do códice ao monitor: a trajetória do escrito

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  • 8/22/2019 Do cdice ao monitor: a trajetria do escrito

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    Do codige ao monitor:A trajetria do escritoR O G E R C H A R t i E R

    livro j no exerce o poder de que disps antigamente, jno o mestre de nossos raciocnios e sentimentos emOace dos novos meios de informao e comunicao, deque doravante dispomos" (1). Essa concluso de Henri-Jean Martinconstituir o ponto de partida de minha reflexo, a qual pretende detec-tar e designar os efeitos de uma revoluo, temida por alguns, aplau-dida por outros, dada como inelutvel ou simplesmente apontada comopossvel, ou seja, a alterao radicaldas modalidades de produo, trans-misso e recepo do escrito. Dissociados dos suportes em que costuma-mos encontr-los (o livro, o jornal, o peridico), os textos, de agora emdiante, estariam fadados a uma existnciaeletrnica: compostos no com-putador ou numerizados, transmitidos por procedimentos teleinform-ticos, eles alcanam um leitor, que os apreende num monitor.Ao abordar esse futuro (que, talvez, j seja um presente), em que

    os textos so separados da forma com que o livro se imps ao Ocidente,h dezessete ou dezoito sculos, meu ponto de vista ser duplo. Ser ode um historiador da cultura escrita, particularmente atento a reunirnuma mesma histria o estudo dos textos (cannicos ou comuns, lite-rrios ou desprovidos de qualidade), bem como dos suportes que ostransmitiram e disseminaram, das leituras desses textos, de seus usos einterpretaes. Ser, igualmente, o ponto de vista de um dos partici-pantes (em nvel modesto) do projeto da Bibliothque de France. Comefeito, um dos eixos essenciais desse projeto a constituio de umimportante acervo de textos eletrnicos, os quais podero ser transmi-tidos distncia e ser objeto de um novo tipo de leitura, possibilitadapelo posto de leitura assistido por computador.Minha primeira pergunta ser a seguinte: como, na longa histriado livro e da relao ao escrito, situar a revoluo anunciada, mas, naverdade, j iniciada, que se passa do livro (ou do objeto escrito), tal qualo conhecemos, com seus cadernos, folhetos, pginas, para o texto ele-trnico e a leitura num monitor? Para responder a essa interrogao,

    cabe distinguir claramente trs registros de mutaes, cujas relaes fi-cam ainda por estabelecer. A primeira revoluo tcnica: ela modifica

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    totalmente, nos meados do sculo XV, os modos de reproduo dostextos e de produo dos livros. Com os caracteres mveis e a prensa deimprimir, a cpia manuscrita deixa de ser o nico recurso disponvelpara assegurar a multiplicao e a circulao dos textos. Da, a nfasedada a esse momento essencial da Histria ocidental, momento consi-derado como assinalando o aparecimento do livro (L 'apparition du livre,esse o ttulo do livro pioneiro de Lucien Febvre e Henri-Jean Martin,publicado em 1958) (2), ou caracterizado como Printing Revolution(ttulo da obra de Elizabeth Eisenstein, editado em 1983) (3).

    Hoje, houve notvel deslocamento da ateno, salientando-se oslimites dessa primeira revoluo. Em primeiro lugar, claro que, emsuas estruturas fundamentais, o livro no modificado pela inveno deGutenberg. Por um lado, pelo menos at mais ou menos 1530, o livroimpresso continua muito dependente do manuscrito: imita-lhe as pagi-naes, escritas, aparncias; acima de tudo, exige-se que o acabamentodo livro seja obra da mo do iluminador que pinta letras iniciais ador-nadas ou historiadas e miniaturas; a mo do corretor, ou emendator, queacrescenta sinais de pontuao, rubricas e ttulos; a mo do leitor, queinscreve na pgina notas e indicaes marginais (4). Por outro lado, emais fundamentalmente, depois como antes de Gutenberg, o livro umobjeto composto de folhas dobradas, reunidas em cadernos, os quais,por sua vez, so encadernados. Nesse sentido, a revoluo da imprensano , de forma alguma, aparecimento do livro. Doze ou treze sculosantes da nova tcnica, o livro ocidental j encontrara a forma que per-maneceria idntica na cultura do impresso.

    Um olhar lanado para o Leste, para os lados da China, da Coria,do Japo traz uma segunda razo para reavaliara revoluo da imprensa.Ele, de fato, revela que a utilizao da tcnica prpria do Ocidente no condio necessria existncia de uma cultura, no somente de umacultura escrita, mas tambm de uma cultura impressa, com base am-pla (5). No Oriente, sem dvida, os caracteres mveis so conhecidos;l, alis, que foram inventados e utilizados bem antes de Gutenberg:caracteres de argila cozida j so utilizados na China no sculo XI e, nosculo XIII, na Coria, textos so impressos com caracteres metlicos.Mas, diferena do Ocidente depois de Gutenberg, a utilizao doscaracteres mveis permanece, no Oriente, limitada, descontnua, con-fiscada pelo imperador ou pelos mosteiros, o que, assim mesmo nosignifica a ausncia de uma cultura do impresso de larga envergadura. Oque a tornou possvel foi outra tcnica, a xilografia, ou seja, a gravuraem madeira de textos impressos em seguida por frico. Atestada desdeos meados do sculo VIII, na Coria, e, no fim do sculo IX, na China,a xilografia propicia, na China das dinastias Ming e Qing, assim como

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    no Japo dos Tukogawa, uma circulao muito ampla do escrito im-presso, com empresas de edies comerciais independentes dos poderes,um a rede densa de livrarias e gabinetes de leitura, gneros popularesamplamente divulgados.No se deve, portanto, medir a cultura impressa das civilizaes

    orientais pela mesma medida da tcnica ocidental, ou seja, como queressaltando as lacunasda primeira.A xilografia tem suas vantagens pr-prias, est mais bem adaptada do que os caracteres mveis a lnguascujos traos marcantes so o grande nmero de caracteres, ou como noJapo, a pluralidade das escritas; ela mantm uma ligao forte entre aescrita manuscrita e a impresso, uma vez que as pranchas gravadas oso a partir de modelos caligrafados; pela prpria resistncia das ma-deiras, conservadas de forma duradoura, ela permite a adequao datiragem demanda. Uma constatao como essa deve conduzir a umaapreciao mais justa da inveno de Gutenberg. Fundamental, ver-dade, essa no a nica tcnica capaz de assegurar uma disseminao,em grande escala, do livro impresso.

    A revoluo do nosso presente , com toda certeza, mais que a deGutenberg. Ela no modifica apenas a tcnica de reproduo do texto,mas tambm asprprias estruturas e formas do suporte que o comunicaa seus leitores. O livro impresso tem sido, at hoje, o herdeiro do ma-nuscrito: quanto organizao em cadernos, hierarquia dos formatos,do libro da banco ao libellus; quanto, tambm, aos subsdios leitura:concordncias, ndices, sumrios etc. (6). Com o monitor, que vemsubstituir o cdice, a mudana mais radical, posto que so os modosde organizao, de estruturao, de consulta do suporte do escrito quese acham modificados. Uma revoluo desse porte necessita, portanto,outros termos de comparao.

    A histria longa da leitura fornece-nos elementos essenciais. Suacronologia organiza-se a partir da identificao de duas mutaes fun-damentais. A primeira d nfase a uma transformao da modalidadefsica, corporal do ato de leitura e insiste na importncia decisiva dapassagem de uma leitura necessariamente oralizada, indispensvel aoleitor para a compreenso do sentido, a uma leitura possivelmente silen-ciosa evisual (7).Tal revoluo diz respeito longa Idade Mdia, j quea leitura silenciosa, inicialmente restrita aos scriptoria monsticos entreos sculos VII e XI, chega s escolas e s universidades no sculo XII e,depois, s aristocracias legais, dois sculos mais tarde. Sua condio aintroduo, pelos escribas irlandeses e anglo-saxnicos da Alta IdadeMdia, da separao entre as palavras; seus efeitos so verdadeiramenteconsiderveis, abrindo-se a possibilidade de ler com mais rapidez e, por-tanto, de ler mais textos e textos mais complexos.

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    Uma perspectiva como essa sugere duas observaes. Primeiro, ofato de o Ocidente medieval ter sido obrigado a conquistar a competn-cia da leitura emsilncio e com os olhos, no deve nos levar conclusode que esta inexistiu na Antigidade grega e romana. Nas civilizaesantigas, em se tratando de populaes para as quais a lngua a mesmaque a lngua vernacular, a ausncia de separao entre as palavras noprobe, de modo algum, a leitura silenciosa (8). prtica, comum naAntigidade, da leitura em voz alta, para os outros e para si mesmo, nodeve, portanto, ser atribuda falta de domnio da leitura com os olhosapenas (essa provavelmente praticada no mundo grego desde o sculoVI a.C.) (9), mas a uma conveno cultural que associa fortemente otexto e a voz, a leitura, a declamao e a escuta (10). Tal trao subsiste,alis, na poca moderna, entre os sculos XVI e XVIII, quando ler emsilncio tornou-se uma prtica comum dos leitores letrados. A leitura emvoz alta permanece, ento, o cimento fundamental das diversas formasde sociabilidade: familiares, eruditas, pblicas, mundanas, e o leitor vi-sado por grande nmero de gneros literrios um leitor que l paraoutros ou um leitor que ouve ler. Na Castela do Sculo de Ouro, leer eoir, vere escuchar so quase sinnimos e a leitura em voz alta a leituraimplcita de gneros bastante diversos: todos os gneros poticos, a co-mdia humanista (lembremo-nos da Celestina), o romance em todassuas formas, at ao Quixote, a prpria Histria (11).

    Segunda observao em forma de pergunta: No que se deveriadar mais importncia s funes do escrito do que a seu modo de leitu-ra ? Sendo afirmativa a resposta, uma censura essencial tem de ser colo-cada no sculo XII, quando se atribui ao escrito no apenas uma funode conservao e memorizao, j que composto e copiado com vistasa uma leitura, entendida como um trabalho intelectual. A um modelomonstico da escrita sucede, nas escolas e universidades, um modeloescolstico. No mosteiro, o livro no copiado para ser lido, ele tesou-riza o saber como um bem patrimonial da comunidade e veicula usosantes de tudo religiosos: a ruminatio do texto, verdadeiramente incor-porado pelo fiel, a meditao, a orao. Com o aparecimentodas escolasurbanas, tudo muda: o lugar de produo do livro, que passa do scripto-rium loja do stationnarius; as formasdo livro, com a multiplicao dasabreviaturas, indicaes, glosas e comentrios, enfim o prprio mtodode leitura, que j no participao no mistrio da Palavra, mas decifra-mento regulado e hierarquizadoda letra (littera), do sentido (sensus) eda doutrina (sententia) (12). As conquistas da leitura silenciosa nopodem, portanto, ser separadas da mutao maior que transforma aprpria funo da escrita.Outra revoluo da leitura a que diz respeito aoestilo de leitura;

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    na segunda metade do sculo XVIII, leitura intensiva haveria de su-ceder outra, qualificada de extensiva (13). O leitor intensivo con-frontado com um corpus limitado e fechado de textos lidos e relidos,memorizados e recitados, ouvidos e sabidos de cor, transmitidos de ge-rao a gerao. Os textos religiosos, e em primeiro lugar a Bblia nospases protestantes, so os alimentos privilegiados desta leitura, forte-mente marcada pela sacralidade e autoridade. O leitor extensivo, o daLesewut, da nsia da leitura que toma conta da Alemanha no tempo deGoethe, um leitor totalmente outro: ele consome muitos e variadosimpressos; l-los com rapidez e avidez, exerce em relao a eles umaatividade crtica que, agora, submete todas as esferas, sem exceo, dvida metdica.

    verdade que semelhante diagnstico tem sido questionado. Defato, no tempo da leitura intensiva, h muitos leitores extensivos: lem-bremo-nos dos letrados humanistas,que acumulamas leituras para com-por seus cadernos de lugares-comuns (14). E o inverso tambm ver-dade e mais ainda: no momento mesmo da repoluo da leitura, comRousseau, Goethe e Richardson, que realmente, desdobra-se a maisintensiva das leituras, aquela por que o romance apodera-se de seu leitor,o prende e governa, como o fazia antes o texto religioso (15). Poroutro lado, para o grupo mais extenso dos leitores, para os mais humil-des os dos ckapbooks, da Bibliothque bleue ou da literatura de cordel,a leitura conserva, de forma duradoura, os traos de uma prtica rara,difcil, que supe memorizao e recitao de textos, os quais, devido aseu nmero restrito, se lhes tornam familiares, sendo, na verdade, antesreconhecidos que descobertos.

    Tais precaues necessrias , que levam a abandonar a visode uma oposio rgida demais entre os dois estilos de leitura, nem porisso invalidamas concluses que situam na segunda metade do sculoXVIII um a revoluo da leitura, cujos suportes so detectados, de formaclara, na Inglaterra, na Alemanhae na Frana: assimo crescimento daproduo do livro, a multiplicao e a transformaodos jornais, o su-cesso dos pequenos formatos, a diminuio do preo dos livros graass contrafaes, a multiplicao das sociedades de leitura (bookclubs,Lesegesellschaften, cabinets de lecture). Descrita como uma ameaa or-dem poltica, um narctico ( a palavra usada por Fichte) ou como umdesregramento da imaginao e dos sentidos essa nsia de leitura chamaa ateno dos observadores contemporneos. Preenche, sem dvida al-guma, um papel essencial nos desligamentos crticos que, por toda aparte na Europa, especialmente na Frana, afastam os sditos do prn-cipe e os cristos de suas igrejas.

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    A revoluo do texto eletrnico ser, ela tambm, uma revoluoda leitura. Ler num monitor no o mesmo que ler num cdice. Se verdade que abre possibilidades novas e imensas, a representao ele-trnica dos textos modifica totalmente a condio destes: materiali-dade do livro, elasubstitui a imaterialidadede textos sem lugar prprio;s relaes de contigidade estabelecidas no objeto impresso, ela ope alivre composio de fragmentos indefinidamente manipulveis; apreenso imediata da totalidade da obra, viabilizada pelo objeto que acontm, ela faz suceder a navegao de muito longo curso, por arqui-plagos textuais sem beira nem limites (16). Essas mutaes coman-dam, inevitvel e imperativamente, novas maneiras de ler, novas relaescom o escrito, novas tcnicas intelectuais. Se as precedentes revoluesda leitura ocorreram em pocas nas quaisas estruturas fundamentais dolivro no mudavam,no o que se d no nosso mundo contemporneo.A revoluo iniciada , antes de tudo, uma revoluo dos suportes e dasformas que transmitem o escrito. Nesse ponto, ela tem apenas um pre-cedente no mundo ocidental: a substituio do volume pelo cdice, dolivro em forma de rolo, nos primeiros sculos da era crist, pelo livrocomposto de cadernos juntados.

    A respeito desta revoluo primeira, a qual inventa o livro queainda o nosso, trs questes devem ser levantadas (17). Primeiro, ade sua data. Os dados arqueolgicos disponveis, fornecidos por escava-es efetuadas no Egito, permitem chegar a vrias concluses. Por umlado, nas comunidades crists que, de forma precoce e macia, o rolovai sendo substitudo pelo cdice: desde o sculo II, todos osmanuscri-tos da Bblia encontrados so cdices escritos em papiros; 90% dostextos bblicos e 70% dos textos litrgicos e hagiogrficos dos sculosII-IV que chegaram at ns apresentam-se na forma do cdice. Poroutro lado, com sensvel defasagem que os textos gregos, literrios oucientficos, adotam a nova forma do livro. preciso esperar o perododos sculos III e IV para que o nmero de cdices se iguale com o dosrolos. Mesmo se a datao dos textos bblicos sobre papiros tem sidoquestionada e, por vezes, retardada, at o sculo III, permanece forte olao que vincula ao cristianismo a preferncia dada ao cdice.

    Uma segunda questo a das razes da adoo desta forma novado livro. Os motivos classicamente apontados, embora devam ser dealgum modo reavaliados, conservam sua pertinncia. A utilizao dosdois lados do suporte reduz, semdvida, o custo de fabricao do livro,mas ela no foi acompanhada por outras possveis economias: diminui-o do mdulo da escrita, estreitamento das margens etc. Por outrolado, o cdice permite, incontestavelmente, reunir uma grande quan-tidade de texto num volume menor, mas tal vantagem pouco foi apro-

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    veitada de imediato: nos primeiros sculos de sua existncia, os cdicespermanecem de tamanho modesto, comportam menos de centro e cin-qenta folhetos, ou seja, trezentas pginas. S a partir do sculo IV, atmesmo do sculo V, que os cdices tornam-se mais grossos e absor-vem o contedo de vrios rolos. Finalmente, inegvel que o cdiceajuda na localizao do texto, agiliza seu manejo: possibilita a paginao,a criao de ndices e concordncias, a comparao de uma passagemcom outra, ou, ainda, permite ao leitor que o folheia percorrer o livropor inteiro. Da, a adaptao da forma nova do livro s necessidadestextuais prprias do cristianismo, ou seja, a confrontao dos Evange-lhos e a mobilizao, para os fins da pregao, do culto ou da orao, decitaes da Palavra sagrada. Mas, fora dos ambientes cristos, o domnioe a utilizao das possibilidades oferecidas pelo cdice no se impemseno lentamente. Parece que aqueles que preferencialmente adotam ocdice so aqueles que no pertencem elite culta a qual permanecefiel, de modo duradouro, aos modelos gregos, portanto ao volume etal adoo diz respeito primeiro a textos situados fora do cnone lite-rrio: textos escolares, obras tcnicas, romances etc.

    Entre as conseqncias da passagem do rolo ao cdice, duas me-recem ateno especial. Por um lado, se o cdice impe sua materiali-dade, nem por isso apaga as designaes ou representaes antigas dolivro. Em a Cidade de Deus de Santo Agostinho, por exemplo, se otermo cdice denomina o livro enquanto objeto fsico, a palavra lber usada para assinalaras divises da obra, conservando-se assima mem-ria da antiga forma, j que o livro., que, neste caso, a unidade dodiscurso (a Cidade de Deus comporta vinte e duas dessas unidades),correspondente quantidade de texto que podia conter um rolo (18).Da mesma forma, as representaes do livro nas moedas e nos monu-mentos, na pintura e na escultura, permanecem duravelmente ligadasaovolume, smbolo de saber e autoridade, apesarde o cdice j ter impostosua materialidade e obrigado a novas prticas de leitura. Por outro lado,para ser lido e, portanto, desenrolado um rolo deve ser seguradocom as duas mos: da, como o mostram afrescos e baixos-relevos, aimpossibilidade para o leitor deescrever e ler ao mesmo tempo, e conse-qentemente, a importncia do ditado em voz alta. graas ao cdiceque o leitor conquista a liberdade: colocado numa mesa ou plpito, olivro reunido em cadernos j no exige uma total mobilizao do corpo,proporciona maior independncia ao leitor que pode ler e escrever aomesmo tempo, passar, a seu bel prazer, de uma pgina a outra, de umlivro a outro. com o cdice, igualmente, que se inventa a tipologiaformal que associa formatos e gneros, tipos de livros e categorias dediscursos, e, portanto, instala-seo sistema de identificaoe localizao

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    dos textos, do qual a imprensa ser herdeira e que conservamos atehoje (19).Por que esses olhares para trs, por que, especialmente, a atenodada ao nascimento do cdice? Provavelmente porque a compreenso eo domnio da revoluo eletrnica de amanh (ou de hoje), dependeamplamente de sua concreta inscrio em uma histria de longa dura-o, a qual permite tomar plenamente conscincia de todas as possibi-lidades inditas, abertas pela numerizao dos textos, sua transmissopela teleinformtica e sua recepo em computador. No mundo dostextos eletrnicos ou, mais exatamente, da representao eletrnica dostextos, duas sujeies, tidas at agora como imperativas, podem ser eli-minadas. Primeira sujeio: a que limita rigorosamente as possveis in-tervenes do leitor no livro impresso. Desde o sculo XVI, isto , desdea poca em que o impressor encarregou-se dos sinais, marcas e ttulos,ttulos de captulos ou ttulos comuns enquanto, no tempo dos in-cunbulos, esses eram acrescentados mo na pgina impressa pelocorretor ou pelo possuidor do livro , o leitor s pode insinuar suaescrita nos espaos virgens do livro. O objeto impresso impe-lhe suaforma, sua estrutura, suas disposies e no supe, de modo algum, suaparticipao. Se, assim mesmo, o leitor pretende inscrever sua presenano objeto, s pode faz-lo ocupando, sub-reptcia e clandestinamente,os lugares do livro preteridos pela escrita: interiores da encadernao,

    folhetos deixados em branco, margens do texto etc. (20).Como texto eletrnico, a coisa muda. No somente o leitor podesubmeter o texto a mltiplas operaes (pode index-lo, colocar obser-vaes, copi-lo, desmembr-lo, recomp-lo, desloc-lo etc.), mas podeainda tornar-se seu co-autor. A distino, fortemente visvel no livroimpresso, entre a escrita e a leitura, entre o autor do texto e o leitor dolivro, desaparece diante de uma realidade diferente: a em que o leitortransforma-se em um dos atores de uma escrita a vrias vozes ou, pelomenos, acha-se em condies de constituir um texto novo, partindo defragmentos livremente recortados e ajuntados. Da mesma forma que oleitor do manuscrito, que podia reunir em um s livro obras de naturezabastante diversa, reunidas no mesmo suporte, num mesmo libro-zibal-done, apenas pela prpria vontade, o leitor da idade eletrnica podeconstruir, a seu bel prazer, conjuntos textuais originais, cuja existncia eorganizao s dependem dele. Mas, alm disso, ele pode, a qualquermomento, intervir nos textos, modificando-os, reescrevendo-os, fazen-do-os seus. Compreende-se, ento, que tal possibilidade questiona eameaa as categorias usadas por ns para descrever as obras, referidasdesde o sculo XVIII a um ato criador individual, singular e original, eque fundam o direito em matria de propriedade literria. A noo de

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    copyright, entendida como o direito de propriedade do autor sobre umaobra original, produzida por seu gnio criador (a primeira ocorrncia dotermo de 1728) (21), ajusta-se mal com os modos de constituio dosbancos de dados eletrnicos. Assim que a Corte supremados EstadosUnidos negou-lhe qualquer pertinncia para a publicao das listas tele-fnicas (22).Por outro lado, o texto eletrnico, pela primeira vez, permite su-perar uma contradio que obsedou os homens do Ocidente: a que opede um lado o sonho de uma biblioteca universal que congregasse todosos livros j publicados, todos os textos j escritos, at mesmo, segundoBorges, todos os livros possveis de serem escritos, esgotando todas ascombinaes das letras do alfabeto e, de outro, a realidade, forosa-mente decepcionante, de acervos, que, por maiores que sejam, s podemfornecer uma imagem parcial, mutilada do saber universal (23). OOcidente deu uma figura exemplar e mtica a essa nostalgia da exaus-tividade perdida: a da biblioteca de Alexandria (24). A comunicao distncia dos textos, a qual anula a distino, at agora irremedivel,entre o lugar do texto e o lugar do leitor, torna possvel, acessvel, essesonho antigo. Sem materialidade, sem localizao, o texto, em sua re-presentao eletrnica, pode alcanar qualquer leitor equipado do ma-terial necessrio para receb-lo. Supondo-se numerizados ou, em outraspalavras, convertidos em textos eletrnicos, todos os textos existentes,sejam eles manuscritos ou impressos, a universal disponibilidade dopatrimnio escrito que se torna possvel. Todo leitor, no lugar em quese encontra, com condio que seja diante de um posto de leitura co-nectado com a rede que efetua a distribuio dos documentos informa-tizados, poder consultar, ler, estudar qualquer texto, independente-mente de sua localizao original (25). "Quando se proclamou que aBiblioteca abrangia todos os livros, a primeira reao foi uma felicidadeextravagante" (26): essa felicidade extravagante a que se refere Borges,nos prometida pelas bibliotecas sem muros e at sem lugar, que seroprovavelmente as de nosso futuro.Felicidade extravagante, mas no sem risco, talvez. Pois, cadaforma, cada suporte, cada estrutura da transmisso e da recepo doescrito afeta-lhe profundamenteos possveis usos, as possveis interpre-taes. Nesses ltimos anos, a histria do livro esforou-se por desco-brir, em diversos nveis, tais efeitos de sentido das formas (27). Somuitos os exemplos que mostram como transformaes propriamentetipogrficas (no sentido amploda palavra) modificam profundamente osusos, as circulaes, as compreenses de um mesmo texto. Assim, asvariaes que aparecem nas divises do texto bblico, especialmente apartir das edies de Robert Estienne com seus versculos numerados.

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    Assim, a imposio de dispositivos prprios do livro impresso (titulo epgina de rosto, diviso em captulos, madeiras gravadas) a obras cujaforma primeira, ligada a uma circulao unicamente manuscrita, era-lhestotalmente estranha: , por exemplo, a sorte do Lazarillo de Tormes, carta apcrifa, sem ttulo, sem captulo, sem ilustrao , destinado aum pblico culto, transformado por seus primeiros editores num livroprximo, por sua apresentao, das vidas de santos e dos escritores deocasio, portanto, dos gneros de maior circulao na Espanha do S-culo de Ouro (28). Assim, na Inglaterra, para as obras teatrais, a pas-sagem das edies elisabetanas, rudimentares e compactas, s ediesque, no incio do sculo XVIII, adotando as convenes clssicas fran-cesas, tornam visvel a diviso em atos e cenas, restituindo, pelas indi-caes dos jogos de cena, algo da ao teatral, no texto impresso (29).Assim, as formas novas dadas a todo um conjunto de textos j publi-cados, no mais das vezes de origem erudita, a fim de que pudessematingir os leitores mais populares e constituir o repertrio das livrariasde literatura de cordel em Castela, Inglaterra ou Frana. A concluso sempre idntica: a significao ou, antes, as significaes, histrica esocialmente diferenciadas de um texto, seja qual for, no podem serseparadas das modalidades materiaispor meio de que o texto oferecidoaos leitores.

    Da, para o nosso presente, uma forte lio: a possvel transfe-rncia do patrimnio escrito de um suporte para outro, do cdice parao monitor, abre possibilidades imensas, mas constituir tambm umaviolncia praticada sobre os textos, separados das formas que contri-buram a construir suas significaes histricas. Supondo-se que, numfuturo mais ou menos prximo, as obras de nossa tradio no fossemmais comunicadase decifradas,a no ser numa representao eletrnica,grande seria o risco de ver perdida a inteligibilidade de uma culturatextual em que um vnculo antigo, essencial, foi estabelecido entre oprprio conceito de texto e uma forma particular do livro: o cdice.Nada melhor para manifestar a fora de tal vnculo que as metforas,que, na tradio ocidental, fazem do livro uma figura possvel do des-tino, do cosmos ou do corpo humano (30). O livro que elas manejam,de Dante a Shakespeare, de Raimundo Llio a Galileu, no um livroqualquer: composto por cadernos, formado de folhetos e pginas,protegido por uma encadernao. A metfora do livro do mundo, dolivro da natureza, to poderosa na idade moderna, acha-se como quevinculada s representaes imediatas e enraizadas que associam natu-ralmente o escrito ao cdice. O universo dos textos eletrnicos signi-ficar, forosamente, um distanciamento com relao s representaesmentais e operaes intelectuais especificamente ligadas s formas que

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    tem apresentado o livro no Ocidente durante esses ltimos dezessete oudezoito sculos. No h ordem dos discursos que seja separvel da or-dem dos livros que lhe contempornea.Aoque me parece, necessrio ater-nos a duas exigncias. Por umlado, preciso acompanharmos, com uma reflexo histrica, jurdica efilosfica, a mutao considervel que vem revolucionando os modos decomunicao e recepo do escrito. Uma revoluo tcnica no se de-creta; tampouco sesuprime. O cdice levou a melhor e suplantou o rolo

    embora este, em outra forma e para outros usos (particularmentearquivsticos) tivesse atravessado toda a Idade Mdia. E a imprensasubstitui o manuscrito como forma maciade reproduo e difusodostextos embora o escrito copiado mo tivesse conservado todo o seupapel, na idade do impresso, no tocante circulao de numerosos tiposde textos, oriundos da escrita do foro privado, das prticas literriasaristocrticas comandadas pela figura do gentleman-writer, ou das ne-cessidades de comunidades particulares: aquelas designadas como he-rticas, ligadas pelo segredo, das corporaes de companheiros franco-maonaria, ou, simplesmente, cimentadas pela circulao de textos ma-nuscritos (31). Pode-se pensar, ento, que no sculo XXV, naquele anode 2440 em que Louis-Sbastien Mercier imaginou, em sua utopia pu-blicada em 1771, a Biblioteca do Rei (ou da Frana) no seria um pe-queno gabinete, em que estariam contidos apenas pequenos livros, osquais concentrariamo nico saber til (32), mas um ponto, numa redeestendida ao mundo inteiro, responsvel pela universal distribuio deum patrimnio textual, acessvel por toda a parte graas sua formaeletrnica. Chegou, portanto, a hora de melhor observar e compreenderos efeitos de uma mutao desse porte e, tendo em vista que os textosno so necessariamente livros, nem mesmo peridicos ou jornais, de-rivados, eles tambm, do cdice, de redefinirmos as noes jurdicas(propriedade literria, direitos autorais, copyright) , regulamentares (de-psito legal, biblioteconmicas (catalogao, classificao, descrio bi-bliogrfica etc.) que foram pensadas e construdas com relao a outramodalidade da produo, da conservaoe comunicao do escrito.Mas existe, para ns, uma segunda exigncia, indissocivel da pre-cedente. A biblioteca do futuro deve ser, tambm, o lugar onde poderoser mantidos o conhecimento e a compreenso da cultura escrita nasformas que foram e ainda so, majoritariamente, aquelas hoje conhe-cidas. A representao eletrnica de todos os textos, cuja existncia nocomea com a informtica no deve, de modo algum, significar relega-o, esquecimento, ou, pior ainda, destruio dos objetos que tm sido

    seus suportes. Mais do que nunca, talvez, uma das tarefas essenciais dasgrandes bibliotecas seja coletar proteger, recensear (por exemplo na

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    forma de catlogos coletivos nacionais, primeiro passo em direo abibliografias nacionais retrospectivas) e, tambm, tornar acessvel a or-dem dos livros que continua sendo a nossa e foi a dos homens e dasmulheres que lem desde os primeiros sculos da era crista. Apenas sefor preservada a inteligncia da cultura do cdice que poder existir,sem ressalva, a felicidade extravagante prometida pelo monitor.Notas1H.J.Martin, Lemessagecrit:lareception. Conferncia dada na Acadmie des SciencesMorales et Politiques. Paris 15 de marode 1993.2 L. Febvre& H.-J. Martin, L 'apparition du livre. Paris, AlbinMichel, 1958.3 E. Eisenstein, The printing revolution in early modern Europe, Cambridge, CambridgeUniversity Press, 1983; verso abreviada de Theprinting press as an agent of change;comunications and cultural transformations in early modem Europe, Cambridge, Cam-bridge University Press, 1979.4 P. Saenger, M. Heilein, Incunable description and its implication for the analysis offifteenth-century reading habits. In: Priming the mitten world, the social history of books,area 1450-1520 S.Mindman (ed.), Ithaca e Londres, Cornell University Press, 1991,p. 225-258; M. M. Smith, Patterns of incomplete rubrication in incunables and whatthey suggest about working methods. In Medieval book production, assessing the evidence,L.L.Brownrigg (ed.), LosAltos Hills, Anderson-Lovelace,The Red Gull Press, 1990,p. 133-145.5 Le livre et l ' imprimerie enExtreme-Orient et enAsie du Sud-Est, J-P. Drge,M. Ishigami-lagolnitzer,M.Cohen (eds.),Bordeaux, Socit desBibliophiles de Guyenne, 1986; E.S. Rawstd, Economic and social foundation of late Imperial China. In: Popular culture

    in late Imperial China, D. Johnson A. Nathan, E.S. Rawski (ed.), Berkeley, Universityof California Press, 1985, p.3-33; Impressions de Chine, M. Cohen, N. Monnet (ed.),Paris, Bibliothque Nationale, 1992.6 A. Petrucci, Alie origine del libro moderno. Libri da banco, libri da biscaia, libreti damano. In: Libri, scrittura e pubblico nel Rinascmento. Guida storica e critica, A,Petrucci(ed.), Roma-Bar, Laterza, 1979, p.137-156.7 P. Saenger, Silent reading: its impact on late Medieval script and society. Viator, M e-

    dieval and Renaissance Studies, 13,1982,p. 367-414; Physiologic de la lecture et spa-ration desmots, AnnalesE.S. C., 1989, p.939-952;Theseparation ofwordsand orderofwords: the genesis ofMedieval reading. Scrittura e Civilt,XIV, 1990, p. 49-74.8 B.Knox, Silent reading inantiquity, Greek, Roman and Byzantine Studies, DC , 1968, p.421-435.9 J. Svenbro, Phrasikleia,anthropologiede to lecture en Grceancienne,Paris, Editions de laDcouverte, 1988.

    10 W.W. Harris, Ancient literacy, Cambridge,Mass, e Londres, Harvard University Press,1989.

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    11 M.Frenk, Lectores y oidores. Ladifusin oral de la literatura en el Siglo de Oro, Actasdel Sptimo Congresso de la asociacin Internacional de Hispanistas, G. Bellini(ed.), Roma,Bulzoni, 1982, v. I, p.101-123.12 F. Alessio, Conservazione e modelli di sapere nell Medioevo. In: La memoria del sapere.

    Forme di conservazione e strutture organizzatve dall'Antichit a oggi.P. Rossi (ed.), Ro-ma-Bar, Laterza, 1988, p. 99-133.13 R.Engelsing, Die peroden der Lesergeschichte inderNeuzeit. Dasstatstsche Aumassunddiesoziokulturelle Bedeutungder Lekture, A r c h i v efurGeschichte des Buchwesens, 10,1970, p. 945-1002. Cf. tambm as revises crticas de E. Schon, Der Verlust der

    Sinnlichkeit oder Die Verwandlungen des Lesers. Mentalitatswandel um 1800, Stuttgart,Klett-Cotta, 1987; M. Nagl, Wandlungen das Lesens in der Aufklarung, Pladoyer fureinige Differenzierungen. In: Bibliotheken und Aufklarung, W. Arnold, P. Vodosek(ed.), Wolfenbutteler schriften zur Gesschichte des Buchwesens, Band 14, Wiesbaden,In Kommission bei Otto Harrassowitz, 1988, p. 21-40; R. Wittman, Geschichte desdeutschen Bucchandels, Munich,C. H. Beck, 1991.

    14 A. Blair, Humanist methods innatural philosophy: the commonplace book. Journal ofhistory of ideas, v. 53, n. 4, Oct.-Dec. 1992, p. 541-551.15 R. Darnton, Readers respond to Rousseau: the fabrication of romanticsensivity. In The

    great ca t massacre and other episodes in French cultural history. New York, Basic Books,1984, p. 215-256.16 G. Nunberg, The places of books in the age of eletronic reproduction. Representations,42; Future libraries, H. Bloch, C. Hesse (ed.), Spring 1993.17 Cf. as observaes formuladas recentemente in Lesdebuts du codex, A. Blanchard (ed.),

    Turnhout, Brepols, 1989; dois artigos de G. Cavallo: Testo, libro, lettura. In: Lo spazioletterario di Roma antica, G. Cavallo, P. Fedeli, A. Giardina (eds.), Roma, SalernoEdtrice, v. II. La circolazione del testo, 1989, p. 307-341; Libro e cultura scritta. In:Storia diRoma, Torino, Einaudi, v. IV, Caratteri e morfologie, 1989, p. 693-734.

    18 L. Holtz, Les mots latinsdsignant le livre au temps d'Augustin. In: Lesdebuts du codex,of. cit, p. 105-113.

    19 A. Petrucci, II libro manoscritto, Letteratura italiana, Torino, Einaudi, 2; Produzionee consumo, 1983, p. 499-524.20 Marks in Books, Cambridge, Mass, The Houghton Library, 1985. Dois exemplos deanlises das menes manuscritasno livro impresso in L. Jardine, A, Grafton, Studiedfor action: how Gabriel Harvey read his livy, Past and present, 129, Nov. 1990, p.30-78; Cathy Davidson, Revolution and the word. The rise of the novel in America, NewYork e Oxford, Oxford university Press, 1986, p. 75-79. Um exemplo para o leitormanuscritoinR.Meyenberg, G.Ouy, AlainChartier, lecteurd'Ovide, Scrittura eCvilt,

    X I V , 1990, p. 75-103.21 D. W. Nichol, On the use of c o p y and copyright: a scriblerian goinage?, The library. Thetransactions o f the bibliographical society, Jun. 1990, p. 110-120.22 P. Jaszi, On the author effect: contemporary copyright and collective creativity, Car-duzo Am and Entertainment LawJournal, v. 10, n. 2,1992; Intellectual property andthe construction of authoship, p. 293-320; A. Prassoloff, Ledroit d'auteur 1'ge de

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    1'ecrit concurrence, Textuel, n. 25; Ecrite, voir, conter,p. 119-129: J.Ginsberg, Copy-right without walls? Speculations on literary property in the lybrary of the future, Re-presentations, 42; Future libraries, Spring 1993.23 R. Charrier, Bibliothquessansmurs. In: L 'order des livres. Lecteurs , auteurs, bibliothquesen Europe entre XTV e L X V I I I e sucle, Aix en Provence, Alnea, 1992, p. 69-94; J. M.Goulemot,Enguise de conclusion: lesbibliothques imaginaires (fictions romanesqueset utopies), Histoire des bibliothques franaises, Paris, Promodis Editions du Cercledela Librairie, t. II, Les bibliothques sous l'Ancien Rgime, C. Jolly (ed.), 1989, p.500-511.24 L. Canfora, La biblioteca scomparsa, Palermo, Sellerio editore, 1986; Alexandrie, H I esuele w.J. C. Tous lessavoirsdu m onde ou l r f o e d^tnwersaUt ds Ptolmes,C. Jacob, F.de Polignac (ed.), Paris, Editions Autrement, 1992.25 J. D. Bolter, Writing s p a c e : the c o m p u t e r , h y p e r t e x t, and the h i s t o r y o f writing, Hilsdale,1991.26 J. L. Borges, La b i b l i o t e c a de Babel, 1941.27 D. F. McKenzie, Bibliography an d the s o c i o l o g y of texts, The Panizzi Lectures 1985, Lon-dres, The British Library, 1986.28 F. Rico, LaprincepsdelLazarillo. Titulo, capitulacinyepgrafes de un texto apcrifo.In: Problemas del Lazarillo, Madrid, Ctedra, 1988, p. 113-15129 D. F.Mckenzie, Typographyand meaning:the caseofWilliam Congreve. In: Buck un dBuchhandel in Europa umachtzehntenjakrhundert, G. Barber, B. Fabian(ed.),Hambur-go, Dr Ernst Hauswedell und Co, 1981, p.81-126.30 E. R. Curtius, Ewropaische Literatur und Lateinisches Mittelalter, Bern, A. Francke AGVerlag, 1948, cap. 16; H. Blumenberg, Die Lesbarkeit des Welt, Frankfurt amMain,Suhrkamp, 1981.31 Harold Love, Scribal publication in seventeenth-century England, Transactons o f theCambridge Bibliographical Society, v. IX, Part 2,1987, p. 130-154; Francois Moureau,La plumeet le plomb: la communicationmanuscrite au XVTII e sicle. In: Correspon-dances littertwres inedites etudes et extraits sumes de Vofauriana, J. Schlobach (ed.),Paris-Geneve, Champion-Slatkine, 1987, p. 21-30.32 L.S. Mercier, L 'a n 2440. Rev s 'il en pit jamais, R.Trousson (ed.), Bordeaux, EditionsDucros, 1971, Labibliothque du roi, p. 247-271.

    ResumoEstariam os textos, de agora em diante, fadados a uma existncia eletrnica? Os livros, naforma que conhecemos, desde o sculo XVI, estariam condenados a desaparecer progres-siva e definitivamente? Antes de responder a essas perguntas, Roger Chartier percorre alonga histria do livro at aos nossos dias: do volumen ao cdice, da xilografia oriental inveno de Gutenberg, da biblioteca de Alexandria at s nossas grandes bibliotecas mo-dernas,do cdice aomonitor. Anossa poca encontra-se diantede umdesafio: o deutilizarde modo adequado o suporte eletrnico do escrito, pois os significados de um texto de-

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    pendem muito do suporte material deste. Afelicidadeextravagante vislumbrada diante daproduo, consulta, comunicao imediata e universalde textos na telinha do computadordever harmonizar-se com a conscincia do papel reservado ao novo suporte: proteo,conservaoe divulgao do patrimnio escrito da humanidadena sua materialidade tantoquanto na sua simblica.

    AbstractWould texts, from now on, be fated to a mere electronic existence? Would books, in theirformat known since the sixteenth century, be condemned to disappear progressively anddefinitely? Before answering these questions we must follow the long history of books:from volumen to codex, from oriental xylography to Gutenberg's invention, from theAlexandrian bibliotheca to our great modern libraries, fromcodices to monitors. Our timefaces a challenge: how to use appropriately the electronic support of writing, since themeanings of a text depend very much on its material support. The extravagant happinessgleamed before the production, the consultation, the immediate and universalcommunication of texts in the computer's screen should be inharmony with the conscienceof the role reserved for the new support: protection, conservation and divulgation of thewriting heritage of manking, both in its materialand symbolic character.

    Roger Chartier professor da Escola de Altos Estudos em Cincias Sociais deParis.Traduo de Jean Briant. O original em francs - Du codex a l'ecran:Lestrajectoires de l' crit - encontra-se disposio do leitor no IEA para eventualconsulta.