaborando para a formação dos educadores de Ensino Religioso, particularmente na capacitação quanto aos conteúdos, me-todologia, comunicação, relações humanas, ética etc.
95
A Paulinas Editora, ao aceitar a solicitação de Dom Aloysio Leal
Penna para publicar uma revista de Ensino Religioso, lançou-se em um
grande desafio, pois “não havia dentro da editora, ou nos diversos departa-
mentos de Paulinas, nenhum suporte de qualquer natureza que possibili-
tasse iniciar a Diálogo – Revista de Ensino Religioso. De modo que a revista
começou do zero e com muitas dificuldades,”96 constatou Luzia Sena, a pri-
meira diretora de Redação da revista.
94
SENA, L., Entrevista 2/7/2012. 95
DIÁLOGO – REVISTA DE ENSINO RELIGIOSO, n. 0, p. 5. 96
SENA, L., Entrevista 2/7/2012.
45 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
2.1. O sonho de uma revista de Ensino Religioso torna-se realidade
Para recontextualizarmos a criação da Diálogo, no âmbito interno
da Congregação das Irmãs Paulinas, entrevistamos irmã Luzia Sena,
encarregada de levar à frente a criação da revista. A entrevista se
desenvolveu a partir de um questionário composto por dez questões
referentes ao Ensino Religioso, cujos temas abarcaram a realidade interna e
externa, à citada congregação, da entrevistada.
As questões buscam evidenciar não só as dificuldades em se criar
uma revista especializada em Ensino Religioso, mas pretendem também
delinear o perfil editorial que foi assumido pela revista e que rege as suas
publicações. E por que desejamos apresentar o perfil dessa revista?
Sabemos que o perfil editorial é a identidade de qualquer veículo de
comunicação, de modo que, por meio dessa identificação, pretendemos
verificar se a revista Diálogo, publicada por uma editora cristã católica, tem
verdadeiramente o enfoque de suas abordagens e conteúdos, desde a sua
origem, pautado pelo “modelo” de Ensino Religioso à luz das Ciências da
Religião.
Tendo em vista que a revista é fruto de um caminho percorrido
por professores e entidades voltados para a questão do Ensino Religioso,
também o seu perfil foi pensado em consonância com o processo que ante-
cedeu a própria revista. Desse modo,
Não foi difícil delinear o perfil da revista de Ensino Religioso, porque as questões relativas à formação do professor de ER, os novos paradigmas e a nova identidade do Ensino Religioso e sua prática pedagógica já vinham sendo discutidos, refletidos e compartilhados por muitos profes-sores, especialmente no Grere e nos Ener. O anseio, a necessidade que emergia da própria base, ou seja, dos professores, era no sentido de oferecer subsídios que ajudassem esses docentes na sua formação profissional, com textos de fundamentação teórica e pedagógica. Surgia
46 A prática de Ensino Religioso não confessional
um novo ER, distinto da catequese, pautado sobre novos
paradigmas.97
Até 1988 a grande preocupação com relação ao Ensino Religioso
era a sua inclusão no currículo escolar. Vencida essa etapa, outro desafio se
configurava no âmbito da formação, ou seja, era necessário oferecer ao
professor de Ensino Religioso uma preparação adequada a esse
componente curricular. No intuito de responder a essa necessidade, pensou-
se a estrutura da Diálogo, ou melhor, a sua composição, a fim de subsidiar a
formação98 e a prática do professor. Esta contribuição sempre foi um dos
objetivos da revista, a fim de que este pudesse desenvolver com maior pro-
priedade a sua prática docente.
Era preciso apresentar os fundamentos epistemológicos e pedagógicos dessa nova proposta de Ensino Religioso. Propor novos temas a serem abordados nas aulas. Dar embasamento aos temas tratados nessa disciplina que se abria para novos horizontes marcados pelo pluralismo e pela diversidade cultural e religiosa, sem proselitismo, nem foco confessional ou restrita a uma religião. Mas, aberta ao diálogo, ao respeito e à valorização do diferente. Era preciso oferecer meios e possibilidades de aprofundamento, sistematização e socialização de experiências e saberes que estavam sendo construídos nessa perspectiva
99.
A partir dos elementos apontados acima, em 26 de setembro de
1995, foi lançada oficialmente a edição de número zero da Diálogo, durante
um encontro em Santa Catarina.
Por ocasião da 29ª Assembleia Ordinária do Conselho de Igrejas para a Educação Religiosa (Cier), que comemorava 25 anos de existência, realizou-se a instalação do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso e o lançamento do primeiro número da revista, que recebeu o nome de Di-álogo – Revista de Ensino Religioso. O evento ocorreu no hotel Itaguaçu, em Florianópolis (SC), e contou com a pre-sença de representantes de entidades educacionais e religi-osas e de professores de vários estados do Brasil
100.
97
SENA, L., Entrevista 2/7/2012. 98
Esse tema foi desenvolvido por Cláudia Regina Tavares Cardoso em sua pesquisa de mestrado A contribuição da revista Diálogo para a formação do professor-leitor do Ensino Religioso, defendida no ano de 2007, na PUC-PR. 99
SENA, L., Entrevista 2/7/2012. 100
SENA, L.; CARNIATO, I., Diálogo: educação para a diversidade – comemoração dos 15 anos da revista Diálogo e do Fonaper. In: POZZER, A., et alii. Diversidade religiosa e Ensino Religioso no Brasil: memórias, propostas e desafios, p. 180.
47 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
E desde a sua primeira edição a revista era monotemática, ou
seja, apresentava um tema principal, indicado na chamada de capa, e abor-
dado em diferentes perspectivas. Estruturalmente a revista intercalava tex-
tos-artigos de fundamentação teórica com textos para serem usados pelo
professor em sala de aula, tais como contos, poesias, parábolas etc.
Considerando que ao ser criada em um departamento autônomo,
a revista contava com poucos recursos, e o seu primeiro projeto gráfico foi
planejado de modo bem simples, isto é, a revista teria impressão em duas
cores, com algumas ilustrações, e somente a capa impressa em quatro co-
res. A revista apresentou as seguintes medidas: 21,5 centímetros de altura
por 15 centímetros de largura.
Figura 1:
Capa de Diálogo – Revista de Ensino Religioso Outubro de 1995 – n. 0
Fonte: Arquivo Paulinas
A edição n. 0 trouxe como tema O Ensino Religioso no Brasil, o
fenômeno religioso e o papel do professor, e dispôs de uma “tiragem de 5
mil exemplares, que foram distribuídos gratuitamente para escolas e
professores de Ensino Religioso de todos os estados do Brasil”101. A revista
apresentava os artigos de fundamentação teórica e os intercalava com
101
SENA, L.; CARNIATO, I., Diálogo: educação para a diversidade – comemoração dos 15 anos da revista Diálogo e do Fonaper. In: POZZER, A., et alii. Diversidade religiosa e Ensino Religioso no Brasil: memórias, propostas e desafios, nota 3, p. 180.
48 A prática de Ensino Religioso não confessional
pequenos textos de conto e/ou parábolas. Também fazia parte da estrutura
da revista uma seção de resenha e de notícias acerca do Ensino Religioso.
Os anos passaram, e a revista se estruturou não só no que diz
respeito ao conteúdo, mas, sobretudo, em sua apresentação gráfica. Assim,
em 2002, a Diálogo passou por mudanças gráficas significativas e recebeu
uma nova “roupagem”.
No ano de 2002 – sétimo da sua publicação –, ela [a revista] ganhou um novo formato, uma apresentação gráfica mais bonita, em quatro cores, enriquecida de novas seções que a tornaram mais dinâmica, interativa e atual
102.
As mudanças na revista concederam efetivamente ao seu visual o
status de revista, tanto em sua diagramação, quanto na própria apresenta-
ção que no primeiro projeto gráfico dava a aparência mais de um livro, do
que propriamente de uma revista. A Diálogo começa a ser organizada em
dois blocos bem definidos: o primeiro, composto por 5 ou 6 artigos de funda-
mentação teórica, e o segundo dividido em 8 seções pedagógicas e de inte-
ração com o leitor. Além dessa estruturação, a revista também ganhou
novas medidas, passando a ter 23,5 centímetros de comprimento por 17
centímetros de largura.
Figura 2:
Capa de Diálogo – Revista de Ensino Religioso Ano VII – Março de 2002 – n. 25
Fonte: Arquivo Paulinas
102
SENA, L., Sonhando juntos. Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 39, p. 47.
49 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
Os artigos, a princípio, não tinham o objetivo de serem utilizados
como material de apoio didático em sala de aula. Esse fato não impediria
que os textos fossem usados pelo professor como um recurso didático;
entretanto, a sua primeira finalidade tinha em vista a formação do professor,
pois didaticamente não se pensa a prática pedagógica sem uma
fundamentação teórica.
Embora os textos dos artigos sejam curtos, de cinco a seis lau-
das, eles buscam levantar os pontos principais em relação ao tema
proposto, sem a preocupação de dar conta de responder a todas as
questões acerca do assunto. A intenção é oferecer as condições para que o
professor se interesse pelo tema proposto e, a partir das provocações
levantadas pelo texto, busque aprofundá-lo e reflita sobre como aplicá-lo em
sua prática docente.
As seções classificam-se em duas categorias: pedagógicas e de
interação. A primeira busca concretamente auxiliar o professor em sala de
aula através de sugestões de atividades. Essas seções são: Aprendendo e
ensinando, que apresenta dinâmicas para o professor assimilar os conteú-
dos dos textos e repassá-los de forma criativa aos alunos; Você sabia, que
enfatiza as particularidades e curiosidades do tema, sempre voltado para as
questões referentes às religiões; Lenda, cuja finalidade é ajudar o professor
a trabalhar a temática a partir da linguagem mítica; e Em pauta, que destaca
uma festa ou data comemorativa, folclórica ou religiosa, do trimestre.
As seções de interação com os professores buscam socializar e
compartilhar experiências de Ensino Religioso, bem como valorizar as inicia-
tivas, realizadas pelos professores ou por suas instituições de ensino. São
as seções: Sua página, cujo conteúdo evidencia as atividades que o pro-
fessor e/ou escola desenvolve e deseja compartilhar com outras escolas;
Entrevista, que põe no centro as pessoas e suas ações realizadas em vista
do Ensino Religioso; e Destaque, que, como o próprio nome diz, põe em
evidência as atividades ou eventos realizados em diferentes regiões do Bra-
50 A prática de Ensino Religioso não confessional
sil e que visam à formação de professores ou ações práticas de Ensino Reli-
gioso.
Há também as seções informativas, que buscam orientar os pro-
fessores em relação ao material produzido na área de Ciências da Religião,
Educação e Ensino Religioso. São as seções: Resenha, que apresenta um
livro que seja de interesse formativo do professor, e Dicas, que traz su-
gestões de material pedagógico de apoio (livros e mídias audiovisuais), que
podem ser utilizados pelos professores e alunos, ou mesmo servem de
aprofundamento do tema geral tratado na edição.
Por fim, a revista também tem seções móveis, ou seja, que são
publicadas circunstancialmente a cada edição. São as seções Conheça
mais, voltada para a legislação ou aspecto relevante do Ensino Religioso;
Conto/Poesia, cujo objetivo tem afinidade com a seção Lenda; e Celebra-
ção/Teatro, que propõe uma atividade relacionada ao tema da revista numa
forma mais celebrativa ou cultural.
Por meio do novo projeto gráfico, de fato, a revista também ga-
nhou mais dinamicidade e interatividade com o leitor, seja na sua estrutura
bem definida em dois blocos, seja através das seções voltadas para o com-
partilhamento de experiências realizadas pelo professor, seja pelas ativida-
des propostas pela própria revista.
Essa interatividade na revista concretiza o sonho de todos aque-
les que, no final do 10º Ener manifestaram o desejo de ter uma revista de
Ensino Religioso como subsídio de formação e informação entre os profes-
sores espalhados de norte a sul pelo Brasil.
51 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
2.2. Uma nova etapa para a revista Diálogo
Além do projeto gráfico, outra mudança ocorreu em outubro de
2005, data na qual Luzia Sena, após dez anos à frente da revista, passou a
direção de Redação da Diálogo para a sua sucessora Maria Inês Carniato.
Essa passagem ficou registrada no editorial da edição n. 40, onde se lê:
Idas e vindas fazem parte da vida. A partir desta edição, Maria Inês Carniato assume a diretoria de Redação da re-vista Diálogo. À nova diretora, boas-vindas, e a todos(as) vocês, com quem mantive um diálogo enriquecedor e amistoso no decorrer desses 10 anos, obrigada!
103
Essa foi a primeira mudança na direção de Redação da revista e
ocorreu num período em que a revista já estava consolidada interna e exter-
namente. É importante ressaltar que, nesse período, a Diálogo, que havia
nascido de forma independente dentro de Paulinas, já integrava o Departa-
mento de Paulinas Revistas.
A nova diretora de Redação, Maria Inês Carniato, fez com que a
revista tomasse outra direção em suas abordagens, isto é, nessa fase a
revista toma como pressuposto um novo critério na seleção de seus
articulistas,
Quando eu assumi a Redação, percebi que o principal crité-rio de escolha dos articulistas era o religioso, porém, ainda que não fossem fixos, os nomes repetiam-se com frequên-cia em várias edições e, de modo geral, as pessoas vinham do meio teológico e filosófico cristão e católico, sendo pe-quena a presença de representantes de outras tradições re-ligiosas. Os autores representavam ainda as regiões Leste, Centro-Oeste e Sul do País, sendo quase nula a contribui-ção de pessoas de outras regiões
104.
Essa mudança no critério de escolha dos articulistas é bastante
significativa para a revista, pois ela consolida o modelo de Ensino Religioso
à luz das Ciências da Religião presente na Diálogo. A opção por articulistas
de diversas áreas do conhecimento e de diferentes regiões do Brasil, bem
103
DIÁLOGO – REVISTA DE ENSINO RELIGIOSO, n. 40, p. 3. 104
Maria Inês Carniato em entrevista respondida via e-mail em 9/4/2012.
52 A prática de Ensino Religioso não confessional
como de outras tradições religiosas, é algo positivo para a revista, pois não
mudou o seu perfil, mas “ajustou” o seu enfoque. O que se depreende das
palavras de Maria Inês Carniato:
Tomei a iniciativa de mudar o critério principal, pois este partia das Tradições Religiosas – geradoras do conteúdo. Passei a ter como critério a escola e os professores, como interlocutores do conteúdo na chave da educação escolar. Procurei também ampliar o critério da representatividade, convidando pessoas de todas as regiões do País, proveni-entes de outras áreas acadêmicas convergentes com a educação e com o ER, tais como História, Geografia, Antro-pologia, Pedagogia, Literatura e outras
105.
Com a mudança, o tema geral contou com a fundamentação a
partir de alguns enfoques, tais como: o histórico, que abarca a parte histórica
do tema geral; o antropológico, que busca resgatar os aspectos humanos da
problemática tratada; o sociológico, que põe em evidência a atualidade do
tema e aponta quais as consequências para a sociedade hoje; o cultural,
que aborda os aspectos da cultura e sua influência na formação do
pensamento hoje, além de apontar possíveis prospectivas para o assunto
em questão; o pedagógico, que, através de uma leitura interdisciplinar,
busca ajudar o professor a pensar a temática numa visão educacional
integrada.
É interessante ressaltar que o enfoque, tanto do Ensino Religioso,
quanto da revista, é a educação e não a religião enquanto doutrinação.
Desse modo, o enfoque na escola e no professor também acarretou mu-
dança na linguagem da revista,
Vejo ainda um avanço na sintonia da linguagem e das pro-postas pedagógicas da revista com os grandes critérios po-lítico-culturais, que vêm da Unesco e regem a legislação e as diretrizes da Educação Básica no País. Esta linguagem tem palavras-chave, tais como: diversidade, multicultura-lismo, inclusão social, positividade das diferenças, valores humanos, valores imateriais, ética, população multiétnica, espiritualidades. Estas são palavras que evocam os valores ensinados pelas religiões e as matrizes religiosas das cultu-ras humanas e almejam uma sociedade de igualdade e di-
105
Idem.
53 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
reitos para todos, que também é uma das principais utopias das religiões
106.
Ao se voltar para as discussões que envolvem a escola de um
modo geral, como, por exemplo, o multiculturalismo ou questões étnicas, a
revista evidencia que o Ensino Religioso como componente curricular não
está centrado apenas em temas acerca da cultura religiosa, pelo contrário, a
sua presença é multi ou transdisciplinar. É no período da segunda diretora
de Redação que esse âmbito do Ensino Religioso é percebido e inserido nos
temas da revista.
Como se vê nas primeiras edições da revista – ainda era bastante restrito ao ecumenismo e ao ensino dos valores cristãos calcados na Bíblia. [...] A revista, porém, emanci-pou-se rapidamente desta mentalidade e avançou na linha da cultura e da antropologia
107.
As mudanças tanto no projeto gráfico, quanto na diretoria de Re-
dação, evidenciou na Diálogo uma característica própria e ao mesmo tempo
em consonância com modelo das Ciências da Religião ao tratar do Ensino
Religioso. Podemos perceber que, num primeiro momento, isto é, no con-
texto de sua criação, a revista abordou temas na ótica das tradições religio-
sas, fato esse que incidia na escolha dos articulistas com formação mais te-
ológica e áreas afins. Todavia, em uma segunda fase, o foco dos temas
passou das tradições religiosas para as áreas do conhecimento que com-
põem a base epistemológica das Ciências da Religião, tais como a antropo-
logia, a história, a sociologia, a fenomenologia entre outras.
É possível perceber nítidas mudanças de uma diretoria a outra, de
modo que identificamos essas duas fases ou perspectivas nas publicações
da revista que se constituem como uma via de “mão dupla” no critério de
suas abordagens. Uma “mão” que parte das tradições religiosas para o
Ensino Religioso, e que busca conhecer as Tradições Religiosas como um
objeto de estudo. E a outra que, alicerçada no âmbito dos diferentes sabe-
res, interpela às tradições religiosas um conteúdo prático e didático ao
Ensino Religioso.
106
CARNIATO, I. M., Entrevista 9/4/2012. 107
Idem.
54 A prática de Ensino Religioso não confessional
3. O modelo das Ciências da Religião presente na Diálogo
Desde a primeira edição, a Diálogo buscou compreender que o
Ensino Religioso é um importante componente curricular, pois visa a ajudar
a formar no cidadão um novo ethos aberto ao respeito e à diversidade social,
política e religiosa presente na educação brasileira. Conforme Oliveira,
Uma das muitas diferenças presentes no contexto educa-cional está relacionada com a questão religiosa, originada na diversidade cultural própria dos diferentes grupos de hu-manos. Ela envolve toda uma gama de relações, interações e conexões, associada a outras questões, que movem, faci-litam ou emperram o processo educativo como um todo
108.
A concepção de um Ensino Religioso na ótica da diversidade e
pluralidade religiosa também se encontra na revista desde a sua primeira
edição, como é possível perceber no editorial da edição n. 0:
No contexto pluralista em que vivemos, a escola é o lugar de diálogo. O Ensino Religioso constitui, na escola, espaço importante no processo de aprendizagem da convivência humana, respeitosa, solidária, aberta ao outro, ao diferente. Colocados comunitária e pessoalmente em face do que dá sentido à vida, educandos e educadores aprendem a com-partilhar suas alegrias, preocupações, lutas e experiências em busca do absoluto, unem-se na procura de respostas aos grandes desafios da vida e descobrem caminhos para se empenharem na construção de um mundo mais humano, mais justo e fraterno
109.
Constata-se que a revista está voltada para o Ensino Religioso à
luz das Ciências da Religião, sobretudo no que diz respeito ao seu método
de abordar os temas. E assim como o Ensino Religioso busca nas Ciências
da Religião a sua base epistemológica, ela passa a se constituir o funda-
mento para todos aqueles que lidam com o Ensino Religioso dentro e/ou fora
da sala de aula,
108
OLIVEIRA, L., Formação de docentes para o Ensino Religioso: Perspectivas e impulsos a partir da ética social de Martinho Lutero, p. 173. 109
DIÁLOGO – REVISTA DE ENSINO RELIGIOSO, n. 0, p. 1.
55 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
As Ciências da Religião, ao se constituírem como uma das bases epistemológicas para o Ensino Religioso, contribuí-ram para a compreensão do humano enquanto ser, aberto à transcendência e histórico-culturalmente situado dentro de referências religiosas, influenciadas por elas de múltiplas maneiras e, muitas vezes, agindo a partir delas
110.
Quando alicerçado nas Ciências da Religião, o Ensino Religioso
recebe delas as suas bases “teóricas e metodológicas para o estudo e o
ensino da religião como disciplina autônoma e plenamente inserida nos
currículos escolares”111. Entretanto, sabemos que ainda há um longo
caminho a ser percorrido até que o modelo das Ciências da Religião seja
consolidado, pois, segundo Passos:
A adoção das Ciências da Religião como base epistemoló-gica desse ensino não parece ser um processo simples de ser concretizado, tendo em vista as práticas já consolidadas e o jogo de interesses políticos das Igrejas em suas rela-ções com as conjunturas governamentais concretas
112.
Mesmo sem uma formalização do modelo das Ciências da
Religião como constituinte do perfil da revista, é possível depreender de
suas abordagens uma grande afinidade a esse modelo, além de agregar a
este um elemento que é próprio da Diálogo, isto é, a sua abordagem
monotemática dos temas.
A estrutura metodológica, monotemática da revista permite uma visão ampla do tema, a partir de diferentes perspecti-vas de abordagens, tanto do ponto de vista das diversas áreas do conhecimento, como antropologia, sociologia, his-tória, psicologia, pedagogia, entre outras, como das dife-rentes tradições religiosas: hinduísmo, judaísmo, budismo, cristianismo, islamismo, bahá’í, candomblé, umbanda, xa-manismo, tradições religiosas indígenas e outras expres-sões do Fenômeno Religioso contemporâneo
113.
Não podemos nos esquecer de que o modelo de Ensino Religioso
cuja base epistemológica é a das Ciências da Religião ainda é algo em
110
JUNQUEIRA, S. R. A., Formação de professores para o Ensino Religioso: Construção de uma identidade, p. 59. 111
PASSOS, J. D., Ensino Religioso, construção de uma proposta, p. 54. 112
Ibid., p. 55. 113
SENA. L.; CARNIATO, I., Diálogo: educação para a diversidade – Comemoração dos 15 anos da revista Diálogo e do Fonaper. In: POZZER, A., et alii. Diversidade religiosa e Ensino Religioso no Brasil: Memórias, propostas e desafios, p. 185.
56 A prática de Ensino Religioso não confessional
construção114, e muitas discussões giram em torno desse eixo. Ademais,
esse modelo é pouco conhecido, sobretudo por parte daqueles que se
opõem ao Ensino Religioso como componente curricular, ou mesmo
daqueles que dirigem duras críticas à liceidade e permanência do Ensino
Religioso escolar.
Enfim, na análise das chamadas de capa, percebe-se que um mo-
delo muito afinado com as Ciências da Religião se faz presente na revista.
Entretanto, vale lembrar que a estruturação do Ensino Religioso em modelos
é uma questão metodológica de diferenciar a aplicação do conteúdo do
Ensino Religioso. E, embora a revista priorize a base epistemológica das
Ciências da Religião em sua forma de abordagem, isso não significa que os
outros modelos ou enfoques não possam ser detectados na Diálogo.
4. As temáticas abordadas entre 1995 e 2010
O período que compreende o nosso estudo vai do ano de 1995 a
2010, ou seja, tomamos como referência os 15 anos de publicação da Diá-
logo. Feita essa delimitação de tempo, apresentamos neste momento em
nossa pesquisa um olhar retrospectivo e também avaliativo sobre os temas
de capa abordados desde a edição n. 0 até a de n. 59. Excluímos a edição
n. 60 (outubro/dezembro 2010), pelo fato de se tratar de uma edição de tran-
sição, isto é, nesta edição acontece a passagem para a terceira editora de
Redação, Roseane Barbosa.
O critério que usaremos para a classificação dos temas publica-
dos nas capas da revista é o seu enquadramento nos cinco eixos temáticos
propostos pelos PCNER, a saber: Culturas e Tradições Religiosas, Escritu-
ras Sagradas e/ou Tradições Orais, Teologias, Ritos e Ethos.
114
PASSOS, J. D., Ensino Religioso construção de proposta. 2007.
57 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
É interessante ressaltar que somente pela chamada de capa não
é possível determinar o conteúdo das abordagens, de modo que a nossa
análise não se estende ao conteúdo, mas estritamente ao tema geral. A
análise do conteúdo será desenvolvida no capítulo III.
4.1. Os cinco eixos temáticos e seus parâmetros para a revista Diálogo
Cabe-nos, porém, antes de iniciar a nossa análise das chamadas
de capa, apresentar o que os PCNER determinam como sendo o conteúdo
básico em cada um dos cinco eixos, ou seja, o que se define por Culturas e
Tradições Religiosas, Escrituras Sagradas e/ou Tradições Orais, Teologias,
Ritos e Ethos.
Para o eixo Culturas e Tradições Religiosas, temos a seguinte
formulação:
É o estudo do Fenômeno Religioso à luz da razão humana, analisando questões como função e valores de tradição re-ligiosa, relação entre tradição religiosa e ética, teodiceia, tradição religiosa natural e revelada, existência e destino do ser humano nas diferentes culturas
115.
No que diz respeito ao eixo Escrituras Sagradas e/ou Tradições
Orais, os PCNER dizem que:
São os textos que transmitem, conforme a fé dos seguido-res, uma mensagem do Transcendente, em que, pela reve-lação, cada forma de afirmar o Transcendente faz conhecer aos seres humanos seus mistérios e sua vontade, dando origem às tradições, e estão ligados ao ensino, à pregação, à exortação e aos estudos eruditos
116.
No eixo Teologias, encontramos a descrição de que este “é o
conjunto de afirmações e conhecimentos elaborados pela religião e repas-
115
FONAPER, Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso, p. 50. 116
FONAPER, Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso, p. 51-52.
58 A prática de Ensino Religioso não confessional
sados para os fiéis sobre o Transcendente, de um modo organizado ou sis-
tematizado”117.
Em relação ao eixo Ritos, a definição é desdobrada em três
subcategorias: rituais, símbolos e espiritualidades, pois o eixo Ritos abrange
uma “série de práticas celebrativas das tradições religiosas que formam um
conjunto”118 composto por aquelas três subcategorias.
Quanto à compreensão do eixo Ethos, os PCNER afirmam que:
É a forma interior da moral humana em que se realiza o próprio sentido do ser. É formado na percepção interior dos valores, de que nasce o dever como expressão da consci-ência e como resposta do próprio “eu” pessoal. O valor mo-ral tem ligação com um processo dinâmico da intimidade do ser humano e, para atingi-lo, não basta se deter à superfície das ações humanas
119.
Lembramos que essas definições teóricas dos cinco eixos temáti-
cos dos PCNER também nortearão a nossa análise das chamadas de capa
e das abordagens da revista no capítulo II, o que justifica a sua
apresentação neste ponto de nosso trabalho.
4.2. Os temas de capa
A contar de outubro de 1995 (edição n. 0), a agosto de 2010 (edi-
ção n. 59), tem-se um total de 60 publicações da revista Diálogo. E a partir
dos cinco eixos temáticos temos o seguinte quadro:
117
Ibid., p. 53. 118
Ibid., p. 54. 119
Ibid., p. 56.
59 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
Gráfico 1: Percentual de publicação por Eixo Temático
O gráfico acima nos mostra que, em sua grande maioria, os te-
mas de capa das publicações da revista se concentram no eixo de Ethos,
seguido por Culturas e Tradições Religiosas. A partir do percentual apre-
sentado nesse gráfico se constata que, nas chamadas de capas, a revista
Diálogo pouco se deteve em temas sobre Escrituras Sagradas, Teologias e
Ritos. O que não significa que a revista não tenha trabalhado sobre esses
eixos, uma vez que a informação aqui analisada se detém somente sobre o
que está enunciado nos títulos das 60 edições, de modo que dentro da re-
vista é possível encontrarmos artigos que se enquadrem nos eixos temáticos
não apresentados pelas capas.
Entre os temas de capa, a revista também tratou do Ensino
Religioso em seu sentido estrito, porém, em nossa análise não
consideramos essas edições, pois elas não estão relacionadas aos eixos
temáticos e se constituem nas abordagens da Diálogo como fundamentação
teórica e legislativa acerca do Ensino Religioso. Desse modo, essas edições
foram classificadas na categoria Não se aplica.
Podemos concluir que, a partir desses dados observados, as
abordagens da revista sobre o Ensino Religioso apontam para uma perspec-
32%
3%
3%
7%
48%
7%
Eixos Temáticos nas chamadas de capa
Culturas e Tradições Religiosas
Escrituras Sagradas
Teologias
Ritos
Ethos
Não se aplica
60 A prática de Ensino Religioso não confessional
tiva cultural. Fato que denota um movimento muito interessante, isto é, os
títulos das revistas partem de um contexto de fora para dentro das religiões,
ou seja, o enfoque das chamadas não se detém nas religiões e suas estrutu-
ras (crenças, ritos, símbolos, dogmas etc.), mas em temas concernentes a
estas, evidenciando assim que os mais variados assuntos podem ser temas
do Ensino Religioso.
Observa-se que a Diálogo não apresenta o tema da religião des-
vinculado de outras dimensões humanas, pois, seja tangencial ou direta-
mente, toda discussão poderá esbarrar com o dado religioso em qualquer
circunstância da vida.
4.3. Os enfoques principais das chamadas de capa
Além de percebermos nas chamadas de capa em qual Eixo
Temático esta se enquadra, também buscamos identificar o assunto
principal ou a tônica contida nas chamadas.
Gráfico 2: Enfoque dos temas de capas
2
10
6
21
7
2
7
2
1
2
0 5 10 15 20 25
Sociorreligioso
Sociopolítico
Socioeducacional
Religião
Ensino Religioso
Educação e Religião
Educação
Cultural em geral
Cultura indígena
Cultura afro-brasileira
Enfoque dos temas de capas
61 Capítulo II: O Ensino Religioso na linguagem de uma revista
Os dados do gráfico 2 apresentam uma informação que não foi
apontada pelo gráfico 1, isto é, embora as chamadas de capa da revista, em
sua maioria, não tratem diretamente do tema religião, ou mesmo de assun-
tos tais como ritos, símbolos ou teologias, os enfoques dados pelo tema ge-
ral estão diretamente ligados à religião e ao Ensino Religioso. Além de apre-
sentar temas voltados para questões sócio-político-religioso-educacionais.
No gráfico 2, as matrizes afro e indígena aparecem como tema na
chamada de capa. E embora poucos números tenham sido dedicados a
essas matrizes, elas não ficaram de fora da Diálogo, evidenciando uma
atenção não só ao Ensino Religioso, mas à educação de modo geral, pois as
duas matrizes que compõem a cultura brasileira tiveram a inclusão de
estudo obrigatório no currículo da educação básica alguns anos após a
criação da revista.
É importante lembrar mais uma vez que o conteúdo dos artigos
não se restringe à chamada de capa, pois esta apresenta apenas o tema
geral, que é desdobrado a partir de diferentes perspectivas dentro da revista.
Finalizando este capítulo, no qual recontextualizamos a criação da
Diálogo, percebemos que, desde a sua origem, o perfil editorial da revista
deixava certa abertura ao Ensino Religioso no modelo das Ciências da
Religião, mesmo que ele, na época de criação da revista, ainda fosse
sistematizado ou mesmo explicitado metodologicamente como o temos
atualmente.
Algo importante que deve ser destacado na caminhada do Ensino
Religioso no Brasil é o apoio dado pela Igreja Católica, representada pela
CNBB, mais especificamente pelo Grere, nos anos que antecederam a
promulgação da LDB n. 9.393/96 e n. 9.475/97. Sem dúvida, os Ener tiveram
grande importância no sentido de subsidiar a formação dos professores e,
ao mesmo tempo, fomentar a discussão acerca do Ensino Religioso no País.
Nesse sentido, não podemos negar que a militância da Igreja foi uma voz a
62 A prática de Ensino Religioso não confessional
favor do Ensino Religioso, e mesmo que o seu posicionamento atual seja
favorável ao ensino confessional, o que contraria a própria legislação, de
modo algum é possível negar o seu mérito e a sua importância para que o
Ensino Religioso permanecesse na Constituição brasileira como parte inte-
grante da formação básica.
A Diálogo nasceu em meio aos Ener, bem como do sonho de
muitos professores que desejavam ter uma revista que os ajudasse em sua
formação e também na comunicação entre eles. Em seus inícios, a revista
contou com o apoio da CNBB, entretanto, a Diálogo sempre teve plena
autonomia para definir seus conteúdos e delinear o seu perfil.
Ao refazer o contexto histórico da criação da Diálogo, em seu per-
fil editorial parece indicar a ideia de que as abordagens da revista não
deveriam ser de cunho confessional, pois esse tipo de abordagem a tornaria
uma revista de catequese e não de Ensino Religioso. Embora não se possa
afirmar categoricamente que, desde a sua origem, a revista propunha o
Ensino Religioso no modelo das Ciências da Religião, com toda certeza, ele
estava presente desde as primeiras edições, mesmo que de forma não
explícita.
63 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
CAPÍTULO III
O DIÁLOGO ENTRE A CRÍTICA EPISTEMOLÓGICA E A
REVISTA DIÁLOGO À LUZ DAS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
Chegamos à etapa final de nossa pesquisa, que percorreu o
seguinte caminho: analisou as ambivalências do Ensino Religioso na
tessitura brasileira (capítulo I), bem como tratou do surgimento da revista
Diálogo (capítulo II). O que pretende agora este último capítulo é estabelecer
um diálogo com os críticos apontados no primeiro capítulo, e as abordagens
da revista Diálogo à luz do modelo de Ensino Religioso cuja base
epistemológica são as Ciências da Religião.
Dos críticos retomaremos os argumentos contrários ao Ensino
Religioso, como componente escolar, e evidenciaremos a suposta problemá-
tica que se encontra por trás de tais argumentos, bem como o modelo de
Ensino Religioso que esses pesquisadores têm diante de si ao lançarem
suas críticas a essa disciplina.
Buscaremos também evidenciar alguns argumentos que funda-
mentam as Ciências da Religião como base epistemológica para o Ensino
Religioso em conformidade com a LDB n. 9.475/97. E a partir dessa funda-
mentação, apresentaremos a nossa análise da revista Diálogo a partir de
duas categorias: articulistas e abordagens. Nosso objetivo é verificar o modo
como a revista aplica o modelo de Ensino Religioso das Ciências da Religião
em suas edições, e evidenciar que é possível desenvolver os conteúdos do
Ensino Religioso sem a perspectiva confessional.
64 A prática de Ensino Religioso não confessional
1. As problemáticas do Ensino Religioso na crítica epistemológica
Antes de entrarmos na problemática levantada pelos nossos críti-
cos, consideramos ser importante evidenciar a formação acadêmica dos três
pesquisadores com os quais nos propomos dialogar. O professor Carlos
Roberto Jamil Cury é doutor em Educação e docente na Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais; José Vaidergorn é doutor em
educação e professor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita
Filho; Emerson Giumbelli é doutor em antropologia social e professor na
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
É interessante ressaltar que esses pesquisadores, embora não
tenham um envolvimento direto com a caminhada do Ensino Religioso, dedi-
caram-se a refletir acerca desse tema, o que de certa forma exige uma
reflexão acerca de suas críticas, bem como se faz necessário apresentar
contra-argumentos, não para instigar acirramentos, mas para evidenciar que
nessa discussão há outra perspectiva de Ensino Religioso que não é
ponderada pelas críticas.
1.1. A crítica ao “lugar” do Ensino Religioso
O ponto de partida que Cury toma para a sua crítica ao Ensino
Religioso é o princípio da laicidade do Estado. Realmente o Brasil é um país
laico, entretanto, ressaltamos que laicidade não é sinônimo de negação da
religião, apenas significa que o Estado não professa uma religião oficial. A
laicidade possibilita a diversidade e a liberdade religiosa aos seus cidadãos,
bem como às instituições religiosas o direito de realizar seus cultos, abrir
templos, “arrebanhar” fiéis e manifestar-se publicamente. É com base neste
argumento que Cury afirma não ser necessária a presença da religião no
âmbito escolar. Segundo este pesquisador, o Estado ao permitir o estudo da
65 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
religião estaria subsidiando a Igreja ou entidade religiosa e isto não é permi-
tido ao Estado laico. Visto que as Igrejas gozam de plena liberdade religiosa,
além de possuírem sob os seus domínios “meios de comunicação de massa,
em especial as redes de televisão ou programas religiosos em canais de di-
fusão”120, não se faz necessário o Ensino Religioso.
Afirma Cury que outro elemento complicador nesta questão é o
próprio texto da LDB n. 9.475/97 que aponta o Ensino Religioso como parte
integrante da formação, porém de caráter facultativo, além de impor a exis-
tência de uma entidade civil composta por diferentes denominações religio-
sas com o agravante de deixar a cargo de tal entidade a função de definir o
conteúdo do Ensino Religioso. Frente a esses impasses, segundo Cury, “o
Ensino Religioso ficaria livre dessa complexidade político-burocrática caso
se mantivesse no âmbito dos respectivos cultos e Igrejas em seus espaços e
templos”121.
A fragilidade do argumento de Cury se encontra no fato de que
ele não leve em consideração que a Lei exige que o conteúdo do Ensino
Religioso não pode ser vinculado a nenhuma crença ou religião em
particular. E a sua natureza pode ser compreendida como “o ensino da
religião na escola sem o pressuposto da fé (que resulta na catequese) e da
religiosidade (que resulta na educação religiosa), mas com o pressuposto
pedagógico (que resulta no estudo de religião)”122. Desse modo, podemos
afirmar que o Ensino Religioso é o estudo da religião enquanto manifestação
humana, e não uma proposta de conversão à fé, seja ela qual for.
120
CURY, C. R. J., Ensino Religioso na escola pública: O retorno de uma polêmica recorrente. Revista brasileira de educação, n. 27, set/out/nov/dez 2004, p. 185. 121
Ibid., p. 187. 122
PASSOS, J. D., Ensino Religioso construção de uma proposta, p. 32.
66 A prática de Ensino Religioso não confessional
1.2. A crítica ao Ensino Religioso como herança da ditadura
A relação entre a Igreja Católica e o Estado brasileiro sempre foi
uma relação tensa, afirma Vaidegorn, pois se por um lado o Estado sofreu
“pressão” ideológica por parte da Igreja, de outro lado ele sempre buscou
nela o apoio político. É olhando para esta relação de poder que Vaidergorn
percebe o surgimento do Ensino Religioso.
No período da ditadura, segundo Vaidergorn, o Estado buscava
oferecer aos seus cidadãos uma “boa cidadania”, mais entendida como
submissão ao Estado. Com esse intuito foram inseridas no currículo escolar
algumas disciplinas, entre as quais o Ensino Religioso, cujo objetivo especí-
fico era formar o cidadão consonante com o sistema de governo totalitarista,
isto é, um cidadão submisso e com uma “boa formação moral”. Com o fim da
ditadura, as disciplinas “cívicas” saíram do currículo, porém, o Ensino
Religioso permaneceu em meio a muitos conflitos.
Para Vaidergorn, a permanência do Ensino Religioso na grade
curricular, mesmo seguindo as orientações dos PCNER, é problemática, pois
há um distanciamento entre a prática escolar e a proposta dos PCNs.
Vaidegorn afirma que os alunos pertencentes às religiões minoritárias ou
sem religião ficam “sujeitos ao proselitismo e ao preconceito, gerando
situações de constrangimentos e conflitos dentro e fora da escola”123.
Diante dos argumentos acima, evidenciamos dois aspectos: o pri-
meiro é que a disciplina de Ensino Religioso não se restringe ao aprendizado
de valores. Estes compõem o conteúdo da disciplina, mas não são os únicos
componentes. O outro é que o estudo da religião pode ter diferentes
finalidades, pois uma questão “é estudar religião para ser mais religioso,
para professar a fé em seus princípios [...] outra, ainda, é estudar religião
123
VAIDERGORN, J., Ensino Religioso, uma herança do autoritarismo. CEDES, vol. 28, set/dez. 2008, p. 409.
67 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
para simplesmente compreendê-la melhor”124, e sem sombra de dúvida essa
é a finalidade do Ensino Religioso na escola.
1.3. A crítica ao cristianismo como substrato do Ensino Religioso
Ao analisar alguns documentos125 voltados para o Ensino
Religioso, a primeira constatação que Giumbelli faz é que o ponto de partida
em um dos livros didáticos126 centra-se na noção de que o transcendente se
expressa na ideia de texto sagrado, seja escrito ou oral, tornando visível a
experiência religiosa. Esta, por sua vez, se manifesta no tempo, isto é, por
um calendário social, e no espaço entendido como lugar e como expressão
artística. Na realidade, para Giumbelli, essa é a ideia que permeia o conceito
de religiões mundiais, em torno do qual se busca articular o conteúdo do
Ensino Religioso. Para Giumbelli, o problema encontra-se em não se dar a
devida importância para as diferenças entre as religiões, pois se valoriza o
que existe em “comum” entre as tradições e não as particularidades que as
diferenciam.
Outro ponto que Giumbelli evidencia em um documento127 é a
substituição do termo transcendente por sagrado, a fim de resolver a
restrição que o uso do termo causaria entre as tradições que não têm em
suas crenças um ser transcendente. Segundo Giumbelli, essa troca de termo
é meramente formal, uma vez que se mantém o mesmo substrato por detrás
das palavras, ou seja, ao se substituir transcendente por sagrado, não se
124
PASSOS, J. D., Ensino Religioso, construção de uma proposta, p. 30. 125
Entre os documentos escolhidos por Giumbelli estão os seguintes: Diretrizes curriculares para o Ensino Religioso no estado de Goiás, 2. ed. 2002; Referencial curricular para o Ensino Religioso na educação básica do sistema estadual de ensino, 2006 (RS); Diretrizes curriculares da Rede Pública de Educação Básica do Paraná – Ensino Religioso. 2006. E o Informativo da Assintec, n. 22, ago./set. de 2007. 126
O livro em questão é Redescobrindo o universo religioso, Editora Vozes, vol. 5. 2. ed. 2008. 127
O documento referido por Giumbelli são as Diretrizes Curriculares da Rede Pública de Educação Básica do Paraná – Ensino Religioso. 2006.
68 A prática de Ensino Religioso não confessional
muda a categoria propriamente dita, pois persiste na palavra sagrado a
noção de transcendente. Para Giumbelli, a mudança se encontra somente
nos termos, a ideia, porém é a mesma.
Giumbelli afirma que há uma leitura universalista das religiões,
presente em um dos documentos128 analisados. Esta é a leitura que
apresenta maior limitação, pois esse universalismo é marcado pelas re-
ferências cristãs que deixa de lado as particularidades das outras tradições.
Apesar desse universalismo não negar a diversidade, esta também não é
afirmada, pois o universalismo cristão não é equivalente ao que verdadeira-
mente se pode chamar de diversidade. Em última instância, não se busca
pelo diverso, e sim pelo igual, ou o que é semelhante.
Os elementos apontados por Giumbelli são relevantes quando
tem à frente de suas críticas apenas o modelo de Ensino Religioso
confessional. Contudo, não podemos deixar considerar que há outras formas
de abordagem no Ensino Religioso referentes ao estudo das religiões e que
não se restringem à visão cristã, como, por exemplo, a abordagem a partir
das Ciências da Religião que buscaremos demonstrar, mais à frente neste
capítulo, por meio da análise da perspectiva e do conteúdo da Diálogo.
A abordagem confessional por muito tempo foi a única forma de
se desenvolver o conteúdo de Ensino Religioso em sala de aula. Entretanto,
constata-se que o modelo confessional não responde ao contexto atual da
sociedade e da educação. O Ensino Religioso “integra um projeto mais
amplo de educação para a cidadania plena, então será lógico concluir que
sua sustentação não deve provir de argumentações religiosas, mas dos
próprios pressupostos educacionais”129.
128
O referido documento é o livro Descobrindo novos caminhos, Editora FTD, vol. 1. 2006. 129
SOARES, A. M. L., Religião & educação: da ciência da religião ao Ensino Religioso, p. 126.
69 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
2. As Ciências da Religião como fundamento teórico do Ensino Religioso
A proposta confessional, e também a interconfessional ou ecumê-
nica, do Ensino Religioso toma como fundamentação teórica a doutrina de
uma determinada Igreja130, e sua teologia, seus valores e sua moral se
constituem em conteúdo ministrado em sala de aula. Na realidade, tal
proposta não configura o Ensino Religioso e sim uma catequese ministrada
no âmbito escolar.
Para não recair na limitação de um ensino catequético, o Ensino
Religioso necessita buscar a sua base teórica e metodológica numa “tradi-
ção” científica, pois “o Ensino Religioso como tarefa epistemológica remete
sua fundamentação para o âmbito das ciências e de seu ensino”131 e não
para as confissões religiosas. Segundo Soares, a desvinculação da confes-
sionalidade é precondição para que o Ensino Religioso possa se servir das
Ciências da Religião como área de conhecimento132.
O Ensino Religioso ao se fundamentar teórica e metodologica-
mente nas Ciências da Religião, como afirma Soares, torna-se a transposi-
ção didática do conhecimento produzido por essa área para as aulas no en-
sino fundamental e também no médio133. Dessa mesma base epistemoló-
gica, que são as Ciências da Religião, também advém o objeto de estudo do
Ensino Religioso, que é o Fenômeno Religioso com toda a sua complexi-
dade134 e diversidade de abordagens.
130
A doutrina católica sempre marcou forte presença no Ensino Religioso, entretanto, não é o único modelo de ensino confessional, pois as escolas adventistas e judaicas também são confessionais e praticam o ensinamento de suas doutrinas em suas escolas. É claro que no panorama nacional do ensino público, em relação ao Ensino Religioso, a presença de outras religiões é bem pequena. 131
PASSOS, J. D., Ensino Religioso: Mediações epistemológicas e finalidades pedagógicas. In: SENA, L., Ensino Religioso e a formação docente, p. 24. 132
Cf. SOARES, A. M. L., Religião e educação, da Ciência da Religião ao Ensino Religioso, p. 119. 133
Ibid., p. 118. 134
Cf. TEIXEIRA, F., Ciências da Religião e “Ensino Do Religioso”. In: SENA, L., op. cit., p. 65.
70 A prática de Ensino Religioso não confessional
As Ciências da Religião também podem contribuir na possibili-
dade de comparar diferentes sistemas de referências135, bem como numa
“análise diacrônica e sincrônica do Fenômeno Religioso, a saber, o aprofun-
damento das questões de fundo da experiência e das expressões religiosas,
a exposição panorâmica das tradições religiosas e as suas correlações so-
cioculturais”136.
É importante lembrar que o modelo de Ensino Religioso sob a
perspectiva das Ciências da Religião não está isento de riscos, como apon-
tamos na esquematização de modelos propostos por Passos e apresentados
no capítulo I deste trabalho. Entretanto, como afirma Soares, “educar é
transmitir conhecimentos e valores, algo muito distante da atitude de quem
vive em cima do muro”137. Passos também afirma que:
Esse modelo [das Ciências da Religião] não afirma o ensino da religião como uma atividade científica neutra, mas com clara intencionalidade educativa postula a importância do conhecimento da religião para a vida ética e social dos edu-
candos138.
O pressuposto que o Ensino Religioso recebe das Ciências da
Religião, segundo Passos, é a educação do cidadão, pois o objetivo do es-
tudo das religiões dentro da escola não difere das demais disciplinas que
têm em vista a cidadania.
O conhecimento da religiosidade e da religião faz parte do processo educacional, assim como o conhecimento da Ma-temática, da História, da Política etc. A religião não é coisa tão somente das instituições confessionais, ela é um fato antropológico e social que permeia de maneira ativa todos os âmbitos da vida dos cidadãos que compõem o Estado plural e laico. Eis a razão fundamental de seu estudo nas
escolas139.
135
Cf. HASSELMANN, C., Das niedersächsische unterrichtsfach. Apud USARSK, F. Ciências da Religião: Uma disciplina referencial. In: SENA, L., op. cit., p. 58. 136
SOARES, A., Ciências da Religião, Ensino Religioso e formação docente. In: KRONBAUER, S.; SIMIONATO, M., Articulando saberes na formação de professores, p. 88. 137
Ibid., p. 97. 138
PASSOS, J. D., Ensino Religioso: Mediações epistemológicas e finalidades pedagógicas. In: SENA, L., Ensino Religioso e a formação docente, p. 32. 139
Ibid., p. 36.
71 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
Ao se pensar a formação básica do cidadão, não se pode subtrair
nenhuma de suas dimensões humanas, pois a educação atinge o indivíduo
em sua integralidade. E mesmo entre aquele que não professam nenhuma
religião, ou se declaram agnósticos ou ateus, se justifica excluir o estudo das
religiões, pois independentemente de o indivíduo reconhecê-la ou não, essa
dimensão está presente no ser humano. É interessante ressaltar que a
religião também é “um dado antropológico e sociocultural que tem força de
fundamentar as ações mais conservadoras ou transformadoras, mais perver-
sas ou benéficas”,140 como afirma Passos. Além de ser um elemento
presente em várias sociedades, a religião também produz um conhecimento
que, como tal, se torna patrimônio da humanidade, e que necessita estar
disponível a todos141. Passos também afirma que:
O estudo científico das religiões é tão laico quanto qualquer outro inscrito na esfera das ciências que são usadas nas escolas, o que não significa que todo ensino não traga em seus objetivos a formação de valores nos educandos. Toda ciência é ensinada com finalidades pedagógicas e tem, portanto, crenças embutidas em suas programações; e toda educação não é uma reprodução de princípios e métodos neutros, mas de valores a serem assimilados pelos educan-dos
142.
É importante ressaltar que o conhecimento religioso dentro da es-
cola tem a finalidade de ser conhecido e não afirmado como verdade de
fé,143 pois, do ponto de vista didático, o Ensino Religioso “não conta com a fé
como ponto de partida, nem mesmo ousa propor a fé como objetivo, pois a
fé explícita, assim como deve ser excluída, não pode ser programada”.144
Se o estudo da religião não parte da fé (como na Teologia), logo o
seu referencial teórico necessita ser mais amplo, “capaz de abarcar as diver-
sidades e, ao mesmo tempo, captar a singularidade que caracteriza”145 as
140
PASSOS, J., Ensino Religioso: Mediações epistemológicas e finalidades pedagógicas In: SENA, L. op. cit., p. 41. 141
FONAPER, Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Religioso, p. 35. 142
PASSOS, J., In: SENA, L. op. cit., p. 23. 143
PASSOS, J., Ensino Religioso construção de uma proposta, 2007. 144
GRUEN, W., O Ensino Religioso na escola, p. 37. 145
PASSOS, J., In: SENNA, L. op. cit., p. 32.
72 A prática de Ensino Religioso não confessional
religiões enquanto fenômeno a ser conhecido. Desse modo, o referencial
apropriado ao Ensino Religioso é o das Ciências da Religião.
3. Revisitando os 15 anos de publicação
Apresentamos a seguir a análise da revista Diálogo, a fim de
confirmar se a sua abordagem está ou não em sintonia com um modelo de
Ensino Religioso que traduza a perspectiva das Ciências da Religião. De
outubro de 1995 a agosto de 2010 foram publicadas 60 edições da revista,
sendo 41 edições sob a editoria de Luzia Sena, e 19 da editoria de Maria
Inês Carniato. Nessas edições, identificamos 274 artigos da primeira editoria
e 105 da segunda. É sobre estes 379 textos que faremos uma análise
panorâmica das abordagens da Diálogo, a fim de percebermos quem
escreve, como escreve e o que escreve nos artigos da revista.
Nossa análise se desenvolverá a partir da consideração de duas
categorias principais: articulista e artigos. Na primeira categoria buscaremos
identificar, nas edições mencionadas, o perfil dos articulistas. A partir das
informações contidas nos próprios artigos, evidenciaremos o grau de
formação, a área de conhecimento, a religião, e se o articulista é docente ou
não. Dado que nem sempre essas informações estavam contidas na própria
revista, buscamos coletá-las via e-mail e em site de busca.
Por meio desses dados pretendemos responder a duas questões:
Quem escreve? Qual a formação que compõe a sua base teórica? As res-
postas a essas perguntas nos indicarão o teor das abordagens que a revista
apresenta, bem como nos ajudarão a perceber na Diálogo a presença das
diferentes áreas de conhecimentos que subsidiam as Ciências da Religião e,
consequentemente o Ensino Religioso não confessional. Também será
possível perceber quais as áreas de conhecimento que mais aparecem nas
abordagens da revista Diálogo.
73 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
Em relação aos textos, examinamos somente os artigos que
visam à fundamentação teórica do tema de cada edição, uma vez que é
neles que se encontra o conteúdo de Ensino Religioso, enquanto que as
demais seções apresentam um caráter prático-pedagógico e informativo. Por
esse motivo, excluímos de nossa análise, com exceção da seção Sua
página, pois esta nos ajudará a fazer uma comparação entre a teoria contida
nos artigos e a prática dos leitores-professores, a fim de perceber se há ou
não contradição entre essas partes.
Visto que as abordagens são subjetivas, utilizaremos as seguintes
categorias: o sujeito que escreve; o grau de formação e a área; o enfoque da
abordagem, ou seja, se o tema é desenvolvido a partir de uma religião ou do
Fenômeno Religioso; a coerência do texto como eixo temático proposto pelo
PCNER. Essas categorias têm por objetivo nos ajudar a perceber qual o mo-
delo de Ensino Religioso presente na revista.
4. Identificação dos articulistas
Ao verificarmos os 379 artigos da Diálogo foram identificados 388
articulistas, pois 7 artigos foram assinados por 2 coautores e 1 artigo
assinado por 3 autores. Identificamos também que nos artigos com
coautores, os articulistas não compartilham do mesmo grau de formação
acadêmica, de modo que as referências são diferentes e, por esse motivo,
os articulistas foram contabilizados individualmente.
Alguns articulistas também se repetem em algumas edições, en-
tretanto eles foram contabilizados pelos artigos escritos e não de forma indi-
vidual, pois nos deparamos com situações em que o mesmo articulista assi-
nou os artigos com graus de formação diferentes, por exemplo, como mes-
tre, doutorando e doutor. Tal fato pode demonstrar ou não certa evolução no
74 A prática de Ensino Religioso não confessional
pensamento do articulista, entretanto, isso não foi observado em nossa aná-
lise, uma vez que essa constatação escapa ao nosso objetivo.
Em relação à coleta dos dados: grau acadêmico, área de conhe-
cimento, religião e atuação como docente, vamos apresentá-los
individualmente e depois faremos os cruzamentos entre os dados obtidos da
seguinte forma: Grau acadêmico X Áreas de conhecimento; Áreas de
conhecimento X Religião; Articulistas docentes e não docentes X Áreas de
conhecimento. Entre outras informações, estes cruzamentos nos permitiram
perceber se a revista atinge um dos objetivos para o qual ela nasceu, ou
seja, ser um veículo no qual os professores contribuam com o Ensino
Religioso.
4.1. Grau acadêmico e áreas de conhecimento
É interessante notar que no período da primeira editoria, que cor-
responde a dez anos, temos um número total de 41 revistas editadas, e nes-
tas identificamos 274 artigos e 277 articulistas. Já na segunda editoria, cujo
período é de cinco anos, foram editadas 19 revistas e encontramos nestas
um total de 105 artigos e 111 articulistas.
Para demonstrar em nossa pesquisa as diferenças entre as edito-
rias, sobretudo no que diz respeito à área de formação do articulista, busca-
remos evidenciar as informações que coletamos acerca deles, tanto por
editorias individualmente, quanto pela soma das mesmas. Desse modo, te-
mos os seguintes percentuais:
75 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
Gráfico 3: Artigos X Editorias
É interessante destacar que estes percentuais também nos ori-
entam em relação à análise das edições sorteadas, sendo quatro revistas da
primeira editoria e duas da segunda, de modo que a análise se torna propor-
cional às publicações de cada editora.
Em relação à autoria dos artigos, é possível identificar articulistas
com diferentes graus acadêmicos que variam entre graduandos e doutores.
Entre os 388 articulistas, identificamos 2 graduandos, 102 graduados, 11
mestrandos, 72 mestres, 27 doutorandos e 154 doutores e 20 não constava.
O grande número de doutores entre os articulistas revela certa tendência na
escolha de articulistas doutores. Com esses dados, obtemos os seguintes
percentuais:
72%
28%
Artigos publicados
Primeira editoria Segunda editoria
76 A prática de Ensino Religioso não confessional
Gráfico 4: Grau acadêmico dos articulistas
Ao separarmos estes números por editoria, temos os seguintes
dados:
Tabela 3: Grau de formação X Editoria
Editorias Grau de formação
Graduando Graduado Mestrando Mestre Doutorando Doutor Não consta Total
Primeira 1 77 8 50 19 107 15 277
Segunda 1 25 3 22 8 47 5 111
Total 2 102 11 72 27 154 20 388
Quando comparamos os números dos diferentes graus nas duas
editorias, percebemos que estes são bastante equilibrados e também fica
evidente a preferência por articulistas com o grau acadêmico de doutor. E,
se somarmos apenas o número dos pós-graduados, é possível perceber
outra tendência: a busca por articulistas especialistas no assunto que
desenvolvem para a revista.
Em relação às áreas de conhecimentos dos articulistas, a fim de
obtermos uma visualização melhor dos dados, optamos por agrupar as dife-
rentes nomenclaturas sob uma única categoria, por exemplo, Ciências Soci-
ais e Sociologia, Pedagogia e Educação, Jornalismo e Comunicação. Dessa
forma, obtivemos um total de 34 áreas de conhecimento com os seguintes
números de articulistas por área:
0%
26%
3%
19%
7%
40%
5%
Grau de formação
Graduando
Graduado
Mestrando
Mestre
Doutorando
Doutor
Não consta
77 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
Tabela 4: Área de conhecimento X Grau acadêmico
G
rau
Áre
a d
e C
on
he
cim
en
to
Adm
inis
tração
A
dm
inis
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Ciê
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Relig
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Cultura
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Desenvolv
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Educação
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H
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Serv
iço S
ocia
l S
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da
de E
Cultura
Socio
logia
Teo
logia
Não C
onsta
Graduando 1 1
Graduado 4 1 1 1 3 6 3 1 20 1 1 1 5 7 17 1 9 1 2 6 11
Mestrando 1 4 3 1 1 1
Mestre 1 21 2 1 1 11 1 1 1 2
1 1 8 20
Doutorando 11 2 4 1 2 1 1 2 3
Doutor 1 12 1 14 7 24 9 1 1 3 2 6 1 19 53
Não Consta 20
Totais 4 1 13 1 1 2 1 54 17 1 1 3 1 63 1 2 1 1 18 1 8 20 1 3 2 1 1 17 1 1 2 1 35 88 20
A tabela acima nos mostra que as principais áreas de conheci-
mentos de procedência dos articulistas são: Teologia, Educação, Ciências
da Religião, Sociologia, Letras, Filosofia, Comunicação, Psicologia e Antro-
pologia. Não obtivemos a informação acerca da área e do grau de formação
de todos os articulistas, desse modo a estes classificamos como “não
consta”. Embora mostremos na tabela acima o “não consta”, optamos por
deixá-lo de fora da análise dos percentuais, pois o que mais nos interessa é
constatar quais as áreas que mais contribuem com as abordagens da revista
Diálogo, de modo que esse total, embora não nos ajude a alcançar o nosso
objetivo, também não compromete o resultado do mesmo.
Nota-se que algumas dessas áreas também fazem parte do grupo
de disciplinas da grande área de conhecimento que são as Ciências da Reli-
gião. O número de teólogos entre os articulistas é o maior entre todas as
áreas, tal ocorrência também pode ter sua origem no fato de que até 1997,
quando a LDB n. 9.475/97 definiu as orientações do Ensino Religioso, no
Brasil não havia cursos específicos para esta disciplina, de modo que a
maioria dos pesquisadores que se interessavam por esse tema eram
teólogos.
Considerando o número total de articulistas das áreas: Teologia,
Educação, Ciências da Religião, Sociologia, Letras, Filosofia, Comunicação,
78 A prática de Ensino Religioso não confessional
Psicologia, Antropologia, e ao separarmos por editoria, iremos perceber que
estes números também estão equilibrados, como mostra o gráfico abaixo:
Gráfico 5: Principais áreas X Editoria
Evidentemente o número de articulistas teólogos é alto na pri-
meira editoria em relação à segunda, visto que o período da primeira é o
dobro do da segunda, podemos considerar que os números são
proporcionais. As demais áreas apresentam equilíbrio em relação ao tempo
de cada editoria e o número de artigos de cada uma das nove áreas que
mais se destacam.
4.2. Áreas de conhecimento e Religião
A respeito da religião dos 388 articulistas, identificamos a religião
de 233 por meio das informações contidas na revista e com pesquisa em site
de busca. Visto que o número dos que não foram identificados era bastante
alto, pois se somava um total de 155 articulistas, decidimos enviar um e-mail
a esses, a fim de obtermos tal informação. Os endereços de e-mail dos
10
41 36
13 13 16 12 21
68
3
21 19
4 5 4 5 15 20
Principais áreas
Primeira Editoria Segunda Eitoria
79 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
articulistas foram concedidos pela revista Diálogo. No e-mail, além da reli-
gião, solicitamos também o grau e a área de formação. Do número total de
e-mails enviados, 73 articulistas nos retornaram; desse modo identificamos
entre os articulistas 20 tradições religiosas.
Tabela 5: Religiões
Reli
giã
o
Afr
o
Anglic
ano
Assem
ble
ia d
e D
eus
Bahá’í
Bra
ma K
um
aris
Budis
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Cató
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Cató
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ano
Espiritualid
ade indíg
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Judeu
Lute
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ta
Muçulm
ano
Não c
onsta
Perf
ect Lib
ert
y
Pre
sbiteriano
Sem
relig
ião
Wic
ca
Xam
ã
11 2 1 6 3 8 211 1 1 9 2 4 15 10 5 82 1 7 6 1 2
Percebemos que há certa representatividade das tradições religi-
osas, embora se evidencie a predominância de católicos. Não é estranho
que a maioria dos articulistas se denomine como católico, uma vez que esta
tradição ainda representa uma grande porcentagem da população nacional.
É interessante ressaltar que, entre aqueles que se denominam católicos, há
os que não são praticantes, mas se denominaram católicos pelo fato de te-
rem sido batizados, como, por exemplo, os articulistas João da Silva, Fran-
cisco de Souza e José dos Santos146, que, por e-mail, declaram-se católicos,
porém participam de outra tradição religiosa ou não praticam a religião.
Ao compararmos os números de articulistas católicos com a soma
das outras tradições religiosas, mais o número dos articulistas cuja religião
não conseguimos identificar, obtivemos um percentual moderado conforme o
gráfico a seguir:
146
Os nomes são fictícios, segundo as normas de pesquisa, utilizamos os dados coletados sem expor os participantes. Entre os articulistas que responderam via e-mail, três casos foram bastante curiosos, pois os três se declararam católicos, porém um afirmou ter proximidade com religião afro-brasileira, outro afirmou praticar espiritualidade indígena e o outro declarou ter recebido os sacramentos do batismo, do crisma, do matrimônio, além de ter batizado todos os filhos na Igreja Católica, mas não é praticante do catolicismo.
80 A prática de Ensino Religioso não confessional
Gráfico 6: Tradições religiosas
Quando cruzamos os dados entre as áreas de conhecimento e a
religião dos articulistas, é possível perceber que há diversidade de áreas en-
tre os articulistas, evidenciando que não são apenas os teólogos que es-
crevem na revista Diálogo.
Tabela 6: Áreas de conhecimento X Religião
Relig
ião
Afr
o
Ang
lica
no
Assem
ble
ia d
e D
eus
Bah
á'í
Bra
ma K
um
aris
Bud
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Cató
lico
Cató
lico
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Cig
an
o
Espiritu
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ta -
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y
Pre
sbiteri
ano
Sem
re
ligiã
o
Wic
can
Xam
ã
To
tal
Administração
4
4
Administração escolar
1
1
Antropologia
1 4
1
6
1
13
Arquitetura
1
1
Artes
1
1
Ciência política
1
1
2
Ciência religiosa 1
1
Ciências da Religião
1
36
1
9 1 5 1
54
Comunicação
1 7
1
6
2
17
Cultura judaica
1
1
Desenvolvimento
1
1
Direito
2
1
3
Economia
1
1
Educação
2
28
4
2 7
19
1
63
Enfermagem
1
1
Engenharia
2
2
Ensino Religioso
1
1
Etnologia
1
1
Filosofia
13
5
18
Fonoaudiologia
1
1
História
4
1 3
8
Letras 1
12
2
2
2
1
20
Linguística
1
1
Matemática
3
3
211 54%
95 25%
82 21%
Tradições religiosas
Católicos
Outras tradições
não consta
81 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
Medicina
2
2
Missiologia
1
1
Música
1
1
Psicologia
1 4
11
1 17
Psiquiatria
1
1
Saúde pública
1
1
Serviço social
1
1
2
Sociedade e cultura
1
1
Sociologia 5
2
20
7
1
35
Teologia
71 1
13
2
1
88
Não consta 4
4 3
3 2
2
1
1 20
Total 11 2 1 6 3 8 211 1 1 9 2 4 15 10 5 82 1 7 6 1 2 390
As diferentes áreas de conhecimento enriquecem as abordagens
e confirmam que o Ensino Religioso à luz das Ciências da Religião está pre-
sente na revista. Do mesmo modo, as diferentes tradições religiosas também
confirmam que as abordagens da revista possibilitam aos articulistas das
diferentes religiões contribuírem com a reflexão acerca do Ensino Religioso.
Evidentemente que, na maioria dos artigos, o enfoque não é confessional,
entretanto, quando o tema diz respeito a uma determinada religião, a
Diálogo prioriza os articulistas pertencentes à religião em questão.
4.3. Articulistas docentes por área de conhecimento
O último dado que analisaremos em relação aos articulistas é se
estes são docentes ou não. Ao analisarmos a presença de articulistas do-
centes na revista Diálogo, que nasceu para ser um meio de comunicação
entre os professores de todo o Brasil, verificaremos se ela atinge tal
presença.
Entre os 388 articulistas, 238 são docentes e 150 não. O número
de docentes confirma que o conteúdo da revista Diálogo é produzido por
professores que visam à formação e a atuação dos professores de Ensino
Religioso.
82 A prática de Ensino Religioso não confessional
Gráfico 7: Docentes X Não docentes
Os articulistas docentes se distribuem em 21 áreas conforme a
tabela abaixo:
Tabela 7: Docentes X Áreas de conhecimento
Áre
a a
cad
êm
ica
do
s d
ocen
tes
Adm
inis
tração e
scola
r
Antr
opolo
gia
Ciê
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política
Ciê
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Com
unic
ação
Cultura
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a
Desenvolv
imento
Educação
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Mate
mática
Medic
ina
Psic
olo
gia
Saúde p
úblic
a
Socie
dade e
cultura
Socio
logia
Teolo
gia
Áre
a n
ão identificada
N° 1 12 2 36 11 1 1 49 1 1 10 2 6 1 3 1 10 1 1 26 59 3
A tabela 7 confirma os dados apresentados na tabela 4, que nos
mostrou o grau e a área de conhecimento dos articulistas. As áreas que
mais contribuíram com a revista Diálogo são também aquelas das quais os
docentes procedem. Optamos por classificar os articulistas em “sim” e “não
consta”, pois, apesar de não termos conseguido essa informação, não
podemos afirmar categoricamente que eles não são professores.
61%
39%
Docentes
Sim
Não Consta
83 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
5. Análise de textos selecionados
Neste item da pesquisa, analisaremos alguns exemplares da re-
vista Diálogo, e, conforme a metodologia proposta, a escolha das revistas se
realizou mediante sorteio. O período da Diálogo que iremos analisar com-
preende os anos de 1995 a 2010. A fim de obtermos uma análise propor-
cional ao tempo de cada editoria, estipulamos que nos intervalos de cada
cinco anos, duas revistas foram sorteadas. Entre os anos de 1995 e 2000 as
edições sorteadas foram: n. 6 – A violência e as religiões, contribuições para
a paz; e n. 18 – Ritos e celebrações no contexto da vida. No período de
2001 a 2005, as edições sorteadas foram: n. 24 – Nossas raízes indígenas;
e n. 31 – Pluralismo e diversidade humana, somos todos iguais, porém
diferentes. E de 2006 a 2010 as edições sorteadas foram: n. 49 – História e
cultura Afro-Brasileira na escola; e n. 58 – O sagrado na pessoa e na
sociedade.
Analisaremos as revistas separadamente conforme as categorias
propostas, ou seja, buscaremos evidenciar quem escreve (grau e área de
formação); o enfoque da abordagem, isto é, o modo como o tema é desen-
volvido, seja a partir de uma religião, seja na perspectiva do Fenômeno
Religioso; por fim verificaremos em qual dos cinco eixos temáticos propostos
pelos PCNER o artigo se classifica.
Nas edições 6, 18 e 24 da revista Diálogo, ainda não há uma
seção específica para relato de experiências desenvolvidas com Ensino
Religioso, pois o projeto gráfico não apresenta a divisão entre artigos e
seções. Somente no segundo projeto gráfico é que encontraremos a seção
Sua página, de modo que tal confronto constará apenas nas edições 31, 49
e 58.
84 A prática de Ensino Religioso não confessional
5.1. Edição n. 6: A violência e as religiões, contribuições para a paz
O tema da revista: A violência e as religiões, contribuições para a
paz se propõe a “contribuir na busca de bases comuns para o diálogo inter-
religioso”147, como se afirmou no editorial da edição n. 6. Essa edição é do
primeiro projeto gráfico, de modo que os textos são ilustrações com
desenhos. Estes buscam destacar alguns elementos que mais são
enfatizados no artigo. O tema geral é desdobrado em sete artigos, e a
edição também traz mensagem, uma entrevista e notícias acerca do Ensino
Religioso.
O primeiro artigo148, A Torá promove a justiça e a paz, traz como
articulista o rabino Henry Sobel, graduado em letras. Abordagem: Religiosa.
O articulista, ao desenvolver o texto, se inclui neste, isto é, ele fala como um
fiel ao usar a primeira pessoa do plural. Ao refletir acerca da violência, o
autor afirma que “muitos conflitos no mundo de hoje são consequência da
intolerância de um grupo em relação a outro”149. O texto expressa a forma
como o judaísmo interpreta a realidade de violência presente na sociedade,
pois seu autor é um líder religioso que tem autoridade de falar em nome de
sua tradição. Eixo temático: Ethos, pois apresenta a forma como o
judaísmo lida com a violência.
O segundo artigo150, As raízes não sacrificiais da mensagem
cristã, é desenvolvido pelo docente e doutor em teologia Ênio José da Costa
Brito. Abordagem: Religiosa. O texto busca estabelecer as relações entre
violência e religiosidade, a partir do cristianismo, e se propõe a “resgatar o
núcleo histórico das cristologias bíblicas neotestamentárias, isto é, resgatar
delas a marca sacrificial tão presente na teoria e prática cristã”151. O articu-
147
DIÁLOGO – REVISTA DE ENSINO RELIGIOSO, n. 6, p. 1. 148
SOBEL, H. I., A Torá promove a justiça e a paz. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 6, p. 5-8. 149
Ibid., p. 7. 150
BRITO, Ê. J. C., As raízes não sacrificiais da mensagem cristã. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 10-15. 151
Ibid., p. 11.
85 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
lista evidencia elementos que o cristianismo assumiu a partir das atitudes de
Jesus, como, por exemplo, “a construção de uma sociedade mais justa que
inclua a todos. Uma sociedade que possa começar a reunir todos à mesa e
celebrar o ano da graça”152. Eixo temático: Teologias, pois a reflexão apre-
senta vários elementos constituintes do cristianismo.
O terceiro artigo153, A violência e a paz: os ensinamentos de
Buddha, é desenvolvido pelo doutor em etnologia Arthur Shaker Fauzi Eid.
Abordagem: Religiosa. Inicialmente o articulista contextualiza a origem de
Buddha, para em seguida falar da existência da violência “que abala todos
os seres, pois todos os seres prezam a vida e buscam a felicidade”154. O ar-
tigo evidencia a visão budista acerca da elevação espiritual do ser humano,
e o faz a partir das Quatro Nobres Verdades que compõem o budismo. Eixo
temático: Teologias, por expor elementos fundamentais da tradição budista.
O quarto artigo155, Tudo é espelho, e a vida do homem é sua
autoexpressão, tem como articulista o mestre em Ciências da Religião Yumi
Fujikura. Abordagem: Religiosa. O autor apresenta alguns “preceitos” que a
Perfect Liberty propõe aos seus seguidores e que visa a ajudar não só a
seus membros, mas à sociedade de modo geral, a enfrentar a questão da
violência. No texto se afirma que, “procurando o caminho da paz e do amor
entre as pessoas, o respeito à dignidade humana e a caridade fraterna
haverá necessariamente a diminuição da violência e o aumento do respeito
entre as pessoas”156. Eixo temático: Culturas e Tradições Religiosas, por
evidenciar as orientações religiosas e éticas da tradição Perfect Liberty.
O quinto artigo157, A tradição de Òrìsà: nossa visão de um
mundo mais alegre, é escrito pela sacerdotisa do Ilê Leuiwyato Sandra Me-
152
Ibid., p. 15. 153
FAUZI EID, A. S., A violência e a paz: Os ensinamentos de Buddha. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 18-23. 154
Ibid., p. 23. 155
FUJIKURA, Y., Tudo é espelho, e a vida do homem é sua autoexpressão. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 6, p. 24-28. 156
Ibid., p. 27. 157
EPEGA, S. M., A tradição de Òrìsà: Nossa visão de um mundo mais alegre. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 30-34.
86 A prática de Ensino Religioso não confessional
deiros Epega, da qual não identificamos a área e grau de formação.
Abordagem: Religiosa. O artigo apresenta os orixás como aqueles que re-
gem toda a existência, bem como a vida e a morte. Entretanto, nenhum orixá
é responsável pela violência causada pelo ser humano, de modo que cabe a
este ensinar aos seus descendentes a vivência dos valores e da religião, e
isto se faz por meio da prática dos mesmos, pois “é mais fácil uma criança
compartilhar que obedecer”158. Eixo temático: Culturas e Tradições
Religiosas, por enfatizar elementos de matriz afro-brasileira.
O sexto artigo159, Quando a violência esfria, a terra se alegra, é
de autoria do mestre em teologia e pastor luterano Roberto Zwetsch.
Abordagem: Religiosa. O texto trata da espiritualidade indígena e do modo
como esta lida com a violência. O autor tem como ponto de referência uma
experiência vivida entre os indígenas Kulina, e a pesquisa de outros estudio-
sos. Segundo o articulista, os indígenas compreendem que “o mal não é
uma simples atitude moral negativa, mas uma condição que precisa ser abo-
lida/vencida”160. Embora o articulista não seja de tradição indígena, o artigo
apresenta com clareza os princípios que regem a vida desses povos, seus
costumes e a relação com o sagrado. Eixo temático: Culturas e Tradições
Religiosas, por sua análise acerca da espiritualidade e cultura indígena.
O sétimo artigo161, A televisão, a nova religião do mundo mo-
derno, tem como articulista o doutor em comunicação Ismar de Oliveira Soa-
res. Abordagem: Fenomenológica. O texto faz uma análise de como a tele-
visão apresenta os elementos religiosos e culturais da sociedade brasileira.
A cultura de massa funciona “como um rito coletivo”, no qual a “religião não
somente está presente nos meios de comunicação, mas que acaba por se
transformar em espaço de seu exercício, sempre, nos mesmos horários,
abertos ao permanente novo”162. Eixo temático: Ethos, pelo fato de apontar
158
Ibid., p. 34. 159
ZWETSCH, R. E., Quando a violência esfria, a terra se alegra. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 36-43. 160
Ibid., p. 41. 161
SOARES, I. O., A televisão, a nova religião do mundo moderno. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 6, p. 44-51. 162
Ibid., p. 51.
87 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
para a necessidade de uma visão crítica diante do conteúdo que é
apresentado pelas TVs.
Os sete artigos da edição n. 6 foram classificados conforme os ei-
xos temáticos: dois em Ethos; dois em Teologias; e três em Culturas e Tra-
dições Religiosas. Acerca dos temas desenvolvidos, os seis artigos foram
apresentados na perspectiva de uma tradição religiosa específica, e apenas
um foi desenvolvido a partir do Fenômeno Religioso. É interessante ressaltar
que alguns articulistas que escrevem a respeito das tradições religiosas não
são apenas estudiosos, mas podem ser considerados “fiéis”, pois algumas
vezes se incluem no texto ou se identificam como tal nos créditos do artigo.
Grosso modo, os enfoques correspondem ao que é proposto no título do
artigo e são consonantes com o tema da edição.
5.2. Edição n. 18: Ritos e celebrações no contexto da vida
A edição n. 18 da revista Diálogo apresenta como tema geral
Ritos e celebrações no contexto da vida. Identificamos nessa revista sete
artigos, os quais praticamente compõem todo o conteúdo da edição.
Semelhante à edição anterior, nessa revista também os artigos são
ilustrados com desenhos e põem em destaque alguns aspectos do texto. A
revista traz uma sugestão de celebração inter-religiosa, cuja motivação é o
jubileu do ano 2000, além da indicação de leitura, de notícia acerca do
Ensino Religioso e da mensagem final da assembleia inter-religiosa reali-
zada no Vaticano.
O primeiro artigo163, A religião e o rito, tem como autor o doutor
em teologia Francisco Catão. Abordagem: Fenomenológica. O texto sob
uma perspectiva antropológica analisa a presença e a importância do rito na
163
CATÃO, F., A religião e o rito. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, ano V, maio, n. 18, p. 5-11.
88 A prática de Ensino Religioso não confessional
vida do ser humano. E, embora faça algumas referências a ritos cristãos, o
articulista não se detém a nenhum rito especificamente. Para o autor, “o rito
é sempre expressão consentida e reconhecida de valores que presidem
atitudes e comportamentos”164 sejam eles de natureza religiosa ou não. O
articulista também estabelece a distinção entre rubricismo, farisaísmo e
magia, a fim de que se tenha atenção para não limitar o rito a nenhuma
dessas práticas. Eixo temático: Culturas e Tradições Religiosas, pois a
abordagem se concentra no significado cristão, apesar de não detalhar
nenhum rito.
O segundo artigo165, Religião: uma expressão do corpo, quem o
escreve é o doutor em educação Nabor Nunes Filho. Abordagem: Fenome-
nológica. O articulista aborda a questão da sensibilidade, que “é o caminho
por onde transitam os signos que nos facultam a sensação de participação
na nossa própria vida, na vida de outrem e na do próprio cosmo”166. Eixo
temático: Ethos, pois a análise não se refere a nenhuma tradição religiosa,
mas reflete sobre a sensibilidade através do corpo, sem o qual não seria
possível nenhuma expressão da subjetividade humana.
O terceiro artigo167, O encontro festivo: uma afirmação da vida,
traz como articulista o doutor em educação Juan Droguett. Abordagem:
Fenomenológica. O texto evidencia a experiência que o ser humano faz nos
diferentes encontros que acontecem no decorrer de sua vida. E a linguagem
é um dos principais elementos que possibilitam esse encontro, pois ela
“deve ser sugestiva e conservar o mistério do transcendente, mas deve estar
formulada com o rigor próprio das realidades”168. Eixo temático: Ethos, por
evidenciar que qualquer encontro remete para uma situação de abertura ao
outro.
164
Ibid, p. 7. 165
NUNES FILHO, N. Religião: Uma expressão do corpo. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 12-18. 166
Ibid., p. 14. 167
DROGUETT, J., O encontro festivo: Uma afirmação da vida. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, ano V, n. 18, p. 20-23. 168
Ibid., p. 23.
89 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
O quarto artigo169, A sala de aula como espaço de celebração,
tem como articulista a doutora em educação Rosa Gitana Krob Meneghetti.
Abordagem: Fenomenológica. A autora reflete acerca da relação entre o
professor e o aluno em sala de aula. Relação esta que não deve se basear
no medo, mas “numa reinvenção constante das formas ritualísticas com que
são celebradas as relações entre os sujeitos”170. Eixo temático: Ethos, pois
aponta para uma nova relação a ser estabelecida em sala de aula.
O quinto artigo171, Rito: uma linguagem humana, é de autoria da
graduada em letras Therezinha Motta Lima da Cruz. Abordagem: Fenome-
nológica. A articulista reflete acerca dos diferentes ritos, religiosos ou não,
“que nascem de necessidades humanas e expressam essas necessida-
des”172. Segundo a articulista, temos uma ritualidade que vai sendo constru-
ída ao longo da vida, e tais ritos devem ser vividos pelos significados que
têm, e não por mera repetição ou tradição. Eixo temático: Ethos, pois o
texto não trata de nenhuma tradição em particular, mas evidencia a impor-
tância dos ritos na prática religiosa.
O sexto artigo173, A ritualística das religiões afrodescendentes,
traz novamente a sacerdotisa do Ilê Leuiwyato Sandra Medeiros Epega, que
escrevera na edição n. 6. Abordagem: Religiosa. Semelhante ao artigo da
edição anterior, nesse texto a articulista apresenta três rituais que marcam a
vida do fiel de tradição afro-brasileira em seu nascimento, casamento e
morte. Para cada um desses momentos, há um “ebo”, ou oferenda a qual
“cria também um campo mágico de energia, onde pedidos podem ser feitos
e obtidos [...] baseado em amor, respeito e merecimento”174 e não apenas
em barganha com os Orixás. Eixo temático: Teologias, pois o artigo busca
esclarecer a importância dos três rituais para as religiões afro-brasileiras.
169
MENEGHETTI, R. G. K., A sala de aula como espaço de celebração. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 24-28. 170
Ibid., p. 26. 171
CRUZ, T. M. L., Rito: Uma linguagem humana. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, ano V, op. cit., p. 31-38. 172
Ibid., p. 32. 173
EPEGA, S. M., A ritualística das religiões afrodescendentes. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 18, p. 39-44. 174
Ibid., p. 40.
90 A prática de Ensino Religioso não confessional
Ao contrário da edição n. 6 analisada no item anterior, a qual
apresentou a maioria dos textos sob o enfoque de uma determinada religião,
a edição n. 18 apresentou, entre os artigos, cinco que tratam da temática
proposta a partir do Fenômeno Religioso, e apenas um em perspectiva da
religião. Nesta edição também identificamos os seguintes artigos por eixos
temáticos: um em Culturas e Tradições Religiosas, quatro em Ethos, e um
em Teologias.
5.3. Edição n. 24: Nossas raízes indígenas
Com o tema Nossas raízes indígenas na edição n. 24, identifica-
mos e analisamos sete artigos que refletem a questão dos povos indígenas
e suas tradições. Além dos artigos, ilustrados com desenhos, a revista
também apresenta pequenos textos que podem ser trabalhados
interdisciplinarmente, como por exemplo a história do Brasil recontada em
rimas175 e a etimologia de alguns nomes de origem indígena176. E também
traz indicações de leituras e notícias pertinentes ao Ensino Religioso.
O primeiro artigo177, Direito à diferença, tem como articulista o
doutorando em Ciências da Religião Antonio Boeing. Abordagem: Fenome-
nológica. O texto apresenta uma perspectiva histórica a respeito dos povos
indígenas que habitavam o Brasil antes da colonização. Esses povos nem
sempre foram respeitados em sua cultura e modo de viver, pois “deveriam
entrar na lógica civilizatória, por ‘bem’ ou à força”178. O articulista aponta que
a violência praticada contra os povos indígenas é resultado de um conceito
de civilização/evangelização que combate o diferente e o extermina. Eixo
175
Consta nos créditos da revista que esse texto foi extraído de MAIA, Germano. Um povo sem rosto. São Paulo: Edições Paulinas, 1983. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, ano VI, outubro, n
o 24, p. 22-25.
176 Esse texto também é uma reprodução, cuja referência a revista Diálogo apenas indica
Jornal Porantim/Cimi. 177
BOEING, A., Direito à diferença. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 07-12. 178
Ibid., p. 9.
91 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
temático: Ethos, por sua perspectiva que aponta para a constatação do
massacre histórico contra os povos indígenas.
O segundo artigo179, O desafiante encontro com o outro, traz no-
vamente como articulista a graduada em letras Therezinha Motta Lima da
Cruz, que escreveu na edição n. 18. Abordagem: Fenomenológica. Um dos
principais elementos que o texto ressalta é a contribuição da Campanha da
Fraternidade (CF) 2002 para a reflexão acerca da importância dos povos
indígenas. A autora apenas cita esse evento, não o desenvolve em seu
artigo. O texto evidencia as “variadas contribuições indígenas que fazem
parte da nossa cultura”180. Eixo temático: Culturas e Tradições Religiosas,
pois o texto trata de questões religiosas e culturais.
O terceiro artigo181, O canto dos Guarani, é desenvolvido pelo
graduado em história Maurício Fonseca. Abordagem: Fenomenológica. O
artigo trata especificamente dos povos Guarani e seus esforços para preser-
var a sua cultura e suas tradições através do canto “que ocupa um papel
fundamental em sua relação com os deuses que criam e regem a vida hu-
mana e a de todos os seres vivos”182. Eixo temático: Culturas e Tradições
Religiosas, pois o texto evidencia elementos do ritual Guarani Xondaro, tais
como os instrumentos que acompanham esse ritual.
O quarto artigo183, Guarani, um povo místico, tem como
articulista o mestre em comunicação Benedito Prezia. Abordagem:
Religiosa. Este artigo também trata dos Guarani e difere do anterior no
enfoque de sua abordagem, que apresenta alguns mitos, crenças e festas
desse povo. Segundo o autor, os Guarani são os místicos da floresta, pois
não “se começa nenhuma atividade sem rezar, isto é, sem pedir a proteção
179
CRUZ, T. M. L., O desafiante encontro com o outro. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 24, p. 15-20. 180
Ibid., p. 18. 181
FONSECA, M., O canto dos Guarani. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 24, p. 26-31. 182
Ibid., p. 28. 183
PREZIA, B., Guarani, um povo místico. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit, p. 32-35.
92 A prática de Ensino Religioso não confessional
de Deus para aquela atividade”184. Eixo temático: Teologias, por apresentar
os elementos essenciais da espiritualidade dos povos Guarani.
O quinto artigo185, Xamã, sacerdote e curador, traz como articu-
lista o xamã Sthan Xannia, cuja formação se desenvolveu não em faculdade,
mas na convivência com índios de várias aldeias do Brasil e dos Estados
Unidos. Abordagem: Fenomenológica. O artigo propõe a reflexão acerca
das práticas do xamã, que “é geralmente visto como alguém que pode curar
as doenças e dirigir as cerimônias e rituais da comunidade”186. O artigo se
concentra na pessoa do xamã e discute de modo tênue o xamanismo. Eixo
temático: Culturas e Tradições Religiosas, por dissertar acerca de algumas
características do xamã e do xamanismo.
O sexto artigo187, Nossas raízes indígenas, traz novamente o
mestre em comunicação Benedito Prezia, que escreveu o artigo quatro desta
edição. Abordagem: Fenomenológica. Este texto complementa as
informações apresentadas pelo articulista em seu artigo anterior. O texto
evidencia “a influência dos povos indígenas em quatro níveis: na cultura
diária, no artístico-cultural, no linguístico e na religiosidade brasileira”188.
Eixo temático: Culturas e Tradições Religiosas, por destacar as influências
da matriz indígena na cultura brasileira.
O sétimo artigo189, Povos indígenas – Uma visão pedagógica,
traz como autora a mestre em educação Viviane Cristina Cândido. Aborda-
gem: Fenomenológica. A articulista inicia o texto relembrando um fato ocor-
rido em 1997, na cidade de Brasília (DF), quando cinco jovens de classe
média alta atearam fogo no índio Pataxó, Galdino Jesus dos Santos. No
texto se propõe a necessidade de uma prática pedagógica que retrate a
184
Ibid., p. 33. 185
XANNIA, S., Xamã, sacerdote e curador. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit, p. 36-38. 186
Ibid., p. 38. 187
PREZIA, B., Nossas raízes indígenas. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 24, p. 39-42. 188
Ibid., p. 39. 189
CÂNDIDO, V. C., Povos indígenas – Uma visão pedagógica. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 44-48.
93 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
verdadeira imagem dos índios em detrimento à visão estereotipada que, em
geral, habita o imaginário popular das pessoas. Segundo a autora, “falamos
de povos indígenas como conteúdo e não conseguimos estabelecer
vínculos, não ajudamos nossos alunos a olhar para o diferente com uma
atitude de reverência”190. Eixo temático: Ethos, por destacar a necessidade
de uma nova visão em relação aos indígenas.
Nos sete artigos da edição n. 24, podemos perceber que as
abordagens mesclam elementos históricos e culturais da matriz indígena
presente na cultura brasileira. Há uma preocupação de fundo que é o
resgate e a valorização de nossa matriz nativa. Entre os articulistas,
identificamos um de origem indígena, fato que dá visibilidade aos povos
indígenas através de alguém que os represente por também ser nativo.
No que diz respeito aos eixos temáticos, classificamos dois
artigos no eixo Ethos; quatro em Culturas e Tradições Religiosas; e um em
Teologias. É interessante destacar que, embora um ou outro texto mencione
algum rito ou mito indígenas, estes aparecem de forma muito tênue nas
abordagens, o que poderia ser mais explicitado pelos articulistas, pois só
refletir acerca da história acaba deixando de explorar a riqueza cultural e
religiosa dos povos indígenas.
5.4. Edição n. 31: Pluralismo e diversidade humana
A diagramação da edição n. 31 faz parte do segundo projeto grá-
fico da revista Diálogo, cuja mudança ocorreu em 2001. Nesta nova apre-
sentação, os artigos e as seções estão divididos em dois blocos bem
definidos. A diagramação está mais arejada e colorida, e o conteúdo todo
não está mais só nos textos, pois as imagens os complementam. Com o
tema Pluralismo e diversidade humana, somos todos iguais, porém
190
Ibid., p. 46.
94 A prática de Ensino Religioso não confessional
diferentes, a revista se compõe de seis artigos, sendo que entre estes há o
relato de uma atividade que a articulista realizou e que, através do artigo,
socializa o seu trabalho. Embora a atividade seja coerente com a temática
da revista, seguiremos o critério de analisar somente a abordagem dos
artigos.
O primeiro artigo191, A diversidade humana: uma fonte de ri-
queza ou uma ameaça?, traz como articulista a doutora em antropologia
Josildeth Gomes Consorte. Abordagem: Fenomenológica. A autora afirma
que a diversidade é um fenômeno universal, entretanto, conviver com o dife-
rente nem sempre é fácil, pois a diversidade “é geralmente percebida como
grave ameaça externa, fonte permanente de desconfiança, empecilho para a
realização dos nossos projetos”192. No caso da cultura brasileira, a diversi-
dade é motivo de luta e ao mesmo tempo de orgulho nacional, e tal dialética
evidencia que uma nova mentalidade em relação ao diferente cresce em
nosso país. Eixo temático: Ethos, devido à perspectiva antropológica do
texto.
O segundo artigo193, Pluralismo: Identidade e alteridade, tem
como articulista o doutorando em Ciências da Religião Waldemar Magaldi
Filho. Abordagem: Fenomenológica. O autor, que também é psicólogo,
apresenta uma reflexão na ótica da psicologia e afirma que o ser humano
“criou um mundo cheio de limites e de regras, mas acabou se tornando
vítima dos próprios limites”194. Eixo temático: Ethos, pois segundo o autor,
vivemos numa constante inter-relação de modo que só podemos saber
quem somos mediante o encontro com o diferente de nós.
O terceiro artigo195, Pluralismo religioso de princípio, tem como
articulista o doutor em teologia Faustino Teixeira. Abordagem: Fenomeno-
191
CONSORTE, J. G., A diversidade humana: Uma fonte de riqueza ou uma ameaça? In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 31, p. 8-11. 192
Ibid., p. 9. 193
MAGALDI FILHO, W., Pluralismo: Identidade e alteridade. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, ano VIII, outubro, n
o 31, p. 12-17.
194 Ibid., p. 10.
195 TEIXEIRA, F., Pluralismo religioso de princípio. In: Diálogo – Revista de Ensino
Religioso, ano VIII, op. cit., p. 18-22.
95 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
lógica. O artigo tem como enfoque principal o diálogo inter-religioso e afirma
que é preciso “reconhecer que a verdade não é uma posse garantida, mas
fruto de uma experiência de caminhada comum”196, de modo que nenhuma
religião é detentora da verdade. O autor considera em sua reflexão eventos
como o Concílio Vaticano II e a Declaração Dominus Iesus, da Igreja Cató-
lica, que podem ser compreendidos como posições distintas dentro da pró-
pria Igreja acerca do pluralismo. Eixo temático: Culturas e Tradições Religi-
osas, pois reflete sobre o tema do pluralismo como um movimento que
atinge as diferentes religiões.
O quarto artigo197, A beleza de sermos diferentes, traz nova-
mente a doutora em educação Rosa Gitana Krob Meneghetti, que escreveu
na edição n. 18. Abordagem: Fenomenológica. O enfoque da abordagem é
o aspecto cultural, pois segundo a autora “é na cultura, como lócus do viver
das sociedades humanas, que as diferenças em todos os campos se evi-
denciam”198. Eixo temático: Ethos, pois enfatiza a necessidade de uma pro-
posta educacional que oriente o educando para o convívio com o pluralismo
em seus diferentes contextos.
O quinto artigo199, Superar temores e construir sonhos, tem
como articulista a mestre em teologia Maria Inês Carniato. Abordagem:
Fenomenológica. O texto aponta que o Ensino Religioso é um meio de supe-
rar preconceitos, pois durante a aula a “sala torna-se espaço e tempo de
democracia religiosa garantida, na qual ninguém deve se sentir objeto de
exclusão, desprezo, preconceito, temor ou indiferença”200. A autora propõe
os cinco eixos temáticos do PCNER como um caminho de superação do
preconceito com o diferente. Eixo temático: Ethos, pois o artigo aponta para
mudanças de atitude e mentalidade.
196
Ibid., p. 19. 197
MENEGHETTI, R. G. K., A beleza de sermos diferentes. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 24-27. 198
Ibid., p. 26. 199
CARNIATO, M. I., Superar temores e construir sonhos. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 31, p. 28-31. 200
Ibid., p. 29.
96 A prática de Ensino Religioso não confessional
Os artigos da edição n. 31 abordaram o tema do pluralismo na
perspectiva do Fenômeno Religioso. Constata-se uma preocupação em
conscientizar os educandos para a importância do respeito às diferenças
culturais e religiosas. O enfoque voltado para a alteridade também se
evidencia em relação aos eixos temáticos, pois os artigos se classificam da
seguinte forma: quatro em Ethos; e um em Culturas e Tradições Religiosas.
É interessante ressaltar que a diagramação do segundo projeto
gráfico também nos permite visualizar melhor as seções pedagógicas. Con-
tudo, não temos a possibilidade de avaliar com maior profundidade o conte-
údo das seções, uma vez que tal análise ultrapassa o nosso objetivo. Desse
modo optamos por averiguar o enfoque da seção Sua página, cujo objetivo é
compartilhar experiências realizadas pelos leitores-professores. O confronto
entre os artigos e a seção Sua página permite-nos perceber se há coerência
entre o que a revista propõe como discussão e o que ela publica como expe-
riências dos leitores-professores.
Na seção Sua página da edição n. 31, cujo título é Comunidade
escolar e Ensino Religioso, constatamos que ela apresenta uma reflexão
acerca do Ensino Religioso no ambiente escolar e aponta algumas orienta-
ções que justificam a presença dessa disciplina no currículo. De um modo
geral, a relação entre os artigos e a seção Sua página se mostra coerente
com a proposta do tema da edição, bem como com as orientações da LDB
n. 9.475/97.
5.5. Edição n. 49: História e cultura Afro-Brasileira na escola
Com o tema de capa História e cultura Afro-Brasileira na escola, a
edição n. 49 apresenta sete artigos que desdobram o tema-geral em dife-
rentes perspectivas. Com as mesmas características de diagramação da
edição n. 31, a presente edição, sob a editoria de Maria Inês Carniato, dá
97 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
continuidade à linha editorial de Ensino Religioso proposta nos inícios da
revista, porém, com uma preocupação mais pedagógica, pois, conforme se
afirma no editorial dessa edição, a escola é um espaço que tem o dever de
promover a igualdade entre todos.
O primeiro artigo201, Valores culturais afrodescendentes na es-
cola, traz como articulista o doutor em comunicação Edimilson de Almeida
Pereira. Abordagem: Fenomenológica. O texto propõe que, no processo de
aprendizagem, o fato de se evidenciar a troca de valores culturais leva à
noção de identidade e alteridade. Segundo o autor, “o estudo da história e
das culturas africanas e afro-brasileiras na escola favorece o conhecimento
de nossa diversidade social”,202 ao mesmo tempo em que evidencia os
conflitos subjacentes ao modelo educacional vigente no Brasil. Eixo
temático: Ethos, pois o articulista reflete na perspectiva da educação e
aponta a importância que esta desempenha na valorização da matriz afro-
brasileira.
O segundo artigo203, O legado africano às culturas brasileiras,
tem como articulista a doutora em sociologia Marise de Santana. Aborda-
gem: Fenomenológica. A autora faz uma análise histórico-cultural acerca
das ideias etnocêntricas europeias trazidas para o Brasil e que também aqui
subjugou as demais culturas como sendo inferiores. No caso a cultura afro-
brasileira, além de inferiorizada, passou por um longo processo de negação.
E, segundo a autora, algumas práticas pedagógicas ainda hoje “desapro-
priam os descendentes de africanos de sua identidade e submetem a sua
cultura a um processo de folclorização”204. Eixo temático: Culturas e Tradi-
ções Religiosas, por seu caráter histórico e antropológico.
201
PEREIRA, E. A., Valores culturais afrodescendentes na escola. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 49, p. 8-11. 202
Ibid., p. 10. 203
SANTANA, M. O legado africano às culturas brasileiras. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, ano XIII, op. cit., p. 12-16. 204
Ibid., p. 13.
98 A prática de Ensino Religioso não confessional
O terceiro artigo205, Sonhos e lutas das comunidades quilombo-
las, traz como articulista a doutoranda em letras e pesquisadora de comuni-
dades quilombolas no Maranhão, Joseane Maia Santos Silva. Abordagem:
Fenomenológica. A autora evidencia que os quilombos representavam o
movimento de resistência para além da questão escravista. “O quilombo não
foi apenas refúgio de fugitivos, mas uma sociedade livre, formada por pes-
soas que se recusavam a viver na escravidão”206, afirma-se no texto. Eixo
temático: Ethos, pois evidencia o dever da escola em educar para a igual-
dade racial, além de promover o respeito à cultura afro-brasileira.
O quarto artigo207, Potencial transformador da cultura afro-brasi-
leira, na escola, é desenvolvido pela doutora em antropologia Rosalira
Oliveira. Abordagem: Fenomenológica. O texto apresenta uma análise do
conceito de cultura, que, segundo a autora, “é uma teia compartilhada de
significados transmitidos em uma sociedade e incorporados em símbolos”208,
cujo conteúdo simbólico pode apresentar significados positivos ou negativos.
No caso da cultura africana presente na sociedade brasileira, esta foi
sempre excluída. Eixo temático: Ethos, pois aponta para a necessidade de
a escola orientar os educandos na percepção das culturas que compõem a
riqueza cultural brasileira.
O quinto artigo209, A vida em imagens na festa baiana, tem como
articulista o doutor em sociologia Edson Dias Ferreira. Abordagem: Feno-
menológica. O texto apresenta um estudo, a partir de fotos, acerca do ciclo
de festas que se realizam na Bahia entre os meses de dezembro e fevereiro.
Segundo o autor, as imagens por ele coletadas, “longe de refletirem uma
descrição pura e simples do fato festivo, traduzem um olhar diferente sobre
elas”210, pois revelam que por trás dos gestos se encontra mais do que uma
205
SILVA, J. M. S., Sonhos e lutas das comunidades quilombolas. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 49, p. 18-21. 206
Ibid., p. 19. 207
OLIVEIRA, R., Potencial transformador da cultura afro-brasileira na escola. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 22-25. 208
Ibid., p. 22. 209
FERREIRA, E. D., A vida em imagens na festa baiana. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 26-28. 210
Ibid., p. 28.
99 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
simples devoção. Eixo temático: Culturas e Tradições Religiosas, pois evi-
dencia no texto como enfoque principal o aspecto religioso.
O sexto artigo211, Festas de brasilidade e igualdade, tem como
articulista a graduada em comunicação Teresinha de Jesus Ferreira.
Abordagem: Religiosa. Esse artigo também trata de uma festa religiosa e
sincrética realizada na cidade de Paula Cândido (MG). A festa é o Congado
que, segundo a autora, surgiu com o objetivo de “abolir as regras sociais da
estrutura escravocrata e fazer dos escravos súditos do rei do Congo”212. O
texto apresenta o depoimento de pessoas que mantêm viva essa tradição.
Eixo temático: Culturas e Tradições, por evidenciar a cultura e a religiosi-
dade popular.
O sétimo artigo213, Trama de saberes, religiosidade afrodescen-
dente e Ensino Religioso, tem como articulista o graduado em história
Morche Ricardo Almeida. Abordagem: Fenomenológica. O texto é o relato
de uma experiência realizada pelo autor, que é professor de Ensino
Religioso, em uma escola pública de Blumenau (SC). Segundo o articulista,
ao propor aos educandos um estudo comparado da cultura africana com
outras culturas europeias, “ajuda os alunos a superar a resistência, a
respeitar a diversidade e a descobrir novas perspectivas de compreensão
dos fenômenos religiosos e sociais”214. Eixo temático: Culturas e Tradições
Religiosas, pois evidencia que nas diferentes culturas há elementos comuns
e que é preciso conhecê-los, a fim de vencer a barreira do preconceito.
Por fim, verificamos o texto da seção Sua Página, sob o título
Colégio em ritmo novo, que apresentou dois relatos de experiências
realizadas pelos professores de Ensino Religioso do sistema estadual de
ensino, das cidades de Maringá (PR) e do Rio de Janeiro (RJ). Ambos os
211
FERREIRA, T., Festas de brasilidade e igualdade. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, ano XIII, n. 49, p. 30-33. 212
Ibid., p. 31. 213
ALMEIDA, M. R., Trama de saberes, religiosidade afrodescendente e Ensino Religioso. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 34-37. 214
Ibid., p. 34.
100 A prática de Ensino Religioso não confessional
trabalhos têm como motivação a Lei n. 10.639/03, de modo que as
atividades realizadas pelos alunos apresentam a cultura afro-brasileira.
Quando comparamos as temáticas desenvolvidas nos artigos e
também na seção Sua página, percebemos que a revista Diálogo, mesmo
tratando de apenas alguns aspectos relativos à temática História e cultura
afro-brasileira na escola, se mostrou coerente com o tema e buscou dar
destaque à matriz afro-brasileira.
5.6. Edição n. 58: O sagrado na pessoa e na sociedade
A última revista Diálogo a ser analisada é a edição n. 58, cujo
tema é O sagrado na pessoa e na sociedade. Além das ilustrações, a revista
também traz um boxe com outras informações que não estão no artigo. Essa
edição da Diálogo apresenta seis artigos e oito seções que complementam a
proposta do tema geral, além de conto, dicas de leitura, resenha e sugestão
de atividade.
O primeiro artigo215, O Sagrado e a religiosidade como jornada
psíquica, tem como articulista o doutor em filosofia Marcos Ferreira Santos.
Abordagem: Fenomenológica. O autor propõe uma reflexão acerca da rela-
ção humana com o sagrado. Ele constata que no campo da psicologia as
posições frente à questão religiosa são diversas, pois “trata-se de uma in-
tensa e extensa jornada existencial e psíquica para uma possível pleni-
tude”216. Eixo temático: Ethos, pelo caráter analítico-subjetivo do texto.
215
SANTOS, M. F., O Sagrado e a religiosidade como jornada psíquica. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 58, p. 8-13. 216
Ibid., p. 11.
101 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
O segundo artigo217, A transcendência humana e o sagrado, tem
como articulista o doutorando em teologia Marlon Leandro Schock.
Abordagem: Fenomenológica. Segundo o autor, o ser humano traz consigo
a capacidade de transcender, pois “nós, seres humanos, mantemos uma ati-
tude de perplexidade e esperanças simultâneas, abertos a toda realidade
possível”218. O articulista também busca estabelecer algumas distinções
teóricas entre transcendência e sagrado. Eixo temático: Culturas e Tradi-
ções Religiosas, por sua leitura acerca da transcendência.
O terceiro artigo219, Religião e Ciência: experimentações, tem
como articulista a doutora em sociologia Leila Marrach Bastos de Albuquer-
que. Abordagem: Fenomenológica. O texto analisa a relação entre Ciência
e Religião no contexto da modernidade. Segundo a autora, “tanto a Religião
como a Ciência são interpretações do mundo, que orientam os modos de
agir, sentir e pensar das pessoas coletivamente”220. Constata-se um
intercâmbio de linguagem e de “valores” entre Religião e Ciência. Eixo te-
mático: Culturas e Tradições Religiosas, por apontar o desenvolvimento di-
alógico entre Religião e Ciência.
O quarto artigo221, O Bricoleur sagrado contemporâneo, tem
como articulista o mestre em sociologia Aislan Vieira de Melo. Abordagem:
Fenomenológica. O autor, ao analisar a questão do sagrado, afirma que “o
sistema religioso, mesmo não conservando o caráter hegemônico de antes,
mantém forte influência na conduta do indivíduo”222. Este, ao transitar entre
as religiões, faz surgir uma expressão das práticas religiosas que o
articulista chamou de bricoleur. O trânsito religioso faz com que as pessoas
levem consigo alguns elementos da tradição anterior, e, ao mesmo tempo,
217
SCHOCK, M. L., A transcendência humana e o sagrado. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 58, p. 14-18. 218
Ibid., p. 16. 219
ALBUQUERQUE, L. M. B., Religião e Ciência: Experimentações. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 20-23. 220
Ibid., p. 20. 221
MELO, A. V., O Bricoleur sagrado contemporâneo. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 24-29. 222
Ibid., p. 25.
102 A prática de Ensino Religioso não confessional
agreguem a estes novas práticas. Eixo temático: Culturas e Tradições
Religiosas, por sua análise acerca da prática religiosa atual.
O quinto artigo223, O sagrado como sentido transformador, tem
como articulista o mestre em sociologia Cléber Seixas Guimarães. Aborda-
gem: Fenomenológica. O autor analisa um caso específico da Igreja do
Evangelho Quadrangular e suas transformações e adequações na socie-
dade contemporânea. Segundo o articulista, a IEQ buscou agregar “elemen-
tos mágicos que servem de pontes entre o indivíduo e seu Deus”224. O texto
também evidencia as relações entre a instituição religiosa e seus fieis, e a
experiência religiosa que esta realiza em seus cultos. Eixo temático:
Culturas e Tradições Religiosas, por sua análise de uma instituição especí-
fica.
O sexto artigo225, O imaginário ribeirinho e a relação com o
sobrenatural, tem como articulista a doutora em linguística Nair Ferreira
Gurgel do Amaral. Abordagem: Fenomenológica. O texto analisa a crença
nos mitos e lendas amazônicas que a população ribeirinha dessa região cul-
tiva e transmite de uma geração a outra com certa “sacralidade”. A autora
afirma que “mito e lenda retratam necessidades humanas de entender as
coisas do universo e de superar o medo e a insegurança”226. Eixo temático:
Culturas e Tradições Religiosas, por sua análise cultural do contexto amazô-
nico.
Em relação à seção Sua página, a edição n. 58, com o título Da
resistência à consciência, apresenta o trabalho realizado com os alunos de
uma escola municipal da cidade de Salvaterra, na Ilha de Marajó (PA). O
relato da atividade evidencia a conscientização e o resgate da religiosidade
afro-brasileira presente na Ilha de Marajó. Frente à temática geral da revista
Diálogo, a experiência publicada destaca um elemento que não se eviden-
223
GUIMARÃES, C. S., O sagrado como sentido transformador. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, n. 58, p.30-35. 224
Ibid., p. 31. 225
AMARAL, N. F. G., O imaginário ribeirinho e a relação com o sobrenatural. In: Diálogo – Revista de Ensino Religioso, op. cit., p. 36-41. 226
Ibid., p. 37.
103 Capítulo III: O diálogo entre a revista Diálogo e a crítica epistemologia à luz das Ciências da Religião
ciou nos artigos, isto é, a questão do sagrado na ótica da matriz afro-brasi-
leira.
Falar do sagrado certamente não é um tema fácil, ainda mais num
curto espaço de uma revista. Embora os temas tenham cercado a questão
de forma tangencial, a revista consegue responder à temática da capa nos
artigos acerca do imaginário ribeirinho, do bricoleur religioso da atualidade e
na questão psíquica da religiosidade. Em relação aos eixos temáticos,
sobressaíram o de Culturas e Tradições Religiosas, com cinco artigos e
Ethos com um artigo. Os demais eixos não foram abordados.
Neste capítulo, buscamos estabelecer um diálogo com os nossos
críticos e retomamos alguns elementos mais importantes de seus
argumentos, evidenciando neles o seu ponto de fragilidade. Para esse
diálogo, tomamos como fundamento teórico as Ciências da Religião, que
também se encontram na fundamentação epistemológica do Ensino
Religioso.
Compreendemos que de modo geral, quando falamos de Ensino
Religioso, não estamos nos referindo apenas a um modelo ou forma de de-
senvolver o conteúdo dessa disciplina. Ao tratarmos da questão, é preciso
considerar a discussão em sentido mais amplo, fora do domínio religioso, ou
seja, a questão encontra-se no âmbito da educação, que tem uma realidade
plural e diversa no Brasil, e é dentro desse domínio que ela deve ser com-
preendida.
No sentido de demonstrar, contrariamente à opinião dos críticos
estudados, que é possível a proposta de um modelo de Ensino Religioso na
perspectiva das Ciências da Religião, analisamos a perspectiva e o
conteúdo da revista Diálogo. Quando examinamos a revista, percebemos
que suas abordagens tratam dos temas na perspectiva das diferentes áreas
de conhecimento, tais como a Sociologia, a Antropologia, a Filosofia e a
Teologia, entre outras. Tal característica confirma que a proposta dos
104 A prática de Ensino Religioso não confessional
PCNER sistematiza os conteúdos do Ensino Religioso nos cinco eixos
temáticos já mencionados.
Quando analisamos por amostragem alguns números da revista,
percebemos dois tipos de abordagens: a fenomenológica e a religiosa.
Mesmo que a nossa análise seja apenas uma amostragem, pois não
analisamos todas as edições da revista, podemos concluir que textos com
enfoque no Fenômeno Religioso são mais frequentes entre os artigos. Isso
demonstra que a perspectiva de Ensino Religioso presente na revista se
coaduna com o modelo das Ciências da Religião. Outro aspecto relevante é
que, embora a quantidade dos artigos com abordagem acerca da religião
seja menor, fica evidente que é possível apresentar as religiões sem
proselitismo.
105 Conclusão
CONCLUSÃO
Quando tratamos do Ensino Religioso, percebemos que essa é
uma discussão muito complexa, tanto pelas opiniões divergentes, quanto
pelas diversas realidades educacionais existentes no Brasil e que não
encontram nos órgãos oficiais e responsáveis pelo currículo escolar o aporte
necessário para lidar com todas as questões que cercam essa disciplina.
Constatamos que a atual legislação acerca do Ensino Religioso
não resolve o problema de sua aplicabilidade, bem como não lhe concede o
mesmo status do qual gozam as demais disciplinas do currículo escolar. A
formulação do Artigo 33, da LDB n. 9.475/97, dá margem para que se
compreenda o Ensino Religioso como a presença da instituição religiosa no
espaço escolar, quando afirma que os sistemas de ensino deverão ouvir
uma entidade civil, constituída por diferentes denominações, a fim de definir
os conteúdos do Ensino Religioso. Além disso, a LDB também deixa em
aberto algumas questões, tais como: O que propor aos alunos que não
optarem pelo Ensino Religioso? Qual é o conteúdo programático dessa
disciplina? Por que a oferta de Ensino Religioso é obrigatória para a escola,
porém, facultativa para o aluno? Não é contraditório que um componente da
formação básica seja facultativo? Qual é a função de um componente
curricular facultativo? Essas e outras questões pedem uma resposta, não só
aos pesquisadores, mas, sobretudo, ao Estado, que é gestor oficial da
educação no Brasil.
Percebemos que o terreno no qual o Ensino Religioso está
assentado é bastante instável, acarretando dificuldades não só aos
professores da disciplina, mas também por despertar críticas que muitas
vezes atrapalham a solução dos problemas apontados. As críticas em toda e
106 A prática de Ensino Religioso não confessional
qualquer situação são positivas, porém, no caso do Ensino Religioso, muitas
vezes impedem de se avançar nas questões acerca do conteúdo e da base
epistemológica e acabam por instigar disputas ideológicas.
Temos que concordar com os críticos quando afirmam que o
Ensino Religioso entrou no currículo escolar mais por uma iniciativa das
instituições religiosas, notadamente a Igreja Católica, porém, houve nesse
ensino um desenvolvimento histórico que nos remete aos diferentes
períodos da história de nosso país. Todavia, revisitaando o desenvolvimento
do Ensino Religioso, constatamos que não podemos considerá-lo
homogêneo, pois ele passou por diferentes concepções em relação aos
seus conteúdos e à sua natureza. É interessante destacar que as mudanças
por ele sofridas podem ser interpretadas como um reflexo das próprias
mudanças socioculturais e político-religiosas ocorridas no Brasil nas últimas
décadas.
No cenário religioso, passamos de um país eminentemente cató-
lico a um Estado plural e diverso, no qual todos os cidadãos gozam de plena
liberdade religiosa. Neste contexto, o modelo de Ensino Religioso que
melhor responde a essa realidade certamente não é o modelo confessional,
e tampouco o ecumênico, mas aquele cuja abordagem se faz à luz das
Ciências da Religião, ou, como optam alguns pesquisadores, o modelo fe-
nomenológico.
Cada modelo de Ensino Religioso teve e/ou tem sua validade, e
corresponde a um determinado contexto socioeducacional, de modo que ao
se analisar ou mesmo lançar criticas a alguns dos modelos, é necessário
considerar seu contexto, a fim de se evitar leituras equivocadas e análises
reducionistas. Analisando as críticas de Cury, Vaidergorn e Giumbelli,
constatamos que há certo equívoco em seus argumentos, pois consideram
somente o Ensino Religioso no modelo confessional e em nenhum momento
de sua reflexão é mencionada a existência dos outros modelos.
107 Conclusão
Falta a esses críticos considerar a possibilidade de um Ensino
Religioso não confessional, fundamentado em resultados das pesquisas
científicas sobre a religião. Ao desconsiderá-las, eles também não se dão
conta dos esforços realizados pelos pesquisadores em fazer do Ensino
Religioso a transposição didática das Ciências da Religião.
Percebemos que a crítica ao modelo confessional se direciona
não ao Ensino Religioso, mas à presença da doutrina católica ou cristã no
ambiente escolar. De fato, em todo o caminho percorrido pelo Ensino
Religioso na educação brasileira, não se pode negar que a atuação da Igreja
Católica, representada pelo Grere, foi de suma importância para chegarmos
ao que hoje compreendemos por Ensino Religioso. É preciso reconhecer
que por muitos anos a Igreja Católica se constituiu numa voz forte a favor do
Ensino Religioso; entretanto, ela não foi a única a defendê-lo. Muitas
pessoas, professores e instituições, civis e religiosas, mobilizaram-se para
que esse ensino entrasse na grade curricular.
Entre os outros articuladores do Ensino Religioso se encontra o
Fonaper, e especificamente o seu empenho em formular e apresentar os
PCNER. Com toda certeza essa iniciativa concedeu ao Ensino Religioso um
novo status, que a legislação não foi capaz de lhe outorgar. Os PCNER
buscaram oferecer uma proposta programática ao Ensino Religioso,
entretanto, tal proposta não foi assumida pelo MEC como oficial, de modo
que os PCNER não se constituíram em diretrizes permanecendo na
categoria de uma alternativa. Embora seja considerada a proposta que
melhor corresponda à legislação, coube aos estados e municípios o livre-
arbítrio de aderir ou não à proposta do Fonaper.
Constatamos também que a caminhada a favor do Ensino
Religioso como componente curricular se divide em duas grandes fases: a
primeira, cujo objetivo era fazer com que se reconhecesse o Ensino
Religioso como elemento integrante da formação do cidadão. E a segunda,
na qual nos encontramos atualmente, que tem em vista o conteúdo e a
108 A prática de Ensino Religioso não confessional
formação docente para o Ensino Religioso. É precisamente nesta etapa que
nasce a revista Diálogo.
A Diálogo nasceu a partir do sonho daqueles 180 professores,
que há 18 anos participaram do 10º Ener, em Fortaleza (CE), e que, ao final
do encontro, manifestaram o desejo de ter uma revista de Ensino Religioso
que os ajudasse em sua formação e comunicação entre eles. A revista, que
tem contribuído com o Ensino Religioso há 17 anos, foi analisada em nossa
pesquisa no período entre outubro de 1995 e agosto de 2010. Nesses 15
anos, sendo dez sob a direção de Luzia Senna, e cinco anos sob o comando
de Maria Inês Carniato, a Diálogo apresentou abordagens acerca do
Fenômeno Religioso, na perspectiva das diferentes áreas de conhecimento,
bem como tratou das religiões como tal. Evidenciamos que cada uma das
duas editoras, conforme as respostas das entrevistas, passaram por
experiências diferentes durante as suas diretorias. Enquanto Luzia Sena,
que recebeu o encargo de iniciar a revista, enfrentou problemas de ordem
interna, estrutural e financeira, Maria Inês Carniato buscou tornar a revista
mais pedagógica.
Percebemos que há continuidade entre uma editoria e outra no
que diz respeito aos objetivos da revista. Embora, na entrevista, a segunda
editora tenha afirmado que na primeira fase da revista as abordagens
enfocavam mais as religiões, enquanto que em sua gestão o enfoque era a
educação, em nossa análise tal afirmação não se comprova. Pelos artigos
das seis edições analisadas neste trabalho, constatamos duas formas de
abordagens, uma na perspectiva da religião ou religiosa, onde se tratava dos
elementos de fé, como por exemplo, do judaísmo, cristianismo, budismo e
religião afro-brasileira. E outra perspectiva com enfoque antropológico,
histórico, social e pedagógico. As abordagens corroboram uma cosmovisão
transreligiosa e com a educação do cidadão segundo o Ensino Religioso, no
modelo das Ciências da Religião.
Em relação aos desafios que a Diálogo enfrentou e/ou ainda en-
frentará, a fim de poder manter uma proposta de Ensino Religioso funda-
109 Conclusão
mentada na legislação e em princípios que valorizam a diversidade cultural e
religiosa, existentes na sociedade e na educação brasileira, com toda
certeza estes são muitos, porém apontamos os mais significativos que se
apresentam para a Diálogo a partir do nosso estudo.
Um desafio, sem sombra de dúvida, é manter a qualidade textual
nas curtas abordagens, ou seja, os artigos devem apresentar um conteúdo
consistente, substancial, de fácil compreensão e possível aplicação em
apenas quatro ou seis páginas da revista. Nem todos os textos que
analisamos apresentam essas características, de modo que na mesma
revista, por exemplo, na edição n. 49, encontramos textos mais elaborados e
outros que, embora figurassem entre os artigos, não mereciam estar nessa
categoria, como no caso dos artigos cinco e seis. O caráter das abordagens
símile ao científico confere credibilidade ao conteúdo da revista.
Buscamos identificar nas chamadas de capa e nos artigos os ei-
xos temáticos propostos pelos PCNER e constatamos que entre os cinco
eixos os mais evidenciados são Ethos, Culturas e Tradições Religiosas e
Teologia. A presença dos outros eixos é quase insignificante, de modo que o
desafio se encontra em abordar temas acerca dos Ritos, dos Textos Sagra-
dos (escritos e orais).
Em relação às perspectivas, no contexto atual, as discussões
acerca do estatuto científico do Ensino Religioso escolar abrem para a
revista, uma das únicas no mercado que têm no modelo das Ciências da
Religião o seu fundamento, a possibilidade de incluir em seu perfil editorial
essa base epistemológica. Pois, diante de uma possível volta da hegemonia
católica sobre o Ensino Religioso, a partir do acordo entre o Brasil e o
Vaticano, a Diálogo, ao apontar em seu perfil a sua base epistemológica,
respalda-se de uma possível investida da Igreja Católica sobre as
publicações da revista, que é de responsabilidade de uma instituição
religiosa, dependente da Igreja Católica apenas em termos doutrinários, mas
que a torna vulnerável.
110 A prática de Ensino Religioso não confessional
Com relação ao caráter da revista, ao assumir como base teórica
do Ensino Religioso presente em suas abordagens as Ciências da Religião,
a Diálogo assume uma identidade clara e definida. A revista tem a sua
identidade, porém, ela deve ser mais explicitada, a fim de não dar margem a
uma aparente neutralidade. Não podemos nos esquecer de que temos
diante de nós um veículo de comunicação, e, por detrás de todo o conteúdo
publicado, há uma linha de pensamento ou uma filosofia explicitada. Desse
modo, é bom para a revista que sejam as Ciências da Religião.
A Diálogo é uma revista voltada para a educação, especifica-
mente ao Ensino Religioso, e essa é a grande perspectiva para o futuro da
revista que desde as suas primeiras publicações buscou oferecer aos seus
leitores-professores conteúdos que fossem suporte pedagógico, bem como
subsídio formativo. Essa contribuição da revista se expressa na forma como
os assuntos estão estruturados, ou seja, nos artigos e nas seções
pedagógicas. Vale ressaltar que os assuntos tratados pela revista são
perenes, de modo que o tema tratado em uma edição não perde a sua
validade e o professor encontra na revista um subsídio de conteúdo du-
radouro.
É interessante observar que a qualidade do conteúdo provém, so-
bretudo, da formação acadêmica dos articulistas, que em sua maioria são
pós-graduados e ligados a centros acadêmicos de diversas regiões do Bra-
sil, bem como de diferentes áreas do conhecimento. Essa diversidade de
professores e de regiões do País que escrevem na revista ratifica o motivo
pelo qual a revista Diálogo foi criada, isto é, ser um meio de comunicação e
de formação entre os professores de Ensino Religioso. E estes contribuem
com a revista, seja por meio dos artigos, seja através dos relatos de
experiências nas seções interativas.
A Diálogo é um periódico de professores para professores, pois
os articulistas da revista também são docentes das diferentes áreas do co-
nhecimento e que, em poucas páginas, oferecem um rico e denso conteúdo.
Podemos afirmar que Ensino Religioso literalmente se faz com diálogo, e a
111 Conclusão
Diálogo faz do seu conteúdo um diálogo aberto no que diz respeito à diversi-
dade cultural e religiosa existente em nosso país.
Por fim, percebemos que educação e religião, embora tenham
objetivos diferentes, compartilham o mesmo “alvo”, que é o ser humano.
Talvez seja esse o cerne da questão, e nos perguntamos: Quem é o
indivíduo que queremos formar? E qual é a formação que queremos lhe
oferecer? Fica para nós o desafio.
112 A prática de Ensino Religioso não confessional
REFERÊNCIAS
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