artigo deformidades dentofaciais: enfoque para o ortodontista - parte ii

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150 Orthodontic Science and Practice. 2010; 3(10). Artigos de Revisão (Review Articles) Reconhecendo as deformidades dentofaciais: um enfoque para o ortodontista – parte II Recognizing dental-facial deformities: an approach for the orthodontist – part II Éber Luís de Lima Stevão - Doutor em CTBMF, Pós-Doutorado pela Baylor College of Dentistry, Fellow em CTBMF pela Baylor University Medical Center em Dallas, Texas – EUA, Membro efetivo da Sociedade Norte-Americana dos Cirurgiões da ATM – ASTMJS, Diretor Científico da Dental Special Products – DSP, Consultor Clínico para América do Sul da TMJ Concepts Califórnia, USA Larry M. Wolford - Cirurgião Bucomaxilofacial com clínica privada em Dallas, Texas – EUA. Professor Clínico da Baylor College of Dentistry, Texas A&M University System, Dallas, Texas – EUA. Resumo O ortodontista tem um papel importante na vida de seus pacientes portadores de deformidades dentofaciais, através da identificação dessas deformidades. Trabalhando com um cirurgião bucoma- xilofacial treinado em cirurgia ortognática, será possível completar uma avaliação pormenorizada, propor um plano de tratamento adequado e realizar o tratamento ortodôntico e cirúrgico necessários. Para o bem estar do paciente, é muito importante que o cirurgião possua o conhecimento, a destreza e experiência para ofertar um resultado de alta qualidade. Através dessa conduta, os pacientes se beneficiarão de uma função e estética melhoradas, aumentando suas oportunidades no trabalho e na vida em geral. Alcançando resultados de alta qualidade, o ortodontista será favorecido pelo au- mento na referência de pacientes. É evidente que resultados com qualidade darão ao ortodontista a sensação de dever cumprido e autossatisfação. Este segundo artigo tem por finalidade de ilustrar o que foi apresentado e discutido na parte I do artigo prévio, mostrando três casos de deformidades dentofaciais que necessitaram do tratamento ortodôntico associado à cirurgia ortognática. Fotos pré e pós tratamentos são mostradas para comparação. Descritores: Deformidades dentofaciais, cirurgia ortognática, cirurgia da ATM, estética facial, tratamento ortodôntico pré-cirúrgico. Abstract The orthodontist can play a significant role in the lives of their patients with dentofacial defor- mities, by identifying the presence of the deformities. Working with an oral and maxillofacial surgeon trained in orthognathic surgery it will be possible to complete a comprehensive evaluation, propose an adequate treatment plan, and perform the necessary orthodontics and surgery. For the welfare of the patients, it is important that the surgeon possesses the knowledge, ability, and experience to provide high quality outcomes. With this approach, the patients benefit by having improved function and es- thetics, thus enhancing their opportunities in the work place and in life. Achieving high quality results benefits the orthodontist, because patient satisfaction is high, patient referrals increase, and provides the orthodontist the feeling of accomplishment and self-satisfaction. This second paper of a series of two has the intention to exemplify what was presented and discussed on the previous one, showing three cases of dentofacial deformities that needed orthodontic treatment associated with orthognathic surgery. Pre- and post-operative photos are presented to illustrate the facial and occlussion outcomes. Descriptors: Dental-facial deformities, orthognathic surgery, TMJ surgery, facial aesthetics, pre- surgical orthodontic treatment. Correspondência com autor: [email protected] Recebido para publicação: 06/11/2009 Aceito para publicação: 29/01/2010

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Este artigo mostra casos operados que foram tratados ortodonticamente e depois tiveram a cirurgia ortognática realizada para correção das deformidades dentofaciais.

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Page 1: Artigo Deformidades Dentofaciais: Enfoque para o Ortodontista - parte II

150 Orthodontic Science and Practice. 2010; 3(10).Artigos de Revisão (Review Articles)

Reconhecendo as deformidades dentofaciais: um enfoque para o ortodontista – parte IIRecognizing dental-facial deformities: an approach for the orthodontist – part II

Éber Luís de Lima Stevão - Doutor em CTBMF, Pós-Doutorado pela Baylor College of Dentistry, Fellow em CTBMF pela Baylor University Medical Center em Dallas, Texas – EUA, Membro efetivo da Sociedade Norte-Americana dos Cirurgiões da ATM – ASTMJS, Diretor Científico da Dental Special Products – DSP, Consultor Clínico para América do Sul da TMJ Concepts Califórnia, USALarry M. Wolford - Cirurgião Bucomaxilofacial com clínica privada em Dallas, Texas – EUA. Professor Clínico da Baylor College of Dentistry, Texas A&M University System, Dallas, Texas – EUA.

Resumo O ortodontista tem um papel importante na vida de seus pacientes portadores de deformidades

dentofaciais, através da identificação dessas deformidades. Trabalhando com um cirurgião bucoma-xilofacial treinado em cirurgia ortognática, será possível completar uma avaliação pormenorizada, propor um plano de tratamento adequado e realizar o tratamento ortodôntico e cirúrgico necessários. Para o bem estar do paciente, é muito importante que o cirurgião possua o conhecimento, a destreza e experiência para ofertar um resultado de alta qualidade. Através dessa conduta, os pacientes se beneficiarão de uma função e estética melhoradas, aumentando suas oportunidades no trabalho e na vida em geral. Alcançando resultados de alta qualidade, o ortodontista será favorecido pelo au-mento na referência de pacientes. É evidente que resultados com qualidade darão ao ortodontista a sensação de dever cumprido e autossatisfação. Este segundo artigo tem por finalidade de ilustrar o que foi apresentado e discutido na parte I do artigo prévio, mostrando três casos de deformidades dentofaciais que necessitaram do tratamento ortodôntico associado à cirurgia ortognática. Fotos pré e pós tratamentos são mostradas para comparação.

Descritores: Deformidades dentofaciais, cirurgia ortognática, cirurgia da ATM, estética facial, tratamento ortodôntico pré-cirúrgico.

AbstractThe orthodontist can play a significant role in the lives of their patients with dentofacial defor-

mities, by identifying the presence of the deformities. Working with an oral and maxillofacial surgeon trained in orthognathic surgery it will be possible to complete a comprehensive evaluation, propose an adequate treatment plan, and perform the necessary orthodontics and surgery. For the welfare of the patients, it is important that the surgeon possesses the knowledge, ability, and experience to provide high quality outcomes. With this approach, the patients benefit by having improved function and es-thetics, thus enhancing their opportunities in the work place and in life. Achieving high quality results benefits the orthodontist, because patient satisfaction is high, patient referrals increase, and provides the orthodontist the feeling of accomplishment and self-satisfaction. This second paper of a series of two has the intention to exemplify what was presented and discussed on the previous one, showing three cases of dentofacial deformities that needed orthodontic treatment associated with orthognathic surgery. Pre- and post-operative photos are presented to illustrate the facial and occlussion outcomes.

Descriptors: Dental-facial deformities, orthognathic surgery, TMJ surgery, facial aesthetics, pre-surgical orthodontic treatment.

Correspondência com autor: [email protected] para publicação: 06/11/2009Aceito para publicação: 29/01/2010

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IntroduçãoSendo especialistas dentro de um sistema de

atendimento à saúde humana, os profissionais da Odon-tologia têm a obrigação de informar aos seus pacientes sobre a existência de deformidades dentofaciais, as im-plicações dessas anomalias, bem como, as possíveis opções de tratamento.

Trabalhando em conjunto, o especialista da Orto-dontia e o Cirurgião Bucomaxilofacial devem apresentar ao seu paciente uma avalição compreensiva e um plano de tratamento adequado, segundo Wolford e Fields(1). Assim, os pacientes poderão decidir se querem obter um tratamento ideal, ou um tratamento que em muitas situações é apenas paliativo ou, ainda, permanecerem da mesma forma como eles adentraram ao consultório, assim relatado por Finlay et al.(2).

Os objetivos básicos do tratamento para aqueles pacientes que buscam a Cirurgia Ortognática e a Orto-dontia como opção de tratamento são:

1) Desenvolver uma função normal da mastiga-ção, fala e respiração;

2) Estabelecer uma harmonia facial com propor-ções balanceadas;

3) Prover um tratamento efetivo e eficaz de uma maneira programada;

4) Prover resultados estáveis em longo prazo.

Relato de casosTodos os pacientes que são mostrados neste tra-

balho assinaram um consentimento informado para seu tratamento e também uma autorização para publicação de seus casos em artigos científicos e/ou apresentação em aulas ou cursos.

Caso 1 - Esta paciente de 32 anos de idade foi

diagnosticada com: 1) Hipoplasia maxilar e assimetria, 2) Hipoplasia mandibular e assimetria, 3) Hipoplasia mentoniana, 4) Reabsorção condilar idiopática da arti-culação têmporomandibular (ATM) esquerda com des-locamento ânteromedial do disco articular, 5) Mordida aberta anterior e posterior do lado direito, 6) Oclusão

Classe II, 7) Dor miofascial, 8) Dor da ATM esquerda e 9) Cefaleias. O diagnóstico é parcialmente evidenciado nas figuras 7A-F, 8A. Repare o mento deficiente, mais evidenciado na figura 7C e a assimetria facial, na figura 7B.

Figura 7A - Paciente com 32 anos de idade, portadora de assimetria maxilo-mandibular, dor miofascial e na ATM esquerda, além de cefaleias.

Figura 7B - Notar a grande discrepância transversal maxilo-mandibular.

Figura 7C - Nessa foto de perfil é possível notar a hipoplasia mandibular e mentoniana.

Figura 7D - Evidência da mordida aberta anterior e posterior do lado direito.

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Figura 7E - Mordida aberta posterior do lado direito e oclusão Classe II.

Figura 7F - Oclusão Classe II com acentuada abrasão das cúspides dos caninos e pré-molares esquerdos.

Figura 8A - O traçado cefalométrico mostra mandíbula retruída, ângulo do plano oclusal aumentado e assimetria vertical.

O tratamento para essa paciente incluiu: 1) Orto-dontia pré-cirúrgica para alinhar e nivelar os arcos; 2) Cirurgia: a) Osteotomia Le Fort I segmentada da maxila para transversalmente nivelar, diminuir o ângulo do pla-no oclusal e corrigir a curva de Spee, b) Osteotomia sa-gital do ramo mandibular bilateral para transversalmente nivelar e avançar a mandíbula no sentido anti-horário (figura 8B), c) Reposicionamento do disco articular da ATM esquerda e reparo do ligamento posterior com a técnica Mitek Anchor; 3) Ortodontia pós cirurgia para re-finar e reter a oclusão.

Figura 8B - O traçado predictivo mostra os resultados projetados seguidos à Ortodontia pré-cirúrgica e cirurgia que consistiu em maxila segmentada em três partes para diminuir o plano oclusal, nivelar o plano oclusal transversal e corrigir a curva de Spee, uma rotação no sentido anti-horário da mandíbula resultando no avanço do mento em 12 mm.

Figura 9A - Resultados da melhora das proporções faciais na vista frontal.

Uma melhora nos resultados funcional e estético foi alcançada com boa estabilidade mantida há mais de 6 anos de tratamento vista nas figuras 9A-E.

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Figura 9B - Melhora da estética facial observada na foto de perfil. Mentoplastia não foi realizada.

Figura 9C - Oclusão com vista frontal, após remoção da aparelhagem ortodôntica, mantida há mais de 6 anos após o tratamento.

Figura 10A - Paciente com 26 anos de idade, mostrando hiperplasia vertical de maxila e prognatismo mandibular.

Figura 10B - Foto de perfil mostrando hipoplasia A-P de maxila e prognatismo mandibular.

Figura 9D - Oclusão com vista lado direito, após remoção da aparelhagem ortodôntica, mantida há mais de 6 anos após o tratamento.

Figura 9E - Oclusão com vista lado esquerdo, após remoção da aparelhagem ortodôntica, mantida há mais de 6 anos após o tratamento.

Caso 2 - Esta paciente de 26 anos de idade ti-nha sido tratada previamente com ortodontia e extra-ção de 4 pré-molares. Na consulta para retratamento ela foi diagnosticada com: 1) Hipoplasia A-P de maxila, hiperplasia vertical e assimetria, 2) Prognatismo mandi-bular, 3) Oclusão Classe III, 4) Mordida cruzada anterior e posterior bilateral e 5) Espaços residuais de extrações prévias dos 4 pré-molares (figuras 10 A-G, 11A). Repa-re a protrusão mandibular e o sorriso “gengival” (figu-ra 10A). Também, note no perfil a posição protruída da mandíbula e do mento em relação a maxila, a incompe-tência labial e o lábio superior retruído.

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Figura 10C - Oclusão vista frontal, mostrando mordida cruzada anterior e posterior bilateral.

Figura 10G - Oclusão vista lado esquerdo, mostrando ortodontia pré-cirúrgica instituída para abir os espaços dos pré-molares em ambas as arcadas dentárias.

Figura 11A - A análise cefalométrica confirma a hipoplasia A-P da maxila e o prognatismo mandibular.

Figura 10D - Oclusão vista lado direito, mostrando mordida cruzada anterior e espaço inferior da ausência do segundo pré-molar.

Figura 10F - Oclusão vista frontal mostrando ortodontia pré-cirúrgica instituída para alinhar e nivelar os arcos e aumentar a angulação dos incisivos.

Figura 10E - Oclusão vista frontal, mostrando ortodontia pré-cirúrgica instituída para alinhar e nivelar os arcos, aumentar a angulação dos incisivos e abrir os espaços dos pré-molares em ambas as arcadas dentárias. O tratamento incluiu: 1) Ortodontia pré-cirúrgica

para alinhar e nivelar os arcos, aumentar a angulação dos incisivos e abrir os espaços dos pré-molares em ambas as arcadas; 2) Cirurgia: a) Osteotomia Le Fort I segmentada para avançar, reposicionar superiormen-te, nivelar, remover os espaços e expandir a maxila, b) Osteotomia sagital do ramo mandibular bilateral para retroceder a mandíbula, e c) Implante aloplástico tipo HTR (Hard Tissue Replacement) do mento (figura 11B); 3) Ortodontia pós cirurgia para refinar e reter a oclusão; 4) Dentística restauradora para confecção das próteses dos segundos pré-molares inferiores.

A melhora da função e estética é vista nas figuras 12A-E e permanecem estáveis há mais de 5 anos após tratamento.

Estevão, E.L.L.; Wolford, L.M.

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Figura 11B - O traçado predictivo mostra a maxila avançada, movimentada superiormente e os espaços dos pré-molares removidos, a mandíbula reposicionada posteriormente e o implante do mento colocado.

Figura 12A - Resultados da melhora da estética facial.

Figura 12B - Vista de perfil, mostrando melhora nas proporções faciais.

Figura 12C - Vista frontal da oclusão, mostrando estabilidade há mais de 5 anos.

Figura 12D - Vista oclusão lado direito, mostrando a restauração do segundo pré-molar inferior direito ausente.

Figura 12E - Vista oclusão lado esquerdo, mostrando a restauração do segundo pré-molar inferior esquerdo ausente.

Caso 3 - Esta paciente de 22 anos de idade ti-nha sido tratada previamente com ortodontia e extração de 4 pré-molares. Na consulta para retratamento ela foi diagnosticada com: 1) Hipoplasia maxilar, 2) Hiperplasia mentoniana, 3) Deslocamento do disco articular da ATM bilateral, 4) Oclusão de término em Classe II no lado di-reito e Classe III no lado esquerdo, 5) Extrações prévias de 4 pré-molares, 6) Mordida profunda, 7) Plano oclusal baixo (tipo facial braquicefálico), 8) Deformidade nasal interna com obstrução de via aérea, 9) Dor miofascial, 10) Dor da ATM, e 11) Cefaleias (figuras 13A-E, 14-A). Repare a maxila extremamente deficiente e o nariz e mento proeminentes (figura 13B).

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Figura 13A - Paciente com 22 anos de idade, tipo facial braquicefálico, portadora de discrepância maxilo-mandibular, dor miofascial, algia nas ATMs e cefaleias.

Figura 13B - Foto de perfil mostrando hipoplasia A-P da maxila e hiperplasia mentoniana. Repare o nariz e mento proeminentes.

Figura 13D - Oclusão vista lado direito, mostrando mordida profunda anterior, Classe II e ausência dos segundos pré-molares.

Figura 13E - Oclusão vista lado esquerdo, mostrando mordida profunda anterior, Classe II e ausência dos segundos pré-molares.

Figura 14A - O traçado cefalométrico mostra maxila retruída, o mento proeminente, plano oclusal diminuído e mordida profunda.

Figura 13C - Oclusão vista frontal, mostrando mordida profunda.

O tratamento incluiu: 1) Ortodontia pré-cirúrgica para alinhar e nivelar os arcos; 2) Cirurgia: a) Osteo-tomia Le Fort I segmentada para avançar a maxila e nivelar o plano oclusal, b) Osteotomia sagital do ramo mandibular bilateral para avançar a mandíbula no sen-tido anti-horário, c) Reposicionamento do disco articular da ATM bilateral e reparo do ligamento posterior com a técnica Mitek Anchor, d) Mentoplastia de redução ânte-roposterior e aumento vertical, e) Turbinectomia bilateral e septoplastia (figuras 14B); 3) Ortodontia pós cirurgia para refinar e reter a oclusão, além do tratamento de dentisteria para confecção de próteses para repor os pri-meiros pré-molares ausentes.

Estevão, E.L.L.; Wolford, L.M.

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Figura 14B - O traçado predictivo mostra a maxila sendo segmentada e aumentada no sentido vertical, a espinha nasal anterior removida e a porção posterior da maxila sendo reposicionada superiomente para aumentar o plano oclusal. A mandíbula está sendo levemente avançada no sentido anti-horário e o mento aumentado verticalmente e diminuído no sentido ânteroposterior. O avanço total do mento foi de 4 mm.

Figura 15A - Foto frontal da face com 4 anos de pós-operatório, mostrando uma maior harmonia nas proporções faciais.

Figura 15B - Foto mostrando um perfil mais normocefálico, resultado da alteração do plano oclusal no sentindo horário. Os lábios estão mais evidentes e proporcionalmente o nariz e o mento ficaram mais harmônicos.

Figura 15C - Oclusão vista frontal mostrando resultado obtido com o refinamento ortodôntico, após 4 anos de pós-operatório.

Figura 15D - Oclusão vista lado direito, após 4 anos de pós-operatório, mostrando resultado após dentisteria para fechamento dos espaços edêntulos dos segundos pré-molares.

Figura 15E - Oclusão vista lado esquerdo, após 4 anos de pós-operatório, mostrando resultado após dentisteria para fechamento dos espaços edêntulos dos segundos pré-molares.

A paciente é vista após 4 anos de tratamento com uma melhora da estética facial, função e autoestima, bem como eliminação das algias e cefaleias (Figuras 15A-E).

DiscussãoNo primeiro caso apresentado, a paciente era por-

tadora de uma inclinação transversal acometendo a ma-xila e a mandíbula. Para que seja possível corrigir esse tipo de discrepância e obter uma harmonia e simetria facial é obrigatório a cirurgia combinada. Sem dúvida, é uma cirurgia de difícil resolução, extremamente sensível à técnica, e somente cirurgiões mais experientes devem operar casos como esse. A reabsorção condilar idiopáti-ca presente na ATM esquerda foi tratada com sucesso, conforme descreveram Wolford e Cardenas(3), reposicio-nando o disco articular da ATM esquerda e reparando o li-gamento posterior com a técnica Mitek Anchor descrita por Mehra e Wolford(4) e Wolford et al.(5). Apesar da hipoplasia mentoniana observada no caso inicial (figura 7C), não foi necessário a mentoplastia devido ao fato da rotação no sentido anti-horário do plano oclusal, que normalmente projeta o mento anteriormente. É evidente uma melhora

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funcional e estética, além da boa estabilidade alcançada e mantida há mais de 6 anos de tratamento. A paciente teve suas algias e cefaleias eliminadas após o tratamento. Por mais que fosse possível resolver o problema oclusal da pa-ciente através da ortodontia, um tratamento empregando cargas biomecânicas intensas seria necessário e também um tempo muito grande para essa correção. Certamente, a instabilidade do caso seria o maior problema a ser enfren-tado posteriormente pelo ortodontista. Frustração do pa-ciente e profissional seriam evidentes no que diz respeito à resolução desse caso que, desde o princípio, tinha uma indicação ortocirúrgica.

A paciente apresentada no segundo caso, já tinha sido tratada através de ortodontia, somente. A proposta que a paciente havia recebido na época fora a extração de 4 pré-molares, porém sem direcionamento algum para uma possível resolução adequada do caso, pois a ortodon-tia prévia foi deficitariamente conduzida, até mesmo para preparar o caso para a cirurgia. Para esses pacientes por-tadores de Classe III verdadeira, a solução ideal é o trata-mento ortodôntico visando o preparo dos arcos dentários para a cirurgia ortognática. Não existe outra opção que for-neça resultado funcional e estética adequados. A cirurgia de redução da mandíbula poderia ser uma opção viável, porém as deformidades diagnosticadas na arcada superior seriam desprezadas e um tratamento muito aquém, no que diz respeito a estética facial, seria obtido. É possível notar que o caso foi resolvido com uma relação molar de Clas-se II bilateralmente e que a oclusão permanece estável há mais de 5 anos após o tratamento.

No último caso, a paciente também fora tratada pre-viamente com ortodontia e extrações dentárias. Pacientes portadores de oclusão tipo Classe II devem obrigatoria-mente ser investigados quanto à possibilidade de deslo-camento dos discos das ATMs, pois a mandíbula tem uma posição instável. Ainda mais, se o próprio paciente relata cliques e dores articulares. Assim sendo, exame das ATMs através de Ressonância Nuclear Magnética é imperativo. A alteração do plano oclusal em pacientes do tipo braquice-fálicos, através do seu aumento, dão um resultado estéti-co muito satisfatório, pois o paciente passa a ter um perfil mais normocefálico, como bem descrito por Wolford et al.(6) e Chemello et al.(7). A cirurgia concomitante das ATMs para reposicionamento dos discos articulares com a cirurgia combinada é de difícil feita, demorada e necessita que o cirurgião tenha muita habilidade, segundo Wolford et al.(8). As cirurgias coadjuvantes intranasais são importantes para corrigir a função respiratória e dar estabilidade ao caso. Após 13 meses de tratamento, é possível notar uma me-lhora da função, estética e autoestima através da figuras 15A-E. Houve eliminação completa das algias e cefaleias e o caso se mantém estável há mais de 4 anos.

Dentre os três casos apresentados, as duas últi-mas pacientes haviam sido tratadas com ortodontia prévia muito aquém de uma resolutividade boa, tanto funcional quanto estética. Acabar um tratamento, que se propõe a resolver todos os problemas que o paciente possui no sis-tema estomatognático, em Classe III e II, respectivamente, como apresentados nos casos, é quase pior do que não propor tratamento algum. Muito logicamente essas duas pacientes voltaram a procurar um tratamento odontológico, no mínimo, condizente.

Sem dúvida alguma, não se poderia obter os resulta-

dos apresentados através de um tratamento isolado, seja cirúrgico ou ortodôntico. As pacientes ficaram muito satis-feitas com o resultado final.

É possível observar, até mesmo em fotos estáticas do pré e pós tratamento, naqueles casos envolvendo de-formidades dentofaciais que receberam um tratamento ortodôntico-cirúgico adequado, que há uma melhora sig-nificativa da autoestima que retorna a sua normalidade. A paciente passa a ter um cuidado muito maior na aparên-cia, até mesmo para que outras pessoas reparem que elas melhoraram esteticamente. É uma característica observa-da não somente em pacientes do gênero feminino, como apresentado nesse artigo, mas também no masculino. Essa melhora na autoestima também diz respeito à saúde integral do paciente.

Portanto, o tratamento que envolve uma deformida-de dentofacial deve obrigatoriamente ser integrado e ne-cessita que os profissionais envolvidos nesse tratamento dialoguem entre si e com o paciente, a fim de buscarem o máximo possível de qualidade no que diz respeito a fun-cionalidade do sistema estomatognático e estética facial.

ConclusãoCasos de deformidades dentofaciais que são cor-

retamente diagnósticos, que têm um adequado plano de tratamento e uma perfeita condução clínica e cirúrgica em ambas etapas, apresentam ótimos resultados funcionais e estéticos. O paciente precisa ser ou estar motivado para o tratamento através da Ortodontia e da Cirurgia Ortognática e os profissionais envolvidos têm um papel fundamental nessa motivação, como ressaltado por Wilmot et al.(9).

É de vital importância que a Ortodontia e a Cirurgia Ortognática trabalhem em conjunto para o mesmo fim, que é a satisfação completa do paciente e dos profissionais en-volvidos no caso.

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Estevão, E.L.L.; Wolford, L.M.