LUANA SIMÃO LUCAS
O JOGO ENTRE ESSÊNCIA E APARÊNCIA NA
DANÇA CONTEMPORÂNEA
THE GAME BETWEEN ESSENCE AND
APPEARANCE IN CONTEMPORARY DANCE
Campinas
2013
3
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO FÍSICA
LUANA SIMÃO LUCAS
O JOGO ENTRE ESSÊNCIA E APARÊNCIA NA DANÇA
CONTEMPORÂNEA
Orientador: Prof. Dr. Odilon José Roble
THE GAME BETWEEN ESSENCE AND
APPEARANCE IN CONTEMPORARY DANCE
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
Graduação da Faculdade de Educação Física da
Universidade Estadual de Campinas para obtenção do
título de Bacharel em Educação Física.
Monography presented to the Graduation Programme
of the School of Physical Education of University of
Campinas to obtain the Bachelor’s degree in Physical
Education.
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE A VERSÃO
FINAL DA MONOGRAFIA DEFENDIDA PELA
ALUNA LUANA SIMÃO LUCAS E ORIENTADA
PELO PROF. DR. ODILON JOSÉ ROBLE.
______________________________
Assinatura do Orientador
Campinas, 2013
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FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA POR
DULCE INES LEOCÁDIO DOS SANTOS AUGUSTO – CRB8/4991 BIBLIOTECA “PROF. ASDRUBAL FERREIRA BATISTA”
FEF - UNICAMP
Lucas, Luana Simão, 1991- L962j
O jogo entre essência e aparência na dança contemporânea / Luana Simão Lucas. -- Campinas, SP: [s.n.], 2013.
Orientador: Odilon José Roble. Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) –
Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação Física.
1. Dança contemporânea. 2. Metafísica. 3. Aparência (Filosofia). I. Roble, Odilon José. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação Física. III. Título.
Informações para Biblioteca Digital
Título em inglês: The game between essence and appearance in contemporary dance. Palavras-chave em inglês:
Contemporary dance Metaphysics Appearance (Philosophy) Banca Examinadora: Odilon José Roble [Orientador] Giovana Regina Sarôa Data da defesa: 28-11-2013 Graduação: Bacharel em Educação Física
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COMISSÃO EXAMINADORA
Prof. Dr. Odilon José Roble
Profª. Ms. Giovanna Regina Sarôa
Prof. Dr. Paulo Ferreira de Araújo
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“Não se deve dar ouvidos aqueles que
aconselham ao homem, por ser mortal, que
se limite a pensar coisas humanas e mortais;
ao contrário, porém, à medida do possível,
precisamos nos comportar como imortais e
tudo fazer para viver segundo a parte mais
nobre que há em nós.”
Aristóteles
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Agradecimentos
Gostaria primeiramente de agradecer minha família, em especial Maurício,
Lina e João Pedro, que sempre acreditaram que eu seria capaz de atingir “grandes
vôos”, eles são minha inspiração e luz. Não poderia deixar de agradecer também em
especial meus padrinhos, Gláucio e Débora, que sempre me apoiaram e não deixam que
nada me faltasse, sem eles a realização desta faculdade não seria possível. Obrigada a
toda família por todo amor e confiança.
Imprescindível é também o agradecimento ao meu orientador, Prof. Dr.
Odilon José Roble, por ter aceitado a orientação deste trabalho, realizando-a de modo
excelente.
Á Profª. Ms. Giovanna Regina Saroa, fica o agradecimento por ter aceitado
compor a banca deste trabalho. Porém, o principal agradecimento a ela é por toda
inspiração dada e valores aprendidos durante todos esses anos de Grupo Ápeiron.
Obrigada por toda amizade, amor e arte que com certeza fora fonte de inspiração para
este trabalho.
Aos integrantes do Grupo Ápeiron, Lívia O. , Priscilla, Marina, Lívia P.,
Isabela, Paula, Carol F., Carol M, Ana, Amanda, Selma, Davi e Luan, muito obrigada
por toda amizade, troca e arte. Vocês são pessoas especiais, maravilhosas e colorem a
minha vida.
Não poderia deixar de agradecer à Sala Maravilhosa – FEF 09 Integral por
todo companheirismo, momentos e amizades que já criaram raízes. Não poderia ter
caído em sala melhor, vocês fizeram da minha faculdade um dos melhores momentos da
vida. Obrigada também às “babacanas”,que surpreenderam com novas e fantásticas
amizades no final da faculdade.
Obrigada também ao Thiago e Jorge, amigos queridos que me aceitaram
para trabalhar ao lado deles, dispondo o tempo que foi necessário para realização deste
trabalho.
Não menos importante, gostaria de agradecer a todos que acompanharam de
alguma forma a faculdade e a realização deste trabalho: Julio, Larissa, Naira, Heloísa,
Nayara, Camila, Luiza, Marília.
A todos o meu muito obrigada, sem vocês não seria nada!
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LUCAS, Luana Simão. O Jogo entre Essência e Aparência na Dança Contemporânea.
2013. 47 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Educação Física) –
Faculdade de Educação Física. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2013.
RESUMO
Os termos essência e aparência podem ser conceituados a partir da filosofia grega,
estabelecendo relações entre a realidade sensível e o intangível. A manifestação de tais
termos pode ser analisada nas artes do movimento em geral, apresentando diferentes
contextos. A dança dentro das artes do movimento é um segmento existente desde o
princípio da história da humanidade até os dias atuais, sendo o principal objeto de
estudo nesta pesquisa. A essência e aparência se manifestaram na história da dança
desde seu princípio, mantendo um jogo constante entre ambas, ora com e essência em
maior evidência e ora com a aparência. Na atualidade, a dança contemporânea se
consolida como fruto da experiência de diversas escolas da dança, como o balé clássico
e moderno, e maneiras recentes e urbanas de se buscar o movimento, indo ao encontro
da construção de uma nova estética. A dança contemporânea, através dos movimentos
dos dançarinos, busca a interação com o público, sendo grande meio expressivo e
agente comunicador na sociedade atual. Os movimentos na dança contemporânea
constituem série de imagens que irão expressar o sentimento a ser passado pelo
dançarino, transcendendo a aparência. É nesta transcendência da aparência, ou seja,
indo além da realidade sensível, que a essência se manifesta na dança contemporânea,
estabelecendo um jogo constante entre forma e imagem, ou em outros termos, essência
e aparência.
Palavras- chave: Dança Contemporânea, Metafísica, Aparência.
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LUCAS, Luana Simão. The Game Between Essence and Appearance in Contemporary
Dance. 2013. 47 f. Monography (Graduate in Physical Education) – Faculdade de
Educação Física. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2013.
ABSTRACT
The terms essence and appearance can be conceptualized from Greek philosophy,
establishing relationships between the sensitive reality and the intangible. The
manifestation of such terms can be analyzed in the movement arts in general, with
different contexts. The dance inside of the movement arts is an existing segment from
the beginning of human history until the present day, be the main object of study in this
research. The essence and appearance is expressed in dance history from its beginning,
maintaining a constant play between them prays with and in essence more evidence, and
sometimes with the appearance. Nowadays, contemporary dance is consolidated as a
result of the experience of different schools of dance such as ballet, modern dance, and
recent and urban ways of searching the movement, meeting the construction of a new
aesthetics. Contemporary dance, through the movements of the dancers, seeks
interaction with the public, be an expressive medium agent and communicator in today's
society. Movements in contemporary dance are series of images that will express the
feeling to be passed by the dancer, transcending appearance. It is this transcendence of
appearance, beyond the sensible reality, that the essence is manifested in contemporary
dance, setting a constant play between form and image, or in other terms, essence and
appearance.
Keywords: Contemporary dance, Metaphysics, Appearance.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Tocadoras e dançarinas sagradas..................................................................28
Figura 2 – Baile na corte de Henrique III.......................................................................29
Figura 3 – Luís XIV como O Sol no “Ballet Royal de La Nuit”....................................30
Figura 4 – “Pas de Quatre 1845” com elenco original: Maria Taglioni, Fanny Cerrito,
Lucile Grahn e Carlota Grisi...........................................................................................31
Figura 5 – “Sagração da Primavera” de Mary Wigman.................................................33
Figura 6 – “Petit Mort” de Kylian com o “Nederlands Dans Theater 1.”……………..34
Figura 7 – Shiva Dançando............................................................................................38
Figura 8 – Cia de Dança Deborah Colker, Nó................................................................40
11
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO...........................................................................................................12
2 CONCEITO DE ESSÊNCIA.......................................................................................13
3 CONCEITO DE APARÊNCIA...................................................................................18
4 O JOGO ENTRE ESSÊNCIA E APARÊNCIA NAS ARTES DO
MOVIMENTO................................................................................................................22
5 A QUESTÃO DA ESSÊNCIA X APARÊNCIA NA DANÇA
CONTEMPORANÊA.....................................................................................................28
5. 1 Uma pequena retrospectiva histórica da dança........................................................35
5. 2 Contextualização da Dança Contemporânea na Sociedade......................................39
5.3 A Dança Contemporânea – Aparência e Essência.....................................................37
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................44
7 REFERÊNCIAS...........................................................................................................46
12
1 Introdução
Essência e aparência são termos discutidos e aplicados em diversos
contextos filosóficos. Tais termos foram conceituados a partir da filosofia grega, com
base principalmente nos filósofos Sócrates, Platão e Aristóteles. Basicamente, essência
pode ser definida como forma (REALE, 2004) e aparência como revelação da realidade
pela imagem (ABBAGNANO, 2000). Estabelecido o conceito filosófico de essência e
aparência pode-se constatar de que forma os termos se manifestam e se expressam na
dança contemporânea.
A dança, por sua vez, pode ser definida de forma abrangente como um
sistema simbólico composto de gestos e movimentos, estando presente na sociedade
desde os tempos arcaicos até os dias atuais (SIQUEIRA, 2006). Pela presença na
história da humanidade desde seu princípio, a dança constituiu-se em momentos de
maior e menor aceitação durante a história, conforme a sociedade e cultura em que
estava inserida (SIQUEIRA, 2006). Estes diferentes contextos acarretaram às diversas
formas de manifestação da essência e aparência na arte da dança, estando em voga ora a
essência e ora a aparência. Assim, os termos essência e aparência vêm dialogando entre
si no contexto da dança até a atualidade, na qual a dança se estabelece como dança
contemporânea.
A dança contemporânea pode ser considerada como potencial meio de
expressão do ser humano, estabelecendo sua relação com a sociedade e com sua
existência (SIQUEIRA, 2006). A expressão na dança contemporânea se dá a partir dos
movimentos dos bailarinos no tempo e espaço, suas imagens formadas e significados
intrínsecos. A dança contemporânea dentre seus movimentos apresenta diversidade de
elementos corporais, permitindo inúmeras formas de expressão, fazendo dialogar
constantemente a aparência da dança com sua essência.
A partir dos conceitos filosóficos de essência e aparência e da dança
contemporânea na condição de potencial meio de expressão do ser, no qual a expressão
de dá a partir das imagens formadas pelos dos movimentos e seus significados, este
trabalho busca constatar como se estabelece o jogo entre essência e aparência na dança
contemporânea, analisando qual dos termos prevalece e consequentemente o caráter
filosófico dessa.
13
2 Conceito de Essência
A essência possui vários significados e alguns deles divergentes entre si.
Mesmo se considerarmos sua definição apenas na área da filosofia, ainda assim iremos
encontrar inúmeras definições.
Em um sentido filosófico mais geral, segundo Abbagnano (2000, p. 360-
361), podemos considerar essência “como constituição ou forma que deveria
explicar todas as qualidades ou caracteres de uma realidade e mostrá-los em suas
interconexões necessárias”.
Para uma definição mais específica de essência, pode-se colocar em questão
a Metafísica, em especial a de Platão. A Metafísica, segundo Platão, seria uma realidade
superior ao mundo sensível, ou seja, uma realidade supra-sensível.
Para Platão, o supra-sensível (inteligível) seria constituído pelo mundo das
idéias (ou formas), estas seriam as “essências” que constituem o verdadeiro ser. O
supra-sensível seria regido pelo princípio do Uno, que é o princípio do ser, da verdade e
do valor, ele é o Bem e é limitado e pela Díade, entendida como indeterminação e
ilimitação (REALE, 2004). O Uno limitaria a Díade.
Já o mundo sensível, segundo Platão, seria a cópia do mundo inteligível,
tendo como mediador um Deus-Ártifice, que Platão denomina como o “Demiurgo”.
Este seria o responsável em representar na realidade física os modelos do mundo ideal,
através da geometria e dos números.
O ser humano estaria então presente no mundo sensível. Platão o define
como ser dualista dividido entre alma e corpo. Nesta divisão o corpo exerce a função de
“túmulo” da alma, que a partir dessa concepção é imortal e transcendente ao corpo,
existindo assim a transmigração das almas entre diferentes corpos.
O corpo considerado como túmulo da alma, pressupõe que enquanto
estamos em um corpo nos encontramos mortos, e que só após a morte a alma está
liberta. O corpo se enquadra como detentor dos males “fonte de amores insensatos, de
paixões, inimizades, discórdias, ignorância e loucura”. (REALE, 2004, p. 152)
Porém, vale reforçar que a ética platônica está apenas em parte condicionada
nesse dualismo extremista, pois Platão apóia-se fundamentalmente na distinção
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metafísica entre corpo e alma, na qual o primeiro é a realidade sensível e o segundo é a
relação com o inteligível.
Existem dois paradoxos de Platão, que se estendem a distinção metafísica
do corpo e alma, contemplando o dualismo exagerado entre os mesmos. O primeiro, que
se encontra no Fédon, é da “Fuga do Corpo”, onde, segundo Platão, a alma deve se
libertar do corpo o quanto antes, sendo a morte fonte da libertação. Ao obter a separação
do corpo a alma está livre para viver para o inteligível, deixando todos os males
causados pelo corpo. O segundo paradoxo é da “Fuga do Mundo”, onde Platão deixa
claro que fugir do mundo significa se assemelhar a Deus, se tornando assim mais
virtuoso, pois o mal residiria apenas entre os homens na natureza mortal e não com os
Deuses. O fugir do mundo significa se assemelhar a Deus até onde seja possível para
um ser humano (REALE, 2004).
Segundo os paradoxos da “Fuga do Corpo” e “Fuga do Mundo”, o
verdadeiro filósofo deve desejar se libertar de seu corpo, ou seja, desejar a morte, sendo
a real filosofia o “exercício da morte” em busca da vida real (dimensão exclusiva da
alma). A partir desse contexto a filosofia seria o treino para vida real, autêntica.
Para Platão, segundo o Timeu, as almas são imortais, uma vez que são
geradas no Demiurgo, possuindo assim a substância de que é feita a alma do mundo –
essência, identidade e diversidade. Afirmando ainda mais essa filosofia, no Fédon,
Platão discorre que a alma é conhecedora de todas as realidades eternas e imutáveis,
pois possui a mesma natureza que elas.
No plano inteligível a alma deve ser pura e sábia. Seguindo a linha de
Sócrates sobre a “cura da alma”, Platão esclarece que a cura da alma é na verdade a
“purificação da alma”. Esta purificação ocorre quando a alma se eleva ao conhecimento
total do inteligível, o conquistando. Portanto, a purificação se dá através da ascensão
progressiva ao conhecimento, que nos leva do sensível ao supra-sensível, entendendo a
verdadeira dimensão do ser em suas características eternas e imutáveis.
Assim, a alma seria fundamentalmente a essência em si e detentora da ponte
entre a realidade sensível (corpo) e o inteligível. Como discorrido anteriormente, a alma
é eterna e imutável, portanto a essência também o é. No que diz respeito ao corpo como
realidade sensível, ele é mutável e aparente. Porém, pode-se dizer que o corpo de certa
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forma carrega a essência em si, uma vez que seria o meio que abriga a alma no mundo
sensível.
Partindo então da conclusão acima de que o corpo também detém a essência
em si, constituindo um caráter mais “substancial”, pode-se chegar a um conceito ainda
mais apurado sobre a essência, por meio da filosofia de Aristóteles. Este foi discípulo de
Platão, porém se diferenciou de seu mestre em três aspectos gerais: abandono do
componente místico-religioso; escasso interesse pelas ciências matemáticas, voltando-se
para as ciências naturais e empíricas; utilização do método sistemático em vez do
dialético-dialógico. (RAELE, 2004)
Aristóteles sistematizou o conhecimento, dividindo a ciência em três
categorias: ciências práticas, que buscam a perfeição moral (ética e política), ciências
poéticas, que buscam produção de determinadas coisas e as ciências teoréticas, que
abrangem a metafísica, a física e a matemática.
No caso, o estudo e conceito de essência, assim como em Platão, se
encontram na metafísica. Em uma definição mais objetiva, segundo Abbaganano, “para
Aristóteles, as coisas têm essência, mas só as formas lingüísticas têm significado.
Significado é aquilo que a essência se torna quando se divorcia do objeto de referência e
se casa com a palavra. Ou seja, a essência se encontra no objeto.” (ABAGNANO,
2000). Assim, Aristóteles denota a essência como algo estritamente substancial.
Sendo a essência para Aristóteles parte da metafísica, convém o
entendimento do significado da mesma para o filósofo em questão. Para Aristóteles, a
metafísica compreende a busca da realidade metaempírica, que advém de todo
pensamento que busca ultrapassar o empírico. Essa busca foi considerada por Aristóles
como “busca das causas primeiras”. A partir deste pensamento, Aristóteles deu quatro
definições à metafísica: a) “indaga as causas e os princípios primeiros ou supremos”; b)
“indaga o ser enquanto ser”; c)“indaga a substância”; d) “indaga Deus e a substância
supra-sensível”(REALE, 2004). Estas definições podem ser consideradas como
aprimoramento de toda especulação anterior feita por Platão.
A segunda definição de metafísica utilizada por Aristóteles, que “indaga o
ser enquanto ser”, tem caráter ontológico, considerando o ser como inteiro, onde as
causas primeiras se encontram no ser enquanto ser.
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Aristóteles atribuiu várias denominações ao ser. Basicamente seria este
tudo aquilo que não é puro nada, podendo existir na realidade sensível ou supra-
sensível. Porém, apesar de múltiplas, todas as denominações do ser levam a “uma
referência comum, a uma unidade”, ou seja, uma “referência à estrutural substância”.
(REALE, 2004). Assim, o ser sempre remeterá a substância, esta, portanto pode ser
considerada sinônima de essência. A essência é a substância e vice-versa. Para definição
concreta da essência segundo Aristóteles, cabe então a definição da substância enquanto
substância. A partir do fato do ser como substância, Aristóteles considera tal
problemática: O que é a substância em geral? (REALE, 2004).
Para definição de substância, Aristóteles parte de dois pontos: a matéria e a
forma. A matéria é o princípio da realidade sensível, sem ela o sensível não existe. A
matéria atua no sensível como o substrato da forma. Porém, depende desta para tornar-
se algo determinado. Assim, a matéria por si só não é substância, apenas o é
impropriamente. A forma então é o que concretiza e realiza a matéria, sendo a essência
de cada coisa, tornando-se assim substância. Para o conjunto matéria e substância,
Aristóteles determinou o termo “sinolo”. O “sinolo” também se enquadra como
substância, uma vez que engloba a substancialidade da matéria e da forma.
A partir da definição de matéria, forma e “sinolo”, há várias divergências do
que seria a substância por excelência, sendo assim a real essência. Há textos nos quais
Aristóteles define o “sinolo” como substância por excelência, em outros a forma. Ao
realizar análise do ponto de vista empírico, o “sinolo” poderia ser considerado a
substância por excelência. Porém, se assim o fosse, o supra-sensível não possuiria
substância, uma vez que o “sinolo” tem em sua constituição a matéria e esta é presente
apenas no sensível. Analisando a questão do ponto de vista da metafísica, a forma seria
a substância por excelência, uma vez que ela é o princípio e fundamento do ser, sendo o
“sinolo” o principiado (REALE, 2004)
Portanto, podemos concluir que o ser é substância, a substância em um
sentido impróprio é matéria, em sentido mais próprio é o “sinolo” e em sentido por
excelência é forma. Assim, Aristóteles denomina a forma como “a causa primeira do
ser”, sendo a substância por excelência e real essência do ser, existindo no sensível e no
supra-sensível.
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Cabe ainda ao entendimento da forma como essência, designar o que é
potência e ato para Aristóteles. A potência seria a matéria, significando a capacidade de
assumir ou receber uma forma. O ato seria então a forma, pois constitui a “atuação” da
capacidade da matéria de constituir forma. Aristóteles também denomina o ato de
“enteléquia”, que significa “realização, perfeição em atualização ou atualiazada”.
(REALE, 2004). Nessas condições, o ato seria superior a potência, pois ele é quem dá
sua condição, objetivo e fim.
Segundo tais definições de ato e potência, pode-se considerar que o “sinolo”
terá potencialidade e ato. Já os seres imateriais (supra-sensível) serão puramente ato,
“enteléquia pura”. Assim, a alma sendo forma (essência) se manifestará na matéria
como ato ou “enteléquia”.
Assim, partindo dos fundamentos de Aristóteles, podemos conceituar a
essência como forma. A forma sempre será substância e substância por excelência
sempre será forma. A essência tem em sua definição como forma o ato em si, que se
manifestará no sensível pela potencialidade. Tal potencialidade, por sua vez, manifesta-
se no mundo sensível por meio da matéria, reforçando que a potência sempre será
designada pelo ato. A potência então seria sinônima de matéria, que apenas se torna
substância através da forma, que denota a essência.
18
3 Conceito de Aparência
Na história da filosofia, segundo Abbagnano (2000), o termo aparência
surge com dois significados diferentes. No primeiro, a aparência seria a ocultação da
realidade, a qual só é revelada quando a aparência é transcendida. O segundo
significado é oposto ao primeiro, a aparência seria a manifestação da realidade, ou seja,
seria a revelação da realidade.
Para Platão, o mundo da Aparência coincide com o mundo da opinião. Na
República, Platão identifica o mundo da opinião como “mundo sensível dividido nos
seus dois segmentos de sombras e imagens refletidas e de coisas e seres vivos
(Rep.,VI,510)” (ABBAGNANO, 2000). Assim, o mundo da aparência sensível apenas
teria conhecimentos prováveis. Platão, também na República, identifica certa
correspondência entre a realidade e aparência, afirmando que “o objeto da opinião está
para o objeto do conhecimento como a imagem está para o modelo (Rep.,VI, 510 a)”
(ABBAGNANO, 2000).
Aristóteles, como dito no capítulo anterior, foi discípulo de Platão, e foi ele
quem concretizou a questão sobre a aparência. Para Aristóteles, a aparência sensível tem
caráter neutro, tanto como sensação, quanto como imagem, as quais podem ser
verdadeiras ou falsas. É apenas com o juízo do intelecto que a aparência pode ser
julgada verdadeira ou falsa. Porém, Aristóteles alega que são a partir dela que a ciência
é realizada, a exemplo dos matemáticos e astrônomos, que observam respectivamente as
aparências físicas e astronômicas e, a partir delas chegam às razões da causa. Assim, a
aparência seria o princípio para busca da verdade, sendo validada pelo uso do intelecto.
No contexto contemporâneo, Abbagnano (2000) afirma que a aparência está
relacionada ao ontológico, discriminando o subjetivo idealista, o qual não leva em conta
o mundo materialista ficando apenas pautado no mundo das idéias. Esse contexto surge
sobre influência da fenomenologia, a qual segundo Heidegger (apud ABBAGNANO,
2000): “é tudo aquilo que é inerente ao modo de demonstrar e de explicitar e tudo aquilo
que exprime a conceituação implícita na presente investigação”, ou ainda segundo
Abbagnano (2000): “o adjetivo fenomenológico qualifica a manifestação do objeto em
sua "essência", bem como a busca que possibilita essa manifestação”.Assim, a relação
entre aparência e ser deixou de se realizar, como também os dualismos que eram
19
utilizados, ex: sensação e pensamento. A relação seria então exercida no plano objetivo
dos diferentes graus de experiências, que podem ser entendidas como realidade. Assim,
a relação entre aparência e realidade seria a relação entre realidade e imagem (símbolo),
ou seja, entre duas determinações objetivas (ABBAGNANO, 2000). Portanto, a
aparência seria a imagem em si, a imagem formada é o que denota a aparência.
Analisando a aparência voltada para as relações sociais, Maffesoli (1996)
afirma que esta é a grande chave para o entendimento das sociedades ao longo da
história. Ao realizar esta análise da aparência de forma empírica, ter-se-ia a
relativização do poder da razão e a eficácia da imagem. Para chegar a conclusão de que
a aparência é fator determinante das sociedades, Mafessoli (1996) cita Adorno, e
especifica a mimesis, como fator imaginal que leva ao abandono da ilusão, gerando
apreensão imediata do espírito, sendo assim a mimesis um fenômeno que volta a tona
na contemporaneidade. Portanto, este fenômeno integra “o ato de conhecimento a
metáfora” (MAFFESOLI, 1996), indo além das imagens sociais, mas que se apóiam
nela para concretizar o estar-junto. O estar-junto faz parte da experiência
contemporânea, onde o corpo individual e o corpo social se entrelaçam constantemente.
O corpo está inserido em uma lógica fenomenológica, onde existem diversas formas de
existência corporal. Todas essas formas levam a uma grande exposição do corpo
individual, que está inserido em um grupo, participando de uma lógica do corpo social.
O estar-junto seria assim o formador da aparência e da teatralidade no corpo no
cotidiano.
Para um melhor entendimento da aparência como fator determinante na
sociedade, cabe o conceito de forma e “formismo”, ressaltando que o conceito
empregado aqui de forma não é necessariamente aquele sinônimo de essência como
discorrido no capítulo anterior. Segundo Maffesoli (1996), a forma seria a matriz que
rege os elementos de dada sociedade, sendo limitadora e detentora da vitalidade. A
partir desta dualidade, surge o neologismo “formismo”. Este mostraria então que o jogo
de aparência, em questão na sociedade atual, seria simultaneamente parte integrante e
meio de compreender um conjunto.
Assim, teríamos um Mundo Imaginal, formado pelas imagens, imaginações
e símbolos que constituem a vida social. Nele o corpo tem suma importância, sendo o
maior meio de comunicação, ocupando o espaço e favorecendo o tátil. O corpo seria
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base para exaltação da aparência. Porém, sentimento e físico estão ligados. Há certa
conexão entre os objetos materiais e imateriais. A forma seria a responsável por essa
interconexão e, a arte em si seria proveniente dessa interconexão. Segundo Paul Klee
(apud MAFFESOLI, 1996): “a arte não cria o visível, ela torna visível”.
Partindo dessa exaltação da aparência e do estar-junto, Maffesoli (1996)
utiliza-se do termo “ética da estética”. Assim, pode-se partir de um princípio de que há
um hedonismo do cotidiano dotado de extrema força, sendo este o fator que dá base à
toda vida em sociedade. Porém, Maffesoli (1996) afirma que o hedonismo ora estará
marginalizado e ora será o que conduz a vida social, dando sua diretriz. As relações
passam a ser intrínsecas e mais orgânicas, determinando a emoção como o laço social.
Portanto, o que é experimentado com o outro passa a ser primordial, culminando para
um sensualismo coletivo, onde tudo ganha suma importância, todos os detalhes e
pequenas coisas, atribuindo ao presente o valor central da vida social. Maffesoli (1996)
utiliza-se do termo “presenteísmo” para tal importância do presente. O autor compara o
“presenteísmo” à sensibilidade barroca, onde o banal e o aspecto efêmero da sociedade
pós-moderna se compara às formas exageradas e conflituosas do barroco, onde tudo
tende a se transformar em obra de arte.
Nesse contexto, a estética é colocada em seu sentido pleno, não sendo
restrita apenas à arte e obras culturais, mas estando também na política, comunicação,
publicidade, consumo e principalmente na vida cotidiana. Todos esses campos tornam-
se de certa forma obras de criação, passando a serem experiências estéticas primárias. A
arte se transforma em um “fato existencial” (MAFFESOLI, 1996), tornando-se a
estrutura da banalidade na sociedade pós-moderna.
A pós-modernidade se enquadra então na mistura de elementos arcaicos e
contemporâneos, mantendo juntos elementos opostos de forma orgânica. Para essa
complexidade da mistura dos contrários na sociedade Maffesoli (1996) utiliza o termo
organicidade. Assim, atribuí-se grande carga estética à sociedade pós-moderna através
desse complexo processo feito de atrações, repulsões, emoções e paixões. As relações
estabelecidas em um conjunto de elementos diversos geram uma solidariedade
específica. Maffesoli (1996) supõe que todas essas contradições e fraqueza da moral
universal podem significar além do fim de certa concepção de vida, o nascimento de
uma nova cultura. Seria no nascimento dessa nova cultura que a estética empregada se
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transforma em ética. A moral universal é aplicada em todos os locais e tempos, já a ética
é particular, podendo ser momentânea e fundar uma comunidade. Assim podem existir
“imoralismos éticos” e por muitas vezes paroxísticos.
Maffesoli (1996) exemplifica como as expressões mais bem acabadas da
ética-estética os “clãs, camarilhas, grupos de pressão, e as diversas igrejas que os
constituem”. Assim, apesar de existirem várias entidades que buscam legitimar uma
prática, como o socialismo, o liberalismo, o social, será sempre a lei tribal que
prevalecerá, modelando o pensamento e a ação em função do grupo.
Nesse contexto, a “lógica da identificação”, substitui a lógica de identidade
presente na modernidade. Os indivíduos se apossam de variadas máscaras dos sistemas
os quais se identificam, podendo ser um território, um guru, uma estrela, e o objeto
ganha pouca importância. A esta lógica, Maffesoli (1996) atribui qualidades próprias,
ressaltando o lúdico. O ambiente estético favorece o jogo, uma vez que os vários clãs
têm características diferentes, a competição e concorrência são estimuladas. A própria
sociedade se torna um jogo e este processo é co-estrutural ao de identificação. Assim, o
reconhecimento e ganho do poder têm caráter “presenteísta”.
Associando todos os pontos pertinentes pode-se dizer que a ética que agrega
um determinado grupo se transforma em estética e vice-versa. Vigora assim um jogo
constante, passando do reino da aparência à lógica da identificação. Todas essas
características dão margem a uma nova cultura, caracterizando o que Maffesoli
caracteriza como Homo Estheticus, onde o que vigora é o social em seu conjunto.
Portanto, pode-se entender que a aparência se contextualiza no plano
objetivo, se relacionando com a realidade através da imagem. O ser na realidade
sensível se exprime através de seu corpo, sendo assim sua imagem (aparência) a que
mais faz parte dessa expressão. Tal expressão através da imagem é a grande forma de
comunicação com o mundo o social. Este então fica a deriva das aparências, que atuam
como peça constituinte fundamental das sociedades, principalmente da contemporânea.
A realidade que se vive está baseada fundamentalmente nas aparências, nas
imagens que são passadas. Volta-se assim à segunda definição utilizada da aparência na
história da filosofia que seria, segundo Abbagnano (2000), a revelação da realidade
através da imagem, que se torna aparente a partir de um ato.
22
4 O Jogo entre Essência e Aparência nas Artes do Movimento
Uma vez definidos os conceitos de essência e aparência, temos a intenção de
aplicá-los aos nossos objetos de estudos, quais sejam o movimento e suas artes,
especificamente a dança contemporânea, a qual será tratada posteriormente de forma
mais aprofundada.
O movimento seria para o homem primeiramente a necessidade para
sobrevivência, foi por meio do movimento que o homem se estabeleceu e ocupou o
mundo. O movimento possuiria assim o conhecimento imediato, anterior ao conceito da
palavra (GARAUDY, 1973). Segundo Laban (1978), o homem busca, através do
movimento, atingir algo que lhe é valioso, podendo ser tangível ou intangível aos
valores que inspiram o movimento. Este pode revelar muitas coisas diferentes,
possuindo vários ritmos e formas. Para Laban (1978) a principal influência para o
movimento seria o meio ambiente que o ser se move e existe. Neste meio o ser
manifesta a busca de um objeto ou de uma condição mental.
Para as artes, o movimento é indispensável. O artista plástico, o dançarino, o
músico, o ator, o mímico só conseguem executar sua determinada arte por meio do
movimento. Laban (1978) afirma que não seria possível apresentar um caráter,
atmosfera, estado de espírito ou uma situação sem que houvesse o movimento e sua
expressividade. O movimento por si só é capaz de expressar à platéia o que o ator ou
bailarino está transmitindo, ele é formador de imagens que irão transmitir ao público o
sentimento a ser passado. Mesmo no teatro muitas vezes as palavras se calam para que o
movimento seja a forma de expressão. As imagens formadas pelo movimento vão além
delas próprias, elas buscam algo a mais.
Outro ponto o qual o movimento se torna crucial é a dramaticidade. O
drama ocorre a partir do contato de dois artistas (LABAN 1978) e o agrupamento destes
para a ação ocorre através do movimento. Seja qual for a intenção: lutar, dançar, falar, é
o movimento que irá demonstrar o desejo de um artista entrar em contato com o outro,
estabelecendo a ponte entre eles. O movimento se manifesta como agente comunicador.
Assim, a arte do movimento no palco possui a totalidade das expressões
corporais, possuindo o falar, representação, mímica, dança e até mesmo um
acompanhamento musical junto às outras expressões (LABAN 1978). Portanto, pode-se
23
dizer que as artes do movimento são constituídas basicamente por aparências, na qual
suas imagens são o que transmitem ao público as diferentes sensações e sentimentos.
No teatro tem-se a utilização da movimentação corporal, das cordas vocais e
em certos casos o acompanhamento musical. Assim, o teatro é uma arte dinâmica
(LABAN 1978), tendo como base o movimento humano e todos seus fatores
emocionais, físicos e mentais. Os gestos e palavras expressam as idéias e sentimentos,
tais representações somem quase após surgirem, dando assim o caráter dinâmico do
teatro (LABAN 1978). A movimentação no teatro tem o papel de transmitir ao público
as várias questões da existência humana, através do interior e exterior do personagem
(LABAN 1978). O teatro além de ter o poder de exprimir o cotidiano teria também o
poder de reflexão sobre a ação do homem, podendo transcender a nossa realidade, o
qual esse grau de transcendência pode ter diferença de ator para ator. Há aqueles que
baseiam suas performances na habilidade de seus movimentos, sendo atores
estritamente da aparência. Por outro lado, há atores que tentam fazer mais que a
representação da vida, usando o movimento de seu corpo e das cordas vocais com foco
no que deseja transmitir a platéia, não usando necessariamente dos movimentos mais
habilidosos. Assim, mesmo o teatro sendo representado por imagens geradas através do
movimento e pela fala, com caráter baseado na aparência, é identificável um aspecto
que transcende a mesma. Pode-se dizer que o teatro ao ter caráter transcendente busca a
forma, chegando assim à essência, apesar de se constituir na aparência.
A mímica, por sua vez, possui caráter estritamente visual e aparente
(LABAN 1978). Os movimentos do corpo do artista são o meio de expressar as
emoções. Assim, é na mímica que os “esforços conflitantes do homem em sua busca de
valores” (LABAN 1978) se tornam mais evidentes. Contextualizando que esforço para
Laban (1978) é o impulso interior que origina o movimento. A mímica seria então a arte
do movimento que requer mais esforço, uma vez que é desprovida de palavras e música,
se tornando aparente apenas pelas ações corporais do artista. A mímica se estabelece
como a arte mais pautada na aparência, pois é somente através das imagens que ela se
manifesta e se expressa. A mímica não possui o caráter de transcendência, ela é a
imagem reprodutiva de algum objeto em questão, sendo pautada totalmente no mundo
sensível material, não sendo uma forma de busca da essência.
24
A dança, assim como a mímica, tem seu fundamento basicamente nos
movimentos corporais, podendo ser também acompanhada por música (LABAN, 1978).
Dentro das artes do movimento, Laban (1978) separa a dança em “dança pura” e
“dança-mímica”. A dança-mímica pode ser representada pelas danças sociais,
características de um período histórico, representando geralmente um status social de
uma ocasião e localidade. Neste tipo de dança os impulsos interiores criam seus
próprios padrões de estilo segundo a época, e o movimento se caracteriza mais
extrínseco e aparente. A dança pura seria aquela que não possui estória descritível, não
sendo possível descrevê-la em palavras, apenas em movimentos. Os significados dos
gestos seriam interpretados pelo público através do jogo do ritmo e formas, geralmente
ocorrendo em um mundo de valores em desejos sem definição lógica. Essa seria,
segundo Laban (1978), a dança atemporal, que se não adapta aos caracteres, ações e
épocas de onde se situa. A dança pura pode ser então interpretada como aquela que tem
sua “expressão através de movimentos do corpo organizados em sequências
significativas, de experiências que transcendem o poder das palavras e da mímica”
(GARAUDY, 1973). A dança seria então a forma de expressão artística que obtém
maior conexão com a natureza e o ritmo do mundo que cerca o homem, transcendendo
assim a aparência e indo a busca da essência.
Portanto, cabe a reflexão de onde viria o movimento nas artes corporais.
Para Gil (2004), o movimento poderia se iniciar através do esforço, que tem neste caso
seu conceito denominado por Laban (apud GIL, 2004): impulso interior que origina o
movimento. Segundo Laban (1978), no campo da dança e podendo ser aplicado para as
artes do movimento, o esforço contém diversas vertentes, como o peso, o tempo, o
espaço e fluxo. Pela lógica, a combinação dessas vertentes que daria origem e forma aos
diversos tipos de movimentos. Porém, Gil (2004) desconstrói a idéia de que o
movimento surge através do esforço. Ele especifica, contrariando Laban, que os
diversos movimentos não se esboçam antes de se concretizarem, apresentando assim
movimento antes do movimento, excluindo a possibilidade do esforço ser o agente do
movimento.
Segundo Gil (2004), antes do movimento tem-se então o repouso, que
oferece a macropercepção, sendo a micropercepção encontrada no movimento. Assim,
no repouso o artista deverá trabalhar o silêncio total em seu corpo. Gil (2004) cita
25
Cunningham ao dizer que o artista, especificamente o bailarino, deve suspender todo
movimento concreto e sensorial, com o objetivo de criar um movimento com o máximo
de intensidade, com sua origem nas mais diversas criações das formas. O movimento
então seria formulado primeiramente no subjetivo idealista, ou seja, no campo das
idéias para posteriormente se tornar aparente, se constituindo em imagem. Seria o
silêncio o que permite a maior concentração de energia, preparando-a para se espalhar
aos fluxos corporais, gerando assim o movimento. Assim, a fonte para o movimento
seria esse grande silêncio, ou vazio, canalizador de toda a energia para se gerar a forma.
Gil (2002) também afirma que todo artista na execução de seus movimentos
busca sempre o desequilíbrio da posição natural, sendo que esse desequilíbrio também é
formador do movimento. Ao abandonar a posição natural, o corpo tem a possibilidade
de buscar os mais inúmeros movimentos. O corpo ao não estar mais em posição natural
faz-se artificial, e “modulável”, tornando-se a matéria para criação de formas. Ao
desestabilizar a posição natural, o artista procura tratar o corpo como material artístico.
Porém, se houvesse apenas o desequilíbrio físico do “corpo-objeto”, este
corpo não poderia alcançar seu movimento artístico pleno. O desequilíbrio do corpo,
buscando um novo equilíbrio em seus movimentos, não vem apenas de sua capacidade
mecânica, mas também de sua concentração. O equilíbrio não se dará apenas pelo jogo
das forças da matéria em presença, mas da maneira em que a consciência designa a
movimentação. Sem a concentração o artista não conseguirá equilibrar seu corpo, o
equilíbrio não forma um sistema a parte da consciência. Isso não só nos movimentos
artísticos, como também nos movimentos naturais. Mas o artista, principalmente o
bailarino, não se limita a preservar o equilíbrio comum, ele procura o equilíbrio no
desequilíbrio (GIL 2002). As imagens formadas pelos movimentos serão provenientes
dessa busca constante pelo desequilíbrio, será por meio desse sistema que o artista irá se
expressar, se comunicar.
O artista procura a instabilidade no sistema corporal, indo além das
possibilidades naturais da estabilização, com o propósito de estabelecer um “equilíbrio
superior” (GIL 2002), não estático. Através da instabilidade no sistema corporal, o
artista adquiri consciência do movimento, sendo desta forma que a consciência se define
sobre o corpo. Este que se torna instável todo momento, não é apenas um sistema
mecânico, ele possui “espírito” e “energia”.
26
Segundo Gil (2002), o fato de o corpo ter inúmeras tensões e ser atravessado
por forças é fator de impedimento para que ele seja colocado no espaço. O corpo fica
livre de qualquer influência exterior, tendo seu equilíbrio através do jogo das forças que
o puxam para inúmeras direções, ora diminuindo o peso, ora seguindo na inércia, ora
quebrando o movimento, pois se trata de um sistema extremamente instável. Devido a
instabilidade qualquer impulso ou energia microscópica ampliam-se por todo corpo se
tornando macroscópica.
A arte do movimento e mais especificamente a dança constitui-se assim em
buscar o máximo de instabilidade possível, desmembrando e segmentando os
movimentos com objetivo de construir um sistema de equilíbrio de extrema delicadeza
(GIL 2002). Este sistema funcionaria como amplificador dos movimentos
microscópicos do corpo, aqueles as quais a consciência não tem controle se não
concentrar neles. Assim, o corpo fica solto e a consciência deste vira um espaço interior
por onde percorrem os movimentos, que espelham de forma macroscópica, os
movimentos que atravessam o órgão (GIL 2002). O corpo ao expressar os movimentos
depende de um sistema altamente complexo que vai além da matéria pela matéria, pois
a consciência agregada ao corpo gera o movimento e ela é pautada no campo das idéias.
Segundo Aristóteles, o mundo material seria aquele que denota a potência, sendo onde a
aparência se manifesta. Já o campo das idéias vai de encontro com as formas, com a
essência. O corpo em movimento busca assim a integração do material com o campo
das idéias.
Gil (2002) justifica que o “sistema-corpo” descrito acima possui espírito,
uma vez que o equilíbrio não é mecânico ou físico, e sim virtual, porque o corpo que
dança é o corpo virtual, não o de “ossos e músculos”. Assim, este atualiza aquele,
encarnando-o e desmaterializando-o simultaneamente (GIL 2002). Portanto, não haveria
separação entre o corpo e espírito, uma vez que os movimentos corporais produzidos
pela consciência são considerados físicos devido ao efeito macroscópico. Assim, o
visível (macroscópico) e o invisível (microscópico) se enquadram no ontológico dentro
do campo das imagens. Fica estabelecida a relação entre matéria e imagem, gerando
uma “consciência-imagem” existindo no corpo do macroscópico ao microscópico, onde
o primeiro se refere ao próprio corpo e o segundo à consciência e às imagens (GIL
27
2002). A imagem é então uma forma de manifestação da consciência no ontológico,
significando que a aparência pode ter alguma ligação com a essência.
Retomando a teoria de Gil (2002) do equilíbrio virtual, pode-se justificá-lo
como virtual não por partir da consciência do corpo como efeito de causa física, mas
sim porque a ação do equilíbrio se encontra no corpo no próprio momento em que se
expressa, manifesta. Assim, a atualização do virtual seria a ação, o ato (GIL 2002).
Portanto, pode-se dizer que os movimentos presentes nas artes são
constituídos basicamente por imagens, remetendo sempre à aparência. É através desta
que o movimento expressa a arte e transmite os sentimentos ao público. Quando o
movimento transcende, sua transcendência é expressa de forma visual, é um processo
presente no campo das imagens, as quais surgem e desaparecem de forma dinâmica.
Tal dinamismo pode ser dado pela busca constante do equilíbrio no
desequilíbrio. O corpo, dotado de matéria e aparente, segue então, através de sua
consciência, na busca do equilíbrio, que se dá no virtual, através do ato. O ato, segundo
Aristóteles, remete à essência, que é também sinônimo de forma. A essência pode ser
alcançada através dos movimentos artísticos, principalmente pela dança, que como
vimos anteriormente, segundo Garaudy (1973), é a forma de expressão artística que
mais se conecta com a natureza (origem das coisas). A essência alcançada pelos
movimentos será expressa por meio da aparência que é constituída pelas imagens
formadas pelo movimento.
Pode-se dizer então que o corpo, como matéria, teria a potência para os
movimentos no âmbito da arte, constituindo as diversas aparências que a arte corporal
implica. Porém, estes movimentos se concretizam e se tornam aparentes através do
equilíbrio virtual que se constitui basicamente pelo ato, dando forma ao movimento, ou
seja, trazendo a essência ao mesmo.
O verdadeiro movimento da arte, que busca o equilíbrio no desequilíbrio,
tornando o corpo ilimitado, carrega consigo a aparência manifestada na matéria e
essência manifestada no ato. É neste contexto que aparência e essência se constituem
nas artes do movimento, estabelecendo neste um jogo de equilíbrio constante, onde uma
traz consigo a outra para alcançar a plenitude do movimento.
28
5 A questão da Essência e Aparência na Dança
Contemporânea
5. 1 Uma pequena retrospectiva histórica da dança.
Para entender o contexto e elementos que constituem a dança
contemporânea sugerimos saber sua procedência. É preciso entender a forma como
ocorreu sua consolidação, qual sua origem e o que ela vem resgatar na sociedade atual,
contemporânea. De certo, que o trabalho poderia tratar diretamente da dança
contemporânea, mas se assim o fosse, parte de seu sentido ficaria nas entrelinhas. Para
se compreender o presente é essencial entender o passado.
Siqueira (2006) afirma que a dança é “um sistema simbólico composto de
gestos e movimentos culturalmente construídos e faz parte da vida das sociedades desde
tempos arcaicos”. A dança pode assim refletir os diversos tipos de sociedades.
Nas diversas sociedades e culturas existentes na história, a dança teve altas e
aceitações variadas. Pode-se considerar seu princípio nos ritos religiosos, voltado aos
cultos sagrados. É importante observar que no seu princípio, a dança buscava ir além
das formas. Ao se dançar, os povos acreditavam ser a dança o que regia o princípio da
vida. A aparência não era então a maior manifestação da dança entendida como sagrada,
a dança era, fundamentalmente, uma política da essência.
Figura 1: Tocadoras e dançarinas sagradas. Túmulo de
Nakht, Tebas. (CAMINADA, 1999)
29
No ocidente, no período da Idade Média, século X ao XV, a dança foi
considerada mundana, a exposição do corpo era sinônima de vergonha e paganismo,
indo contra a moral do cristianismo pregado na época. A popularidade da dança só
retorna no período do Renascentismo, sendo que à dança vem agregada a operata e a
mímica, esboçando assim o gênero do balé, que viria a se tornar clássico.
O balé clássico, que deu origem à dança sistematizada, pode ser considerado
a partir da renascença italiana, se constituindo como divertimento de salão. Os
“dançarinos” da época declamavam e dançavam junto a um acompanhamento musical e
tinham como traje luxuosos figurinos e se apresentavam em cenários montados. Os
dançarinos podiam ser nobres ou amadores, não possuíam formação profissional e não
ligavam para o profissionalismo. Os balés da corte eram puramente realizados para o
entretenimento, não carregando consigo outra bagagem. Seu aspecto aparente apenas
refletia nas relações sociais, uma vez que dançar era considerado grande meio de
socialização do indivíduo, levando-o em harmonia com o grupo, constituindo parte da
educação de um cavalheiro. Assim, o balé exercia um efeito real sobre aqueles que
assistiam ou participavam dele.
Figura 2: Baile na corte de Henrique III.
Museu do Louvre, Paris. (CAMINADA, 1999)
30
A mitologia grega era tema constante dos balés de corte e tratavam
simbolicamente, através dos personagens, sobre assuntos relativos à política da época.
O grande exemplo é o antigo rei da França Luís XIV, que teve simbolicamente sua
imagem associada ao Sol após interpretar Apolo, ficando historicamente conhecido
como Rei-Sol. Nesse contexto, a dança aparece como uma das formas de se refletir a
sociedade totalmente pautada na aparência.
Figura 3: Luís XIV como O Sol no
“Ballet Royal de La Nuit”
(CAMINADA, 1999)
Nesse ponto pode-se notar grande diferença entre as expressões da dança
primitiva como rituais religiosos e seu uso nos balés de corte. Quando se trata da dança
como rito religioso, põe-se em questão a transcendência, a busca por algo impalpável na
realidade sensível. Já o balé de corte fica atado completamente à realidade sensível e
aparente, nele há apenas a manifestação da sociedade, não se busca o transcendente.
31
O balé passa da corte para o teatro no reinado de Luís XVI, com a criação
da Academie Royale de Musique Et de La Danse, em 1671, destacando-se Lully como
diretor e Beauchamp como mestre de balé. A dança passa então a exigir movimentos
mais refinados e rápidos, deixando de ser dança social, por pura diversão e
extravagância, para transforma-se em coreografia montada e executada por
profissionais. Assim, o balé ganha mais verticalidade e elevação, com melhor
aproveitamento dos braços e do corpo como um todo, o bailarino passa a encarar o
público frontalmente, utilizando-se da posição en dehors . O balé passa a ser visto como
uma arte destinada e expressão e ao desenvolvimento de um tema, não atado apenas a
diversão. Assim, se ganha mais expressão, menos luxo, figurinos mais cômodos e
apropriados para dançar e coreografias com temas (SIQUEIRA, 2006). Pode-se notar
que o balé adquiriu caráter aparente, não há a busca pela essência, apenas a aparência a
ser passada para o público era o que importava aos coreógrafos e bailarinos.
No século XIX, o balé adquire sua identidade moderna, principalmente na
Rússia, com Marius Petipa. O balé moderno utiliza-se da técnica da ponta, do tutu, e da
alusão a leveza e falta de esforço das bailarinas. Estas encenavam criaturas da fantasia,
não havendo reflexão sobre a dada sociedade da época. O caráter dos balés e suas
imagens passadas levavam o público a outra esfera que não a realidade em questão, era
a expressão de uma realidade sensível imaginária.
Figura 4: “Pas de Quatre 1845” com elenco original: Maria Taglioni,
Fanny Cerrito, Lucile Grahn e Carlota Grisi. Museu Teatral do Scala de
Milão. (CAMINADA, 1999).
32
Ainda no século XIX outros elementos começam a se desenvolver na dança,
dando origem à dança moderna, que teve sua consolidação no século XX. A dança
moderna diferentemente do balé clássico tem seus movimentos mais livres e menos
plastificados, buscando-os de forma mais orgânica. A grande percussora da dança
moderna foi Isadora Duncan, que se absteve da técnica do balé clássico em sua dança e
expressava através dela temas abstratos, que buscavam ligação com a natureza. A
consolidação de fato da dança moderna deu-se na Alemanha, através do expressionismo
que vigorava nas artes no início do século XX. O expressionismo era baseado em um
pessimismo cultural gerado por revolta política, intelectual e moral contra um mundo
em que os artistas julgavam ser de extrema agonia. Na dança, a grande percussora do
expressionismo foi Mary Wigman. Discípula de Rudolf Von Laban, ela pregava através
de sua dança renovação cultural e humana, buscando certo misticismo, como exemplo o
filme Das Totenmahl, de 1930, que mostra dança realizada com máscaras para
representar os mortos pela Primeira Guerra Mundial. As máscaras davam alusão dos
mortos como seres despersonalizados, sem esperança de escapar do destino trágico,
conotando ao misticismo.
Segundo Siqueira (2006), a dança moderna almejava então conteúdo e
discurso aos movimentos, expressando significados que fazem da dança uma linguagem
além do virtuosismo. Principalmente pelo fato dos temas da dança moderna serem
pautados na mitologia, cristianismo, religiões orientais e literatura, há reafirmação da
concepção de que a dança permite à alma se expressar em movimento, indo além do
corpo aparente, gerando compreensão da vida.A dança moderna retoma a dança além da
imagem, com o caráter de sublimar a mesma ao expressar sentimentos que vão além da
realidade sensível. Tem-se assim a retomada da essência na dança através da inspiração
no campo das idéias e formas para a realização dos elementos corporais que constituem
a dança.
33
Figura 5: “Sagração da Primavera” de Mary Wigman. Foto
Enkelmann. (CAMINADA, 1999)
A dança moderna para alcançar sua proposta põe o corpo todo para
trabalhar, não enfatizando apenas os membros, como no balé, mas também e
principalmente o tronco. A respiração passa a ser o centro gerador de todo movimento,
conotando traço comum aos trabalhos de dança moderna. (SIQUEIRA, 2006)
A partir deste desenvolvimento técnico, aceitação do público e da crítica, a
dança moderna mostrou que o balé acadêmico não poderia mais dominar o campo da
dança. O mundo se transformou e sua arte deve atualizar-se juntamente com ele, com a
aceitação da contemporaneidade. (SIQUEIRA, 2006)
Nos anos 60, mais uma vez os artistas buscam expandir as fronteiras. O
mundo vive o pós-guerra e intensificam-se os movimentos sociais, políticos e artísticos.
Os artistas se utilizavam de liberdade para a criação de seus movimentos de forma
percussora da crítica, que acompanhava a mudança global do mundo. Diferentes formas
de experimentação foram utilizadas, o expressionismo não é mais presente de forma
34
marcante, o contexto em que os bailarinos estão inseridos se torna mais evidente na
dança e os movimentos passam a ser realizados de diversas maneiras.
A dança contemporânea se consolida então como fruto da experiência do
balé clássico, dança moderna, influências orientais e maneiras recentes e urbanas de se
buscar o movimento (SIQUEIRA,2006). Tem-se então a abordagem de elementos de
várias construções estéticas, ao agregar esses diversos elementos a dança
contemporânea busca a construção de uma nova estética, embora difícil de conceituar,
através de um novo corpo, que explora desde a verticalidade ao contato com o chão.
Figura 6: “Petit Mort” de Kylian com o “Nederlands Dans Theater 1.” (CAMINADA, 1999)
35
5. 2 Contextualização da Dança Contemporânea na Sociedade
A dança contemporânea se consolida na sociedade como meio expressivo e
comunicativo. A diversidade que emprega em seus elementos, tendo diversos
segmentos dentro da própria dança contemporânea lhe confere o poder de expressão das
diferentes formas de se pensar e expressar a sociedade e o ser humano em sua
existência.
A sociedade contemporânea como um todo resgatou as imagens, gestos e
movimentos como forma de transmissão de conhecimento, tendo o corpo como
percussor. O corpo atua então como instrumento básico para análise e reflexão.
Dentro das diversas comunicações não-verbais do corpo pode-se destacar a
dança contemporânea como um grande fenômeno de comunicação, refletindo de modo
particular a sociedade em que ocorre. A dança contemporânea ainda é um fenômeno
estético, cultural e simbólico, que expressa e constrói sentidos através do movimento.
Segundo Siqueira (2006), o corpo é o grande “veículo” de comunicação da
dança contemporânea e modifica sua expressão mediante cada cultura. As técnicas
corporais surgiram paulatinamente fazendo com que o corpo do dançarino adquirisse e
incorporasse elementos. Cada técnica, algumas até transformadas em escolas, fez-se
acertar diversos valores no corpo, construindo imagens que o público deverá decodificar
e interpretar.
A dança contemporânea se constitui de trabalhos executados em silêncio,
acompanhado de falas, frenéticos, quase sem movimento, com ou sem uso da
tecnologia, revelando diversas abordagens estéticas, que refletem diversos segmentos
históricos, econômicos, religiosos e até mesmo técnicos. Nesse contexto, a dança
contemporânea pode ser entendida como parte de um sistema cultural e social, o qual há
trocas de informações constantemente, sempre se modificando, transformando e
atualizando.
Atualmente, os espetáculos de dança contemporânea têm tendência a recorrer a
novos aparatos, treinamentos variados e execução simultânea de eventos no palco,
cabendo aos dançarinos muito mais do que a execução de movimentos, mas também a
uma grande percepção do todo e de ter a consciência além dos movimentos. Os
espetáculos têm diversos modos de expressão (através do movimento), sendo que a
36
maioria tem a cidade como espaço e tempo no qual se desenvolvem, tratando-se assim
de um fenômeno urbano. Portanto, a dança contemporânea recebe múltipla influencia
urbana reafirmando que se constitui em uma rede de relações sociais e culturais. O
corpo do dançarino irá refletir esta influência urbana através dos gestos, trejeitos e
posturas (SIQUEIRA, 2006).
Ao refletir este momento urbano, que é o contexto de nossa sociedade
atualmente, a dança contemporânea assume papel de agente comunicador. Através das
imagens construídas pelos movimentos dos bailarinos é que se tem a comunicação e
expressão da sociedade. Porém, o que é expresso pela dança contemporânea busca mais
que a aparência. A comunicação com o público vai além da imagem, os movimentos
buscam transcende-la, estabelecendo o jogo entre a essência e aparência na dança
contemporânea para contextualizar a sociedade e o ser humano em sua existência.
37
5.3 A Dança Contemporânea – Aparência e Essência
A Dança Contemporânea além de meio comunicativo social, como afirma
Siqueira (2006), pode estabelecer a relação do ser humano com o mundo sensível que o
cerca como também com o inteligível, como será visto neste capítulo.
A dança em si é uma imprescindível forma de expressão do ser humano, ela
está sempre se renovando conforme o contexto histórico e social, atualizando-se, e
constituindo-se de diversos movimentos, expressando diversas formas de se viver.
Porém, além de expressar um contexto social a dança também tem a capacidade de ligar
o ser humano à natureza (GARAUDY, 1973).
Segundo Garaudy (1973), a dança tem o poder de transcender as palavras e
mímicas, possuindo grande poder de expressão ao conseguir transmitir o que as palavras
e mímicas não conseguem. A dança seria em si um modo de existir, de fazer parte de
um todo, vivenciando e exprimindo a relação do homem com a natureza, com a
sociedade e cultura, com intensidade máxima. Assim, a dança vem a constituir relação
ativa entre o ser humano e a natureza, relação a qual o primeiro fator, ser humano, teria
o domínio sobre o segundo, natureza. Enfatizando que natureza aqui é usada no
contexto de origem, em buscar o conhecimento das primeiras causas.
Mesmo a dança se renovando conforme o contexto em que está inserida,
tomando as características deste contexto, ela só viria atingir sua plenitude ao atrelar-se
ao ritmo natural do mundo, ou pode-se dizer até mesmo do universo. Segundo Garaudy
(1973), pode-se ter a forma de identificação do ser humano no mundo através da dança,
conhecendo e incorporando os ritmos da natureza. Garaudy em sua obra exemplifica tal
relação de dança e natureza ao descrever a dança do deus indiano Shiva:
A dança de Shiva exprime as cinco atividades divinas: a criação continua do
mundo, pois do ritmo desta dança o universo nasceu e se expande; a
manutenção deste universo, pois o equilíbrio deste cosmos em movimento
incessante só se conserva pelo ritmo da dança; a destruição, pois as formas
se destroem para que outras possam nascer infinitamente, e Shiva dança em
meio às chamas dos palácios incendiados; a reencarnação, pois a dança de
Shiva mostra o percurso através das diversas vidas, para além das ilusões de
existências limitadas; a salvação, enfim, ou a libertação última pela qual
cada um toma consciência do que é pó toda eternidade: um momento da
atividade rítmica de Shiva, o deus que dança.
38
Figura 7: Shiva Dançando (Museu Guimet, Paris).
(CAMINADA, 1999)
A dança pensada desta forma vem a transcender a matéria, ela transcende o
mundo sensível (material). No início, a dança é apenas aparência, a imagem do jogo
rítmico em questão, fonte do movimento do ser, mas ao tomar o entendimento do ritmo
natural liberta o homem da ilusão de ser aprisionado por seu corpo, dando-lhe caráter
ilimitado. O corpo e o ser contemplariam o universo por inteiro. A aparência,
constituída pelas imagens, passa a ser veículo para a expressão das formas, que se
constroem e destroem constantemente, gerando o ritmo do mundo. Retomando
Aristóteles, a dança sendo constituinte das formas é entendida aqui como essência, já
que está seria a forma. O corpo constituiria a potência para a dança no mundo sensível,
ao reproduzir o ritmo do universo. A aparência ficaria então secundária à essência. A
dança sagrada seria o modo total de viver o mundo: em tempo, conhecimento, arte e
religião (GARAUDY, 1973). A dança seria a harmonia de um todo: integração do ser,
corpo, mundo e universo.
Vale ressaltar que no contexto da dança sagrada não há performance, o
objetivo vai além do estético, ela atua como forma de ligação do ser humano com sua
origem. Toda ela é realizada de maneira transcendente ao corpo. O corpo sendo o meio
de manifestação da dança em matéria é representador de integridade, pois, segundo
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Garaudy, o carnal também é sagrado, constituindo a beleza e a grandeza do ato ao não
separar o homem de si mesmo, mas estando inteiramente presente em sua ação,
principalmente. O corpo é a aparência e ao mesmo tempo veículo para se chegar a
essência enquanto se dança.
Segundo Garaudy (1973), seria através das danças e dos cantos que o
homem se afirma como membro de uma sociedade. Em cada organização social há o
trabalho e a vivência que se dão de forma ritmada. A dança seria então a transformação
dos ritmos da natureza e biológicos em ritmos voluntários, dando ao ser humano poder
para dominar a natureza.
Pode-se dizer que a dança seria a ponte entre o inteligível e o sensível, ao
ser através dela que se compreendem os ritmos e formas da natureza. A dança seria no
sensível a expressão de toda a rítmica universal, estabelecendo conexão entre o ser, o
mundo e o inteligível. A manifestação das imagens criadas quando se dança permite a
conexão e comunicação entre um ou mais seres, a aparência estabelece a comunicação.
A partir desta comunicação, os seres já interligados conseguem transmitir uns aos outros
o sentimento e a transcendência implícita em sua dança. A dança seria além de ponte
entre o ser humano e a natureza, a ponte que conecta os seres humanos entre si.
Ressaltando que até este ponto a dança está sendo tratada de forma não
performática. Vale-se até aqui o contexto da dança dita “sagrada”. Essa dança age como
força dos povos, como dizia Confúncio (apud GARAUDY, 1973), no século VI:
“Mostram-me como dança um povo e eu lhes direi se sua civilização está doente ou tem
boa saúde”. Pode-se constatar que além da dança ser a conexão do ser humano com o
todo, ela também é detentora de toda uma cultura de dada sociedade, carregando
consigo todas as características dos povos.
Porém, como visto anteriormente, durante a história a dança perde seu
caráter sagrado. Ela passa por momentos de grande aceitação e de negação e se
consolida hoje na “Dança Contemporânea”, que se expressa basicamente através de
performances, espetáculos.
Apesar de performática a Dança Contemporânea vem estabelecendo maior
conexão com os ritmos naturais, buscando assim como na dança sagrada a
transcendência do movimento. Segundo Siqueira (2006), a dança contemporânea surge
em busca da diversidade, ela está em busca de sua estética, porém desconstruindo a
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idéia de uma estética padronizada e rígida. Para exemplificar a retomada do caráter de
transcendência na dança contemporânea, tem-se a grande diferença entre esta e a dança
acadêmica ou balé clássico. No que diz respeito ao plano corporal, a dança acadêmica
ou balé clássico é rígido, voltado totalmente à verticalidade, obedece a regras de
terceiros, constituindo-se assim através da repetição de movimentos padronizados, não
havendo grande fluxo de movimento. O corpo na dança contemporânea já é dotado de
maior autonomia e busca o diálogo e comunicação, estabelecendo uma ponte de
sentimentos com o público. Ao quebrar a rigidez da dança acadêmica, que buscava
minimizar as diferenças corporais através desta rigidez, a dança contemporânea traz de
volta à dança a autonomia e liberdade. Ao ser conferida a liberdade e autonomia dos
movimentos, chega-se mais perto ao ritmo natural do mundo e os sentimentos estão de
volta à dança em sua expressão. A dança contemporânea então se consolida como
fenômeno construtor de sentidos dentro do real, refletindo através de sua expressão a
sociedade a qual está inserida.
Figura 8: Cia de Dança Deborah Colker, Nó.
Fonte: http://www.ciadeborahcolker.com.br
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A dança contemporânea pode ser considerada na atualidade como
“expressão criadora” que confere ao ser humano a situação de “ser-no-mundo”, não
existindo apenas no sentido de “corpo-objeto”, pois há o entrelaçamento do corpo e
consciência, que nos permite então a percepção do mundo. Assim, a dança
contemporânea resgata verdadeiramente a capacidade de infinita criação e
ressignificação humana. A expressão na dança contemporânea é (re)construída e
(re)inventada a partir de cada sujeito, de acordo com sua percepção e seu sentido que é
único e em paradoxo também é múltiplo (MARQUES, 2013).
Segundo Marques (2013), a dança ao se voltar para as experiências
humanas, sendo manifestada a partir do próprio sujeito, conota consigo o caráter de
redução fenomenológica, ao “voltar às coisas próprias” (MARQUES 2013), atingindo a
essência dos fenômenos. A realidade concebida até então é colocada por um instante em
segundo plano para que o olhar seja voltado à origem das coisas, como o olhar primeiro.
Ou seja, há volta do olhar para a natureza. Juntamente a redução fenomenológica, o
dançarino contemporâneo, sendo a unificação de consciência e corpo, também busca
entender o mundo-vivivo, que é aquele que se da através da vivência aparente. Essa
relação entre mundo-vivido e a fenomenologia é essencial, pois o mundo como
fenômeno só terá sentido ao sujeito em sua manifestação (vivência).
Assim, o dançarino contemporâneo se (re)inventa constantemente e se
expressa pautado no mundo sensível que o cerca, buscando em complemento a essência
dos fenômenos, através da consciência corpórea. Portanto, o dançarino expressa através
de seu corpo imagens que buscam transcender elas mesmas. A imagem sendo
interpretada por si só não é capaz de se fazer entender o significado de que a dança
contemporânea vem a expressar. A imagem se porta como o veículo para uma
consciência além da realidade visível.
Porém, diferentemente das danças sagradas pode-se dizer que a aparência na
dança contemporânea não fica secundária a essência. A dança contemporânea busca
transcender a imagem e alcançar as formas originárias, que seriam em si a essência.
Porém, a dança contemporânea ao se estabelecer como forma de comunicação entre os
homens conota assim a aparência. O dançarino contemporâneo não dança apenas para
si, ele se comunica com o outro, o público é peça fundamental para a dança
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contemporânea e a estética é a base para que a comunicação seja realizada com sucesso.
O dançarino contemporâneo passa então a buscar a essência na estética.
Segundo Garaudy (1973), toda dança implica participação. No caso da
dança contemporânea, mesmo que ela seja firmada no espetáculo, não é apenas com os
olhos que o público a acompanha. A dança mobiliza certo sentido pelo qual o público
passa a ter consciência da posição e tensão de seus próprios músculos, relatando um
fenômeno de comunicação intensa entre o dançarino e o participante. O contato entre
dançarino e público através do movimento do corpo em sua máxima tensão, manifesta
no público a emoção e entendimento das imagens constituídas pelos movimentos dos
dançarinos que estão se apresentando.
Garaudy (1973) utiliza-se da expressão “metacinese” para definir esta
transmissão direta entre o dançarino e público, sendo que a comunicação se da por
simpatia direta que faz reviver os sentimentos, constituindo assim um dos mais elevados
ensinamentos da dança, enriquecendo a própria vida de quem dança e de quem assiste a
dança. Ao passar os sentimentos a dança denota unidade em seus movimentos,
mostrando que o espírito e corpo não são domínios separados, mas atuam em mesma
realidade. A arte seria então o caminho mais curto entre dois seres humanos
(GARAUDY,1973). Aqui a estética reafirma-se como valor fundamental na
comunicação entre os homens contemporâneos e a dança retorna a ter caráter de
integração e ligação do ser humano com sua natureza. Tem-se a retomada da essência
presente na dança, apesar do constante valor estético pautado nas aparências.
O valor estético se consolidou como fator imprescindível nas comunicações
e expressões da humanidade. Retomando Maffesoli (1996), a sociedade está pautada na
ética da estética. A dança contemporânea, como visto anteriormente, vem a agregar este
fator estético. As imagens são formadas através dos movimentos com o máximo de
intencionalidade para que haja a ligação entre público e dançarino. Segundo Garaudy
(1973), a experiência estética pode ser a ponte para abranger realidades maiores que vão
além da apropriação do tipo intelectual apenas. O dançarino seria então projetivo,
induzindo experiência além da palavra. Garaudy (1973) coloca a dança além da
verbalização: “Se pudéssemos dizer uma certa coisa, não precisaríamos dançá-la.”. A
dança contemporânea seria assim indicadora de transcendência.
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A dança contemporânea transcenderia então os objetos. Para exemplificar
esta transcendência pode-se usar o exemplo de Gaurady (1973): o dançarino ao
expressar no palco uma árvore não estará apenas a imitando, porque se assim fosse
estaria exercendo a mímica e não a dança. Ao dançar como uma árvore o dançarino iria
viver o mundo como árvore, iria expressar “ o movimento graças ao qual as raízes não
param de extrair forças do universo para projetar ao céu ramos e flores, fecundar
infinitamente a terra e respirar o céu”. O dançarino passa a representar a árvore não
como um objeto, mas como um ato. Segundo Aristóteles, o ato aqui empregado seria a
essência em si, a forma.
A dança que transcende a aparência estaria então em busca da essência das
coisas, a forma. Porém mesmo sendo transcendente, a dança é totalmente pautada na
aparência, pois sem movimento não haveria dança e o movimento é gerador de imagem,
que constitui a aparência. A dança contemporânea é então expressada através das
aparências e busca a essência ao transcender os objetos em busca da natureza.
Assim, a dança contemporânea seria a expressão de toda a diversidade da
sociedade e cultura atual, resgatando ao mesmo tempo o caráter da dança como ponte
do ser humano com a natureza (origem das coisas) e como dos seres humanos entre si.
O corpo na dança contemporânea, juntamente com a consciência é quem realiza os
movimentos, tornando a dança possível. Os movimentos formados pelo corpo-
consciência geram as imagens, que irão atingir o público, expressando o sentimento a
ser passado pelo dançarino. Tal sentimento carrega consigo a transcendência das
imagens geradas pelos movimentos.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A dança contemporânea seria uma tentativa de expressão de toda a
diversidade da sociedade e cultura atual, resgatando ao mesmo tempo o caráter da dança
como ponte do ser humano com a natureza (origem das coisas) e como dos seres
humanos entre si. O corpo na dança contemporânea, juntamente com a consciência é
quem realiza os movimentos, tornando a dança possível. Os movimentos formados pelo
corpo-consciência geram as imagens, que irão atingir o público, expressando o
sentimento a ser passado pelo dançarino. Tal sentimento carrega consigo a
transcendência das imagens geradas pelos movimentos.
Vale citar um pequeno trecho de Paul Valéry (1996) que exemplifica a
magnitude que a dança pode alcançar enquanto aparência e essência, não só para quem
se dança, mas também para quem assiste a dança:
“Sócrates – ó meus amigos, o que é verdadeiramente a dança? (p.37)
Erixímaco – Não é o que estamos vendo? – Que queres de mais claro sobre a
dança, além da dança nela mesma? (p.38)
Sócrates – Mas o que é então a dança, e que podem dizer os passos? (p.38)
Fedro – Não é ela a alma das fábulas, e a fresta de todas as portas da vida?
(p.39)
Erixímaco – podes, então conforme teu humor compreender, não
compreender: achar belo, achar ridículo, como quiseres? (p.40)
Fedro – Quanto a mim, Sócrates, a contemplação da dançarina me faz
conceber muitas coisas, e muitas relações entre as coisas, que, no momento,
constituem meu próprio pensamento. Ela inteira [...] era o amor!...Era jogos
e prantos [...]. Não é ela de repente uma onda no mar? Ora mais pesada, ora
mais leve que seu corpo... (p.42/43)
Erixímaco – Fedro quer, a todo custo que ela represente alguma coisa!
(p.43)
Fedro – Que pensas, Sócrates? [...] Crês que ela represente alguma coisa?
(p,43)
Sócrates – Coisa nenhuma, caro Fedro. Mas qualquer coisa, Erixímaco.
Tanto o amor quanto o mar, e a própria vida, e os pensamentos... Não sentis
que ela é o ato puro das metamorfoses? (p.44)”
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Assim, a dança contemporânea se estabelece através do jogo entre essência
e aparência, no qual não há domínio de uma sobre a outra. A dança contemporânea se
constituí através da aparência, que é sua manifestação e forma de comunicação, mas ao
buscar ir além da aparência a dança se faz essência, ela busca a forma.
A dança contemporânea então se torna essência através da aparência,
estabelecendo um jogo constante entre as duas, no qual é infrutífero separar os
fenômenos, mas antes, fruir esteticamente com eles.
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