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Il1MA HISTORIA DO DESPORTO EM PORTUGAL Yolume III - Associativismo e Estado ,!Cna Santos, Rahul Kumar, Pedro David Gomes, Raquel Carvaiheira, "':!nO Domingos. Alfredo Rosas e Vftor Sergio ferreira :opyrigllt 2011 Autores e QuidNovi "eservados todos os direitos para estd edi,ao r,Jordena,30: Jose Neves e Nuno Domingos :3pa: Sara Soares/OuidNovi :tagina,ao: Joel Rocha/QuidNovi mpressao e acabamento: Peres'Soctip. S, A, www.soctip.pt) ·a edi,50; Outubro de 2011 SBN: 978,989-554,889,7 3€posito legal: 33.1771/11 CUIDNOVION Edi,ao e Conteudos. SA Rua 10 de Junna, 54 ' Aveleda 4485,029 Vila do Conde Tel. +351229 3881551 fax, +351 229 388155 www,quidnovLpt I quidnovi@quidnovLpt £di,ao promovida pela Comissao Nacional para as Cornemora,i5es do Center,ario da Repilblica nambito do Programa das do Centenario da Republica. UMA HrSTORlA DO DESPORTO EM PORTUGAl, Classes, AssociativisInO e Estado [Q)

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Page 1: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

Il1MA HISTORIA DO DESPORTO EM PORTUGAL Yolume III - Clas~es Associativismo e Estado Cna Santos Rahul Kumar Pedro David Gomes Raquel Carvaiheira nO Domingos Alfredo Rosas e Vftor Sergio ferreira

opyrigllt 2011 Autores e QuidNovi eservados todos os direitos para estd ediao

rJordena30 Jose Neves e Nuno Domingos 3pa Sara SoaresOuidNovi taginaao Joel RochaQuidNovi mpressao e acabamento PeresSoctip S A wwwsoctippt)

middota edi50 Outubro de 2011

SBN 978989-5548897 3europosito legal 33177111

CUIDNOVION Ediao e Conteudos SA Rua 10 de Junna 54 Aveleda 4485029 Vila do Conde Tel +351229 3881551 fax +351 229 388155 wwwquidnovLpt I quidnoviquidnovLpt

pounddiao promovida pela Comissao Nacional para as Cornemorai5es do Centerario da Repilblica nambito do Programa das Comernora~6es do Centenario da Republica

UMA HrSTORlA DO DESPORTO EM PORTUGAl

Classes AssociativisInO e Estado

[Q)

Pesos halteres e sentidos dos corpos (h)alterados urn seculo de muscula~ao

em Portugal

[VfTOR SERGIO FERREIRA]

A muscufrio corresponde a uma actividade fisica que pressup6e a

realiza00 progressiva de urn conjunto de exerdcios racionais met6dicos

instrumentais e repetitivos de forlta e resistencia que implicam a sobreshy

carsa de zonas muscu~ares concretas com recurso quer aos tradicionais

pesos livres como barras -e alteres quer a cad a vez mais sofisticados

aparelhos ergonomicamente adaptados avariedade do corpo humano

Capitalizado nas suas capacidades motora e energetica 0 investimento

corporal implicado na musculaltao e potencialmente traduzivel em forlta

e desempenho fiico

No entanto recentemente em tempos de carpolatria l a sua capishy

talizaltao em termos esteticos e pListicos tambem tern vindo a ser valoshy

rizada quando 0 movimento implicado neste sistema fisico passa a ser

convocado sobretudo com 0 objectivo de esculpir e moldar a materia

organica a carne Numa sociedade gue cad a vez mais prescinde da

forlta e do seu rendimento 0 musculo gue a potencia converte-se

simplesmente em aparencia

De facto a I6gica da promoltao da imagem tern encontrado na

musculaltao urn dos dominios de aplicaltao por excelencia De acordo

com a frequencia semanal da pdtica as cargas utilizadas 0 numero

de repeLlc6es a velocidade e a amplitude de execultao cada exerdcio

obtem diferentes resultados sobre 0 crescimento da massa muscular

231

CLASSES ASSOCIATlVISMO E ESTADO

do praticante desde a sua manutenltao tonificaltao ou definiltao ate

ao seu aumento acentuado designado hipertrofia

A musculalaquoao difere do tlsiculturismo do halterotllismo (levantashy

mento de pesos olfmpicos) ou do powerlifting (levantamento de pesos

basicos) na medida ern que se trata de uma actividade ffsica praticada

uma forma nao competitiva - ainda que normalmente 0 treino com

pesos e tfeinos de for~a fatam parte do de aClividades dos

atletas dessas modalidades Foi alias sobretudo enquanto treino comshy

plementar funcional e sem autonomia espedfiea que subsistiu ern Porshy

tugal durante grande parte do seculo xx De facto apcsar presente

no pais a pratica mnselllaltao enqultmto actividade fIsica relativashy

mente autonoma outras nao obteve sucesso senao recentemente

C haUeres no

do povo portugues

Escrevia-se na coluna sobre Vida Sportiva do jornal A Capital em

1926 em jeito de critied aeampanha publiea que estava a ser realizada

do rninistro da Instrulaquolt1o para terminar com a Parada da Ginastica

da Festa Nacional de Edueacao Ffsica I Ioje em rodas as nar6cs civilizashy

a educaltao tern urn lugar paralcIo aeducarao mental E

Porque cIa e considerada nao apenas como urn passatempo 11111 recreio

uma missao mas prineipalmente como 0 linieo meio de conservar e

melhorar um povo uma ralta Euma obrigaltao individual eum dever

sociaL Logo e preeiso mais e indispensavel que reeonheyam a

absoluta nccessidade da eduealtao corporea Nos nOSS05 mats ao que

nunea se veritlca que para Imar eom vantagem contra as tempestades

vida nao basta eapacidadc mental - e indispensavel eapacidade ffllica

Esta e uma verdade incontesciveL E nao queirarn fuzer dos rapazes plantas

de estufa ( ) Se os exerdcios exibidos sao violentos 0 que e bastante

discutivel reduzam-se substituam-sc modifiquem-se mas nao se deixe

de realizar essa festa louvavel sob rados os pontos de vista1

232

I PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AITERADOS

I Certo e que a eapacidade fisica da moddade da epoca nao era das

mais roblL~tas Alias a mesma pagina desse jomal apresentava urn pequeno

anlmcio publicitario as vantagens da Farinha Lacto Licishy tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira Lto para combater 0 raquishyI que dominava entre a juvcntude da epoea No mcsmo senti do

era talllbem anunciado na primeira pagina mesmo jomal 0 Iodo-I

I

wn reconstituinte poderoso cientffico e racionaI especialmente

dirigido a crianltas fracas Numa epoca em que a fome e as mas conshy

dic6es de vida grassavam em Portugal debilitando a saude 0 rendishy

mento 110 trabalho e ate mesmo a de muitas erianltas e jovens 0

lCvigoramento fisico das Illais novas geraroes rornou-se urn projecto

do regime que se instaurava

Entre os varios meios cientificos disponiveis ao desenvolvimento

eorpos franzinos e raqulticus a Educaltao FIsiea enquanto disciplina

providenciada pelas insrituioes publieas foi assumindo

mas nao sem Entre varios motivos porque 0 regime nao

pretendia que esta disciplina integrasse exerdcios violemos Estes nao

s6 poderian1 lesionar as ja fdgeis corpos dos seus cxecutantes como

ainda estimlllar a produltao desses corpos herclueos que sistemas Hsicos

estrangeirados nomeadamente provenientes dos Estados Unidos da

America tentavam iaInbem moldar no pais esta nao

simpatizava com esses corpo eolossais que 0 repllblicanismo havia proshy

nao apenas par uma questao estctica mas sobretudo pelos

res modemos e progressistas que representavam

Sfmbolo mundano do ascetisrno earaeterlstico da etica protestante

anglo-sax6nica 0 body building - forma como a muscula~ao eomerou

por se chamar4 - representava nao apenas valores como disciplina e

esforlaquoo mas tambem sucesso elllpreendedorismo e fona de vontade

pessoal fundamentais ao funcionamento ordeiro de uma sociedade que

se pretendia democratica racionalizada e industrializada Surgida na

lnglaterra vitoriana de meados do seculo XIX foi de facto nos Estados

Unidos da America que a muscularao mals se expandiu enquanto sisshy

tema Hsico criado com 0 obiectivo de moditlcar os corpos sobretudo

233

1 CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

masculinos atraves do aumento hiperb61ico da massa muscular Foi at

que desde finais do seculo XIX esse sistema fisico passou a ser produzido

em larga escala sendo comercializado nacional e intemacionalmente5

Comeltou por ser urn sistema fisico desenvolvido por entre gentes

de feiras circos e freak-shows itinerantes por entre a Europa e os EUA

onde corpos apolineos de lutadores e artistas-Ievantadores de pesos e

alteres em tangas de pee de leopardo participavam de uma cultura

visual que hiperbolizava a virilidade masculina atraves de demonstrashy

ltoes espectaculares de volume e forlta muscular Depois autonomiza-se

e amplia-se com a emergencia de campeonatos desportivos bern

como de todo urn mercado de equipamentos e sistemas de produltao

muscular que veio a estend~r-se dos clubes ou sociedades de ginasshy

tica a proprilt1 vida domestica e profissional com a comercializa=ao

de maquinas e sis[emas de movimento para utilizarao na sala eou roo

local de trabalho

Ainda que xiLanJ indicios da tentatiYa de integrarao deste tipo

de sistema em Portugal a visibilidade social que colossos musculados

poderiam obter era susceptive de ferir a paisagem moral que Salazar

idealizava Corpos como 0 de Manue da Silveira6 ou 0 de Francisco

Padinha7 - famosos recordistas mundiais de pesos e halteres durante a

I Republica ~ nao eram especialmente apreciados peas novas instancias

de poder

Em ruptura com concepltoes libertarias e viciosas do republicashy

nismo 0 corpo masculino ideal do Estado Novo nao correspondia a

uma cultura fisica atletica em que as priticas fisicas de modificaltao

corporal serviriam propositos frivolos hedonistas e individualistas assoshy

ciados abeeza ao prazer e asatisfarao pessoal do homem Aquee corpo

vinha antes ao encontro de uma cultura fisica higienista e moralizadora nao so com 0 objectivo colectivo de tomar os corpos dos jovens portushy

gueses mais fortes resistentes e imunes mas tambem socialmente mais

respeidveis e disciplinados A promoltao da saude do corpo nao s6 se

revearia no rendimento fisico do trabalho como Faria transparecer as

qualidades morais do individuo que se pretendiam de acordo com a

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

nova ordem moral e social pretendida para a narao portuguesa Cada

corpo individualmente deveria entregar-se aautoridade do ideal colecshy

tivo e deixar transparecer os principios cristaos e politicos do regime

urn ideal fisico de virtude e pudor obediencia e disciplina sobriedade

e austeridade higiene e robustez8bull Urn corpo dedicado a Deus aPatria

aFamilia e ao T rabalh09bull

Instituiltoes como a Mocidade Portuguesa ou a Fundarao Nacional

para a Alegria no Trabalho em articularao com instituiltoes medicas

desportivas pedagogicas eclesiasticas e politicas adquiriam urn pape

central nesse projecto colectivo Atraves deas 0 Estado Novo tentava

toniflcar fisica e moralmente a sua juventude reformando-Ihe 0 esqueshy

leto ea musculatura tornando-lhe 0 espinhalto rijo e 0 pulso vigoroso

camo descreve Ines Brasao lO bull 0 incitamento ao exercicio fisico que os

jovens encontravam nessas organizaroes visava [[ansformar potenciais

corpos definhados enfezados e raquiticos em corpofrobustDs corados

e verticais capazes de enfrentar quaisquer adversidades a bern da naltao

Scm alinhar porem nos principios tecnicos e morais do body building norte-americano evitando que 0 corpo dos seus praticantes Fosse abanshy

donado a excessos apoHneos e narcisistas

A preocuparao poHtica com a fisicalidade dos portugueses favoreshy

ceu sim a adopltao do sistema fisico de Pehr Henrik Ling (1776-1839)

urn sueco cuja doutrina de educaltao fisica havia sido posta ern pratica

em outras naroes europeiasll 0 objectivo deste sistema nao era 0 adenshy

samento do sistema muscular mas 0 desenvolvimento racional de roda

a fisiologia e morfologia corporal de forma a socializar 0 praticante no

autocontrolo social das suas manifestaltoes fisicas e emocionais Vulgarshy

mente conhecido por ginastica sueca tratava-se de urn sistema racioshy

nal de exercicios localizados e sequencialmente cadenciados promotores

da respiraltao da verticalizaltao do aprumo e da correcltao dos movimenshy

to Executados em colectivos sincronizados e uniformizados de branco

sugeriam uma imagem de disciplina e ordem de pureza fisica e moral

de cooperaltao e de exortaltao nacional que esbatia e determinava as

singularidades de cada corpo fisico em nome do corpo social

234 235

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

Do sistema de Ling pretendia-se 0 adestramento de

des instintivas dos jovens rapazes atraves da incorpora~ao do gosto

disciplina e obediencia ligado a uma instru~ao militar preparat6shy

ria vocacionada para demonstralt6es de engralldecimento e exaltaltao

da patria bem como a seu tempo para a defesa do Imperio A forlta e

) tonicidade dos carpos masculinos bern como a ordem e a disciplina

colectiva quc demonstravam aquando das marchas plihlicas dos

filiados nos quadros da Legiao ou da Mocidade Portuguesa

simbolicamente a projecltao social da for~a do Estado sobre 0 territorio

nacional e imperial Mais do que replicar criterillS bcleza associ ados

a toniftcalt~o muscular a gi1astica suecaambicionava promover aptishy

does morais =1UaVeS do descnvolvimento racional e equilibrado d~ fisioshy

logia e morfokgia do corpo Cumprir-sc-ia assim 0 adestramento corshy

poral prescrito por Juvenal- mens sana in corpore sana - maxima eF

que em saLujsmo escorrcito queria dizer t()rmaltao da consciencia na

e atraves da disciplina e submissao dO$

Sinais demudanlta medraram nas decadas de cinquentae sessenta

Algumfl ousadia e desejo de ruplura nas atitudes e cuidados com 0

corpo ganharam enfase por cntre as camadas juvenis mals escolarizadas e nem sempre d6ceis e acriticas Muitos rapnes e rapallgas as corpos nao tanto pOl referencia as insrancias socializadorao do regime mas reportando-se as corporalidades

mais mundanas que se davam quotidianamente a ver nos jornais revisshy

tas cartazes espectaculos cinema e televisao Movidos pelas novas

referencias simb6licas que estes meios trouxeram assim como pelo

proprio comacto social quotidiano com os sectores femininos da popushy

laltao quer no trabalho quer na vida mundana os homens veem-se

socialmente pressionados para melhor cuidar a sua

corporal

A clegancia corporal de cones cinematogrMicos como John Wayne

Clark Gable ou Gregory Peck concorria socialmcnte com a virilidade

ostensiva de corpos como 0 de Tarzan Taborda13 pOI exemplo que

atraam a ateIlltao dos home11s e 0 desejo das mulheres para os ringues

236

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

portugueses de lura livre Escrevia Garcia Alvarez no jornal Record

ainda em 197214 Embora possua pouca yoga no 110SS0 Pais 0

rismo consegue chamar a 5i a atenltao eo interesse de rnilhares de adepshy

tos e goza de justificavel prestigio em muitos paises do mundo

palmentc no outro ado do Atlantico Na America do Norte entao

multiplicam-se os torneios para apuramento dos corpos mais modelares

diremos mais modelados - subsistindo 0 maior interesse e

entusiasmo pelas sucessivas deilt6es do laquoMr qualquer coisaraquo que culshy

minam com os certames correspondentes adesignaltao do laquoMr USAraquo e

do laquoMr Universoraquo A Falange feminina nao perde pitada destas compeshy

tilt6es seguindo com entusiasmo indescridvel as actua~6es mais salientes

respectivos idolos do momento

A tradicional alfaiataria entra em crise nos anos setenta nomeadashy

mente com a emergencia industria do proflto-a-vestir uma realishy

que tambem c011quist3 0 consumidot masculino 15 As Iinhas rna is

iDrmais e rfgidas no modo de vdtir sao ahandonadas e suhstitufdas

por uma moda jovem promotora lima silhueta mais leve e conshy

forrive que marcava e enfatizava as formas corporais Por outro

a progressiva expansao do direito a tempos de lazer e a ferias remuneshy

radas simuldlneo a propagaltao de parques de campismo e dos ideais

contacto com a Natureza tambern contribula para a exposi~ao de

urn corpo que se deveria mostrar atractivo por emre trajes de a

banhos cada vez mais cunos

Libertando-se das vesLimentas que os encobriam e dissimulavam

as corpos vao-se entao progressivamente desnudando e exibindo ao

lange da segullda metade do seculo XX portugues Vma liberdade

contudo condicionada por novas forltas e institui-oes sociais geradoras

de novas exigencjas e expectativas sociais que em condilt6es de exposishy

publica os tendem a encarnar e a moldar

nao vdculo de um projecto de identidade naclOnal au apenas

instrumento que carece manter robusto encrgico e bern nutrido para

trabalhar e garantir a sobrevivencla 0 corpo p6s-democratico ganha

visibilidade e valor social entre as mais novas de portugueses

237

U ~1~

i11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

enquanto acessorio de identidade pessoal que urge cui dar investir e

plan ear Particularidades 1uperHuas que passavam discretamente por

entre roupas que 0 vclavam ganham 0 estatuto de imperfeiltao que urge

combater em nome novos canones corporais 0 corpo deseja-se agora

perfeito reHectindo uma imagem jovem e saudavel

o projecto colectivo de revigoramento f1sico politicamente conshy

duzido entao lU2ar a projectos individuals de manutencao e modishy

ficacao aconteceu nao apenas devido amudan)a de regime

politico mas tambem no contexto de urn conjunto alterayoes estrushy

turais na sociedade portuguesa ondc novos agentes e dinamicas mershy

cantilistas passaram a investir em forra Os pesos e halteres ltllCaUaIll

urn novo protagonismo social no mercado poftugues ganhando novos

contextos sociais e novas contlguraocs em varias actividadesffsicas

meios competitivos do balterofilismo do boc ou da

luta liv- ondc cram convocados como treino complementar para

autonomia relativa nas inumeras salas de ginasio e health

dubs onde passaram a ser mercantilizados no ambito de modalidades

pr6prias

Pesos e alteres na recente industria de design corporal

N urn contexto onde homens e mulheres passaram a exibir e

mais atentamente as suas aparcncias as foryas privadas do capitalismo

acabaram por contribuir mais do que as instituiyoes publicas higienistas

na difusao de novos habitos e cuidados corporais A incipiente

da moda e do design corporal que ja havia despontado antes do de

Abril cresce numa escala mais alargada e diversificada fragmentando

produtos e clientelas e alimentando expectativas e aspiraltDcs diferenciashy

das do passado Mais do que 0 ambicionado relligoramento fisico as

exigencias e desejos sociais gerados por essa industria VaG agora no senshy

tido do rejullenescimento C do aperfeiroamento da imagem e forma corshy

porais produzindo a ilusao massitlcada de cada um planear e

238

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

esculpir 0 pr6prio COIPO dentro urn padrao de beleza estabelecido

globalmenteo

Novas lojas fabricantes e empresas nacionais e internacionais vem

afirmar-se no mercado portugues disponibilizando modernos e

ticados produtos tecnicas e serviyos de modificacao e manutenyao

corporal em esferas diversas Da cosmetica a da cirurgia

ao nutricionismo dos centros de estetica aos spa toda uma pletora

de bens tecnologias e servios de bem-estar e bem-parecer do corpo

que prometem 0 ajustamento aos canones corporais do momento l6

por sua vez no que a masculinidade dizem rcspeito veem

substituir a clegancia eo glamour das estrelas de cinema dos anos cinshy

quenta pda fora e vigor de herois de torso em forma de V represenshy

tados por Arnold Schwarzcnegger Sylvester Stallone ou Jean-Claude

Van Damme

POI entre esra florescente industria de aesigncorporal o cresshy

cimento de iniciativas comerciais de actividade fisica geridas por pane

do sector privado qlier ao nlvd do invcstimento em produtos para

em espao domestico desde sistemas de exerdcios peri6dishy

cos espccializados roupa e calltado ate equipamemo caseiro diverso17

quer ao nivel do investimento em espayOS colectivos proporcionadores

de um conjullto de produtos e servios bem-estar e bem-parecer

Esses espayos colectivos comc~aram por assumir a forma de ginasio

de bairro contexto popularizado nos anos oitenta Nestes a musshy

culaao surgia com lugar destacado ao lado de novas modalidades

como a ginastica aerobica a primeira mais orientada para urn publico

masculino a segunda para urn pliblico fcminino A pratica da muscushy

lacao poren1 ja adicionava aos tradicionais pesos e halteres rnodernos

cquipamentos ergonomicos dotados de um design mais apelativo onde

cada detalhe passaria a ser concebido com 0 intuito de proporcionar aos

novos LlllLaUUU~ urn trcino menos arriscado e sofrido mais comodo e

con fomlveL

Postcriormente ja proximo anos noventa a musculayao toi

dlUIlllUa no con texto dos clubs que vieram a instalar-se

239

CLASSES ASSOCIATIVrSMO E ESTADO

em espaos multifunciol1ais deposidrios de valencias diversas

nas areas da da saude da alirnentacao e do lazer corporal muishy

tos representantes de cadeias internacionais que se instalaram em

algumas das principais cidades pormguesas com elevados invcstimentos

em sofisticadas tecnicas de gestao mflrketing e publicidade para cap tar

e ftdelizar potenciais publicos-alvo Entre 0 ann 2000 e 0 ana de 2008

o numero de health clubs em Portugal passou de 600 a 1400

bando mais de 600 mil mernbrosl 8bull Com uma

57 em Portugal estas estruturas facturam

euros

ras os

mais 1

mIS riscos e caracteristicas

um programa de Heino adequado a detershy

rrunaao corpo e acompanhar individualmente a sua exccuao

- C0 do egolmilriintO que perpassa no desporto

amador contemporaneo um dos produtoslservi~os em que

os health clubs mais apostam hoje ern dia devido aos ganhos financciros

proporcionados exclusividade desse servico urn dos mais caros para

o cotlSumidor

Concomitamemcntc novas actividades ffsicas e desportivas emershy

gem no ambito destcs novos espaos anunciadas como esteategias para

enfrentar e Edar corn os duros dcsafios da sociedade contemporanea ao

mcsmo tempo que velhas modalidades se rcnovam e sofisticam transshy

formando-se em mercadoria vendavel e derelativamente faeil

lidade Sistemas fisicos ancestrais como 0 por

exemplo ou ate mesmo varias artes enquanto

no

A sempre presente nos ginasios

a pesos e halterc~

240

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTFRADOS

acurnulado de

oHlzaoo de

dlllCllU e coreografado ao

fIrmo de musleas do momento que apresenta como relatishy

vamente ao esquema anterior 0 facto de eoncentrar uma quamidade e

de exerdeios musculares num curto periodo de tempo

45 a 60) reeuperando as da pratica desporriva

em grupo e desta fonna proporcionando um ambieme estimulante e

divertido

o objccrivo inicial do body pump nos anos novema ted ido em

medida lucrativo atrair 0 publico-alvo maseulino para a pdtica

de ccrclcio fisico eolectivo nomeadarnenLe ao da ginistiea aeroshy

scm contudo deixar de Ihes proporcionar 0 e atletieo

que indiidualmente a pcatica da musculacao lhes concediarn O~fdy

pump a par de outras modalidades que foram sob 0 mesrno COI1shy

ceito (designados de body training ou group como 0 body balance body combat body body

jump ou 0 spinning - RPlvf) tern a

registadas

monitores

COlllerClaUampauas eoroduzem-se exactamente nos

exerdcios e re1pectJlVO

uallzaao a cada tees meses de a a desmlotlV3ltao

por via da repctiao continuada

muitas dessas modalidades nos anos noventa vieram

U~LdUlUllC no sentido de diminuir 0 sofrimento do treino solidrio ClStishy

dioso silencioso e ascetico gue ate af implicava 0 treino tradicional de

muscular substituil1do-o pelo divertimento proporcionado

soeiabilidade e a mitsica que passaram a parte desses sistemas

241

- CLASSES ASSOClATrvISMO E ESTADO

treino 0 que vern corroborar empiricamente a hipotese avanshy

ltada por Lipovetsky de que hoje em dia 0 desporto de massas eessenshy

cialmente uma actividade dominada pda procura do prazer

mismo energetico da experiencia de si proprio depois do desporto

disciplinar e moralista cis 0 desporto-lazer a desporto-saude 0 desporshy

to-desafio Da pratica desportiva esperamos apenas sensalt6es e equilibr

valorizasao individual e evasao norma e descontraclt3o ja nao e a vinude que legitima 0 despono mas sim a emmao corporal 0 prazer

a forma e psicologica 0 des porto tornou-se urn dosemblemas mais

da cultura nardsica centrada no extase do

Oprocesso crescimento e de diversiflcaltao comercial das activishy

rades ffsicas indoor beneficiou durante os anos oitentac noventa

uma conjuntura economica favorivd caracterizada pdo aumento do

poder de compra da populaltao portuguesa tpela melhoria das de vida alguns dos seus sectores e sociais nomeadamente

classes rr Mias A proliferalt3o de gimisios health clubs foi ltlinda

favorecida pdo prolongamento quer da esperanlta media de vida quer

das processos de escolarizaltao e de transiltao para a vida adulta Estas

din1Unicas que efectivamente fizeram dos reformadas e dos jovens

estudantes publicos-alvo fundamentals na promQ(ao de actividades

fisicas no espalto do ginasio considerando 0 tempo que tern POLCllUltUshy

mente disponivel ao longo do dia nome~damente fora das hons

maior wifego nos ginasios (perfodos almolto e p6s-laborais)

Urn outros pltblicos-alvo a que este segmento da indUstria de

design corporal mais se tem dirigido tern ido os homens mais disponishy

ao consumo dos sellS produtos e servi~os A imagem de

pader e competencia produzida e difundida pela publicidade e pclas

revistas hoje dedicadas ao segmento masculino ji nao e reflectida apenas

atravcs de sfmbolos tradicionais consumo masculino como 0 carro 0

relogio ou a can eta mas tam bern atraves investimentos na proawao

e manutenltao da aparencia fisica que tende a perder 0 formalismo do

fato-e-gravata A imagem de urn hamem atletico e cuidado passa a ser

inclusivamente apresentada como chave do sucesso entre as

242

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AITERADOS

mais exigentes quanto aDS cuidados masculinos com a imagem Esta nova

mostra um novo homem preocupado com a flexibilidade da

sua pele com a domesticaltao dos seus odores com a qualidade do seu

[[sico com a tonicidade da sua silhueta com a definiltao do

seu abdomen com 0 volume do seu biceps A pdtica de musculaltao

assume entao tun valor estratcgico na produltao do actual corpo mascushy

referencia e de reverencia

Trata-se de facto do regime corporal socialmente mals difundido

estrategia de promoltao de urn modelo corporeidade ma~cu-

modelo adetico com acento na potencia vitalidade

IHUgtCUlaL 0 que de resto nao sera de surpreender dada

a diiilsao incorporada de estereotipos da sociedade ocidental sabre a masshy

que tradicionalmemc ligam os padr6es de perfectibilidade e

atractivlhde masculina ao modelo de corporeidade mesomorfico e hipershy

troEado em medida cOlldensado na massa muscular tCUlllUldUd

nos peltoral~ braltos e costas esnuturando um torso de

adclgalta ate a

Um homem deve ter os ombros mais largos do que a anea ter uma

anca fina e deve ser algo robusto mats cheinho Mais cheinho

mas nao e em gordura e em musculo ( ) Estou contente com 0 ter

aos 80 Guilos Acho que eu ainda tenho muito parauabalhar

ainda me falta muito trabalho frente Ainda vai ser uma coisa

que YCJo-me nos pr()X1mOS 6 an os a ter de trabalhar 0 corpo ate cheshy

gar 11 tal forma ideal ao corpo ideal ( ) Eo tal corpo masculino com

os ombros mais a cintura mais em V - Ii esra 0 torso em

V - e musculado

ESTUDANTE UNlVERSITiillIO 21 ANOS PRATICANTE DE MUSCUIAtAo

porem scm a rudeza do passado impressa pelas condilt6es de

nabalho que sem intenltio moldavam 0 corpo 0 corpo do hom em ja nao

e urn mero instrurnento que se abandona ao trabalho mas de proprio

243

CLASSES ASSOCIATfVTSMO E ESTADO

MlllUCla como COOl

extracltao total dos pel os que possam encobrir 0

ao

da simetria muscular conseguida

Mas os corpos femininos tambem nao ficaram de fora dos sistemas

fisicos associados a muscutaltao Com objectivos mais moderados em

termos de volume corporal e sobretudo direccionados para a perda de

adiposidade e tonificaltao determinadas zonas do corpo as mulheres

encontraram res posta aos seus anseios corporais sobretudo nos body Mesmo

aos pesos e e aoontrario

publico masCilliri~ as roulheres tendem a

do corpo como (lllS de intervenltao prioritaria no sentido da manuten

ltao ou mociitJG50 Face a tais aspiraltoes a chegoll

a conceber um sistema fisieo particular para dar ao pllbico

especificameme feminino comercializando-o sob a designaltio de GAP

uma modalidade que promove 0 trabalho de resistencia e forshy

talecimento atraves de varios exerdcios localizados nas zonas

dos gl(lteos abdommalS e pernas

Eu era ter aqude corpo musculado corpo bonito

que tada a gente rilio e () Nao llma mulher eXclgeJradamell1le

muscuCida porque perde os trayos femininosEuma mulher ddinida

Nao precisa de ser magra Nao acho que eaquele estereotipo de magre-La

que cada vez ha mais que leva as miudas hoje em dia a rornarem-se

anonxicas ( ) Hoje no ginasio a imagem que se quer passar e que

essa nao ea nao eo ideal de urn corpo 0 ideal de urn corpo e umamulher a mulher nao precisa de estar MOr

desde que bem ueWllUa e0 ideal

23 ANOS 120 ANO INSTRJroRA DE CARDlo-FrfNESS

244

PESOS HALTERES E SENTiDOS DOS CORPOS (H)AIrERADOS

tern

cas no seio da industria de design corporal Como assinala Fortuna

os de edllcalt3o ffsica tinham como vocaltao disciplinar 0 corpo

para for mar rnelhores cidactios mais saudaveis e competemes prepashy

rando-os para os desafios das novas sociedades surgidas com a industriashy

os actuais health clubs por seu lado associ am a juventude a

beleza e a satide do corpo aamo-confianya aauto-estima e ao bem-estar

ol(rcendo prodmos e serviltos a moldar 0 corpo amedida

e preocupalt6es de

outros mats imageticos

some body Estar em mostrar (determinadas)

A manifestalt3o mais valorizada do corpo saudavel deixa de

ser a seu rendimeDto fo1lta e para passar a ser a sua aparenshy

cia A sallde cosmetiza-se e torna-se num fen6meno estetico nao basta

mante-la mas fazer transparece-la nomeadamente atraves da aquisiltao

urn corpo perfeito Este par sua vez passa a ser condiltao sine

non para 0

Higt LdllI-la para a ser

Eu via que tinlIa urn corpo com varios problemas Precisava de

rirar a barriga algum poeu e Tinha urn peito quase fundo dentro

quase que nao se via a barriga mais saida que 0 peito Via que tinha

problemas e estava a caminhar para 0 problema da obesidade ( )

Agora quando olho para 0 espdho vejo urn corpo perfeito 0 que todo

o hornem gostaria de tef E simo-me orgulhoso por isso

AUXILlAR DE ACOO MEDICA 120 ANO 24 ANOS

PHKnCANTE DE

245

CLASSES ASSOCIATIVLSMO E ESTADO

despono ou pelo menos efectuar com regushy

[sica passou aser nao apenas urn direito25 mas

tambem urn dever sociedades contempodneas um

cuja falta acarreta frequentemente sentimentos de culpa pessoal

e aclt6es de sanyao social sobre aqueles que se encontram pouco

a descobrir as suas supostas vantagens ou cujos corpos se afastarn

da normatividade da silhueta canonica quese deseia bem deflllida e

tonificada

Pesos e halteres entre 0 estUode vida saudltivel doeura ddec a a sau

Se a pFl1rllpaltao com os cuidados corporlis era anteriOrrneHr proshy

pria das classt~s onis lhastad3s nas condilt6es

oitenta f) portugues comum passa a tcr acesso em qualqucr sureil1ler~

cadoa uma pan6plia de prodUloh tecnicas e servicos que prometem criar

e conservar um corpo jovem perfeira e saudive qualidades de refeshy

rencia e reverencia no culto conremporaneo do corpo Socialmente apreshy

sentados e mercantilizados em associacao acriacao de urn

produtor de salIde e preventor doenca tais produtos tecshy

nicas e servi~os sao frequentemente assumidos na vida quotidiana Como

sendodo oll mais importante que os propdes servicos de saude e de

prestacao de cuidados medicos na concretizayao do bem-estar fisico e

psicologico das pessoas A ideia hoje partilhada no imaginario

de que a saude ealgo que se conquista ccoroHrio simb61ico da delegashy

ltao social no individuo das formas manutenlt3o controlo e vigilancia

do corpo que outrora haviam sido exercidas pelas autoridades

A difusao e enraizamento social da assuncao de que e possivd obter

e manrera saude do corpo atraves do envolvimento do individuo num

de pratiCa5 ditas saudaveis acabaram efectivamente por impushy

tar a cada urn uma responsabilidade crescente pelo seu estado de

Concomitantemente em alguns contextos forneceram argumentos a

246

PESOS HAJTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AIfERADOS

desresponsabiliza~o parcial do Estado em materia de ULUltlUU medicos

e sallde publica Doravante nao esuposto que os cidadaos necessitem

de instrw5es das autoridades e instituiltoes publicas sobre como cui dar

sua existencia ffsica 0 corpo passa a ser urn espaco regulado

opc5es e escolhas de cada urn entre a pleiade de produtos tecnicas

e serviltos actualmente ao seu dispor

Sob a egide da crenca na autoridade pessoal sobre 0 corpo cada pessoa

apartida detem plenos direitos sobre esse bern patrimonial sen do igualshy

mente responsive pelo cumprimento determinados deveres sociais

Estes passam entre outros pdo governo da sua respectiva aparencia e

de vida Ao indivfduo eatribufdo urn papd preponderante na

identificaltao e controlo atempado dos sintomas de patologias diversas

problemas cardiovasculares na preVcncao perante condutas

risco (nomeadameHte atTaves da redwao doakool e do tabaco

obrigatoriedade de sexo protegido ou do exerdcia Hsico) au na

cia e evitamento do que sao socialmente considerados excessos (alimen-

tares exposicao ao sol de medicaliiacentio etc)

da adop~ao cada vez matS generalizada desta nova atitude de

pntdencialismo individualist a perante 0 bem-estar corporal e a evolultao

da oroDorcao de populaltao que em Portugal na viragem do

desenvolver algum tipo de aCyao no sentido de melhorar ou

manter 0 seu estado de salide Segundo 0 estudo 0 Estado de Saude em

entre 2001 e 2008 a percentagem de portuguese que afirshy

mavam estar a tomar no momenta realizaltao do inquerito alguma

iniciativ3 no sentido de mclhorar ou manter 0 seu estado de saude

viu-se aumentar de 368 em 2001 para cerca de metade da populaltao

(498) em 2008

Segundo 0 mesmo estudo essa evolultao e acompanhada da alterashy

de comportamento declarado rclativamente a determinados hibishy

tos de vida considerados saudaveis designadamente no que respeita

ao exerdcio fisico A percentagem de portugueses que afirmam

exerdcio [SICO regular (ginistica COffer etc) ve-se significativamente

de 33 em 2001 para 475 em 2008 Mesmo que 11ao

247

11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

se traduza numa pratica efectiva27 csta evolu~ao corresponded

a uma assinalivel incorporaltao social do dezJer-ser contemporaneo da

actividade fisica A representaiyao desta enquanto habito de vida saudishy

torna-se clara quando noutra investiga~a028 se constatou ser entre

os individuos que mais regularmente praticam exerdcio Hsico que mais

presente esta a percep~ao do risco cia sua ausencia quotidiana29

e born esaudiveJ eurn habito saudaveL E como se

fosse lel livros sel inteligente Esras a arranjar 0 teu corpo Sabes

que vais chegar aos quarenta e tal arros e ainda vais estar born Agora

muitos chegam aos qualcrrra e tal anos e ja esrao com barriga e

com sei a ter tanras ~u~tas coisas Ficas mas saudivel se estas a

treinar bem e sew mdar contra a tua

29 ANOS LH ENClfO ENFERMEI(O PRATICANTE DE MusCutAltAo

A tendcncia para a crenlta incontestlvel no exerdcio fisico como

habito de vida saudivel nao se apresenta contudo disrribulda

igual maneira no espa~o social e cultural portugues Sao varios os estushy

que tern localizado urn maior enraizamento social da disposi~ao

para a pratica de exerdcio fisico entre as mais jovens geralt6es e entre

os individuos provenientes dos estratos socioeconomicos mais clevashy

dos Resultadonao apenas das novas con(li~6es de sociais economicas

e simbolicas em que as gera~6es pos-25 de Abril sao socializadas relatishy

vamente ao corpo e aos cuidados corporais30 mas tambem de urn efeito

de trnsltao no curso

Investiga~6es realizadas sobre a pnitica de actividades ffsicas entre os

jovens portugueses denotam-na mais regular e intensiva nos grupos etashy

rios mais novos nomeadamente ate ainserlt5o no mercado de trabalho

e aassunlt5o de novas responsabilidades familiares31bull 0 que indica que

amedida que as etapas do processo de transi~ao para a vida adulta se vao

cum prindo a pritica desportiva vai efectivamente sendo abandonada no

quotidiano dos jovens portugueses

248

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

No caso especifico da 11l~LU1ltll-alJ uma actividade particularmente

exigente em termos do tempo dispoIl lVei para a sua pratica esta tenshy

dencia revela-se particularrnente marcante Trata-se no eatanto de

uma das modalidades com maior adesao efectiva ou potencial entre os

jovens em Portugal A sua pdtica efectiva (prcsente ou passada)

declarada por cerca de 12 da populalt5o jovem porttlguesa no ano

200032 sendo 34 a percentagem de jovens que nunca tendo pratishy

cado admitiram vir a faze-Io no futuro Quer a sua pdtica efectiva

quer a sua pr~hica potencial viram-se substancialmeme acrescidas entre

os jovens do sexo lTlasculin033 com idades compreendidas entre 18 e

anos ainda a residir com a familia de origem ou sozinhos solteiros

ou ja separados ou divorciados sem filhos Perfil dpieo para stlstentar

a hip6tese de 0 aumento de massa muscular ser urn investimento corshy

poral que corresponde ellliarga medida a uma fOlm~de capitalizar

o potencial expressivo do corpo masculino em estrategiasde atracltao e

sedult5o

Embora a disponibilidade potencial para a pratica da musculaltao

- nunca fiz mas admito vir a fazec surja praticamente transversal aos

jovens qualquer que seja 0 seu estatuto social ou habitat de residencia

o facto cque as condilt6es materiais de existencia continuam a constranshy

ger a sua ptatica efectiva Mais devada entre os jovens que melhores

condilt6es sociais detem para fa_zet face as mensalidades exigidas pelos

cspaltos destinados ao seu exerdci0 34 a pratica de musculaltao decrescc

amedida que se desce na estrutura social de 26 entre os jovens de

estatuto social alto diminui para 9 entre os jovens de estatuto social

mais baixo Do mesmo modo sao os jovcns que tern urn acesso mais

facilitado as instalalt6es que disponibilizam tal servi~o quem mais adere

efectivamente a sua pritica ou seja os jovens residentes em habitat

e suburbano 0 sanho em obter urn corpo musculado revela-se

portanto substancialmente mats democratizado na sua distribui~ao social

(mediaticamente amplificada) do que as condi~6es que perrnitem a sua

concrecizaltao

149

CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 2: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

Pesos halteres e sentidos dos corpos (h)alterados urn seculo de muscula~ao

em Portugal

[VfTOR SERGIO FERREIRA]

A muscufrio corresponde a uma actividade fisica que pressup6e a

realiza00 progressiva de urn conjunto de exerdcios racionais met6dicos

instrumentais e repetitivos de forlta e resistencia que implicam a sobreshy

carsa de zonas muscu~ares concretas com recurso quer aos tradicionais

pesos livres como barras -e alteres quer a cad a vez mais sofisticados

aparelhos ergonomicamente adaptados avariedade do corpo humano

Capitalizado nas suas capacidades motora e energetica 0 investimento

corporal implicado na musculaltao e potencialmente traduzivel em forlta

e desempenho fiico

No entanto recentemente em tempos de carpolatria l a sua capishy

talizaltao em termos esteticos e pListicos tambem tern vindo a ser valoshy

rizada quando 0 movimento implicado neste sistema fisico passa a ser

convocado sobretudo com 0 objectivo de esculpir e moldar a materia

organica a carne Numa sociedade gue cad a vez mais prescinde da

forlta e do seu rendimento 0 musculo gue a potencia converte-se

simplesmente em aparencia

De facto a I6gica da promoltao da imagem tern encontrado na

musculaltao urn dos dominios de aplicaltao por excelencia De acordo

com a frequencia semanal da pdtica as cargas utilizadas 0 numero

de repeLlc6es a velocidade e a amplitude de execultao cada exerdcio

obtem diferentes resultados sobre 0 crescimento da massa muscular

231

CLASSES ASSOCIATlVISMO E ESTADO

do praticante desde a sua manutenltao tonificaltao ou definiltao ate

ao seu aumento acentuado designado hipertrofia

A musculalaquoao difere do tlsiculturismo do halterotllismo (levantashy

mento de pesos olfmpicos) ou do powerlifting (levantamento de pesos

basicos) na medida ern que se trata de uma actividade ffsica praticada

uma forma nao competitiva - ainda que normalmente 0 treino com

pesos e tfeinos de for~a fatam parte do de aClividades dos

atletas dessas modalidades Foi alias sobretudo enquanto treino comshy

plementar funcional e sem autonomia espedfiea que subsistiu ern Porshy

tugal durante grande parte do seculo xx De facto apcsar presente

no pais a pratica mnselllaltao enqultmto actividade fIsica relativashy

mente autonoma outras nao obteve sucesso senao recentemente

C haUeres no

do povo portugues

Escrevia-se na coluna sobre Vida Sportiva do jornal A Capital em

1926 em jeito de critied aeampanha publiea que estava a ser realizada

do rninistro da Instrulaquolt1o para terminar com a Parada da Ginastica

da Festa Nacional de Edueacao Ffsica I Ioje em rodas as nar6cs civilizashy

a educaltao tern urn lugar paralcIo aeducarao mental E

Porque cIa e considerada nao apenas como urn passatempo 11111 recreio

uma missao mas prineipalmente como 0 linieo meio de conservar e

melhorar um povo uma ralta Euma obrigaltao individual eum dever

sociaL Logo e preeiso mais e indispensavel que reeonheyam a

absoluta nccessidade da eduealtao corporea Nos nOSS05 mats ao que

nunea se veritlca que para Imar eom vantagem contra as tempestades

vida nao basta eapacidadc mental - e indispensavel eapacidade ffllica

Esta e uma verdade incontesciveL E nao queirarn fuzer dos rapazes plantas

de estufa ( ) Se os exerdcios exibidos sao violentos 0 que e bastante

discutivel reduzam-se substituam-sc modifiquem-se mas nao se deixe

de realizar essa festa louvavel sob rados os pontos de vista1

232

I PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AITERADOS

I Certo e que a eapacidade fisica da moddade da epoca nao era das

mais roblL~tas Alias a mesma pagina desse jomal apresentava urn pequeno

anlmcio publicitario as vantagens da Farinha Lacto Licishy tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira Lto para combater 0 raquishyI que dominava entre a juvcntude da epoea No mcsmo senti do

era talllbem anunciado na primeira pagina mesmo jomal 0 Iodo-I

I

wn reconstituinte poderoso cientffico e racionaI especialmente

dirigido a crianltas fracas Numa epoca em que a fome e as mas conshy

dic6es de vida grassavam em Portugal debilitando a saude 0 rendishy

mento 110 trabalho e ate mesmo a de muitas erianltas e jovens 0

lCvigoramento fisico das Illais novas geraroes rornou-se urn projecto

do regime que se instaurava

Entre os varios meios cientificos disponiveis ao desenvolvimento

eorpos franzinos e raqulticus a Educaltao FIsiea enquanto disciplina

providenciada pelas insrituioes publieas foi assumindo

mas nao sem Entre varios motivos porque 0 regime nao

pretendia que esta disciplina integrasse exerdcios violemos Estes nao

s6 poderian1 lesionar as ja fdgeis corpos dos seus cxecutantes como

ainda estimlllar a produltao desses corpos herclueos que sistemas Hsicos

estrangeirados nomeadamente provenientes dos Estados Unidos da

America tentavam iaInbem moldar no pais esta nao

simpatizava com esses corpo eolossais que 0 repllblicanismo havia proshy

nao apenas par uma questao estctica mas sobretudo pelos

res modemos e progressistas que representavam

Sfmbolo mundano do ascetisrno earaeterlstico da etica protestante

anglo-sax6nica 0 body building - forma como a muscula~ao eomerou

por se chamar4 - representava nao apenas valores como disciplina e

esforlaquoo mas tambem sucesso elllpreendedorismo e fona de vontade

pessoal fundamentais ao funcionamento ordeiro de uma sociedade que

se pretendia democratica racionalizada e industrializada Surgida na

lnglaterra vitoriana de meados do seculo XIX foi de facto nos Estados

Unidos da America que a muscularao mals se expandiu enquanto sisshy

tema Hsico criado com 0 obiectivo de moditlcar os corpos sobretudo

233

1 CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

masculinos atraves do aumento hiperb61ico da massa muscular Foi at

que desde finais do seculo XIX esse sistema fisico passou a ser produzido

em larga escala sendo comercializado nacional e intemacionalmente5

Comeltou por ser urn sistema fisico desenvolvido por entre gentes

de feiras circos e freak-shows itinerantes por entre a Europa e os EUA

onde corpos apolineos de lutadores e artistas-Ievantadores de pesos e

alteres em tangas de pee de leopardo participavam de uma cultura

visual que hiperbolizava a virilidade masculina atraves de demonstrashy

ltoes espectaculares de volume e forlta muscular Depois autonomiza-se

e amplia-se com a emergencia de campeonatos desportivos bern

como de todo urn mercado de equipamentos e sistemas de produltao

muscular que veio a estend~r-se dos clubes ou sociedades de ginasshy

tica a proprilt1 vida domestica e profissional com a comercializa=ao

de maquinas e sis[emas de movimento para utilizarao na sala eou roo

local de trabalho

Ainda que xiLanJ indicios da tentatiYa de integrarao deste tipo

de sistema em Portugal a visibilidade social que colossos musculados

poderiam obter era susceptive de ferir a paisagem moral que Salazar

idealizava Corpos como 0 de Manue da Silveira6 ou 0 de Francisco

Padinha7 - famosos recordistas mundiais de pesos e halteres durante a

I Republica ~ nao eram especialmente apreciados peas novas instancias

de poder

Em ruptura com concepltoes libertarias e viciosas do republicashy

nismo 0 corpo masculino ideal do Estado Novo nao correspondia a

uma cultura fisica atletica em que as priticas fisicas de modificaltao

corporal serviriam propositos frivolos hedonistas e individualistas assoshy

ciados abeeza ao prazer e asatisfarao pessoal do homem Aquee corpo

vinha antes ao encontro de uma cultura fisica higienista e moralizadora nao so com 0 objectivo colectivo de tomar os corpos dos jovens portushy

gueses mais fortes resistentes e imunes mas tambem socialmente mais

respeidveis e disciplinados A promoltao da saude do corpo nao s6 se

revearia no rendimento fisico do trabalho como Faria transparecer as

qualidades morais do individuo que se pretendiam de acordo com a

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

nova ordem moral e social pretendida para a narao portuguesa Cada

corpo individualmente deveria entregar-se aautoridade do ideal colecshy

tivo e deixar transparecer os principios cristaos e politicos do regime

urn ideal fisico de virtude e pudor obediencia e disciplina sobriedade

e austeridade higiene e robustez8bull Urn corpo dedicado a Deus aPatria

aFamilia e ao T rabalh09bull

Instituiltoes como a Mocidade Portuguesa ou a Fundarao Nacional

para a Alegria no Trabalho em articularao com instituiltoes medicas

desportivas pedagogicas eclesiasticas e politicas adquiriam urn pape

central nesse projecto colectivo Atraves deas 0 Estado Novo tentava

toniflcar fisica e moralmente a sua juventude reformando-Ihe 0 esqueshy

leto ea musculatura tornando-lhe 0 espinhalto rijo e 0 pulso vigoroso

camo descreve Ines Brasao lO bull 0 incitamento ao exercicio fisico que os

jovens encontravam nessas organizaroes visava [[ansformar potenciais

corpos definhados enfezados e raquiticos em corpofrobustDs corados

e verticais capazes de enfrentar quaisquer adversidades a bern da naltao

Scm alinhar porem nos principios tecnicos e morais do body building norte-americano evitando que 0 corpo dos seus praticantes Fosse abanshy

donado a excessos apoHneos e narcisistas

A preocuparao poHtica com a fisicalidade dos portugueses favoreshy

ceu sim a adopltao do sistema fisico de Pehr Henrik Ling (1776-1839)

urn sueco cuja doutrina de educaltao fisica havia sido posta ern pratica

em outras naroes europeiasll 0 objectivo deste sistema nao era 0 adenshy

samento do sistema muscular mas 0 desenvolvimento racional de roda

a fisiologia e morfologia corporal de forma a socializar 0 praticante no

autocontrolo social das suas manifestaltoes fisicas e emocionais Vulgarshy

mente conhecido por ginastica sueca tratava-se de urn sistema racioshy

nal de exercicios localizados e sequencialmente cadenciados promotores

da respiraltao da verticalizaltao do aprumo e da correcltao dos movimenshy

to Executados em colectivos sincronizados e uniformizados de branco

sugeriam uma imagem de disciplina e ordem de pureza fisica e moral

de cooperaltao e de exortaltao nacional que esbatia e determinava as

singularidades de cada corpo fisico em nome do corpo social

234 235

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

Do sistema de Ling pretendia-se 0 adestramento de

des instintivas dos jovens rapazes atraves da incorpora~ao do gosto

disciplina e obediencia ligado a uma instru~ao militar preparat6shy

ria vocacionada para demonstralt6es de engralldecimento e exaltaltao

da patria bem como a seu tempo para a defesa do Imperio A forlta e

) tonicidade dos carpos masculinos bern como a ordem e a disciplina

colectiva quc demonstravam aquando das marchas plihlicas dos

filiados nos quadros da Legiao ou da Mocidade Portuguesa

simbolicamente a projecltao social da for~a do Estado sobre 0 territorio

nacional e imperial Mais do que replicar criterillS bcleza associ ados

a toniftcalt~o muscular a gi1astica suecaambicionava promover aptishy

does morais =1UaVeS do descnvolvimento racional e equilibrado d~ fisioshy

logia e morfokgia do corpo Cumprir-sc-ia assim 0 adestramento corshy

poral prescrito por Juvenal- mens sana in corpore sana - maxima eF

que em saLujsmo escorrcito queria dizer t()rmaltao da consciencia na

e atraves da disciplina e submissao dO$

Sinais demudanlta medraram nas decadas de cinquentae sessenta

Algumfl ousadia e desejo de ruplura nas atitudes e cuidados com 0

corpo ganharam enfase por cntre as camadas juvenis mals escolarizadas e nem sempre d6ceis e acriticas Muitos rapnes e rapallgas as corpos nao tanto pOl referencia as insrancias socializadorao do regime mas reportando-se as corporalidades

mais mundanas que se davam quotidianamente a ver nos jornais revisshy

tas cartazes espectaculos cinema e televisao Movidos pelas novas

referencias simb6licas que estes meios trouxeram assim como pelo

proprio comacto social quotidiano com os sectores femininos da popushy

laltao quer no trabalho quer na vida mundana os homens veem-se

socialmente pressionados para melhor cuidar a sua

corporal

A clegancia corporal de cones cinematogrMicos como John Wayne

Clark Gable ou Gregory Peck concorria socialmcnte com a virilidade

ostensiva de corpos como 0 de Tarzan Taborda13 pOI exemplo que

atraam a ateIlltao dos home11s e 0 desejo das mulheres para os ringues

236

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

portugueses de lura livre Escrevia Garcia Alvarez no jornal Record

ainda em 197214 Embora possua pouca yoga no 110SS0 Pais 0

rismo consegue chamar a 5i a atenltao eo interesse de rnilhares de adepshy

tos e goza de justificavel prestigio em muitos paises do mundo

palmentc no outro ado do Atlantico Na America do Norte entao

multiplicam-se os torneios para apuramento dos corpos mais modelares

diremos mais modelados - subsistindo 0 maior interesse e

entusiasmo pelas sucessivas deilt6es do laquoMr qualquer coisaraquo que culshy

minam com os certames correspondentes adesignaltao do laquoMr USAraquo e

do laquoMr Universoraquo A Falange feminina nao perde pitada destas compeshy

tilt6es seguindo com entusiasmo indescridvel as actua~6es mais salientes

respectivos idolos do momento

A tradicional alfaiataria entra em crise nos anos setenta nomeadashy

mente com a emergencia industria do proflto-a-vestir uma realishy

que tambem c011quist3 0 consumidot masculino 15 As Iinhas rna is

iDrmais e rfgidas no modo de vdtir sao ahandonadas e suhstitufdas

por uma moda jovem promotora lima silhueta mais leve e conshy

forrive que marcava e enfatizava as formas corporais Por outro

a progressiva expansao do direito a tempos de lazer e a ferias remuneshy

radas simuldlneo a propagaltao de parques de campismo e dos ideais

contacto com a Natureza tambern contribula para a exposi~ao de

urn corpo que se deveria mostrar atractivo por emre trajes de a

banhos cada vez mais cunos

Libertando-se das vesLimentas que os encobriam e dissimulavam

as corpos vao-se entao progressivamente desnudando e exibindo ao

lange da segullda metade do seculo XX portugues Vma liberdade

contudo condicionada por novas forltas e institui-oes sociais geradoras

de novas exigencjas e expectativas sociais que em condilt6es de exposishy

publica os tendem a encarnar e a moldar

nao vdculo de um projecto de identidade naclOnal au apenas

instrumento que carece manter robusto encrgico e bern nutrido para

trabalhar e garantir a sobrevivencla 0 corpo p6s-democratico ganha

visibilidade e valor social entre as mais novas de portugueses

237

U ~1~

i11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

enquanto acessorio de identidade pessoal que urge cui dar investir e

plan ear Particularidades 1uperHuas que passavam discretamente por

entre roupas que 0 vclavam ganham 0 estatuto de imperfeiltao que urge

combater em nome novos canones corporais 0 corpo deseja-se agora

perfeito reHectindo uma imagem jovem e saudavel

o projecto colectivo de revigoramento f1sico politicamente conshy

duzido entao lU2ar a projectos individuals de manutencao e modishy

ficacao aconteceu nao apenas devido amudan)a de regime

politico mas tambem no contexto de urn conjunto alterayoes estrushy

turais na sociedade portuguesa ondc novos agentes e dinamicas mershy

cantilistas passaram a investir em forra Os pesos e halteres ltllCaUaIll

urn novo protagonismo social no mercado poftugues ganhando novos

contextos sociais e novas contlguraocs em varias actividadesffsicas

meios competitivos do balterofilismo do boc ou da

luta liv- ondc cram convocados como treino complementar para

autonomia relativa nas inumeras salas de ginasio e health

dubs onde passaram a ser mercantilizados no ambito de modalidades

pr6prias

Pesos e alteres na recente industria de design corporal

N urn contexto onde homens e mulheres passaram a exibir e

mais atentamente as suas aparcncias as foryas privadas do capitalismo

acabaram por contribuir mais do que as instituiyoes publicas higienistas

na difusao de novos habitos e cuidados corporais A incipiente

da moda e do design corporal que ja havia despontado antes do de

Abril cresce numa escala mais alargada e diversificada fragmentando

produtos e clientelas e alimentando expectativas e aspiraltDcs diferenciashy

das do passado Mais do que 0 ambicionado relligoramento fisico as

exigencias e desejos sociais gerados por essa industria VaG agora no senshy

tido do rejullenescimento C do aperfeiroamento da imagem e forma corshy

porais produzindo a ilusao massitlcada de cada um planear e

238

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

esculpir 0 pr6prio COIPO dentro urn padrao de beleza estabelecido

globalmenteo

Novas lojas fabricantes e empresas nacionais e internacionais vem

afirmar-se no mercado portugues disponibilizando modernos e

ticados produtos tecnicas e serviyos de modificacao e manutenyao

corporal em esferas diversas Da cosmetica a da cirurgia

ao nutricionismo dos centros de estetica aos spa toda uma pletora

de bens tecnologias e servios de bem-estar e bem-parecer do corpo

que prometem 0 ajustamento aos canones corporais do momento l6

por sua vez no que a masculinidade dizem rcspeito veem

substituir a clegancia eo glamour das estrelas de cinema dos anos cinshy

quenta pda fora e vigor de herois de torso em forma de V represenshy

tados por Arnold Schwarzcnegger Sylvester Stallone ou Jean-Claude

Van Damme

POI entre esra florescente industria de aesigncorporal o cresshy

cimento de iniciativas comerciais de actividade fisica geridas por pane

do sector privado qlier ao nlvd do invcstimento em produtos para

em espao domestico desde sistemas de exerdcios peri6dishy

cos espccializados roupa e calltado ate equipamemo caseiro diverso17

quer ao nivel do investimento em espayOS colectivos proporcionadores

de um conjullto de produtos e servios bem-estar e bem-parecer

Esses espayos colectivos comc~aram por assumir a forma de ginasio

de bairro contexto popularizado nos anos oitenta Nestes a musshy

culaao surgia com lugar destacado ao lado de novas modalidades

como a ginastica aerobica a primeira mais orientada para urn publico

masculino a segunda para urn pliblico fcminino A pratica da muscushy

lacao poren1 ja adicionava aos tradicionais pesos e halteres rnodernos

cquipamentos ergonomicos dotados de um design mais apelativo onde

cada detalhe passaria a ser concebido com 0 intuito de proporcionar aos

novos LlllLaUUU~ urn trcino menos arriscado e sofrido mais comodo e

con fomlveL

Postcriormente ja proximo anos noventa a musculayao toi

dlUIlllUa no con texto dos clubs que vieram a instalar-se

239

CLASSES ASSOCIATIVrSMO E ESTADO

em espaos multifunciol1ais deposidrios de valencias diversas

nas areas da da saude da alirnentacao e do lazer corporal muishy

tos representantes de cadeias internacionais que se instalaram em

algumas das principais cidades pormguesas com elevados invcstimentos

em sofisticadas tecnicas de gestao mflrketing e publicidade para cap tar

e ftdelizar potenciais publicos-alvo Entre 0 ann 2000 e 0 ana de 2008

o numero de health clubs em Portugal passou de 600 a 1400

bando mais de 600 mil mernbrosl 8bull Com uma

57 em Portugal estas estruturas facturam

euros

ras os

mais 1

mIS riscos e caracteristicas

um programa de Heino adequado a detershy

rrunaao corpo e acompanhar individualmente a sua exccuao

- C0 do egolmilriintO que perpassa no desporto

amador contemporaneo um dos produtoslservi~os em que

os health clubs mais apostam hoje ern dia devido aos ganhos financciros

proporcionados exclusividade desse servico urn dos mais caros para

o cotlSumidor

Concomitamemcntc novas actividades ffsicas e desportivas emershy

gem no ambito destcs novos espaos anunciadas como esteategias para

enfrentar e Edar corn os duros dcsafios da sociedade contemporanea ao

mcsmo tempo que velhas modalidades se rcnovam e sofisticam transshy

formando-se em mercadoria vendavel e derelativamente faeil

lidade Sistemas fisicos ancestrais como 0 por

exemplo ou ate mesmo varias artes enquanto

no

A sempre presente nos ginasios

a pesos e halterc~

240

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTFRADOS

acurnulado de

oHlzaoo de

dlllCllU e coreografado ao

fIrmo de musleas do momento que apresenta como relatishy

vamente ao esquema anterior 0 facto de eoncentrar uma quamidade e

de exerdeios musculares num curto periodo de tempo

45 a 60) reeuperando as da pratica desporriva

em grupo e desta fonna proporcionando um ambieme estimulante e

divertido

o objccrivo inicial do body pump nos anos novema ted ido em

medida lucrativo atrair 0 publico-alvo maseulino para a pdtica

de ccrclcio fisico eolectivo nomeadarnenLe ao da ginistiea aeroshy

scm contudo deixar de Ihes proporcionar 0 e atletieo

que indiidualmente a pcatica da musculacao lhes concediarn O~fdy

pump a par de outras modalidades que foram sob 0 mesrno COI1shy

ceito (designados de body training ou group como 0 body balance body combat body body

jump ou 0 spinning - RPlvf) tern a

registadas

monitores

COlllerClaUampauas eoroduzem-se exactamente nos

exerdcios e re1pectJlVO

uallzaao a cada tees meses de a a desmlotlV3ltao

por via da repctiao continuada

muitas dessas modalidades nos anos noventa vieram

U~LdUlUllC no sentido de diminuir 0 sofrimento do treino solidrio ClStishy

dioso silencioso e ascetico gue ate af implicava 0 treino tradicional de

muscular substituil1do-o pelo divertimento proporcionado

soeiabilidade e a mitsica que passaram a parte desses sistemas

241

- CLASSES ASSOClATrvISMO E ESTADO

treino 0 que vern corroborar empiricamente a hipotese avanshy

ltada por Lipovetsky de que hoje em dia 0 desporto de massas eessenshy

cialmente uma actividade dominada pda procura do prazer

mismo energetico da experiencia de si proprio depois do desporto

disciplinar e moralista cis 0 desporto-lazer a desporto-saude 0 desporshy

to-desafio Da pratica desportiva esperamos apenas sensalt6es e equilibr

valorizasao individual e evasao norma e descontraclt3o ja nao e a vinude que legitima 0 despono mas sim a emmao corporal 0 prazer

a forma e psicologica 0 des porto tornou-se urn dosemblemas mais

da cultura nardsica centrada no extase do

Oprocesso crescimento e de diversiflcaltao comercial das activishy

rades ffsicas indoor beneficiou durante os anos oitentac noventa

uma conjuntura economica favorivd caracterizada pdo aumento do

poder de compra da populaltao portuguesa tpela melhoria das de vida alguns dos seus sectores e sociais nomeadamente

classes rr Mias A proliferalt3o de gimisios health clubs foi ltlinda

favorecida pdo prolongamento quer da esperanlta media de vida quer

das processos de escolarizaltao e de transiltao para a vida adulta Estas

din1Unicas que efectivamente fizeram dos reformadas e dos jovens

estudantes publicos-alvo fundamentals na promQ(ao de actividades

fisicas no espalto do ginasio considerando 0 tempo que tern POLCllUltUshy

mente disponivel ao longo do dia nome~damente fora das hons

maior wifego nos ginasios (perfodos almolto e p6s-laborais)

Urn outros pltblicos-alvo a que este segmento da indUstria de

design corporal mais se tem dirigido tern ido os homens mais disponishy

ao consumo dos sellS produtos e servi~os A imagem de

pader e competencia produzida e difundida pela publicidade e pclas

revistas hoje dedicadas ao segmento masculino ji nao e reflectida apenas

atravcs de sfmbolos tradicionais consumo masculino como 0 carro 0

relogio ou a can eta mas tam bern atraves investimentos na proawao

e manutenltao da aparencia fisica que tende a perder 0 formalismo do

fato-e-gravata A imagem de urn hamem atletico e cuidado passa a ser

inclusivamente apresentada como chave do sucesso entre as

242

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AITERADOS

mais exigentes quanto aDS cuidados masculinos com a imagem Esta nova

mostra um novo homem preocupado com a flexibilidade da

sua pele com a domesticaltao dos seus odores com a qualidade do seu

[[sico com a tonicidade da sua silhueta com a definiltao do

seu abdomen com 0 volume do seu biceps A pdtica de musculaltao

assume entao tun valor estratcgico na produltao do actual corpo mascushy

referencia e de reverencia

Trata-se de facto do regime corporal socialmente mals difundido

estrategia de promoltao de urn modelo corporeidade ma~cu-

modelo adetico com acento na potencia vitalidade

IHUgtCUlaL 0 que de resto nao sera de surpreender dada

a diiilsao incorporada de estereotipos da sociedade ocidental sabre a masshy

que tradicionalmemc ligam os padr6es de perfectibilidade e

atractivlhde masculina ao modelo de corporeidade mesomorfico e hipershy

troEado em medida cOlldensado na massa muscular tCUlllUldUd

nos peltoral~ braltos e costas esnuturando um torso de

adclgalta ate a

Um homem deve ter os ombros mais largos do que a anea ter uma

anca fina e deve ser algo robusto mats cheinho Mais cheinho

mas nao e em gordura e em musculo ( ) Estou contente com 0 ter

aos 80 Guilos Acho que eu ainda tenho muito parauabalhar

ainda me falta muito trabalho frente Ainda vai ser uma coisa

que YCJo-me nos pr()X1mOS 6 an os a ter de trabalhar 0 corpo ate cheshy

gar 11 tal forma ideal ao corpo ideal ( ) Eo tal corpo masculino com

os ombros mais a cintura mais em V - Ii esra 0 torso em

V - e musculado

ESTUDANTE UNlVERSITiillIO 21 ANOS PRATICANTE DE MUSCUIAtAo

porem scm a rudeza do passado impressa pelas condilt6es de

nabalho que sem intenltio moldavam 0 corpo 0 corpo do hom em ja nao

e urn mero instrurnento que se abandona ao trabalho mas de proprio

243

CLASSES ASSOCIATfVTSMO E ESTADO

MlllUCla como COOl

extracltao total dos pel os que possam encobrir 0

ao

da simetria muscular conseguida

Mas os corpos femininos tambem nao ficaram de fora dos sistemas

fisicos associados a muscutaltao Com objectivos mais moderados em

termos de volume corporal e sobretudo direccionados para a perda de

adiposidade e tonificaltao determinadas zonas do corpo as mulheres

encontraram res posta aos seus anseios corporais sobretudo nos body Mesmo

aos pesos e e aoontrario

publico masCilliri~ as roulheres tendem a

do corpo como (lllS de intervenltao prioritaria no sentido da manuten

ltao ou mociitJG50 Face a tais aspiraltoes a chegoll

a conceber um sistema fisieo particular para dar ao pllbico

especificameme feminino comercializando-o sob a designaltio de GAP

uma modalidade que promove 0 trabalho de resistencia e forshy

talecimento atraves de varios exerdcios localizados nas zonas

dos gl(lteos abdommalS e pernas

Eu era ter aqude corpo musculado corpo bonito

que tada a gente rilio e () Nao llma mulher eXclgeJradamell1le

muscuCida porque perde os trayos femininosEuma mulher ddinida

Nao precisa de ser magra Nao acho que eaquele estereotipo de magre-La

que cada vez ha mais que leva as miudas hoje em dia a rornarem-se

anonxicas ( ) Hoje no ginasio a imagem que se quer passar e que

essa nao ea nao eo ideal de urn corpo 0 ideal de urn corpo e umamulher a mulher nao precisa de estar MOr

desde que bem ueWllUa e0 ideal

23 ANOS 120 ANO INSTRJroRA DE CARDlo-FrfNESS

244

PESOS HALTERES E SENTiDOS DOS CORPOS (H)AIrERADOS

tern

cas no seio da industria de design corporal Como assinala Fortuna

os de edllcalt3o ffsica tinham como vocaltao disciplinar 0 corpo

para for mar rnelhores cidactios mais saudaveis e competemes prepashy

rando-os para os desafios das novas sociedades surgidas com a industriashy

os actuais health clubs por seu lado associ am a juventude a

beleza e a satide do corpo aamo-confianya aauto-estima e ao bem-estar

ol(rcendo prodmos e serviltos a moldar 0 corpo amedida

e preocupalt6es de

outros mats imageticos

some body Estar em mostrar (determinadas)

A manifestalt3o mais valorizada do corpo saudavel deixa de

ser a seu rendimeDto fo1lta e para passar a ser a sua aparenshy

cia A sallde cosmetiza-se e torna-se num fen6meno estetico nao basta

mante-la mas fazer transparece-la nomeadamente atraves da aquisiltao

urn corpo perfeito Este par sua vez passa a ser condiltao sine

non para 0

Higt LdllI-la para a ser

Eu via que tinlIa urn corpo com varios problemas Precisava de

rirar a barriga algum poeu e Tinha urn peito quase fundo dentro

quase que nao se via a barriga mais saida que 0 peito Via que tinha

problemas e estava a caminhar para 0 problema da obesidade ( )

Agora quando olho para 0 espdho vejo urn corpo perfeito 0 que todo

o hornem gostaria de tef E simo-me orgulhoso por isso

AUXILlAR DE ACOO MEDICA 120 ANO 24 ANOS

PHKnCANTE DE

245

CLASSES ASSOCIATIVLSMO E ESTADO

despono ou pelo menos efectuar com regushy

[sica passou aser nao apenas urn direito25 mas

tambem urn dever sociedades contempodneas um

cuja falta acarreta frequentemente sentimentos de culpa pessoal

e aclt6es de sanyao social sobre aqueles que se encontram pouco

a descobrir as suas supostas vantagens ou cujos corpos se afastarn

da normatividade da silhueta canonica quese deseia bem deflllida e

tonificada

Pesos e halteres entre 0 estUode vida saudltivel doeura ddec a a sau

Se a pFl1rllpaltao com os cuidados corporlis era anteriOrrneHr proshy

pria das classt~s onis lhastad3s nas condilt6es

oitenta f) portugues comum passa a tcr acesso em qualqucr sureil1ler~

cadoa uma pan6plia de prodUloh tecnicas e servicos que prometem criar

e conservar um corpo jovem perfeira e saudive qualidades de refeshy

rencia e reverencia no culto conremporaneo do corpo Socialmente apreshy

sentados e mercantilizados em associacao acriacao de urn

produtor de salIde e preventor doenca tais produtos tecshy

nicas e servi~os sao frequentemente assumidos na vida quotidiana Como

sendodo oll mais importante que os propdes servicos de saude e de

prestacao de cuidados medicos na concretizayao do bem-estar fisico e

psicologico das pessoas A ideia hoje partilhada no imaginario

de que a saude ealgo que se conquista ccoroHrio simb61ico da delegashy

ltao social no individuo das formas manutenlt3o controlo e vigilancia

do corpo que outrora haviam sido exercidas pelas autoridades

A difusao e enraizamento social da assuncao de que e possivd obter

e manrera saude do corpo atraves do envolvimento do individuo num

de pratiCa5 ditas saudaveis acabaram efectivamente por impushy

tar a cada urn uma responsabilidade crescente pelo seu estado de

Concomitantemente em alguns contextos forneceram argumentos a

246

PESOS HAJTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AIfERADOS

desresponsabiliza~o parcial do Estado em materia de ULUltlUU medicos

e sallde publica Doravante nao esuposto que os cidadaos necessitem

de instrw5es das autoridades e instituiltoes publicas sobre como cui dar

sua existencia ffsica 0 corpo passa a ser urn espaco regulado

opc5es e escolhas de cada urn entre a pleiade de produtos tecnicas

e serviltos actualmente ao seu dispor

Sob a egide da crenca na autoridade pessoal sobre 0 corpo cada pessoa

apartida detem plenos direitos sobre esse bern patrimonial sen do igualshy

mente responsive pelo cumprimento determinados deveres sociais

Estes passam entre outros pdo governo da sua respectiva aparencia e

de vida Ao indivfduo eatribufdo urn papd preponderante na

identificaltao e controlo atempado dos sintomas de patologias diversas

problemas cardiovasculares na preVcncao perante condutas

risco (nomeadameHte atTaves da redwao doakool e do tabaco

obrigatoriedade de sexo protegido ou do exerdcia Hsico) au na

cia e evitamento do que sao socialmente considerados excessos (alimen-

tares exposicao ao sol de medicaliiacentio etc)

da adop~ao cada vez matS generalizada desta nova atitude de

pntdencialismo individualist a perante 0 bem-estar corporal e a evolultao

da oroDorcao de populaltao que em Portugal na viragem do

desenvolver algum tipo de aCyao no sentido de melhorar ou

manter 0 seu estado de salide Segundo 0 estudo 0 Estado de Saude em

entre 2001 e 2008 a percentagem de portuguese que afirshy

mavam estar a tomar no momenta realizaltao do inquerito alguma

iniciativ3 no sentido de mclhorar ou manter 0 seu estado de saude

viu-se aumentar de 368 em 2001 para cerca de metade da populaltao

(498) em 2008

Segundo 0 mesmo estudo essa evolultao e acompanhada da alterashy

de comportamento declarado rclativamente a determinados hibishy

tos de vida considerados saudaveis designadamente no que respeita

ao exerdcio fisico A percentagem de portugueses que afirmam

exerdcio [SICO regular (ginistica COffer etc) ve-se significativamente

de 33 em 2001 para 475 em 2008 Mesmo que 11ao

247

11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

se traduza numa pratica efectiva27 csta evolu~ao corresponded

a uma assinalivel incorporaltao social do dezJer-ser contemporaneo da

actividade fisica A representaiyao desta enquanto habito de vida saudishy

torna-se clara quando noutra investiga~a028 se constatou ser entre

os individuos que mais regularmente praticam exerdcio Hsico que mais

presente esta a percep~ao do risco cia sua ausencia quotidiana29

e born esaudiveJ eurn habito saudaveL E como se

fosse lel livros sel inteligente Esras a arranjar 0 teu corpo Sabes

que vais chegar aos quarenta e tal arros e ainda vais estar born Agora

muitos chegam aos qualcrrra e tal anos e ja esrao com barriga e

com sei a ter tanras ~u~tas coisas Ficas mas saudivel se estas a

treinar bem e sew mdar contra a tua

29 ANOS LH ENClfO ENFERMEI(O PRATICANTE DE MusCutAltAo

A tendcncia para a crenlta incontestlvel no exerdcio fisico como

habito de vida saudivel nao se apresenta contudo disrribulda

igual maneira no espa~o social e cultural portugues Sao varios os estushy

que tern localizado urn maior enraizamento social da disposi~ao

para a pratica de exerdcio fisico entre as mais jovens geralt6es e entre

os individuos provenientes dos estratos socioeconomicos mais clevashy

dos Resultadonao apenas das novas con(li~6es de sociais economicas

e simbolicas em que as gera~6es pos-25 de Abril sao socializadas relatishy

vamente ao corpo e aos cuidados corporais30 mas tambem de urn efeito

de trnsltao no curso

Investiga~6es realizadas sobre a pnitica de actividades ffsicas entre os

jovens portugueses denotam-na mais regular e intensiva nos grupos etashy

rios mais novos nomeadamente ate ainserlt5o no mercado de trabalho

e aassunlt5o de novas responsabilidades familiares31bull 0 que indica que

amedida que as etapas do processo de transi~ao para a vida adulta se vao

cum prindo a pritica desportiva vai efectivamente sendo abandonada no

quotidiano dos jovens portugueses

248

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

No caso especifico da 11l~LU1ltll-alJ uma actividade particularmente

exigente em termos do tempo dispoIl lVei para a sua pratica esta tenshy

dencia revela-se particularrnente marcante Trata-se no eatanto de

uma das modalidades com maior adesao efectiva ou potencial entre os

jovens em Portugal A sua pdtica efectiva (prcsente ou passada)

declarada por cerca de 12 da populalt5o jovem porttlguesa no ano

200032 sendo 34 a percentagem de jovens que nunca tendo pratishy

cado admitiram vir a faze-Io no futuro Quer a sua pdtica efectiva

quer a sua pr~hica potencial viram-se substancialmeme acrescidas entre

os jovens do sexo lTlasculin033 com idades compreendidas entre 18 e

anos ainda a residir com a familia de origem ou sozinhos solteiros

ou ja separados ou divorciados sem filhos Perfil dpieo para stlstentar

a hip6tese de 0 aumento de massa muscular ser urn investimento corshy

poral que corresponde ellliarga medida a uma fOlm~de capitalizar

o potencial expressivo do corpo masculino em estrategiasde atracltao e

sedult5o

Embora a disponibilidade potencial para a pratica da musculaltao

- nunca fiz mas admito vir a fazec surja praticamente transversal aos

jovens qualquer que seja 0 seu estatuto social ou habitat de residencia

o facto cque as condilt6es materiais de existencia continuam a constranshy

ger a sua ptatica efectiva Mais devada entre os jovens que melhores

condilt6es sociais detem para fa_zet face as mensalidades exigidas pelos

cspaltos destinados ao seu exerdci0 34 a pratica de musculaltao decrescc

amedida que se desce na estrutura social de 26 entre os jovens de

estatuto social alto diminui para 9 entre os jovens de estatuto social

mais baixo Do mesmo modo sao os jovcns que tern urn acesso mais

facilitado as instalalt6es que disponibilizam tal servi~o quem mais adere

efectivamente a sua pritica ou seja os jovens residentes em habitat

e suburbano 0 sanho em obter urn corpo musculado revela-se

portanto substancialmente mats democratizado na sua distribui~ao social

(mediaticamente amplificada) do que as condi~6es que perrnitem a sua

concrecizaltao

149

CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 3: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

CLASSES ASSOCIATlVISMO E ESTADO

do praticante desde a sua manutenltao tonificaltao ou definiltao ate

ao seu aumento acentuado designado hipertrofia

A musculalaquoao difere do tlsiculturismo do halterotllismo (levantashy

mento de pesos olfmpicos) ou do powerlifting (levantamento de pesos

basicos) na medida ern que se trata de uma actividade ffsica praticada

uma forma nao competitiva - ainda que normalmente 0 treino com

pesos e tfeinos de for~a fatam parte do de aClividades dos

atletas dessas modalidades Foi alias sobretudo enquanto treino comshy

plementar funcional e sem autonomia espedfiea que subsistiu ern Porshy

tugal durante grande parte do seculo xx De facto apcsar presente

no pais a pratica mnselllaltao enqultmto actividade fIsica relativashy

mente autonoma outras nao obteve sucesso senao recentemente

C haUeres no

do povo portugues

Escrevia-se na coluna sobre Vida Sportiva do jornal A Capital em

1926 em jeito de critied aeampanha publiea que estava a ser realizada

do rninistro da Instrulaquolt1o para terminar com a Parada da Ginastica

da Festa Nacional de Edueacao Ffsica I Ioje em rodas as nar6cs civilizashy

a educaltao tern urn lugar paralcIo aeducarao mental E

Porque cIa e considerada nao apenas como urn passatempo 11111 recreio

uma missao mas prineipalmente como 0 linieo meio de conservar e

melhorar um povo uma ralta Euma obrigaltao individual eum dever

sociaL Logo e preeiso mais e indispensavel que reeonheyam a

absoluta nccessidade da eduealtao corporea Nos nOSS05 mats ao que

nunea se veritlca que para Imar eom vantagem contra as tempestades

vida nao basta eapacidadc mental - e indispensavel eapacidade ffllica

Esta e uma verdade incontesciveL E nao queirarn fuzer dos rapazes plantas

de estufa ( ) Se os exerdcios exibidos sao violentos 0 que e bastante

discutivel reduzam-se substituam-sc modifiquem-se mas nao se deixe

de realizar essa festa louvavel sob rados os pontos de vista1

232

I PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AITERADOS

I Certo e que a eapacidade fisica da moddade da epoca nao era das

mais roblL~tas Alias a mesma pagina desse jomal apresentava urn pequeno

anlmcio publicitario as vantagens da Farinha Lacto Licishy tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira Lto para combater 0 raquishyI que dominava entre a juvcntude da epoea No mcsmo senti do

era talllbem anunciado na primeira pagina mesmo jomal 0 Iodo-I

I

wn reconstituinte poderoso cientffico e racionaI especialmente

dirigido a crianltas fracas Numa epoca em que a fome e as mas conshy

dic6es de vida grassavam em Portugal debilitando a saude 0 rendishy

mento 110 trabalho e ate mesmo a de muitas erianltas e jovens 0

lCvigoramento fisico das Illais novas geraroes rornou-se urn projecto

do regime que se instaurava

Entre os varios meios cientificos disponiveis ao desenvolvimento

eorpos franzinos e raqulticus a Educaltao FIsiea enquanto disciplina

providenciada pelas insrituioes publieas foi assumindo

mas nao sem Entre varios motivos porque 0 regime nao

pretendia que esta disciplina integrasse exerdcios violemos Estes nao

s6 poderian1 lesionar as ja fdgeis corpos dos seus cxecutantes como

ainda estimlllar a produltao desses corpos herclueos que sistemas Hsicos

estrangeirados nomeadamente provenientes dos Estados Unidos da

America tentavam iaInbem moldar no pais esta nao

simpatizava com esses corpo eolossais que 0 repllblicanismo havia proshy

nao apenas par uma questao estctica mas sobretudo pelos

res modemos e progressistas que representavam

Sfmbolo mundano do ascetisrno earaeterlstico da etica protestante

anglo-sax6nica 0 body building - forma como a muscula~ao eomerou

por se chamar4 - representava nao apenas valores como disciplina e

esforlaquoo mas tambem sucesso elllpreendedorismo e fona de vontade

pessoal fundamentais ao funcionamento ordeiro de uma sociedade que

se pretendia democratica racionalizada e industrializada Surgida na

lnglaterra vitoriana de meados do seculo XIX foi de facto nos Estados

Unidos da America que a muscularao mals se expandiu enquanto sisshy

tema Hsico criado com 0 obiectivo de moditlcar os corpos sobretudo

233

1 CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

masculinos atraves do aumento hiperb61ico da massa muscular Foi at

que desde finais do seculo XIX esse sistema fisico passou a ser produzido

em larga escala sendo comercializado nacional e intemacionalmente5

Comeltou por ser urn sistema fisico desenvolvido por entre gentes

de feiras circos e freak-shows itinerantes por entre a Europa e os EUA

onde corpos apolineos de lutadores e artistas-Ievantadores de pesos e

alteres em tangas de pee de leopardo participavam de uma cultura

visual que hiperbolizava a virilidade masculina atraves de demonstrashy

ltoes espectaculares de volume e forlta muscular Depois autonomiza-se

e amplia-se com a emergencia de campeonatos desportivos bern

como de todo urn mercado de equipamentos e sistemas de produltao

muscular que veio a estend~r-se dos clubes ou sociedades de ginasshy

tica a proprilt1 vida domestica e profissional com a comercializa=ao

de maquinas e sis[emas de movimento para utilizarao na sala eou roo

local de trabalho

Ainda que xiLanJ indicios da tentatiYa de integrarao deste tipo

de sistema em Portugal a visibilidade social que colossos musculados

poderiam obter era susceptive de ferir a paisagem moral que Salazar

idealizava Corpos como 0 de Manue da Silveira6 ou 0 de Francisco

Padinha7 - famosos recordistas mundiais de pesos e halteres durante a

I Republica ~ nao eram especialmente apreciados peas novas instancias

de poder

Em ruptura com concepltoes libertarias e viciosas do republicashy

nismo 0 corpo masculino ideal do Estado Novo nao correspondia a

uma cultura fisica atletica em que as priticas fisicas de modificaltao

corporal serviriam propositos frivolos hedonistas e individualistas assoshy

ciados abeeza ao prazer e asatisfarao pessoal do homem Aquee corpo

vinha antes ao encontro de uma cultura fisica higienista e moralizadora nao so com 0 objectivo colectivo de tomar os corpos dos jovens portushy

gueses mais fortes resistentes e imunes mas tambem socialmente mais

respeidveis e disciplinados A promoltao da saude do corpo nao s6 se

revearia no rendimento fisico do trabalho como Faria transparecer as

qualidades morais do individuo que se pretendiam de acordo com a

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

nova ordem moral e social pretendida para a narao portuguesa Cada

corpo individualmente deveria entregar-se aautoridade do ideal colecshy

tivo e deixar transparecer os principios cristaos e politicos do regime

urn ideal fisico de virtude e pudor obediencia e disciplina sobriedade

e austeridade higiene e robustez8bull Urn corpo dedicado a Deus aPatria

aFamilia e ao T rabalh09bull

Instituiltoes como a Mocidade Portuguesa ou a Fundarao Nacional

para a Alegria no Trabalho em articularao com instituiltoes medicas

desportivas pedagogicas eclesiasticas e politicas adquiriam urn pape

central nesse projecto colectivo Atraves deas 0 Estado Novo tentava

toniflcar fisica e moralmente a sua juventude reformando-Ihe 0 esqueshy

leto ea musculatura tornando-lhe 0 espinhalto rijo e 0 pulso vigoroso

camo descreve Ines Brasao lO bull 0 incitamento ao exercicio fisico que os

jovens encontravam nessas organizaroes visava [[ansformar potenciais

corpos definhados enfezados e raquiticos em corpofrobustDs corados

e verticais capazes de enfrentar quaisquer adversidades a bern da naltao

Scm alinhar porem nos principios tecnicos e morais do body building norte-americano evitando que 0 corpo dos seus praticantes Fosse abanshy

donado a excessos apoHneos e narcisistas

A preocuparao poHtica com a fisicalidade dos portugueses favoreshy

ceu sim a adopltao do sistema fisico de Pehr Henrik Ling (1776-1839)

urn sueco cuja doutrina de educaltao fisica havia sido posta ern pratica

em outras naroes europeiasll 0 objectivo deste sistema nao era 0 adenshy

samento do sistema muscular mas 0 desenvolvimento racional de roda

a fisiologia e morfologia corporal de forma a socializar 0 praticante no

autocontrolo social das suas manifestaltoes fisicas e emocionais Vulgarshy

mente conhecido por ginastica sueca tratava-se de urn sistema racioshy

nal de exercicios localizados e sequencialmente cadenciados promotores

da respiraltao da verticalizaltao do aprumo e da correcltao dos movimenshy

to Executados em colectivos sincronizados e uniformizados de branco

sugeriam uma imagem de disciplina e ordem de pureza fisica e moral

de cooperaltao e de exortaltao nacional que esbatia e determinava as

singularidades de cada corpo fisico em nome do corpo social

234 235

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

Do sistema de Ling pretendia-se 0 adestramento de

des instintivas dos jovens rapazes atraves da incorpora~ao do gosto

disciplina e obediencia ligado a uma instru~ao militar preparat6shy

ria vocacionada para demonstralt6es de engralldecimento e exaltaltao

da patria bem como a seu tempo para a defesa do Imperio A forlta e

) tonicidade dos carpos masculinos bern como a ordem e a disciplina

colectiva quc demonstravam aquando das marchas plihlicas dos

filiados nos quadros da Legiao ou da Mocidade Portuguesa

simbolicamente a projecltao social da for~a do Estado sobre 0 territorio

nacional e imperial Mais do que replicar criterillS bcleza associ ados

a toniftcalt~o muscular a gi1astica suecaambicionava promover aptishy

does morais =1UaVeS do descnvolvimento racional e equilibrado d~ fisioshy

logia e morfokgia do corpo Cumprir-sc-ia assim 0 adestramento corshy

poral prescrito por Juvenal- mens sana in corpore sana - maxima eF

que em saLujsmo escorrcito queria dizer t()rmaltao da consciencia na

e atraves da disciplina e submissao dO$

Sinais demudanlta medraram nas decadas de cinquentae sessenta

Algumfl ousadia e desejo de ruplura nas atitudes e cuidados com 0

corpo ganharam enfase por cntre as camadas juvenis mals escolarizadas e nem sempre d6ceis e acriticas Muitos rapnes e rapallgas as corpos nao tanto pOl referencia as insrancias socializadorao do regime mas reportando-se as corporalidades

mais mundanas que se davam quotidianamente a ver nos jornais revisshy

tas cartazes espectaculos cinema e televisao Movidos pelas novas

referencias simb6licas que estes meios trouxeram assim como pelo

proprio comacto social quotidiano com os sectores femininos da popushy

laltao quer no trabalho quer na vida mundana os homens veem-se

socialmente pressionados para melhor cuidar a sua

corporal

A clegancia corporal de cones cinematogrMicos como John Wayne

Clark Gable ou Gregory Peck concorria socialmcnte com a virilidade

ostensiva de corpos como 0 de Tarzan Taborda13 pOI exemplo que

atraam a ateIlltao dos home11s e 0 desejo das mulheres para os ringues

236

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

portugueses de lura livre Escrevia Garcia Alvarez no jornal Record

ainda em 197214 Embora possua pouca yoga no 110SS0 Pais 0

rismo consegue chamar a 5i a atenltao eo interesse de rnilhares de adepshy

tos e goza de justificavel prestigio em muitos paises do mundo

palmentc no outro ado do Atlantico Na America do Norte entao

multiplicam-se os torneios para apuramento dos corpos mais modelares

diremos mais modelados - subsistindo 0 maior interesse e

entusiasmo pelas sucessivas deilt6es do laquoMr qualquer coisaraquo que culshy

minam com os certames correspondentes adesignaltao do laquoMr USAraquo e

do laquoMr Universoraquo A Falange feminina nao perde pitada destas compeshy

tilt6es seguindo com entusiasmo indescridvel as actua~6es mais salientes

respectivos idolos do momento

A tradicional alfaiataria entra em crise nos anos setenta nomeadashy

mente com a emergencia industria do proflto-a-vestir uma realishy

que tambem c011quist3 0 consumidot masculino 15 As Iinhas rna is

iDrmais e rfgidas no modo de vdtir sao ahandonadas e suhstitufdas

por uma moda jovem promotora lima silhueta mais leve e conshy

forrive que marcava e enfatizava as formas corporais Por outro

a progressiva expansao do direito a tempos de lazer e a ferias remuneshy

radas simuldlneo a propagaltao de parques de campismo e dos ideais

contacto com a Natureza tambern contribula para a exposi~ao de

urn corpo que se deveria mostrar atractivo por emre trajes de a

banhos cada vez mais cunos

Libertando-se das vesLimentas que os encobriam e dissimulavam

as corpos vao-se entao progressivamente desnudando e exibindo ao

lange da segullda metade do seculo XX portugues Vma liberdade

contudo condicionada por novas forltas e institui-oes sociais geradoras

de novas exigencjas e expectativas sociais que em condilt6es de exposishy

publica os tendem a encarnar e a moldar

nao vdculo de um projecto de identidade naclOnal au apenas

instrumento que carece manter robusto encrgico e bern nutrido para

trabalhar e garantir a sobrevivencla 0 corpo p6s-democratico ganha

visibilidade e valor social entre as mais novas de portugueses

237

U ~1~

i11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

enquanto acessorio de identidade pessoal que urge cui dar investir e

plan ear Particularidades 1uperHuas que passavam discretamente por

entre roupas que 0 vclavam ganham 0 estatuto de imperfeiltao que urge

combater em nome novos canones corporais 0 corpo deseja-se agora

perfeito reHectindo uma imagem jovem e saudavel

o projecto colectivo de revigoramento f1sico politicamente conshy

duzido entao lU2ar a projectos individuals de manutencao e modishy

ficacao aconteceu nao apenas devido amudan)a de regime

politico mas tambem no contexto de urn conjunto alterayoes estrushy

turais na sociedade portuguesa ondc novos agentes e dinamicas mershy

cantilistas passaram a investir em forra Os pesos e halteres ltllCaUaIll

urn novo protagonismo social no mercado poftugues ganhando novos

contextos sociais e novas contlguraocs em varias actividadesffsicas

meios competitivos do balterofilismo do boc ou da

luta liv- ondc cram convocados como treino complementar para

autonomia relativa nas inumeras salas de ginasio e health

dubs onde passaram a ser mercantilizados no ambito de modalidades

pr6prias

Pesos e alteres na recente industria de design corporal

N urn contexto onde homens e mulheres passaram a exibir e

mais atentamente as suas aparcncias as foryas privadas do capitalismo

acabaram por contribuir mais do que as instituiyoes publicas higienistas

na difusao de novos habitos e cuidados corporais A incipiente

da moda e do design corporal que ja havia despontado antes do de

Abril cresce numa escala mais alargada e diversificada fragmentando

produtos e clientelas e alimentando expectativas e aspiraltDcs diferenciashy

das do passado Mais do que 0 ambicionado relligoramento fisico as

exigencias e desejos sociais gerados por essa industria VaG agora no senshy

tido do rejullenescimento C do aperfeiroamento da imagem e forma corshy

porais produzindo a ilusao massitlcada de cada um planear e

238

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

esculpir 0 pr6prio COIPO dentro urn padrao de beleza estabelecido

globalmenteo

Novas lojas fabricantes e empresas nacionais e internacionais vem

afirmar-se no mercado portugues disponibilizando modernos e

ticados produtos tecnicas e serviyos de modificacao e manutenyao

corporal em esferas diversas Da cosmetica a da cirurgia

ao nutricionismo dos centros de estetica aos spa toda uma pletora

de bens tecnologias e servios de bem-estar e bem-parecer do corpo

que prometem 0 ajustamento aos canones corporais do momento l6

por sua vez no que a masculinidade dizem rcspeito veem

substituir a clegancia eo glamour das estrelas de cinema dos anos cinshy

quenta pda fora e vigor de herois de torso em forma de V represenshy

tados por Arnold Schwarzcnegger Sylvester Stallone ou Jean-Claude

Van Damme

POI entre esra florescente industria de aesigncorporal o cresshy

cimento de iniciativas comerciais de actividade fisica geridas por pane

do sector privado qlier ao nlvd do invcstimento em produtos para

em espao domestico desde sistemas de exerdcios peri6dishy

cos espccializados roupa e calltado ate equipamemo caseiro diverso17

quer ao nivel do investimento em espayOS colectivos proporcionadores

de um conjullto de produtos e servios bem-estar e bem-parecer

Esses espayos colectivos comc~aram por assumir a forma de ginasio

de bairro contexto popularizado nos anos oitenta Nestes a musshy

culaao surgia com lugar destacado ao lado de novas modalidades

como a ginastica aerobica a primeira mais orientada para urn publico

masculino a segunda para urn pliblico fcminino A pratica da muscushy

lacao poren1 ja adicionava aos tradicionais pesos e halteres rnodernos

cquipamentos ergonomicos dotados de um design mais apelativo onde

cada detalhe passaria a ser concebido com 0 intuito de proporcionar aos

novos LlllLaUUU~ urn trcino menos arriscado e sofrido mais comodo e

con fomlveL

Postcriormente ja proximo anos noventa a musculayao toi

dlUIlllUa no con texto dos clubs que vieram a instalar-se

239

CLASSES ASSOCIATIVrSMO E ESTADO

em espaos multifunciol1ais deposidrios de valencias diversas

nas areas da da saude da alirnentacao e do lazer corporal muishy

tos representantes de cadeias internacionais que se instalaram em

algumas das principais cidades pormguesas com elevados invcstimentos

em sofisticadas tecnicas de gestao mflrketing e publicidade para cap tar

e ftdelizar potenciais publicos-alvo Entre 0 ann 2000 e 0 ana de 2008

o numero de health clubs em Portugal passou de 600 a 1400

bando mais de 600 mil mernbrosl 8bull Com uma

57 em Portugal estas estruturas facturam

euros

ras os

mais 1

mIS riscos e caracteristicas

um programa de Heino adequado a detershy

rrunaao corpo e acompanhar individualmente a sua exccuao

- C0 do egolmilriintO que perpassa no desporto

amador contemporaneo um dos produtoslservi~os em que

os health clubs mais apostam hoje ern dia devido aos ganhos financciros

proporcionados exclusividade desse servico urn dos mais caros para

o cotlSumidor

Concomitamemcntc novas actividades ffsicas e desportivas emershy

gem no ambito destcs novos espaos anunciadas como esteategias para

enfrentar e Edar corn os duros dcsafios da sociedade contemporanea ao

mcsmo tempo que velhas modalidades se rcnovam e sofisticam transshy

formando-se em mercadoria vendavel e derelativamente faeil

lidade Sistemas fisicos ancestrais como 0 por

exemplo ou ate mesmo varias artes enquanto

no

A sempre presente nos ginasios

a pesos e halterc~

240

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTFRADOS

acurnulado de

oHlzaoo de

dlllCllU e coreografado ao

fIrmo de musleas do momento que apresenta como relatishy

vamente ao esquema anterior 0 facto de eoncentrar uma quamidade e

de exerdeios musculares num curto periodo de tempo

45 a 60) reeuperando as da pratica desporriva

em grupo e desta fonna proporcionando um ambieme estimulante e

divertido

o objccrivo inicial do body pump nos anos novema ted ido em

medida lucrativo atrair 0 publico-alvo maseulino para a pdtica

de ccrclcio fisico eolectivo nomeadarnenLe ao da ginistiea aeroshy

scm contudo deixar de Ihes proporcionar 0 e atletieo

que indiidualmente a pcatica da musculacao lhes concediarn O~fdy

pump a par de outras modalidades que foram sob 0 mesrno COI1shy

ceito (designados de body training ou group como 0 body balance body combat body body

jump ou 0 spinning - RPlvf) tern a

registadas

monitores

COlllerClaUampauas eoroduzem-se exactamente nos

exerdcios e re1pectJlVO

uallzaao a cada tees meses de a a desmlotlV3ltao

por via da repctiao continuada

muitas dessas modalidades nos anos noventa vieram

U~LdUlUllC no sentido de diminuir 0 sofrimento do treino solidrio ClStishy

dioso silencioso e ascetico gue ate af implicava 0 treino tradicional de

muscular substituil1do-o pelo divertimento proporcionado

soeiabilidade e a mitsica que passaram a parte desses sistemas

241

- CLASSES ASSOClATrvISMO E ESTADO

treino 0 que vern corroborar empiricamente a hipotese avanshy

ltada por Lipovetsky de que hoje em dia 0 desporto de massas eessenshy

cialmente uma actividade dominada pda procura do prazer

mismo energetico da experiencia de si proprio depois do desporto

disciplinar e moralista cis 0 desporto-lazer a desporto-saude 0 desporshy

to-desafio Da pratica desportiva esperamos apenas sensalt6es e equilibr

valorizasao individual e evasao norma e descontraclt3o ja nao e a vinude que legitima 0 despono mas sim a emmao corporal 0 prazer

a forma e psicologica 0 des porto tornou-se urn dosemblemas mais

da cultura nardsica centrada no extase do

Oprocesso crescimento e de diversiflcaltao comercial das activishy

rades ffsicas indoor beneficiou durante os anos oitentac noventa

uma conjuntura economica favorivd caracterizada pdo aumento do

poder de compra da populaltao portuguesa tpela melhoria das de vida alguns dos seus sectores e sociais nomeadamente

classes rr Mias A proliferalt3o de gimisios health clubs foi ltlinda

favorecida pdo prolongamento quer da esperanlta media de vida quer

das processos de escolarizaltao e de transiltao para a vida adulta Estas

din1Unicas que efectivamente fizeram dos reformadas e dos jovens

estudantes publicos-alvo fundamentals na promQ(ao de actividades

fisicas no espalto do ginasio considerando 0 tempo que tern POLCllUltUshy

mente disponivel ao longo do dia nome~damente fora das hons

maior wifego nos ginasios (perfodos almolto e p6s-laborais)

Urn outros pltblicos-alvo a que este segmento da indUstria de

design corporal mais se tem dirigido tern ido os homens mais disponishy

ao consumo dos sellS produtos e servi~os A imagem de

pader e competencia produzida e difundida pela publicidade e pclas

revistas hoje dedicadas ao segmento masculino ji nao e reflectida apenas

atravcs de sfmbolos tradicionais consumo masculino como 0 carro 0

relogio ou a can eta mas tam bern atraves investimentos na proawao

e manutenltao da aparencia fisica que tende a perder 0 formalismo do

fato-e-gravata A imagem de urn hamem atletico e cuidado passa a ser

inclusivamente apresentada como chave do sucesso entre as

242

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AITERADOS

mais exigentes quanto aDS cuidados masculinos com a imagem Esta nova

mostra um novo homem preocupado com a flexibilidade da

sua pele com a domesticaltao dos seus odores com a qualidade do seu

[[sico com a tonicidade da sua silhueta com a definiltao do

seu abdomen com 0 volume do seu biceps A pdtica de musculaltao

assume entao tun valor estratcgico na produltao do actual corpo mascushy

referencia e de reverencia

Trata-se de facto do regime corporal socialmente mals difundido

estrategia de promoltao de urn modelo corporeidade ma~cu-

modelo adetico com acento na potencia vitalidade

IHUgtCUlaL 0 que de resto nao sera de surpreender dada

a diiilsao incorporada de estereotipos da sociedade ocidental sabre a masshy

que tradicionalmemc ligam os padr6es de perfectibilidade e

atractivlhde masculina ao modelo de corporeidade mesomorfico e hipershy

troEado em medida cOlldensado na massa muscular tCUlllUldUd

nos peltoral~ braltos e costas esnuturando um torso de

adclgalta ate a

Um homem deve ter os ombros mais largos do que a anea ter uma

anca fina e deve ser algo robusto mats cheinho Mais cheinho

mas nao e em gordura e em musculo ( ) Estou contente com 0 ter

aos 80 Guilos Acho que eu ainda tenho muito parauabalhar

ainda me falta muito trabalho frente Ainda vai ser uma coisa

que YCJo-me nos pr()X1mOS 6 an os a ter de trabalhar 0 corpo ate cheshy

gar 11 tal forma ideal ao corpo ideal ( ) Eo tal corpo masculino com

os ombros mais a cintura mais em V - Ii esra 0 torso em

V - e musculado

ESTUDANTE UNlVERSITiillIO 21 ANOS PRATICANTE DE MUSCUIAtAo

porem scm a rudeza do passado impressa pelas condilt6es de

nabalho que sem intenltio moldavam 0 corpo 0 corpo do hom em ja nao

e urn mero instrurnento que se abandona ao trabalho mas de proprio

243

CLASSES ASSOCIATfVTSMO E ESTADO

MlllUCla como COOl

extracltao total dos pel os que possam encobrir 0

ao

da simetria muscular conseguida

Mas os corpos femininos tambem nao ficaram de fora dos sistemas

fisicos associados a muscutaltao Com objectivos mais moderados em

termos de volume corporal e sobretudo direccionados para a perda de

adiposidade e tonificaltao determinadas zonas do corpo as mulheres

encontraram res posta aos seus anseios corporais sobretudo nos body Mesmo

aos pesos e e aoontrario

publico masCilliri~ as roulheres tendem a

do corpo como (lllS de intervenltao prioritaria no sentido da manuten

ltao ou mociitJG50 Face a tais aspiraltoes a chegoll

a conceber um sistema fisieo particular para dar ao pllbico

especificameme feminino comercializando-o sob a designaltio de GAP

uma modalidade que promove 0 trabalho de resistencia e forshy

talecimento atraves de varios exerdcios localizados nas zonas

dos gl(lteos abdommalS e pernas

Eu era ter aqude corpo musculado corpo bonito

que tada a gente rilio e () Nao llma mulher eXclgeJradamell1le

muscuCida porque perde os trayos femininosEuma mulher ddinida

Nao precisa de ser magra Nao acho que eaquele estereotipo de magre-La

que cada vez ha mais que leva as miudas hoje em dia a rornarem-se

anonxicas ( ) Hoje no ginasio a imagem que se quer passar e que

essa nao ea nao eo ideal de urn corpo 0 ideal de urn corpo e umamulher a mulher nao precisa de estar MOr

desde que bem ueWllUa e0 ideal

23 ANOS 120 ANO INSTRJroRA DE CARDlo-FrfNESS

244

PESOS HALTERES E SENTiDOS DOS CORPOS (H)AIrERADOS

tern

cas no seio da industria de design corporal Como assinala Fortuna

os de edllcalt3o ffsica tinham como vocaltao disciplinar 0 corpo

para for mar rnelhores cidactios mais saudaveis e competemes prepashy

rando-os para os desafios das novas sociedades surgidas com a industriashy

os actuais health clubs por seu lado associ am a juventude a

beleza e a satide do corpo aamo-confianya aauto-estima e ao bem-estar

ol(rcendo prodmos e serviltos a moldar 0 corpo amedida

e preocupalt6es de

outros mats imageticos

some body Estar em mostrar (determinadas)

A manifestalt3o mais valorizada do corpo saudavel deixa de

ser a seu rendimeDto fo1lta e para passar a ser a sua aparenshy

cia A sallde cosmetiza-se e torna-se num fen6meno estetico nao basta

mante-la mas fazer transparece-la nomeadamente atraves da aquisiltao

urn corpo perfeito Este par sua vez passa a ser condiltao sine

non para 0

Higt LdllI-la para a ser

Eu via que tinlIa urn corpo com varios problemas Precisava de

rirar a barriga algum poeu e Tinha urn peito quase fundo dentro

quase que nao se via a barriga mais saida que 0 peito Via que tinha

problemas e estava a caminhar para 0 problema da obesidade ( )

Agora quando olho para 0 espdho vejo urn corpo perfeito 0 que todo

o hornem gostaria de tef E simo-me orgulhoso por isso

AUXILlAR DE ACOO MEDICA 120 ANO 24 ANOS

PHKnCANTE DE

245

CLASSES ASSOCIATIVLSMO E ESTADO

despono ou pelo menos efectuar com regushy

[sica passou aser nao apenas urn direito25 mas

tambem urn dever sociedades contempodneas um

cuja falta acarreta frequentemente sentimentos de culpa pessoal

e aclt6es de sanyao social sobre aqueles que se encontram pouco

a descobrir as suas supostas vantagens ou cujos corpos se afastarn

da normatividade da silhueta canonica quese deseia bem deflllida e

tonificada

Pesos e halteres entre 0 estUode vida saudltivel doeura ddec a a sau

Se a pFl1rllpaltao com os cuidados corporlis era anteriOrrneHr proshy

pria das classt~s onis lhastad3s nas condilt6es

oitenta f) portugues comum passa a tcr acesso em qualqucr sureil1ler~

cadoa uma pan6plia de prodUloh tecnicas e servicos que prometem criar

e conservar um corpo jovem perfeira e saudive qualidades de refeshy

rencia e reverencia no culto conremporaneo do corpo Socialmente apreshy

sentados e mercantilizados em associacao acriacao de urn

produtor de salIde e preventor doenca tais produtos tecshy

nicas e servi~os sao frequentemente assumidos na vida quotidiana Como

sendodo oll mais importante que os propdes servicos de saude e de

prestacao de cuidados medicos na concretizayao do bem-estar fisico e

psicologico das pessoas A ideia hoje partilhada no imaginario

de que a saude ealgo que se conquista ccoroHrio simb61ico da delegashy

ltao social no individuo das formas manutenlt3o controlo e vigilancia

do corpo que outrora haviam sido exercidas pelas autoridades

A difusao e enraizamento social da assuncao de que e possivd obter

e manrera saude do corpo atraves do envolvimento do individuo num

de pratiCa5 ditas saudaveis acabaram efectivamente por impushy

tar a cada urn uma responsabilidade crescente pelo seu estado de

Concomitantemente em alguns contextos forneceram argumentos a

246

PESOS HAJTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AIfERADOS

desresponsabiliza~o parcial do Estado em materia de ULUltlUU medicos

e sallde publica Doravante nao esuposto que os cidadaos necessitem

de instrw5es das autoridades e instituiltoes publicas sobre como cui dar

sua existencia ffsica 0 corpo passa a ser urn espaco regulado

opc5es e escolhas de cada urn entre a pleiade de produtos tecnicas

e serviltos actualmente ao seu dispor

Sob a egide da crenca na autoridade pessoal sobre 0 corpo cada pessoa

apartida detem plenos direitos sobre esse bern patrimonial sen do igualshy

mente responsive pelo cumprimento determinados deveres sociais

Estes passam entre outros pdo governo da sua respectiva aparencia e

de vida Ao indivfduo eatribufdo urn papd preponderante na

identificaltao e controlo atempado dos sintomas de patologias diversas

problemas cardiovasculares na preVcncao perante condutas

risco (nomeadameHte atTaves da redwao doakool e do tabaco

obrigatoriedade de sexo protegido ou do exerdcia Hsico) au na

cia e evitamento do que sao socialmente considerados excessos (alimen-

tares exposicao ao sol de medicaliiacentio etc)

da adop~ao cada vez matS generalizada desta nova atitude de

pntdencialismo individualist a perante 0 bem-estar corporal e a evolultao

da oroDorcao de populaltao que em Portugal na viragem do

desenvolver algum tipo de aCyao no sentido de melhorar ou

manter 0 seu estado de salide Segundo 0 estudo 0 Estado de Saude em

entre 2001 e 2008 a percentagem de portuguese que afirshy

mavam estar a tomar no momenta realizaltao do inquerito alguma

iniciativ3 no sentido de mclhorar ou manter 0 seu estado de saude

viu-se aumentar de 368 em 2001 para cerca de metade da populaltao

(498) em 2008

Segundo 0 mesmo estudo essa evolultao e acompanhada da alterashy

de comportamento declarado rclativamente a determinados hibishy

tos de vida considerados saudaveis designadamente no que respeita

ao exerdcio fisico A percentagem de portugueses que afirmam

exerdcio [SICO regular (ginistica COffer etc) ve-se significativamente

de 33 em 2001 para 475 em 2008 Mesmo que 11ao

247

11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

se traduza numa pratica efectiva27 csta evolu~ao corresponded

a uma assinalivel incorporaltao social do dezJer-ser contemporaneo da

actividade fisica A representaiyao desta enquanto habito de vida saudishy

torna-se clara quando noutra investiga~a028 se constatou ser entre

os individuos que mais regularmente praticam exerdcio Hsico que mais

presente esta a percep~ao do risco cia sua ausencia quotidiana29

e born esaudiveJ eurn habito saudaveL E como se

fosse lel livros sel inteligente Esras a arranjar 0 teu corpo Sabes

que vais chegar aos quarenta e tal arros e ainda vais estar born Agora

muitos chegam aos qualcrrra e tal anos e ja esrao com barriga e

com sei a ter tanras ~u~tas coisas Ficas mas saudivel se estas a

treinar bem e sew mdar contra a tua

29 ANOS LH ENClfO ENFERMEI(O PRATICANTE DE MusCutAltAo

A tendcncia para a crenlta incontestlvel no exerdcio fisico como

habito de vida saudivel nao se apresenta contudo disrribulda

igual maneira no espa~o social e cultural portugues Sao varios os estushy

que tern localizado urn maior enraizamento social da disposi~ao

para a pratica de exerdcio fisico entre as mais jovens geralt6es e entre

os individuos provenientes dos estratos socioeconomicos mais clevashy

dos Resultadonao apenas das novas con(li~6es de sociais economicas

e simbolicas em que as gera~6es pos-25 de Abril sao socializadas relatishy

vamente ao corpo e aos cuidados corporais30 mas tambem de urn efeito

de trnsltao no curso

Investiga~6es realizadas sobre a pnitica de actividades ffsicas entre os

jovens portugueses denotam-na mais regular e intensiva nos grupos etashy

rios mais novos nomeadamente ate ainserlt5o no mercado de trabalho

e aassunlt5o de novas responsabilidades familiares31bull 0 que indica que

amedida que as etapas do processo de transi~ao para a vida adulta se vao

cum prindo a pritica desportiva vai efectivamente sendo abandonada no

quotidiano dos jovens portugueses

248

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

No caso especifico da 11l~LU1ltll-alJ uma actividade particularmente

exigente em termos do tempo dispoIl lVei para a sua pratica esta tenshy

dencia revela-se particularrnente marcante Trata-se no eatanto de

uma das modalidades com maior adesao efectiva ou potencial entre os

jovens em Portugal A sua pdtica efectiva (prcsente ou passada)

declarada por cerca de 12 da populalt5o jovem porttlguesa no ano

200032 sendo 34 a percentagem de jovens que nunca tendo pratishy

cado admitiram vir a faze-Io no futuro Quer a sua pdtica efectiva

quer a sua pr~hica potencial viram-se substancialmeme acrescidas entre

os jovens do sexo lTlasculin033 com idades compreendidas entre 18 e

anos ainda a residir com a familia de origem ou sozinhos solteiros

ou ja separados ou divorciados sem filhos Perfil dpieo para stlstentar

a hip6tese de 0 aumento de massa muscular ser urn investimento corshy

poral que corresponde ellliarga medida a uma fOlm~de capitalizar

o potencial expressivo do corpo masculino em estrategiasde atracltao e

sedult5o

Embora a disponibilidade potencial para a pratica da musculaltao

- nunca fiz mas admito vir a fazec surja praticamente transversal aos

jovens qualquer que seja 0 seu estatuto social ou habitat de residencia

o facto cque as condilt6es materiais de existencia continuam a constranshy

ger a sua ptatica efectiva Mais devada entre os jovens que melhores

condilt6es sociais detem para fa_zet face as mensalidades exigidas pelos

cspaltos destinados ao seu exerdci0 34 a pratica de musculaltao decrescc

amedida que se desce na estrutura social de 26 entre os jovens de

estatuto social alto diminui para 9 entre os jovens de estatuto social

mais baixo Do mesmo modo sao os jovcns que tern urn acesso mais

facilitado as instalalt6es que disponibilizam tal servi~o quem mais adere

efectivamente a sua pritica ou seja os jovens residentes em habitat

e suburbano 0 sanho em obter urn corpo musculado revela-se

portanto substancialmente mats democratizado na sua distribui~ao social

(mediaticamente amplificada) do que as condi~6es que perrnitem a sua

concrecizaltao

149

CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 4: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

1 CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

masculinos atraves do aumento hiperb61ico da massa muscular Foi at

que desde finais do seculo XIX esse sistema fisico passou a ser produzido

em larga escala sendo comercializado nacional e intemacionalmente5

Comeltou por ser urn sistema fisico desenvolvido por entre gentes

de feiras circos e freak-shows itinerantes por entre a Europa e os EUA

onde corpos apolineos de lutadores e artistas-Ievantadores de pesos e

alteres em tangas de pee de leopardo participavam de uma cultura

visual que hiperbolizava a virilidade masculina atraves de demonstrashy

ltoes espectaculares de volume e forlta muscular Depois autonomiza-se

e amplia-se com a emergencia de campeonatos desportivos bern

como de todo urn mercado de equipamentos e sistemas de produltao

muscular que veio a estend~r-se dos clubes ou sociedades de ginasshy

tica a proprilt1 vida domestica e profissional com a comercializa=ao

de maquinas e sis[emas de movimento para utilizarao na sala eou roo

local de trabalho

Ainda que xiLanJ indicios da tentatiYa de integrarao deste tipo

de sistema em Portugal a visibilidade social que colossos musculados

poderiam obter era susceptive de ferir a paisagem moral que Salazar

idealizava Corpos como 0 de Manue da Silveira6 ou 0 de Francisco

Padinha7 - famosos recordistas mundiais de pesos e halteres durante a

I Republica ~ nao eram especialmente apreciados peas novas instancias

de poder

Em ruptura com concepltoes libertarias e viciosas do republicashy

nismo 0 corpo masculino ideal do Estado Novo nao correspondia a

uma cultura fisica atletica em que as priticas fisicas de modificaltao

corporal serviriam propositos frivolos hedonistas e individualistas assoshy

ciados abeeza ao prazer e asatisfarao pessoal do homem Aquee corpo

vinha antes ao encontro de uma cultura fisica higienista e moralizadora nao so com 0 objectivo colectivo de tomar os corpos dos jovens portushy

gueses mais fortes resistentes e imunes mas tambem socialmente mais

respeidveis e disciplinados A promoltao da saude do corpo nao s6 se

revearia no rendimento fisico do trabalho como Faria transparecer as

qualidades morais do individuo que se pretendiam de acordo com a

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

nova ordem moral e social pretendida para a narao portuguesa Cada

corpo individualmente deveria entregar-se aautoridade do ideal colecshy

tivo e deixar transparecer os principios cristaos e politicos do regime

urn ideal fisico de virtude e pudor obediencia e disciplina sobriedade

e austeridade higiene e robustez8bull Urn corpo dedicado a Deus aPatria

aFamilia e ao T rabalh09bull

Instituiltoes como a Mocidade Portuguesa ou a Fundarao Nacional

para a Alegria no Trabalho em articularao com instituiltoes medicas

desportivas pedagogicas eclesiasticas e politicas adquiriam urn pape

central nesse projecto colectivo Atraves deas 0 Estado Novo tentava

toniflcar fisica e moralmente a sua juventude reformando-Ihe 0 esqueshy

leto ea musculatura tornando-lhe 0 espinhalto rijo e 0 pulso vigoroso

camo descreve Ines Brasao lO bull 0 incitamento ao exercicio fisico que os

jovens encontravam nessas organizaroes visava [[ansformar potenciais

corpos definhados enfezados e raquiticos em corpofrobustDs corados

e verticais capazes de enfrentar quaisquer adversidades a bern da naltao

Scm alinhar porem nos principios tecnicos e morais do body building norte-americano evitando que 0 corpo dos seus praticantes Fosse abanshy

donado a excessos apoHneos e narcisistas

A preocuparao poHtica com a fisicalidade dos portugueses favoreshy

ceu sim a adopltao do sistema fisico de Pehr Henrik Ling (1776-1839)

urn sueco cuja doutrina de educaltao fisica havia sido posta ern pratica

em outras naroes europeiasll 0 objectivo deste sistema nao era 0 adenshy

samento do sistema muscular mas 0 desenvolvimento racional de roda

a fisiologia e morfologia corporal de forma a socializar 0 praticante no

autocontrolo social das suas manifestaltoes fisicas e emocionais Vulgarshy

mente conhecido por ginastica sueca tratava-se de urn sistema racioshy

nal de exercicios localizados e sequencialmente cadenciados promotores

da respiraltao da verticalizaltao do aprumo e da correcltao dos movimenshy

to Executados em colectivos sincronizados e uniformizados de branco

sugeriam uma imagem de disciplina e ordem de pureza fisica e moral

de cooperaltao e de exortaltao nacional que esbatia e determinava as

singularidades de cada corpo fisico em nome do corpo social

234 235

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

Do sistema de Ling pretendia-se 0 adestramento de

des instintivas dos jovens rapazes atraves da incorpora~ao do gosto

disciplina e obediencia ligado a uma instru~ao militar preparat6shy

ria vocacionada para demonstralt6es de engralldecimento e exaltaltao

da patria bem como a seu tempo para a defesa do Imperio A forlta e

) tonicidade dos carpos masculinos bern como a ordem e a disciplina

colectiva quc demonstravam aquando das marchas plihlicas dos

filiados nos quadros da Legiao ou da Mocidade Portuguesa

simbolicamente a projecltao social da for~a do Estado sobre 0 territorio

nacional e imperial Mais do que replicar criterillS bcleza associ ados

a toniftcalt~o muscular a gi1astica suecaambicionava promover aptishy

does morais =1UaVeS do descnvolvimento racional e equilibrado d~ fisioshy

logia e morfokgia do corpo Cumprir-sc-ia assim 0 adestramento corshy

poral prescrito por Juvenal- mens sana in corpore sana - maxima eF

que em saLujsmo escorrcito queria dizer t()rmaltao da consciencia na

e atraves da disciplina e submissao dO$

Sinais demudanlta medraram nas decadas de cinquentae sessenta

Algumfl ousadia e desejo de ruplura nas atitudes e cuidados com 0

corpo ganharam enfase por cntre as camadas juvenis mals escolarizadas e nem sempre d6ceis e acriticas Muitos rapnes e rapallgas as corpos nao tanto pOl referencia as insrancias socializadorao do regime mas reportando-se as corporalidades

mais mundanas que se davam quotidianamente a ver nos jornais revisshy

tas cartazes espectaculos cinema e televisao Movidos pelas novas

referencias simb6licas que estes meios trouxeram assim como pelo

proprio comacto social quotidiano com os sectores femininos da popushy

laltao quer no trabalho quer na vida mundana os homens veem-se

socialmente pressionados para melhor cuidar a sua

corporal

A clegancia corporal de cones cinematogrMicos como John Wayne

Clark Gable ou Gregory Peck concorria socialmcnte com a virilidade

ostensiva de corpos como 0 de Tarzan Taborda13 pOI exemplo que

atraam a ateIlltao dos home11s e 0 desejo das mulheres para os ringues

236

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

portugueses de lura livre Escrevia Garcia Alvarez no jornal Record

ainda em 197214 Embora possua pouca yoga no 110SS0 Pais 0

rismo consegue chamar a 5i a atenltao eo interesse de rnilhares de adepshy

tos e goza de justificavel prestigio em muitos paises do mundo

palmentc no outro ado do Atlantico Na America do Norte entao

multiplicam-se os torneios para apuramento dos corpos mais modelares

diremos mais modelados - subsistindo 0 maior interesse e

entusiasmo pelas sucessivas deilt6es do laquoMr qualquer coisaraquo que culshy

minam com os certames correspondentes adesignaltao do laquoMr USAraquo e

do laquoMr Universoraquo A Falange feminina nao perde pitada destas compeshy

tilt6es seguindo com entusiasmo indescridvel as actua~6es mais salientes

respectivos idolos do momento

A tradicional alfaiataria entra em crise nos anos setenta nomeadashy

mente com a emergencia industria do proflto-a-vestir uma realishy

que tambem c011quist3 0 consumidot masculino 15 As Iinhas rna is

iDrmais e rfgidas no modo de vdtir sao ahandonadas e suhstitufdas

por uma moda jovem promotora lima silhueta mais leve e conshy

forrive que marcava e enfatizava as formas corporais Por outro

a progressiva expansao do direito a tempos de lazer e a ferias remuneshy

radas simuldlneo a propagaltao de parques de campismo e dos ideais

contacto com a Natureza tambern contribula para a exposi~ao de

urn corpo que se deveria mostrar atractivo por emre trajes de a

banhos cada vez mais cunos

Libertando-se das vesLimentas que os encobriam e dissimulavam

as corpos vao-se entao progressivamente desnudando e exibindo ao

lange da segullda metade do seculo XX portugues Vma liberdade

contudo condicionada por novas forltas e institui-oes sociais geradoras

de novas exigencjas e expectativas sociais que em condilt6es de exposishy

publica os tendem a encarnar e a moldar

nao vdculo de um projecto de identidade naclOnal au apenas

instrumento que carece manter robusto encrgico e bern nutrido para

trabalhar e garantir a sobrevivencla 0 corpo p6s-democratico ganha

visibilidade e valor social entre as mais novas de portugueses

237

U ~1~

i11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

enquanto acessorio de identidade pessoal que urge cui dar investir e

plan ear Particularidades 1uperHuas que passavam discretamente por

entre roupas que 0 vclavam ganham 0 estatuto de imperfeiltao que urge

combater em nome novos canones corporais 0 corpo deseja-se agora

perfeito reHectindo uma imagem jovem e saudavel

o projecto colectivo de revigoramento f1sico politicamente conshy

duzido entao lU2ar a projectos individuals de manutencao e modishy

ficacao aconteceu nao apenas devido amudan)a de regime

politico mas tambem no contexto de urn conjunto alterayoes estrushy

turais na sociedade portuguesa ondc novos agentes e dinamicas mershy

cantilistas passaram a investir em forra Os pesos e halteres ltllCaUaIll

urn novo protagonismo social no mercado poftugues ganhando novos

contextos sociais e novas contlguraocs em varias actividadesffsicas

meios competitivos do balterofilismo do boc ou da

luta liv- ondc cram convocados como treino complementar para

autonomia relativa nas inumeras salas de ginasio e health

dubs onde passaram a ser mercantilizados no ambito de modalidades

pr6prias

Pesos e alteres na recente industria de design corporal

N urn contexto onde homens e mulheres passaram a exibir e

mais atentamente as suas aparcncias as foryas privadas do capitalismo

acabaram por contribuir mais do que as instituiyoes publicas higienistas

na difusao de novos habitos e cuidados corporais A incipiente

da moda e do design corporal que ja havia despontado antes do de

Abril cresce numa escala mais alargada e diversificada fragmentando

produtos e clientelas e alimentando expectativas e aspiraltDcs diferenciashy

das do passado Mais do que 0 ambicionado relligoramento fisico as

exigencias e desejos sociais gerados por essa industria VaG agora no senshy

tido do rejullenescimento C do aperfeiroamento da imagem e forma corshy

porais produzindo a ilusao massitlcada de cada um planear e

238

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

esculpir 0 pr6prio COIPO dentro urn padrao de beleza estabelecido

globalmenteo

Novas lojas fabricantes e empresas nacionais e internacionais vem

afirmar-se no mercado portugues disponibilizando modernos e

ticados produtos tecnicas e serviyos de modificacao e manutenyao

corporal em esferas diversas Da cosmetica a da cirurgia

ao nutricionismo dos centros de estetica aos spa toda uma pletora

de bens tecnologias e servios de bem-estar e bem-parecer do corpo

que prometem 0 ajustamento aos canones corporais do momento l6

por sua vez no que a masculinidade dizem rcspeito veem

substituir a clegancia eo glamour das estrelas de cinema dos anos cinshy

quenta pda fora e vigor de herois de torso em forma de V represenshy

tados por Arnold Schwarzcnegger Sylvester Stallone ou Jean-Claude

Van Damme

POI entre esra florescente industria de aesigncorporal o cresshy

cimento de iniciativas comerciais de actividade fisica geridas por pane

do sector privado qlier ao nlvd do invcstimento em produtos para

em espao domestico desde sistemas de exerdcios peri6dishy

cos espccializados roupa e calltado ate equipamemo caseiro diverso17

quer ao nivel do investimento em espayOS colectivos proporcionadores

de um conjullto de produtos e servios bem-estar e bem-parecer

Esses espayos colectivos comc~aram por assumir a forma de ginasio

de bairro contexto popularizado nos anos oitenta Nestes a musshy

culaao surgia com lugar destacado ao lado de novas modalidades

como a ginastica aerobica a primeira mais orientada para urn publico

masculino a segunda para urn pliblico fcminino A pratica da muscushy

lacao poren1 ja adicionava aos tradicionais pesos e halteres rnodernos

cquipamentos ergonomicos dotados de um design mais apelativo onde

cada detalhe passaria a ser concebido com 0 intuito de proporcionar aos

novos LlllLaUUU~ urn trcino menos arriscado e sofrido mais comodo e

con fomlveL

Postcriormente ja proximo anos noventa a musculayao toi

dlUIlllUa no con texto dos clubs que vieram a instalar-se

239

CLASSES ASSOCIATIVrSMO E ESTADO

em espaos multifunciol1ais deposidrios de valencias diversas

nas areas da da saude da alirnentacao e do lazer corporal muishy

tos representantes de cadeias internacionais que se instalaram em

algumas das principais cidades pormguesas com elevados invcstimentos

em sofisticadas tecnicas de gestao mflrketing e publicidade para cap tar

e ftdelizar potenciais publicos-alvo Entre 0 ann 2000 e 0 ana de 2008

o numero de health clubs em Portugal passou de 600 a 1400

bando mais de 600 mil mernbrosl 8bull Com uma

57 em Portugal estas estruturas facturam

euros

ras os

mais 1

mIS riscos e caracteristicas

um programa de Heino adequado a detershy

rrunaao corpo e acompanhar individualmente a sua exccuao

- C0 do egolmilriintO que perpassa no desporto

amador contemporaneo um dos produtoslservi~os em que

os health clubs mais apostam hoje ern dia devido aos ganhos financciros

proporcionados exclusividade desse servico urn dos mais caros para

o cotlSumidor

Concomitamemcntc novas actividades ffsicas e desportivas emershy

gem no ambito destcs novos espaos anunciadas como esteategias para

enfrentar e Edar corn os duros dcsafios da sociedade contemporanea ao

mcsmo tempo que velhas modalidades se rcnovam e sofisticam transshy

formando-se em mercadoria vendavel e derelativamente faeil

lidade Sistemas fisicos ancestrais como 0 por

exemplo ou ate mesmo varias artes enquanto

no

A sempre presente nos ginasios

a pesos e halterc~

240

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTFRADOS

acurnulado de

oHlzaoo de

dlllCllU e coreografado ao

fIrmo de musleas do momento que apresenta como relatishy

vamente ao esquema anterior 0 facto de eoncentrar uma quamidade e

de exerdeios musculares num curto periodo de tempo

45 a 60) reeuperando as da pratica desporriva

em grupo e desta fonna proporcionando um ambieme estimulante e

divertido

o objccrivo inicial do body pump nos anos novema ted ido em

medida lucrativo atrair 0 publico-alvo maseulino para a pdtica

de ccrclcio fisico eolectivo nomeadarnenLe ao da ginistiea aeroshy

scm contudo deixar de Ihes proporcionar 0 e atletieo

que indiidualmente a pcatica da musculacao lhes concediarn O~fdy

pump a par de outras modalidades que foram sob 0 mesrno COI1shy

ceito (designados de body training ou group como 0 body balance body combat body body

jump ou 0 spinning - RPlvf) tern a

registadas

monitores

COlllerClaUampauas eoroduzem-se exactamente nos

exerdcios e re1pectJlVO

uallzaao a cada tees meses de a a desmlotlV3ltao

por via da repctiao continuada

muitas dessas modalidades nos anos noventa vieram

U~LdUlUllC no sentido de diminuir 0 sofrimento do treino solidrio ClStishy

dioso silencioso e ascetico gue ate af implicava 0 treino tradicional de

muscular substituil1do-o pelo divertimento proporcionado

soeiabilidade e a mitsica que passaram a parte desses sistemas

241

- CLASSES ASSOClATrvISMO E ESTADO

treino 0 que vern corroborar empiricamente a hipotese avanshy

ltada por Lipovetsky de que hoje em dia 0 desporto de massas eessenshy

cialmente uma actividade dominada pda procura do prazer

mismo energetico da experiencia de si proprio depois do desporto

disciplinar e moralista cis 0 desporto-lazer a desporto-saude 0 desporshy

to-desafio Da pratica desportiva esperamos apenas sensalt6es e equilibr

valorizasao individual e evasao norma e descontraclt3o ja nao e a vinude que legitima 0 despono mas sim a emmao corporal 0 prazer

a forma e psicologica 0 des porto tornou-se urn dosemblemas mais

da cultura nardsica centrada no extase do

Oprocesso crescimento e de diversiflcaltao comercial das activishy

rades ffsicas indoor beneficiou durante os anos oitentac noventa

uma conjuntura economica favorivd caracterizada pdo aumento do

poder de compra da populaltao portuguesa tpela melhoria das de vida alguns dos seus sectores e sociais nomeadamente

classes rr Mias A proliferalt3o de gimisios health clubs foi ltlinda

favorecida pdo prolongamento quer da esperanlta media de vida quer

das processos de escolarizaltao e de transiltao para a vida adulta Estas

din1Unicas que efectivamente fizeram dos reformadas e dos jovens

estudantes publicos-alvo fundamentals na promQ(ao de actividades

fisicas no espalto do ginasio considerando 0 tempo que tern POLCllUltUshy

mente disponivel ao longo do dia nome~damente fora das hons

maior wifego nos ginasios (perfodos almolto e p6s-laborais)

Urn outros pltblicos-alvo a que este segmento da indUstria de

design corporal mais se tem dirigido tern ido os homens mais disponishy

ao consumo dos sellS produtos e servi~os A imagem de

pader e competencia produzida e difundida pela publicidade e pclas

revistas hoje dedicadas ao segmento masculino ji nao e reflectida apenas

atravcs de sfmbolos tradicionais consumo masculino como 0 carro 0

relogio ou a can eta mas tam bern atraves investimentos na proawao

e manutenltao da aparencia fisica que tende a perder 0 formalismo do

fato-e-gravata A imagem de urn hamem atletico e cuidado passa a ser

inclusivamente apresentada como chave do sucesso entre as

242

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AITERADOS

mais exigentes quanto aDS cuidados masculinos com a imagem Esta nova

mostra um novo homem preocupado com a flexibilidade da

sua pele com a domesticaltao dos seus odores com a qualidade do seu

[[sico com a tonicidade da sua silhueta com a definiltao do

seu abdomen com 0 volume do seu biceps A pdtica de musculaltao

assume entao tun valor estratcgico na produltao do actual corpo mascushy

referencia e de reverencia

Trata-se de facto do regime corporal socialmente mals difundido

estrategia de promoltao de urn modelo corporeidade ma~cu-

modelo adetico com acento na potencia vitalidade

IHUgtCUlaL 0 que de resto nao sera de surpreender dada

a diiilsao incorporada de estereotipos da sociedade ocidental sabre a masshy

que tradicionalmemc ligam os padr6es de perfectibilidade e

atractivlhde masculina ao modelo de corporeidade mesomorfico e hipershy

troEado em medida cOlldensado na massa muscular tCUlllUldUd

nos peltoral~ braltos e costas esnuturando um torso de

adclgalta ate a

Um homem deve ter os ombros mais largos do que a anea ter uma

anca fina e deve ser algo robusto mats cheinho Mais cheinho

mas nao e em gordura e em musculo ( ) Estou contente com 0 ter

aos 80 Guilos Acho que eu ainda tenho muito parauabalhar

ainda me falta muito trabalho frente Ainda vai ser uma coisa

que YCJo-me nos pr()X1mOS 6 an os a ter de trabalhar 0 corpo ate cheshy

gar 11 tal forma ideal ao corpo ideal ( ) Eo tal corpo masculino com

os ombros mais a cintura mais em V - Ii esra 0 torso em

V - e musculado

ESTUDANTE UNlVERSITiillIO 21 ANOS PRATICANTE DE MUSCUIAtAo

porem scm a rudeza do passado impressa pelas condilt6es de

nabalho que sem intenltio moldavam 0 corpo 0 corpo do hom em ja nao

e urn mero instrurnento que se abandona ao trabalho mas de proprio

243

CLASSES ASSOCIATfVTSMO E ESTADO

MlllUCla como COOl

extracltao total dos pel os que possam encobrir 0

ao

da simetria muscular conseguida

Mas os corpos femininos tambem nao ficaram de fora dos sistemas

fisicos associados a muscutaltao Com objectivos mais moderados em

termos de volume corporal e sobretudo direccionados para a perda de

adiposidade e tonificaltao determinadas zonas do corpo as mulheres

encontraram res posta aos seus anseios corporais sobretudo nos body Mesmo

aos pesos e e aoontrario

publico masCilliri~ as roulheres tendem a

do corpo como (lllS de intervenltao prioritaria no sentido da manuten

ltao ou mociitJG50 Face a tais aspiraltoes a chegoll

a conceber um sistema fisieo particular para dar ao pllbico

especificameme feminino comercializando-o sob a designaltio de GAP

uma modalidade que promove 0 trabalho de resistencia e forshy

talecimento atraves de varios exerdcios localizados nas zonas

dos gl(lteos abdommalS e pernas

Eu era ter aqude corpo musculado corpo bonito

que tada a gente rilio e () Nao llma mulher eXclgeJradamell1le

muscuCida porque perde os trayos femininosEuma mulher ddinida

Nao precisa de ser magra Nao acho que eaquele estereotipo de magre-La

que cada vez ha mais que leva as miudas hoje em dia a rornarem-se

anonxicas ( ) Hoje no ginasio a imagem que se quer passar e que

essa nao ea nao eo ideal de urn corpo 0 ideal de urn corpo e umamulher a mulher nao precisa de estar MOr

desde que bem ueWllUa e0 ideal

23 ANOS 120 ANO INSTRJroRA DE CARDlo-FrfNESS

244

PESOS HALTERES E SENTiDOS DOS CORPOS (H)AIrERADOS

tern

cas no seio da industria de design corporal Como assinala Fortuna

os de edllcalt3o ffsica tinham como vocaltao disciplinar 0 corpo

para for mar rnelhores cidactios mais saudaveis e competemes prepashy

rando-os para os desafios das novas sociedades surgidas com a industriashy

os actuais health clubs por seu lado associ am a juventude a

beleza e a satide do corpo aamo-confianya aauto-estima e ao bem-estar

ol(rcendo prodmos e serviltos a moldar 0 corpo amedida

e preocupalt6es de

outros mats imageticos

some body Estar em mostrar (determinadas)

A manifestalt3o mais valorizada do corpo saudavel deixa de

ser a seu rendimeDto fo1lta e para passar a ser a sua aparenshy

cia A sallde cosmetiza-se e torna-se num fen6meno estetico nao basta

mante-la mas fazer transparece-la nomeadamente atraves da aquisiltao

urn corpo perfeito Este par sua vez passa a ser condiltao sine

non para 0

Higt LdllI-la para a ser

Eu via que tinlIa urn corpo com varios problemas Precisava de

rirar a barriga algum poeu e Tinha urn peito quase fundo dentro

quase que nao se via a barriga mais saida que 0 peito Via que tinha

problemas e estava a caminhar para 0 problema da obesidade ( )

Agora quando olho para 0 espdho vejo urn corpo perfeito 0 que todo

o hornem gostaria de tef E simo-me orgulhoso por isso

AUXILlAR DE ACOO MEDICA 120 ANO 24 ANOS

PHKnCANTE DE

245

CLASSES ASSOCIATIVLSMO E ESTADO

despono ou pelo menos efectuar com regushy

[sica passou aser nao apenas urn direito25 mas

tambem urn dever sociedades contempodneas um

cuja falta acarreta frequentemente sentimentos de culpa pessoal

e aclt6es de sanyao social sobre aqueles que se encontram pouco

a descobrir as suas supostas vantagens ou cujos corpos se afastarn

da normatividade da silhueta canonica quese deseia bem deflllida e

tonificada

Pesos e halteres entre 0 estUode vida saudltivel doeura ddec a a sau

Se a pFl1rllpaltao com os cuidados corporlis era anteriOrrneHr proshy

pria das classt~s onis lhastad3s nas condilt6es

oitenta f) portugues comum passa a tcr acesso em qualqucr sureil1ler~

cadoa uma pan6plia de prodUloh tecnicas e servicos que prometem criar

e conservar um corpo jovem perfeira e saudive qualidades de refeshy

rencia e reverencia no culto conremporaneo do corpo Socialmente apreshy

sentados e mercantilizados em associacao acriacao de urn

produtor de salIde e preventor doenca tais produtos tecshy

nicas e servi~os sao frequentemente assumidos na vida quotidiana Como

sendodo oll mais importante que os propdes servicos de saude e de

prestacao de cuidados medicos na concretizayao do bem-estar fisico e

psicologico das pessoas A ideia hoje partilhada no imaginario

de que a saude ealgo que se conquista ccoroHrio simb61ico da delegashy

ltao social no individuo das formas manutenlt3o controlo e vigilancia

do corpo que outrora haviam sido exercidas pelas autoridades

A difusao e enraizamento social da assuncao de que e possivd obter

e manrera saude do corpo atraves do envolvimento do individuo num

de pratiCa5 ditas saudaveis acabaram efectivamente por impushy

tar a cada urn uma responsabilidade crescente pelo seu estado de

Concomitantemente em alguns contextos forneceram argumentos a

246

PESOS HAJTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AIfERADOS

desresponsabiliza~o parcial do Estado em materia de ULUltlUU medicos

e sallde publica Doravante nao esuposto que os cidadaos necessitem

de instrw5es das autoridades e instituiltoes publicas sobre como cui dar

sua existencia ffsica 0 corpo passa a ser urn espaco regulado

opc5es e escolhas de cada urn entre a pleiade de produtos tecnicas

e serviltos actualmente ao seu dispor

Sob a egide da crenca na autoridade pessoal sobre 0 corpo cada pessoa

apartida detem plenos direitos sobre esse bern patrimonial sen do igualshy

mente responsive pelo cumprimento determinados deveres sociais

Estes passam entre outros pdo governo da sua respectiva aparencia e

de vida Ao indivfduo eatribufdo urn papd preponderante na

identificaltao e controlo atempado dos sintomas de patologias diversas

problemas cardiovasculares na preVcncao perante condutas

risco (nomeadameHte atTaves da redwao doakool e do tabaco

obrigatoriedade de sexo protegido ou do exerdcia Hsico) au na

cia e evitamento do que sao socialmente considerados excessos (alimen-

tares exposicao ao sol de medicaliiacentio etc)

da adop~ao cada vez matS generalizada desta nova atitude de

pntdencialismo individualist a perante 0 bem-estar corporal e a evolultao

da oroDorcao de populaltao que em Portugal na viragem do

desenvolver algum tipo de aCyao no sentido de melhorar ou

manter 0 seu estado de salide Segundo 0 estudo 0 Estado de Saude em

entre 2001 e 2008 a percentagem de portuguese que afirshy

mavam estar a tomar no momenta realizaltao do inquerito alguma

iniciativ3 no sentido de mclhorar ou manter 0 seu estado de saude

viu-se aumentar de 368 em 2001 para cerca de metade da populaltao

(498) em 2008

Segundo 0 mesmo estudo essa evolultao e acompanhada da alterashy

de comportamento declarado rclativamente a determinados hibishy

tos de vida considerados saudaveis designadamente no que respeita

ao exerdcio fisico A percentagem de portugueses que afirmam

exerdcio [SICO regular (ginistica COffer etc) ve-se significativamente

de 33 em 2001 para 475 em 2008 Mesmo que 11ao

247

11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

se traduza numa pratica efectiva27 csta evolu~ao corresponded

a uma assinalivel incorporaltao social do dezJer-ser contemporaneo da

actividade fisica A representaiyao desta enquanto habito de vida saudishy

torna-se clara quando noutra investiga~a028 se constatou ser entre

os individuos que mais regularmente praticam exerdcio Hsico que mais

presente esta a percep~ao do risco cia sua ausencia quotidiana29

e born esaudiveJ eurn habito saudaveL E como se

fosse lel livros sel inteligente Esras a arranjar 0 teu corpo Sabes

que vais chegar aos quarenta e tal arros e ainda vais estar born Agora

muitos chegam aos qualcrrra e tal anos e ja esrao com barriga e

com sei a ter tanras ~u~tas coisas Ficas mas saudivel se estas a

treinar bem e sew mdar contra a tua

29 ANOS LH ENClfO ENFERMEI(O PRATICANTE DE MusCutAltAo

A tendcncia para a crenlta incontestlvel no exerdcio fisico como

habito de vida saudivel nao se apresenta contudo disrribulda

igual maneira no espa~o social e cultural portugues Sao varios os estushy

que tern localizado urn maior enraizamento social da disposi~ao

para a pratica de exerdcio fisico entre as mais jovens geralt6es e entre

os individuos provenientes dos estratos socioeconomicos mais clevashy

dos Resultadonao apenas das novas con(li~6es de sociais economicas

e simbolicas em que as gera~6es pos-25 de Abril sao socializadas relatishy

vamente ao corpo e aos cuidados corporais30 mas tambem de urn efeito

de trnsltao no curso

Investiga~6es realizadas sobre a pnitica de actividades ffsicas entre os

jovens portugueses denotam-na mais regular e intensiva nos grupos etashy

rios mais novos nomeadamente ate ainserlt5o no mercado de trabalho

e aassunlt5o de novas responsabilidades familiares31bull 0 que indica que

amedida que as etapas do processo de transi~ao para a vida adulta se vao

cum prindo a pritica desportiva vai efectivamente sendo abandonada no

quotidiano dos jovens portugueses

248

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

No caso especifico da 11l~LU1ltll-alJ uma actividade particularmente

exigente em termos do tempo dispoIl lVei para a sua pratica esta tenshy

dencia revela-se particularrnente marcante Trata-se no eatanto de

uma das modalidades com maior adesao efectiva ou potencial entre os

jovens em Portugal A sua pdtica efectiva (prcsente ou passada)

declarada por cerca de 12 da populalt5o jovem porttlguesa no ano

200032 sendo 34 a percentagem de jovens que nunca tendo pratishy

cado admitiram vir a faze-Io no futuro Quer a sua pdtica efectiva

quer a sua pr~hica potencial viram-se substancialmeme acrescidas entre

os jovens do sexo lTlasculin033 com idades compreendidas entre 18 e

anos ainda a residir com a familia de origem ou sozinhos solteiros

ou ja separados ou divorciados sem filhos Perfil dpieo para stlstentar

a hip6tese de 0 aumento de massa muscular ser urn investimento corshy

poral que corresponde ellliarga medida a uma fOlm~de capitalizar

o potencial expressivo do corpo masculino em estrategiasde atracltao e

sedult5o

Embora a disponibilidade potencial para a pratica da musculaltao

- nunca fiz mas admito vir a fazec surja praticamente transversal aos

jovens qualquer que seja 0 seu estatuto social ou habitat de residencia

o facto cque as condilt6es materiais de existencia continuam a constranshy

ger a sua ptatica efectiva Mais devada entre os jovens que melhores

condilt6es sociais detem para fa_zet face as mensalidades exigidas pelos

cspaltos destinados ao seu exerdci0 34 a pratica de musculaltao decrescc

amedida que se desce na estrutura social de 26 entre os jovens de

estatuto social alto diminui para 9 entre os jovens de estatuto social

mais baixo Do mesmo modo sao os jovcns que tern urn acesso mais

facilitado as instalalt6es que disponibilizam tal servi~o quem mais adere

efectivamente a sua pritica ou seja os jovens residentes em habitat

e suburbano 0 sanho em obter urn corpo musculado revela-se

portanto substancialmente mats democratizado na sua distribui~ao social

(mediaticamente amplificada) do que as condi~6es que perrnitem a sua

concrecizaltao

149

CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 5: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

Do sistema de Ling pretendia-se 0 adestramento de

des instintivas dos jovens rapazes atraves da incorpora~ao do gosto

disciplina e obediencia ligado a uma instru~ao militar preparat6shy

ria vocacionada para demonstralt6es de engralldecimento e exaltaltao

da patria bem como a seu tempo para a defesa do Imperio A forlta e

) tonicidade dos carpos masculinos bern como a ordem e a disciplina

colectiva quc demonstravam aquando das marchas plihlicas dos

filiados nos quadros da Legiao ou da Mocidade Portuguesa

simbolicamente a projecltao social da for~a do Estado sobre 0 territorio

nacional e imperial Mais do que replicar criterillS bcleza associ ados

a toniftcalt~o muscular a gi1astica suecaambicionava promover aptishy

does morais =1UaVeS do descnvolvimento racional e equilibrado d~ fisioshy

logia e morfokgia do corpo Cumprir-sc-ia assim 0 adestramento corshy

poral prescrito por Juvenal- mens sana in corpore sana - maxima eF

que em saLujsmo escorrcito queria dizer t()rmaltao da consciencia na

e atraves da disciplina e submissao dO$

Sinais demudanlta medraram nas decadas de cinquentae sessenta

Algumfl ousadia e desejo de ruplura nas atitudes e cuidados com 0

corpo ganharam enfase por cntre as camadas juvenis mals escolarizadas e nem sempre d6ceis e acriticas Muitos rapnes e rapallgas as corpos nao tanto pOl referencia as insrancias socializadorao do regime mas reportando-se as corporalidades

mais mundanas que se davam quotidianamente a ver nos jornais revisshy

tas cartazes espectaculos cinema e televisao Movidos pelas novas

referencias simb6licas que estes meios trouxeram assim como pelo

proprio comacto social quotidiano com os sectores femininos da popushy

laltao quer no trabalho quer na vida mundana os homens veem-se

socialmente pressionados para melhor cuidar a sua

corporal

A clegancia corporal de cones cinematogrMicos como John Wayne

Clark Gable ou Gregory Peck concorria socialmcnte com a virilidade

ostensiva de corpos como 0 de Tarzan Taborda13 pOI exemplo que

atraam a ateIlltao dos home11s e 0 desejo das mulheres para os ringues

236

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

portugueses de lura livre Escrevia Garcia Alvarez no jornal Record

ainda em 197214 Embora possua pouca yoga no 110SS0 Pais 0

rismo consegue chamar a 5i a atenltao eo interesse de rnilhares de adepshy

tos e goza de justificavel prestigio em muitos paises do mundo

palmentc no outro ado do Atlantico Na America do Norte entao

multiplicam-se os torneios para apuramento dos corpos mais modelares

diremos mais modelados - subsistindo 0 maior interesse e

entusiasmo pelas sucessivas deilt6es do laquoMr qualquer coisaraquo que culshy

minam com os certames correspondentes adesignaltao do laquoMr USAraquo e

do laquoMr Universoraquo A Falange feminina nao perde pitada destas compeshy

tilt6es seguindo com entusiasmo indescridvel as actua~6es mais salientes

respectivos idolos do momento

A tradicional alfaiataria entra em crise nos anos setenta nomeadashy

mente com a emergencia industria do proflto-a-vestir uma realishy

que tambem c011quist3 0 consumidot masculino 15 As Iinhas rna is

iDrmais e rfgidas no modo de vdtir sao ahandonadas e suhstitufdas

por uma moda jovem promotora lima silhueta mais leve e conshy

forrive que marcava e enfatizava as formas corporais Por outro

a progressiva expansao do direito a tempos de lazer e a ferias remuneshy

radas simuldlneo a propagaltao de parques de campismo e dos ideais

contacto com a Natureza tambern contribula para a exposi~ao de

urn corpo que se deveria mostrar atractivo por emre trajes de a

banhos cada vez mais cunos

Libertando-se das vesLimentas que os encobriam e dissimulavam

as corpos vao-se entao progressivamente desnudando e exibindo ao

lange da segullda metade do seculo XX portugues Vma liberdade

contudo condicionada por novas forltas e institui-oes sociais geradoras

de novas exigencjas e expectativas sociais que em condilt6es de exposishy

publica os tendem a encarnar e a moldar

nao vdculo de um projecto de identidade naclOnal au apenas

instrumento que carece manter robusto encrgico e bern nutrido para

trabalhar e garantir a sobrevivencla 0 corpo p6s-democratico ganha

visibilidade e valor social entre as mais novas de portugueses

237

U ~1~

i11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

enquanto acessorio de identidade pessoal que urge cui dar investir e

plan ear Particularidades 1uperHuas que passavam discretamente por

entre roupas que 0 vclavam ganham 0 estatuto de imperfeiltao que urge

combater em nome novos canones corporais 0 corpo deseja-se agora

perfeito reHectindo uma imagem jovem e saudavel

o projecto colectivo de revigoramento f1sico politicamente conshy

duzido entao lU2ar a projectos individuals de manutencao e modishy

ficacao aconteceu nao apenas devido amudan)a de regime

politico mas tambem no contexto de urn conjunto alterayoes estrushy

turais na sociedade portuguesa ondc novos agentes e dinamicas mershy

cantilistas passaram a investir em forra Os pesos e halteres ltllCaUaIll

urn novo protagonismo social no mercado poftugues ganhando novos

contextos sociais e novas contlguraocs em varias actividadesffsicas

meios competitivos do balterofilismo do boc ou da

luta liv- ondc cram convocados como treino complementar para

autonomia relativa nas inumeras salas de ginasio e health

dubs onde passaram a ser mercantilizados no ambito de modalidades

pr6prias

Pesos e alteres na recente industria de design corporal

N urn contexto onde homens e mulheres passaram a exibir e

mais atentamente as suas aparcncias as foryas privadas do capitalismo

acabaram por contribuir mais do que as instituiyoes publicas higienistas

na difusao de novos habitos e cuidados corporais A incipiente

da moda e do design corporal que ja havia despontado antes do de

Abril cresce numa escala mais alargada e diversificada fragmentando

produtos e clientelas e alimentando expectativas e aspiraltDcs diferenciashy

das do passado Mais do que 0 ambicionado relligoramento fisico as

exigencias e desejos sociais gerados por essa industria VaG agora no senshy

tido do rejullenescimento C do aperfeiroamento da imagem e forma corshy

porais produzindo a ilusao massitlcada de cada um planear e

238

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

esculpir 0 pr6prio COIPO dentro urn padrao de beleza estabelecido

globalmenteo

Novas lojas fabricantes e empresas nacionais e internacionais vem

afirmar-se no mercado portugues disponibilizando modernos e

ticados produtos tecnicas e serviyos de modificacao e manutenyao

corporal em esferas diversas Da cosmetica a da cirurgia

ao nutricionismo dos centros de estetica aos spa toda uma pletora

de bens tecnologias e servios de bem-estar e bem-parecer do corpo

que prometem 0 ajustamento aos canones corporais do momento l6

por sua vez no que a masculinidade dizem rcspeito veem

substituir a clegancia eo glamour das estrelas de cinema dos anos cinshy

quenta pda fora e vigor de herois de torso em forma de V represenshy

tados por Arnold Schwarzcnegger Sylvester Stallone ou Jean-Claude

Van Damme

POI entre esra florescente industria de aesigncorporal o cresshy

cimento de iniciativas comerciais de actividade fisica geridas por pane

do sector privado qlier ao nlvd do invcstimento em produtos para

em espao domestico desde sistemas de exerdcios peri6dishy

cos espccializados roupa e calltado ate equipamemo caseiro diverso17

quer ao nivel do investimento em espayOS colectivos proporcionadores

de um conjullto de produtos e servios bem-estar e bem-parecer

Esses espayos colectivos comc~aram por assumir a forma de ginasio

de bairro contexto popularizado nos anos oitenta Nestes a musshy

culaao surgia com lugar destacado ao lado de novas modalidades

como a ginastica aerobica a primeira mais orientada para urn publico

masculino a segunda para urn pliblico fcminino A pratica da muscushy

lacao poren1 ja adicionava aos tradicionais pesos e halteres rnodernos

cquipamentos ergonomicos dotados de um design mais apelativo onde

cada detalhe passaria a ser concebido com 0 intuito de proporcionar aos

novos LlllLaUUU~ urn trcino menos arriscado e sofrido mais comodo e

con fomlveL

Postcriormente ja proximo anos noventa a musculayao toi

dlUIlllUa no con texto dos clubs que vieram a instalar-se

239

CLASSES ASSOCIATIVrSMO E ESTADO

em espaos multifunciol1ais deposidrios de valencias diversas

nas areas da da saude da alirnentacao e do lazer corporal muishy

tos representantes de cadeias internacionais que se instalaram em

algumas das principais cidades pormguesas com elevados invcstimentos

em sofisticadas tecnicas de gestao mflrketing e publicidade para cap tar

e ftdelizar potenciais publicos-alvo Entre 0 ann 2000 e 0 ana de 2008

o numero de health clubs em Portugal passou de 600 a 1400

bando mais de 600 mil mernbrosl 8bull Com uma

57 em Portugal estas estruturas facturam

euros

ras os

mais 1

mIS riscos e caracteristicas

um programa de Heino adequado a detershy

rrunaao corpo e acompanhar individualmente a sua exccuao

- C0 do egolmilriintO que perpassa no desporto

amador contemporaneo um dos produtoslservi~os em que

os health clubs mais apostam hoje ern dia devido aos ganhos financciros

proporcionados exclusividade desse servico urn dos mais caros para

o cotlSumidor

Concomitamemcntc novas actividades ffsicas e desportivas emershy

gem no ambito destcs novos espaos anunciadas como esteategias para

enfrentar e Edar corn os duros dcsafios da sociedade contemporanea ao

mcsmo tempo que velhas modalidades se rcnovam e sofisticam transshy

formando-se em mercadoria vendavel e derelativamente faeil

lidade Sistemas fisicos ancestrais como 0 por

exemplo ou ate mesmo varias artes enquanto

no

A sempre presente nos ginasios

a pesos e halterc~

240

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTFRADOS

acurnulado de

oHlzaoo de

dlllCllU e coreografado ao

fIrmo de musleas do momento que apresenta como relatishy

vamente ao esquema anterior 0 facto de eoncentrar uma quamidade e

de exerdeios musculares num curto periodo de tempo

45 a 60) reeuperando as da pratica desporriva

em grupo e desta fonna proporcionando um ambieme estimulante e

divertido

o objccrivo inicial do body pump nos anos novema ted ido em

medida lucrativo atrair 0 publico-alvo maseulino para a pdtica

de ccrclcio fisico eolectivo nomeadarnenLe ao da ginistiea aeroshy

scm contudo deixar de Ihes proporcionar 0 e atletieo

que indiidualmente a pcatica da musculacao lhes concediarn O~fdy

pump a par de outras modalidades que foram sob 0 mesrno COI1shy

ceito (designados de body training ou group como 0 body balance body combat body body

jump ou 0 spinning - RPlvf) tern a

registadas

monitores

COlllerClaUampauas eoroduzem-se exactamente nos

exerdcios e re1pectJlVO

uallzaao a cada tees meses de a a desmlotlV3ltao

por via da repctiao continuada

muitas dessas modalidades nos anos noventa vieram

U~LdUlUllC no sentido de diminuir 0 sofrimento do treino solidrio ClStishy

dioso silencioso e ascetico gue ate af implicava 0 treino tradicional de

muscular substituil1do-o pelo divertimento proporcionado

soeiabilidade e a mitsica que passaram a parte desses sistemas

241

- CLASSES ASSOClATrvISMO E ESTADO

treino 0 que vern corroborar empiricamente a hipotese avanshy

ltada por Lipovetsky de que hoje em dia 0 desporto de massas eessenshy

cialmente uma actividade dominada pda procura do prazer

mismo energetico da experiencia de si proprio depois do desporto

disciplinar e moralista cis 0 desporto-lazer a desporto-saude 0 desporshy

to-desafio Da pratica desportiva esperamos apenas sensalt6es e equilibr

valorizasao individual e evasao norma e descontraclt3o ja nao e a vinude que legitima 0 despono mas sim a emmao corporal 0 prazer

a forma e psicologica 0 des porto tornou-se urn dosemblemas mais

da cultura nardsica centrada no extase do

Oprocesso crescimento e de diversiflcaltao comercial das activishy

rades ffsicas indoor beneficiou durante os anos oitentac noventa

uma conjuntura economica favorivd caracterizada pdo aumento do

poder de compra da populaltao portuguesa tpela melhoria das de vida alguns dos seus sectores e sociais nomeadamente

classes rr Mias A proliferalt3o de gimisios health clubs foi ltlinda

favorecida pdo prolongamento quer da esperanlta media de vida quer

das processos de escolarizaltao e de transiltao para a vida adulta Estas

din1Unicas que efectivamente fizeram dos reformadas e dos jovens

estudantes publicos-alvo fundamentals na promQ(ao de actividades

fisicas no espalto do ginasio considerando 0 tempo que tern POLCllUltUshy

mente disponivel ao longo do dia nome~damente fora das hons

maior wifego nos ginasios (perfodos almolto e p6s-laborais)

Urn outros pltblicos-alvo a que este segmento da indUstria de

design corporal mais se tem dirigido tern ido os homens mais disponishy

ao consumo dos sellS produtos e servi~os A imagem de

pader e competencia produzida e difundida pela publicidade e pclas

revistas hoje dedicadas ao segmento masculino ji nao e reflectida apenas

atravcs de sfmbolos tradicionais consumo masculino como 0 carro 0

relogio ou a can eta mas tam bern atraves investimentos na proawao

e manutenltao da aparencia fisica que tende a perder 0 formalismo do

fato-e-gravata A imagem de urn hamem atletico e cuidado passa a ser

inclusivamente apresentada como chave do sucesso entre as

242

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AITERADOS

mais exigentes quanto aDS cuidados masculinos com a imagem Esta nova

mostra um novo homem preocupado com a flexibilidade da

sua pele com a domesticaltao dos seus odores com a qualidade do seu

[[sico com a tonicidade da sua silhueta com a definiltao do

seu abdomen com 0 volume do seu biceps A pdtica de musculaltao

assume entao tun valor estratcgico na produltao do actual corpo mascushy

referencia e de reverencia

Trata-se de facto do regime corporal socialmente mals difundido

estrategia de promoltao de urn modelo corporeidade ma~cu-

modelo adetico com acento na potencia vitalidade

IHUgtCUlaL 0 que de resto nao sera de surpreender dada

a diiilsao incorporada de estereotipos da sociedade ocidental sabre a masshy

que tradicionalmemc ligam os padr6es de perfectibilidade e

atractivlhde masculina ao modelo de corporeidade mesomorfico e hipershy

troEado em medida cOlldensado na massa muscular tCUlllUldUd

nos peltoral~ braltos e costas esnuturando um torso de

adclgalta ate a

Um homem deve ter os ombros mais largos do que a anea ter uma

anca fina e deve ser algo robusto mats cheinho Mais cheinho

mas nao e em gordura e em musculo ( ) Estou contente com 0 ter

aos 80 Guilos Acho que eu ainda tenho muito parauabalhar

ainda me falta muito trabalho frente Ainda vai ser uma coisa

que YCJo-me nos pr()X1mOS 6 an os a ter de trabalhar 0 corpo ate cheshy

gar 11 tal forma ideal ao corpo ideal ( ) Eo tal corpo masculino com

os ombros mais a cintura mais em V - Ii esra 0 torso em

V - e musculado

ESTUDANTE UNlVERSITiillIO 21 ANOS PRATICANTE DE MUSCUIAtAo

porem scm a rudeza do passado impressa pelas condilt6es de

nabalho que sem intenltio moldavam 0 corpo 0 corpo do hom em ja nao

e urn mero instrurnento que se abandona ao trabalho mas de proprio

243

CLASSES ASSOCIATfVTSMO E ESTADO

MlllUCla como COOl

extracltao total dos pel os que possam encobrir 0

ao

da simetria muscular conseguida

Mas os corpos femininos tambem nao ficaram de fora dos sistemas

fisicos associados a muscutaltao Com objectivos mais moderados em

termos de volume corporal e sobretudo direccionados para a perda de

adiposidade e tonificaltao determinadas zonas do corpo as mulheres

encontraram res posta aos seus anseios corporais sobretudo nos body Mesmo

aos pesos e e aoontrario

publico masCilliri~ as roulheres tendem a

do corpo como (lllS de intervenltao prioritaria no sentido da manuten

ltao ou mociitJG50 Face a tais aspiraltoes a chegoll

a conceber um sistema fisieo particular para dar ao pllbico

especificameme feminino comercializando-o sob a designaltio de GAP

uma modalidade que promove 0 trabalho de resistencia e forshy

talecimento atraves de varios exerdcios localizados nas zonas

dos gl(lteos abdommalS e pernas

Eu era ter aqude corpo musculado corpo bonito

que tada a gente rilio e () Nao llma mulher eXclgeJradamell1le

muscuCida porque perde os trayos femininosEuma mulher ddinida

Nao precisa de ser magra Nao acho que eaquele estereotipo de magre-La

que cada vez ha mais que leva as miudas hoje em dia a rornarem-se

anonxicas ( ) Hoje no ginasio a imagem que se quer passar e que

essa nao ea nao eo ideal de urn corpo 0 ideal de urn corpo e umamulher a mulher nao precisa de estar MOr

desde que bem ueWllUa e0 ideal

23 ANOS 120 ANO INSTRJroRA DE CARDlo-FrfNESS

244

PESOS HALTERES E SENTiDOS DOS CORPOS (H)AIrERADOS

tern

cas no seio da industria de design corporal Como assinala Fortuna

os de edllcalt3o ffsica tinham como vocaltao disciplinar 0 corpo

para for mar rnelhores cidactios mais saudaveis e competemes prepashy

rando-os para os desafios das novas sociedades surgidas com a industriashy

os actuais health clubs por seu lado associ am a juventude a

beleza e a satide do corpo aamo-confianya aauto-estima e ao bem-estar

ol(rcendo prodmos e serviltos a moldar 0 corpo amedida

e preocupalt6es de

outros mats imageticos

some body Estar em mostrar (determinadas)

A manifestalt3o mais valorizada do corpo saudavel deixa de

ser a seu rendimeDto fo1lta e para passar a ser a sua aparenshy

cia A sallde cosmetiza-se e torna-se num fen6meno estetico nao basta

mante-la mas fazer transparece-la nomeadamente atraves da aquisiltao

urn corpo perfeito Este par sua vez passa a ser condiltao sine

non para 0

Higt LdllI-la para a ser

Eu via que tinlIa urn corpo com varios problemas Precisava de

rirar a barriga algum poeu e Tinha urn peito quase fundo dentro

quase que nao se via a barriga mais saida que 0 peito Via que tinha

problemas e estava a caminhar para 0 problema da obesidade ( )

Agora quando olho para 0 espdho vejo urn corpo perfeito 0 que todo

o hornem gostaria de tef E simo-me orgulhoso por isso

AUXILlAR DE ACOO MEDICA 120 ANO 24 ANOS

PHKnCANTE DE

245

CLASSES ASSOCIATIVLSMO E ESTADO

despono ou pelo menos efectuar com regushy

[sica passou aser nao apenas urn direito25 mas

tambem urn dever sociedades contempodneas um

cuja falta acarreta frequentemente sentimentos de culpa pessoal

e aclt6es de sanyao social sobre aqueles que se encontram pouco

a descobrir as suas supostas vantagens ou cujos corpos se afastarn

da normatividade da silhueta canonica quese deseia bem deflllida e

tonificada

Pesos e halteres entre 0 estUode vida saudltivel doeura ddec a a sau

Se a pFl1rllpaltao com os cuidados corporlis era anteriOrrneHr proshy

pria das classt~s onis lhastad3s nas condilt6es

oitenta f) portugues comum passa a tcr acesso em qualqucr sureil1ler~

cadoa uma pan6plia de prodUloh tecnicas e servicos que prometem criar

e conservar um corpo jovem perfeira e saudive qualidades de refeshy

rencia e reverencia no culto conremporaneo do corpo Socialmente apreshy

sentados e mercantilizados em associacao acriacao de urn

produtor de salIde e preventor doenca tais produtos tecshy

nicas e servi~os sao frequentemente assumidos na vida quotidiana Como

sendodo oll mais importante que os propdes servicos de saude e de

prestacao de cuidados medicos na concretizayao do bem-estar fisico e

psicologico das pessoas A ideia hoje partilhada no imaginario

de que a saude ealgo que se conquista ccoroHrio simb61ico da delegashy

ltao social no individuo das formas manutenlt3o controlo e vigilancia

do corpo que outrora haviam sido exercidas pelas autoridades

A difusao e enraizamento social da assuncao de que e possivd obter

e manrera saude do corpo atraves do envolvimento do individuo num

de pratiCa5 ditas saudaveis acabaram efectivamente por impushy

tar a cada urn uma responsabilidade crescente pelo seu estado de

Concomitantemente em alguns contextos forneceram argumentos a

246

PESOS HAJTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AIfERADOS

desresponsabiliza~o parcial do Estado em materia de ULUltlUU medicos

e sallde publica Doravante nao esuposto que os cidadaos necessitem

de instrw5es das autoridades e instituiltoes publicas sobre como cui dar

sua existencia ffsica 0 corpo passa a ser urn espaco regulado

opc5es e escolhas de cada urn entre a pleiade de produtos tecnicas

e serviltos actualmente ao seu dispor

Sob a egide da crenca na autoridade pessoal sobre 0 corpo cada pessoa

apartida detem plenos direitos sobre esse bern patrimonial sen do igualshy

mente responsive pelo cumprimento determinados deveres sociais

Estes passam entre outros pdo governo da sua respectiva aparencia e

de vida Ao indivfduo eatribufdo urn papd preponderante na

identificaltao e controlo atempado dos sintomas de patologias diversas

problemas cardiovasculares na preVcncao perante condutas

risco (nomeadameHte atTaves da redwao doakool e do tabaco

obrigatoriedade de sexo protegido ou do exerdcia Hsico) au na

cia e evitamento do que sao socialmente considerados excessos (alimen-

tares exposicao ao sol de medicaliiacentio etc)

da adop~ao cada vez matS generalizada desta nova atitude de

pntdencialismo individualist a perante 0 bem-estar corporal e a evolultao

da oroDorcao de populaltao que em Portugal na viragem do

desenvolver algum tipo de aCyao no sentido de melhorar ou

manter 0 seu estado de salide Segundo 0 estudo 0 Estado de Saude em

entre 2001 e 2008 a percentagem de portuguese que afirshy

mavam estar a tomar no momenta realizaltao do inquerito alguma

iniciativ3 no sentido de mclhorar ou manter 0 seu estado de saude

viu-se aumentar de 368 em 2001 para cerca de metade da populaltao

(498) em 2008

Segundo 0 mesmo estudo essa evolultao e acompanhada da alterashy

de comportamento declarado rclativamente a determinados hibishy

tos de vida considerados saudaveis designadamente no que respeita

ao exerdcio fisico A percentagem de portugueses que afirmam

exerdcio [SICO regular (ginistica COffer etc) ve-se significativamente

de 33 em 2001 para 475 em 2008 Mesmo que 11ao

247

11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

se traduza numa pratica efectiva27 csta evolu~ao corresponded

a uma assinalivel incorporaltao social do dezJer-ser contemporaneo da

actividade fisica A representaiyao desta enquanto habito de vida saudishy

torna-se clara quando noutra investiga~a028 se constatou ser entre

os individuos que mais regularmente praticam exerdcio Hsico que mais

presente esta a percep~ao do risco cia sua ausencia quotidiana29

e born esaudiveJ eurn habito saudaveL E como se

fosse lel livros sel inteligente Esras a arranjar 0 teu corpo Sabes

que vais chegar aos quarenta e tal arros e ainda vais estar born Agora

muitos chegam aos qualcrrra e tal anos e ja esrao com barriga e

com sei a ter tanras ~u~tas coisas Ficas mas saudivel se estas a

treinar bem e sew mdar contra a tua

29 ANOS LH ENClfO ENFERMEI(O PRATICANTE DE MusCutAltAo

A tendcncia para a crenlta incontestlvel no exerdcio fisico como

habito de vida saudivel nao se apresenta contudo disrribulda

igual maneira no espa~o social e cultural portugues Sao varios os estushy

que tern localizado urn maior enraizamento social da disposi~ao

para a pratica de exerdcio fisico entre as mais jovens geralt6es e entre

os individuos provenientes dos estratos socioeconomicos mais clevashy

dos Resultadonao apenas das novas con(li~6es de sociais economicas

e simbolicas em que as gera~6es pos-25 de Abril sao socializadas relatishy

vamente ao corpo e aos cuidados corporais30 mas tambem de urn efeito

de trnsltao no curso

Investiga~6es realizadas sobre a pnitica de actividades ffsicas entre os

jovens portugueses denotam-na mais regular e intensiva nos grupos etashy

rios mais novos nomeadamente ate ainserlt5o no mercado de trabalho

e aassunlt5o de novas responsabilidades familiares31bull 0 que indica que

amedida que as etapas do processo de transi~ao para a vida adulta se vao

cum prindo a pritica desportiva vai efectivamente sendo abandonada no

quotidiano dos jovens portugueses

248

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

No caso especifico da 11l~LU1ltll-alJ uma actividade particularmente

exigente em termos do tempo dispoIl lVei para a sua pratica esta tenshy

dencia revela-se particularrnente marcante Trata-se no eatanto de

uma das modalidades com maior adesao efectiva ou potencial entre os

jovens em Portugal A sua pdtica efectiva (prcsente ou passada)

declarada por cerca de 12 da populalt5o jovem porttlguesa no ano

200032 sendo 34 a percentagem de jovens que nunca tendo pratishy

cado admitiram vir a faze-Io no futuro Quer a sua pdtica efectiva

quer a sua pr~hica potencial viram-se substancialmeme acrescidas entre

os jovens do sexo lTlasculin033 com idades compreendidas entre 18 e

anos ainda a residir com a familia de origem ou sozinhos solteiros

ou ja separados ou divorciados sem filhos Perfil dpieo para stlstentar

a hip6tese de 0 aumento de massa muscular ser urn investimento corshy

poral que corresponde ellliarga medida a uma fOlm~de capitalizar

o potencial expressivo do corpo masculino em estrategiasde atracltao e

sedult5o

Embora a disponibilidade potencial para a pratica da musculaltao

- nunca fiz mas admito vir a fazec surja praticamente transversal aos

jovens qualquer que seja 0 seu estatuto social ou habitat de residencia

o facto cque as condilt6es materiais de existencia continuam a constranshy

ger a sua ptatica efectiva Mais devada entre os jovens que melhores

condilt6es sociais detem para fa_zet face as mensalidades exigidas pelos

cspaltos destinados ao seu exerdci0 34 a pratica de musculaltao decrescc

amedida que se desce na estrutura social de 26 entre os jovens de

estatuto social alto diminui para 9 entre os jovens de estatuto social

mais baixo Do mesmo modo sao os jovcns que tern urn acesso mais

facilitado as instalalt6es que disponibilizam tal servi~o quem mais adere

efectivamente a sua pritica ou seja os jovens residentes em habitat

e suburbano 0 sanho em obter urn corpo musculado revela-se

portanto substancialmente mats democratizado na sua distribui~ao social

(mediaticamente amplificada) do que as condi~6es que perrnitem a sua

concrecizaltao

149

CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 6: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

U ~1~

i11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

enquanto acessorio de identidade pessoal que urge cui dar investir e

plan ear Particularidades 1uperHuas que passavam discretamente por

entre roupas que 0 vclavam ganham 0 estatuto de imperfeiltao que urge

combater em nome novos canones corporais 0 corpo deseja-se agora

perfeito reHectindo uma imagem jovem e saudavel

o projecto colectivo de revigoramento f1sico politicamente conshy

duzido entao lU2ar a projectos individuals de manutencao e modishy

ficacao aconteceu nao apenas devido amudan)a de regime

politico mas tambem no contexto de urn conjunto alterayoes estrushy

turais na sociedade portuguesa ondc novos agentes e dinamicas mershy

cantilistas passaram a investir em forra Os pesos e halteres ltllCaUaIll

urn novo protagonismo social no mercado poftugues ganhando novos

contextos sociais e novas contlguraocs em varias actividadesffsicas

meios competitivos do balterofilismo do boc ou da

luta liv- ondc cram convocados como treino complementar para

autonomia relativa nas inumeras salas de ginasio e health

dubs onde passaram a ser mercantilizados no ambito de modalidades

pr6prias

Pesos e alteres na recente industria de design corporal

N urn contexto onde homens e mulheres passaram a exibir e

mais atentamente as suas aparcncias as foryas privadas do capitalismo

acabaram por contribuir mais do que as instituiyoes publicas higienistas

na difusao de novos habitos e cuidados corporais A incipiente

da moda e do design corporal que ja havia despontado antes do de

Abril cresce numa escala mais alargada e diversificada fragmentando

produtos e clientelas e alimentando expectativas e aspiraltDcs diferenciashy

das do passado Mais do que 0 ambicionado relligoramento fisico as

exigencias e desejos sociais gerados por essa industria VaG agora no senshy

tido do rejullenescimento C do aperfeiroamento da imagem e forma corshy

porais produzindo a ilusao massitlcada de cada um planear e

238

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

esculpir 0 pr6prio COIPO dentro urn padrao de beleza estabelecido

globalmenteo

Novas lojas fabricantes e empresas nacionais e internacionais vem

afirmar-se no mercado portugues disponibilizando modernos e

ticados produtos tecnicas e serviyos de modificacao e manutenyao

corporal em esferas diversas Da cosmetica a da cirurgia

ao nutricionismo dos centros de estetica aos spa toda uma pletora

de bens tecnologias e servios de bem-estar e bem-parecer do corpo

que prometem 0 ajustamento aos canones corporais do momento l6

por sua vez no que a masculinidade dizem rcspeito veem

substituir a clegancia eo glamour das estrelas de cinema dos anos cinshy

quenta pda fora e vigor de herois de torso em forma de V represenshy

tados por Arnold Schwarzcnegger Sylvester Stallone ou Jean-Claude

Van Damme

POI entre esra florescente industria de aesigncorporal o cresshy

cimento de iniciativas comerciais de actividade fisica geridas por pane

do sector privado qlier ao nlvd do invcstimento em produtos para

em espao domestico desde sistemas de exerdcios peri6dishy

cos espccializados roupa e calltado ate equipamemo caseiro diverso17

quer ao nivel do investimento em espayOS colectivos proporcionadores

de um conjullto de produtos e servios bem-estar e bem-parecer

Esses espayos colectivos comc~aram por assumir a forma de ginasio

de bairro contexto popularizado nos anos oitenta Nestes a musshy

culaao surgia com lugar destacado ao lado de novas modalidades

como a ginastica aerobica a primeira mais orientada para urn publico

masculino a segunda para urn pliblico fcminino A pratica da muscushy

lacao poren1 ja adicionava aos tradicionais pesos e halteres rnodernos

cquipamentos ergonomicos dotados de um design mais apelativo onde

cada detalhe passaria a ser concebido com 0 intuito de proporcionar aos

novos LlllLaUUU~ urn trcino menos arriscado e sofrido mais comodo e

con fomlveL

Postcriormente ja proximo anos noventa a musculayao toi

dlUIlllUa no con texto dos clubs que vieram a instalar-se

239

CLASSES ASSOCIATIVrSMO E ESTADO

em espaos multifunciol1ais deposidrios de valencias diversas

nas areas da da saude da alirnentacao e do lazer corporal muishy

tos representantes de cadeias internacionais que se instalaram em

algumas das principais cidades pormguesas com elevados invcstimentos

em sofisticadas tecnicas de gestao mflrketing e publicidade para cap tar

e ftdelizar potenciais publicos-alvo Entre 0 ann 2000 e 0 ana de 2008

o numero de health clubs em Portugal passou de 600 a 1400

bando mais de 600 mil mernbrosl 8bull Com uma

57 em Portugal estas estruturas facturam

euros

ras os

mais 1

mIS riscos e caracteristicas

um programa de Heino adequado a detershy

rrunaao corpo e acompanhar individualmente a sua exccuao

- C0 do egolmilriintO que perpassa no desporto

amador contemporaneo um dos produtoslservi~os em que

os health clubs mais apostam hoje ern dia devido aos ganhos financciros

proporcionados exclusividade desse servico urn dos mais caros para

o cotlSumidor

Concomitamemcntc novas actividades ffsicas e desportivas emershy

gem no ambito destcs novos espaos anunciadas como esteategias para

enfrentar e Edar corn os duros dcsafios da sociedade contemporanea ao

mcsmo tempo que velhas modalidades se rcnovam e sofisticam transshy

formando-se em mercadoria vendavel e derelativamente faeil

lidade Sistemas fisicos ancestrais como 0 por

exemplo ou ate mesmo varias artes enquanto

no

A sempre presente nos ginasios

a pesos e halterc~

240

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTFRADOS

acurnulado de

oHlzaoo de

dlllCllU e coreografado ao

fIrmo de musleas do momento que apresenta como relatishy

vamente ao esquema anterior 0 facto de eoncentrar uma quamidade e

de exerdeios musculares num curto periodo de tempo

45 a 60) reeuperando as da pratica desporriva

em grupo e desta fonna proporcionando um ambieme estimulante e

divertido

o objccrivo inicial do body pump nos anos novema ted ido em

medida lucrativo atrair 0 publico-alvo maseulino para a pdtica

de ccrclcio fisico eolectivo nomeadarnenLe ao da ginistiea aeroshy

scm contudo deixar de Ihes proporcionar 0 e atletieo

que indiidualmente a pcatica da musculacao lhes concediarn O~fdy

pump a par de outras modalidades que foram sob 0 mesrno COI1shy

ceito (designados de body training ou group como 0 body balance body combat body body

jump ou 0 spinning - RPlvf) tern a

registadas

monitores

COlllerClaUampauas eoroduzem-se exactamente nos

exerdcios e re1pectJlVO

uallzaao a cada tees meses de a a desmlotlV3ltao

por via da repctiao continuada

muitas dessas modalidades nos anos noventa vieram

U~LdUlUllC no sentido de diminuir 0 sofrimento do treino solidrio ClStishy

dioso silencioso e ascetico gue ate af implicava 0 treino tradicional de

muscular substituil1do-o pelo divertimento proporcionado

soeiabilidade e a mitsica que passaram a parte desses sistemas

241

- CLASSES ASSOClATrvISMO E ESTADO

treino 0 que vern corroborar empiricamente a hipotese avanshy

ltada por Lipovetsky de que hoje em dia 0 desporto de massas eessenshy

cialmente uma actividade dominada pda procura do prazer

mismo energetico da experiencia de si proprio depois do desporto

disciplinar e moralista cis 0 desporto-lazer a desporto-saude 0 desporshy

to-desafio Da pratica desportiva esperamos apenas sensalt6es e equilibr

valorizasao individual e evasao norma e descontraclt3o ja nao e a vinude que legitima 0 despono mas sim a emmao corporal 0 prazer

a forma e psicologica 0 des porto tornou-se urn dosemblemas mais

da cultura nardsica centrada no extase do

Oprocesso crescimento e de diversiflcaltao comercial das activishy

rades ffsicas indoor beneficiou durante os anos oitentac noventa

uma conjuntura economica favorivd caracterizada pdo aumento do

poder de compra da populaltao portuguesa tpela melhoria das de vida alguns dos seus sectores e sociais nomeadamente

classes rr Mias A proliferalt3o de gimisios health clubs foi ltlinda

favorecida pdo prolongamento quer da esperanlta media de vida quer

das processos de escolarizaltao e de transiltao para a vida adulta Estas

din1Unicas que efectivamente fizeram dos reformadas e dos jovens

estudantes publicos-alvo fundamentals na promQ(ao de actividades

fisicas no espalto do ginasio considerando 0 tempo que tern POLCllUltUshy

mente disponivel ao longo do dia nome~damente fora das hons

maior wifego nos ginasios (perfodos almolto e p6s-laborais)

Urn outros pltblicos-alvo a que este segmento da indUstria de

design corporal mais se tem dirigido tern ido os homens mais disponishy

ao consumo dos sellS produtos e servi~os A imagem de

pader e competencia produzida e difundida pela publicidade e pclas

revistas hoje dedicadas ao segmento masculino ji nao e reflectida apenas

atravcs de sfmbolos tradicionais consumo masculino como 0 carro 0

relogio ou a can eta mas tam bern atraves investimentos na proawao

e manutenltao da aparencia fisica que tende a perder 0 formalismo do

fato-e-gravata A imagem de urn hamem atletico e cuidado passa a ser

inclusivamente apresentada como chave do sucesso entre as

242

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AITERADOS

mais exigentes quanto aDS cuidados masculinos com a imagem Esta nova

mostra um novo homem preocupado com a flexibilidade da

sua pele com a domesticaltao dos seus odores com a qualidade do seu

[[sico com a tonicidade da sua silhueta com a definiltao do

seu abdomen com 0 volume do seu biceps A pdtica de musculaltao

assume entao tun valor estratcgico na produltao do actual corpo mascushy

referencia e de reverencia

Trata-se de facto do regime corporal socialmente mals difundido

estrategia de promoltao de urn modelo corporeidade ma~cu-

modelo adetico com acento na potencia vitalidade

IHUgtCUlaL 0 que de resto nao sera de surpreender dada

a diiilsao incorporada de estereotipos da sociedade ocidental sabre a masshy

que tradicionalmemc ligam os padr6es de perfectibilidade e

atractivlhde masculina ao modelo de corporeidade mesomorfico e hipershy

troEado em medida cOlldensado na massa muscular tCUlllUldUd

nos peltoral~ braltos e costas esnuturando um torso de

adclgalta ate a

Um homem deve ter os ombros mais largos do que a anea ter uma

anca fina e deve ser algo robusto mats cheinho Mais cheinho

mas nao e em gordura e em musculo ( ) Estou contente com 0 ter

aos 80 Guilos Acho que eu ainda tenho muito parauabalhar

ainda me falta muito trabalho frente Ainda vai ser uma coisa

que YCJo-me nos pr()X1mOS 6 an os a ter de trabalhar 0 corpo ate cheshy

gar 11 tal forma ideal ao corpo ideal ( ) Eo tal corpo masculino com

os ombros mais a cintura mais em V - Ii esra 0 torso em

V - e musculado

ESTUDANTE UNlVERSITiillIO 21 ANOS PRATICANTE DE MUSCUIAtAo

porem scm a rudeza do passado impressa pelas condilt6es de

nabalho que sem intenltio moldavam 0 corpo 0 corpo do hom em ja nao

e urn mero instrurnento que se abandona ao trabalho mas de proprio

243

CLASSES ASSOCIATfVTSMO E ESTADO

MlllUCla como COOl

extracltao total dos pel os que possam encobrir 0

ao

da simetria muscular conseguida

Mas os corpos femininos tambem nao ficaram de fora dos sistemas

fisicos associados a muscutaltao Com objectivos mais moderados em

termos de volume corporal e sobretudo direccionados para a perda de

adiposidade e tonificaltao determinadas zonas do corpo as mulheres

encontraram res posta aos seus anseios corporais sobretudo nos body Mesmo

aos pesos e e aoontrario

publico masCilliri~ as roulheres tendem a

do corpo como (lllS de intervenltao prioritaria no sentido da manuten

ltao ou mociitJG50 Face a tais aspiraltoes a chegoll

a conceber um sistema fisieo particular para dar ao pllbico

especificameme feminino comercializando-o sob a designaltio de GAP

uma modalidade que promove 0 trabalho de resistencia e forshy

talecimento atraves de varios exerdcios localizados nas zonas

dos gl(lteos abdommalS e pernas

Eu era ter aqude corpo musculado corpo bonito

que tada a gente rilio e () Nao llma mulher eXclgeJradamell1le

muscuCida porque perde os trayos femininosEuma mulher ddinida

Nao precisa de ser magra Nao acho que eaquele estereotipo de magre-La

que cada vez ha mais que leva as miudas hoje em dia a rornarem-se

anonxicas ( ) Hoje no ginasio a imagem que se quer passar e que

essa nao ea nao eo ideal de urn corpo 0 ideal de urn corpo e umamulher a mulher nao precisa de estar MOr

desde que bem ueWllUa e0 ideal

23 ANOS 120 ANO INSTRJroRA DE CARDlo-FrfNESS

244

PESOS HALTERES E SENTiDOS DOS CORPOS (H)AIrERADOS

tern

cas no seio da industria de design corporal Como assinala Fortuna

os de edllcalt3o ffsica tinham como vocaltao disciplinar 0 corpo

para for mar rnelhores cidactios mais saudaveis e competemes prepashy

rando-os para os desafios das novas sociedades surgidas com a industriashy

os actuais health clubs por seu lado associ am a juventude a

beleza e a satide do corpo aamo-confianya aauto-estima e ao bem-estar

ol(rcendo prodmos e serviltos a moldar 0 corpo amedida

e preocupalt6es de

outros mats imageticos

some body Estar em mostrar (determinadas)

A manifestalt3o mais valorizada do corpo saudavel deixa de

ser a seu rendimeDto fo1lta e para passar a ser a sua aparenshy

cia A sallde cosmetiza-se e torna-se num fen6meno estetico nao basta

mante-la mas fazer transparece-la nomeadamente atraves da aquisiltao

urn corpo perfeito Este par sua vez passa a ser condiltao sine

non para 0

Higt LdllI-la para a ser

Eu via que tinlIa urn corpo com varios problemas Precisava de

rirar a barriga algum poeu e Tinha urn peito quase fundo dentro

quase que nao se via a barriga mais saida que 0 peito Via que tinha

problemas e estava a caminhar para 0 problema da obesidade ( )

Agora quando olho para 0 espdho vejo urn corpo perfeito 0 que todo

o hornem gostaria de tef E simo-me orgulhoso por isso

AUXILlAR DE ACOO MEDICA 120 ANO 24 ANOS

PHKnCANTE DE

245

CLASSES ASSOCIATIVLSMO E ESTADO

despono ou pelo menos efectuar com regushy

[sica passou aser nao apenas urn direito25 mas

tambem urn dever sociedades contempodneas um

cuja falta acarreta frequentemente sentimentos de culpa pessoal

e aclt6es de sanyao social sobre aqueles que se encontram pouco

a descobrir as suas supostas vantagens ou cujos corpos se afastarn

da normatividade da silhueta canonica quese deseia bem deflllida e

tonificada

Pesos e halteres entre 0 estUode vida saudltivel doeura ddec a a sau

Se a pFl1rllpaltao com os cuidados corporlis era anteriOrrneHr proshy

pria das classt~s onis lhastad3s nas condilt6es

oitenta f) portugues comum passa a tcr acesso em qualqucr sureil1ler~

cadoa uma pan6plia de prodUloh tecnicas e servicos que prometem criar

e conservar um corpo jovem perfeira e saudive qualidades de refeshy

rencia e reverencia no culto conremporaneo do corpo Socialmente apreshy

sentados e mercantilizados em associacao acriacao de urn

produtor de salIde e preventor doenca tais produtos tecshy

nicas e servi~os sao frequentemente assumidos na vida quotidiana Como

sendodo oll mais importante que os propdes servicos de saude e de

prestacao de cuidados medicos na concretizayao do bem-estar fisico e

psicologico das pessoas A ideia hoje partilhada no imaginario

de que a saude ealgo que se conquista ccoroHrio simb61ico da delegashy

ltao social no individuo das formas manutenlt3o controlo e vigilancia

do corpo que outrora haviam sido exercidas pelas autoridades

A difusao e enraizamento social da assuncao de que e possivd obter

e manrera saude do corpo atraves do envolvimento do individuo num

de pratiCa5 ditas saudaveis acabaram efectivamente por impushy

tar a cada urn uma responsabilidade crescente pelo seu estado de

Concomitantemente em alguns contextos forneceram argumentos a

246

PESOS HAJTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AIfERADOS

desresponsabiliza~o parcial do Estado em materia de ULUltlUU medicos

e sallde publica Doravante nao esuposto que os cidadaos necessitem

de instrw5es das autoridades e instituiltoes publicas sobre como cui dar

sua existencia ffsica 0 corpo passa a ser urn espaco regulado

opc5es e escolhas de cada urn entre a pleiade de produtos tecnicas

e serviltos actualmente ao seu dispor

Sob a egide da crenca na autoridade pessoal sobre 0 corpo cada pessoa

apartida detem plenos direitos sobre esse bern patrimonial sen do igualshy

mente responsive pelo cumprimento determinados deveres sociais

Estes passam entre outros pdo governo da sua respectiva aparencia e

de vida Ao indivfduo eatribufdo urn papd preponderante na

identificaltao e controlo atempado dos sintomas de patologias diversas

problemas cardiovasculares na preVcncao perante condutas

risco (nomeadameHte atTaves da redwao doakool e do tabaco

obrigatoriedade de sexo protegido ou do exerdcia Hsico) au na

cia e evitamento do que sao socialmente considerados excessos (alimen-

tares exposicao ao sol de medicaliiacentio etc)

da adop~ao cada vez matS generalizada desta nova atitude de

pntdencialismo individualist a perante 0 bem-estar corporal e a evolultao

da oroDorcao de populaltao que em Portugal na viragem do

desenvolver algum tipo de aCyao no sentido de melhorar ou

manter 0 seu estado de salide Segundo 0 estudo 0 Estado de Saude em

entre 2001 e 2008 a percentagem de portuguese que afirshy

mavam estar a tomar no momenta realizaltao do inquerito alguma

iniciativ3 no sentido de mclhorar ou manter 0 seu estado de saude

viu-se aumentar de 368 em 2001 para cerca de metade da populaltao

(498) em 2008

Segundo 0 mesmo estudo essa evolultao e acompanhada da alterashy

de comportamento declarado rclativamente a determinados hibishy

tos de vida considerados saudaveis designadamente no que respeita

ao exerdcio fisico A percentagem de portugueses que afirmam

exerdcio [SICO regular (ginistica COffer etc) ve-se significativamente

de 33 em 2001 para 475 em 2008 Mesmo que 11ao

247

11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

se traduza numa pratica efectiva27 csta evolu~ao corresponded

a uma assinalivel incorporaltao social do dezJer-ser contemporaneo da

actividade fisica A representaiyao desta enquanto habito de vida saudishy

torna-se clara quando noutra investiga~a028 se constatou ser entre

os individuos que mais regularmente praticam exerdcio Hsico que mais

presente esta a percep~ao do risco cia sua ausencia quotidiana29

e born esaudiveJ eurn habito saudaveL E como se

fosse lel livros sel inteligente Esras a arranjar 0 teu corpo Sabes

que vais chegar aos quarenta e tal arros e ainda vais estar born Agora

muitos chegam aos qualcrrra e tal anos e ja esrao com barriga e

com sei a ter tanras ~u~tas coisas Ficas mas saudivel se estas a

treinar bem e sew mdar contra a tua

29 ANOS LH ENClfO ENFERMEI(O PRATICANTE DE MusCutAltAo

A tendcncia para a crenlta incontestlvel no exerdcio fisico como

habito de vida saudivel nao se apresenta contudo disrribulda

igual maneira no espa~o social e cultural portugues Sao varios os estushy

que tern localizado urn maior enraizamento social da disposi~ao

para a pratica de exerdcio fisico entre as mais jovens geralt6es e entre

os individuos provenientes dos estratos socioeconomicos mais clevashy

dos Resultadonao apenas das novas con(li~6es de sociais economicas

e simbolicas em que as gera~6es pos-25 de Abril sao socializadas relatishy

vamente ao corpo e aos cuidados corporais30 mas tambem de urn efeito

de trnsltao no curso

Investiga~6es realizadas sobre a pnitica de actividades ffsicas entre os

jovens portugueses denotam-na mais regular e intensiva nos grupos etashy

rios mais novos nomeadamente ate ainserlt5o no mercado de trabalho

e aassunlt5o de novas responsabilidades familiares31bull 0 que indica que

amedida que as etapas do processo de transi~ao para a vida adulta se vao

cum prindo a pritica desportiva vai efectivamente sendo abandonada no

quotidiano dos jovens portugueses

248

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

No caso especifico da 11l~LU1ltll-alJ uma actividade particularmente

exigente em termos do tempo dispoIl lVei para a sua pratica esta tenshy

dencia revela-se particularrnente marcante Trata-se no eatanto de

uma das modalidades com maior adesao efectiva ou potencial entre os

jovens em Portugal A sua pdtica efectiva (prcsente ou passada)

declarada por cerca de 12 da populalt5o jovem porttlguesa no ano

200032 sendo 34 a percentagem de jovens que nunca tendo pratishy

cado admitiram vir a faze-Io no futuro Quer a sua pdtica efectiva

quer a sua pr~hica potencial viram-se substancialmeme acrescidas entre

os jovens do sexo lTlasculin033 com idades compreendidas entre 18 e

anos ainda a residir com a familia de origem ou sozinhos solteiros

ou ja separados ou divorciados sem filhos Perfil dpieo para stlstentar

a hip6tese de 0 aumento de massa muscular ser urn investimento corshy

poral que corresponde ellliarga medida a uma fOlm~de capitalizar

o potencial expressivo do corpo masculino em estrategiasde atracltao e

sedult5o

Embora a disponibilidade potencial para a pratica da musculaltao

- nunca fiz mas admito vir a fazec surja praticamente transversal aos

jovens qualquer que seja 0 seu estatuto social ou habitat de residencia

o facto cque as condilt6es materiais de existencia continuam a constranshy

ger a sua ptatica efectiva Mais devada entre os jovens que melhores

condilt6es sociais detem para fa_zet face as mensalidades exigidas pelos

cspaltos destinados ao seu exerdci0 34 a pratica de musculaltao decrescc

amedida que se desce na estrutura social de 26 entre os jovens de

estatuto social alto diminui para 9 entre os jovens de estatuto social

mais baixo Do mesmo modo sao os jovcns que tern urn acesso mais

facilitado as instalalt6es que disponibilizam tal servi~o quem mais adere

efectivamente a sua pritica ou seja os jovens residentes em habitat

e suburbano 0 sanho em obter urn corpo musculado revela-se

portanto substancialmente mats democratizado na sua distribui~ao social

(mediaticamente amplificada) do que as condi~6es que perrnitem a sua

concrecizaltao

149

CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 7: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

CLASSES ASSOCIATIVrSMO E ESTADO

em espaos multifunciol1ais deposidrios de valencias diversas

nas areas da da saude da alirnentacao e do lazer corporal muishy

tos representantes de cadeias internacionais que se instalaram em

algumas das principais cidades pormguesas com elevados invcstimentos

em sofisticadas tecnicas de gestao mflrketing e publicidade para cap tar

e ftdelizar potenciais publicos-alvo Entre 0 ann 2000 e 0 ana de 2008

o numero de health clubs em Portugal passou de 600 a 1400

bando mais de 600 mil mernbrosl 8bull Com uma

57 em Portugal estas estruturas facturam

euros

ras os

mais 1

mIS riscos e caracteristicas

um programa de Heino adequado a detershy

rrunaao corpo e acompanhar individualmente a sua exccuao

- C0 do egolmilriintO que perpassa no desporto

amador contemporaneo um dos produtoslservi~os em que

os health clubs mais apostam hoje ern dia devido aos ganhos financciros

proporcionados exclusividade desse servico urn dos mais caros para

o cotlSumidor

Concomitamemcntc novas actividades ffsicas e desportivas emershy

gem no ambito destcs novos espaos anunciadas como esteategias para

enfrentar e Edar corn os duros dcsafios da sociedade contemporanea ao

mcsmo tempo que velhas modalidades se rcnovam e sofisticam transshy

formando-se em mercadoria vendavel e derelativamente faeil

lidade Sistemas fisicos ancestrais como 0 por

exemplo ou ate mesmo varias artes enquanto

no

A sempre presente nos ginasios

a pesos e halterc~

240

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTFRADOS

acurnulado de

oHlzaoo de

dlllCllU e coreografado ao

fIrmo de musleas do momento que apresenta como relatishy

vamente ao esquema anterior 0 facto de eoncentrar uma quamidade e

de exerdeios musculares num curto periodo de tempo

45 a 60) reeuperando as da pratica desporriva

em grupo e desta fonna proporcionando um ambieme estimulante e

divertido

o objccrivo inicial do body pump nos anos novema ted ido em

medida lucrativo atrair 0 publico-alvo maseulino para a pdtica

de ccrclcio fisico eolectivo nomeadarnenLe ao da ginistiea aeroshy

scm contudo deixar de Ihes proporcionar 0 e atletieo

que indiidualmente a pcatica da musculacao lhes concediarn O~fdy

pump a par de outras modalidades que foram sob 0 mesrno COI1shy

ceito (designados de body training ou group como 0 body balance body combat body body

jump ou 0 spinning - RPlvf) tern a

registadas

monitores

COlllerClaUampauas eoroduzem-se exactamente nos

exerdcios e re1pectJlVO

uallzaao a cada tees meses de a a desmlotlV3ltao

por via da repctiao continuada

muitas dessas modalidades nos anos noventa vieram

U~LdUlUllC no sentido de diminuir 0 sofrimento do treino solidrio ClStishy

dioso silencioso e ascetico gue ate af implicava 0 treino tradicional de

muscular substituil1do-o pelo divertimento proporcionado

soeiabilidade e a mitsica que passaram a parte desses sistemas

241

- CLASSES ASSOClATrvISMO E ESTADO

treino 0 que vern corroborar empiricamente a hipotese avanshy

ltada por Lipovetsky de que hoje em dia 0 desporto de massas eessenshy

cialmente uma actividade dominada pda procura do prazer

mismo energetico da experiencia de si proprio depois do desporto

disciplinar e moralista cis 0 desporto-lazer a desporto-saude 0 desporshy

to-desafio Da pratica desportiva esperamos apenas sensalt6es e equilibr

valorizasao individual e evasao norma e descontraclt3o ja nao e a vinude que legitima 0 despono mas sim a emmao corporal 0 prazer

a forma e psicologica 0 des porto tornou-se urn dosemblemas mais

da cultura nardsica centrada no extase do

Oprocesso crescimento e de diversiflcaltao comercial das activishy

rades ffsicas indoor beneficiou durante os anos oitentac noventa

uma conjuntura economica favorivd caracterizada pdo aumento do

poder de compra da populaltao portuguesa tpela melhoria das de vida alguns dos seus sectores e sociais nomeadamente

classes rr Mias A proliferalt3o de gimisios health clubs foi ltlinda

favorecida pdo prolongamento quer da esperanlta media de vida quer

das processos de escolarizaltao e de transiltao para a vida adulta Estas

din1Unicas que efectivamente fizeram dos reformadas e dos jovens

estudantes publicos-alvo fundamentals na promQ(ao de actividades

fisicas no espalto do ginasio considerando 0 tempo que tern POLCllUltUshy

mente disponivel ao longo do dia nome~damente fora das hons

maior wifego nos ginasios (perfodos almolto e p6s-laborais)

Urn outros pltblicos-alvo a que este segmento da indUstria de

design corporal mais se tem dirigido tern ido os homens mais disponishy

ao consumo dos sellS produtos e servi~os A imagem de

pader e competencia produzida e difundida pela publicidade e pclas

revistas hoje dedicadas ao segmento masculino ji nao e reflectida apenas

atravcs de sfmbolos tradicionais consumo masculino como 0 carro 0

relogio ou a can eta mas tam bern atraves investimentos na proawao

e manutenltao da aparencia fisica que tende a perder 0 formalismo do

fato-e-gravata A imagem de urn hamem atletico e cuidado passa a ser

inclusivamente apresentada como chave do sucesso entre as

242

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AITERADOS

mais exigentes quanto aDS cuidados masculinos com a imagem Esta nova

mostra um novo homem preocupado com a flexibilidade da

sua pele com a domesticaltao dos seus odores com a qualidade do seu

[[sico com a tonicidade da sua silhueta com a definiltao do

seu abdomen com 0 volume do seu biceps A pdtica de musculaltao

assume entao tun valor estratcgico na produltao do actual corpo mascushy

referencia e de reverencia

Trata-se de facto do regime corporal socialmente mals difundido

estrategia de promoltao de urn modelo corporeidade ma~cu-

modelo adetico com acento na potencia vitalidade

IHUgtCUlaL 0 que de resto nao sera de surpreender dada

a diiilsao incorporada de estereotipos da sociedade ocidental sabre a masshy

que tradicionalmemc ligam os padr6es de perfectibilidade e

atractivlhde masculina ao modelo de corporeidade mesomorfico e hipershy

troEado em medida cOlldensado na massa muscular tCUlllUldUd

nos peltoral~ braltos e costas esnuturando um torso de

adclgalta ate a

Um homem deve ter os ombros mais largos do que a anea ter uma

anca fina e deve ser algo robusto mats cheinho Mais cheinho

mas nao e em gordura e em musculo ( ) Estou contente com 0 ter

aos 80 Guilos Acho que eu ainda tenho muito parauabalhar

ainda me falta muito trabalho frente Ainda vai ser uma coisa

que YCJo-me nos pr()X1mOS 6 an os a ter de trabalhar 0 corpo ate cheshy

gar 11 tal forma ideal ao corpo ideal ( ) Eo tal corpo masculino com

os ombros mais a cintura mais em V - Ii esra 0 torso em

V - e musculado

ESTUDANTE UNlVERSITiillIO 21 ANOS PRATICANTE DE MUSCUIAtAo

porem scm a rudeza do passado impressa pelas condilt6es de

nabalho que sem intenltio moldavam 0 corpo 0 corpo do hom em ja nao

e urn mero instrurnento que se abandona ao trabalho mas de proprio

243

CLASSES ASSOCIATfVTSMO E ESTADO

MlllUCla como COOl

extracltao total dos pel os que possam encobrir 0

ao

da simetria muscular conseguida

Mas os corpos femininos tambem nao ficaram de fora dos sistemas

fisicos associados a muscutaltao Com objectivos mais moderados em

termos de volume corporal e sobretudo direccionados para a perda de

adiposidade e tonificaltao determinadas zonas do corpo as mulheres

encontraram res posta aos seus anseios corporais sobretudo nos body Mesmo

aos pesos e e aoontrario

publico masCilliri~ as roulheres tendem a

do corpo como (lllS de intervenltao prioritaria no sentido da manuten

ltao ou mociitJG50 Face a tais aspiraltoes a chegoll

a conceber um sistema fisieo particular para dar ao pllbico

especificameme feminino comercializando-o sob a designaltio de GAP

uma modalidade que promove 0 trabalho de resistencia e forshy

talecimento atraves de varios exerdcios localizados nas zonas

dos gl(lteos abdommalS e pernas

Eu era ter aqude corpo musculado corpo bonito

que tada a gente rilio e () Nao llma mulher eXclgeJradamell1le

muscuCida porque perde os trayos femininosEuma mulher ddinida

Nao precisa de ser magra Nao acho que eaquele estereotipo de magre-La

que cada vez ha mais que leva as miudas hoje em dia a rornarem-se

anonxicas ( ) Hoje no ginasio a imagem que se quer passar e que

essa nao ea nao eo ideal de urn corpo 0 ideal de urn corpo e umamulher a mulher nao precisa de estar MOr

desde que bem ueWllUa e0 ideal

23 ANOS 120 ANO INSTRJroRA DE CARDlo-FrfNESS

244

PESOS HALTERES E SENTiDOS DOS CORPOS (H)AIrERADOS

tern

cas no seio da industria de design corporal Como assinala Fortuna

os de edllcalt3o ffsica tinham como vocaltao disciplinar 0 corpo

para for mar rnelhores cidactios mais saudaveis e competemes prepashy

rando-os para os desafios das novas sociedades surgidas com a industriashy

os actuais health clubs por seu lado associ am a juventude a

beleza e a satide do corpo aamo-confianya aauto-estima e ao bem-estar

ol(rcendo prodmos e serviltos a moldar 0 corpo amedida

e preocupalt6es de

outros mats imageticos

some body Estar em mostrar (determinadas)

A manifestalt3o mais valorizada do corpo saudavel deixa de

ser a seu rendimeDto fo1lta e para passar a ser a sua aparenshy

cia A sallde cosmetiza-se e torna-se num fen6meno estetico nao basta

mante-la mas fazer transparece-la nomeadamente atraves da aquisiltao

urn corpo perfeito Este par sua vez passa a ser condiltao sine

non para 0

Higt LdllI-la para a ser

Eu via que tinlIa urn corpo com varios problemas Precisava de

rirar a barriga algum poeu e Tinha urn peito quase fundo dentro

quase que nao se via a barriga mais saida que 0 peito Via que tinha

problemas e estava a caminhar para 0 problema da obesidade ( )

Agora quando olho para 0 espdho vejo urn corpo perfeito 0 que todo

o hornem gostaria de tef E simo-me orgulhoso por isso

AUXILlAR DE ACOO MEDICA 120 ANO 24 ANOS

PHKnCANTE DE

245

CLASSES ASSOCIATIVLSMO E ESTADO

despono ou pelo menos efectuar com regushy

[sica passou aser nao apenas urn direito25 mas

tambem urn dever sociedades contempodneas um

cuja falta acarreta frequentemente sentimentos de culpa pessoal

e aclt6es de sanyao social sobre aqueles que se encontram pouco

a descobrir as suas supostas vantagens ou cujos corpos se afastarn

da normatividade da silhueta canonica quese deseia bem deflllida e

tonificada

Pesos e halteres entre 0 estUode vida saudltivel doeura ddec a a sau

Se a pFl1rllpaltao com os cuidados corporlis era anteriOrrneHr proshy

pria das classt~s onis lhastad3s nas condilt6es

oitenta f) portugues comum passa a tcr acesso em qualqucr sureil1ler~

cadoa uma pan6plia de prodUloh tecnicas e servicos que prometem criar

e conservar um corpo jovem perfeira e saudive qualidades de refeshy

rencia e reverencia no culto conremporaneo do corpo Socialmente apreshy

sentados e mercantilizados em associacao acriacao de urn

produtor de salIde e preventor doenca tais produtos tecshy

nicas e servi~os sao frequentemente assumidos na vida quotidiana Como

sendodo oll mais importante que os propdes servicos de saude e de

prestacao de cuidados medicos na concretizayao do bem-estar fisico e

psicologico das pessoas A ideia hoje partilhada no imaginario

de que a saude ealgo que se conquista ccoroHrio simb61ico da delegashy

ltao social no individuo das formas manutenlt3o controlo e vigilancia

do corpo que outrora haviam sido exercidas pelas autoridades

A difusao e enraizamento social da assuncao de que e possivd obter

e manrera saude do corpo atraves do envolvimento do individuo num

de pratiCa5 ditas saudaveis acabaram efectivamente por impushy

tar a cada urn uma responsabilidade crescente pelo seu estado de

Concomitantemente em alguns contextos forneceram argumentos a

246

PESOS HAJTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AIfERADOS

desresponsabiliza~o parcial do Estado em materia de ULUltlUU medicos

e sallde publica Doravante nao esuposto que os cidadaos necessitem

de instrw5es das autoridades e instituiltoes publicas sobre como cui dar

sua existencia ffsica 0 corpo passa a ser urn espaco regulado

opc5es e escolhas de cada urn entre a pleiade de produtos tecnicas

e serviltos actualmente ao seu dispor

Sob a egide da crenca na autoridade pessoal sobre 0 corpo cada pessoa

apartida detem plenos direitos sobre esse bern patrimonial sen do igualshy

mente responsive pelo cumprimento determinados deveres sociais

Estes passam entre outros pdo governo da sua respectiva aparencia e

de vida Ao indivfduo eatribufdo urn papd preponderante na

identificaltao e controlo atempado dos sintomas de patologias diversas

problemas cardiovasculares na preVcncao perante condutas

risco (nomeadameHte atTaves da redwao doakool e do tabaco

obrigatoriedade de sexo protegido ou do exerdcia Hsico) au na

cia e evitamento do que sao socialmente considerados excessos (alimen-

tares exposicao ao sol de medicaliiacentio etc)

da adop~ao cada vez matS generalizada desta nova atitude de

pntdencialismo individualist a perante 0 bem-estar corporal e a evolultao

da oroDorcao de populaltao que em Portugal na viragem do

desenvolver algum tipo de aCyao no sentido de melhorar ou

manter 0 seu estado de salide Segundo 0 estudo 0 Estado de Saude em

entre 2001 e 2008 a percentagem de portuguese que afirshy

mavam estar a tomar no momenta realizaltao do inquerito alguma

iniciativ3 no sentido de mclhorar ou manter 0 seu estado de saude

viu-se aumentar de 368 em 2001 para cerca de metade da populaltao

(498) em 2008

Segundo 0 mesmo estudo essa evolultao e acompanhada da alterashy

de comportamento declarado rclativamente a determinados hibishy

tos de vida considerados saudaveis designadamente no que respeita

ao exerdcio fisico A percentagem de portugueses que afirmam

exerdcio [SICO regular (ginistica COffer etc) ve-se significativamente

de 33 em 2001 para 475 em 2008 Mesmo que 11ao

247

11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

se traduza numa pratica efectiva27 csta evolu~ao corresponded

a uma assinalivel incorporaltao social do dezJer-ser contemporaneo da

actividade fisica A representaiyao desta enquanto habito de vida saudishy

torna-se clara quando noutra investiga~a028 se constatou ser entre

os individuos que mais regularmente praticam exerdcio Hsico que mais

presente esta a percep~ao do risco cia sua ausencia quotidiana29

e born esaudiveJ eurn habito saudaveL E como se

fosse lel livros sel inteligente Esras a arranjar 0 teu corpo Sabes

que vais chegar aos quarenta e tal arros e ainda vais estar born Agora

muitos chegam aos qualcrrra e tal anos e ja esrao com barriga e

com sei a ter tanras ~u~tas coisas Ficas mas saudivel se estas a

treinar bem e sew mdar contra a tua

29 ANOS LH ENClfO ENFERMEI(O PRATICANTE DE MusCutAltAo

A tendcncia para a crenlta incontestlvel no exerdcio fisico como

habito de vida saudivel nao se apresenta contudo disrribulda

igual maneira no espa~o social e cultural portugues Sao varios os estushy

que tern localizado urn maior enraizamento social da disposi~ao

para a pratica de exerdcio fisico entre as mais jovens geralt6es e entre

os individuos provenientes dos estratos socioeconomicos mais clevashy

dos Resultadonao apenas das novas con(li~6es de sociais economicas

e simbolicas em que as gera~6es pos-25 de Abril sao socializadas relatishy

vamente ao corpo e aos cuidados corporais30 mas tambem de urn efeito

de trnsltao no curso

Investiga~6es realizadas sobre a pnitica de actividades ffsicas entre os

jovens portugueses denotam-na mais regular e intensiva nos grupos etashy

rios mais novos nomeadamente ate ainserlt5o no mercado de trabalho

e aassunlt5o de novas responsabilidades familiares31bull 0 que indica que

amedida que as etapas do processo de transi~ao para a vida adulta se vao

cum prindo a pritica desportiva vai efectivamente sendo abandonada no

quotidiano dos jovens portugueses

248

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

No caso especifico da 11l~LU1ltll-alJ uma actividade particularmente

exigente em termos do tempo dispoIl lVei para a sua pratica esta tenshy

dencia revela-se particularrnente marcante Trata-se no eatanto de

uma das modalidades com maior adesao efectiva ou potencial entre os

jovens em Portugal A sua pdtica efectiva (prcsente ou passada)

declarada por cerca de 12 da populalt5o jovem porttlguesa no ano

200032 sendo 34 a percentagem de jovens que nunca tendo pratishy

cado admitiram vir a faze-Io no futuro Quer a sua pdtica efectiva

quer a sua pr~hica potencial viram-se substancialmeme acrescidas entre

os jovens do sexo lTlasculin033 com idades compreendidas entre 18 e

anos ainda a residir com a familia de origem ou sozinhos solteiros

ou ja separados ou divorciados sem filhos Perfil dpieo para stlstentar

a hip6tese de 0 aumento de massa muscular ser urn investimento corshy

poral que corresponde ellliarga medida a uma fOlm~de capitalizar

o potencial expressivo do corpo masculino em estrategiasde atracltao e

sedult5o

Embora a disponibilidade potencial para a pratica da musculaltao

- nunca fiz mas admito vir a fazec surja praticamente transversal aos

jovens qualquer que seja 0 seu estatuto social ou habitat de residencia

o facto cque as condilt6es materiais de existencia continuam a constranshy

ger a sua ptatica efectiva Mais devada entre os jovens que melhores

condilt6es sociais detem para fa_zet face as mensalidades exigidas pelos

cspaltos destinados ao seu exerdci0 34 a pratica de musculaltao decrescc

amedida que se desce na estrutura social de 26 entre os jovens de

estatuto social alto diminui para 9 entre os jovens de estatuto social

mais baixo Do mesmo modo sao os jovcns que tern urn acesso mais

facilitado as instalalt6es que disponibilizam tal servi~o quem mais adere

efectivamente a sua pritica ou seja os jovens residentes em habitat

e suburbano 0 sanho em obter urn corpo musculado revela-se

portanto substancialmente mats democratizado na sua distribui~ao social

(mediaticamente amplificada) do que as condi~6es que perrnitem a sua

concrecizaltao

149

CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 8: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

- CLASSES ASSOClATrvISMO E ESTADO

treino 0 que vern corroborar empiricamente a hipotese avanshy

ltada por Lipovetsky de que hoje em dia 0 desporto de massas eessenshy

cialmente uma actividade dominada pda procura do prazer

mismo energetico da experiencia de si proprio depois do desporto

disciplinar e moralista cis 0 desporto-lazer a desporto-saude 0 desporshy

to-desafio Da pratica desportiva esperamos apenas sensalt6es e equilibr

valorizasao individual e evasao norma e descontraclt3o ja nao e a vinude que legitima 0 despono mas sim a emmao corporal 0 prazer

a forma e psicologica 0 des porto tornou-se urn dosemblemas mais

da cultura nardsica centrada no extase do

Oprocesso crescimento e de diversiflcaltao comercial das activishy

rades ffsicas indoor beneficiou durante os anos oitentac noventa

uma conjuntura economica favorivd caracterizada pdo aumento do

poder de compra da populaltao portuguesa tpela melhoria das de vida alguns dos seus sectores e sociais nomeadamente

classes rr Mias A proliferalt3o de gimisios health clubs foi ltlinda

favorecida pdo prolongamento quer da esperanlta media de vida quer

das processos de escolarizaltao e de transiltao para a vida adulta Estas

din1Unicas que efectivamente fizeram dos reformadas e dos jovens

estudantes publicos-alvo fundamentals na promQ(ao de actividades

fisicas no espalto do ginasio considerando 0 tempo que tern POLCllUltUshy

mente disponivel ao longo do dia nome~damente fora das hons

maior wifego nos ginasios (perfodos almolto e p6s-laborais)

Urn outros pltblicos-alvo a que este segmento da indUstria de

design corporal mais se tem dirigido tern ido os homens mais disponishy

ao consumo dos sellS produtos e servi~os A imagem de

pader e competencia produzida e difundida pela publicidade e pclas

revistas hoje dedicadas ao segmento masculino ji nao e reflectida apenas

atravcs de sfmbolos tradicionais consumo masculino como 0 carro 0

relogio ou a can eta mas tam bern atraves investimentos na proawao

e manutenltao da aparencia fisica que tende a perder 0 formalismo do

fato-e-gravata A imagem de urn hamem atletico e cuidado passa a ser

inclusivamente apresentada como chave do sucesso entre as

242

PESOS HAITERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AITERADOS

mais exigentes quanto aDS cuidados masculinos com a imagem Esta nova

mostra um novo homem preocupado com a flexibilidade da

sua pele com a domesticaltao dos seus odores com a qualidade do seu

[[sico com a tonicidade da sua silhueta com a definiltao do

seu abdomen com 0 volume do seu biceps A pdtica de musculaltao

assume entao tun valor estratcgico na produltao do actual corpo mascushy

referencia e de reverencia

Trata-se de facto do regime corporal socialmente mals difundido

estrategia de promoltao de urn modelo corporeidade ma~cu-

modelo adetico com acento na potencia vitalidade

IHUgtCUlaL 0 que de resto nao sera de surpreender dada

a diiilsao incorporada de estereotipos da sociedade ocidental sabre a masshy

que tradicionalmemc ligam os padr6es de perfectibilidade e

atractivlhde masculina ao modelo de corporeidade mesomorfico e hipershy

troEado em medida cOlldensado na massa muscular tCUlllUldUd

nos peltoral~ braltos e costas esnuturando um torso de

adclgalta ate a

Um homem deve ter os ombros mais largos do que a anea ter uma

anca fina e deve ser algo robusto mats cheinho Mais cheinho

mas nao e em gordura e em musculo ( ) Estou contente com 0 ter

aos 80 Guilos Acho que eu ainda tenho muito parauabalhar

ainda me falta muito trabalho frente Ainda vai ser uma coisa

que YCJo-me nos pr()X1mOS 6 an os a ter de trabalhar 0 corpo ate cheshy

gar 11 tal forma ideal ao corpo ideal ( ) Eo tal corpo masculino com

os ombros mais a cintura mais em V - Ii esra 0 torso em

V - e musculado

ESTUDANTE UNlVERSITiillIO 21 ANOS PRATICANTE DE MUSCUIAtAo

porem scm a rudeza do passado impressa pelas condilt6es de

nabalho que sem intenltio moldavam 0 corpo 0 corpo do hom em ja nao

e urn mero instrurnento que se abandona ao trabalho mas de proprio

243

CLASSES ASSOCIATfVTSMO E ESTADO

MlllUCla como COOl

extracltao total dos pel os que possam encobrir 0

ao

da simetria muscular conseguida

Mas os corpos femininos tambem nao ficaram de fora dos sistemas

fisicos associados a muscutaltao Com objectivos mais moderados em

termos de volume corporal e sobretudo direccionados para a perda de

adiposidade e tonificaltao determinadas zonas do corpo as mulheres

encontraram res posta aos seus anseios corporais sobretudo nos body Mesmo

aos pesos e e aoontrario

publico masCilliri~ as roulheres tendem a

do corpo como (lllS de intervenltao prioritaria no sentido da manuten

ltao ou mociitJG50 Face a tais aspiraltoes a chegoll

a conceber um sistema fisieo particular para dar ao pllbico

especificameme feminino comercializando-o sob a designaltio de GAP

uma modalidade que promove 0 trabalho de resistencia e forshy

talecimento atraves de varios exerdcios localizados nas zonas

dos gl(lteos abdommalS e pernas

Eu era ter aqude corpo musculado corpo bonito

que tada a gente rilio e () Nao llma mulher eXclgeJradamell1le

muscuCida porque perde os trayos femininosEuma mulher ddinida

Nao precisa de ser magra Nao acho que eaquele estereotipo de magre-La

que cada vez ha mais que leva as miudas hoje em dia a rornarem-se

anonxicas ( ) Hoje no ginasio a imagem que se quer passar e que

essa nao ea nao eo ideal de urn corpo 0 ideal de urn corpo e umamulher a mulher nao precisa de estar MOr

desde que bem ueWllUa e0 ideal

23 ANOS 120 ANO INSTRJroRA DE CARDlo-FrfNESS

244

PESOS HALTERES E SENTiDOS DOS CORPOS (H)AIrERADOS

tern

cas no seio da industria de design corporal Como assinala Fortuna

os de edllcalt3o ffsica tinham como vocaltao disciplinar 0 corpo

para for mar rnelhores cidactios mais saudaveis e competemes prepashy

rando-os para os desafios das novas sociedades surgidas com a industriashy

os actuais health clubs por seu lado associ am a juventude a

beleza e a satide do corpo aamo-confianya aauto-estima e ao bem-estar

ol(rcendo prodmos e serviltos a moldar 0 corpo amedida

e preocupalt6es de

outros mats imageticos

some body Estar em mostrar (determinadas)

A manifestalt3o mais valorizada do corpo saudavel deixa de

ser a seu rendimeDto fo1lta e para passar a ser a sua aparenshy

cia A sallde cosmetiza-se e torna-se num fen6meno estetico nao basta

mante-la mas fazer transparece-la nomeadamente atraves da aquisiltao

urn corpo perfeito Este par sua vez passa a ser condiltao sine

non para 0

Higt LdllI-la para a ser

Eu via que tinlIa urn corpo com varios problemas Precisava de

rirar a barriga algum poeu e Tinha urn peito quase fundo dentro

quase que nao se via a barriga mais saida que 0 peito Via que tinha

problemas e estava a caminhar para 0 problema da obesidade ( )

Agora quando olho para 0 espdho vejo urn corpo perfeito 0 que todo

o hornem gostaria de tef E simo-me orgulhoso por isso

AUXILlAR DE ACOO MEDICA 120 ANO 24 ANOS

PHKnCANTE DE

245

CLASSES ASSOCIATIVLSMO E ESTADO

despono ou pelo menos efectuar com regushy

[sica passou aser nao apenas urn direito25 mas

tambem urn dever sociedades contempodneas um

cuja falta acarreta frequentemente sentimentos de culpa pessoal

e aclt6es de sanyao social sobre aqueles que se encontram pouco

a descobrir as suas supostas vantagens ou cujos corpos se afastarn

da normatividade da silhueta canonica quese deseia bem deflllida e

tonificada

Pesos e halteres entre 0 estUode vida saudltivel doeura ddec a a sau

Se a pFl1rllpaltao com os cuidados corporlis era anteriOrrneHr proshy

pria das classt~s onis lhastad3s nas condilt6es

oitenta f) portugues comum passa a tcr acesso em qualqucr sureil1ler~

cadoa uma pan6plia de prodUloh tecnicas e servicos que prometem criar

e conservar um corpo jovem perfeira e saudive qualidades de refeshy

rencia e reverencia no culto conremporaneo do corpo Socialmente apreshy

sentados e mercantilizados em associacao acriacao de urn

produtor de salIde e preventor doenca tais produtos tecshy

nicas e servi~os sao frequentemente assumidos na vida quotidiana Como

sendodo oll mais importante que os propdes servicos de saude e de

prestacao de cuidados medicos na concretizayao do bem-estar fisico e

psicologico das pessoas A ideia hoje partilhada no imaginario

de que a saude ealgo que se conquista ccoroHrio simb61ico da delegashy

ltao social no individuo das formas manutenlt3o controlo e vigilancia

do corpo que outrora haviam sido exercidas pelas autoridades

A difusao e enraizamento social da assuncao de que e possivd obter

e manrera saude do corpo atraves do envolvimento do individuo num

de pratiCa5 ditas saudaveis acabaram efectivamente por impushy

tar a cada urn uma responsabilidade crescente pelo seu estado de

Concomitantemente em alguns contextos forneceram argumentos a

246

PESOS HAJTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AIfERADOS

desresponsabiliza~o parcial do Estado em materia de ULUltlUU medicos

e sallde publica Doravante nao esuposto que os cidadaos necessitem

de instrw5es das autoridades e instituiltoes publicas sobre como cui dar

sua existencia ffsica 0 corpo passa a ser urn espaco regulado

opc5es e escolhas de cada urn entre a pleiade de produtos tecnicas

e serviltos actualmente ao seu dispor

Sob a egide da crenca na autoridade pessoal sobre 0 corpo cada pessoa

apartida detem plenos direitos sobre esse bern patrimonial sen do igualshy

mente responsive pelo cumprimento determinados deveres sociais

Estes passam entre outros pdo governo da sua respectiva aparencia e

de vida Ao indivfduo eatribufdo urn papd preponderante na

identificaltao e controlo atempado dos sintomas de patologias diversas

problemas cardiovasculares na preVcncao perante condutas

risco (nomeadameHte atTaves da redwao doakool e do tabaco

obrigatoriedade de sexo protegido ou do exerdcia Hsico) au na

cia e evitamento do que sao socialmente considerados excessos (alimen-

tares exposicao ao sol de medicaliiacentio etc)

da adop~ao cada vez matS generalizada desta nova atitude de

pntdencialismo individualist a perante 0 bem-estar corporal e a evolultao

da oroDorcao de populaltao que em Portugal na viragem do

desenvolver algum tipo de aCyao no sentido de melhorar ou

manter 0 seu estado de salide Segundo 0 estudo 0 Estado de Saude em

entre 2001 e 2008 a percentagem de portuguese que afirshy

mavam estar a tomar no momenta realizaltao do inquerito alguma

iniciativ3 no sentido de mclhorar ou manter 0 seu estado de saude

viu-se aumentar de 368 em 2001 para cerca de metade da populaltao

(498) em 2008

Segundo 0 mesmo estudo essa evolultao e acompanhada da alterashy

de comportamento declarado rclativamente a determinados hibishy

tos de vida considerados saudaveis designadamente no que respeita

ao exerdcio fisico A percentagem de portugueses que afirmam

exerdcio [SICO regular (ginistica COffer etc) ve-se significativamente

de 33 em 2001 para 475 em 2008 Mesmo que 11ao

247

11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

se traduza numa pratica efectiva27 csta evolu~ao corresponded

a uma assinalivel incorporaltao social do dezJer-ser contemporaneo da

actividade fisica A representaiyao desta enquanto habito de vida saudishy

torna-se clara quando noutra investiga~a028 se constatou ser entre

os individuos que mais regularmente praticam exerdcio Hsico que mais

presente esta a percep~ao do risco cia sua ausencia quotidiana29

e born esaudiveJ eurn habito saudaveL E como se

fosse lel livros sel inteligente Esras a arranjar 0 teu corpo Sabes

que vais chegar aos quarenta e tal arros e ainda vais estar born Agora

muitos chegam aos qualcrrra e tal anos e ja esrao com barriga e

com sei a ter tanras ~u~tas coisas Ficas mas saudivel se estas a

treinar bem e sew mdar contra a tua

29 ANOS LH ENClfO ENFERMEI(O PRATICANTE DE MusCutAltAo

A tendcncia para a crenlta incontestlvel no exerdcio fisico como

habito de vida saudivel nao se apresenta contudo disrribulda

igual maneira no espa~o social e cultural portugues Sao varios os estushy

que tern localizado urn maior enraizamento social da disposi~ao

para a pratica de exerdcio fisico entre as mais jovens geralt6es e entre

os individuos provenientes dos estratos socioeconomicos mais clevashy

dos Resultadonao apenas das novas con(li~6es de sociais economicas

e simbolicas em que as gera~6es pos-25 de Abril sao socializadas relatishy

vamente ao corpo e aos cuidados corporais30 mas tambem de urn efeito

de trnsltao no curso

Investiga~6es realizadas sobre a pnitica de actividades ffsicas entre os

jovens portugueses denotam-na mais regular e intensiva nos grupos etashy

rios mais novos nomeadamente ate ainserlt5o no mercado de trabalho

e aassunlt5o de novas responsabilidades familiares31bull 0 que indica que

amedida que as etapas do processo de transi~ao para a vida adulta se vao

cum prindo a pritica desportiva vai efectivamente sendo abandonada no

quotidiano dos jovens portugueses

248

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

No caso especifico da 11l~LU1ltll-alJ uma actividade particularmente

exigente em termos do tempo dispoIl lVei para a sua pratica esta tenshy

dencia revela-se particularrnente marcante Trata-se no eatanto de

uma das modalidades com maior adesao efectiva ou potencial entre os

jovens em Portugal A sua pdtica efectiva (prcsente ou passada)

declarada por cerca de 12 da populalt5o jovem porttlguesa no ano

200032 sendo 34 a percentagem de jovens que nunca tendo pratishy

cado admitiram vir a faze-Io no futuro Quer a sua pdtica efectiva

quer a sua pr~hica potencial viram-se substancialmeme acrescidas entre

os jovens do sexo lTlasculin033 com idades compreendidas entre 18 e

anos ainda a residir com a familia de origem ou sozinhos solteiros

ou ja separados ou divorciados sem filhos Perfil dpieo para stlstentar

a hip6tese de 0 aumento de massa muscular ser urn investimento corshy

poral que corresponde ellliarga medida a uma fOlm~de capitalizar

o potencial expressivo do corpo masculino em estrategiasde atracltao e

sedult5o

Embora a disponibilidade potencial para a pratica da musculaltao

- nunca fiz mas admito vir a fazec surja praticamente transversal aos

jovens qualquer que seja 0 seu estatuto social ou habitat de residencia

o facto cque as condilt6es materiais de existencia continuam a constranshy

ger a sua ptatica efectiva Mais devada entre os jovens que melhores

condilt6es sociais detem para fa_zet face as mensalidades exigidas pelos

cspaltos destinados ao seu exerdci0 34 a pratica de musculaltao decrescc

amedida que se desce na estrutura social de 26 entre os jovens de

estatuto social alto diminui para 9 entre os jovens de estatuto social

mais baixo Do mesmo modo sao os jovcns que tern urn acesso mais

facilitado as instalalt6es que disponibilizam tal servi~o quem mais adere

efectivamente a sua pritica ou seja os jovens residentes em habitat

e suburbano 0 sanho em obter urn corpo musculado revela-se

portanto substancialmente mats democratizado na sua distribui~ao social

(mediaticamente amplificada) do que as condi~6es que perrnitem a sua

concrecizaltao

149

CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 9: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

CLASSES ASSOCIATfVTSMO E ESTADO

MlllUCla como COOl

extracltao total dos pel os que possam encobrir 0

ao

da simetria muscular conseguida

Mas os corpos femininos tambem nao ficaram de fora dos sistemas

fisicos associados a muscutaltao Com objectivos mais moderados em

termos de volume corporal e sobretudo direccionados para a perda de

adiposidade e tonificaltao determinadas zonas do corpo as mulheres

encontraram res posta aos seus anseios corporais sobretudo nos body Mesmo

aos pesos e e aoontrario

publico masCilliri~ as roulheres tendem a

do corpo como (lllS de intervenltao prioritaria no sentido da manuten

ltao ou mociitJG50 Face a tais aspiraltoes a chegoll

a conceber um sistema fisieo particular para dar ao pllbico

especificameme feminino comercializando-o sob a designaltio de GAP

uma modalidade que promove 0 trabalho de resistencia e forshy

talecimento atraves de varios exerdcios localizados nas zonas

dos gl(lteos abdommalS e pernas

Eu era ter aqude corpo musculado corpo bonito

que tada a gente rilio e () Nao llma mulher eXclgeJradamell1le

muscuCida porque perde os trayos femininosEuma mulher ddinida

Nao precisa de ser magra Nao acho que eaquele estereotipo de magre-La

que cada vez ha mais que leva as miudas hoje em dia a rornarem-se

anonxicas ( ) Hoje no ginasio a imagem que se quer passar e que

essa nao ea nao eo ideal de urn corpo 0 ideal de urn corpo e umamulher a mulher nao precisa de estar MOr

desde que bem ueWllUa e0 ideal

23 ANOS 120 ANO INSTRJroRA DE CARDlo-FrfNESS

244

PESOS HALTERES E SENTiDOS DOS CORPOS (H)AIrERADOS

tern

cas no seio da industria de design corporal Como assinala Fortuna

os de edllcalt3o ffsica tinham como vocaltao disciplinar 0 corpo

para for mar rnelhores cidactios mais saudaveis e competemes prepashy

rando-os para os desafios das novas sociedades surgidas com a industriashy

os actuais health clubs por seu lado associ am a juventude a

beleza e a satide do corpo aamo-confianya aauto-estima e ao bem-estar

ol(rcendo prodmos e serviltos a moldar 0 corpo amedida

e preocupalt6es de

outros mats imageticos

some body Estar em mostrar (determinadas)

A manifestalt3o mais valorizada do corpo saudavel deixa de

ser a seu rendimeDto fo1lta e para passar a ser a sua aparenshy

cia A sallde cosmetiza-se e torna-se num fen6meno estetico nao basta

mante-la mas fazer transparece-la nomeadamente atraves da aquisiltao

urn corpo perfeito Este par sua vez passa a ser condiltao sine

non para 0

Higt LdllI-la para a ser

Eu via que tinlIa urn corpo com varios problemas Precisava de

rirar a barriga algum poeu e Tinha urn peito quase fundo dentro

quase que nao se via a barriga mais saida que 0 peito Via que tinha

problemas e estava a caminhar para 0 problema da obesidade ( )

Agora quando olho para 0 espdho vejo urn corpo perfeito 0 que todo

o hornem gostaria de tef E simo-me orgulhoso por isso

AUXILlAR DE ACOO MEDICA 120 ANO 24 ANOS

PHKnCANTE DE

245

CLASSES ASSOCIATIVLSMO E ESTADO

despono ou pelo menos efectuar com regushy

[sica passou aser nao apenas urn direito25 mas

tambem urn dever sociedades contempodneas um

cuja falta acarreta frequentemente sentimentos de culpa pessoal

e aclt6es de sanyao social sobre aqueles que se encontram pouco

a descobrir as suas supostas vantagens ou cujos corpos se afastarn

da normatividade da silhueta canonica quese deseia bem deflllida e

tonificada

Pesos e halteres entre 0 estUode vida saudltivel doeura ddec a a sau

Se a pFl1rllpaltao com os cuidados corporlis era anteriOrrneHr proshy

pria das classt~s onis lhastad3s nas condilt6es

oitenta f) portugues comum passa a tcr acesso em qualqucr sureil1ler~

cadoa uma pan6plia de prodUloh tecnicas e servicos que prometem criar

e conservar um corpo jovem perfeira e saudive qualidades de refeshy

rencia e reverencia no culto conremporaneo do corpo Socialmente apreshy

sentados e mercantilizados em associacao acriacao de urn

produtor de salIde e preventor doenca tais produtos tecshy

nicas e servi~os sao frequentemente assumidos na vida quotidiana Como

sendodo oll mais importante que os propdes servicos de saude e de

prestacao de cuidados medicos na concretizayao do bem-estar fisico e

psicologico das pessoas A ideia hoje partilhada no imaginario

de que a saude ealgo que se conquista ccoroHrio simb61ico da delegashy

ltao social no individuo das formas manutenlt3o controlo e vigilancia

do corpo que outrora haviam sido exercidas pelas autoridades

A difusao e enraizamento social da assuncao de que e possivd obter

e manrera saude do corpo atraves do envolvimento do individuo num

de pratiCa5 ditas saudaveis acabaram efectivamente por impushy

tar a cada urn uma responsabilidade crescente pelo seu estado de

Concomitantemente em alguns contextos forneceram argumentos a

246

PESOS HAJTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AIfERADOS

desresponsabiliza~o parcial do Estado em materia de ULUltlUU medicos

e sallde publica Doravante nao esuposto que os cidadaos necessitem

de instrw5es das autoridades e instituiltoes publicas sobre como cui dar

sua existencia ffsica 0 corpo passa a ser urn espaco regulado

opc5es e escolhas de cada urn entre a pleiade de produtos tecnicas

e serviltos actualmente ao seu dispor

Sob a egide da crenca na autoridade pessoal sobre 0 corpo cada pessoa

apartida detem plenos direitos sobre esse bern patrimonial sen do igualshy

mente responsive pelo cumprimento determinados deveres sociais

Estes passam entre outros pdo governo da sua respectiva aparencia e

de vida Ao indivfduo eatribufdo urn papd preponderante na

identificaltao e controlo atempado dos sintomas de patologias diversas

problemas cardiovasculares na preVcncao perante condutas

risco (nomeadameHte atTaves da redwao doakool e do tabaco

obrigatoriedade de sexo protegido ou do exerdcia Hsico) au na

cia e evitamento do que sao socialmente considerados excessos (alimen-

tares exposicao ao sol de medicaliiacentio etc)

da adop~ao cada vez matS generalizada desta nova atitude de

pntdencialismo individualist a perante 0 bem-estar corporal e a evolultao

da oroDorcao de populaltao que em Portugal na viragem do

desenvolver algum tipo de aCyao no sentido de melhorar ou

manter 0 seu estado de salide Segundo 0 estudo 0 Estado de Saude em

entre 2001 e 2008 a percentagem de portuguese que afirshy

mavam estar a tomar no momenta realizaltao do inquerito alguma

iniciativ3 no sentido de mclhorar ou manter 0 seu estado de saude

viu-se aumentar de 368 em 2001 para cerca de metade da populaltao

(498) em 2008

Segundo 0 mesmo estudo essa evolultao e acompanhada da alterashy

de comportamento declarado rclativamente a determinados hibishy

tos de vida considerados saudaveis designadamente no que respeita

ao exerdcio fisico A percentagem de portugueses que afirmam

exerdcio [SICO regular (ginistica COffer etc) ve-se significativamente

de 33 em 2001 para 475 em 2008 Mesmo que 11ao

247

11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

se traduza numa pratica efectiva27 csta evolu~ao corresponded

a uma assinalivel incorporaltao social do dezJer-ser contemporaneo da

actividade fisica A representaiyao desta enquanto habito de vida saudishy

torna-se clara quando noutra investiga~a028 se constatou ser entre

os individuos que mais regularmente praticam exerdcio Hsico que mais

presente esta a percep~ao do risco cia sua ausencia quotidiana29

e born esaudiveJ eurn habito saudaveL E como se

fosse lel livros sel inteligente Esras a arranjar 0 teu corpo Sabes

que vais chegar aos quarenta e tal arros e ainda vais estar born Agora

muitos chegam aos qualcrrra e tal anos e ja esrao com barriga e

com sei a ter tanras ~u~tas coisas Ficas mas saudivel se estas a

treinar bem e sew mdar contra a tua

29 ANOS LH ENClfO ENFERMEI(O PRATICANTE DE MusCutAltAo

A tendcncia para a crenlta incontestlvel no exerdcio fisico como

habito de vida saudivel nao se apresenta contudo disrribulda

igual maneira no espa~o social e cultural portugues Sao varios os estushy

que tern localizado urn maior enraizamento social da disposi~ao

para a pratica de exerdcio fisico entre as mais jovens geralt6es e entre

os individuos provenientes dos estratos socioeconomicos mais clevashy

dos Resultadonao apenas das novas con(li~6es de sociais economicas

e simbolicas em que as gera~6es pos-25 de Abril sao socializadas relatishy

vamente ao corpo e aos cuidados corporais30 mas tambem de urn efeito

de trnsltao no curso

Investiga~6es realizadas sobre a pnitica de actividades ffsicas entre os

jovens portugueses denotam-na mais regular e intensiva nos grupos etashy

rios mais novos nomeadamente ate ainserlt5o no mercado de trabalho

e aassunlt5o de novas responsabilidades familiares31bull 0 que indica que

amedida que as etapas do processo de transi~ao para a vida adulta se vao

cum prindo a pritica desportiva vai efectivamente sendo abandonada no

quotidiano dos jovens portugueses

248

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

No caso especifico da 11l~LU1ltll-alJ uma actividade particularmente

exigente em termos do tempo dispoIl lVei para a sua pratica esta tenshy

dencia revela-se particularrnente marcante Trata-se no eatanto de

uma das modalidades com maior adesao efectiva ou potencial entre os

jovens em Portugal A sua pdtica efectiva (prcsente ou passada)

declarada por cerca de 12 da populalt5o jovem porttlguesa no ano

200032 sendo 34 a percentagem de jovens que nunca tendo pratishy

cado admitiram vir a faze-Io no futuro Quer a sua pdtica efectiva

quer a sua pr~hica potencial viram-se substancialmeme acrescidas entre

os jovens do sexo lTlasculin033 com idades compreendidas entre 18 e

anos ainda a residir com a familia de origem ou sozinhos solteiros

ou ja separados ou divorciados sem filhos Perfil dpieo para stlstentar

a hip6tese de 0 aumento de massa muscular ser urn investimento corshy

poral que corresponde ellliarga medida a uma fOlm~de capitalizar

o potencial expressivo do corpo masculino em estrategiasde atracltao e

sedult5o

Embora a disponibilidade potencial para a pratica da musculaltao

- nunca fiz mas admito vir a fazec surja praticamente transversal aos

jovens qualquer que seja 0 seu estatuto social ou habitat de residencia

o facto cque as condilt6es materiais de existencia continuam a constranshy

ger a sua ptatica efectiva Mais devada entre os jovens que melhores

condilt6es sociais detem para fa_zet face as mensalidades exigidas pelos

cspaltos destinados ao seu exerdci0 34 a pratica de musculaltao decrescc

amedida que se desce na estrutura social de 26 entre os jovens de

estatuto social alto diminui para 9 entre os jovens de estatuto social

mais baixo Do mesmo modo sao os jovcns que tern urn acesso mais

facilitado as instalalt6es que disponibilizam tal servi~o quem mais adere

efectivamente a sua pritica ou seja os jovens residentes em habitat

e suburbano 0 sanho em obter urn corpo musculado revela-se

portanto substancialmente mats democratizado na sua distribui~ao social

(mediaticamente amplificada) do que as condi~6es que perrnitem a sua

concrecizaltao

149

CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

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PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 10: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

CLASSES ASSOCIATIVLSMO E ESTADO

despono ou pelo menos efectuar com regushy

[sica passou aser nao apenas urn direito25 mas

tambem urn dever sociedades contempodneas um

cuja falta acarreta frequentemente sentimentos de culpa pessoal

e aclt6es de sanyao social sobre aqueles que se encontram pouco

a descobrir as suas supostas vantagens ou cujos corpos se afastarn

da normatividade da silhueta canonica quese deseia bem deflllida e

tonificada

Pesos e halteres entre 0 estUode vida saudltivel doeura ddec a a sau

Se a pFl1rllpaltao com os cuidados corporlis era anteriOrrneHr proshy

pria das classt~s onis lhastad3s nas condilt6es

oitenta f) portugues comum passa a tcr acesso em qualqucr sureil1ler~

cadoa uma pan6plia de prodUloh tecnicas e servicos que prometem criar

e conservar um corpo jovem perfeira e saudive qualidades de refeshy

rencia e reverencia no culto conremporaneo do corpo Socialmente apreshy

sentados e mercantilizados em associacao acriacao de urn

produtor de salIde e preventor doenca tais produtos tecshy

nicas e servi~os sao frequentemente assumidos na vida quotidiana Como

sendodo oll mais importante que os propdes servicos de saude e de

prestacao de cuidados medicos na concretizayao do bem-estar fisico e

psicologico das pessoas A ideia hoje partilhada no imaginario

de que a saude ealgo que se conquista ccoroHrio simb61ico da delegashy

ltao social no individuo das formas manutenlt3o controlo e vigilancia

do corpo que outrora haviam sido exercidas pelas autoridades

A difusao e enraizamento social da assuncao de que e possivd obter

e manrera saude do corpo atraves do envolvimento do individuo num

de pratiCa5 ditas saudaveis acabaram efectivamente por impushy

tar a cada urn uma responsabilidade crescente pelo seu estado de

Concomitantemente em alguns contextos forneceram argumentos a

246

PESOS HAJTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)AIfERADOS

desresponsabiliza~o parcial do Estado em materia de ULUltlUU medicos

e sallde publica Doravante nao esuposto que os cidadaos necessitem

de instrw5es das autoridades e instituiltoes publicas sobre como cui dar

sua existencia ffsica 0 corpo passa a ser urn espaco regulado

opc5es e escolhas de cada urn entre a pleiade de produtos tecnicas

e serviltos actualmente ao seu dispor

Sob a egide da crenca na autoridade pessoal sobre 0 corpo cada pessoa

apartida detem plenos direitos sobre esse bern patrimonial sen do igualshy

mente responsive pelo cumprimento determinados deveres sociais

Estes passam entre outros pdo governo da sua respectiva aparencia e

de vida Ao indivfduo eatribufdo urn papd preponderante na

identificaltao e controlo atempado dos sintomas de patologias diversas

problemas cardiovasculares na preVcncao perante condutas

risco (nomeadameHte atTaves da redwao doakool e do tabaco

obrigatoriedade de sexo protegido ou do exerdcia Hsico) au na

cia e evitamento do que sao socialmente considerados excessos (alimen-

tares exposicao ao sol de medicaliiacentio etc)

da adop~ao cada vez matS generalizada desta nova atitude de

pntdencialismo individualist a perante 0 bem-estar corporal e a evolultao

da oroDorcao de populaltao que em Portugal na viragem do

desenvolver algum tipo de aCyao no sentido de melhorar ou

manter 0 seu estado de salide Segundo 0 estudo 0 Estado de Saude em

entre 2001 e 2008 a percentagem de portuguese que afirshy

mavam estar a tomar no momenta realizaltao do inquerito alguma

iniciativ3 no sentido de mclhorar ou manter 0 seu estado de saude

viu-se aumentar de 368 em 2001 para cerca de metade da populaltao

(498) em 2008

Segundo 0 mesmo estudo essa evolultao e acompanhada da alterashy

de comportamento declarado rclativamente a determinados hibishy

tos de vida considerados saudaveis designadamente no que respeita

ao exerdcio fisico A percentagem de portugueses que afirmam

exerdcio [SICO regular (ginistica COffer etc) ve-se significativamente

de 33 em 2001 para 475 em 2008 Mesmo que 11ao

247

11

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

se traduza numa pratica efectiva27 csta evolu~ao corresponded

a uma assinalivel incorporaltao social do dezJer-ser contemporaneo da

actividade fisica A representaiyao desta enquanto habito de vida saudishy

torna-se clara quando noutra investiga~a028 se constatou ser entre

os individuos que mais regularmente praticam exerdcio Hsico que mais

presente esta a percep~ao do risco cia sua ausencia quotidiana29

e born esaudiveJ eurn habito saudaveL E como se

fosse lel livros sel inteligente Esras a arranjar 0 teu corpo Sabes

que vais chegar aos quarenta e tal arros e ainda vais estar born Agora

muitos chegam aos qualcrrra e tal anos e ja esrao com barriga e

com sei a ter tanras ~u~tas coisas Ficas mas saudivel se estas a

treinar bem e sew mdar contra a tua

29 ANOS LH ENClfO ENFERMEI(O PRATICANTE DE MusCutAltAo

A tendcncia para a crenlta incontestlvel no exerdcio fisico como

habito de vida saudivel nao se apresenta contudo disrribulda

igual maneira no espa~o social e cultural portugues Sao varios os estushy

que tern localizado urn maior enraizamento social da disposi~ao

para a pratica de exerdcio fisico entre as mais jovens geralt6es e entre

os individuos provenientes dos estratos socioeconomicos mais clevashy

dos Resultadonao apenas das novas con(li~6es de sociais economicas

e simbolicas em que as gera~6es pos-25 de Abril sao socializadas relatishy

vamente ao corpo e aos cuidados corporais30 mas tambem de urn efeito

de trnsltao no curso

Investiga~6es realizadas sobre a pnitica de actividades ffsicas entre os

jovens portugueses denotam-na mais regular e intensiva nos grupos etashy

rios mais novos nomeadamente ate ainserlt5o no mercado de trabalho

e aassunlt5o de novas responsabilidades familiares31bull 0 que indica que

amedida que as etapas do processo de transi~ao para a vida adulta se vao

cum prindo a pritica desportiva vai efectivamente sendo abandonada no

quotidiano dos jovens portugueses

248

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

No caso especifico da 11l~LU1ltll-alJ uma actividade particularmente

exigente em termos do tempo dispoIl lVei para a sua pratica esta tenshy

dencia revela-se particularrnente marcante Trata-se no eatanto de

uma das modalidades com maior adesao efectiva ou potencial entre os

jovens em Portugal A sua pdtica efectiva (prcsente ou passada)

declarada por cerca de 12 da populalt5o jovem porttlguesa no ano

200032 sendo 34 a percentagem de jovens que nunca tendo pratishy

cado admitiram vir a faze-Io no futuro Quer a sua pdtica efectiva

quer a sua pr~hica potencial viram-se substancialmeme acrescidas entre

os jovens do sexo lTlasculin033 com idades compreendidas entre 18 e

anos ainda a residir com a familia de origem ou sozinhos solteiros

ou ja separados ou divorciados sem filhos Perfil dpieo para stlstentar

a hip6tese de 0 aumento de massa muscular ser urn investimento corshy

poral que corresponde ellliarga medida a uma fOlm~de capitalizar

o potencial expressivo do corpo masculino em estrategiasde atracltao e

sedult5o

Embora a disponibilidade potencial para a pratica da musculaltao

- nunca fiz mas admito vir a fazec surja praticamente transversal aos

jovens qualquer que seja 0 seu estatuto social ou habitat de residencia

o facto cque as condilt6es materiais de existencia continuam a constranshy

ger a sua ptatica efectiva Mais devada entre os jovens que melhores

condilt6es sociais detem para fa_zet face as mensalidades exigidas pelos

cspaltos destinados ao seu exerdci0 34 a pratica de musculaltao decrescc

amedida que se desce na estrutura social de 26 entre os jovens de

estatuto social alto diminui para 9 entre os jovens de estatuto social

mais baixo Do mesmo modo sao os jovcns que tern urn acesso mais

facilitado as instalalt6es que disponibilizam tal servi~o quem mais adere

efectivamente a sua pritica ou seja os jovens residentes em habitat

e suburbano 0 sanho em obter urn corpo musculado revela-se

portanto substancialmente mats democratizado na sua distribui~ao social

(mediaticamente amplificada) do que as condi~6es que perrnitem a sua

concrecizaltao

149

CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

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CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

se traduza numa pratica efectiva27 csta evolu~ao corresponded

a uma assinalivel incorporaltao social do dezJer-ser contemporaneo da

actividade fisica A representaiyao desta enquanto habito de vida saudishy

torna-se clara quando noutra investiga~a028 se constatou ser entre

os individuos que mais regularmente praticam exerdcio Hsico que mais

presente esta a percep~ao do risco cia sua ausencia quotidiana29

e born esaudiveJ eurn habito saudaveL E como se

fosse lel livros sel inteligente Esras a arranjar 0 teu corpo Sabes

que vais chegar aos quarenta e tal arros e ainda vais estar born Agora

muitos chegam aos qualcrrra e tal anos e ja esrao com barriga e

com sei a ter tanras ~u~tas coisas Ficas mas saudivel se estas a

treinar bem e sew mdar contra a tua

29 ANOS LH ENClfO ENFERMEI(O PRATICANTE DE MusCutAltAo

A tendcncia para a crenlta incontestlvel no exerdcio fisico como

habito de vida saudivel nao se apresenta contudo disrribulda

igual maneira no espa~o social e cultural portugues Sao varios os estushy

que tern localizado urn maior enraizamento social da disposi~ao

para a pratica de exerdcio fisico entre as mais jovens geralt6es e entre

os individuos provenientes dos estratos socioeconomicos mais clevashy

dos Resultadonao apenas das novas con(li~6es de sociais economicas

e simbolicas em que as gera~6es pos-25 de Abril sao socializadas relatishy

vamente ao corpo e aos cuidados corporais30 mas tambem de urn efeito

de trnsltao no curso

Investiga~6es realizadas sobre a pnitica de actividades ffsicas entre os

jovens portugueses denotam-na mais regular e intensiva nos grupos etashy

rios mais novos nomeadamente ate ainserlt5o no mercado de trabalho

e aassunlt5o de novas responsabilidades familiares31bull 0 que indica que

amedida que as etapas do processo de transi~ao para a vida adulta se vao

cum prindo a pritica desportiva vai efectivamente sendo abandonada no

quotidiano dos jovens portugueses

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PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

No caso especifico da 11l~LU1ltll-alJ uma actividade particularmente

exigente em termos do tempo dispoIl lVei para a sua pratica esta tenshy

dencia revela-se particularrnente marcante Trata-se no eatanto de

uma das modalidades com maior adesao efectiva ou potencial entre os

jovens em Portugal A sua pdtica efectiva (prcsente ou passada)

declarada por cerca de 12 da populalt5o jovem porttlguesa no ano

200032 sendo 34 a percentagem de jovens que nunca tendo pratishy

cado admitiram vir a faze-Io no futuro Quer a sua pdtica efectiva

quer a sua pr~hica potencial viram-se substancialmeme acrescidas entre

os jovens do sexo lTlasculin033 com idades compreendidas entre 18 e

anos ainda a residir com a familia de origem ou sozinhos solteiros

ou ja separados ou divorciados sem filhos Perfil dpieo para stlstentar

a hip6tese de 0 aumento de massa muscular ser urn investimento corshy

poral que corresponde ellliarga medida a uma fOlm~de capitalizar

o potencial expressivo do corpo masculino em estrategiasde atracltao e

sedult5o

Embora a disponibilidade potencial para a pratica da musculaltao

- nunca fiz mas admito vir a fazec surja praticamente transversal aos

jovens qualquer que seja 0 seu estatuto social ou habitat de residencia

o facto cque as condilt6es materiais de existencia continuam a constranshy

ger a sua ptatica efectiva Mais devada entre os jovens que melhores

condilt6es sociais detem para fa_zet face as mensalidades exigidas pelos

cspaltos destinados ao seu exerdci0 34 a pratica de musculaltao decrescc

amedida que se desce na estrutura social de 26 entre os jovens de

estatuto social alto diminui para 9 entre os jovens de estatuto social

mais baixo Do mesmo modo sao os jovcns que tern urn acesso mais

facilitado as instalalt6es que disponibilizam tal servi~o quem mais adere

efectivamente a sua pritica ou seja os jovens residentes em habitat

e suburbano 0 sanho em obter urn corpo musculado revela-se

portanto substancialmente mats democratizado na sua distribui~ao social

(mediaticamente amplificada) do que as condi~6es que perrnitem a sua

concrecizaltao

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CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 12: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

CLASSES ASSOCIATIVISMO b ESTADO

Para fazer [musculayao] como se fosse urn culto tern que se rer

tempo e disponibilidade E depois tern que se ter vontade uma

vontade E dinheiro Estas sao as coisas vontade dinheiro e disposhy

nibilidade

29 ANOS LICENCLADO ENFER1v1EIRO PRATCANTE DE MUSCULAyo

Tern que se ter muita forlfa de vontade tem que eter

tambem () torna-se a tal de qlle eu poundalo eV1Clame

( ) A pessoa para rcr urn corpo assimrem quI s~ trabalhar muito

nao e Nao e brincaJeira 1150 e E preciso urn esforyo de

tempo alillleatar A nutri(ao entao se para

rnentos tem que $( fr n30 IE pode

28 ANOS 10deg ANO DESEM[REGADO JTICANTE DE MUSCULAtAo

Mesmo entre aqueles que reunem as condic5es socioeconomicas

que permitem 0 acesso a constru~ao urn corpo de atraves da

de muscidacento nem todos dispoem das disposilt6es subjectivas

C(IgtIIld para enfrentar 0 longo processo da suaconcretizasao Euma

dctividade que quando 0 objectivo ea obtensao eoumanuten~ao

urn dado modelo de compleiltao fisica volumoso e definido exige dos

seuspraticantes trabalho arduo e dedicaltao quase monastica forsa de

e determinacao perseveranlta e espfrito de sacriflcio pain no abnegalt3o e autocomrolo e disciplina Nao e por

acaso que entre os jovens que praticam algum tipo despono Oll actishy

vidade fisica sao os adeptos musculalt3o os que uma

tica mais intensiva e regular sendo mais de metade os que se exercitam

diaria ou quase diariamentel5

A maximizasao da estetica corporal proposta pela rnusculasao

ponamo a realizacao de uma etica que transcende a pritica

250

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

desta modalidade e se estende a outros domfnios vida do seu

came A etica de disciplina cultivada durante os a dado momento

da efectivameute a ir dos tempos e espashy

lt05 que sao dedicados A alirnentacento passa a ser bastante cuidada

hiper-re5tritiva nas gorduras e e sobredimensionada nas proteinas

c hidratos de nutrientcs que permitem acumular energia para 0

t[eino eo concomitante crcscimento do volume muscular 0 sono Dassa a

ser tambem hiper-regrado sacrificando-se momentos de lazer e

noctumas por exemplo 0 tempo disponfvd para sociabilidadcs amicais

e por vezes atc familiares e Iaborais passa a ser gerido em funsao das

necessidades treino diario

aquela vontade de ter urna vida de mudar 0

corro ]a nao queres comer gotJuras porque estas aver 0 reu carpo

Vais a um piquenique ou qualquer coisa assilll e wrnes alguma coisa

assim mais na semana que vem ji se nota nosabdominais En Jesus

Cristo engordei Eja vais xiiiiiiiiiii Corras com fritos e com gorduras

puxas mais hidratos de carbono e protdn~i ( ) Cada dia

contralo 0 peso e controlo muito bem aquilo que como percebes De

manha e uma dose multo torte de hidratos de carbono papas

Ncstum Uma coisa muito com leltemagro scm Nada

de gorduras nada de manteig~~ nada De manha e 15S0 on2C horas

tambem comes alguma coisa uma sandufche com cafe com ramshy

bern magro Alrno~o tambem comes cada dia qualQuer coisa

corni guisado com com com urn bom azeite

Ao jantar ji epouca coisa porque nao estou naquela fase de tomar

aminokidos e nao preciso N 50 estoll agora naquela fase de puxar para

crescer agora estou assim Niio lhe dd as vezes vontade de comer sei Ed

um bolo com chantilly Nao mete porque sabes que re vai

fazer maL Olhas para mas nao com aquela vontade de comer Sabes

que e born mas nao tens 0 corpo esta em primeiro

Niio e que narcisismo ou uma coisa assim E urna preocupayao

saudiveL Nao eque estejas a olhar para 0 espelho ai que sou bonito

251

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

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Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

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confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

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-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

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6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 13: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

nao 1sto ja enarcisismo Mas todas as pessoas estao prcocupadas com

aqllelc reslIltado que conseguiu e nao vais estragar agora de urn dia

para 0 outro ( ) Trabalho como um relagio todos os dias tteino as

tres ( ) Tem que ser nao podes brincar com a corpo Tem que set

tudo controlado ( ) Precisas descansar Par isso tem que ser llma vida

bern organizada Levantar-se as mesmas horas comer as mesmas horas

descansar as mesmas horas treinar as mesmas horas Tern que ser tuclo

arranjadinho nao podes andar disparatadQ a fazer coisas II um culto

Por isso cque tern resultados

29 ANOS UCENCLADO ENFERMEIlZO PRATICANTE DE MUSCULA(AO

1Boa parte do oe do praticante empenhado em

erescer a massa muscular fassa entao a ser geridoem fun~5o da maxishy

mizaltaodos ganhos de vDlume e ddiniltao corporal Este e um

tivo que 0 faz Ianyar mao de um impladvd processo racional instrushy

de autogoverno e hiperdiseiplina do seu tempo e das actividades

do corpo e sobre 0 corpo A ohten~ao de urn corpo hiperbolico impliea

paradoxalmente um rigoroso comedimento dos seus habitos e

eomportarnentos mais habituais Quando a hiperdisciplina earacterisshy

tica das pratieas introduzidas na vida quotidiana ja nao e capaz de dar

resposta as voIumosas ambi~6es do indivfduo quando ji nao eonsegue

maximizar 0 potencial corporal idealizado como meta por parte do prashy

ticantc cste nao se da obrigatoriamente por veneido 0 desatlo dos seus

pessoais e propriamente fisicos pode ser superado atraves do

consumo de outros reeursos tambem produzidos e comercializados

industria de design corporal nao caras vezes nos mesmos espaos onde

o exerdeio fisieo os poreneia

Eentao que chega a nora de experimentar as vantagens dos supleshy

mentos alimentares exibidos nas prateleiras das gcandes e pequenas

superficies de lojas de despofto bern como das entradas de muitos

ginasios indo de encontro as (rapidas) amhilt6es dos seus frequentashy

dores Para aIem destes produros enconttam-se ainda disponfveis em

252

PESOS HALTERES E SENTfDOS DOS CORPOS

circuitos de comercio rna is alternativo e underground uma diversidade

de ester6ides anabolizantes e de outros produtos euja venda livre eilegal

pelos efeitos perversos que acarretam na homeostasia interna do orgashy

nlsmo mas cujos ganhos de e massa muscular sao surpreendentes

na quantidade e eeleridade bem como na redwao significativa da adishy

posidade 0 uso dessas drogas apolineas36 tem-Se tornado uma op~ao

disseminada entre outros praticantes de muscuIaltao que

nao apenas as fisioeulturistas que desde sempre riveram uma rela~o

axiomitica37 bull

Entretanto vim para ca e aqui come-eei a tomar suplemenro

uma proteinazinha uma creatinazinha Entretanto fahram-mc sobre

a tal siruaifao [esteraides anabolizantesJ e eu tentei experimentar

para saber uma situa~o de curiosidade () Espectacular rnesmo

Uma pessoa atinge urn nive mesmo muito bom E Ilma qualidad

brutal Por isso e que dizem que a malta que eomeltlt a faxer essas

coisas depois torna-se viciada

28 ANOS 100 ANO DESEMPREGADO PRAT1CANTE DE

Assim que comepmos a ganhar 0 mfnimo musculo queremos

semprc mais sempre mais sempre mais Depois atillgimos quase a

performance dai nao safmos mais Depois onde vamos recorrcr ea

substincias batidos e aminoicidos que epara ver se conseguimos

desenvolver mais 0 110SS0 conseguir desenvolver mais os

mUsculos E acaba nisso ( quase urn CicIo ( ) E dcpois da eonseguishy

mos mais vamos desenvolvendo desenvolvendo

24 ANOS 120 AlOAUXIUAR DE ACOtO MEDICA

PRATlCANTE DE MUSCULAltAo

253

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

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PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

257

Page 14: Classes, AssociativisInO e Estadovitorsergioferreira.net/wp-content/uploads/2014/12... · tina do Deposit6rio exdusivo Raul Vieira, Lto" para combater 0 raqui I que dominava entre

I

CLASSES ASSOC1ATIVISMO E ESTADO

que os cultorcs da muscula~ao a actividade adamando

a sua preocupatao com a saude e 0 bem-estar presente e fururo represhy

sentando-a como uma mobilizada no scntido de manter ou

a forma e obter a imagem um corpo sauc1avel e atrashy

ente 0 facto c que a compreensao sempre positiva da entre cxershy

dcio e saude como afirmam Bagrichevsky e Estevao nao passa de uma

hipotese optimista38 Apesar de prevalecente enquanto ideal e a priori ramada por certa e incontroversa a rnixima despo[m c saude esconde

luitas vezes vivencias e representatoes

Com efeitoexistem cada vez mais situatoes em que as pretensoes

perfeccionistas e aobsess5n pela saude e peIo collt-mio do corp( podem

confIgurar cstados

mtermizados e

cinicamentc susceptivcis de sercm

J iuttoloeia do corpu

- ou

e saudiyei de lut ~e iessente a socdde e middotem grande

em exerdcio

dependentes dapropria imagem corpotal bull 1

-r que cnarm ltIe a qual sc esfof~m ao miximo por manter e

~oar -- compulsivos dotados grande perseveran~a t toleshy

rfll1cia ao sofriPlento traduzido em sintomas como a dor a exausshy

tao e a lesao entre outros n1enos comuns

Eu viciei-me nlquilo Viciei-me mesmo em ginasio Se nao fosse

para era como uma docnlta Tinha que if Era mesmo

6bcecado com aquilo C)Queria hear grande E fiquei V) 0

nvo era corpo como deg dessamiddotmalta que a gente ve af

( ) Depois toma-se urn vieio qucrer atingit (ilo

28 ANOS 100 amp10 DESEMPREGADO lRATICANTE DE MUSCULAltAo

HUSCUlaltao nunca pode vir a ser um problema Pode vir a scr

urn quando hi eXCt5SOS ( ) Mas os excessos nao controshy

[ados Porque eu neste momento estou a entrar numa de cxccssos

251

PESOS HALTERES E SENTIDOS DOS CORPOS (H)ALTERADOS

mas controlados Os excesses tem que scr controlados Cbull ) A nIve

de problemas 0 unico problema que traz no fundo eisso quando os

excessos nao sao controlados De resto nao enada assim de

28 ANOS 110 ANO pOLfClA PRATICANTE DE MIJSCULAltAo

Apesar de serem mobilizadas no sentido da conformidade aos rnodeshy

los corporais referencia e reverencia as praticas muscula~ao e seus

sistemas f1sicos derivados podem a qualquer momento ver-se desvirtushy

no seu sentido original quando os projectos corporais que alimenshy

tam se rll1icalizam pdo excesso de di~ciplina na eonformdade aos

1l10delos de referencia institufdos Este de comportamentos hipershy

diciplinad)s pode traduzir-se por exemplo em comportamentos

sifcdos Gomodisturbio dismorfC( muscular mais vulgarmente conheshy

ruygttYl a vigorexia Tambem descrita como complexo de Adonis

ou anorexia reversiva39 trata-se uma sindrome caracrcrizada

bLW dos seus portadores geralmente homens e independentemente da

sua museulatura (embora sejam normal mente bern desenvolvidos)

deterem uma auto-imagem corporal diswrcida e persistente no

de se sentirem muito pequenos fraeos e frageis

simultanealllente pdo deseio de serem musculados e 0

medo de screm magros desenvolvem uma exceSSlva

exerdcio (ouertrtlining) por um tipo de hiperproteico

e pelo consumo regUlar de produtos sintcticos anab61icos e outros no

sentido de hipertroflar 0 seu sistema muscular A vigilancia dos resultashy

dos obtidos atravcs d3 flta mctrica da balan~ e do espeIho bem como

a reClef1iii~aoae e Slmeshy

tria de cada museulo e tambcm constante

riscos que potencialmente correm continuam a acreditar no seu poder

autocontrolo e em mante-Io em nome da sua saude Efcmeras ilus6cs

prometeicas que a seu tempo sc poderao transformar em f1tais

soes

255

CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

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PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

reverse

Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

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CLASSES ASSOCIATIVISMO E ESTADO

edos (200~) Cultura da e vol 3 nY 13-25

in A Festa EdlJCaao Fisica Acampanh anti-patriotic que n 5279 17 ana 6 de JUlho de 1926

Jorge Crespo (1977) Hist6ria Ludens 2 n 1 45-52 Rui Gomes (1991) Poder e saber 0 corpo (1936-19401 de Educoao n 2middot3 Building a motor habitus physical in the Portuguese Estado Novo Intrmiddotmrrtionn

ofSpGrt vol 45 0 1 pp 23-37 -1 Prlt3tj r a corresponde ao que em

em muio as tor mas mai~ retentes e

5

in Ant6nio forg)

(19901 volw co POllugal Contemporonco (1926- (958) vol IV Usboa Alfa 333-338

10 In Ines (1999) Dons eDisciplinas do Corpo Feminino 0 OiscursoS5obre 0 COPO nu Historin do Esturio Novo bsboa Qrqanizcoes Nao Govt~rnamcntais do Consultivo Comissao 19ualdade e

3940 CGvalho (2005) lxplorando transferenci8lt nal prrmeiras deeadris

S~(ulo An61iseSocfaf vol XL nO 499-518j

12 In Hui Gomes (1991 I op 130 musculado dr Taborda chamava

do ~e(u0 nao Coriu dos Reereio$ do Desportos tambem aDs pal(os alem de ter sido (incovezes campeao rnundial e vezes

europeu de luta livre foi ainda ballarino Udo ern Paris e como duplo em algumas ploduoes de

Garcia Alvarez Onde para a rua ern corpinho bern Record Ana XXiii n 21B915 de Junho 1972 p 9

15 Ver Valter Cutum e IdentidadeA costuro social do moda em lIumanas (tese doutor

idrntitariamp na ocie Ide da Silva (orgs) tineroriw

pp671-689 17 Olivia Newton~ John liderava lugares clmeiros tops de vend as com a

can lao Lets get Physicol Jane ronda tornava-se na de marea da aerobica urn novo sistema fisieo mente teve exito atravegt do livra video best-seliersJane fondas Workout Nestes a dernonstrava eio a ern Beverly Hills por forma ao pratieante poder reproduzi-o no recolhimento do mats convlesse

1B Pam se ter uma no~ao compsritiva 0 futebol tem 1D0Y madamentc 150 mil praticantes federados ern Portugal 19 anuais elaborados Deia International Health

Association em (onjunto com J DeJaiHe e furor neilmente cedidos pea Associaao de Empres3s de Gi nasi os eAcademias

256

PESOS HAlTERES E SENTIDOS DOS CORlOS (H)AlTERADOS

19921) 0 Crepuscuo do A Etica Indolor des p129

a frente sao provenientes de urn con~ rnUSCLH3cao 110 ambito do de investiga~ao

por Vi tor a deeorrer no

maSCUlniOaCie in Miriam Golddenberg

[uitu[ois reoctonadas com 0 estetica eo jcrrl-eMo Otlsfrvat6r[o Que 0 Estado ja navia atraves da de distiplina de

Crespo Pedro Alcltlntara do (2009) 0 Estadoda Saude em Portugal USDaa Impreno

d~ (~iend3s Socials Segundo dados pelo Eurobarometro em 73 da populao nao praticava

reguiarmente exercicioshyVitor Seraio corpo in Machado Pais

peronte 0 Corpo Geiras Celta

qualquer reiaao d~fecta de causa-delta medida qlle ficarnos estimular a pratica de exerricio fisico

rontrario previa refexivamente PBra 35sodados asua

i~aizado noambJto do Observat0rio Perma-Ver Vftor Fcrrrira

33 Onde de metade (49) admitiu muscula~ao acrescendo 18 que afirmaram ter praticado

o

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Adalescincio Latinoomericono volume 2 n 2 pp 97-101

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