diaporas migraciones tic identidades 03-libre

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 Diaspora, migration, communication technologies and transnational identities Diasporas, migrations, technologies de la communication et identités transnationales 3 Diásporas, migrações, tecnologias da comunicação e identidades transnacionais Diásporas, migraciones, tecnologías de la comunicación e identidades transnacionales Diaspora, migration, communication technologies and transnational identities Diasporas, migrations, technologies de la communication et identités transnationales Denise Cogo Mohammed ElHajji  Amparo Huertas (eds.)

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  • Diaspora, migration, communication technologies and transnational identities Diasporas, migrations, technologies de la communication et identits transnationales

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    Disporas, migraes, tecnologias da comunicao e identidades transnacionais

    Disporas, migraciones, tecnologas de la comunicacin e identidades transnacionales

    Diaspora, migration, communication technologies and transnational identities

    Diasporas, migrations, technologies de la communication et identits transnationales

    Denise Cogo

    Mohammed ElHajji

    Amparo Huertas

    (eds.)

  • Disporas, migraes, tecnologias da comunicao e identidades transnacionais Disporas, migraciones, tecnologas de la comunicacin e identidades transnacionales

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    Comit Cientfico / Comit cientfico / Scientific Committee / Comit scientifique: Adela Ros Migration and Network Society Programme // Internet Interdisciplinary

    Institute (IN3) Universitat Oberta de Catalunya (Espaa) Aly Tandian Universit Gaston Berger de St. Louis (Senegal) Carmen Peafiel Siz Universidad del Pas Vasco (Espaa) Jamal Eddine Naji l'Institut Superieur de l'Information et de la Communication de Rabat (Marruecos). Director Titular de la Ctedra Orbicom Unesco en Comunicacin Pblica y Comunitaria Joo Maia Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Brasil) Jos Ricardo Cavalheiros Universidade da Beira do Interior (Portugal) Manuel Jos Damsio Universidade Lusfona de Humanidades e Tecnologias (Portugal) Marta Rizo Garca Universidad Autnoma de la Ciudad de Mxico (Mxico) Miquel Rodrigo Alsina Universitat Pomepu Fabra (Espaa) Raquel Paiva Universidade Federal do Rio de Janeiro (Brasil) Rosa Cabecinhas Universidade do Minho (Portugal)

    Denise Cogo, Mohammed ElHajji & Amparo Huertas (eds.) (2012): Disporas, migraes, tecnologias da comunicao e identidades transnacionais = Disporas, migraciones, tecnologas de la comunicacin e identidades transnacionales = Diaspora, migration, communication technologies and transnational identities

    = Diasporas, migrations, technologies de la communication et identits transnationales. Bellaterra : Institut de la Comunicaci, Universitat Autnoma de Barcelona. ISBN 978-84-939545-7-4

    Editores / Editors / Editeurs: Denise Cogo Mohammed ElHajji Amparo Huertas Contribuintes / Colaboradores / Contributors / Contributeurs: Ramon G. Sed Yolanda Martnez Surez Institut de la Comunicaci (InCom-UAB) Universitat Autnoma de Barcelona Campus UAB - Edifici N, planta 1. E- 08193 Bellaterra (Cerdanyola del Valls) Barcelona. Espanya http://incom.uab.cat ISBN: 978-84-939545-7-4

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    Tecnologias da comunicao y reconfigurao de identidades em processos migratrios entre frica Ocidental, Europa e o Cone Sul

    Pilar Uriarte Blsamo

    [email protected]

    Professora adjunta, Departamento de Antropologa Social, Universidad de la Repblica. Uruguay32

    Daniel Etcheverry

    [email protected]

    Professor Adjunto, Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA). Brasil33

    Resumo: O artigo analisa o papel das tecnologias da informao e a comunicao no fenmeno migratrio, tomando como campo de estudo as migraes desde frica Subsaariana para Europa e Amrica do sul. A pesquisa foi desenvolvida em diversos locais de partida e de chegada dos migrantes, onde foi possvel observar a importncia dos meios de comunicao na construo do projeto migratrio, nas possibilidades de viabiliz-lo e uma vez concretizado, nas diversas formas de integrao com a sociedade receptora e com coletivos de migrantes no local de destino. Busca compreender as formas em que a tecnologia incorporada pelos migrantes no seu cotidiano, extrapolando as situaes relacionadas com a projeo da migrao ou com a manuteno das redes no local de origem. O deslocamento espacial e social produzido pela migrao gera uma reconfigurao de identidades. Parte constitutiva desse processo se estabelece a travs das TICs. Palavras chave: migraes, frica, TICs, identidade. Resumen: El artculo analiza el papel de las tecnologas de la informacin y la comunicacin en el fenmeno migratorio, tomando como campo de estudio las migraciones desde frica Subsahariana

    32 Website (Research Group): http://www.ufrgs.br/naci

    33 Website (Research Group): http://www.ufrgs.br/naci

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    hacia Europa y Amrica del Sur. La investigacin fue desarrollada en diversos lugares de partida y de llegada de los inmigrantes, donde fue posible observar la importancia de los medios de comunicacin en la construccin del proyecto migratorio, en las posibilidades de hacerlo viable y una vez concretado en las diversas formas de integracin con la sociedad receptora y con colectivos migrantes en el local de destino. Busca comprender las formas en que la tecnologa es incorporada por los migrantes en su cotidiano, extrapolando las situaciones relacionadas con la proyeccin de la migracin o con el mantenimiento de redes en el lugar de origen. El desplazamiento espacial y social producido por la migracin genera una reconfiguracin de identidades. Parte constitutiva de ese proceso se establece a travs de las TICs. Palabras clave: migraciones, frica, TICs, identidad.

    Abstract: In this article we analize the roles of the information and communication technologies (ICTs) in the context of migration, having the migratory movements from Subsahharian Africa to Europe and South America. The research was carried out in diverse departure and arrival sites, with special attention to the roles of the means of communication in the construction of the migratory project. We observed the importance of such media in the process of making the migratory Project feasible and, once on course, in the relations between the local societies, migrant associations and immigrants. We focus on understanding and revealing the ways in which the media is employed by inmigrantes in their daily lives, beyond mobility itself and the maintanance of social networks in their countries of origin. The geographical and social displacements give way to new identity configurations. A considerable part of this process is mediated by the ICTs. Keywords: migrations, Africa, ICTs, identity.

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    Introduo

    O presente trabalho busca analisar a forma em que os meios de comunicao e as novas tecnologias so incorporados ao projeto migratrio em suas diferentes fases. Faz parte do senso comum a idia de que o aceso aos meios de informao e comunicao tem mudado de forma radical as formas de habitar o mundo e de se relacionar quotidianamente. Mas se esse um fenmeno global, ele se verifica ainda mais para aquelas pessoas que se encontram de uma ou outra forma prximas migrao. Tanto para aqueles que planejam um deslocamento, quanto para quem j tem sado do local de origem, ou aqueles que ficando, permanecem espera ou formam parte do projeto migratrio de algum da famlia ou das redes de amizade, as possibilidades que as novas tecnologias abrem irrompem de cheio na organizao quotidiana e na construo do projeto, a travs da possibilidade de se comunicar de forma rpida e barata com quem est longe e de obter informaes que de outra forma seriam inacessveis.

    Esse trabalho pretende ir alm dessa comprovao e compreender como, nas diferentes fases do processo migratrio, a utilizao dos meios de comunicao e informao no se restringe unicamente viabilizao do deslocamento ou ao contato com as pessoas nos locais de destino e origem, mas est inserida em todos os relacionamentos. Nosso objetivo compreender a forma como as pessoas se apropriam das vias de comunicao que a internet proporciona em funo da relao de dupla pertena, ao local de origem do qual migraram e ao local de destino onde moram, muitas vezes perpetuando a condio de serem estrangeiros, outras vezes se apropriando e resignificando essa condio. Sendo ferramentas para concretizar um projeto pessoal ou familiar, as tecnologias da informao e a comunicao so tambm ferramentas polticas que ajudam a organizar e mudar de forma coletiva as condies de vida.

    Alm da duplicidade nos pertencimentos sociais, em todos os casos encontramos situaes de bilingismo ou de uso de mais de duas lnguas para se comunicar. Buscamos observar como as diferentes lnguas geram espaos de interlocuo diferentes, construindo cada uma delas narrativas identitrias diferentes, porm no excludentes. Aparece ento o carter construdo, dinmico e fluido das identidades, particularmente no caso dos processos migratrios.

    O texto parte da pesquisa realizada com migrantes subsaarianos, anglo e franco falantes no local de partida -frica Ocidental- e em dois destinos bem diferenciados: Espanha e Uruguai. Os dados coletados atravs de pesquisas de carter qualitativo, com forte nfase na etnografia, forma revisados luz da proposta de pensar o fenmeno migratrio a partir do acesso as tecnologias da comunicao. O trabalho de campo foi desenvolvido no marco da realizao de duas teses de doutorado, ambas sobre o fenmeno migratrio. A pesar de terem objetivos diferentes, ambas as teses respondem a uma orientao metodolgica comum, assim como s preocupaes e orientaes tericas desenvolvidas nos debates do Ncleo de Antropologia e Cidadania do Programa de Ps-Graduao em Antropologia Social da UFRGS.

    Porm, a construo de um texto coletivo implicou definir aproximaes tericas e pontos de vista sobre as migraes, assim como a necessidade de lidar com dados que no seriam de primeira mo em todos os casos. A pesar de que, nos diferentes apartados, a apresentao do caso e a anlise estejam guiadas por cada um dos pesquisadores individualmente, o desenrolar do artigo e as concluses s que chegamos so partilhadas por ambos. Isso importante por dois motivos. Primeiro, porque deixa claro que as formas de vivenciar o entrelaamento das experincias de

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    deslocamento e de uso de meios de comunicao relativamente novos, porm rapidamente assimilados ao cotidiano dos nossos interlocutores, so capazes de dialogar entre si, constituindo um campo discursivo que abriga e possibilita seu estudo. Ambos os pesquisadores passamos tambm por processos de deslocamento antes e durante e depois de nossas pesquisas, vivenciando os usos e limites das tecnologias de comunicao como descobertas associadas diretamente mobilidade. Em decorrncia disso, possvel afirmar que, cada um de ns a sua maneira, partilhamos com nossos interlocutores experincias onde deslocamento e uso das TICs se entrelaam. Da que as questes relativas reconfigurao identitria produzida em contextos de deslocamento no sejam meros desdobramentos intelectuais elaborados frente tela do computador. Mais do que isso, so reflexes baseadas na exposio direta, junto aos nossos interlocutores, s diversas tenses que compem esse campo, e que de alguma maneira, colocam em questo a dicotomia observador-observado, com as TICs permitindo aos sujeitos falar por e sobre si mesmos para alm dos eventos de comunicao pontuais.

    O papel da informao na construo do projeto migratrio

    Nesse primeiro apartado vamos nos ocupar do local de partida dos migrantes e das formas como a migrao concebida, primeiro enquanto um projeto ao mesmo tempo individual e coletivo, e posteriormente como um desafio subjetivo a ser afrontado. Como foi mencionado acima, nosso objetivo no unicamente compreender o papel que a tecnologia tem na implementao do projeto migratrio, mas compreender o quanto a idia de deslocamento est imbricada a um tipo de relacionamento social, sendo seu uso parte constitutiva de uma identidade.

    Pensar os vnculos entre migraes e usos das tecnologias da informao e a comunicao na frica Ocidental traz algumas dificuldades conceptuais e operativas, j que estamos falando de dois fenmenos muito abrangentes. frica, e particularmente frica Ocidental, um territrio atravessado por dinmicas migratrias de diferente escala, complexas e complementrias. Desde que as cincias sociais comearam olhar para a frica, as migraes foram um tema sempre presente. Consideradas como uma das principais dificuldades dos ocupantes europeus para transformar suas colnias em locais produtivos, as migraes foram analisadas como causa e conseqncia dos problemas sociais e econmicos no continente e simultaneamente como uma parte constitutiva do padro cultural tradicional no territrio (BILGER & KRALER, 2005).

    Se bem a preocupao pela mobilidade da populao continua presente em muitos dos trabalhos contemporneos como um problema social, outras perspectivas tm surgido recentemente, lanando um novo olhar sobre o tema inserido na ideia de movimento (SANTOS, 2008). A ideia de movimentao teria uma abrangncia maior, compreendendo no somente as migraes enquanto deslocamentos de um meio ao outro, mas tambm a passagem entre unidades domsticas ou mesmo o andar na rua. Essa ideia permite tambm pensar os fluxos de pessoas e informaes como algo positivamente valorado pelos protagonistas desse movimento. Lobo (2010) apresenta essa ideia, mostrando como, em muitas situaes, o fato de se movimentar o que permite a melhora nas condies de vida e na situao pessoal e familiar, sendo assim percebido pelo contexto social. Outros trabalhos tm olhado para os deslocamentos de pessoas dentro ou fora da rede familiar e social como uma etapa do ciclo de vida, permitindo assim o amadurecimento e a transformao em um sujeito adulto (PINA CABRAL, 2000). Esse ritual de passagem funciona tambm como uma

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    configurao especfica dos povos da frica Ocidental, para os quais a migrao , de certa forma, um sinnimo de aventura, sendo este um conceito fundamental para entender a forma como os sujeitos se percebem no mundo (SARR, 2009). Os casos de migrao analisados aqui, aqueles ainda em preparao, os retornados e os frustrados sero abordados numa perspectiva muito mais prxima da migrao como um projeto ao mesmo tempo individual e coletivo dos sujeitos que lhes permite se posicionar dentro de sua comunidade e no mundo, do que como um problema a ser compreendido em suas causas para ser resolvido nas suas conseqncias.

    A fase de pesquisa de campo em frica, a qual abordou trs pases Gana, Togo e Nigeria, fez parte de uma pesquisa maior que buscou compreender o fenmeno especfico de jovens urbanos que partem de suas cidades de forma clandestina, abordando navios de carga, mas sem conhecer o destino final dessa viagem. Trata-se de habitantes de centros urbanos, que segundo foi apontado pela pesquisa, encontram-se em uma situao particularmente propcia migrao. Eles tambm apresentam uma forma particular de utilizar os meios de comunicao, especificamente a internet. A pesquisa comeou no local de destino desses jovens, no caso Montevidu e Maldonado, duas cidades do Uruguai, analisando as formas de integrao sociedade receptora, colocando a nfase em mbitos como a obteno de documentao e os conflitos raciais. Seguindo as redes desses jovens, a segunda fase da pesquisa foi realizada na frica Ocidental, entrevistando familiares e amigos de esses jovens, muitos dos quais tambm tentaram migrar.

    Durante os seis meses de pesquisa nesses trs pases, atravs de entrevistas em profundidade e fundamentalmente do convvio cotidiano,34 foi possvel construir uma imagem mais acabada da importncia que a ideia da migrao como o caminho preferencial para o desenvolvimento pessoal e familiar e a melhora nas condies materiais de vida tem no contexto africano. Entretanto, se o movimento e a migrao so idias amplamente espalhadas e fortemente valoradas, o fenmeno estudado apresenta caractersticas especficas que vinculam um lugar na estrutura social com o momento histrico e econmico por que atravessam os estados de frica Ocidental, o acesso aos meios de comunicao e informao e outros elementos caractersticos do processo de globalizao atual.

    Em congruncia com o apresentado por outros autores, o trabalho de campo realizado mostrou como as novas geraes urbanas, e particularmente os homens jovens, encarnam algumas das contradies mais claras dos processos histricos vividos na frica nos ltimos anos. Embora os estados tenham passado por processos de independncia nacional durante as dcadas de 1960 e 1970 e por um importante incremento das possibilidades de educao no comeo do sculo XXI, a situao atual nos lugares de origem est ainda muito longe da realizao das metas de desenvolvimento que lhes foram prometidas (KI-ZERBO, 2006). No se trata apenas das condies de vida nem das carncias materiais, mas da impossibilidade de se projetar no futuro e na comunidade de uma forma positiva, o que constitui o eixo das crticas desses jovens e que os projeta para fora do territrio. A falta de um espao social, condicionada pela ausncia de recursos econmicos e sociais para construir um lugar de prestgio comunitrio que esses jovens entendem que lhes corresponde o elemento determinante da posio desconfortvel que eles expressam.

    34Sobre este tema: Uriarte, Pilar (2011). "Migraciones, subjetividades y contextos de investigacin". Revista

    Latinoamericana de Metodologa de la Investigacin Social - ReLMIS. No 2. Ao 1. Oct. 2011 - Marzo 2012. Argentina. Estudios Sociolgicos Editora, 71 - 80.

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    Podemos falar de uma experincia comum nos centros urbanos visitados e em outros da frica Ocidental, mas a experincia dos jovens de Lagos particularmente representativa, devido s dimenses que o fenmeno de crescimento e concentrao da populao assumiu nessa cidade. Muitos dos jovens entrevistados migraram de regies rurais para Lagos e ainda conservam parte de suas famlias naquelas regies. Outros nasceram na cidade, filhos de pais e mes que chegaram de longe, ou de famlias moradoras da cidade h vrias geraes. Todos eles sintetizam em suas histrias de vida experincias de vrias geraes. Eles moram em uma cidade que tem em torno de 20 milhes de habitantes, um lugar desconhecido anos atrs para seus pais e avos. A cidade contava, em 1940, com 200.000 habitantes (FRICA POPULATION DYNAMICS, 2001).

    Tanto uma anlise da posio social desses jovens quanto de seus prprios relatos caracterizam-os como sujeitos sem um espao social onde se localizar, e sem possibilidades de constru-lo. Essa impossibilidade se desagrega em duas, estreitamente vinculadas entre si: a impossibilidade para achar um emprego estvel em concordncia com o nvel de estudos que eles alcanaram e a impossibilidade de gerar os recursos para se casar, manter uma famlia e, por tanto, tornar-se adultos.

    Os jovens formados no podem esperar achar um emprego no setor formal: o setor pblico tem estado sob ajustes estruturais por dcadas com severas limitaes na contratao de pessoal, e o setor industrial tem perdido empregos desde metade dos anos de 1980 (FALL, 1997). Como Donal Cruise OBrien salienta: Os estudantes freqentemente se comparam com as geraes precedentes, aquelas que podiam contar com um emprego no governo com sua formao universitria, e tendem a se enxergar com uma gerao abandonada (RICCIO, 2005, p. 103)

    A incluso tardia na modernidade, a qual possibilita o acesso a muitas formas de conhecimento e informao, mas no aos caminhos para se chegar s condies associadas a um estilo de vida moderno, mudou de forma radical as perspectivas e vises de mundo em poucas geraes. Entre esses jovens que tm a ideia da migrao como a nica forma de melhorar as condies de vida, encontramos uma inclinao por se informar e consumir produtos caracterizados como globais e uma importante tendncia conexo com outras pessoas da rede social j em situao de migrao. Assim, o uso de TICs e a possibilidade de migrar so dois elementos interconectados, entre os quais no podemos estabelecer uma relao de causa e resultado.

    As fontes de informao desempenham um papel significativo na formao do alcance e da composio do potencial migratrio, na medida em que elas habilitam seus receptores a comparar suas situaes de vida com as da populao no Ocidente. As fontes de informao incluem a mdia, bem como outras como redes transnacionais, o sistema educacional ou o conhecimento coletivo. A mdia pode contribuir para a homogeneizao de valores, e estes podem prover informaes sobre a situao econmica, poltica, legal e social das potenciais regies de destino (PRINZ, 2005, p. 120)

    Do outro lado, a falta de oportunidades e a vontade de migrar o que leva esses jovens a realizar um uso mais freqente e diretamente orientado a um fim do que outros grupos. Entrando no cybercaf encontramos que quase a totalidade dos usurios so homens jovens.

    Na leitura que os jovens entrevistados fazem de sua experincia, a dimenso de gnero esta diretamente vinculada s problemticas que eles identificam como prprias e que os levam a emigrar. Isso est diretamente vinculado a um uso significativo da internet. A interpretao que eles fazem das estruturas de gnero, na qual as mulheres jovens no tm maiores problemas e os homens jovens so

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    os mais prejudicados, parece bastante parcial e difcil de compartilhar. Em termos analticos, porm, possvel dizer que essa diviso de tarefas e de espaos sociais por gneros determinante na configurao do fenmeno migratrio.

    O padro de ocupao est claramente determinado pelo gnero, e, portanto, as possibilidades de obter um emprego so diferentes para homens e para mulheres. Mas muito mais do que o acesso ao emprego, a diferente valorao que se d a essas vrias atividades e a necessidade dos homens jovens de obter um emprego que lhes permita manter uma famlia o que resulta determinante na hora de decidir correr os riscos da migrao. Christian, um rapaz de 20 anos, morador do bairro Apapa, em Lagos, quem j acabou a escola e no tem emprego fixo para alm de alguns bicos ocasionais no bairro, me explica essa diferena que transcrevo no meu dirio de campo:

    Elas podem se engajar em atividades produtivas vinculadas ao domstico, como a confeco de vestimenta, produo de alimentos para o consumo local ou pequenas lojas de comestveis. Essas atividades no so igualmente valorizadas quando exercidas por homens. As atividades destinadas a eles, como o comrcio de alimentos ou cartes de telefone nas estradas, so altamente sacrificadas e de poucos ingressos, e so realizadas de forma espordica, com a finalidade de dar conta de gastos mnimos de subsistncia, mas nunca entendidas como formas de desenvolvimento pessoal. Por exemplo, Margaret, a namorada de Eric, finalizou a escola junto com ele, nesse momento se encontra trabalhando como aprendiz de costureira numa escola de confeces de roupas tradicionais no mesmo bairro. Ela no remunerada pelo seu trabalho, mas no precisa pagar taxas pela educao tcnica que est recebendo. Depois de trs anos, poder abrir sua prpria loja de confeces... Ele me explica a continuao que as mulheres tm tudo fcil, no precisam se preocupar com nada, elas ficam em casa, esperando um bom marido para lhes dar filhos.

    Em outra oportunidade, quando estvamos retornando ao hotel depois de uma visita aos jovens do bairro, caminhando rumo ao ponto de txis, no muito prximo de l, Eric e Martin, outros dois amigos de Christian me explicaram, como exemplo das diferenas entre os homens e as mulheres jovens, a forma como a internet utilizada. Segundo eles, as meninas no vo muito ao caf porque no tm muito interesse em navegar na internet, muitas delas, inclusive, no sabem como a internet funciona. Elas no realizam esforos em aprender, e nos casos em que utilizam esse meio de comunicao para coisas pouco importantes, como pesquisar sobre os programas de televiso ou fofocas sobre os artistas. Segundo eles, os meninos fazem um uso mais construtivo da informao que pode ser obtida na rede. (Dirio de campo, Lagos, novembro de 2007)

    Preocupados em pesquisar diferentes lugares e especialmente em fazer amigos no exterior, os jovens dizem pr a tecnologia a trabalhar em funo da consecuo de seus planos de migrar. A maior parte das informaes que esses jovens podem obter em relao ao mundo exterior e s formas de migrar provm tanto dos relatos de outros migrantes e retornados como das pesquisas realizadas na internet. A crtica aos usos diferenciados da rede parece coerente com os posicionamentos que eles marcam como diferenciados entre os dois sexos. Segundo esses jovens, o uso que as meninas fazem da internet que muito pouco freqente refora sua participao no mundo domstico e fundamentalmente local. Em oposio, os meninos utilizam a rede como uma forma de ampliar seu universo de referncia e suas redes sociais, ou seja, de se projetar no mundo. Os homens so, ou deveriam ser, os donos do seu destino e por isso decidem migrar e, portanto, devem procurar as condies para faz-lo.

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    O uso da tecnologia na manuteno e criao de redes sociais

    O crescente acesso aos meios de comunicao tanto nos pases de destino quanto nos de origem cada vez mais baratos e eficientes, telefone, celular, internet, transferncias eletrnicas de dinheiro, entre outros, tem tido uma importncia fundamental na forma em que as relaes pessoais se estabelecem em casos de migrao. A presena cotidiana dos migrantes no local de origem oferece uma maior incidncia na tomada de decises, seja em relao a assuntos familiares ou comunitrios ou no sentido de oferecer, aos que se encontram no lugar de origem, maiores possibilidades de exercer presso sobre quem se encontra no exterior e pedir auxlio econmico, seja para a resoluo de conflitos sociais ou problemas de sade ou para a celebrao de festividades.

    O desenvolvimento das transferncias de dinheiro instantneas facilitou e acelerou o envio de remessas. Analisando as imagens utilizadas para as campanhas publicitrias da Western Union, Juliana Braz Diaz (2010) mostra o quanto essas remessas carregam muito mais do que um valor econmico. Com o envio e recebimento de dinheiro, as relaes familiares e de amizade so atualizadas e reconfiguradas, mantendo as funes esperadas do lugar de cada um na estrutura social ou outorgando-lhes novos significados. Entretanto, no por permitirem um contato mais freqente, rpido e barato, os meios de comunicao devem ser entendidos a priori como uma mudana positiva em si mesma. Se, por um lado, a proliferao das telecomunicaes ajudou a redefinir as distncias sociais, por outro possibilitou que a comunidade de origem exera maior presso sobre esses sujeitos. Para compreender o papel que eles jogam no cotidiano dos migrantes, e na insero social dos imigrantes no local de origem e de destino, necessrio acudir ao trabalho etnogrfico olhando para o sentido e as formas que eles do a essa comunicao em cada caso.

    Sargent, Larchanche-Kim & Yatera (2007) realizaram um trabalho sobre a proliferao das telecomunicaes na frica Ocidental e na Frana, analisando as formas como migrantes localizados na Frana avaliam as possibilidades de comunicao com suas famlias:

    Enquanto parecia inicialmente (e intuitivamente) que as telecomunicaes diminuiriam o peso emocional de estar longe da famlia e do lugar de origem, tornou-se cada vez mais evidente que a facilidade em comunicar-se tambm parecia reforar as relaes de dependncia de comunidades na frica dos que migraram para a Frana. Com a proliferao de telefones, fax, acessos internet, fitas de audio e vdeo cassetes, demandas por suporte financeiro e assistncia social se tornaram mais do que nunca freqentes e urgentes (SARGENT, LARCHANCHE-KIM & YATERA, 2007, p. 4).

    Em pesquisas anteriores, a experincia de campo com estudantes de intercmbio nigerianos residentes no Brasil mostrou que eles valoram como muito importantes a presena das tecnologias de comunicao no seu cotidiano, por serem elas uma forma de manter o vnculo cotidiano, aquele que expresso como do qual mais se sente falta. Outros autores, trabalhando com estudantes de intercmbio no Brasil, tambm apontam para esse tipo de comunicao como o elemento atravs do qual se mantm o vnculo (MUNGOI, 2006). Mas necessrio chamar a ateno para o fato de que o acesso internet na frica Ocidental , para as famlias e redes sociais dos migrantes, muito menor do que para as pessoas em outras partes do mundo; portanto, o vnculo cotidiano atravs da internet poderia estar associado a pessoas numa melhor posio social, ou mesmo a pessoas da rede familiar tambm no exterior. Ao contrrio, os telefones celulares tm uma difuso comparvel do resto do mundo, e esse o meio de comunicao mais utilizado na regio.

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    Durante o perodo de campo no Uruguai, trabalhando com aqueles jovens nigerianos que posteriormente me facilitariam o acesso aos jovens em Lagos, encontramos uma situao parecida que descrevem as autoras. Os meios de comunicao fazem parte do cotidiano desses jovens, mas no necessariamente so valoradas por facilitar o contato com o local de origem. Certo grau de insatisfao em relao aos contatos estabelecidos com familiares e amigos no local de origem manifestado pelos jovens entrevistados. Segundo explicam, parece difcil para as pessoas l compreenderem as dificuldades pelas que eles passam aqui. Do outro lado, as pessoas que ficam no local de origem, para os quais os pedidos de ajuda econmica para permanecer ou para sair so imperativos, manifestam o mesmo grau de insatisfao. Eu pedi muitas vezes para eles me ajudarem. Eles nunca fizeram nada... No d para confiar, eu no queria ficar esperando...

    As tecnologias de comunicao so utilizadas de formas diferentes, o telefone celular o meio mais freqente para se manter em contato com a comunidade de origem, fundamentalmente com a famlia. O uso de internet se orienta a fins diferentes do que a comunicao com a famlia. Em muitos casos, a internet a que permite estabelecer contatos com pessoas ao redor do mundo, sejam familiares ou amigos migrando em outros lugares, seja novos contatos a se estabelecer atravs de redes sociais ou pessoalmente. Esses contatos representam uma possibilidade de continuar o movimento, e isso altamente valorado por aqueles que, tendo dado o passo mais difcil no percurso migratrio, a sada do lugar de origem em si mesma, no pensam o deslocamento como uma forma de estar no mundo, seno como um processo unidirecional nos modelos clssicos da migrao.

    Mas, assim como a internet e os celulares permitem estabelecer contatos com o mundo fora, eles tambm so utilizados nos contatos com as pessoas do cotidiano. Ao contrrio dos jovens entrevistados em Lagos, que realizam um uso especfico da internet privilegiando a oportunidade que ela oferece de obter informaes sobre como migrar, e desmerecendo outros possveis usos, esses jovens utilizam redes sociais, blogs, pginas de msica. O uso da internet est mais integrado ao cotidiano, vinculando relaes entre pessoas que convivem no mesmo espao fsico e outras no exterior. A combinao de lnguas, espanhol, ingls, broken english, mostra como os diferentes registros orientam as interaes a pessoas em diferentes locais.

    No caso dos telefones celulares, essa combinao entre contatos no exterior e lugar prprio comum entre as pessoas que entrevistei aos dois lados do oceano Atlntico. No trecho do dirio de campo que se transcreve embaixo podemos ver como o uso do telefone celular permite o contato com pessoas aqui e l.

    Sonny est bravo com Wenzel, porque ele estava com o celular quando sua namorada ligou. Proponho a Sonny que ligue de volta para ela, mas me diz que no tem crditos, que na sexta-feira comprou $300, mas gastou todos eles. Eu fico assombrada e pergunto como ele fez. Me diz que ligou para a Nigria. Primeiro tentou falar com sua me, mas o celular dela estava com problemas, a ligou para algum que deveria estar perto dela, mas no estava. Ento gastou o resto do carto falando com seus amigos.

    Pergunto a cada quanto tempo ele liga, e me diz que sempre que sente saudades, s vezes uma vez por ms, s vezes uma vez por semana. Diz que mais barato ligar do celular que do locutrio, no celular paga $ 15 por minuto e no locutrio $ 45. Com Movistar35 tambm pode mandar mensagens

    35Movistar e CTI sao duas operadoras telefnicas no pas.

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    de texto Nigria ou a qualquer outra parte do mundo. Wenzel me conta que antes tinha um CTI, mas era muito mais caro, ento ele tambm passou para Movistar, para ligar para a Nigria (Dirio de campo, Maldonado Uruguai, maio de 2006)

    Mas difcil compreender o uso das tecnologias de comunicao sem considerar os significados outorgados aos aparelhos tecnolgicos que permitem o acesso rede, como computadores e celulares, assim como cmeras fotogrficas, gravadores, reprodutores de msica entre outros. O valor desses objetos no est vinculado unicamente aos possveis usos, seno tambm a seu valor econmico e valorao simblica dadas a eles. A pose de objetos tecnolgicos e o acesso a eles valorado em si mesmo, como uma ferramenta para ampliar o leque de possibilidades da comunicao digital, mas tambm como forma de se apresentar na comunidade. As diferentes utilidades, esttica e qualidade desses aparelhos foram debatidas em diferentes instncias de campo, estabelecendo comparaes entre as coisas que podem ser compradas na Nigria e aqui, os custos e a durabilidade desses produtos. Mas junto com eles, outros elementos como a operadora contratada, os custos e a eficincia de cada uma delas para ligaes locais e internacionais tambm foram apresentados como temas importantes.

    O alto valor que esses jovens do aos objetos e ao uso da tecnologia, associado a um estilo particular de vida, aproximou experincias de vida; a deles com a minha. A utilizao de cones ou desenhos nas conversas pela internet, cmera web e microfone, participao em pginas pessoais e redes de amigos, representaram no somente ferramentas de comunicao, mas tpicos de conversa em si mesmos.

    Marcus tira uma foto de mim e pede a Wenzel para ele tirar uma de ns dois. Comeamos a falar sobre celulares. Eu mostro o meu, e me pedem para tirar uma foto, mas meu celular no tira fotos. Dos quatro, o nico que no tem um aparelho dos caros Sonny. Marcus tem um Samsung de abrir e fechar, com tela colorida e que tira fotos, tambm o de Simon tira fotos e grava som. Wenzel me conta que comprou um celular de U$S 400 (!). Pergunto para que um celular to caro, e ele me diz que era um bom aparelho. O problema que poucos dias depois ia andando na rua e um cachorro o atacou e quebrou o celular. Foi polcia, mas eles no fizeram nada. Tira da carteira a denncia policial e o pedido de oramento para o conserto do telefone. Diz que quando a atendente da loja viu o aparelho, quase comeou a chorar. (Dirio de campo, Maldonado, setembro 2006)

    Informao e consumo esto diretamente vinculados. Assim como os objetos que permitem o acesso tecnologia digital, so bens a serem consumidos. O acesso a informao habilita a um tipo especfico de consumo, envolvendo no somente consumo de objetos seno tambm um tipo especfico de consumo cultural identificado por eles como um consumo global. Assim, a relao entre informao e consumo vai muito alm do consumo irracional.

    A internet como ferramenta poltica

    Os dados analisados a continuao fazem parte da terceira fase da pesquisa de campo para tese de doutoramento realizada entre agosto de 2009 e julho de 2010 na cidade de Madri, Vivo em um mundo y quero outro: Um estudo etnogrfico comparativo sobre os discursos migratrios e as modalidades de controle dos imigrantes em Buenos Aires, Madri e Porto Alegre. As duas etapas anteriores, em Porto Alegre e Buenos Aires, j haviam sido realizadas. O objetivo da pesquisa era

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    compreender os discursos sobre as migraes por parte dos organismos de assistncia a imigrantes, incluindo principalmente ONGs, agentes governamentais, organizaes de base religiosa e associaes de imigrantes.

    Uma das associaes que fizeram parte dessa pesquisa em Madri estava orientada a trabalhar com imigrantes em situao irregular no pas e havia sido criada aproximadamente um ano antes que eu comeara freqent-la; ou seja, estava ainda em fase de implementao. O trabalho de campo implicou, como condio necessria realizao de uma pesquisa junto organizao, a participao nas atividades ali realizadas. Dai que o contato com essa associao de imigrantes significasse tambm um engajamento de minha parte no ativismo poltico que pressupunha ter um membro ativo dela.

    Esta associao estava composta por um ncleo de militantes dos direitos dos imigrantes, formado por espanhis e os prprios imigrantes, a maioria deles do Senegal, embora houvesse tambm pessoas de Ghana, Mali, Bangladesh, magrebies e latino-americanos. A associao tinha, entre seus objetivos, lutar contra a discriminao e o racismo manifesto nas continuas redadas policiais. Como objetivo primordial, entretanto, aquele que no sempre est claro, mas que no fundo movimenta o sentido de luta, est o empoderamento dos imigrantes. Contudo, o que caracteriza essa associao o descontentamento com o sistema poltico e econmico da Espanha e da Europa em geral, que leva a uma luta ampla e organizada contra o poder regulador do Estado e do mercado. Vale ressaltar que o lema da associao era Vivo en un mundo y quiero otro. Os imigrantes eram, por outro lado, o motivo de existncia da associao, considerados como la parte ms vulnerable de la sociedad.

    A centralidade da participao dos imigrantes ficou clara quando, por algum motivo que nunca foi realmente conhecido, sua assistncia s reunies diminuiu sensivelmente, ao ponto de haverem muitos mais militantes espanhis que imigrantes nas assemblias. Essa fase crtica da associao durou em torno um ms, e, durante esse perodo, muitas conjeturas foram levantadas na tentativa de encontrar as razes da ausncia dos imigrantes. Um dos membros espanhis resumiu numa frase a falta de sentido que teria a associao sem a participao dos imigrantes: Nosotros hacemos todo esto y ellos no vienen.

    Embora as reunies fossem semanais, os membros da associao costumavam manter contato dirio ou, pelo menos, freqente, j que quase todos eles, imigrantes e espanhis, so moradores do mesmo bairro. Isso no significava, entretanto, que houvesse membros mais prximos da associao e membros menos assduos, algo que podia ser observado em seus discursos sobre a migrao e sobre suas realidades cotidianas. Aqueles mais prximos da associao, aqueles cujo contato com os outros membros e com o ncleo espanhol, que era, em definitiva, quem poderia acionar com maior facilidade e rapidez os recursos legais em caso de serem presos, articulavam muito mais fluentemente um discurso sobre a situao dos imigrantes na cidade. Isso importante no porque os imigrantes dependessem da associao, e do ncleo branco dela, para ter um discurso sobre si mesmos, seno porque a associao se constitua, como revelou a pesquisa, num lugar onde elaborado um tipo de discurso muito especfico, com limites bem definidos e dificilmente extrapolveis, que combina assuntos relativos migrao Espanha com a situao da sociedade espanhola contempornea36.

    36Desenvolvo mais profundamente este tema em Daniel Etcheverry (2011).

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    preciso tambm ressaltar que existia uma diviso muito clara entre espanhis e no-espanhis na associao. Os espanhis denominavam-se a si mesmos os brancos ou espanhois, e caracterizavam os imigrantes como negros ou africanos. Esta diviso era evidente at na distribuio do espao da assemblia da associao. Os brancos sentados esquerda de quem entra, os negros no fundo, direita. Essa distribuio do espao foi se desarticulando aos poucos; ela foi trazida como algo a ser superado durante algumas reunies, o que evidenciava o carter reflexivo da associao. As reunies da assemblia da associao eram em castelhano, e sempre algum dos imigrantes mais prximos da associao traduzia lngua Welof para os que no compreendiam o castelhano fluentemente ainda. Quando, como mencionei acima, houve uma diminuio na participao dos imigrantes na associao, foram elencadas propostas que pudessem aproximar os imigrantes dela. Enquanto membro da associao, mais do que enquanto pesquisador, eu propus a formao de um grupo de intercmbio Yahoo ou uma lista de e-mails que inclusse tambm a todos os membros imigrantes da associao. Meu argumento era, no momento, que alm de servir de forma de comunicao, poderia ajudar no empoderamento dos sujeitos imigrantes, o que era, em princpio, o fim ltimo de sua existncia. Dessa maneira, imigrantes e espanhis poderiam estar em contato durante a semana e, no caso de no poder assistir reunio semanal, no perderiam o contedo.

    A primeira reao dos membros nacionais foi o silncio perante a proposta. Posteriormente, em conversas fora da reunio, os argumentos contra a criao de uma lista de e-mails variavam entre que a criao de uma lista podia colocar em risco a privacidade das informaes e assuntos que eram debatidos na reunio e a negao da possibilidade de que os imigrantes pudessem sequer saber usar a internet e a lngua espanhola para se comunicar. Vrios debates sucederam-se at que finalmente foi criada uma lista de e-mails para a comunicao diria. Restava agora ver se os imigrantes fariam uso dela e como, j que o objetivo era incentivar a comunicao entre todos os membros da associao.

    A lista de e-mail passou a ser usada por imigrantes e nativos. Mais do que isso, veio tona que alguns dos imigrantes j usavam as redes sociais e os que no o faziam at ento passaram a faz-lo. Conseqentemente, o Facebook e o Twitter passaram a ser mais uma forma de comunicao, com um carter diferente, do da lista de e-mails. O que mais me chamou a ateno que as redes sociais, que implicam a criao de um perfil e serviriam para comunicar-se tambm com seus parentes e amigos em seus pases de origem, eram utilizadas em espanhol.

    O domnio da lngua escrita era muito melhor do que eu esperava. Entretanto, no todos os imigrantes usavam a lista de e-mail com a mesma intensidade. A proximidade associao fazia com que o uso da lista fosse mais intenso. De fato, as pessoas mais prximas, aquelas que tm mais convivncia com o ncleo branco da associao, trocavam e-mails com mais freqncia.

    Tambm foi uma surpresa para mim, que j estava de volta ao Brasil, o domnio no s da lngua, seno tambm dos cdigos de interao escrita, como o uso de @ para referir-se a homens e mulheres e o uso de abreviaes prprias dos meios digitais. Transcrevo, a seguir, alguns trechos de e-mails escritos por imigrantes senegaleses e trocados na lista. Das muitas mensagens que tm circulado desde sua criao, estes trechos foram escolhidos e recortados de maneira a no comprometer os nomes nem as informaes. Os nomes prprios e informaes comprometedoras foram substitudos por um parntese (...):

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    yo me parece super interesante y es algo k esperaba hace ya bastante tiempo por donde puedo mejorar mi ingles, asi k me voy a apuntar incha allah,animense chavales y es un tesoro mas nojejejeje [] gracias a tod@s de cerca u de lejano que esten luchando por una vida justa e mejor de los inmigrantes sobre todo de los manteros "mbolo moy dole " [] me alegro mucho de que (.. )ya esta fuera del injusto( c.i.e ) que salga tambien (.) que no se interne nadie mas de nosotros . tengo mucho ganas de vern@s tod@s junt@s Gracias (.) x la noticia de (.) , Es muy buena noticia ojal que habr + novedades! Abrzs muxos [] estoy intentando llamar a () pero no me lo coge... ayer por la noche hable con (.) y me dijo que vena una amiga suya a visitarle... podrais ir otro da? espero que veais este mensaje, si alguien que tiene el telefono de (.)lo ve, que me lo mande y asi la llamo...37

    Como apontei acima, so os imigrantes mais ativos da associao aqueles que recorrem lista com maior freqncia, embora tambm sejam os que mais se comunicam por telefone e pessoalmente com os outros membros. Isso parece inserir-se numa lgica de reciprocidades e de retroalimentao das interaes.

    Os membros nacionais brancos da associao so pessoas de entre 25 e 50 anos aproximadamente, quase todos com formao acadmica ou tcnica, embora no incio de carreira ou desempregados ou sem grandes recursos econmicos; ou seja, so pessoas educadas, com capital cultural considervel, embora isso no se reflita num acmulo de capital econmico.

    Os migrantes africanos, membros negros da associao no so diferentes. Eles podem no ter dinheiro para sobreviver dignamente, em conseqncia da falta de documentos que lhes permitissem conseguir trabalho e da crise econmica que vive a Espanha em geral. No convvio com eles na associao e nos momentos de lazer que compartilhamos pude perceber que se trata de pessoas com uma grande capacidade de transitar entre sua sociedade de origem e a de recepo. Apresentaram formas de vestir aprimoradas, maneiras sofisticadas na interao cotidiana com os outros membros e uma interao conscienciosa, nos termos do que era exposto nas reunies da associao como algo desejvel, com o bairro.

    Esta relao com o espao do bairro especialmente importante na medida em que, de acordo com as observaes do trabalho de campo, uma das contribuies importantes destes imigrantes associao. De fato, a problemtica migratria em Madri passa, por entre outros assuntos, pelo uso dos espaos pblicos. Desde o ingresso da Espanha Unio Europia, a cidade vem passando por transformaes que nem sempre so bem vistas por todos. A substituio de reas verdes de lazer por concreto, a retirada dos bancos das praas e a colocao de cmaras de vdeo nas ruas e parques

    37O texto apresentado na lngua original que permite observar os usos de abreviaes e smbolos.

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    vm surpreendendo e angustiando a populao, e isso ficou claro durante muitas conversas fora das reunies da associao, especialmente quando, aps as reunies semanais, freqentvamos os bares do bairro para um momento de laser.

    Algumas pessoas culpam os imigrantes por isso, argindo que a criminalidade que desencadeou essas decises por parte do governo municipal responsabilidade dos imigrantes. Outros, como os membros da associao em que trabalhei, vm nos imigrantes um reforo para o estilo de vida que os madrilenhos esto perdendo; a convivncia na rua, nas portas das casas, nas esquinas e parques reforada pela presena destes nuevos vecinos, os quais tm hbitos de convivncia semelhantes aos que eles esto prestes a perder. Do lado dos nacionais, o apelo ao migrante como uma possibilidade para o resgate ou a manuteno dos bons hbitos madrilenhos de convivncia pode ser observada a continuao. Uma dos membros da associao deixa isso claro numa discusso que tivemos quando eu defendia a criao da lista de e-mails:

    T llegas aqu y quieres cambiar todo. Es que no te das cuenta que aqu las cosas no funcionan as? Tu vas a quedarte un tiempo y luego te marchas, no eres de aqu ni del barrio, y aqu las relaciones son las del da a da, en la calle, uno que encuentra al otro en la calle. Y t vienes queriendo una lista de e-mails. Pero no es as que funciona. Pues yo te lo digo que la mayora de ellos ni sabe lo que es una lista de e-mail, o si lo saben no la utilizan.

    No contexto das transformaes pelas que a cidade est passando, a fala desta moa expressa um temor de que as relaes que se tecem no dia-a-dia sejam substitudas pelos meios de comunicao, menos pessoais. A possibilidade de que os migrantes possam partilhar, do mesmo modo que os locais das formas modernas de comunicao no caso uma lista de emails-, em oposio s tradicionais a ocupao do espao urbano e o contato cara a cara, no somente perigosa, mas tambm inimaginvel. Perigosa porque ela, de alguma forma, retira o imigrante do lugar que lhe est sendo designado, o do buen vecino que contribui para conservar o espao, mesmo que isso seja algo que muitos gostaramos que acontecesse; inimaginvel porque, depois de tudo, o africano no se encaixa dentro do perfil do cidado do mundo que a noo de usurio das novas tecnologias da comunicao faz questo de enaltecer e que apresentado nos meios de comunicao de massa como a forma de se inserir na sociedade contempornea.

    Entretanto, isso no foi o que aconteceu. ainda muito cedo para afirmar que o uso das redes sociais e lista de e-mails por parte destes jovens no afetou seu convvio cotidiano, mas tudo indica que essas tecnologias somaram-se s interaes cotidianas, sem substitu-las.

    Mais do que isso, o uso da rede em proximidade com a associao possibilitou que, mediante o que se poderia chamar de uma ao poltica38, os migrantes elaborassem mais facilmente um discurso positivo sobre si mesmos, de forma a enfrentar os desafios da sobrevivncia e principalmente o constante assdio da policia. O uso da internet se insere nas relaes entre os ncleos branco e negro da associao como um elemento agregador, como o deixam claro as mensagens de correio eletrnico apresentadas acima. Em se tornando um elemento agregador que acrescenta interao diria,

    38 Ema (2007) define a ao poltica em torno de trs eixos: 1) A tenso entre a poltica e o poltico, ou seja, o conflito

    entre as prticas e lgicas que buscam a ordem e outras que a subvertem; 2) o deslocamento entre o social naturalizado e o poltico controverso e 3) o evento poltico propriamente dito, no qual os dois extremos dos eixos anteriores entrelaam-se subvertem-se simultaneamente.

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    acrescenta uma dimenso do uso da rede por parte de imigrantes diferente daquela segundo a qual a internet um meio de salvar as distncias entre o lugar de chegada e o de origem.

    O imigrante no hispano-falante mostra que capaz de usar a lngua local e que, apesar de no dominar completamente as estruturas gramaticais ou os verbos, capaz de se apropriar e resignificar os cdigos locais de comunicao. Dessa maneira, o imigrante, que na viso do nativo o espanhol neste caso- poderia no ter a capacidade de usar a internet ou de se comunicar na lngua local, passa a colocar o nacional frente necessidade de repensar sua relao com o outro que divide o espao com ele. Diferentemente da experincia de colonizao que a lngua francesa ou o ingls podem ter significado, se olharmos do ponto de vista da histria, na qual o colonizador imps sua lngua sem se apropriar da lngua dos habitantes locais, a apropriao da lngua espanhola em territrio espanhol de maneiras que extrapolam a comunicao mais imediata cara a cara, permite um espao de autonomia onde o criar e o resignificar so, ao mesmo tempo, sedutores e perigosos. Ao escrever um e-mail ou um depoimento em uma rede social, o imigrante no est frente ao nativo que vai acenar indicando que entendeu o que ele quis dizer nem corrigir sua fala, como costuma acontecer na comunicao oral. Ele ir se valer sozinho de sua capacidade interpretativa e criativa para transmitir sua mensagem, contando com a possibilidade de um retorno rpido, mas no imediato. Dessa maneira, o nacional se v na necessidade de repensar seus prprios cdigos atravs dos olhos do outro, e considerar que esse outro no mais algum que ir aceitar o que lhe est sendo dado apenas, seno algum que imprimir no local uma marca que escapa ao controle do nacional.

    Assim, os espaos da lista de e-mail e das redes sociais tornam-se lugares de criao que permitem a comunicao num tempo quase real, rpido o suficiente para refazer a mensagem e lento o suficiente para que esta no seja banalizada e caia no esquecimento do interlocutor local. Por providenciar assim um espao de interlocuo que permite a criao, o uso da internet por parte de imigrantes imprime no local pequenas reconfiguraes da lngua e da cultura locais. E o que a cultura seno a capacidade de criar cultura?

    Nesse sentido, o uso da internet tem o potencial de contribuir para um entendimento inverso da dominao. Ao sair do Senegal, eles podem se apropriar de uma outra lngua, mostrando assim sua flexibilidade e capacidade de transitar entre culturas. No processo de apropriao iro deixar as marcas da migrao na lngua local.

    Por isso o uso da internet por parte de imigrantes pode ser pensado como potencialmente ameaador, e embora nunca tivesse sido expresso dessa maneira, a resistncia que os membros espanhis da associao colocaram inicialmente ao uso da internet pode ser pensada como uma forma de negar aos imigrantes um tipo de agncia que est fora do seu controle. O imigrante no est agora, no espao do bairro, preenchendo as necessidades e vazios criados pelas transformaes pelas que passa a cidade, por exemplo; est criando um espao de interao onde ele tambm determina algumas regras.

    Se, por um lado, a proximidade associao significa uma possibilidade de empoderamento, pelo outro, a associao tende tambm a encaixar o imigrante dentro dos vazios que determinadas transformaes sociais vo deixando, dessa forma colocando constrangimentos sua mobilidade; ou seja, h um lugar predeterminado para o imigrante e ele deve se encaixar nele. O espao providenciado pelo uso da internet como meio de comunicao rompe, de alguma forma, com esses constrangimentos.

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    Assim como no imaginrio da associao, o migrante continua no seu lugar distanciado da sociedade de destino, no se representando a si mesmo, mas sim uma falha concreta e especfica que os nativos querem denunciar. Nesse caso, a possibilidade de que os migrantes possam vir a utilizar a rede para se organizar e se comunicar com a sociedade receptora no seus prprios termos e na sua prpria lngua no sequer imaginada, mas negada na sua possibilidade, na medida em que no esse o lugar destinado aos migrantes. O fato de que muitos deles utilizaram com anterioridade redes sociais, s vem tona depois de que a possibilidade de gerar uma lista de e-mails foi concretizada.

    A utilizao no vigiada da lngua do pas de chegada rompe tambm com o constrangimento que faz do imigrante um ser de dois mundos separados, como se nada houvesse no meio e como se no processo de deslocamento nada se ganhasse nem se perdesse. Essa perspectiva dualista permite fixar o imigrante em dois lugares e a duas formas de se relacionar com o mundo, uma na sua casa, outra na situao de imigrante. Perceber que ele tem um espao de autonomia dentro do lugar de chegada torna-o menos previsvel. No mais aquele que recebe passivamente a cultura que lhe oferecida no lugar de chegada e oferece, em retorno, manifestaes pontuais e palatveis de sua cultura de origem; agora algum que se apropria de sua experincia de deslocamento. Na perspectiva dos locais, o outro imigrante poder no mais ser algum que estava l e veio para c, seno algum que tem uma histria e uma narrativa sobre si mesmo, e que se baseia menos na categoria de outro que lhe foi conferida, podendo assim querer participar da interao de maneira independente e em p de igualdade.

    A modo de concluses

    Muito freqentemente, os estudos sobre meios de comunicao e migraes referem s formas como os primeiros permitem reconfigurar relaes e aproximar pessoas em situao de deslocamento. Esses trabalhos so muito importantes e permitem obter diferentes formas de compreender o fenmeno migratrio. A digitalizao das comunicaes permite diferentes formas de aproximao de pessoas morando em continentes diferentes. Porm, muitas vezes esses trabalhos colocam ao migrante em uma posio cristalizada, que enxerga o processo migratrio desde uma perspectiva unidireccional: O migrante desloca-se de uma regio pobre a uma mais desenvolvida, muda de um contexto tradicional para um moderno. Nesse novo local, deve permanecer no lugar que a sociedade receptora lhe outorga.

    A incorporao das novas tecnologias, prprias da modernidade, e por tanto da sociedade receptora, deveriam ser utilizados pelo migrante para se comunicar com o lugar de origem. O ingresso modernidade a partir do uso das tecnologias de comunicao no um ingresso integral, j que ele utilizado unicamente como ponte para emendar o afastamento.

    Os dados de campo confrontam a perspectiva e mostram como o uso de redes utilizado de forma integral, como uma possibilidade de se representar perante a sociedade de origem e tambm perante a sociedade de acolhida. Uma ferramenta para se pensar enquanto sujeitos individuais e coletivos. Sujeitos modernos e fundamentalmente sujeitos integrais, com diferentes formas de relacionamentos sociais y registros para alm de sua condio de migrantes no local de destino.

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    Quando samos da perspectiva da sociedade receptora e olhamos para a experincia dos migrantes, antes ou depois de sair do local de origem, podemos ver que a utilizao dos meios de comunicao no diz necessariamente respeito sua condio de migrantes; trata-se de um uso integrado, um meio que permite estabelecer relaes sociais mais ou menos intensas com as pessoas que moram perto e que encontramos no dia a dia, assim como com aqueles mais distantes, no local de origem ou em outros.

    No primeiro apartado, mostramos como os diferentes usos dados internet podem nos orientar para compreender os papeis de gnero e as leituras desses papeis realizadas pelos jovens para explicar sua necessidade de migrar. O uso que eles realizam da internet caracterstico do lugar social que lhes outorgado e do que eles procuram para se mesmos. No segundo caso apresentado, em Uruguai, vimos como os meios de comunicao e outras tecnologias so usadas para se comunicar com o local de origem e para tender relaes com pessoas da sociedade de destino e no exterior. Na terceira experincia que analisa as formas de participao poltica de migrantes e nacionais em uma organizao social em Madri, vemos o quanto as listas de e-mail e redes sociais na internet podem se converter em uma ferramenta para re elaborar seu lugar na sociedade global, na cidade de acolhida e dentro da organizao da qual fazem parte. Recuperando o conceito de ao poltica j citado, estas novas tecnologias apresentam potenciais ainda inexplorados de reestruturao social; ainda que sejam vendidas para ns, e freqentemente pensadas, apenas enquanto uma maneira de incluso nos moldes de uma sociedade capitalista consumista, a capacidade dos sujeitos de agenciar sua insero nos coloca frente necessidade de reconsiderar seus usos.

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