evolução paleogeográfica da planície costeira da praia vermelha, entrada da baía de guanabara,...

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92 Anuário do Instituto de Geociências - UFRJ www.anuario.igeo.ufrj.br Evolução Paleogeográfica da Planície Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baía de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros Palinológicos The Palaeogeographical Evolution of the Shore Plane of the Praia Vermelha, Entrance of the Guanabara Bay, Rio de Janeiro, Through Palynological Registers Robson Lucas Bartholomeu 1 ; Marcia Aguiar de Barros 1 ; Marcel Rocha Soares Lopes 2 ; Claudia Gutterres Vilela 3 & Ortrud Monika Barth 1,4 1 Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Geociências, Departamento de Geologia, Laboratório de Palinologia, Rua Athos da Silveira Ramos 274, Cidade Universitária, 21941-916. Rio de Janeiro, RJ, Brasil 2 Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Geociências, Departamento de Geografia, Rua Athos da Silveira Ramos 274, Cidade Universitária, 21941-916. Rio de Janeiro, RJ, Brasil 3 Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Geociências, Departamento de Geologia, Laboratório de Análise Micropaleontológica, Rua Athos da Silveira Ramos 274, Cidade Universitária, 21941-916. Rio de Janeiro, RJ, Brasil 4 Instituto Oswaldo Cruz, Av. Brasil 4365, 21040-900 Rio de Janeiro, RJ, Brasil E-mails: [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; barth@ioc.fiocruz.br Recebido em: 09/11/2013 Aprovado em: 20/12/2013 DOI: http://dx.doi.org/10.11137/2014_1_92_103 Resumo Sedimentos turfosos, expostos em períodos de ressaca, foram encontrados na Praia Vermelha, área urbana da cidade do Rio de Janeiro. As análises palinológicas aplicadas a estes sedimentos, visando verificar variações ambientais que possam ter ocorrido durante o Período Quaternário, compreenderam o intervalo de tempo entre 4.520 – 4.270 anos A.P. Os resultados obtidos indicaram que durante o intervalo de tempo citado havia inicialmente o domínio de uma vegetação característica de mata de restinga que passou a ser dominada pela vegetação de brejo de restinga, sem intervenção marinha. A ocorrência de um grande número de esporos apresentando danos de corrosão/degradação por terem sofrido oxidação pela exposição ao ar, indica que ocasionalmente houve menor disponibilidade de água no local. Palavras-chave: Palinologia; Quaternário; Praia Vermelha; cidade do Rio de Janeiro Abstract Peat sediments were observed during high tide occasions in the Praia Vermelha beach, urban area of the Rio de Janeiro city. They were studied to investigate possible environmental variations during the Quaternary Period. Palynological analysis was carried out comprising a time interval from ca. 4.520 ± 80 to 4.270 ± 60 years B.P. During this time the results obtained indicate that a restinga forest vegetation was sequentially dominated by a restinga bog vegetation. A great number of spores presenting corrosion/degradation damage, typical characteristics of exposition to the air, indicate that low quantity of water was disposable occasionally. Keywords: Palynology; Quaternary; Praia Vermelha; Rio de Janeiro city Anuário do Instituto de Geociências - UFRJ ISSN 0101-9759 e-ISSN 1982-3908 - Vol. 37 - 1 / 2014 p. 92-103

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Sedimentos turfosos, expostos em períodos de ressaca, foram encontrados na Praia Vermelha, área urbana dacidade do Rio de Janeiro. As análises palinológicas aplicadas a estes sedimentos, visando verificar variações ambientaisque possam ter ocorrido durante o Período Quaternário, compreenderam o intervalo de tempo entre 4.520 – 4.270anos A.P. Os resultados obtidos indicaram que durante o intervalo de tempo citado havia inicialmente o domínio deuma vegetação característica de mata de restinga que passou a ser dominada pela vegetação de brejo de restinga, semintervenção marinha. A ocorrência de um grande número de esporos apresentando danos de corrosão/degradação porterem sofrido oxidação pela exposição ao ar, indica que ocasionalmente houve menor disponibilidade de água no local.

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    Anurio do Instituto de Geocincias - UFRJ www.anuario.igeo.ufrj.br

    Evoluo Paleogeogrfica da Plancie Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros Palinolgicos

    The Palaeogeographical Evolution of the Shore Plane of the Praia Vermelha, Entrance of the Guanabara Bay, Rio de Janeiro, Through Palynological Registers

    Robson Lucas Bartholomeu1; Marcia Aguiar de Barros1; Marcel Rocha Soares Lopes2; Claudia Gutterres Vilela3 & Ortrud Monika Barth1,4

    1Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Geocincias, Departamento de Geologia, Laboratrio de Palinologia, Rua Athos da Silveira Ramos 274, Cidade Universitria, 21941-916. Rio de Janeiro, RJ, Brasil

    2Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Geocincias, Departamento de Geografia, Rua Athos da Silveira Ramos 274, Cidade Universitria, 21941-916. Rio de Janeiro, RJ, Brasil

    3Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Geocincias, Departamento de Geologia, Laboratrio de Anlise Micropaleontolgica, Rua Athos da Silveira Ramos 274, Cidade Universitria, 21941-916. Rio de Janeiro, RJ, Brasil

    4Instituto Oswaldo Cruz, Av. Brasil 4365, 21040-900 Rio de Janeiro, RJ, BrasilE-mails: [email protected]; [email protected]; [email protected];

    [email protected]; [email protected] em: 09/11/2013 Aprovado em: 20/12/2013

    DOI: http://dx.doi.org/10.11137/2014_1_92_103

    Resumo

    Sedimentos turfosos, expostos em perodos de ressaca, foram encontrados na Praia Vermelha, rea urbana da cidade do Rio de Janeiro. As anlises palinolgicas aplicadas a estes sedimentos, visando verificar variaes ambientais que possam ter ocorrido durante o Perodo Quaternrio, compreenderam o intervalo de tempo entre 4.520 4.270 anos A.P. Os resultados obtidos indicaram que durante o intervalo de tempo citado havia inicialmente o domnio de uma vegetao caracterstica de mata de restinga que passou a ser dominada pela vegetao de brejo de restinga, sem interveno marinha. A ocorrncia de um grande nmero de esporos apresentando danos de corroso/degradao por terem sofrido oxidao pela exposio ao ar, indica que ocasionalmente houve menor disponibilidade de gua no local.Palavras-chave: Palinologia; Quaternrio; Praia Vermelha; cidade do Rio de Janeiro

    Abstract

    Peat sediments were observed during high tide occasions in the Praia Vermelha beach, urban area of the Rio de Janeiro city. They were studied to investigate possible environmental variations during the Quaternary Period. Palynological analysis was carried out comprising a time interval from ca. 4.520 80 to 4.270 60 years B.P. During this time the results obtained indicate that a restinga forest vegetation was sequentially dominated by a restinga bog vegetation. A great number of spores presenting corrosion/degradation damage, typical characteristics of exposition to the air, indicate that low quantity of water was disposable occasionally. Keywords: Palynology; Quaternary; Praia Vermelha; Rio de Janeiro city

    A n u r i o d o I n s t i t u t o d e G e o c i n c i a s - U F R JISSN 0101-9759 e-ISSN 1982-3908 - Vol. 37 - 1 / 2014 p. 92-103

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    Evoluo Paleogeogrfica da Plancie Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros PalinolgicosRobson Lucas Bartholomeu; Marcia Aguiar de Barros; Marcel Rocha Soares Lopes; Claudia Gutterres Vilela & Ortrud Monika Barth

    1 Introduo

    As flutuaes do nvel relativo do mar ao longo do Quaternrio constituem fator de grande importncia na evoluo das plancies costeiras do Brasil (Suguio et al., 1985; Martin & Suguio, 1989). No compartimento de relevo costeiro fluminense, compreendido entre Cabo Frio e Angra dos Reis, sucessivas transgresses e regresses marinhas quaternrias formaram sequncias de cordes litorneos, frequentemente ocorrendo em forma de duplos cordes, dispostos paralelamente entre si, separados por depresses estreitas, em cuja retaguarda se desenvolveu um conjunto de lagunas (Muehe, 1998).

    Dentro deste contexto, o afloramento de turfas durante perodos de ressaca na Praia Vermelha (Macedo, 1971), localizada entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, pode se constituir num importante indicador das oscilaes do nvel relativo do mar durante o Holoceno para a regio da Baa de Guanabara. No entanto, h dvidas quanto origem desses depsitos, de modo que ainda no foi estabelecida nenhuma relao entre esses depsitos com outros indicadores de oscilao do nvel relativo do mar na regio.

    Quanto natureza desses depsitos, especula-se que poderiam ser de origem lagunar ou paludial ou mista, pois h registros iconogrficos e cartogrficos dos sculos XVI e XVII (Tossato, 1994; Almeida, 1998) que indicam a ocorrncia de um corpo hdrico na depresso entre os cordes da praia Vermelha e da praia da Saudade, na enseada de Botafogo, que ligavam o conjunto dos morros da Urca e do Po de Acar ao continente (Amador, 1997). Uma anlise palinolgica desses sedimentos poderia confirmar essas assunes, pois ela constitui uma ferramenta que empregada na reconstituio ambiental, permitindo um grande detalhamento da evoluo de paisagens costeiras e continentais durante o Quaternrio (Absy & Suguio, 1975; Barros, 2003; Coelho, 1999; Lorscheitter, 1988; 1989; Luz, 1997; 2003; Santos, 2000, Ybert et al., 2001). Alm disso, estudos palinolgicos de ambientes costeiros no Estado do Rio de Janeiro so pouco numerosos, destacando os de Toledo (1998) em sedimentos lagoa Salgada, os de Coelho (1999) e Santos (2000) em sedimentos da baa de Sepetiba, os de Misumi (2011) da bacia hidrogrfica do rio Guandu e os Barth et al. (2011) em sedimentos da baa de Guanabara.

    Com relao idade dos depsitos desse corpo hdrico e sua relao com a evoluo da linha de costa na regio da baa de Guanabara no Holoceno, Amador (1985; 1997) levanta a hiptese de que esse corpo hdrico seria uma laguna do tipo intercordo, que evoluiria, por processos de colmatao, para pntanos. Segundo o autor, este tipo de laguna teria sido gerado aps a segunda regresso do nvel relativo do mar no Holoceno (Suguio et al., 1985) e, portanto, seria mais recente que 3.000 anos AP.

    A descoberta de um depsito de turfa na intermar da Praia Vermelha, dessa vez embutido no prisma praial emerso, constitudo de camadas de lama, turfa e areia, facilitou a sua amostragem e assim possibilitou a realizao da estratigrafia dos depsitos e anlises sedimentolgicas, bem como palinolgicas que so o objetivo da presente investigao.

    2 rea de Estudo

    A rea de estudo a plancie costeira da Praia Vermelha, localizada no bairro da Urca, Rio de Janeiro (Figura 1). Essa pequena praia, cercada por promontrios rochosos (pocket beach), uma plancie composta por sedimentos marinhos e hoje, na sua maioria, cobertos por aterros que ligam o conjunto de morros da Urca e do Po de Acar ao continente. O pacote de sedimentos turfosos apresenta-se ocasionalmente vista em pores descontnuas ao longo da faixa de praia (Figura 2).

    Figura 1 Localizao da Praia Vermelha, entrada da baa de Guanabara.

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    Evoluo Paleogeogrfica da Plancie Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros PalinolgicosRobson Lucas Bartholomeu; Marcia Aguiar de Barros; Marcel Rocha Soares Lopes; Claudia Gutterres Vilela & Ortrud Monika Barth

    A vegetao nativa a floresta tropical (Mata Atlntica) (Veloso et al., 1991). Essa floresta compreende vrios mosaicos de ecossistemas florestais com estrutura e composio muito diversas, segundo os tipos de solos, a topografia e as caractersticas microclimticas (Carauta & Oliveira, 1984). No entanto, ela est sempre exposta aos ventos midos que sopram do oceano para a terra. Na costa, dentro da faixa de Mata Atlntica, encontramos vrios padres de vegetao associados a ambientes de sedimentao e ao ambiente das mars atual. Nas escarpas de terras mais altas encontra-se uma floresta tropical de planalto, resultante da existncia de um clima mido, mas com a sazonalidade bem marcada. A paisagem demonstra graus variados de transformaes antrpicas (Radambrasil, 1983; Marques & Martins, 1997). No conjunto dos morros da Urca, Po de Acar e nas colinas da Babilnia ocorrem vrios tipos de vegetao que incluem a floresta tropical, a flora rupcola, o capim murumbu (colonio ou da Guin), plantas ruderais e a vegetao dos cumes (Carauta & Oliveira, 1984).

    3 Material e Mtodos3.1 Estratgia de Coleta de Sedimentos e Materiais

    No depsito embutido nos sedimentos do prisma praial emerso foi levantada uma seo estratigrfica atravs de abertura de trincheira, localizada a 225716 S 430953 W (Figura 3). Foram realizadas descries de espessura de suas camadas, relaes de contato, anlises granulomtricas e de estruturas sedimentares. Cerca de 1,0 kg de sedimento de cada camada foi coletado.

    Amostras das duas camadas orgnicas turfosas (turfas I e II) foram coletadas para datao

    radiomtrica pelo mtodo do 14C. As anlises palinolgicas foram realizadas em uma sequncia de sedimentos no mesmo perfil estratigrfico, abarcando a turfa inferior, a areia lamosa intermediria e a turfa superior. A coleta foi realizada em canaletas de alumnio (45 x 2,5 x 2 cm), dentro das quais foram definidas oito subamostras, cujo tratamento qumico seguiu a padronizao segundo Ybert et al. (1992).

    Foram levantados materiais cartogrficos e iconogrficos antigos para auxiliar na interpretao do ambiente de sedimentao.

    Figura 2 Turfa exumada na rampa de swash da praia Vermelha, RJ (1998).

    Figura 3 Trincheira aberta no prisma praial emerso da praia Vermelha, RJ, mostrando os depsitos de turfa, lama e areia basal. Ao centro a canaleta de alumnio de 40 cm de comprimento empregada na amostragem de sedimentos para anlise palinolgica.

    3.2 Mtodos

    As amostras das turfas superior e inferior foram datadas pelo mtodo radiomtrico de 14C em espectrmetro de massa com acelerao de partculas pelo Laboratrio Beta Analytic (Flrida, USA).

    As fraes de areia lamosa foram submetidas a exame microscpico que objetivaram a identificao da estrutura dos gros de areia, bem como uma possvel ocorrncia de microfsseis marinhos como foraminferos, ostracodes e espculas de esponjas.

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    Evoluo Paleogeogrfica da Plancie Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros PalinolgicosRobson Lucas Bartholomeu; Marcia Aguiar de Barros; Marcel Rocha Soares Lopes; Claudia Gutterres Vilela & Ortrud Monika Barth

    Para as preparaes palinolgicas, as amostras de sedimento de aproximadamente 8 cm3 de volume foram tratadas sucessivamente com solues cido fluordrico (HF) a 40% (v/v), cido clordrico (HCl) a 10% (v/v), acetlise clssica e cloreto de zinco (ZnCl2) densidade 2, sendo preparadas trs lminas de cada. Objetivando determinar a concentrao dos palinomorfos, foram adicionadas pastilhas de esporo extico Lycopodium clavatum, contendo um nmero conhecido de esporos, no incio do processamento do material.

    4 Resultados

    A abertura de uma trincheira no ps-praia permitiu a identificao das camadas sedimentares descritas no perfil sedimentar (Figura 4).

    que capeia esta camada. Isto indica uma reduo de energia neste sentido, que culmina com na deposio de matria orgnica caracterizando a colmatao total da depresso.

    Pela anlise palinolgica foram identificados 89 txons de palinomorfos. Estes foram agrupados segun-do as comunidades vegetais nas quais se enquadraram por frequncia relativa ou concentrao absoluta (Ta-belas 1, 2 e 3; Figuras 5 e 6).

    A mineralogia das areias basais caracterizada pela forma dos gros variando de muito angulares at arredondados. A camada de lama mostrou uma diminuio progressiva dos teores de areia e aumento progressivo dos teores de silte e argila conforme a classificao de Shepard (1954) em direo turfa

    Figura 4 Perfil sedimentar de um depsito turfoso da praia Vermelha, bairro da Urca, Rio de Janeiro. Os nmeros direita indicam os nveis analisados.

    Tabela 1 Lista dos txons identificados, baseado na morfologia de gros de plen e esporos, segundo sua ocorrncia fitoecolgica.

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    Evoluo Paleogeogrfica da Plancie Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros PalinolgicosRobson Lucas Bartholomeu; Marcia Aguiar de Barros; Marcel Rocha Soares Lopes; Claudia Gutterres Vilela & Ortrud Monika Barth

    Os oito nveis selecionados continham, em sua maioria, gros de plen bem preservados. Entretanto, os esporos de Pteridophyta/Bryophyta apresentaram danos de corroso e/ou degradao, sendo que alguns nveis possuiram, como caracterstica marcante, uma alta concentrao (Tabela 3) e m preservao destes palinomorfos.

    No foram encontrados microfsseis mari-nhos, tais como microforaminferos, dinoflagela-dos, diatomceas, entre outros, que pudessem evi-denciar a contribuio de sedimentos marinhos na rea de estudo.

    Nvel 1

    No nvel 1 (99 cm) foram identificados 30 tipos polnicos, com predomnio da Comunidade Arbustiva e Arbrea de Restinga (58,5%). O tipo polnico Schinus (48,9) foi o mais representativo, seguido de Rapanea (2,3%), Psychotria e Ouratea, ambas com 1,3%. A vegetao de Brejo de Restinga (12,7%) apresentou como principais representantes Asteraceae (7,1%), Melastomataceae/Combretaceae (2,8%) e Cyperaceae (1,3%). Em Mata (5,3%) as Lecythidaceae (4,6%) foram o principal representante, seguido de Celtis (0,5%) e Hedyosmum (0,3%). Hyptis (0,8%) e Scrophulariaceae (0,5%) eram os nicos representantes de Campo

    Tabela 2 Percentagem dos palinomorfos encontrados nos tipos de vegetao estabelecidos e nos nveis de sedimentos analisados da praia Vermelha (gros de plen = 100%).

    Tabela 3 Concentrao dos palinomorfos encontrados nos tipos de vegetao estabelecidos e nos nveis de sedimentos analisados da praia Vermelha (gros de plen, esporos e demais palinomorfos/cm3).

    Figura 5 Diagrama de percentagem dos grupos ecolgicos estabelecidos segundo as amostras analisadas de um depsito turfoso da praia Vermelha, bairro da Urca, Rio de Janeiro.

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    Evoluo Paleogeogrfica da Plancie Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros PalinolgicosRobson Lucas Bartholomeu; Marcia Aguiar de Barros; Marcel Rocha Soares Lopes; Claudia Gutterres Vilela & Ortrud Monika Barth

    Figura 6 Tipos polnicos significativos encontrados na

    anlise palinolgica de um depsito turfoso da praia Vermelha, bairro

    da Urca, Rio de Janeiro. A Alchornea (Euphorbiaceae, nvel 6);

    B Amaranthus/Chenopodiaceae (nvel 1); C Asteraceae (nvel 2); D - Borreria (Rubiaceae, nvel 5);

    E Celtis (Ulmaceae, nvel 6); F Hedyosmum (Chloranthaceae, nvel

    6); G Hyptis (Lamiaceae, nvel 1); H Lecythidaceae (nvel 5); I

    Malvaceae (nvel 2); J Myrsine (Rapanea, Myrsinaceae, nvel7); K Myrtaceae (nvel 6); L Schinus

    (Anacardiaceae, nvel 1). Barra = 10 m para todas as imagens.

    encontrados. Ampla Distribuio (1,3%) teve como tipo mais representativo Bignoniaceae (8,9%). Euphorbiaceae (1,0%), Fabaceae (0,8%), Rosaceae, Rubiaceae e Solanaceae com 0.3% tambm compem este grupo.

    Os esporos triletes (73,8%) dominaram no grupo Pteridophyta/Bryophyta, seguido de monoletes (0,5%). Plen no Identificado (10,7%) e Palinomorfos Indeterminados (7,1%) tambm foram encontrados.

    Nvel 2

    O nvel 2 (96 cm) apresentou 25 tipos polnicos identificados. A Comunidade Arbrea e Arbustiva de Restinga (62,8%) continuou dominando sobre os demais grupos, tendo uma diminuio na concentrao em relao ao nvel 1 (99 cm). O tipo polnico Schinus (37,6%) continuou predominando expressivamente sobre os demais. Ainda foram encontrados Rapanea (9,2%), Myrtaceae (4,1%), Alchornea (3,7% ) e Arecaceae (3,2%).

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    Evoluo Paleogeogrfica da Plancie Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros PalinolgicosRobson Lucas Bartholomeu; Marcia Aguiar de Barros; Marcel Rocha Soares Lopes; Claudia Gutterres Vilela & Ortrud Monika Barth

    Asteraceae (6,0%), Cyperaceae (3,2%), Me-lastomataceae/Combretaceae (2,8%) e Borreria (0,5%) foram os representantes de Brejo de Restinga encontrados. Em Mata (6,0%) o txon Lecythidace-ae (3,7%) continuou dominando. Celtis (2,3%) tam-bm foi encontrado. Hedyosmum desaparece neste nvel. Scrophulariaceae (1,8%) foi o nico represen-tante na vegetao de Campo. Em Ampla Distribui-o (7,8%), o tipo polnico Urticaceae (4,1%) passou a dominar. Fabaceae (2,3%), Bignoniaceae (0,9%) e Rubiaceae (0,5%) tambm foram identificados.

    Os esporos triletes (377,5%) no apenas conti-nuaram dominando no grupo de Pteridophyta/Bryo-phyta, como aumentaram em percentagem e con-centrao em relao ao nvel 1. Monoletes (3,7%) tambm estavam presentes. Plen no Identificado (9,2%) e Palinomorfos Indeterminados (6,0%) dimi-nuiram em percentagem e concentrao em relao ao nvel 1.

    Nvel 3

    O nvel 3 (94 cm) apresentou a menor diversidade polnica, com apenas 10 tipos polnicos identificados. A Comunidade Arbustiva e Arbrea de Restinga (38,1%) permaneceu dominando. Schinus e Alchornea, ambas com 9,5%, foram os tipos polnicos mais representativos, sendo ainda encontrados Bromeliaceae, Olacaceae, Iridaceae e Ouratea, todas com 4,8%. Asteraceae (14,3%) foi o nico representante de Brejo de Restinga encontrado. Em Ampla Distribuio (14,3%) foram encontradas as famlias Euphorbiaceae, Fabaceae e Rubiaceae, todas com 4,8%.

    Foram encontrados esporos triletes (42,9%) e monoletes (9,5%) em Pteridophyta/Bryophyta. Plen no Identificado (28%) e Palinomorfos Indeterminados (1,0%) estavam presentes.

    No foi encontrado nenhum representante das vegetaes de Mata e Campo nesta amostra, refletindo assim, a menor diversidade polnica entre todos os nveis estudados.

    Nvel 4

    No nvel 4 (91.5 cm), foram identificados 20 tipos polnicos, passando a ocorrer um pequeno domnio da vegetao de Brejo de Restinga (35,2%). Asteraceae (18,3%) foi o tipo polnico dominante deste grupo. Borreria (8,9%) e Cyperaceae (5,2%) tambm estavam presentes. Na Comunidade

    Arbustiva e Arbrea de Restinga (21,6%) o tipo polnico Schinus (6,1%) volta a dominar sozinho. Arecaceae (4,2%), Alchornea (3,8%), Meliaceae e Rapanea, ambas com 2,8% tambm foram identificados. No grupo Mata (10,8%), o tipo polnico Lecythidaceae (10,3%) foi o mais representativo. Dilleniaceae (0,5%) surge pela primeira vez nos nveis analisados. Hyptis (2,3%) e Lamiaceae (0,5%) caracterizaram a vegetao de Campo. No grupo Ampla Distribuio (21,6%) Euphorbiaceae (18,3%) foi o tipo polnico mais importante. Bignoniaceae (1,9%) e Fabaceae (1,4%) tambm estavam presentes.

    Os esporos triletes (93,9%) e monoletes (5,6%) estavam presentes no grupo Pteridophyta/Bryophyta, bem como Gros de Plen no Identificados (8,0%) e Palinomorfos Indeterminados (14,1%) neste nvel.

    Nvel 5

    No nvel 5 (59 cm), foram identificados 25 tipos polnicos. Os grupos ecolgicos: Brejo de Restinga, Mata, Campo e Ampla Distribuio tiveram aumento de percentagem e concentrao. Porm, a Comunidade Arbustiva e Arbrea de Restinga (12,6%) diminuiu em percentagem em relao ao nvel 4. Brejo de Restinga (41,0%) manteve sua tendncia de domnio. Asteraceae (26,1%) foi o tipo polnico mais importante, seguido de Poaceae (6.5%), Borreria (5,0%), Melastomataceae/Combretaceae (2,5%), Apiaceae (0,8%) e Cyperaceae (0,2%). Schinus (6,1%) continuou sendo o tipo mais representativo da Comunidade Arbustiva e Arbrea de Restinga. Alchornea (2,7%) e Rapanea (2,3%) tambm foram encontrados. No grupo Mata (12,2%) foi mantido o predomnio da famlia Lecythidaceae (11,5%). Bombacaceae, Neea e Zanthoxylum, todas com 0,2%, surgiram neste nvel. Hyptis (3,2%) e Lamiaceae (0,4%) continuaram sendo os nicos representantes de Campo identificados. Em Ampla Distribuio (22,1%) Euphorbiaceae (14,1%) foi o txon mais representativo, seguido das famlias Bignoniaceae (3,6%) e Fabaceae (3,2%).

    Esporos triletes (261%) e monoletes (9,8%) representaram o grupo de Pteridophyta/Bryophyta. Plen no Identificado (8,4%) e Palinomorfos Indeterminados (6,7%) tambm foram encontrados.

    Nvel 6

    No nvel 6 (87 cm) foi mantido o domnio da vegetao de Brejo de Restinga (64,2%).

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    Evoluo Paleogeogrfica da Plancie Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros PalinolgicosRobson Lucas Bartholomeu; Marcia Aguiar de Barros; Marcel Rocha Soares Lopes; Claudia Gutterres Vilela & Ortrud Monika Barth

    Borreria (46,1%) passou a dominar neste grupo, seguido de Asteraceae (11,6%) e Poaceae (4,7%). Na Comunidade Arbustiva e Arbrea de Restinga (15,8%), o tipo polnico Schinus (10,6%), continuou sendo o mais importante. Rapanea e Meliaceae (0,9%) tambm foram encontrados. Lecythidaceae (3,6%) continuou seu domnio na vegetao de Mata. Hedyosmum (0,2%) reaparece e no mais volta a ser encontrado nos nveis seguintes. Em Campo (0,4%) foram encontrados Scrophulariaceae (0,2%) e Lamiaceae (0,1%). Euphorbiaceae (3,0%) dominou no grupo Ampla Distribuio, seguido de Bignoniaceae (1.85) e Averrhoa carambola (1,7%).

    Os esporos triletes (146%) continuaram dominando no grupo Pteridophyta Bryophyta. Monoletes (5,3%) tambm estavam presentes. Neste nvel foram encontrados ainda Plen no Identificado (7,1%) e Palinomorfos Indeterminados (6,5%).

    Nvel 7

    No nvel 7 (86 cm) foram identificados 33 tipos polnicos, sendo mantido o domnio da vegetao de Brejo de Restinga. Em Brejo de Restinga (70,6%) Asteraceae (55,4%) manteve seu domnio sobre os demais tipos polnicos. Poaceae (10,9%) aumentou em percentagem e concentrao. Borreria (0,3%) teve diminuio expressiva em percentagem e concentrao em relao ao nvel 6. Typha (0,2%) aparece pela nica vez nos nveis analisados. No grupo Mata (3,2%) foram encontrados apenas Lecythidaceae (3,1%) e Neea (0,1%). Em Ampla Distribuio (5,3%) Bignoniaceae (2,0%) dominou sobre os demais tipos polnicos. Euphorbiaceae (1,8%), Rubiaceae (0,8%), Oxalidaceae (0,3%), Araliaceae e Phytolaccaceae (0,2%) tambm estavam presentes. No foi encontrado nenhum representante de Campo neste nvel.

    Em Pteridophyta/Bryophyta foram en-contrados esporos triletes (598,5%) e monoletes (16,7%). Plen no Identificado (12,2%) aumen-tou em percentagem e concentrao. Palinomorfos Indeterminados (2,6%) tambm foram encontra-dos. Pseudoschizaea (0.1%) apareceu pela primei-ra e nica vez.

    Nvel 8

    O nvel 8 (84 cm) apresentou 30 tipos polnicos identificados, com o predomnio de Brejo de Restinga (84,9%). Borreria (36,2%) foi o tipo dominante.

    Asteraceae (28,0%) e Poaceae (19,2%) tambm foram encontrados. A Comunidade Arbustiva e Arbrea de Restinga (6,4%) ficou composta por Schinus (1,8%), Rapanea (1.3%), Alchornea (0.8%) e Arecaceae (0,7%). Lecythidaceae (1,7%) e Symplocos nitens (0,1%) foram os principais representantes de Mata. Lamiaceae (0,1%) foi o nico representante de Campo encontrado. O grupo Ampla Distribuio (3,6%) passou a ter como txon dominante a famlia Euphorbiaceae (1,7%), seguido de Rubiaceae (1,6%), Phytolaccaceae (0,2%) e Fabaceae (0,1%).

    Os esporos triletes (82,2%) tiveram os maiores valores de percentagem e concentrao de todos os nveis analisados. Monoletes (8,2%) tambm foram encontrados. Plen no Identificado (3,0%) e Palinomorfos Indeterminados (1,2%) tambm estavam presentes.

    5 Discusso

    A inexistncia de microfsseis marinhos nos sedimentos lamosos e nas turfas comprovou a ori-gem continental para os sedimentos analisados. As idades das turfas so compatveis com a formao de um pntano durante o recuo do nvel relativo do mar aps o mximo holocnico h 5.100 anos A.P., e no aps a segunda oscilao como previa Ama-dor (1997).

    O esquema evolutivo exposto por Amador (1997) indica que a formao de vrios pntanos na borda da baa de Guanabara, incluindo um situado no istmo que liga o conjunto do Morro da Urca e Po de Acar com o continente, levaria cerca de 3.000 anos A.P. No entanto, a camada de turfa sob a areia lamosa, que marca o incio da formao do pntano, revelou uma idade de 4520 80 anos AP. Esta idade, de acordo com a curva do nvel mdio do mar durante o Holoceno ao longo da poro central da costa do Brasil, preparada por Suguio et al. (1985) e ngulo e Lessa (1997), relaciona-se com a primeira emergncia, imediatamente aps o nvel mximo holocnico do mar atingido em 5.100 anos B.P., contrariando a suposio anterior de Amador (1997).

    O pacote turfoso foi dividido em trs zonas com base nos espectros polnicos. A Zona 1 (99-94 cm) corresponde aos nveis de 1 a 3 (Figura 4). Esta rea teve, em sua fase inicial (4.520 80 anos A.P.) na Comunidade Arbustiva e Arbrea de Restinga como principal tipo polnico o de Schinus,

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    Evoluo Paleogeogrfica da Plancie Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros PalinolgicosRobson Lucas Bartholomeu; Marcia Aguiar de Barros; Marcel Rocha Soares Lopes; Claudia Gutterres Vilela & Ortrud Monika Barth

    que ocorre em todos os nveis ao longo do perfil analisado. Atualmente, este txon pioneiro pode ser encontrado em ambientes com solos secos, solos arenosos e crregos prximos, bosques, campos, banhados e pntanos (Lorenzi, 1992).

    A predominncia do tipo polnico de Schinus, associado aos de Alchornea, Anthurium, Araceae, Arecaceae, Malpighiaceae Moraceae, Myrtaceae, Ouratea, Olacaceae, Pavonia, Psychotria, Rapanea e Smilax, indicou a formao de uma vegetao de restinga. A associao sugere uma zona chamada de "moita de Myrtaceae, uma vegetao que fica s margens da primeira cadeia de bancos de areia, sendo arbustiva, densa e fechada, dominada principalmente por espcies da famlia Myrtaceae (Araujo & Henriques, 1984). Embora a famlia Myrtaceae no seja dominante, nem ao longo do perfil estudado, esta zona descrita como sendo de maior riqueza de espcies em solos salinos do Rio de Janeiro (Pereira et al., 2001). No nvel 2 (96 cm) observou-se uma diminuio na concentrao de quase todos os grupos ambientais, exceto Pteridophyta/Bryophyta, cujo aumento na porcentagem e concentrao sugere a presena de uma rea de origem fechada com algum grau de humidade (Tyson, 1995; Camus et al., 1991).

    A vegetao de Brejo de Restinga no foi muito representativa nesta zona, os txons Amaranthus/Chenopodiaceae Asteraceae Borreria, Combretum/Melastomataceae e Cyperaceae estavam com baixa porcentagem e concentrao.

    Uma percentagem significativa de esporos com danos corroso/degradao encontrado nos n-veis 1 (99 cm) e 2 (96 cm) nesta zona, mostrou que esses esporos teriam provavelmente sido expostos a um oxidao qumica (exposio ao ar), indican-do perodos de seca, o que pode estar relacionado com a flutuao do nvel de gua (Arajo e Lacerda, 1987; Birks, 1972; Campbell, 1991, 1999; Moore et al. 1991).

    O fim desta zona (nvel 3, 94 cm) caracterizado por uma menor riqueza em plen, um maior nmero de esporos inteiros e a ausncia de esporos com danos mecnicos. De acordo com a anlise sedimentolgica trata-se de uma diminuio gradual do teor de areia na camada de areia lamosa. O nvel 3 tem o maior teor de areia desta frao, provavelmente indicando que esta menor riqueza em plen pode estar associada com a preservao deficiente em camadas com alto teor de areia (Barros, 2003). A baixa porcentagem de esporos com danos mecnicos encontrados seria indicativa da

    proximidade da rea fonte de palinomorfos, uma vez que este dano estaria relacionado com o transporte dos mesmos (Tyson, 1995). No entanto, Bauermann et al. (2002) sugerem que palinomorfos encontrados em sedimentos de turfa so provenientes no s da vegetao local, mas tambm a partir de vegetao adjacente, bem como por transporte areo.

    A baixa porcentagem de esporos com corroso/degradao e o aumento geral de esporos, podem estar ligados a uma deposio sub-aquosa, o que consistente com a presena da camada de areia lamosa, sugerindo que os palinomorfos foram depositados sem ser expostos ao ar (Campbell, 1991; Moore et al., 1991).

    A Zona 2 (94-89 cm) corresponde aos nveis 4 e 5. Esta zona, na sua fase inicial, caracterizada pelo equilbrio entre os grupos ecolgicos estudados. No nvel 4 (91,5 cm) estabelecida uma pequena zona de vegetao Brejo de Restinga. Asteraceae o taxon mais importante.

    Neste nvel houve um equilbrio entre a corroso/degradao e os esporos inteiros, refletindo possivelmente uma pequena variao na flutuao de guas subterrneas (Arajo & Lacerda, 1987).

    No final do nvel 5, a vegetao de Brejo de Restinga continua a dominar, sendo o principal representante Asteraceae. A associao dos elementos desta vegetao com o grupo Pteridophyta/Bryophyta, que novamente significativo no final desta zona, pode ser interpretada por baixos nveis de umidade, especialmente considerando a proximidade da camada de turfa.

    A Zona 3 (89-84 cm) compreende os nveis 6,7 e 8. Nesta zona, datada em 4270 60 anos A.P. mantida a dominncia do Brejo de Restinga. No nvel 6 (87 cm) foi observado o tipo polnico Borreria de vegetao de Campo, frequentemente encontrado na plancie costeira, ocorrendo tambm em formao de restinga em associao com Asteraceae, Combretum/Melastomataceae, Cyperaceae e Poaceae. Este nvel marca o domnio dos esporos com corroso/degradao, uma tendncia que permanecer ao final dessa zona. O grau de preservao dos esporos reflete a flutuao de guas subterrneas na rea de estudo (Arajo & Lacerda, 1987).

    No nvel 7 (86 cm) domina a vegetao de brejo sobre os outros grupos ecolgicos. Os grupos ecolgicos Comunidade Arbustiva e Arbrea de Restinga, Mata e Campo, diminuram em concentrao e percentual em relao ao

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    Evoluo Paleogeogrfica da Plancie Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros PalinolgicosRobson Lucas Bartholomeu; Marcia Aguiar de Barros; Marcel Rocha Soares Lopes; Claudia Gutterres Vilela & Ortrud Monika Barth

    nvel anterior. A vegetao de restinga tem a sua implementao definitiva.

    No nvel 8 (84 cm) a vegetao predominante a de restinga, com Borreria voltando a ser o txon dominante. Asteraceae, Combretum/Melastomataceae, Cyperaceae e Poaceae formam a vegetao de Brejo de Restinga. Esporos de Pteridophyta/Bryophyta tm os valores mais elevados de danos de corroso/degradao de todos os nveis analisados, indicando o a sua exposio ao ar (Campbell, 1991; Moore et al., 1991).

    Os registros de plen sugerem que durante todo o perodo de tempo examinado existia uma vegetao arbrea semelhante encontrada atualmente. No entanto, rvores dominaram apenas nos nveis iniciais analisados, embora permanecessem em todos os nveis estudados. Os tipos polnicos encontrados indicam que esta vegetao estaria situada entre o primeiro e segundo cordo litorneo, como proposto por Arajo & Henriques (1984). Espcies relacionadas vegetao de Mata teriam como fonte os Morro da Urca, Cara de Co, Po de Acar e da Babilnia, onde ainda hoje permanecem remanescentes de Mata Atlntica (Carauta & Oliveira, 1984).

    Os resultados obtidos mostram que os nveis com sedimentos turfosos (1, 2, 6, 7 e 8) apresentaram a maior incidncia de esporos com danos de corroso/degradao, sugerindo que foram expostos ao ar, mesmo se temporariamente (Bauermann et al., 2002; Campbell, 1991; Moore et al., 1991).

    Os nveis amostrados na areia lamosa (nveis 3,4,5) mostraram maior porcentagem de esporos bem

    preservados, sugerindo que este pacote sedimentar foi pouco exposto ao ar e que os palinomorfos foram cobertos imediatamente aps a sua deposio. A predominncia de esporos intactos em alguns nveis, sem apresentarem danos, sugere uma sedimentao sub-aquosa, corroborada por anlise de lamas de areia (Bauermann et al., 2002).

    Os dados obtidos no presente trabalho so consistentes com os apresentados por Coelho (1999) para o mesmo intervalo de tempo na regio de Sepetiba, embora fossem observadas diferenas que, entre outros fatores, estariam relacionadas variao do nvel relativo do mar durante o Holoceno. Santos (2000) encontrou na faixa de 5.700 a 3.800 anos A.P. tambm em um testemunho da Baa de Sepetiba uma abundncia de tipos de plen que podem ocorrer tanto em restingas quanto em florestas, embora em baixa frequncia neste ltimo tipo de vegetao. Em ambos os estudos foi encontrado o plen de Hedyosmum (Chloranthaceae), Myrsinaceae (Rapanea), Myrtaceae, Sapindaceae e Trema, caracterstico de vegetao de floresta, e tambm identificado no presente estudo.

    Luz (2003) analisou um testemunho da Lagoa de Cima, regio norte do Estado do Rio de Janeiro, encontrando num intervalo de cerca 4.950 a 4.000 A.P. um baixo nmero de palinomorfos degradados, bem diferente da situao na Praia Vermelha no mesmo perodo.

    J Amador (1997) e Suguio et al. (1985) concordaram que, por volta de 4.200 anos A.P., o nvel do mar estivesse cerca de 1 a 2 m abaixo do atual. Barth et al. (2004), analisaram o espectro

    Figura 7 Interpretao grfica da evoluo da paisagem correspondente ao perodo de 4.520 a 4.270 anos A.P. de um depsito turfoso da praia Vermelha, bairro da Urca, Rio de Janeiro.

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    Evoluo Paleogeogrfica da Plancie Costeira da Praia Vermelha, Entrada da Baa de Guanabara, Rio de Janeiro, por meio de Registros PalinolgicosRobson Lucas Bartholomeu; Marcia Aguiar de Barros; Marcel Rocha Soares Lopes; Claudia Gutterres Vilela & Ortrud Monika Barth

    polnico de um nvel de um testemunho retirado da Baa de Guanabara prximo ilha de Paquet, datado em 4.210 anos A.P. Verificaram que o maior influxo de gros de plen era proveniente de rvores de mata e que os de plantas de manguezais e campos abertos eram pouco representados. Estes dados confirmaram para esta idade um nvel do mar mais baixo que o atual, permitindo o acmulo de sedimentos ricos em representantes da flora regional, estando em concordncia com os resultados obtidos no presente estudo.

    Os resultados palinolgicos e sedimentolgicos sugerem o seguinte quadro evolutivo para a Praia Vermelha e adjacncias no intervalo de tempo estudado (Figura 7). Inicialmente, h 4.520 anos A.P., formou-se um pacote de turfa num pequeno brejo de restinga entre duas cristas de praia, aps a elevao mxima do nvel mdio do mar do Holoceno por volta de 5.100 A.P. Existia uma vegetao de restinga semelhante atual, segundo a associao de palinomorfos como Arecaceae, Myrsine, Myrtaceae e principalmente Schinus. Os tipos de plen de vegetao de campo indicariam uma vegetao stio localizada em depresses midas entre as restingas. Foi depositado sobre esta turfa uma sequncia de areias lamosas, sem interferncia marinha. Acima desta formou-se um novo pacote de turfa que estaria relacionado a uma obstruo do corpo paludial, correspondendo idade de 4.270 A.P. A predominncia de gros de plen e esporos intactos, sem danos, em alguns nveis sugere uma sedimentao sub-aquosa, a qual pode ser corroborada pelo tipo de sedimentao observado. O pacote turfoso analisado no presente trabalho foi soterrado por areias modernas correspondentes ao atual ambiente de praia. Este evento pode ser associado a uma segunda transgresso marinha.

    6 Agradecimentos

    Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq), pela Bolsa de Produtividade em Pesquisa concedida a O.M. Barth (Processo 301525/2009-9); Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES), pela Bolsa de Mestrado concedida a R.L. Bartholomeu e ao Programa de Ps-Graduao em Geologia, Departamento de Geologia, Instituto de Geocincias, Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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