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Erudito e popular: do inconciliável ao indiscernível. Ensaio sobre Estética e Epistemologia. 1 Antonio Herci Ferreira Júnior Mestrando pelo Interunidades de Pós Graduação em Estética e História da Arte (PGEHA) — MAC / FFLCH / ECA / FAU / CPR — Universidade de São Paulo (USP) Orientação: Prof. Dr. Arthur Hunold Lara Trata-se, aqui, de refletir sobre uma das questões mais sensíveis da tradição da crítica e análise musicais, que traz profundas marcas sobre a regulação ou discriminação de determinados ritmos, costumes ou estéticas: a bipartição da arte em “erudita” e “popular”. Parte-se do impacto que teve, no Brasil, a recepção da teoria do fetichismo na música e da regressão da audição, de Theodor Adorno, e de uma certa tradição estética que, a partir da aplicação da fórmula marxista da alienação ou da divisão do trabalho, da crítica à cultura de massa e da reprodutibilidade, identifica nas novas formas de relação entre arte e meio, nos ritmos regulares das canções e das batidas de origem africana, sertaneja ou tribal, um campo estético de manipulações e enganações, enfeixado sob o epíteto do fetichismo. Em contraposição a um outro campo capaz de conter “valores verdadeiros”, que estaria em um processo de decadência e perda de essencialidade. Tradição que seria caracterizada pelo resgate ou busca melancólica de uma “aura” reconhecível ou emanada da obra de arte legítima e pela necessidade da reafirmação do “rico de informação”, da “não redundância”, do 1 Resumo expandido submetido ao “II seminário de estética e crítica de arte. Arte e política: territórios em disputa” em 15 de julho de 2015. 1

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Congresso na FFLCH/USP, Território em disputa. Filosofia e estética.

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Page 1: Erudito e Popular

Erudito e popular: do inconciliável ao indiscernível.

Ensaio sobre Estética e Epistemologia.1

Antonio Herci Ferreira Júnior

Mestrando pelo Interunidades de Pós Graduação

em Estética e História da Arte (PGEHA)

— MAC / FFLCH / ECA / FAU / CPR —

Universidade de São Paulo (USP)

Orientação: Prof. Dr. Arthur Hunold Lara

Trata-se, aqui, de refletir sobre uma das questões mais sensíveis da

tradição da crítica e análise musicais, que traz profundas marcas sobre a

regulação ou discriminação de determinados ritmos, costumes ou estéticas: a

bipartição da arte em “erudita” e “popular”.

Parte-se do impacto que teve, no Brasil, a recepção da teoria do

fetichismo na música e da regressão da audição, de Theodor Adorno, e de

uma certa tradição estética que, a partir da aplicação da fórmula marxista da

alienação ou da divisão do trabalho, da crítica à cultura de massa e da

reprodutibilidade, identifica nas novas formas de relação entre arte e meio, nos

ritmos regulares das canções e das batidas de origem africana, sertaneja ou

tribal, um campo estético de manipulações e enganações, enfeixado sob o

epíteto do fetichismo. Em contraposição a um outro campo capaz de conter

“valores verdadeiros”, que estaria em um processo de decadência e perda de

essencialidade.

Tradição que seria caracterizada pelo resgate ou busca melancólica de

uma “aura” reconhecível ou emanada da obra de arte legítima e pela

necessidade da reafirmação do “rico de informação”, da “não redundância”, do

1 Resumo expandido submetido ao “II seminário de estética e crítica de arte. Arte e política: territórios em disputa” em 15 de julho de 2015.

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“verdadeiro”; em contraposição ao “fútil”, “valores do mass media”, ao

“efêmero” ou “acidental”.

São apresentadas, em contraste a isso, as proposições de H. J. Koellreutter, Mário Schenberg — colaboradores recorrentes na postulação de

um Novo Humanismo — e Nicolas Bourriaud, que convergem para uma

Estética Relacional, caracterizada pela concepção de “arte participante” ou

“arte funcional”, que entende o objeto de arte não como algo dado a partir de

emanações ou cânones de beleza, mas constituído e valorado a partir de

relações sociais e resultante de um modo de vida, onde são reconsideradas as

contribuições da mass media como valor expressivo e criativo, abandonadas as

ideias de essencialidade e onde os limites entre a “arte” e o “cotidiano” se

encontram borrados.

Defende-se que tais posições estariam mais aptas a compreender as

relações expandidas entre a música, a epistemologia e outras linguagens na

contemporaneidade, como a performance e a arte no contexto da sociedade

em rede.

Por outro lado, ao postular um campo indiscernível entre o “erudito” e o

“popular”, seriam mais adequadas para avaliar fenômenos contemporâneos

como o Funk e a música de massa sem repetir ou incorrer na discriminação e

preconceito social que marcaram a história da música brasileira, por exemplo

em consideração ao Maxixe, Umbigada ou mesmo ao Samba.

Palavras-chave: Estética relacional; Novo Realismo; Cultura de massa; Rede;

Novo humanismo.

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