cultura.sul 30 fev2011

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10 | FEV | 2011 • Nº 30 • Mensal • Este caderno faz parte integrante da edição nº1020 do POSTAL do ALGARVE e não pode ser vendido separadamente Mensalmente com o POSTAL em conjunto com o PÚBLICO 9.096 EXEMPLARES www.issuu.com/postaldoalgarve Emocionar, mais do que impressionar » p. 4 e 5 • Amar Guitarra: DR JOGO DA LÍNGUA PORTUGUESA Um ano a desafiar a população a escrever e falar correctamente a nossa Língua é motivo suficiente para destacar esta iniciativa das Bibliotecas Paula Nogueira que conta já com a parceria de 13 agrupamentos de escolas do Algarve, a Casa da Juventude de Olhão e o Postal do Algarve que semanalmente divulga os desafios e as soluções do jogo. O convite às escolas e instituições que queiram aderir a esta iniciativa continua em aberto, basta solicitar o regulamento e os materiais através do email biblioteca: [email protected] 1 ano

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• Amar Guitarra: Emocionar, mais do que impressionar » Espaço AGECAL: A Gestão do Património Arqueológico em Meio Urbano » Factor Desenvolvimento: Allgarve » Blogosferas: Infl exões » ALFA: Entre Buretas, Mufl as e Gobelés » Espaço Educação: O Projecto Português » LIVROS: Amar é uma arte » SERUCA EMÍDIO: Entender o passado para ter futuro » TEATROS: A Verdade do Teatro - XVI Aniversário do Ensemble de Flautas de Loulé - Teatro no Inverno » BAÚS: Instrumentos de Escrita » Jornais de Vila Real de Santo António » Museu do Trajo de São Brás de Alportel » Espaço Cultura: VIVE PCI Uma iniciativa para viver o Património Cultural Imaterial » António Pina Convida » Cineclubes de Faro, Olhão e Tavira

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Mensalmente com o POSTAL em conjunto com o PÚBLICO 9.096 EXEMPLARESwww.issuu.com/postaldoalgarve

Emocionar,mais do queimpressionar

» p. 4 e 5

• Amar Guitarra:

DR

JOGO DA LÍNGUA PORTUGUESAUm ano a desafi ar a população a escrever e falar correctamente a nossa Língua é motivo sufi ciente para destacar esta

iniciativa das Bibliotecas Paula Nogueira que conta já com a parceria de 13 agrupamentos de escolas do Algarve, a Casa da

Juventude de Olhão e o Postal do Algarve que semanalmente divulga os desaf ios e as soluções do jogo.

O co n v i te à s e s co l a s e instituições que queiram aderir a esta iniciativa continua em aberto, basta solicitar o

regulamento e os materiais através do email biblioteca:[email protected]

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Cultura.Sul10.02.2011 2

Rosa Azinheira pinta OlhãoEstá em exposição até dia 4 de

Março, no Corredor das Artes da Casa da Juventude, a exposição de pintura de Rosa Azinheira. Nascida em Olhão, em Março de 1955, apresenta-nos um trabalho que refl ecte vivências e aspectos singulares da sua terra natal.

Filha de pais emigrantes em Paris, desde cedo que revelou o seu gosto pelo desenho e pela vontade de criar.

Em 1976 regressou a Portugal, constituiu família, e trabalhou no comércio durante 30 anos, tendo sempre como hobby as artes plásticas.

Em 1990 iniciou a sua aprendizagem e aperfeiçoamento em artes, no Curso de Iniciação à Pintura, liderado pelo Mestre Martins Leal, tendo, a partir daí, dedicado o seu tempo livre à sua arte.

Participou já em 20 exposições colectivas e esta é a sua quinta exposição individual.

A não perder!

» 4 MAR | Corredor das Artes, Casa da Juventude de Olhão

arte Jady Batista

‘Um dia em Albufeira’por Reinaldo Jerónimo

Reinaldo Jerónimo vai ter a sua obra em exposição na Galeria Municipal de Albufeira, entre os dias 4 e 26 de Fevereiro.

Com esta mostra de 15 telas, o artista plástico retrata Albufeira antiga e moderna sob uma perspectiva e interpretação muito próprias.

O pintor brasileiro e professor de Artes Plásticas inclui no seu curriculum várias exposições individuais e colectivas, em Portugal e no estrangeiro.

“Um dia em Albufeira” poderá ser contemplada diariamente das 10h30 às 16h30, com excepção de domingos e feriados.

» 26 FEV |Galeria Municipal de Albufeira Pintor brasileiro retrata Albufeira antiga e moderna

Exposição sobre Olhão, terra natal de Rosa Azinheira

Simplex dictum

Ficha Técnica

GASPAS, CAPAS E MEIAS SOLAS

«Nós, em Portugal, somos uns grandes sapateiros!»

Dizia o Ribeirinho, com orgulho, no f i lme «O Pai Tirano».

Eram outros tempos! Tudo tinha um duplo sentido, para fugir à censura. E se era para fugir convinha ter bons sapatos.

O povo era inteligente e percebia as piadas. Desenvolveu essa percepção! A necessidade faz o engenho!

Não sei se na altura o tirano era mais pai ou padrasto, mas ao que oiço dizer parece que naquele tempo é que era bom.

O tempo distorce a memória e as saudades aumentam.

Há até quem já tenha proposto uma revisitação temporária. Mas também não me parece que se conseguisse fazer em 6 meses o que não se fez em 40 anos.

O s p ov o s m e r e c e m o s governantes que têm!

Bem, não sei se naquele tempo mereciam… mas pelo menos agora, se não têm os que merecem, têm os que escolhem.

Há uns chicos-espertos que se abstêm… julgando que assim se livram das culpas. Das responsabilidades. Quem não contribui está sempre à-vontade para resmungar, seja qual for o resultado.

O povo quer é ser mandado!

Mas quem é que disse que o povo quer poder decidir? Isso dá muito trabalho. Muita responsabilidade. O povo quer um pai. Tirano ou não!

E l e s m a n d a m , n ó s resmungamos. Eles são os maus e nós a vítimas. Há assim uma espécie de equilíbrio cósmico. Ninguém chateia ninguém e vamos todos andando na paz do senhor…

Escolher para quê? É tudo igual… Sejam governantes ou sapatos! E por isso nos dói tanto cada passo e nos custa pagar a prestações gaspas, capas e meias solas.

Direcção:GORDAAssociação Sócio-Cultural

Editor:João Evaristo

Paginação:Postal do Algarve

João EvaristoEditor Cultura.Sul

Colaboradores:Cineclube de Faro, Cineclube de Olhão, Cineclube de Tavira, AGECAL, Elena Morán, Cristian Valsecchi, ALFA, João Pelica, Miriam Aço, Elisete Santos, Marta Dias.

Responsáveis pelas secções:» panorâmica.S: Ricardo Claro» blogosfera.S: Jady Batista» livro.S: Adriana Nogueira» placo.S: João Evaristo» momento.S: Vítor Correia» baú.S: Joaquim Parra» políticas.S: Henrique Dias Freire» museu.S: Isabel Soares

Parceiros:Direcção Regional de Cultura do Algarve, Direcção Regional de Educação do Algarve, Postal do Algarve.

e-mail: [email protected]

on-line: www.issuu.com/postaldoalgarve

Tiragem:9.096 exemplares

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3Cultura.Sul10.02.2011

A grande novidade deste mês de Fevereiro é a ocupação em pleno da nova sede do Cineclube de Faro. Ambição antiga, e muito justa, esta de determos um espaço onde todos, associados ou não, podem ser acolhidos em condições de conforto e harmonia para qualquer uma das valências de que ele dispõe: biblioteca (sala de leitura e requisição domiciliária), fi lmoteca (2 postos tv e ecrã para sessões), computadores públicos (2, oferecidos pela ANA - Aeroportos do Algarve), internet sem fios, para que qualquer um possa ir para lá trabalhar ou passar o tempo… e Centro Jovem, claro. Jovem e de 3ª idade, que as utentes da Universidade do Algarve para a Terceira Idade, nossas vizinhas, já nos têm visitado!

Uma sede para qualquer idade, uma sede para qualquer amante do cinema. A aproveitar, este que queremos venha a constituir-se como novo equipamento cultural da cidade. Workshops, Cursos, Ateliers, organizados ou co-

organizados por nós mas também por outras entidades! Estamos felizes, ali para os lados das traseiras das Urgências do Hospital. Mapa e horário no nosso blog. Façam-na vossa!

O resto… o resto são os filmes: Zéfi ro, a terminar com chave de ouro o Ciclo “Olhares Forasteiros – O Algarve num certo cinema”, no Museu Municipal. E os restantes quatro títulos do Ciclo “Por detrás do amor”. À previsível enchente de Cópia Certifi cada, que valeu a Juliette Binoche o prémio em Cannes, poderá ser acompanhada pela obra que ganhou o Festival Queer de Lisboa, num Verão de Boyita que é, acima de tudo, um fi lme humano. E se Jacques Rivette talvez assine o seu testamento cinematográfi co com estas

Vistas de gente saltimbanca de alma imprisionável, Frears diverte-nos com uma Tamara Drew imprevisível como

furacão. Gente boa, gente gira. Gente de cinema. Como nós, como vós.

POR DETRÁS DO AMORIPJ | 21.30

7 FEV | O VERÃO DA BOYITA de Julia Solomonoff (93’) ( M/12)

14 FEV | CÓPIA CERTIFICADA de Abbas Kiarostami (106’) ( M/12)

21 FEV | 36 VISTAS DO MONTE SAINT-LOUP de Jacques Rivette (84’) ( M/12) 28 FEV | TAMARA DREWEde Stephen Frears (111’) (M/12)

OLHARES FORASTEIROSO Algarve num certo cinemaALLGARVE - Museu Municipal de Faro

8 FEV (Conclusão do Ciclo) | ZÉFIRO de José Álvaro Morais (52’)(fi lme igualmente em exibição entre 9 e 27 Fevereiro em sistema de sessões contínuas entre as 10 e as 16 horas mesmo local, entrada livre)

Nova sede. Ambição antiga e muito justa

Para o corrente mês o Cineclube de Olhão (CCO) propõe dois filmes interessantes como é seu apanágio. O Gigante r epre senta o l ado contemporâneo do cinema latino-americano, mais concretamente da Argentina, país do qual não temos muitos fi lmes disponíveis, mas que o CCO tem procurado trazer com a frequência que o mercado permita. Este Gigante chega bem cotado, tendo sido premiado em diversos festivais internacionais, sendo de destacar o

de Berlim.Por outro lado, O Concerto é o fi lme do qual espero bastante. Isto porque é da autoria do cineasta Radu Mihaileanu, de origem romena mas radicado em França, devido ao regime do ditador Ceausescu. Este foi o realizador, na minha opinião, do qual exibimos o melhor fi lme dos últimos anos do Cineclube. Tratou-se do Vai e Vive, que conseguiu reunir aqueles que considero os principais ingredientes do cinema: interpretação,

riqueza de situações e personagens, enredo imprevisível mas realista, e uma grande humanidade e simplicidade.Estes pareceram-me ser as grandes qualidades de Mihaileanu que, espero poder ver retratadas de novo, no grande écran do CCO.

Vico Ughetto (pres. dir. CCO)

Da Cinemateca para o país

cinema

Desde o início das nossas actividades, tanto como os outros vinte-e-tal cineclubes portugueses actualmente em ac t iv idade , ansiosamente esperamos para ter acesso a alguns dos vários milhares de filmes (em suporte 35mm) que fazem parte da colecção da Cinemateca Portuguesa. Refiro-me à filmes cruciais, obras marcantes que continuam a inspirar e infl uenciar cineastas em todo o mundo. Contrariamente ao que acontece na maioria dos países europeus (e não só), em Portugal esta colecção de fi lmes é exibida exclusivamente na sala da própria Cinemateca em Lisboa (com umas excepções pontuais e raras).

O resto do país até hoje não tem tido acesso à estas jóias do cinema nacional e mundial. Em 22 de Janeiro fomos convidados para uma reunião, na própria Cinemateca, sobre uma possível abertura desta instituição estatal ao resto do país. Representantes de 14 cineclubes fi zeram o esforço de viajar longas horas para ouvirem ao vivo os pormenores desta notícia tão esperada, mas rapidamente percebemos que iremos ter que esperar mais um tempo indeterminável, incluir clássicos do cinema na nossa programação certamente não será possível no futuro próximo...À espera de tempos melhores,

continuamos a compor o nosso programa mensal com o melhor que o mercado nacional de distribuição tem a oferecer. Títulos como Inside Job (A Verdade da Crise), ou ainda Mistérios de Lisboa (atenção: por causa da sua duração será exibido em duas partes em dias seguidos, no entanto, a entrada é só uma) e o magnífi co L’Illusioniste (O Mágico), baseado num argumento nunca realizado de Jacques Tati, fi lmes que certamente merecem um lugar de destaque no panorama da história do cinema. Não percam a experiência de disfrutar destas pérolas no ambiente mágico da nossa sala escura e no grande ecrã!

SALA 2 no RIA SHOPPING | 21.30 (Sócios: 1 Euro | Não sócios 3 Euros)

8 FEV | GIGANTEde Adrián Biniez (85’)(M/12)22 FEV | O Concerto de: Radu Mihaileanu (119’) (M/12)

Apoios: C.M. Olhão e J.F. Olhão

PROGRAMAÇÃOwww.cineclubeolhao.com

Radu Mihaileanu de volta a Olhão

Sessões RegularesCine-Teatro António Pinheiro | 21.30

3 FEV | HISTÓRIAS DA IDADE DE OURO de Hanno Höfer e Razvan Marculescu (155‘) (M/12)6 FEV | A VERDADE DA CRISE de Charles Ferguson (120‘) (M/12)10 FEV | O CASO FAREWELL de Christian Carion (113‘) (M/12)13 FEV | JOGO LIMPO de Doug Liman (108‘) (M/12)17 FEV | 1ª PARTE DE: MISTÉRIOS DE LISBOA de Raúl Ruiz (136‘) (M/12)

18 FEV | 2ª PARTE DE: MISTÉRIOS DE LISBOA de Raúl Ruiz (136’) (M/12)20 FEV | MACHETE de Rober t Rodriguez (105‘) (M/16)24 FEV | CELA 211 de Daniel Monzón (113‘) (M/16)27 FEV | O MÁGICO de Sylvain Chomet (90‘) (M/6)

PROGRAMAÇÃOwww.cineclube-tavira.com

PROGRAMAÇÃOwww.cineclubefaro.com

Cineclube de Faro

Cineclube de Olhão

O João vai apanhar o avião no aerioporto.

O João vai apanhar o avião no aeroporto.

O João vai apanhar o avião no aero porto.

O João vai apanhar o avião no aerio porto.

>> SOLUÇÃO da semana passada>> ASSINALE A FRASE CORRECTAO texto do João está elegível.O texto do João está ilegível.O texto do João está eligível.O texto do João está elejível.

A forma correta é ilegível.Ilegível é um adjetivo que significa “que não se pode ler”.Elegível também é um adjetivo mas significa “que pode ser eleito”.As restantes formas estão incorrectas, apesar de serem utilizadas indevidamente em situação de oralidade e escrita.

Esta é uma iniciativa das Bibliotecas Paula Nogueira do Agrupamento de Escolas Professor Paula Nogueira (Olhão) em parceria com a Casa da Juventude de Olhão e o POSTAL, que semanalmente divulga os problemas e as soluções deste jogo.Várias escolas do Algarve já aderiram à iniciativa: AE Professor Paula Nogueira (Olhão) / AE da Sé (Faro) / AE D. Afonso III (Faro) / AE Dr. Alberto Iria (Olhão) / Colégio Bernardete (Olhão) / AE Dr. João Lúcio (Fuseta) / AE de Estoi (Faro) / AE Joaquim Magalhães (Faro) / AE do Montenegro (Faro) / AE de Castro Marim ( Vila Real de St. António) / AE Professora Diamantina Negrão / (Albufeira) / Agrupamento de Escolas José Belchior Viegas (Mega Agrupamento de São Brás de Alportel) / Escola Secundária João de Deus (Faro).Convidamos todas as escolas e bibliotecas, interessadas em aderir ao Jogo da Língua Portuguesa e receber os materiais para o mesmo, a contactar: [email protected] ou [email protected].

>> SOLUÇÃO >> SOLUÇÃO

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Cineclube de Tavira

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“Procuro quem me emocione e não quem me impressione” é a frase chave de uma conversa com um guitarrista para quem o aprender não ocupa lugar, nem tem um momento adequado. O Cultura.Sul foi conhecer o dono de um dedilhar impressionante, mas que aposta em emocionar mais do que impressionar, João Cuña, responsável pelo soar da portuguesíssima guitarra nos Amar Guitarra.

Os Amar Guitarra são o produto da evolução natural de uma ideia inicial que surgiu sob o nome de Las Guitarras Locas, é o próprio que o reconhece, “o projecto inicial desenvolveu-se, ganhou uma força própria e evoluiu um pouco autonomamente face à vontade dos intervenientes”.

Os Las Guitarras Locas, nascidos em 1995 como um trio onde marcavam presença João Cuña, Pierre e Zapata, assumiram as mais diferentes formações, constituídos ora em duo, ora em trio ou quarteto, conforme as circunstâncias e pelo grupo passaram nomes como o guitarrista clássico Ricardo Aleixo, os baixistas Marco Martins, Xik Mesquita e Luís Henriques, os percussionistas Tiago Rêgo e Chris McCartney ou Raimund Engelhardt, que deu alma às tablas e ao cajon.

Mas ainda antes dos Las Guitarras Locas, cujo conceito foi criado por João Cuña, o músico descreveu um percurso musical que nasceu ainda em Lisboa, de onde é natural, com os primeiros passos numa “banda de garagem” e que se desenvolveu com a vinda para o Algarve aos 17 anos.

“Vim para longe de toda a minha vida e agarrei-me à guitarra”, diz o guitarrista, que à época tinha como instrumento de eleição a guitarra acústica de cordas de aço. “Evolui imenso no Algarve, onde frequentei o Conservatório Regional e tive oportunidade de ter aulas e tocar com imensos músicos nacionais e estrangeiros que imprimiram à minha formação uma grande amplitude”, confessa quando questionado sobre se não teria sido mais fácil crescer na profi ssão em Lisboa.

Depois de ter integrado o percurso dos bares no Algarve, em grande medida pela mão de Luís Fialho, um dos nomes incontornáveis dos Entre Aspas e dos Opinião Pública, e de ter percorrido as capelinhas da região com bandas de covers, João Cuña queria mais.

“Queria pôr as guitarras em diálogo. No palco que é o meu espaço natural”, diz, recordando que o bichinho da conversa entre os instrumentos lhe

ficou de um espectáculo em que participou com Luís Fialho no Lethes, o Prata da Casa.

A evolução dos Las Guitarras Locas, cujo nome nasceu de uma frase ouvida por João Cuña da boca de Brian May no encontro de guitarristas memorável que foi o “Legends of Guitars” em Sevilha e que tiveram o seu primeiro CD, com o mesmo nome, lançado em 2002, fez nascer os Amar Guitarra.

“Depois de termos conquistado visibilidade nacional com o Las Guitarras Locas e de termos percorrido o país, a internacionalização passava por ter uma identidade mais defi nida no campo da world music onde nos integrávamos em termos

internacionais”, diz João Cuña, que entretanto se havia rendido aos encantos da sonoridade da guitarra portuguesa.

A sonoridade ganhara mais identidade nacional com a entrada da guitarra portuguesa e era essa mesma identidade que se buscava quando os Las Guitarras Locas deram origem aos Amar Guitarra que hoje conhecemos, numa assunção defi nitiva da portugalidade do som, quer nas composições originais, quer nos novos arranjos concebidos para temas tão incontornáveis da música internacional como o Libertango de Piazzolla.

Hoje, e depois de lançado o CD homónimo dos Amar Guitarra, o grupo apresenta uma formação,

uma vez mais eclética, do trio ao quinteto, e prepara já o lançamento do próximo disco com uma novidade que já consta dos espectáculos que hoje a banda faz ao vivo, a voz e o violino de Betty M.

Com concertos agendados para o Cantaloupe, em Olhão, a 11 e 12 de Fevereiro, Café Inglês em Silves, a 5 de Março, e Associação Catavento, em Castro Marim a 12 de Março, a força da sonoridade dos Amar Guitarra está na rua à espera de quem queira fazer um périplo pela latinidade, numa revisitação dos acordes do fl amenco, do jazz e dos blues, sempre com o pano de fundo verde e vermelho da portugalidade criado pelas cordas da guitarra portuguesa.

AMAR GUITARRA

Guitarras em diálogo•

panorâmica panorâmica

Cultura.Sul10.02.2011

«O JLP tem tido muito sucesso em todas as escolas/agrupamentos que participam nesta nossa iniciativa. É com agrado que vemos que os nossos colegas parceiros estão satisfeitos com a procura que existe, por parte da comunidade educativa. Alunos, professores, funcionários discutem sobre qual será a solução do problema e, por vezes, até precisam de confi rmar se aquela resposta é a certa devido à complexidade da nossa língua.»

Teresa Pedro e Fernando Aquino, professores bibliotecários do Agrupamento de Escolas Professor Paula Nogueira, Olhão

DR

João Cuña

Lisboeta nascido em 1970, chega ao Algarve com 17 anos. João Cuña deu os primeiros passos na música em Lisboa, lado a lado, com amigos que como ele fizeram da parceria uma escola e do conjunto a motivação para crescer musicalmente.Guitarrista acústico de base viria mais tarde a tornar-se um executante e um amante da guitarra portuguesa, mas não sem antes percorrer um caminho longo por entre as pautas e o dedilhar.Estudou no Conservatório Regional do Algarve, uma formação que considera “fundamental”, mas que não era compaginável com o seu fervor de executante. Esperava mais e esse aporte foi busca-lo à prática, ao cruzamento com outros músicos, às aulas, workshops e formação incessante que escolheu como estrada a percorrer.Depois de dar voz às cordas pelo circuito de bares do Algarve, o músico, sem repudiar os covers e as versões de músicas mundialmente conhecidas e que o acompanharam ao longo de anos, avança para a criação de originais sob a capa de um formação de que muitos ainda se lembram, os Com Fluências, simbiose perfeita entre encontro de infl uências e a fl uência que deseja ver impressa na capacidade de comunicar através da música.Ideólogo dos Las Guitarras Locas e dos Amar Guitarra, evolução daquele primeiro grupo, Juão Cuña nunca deixou de lado todos os seus outros projectos em que a música é sempre pedra de toque.Pai do maior sítio da internet dedicado à guitarra portuguesa e do Festival de Guitarra Portuguesa que nasceu em 2010 em Faro, o guitarrista deixa marca na formação entre workshops e aulas, criando raízes musicais nas actuais e futuras gerações de músicos, sem descurar a inovação, onde a sua experiência na área de aplicação das novas tecnologias à guitarra representam uma mais-valia.Nomes como Pedro Caldeira Cabral, Luís Fialho, Miguel Drago e Zé Eduardo, entre outros, marcaram a identidade artística deste homem das cordas que se lança hoje em novos projectos que incluem os Amar Guitarra - como não?! ‒ mas muito mais do que isso incluem um sem número de novas aventuras que cumprem a função maior do artista.

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João Cuña ideólogo do conceito Amar Guitarra, evolução natural dos Las Guitarras Locas

DR

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5Cultura.Sul10.02.2011

Dizem que a guitarra portuguesa é a única que chora. Se o “chorar” poderá ser uma hipérbole do sentir nacional - chorar podem chorar todas as guitarras quando o executante seja de excelência e o seu sentir o do choro - o carácter único do instrumento símbolo nacional é inequívoco.

Herdeira da cítara europeia, que deu origem a guitarras como a alemã ou inglesa - muitas vezes assumida como a mãe da guitarra portuguesa, um erro segundo Caldeira Cabral, um dos maiores experts mundiais da temática – tornar-se-á a rainha das

guitarras em terras lusas com o

avançar dos séculos que levaram a cítara a ser relegada para segundo plano enquanto instrumento de excelência.

O instrumento nacional, primaz dos cordofones em Portugal, é dentro da sua classe um caso distinto. As dimensões da caixa de ressonância, a que se juntam as 12 cordas metálicas dispostas em seis pares e um cavalete móvel em osso, marcam as primeiras premissas da singularidade da guitarra portuguesa.

Se ao hardware deste instrumento

peculiar juntarmos uma afi nação única (si; lá; mi; Si; Lá; Ré; ou lá; sol; ré; Lá; Sol; Dó) e o sistema mecânico de afi nação, com o cravelhal metálico em forma de leque, com sistema de tarrachas deslizantes e parafuso sem fim, temos um caso raro de excepcionalidade.

E o som não desmente. Conhece-se o som da portuguesa guitarra entre um mar de instrumentos de cordas e o trinado, esse é absolutamente único, daí dizer-se que nenhuma outra chora assim.

A mão direita do guitarrista equipada de unhas específ icas, antigamente feitas de tartaruga e hoje muito mais ecológicas criadas a partir de acrílicos e outros polímeros, tem um dedilho especial que recorre exclusivamente ao indicador e ao polegar e também aqui, ao nível da execução, estamos perante um instrumento peculiar, que fez subir à categoria de artistas supremos os guitarristas que a dominam.

São estes homens que pelo seu pequeno número e enorme dedicação, a guitarra fez maiorais, criando uma devoção face à sua arte e um respeito dificilmente atingível por outros guitarristas em Portugal.

A guitarra portuguesa é por excelência um instrumento solista, preenche a voz e é contraponto, mas no fado, praça maior da sua apresentação pública, não passa sem a guitarra clássica que lhe dá o tempo e lhe cumpre a menoridade no que toca a graves.

Carlos Paredes, Pedro Caldeira Cabral e António Chaínho são nomes que fazem parte integrante da história da guitarra portuguesa. Estes como todos os muitos que deram ao instrumento toda a sua alma e muito em particular o fado de Lisboa e de Coimbra, garantiram a sobrevivência da guitarra nacional e deram-lhe novas sonoridades.

Um percurso que ainda hoje - e talvez mais do que nunca - se trilha

para garantir que a guitarra ganha mais executantes, se torna mais versátil no repertório e mantém acesa a sua chama de estandarte da sonoridade portuguesa.

Ainda pouco estudada do ponto de vista da sistematização dos métodos de aprendizagem e ensino e com muito por compilar sobre todas as vertentes do conhecimento de um instrumento tão peculiar, a guitarra portuguesa pode entretanto vir a benefi ciar em parte dos avanços realizados recentemente no campo da investigação do fado, que sem guitarristas se queda manco, a propósito da candidatura da canção nacional a património imaterial da humanidade.

Uma distinção que se espera que Portugal e o fado venham a receber da UNESCO e que possa ser um desafi o a que a guitarra portuguesa e o conhecimento dos seus segredos e características venha a ser um dos desafi os do futuro para a nossa guitarra.

Segredos da guitarra que chora

Ricardo Claro

«O Jogo da Língua Portuguesa tornou-se uma actividade de referência nas escolas do 1º Ciclo do Agrupamento da Sé. Foram criadas nas turmas dinâmicas de registo, tendo-se verifi cado uma subida no número de respostas certas nas últimas semanas. O jogo entrou na vida escolar e, em alguns casos, familiar, dos alunos, o que é muito benéfi co dada a variedade de conteúdos que integra.»

Elisete Duarte Santos, professora bibliotecária do Agrupamento Vertical de Escolas da Sé, Faro

O trabalho de João Cuña no âmbito da música e muito particularmente no âmbito da guitarra portuguesa e da sua divulgação e conservação enquanto parte do espólio cultural e artístico nacional vai muito para além da execução enquanto guitarrista.

O músico é também ele um criador de eventos e ferramentas associados ao panorama artístico e nessa medida são da sua autoria a criação do maior site nacional e internacional dedicado à guitarra portuguesa e o desenvolvimento, em 2010, do primeiro festival da região exclusivamente dedicado à guitarra nacional.

Quanto ao sítio da internet, www.guitarraportuguesa.com, ocupa o primeiro lugar nos motores de busca e a razão é simples: a informação contida na página e o nível dos conteúdos associados à presença da fatia de leão dos executantes, estudiosos e amantes da guitarra portuguesa e aos milhares de visitantes, fazem do sítio um local

obrigatório de paragem para quem quer saber mais sobre o instrumento.

“Trata-se de um veículo de divulgação exponencial de informação sobre a guitarra portuguesa”, afi rma João Cuña, que se valeu dos seus conhecimentos na área das novas tecnologias para dar corpo ao projecto nascido em 2007 – decerto propositadamente no dia 10 de Junho (Dia de Portugal) - e que conta já com cerca de meio milhão de visitantes.

A história, a técnica e o ensino, bem como os executantes, os fabricantes e os eventos associados à guitarra portuguesa têm assim lugar cativo no espaço cibernauta e uma visibilidade que poucos meios poderiam garantir ao instrumento símbolo nacional.

“A guitarra portuguesa é ainda muito desconhecida no mundo e mesmo em Portugal”, diz o músico, que leva ainda a bom porto o projecto que dá corpo a uma ideia, divulgar a guitarra portuguesa e a sua tradição e futuro.

A página reserva ainda espaço para um fórum sobre a temática e criou uma comunidade cujo contacto tem por mote a guitarra portuguesa, razões sobejantes para que ao passar os olhos pelo livro de visitas do sítio nos deparemos com um sem fi m de elogios ao trabalho realizado.

Quanto ao festival Guitarra Portuguesa, nascido em 2010, tratou-se de um evento que reuniu em Faro grandes nomes de guitarristas nacionais e que trouxe ao Algarve os grandes construtores de guitarras portuguesas, nacionais e estrangeiros, bem como, os mais reconhecidos teóricos.

Quatro dias que foram muito mais do que um desenrolar de concertos - reconhecendo-se o brilho de momentos inesquecíveis no Lethes – e que constituíram um momento em que a formação, com base em workshops e palestras, a troca de experiências e a visão do mundo da guitarra portuguesa, nomeadamente através da exposição que se manteve

aberta durante a duração do festival, foram os trunfos de uma organização cuidada e pensada para o público, que mereceu o apoio da Direcção Geral as Artes.

Resta saber se esta oportunidade criada por João Cuña terá pernas para se repetir este ano. O músico aposta numa segunda edição, mas afasta a possibilidade de assumir a produção integral do evento. “Eu sou músico e não produtor, pelo que procuro quem possa assumir a produção do festival de forma profi ssional e assegurar a sua qualidade e viabilidade, numa cidade onde os eventos culturais de dimensão e originalidade são escassos”, diz.

Uma oportunidade de Faro ter algo muito diverso do espectáculo puro e duro, capaz de deixar sementes e de constituir um momento original a nível nacional, mas que se pode perder para outros municípios do Algarve ou do país que têm desenvolvido contactos no sentido de acolherem o certame.

Sítio na internet e festival promovem guitarra portuguesa

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Dizem que a guitarra portuguesa é a única que chora. Se o “chorar” poderá ser uma hipérbole do sentir nacional - chorar podem chorar todas as guitarras quando o executante seja de excelência e o seu sentir o do choro

guitarras em

levaram a cítara a ser relegada para

peculiar juntarmos uma afi nação única (si; lá; mi; Si; Lá; Ré; ou lá; sol; ré; Lá; Sol; Dó) e o sistema mecânico de afi nação, com o cravelhal metálico em forma de leque, com sistema de tarrachas deslizantes e parafuso sem fim, temos um caso raro de excepcionalidade.

São estes homens que pelo seu

Segredos da guitarra que chora

Pedro Caldeira Cabral

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Cultura.Sul10.02.2011 6

A Gestão do PatrimónioArqueológico em Meio Urbano

Elena MoránArqueóloga. Sócia da AGECAL ‒ Associação de Gestores Culturais do Algarve.

Durante décadas, a ocupação dos centros históricos esteve conotada com o insucesso económico dos seus moradores, derivando num abandono progressivo dos mesmos. Posteriormente, a procura destas áreas por cidadãos alóctones tornou-as, sobretudo a partir dos fi nais da década de 1980, alvo da cobiça do mercado imobiliário, o que, associado à falta de incentivos para uma política de reabilitação e ao favorecimento de uma política de renovação urbana, supôs o início da sua banalização: o edifi cado antigo foi paulatinamente demolido e substituído, muitas vezes, por novas construções carentes de qualidade arquitectónica. Perdeu-

se a leitura coerente das ruas na malha urbana onde se inseriam. Foi adulterando-se, progressivamente, a imagem tradicional dos cascos históricos. Estes centros urbanos, historicamente diferenciados, que constituem, em si mesmos, lugares de memória inalienáveis, foram «harmoniosamente homogeneizados» como consequência das políticas culturais neoliberais mais preocupadas em conceber novos centros urbanos, antessalas de novos mercados imobiliários.

A conf iguração dos centros históricos é o resultado de uma ocupação contínua do espaço, onde a cidade actual sobrepõe horizontes de ocupação anterior (pré e proto-históricos, romanos, medievais e/ou modernos). Contém um «arquivo de terra» cuja informação é relevante para o conhecimento do passado e a caracterização da especificidade cultural destes locais de memória colectiva. Os centros históricos constituem-se, assim, como sítios

arqueológicos muito sensíveis à voracidade das políticas urbanísticas, pelo que devem ser-lhes aplicados, escrupulosamente, os normativos legais previstos na Lei 107/2001, de 8 de Setembro, relativos quer ao património arqueológico (art.os 74.º a 79.º), quer aos bens culturais imóveis classificados (sempre que abarcados em áreas de protecção patrimonial); mais especifi camente, devem cumprir-se os normativos contidos no Decreto-Lei nº 270/99, de 15 de Julho, com as alterações introduzidas pelo DL 287/2000, de 10 de Novembro, para a prevenção, salvamento, investigação e gestão do património arqueológico. E devem, ainda, todas as intervenções reger-se pelo princípio do serviço público, fazendo prevalecer os interesses da salvaguarda do património de todos os cidadãos sobre os interesses de incremento do património dos particulares. Em conformidade com o actual modelo gestionário, apl icando-se o pr inc ípio do

«utilizador pagador».Será papel fundamental das

entidades de tutela do património arqueológico, intervenientes na construção do território, inserir o património arqueológico na ordem cultural, social e económica contemporânea, contribuindo cada vez mais para a caracterização e identidade das cidades. Uma acção realista, que deve procurar a preservação e a valorização das preexistências ainda conservadas no subsolo ou mascaradas no edifi cado e conciliar o planeamento urbanístico com a salvaguarda dos bens culturais e a sua investigação arqueológica, através da implementação de uma arqueologia preventiva que não pode resumir-se à mera fi scalização. Para isso, deverá incentivar-se a elaboração de cartas de risco, com gradientes de sensibilidade arqueológica, e os correspondentes normativos de medidas de sa lvaguarda / valorização que condicionem a execução dos projectos de construção:

«acompanhamento arqueológico (de desaterros e/ou demolições)», «exame parietal (para salvaguarda de possíveis preexistências no cerne das construções)», «escavação de diagnóstico», «escavação em área», e «ausência de medidas preventivas de impacte sobre património arqueológico enterrado». Será obrigação dos municípios incorporar a especialidade de arqueologia no conjunto de especif icidades técnicas que const ituem um processo de construção, somando as condicionantes arqueológicas, enunciadas nos pareceres técnicos elaborados pelos técnicos de arqueologia municipais, ao conjunto de imposições legais constantes das licenças de construção, cujo cabal cumprimento condiciona a emissão das licenças de utilização.

Cristian ValsecchiEconomista da cultura e GestorFactor Desenvolvimento [email protected]

A cultura alimenta uma parte considerável do turismo mundial, representando o turismo cultural uma verdadeira fonte de diversifi cação de receitas de alguns Estados e regiões europeias. O programa Allgarve parece subscrever esta tendência propondo-a como um complemento determinante da oferta turística local. À imagem do que acontece com os demais projectos ambiciosos, também o programa de eventos Allgarve arrastou consigo um rasto de polémicas, gerando formações opostas, algumas favoráveis outras discordantes. Quem escreve parte de um princípio

muito simples ditado pela experiência: o óptimo é inimigo do bom. Como tal, melhor do que a inércia perante difi culdades que se fazem acompanhar pela globalização dos mercados turísticos que estão a testar a competitividade do turismo algarvio, é melhor reagir com propostas.Aliás, apesar da marca ref lectir um débil espírito identitário local e uma certa sujeição da região Algarve em relação ao estrangeiro, deve reconhecer-se que, graças à particular sensibilidade e capacidade de alguns operadores, o programa Allgarve soube também apresentar iniciativas de interesse do ponto de vista cultural que não podem deixar de reverter a favor da imagem da Região. Embora do ponto de v i s t a quantitativo os resultados atingidos até então - ainda que apresentem sinais de incremento - sejam ainda decididamente modestos, o que nos leva a presumir que o trabalho levado a cabo até à data teve um papel marginal na consolidação de uma parte da procura turística, e

certamente não se apresentou como um motor de atracção de f luxos turísticos, seria um erro pensar em abandoná-lo. Seria porém oportuno analisar com sentido crítico algumas lacunas que parecem caracterizar o programa do ponto de vista conceptual e estrutural, a partir da governance do projecto, dos mercados-alvo, e da falta de uma programação estratégica a médio e longo prazo.No que respeita a governance, é particularmente singular que a política cultural seja a expressão, ainda que concertada a nível local, de entidades responsáveis pela promoção turística.É uma anomalia relativamente a sistemas de gestão de políticas culturais mais efi cazes, que constitui um elemento crítico do actual modelo de governance do projecto.Elemento cr ít ico este que se repercute na defi nição do target das actividades. Ao contrário do que seria expectável e desejável, as acções promovidas pelo

programa Allgarve - que deveriam dirigir-se ao cidadão local – nascem e desenvolvem-se declaradamente para satisfazer a procura turística. Esta ideia é corroborada pela decisão de redefinir a programação 2011 em função de um dos principais segmentos turísticos para a região: o mercado britânico.E logo me deparo com uma questão: o turista experiencial e cultural abdicaria da autenticidade dos lugares e cultura local em favor de uma cultura que se arrisca a ser forjada?A experiência ensina-nos efectivamente que as políticas culturais que cedem às lógicas turísticas não só constituem um entrave à expressão das potencialidades que a cultura garante ao desenvolvimento socioeconómico local como também não favorecem a diversifi cação dos potenciais turistas, dado que o turista cultural privilegia destinos onde a cultura seja expressão autêntica de um lugar. Eis a razão porque os principais destinos turísticos culturais são precisamente aqueles onde a cultura respondeu às exigências de

um território e respectivas sociedades, antes ainda de responder às exigências turísticas.O programa Allgarve deveria enfi m abandonar uma lógica de intervenção constituída por eventos programados anualmente, dotando-se sim de uma verdadeira política cultural que resulte de uma programação estratégica e de gestão de médio e longo prazo que saiba delinear um cenário preciso do que será o Algarve nos próximos anos. Estar-se-ia assim a servir a efi cácia do programa, a optimização da gestão, bem como a consequente geração de receitas. Sem querer banalizar, a título de exemplo, se alguns dos mais de 170 milhões de turistas que em 2009 procuraram a Europa do sul/mediterrânica, desejasse hoje programar um fim-de-semana no Algarve nos próximos meses, não encontraria qualquer informação disponível relativa à programação Allgarve 2011, o que se traduz em turistas perdidos, ou melhor dito, no desgaste da competitividade do destino Algarve.

Allgarve

«O Jogo da Língua Portuguesa tem sido dinamizado pela BE, uma vez por mês. A questão é afi xada num placard e divulgada na página do agrupamento e blogue Farol Digital. Os alunos têm mostrado entusiasmo com a actividade.»

Norberta Sousa, professora bibliotecária do Agrupamento Vertical de Escolas Dr. João Lúcio, Olhão

Espaço AGECALEspaço AGECAL

Factor Desenvolvimento

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7Cultura.Sul10.02.2011

blogosfera

Infl exões Para onde caminhamos neste

destino incerto? Será que atingimos o limiar das nossas capacidades e começamos aos poucos a perder o controlo sobre a nossa ambição? Onde deixamos a relação com a natureza, aquela humanidade que nos caracterizou? Estarão os nossos f ilhos preparados para receber a pesada herança que um consumismo exacerbado lhes vai deixar? Serão eternos dependentes?

Há muitas questões que se nos colocam no actual caminho da sociedade. Vejo hoje perdidos muitos dos laços que nos uniam a um passado, a uma tradição de respeito e veneração pelo sábio conhecimentos dos nossos ancestrais. Hoje tudo é volátil, a família, as relações de amizade, os empregos, tudo pode não ser amanhã aquilo que vemos hoje. Para onde corre este rio de águas alvoraçadas, que ao passar desgasta as margens e

arrasta consigo tudo o que encontra pela frente. Não haverá limites nesta corrente que nos últimos 20 anos tem vindo a varrer o planeta, numa escalada da ambição em que tudo vale para atingir um objectivo.

A mentira e a perf ídia são actualmente valores comuns em qualquer humano que se preze, ninguém mais se preocupa se está a prejudicar o outro desde que isso o beneficie a si mesmo. Teremos atingido o estado de evolução tal que só nos resta regredir através de uma autodestruição dos valores, da moral e dos bons costumes, acabando por regressarmos ao início dos tempos, em que vivíamos num estado selvagem de consciência? Não sei para onde vamos, mas sei que vamos na direcção errada.

http://druidadanoite.blogspot.com/

Celebra-se em 2011 o Ano Internacional da Química, sob o tema “Química – a nossa vida, o nosso futuro” e com o objectivo de destacar as contribuições da química para o bem-estar da humanidade, sendo a próxima actividade da Associação Livre Fotógrafos do Algarve (ALFA), programada para o dia 19 de Fevereiro, um passeio fotográfi co que, pelas 14:30 horas, leva ao Laboratório Regional de Saúde Pública do Algarve Dra. Laura Ayres (ARS Algarve IP), no Parque das Cidades Faro/Loulé.

Esta iniciativa da ALFA dará a possibilidade aos participantes de fi carem a conhecer o palco das placas

de Petri, das provetas, das pipetas e dos microscópios, nas instalações modernas deste laboratório para o século XXI, inaugurado no dia 8 de Maio de 2009, e ainda imortalizar, através da lente fotográf ica, o trabalho desenvolvido nos seus vários serviços de qualidade (com Certifi cado de Qualidade de acordo com a NP EN ISO 9001:2008) que abrangem áreas como Análises Cl ín icas , Fís ico-Química e Microbiologia.

O A no Inte r nac iona l d a Química 2011 é organizado pela União Internacional de Química Pura e Aplicada (Iupac) e pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Bureta: para medir volume de l íqu idos ou soluções por escoamento.

Muf la: tipo de estufa para a ltas temperaturas usada em laboratórios.

Gobelé: Copo de vidro utilizado para aquecer e cristalizar substâncias, fazer decantações e misturar reagentes. A ALFA leva fotógrafos a visitar o mundo da química

«O Jogo de Língua Portuguesa tem tido uma forte adesão e o problema semanal é esperado com muita curiosidade. Progressivamente, vai provocando a refl exão entre alunos sobre a resposta correcta e a preocupação em acertar começa a passar pela pesquisa prévia.»

Isabel Martins, professora bibliotecária do Agrupamento de Escolas José Belchior Viegas, S. Brás de Alportel

Jady BatistaUm espaço que dá relevo a uma fonte de actividade literária que fervilha, muitas vezes, à margem dos circuitos convencionais.

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ALFA – ASSOCIAÇÃO LIVRE FOTÓGRAFOS DO ALGARVE

Entre Buretas, Mufl as e Gobelés•

Espaço ALFA

João Pelica,Vice-presidente da ALFA

JOÃO PELICA

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Cultura.Sul10.02. 2011 �

Míriam AçoCoordenadora Técnico-Pedagógicado Projecto PPT na DREAlg

Para Todos (PPT), é, desde 2008/2009, ano em que teve início ,quer como Projecto Nacional, quer como Projecto Regional, um marco de qualidade na promoção do Diálogo Intercultural, facilitando a comunicação e a inclusão pela aprendizagem da língua do país de acolhimento.

Sustentado por uma política de integração dos imigrantes que valoriza a diversidade, nas suas mais diferentes manifestações, e que aceita a multiculturalidade como espaço privilegiado de enriquecimento de todos os que a vivenciam e partilham, este Projecto defende um paradigma de intervenção onde a aprendizagem da língua ocorre como um modo operativo de corrigir as assimetrias de comunicação que o desconhecimento da língua pode implicar, e que limitam a inclusão e a cidadania plena.

Procurando concretizar este grande objectivo, de promover a aprendizagem da Língua Portuguesa como competência linguística, social e pragmática, capaz de se constituir como um verdadeiro instrumento de integração, a Direcção Regional de Educação do Algarve entrou neste

desafio. E, com a colaboração das escolas seleccionadas, a coordenação do ACIDI, o apoio financeiro do POPH e a competência pedagógica e envolv imento pessoa l dos professores, tem vindo a garantir que largas centenas de imigrantes tenham acesso a esta formação, em ambientes pedagógicos que valorizam a heterogeneidade como valor acrescentado dessa mesma aprendizagem.

A experiência do PPT na região do Algarve tem sido, pois, para todos os intervenientes, uma experiência pioneira e inovadora, porque as salas de aula se têm constituído em espaços de experimentação onde se fomenta o diálogo intercultural, e onde se desenvolvem aprendizagens e se adquirem competências, mobilizando o património de saberes de cada aprendente; e onde, para além das redes de proximidade, que criam ambientes colaborativos e motivam a qualidade dos percursos formativos individuais, se oferece uma certificação formal de competência linguística de nível A2, que se constitui como prova de língua para o acesso à nacionalidade e ao estatuto de residente permanente.

Com um volume de horas de formação, realizadas nos dois últimos anos, na ordem das 100 mil, com centenas de imigrantes (486) já certificados, com uma abrangência de nacionalidades (50) que evidencia a diversidade dos contextos, com uma média de 25 escolas envolvidas em cada ano, correspondendo a uma média de 30 cursos por ano, o PPT é, na verdade, um Projecto de Futuro e um Projecto com Futuro, um Projecto que na Direcção Regional de Educação do Algarve se faz como caminho desejável para a Cidadania Activa, a Inclusão e o Diálogo Intercultural.

O PROJECTO PORTUGUÊS PARA TODOS: UmA PROPOSTA DE APREnDizAGEm E inClUSãO Em COnTExTO fORmATivO

O Projecto Português•

Espaço Educação

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Uma média de 25 escolas envolvidas em cada ano. Uma média de 30 cursos por ano

O projecto é sustentado por uma política de integração dos imigrantes que valoriza a diversidade

As salas de aula têm-se constituído em es-paços de experimentação onde se fomenta o diálogo intercultural

Formação, em ambientes pedagógicos que valorizam a heterogeneidade como valor acrescentado dessa mesma aprendizagem

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Apesar de se aproximar uma dessas datas comerciais que pretende vender o namoro de todas as maneiras (e materiais) possíveis, até onde a imaginação dos publicitários as levar, o tema do amor é sempre interessante. E livros sobre o assunto não faltam, mesmo com mais de 2000 anos.

Se amar é uma arte, precisava de um manual, deve ter pensado Ovídio, poeta latino, que viveu no séc. I a.C. e morreu no ano 17 ou 18 da nossa era.

A Arte de Amar (Ars Amatoria, no original) valeu-lhe – assim se pensa, pois nem o poeta alguma vez explicou bem o que se passou exactamente – um exílio de cerca de dez anos e que durou (não o sabia ele) até ao fi m da sua vida. E porquê? Porque o conteúdo deste livrinho não terá agradado aos intentos moralizadores do imperador Augusto (e Tibério, que lhe sucedeu), nunca mais lhe foi concedida a possibilidade de regressar à capital. Morreu numa província romana que corresponde à actual Roménia, na cidade que hoje se chama Constança.

Que podemos encontrar, na Arte de Amar? Diz-nos o poeta nos primeiros versos:

Se alguém das nossas gentes não conhece a arte de amar, / leia este canto; e, depois de o ter lido, entregue-se, com sabedoria, ao amor./ É a arte das velas e os remos que fazem mover as naus,/ é a arte que faz mover, ligeira, a quadriga. É a arte que deve reger o Amor.

Carlos A. André, o tradutor desta obra, afi rma, na introdução que faz a uma outra, do mesmo poeta, chamada Amores (ambas foram publicadas pela editora Livros Cotovia, em 2006): «os Amores, mas também, em certa medida, a Arte de Amar, constituem, no seu conjunto, verdadeiros manuais de engano e da traição».

Como um bom manual que se preze, tem dicas de vária ordem sobre as melhores técnicas de sedução (locais, modos, etc.) e dá conselhos importantes, como, por exemplo, a importância que os homens devem prestar à higiene (relembro que este livro tem 2000 anos), posto que considerava que ser feio, bruto e cheirar a cavalo não era uma boa opção: as unhas não devem dar nas vistas de compridas e devem estar limpas,/ e no nariz não deve haver qualquer pelo;/ não saia mau hálito de uma boca mal cheirosa,/ nem atinja o nariz dos outros o fedor do macho e do pai do rebanho.

Cinco anos tem um lustro

Neste livro não há pudor nem moralismo de espécie alguma, regendo-se as normas pelo prazer que se pode obter (não se dirigindo apenas a homens). E o prazer importa, em

Amar é uma artequalquer idade. Aliás, relativamente às mulheres, diz que são as mais velhas que o aproveitam melhor. Leiam o que Ovídio diz, nas belas palavras que o tradutor encontrou na nossa língua (vv. 681-696):

Elas sentem o prazer sem artifício;para dar gozo, devem senti-lo

igualmente a mulher e o homem.Odeio o acto de amor que não faz

soltar ambos os parceiros(eis porque me apraz menos o amor

com rapazes);odeio aquela que se entrega por ser

preciso entregar-see que, na sua secura, só pensa na sua

lã;prazer cedido por dever não é prazer

que me dê gozo;um dever, que nenhuma mulher o

pratique comigo.A mim, apraz-me ouvir gemidos que

façam sentir o gozo dela,e que me suplique que me demore, que

me aguente;quero ver os olhos rendidos da mulher,

já fora de si,e que ali fi que desfalecida e largo tempo

não queira que lhe toque.Tais bens não os concedeu a natureza

nos alvores da juventude;é logo depois de sete lustros que

costumam aparecer.Quem tem pressa beba vinho novo;

para mim, que faça escorrer um velhovinho a ânfora arrecadada desde o

tempo dos antigos cônsules.

Disfarçar os defeitos

Um dos livros (esta obra é composta por 3 livros, como se fossem 3 capítulos) é, precisamente, dedicado às mulheres, a quem dá diversos tipos de conselhos. Este aqui é sobre o vestuário mais adequado a cada tipo físico:

Rara é a beleza que está livre de defeito; disfarça os defeitos

e, tanto quanto puderes, esconde as mazelas do teu corpo.

Se és pequena, senta-te, para, de pé, não pareceres sentada,

e estende-te, por pequena que sejas, no teu leito;

mesmo aí, para não poderem tirar-te a medida, quando estendida,

esconde os pés, lançando-lhes por cima o manto;

a que é delgada demais, vista roupa de pano grosso

e faça cair dos ombros um manto largueirão;a que tem uma cor desmaiada traga no corpo riscados de púrpura;se és morena em demasia, parte em busca da ajuda de tecidos de Faros;o pé chato deve fi car sempre resguardado dentro de sapato branco e fi no,e pernas descarnadas não devem andar sem correias;

fi cam bem pequenos chumaços em ombros altos;à volta do peito raso deve sempre passar um corpete.Deve acompanhar de gestos curtos tudo quanto disser aquelaque possui dedos gordos e unhas sujas;a que tem mau hálito nunca fale em jejume guarde sempre distância do rosto do seu homem;se tens dentes negros ou grandes ou tortos,enorme é o teu prejuízo quando te rires.

Poemas de amor

Dos romanos chegaram-nos muitos poemas de temática amorosa. Porém, poucos poderiam ser usados num dia dos namorados, pois uma grande parte refl ecte amores adúlteros (primeiro felizes, depois infelizes). Suspira Catulo (poeta também do séc. I a.C.) pelos beijos da amada (mulher casada… com outro):

Dá-me mil beijos, em seguida um cento,

depois outros mil, depois outra vez cem,

mais outros mil ainda, ainda mais cem.

Depois... já completados muitos milhares,

misturemos tudo, para lhes perder a conta,

- ou nenhum malvado, possa sentir inveja,

ao saber que tantos foram os beijos entre nós.

Este Catulo, como muitos ainda hoje, tinha sentimentos ambivalentes, tendo-nos deixando um pequenino poema que expressa muito bem essa dualidade por que muitas vezes o amor nos faz passar:

Odeio e amo. Como tal possa ser, talvez perguntes.

Não sei. Sinto que acontece e aí reside a minha cruz.

Quem gostar destas temáticas tem vários livros com boas traduções do latim à disposição, como a colectânea Poemas de Amor - Antologia Poética Latina (I a.C.- III), publicada na Relógio d’Água, em 2009.

As traduções de Catulo aqui apresentadas são de uma antologia i n t i t u l a d a O d e io e Am o , d a responsabilidade de José Ribeiro Ferreira (também ele poeta), professor catedrático da Universidade de Coimbra A editora é a MinervaCoimbra (assim mesmo, tudo junto, com a maiúscula no meio) e a publicação é de 2005.

livro livro

Adriana NogueiraProfessora Universitáriade Estudos Clá[email protected]

Mito de Eros e Psique. Escultura de Antonio Canova, em exposição no Ermitage, em São Petersburgo, na Rússia

«O Jogo da Língua Portuguesa é muito importante para o desenvolvimento da literacia dos alunos. A participação dos alunos é facultativo e tem sido excepcional, procuram a biblioteca com o intuito de saber as soluções e as novas propostas. Estas actividades são sempre importantes para promover o conhecimento do funcionamento da Língua. A dinamização do jogo tem sido feita através da professora bibliotecária Rosália Boneco e das funcionárias da biblioteca.»

José Barros, director do Agrupamento de Escolas Dr. Alberto Iria, Olhão1ano1

ADRIANA NOGUEIRA

DA MINHA BIBLIOTECA

Um ensa io da pr imeira metade do séc. XX (a 1ª edição é de 1938 e a segunda foi revista em 1954), que muitas gerações leram e aprovaram: O Amor e o Ocidente, de Denis de Rougemont (a minha edição é da Moraes, mas actualmente só está disponível na Nova Vega).

Partindo do mito de Tristão e Isolda, começa a sua análise no séc. XII, onde o amor ainda é paixão e, daí decorrente, desejo de morte; depois, o paganismo a opor-se ao cristianismo, em que a via de salvação já não é Eros, mas Cristo. Sempre com o Romance de Tristão e Isolda em vista, desenvolve a temática da paixão e da mística, da recepção (e suas implicações) no ocidente, principalmente na literatura e na ópera (onde se distingue Wagner), de diversos mitos e morais que nos condicionaram, para concluir que devemos tomar o partido da sobriedade, tendo no horizonte a felicidade, «uma felicidade semelhante à antiga mas que já não pertence à forma do mundo porque é ela que transforma o mundo».

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política política Henrique Dias Freire

A falta de referências culturais é uma das causas da crise que actualmente se vive, afi rma Seruca Emídio, presidente da Câmara de Loulé. E apesar das difi culdades gerais, a autarquia nunca deixou de investir na preservação do património edificado. É o caso do recém-inaugurado Cine-Teatro, espaço emblemático da cidade, que surge com a velha traça mas totalmente adaptado aos novos públicos. Renovações em nome do turismo mas também da preservação da memória colectiva. Porque entender o passado é essencial para ter futuro.

Cultura.Sul – Qual tem sido a aposta de relevo no âmbito cultural?Ser uca Emídio – Nós temos apostado não só no património edifi cado, cultural, mas também num património mais substantivo, ao nível das referências pessoais. Isto, porque entendemos que as comunidades precisam cada vez de mais referências. A falta de referências tem sido um dos grandes contributos para a situação que hoje se vive. A falta de solidariedade e de humanidade, tem muito a ver com a perda de identidade. Uma terra que não valoriza o seu passado e a sua história, difi cilmente compreenderá o seu futuro e terá êxito.

CS – Daí a recuperação do Cine-Teatro?SE – O Cine-Teatro Louletano e outros edifícios emblemáticos são elementos que unem as pessoas em seu torno, muitas vezes resultantes de uma história conturbada. O caso do Cine-Teatro Louletano é um bom exemplo. Frutuoso da Silva comprometeu na sua construção a sua vida profi ssional e pessoal, indo à bancarrota. A própria construção do cinema esteve algum tempo parada. Durante quatro ou cinco anos não houve fi nanciamento. Frutuoso da Silva era um homem ligado às artes e às letras, à cultura da cidade de Loulé nos anos 20-30. E comprometeu toda a sua fortuna pessoal no cinema. Isto tem muito a ver com a situação que hoje se vive. Os entusiastas da cultura passam por grandes difi culdades para conseguir fazer alguma coisa.

CS – Esse percurso sensibilizou a auta rqu ia a ava nça r com a reabilitação daquele espaço?SE – Era mais do que justo que aquele espaço fosse reabilitado. Nos anos 70 pôs-se a possibilidade de demolir aquele espaço e construir um edifício novo. Era o normal na altura, mas foi ultrapassado graças à boa vontade e sensibilidade dos que eram responsáveis autárquicos na altura. Contudo, o cinema estava dependente dos seus proprietários, era privado. Quando uns pensaram em vender, nos anos 70, a Câmara interveio e alugou o espaço. Entretanto, foram surgindo novos espaços com ofertas adaptadas aos novos tempos e o Cine-Teatro já só fazia sentido se

fosse adaptado às condições actuais, quer em termos de conforto, quer de condições técnicas.

CS – Houve então a necessidade da autarquia adquirir o espaço? SE – A Câmara não ia investir quase quatro milhões de euros, como o fez, se o espaço não fosse seu. Quando chegámos à Câmara há nove anos começámos logo a pensar em adquirir o edifício. Estava na altura a necessitar de obras de conservação, nomeadamente o telhado e o exterior, obras muito pesadas em termos fi nanceiros, que não fariam sentido se aquilo nunca fosse nosso. Daí que iniciássemos contactos com os herdeiros dos primeiros proprietários. Agora, calcule-se a difi culdade que foi encontrar netos, bisnetos dos proprietários originais. Tivemos de negociar com cerca de 70 herdeiros.

CS – Foram negociações difíceis?SE – A todas essas pessoas, quero deixar uma palavra de reconhecimento. A Câmara pagou mas nada que fi casse fora do equilíbrio e do bom senso. Eles quiseram que aquilo que foi construído pelos seus avós continuasse vivo e na comunidade. E isso é uma riqueza que não pode ser contabilizada.

CS – Qual foi o passo seguinte?SE – Após a aquisição pensámos numa intervenção profunda, de adaptação, sem descaracterizar o edifício original. O exterior está como está. No interior, quem conheceu o edifício vê o que lá está, embora com bastantes transformações, particularmente no aspecto técnico. O edifício tem hoje uma utilização polivalente, já não é só cinema e teatro. Tem um apoio tecnólógico que permite congressos, tem tradução simultânea, projecção de power point, enfi m, garante o espaço polivalente de que a cidade necessita. E tem uma riqueza que permite dar um contributo para a afi rmação da cidade de Loulé como sede de um concelho que se afi rma como o mais importante em termos de qualidade do turismo mas que também se vai afi rmando como um centro de serviços e de referência em termos culturais e arquitectónicos na região.

Loulé é talvez o concelho mais completo do Algarve

CS – Como classifi ca o património arquitectónico de Loulé no contexto do país?Temos de reconhecer que o património arquitectónico de regiões como Évora, para nos referirmos ao Sul, ou Braga, mais a Norte, e outros concelhos estão mais bem apetrechados em termos de património. Há muitos factores que contribuíram ao longo da história para que assim fosse. O Algarve sofreu vicissitudes que essas regiões ou não sofreram ou sofreram num menor grau. Invasões e terramotos depauperaram-nos bastante.

CS – Quais são para si os trunfos mais fortes de Loulé?SE – O concelho de Loulé é talvez o mais completo do Algarve, tem uma grande complementaridade, desde o litotal até à serra. Tem a zona litoral, o barrocal e a serra, e isso dá-lhe uma riqueza, uma variedade, uma personalidade muito forte. O facto de não ter a sua sede no litoral pode trazer desvantagens a nível do crescimento urbano, mas isso acaba por trazer uma vantagem, por não se registar tanta pressão urbanística e do imobiliário. Isso permitiu que a matriz da cidade não fosse adulterada, o que foi uma mais-valia, que hoje todos reconhecem. Loulé é uma cidade atractiva e com qualidade de vida.

CS – Como é que tem sido possível manter essa qualidade de vida?SE – Temos uma pol ít ica de preservação que tem valorizado muito a cidade. Para além do Cine-Teatro, agora inaugurado, temos outros exemplos bastante marcantes. O Mercado Municipal, que fez 100 anos em 2008 e foi completamente reabilitado, a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, que é uma das mais bonitas do Algarve, em termos de

azulejaria dos séculos XVII e XVIII e foi completamente restaurada, a Praça da República. Há uma série de intervenções, como a reabilitação da Muralha do Castelo, que demonstram bem qual tem sido a política do executivo.

CS – Essas intervenções têm-se realizado noutras zonas do concelho?SE – Noutras zonas do concelho, temos também muitos exemplos. O Largo da Igreja de Querença, a reabilitação urbana de Alte. Praticamente em todo o concelho, temos feito uma intervenção de reabilitação urbana, de preservação dos elementos arquitectónicos mais emblemáticos. Isso foi feito quando era possível, quando havia condições fi nanceiras para o fazer. Agora, como todos sabemos, seria muito mais difícil. Foi um ganho importante. Nas comemorações do Dia da Cidade, foi também possível visitar uma intervenção feita numa ponte romana, a Ponte do Álamo, na antiga estrada de Loulé para Faro. Enfi m, são pormenores que demonstram a nossa preocupação e a nossa sensibilidade.

CS – Que outras intervenções têm sido levadas a cabo? SE – Temos feito reabilitação urbana na cidade de Loulé, nas fachadas das casas, temos o Arquivo Municipal, outro edifício emblemático. Adquirimos edifícios emblemáticos, onde ainda não fi zemos intervenções porque não é possível fazer tudo ao mesmo tempo. Entre estes conta-se o Palácio dos Espanhóis, que já tinha sido adquirido antes de cá chegarmos. Adquirimos o Solar que era a sede da Sociedade Filarmónica Artistas de Minerva. Está em ruínas, a necessitar de uma grande intervenção, mas é nosso e a Câmara vai fazer uma reabilitação quando tiver possibilidades. Adquirimos o Convento de Santo António, que era da Santa Casa da Misericórdia. Tem hav ido um conjunto de intervenções, numa perspectiva global de estratégia de intervenção, d e p r e s e r v a ç ã o d o n o s s o património, sempre associando isto à mais-valia que representa para a mais importante actividade económica do concelho, o turismo. E também para a coesão da própria comunidade.

ENTREVISTA COM SERUCA EMÍDIO, PRESIDENTE DA CÂMARA DE LOULÉ

Entender o passado para ter futuro•

Seruca Emídio: “Temos uma política de preservação que tem valorizado muito a cidade"

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“A partir da projecção da vida e do discurso entre o alienado e o coerente do que foi José Júlio da Costa (a quem se atribui a morte de Sidónio Pais) pretendi levantar um pouco o véu e revisitar a realidade de Portugal nas duas primeiras décadas do século XX, sendo essa realidade construída e comentada pelo director de um jornal vinte anos depois, já em plena ascensão do Estado Novo”, revela-nos Ana Cristina Oliveira, no programa da peça Do Lado da Verdade, de sua autoria.

Falar sobre a 1ª República às novas gerações não é tarefa para todos, deliciá-los com os pormenores da História e das histórias é empreitada para muito poucos.

Ana Cristina Oliveira consegue fazê-lo na perfeição com a peça Do Lado da Verdade. Consegue-o, porque é uma pedagoga, uma referência na formação de jovens nas artes do palco, uma amante do teatro, ao qual se entrega, desde alguns anos,

como professora, encenadora, actriz, produtora, escritora de peças e de textos de análise/crítica ou até mesmo investigação teatral. É da sua autoria a mais relevante obra sobre a história do teatro no Algarve.

Estes atributos contribuem, todos eles, de forma fundamental e cirúrgica para a qualidade deste trabalho.

Mérito também de António Gambóias que enriquece a personagem de José da Costa, pela forma excelente como a interpreta. Foge aos estériotipos, deixando a incoerência e desequilíbrio entregues apenas à personagem e não ao actor ou à interpretação deste.

O jornalista que o entrevista, 20 anos depois deste ter assassinado Sidónio Pais, é interpretado por Diogo Simões, que se estreia como actor e que defende bem o papel. Recentemente chegado ao país e desconhecedor da realidade do Estado Novo promete a José da Costa publicar a sua verdade. Este é o mote para a segunda parte deste espectáculo, em que António

Gambóias surge com uma personagem diametralmente oposta à primeira, a de director do Jornal que irá tentar converter esse jornalista à verdade vigente. Uma oportunidade criada pela autora para retratar a política de censura e reconstrução das verdades, de forma clara, pedagógica e com um sentido de humor genial.

O Lado da Verdade apresenta-nos não só uma abordagem singular, diferente de tudo o que se tem feito no âmbito das comemorações da 1ª República, como constitui um casamento perfeito entre conteúdo e forma. Fruto de uma maturidade dramatúrgica de quem domina as técnicas e conhece os públicos.

Lamentavelmente são poucos os que têm tido acesso a este espectáculo. Talvez por se tratar de uma produção independente que não tem atrás de si uma estrutura que a promova e agencie.

Quem perde é o público!

A Verdade do Teatro

Tavira recebe, até ao próximo dia 6 de Março, a sexta edição do Teatro no Inverno, numa organização da AL MaSRAH Teatro.

Devido à grande af luência de público verifi cada no ano passado, este Inverno vai contar com seis semanas de teatro e recebe, pela primeira vez, uma presença internacional. Como habitualmente, este festival inclui na sua programação uma série de espectáculos para o público em geral e infantil, bem como ofi cinas de formação, fi lmes e conversas sobre teatro. Neste intervalo, entre a quadra natalícia e o Carnaval, a proposta é abandonar o frio invernal e receber imenso calor teatral.

A programação do evento é bastante variada, incluindo:

» Conversas e Fi lmes, na Biblioteca Municipal Álvaro de Campos, a partir das 16.30 horas:

12 de Fevereiro - Teatro e Comunidade conversa com Luís Varela;

19 de Fevereiro - Não Fumar de Alains Resnais (Ficção)

26 de Fevereiro - Crítica e Dramaturgia Portuguesas conversa com Jorge Louraço Figueira;

» Espectáculos, no Espaço da Corredoura, a partir das 21.30 horas:

11 e 12 de Fevereiro - Ay Carmela, Teatro das Beiras;

18 e 19 de Fevereiro - Invasão, EntreTanto Teatro;

25 e 26 de Fevereiro - Europa, Teatro da Academia;

4 e 5 Março - Brilharetes - Artistas Unidos.

» Oficinas de Formação, no Espaço da Corredoura, 14.30 – 17.30 horas;

12, 13, 19, 20, 26, 27 de Fevereiro e 5 e 6 Março, Brincando ao Teatro

»Espectáculos para Crianças, no Espaço da Corredora, entre as 16 e as 18 horas;

13 de Fevereiro - A Ilha do Tesouro, Art’Imagem;

20 de Fevereiro - O Romance da Raposa, Jangada Teatro;

27 de Fevereiro - A Lenda do Menino da Gralha, Teatro do Mar.

Mais informações e reservas podem ser feitas pelo telefone 967 779 122 ou endereço electrónico [email protected].

AL-MASRAH TEATRO PROMOVE

Teatro no Inverno•

António Gambóias interpreta assassino de Sidónio Pais

João Evaristo

XVI Aniversáriodo Ensemblede Flautas de Loulé

Para comemorar o seu XVI aniversário, o Ensemble de Flautas realizou um concerto, na Igreja Matriz de Loulé, que contou também com a presença do Coral Ideias do Levante, de Lagoa.

Apesar do intenso frio, foram muitos os que não quiseram perder aquele momento musica l . O repertório do Ensemble incluiu temas de compositores do Renascimento e primeiro Barroco (Cavaccio e Soderino) e também do Barroco tardio(Corelli e Telemann), bem como um tema moderno – Tears in Heaven – em adaptação para quarteto de fl autas por um dos elementos do Ensemble (Joana Alho).

O agrupamento apresentou interpretações de muito bom nível, com f luência e espontaneidade, recebendo muitos aplausos do público que no fi nal – e de pé – ovacionou os jovens do Ensemble de Flautas e os elementos do Coral Ideias do Levante, que ao longo do concerto

apresentaram – alternadamente com o Ensemble – repertório centrado em compositores do século XIX, ao lado de alguns temas populares portugueses.

Constituído em Dezembro de 1994, o Ensemble de Flautas de Loulé é hoje uma referência da nossa região. Sob a orientação do professor Francisco Rosado, tem-se apresentado nas várias edições do Encontro de Música Antiga, do concelho de Loulé, no Festival Med e em inúmeros espectáculos por todo o Algarve. Tem três cds gravados, com peças da Idade Média ao século XX. Foi já referenciado na imprensa internacional, como são os casos da revista americana “American Recorder” e da revista inglesa “ Recorder Magazine”.

A grande aposta continua a ser a da formação. Prova disso são as participações dos alunos do Ensemble de Flautas em Master Classes com consagrados músicos de vários países.

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palco

ETHAN CARDIEL

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momento momento Vítor Correia

"Da Arte Sub-Urbana às Galerias a Céu-Aberto"

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Esferográfi ca

No seguimento do trabalho iniciado no número anterior, aqui fi cam, para os mais curiosos, mais duas referências bibliográf icas sobre a imprensa periódica algarvia, neste caso relativas a Portimão: Jornais, Homens e Factos de Portimão, Joaquim António Nunes, Lisboa, 1962, editado pela Casa do Algarve e integrado na colecção, Estudos Algarvios (VIII) e História da Imprensa Portimonense, Roteiro da Exposição, Museu Municipal de Portimão, Centro de Documentação e Informação, s/ data.

Vila Real de Santo António

Ao que parece o primeiro periódico de Vila Real de Santo António terá sido O Petiz, que saiu à rua a 26 de Novembro de 1893, sendo o seu proprietário Joaquim António Socorro Júnior. Tratava-se de um jornal de pequenas dimensões e igualmente de pequena duração, pois terá terminado ainda nesse ano. Era um periódico essencialmente de lazer, sem um carácter noticioso. Com estas características e com um corpo noticioso a que poderemos atribuir o título de jornal, surge O Algarve, que viu a luz do dia em Janeiro de 1901, sendo seu Director, Editor e Redactor, Joaquim António Socorro Júnior. Dizia-se “semanário popular, independente, literário, agrícola, noticioso, recreativo e anunciador”. Terminou em Outubro do mesmo

ano. Desde essa data foram surgindo, pontualmente outros títulos, não só de carácter noticioso mas abrangendo diversas áreas, desde os espectáculos (Jornal de Cinema, 1930; Teatro, 1964) à política (O Lutador, 1913; Lutar no Mar Lutar em Terra, 1975 [Vila Nova de Cacela]) e até de defesa do património (Património e Cultura, 1981).

Desta grande var iedade de periódicos decidi destacar três.

Horizonte – Jornal dos Alunos do Antigo Colégio Nacional (1948).

Jornal escolar, policopiado, de que

era Editor, João Marques Colaço, Directora, Fernanda Cavaco dos Santos e Redactor Manuel Francisco da Conceição. Como colaboradores no número um, apareciam Maria da Conceição Felizardo Sabino, Fernando Calado e Gavino Luís Correia Ribeiro Alves. Cada número custava 1$00. Sei que se publicaram vários números, mas desconheço exactamente quantos. Tinha várias secções, nomeadamente: campismo, enigmas, página literária, poemas, passatempos, adivinhas, humor e notícias relativas à escola.

Foz do Guadiana (1935 - 1936)

“Periódico independente e de propaganda regionalista”, era seu Director António Vicente Campinas, Redactor Principal, Manuel Clemente,

Secretário da Redacção, Luís Pistone, e Administ rador, Gui lherme Padesca. Custava $50 e publicaram-se 54 números. Tinha várias secções regulares, como por exemplo: notas e notícias, instantâneos, desporto mental, esperanto, vida social, livros, crónica desportiva, etc.. Trata-se de um jornal de extrema importância na história deste concelho, do Algarve e até mesmo do país, para o período da ditadura salazarista.

A razão de incluir este periódico deve-se ao facto de ser seu director António Vicente Campinas, do qual se celebra neste ano de 2011, o centenário do seu nascimento. Autodidacta e polifacetado, republicano convicto, opositor ao Estado Novo, perseguido e

preso pela PIDE, obrigado ao exílio (França, 1961-1974), grande entusiasta do Escutismo, (sendo um dos grandes impulsionadores do Grupo 60 de Vila Real de Santo António). Autor de uma vasta obra literária entre poesia e romance (cerca de quarenta livros publicados), bem como diversas colaborações literárias em revistas e jornais.

Jornal do Algarve (1957-)

Trata-se do jornal com maior longevidade do concelho, ainda em publicação. Dizia-se “semanário provincial”, a que foi acrescentado anos mais tarde “semanário de maior expansão de todos os jornais do Algarve”. Foi fundado e dirigido

por José Barão até à sua morte, sendo posteriormente entregue esta tarefa a diversas pessoas. Apesar de inicialmente seguir uma linha próxima do Estado Novo, com o 25 de Abril muda, passando, inclusivamente, a ser conotado com o Partido Comunista, facto que termina em 1984, quando regressa, politicamente, a uma orientação independente. Custava 1$00. Teve (e tem) diversas secções regulares, assim como inúmeros colaboradores, pelo que se torna impossível neste pequeno artigo mencioná-los a todos. Trata-se, sem dúvida, de um importante e indispensável periódico, para o estudo monográfi co e regional.

Caneta de tinta permanenteCaneta de aparo

«A dinamização do Jogo da Língua Portuguesa na nossa biblioteca tem sido um sucesso por contar semanalmente com a participação entusiasmada e responsável de cerca de 100 alunos. A opinião dos alunos é, de facto, o mais importante revelando que esta parceria em torno da Língua Portuguesa entre escolas e muitos dos seus alunos é um sucesso nas nossas bibliotecas escolares.»

Elisabete Estevens e Sofi a Afonso, professoras bibliotecárias do Agrupamento de Escolas Prof.ª Diamantina Negrão, Albufeira

DA IMPRENSA LOCAL

Jornais de Vila Real de Santo António•

Joaquim ParraProfessor de Históriae Coleccionador

Ao contrário do que sucede hoje em dia, em que a indecisão, na hora da compra, assume proporções de grande angústia, quando o aluno tem que escolher entre uma caneta de gel, ou de tinta com brilhantes ou ainda com sabor (cheiro) a chocolate ou baunilha, o aluno de illo tempore não precisava de se preocupar muito com a escolha do instrumento de escrita. Bastava-lhe a caneta de aparo. A tinta era diligentemente distribuída pelo(a) professor(a) nos pequenos tinteiros que se encontravam encaixados nos orifícios próprios das carteiras.

O aluno ia molhando o aparo à medida que ia escrevendo.

O único problema é que por vezes o aparo espetava-se no papel e isso era sinónimo de borrão e, eventualmente, culminava numa reguada ou puxão de orelhas. Os estudantes eram facilmente reconhecidos não só pela bata branca, mas também pelos dedos sujos de tinta. Seguiu-se a caneta de tinta permanente. Objecto cobiçado e invejado, não havia Natal, Comunhão ou Aniversário em que ela não fosse desejada (embora nem sempre obtida). E Parker.

Caneta de tinta permanente era a Parker.

Na escola fazia-se questão de a mostrar aos colegas. Os borrões desapareceram dos cadernos e os dedos… Bom, esses continuavam com os estigmas dos estudantes: os calos nos dedos indicador e médio e a tinta. Os erros eram cientifi camente rasurados pelo(a) professor(a) com lixívia ou uma lâmina de barbear ou, em situações mais delicadas, por um complexo sistema de dois ou três frasquinhos que eles manipulavam como se de uma experiência química se tratasse. E de repente (é como quem diz):

Bic Laranja Bic CristalDuas escritas à sua escolha Bic Laranja para a escrita fi naBic Cristal para a escrita normalBic, Bic, Bic Bic,Bic, Bic

De Clichy, na França, um barão de origem italiana, naturalizado francês, Marcel Bich, inventa algo totalmente inovador: uma caneta de tinta, sem aparo, que não sujava os dedos e ainda por cima era barata. A sua entrada em cena foi triunfante: spots televisivos e radiofónicos, até na Volta a Portugal em Bicicleta (lembram-se do Joaquim Agostinho com a camisola da Bic?) Foi de tal modo que nem a pobre Molin, congénere de fabrico nacional, lhe pôde fazer frente. Esferográfi ca era Bic. E entre os estudantes rapidamente se descobriram outras qualidades. Já não era necessário recorrer aos saberes alquímicos do professor(a), bastando uma borracha “de tinta”

(de que resultava, normalmente, uma “janela”na folha).

Além disso, eram excelentes zarabatanas.

Retirada a carga, um bocadinho de papel, devidamente “ensalivado”, era colocado numa das extremidades do tubo e, pela outra, soprava-se com força. O alvo, dependia da mestria do snipper: as orelhas ou o pescoço do colega. Para treinar, não havia nada melhor do que o tecto da sala de aula. Além desta fantástica utilidade, também era possível personalizar o instrumento.

Bastava passá-la pela chama e dar-lhe a forma que se quisesse.

Esta personalização artística chocava, por vezes, com os cinco dedos do pai ou da mãe, incapazes de reconhecer a veia artística do fi lho.

Instrumentos de Escrita baú

Primeiro número do Jornaldo Algarve

O Horizonte era um jornal escolar

Foz do Guadiana, dirigidopor Vicente Campinas

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N.06 AGENDACULTURAL

FEV.2011

PARECEQUE FOI ONTEM MAS JÁ PASSARAM

ANOS.Foi em que tudo começou. Ao longo dos últimos Anos caminhámos ao lado de muitos projectos e ambições. Apoiámos famílias, empresas e instituições de solidariedadesocial. Contribuímos para o desenvolvimentoeconómico-social das comunidades locais. Dealdeias a vilas, de vilas a cidades e de geração em geração. Hoje somos um Grupo Financeiro com uma oferta global de produtos e serviços em que os portugueses confiam. Balcões, mais de mil Associados e mais de 1 milhão de Clientes. Juntos somos cada vez mais, e juntos celebramos

Anos de Crédito Agrícola.

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Num passeio pelo interior algarvio, diante de uma paisagem que nos convida a apreciar as particularidades do barrocal, marcado por pequenas quintas e campos verdejantes, que contrastam com as características da serra “enfeitada” por mato, medronheiros, azinheiras e sobreiros, admiramos, neste lugar, pormenores que nos escapam à velocidade dos dias e das horas que passam. Tudo aqui aparenta ser calmo e com tempo para retirar da paisagem a beleza, como quem retira das árvores a cortiça, riqueza que engrandeceu esta terra.

Chegamos, assim, a uma pacata vila chamada São Brás de Alportel. Nas ruas, as conversas entre os vizinhos refl ectem os modos de sociabilidade. Paramos no café mais frequentado do largo principal – Largo São Sebastião, onde todos têm atendimento personalizado; os clientes tratam-se pelo nome e são conhecidos os seus hábitos e preferências.

Este estabelecimento, cujo aspecto já em nada se assemelha ao das antigas tascas ou tabernas, conserva ainda o espírito de convívio e de entreajuda, onde se estabelecem relações de vizinhança e se conversa sobre os afazeres do campo.

Passeando pelas ruelas descobrimos, entre o casario da vila, o Museu do Trajo de São Brás de Alportel. Conta-se que, no séc. XIX, foi um palacete de um abastado proprietário de cortiça e que, nos anos oitenta, foi doado à Santa Casa da Misericórdia de São Brás de Alportel, pelo herdeiro António Bentes, com o objectivo de ser criado um museu, o que acabou por acontecer por iniciativa do Sr. Padre Cunha. Este homem de cultura fomentou a sensibilização do povo relativamente à importância das memórias e dos objectos antigos, para a construção da identidade e da história da vila. Neste sentido, angariou junto da população diversos objectos tradicionais e trajos antigos, representativos deste local ou de outros sítios do Algarve.

Depois deste breve apontamento sobre a história do museu, comecemos então por partilhar a visita aos seus espaços e, particularmente, o que nos contam as exposições.

A primeira “viagem” no palacete oitocentista traz-nos ao presente o quotidiano, a mentalidade e a cultura da sociedade do séc. XIX, no Algarve. Aqui apreciamos as formas de vestir e, muito especialmente, de

parecer e de ser, que espelham a cultura algarvia da época.

Os trajes, objectos e fotografias transportam-nos através da sua beleza, formas e usos, quer para ambientes domésticos, quer sociais, de lazer, de etiqueta e/ou de trabalho. Estas salas e recantos de “Sombras e Luz” retratam “o Algarve do Século XIX” e despertam-nos os sentidos. Isto acontece simplesmente porque a exposição nos presenteia com os aromas das esponjas perfumadas, os sons da caixa de música, o tactear das vestimentas e, sobretudo, porque nos arrebata com a profusão e beleza das suas cores.

Todos estes elementos e ambiências transmitem vivências e lugares diferentes, longínquos dos nossos. Hoje, libertamo-nos dos vestidos longos, dos excessos ornamentais dos folhinhos e rendinhas, dos corpetes, dos espartilhos, dos culotes e saiotes. A simplicidade e a funcionalidade imperam numa sociedade que privilegia a quantidade e as marcas. A forma de vestir quotidiana é cada

vez menos um elemento que compõe um espaço, uma actividade, um dia festivo ou religioso. Ao que parece, por falta de tempo ou de gosto, deixamos, progressivamente, de nos “engalanar”.

Depois desta mostra prosseguimos para outros espaços, que nos convidam a conhecer diversas colecções e actividades do museu. Estamos a falar das salas que se situam no desafogado jardim da casa: as antigas casas agrícolas e alpendres, reservas técnicas e ateliês de formação. Aqui, assume maior relevância o extraordinário património etnográfi co da região e, em particular, o dos são-brasenses. Esta colecção permite identificar uma comunidade rural que viveu da “terra e para a terra”, cujas actividades representadas estão, na sua maioria, ligadas à agricultura.

Salientamos, dos espaços contíguos ao jardim, a exposição “Terra da Cortiça”, que nos apresenta alguns processos ligados à preparação e transformação desta matéria-prima,

bem como a dimensão humana do trabalho, mostrando-nos a importância deste património industrial para a realidade histórica e identitária do Município de São Brás de Alportel.

D e s t a c a m o s , t a m b é m , o extraordinário conjunto de veículos tradicionais de tracção animal, de alfaias e de outros instrumentos agrícolas, que se encontram expostos na zona dos telheiros. Estes veículos algarvios levam-nos ao tempo em que não existiam automóveis, sendo estes os únicos meios de transporte utilizados para movimentar bens e/ou pessoas.

Entendemos que, para redescobrir os saberes destas gentes que “reencontram” nestes espaços parte das suas vidas, interessa perceber cada objecto exposto. Para tal, é necessário desvendar e entender, de entre a panóplia de coisas típicas da região, o signifi cado único de cada peça, porque foi pertença de alguém e, sobretudo, porque conta a história de alguém. Embora pareça óbvio, não é assim tão

simples, uma vez que se tratam das memórias e das histórias de cada um, razão pela qual este museu tem, ao longo da sua existência, construído relações de confi ança, reciprocidade e dedicação mútua.

Para além das suas exposições, este museu também organiza e dinamiza, nos restantes espaços, um conjunto de actividades através do seu grupo de amigos, procurando soluções cuidadas para responder às necessidades da comunidade e do território, contudo, sem o propósito de atrair a si multidões.

Já fora de portas, terminamos esta visita, conversando com alguns habitantes da terra que partilharam um misto de respeito e de carinho por este espaço. A maioria estabeleceu laços com o seu museu, através de doações de peças ou fotografi as, de testemunhos, da escola, de actividades lúdicas, de voluntariado, entre outras formas que contribuíram para fortalecer laços de amizade e preservar a identidade cultural da região.

MUSEUS – A VEZ E A VOZ DO VISITANTE

Museu do Trajode São Brás de Alportel

Sombras e Luz – O Século XIX no Algarve

museu museu

« A Casa da Juventude de Olhão aderiu recentemente ao Jogo da Língua Portuguesa por considerar tratar-se de uma iniciativa muito importante a nível do desenvolvimento das habilidades linguistas dos jovens e da população em geral. As reacções que nos chegam, directamente ou através do Facebook ou do correio electrónico, têm sido muito positivas e encorajadoras. Parabéns às Bibliotecas Paula Nogueira pela iniciativa e ao Postal pelo apoio dado com a publicação semanal dos desafi os e soluções.»

Casa da Juventude de Olhão

Isabel SoaresMuseóloga/Arqueóloga

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Cultura.Sul10.02. 2011 16

Até aos anos setenta do século XX, a República e o Estado Novo consolidaram a imagem do Algarve popular e da paisagem cultural algarvia que ainda hoje persiste: o «tradicional algarvio» era o campo com amendoeiras floridas, a rua com o mar ao fundo, a casa com açoteia, a chaminé rendilhada, o folclórico corridinho, o trajo de montanheira e algumas peculiaridades alimentares, como o doce-fino e a cataplana…

A categoria de Património Cultural Imaterial – abreviadamente PCI – é expressão de um aperfeiçoamento da velha noção de património etnográfico cobrindo aquelas realidades que, não possuindo suporte material, têm contudo um forte significado para a identidade e memória colectivas. Expressões orais e musicais, maneiras de construir, modos de preparar o comer, são algumas das realidades que – quer tenham, quer não tenham suporte em coisas móveis e imóveis – constituem uma parte significativa do património cultural. Em Portugal, a Lei 107/2001, de 8 de setembro, introduziu no quadro legal essa mudança de paradigma (artigos 91.º e 92.º), institucionalizado internacionalmente pela UNESCO na convenção de 17 de outubro de 2003 (ratificada por Portugal em março de 2008). Neste universo integra-se toda uma multiplicidade de práticas, representações e expressões tradicionais que se manifestam tanto oralmente como através de expressões artísticas e manifestações de carácter performativo. Práticas sociais, rituais e festividades, concepções, conhecimentos e práticas relacionadas com a natureza e o universo, bem como os conhecimentos e

competências técnicas tradicionais, bens materiais e espaços que lhes estão associados, e que as comunidades reconhecem como parte integrante da sua herança cultural, no quadro de uma titularidade colectiva e de uma efectiva transmissão entre gerações.

Sendo objecto de uma constante recriação – e da aí também a sua fragilidade enquanto património, porque exposto à transformação dos sistemas de produção, da sociedade e dos saberes – o Património Cultural Imaterial proporciona um sentimento de identidade e de continuidade aos grupos e comunidades, um nexo de trajectória com espessura temporal, com passado e futuro e em que o

presente é gerador de felicidade, compatível com os direitos humanos tal como estes são internacionalmente aceites. Pela sua natureza específica, este património intangível só pode ser preservado se for sentido como uma necessidade vital de afirmação dos indivíduos, de asserção do colectivo, no respeito pela diversidade e por aquilo que nos aproxima enquanto pessoas. Para salvaguardar este património é necessário atrever-se a ser diferente: e a maneira mais eficaz de o ser é manter a tradição vivendo-a.

A s s o c i a n d o - s e a o A n o Internacional da Juventude, a Direcção Regional de Cultura do

Algarve e a Fnac Algarveshopping associam-se e lançam o concurso V I V E P C I – P a t r i m ó n i o Cultural Imaterial que se propõe estimular a educação patrimonial desafiando os jovens entre os 15 e os 25 anos residentes (temporária ou permanentemente) na Região a que, dando asas à sua veia artística, levem a concurso registos fotográficos e audiovisuais ilustrativos do tema, numa vertente original e criativa.

De um modo d inâmico e participativo, que desafia a criatividade e a originalidade individuais, o concurso procura motivar os jovens da região a conhecer melhor e a valorizar as suas memórias e

identidade cultural, promover o conhecimento do Património Cultural Imaterial algarvio e torná-lo objecto de obras criativas, estimular um olhar contemporâneo sobre o legado patrimonial imaterial. A iniciativa visa capitalizar a identidade e fortalecer a auto-estima colectiva da região, promovendo a memória e as tradições locais.

As inscrições deverão ser feitas online até 15 de março através do preenchimento e submissão da Ficha de Inscrição disponível no site oficial do concurso em www.vivepci.com podendo os trabalhos ser entregues até ao dia 30 de junho de 2011.

VIVE PCIUma iniciativa para viver o Património Cultural Imaterial

Quero, antes de mais, agradecer aos responsáveis pelo Cultura.Sul o facto de se terem lembrado de mim para ser o elemento que dirige os convites às personalidades que farão uso deste espaço para nos darem a sua opinião sobre a cultura algarvia, seus pontos fracos e fortes, os seus destinos brilhantes ou sombrios e a sua importância para o desenvolvimento do “Reino”.

Espaço de total liberdade que irá, decerto, do optimismo pateta ao fatalismo patético não deixando naturalmente por passar pelo optimismo realista.

Serão os caminhos que cada protagonista assim o entenda, com total liberdade.

A nós cabe-nos apenas a tarefa de nos esforçarmos por convencer o convidado a elaborar um texto (aproximadamente 2.500 caracteres, com espaços incluídos) onde expresse a sua visão do papel da Cultura no desenvolvimento deste poucadinho de terra que tanto estimamos.

Isenção total e absoluta quanto aos critérios de escolha. Bateremos às por tas que entendermos,

independentemente da cor política, religiosa, etc. e tal com que a mesma esteja conotada.

Peço-vos a ousadia nas reflexões para que a humidade da rotina não nos tolha o pensamento e acção.

Que o orvalho da esperança em nós e na nossa gente nos permita alimentar a crença de que saberemos afirmarmo-nos como Região.

A Regionalização, esse acto de procura da Dignidade, passa muito, mesmo muito pela Cultura,

mais do que pela economia ou pelas finanças.

Obrigado pelo convite que me foi formulado.

Obrigadinho – à boa moda algarvia – a todos os que aceitarem o nosso convite.

Palma e Esparto

Palma e Esparto Festa da Espiga

Espaço de total liberdade

António PinaCidadão Algarvio

Espaço Cultura

António Pina Convida

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