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1 Design For All Institute of India| August 2012 Vol-7 No-8 A Publication of Design For All Institute of India August 2012 Vol 7 Nº 8 Design For All Accessible Tourism in Portugal

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As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura, Algarve, Portugal

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Page 1: As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura

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D e s i g n F o r A l l I n s t i t u t e o f I n d i a | A u g u s t 2 0 1 2 V o l - 7 N o - 8

A Publication of Design For All Institute of India August 2012 Vol – 7 Nº 8

Design For All Accessible Tourism in Portugal

Page 2: As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura

NOTA BIOGRÁFICA PAULA TELES

Paula Cristina Ribeiro da Silva Teles, nasceu em Alvarenga, concelho de Arouca, a 16 de Maio

de 1969. Engenheira Civil – opção de Planeamento do Território (FEUP), Pós-Graduada em

Estratégias e Metodologias da Gestão Urbanística e Mestre em Planeamento e Projeto do

Ambiente Urbano pelas Faculdades de Engenharia e Arquitetura da Universidade do Porto,

concluiu Tese de Mestrado sobre “Os Territórios sociais da Mobilidade.”

Entre 1994 e 2004 é técnica autárquica na Câmara Municipal de Matosinhos com funções na

Divisão de Trânsito e Mobilidade. Entre 1994 e 1996 inclui a equipa de trabalho do Projeto

Europeu PROACESS.

Em 2004 constituiu a mpt® - mobilidade e planeamento do território (www.mobilidadept.com)

empresa de planeamento urbano e gestão da mobilidade, pioneira em Portugal em matéria de

mobilidade urbana inclusiva.

Coordenadora Nacional da Rede de Cidades e Vilas com Mobilidade para Todos, projeto que

criou e desenvolveu em colaboração com a APPLA - Universidade de Aveiro desde 2003, e que

conta com cerca de 80 municípios.

Atualmente, é Consultora Autárquica na área do Trânsito e Mobilidade Urbana em vários

municípios e especialista em Acessibilidade e Mobilidade para Todos, tendo vindo a colaborar

pontualmente com várias entidades do Governo Português.

Foi assistente convidada da Universidade de Aveiro lecionando as cadeiras de Planeamento da

Cidade, Planeamento Urbano, Transportes e Mobilidade nos cursos de licenciatura de

Planeamento Regional e Urbano e Engenharia Civil. Atualmente, leciona nalgumas

universidades portuguesas, a destacar o Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa,

e é docente convidada da UTAD – Universidade de Trás-os–Montes e Alto Douro, desde 2009,

na licenciatura de Engenharia da Reabilitação e Acessibilidades Humanas.

Presidente e fundadora do Instituto de Cidades e Vilas com Mobilidade

(www.institutodemobilidade.org). Lançou em Novembro de 2007 o Jornal Planeamento e

Cidades, periódico mensal e de distribuição nacional.

Em Março de 2008 é nomeada pelo Governo Português para integrar o Grupo de Trabalho da

Lei das Acessibilidades em vigor (Decreto-Lei n.º 163/06, de 8 de Agosto).

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Desde 2008, membro certificado da ENAT – European Network for Accessible Tourism e

Membro do Conselho de Acompanhamento da Acessibilidade e Mobilidade para Todos da

Área Metropolitana do Porto.

Eleita Presidente da Comissão Técnica de Acessibilidade e Design Inclusivo (CT 177) do IPQ –

Instituto Português da Qualidade, em Abril de 2008, para a elaboração das Normas Técnicas

para a Certificação da Acessibilidade e Design Inclusivo em Portugal. Representante de

Portugal no CEN (Comité Europeu de Normalização) em Bruxelas, para a Normalização da

Acessibilidade e Design for All.

Nos últimos anos apresentou inúmeras comunicações em Conferências, Workshops,

Seminários e Tertúlias sob o tema Mobilidade Urbana e Desenho de Cidades em diferentes

cidades Europeias, destacando-se, em Outubro de 2008, a sua participação, única técnica

oradora, no lançamento nacional do programa do governo ”Portugal mais Acessível” e ainda,

ter sido convidada, como técnica especialista em planos de promoção da acessibilidade em

Portugal, para o lançamento nacional do programa RAMPA, na Universidade de Aveiro, em

Julho de 2010.

É autora de um vasto conjunto de participações em trabalhos e publicações. Das suas

publicações em livro destacam-se “Os territórios (sociais) da Mobilidade” (2005), Lugar do

Plano, Aveiro | “Desenho Urbano e Mobilidade para Todos” (2006), APPLA, UA | Revista

Planeamento, número especial sobre Mobilidade (coordenação) | Autora do “Guia da

Acessibilidade e Mobilidade para Todos”, Edição do Governo Português, lançado em Lisboa a 6

de Junho de 2007 para a descodificação da atual legislação portuguesa em matéria das

acessibilidades.

Em Setembro de 2009, lançou a publicação com o título: “Cidades de Desejo entre Desenhos

de Cidades - Boas Práticas de Desenho Urbano e Design Inclusivo”.

Foi coordenadora de cerca de 90% da primeira geração dos Planos de Promoção da

Acessibilidade desenvolvidos em Portugal.

Em Fevereiro de 2012 foi convidada para audição sobre Reabilitação Urbana e Arrendamento

Urbano pela Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local da Assembleia

da República.

É investigadora da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro no projeto de mobilidade

MOBMAPS - Modelo, processo e dispositivo para a avaliação da mobilidade/acessibilidade em

áreas urbanas.

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As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na

Requalificação da Baixa de Vilamoura, Algarve, Portugal

Paula Teles

mpt® - mobilidade e planeamento do território, lda, Porto, Portugal, [email protected]

1. A baixa de Vilamoura, território e turismo

Vilamoura é o maior e mais completo complexo turístico da Europa abrangendo uma área de

1600hectares. A sua edificação foi iniciada em 1960 e, enquanto projeto arquitetónico,

desenvolve-se em torno da marina, incluindo também campos de golfe, casino, clubes de

ténis, centenas de vivendas e outros empreendimentos dedicados, quase na sua totalidade, ao

turismo.

Figura 1 – Localização de Vilamoura no Algarve (Portugal)

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Ancorada em redor da sua prestigiada e reconhecida marina, com cerca de 825 postos de

amarração, Vilamoura navegou para muitos dos territórios a ela envolventes, pautando-se

sempre pelo desígnio da Qualidade, e nunca deixando de a ter como elemento referencial,

físico e simbólico.

Cuidadosamente, quase sempre, alheia aos maiores erros que proliferam na região, é hoje

resultado de um desenvolvimento ponderado e equilibrado, em várias frentes e vetores.

Permitiu-se, assim, afirmar também como uma área de qualidade ambiental, de que é

exemplo entre outros, a distinção da Praia da Falésia, das poucas do país, e uma das primeiras

do mundo, que foi distinguida, em julho de 2003, com a certificação ambiental, de acordo com

a norma ISO 14001 (reforçada em 2004 com a ISO 9001), sinónimo de uma rigorosa gestão

ambiental e um constante processo de melhoria da qualidade ambiental oferecida aos seus

utentes.

Sem sucumbir ao elitismo, mas resistindo ao populismo, Vilamoura oferece sempre algo a cada

um. Da marina ao casino, das praias ao golfe, da observação de aves à vida noturna, da

restauração de luxo à refeição rápida, das lojas exclusivas ao quiosque de recordações, a

diversidade consagrou-lhe uma qualidade de vida que ultrapassa já em muito a lógica do mero

“resort” turístico, tendo-se afirmado como lugar de excelência para viver.

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Figura 2 – A marina, a praia da marina e os campos de golfe

Obviamente esta diversidade complexa fez manifestar sobre o espaço público os efeitos da sua

sobrecarga funcional, já não sazonal, mas quotidiana e progressivamente intensa. Sem

possibilidade de estar presente em todo o lado a todo o momento, devido a um crescimento

exponencial da área urbanizada e das responsabilidades inerentes, algumas zonas da cidade,

foram sendo, naturalmente, preteridas na hierarquização das prioridades.

Figura 3 – Paisagem urbana da Baixa de Vilamoura antes da intervenção

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A Baixa de Vilamoura não deixa de ser na atualidade reflexo da sua qualidade inicial que,

permitindo resistir eficazmente ao uso e ao tempo, se sacrificou para permitir a diversificação

de investimentos nesse crescimento constante.

No entanto, essa determinação, vontade, projeto de qualidade e a imagem que também por aí

veiculou, não são já compatíveis com a situação que se verifica na Baixa de Vilamoura,

nomeadamente, no que diz respeito à qualidade do ambiente urbano como suporte dos novos

desafios dos lugares contemporâneos.

2. Conceitos e estratégia de intervenção

2.1. Estratégia de Intervenção

O objetivo mais geral e central do projeto desenvolvido foi o da Requalificação Urbanística do

“espaço” que abrange praticamente toda a Baixa de Vilamoura em redor da Marina. Desde a

Praça Cupertino de Miranda à Alameda da Praia, a norte e sul respetivamente, dos espaços

envolventes da Praça Parlatório Romano ao encontro da Rua do Sol com a Estrada da

Quarteira.

Numa primeira fase, requalificaram-se os espaços que dizem respeito direto ao espaço

ancorado, na sua quase totalidade, no “anel dos hotéis”, grande rotunda urbana a sul da Rua

do Sol, constituída pela Avenida da Marina e Avenida Tivoli.

Cientes de que um dos critérios fundamentais da qualidade, legibilidade e agradabilidade do

espaço público residia na sua continuidade e identidade, a segunda fase correspondeu ao

prolongamento do corredor verde/circuito de manutenção da Av. Eng.º Joaquim Meireles até

ao limite sul da Alameda da Praia de Vilamoura.

A terceira fase, por iniciar, incidirá em espaços a norte da Marina, menos visíveis e solicitados

funcionalmente, estruturados pela Rua da Botelha. Apesar de alguns sinais visíveis de

degradação e descuido, são, de toda a área, aqueles que apresentam uma menor urgência de

requalificação.

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Figura 4 – Faseamento da intervenção da obra de Requalificação da Baixa de Vilamoura

(Re)Qualificação é a palavra certa, exaltando o sentido etimológico de “voltar a qualificar”, de

qualificar “de novo”. Independentemente dos problemas que hoje se reconhecem ao sentido

do desenho de vias urbanas dos anos 60, é inequívoco que esta Avenida foi, desde o seu início,

dotada de verdadeira qualidade urbana. E, em muitos aspetos, porventura os mais

importantes e mais estruturantes, ainda o é. Não nos devemos deixar ofuscar pelas aparências

do muito que de menos positivo hoje em dia nela é possível verificar, e que acima referimos,

sem, justamente, deixar de ver igualmente os valores que ainda permanecem.

Infraestrutura determinante e estruturante do espaço urbano de Vilamoura, claramente bem

pensada e bem gizada, chamou a si e organizou de forma “natural” muito do crescimento mais

intenso das últimas décadas, que articuladamente e dialeticamente, mutuamente se

qualificaram. A Avenida, espaço urbano, servindo de âncora e estrutura ordenadora para o

edificado que a margina; este, dotando-a do seu verdadeiro sentido e ambição, no diálogo das

atividades urbanas que possibilita, e na dignidade que o alinhamento minimamente regrado e

o porte significativo lhe conferem.

FASE 1

FASE 2

FASE 3

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Figura 5 – Projeto de Requalificação da Baixa de Vilamoura (Algarve) - Portugal

Com esta base, que não deixou com certeza de servir como exemplo, a área cresceu de uma

forma regrada e organizada, características tão ausentes de outros espaços urbanos coevos,

perdidos na volúpia parasitária de loteamentos dispersos, desconexos, absolutamente autistas

ao seu “vizinho” imediato, espartilhados e espartilhando territórios e hipóteses de urbanidade.

Urbanística, de Urbano, também inequivocamente, entre a adjetivação e substantivação, quer

pela vontade de honrar e recuperar esse passado qualificado (devidamente adaptado às

exigências e anseios da contemporaneidade); quer também, precisamente face a essa

atualidade, elegendo como dois outros objetivos gerais dois temas centrais da atual

construção (sentido lato) da(s) urbanidade(s): Acessibilidade e Mobilidade para Todos e o

Desenvolvimento Urbano Sustentável.

Dito este título de outra maneira, de que formas tornar operativos, concretizáveis no espaço,

no terreno, na obra, esses outros objetivos gerais, essa vontade de Requalificação Urbana,

com ênfase na Acessibilidade e Mobilidade para Todos e no Desenvolvimento Urbano

Sustentável?

Quanto à Acessibilidade e Mobilidade para Todos as medidas e ações específicas passaram, no

essencial, por:

Criação de um Percurso Acessível: sem concessões a qualquer obstáculo a qualquer

cidadão, quaisquer que sejam as suas condições físicas e mentais;

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Marcação específica e contínua de meios auxiliares de deslocação para deficientes

visuais: associado ao Percurso Acessível, reforçando as condições deste como

elemento indutor de uma mobilidade verdadeiramente universal e democrática no

acesso à cidade e ao espaço urbano;

Criação de um canal de infraestruturas e mobiliário urbano: libertando o espaço

urbano dos obstáculos que geralmente nele se acumulam, articulando-se com o

Percurso Acessível, na efetivação da sua operacionalidade;

Rigoroso e detalhado controlo das cotas de Projeto e Obra: garantido na maior

extensão possível a eliminação de barreiras ao acesso ao comércio e equipamentos,

entendendo estes como natural extensão do espaço público;

Execução do perfil transversal todo à mesma cota: talvez a solução mais inovadora

considerando o carácter misto da Avenida (viário e pedonal), mas provavelmente a de

maior afirmação do sentido estratégico da intervenção: uma renovada consideração

do peão e das suas necessidades de deslocação, nomeadamente tendo em conta o

forte envelhecimento da população, e a crescente importância do turismo sénior.

Obviamente sem poder descurar as questões da segurança, esta solução só se tornou

possível considerando também a solução inovadora da dupla arborização

desencontrada que orienta o estacionamento e protege o peão de qualquer

desatenção do condutor.

Em termos de Desenvolvimento Urbano Sustentável as medidas tomadas foram, entre outras:

Aumento deveras significativo da área permeável: a caldeira contínua permitiu

alcançar uma percentagem de área permeável superior a 40% no perfil transversal.

Obviamente que dada a pluviosidade de Vilamoura, e mesmo os solos típicos da

região, os ganhos não se verificarão ao nível da drenagem natural, mas sim ao nível

dos equilíbrios higrométricos e das trocas de calor e retenção de poluentes em

suspensão, contribuindo decisivamente para a qualidade e conforto do ar na Avenida;

Quádrupla arborização transversal: duplicando o número de árvores vulgarmente

presentes mesmo nas vias mais intensamente arborizadas, também por aqui é

significativo o aumento das amenidades ambientais que esta solução pode oferecer ao

espaço urbano que transforma.

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Aumenta-se decisivamente o sequestro de carbono libertado pelos escapes das

viaturas em funcionamento, reduz-se, de Verão, a evaporação do solo permeável que

lhes subjaz e arrefece-se de forma nítida a temperatura do ar que medeia entre o

pavimento relvado e a copa das árvores. A redução, quase eliminação, da exposição

solar do asfalto negro, enorme armazém de calor, também contribui decisivamente

para o controlo microclimático de toda a Avenida e para a sua envolvente imediata.

Neste contexto, será também de registar os impactos positivos que a densa

arborização terá sobre o sombreamento dos edifícios contíguos, diminuindo a

amplitude térmica a que estão sujeitos, contribuindo para a diminuição dos seus

consumos energéticos em climatização e, também por aí, consequentemente, para a

redução da emissão de CO2;

Escolha rigorosa e correta do coberto arbóreo e herbáceo a instalar: para o sentido e

amplitude dos benefícios ambientais que se pretendiam alcançar não era suficiente

plantar árvores, quaisquer árvores. As espécies escolhidas encontram-se entre nativas

ou “aculturadas” – espécies há séculos no país, com provas dadas de compatibilidade

com a fauna e flora nativa ou endógena.

Obviamente que outro critério de seleção se referiu à sua compatibilidade com o clima

local, nomeadamente face à proximidade marítima e aos solos em presença, e

igualmente aos critérios de espaço e ambiente urbano que acima se definiram;

Gestão de iluminação pública: energética e de desenho – implantação, colocação e

distribuição, reduzindo ao máximo desperdícios.

Mais uma vez face aos critérios variados e complexos em ponderação, sem respostas

adequadas no atual mercado de iluminação pública (particularmente face à

acumulação da solução de arborização com a definição do canal de infraestruturas), a

decisão recaiu no desenvolvimento de uma nova luminária de raiz.

Sintetizando a mais recente tecnologia mundial em termos de eficiência energética, as

luminárias são exclusivamente em led’s, quer se trate do ponto à cota baixa (4 metros

– pedonal), quer à cota alta (7,5 metros – viária). Esta tecnologia tem demonstrado

possibilitar reduções de consumo energético de cerca de 40%, em comparação com os

vulgares iodetos metálicos ou vapor de sódio.

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O desenho específico que se desenvolveu para a luminária, em conjunto com as

características específicas dos led’s, permitiu também uma muito significativa redução

da poluição lumínica. Acresce serem referidos para a mesma, tempos de vida útil entre

60.000 a 100.000 horas, o que face aos tempos médios de iluminação diária

significando aproximadamente 20 anos de duração da lâmpada/luminária.

Independentemente das grandes vantagens enunciadas a solução de poste/luminária,

permitiu garantir um preço extremamente competitivo, inferior a um sobrecusto de 10

% comparado com as atuais luminárias de vapor de sódio e iodetos metálicos;

Criação de um canal subterrâneo de infraestruturas: ponderado o rácio custo-

benefício face às circunstâncias atuais das infraestruturas de Vilamoura (recentemente

renovadas), a solução adotada recaiu na instalação de duas bainhas de cabos flexíveis,

que permitirão com um custo reduzido, a todo o momento, proceder à instalação de

novos cabos (por exemplo fibra ótica, ou cablagem para alimentação de veículos

elétricos) praticamente sem obras de remoção e reposição de pavimentos. Pela

redução dos consumos de materiais e resíduos inerentes a essas intervenções, esta

solução não deixou de contribuir positivamente para um dos vetores fundamentais

deste projeto: o Desenvolvimento Urbano Sustentável;

Estudo de pontos de recarga de baterias de automóveis elétricos: em situação

idêntica ao ponto anterior, e face ao Estudo Prévio, também aqui se optou por apenas

instalar a base infraestrutural. As grandes indefinições inerentes a qualquer nova

tecnologia; bem como a possibilidade de, em articulação com dois elementos

(infra)estruturais do projeto – canal verde de infraestruturas e bainhas de cabos

subterrâneos – poder-se, em todo momento, implantar qualquer solução sem

impactos nem custos significativos;

Formalização da Ciclovia da Baixa: sem prejuízo de que no nosso entendimento a

bicicleta é um veículo, podendo portanto circular em quase todas as vias que servem o

trânsito automóvel, a definição de canais específicos, pensados e dedicados a este

meio de transporte com contributos vários para a sustentabilidade das nossas cidades

e populações, revelou-se indutor do seu uso, seja por uma questão de moda, também

necessária para implementar bons hábitos, seja pela efetiva segurança para todos os

utentes do espaço público. Esta foi mais uma ação promotora do carácter liderante, de

sentido de futuro e de qualidade, com impactos positivos muito significativos na

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imagem de Vilamoura, e nas relações simbólicas que possibilita estabelecer com os

seus utentes;

Devolução da cidade ao peão: muito na conjugação de todos os objetivos específicos

referidos, o objetivo, principal norteador da globalidade da intervenção e a restituição

das possibilidades de uso concreto do espaço urbano ao peão. Sem exageros de

separação forte e definitiva face ao automóvel, que a história recente foi provando

como negativa a vários níveis, a consideração do desenho urbano contemporâneo,

muito mais transversal e abrangente do que os dois temas que elegemos como

preferenciais, não pôde deixar de encarar como prioritária a reposição das hierarquias

dos utentes do espaço. Sem um prejuízo excessivo da circulação rodoviária, o futuro

próximo terá que passar pela consideração prioritária da circulação pedonal e das

mobilidades de baixo impacto, e fazê-lo com a maior abrangência e inclusão possível.

Muitas vezes pensado como uma questão isolada ou sectorial, há que considerar que

esta é uma medida fundamental dos objetivos mais amplos do Desenvolvimento

Urbano Sustentável.

Figura 6 – A visão para a Baixa de Vilamoura

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2.2. A escolha da Equipa Técnica

A mpt® - mobilidade e planeamento do território, lda foi a empresa selecionada pela

Inframoura, E.M. (entidade responsável pela gestão, conservação e manutenção de todos os

espaços públicos de Vilamoura) para o desenvolvimento desta intervenção por ser uma das

maiores empresas a operarem em Portugal em matéria de acessibilidade e cujos projetos se

orientam para 4 componentes principais, tal como demonstra a imagem seguinte.

Figura 7 – Conceito do projeto mpt®

Um dos principais objetivos da empresa é promover os territórios sociais da mobilidade numa

fusão completa de transdisciplinaridade. De resto, é esta a sua grande aposta, através de

práticas de planeamento e projeto integradas, envolvendo as vertentes de tráfego e

transportes, do planeamento urbano, da arquitetura e do desenho da cidade, numa perspetiva

da melhoria da qualidade urbana e social.

A mpt®, é, efetivamente, pioneira em Portugal em matéria de acessibilidade e mobilidade

urbana inclusiva. Este é o eixo estratégico da empresa, quer no domínio público quer no

privado, pela urgência na avaliação das condições de acessibilidade nas vilas e cidades,

tornando os territórios mais acessíveis.

A Inframoura selecionou a mpt® devido à sua vasta experiência adquirida em matéria de

acessibilidade, onde se destaca a responsabilidade técnica pelo desenvolvimento da Rede

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Nacional de Cidades e Vilas com Mobilidade tendo sido Paula Teles a coordenadora nacional

do projeto; ter realizado cerca de 90% da 1ª Geração de Programas de Promoção da

Acessibilidade em Portugal, tornando-se uma empresa experiente nesta matéria e líder de

mercado, e, por esta razão, ter sido a empresa selecionada pelo Governo (POPH) para o

lançamento do atual Programa RAMPA, por forma a explicar o trabalho efetuado na 1ª

Geração.

A experiência adquirida permitiu aferir métodos de trabalho, essencialmente na procura da

qualidade de vida das pessoas e na relação destas com os lugares. Foi o desenvolvimento

desta metodologia, com base na aplicação dos Sistemas de Informação Geográfica (SIG), que

traçou o Papel Inovador dos Planos de Promoção da Acessibilidade na Qualificação das Cidades

e dos Territórios Físicos e Sociais em Portugal.

Neste momento, conta com cerca de 50% dos municípios portugueses como seus clientes.

Figura 8 – Reunião da equipa de projeto com a Inframoura nas instalações da mpt®

2.3. Antiga Baixa de Vilamoura – estado de degradação do espaço público

Coração da Baixa de Vilamoura, a área de intervenção caracterizava-se por ser a de maior

diversidade em todo o aglomerado. Para o bem e para o mal, sucediam-se de forma algo

aleatória volumes altos e baixos, onde zonas mais densas contrastam com lotes ainda vazios,

cores neutras e garridas sucediam-se entre o desvanecimento do espaço público e a afirmação

da imagem privada e comercial.

A delicadeza dos edifícios que definem a frente nascente da Marina, afrontavam-se

diretamente com os hotéis que tentam espreitar por cima, na vertigem da visual maresia.

Tivoli, Ampalius, Aqua Pazza e Dom Pedro (Golf), Hotel Crown Plaza e Sheraton destacavam-se

no meio do Casino, que de todos parece zombar na quietude da sua altura.

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Não era nosso pressuposto que a uniformidade, neste caso volumétrica e imagética, fosse uma

característica qualificadora do espaço público, da sua imagem, de qualquer hipótese da sua

qualificação. Se em muitos casos o era, em muitos outros a inversa diversidade era

precisamente a razão de ser da atratividade que esses espaços exerciam sobre quem os vive.

No entanto, como em muitos outros aspetos da vida humana, para que os contrastes se

evidenciem de forma não perturbadora e desestabilizadora, necessitam de uma grelha, de

uma rede de segurança, de uma matriz definida e sistematizada. É assim, por exemplo, em

Nova Iorque, onde a enorme diversidade volumétrica e de imagens se ancora numa rigorosa

grelha hipodámica.

Neste contexto, e para completa equação do acima referido, foram ponderados atentamente

alguns aspetos de disfuncionalidade que caracterizavam a área de intervenção:

Espaços de desenho e escala descontrolados: Ao nível das possibilidades de

transformação qualificadora, destacaram-se alguns pontos da área onde era notória a

pouco atenção ao desenho, resultando numa imagem de escalas descontroladas, com

o asfalto como senhor e rei, fortemente perturbadora da qualificação do espaço

público. Grandes cruzamentos, com excesso de alcatrão e enorme distância entre

espaços de circulação pedonal, não só desestabilizavam a leitura da escala

urbana/humana, como claro sinónimo do predomínio do automóvel e da engenharia

viária, se constituíam como focos de desagrado e insegurança;

Figura 9 – Espaços de desenho e escala descontrolados

Imagem pouco cuidada: Contribuía para o reforçar desta ideia, e da sua efetividade,

um conjunto de pequenos momentos de atuação pragmática e pouco cuidada.

Provavelmente resolvendo problemas urgentes, mas não cuidado de ponderar

devidamente outros que surgiam como consequência, e que, na sua aparente

singeleza, acabavam por caracterizar toda a zona como vítima de atuações de estética

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e qualidade de atuação duvidáveis. Aglomerados amalgamados de equipamento

urbano diverso e dissonante, nomeadamente na sua proximidade e inter-relação;

exposição pública e quase ostensiva de contentores de lixo, mesmo a receber qualquer

um que acabe de chegar à Baixa de Vilamoura e improvisações temporárias que se

eternizavam, em nada contribuindo para a imagem que ainda se tem e se quer ter de

Vilamoura. Mais preocupante ainda, é o facto de estar provado que estes sinais de

negligência, abandono e pouco cuidado, funcionam como rastilho de uma espiral do

declínio, que desestrutura a relação dos cidadãos com o necessário cuidado com o

espaço que é de todos;

Figura 10 – Espaços com imagem pouco cuidada

Resolução pouco abrangente: De sentido idêntico ao ponto anterior, caracterizava a

área de intervenção alguns apontamentos de boas intenções, que, no entanto, não

alcançaram tanta abrangência como poderiam e deviam. Uma louvável rampa, que

uns possíveis centímetros mais recuada, não constituiria uma armadilha no passeio, e

mais uns centímetros ainda (bem possíveis face ao espaço disponível na cota alta),

permitiriam uma inclinação de subida/descida capaz de servir outros que não apenas

os atletas de desporto adaptado, e assim em vésperas de competição. Ou, que

também, por escassos centímetros, os rebaixamentos se pudessem constituir como

um cuidado de urbanidade sem exclusões, e não, mais uma vez, como uma hipótese

de convite ao acidente, vizinho do diâmetro reduzido da roda frontal de qualquer

cadeira de rodas, ou distração com carrinho de bebé. Mais se torna presente, e se

generaliza a perceção das consequências deste problema com a condição de destino

de férias e, portanto, a recorrente utilização de malas pesadas com rodas.

É possível, ainda, referir elementos onde se evidenciava ao mesmo nível a conjugação

deste ponto e do anterior. Sem dúvida que ao serviço de uma necessidade efetiva e,

passe a redundância, necessária. Mas o conhecimento nesta matéria já nos permitiu

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concluir que as opções de desenho/projeto são várias e múltiplas, e, alguma maior

consideração na altura da ponderação dos problemas, permitiria, com certeza,

soluções bem mais integradas, articuladas e qualificadas, do que a triste e infeliz

estação de tratamento de águas residuais, que ocupava de forma pouco digna aquele

que deveria ser um dos espaços mais significativos, simbólicos e icónicos de

Vilamoura: o acesso à praia. Sim, porque apesar de a Falésia poder ter maior projeção,

é esta a praia que carrega com o nome de referência;

Figura 11 – Espaços com uma resolução pouco abrangente

Barreiras arquitetónicas e urbanísticas: Na articulação de um dos vetores centrais da

estratégia de projeto (Acessibilidade e Mobilidade para Todos), com a caracterização

crítica e de diagnóstico que se promoveu não poderá deixar de ser afirmado que este é

um dos aspetos que caracterizava recorrentemente toda a área de intervenção do

projeto apresentado, ou seja, a aplicação do Decreto-Lei n.º 163/2006 de 8 de Agosto.

Figura 12 – Barreiras arquitetónicas e urbanísticas na área de intervenção

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2.4. Elaboração do Plano de Acessibilidade

O crescimento rápido e desordenado do espaço público urbano propiciou o desenvolvimento

de espaços polvilhados de elementos e situações que potenciam a exclusão dos cidadãos,

principalmente daqueles com mobilidade reduzida, quando este deveria constituir-se como

um lugar de, e para Todos. Efetivamente, são muitas as imobilidades que existiam na área de

intervenção, impedindo um número muito significativo de pessoas de vivenciarem estes

espaços públicos que também lhes pertencem.

Assim, entendeu-se fundamental, antes de se iniciar o desenho propriamente dito, elaborar

um plano de acessibilidade com o qual fosse possível obter uma radiografia rigorosa da área

de intervenção em matéria de acessibilidades, enumerando todos os problemas detetados de

forma a ser possível elencar prioridades e definir o programa de intervenção que iria, mais

tarde, dar origem ao desenho urbano.

As barreiras urbanísticas e arquitetónicas ou móveis presentes na área de intervenção (como

representado na figura seguinte), assumiam-se como um fator muito relevante na forma como

os territórios propiciam ambientes e experiências mais ou menos agradáveis, seja a quem lá

vive, a quem lá trabalha ou a quem visita.

Page 20: As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura

17

Figura 13 – Tipologias de barreiras arquitetónicas, urbanísticas e móveis

Por exemplo, os passeios são a base da circulação pedonal do espaço público e, no entanto,

são raras as vezes em que o seu tratamento é pensado em conformidade com a importância

que têm. Ou a distribuição de mobiliário urbano no espaço, da qualidade e conforto dos

pavimentos presentes ou, da relação dos passeios com as passadeiras, sendo frequente a falta

de rebaixamentos dos lancis nas zonas de atravessamento ou a sua errada execução. Aliando

estes problemas à falta de civismo e o incumprimento da lei, refletidos sobretudo no

estacionamento abusivo, a forma desregrada e desordenada como o espaço é ocupado por um

leque diferente de atividades (obras, comércio, etc.) e o modo como a falta de articulação e

coordenação entre serviços (obras, ambiente, fiscalização) gera novas barreiras, percebemos

que estamos perante um desafio que tem de ser encarado de fundo.

Desta forma, e de maneira geral, as barreiras encontradas no espaço público foram várias e

infligindo diferentes dificuldades aos cidadãos, nomeadamente:

Tipologias de Barreiras Arquitectónicas, Urbanísticas e Móveis|Temporárias

Barreiras Arquitectónicas e Urbanísticas

Abrigo de Transportes Colectivos

Armário (EDP, Gás, …)

Árvore

Bandeira

Boca-de-incêndio

Bola, Prumo ou Meco

Cabina Telefónica

Grelha para Caldeira de Árvore

Candeeiro de Iluminação Pública

CicloParque

Contentor do Lixo

Degrau, Escada ou Rampa

Floreira

Gradeamento

Marco do Correio

MUPI

Papeleira

Parquímetro

Passadeira

Passadeira a Terminar em Estacionamento

Passadeira Mal Dimensionada

Passeio Subdimensionado/Inexistente

Pavimento Degradado

Placa Toponímica

Poste com Floreira

Quiosque

Rebaixamento de Passeio

Semáforo

Sinal de Trânsito

Barreiras Móveis | Temporárias

Estacionamento Abusivo no Passeio

Iluminação de Festas e Romarias

Obra ou Tapume

Obstáculo Comercial

Page 21: As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura

18

A existência de degraus em toda a extensão do canal de circulação e a inexistência de

continuidade nos percursos pedonais, cerceadores da capacidade de circulação dos

cidadãos com mobilidade reduzida;

Figura 14 – Descontinuidade dos percursos pedonais

A inexistência de passagens de peões ou passagens de peões com rampas de acesso

indevidamente construídas aumentavam o risco na travessia pela inexistente perceção

dada ao automobilista da presença do peão. Adicionalmente, a inexistência de rampas

de acesso à passadeira causava, como explicado no ponto anterior, descontinuidades

nos percursos pedonais tornando-os inacessíveis;

Figura 15 – Construção deficiente ou inexistência de passagens de peões

O subdimensionamento dos percursos pedonais foi uma barreira recorrentemente

encontrada no espaço público de Vilamoura, impossibilitando a circulação de pessoas

que se deslocam em cadeira de rodas, que transportam volumes ou pais com carrinhos

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de bebé. Este subdimensionamento, é, muitas vezes, originado pela forma como os

comerciantes dispõem, em pleno percurso pedonal, um conjunto de elementos que

perturbam ou impossibilitam a circulação;

Figura 16 – Percursos pedonais estreitos de forma permanente ou temporária

A indevida localização do mobiliário urbano impossibilitava, muitas das vezes, a livre

circulação pedonal quebrando o efeito de rede que os percursos pedonais deveriam

ter. Adicionalmente, a disposição inadequada dos elementos e a escolha de materiais

efetuada, com baixa qualidade estética, transmite a imagem de um território com

baixa qualificação da imagem urbana;

Figura 17 – Indevida localização de mobiliário urbano

Devido à diferença de cotas ao longo da área de intervenção, detetou-se um conjunto

de barreiras arquitetónicas que impossibilitavam o acesso a estabelecimentos de

pequeno comércio, de serviços e aos hotéis. A existência destas situações criava

Page 23: As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura

20

dificuldade de acesso a cidadãos com mobilidade reduzida, discriminando-os quanto à

igualdade de acesso aos espaços;

Figura 18 – Existência de barreiras arquitetónicas no acesso ao comércio e serviços

Em alguns locais, verificou-se que houve a preocupação de tentar solucionar, de forma

pontual, as questões de ausência de acessibilidade aos estabelecimentos. Contudo,

algumas soluções adotadas constituem-se como armadilhas, não só a quem pretende

aceder aos espaços dotados desta “suposta acessibilidade” mas também a quem

circula na via pública;

Figura 19 – Criação de armadilhas na tentativa de resolução da inacessibilidade

Impôs-se pois, que existisse vontade de encarar este problema como ele tinha de ser

assumido, reequacionando-o como uma prioridade no sentido de dar mais qualidade à forma

como se vive o território.

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21

E para que os resultados desejados fossem realmente ajustados a realidade local,

nomeadamente de quem habita, trabalha ou visita, a proximidade em todo o processo de

elaboração do projeto e obra foi extrema, havendo múltiplas reuniões com a Inframoura mas

também com os principais agentes locais, nomeadamente com representantes dos hotéis e do

comércio local, cujos acessos aos estabelecimentos importava assegurar.

Figura 20 – Momentos de discussão e debate em torno do projeto

Assim, porque o que é público deve estar ao alcance de Todos, um dos principais objetivos do

Plano de Acessibilidade elaborado passou por identificar todos os incidentes que limitam a

acessibilidade pedonal, inserindo-os em Sistema de Informação Geográfica e utilizando

métodos de georreferenciação inovadores que permitissem inserir informação em bases de

dados geográficos, de forma rápida e expedita.

Utilizando estes sistemas inovadores de georreferenciação foi possível transpor e representar

em Sistema de Informação Geográfica o resultado obtido com o levantamento das condições

de acessibilidade (figura 21) onde, para o extrato apresentado, foi possível identificar um

conjunto diversificado de situações, nomeadamente relacionadas com a ausência de passeio

ou o seu subdimensionamento, a existência de extensões consideráveis com pavimento

degradado nos percursos pedonais, deficiente execução de rebaixamentos de acesso às

passadeiras ou a sua inexistência e também a existência de caldeiras de árvores que

impossibilitavam a circulação facilitada dos peões. Por tudo isto, a rede de percursos

representada na figura 22 foi considerada inacessível para cidadãos com mobilidade reduzida,

e, portanto, representada a vermelho.

Page 25: As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura

22

Figura 21 – Inserção de barreiras à mobilidade em Sistemas de Informação Geográfica

Figura 22 – Geração de percursos pedonais acessíveis/inacessíveis em Sistemas de Informação Geográfica

Os SIG constituíram, neste projeto, um importante sistema de apoio à decisão política face à

potencialidade existente no cruzamento de informação territorial e aos resultados passíveis de

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23

serem obtidos, permitindo percecionar a espacialização de barreiras arquitetónicas e

urbanísticas e a definição de áreas de intervenção prioritárias.

2.5. Um projeto de cota zero e a aposta nos modos suaves

Claramente o espaço mais solicitado e com maior carga funcional da envolvente da Marina, é

aquele que, não sem surpresa, apresentava os sinais mais evidentes de desqualificação da

imagem e do ambiente urbano. Desafios mais intensos pela complexidade e variação de cotas,

o objetivo complementar era o de implementar uma relação entre o físico e o psicológico,

entre o explícito e o subliminar, entre o visual e o transcendente, que afirmasse: “este é um

percurso preferencial de relação entre as Avenidas e a Marina”.

A concretização de todo o projeto assentou num perfil-tipo que contempla o conjunto das

questões referidas no ponto “2.1. Estratégia de intervenção”, e que, de forma sucinta,

corresponde à criação de uma via de tráfego automóvel onde se introduziu um canal

destinado à bicicleta.

O balizamento de toda a Avenida foi efetuado por estacionamento ao qual foi adicionado o

alinhamento quádruplo arbóreo que funciona aqui de duas formas, na sua vertente climática e

na vertente de segurança rodoviária, protegendo os peões que, não esquecendo, circulam

numa solução “cota zero” e, portanto, em teoria, mais suscetíveis de sofrer algum dano

infligido pelos automóveis.

Adicionalmente, e talvez o ponto de maior relevância, a criação de percursos pedonais com

dimensões consideráveis (nunca inferiores a 1,5m de largura, podendo, em muitos casos ter

dimensão superior), aos quais se adicionaram as linhas de orientação para cegos, pavimento

texturado e de cor contrastante nas passagens de peões.

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Figura 23 – Perfil-tipo implementado na Baixa de Vilamoura

2.6. Um conceito que se quer desenhar

A ideia fulcral do projeto era devolver este espaço urbano ao peão, permitindo, num mesmo

espaço, conjugar as múltiplas mobilidades, e permitir que “cada ator que representa neste

espaço” respeitasse e fosse respeitado, conseguindo-se, desta forma, que todos tivessem

direito ao seu lugar na Baixa de Vilamoura.

O peão dispõe de canais seguros e confortáveis para circular (com a incorporação de

elementos adicionais para a sua orientação) e de locais onde a travessia está assegurada em

condições de segurança, os automóveis dispõem do seu local de circulação (onde antes se

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fomentava a circulação massiva), espaços para estacionar de forma regrada e bem balizada e

os ciclistas dispõem de canais específicos para a sua circulação, devidamente assinalados.

Figura 24– A Baixa de Vilamoura antes de depois da requalificação (1/9)

Figura 25 – A Baixa de Vilamoura antes de depois da requalificação (2/9)

Figura 26 – A Baixa de Vilamoura antes de depois da requalificação (3/9)

Page 29: As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura

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Figura 27 – A Baixa de Vilamoura antes de depois da requalificação (4/9)

Figura 28 – A Baixa de Vilamoura antes de depois da requalificação (5/9)

Figura 29 – A Baixa de Vilamoura antes de depois da requalificação (6/9)

Page 30: As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura

27

Figura 30 – A Baixa de Vilamoura antes de depois da requalificação (7/9)

Figura 31 – A Baixa de Vilamoura antes de depois da requalificação (8/9)

Figura 32 – A Baixa de Vilamoura antes de depois da requalificação (9/9)

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3. Da teoria à prática

Estudando soluções específicas de desenho, espacialização e configuração, de materiais e

iluminação, de sinalética e informação gráfica, tal como soluções específicas de acessibilidade

e mobilidade para todos, na eliminação de barreiras urbanísticas, desenhando percursos

acessíveis para pessoas com mobilidade reduzida, no encontro do mobiliário urbano com

design inclusivo, pretendeu-se reforçada e cristalizada a relação entre os dois espaços pelos

“cordões umbilicais” a reformular e requalificar, cumprindo, desta forma, um papel

estruturante no acesso ao “centro comercial de rua” que caracteriza a envolvente do plano de

água.

Figura 33 – A integração da diversidade nos diferentes usos do espaço urbano

O objetivo foi de que, também nesses espaços, o peão sentisse que era seguro e confortável

aventurar-se no risco acrescido da travessia. Eventualmente, reforçado por soluções

específicas como a arborização, refinamento dos materiais, desenho próprio, iluminação

excecional, etc.

Figura 34 – Os percursos seguros e confortáveis para os peões

Page 32: As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura

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Pretendeu-se, não só, requalificar a escala e ambiente desses espaços, como dotá-los de

identidade específica, permitindo que se afirmassem como pontos de referenciação ao longo

do percurso cinético das Avenidas, em particular, para as deslocações mais rápidas de carro e

bicicleta.

Figura 35 – A implementação de modos suaves de deslocação

Igualmente com o objetivo de que o ambiente tenha referências polissémicas, diacrónicas e

sincrónicas, o estudo paisagístico considerou como critério importante a escolha de espécies

com reforço da variação temporal e sazonal, nomeadamente pela ocorrência de floração.

Diversificando, significativamente, a experiência visual, esta ocorrência permite igualmente

ativar o sentido do olfato, conhecido como o de maior impacto na memorização das

experiências. Assim, esses “cordões umbilicais” apresentam uma imagem sistematizada e

referenciável, que permite veicular a ideia: “este é um ponto de acesso preferencial entre a

rua urbana e a esplanada marítima”.

4. A importância do design universal em todo o projeto

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A importância que a equipa técnica deu ao Design Universal ao longo de todo o projeto está

bem patente em todas as preocupações de desenho. A ideia principal foi a de desenhar

Vilamoura para Todos, para que fosse utilizável pelo maior número de pessoas possível

independentemente da idade, habilidade ou situação física.

Desta forma, foram desenhados diversos elementos de mobiliário urbano especificamente

para este projeto, foi incluído pavimento tátil e de cor contrastante para orientação de cegos e

amblíopes e foram alargados os canais de circulação pedonal para permitir uma circulação

fluida e o cruzamento entre pessoas.

Figura 36 – As preocupações notórias com a usabilidade dos espaços e equipamentos

O Design universal apresenta um conjunto de sete princípios que se incluíram em todo o

projeto, nomeadamente:

1. Uso equitativo - Propicia o mesmo modo de uso a todos os utentes: idêntico quando

possível; equivalente quando não o for;

2. Flexibilidade no uso - Satisfaz uma larga gama de preferências e aptidões individuais;

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3. Uso simples e intuitivo - Utilização fácil de perceber, independentemente da

experiência, conhecimentos, idioma, aptidões e grau de concentração do utente;

4. Informação percetível - Comunica a informação necessária ao utente

independentemente das suas capacidades ou das condições ambientais;

5. Tolerância ao erro - Minimiza os enganos e as consequências de ações não

intencionais;

6. Pequeno esforço físico - Pode ser usado eficiente, confortavelmente e com o mínimo

de fadiga;

7. Tamanho e espaço para aproximação - Tamanho e espaço apropriado para a

aproximação, alcance, manipulação e uso, independentemente da estatura, postura

ou mobilidade do utente.

De forma a tornar equitativo o seu uso, também pelo facto de Vilamoura ser um local de

grande afluência de turistas, introduziu-se, no mobiliário urbano, informação em diversos

idiomas para além do português, nomeadamente, inglês, francês, espanhol e alemão.

E porque falamos de inclusão, de utilização equitativa dos espaços e equipamentos, houve

também inscrição de braille em diversas peças de mobiliário urbano para que, também os

cegos pudessem experienciar o espaço público em condições de plena igualdade com os

demais cidadãos.

Figura 37 – A integração de braille e descrição multilingue

5. Do projeto à obra

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32

Definidos os conceitos e as pretensões de todas as partes para a concretização de ambicioso

projeto, foram transpostas as ideias do papel para o terreno, agilizando-se complicada tarefa

de incorporar, numa mesma obra um sem fim de ideias que permitissem devolver este espaço

urbano ao peão, em igualdade de circunstâncias consoante as suas capacidades de mobilidade.

Figura 38 – Requalificação da Baixa de Vilamoura: a obra

Figura 39 – A Baixa de Vilamoura (re)qualificada (1/4)

Page 36: As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura

33

Figura 40 – A Baixa de Vilamoura (re)qualificada (2/4)

Figura 41 – A Baixa de Vilamoura (re)qualificada (3/4)

Figura 42 – A Baixa de Vilamoura (re)qualificada (4/4)

Page 37: As acessibilidades como vetor estratégico do desenho urbano na Requalificação da Baixa de Vilamoura

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6. Síntese: Vilamoura, um lugar de todos, um lugar de excelência

Com a concretização do projeto, Vilamoura tornou-se, assim, uma zona urbana renovada e

sustentável, acessível a Todos, recuperando a imagem de qualidade que a celebrizou nacional

e internacionalmente como ícone do turismo em Portugal e no estrangeiro em finais da

década 80. Neste momento, Vilamoura afirma-se como um território atrativo para viver,

trabalhar e visitar! De resto, a Inframoura e as entidades locais apostam, neste momento, em

políticas locais para promover o “residir”, contrariando as anteriores políticas com forte opção

apenas num local como destino turístico.

Acreditamos que a aposta na requalificação permitiu, em termos turísticos, aumentar a

capacidade de fixação dos atuais públicos, face à degradação urbana que se começava a sentir

e, por outro, está a permitir a atração de muitos outros, nomeadamente dos cidadãos com

mobilidade reduzida (seniores, pessoas com deficiência, famílias com crianças, etc.).

De resto, em pleno ano de crise financeira que o país está a atravessar, o Algarve foi escolhido,

neste ano de 2012, por muitas famílias que não viajaram para o exterior e Vilamoura já está a

ter resultados na escolha por parte de muitas famílias. Algumas delas apontam a seleção do

local por saberem que agora tem boas condições de acessibilidade podendo levar os carrinhos

de bebé, ou mesmo levar pessoas de idade avançada. Algumas famílias, com pessoas com

deficiência, apontam o local pelas mesmas razões não ignorando algumas que dizem que

Vilamoura apresenta elevadas condições de qualidade urbana e ambiental.

Hoje vamos ao local e vemos um palco cosmopolita, em que os modos suaves são a sua opção

de excelência. O uso da bicicleta, o andar a pé, as caminhadas, os passeios pelos decks entre

árvores e flores que pintam o chão organizado e sem barreiras, mostra que afinal é possível

desenhar uma cidade inclusiva, uma cidade para todos.

É certo, que esta ainda é apenas uma fase da estratégia global da Baixa de Vilamoura e muita

obra terá ainda de se construir no futuro. Contudo, os resultados já são tão positivos que

encorajam a equipa mpt® e outras a desenharem com toda a convicção e determinação em

conceitos de espaços desta natureza. São espaços diferenciadores. São espaços de todos. São

espaços intuitivos. São espaços simples. Enfim, tudo aquilo que está inerente ao

funcionamento do desenho urbano pela aplicação dos sete princípios do Design Universal.

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7. Equipa projetista da mpt® – mobilidade e planeamento do território, lda

Coordenação Geral

Paula Teles, Eng.ª Civil

Coordenação de Urbanismo e Arquitetura

Fernandes Andrade, Arq.º Urbanista

Coordenação de Engenharia

Machado dos Santos, Eng.º Civil

Costa Simões, Eng.º Eletrotécnico

Estratégia de Desenvolvimento Local

Pedro Ribeiro da Silva, Consultor em Urbanismo e Turismo

Equipa Técnica

André Bevilacqua, Arq.º Urbanista | Daniel Geada, Arq.º | Nilton Marques,

Arq.º | Marcelo Altieri, Arq.º | Tiago Oliveira, Arq.º | Ana Silva, Arq.ª Paisagista

| Hugo Carneiro, Arq.º Paisagista | Raquel Colaço, Arq.º Paisagista | Jorge

Gorito, Geógrafo