identidades em movimento: pensando a cultura nacional por

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Identidades em movimento: pensando a cultura nacional pot meio do cinema Identitie g ia movement: thinking the twtion.91 eultute by me. g ns of the cinema A questão da formação das identidades é muito relevante para os chamados estudos culturais em nossos dias. Em especial as identidades nacionais, vinculadas automaticamente às diversas manifestações da cultura popular e midiática, têm ganhado cada vez mais espaço em diversos campos de pesquisa. Entende-se uma identidade não mais como uma instância cartesiana, fechada e unívoca, mas, sim, plural e portadora de paradoxos e mesmo oposições. Para fundamentar este estudo, buscou-se autores contemporâneos, como Stuart Hall, Nestor Canclini, Naomi K. Bhabha e Tzvetan Todorov. Neste artigo, discute-se alguns conceitos contemporâneos de identidade e da formação de nosso sentido identitário cultural. Para isso, escolheu-se o cinema como uma área que serve de ponto de apoio para se discorrer sobre as identidades em trânsito que se fazem presentes na complexa sociedade brasileira, a qual se vê refletida com suas variadas problemáticas em muitos filmes atuais. Palavras-chave: identidade, contempo- raneidade, cultura, cinema brasileiro. , ## v bgtraet The question of the formation of identities is very important for the so-called cultural studies. In particular national identities, linked automatically to the varied manifestations of popular and media culture, have gained increasing space in various research fields. An identity is no longer understood as Cartesian, closed and univocal, but as something plural that embodies paradoxes and oppositions. This study is based on contemporary authors including Stuart Hall, Nestor Canclini, Naomi K. Bhabha and Tzvetan Todorov. The article discurses some contemporary concepts of identity and the formation of a sense of cultural identity. Cinema is used as the basis of the analysis of the identities in transition that are present in the complex Brazilian society, which is reflected in its various problematics in many current films. Key words: identity, contemporary, culture, Brazilian cinema. Adriano Messias de Oliveira Mestre em Comunicação pela Univ. Federal de Minas Gerais-UFMG. Professor no Centro Universitário de Belo Horizonte —UNI-BH. KATÁLYSIS v. 7 n. 2 jul./dez. 2004 Florianópolis SC 158-169

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Identidades em movimento:pensando a cultura nacionalpot meio do cinema

Identitieg ia movement: thinking the twtion.91eultute by me.gns of the cinema

A questão da formação das identidadesé muito relevante para os chamados estudosculturais em nossos dias. Em especial asidentidades nacionais, vinculadasautomaticamente às diversas manifestaçõesda cultura popular e midiática, têm ganhadocada vez mais espaço em diversos camposde pesquisa. Entende-se uma identidadenão mais como uma instância cartesiana,fechada e unívoca, mas, sim, plural eportadora de paradoxos e mesmo oposições.Para fundamentar este estudo, buscou-seautores contemporâneos, como Stuart Hall,Nestor Canclini, Naomi K. Bhabha e TzvetanTodorov. Neste artigo, discute-se algunsconceitos contemporâneos de identidade eda formação de nosso sentido identitáriocultural. Para isso, escolheu-se o cinemacomo uma área que serve de ponto de apoiopara se discorrer sobre as identidades emtrânsito que se fazem presentes na complexasociedade brasileira, a qual se vê refletidacom suas variadas problemáticas em muitosfilmes atuais.

Palavras-chave: identidade, contempo-raneidade, cultura, cinema brasileiro.

,##v bgtraetThe question of the formation of

identities is very important for the so-calledcultural studies. In particular nationalidentities, linked automatically to the variedmanifestations of popular and mediaculture, have gained increasing space invarious research fields. An identity is nolonger understood as Cartesian, closed andunivocal, but as something plural thatembodies paradoxes and oppositions. Thisstudy is based on contemporary authorsincluding Stuart Hall, Nestor Canclini,Naomi K. Bhabha and Tzvetan Todorov.The article discurses some contemporaryconcepts of identity and the formation ofa sense of cultural identity. Cinema is usedas the basis of the analysis of the identitiesin transition that are present in the complexBrazilian society, which is reflected in itsvarious problematics in many current films.

Key words: identity, contemporary,culture, Brazilian cinema. Adriano Messias de Oliveira

Mestre em Comunicação pela Univ.Federal de Minas Gerais-UFMG.

Professor no Centro Universitário de BeloHorizonte —UNI-BH.

KATÁLYSIS v. 7 n. 2 jul./dez. 2004 Florianópolis SC 158-169

Identidades em movimento: pensando a cultura nacional por meio do cinema

1 O campo das identidades

iga contemporaneidade,diversos campos dosaber, como a comu-

nicação social, a antropologia, a psico-logia, a história, a filosofia, têm se preo-cupado com as questões ligadas à iden-tidade, sobretudo a cultural. Fica difícilpensar o mundo de hoje sem levarmosem consideração as questões identitáriasque alimentam e forjamos diversos do-mínios da vida social. Ao olharmos paraa cultura brasileira, verificamos que aquestão da identidade cultural faz-secada vez mais evidente.

Temos percebido que já não é pos-sível compreender uma identidadequalquer como algo constituído isola-damente; pelo contrário, as múltiplasidentidades que consolidam uma de-terminada imagem de povo e nação,por exemplo, antes de serem entida-des essencializadas, cruzam-se e in-terpõem-se, todo o tempo, em um pro-cesso contínuo de construção, de talmaneira que, para se pensar algumadelas, é preciso recorrer às demais.

As identidades são práticas discur-sivas; necessitam de elementos vári-os para serem configuradas. Isso nospermite colocar de lado a idéia de queas identidades seriam preconcebidasou já estabelecidas. Antes, é precisocompreendê-las como estando sem-pre em formação.

Para Castells (2000, p. 23-24), au-tor contemporâneo que pesquisa asquestões identitárias, uma pluralidadede elementos conformam o que sepode chamar de identidade:

A construção de identidadesvale-se da matéria-primafornecida pela história, geo-grafia, biologia, instituiçõesprodutivas e reprodutivas,pela memória coletiva e porfantasias pessoais, pelosaparatos de poder e revela-ções de cunho religioso. [...]em linhas gerais, quem cons-

trói a identidade coletiva, epara que essa identidade éconstruída, são em grandemedida os determinantes doconteúdo simbólico dessaidentidade, bem como de seusignificado para aqueles quecom ela se identificam oudela se excluem.

Marcus (1991) é um estudioso quesalienta a necessidade de enxergarmosalém das simples demarcações entrea semelhança e a diferença, entre oglobal e o local. Paralelamente ao queele denomina de "processos desincretismo global" — a idéia de quevivemos em um mundo transculturalno qual, paradoxalmente, emergem di-versidades no âmbito local e no âmbi-to global e cabe ao estudioso, nessamiscelânea, a "habilidade de ver 'tudoem toda parte' como condição paraperceber a diversidade" (MARCUS,1991, p. 198), encontramos um apeloà etnicidade e à identidade, seja elaracial, nacional ou cultural. A vanta-gem de se operar uma análise culturalnestes parâmetros é a possibilidade dese fugir de "qualquer lógica que incluacontradições duradouras" (MARCUS,1991, p. 203). Assim sendo, não trata-mos jamais das questões culturais comoimutáveis e permanentes.

Outra questão que vai se somar aesta discussão é a do tempo: uma iden-tidade, como afirma Marcus, se auto-reconhece mediante a memória cole-tiva ou individual, que atravessa o tem-po cronológico. Assim, uma identida-de ganha "vida própria" e ultrapassaas barreiras do tempo e de qualqueroutro controle:

Construída e sempre se des-locando dentro de uma redede locais que constituemfragmentos mais do quequalquer tipo de comunida-de, a identidade é um fenô-meno disseminador que pos-sui uma vida própria que vaialém do sentido literal de fa-

zer parte de agentes huma-nos específicos num dadolocal ou momento. Os seussignificados são sempre de-feridos num dado texto/locala outros focos possíveis dasua produção, por meio dasdiversas associações mentaise referências com as quaisum ator humano pode ope-rar de forma criativa através,literalmente, das contingên-cias, dos eventos e, às vezes,através de uma política ex-plícita a favor ou contra oestabelecimento de identida-des em lugares específicos(MARCUS, 1991, p. 207).

O estudioso ainda chama a aten-ção para a limitação e os riscos decertos modelos de análise, em se tra-tando da identidade:

Controlar o contexto e regis-trar empiricamente a compo-sição atual de fluxos e asso-ciações presentes nos dadosrelativos ao discurso signifi-cou questionar a adequaçãodos modelos estruturais ousemióticos para dar contadas associações que não sedeixam assimilar por mode-los de dimensões limitadas(MARCUS, 1991, p. 207).

Hall (1999) ressalta que a identi-dade, em vez de algo que seja inato anós, acabado e definitivo, é, antes, umprocesso que vem do exterior preen-cher aquilo que nos falta.

[...] a identidade é realmentealgo formado, ao longo dotempo, através de processosinconscientes, e não algo ina-to, existente na consciência nomomento do nascimento. Exis-te sempre algo 'imaginário' oufantasiado sobre sua unidade.Ela permanece sempre incom-

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pleta, está sempre 'em proces-so', sempre 'sendo formada'.As partes 'femininas' do eumasculino, por exemplo, quesão negadas, permanecemcom ele e encontram expres-são inconsciente em muitasformas não reconhecidas, navida adulta. Assim, em vez defalar da identidade como umacoisa acabada, deveríamosfalar de identificação, e vê-lacomo um processo em anda-mento. A identidade surge nãotanto da plenitude da identi-dade que já está dentro de nóscomo indivíduos, mas de umafalta de inteireza que é 'pre-enchida' a partir de nosso ex-terior, pelas formas atravésdas quais nós imaginamos servistos por outros (HALL, 1999,p. 38-39).

2 Identidades e "Brasis"

Ao pensarmos em "identidade cul-tural brasileira", temos aí um desafiosobre o qual iremos apenas brevemen-te discorrer. Pelo fato de se tratar deuma terminologia tão amplamente em-pregada, sabemos que seu uso excessi-vo ocasiona perda de seu sentido e deforça. Sabemos o quão arriscado seriaensaiar uma definição de cultura brasi-leira, por isso, valemo-nos, inicialmente,da concepção de Thompson (1999) so-bre cultura, que ele denominou de "con-cepção estrutural", na qual é enfatizadoo caráter simbólico dos fenômenos cul-turais e, ao mesmo tempo, são valoriza-dos os contextos sócio-historicamenteestruturados. Uma cultura não pode sercompreendida apenas em seus aspec-tos simbólicos; é preciso relacionar taisaspectos com a vida social na qual ossujeitos estão engendrados, reproduzin-do e produzindo saberes.

Todas as sociedades possuem suasculturas, porém, uma cultura está para

além da sociedade. Ela não apenascristaliza e consolida práticas e tradi-ções sociais, mas mantém valores eliames que ajudam a configurar umadeterminada comunidade. DaMatta(2000, p. 50) explica:

Podemos assim dizer que so-ciedades sem cultura apenasacontecem no caso dos 'ani-mais sociais' (uma expressão,sem dúvida, contraditória).No caso do homem, a cadasociedade corresponde umatradição cultural que se as-senta no tempo e se projetano espaço. Daí o seguintepostulado básico: dado ofato de que a cultura pode serreificada no tempo e no espa-ço (através de sua projeção

materialização em objetos),ela pode sobreviver à socie-dade que a atualiza num con-junto de práticas concretas evisíveis. Assim, pode havercultura sem sociedade, embo-ra não possa existir uma so-ciedade sem cultura.

Nessa mesma linha de pensamen-to, Ribeiro (1995, p. 138) afirma queuma cultura nunca é homogênea:

A cultura reflete a experiênciaprévia da sociedade e reflete,por igual, suas característicasestruturais. Assim, aestratificação de classes, acondição de dependência, aheterogeneidade do desenvol-vimento social ou regionalcomparecem no quadro dacultura como variantes dife-renciadas desta. Só no caso deuma sociedade idealmente ho-mogênea, e, portanto, simples

rudimentar, a cultura podeconfigurar-se como urna enti-dade coerente e uniforme. Emtodos os demais casos — e so-bretudo no das civilizações —

as culturas são sempre entida-des complexas, diferenciadase dinamizadas por intensosprocessos de traumatização.

Ribeiro ainda propõe que, no casoparticular da cultura brasileira, ela pos-sui um caráter espúrio, devido à nature-za exógena e mercantil da metrópoleportuguesa, que participou de sua for-mação. Por isso, a questão da alteridadeestá arraigada em nossa cultura e nasdiscussões de nosso sentido de culturadesde a época colonial.

Ainda no âmbito da "cultura bra-sileira", transcrevemos um comentá-rio de Bosi (1996, p. 308), a fim dediscorrermos um pouco mais sobreesta terminologia:

Estamos acostumados a falarem cultura brasileira, assim,no singular, como se existisseuma unidade prévia queaglutinasse todas as manifes-tações materiais e espirituaisdo povo brasileiro. Mas é cla-ro que uma tal unidade ouuniformidade parece não exis-tir em sociedade moderna al-guma e, menos ainda, em umasociedade de classes. Talvez sepossa falar em cultura bororoou cultura nhamnbiquara ten-do por referente a vida mate-rial e simbólica desses gruposantes de sofrerem a invasão eaculturação do branco. Masdepois, e na medida em que háfrações no interior do grupo,a cultura tende também a ra-char-se, a criar tensões, a per-der a sua primitiva fisionomiaque, ao menos para nós, pa-recia homogênea.

De acordo com o autor, é precisoabandonar o pensamento de que a cultu-ra brasileira é algo estagnado e pronto,que sempre nos remete ao singular, paraimaginarmos um entrelaçamento de cul-turas várias e híbridas. O sociólogo Ri-

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beiro também adota um ponto de vistasemelhante ao falar de "Brasis", desta-cando algumas paisagens humanas queformam nossa cultura, como o Brasil cri-oulo, o Brasil caboclo, o Brasil sertanejo,o Brasil caipira e os Brasis sulinos. Nãose pode, portanto, ao se referir à "culturabrasileira", querer abarcar toda a diver-sidade cultural de um povo dentro davastidão semântica dessas duas palavras.

Ribeiro (1995, p. 447), ao comen-tar o que seria o brasileiro, escreveu:

Nós, brasileiros, nesse qua-dro, somos um povo em ser,impedido de sê-lo. Um povomestiço na carne e no espíri-to, já que aqui a mestiçagemjamais foi crime ou pecado.Nela fomos feitos e ainda con-tinuamos nos fazendo. Essamassa de nativos oriundos damestiçagem viveu por séculossem consciência de si, afun-dada na ninguendade. Assimfoi até se definir como umanova identidade étnico-naci-onal, a de brasileiros. Umpovo, até hoje, em ser, na durabusca de seu destino. Olhan-do-os, ouvindo-os, é fácil per-ceber que são, de fato, umanova romanidade, umaromanidade tardia, mas me-lhor, porque lavada em san-gue índio e em sangue negro.

Quando pensamos em cultura bra-sileira, não podemos deixar de discu-tir um pouco o termo nação, que qua-se sempre a acompanha. Faremosuma breve recapitulação histórica so-bre os sentidos que a palavra naçãoassumiu desde a sua origem, basean-do-nos em Hobsbawn (1990) eTodorov (1989). Até 1884, na Euro-pa, empregava-se o termo nation parareferir-se ao conjunto de habitantesde uma província, país ou reino. Apósesta data, a palavra passou a assumiro significado de Estado e corpo políti-co, dotado de um governo comum, eo território ocupado por esse Estado

e por seus habitantes. O termo "na-ção" passava, portanto, a se referir agrandes grupos fechados, estando vin-culado ao seu território mediante aassociação nação = Estado = povo(por influência da acepção de StuartMill, a partir do século XVIII).

Às vésperas da Revolução France-sa e nos primeiros anos após, a naçãopassa a ser um espaço de legitimação ese opõe ao poder estabelecido, seja elereal ou divino (110DOROV, 1989). Équando o "Vive la nation!" suplanta o"Vive le roi!", e a nação toma-se o es-paço de igualdade entre os cidadãos (ex-cluem-se as mulheres e os pobres), ecombate privilégios sociais e particularis-mos regionais. Este é o que se pode cha-mar de "sentido interior" de nação. Toda-via, uma nação se opõe a outra para seauto-afirmar e se diferenciar: nação bra-sileira, nação francesa, nação inglesa...Este é o "sentido exterior" de nação.

Em um aspecto, falamos amesma língua, dividimos

o mesmo território epartilhamos de uma

memória ou tradição,possuímos costumes

semelhantes.

O significado de "nação", porém,muito caminhou do início do século XIXaos nossos dias. Para além de um es-paço geográfico coabitado por homense mulheres unilíngües e que partilhamcostumes e crenças, entende-se, hoje,que a nação é um organismo amplo erico. Todorov (1989, p. 199)) afirma:

"La nation, elle, est une entitéà la fois politique et culturelle.Alors que les entités culturelleset politiques ont toujoursexisté, les nations sont uneinnovation, introduite enEurope à l'époque".1

Em um aspecto, falamos a mes-ma língua, dividimos o mesmo territó-rio e partilhamos de uma memória outradição, possuímos costumes seme-lhantes. Isso, antropologicamente, con-fere um sentido de "cultura" e "etnia";em outro aspecto, existem as comuni-dades que garantem a ordem social me-diante leis e regras, impondo deveres, oque nos toma cidadãos. "D'un côté lescultures, de l'autre, les États", comoresume Todorov (1989, p. 199). Partin-do desta abordagem fundamental, ten-taremos ver a nação como um "entre-lugar deslizante", tomando emprestadoum termo de Bhabha (2000). Uma na-ção está repleta de hibridismos e jamaispermanece cristalizada ou estagnada.

Em nossa época, pensamos que háalgo maior que une as pessoas em tor-no do sentido de nação, algo que ultra-passa a necessidade de uniformidadelingüística, posto que, como exemplo,gascões, bretões e alsacianos nuncadeixaram de se sentir pertencentes ànação e ao povo francês, apesar deseus idiomas particulares e de suaspeculiaridades regionais. Mais do quea etnia ou do que a língua comum aunir os homens em uma nação, o vín-culo coletivo mais relevante vem a seraquele que une os homens em tornode uma comunidade imaginada, deacordo com terminologia de Andersen(apud HOBSBAWN, 1990, p. 76).

Hobsbawn, por sua vez, mencio-na os laços protonacionais, que sãoos que já existem em determinadacoletividade, antes mesmo que esta seconfigure em uma nação politicamen-te organizada (1990, p. 63). Uma dasformas de protonacionalismo seria,por exemplo, as formas supralocais deidentificação popular, que ultrapassamos locais delimitados territorialmente.Assim, teríamos no Brasil, por exem-plo, a figura do cangaceiro Lampiãoque, circunscrita, inicialmente, aoPolígono das Secas nordestino, ultra-passou as fronteiras da caatinga echegou praticamente a todo o país emesmo ao exterior. Difícil descrevereste protonacionalismo popular, pois

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ele carece de que se visite os senti-mentos das numerosas comunidadesque geralmente estão envolvidas emtorno de uma nação e, mesmo assim,seria apenas um esforço parcial.Hobsbawn (1990, p. 64) explica queo critério fundamental para uma na-ção seria uma "relação necessáriacom a unidade da organização políti-ca territorial".

Assim, mesmo não nos reportan-do profundamente a questões de am-plitude nacional para este artigo, nãopodemos deixar de ter em mente que,ao mencionarmos identidade cultural,estamos, implicitamente, falando detraços culturais que se circunscre-vem também geográfica e politica-mente no Brasil.

2.1 Cinema nacional — refle-tor e criador dos laços iden-titários

Entendemos que o cinema é ins-trumento precioso para um estudometonímico dos "sentidos" de identi-dade cultural nacional. Os traçosidentitários que vamos encontrar emmuitos filmes brasileiros contemporâ-neos refletem também traçosidentitários de nossa nação, posto quetais traços estão presentes no imagi-nário dos brasileiros.

O cinema é um campo em que asidentidades presentes em uma dadacultura se expressam e se fazem no-tar. Ele desempenha o papel de espe-lho ou duplo, no qual se refletem asmudanças e as interações identitárias.Para além de problematizar as ques-tões das diferentes identidades, eletambém propicia novas identificações.Juntamente com a televisão e com as"vias de comunicação", 2 o cinemacolabora para que as identidades na-cionais, na América Latina, por exem-plo, assumam uma redefinição nostempos atuais.

O cinema vem a ser instrumentoútil para entendermos como as identi-dades, sua legitimação e suas lutas

estão presentes em nossa sociedade.Ele é uma instância que faz parte doimaginário de nossa cultura, ao mes-mo tempo em que colabora paraenriquecê-la, reproduzindo e criandonovas formulações culturais. Comoafirma Canevacci (1990, p. 25):

Entre outras coisas, o cine-ma é — por sua 'natureza' —antropológico, na medida emque não lhe é estranha a pos-sibilidade de representarqualquer momento culturalda história do homem no es-paço e no tempo, com umenvolvimento da percepçãobem superior às anterioresformas de narração.

O cinema nos situa no mundo epara além dele, porque nos permitereelaborar uma outra visão dessemundo. Também, devido à sua pró-pria economia, técnica e apropriaçãoda linguagem, ele busca uma outracoisa, inventa um mundo somente seue que nos permite fazer uma ponteentre o verossímil e o verídico, entre-laçando o real e o imaginário, o fato ea invenção.

O cinema não é jamais um meiode comunicação deslocado do mundosocial, das buscas identitárias e dasinterações coletivas; pelo contrário:entendemos que a construção socialda realidade é também forjada peloimaginário, pelo simbólico e peloafetivo,' instâncias presentes nas pro-duções cinematográficas. Sobre oafetivo, que neste caso está relacio-nado ao campo das identificações doespectador com o filme, Morim (1958,p.76) afirma:

"Entre la magie et la subjectivités'étend une nébuleuse incer-taine, qui déborde l'hommesans pourtant s'en détacher,dont nous repérons oudésignons les manifestationsavec les mots d'âme, de coeur,de sentiment. Ce magma qui

tient de l'une et de l'autre n'estni la magie, ni la subjectivitéproprement dites. C'est leroyaume des projections-identifications ou partici-pations affectives".4

2.2 Encontro com a alteri-dade

Isso nos mostra como o cinema éum campo proveitoso para compre-endermos a relação dos sujeitos en-tre si, suas projeções, identificaçõese a maneira como eles constroem omundo

A história brasileira está marcadapela presença do outro, pelo encontroe pelo confronto com a alteridade (nocaso específico de nossa história, aalteridade está impressa na confron-tação do elemento europeu com a fi-gura do negro, do indígena e, posteri-ormente, do estrangeiro que aqui che-gou, seja ele o próprio colono ou oimigrante, mesmo ocupando posiçõesdiferenciadas). Porém, buscamosconvergir nosso olhar para o local,para o "mestiço", para aquilo quepode, de acordo com o nosso imagi-nário, fazer ou explicar o sentido determos como "brasilidade"5 e identi-dade cultural (mesmo levando emconsideração que a alteridade tem sidorecalcada por esse elemento "brancodescendente de portugueses", ao qualse agregam historicamente nossas eli-tes intelectuais). Ou seja: a alteridadepassou a ser sinônimo de não-branco,não-reconhecido, de excluído.

O movimento antagônico de retor-no ao local e de abertura para o mun-do tem sido percebido, de modo maisamplo, na América Latina, nareorientação dos cinemas nacionaisem relação às suas culturas e igual-mente à cultura transnacional, desta-cando-se, em um plano geral, todosos meios de comunicação de massacomo contribuintes para a formaçãodo que Canclini denomina "cidadania

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Identidades em movimento: pensando a cultura nacional por meio do cinema

cultural" (1997, p. 179). O conceitode identidade passa, assim, a não sero antônimo absoluto de alteridade, ouseja, uma identidade passa a ser en-tendida não mais como o extremo deuma alteridade, desprovida de elemen-tos que configurem o outro; esta últi-ma, pelo contrário, passa a ser perce-bida também como elemento perten-cente, intrínseco às identidades.

Os conceitos em torno do que Hall(1999) chamou de "narrativa da cul-tura nacional", podem ser atribuídosao cinema brasileiro, o que vem a serfundamental para prosseguirmos asarticulações de nossas idéias. Primei-ramente, o autor reforça a relevânciaque as histórias e as literaturas de umpaís, revividas pela cultura popular epela mídia, têm na construção da idéiade nação. Assim sendo, menciona-mos, como exemplo, o sertão, os can-gaceiros e a figura de Lampião comoelementos que alinhavam muitas des-sas narrativas no Brasil. São elemen-tos como estes que dão

[...] significado e importânciaà nossa monótona existência,conectando nossas vidas co-tidianas com um destino na-cional que preexiste a nós econtinua existindo após a nos-sa morte (HALL, 1999, p. 52).

Em segundo lugar, o autor menci-ona a impossibilidade de se encontraruma essência de nação; em nossocaso, é a tão buscada "brasilidade",tida como algo que sempre existiu,gerada por si mesma; algo que sem-pre esteve "lá", em seu lugar, mesmosem se poder delineá-lo.

Uma outra estratégia da narrati-va da cultura nacional seria a "inven-ção da tradição", com o objetivo decriar normas e procedimentos quepareçam vinculados a um passado,muitas vezes heróico, forjado pelosmitos já existentes, como ocorre como cangaço e com o heroísmo que seatribui a ele. O cangaço permaneceno imaginário nacional de forma

atemporal, mesmo que tenha se ma-nifestado, basicamente, em quatrodécadas. Ele é capaz, por exemplo,de ser rememorado por muitos, quenarram os feitos dos cangaceiroscomo se estivessem estado pessoal-mente com eles. Hall (1999) salientaque existe ainda, em qualquer nação,a idéia de um mito fundante, repletode histórias duvidosas que o circun-dam, perdido nas eras e capaz de ex-plicar e exaltar a história de um povo.Um exemplo é o mito de que ocangaço teria surgido imbuído deuma ação benfeitora, como se o can-gaceiro fosse um tipo de Robin Hoodque teria nascido para fazer justiçano sertão, local sempre povoado porlendas antigas, como as medievais.6É como se pudéssemos dizer: na"época de Lampião" é que se faziajustiça nesse país, é que alguém de-fendia os oprimidos.

Mesmo levando-se em

consideração que o Brasil

é português, africano,

indígena, holandês, árabe,

judaico, italiano,

espanhol, alemão,

polonês, francês, oriental,

etc, em seus múltiplos

arranjos étnicos, ainda

assim uma idéia de nação

pode ser construída,

malgrado essas

diferenciações.

Também é marcante a idéia de quea identidade nacional alicerça um povooriginalmente puro, sem olhar para os

hibridismos socioculturais e étnicosque forjam a nação. Isso não deixade ser uma postura anacrônica e re-gressiva, o que mostra que as cultu-ras nacionais não são assim tão mo-dernas quanto pretendem sê-lo, e es-tão sempre vinculadas a um movimen-to que busca restaurar identidadespassadas. Ao se discutir a particulari-dade de qualquer fenômeno cultural,podemos adotar o mesmo ponto devista de Hall (1999, p. 59):

[...] não importa quão dife-rentes seus membros [os mem-bros de uma mesma cultura]possam ser em termos de clas-se, gênero ou raça, uma cul-tura nacional busca unificá-los numa identidade cultural,para representá-los todoscomo pertencendo à mesmae grande família nacional.

Mesmo levando-se em considera-ção que o Brasil é português, africa-no, indígena, holandês, árabe, judaico,italiano, espanhol, alemão, polonês,francês, oriental, etc, em seus múlti-plos arranjos étnicos, ainda assim umaidéia de nação pode ser construída,malgrado essas diferenciações.

Se olharmos para nosso país, re-cordaremos o quanto a questão daidentidade cultural sempre foi uma in-quietação histórica entre nós. Pre-sentificada nos movimentos artísticos,mencionamos aqui o Romantismo, coma ênfase indianista que muitos autoresderam aos seus romances (José deAlencar, um dos mais exponenciaisdentre eles, com O Guarani, Ubira-jara e Iracema). O realismo macha-diano procurou retratar a fundo a almaidentitária do brasileiro do Rio de Ja-neiro da segunda metade do século XIX,mostrando seus costumes, hábitos e in-teresses, de maneira bastante crítica(Memórias póstumas de Brás Cubas,Dom Casmurro, Quincas Borba). Apreocupação com a identidade cultu-ral foi retomada a partir do movimentopré-Modernista e Modernista nas vá-

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rias artes. Mencionamos, no campo daliteratura, Monteiro Lobato (JecaTatu), Graça Aranha (Canaã, obra quediscute o destino histórico do Brasil),Euclides da Cunha (Os sertões), Má-rio de Andrade (Paulicéia desvaira-da, Macunaíma), a revista Klaxon,mensário de arte moderna pós-Sema-na de 1922, o movimento Pau-Brasil ea Revista de Antropofagia, deOswald de Andrade, os movimentosVerde-Amarelismo e Escola da Anta,liderados por Plínio Salgado; GilbertoFreire, com o ciclo regional nordestino(Casa grande e senzala, Sobradose mocambos), José Américo deAlmeida (A bagaceira), Lima Barreto(Triste fim de Policarpo Quaresma,uma crítica à cultura nacional), JorgeAmado com suas diversas obras queretratam a cultura do Nordeste, Gui-marães Rosa (Grande sertão: vere-das, Sagarana, Primeiras estórias).Na música, tivemos o destaque deVilla-Lobos; nas artes plásticas, Tarsilado Amaral e Cândido Portinari; no te-atro, o teatro da República Velha, queretratou temas nacionais em diversaspeças (Onde canta o sabiá, de GastãoTojeiro) e o Teatro de Arena, deAugusto Boal, nos anos 60.

Nesta caminhada, a busca por umconceito adequado de imaginário cul-tural não se prende a "símbolospátrios", a elementos que foram forja-dos pelas instâncias estatais, de acor-do com Hobsbawn (ou seja, os seto-res governamentais, políticos, educa-cionais de um país),' mas, sim, a for-mações espontâneas do imaginário deuma cultura, formações estas nascidasda sociabilidade,' que perduram atra-vés das gerações, e que se expressamna memória, na oralidade, nas artes,nos veículos de comunicação.

2.2 Cinema e imagináriocultural

O cinema está muito arraigado navida de todos nós; tanto é que, aoemergir, no final do século XIX, fun-da novas formas de relacionamento

social e de interação do homem coma técnica. Antropologicamente estu-dado, de acordo com Morin (1958),9podemos afirmar que o cinema nas-ceu no seio da civilização burguesa,em uma época em que o fantástico jáera relegado apenas ao universo in-fantil, e não fazia parte do universodas pessoas "importantes", cheias deresponsabilidades. Hoje, entendemosa grande tela como o duplo de nossoimaginário cultural, posto que, assen-tados no escuro, identificamo-nos comas histórias mostradas pelos filmes. Ocinema fala o que sabemos, o que nãosabemos ainda e o que não imaginá-vamos que pudesse "existir": um uni-verso de possibilidades e de caminhosa serem decodificados. Como já dis-semos, ele cristaliza o mundo ao exi-bi-lo, mas, ao mesmo tempo, recria-o,inventando um outro mundo. Por suanatureza reflexiva, ele é capaz de exi-bir a realidade social de seu tempo ede um dado momento histórico, agin-do, assim, como um palimpsesto so-bre o qual vão-se inscrevendo as ima-gens e as narrativas de uma época.

O cinema, mais do que mostruárioou mausoléu de uma época, tambémcristaliza o mundo por ser capaz decondensar um certo modo de ver, deagir e de conceber a própria vida. Eleassegura, para gerações posteriores,um "congelamento" de valores, com-portamentos e pontos de vista de ummundo que está em constante muta-ção e que é apreendido pelas lentesdas câmeras. Assim, ao inventar umoutro mundo, forja sua própria reali-dade e mantém seu caráter inovador,dotado de uma força propriamenteestética. Em suma: ele exibe o mun-do, ao mesmo tempo em que é capazde circunscrever esse mundo nas pe-lículas, inovando-o ao retratá-lo deuma maneira ficcional, fabulada, mo-dulada pela técnica e pelo olhar da-queles que participam da criação deum filme.

Por tudo isso é que as sessões decinema são dotadas de um caráterpara-hipnótico, o que corresponde, em

parte, ao processo do sonho para oespectador. Essa realidade fictícia queas pessoas contemplam em uma salaescura, possuidora de diversasgradações — desde a ficção mais ligei-ra e próxima do que poderíamos cha-mar realidade da vida quotidiana atéas mais escabrosas e articuladas ima-gens de mundos e criações hiperfan-tásticas —, não é outra senão a"irrealidade imaginária" de que nos falaMorin !" As necessidades afetivas eracionais de uma dada sociedade seimbricam na constituição dos acervosficcionais de um filme. Assim, inúme-ras possibilidades se fixam e se crista-lizam em sistemas de ficção que, comofoi dito, variam e evoluem desde osprimórdios do cinema, multiplicando-sede acordo com os desejos colocadosem questão ao se concretizar uma obraffimica. Eis aqui a especificidade docinema: a capacidade de existir e seoperar a partir do movimento dialéticoreal-irreal. Neste oceano de vida mer-gulham os elementos do imaginário deuma sociedade, de uma cultura, pre-servados no arcabouço do imagináriodo cinema. Como reforça Morin (1958,p. 141), "[...] tout sistème de fictionest, par lui-même, un produithistorique et social déterminé"."

Fator de coesão social, o cinema fazparte de um momento de mudançasparadigmáticas que o mundo viveu, es-pecialmente no século XX, resultante deuma crise geral que atingiu o campo dasartes, "résultante à la fois d'uneconjoncture historique et d'uneattitude spirituelle qui s'influencentd' ailleurs réciproquement" , 2 de acor-do com Leirens (1960, p.7). Autor que,já no início dos anos 60, questionava acrise do humanismo refletida no cine-ma e mostrava que nenhuma época mul-tiplicou tanto os meios de entretenimentocomo a nossa.2

2.4- Um cinema que se retoma

Podemos entender o cinema bra-sileiro dos anos 90, sobretudo de 1994até hoje, período que marca o fim da

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Era Collor'4 e a entrada no chamadoCinema da Retomada, como um ci-nema plurivocal, sem unidade e comdiversas tendências esboçadas. A se-guir, trataremos brevemente de algu-mas dessas tendências, que muito re-fletem os olhares que foram emitidossobre nossas identidades.°

Falar de um país ausente (Terraestrangeira, 1995-1996, de WalterSalles Jr. e Daniela Thomas; Centraldo Brasil, 1998, de Walter Salles Jr.),voltar para questões da alteridade (ForAll, o trampolim da vitória, 1997-1998,de Luís Carlos Lacerda e Buza Ferraz;Baile perfumado, 1997, de LírioFerreira e Paulo Caldas); CarlotaJoaquina, princesa do Brasil, 1995,de Carla Camurati; Jenipapo, 1995-1996, de Monique Gardenberg), filmarno estrangeiro (O judeu, 1990-1996,de Jom Tob Azulay; Terra estrangei-ra) e buscar a língua do outro (O mon-ge e a filha do carrasco, 1996, deWalter Lima Jr.; Carlota Joaquina;For All, o trampolim da vitória; OBaile perfumado; Jenipapo) iriamconfigurar, em parte, a desestímulo denossa cinematografia que, cada vezmais, procurava um cinema de mer-cado, estetizado e estrangeiro.

Esse desejo de buscar outro paísjá se fazia presente em filmes dos anos80: O beijo da Mulher Aranha,1984, dirigido por Hector Babenco,traz o personagem Molina como o pri-sioneiro que vive a vida dos persona-gens que guarda na memória, ou, ain-da, os dubladores de Dias melhoresvirão (1989, de Cacá Diegues), quehomenageiam a ficção norte-ameri-cana, ou mesmo Bye bye Brasil(1981, de Cacá Diegues), em que aCaravana Rolidei, em uma cidadezi-nha sertaneja, faz nevar na caatinga— neve como a do "mundo civilizado".

Surgem os filmes que olham parao cinema, em vez de fazer do cinemaum modo de ver, de acordo com JoséCarlos Avellar (1994). É o caso de Adama do cine Shangai (1988, Gui-lherme de Almeida Prado), Ópera domalandro (1986, de Ruy Guerra), Jor-

ge, um brasileiro (1988, PauloThiago), Doida demais (1989, Sér-gio Rezende) e Faca de dois gumes(1989, Murillo Salles), tentativas dedublar as imagens do cinema feito pelaindústria norte-americana.

A vontade de sair do país tambémse expressa em Gaijin (1980, deTizuka Yamazaki), em que o especta-dor é projetado na condição de estran-geiro do imigrante japonês, italiano ounordestino na fazenda de café da SãoPaulo, na primeira metade do séculoXX; Nunca fomos tão felizes (1984,de Murilo Salles), em que um filho étirado do colégio interno pelo pai,trancafiado em um apartamento,aguardando o momento de viajar parafora do país. A construção de umautópica terra brasileira longe daqui eaqui mesmo pode ser vista emQuilombo (1984, de Cacá Diegues),e o jogo de filmagem que situa a his-tória em um espaço e tempo irreaisestá em Anjos da noite (1987). O so-nho de ir embora esbarrando nas difi-culdades impostas pela realidade épercebido em Um trem para as es-trelas (1987). Todavia, José CarlosAvellar (1994, p. 79) alerta:

Não devemos, no entanto, vereste movimento de partirpara longe daqui aqui mes-mo como uma simples imita-ção das formas de constru-ção norte-americanas (talcomo já ocorreu entre nósmais nitidamente no começodos anos 30 e no começo dosanos 50).

O desejo de deixar o país, nos anos80, encarna-se na desesperança e naausência de identidades que nos bas-tem.

Segundo ressalta Avellar (1994),houve ainda um movimento de filmese diretores que tentaram encontrar umdiálogo com a cultura nacional, aindaque de forma regionalista e metonímicacomo, por exemplo, filmes que abor-davam personagens que representas-

sem o povo ou a identidade do que se-ria o brasileiro, mesmo com uma visãodesiludida e parva. Temos como exem-plo a personagem Macabéa, de A horada estrela (1985, dirigido por SuzanaAmaral), uma nordestina semi-analfa-beta que chega a São Paulo e apreen-de o mundo por meio das informaçõesdo rádio e das pessoas que conhece.

A configuração de tendências e ver-tentes do cinema brasileiro contempo-râneo só pode se dar mediante o olharsobre os filmes, retirando deles os pon-tos que se sobressaem. É problemáticoapresentar generalizações, na ânsia devislumbrar um prospecto do recente ci-nema brasileiro. Entretanto, ao lado des-se cinema de violência, sexo, imagens-clichê e modelos importados, enfim, umcinema do simulacro, quase sempre so-breviveu um cinema de invenção,desvinculado de ciclos e que, se nãopodia mais capturar o real, ao menosbuscava, no real banalizado e insosso,uma força espiritual, ainda que violentae bárbara (A hora da estrela).

A década de 90 vai se iniciar sobo signo da incerteza quanto ao desti-no das produções fílmicas. Os fato-res econômicos colaboram, como écomum em nossa história cinemato-gráfica, para direcionar o cinema na-cional. A Era Collor praticamente ex-tinguiu o cinema com o fechamentodas fontes de recursos para a sobre-vivência da Embrafilme, EmpresaBrasileira de Filmes, do Concine, Con-selho Nacional de Cinema, da Funda-ção do Cinema Brasileiro e daCinemateca Brasileira.

A Constituinte de 1988, por suavez, havia deixado de lado as relaçõesentre cinema e tevê. A ausência deinserção do cinema em uma políticado audiovisual, o que poderia garantirsua subsistência, impediu que o cine-ma nacional ganhasse novos fôlegos.Apenas retomavam os antigos cine-astas que monopolizavam nossas pro-duções. O Ministério da Cultura tor-nou-se depósito de acetato (o chama-do Ciclo Rouanet 16 / Houaiss, ou Ci-clo da Prateleira), pois muitos proje-

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Adriano Messias de Oliveira

tos eram aprovados, porém, pela au-sência de verbas para prosseguimen-to, permaneciam empilhados. Resul-tado de uma crise em que, em primei-ra instância, é de ordem política, o ci-nema ficou fadado a esperar por diasmelhores. Sabe-se, por exemplo, que90% do público de um filme o assistemediante redes de tevê comum e acabo ou por meio de videocassetes(home-videos), daí a necessidade decolocar nosso cinema dentro do mer-cado do audiovisual (1/3 do filme épago em salas de cinema; 1/3 por dis-tribuição de home-videos e 1/3 natevê; sozinho, o cinema brasileiro nãoassegura nenhum desses mercados).

Quando se pensa em cinema bra-sileiro da década de 90, tende-se aassociá-lo quase que imediatamente aochamado "renascimento" que as pro-duções fílmicas tiveram em nosso país,nesse período. Inicialmente com cer-ca de seis produções anuais (1993), adécada terminou com aproximadamen-te 30 filmes sendo produzidos anual-mente, o que pode ser considerado, noBrasil, um boom cinematográfico.

Tem-se a tendência de apreciar al-guns dos filmes dessa época pela be-leza da fotografia e por um certo ufa-nismo nascente (Carlota Joaquina:princesa do Brasil; O quatrilho,1995, Fábio Barreto; Policarpo Qua-resma — herói do Brasil, 1996, PauloThiago). Mas por que houve essa aber-tura para o cinema brasileiro e parafilmes cujas temáticas retratassemnossos valores? Vários são os fatoresque temos de levar em consideração.

A partir do momento em que surgi-ram a Lei do Audiovisual e as demaisleis culturais," o cinema brasileiro ten-tou retomar um lugar na produção cul-tural nacional. Foi o chamado "renas-cimento do cinema brasileiro", termoque hoje deve ser encarado com cui-dado. Tal renascimento se deu em umvazio estético, presente no fazer cine-matográfico do Brasil dos anos 80: aestética de mercado, a fotografia "bemfeita" indicavam um movimento parafora, em busca do olhar e da aprecia-

ção exterior. Por outro lado, astemáticas do local, do regional, do his-tórico perfaziam, também, um movi-mento de se tentar uma forma de olharpara dentro, de buscar uma identidadede nação. Mesmo a tentativa do res-gate histórico e literário vinhapermeada de uma estética popular in-ternacional (Carlota Joaquina, Oquatrilho, Guerra de Canudos, 1997,Sérgio Rezende). Este primeiro é con-siderado o marco inaugurador do cha-mado "renascimento", simbolizandoigualmente a onda de novos cineastasque formariam o chamado "cinema deautor", marcado por individualidades e,por isso mesmo, oferecendo uma difi-culdade maior em se precisar um esti-lo mais unívoco.

Um autor que indica alguns dostraços do cinema dos anos 90 é Xavier(1998). Ele descreve um cinema quetrata de questões da sociabilidade eda experiência social, de um realismoconvencional e de um diálogo com asvertentes globalizantes. A questão daalteridade ganha peso: por exemplo,a figura de Benjamin Abrahão, sírio-libanês, recebe projeção em O baileperfumado; dois dos seqüestrados deComo nascem os anjos (1996, MuriloSalles), filme que retrata a violêncianas favelas do Rio, são um pai e umafilha americanos; em CarlotaJoaquina, há um narrador escocêsfalando inglês, e Terra estrangeira éfilmado no exterior, assim como DuBocage, o triunfo do amor (DjalmaLimonge Baptista, 1995). A diversi-dade das produções do período nãodeve ser mencionada somente comoum valor, mas, também, como resul-tado de um cinema vinculado a umrarefeito fomentador econômico. Ade-mais, a diversidade sempre esteve pre-sente em nossa cinematografia.

Apesar das dificuldades em se pon-tuar este renascimento, e das críticasa ele feitas, podemos discutir algumascaracterísticas norteadoras de nossocinema contemporâneo. Surgido semuma unidade estética que permeasseos diversos produtores (o que nos per-

mite, assim, caracterizar este comosendo um cinema de "individualidades",mais do que de um estilo ou correntepreponderante, como ocorreu no Ci-nema Novo), a variedade de olharespermitiu, em contrapartida, uma diver-sidade estética que buscou contemplaras tendências globalizantes do mundo,ao tomar recursos emprestados deoutras mídias para se tentar um cine-ma que falasse também ao estrangei-ro e que agradasse, ao mesmo tempo,ao público brasileiro a partir de umalinguagem visual "importada", com aqual ele manteve afinidade nos árduostempos que enfrentou na década de 80até a chamada Era Collor.

Como se sabe, foi após o governode Collor, conturbado período para ocinema brasileiro, que as produçõescinematográficas ressurgiram, levan-tando, em suas temáticas, questões ine-rentes à identidade nacional, embala-das pelo otimismo inicial da nova faseeconômica (com a instauração do Pla-no Real), e tendo o respaldo das leisde apoio às produções audiovisuais.Nesse contexto, despontaram questõesparalelas e periféricas a respeito dasidentidades que comporiam nossa iden-tidade cultural. Como afirma Mattos(1998, p. 46),

A questão da identidade naci-onal vai deixando de ser umdiscurso extrafílmico paraganhar forma dramatúrgicaconcreta em filmes como ForAll — o trampolim da vitória,de Luiz Carlos Lacerda, quesatiriza amorosamente a inva-são do Brasil pela cultura ame-ricana; 'Policarpo Quaresma— herói do Brasil, de PauloThiago, que retoma acritica-mente um clássico personagemnacionalista da literatura bra-sileira; e 'Yndio do Brasil,documentário de Sylvio Backque compila as formas comoo indígena brasileiro foi tra-tado na mídia através do sé-culo. A relação com a idéia de

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Identidades em movimento: pensando a cultura nacional por meio do cinema

estrangeiro é explorada, ain-da, em 'Como nascem os an-jos, de Murillo Salles, thrillercheio de observações psicoló-gicas sobre raça, classes e na-.cionalidade

Porém, menos do que um cinemapreocupado em politizar ou polemizaros temas nacionais, como faziam al-guns filmes do Cinema Novo, nosanos 60, alguns do Cinema Marginal,nos anos 60 e 70 e uma parte dos fil-mes da década de 90, provocam umareflexão, uma contemplação, um olharmais estático e menos crítico sobre acultura, como em busca do país que,naquele momento, se apresentava.Assim o fizeram obras como Oquatrilho, Aleijadinho (de RenatoSantos Pereira, 1995), O Guarani (deNorma Bengell, 1996), Kenoma (deEliana Caffe, 1996) e Anahy de lasMissiones (de Sérgio Silva, 1996).

Ismail Xavier salienta que o ser-tão e o cangaço, os dramas domésti-cos e a feudalização e desterritoria-lização do espaço — e mais o tema daviolência urbana — vão estar presen-tes em alguns filmes representativosda produção da década. Um mesmotipo de estrutura de relações perma-necerá nos enredos: jogos de poder,relações anômicas, "coronelismo" eembate corpo-a-corpo, pessoa-a-pes-soa. O crítico destaca Como nascemos anjos, Um céu de estrelas (1995/1997, de Tata Amaral), e Os mata-dores (1996/1997, de Beto Brant),como representantes de boas inten-ções de fabulação, fugindo das ima-gens-clichê. O sertão como um espa-ço específico do imaginário brasileirotambém retorna em filmes como Cen-tral do Brasil (1998, de Walter Salles),Crede mi (1996, de Bia Lessa e DannyRoland), Corisco e Dadá, O canga-ceiro e O baile perfumado. Neste úl-timo, surge um sertão pop, no qual pe-netram as maravilhas do mundo mo-derno, entre elas, o próprio cinema.

Falar do cinema, da mídia e, especi-almente, da tevê, foi um traço que se

presentificou em diversos filmes: Comonascem os anjos e Um céu de estre-las possuem a presença da tevê, ele-mento que serve de vetor da tragédia esimplifica a realidade, a partir do mo-mento em que a pasteuriza. É um tele-visor que atrai a cobiça de Dora (Cen-tral do Brasil, 1998), a ponto de elavender o garoto Josué para "os estran-geiros", para adquirir um novo televi-sor, ou o glamour desconstruído da fil-magem de uma propaganda de tevê noelevador de um edifício (Sábado, 1995,de Ugo Giorgetti). É ainda a tevê quefisga os personagens, como Japa e Bran-quinha (Como nascem os anjos, 1997),que querem ser vistos e respeitados pelamídia eletrônica.

Ismail Xavier, em entrevista à re-vista Praga (2000, p.100), discute estacrise da representação verificada nocinema brasileiro da última década doséculo XX. Guerra de Canudos, porexemplo, esteve enquadrado em umestilo próximo ao da ficção televisiva,tanto é que, logo após sua exibiçãonas salas de cinema, foi transforma-do em minissérie pela Rede Globo,adaptando-se perfeitamente aos re-cursos da tevê. Ismail reforça (PRA-GA, 2000, p. 100):

A ausência de experiênciaspromissoras nas personagensque tipificavam uma condiçãonacional foi um dado que aca-bou por perdurar até um ci-nema mais recente, com as ex-ceções de sempre, como Cen-tral do Brasil (Walter Salles,98), que funcionam comocontraponto a fracassos recor-rentes que terminam por defi-nir certo perfil temático e depostura, apesar das proclama-ções de diversidade que mar-cam a produção atual em fun-ção da política de produçãoimplantada a partir da cria-ção da lei do audiovisual.

Para o crítico, tivemos, nos anos90, um "cinema do entre-lugar", um

cinema "intertextual" no que concerneàs discussões sobre a nossa identida-de cultural, o que

[...] promoveu inclusive um re-torno de figuras e espaços so-ciais típicos do Cinema Novo.Daí a permanência de temasnacionais que, por um momen-to, pareciam estar se dissolven-do (PRAGA, 2000, 104).

Esse chamado "entre-lugar" é umtermo-chave para compreendermos osentido de cultura e de identidade queestamos investigando Impossibilitadode começar tudo de novo em nossa ci-nematografia, o cinema brasileiro ten-tou trabalhar uma nova maneira de tra-tar do nosso passado, buscando dialo-gar com diferentes gêneros ao mesmotempo (O judeu, 1990-1996, O mon-ge e a filha do carrasco, 1996). Comopropõe Ismail Xavier, esse esforço veiodotado de um olhar mais paciente, maiscomplacente para com nossa cultura,sem, por exemplo, as exigênciassociopolíticas que o cinema engajadodos anos 60 propunha. Contudo, men-cionamos que uma parte dos filmesproduzidos na década de 90 pretendeumanter um diálogo com o período com-preendido entre os anos 60 e 70, deindagações políticas. Como exemplo,temos Alma corsária (1994, CarlosReichenbach), Lamarca (1994, SérgioResende), O que é isso companhei-ro, (1996, Bruno Barreto), e A causasecreta (1995, Sérgio Bianchi).

Ismail Xavier chama a atenção paraa riqueza da variedade de produçõescinematográficas que a década de 90exibiu. As tentativas de diálogos como passado, como vimos, também inclu-íram diálogos com o cinema de outro-ra. For All trabalha com clichês pró-prios da chanchada, enquanto queGuerra de Canudos possui uma es-trutura parecida com a dos romanceshistóricos de Hollywood (como ...E ovento levou). Assim como o clássicoamericano, este filme brasileiro tam-bém mostra uma família comum que

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Manuel Jesús Sabariego GO=

luta para sobreviver em meio a fatos epersonagens verídicos.

E quando o cinema trata dobanditismo nos anos 90, afirma Xavier,tomando como ilustração O baile per-fumado, não há, grosso modo, aquelebanditismo dentro da visão hobsba-wniana (o vilão vingador revolucioná-rio e agente transformador da histó-ria), como em Deus e o diabo na ter-ra do sol, o clássico de Glauber Ro-cha. Percebemos um cinema que anun-cia o fim da teleologia histórica dobanditismo para encontrar um sertãocomo lugar de circulação, de troca,mantendo conexões com o litoral (sejapelo comércio, seja pelo cinema).

2 Considerações finais

Devido à multiplicidade de olha-res que podem ser dirigidos a um fil-me, e à influência que um filme podeter em seu público, o cinema vem aconstituir um campo de construçãoidentitária muito particular. Este cam-po emerge como depositário de nos-sas indagações: quem somos nós?como nos vemos? No caso do cine-ma nacional, produções que tratamdo povo brasileiro, de nosso modo devida e de nossas concepções identi-tárias, têm percorrido a história denossa cinematografia com maior oumenor fôlego e vigor. Personagens,figuras, caracterizações de nossopovo, recriações de modus vivendiintegram conjuntos de filmes que for-mam temáticas distintas (o sertão, aviolência urbana), ciclos (o cangaço,no Cinema Novo) ou mesmo perma-necem avulsos, sem outras ligaçõescinematográficas muito semelhantes,guardando, todavia, sua importância.

Não podemos negar a existênciade um processo pelo qual percebe-mos nos filmes nacionais traços denossa identidade cultural, ainda quede uma forma pouco elaborada e li-mitada, conseqüência da própria na-tureza de muitos filmes. Da mesmaforma como o camponês marginali-

zado do sertão nordestino reinventasua identidade, não se consumindo,assim, em meio às agruras de suavida, podemos dizer que o especta-dor vai reconstruindo também suaidentidade cultural à medida que con-templa um filme de cangaço ou deviolência urbana. De uma maneiramais ou menos significativa, consi-deramos que os filmes brasileiros re-alizam este papel. Seja o espelho maisclaro ou mais opaco, algum reflexode si mesmo o sujeito percebe a par-tir da grande tela. E o fato de quedesde a década de 90 até hoje nãoterem existido filmes apenas com a"estética empobrecida" e nemtampouco olhares "glauberianizados"não desvaloriza as obras em questãono que elas oferecem: um certo olharsobre a nossa identidade cultural,reconfigurada, mal ou bem. Perce-be-se um Brasil que ainda se ensaia,se pergunta, se forma, se conforma,se re-forma. O tema da identidadecultural torna-se difícil de lidar se nãohouver respiradouros, aberturas.Esta é uma questão ainda aberta enossa mais significativa conclusão éque se pode olhar para qualquer lado,pois há vários caminhos. Encontra-mos, por conseguinte, identidadesculturais cruzadas, que se rearranjamo tempo todo.

No caso do cinema

nacional, produções que

tratam do povo brasileiro,

de nosso modo de vida e

de nossas concepções

identitárias, têm percorrido

a história de nossa

cinematografia com maior

ou menor fôlego e vigor.

Recebido em 29.04.2004. Aprova-do em 16.08.2004.

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Notas

1 "A nação é uma entidade aomesmo tempo política e cultural.Enquanto que as entidades cul-turais e políticas sempre existiram,as nações são uma inovação,introduzida na Europa na épocamoderna." (Todas as traduções dofrancês são do autor do artigo).

2 Ver CANCLINI, N. G. Consumi-dores e cidadãos. Rio de Janeiro:Ed. UFRJ, 1997, p. 160.

3 Conforme Berger e Luckmann(1999).

4 "Entre a magia e a subjetividade seestende uma nebulosa incerta, que

circunda o homem sem, contudo,dele se soltar, a qual nós indicamosou designamos de manifestaçõescom as palavras da alma, do coração,dos sentimentos. Este magma quesustenta a uma e a outra não é nema magia, nem a subjetividadepropriamente ditas. É o reino dasprojeções-identificações ouparticipações afetivas."

5 O termo "brasilidade" assume umadefinição difusa, enfraquecida epouco clara; por isso, ele estáinserido aqui de maneira cuidadosa.Lembramo-nos de que a preocu-pação com a terminologia e suadefinição já estava explicitada emtextos do início do século, escritospelo historiador Capistrano deAbreu. Malgrado a dominaçãoportuguesa, este autor buscava,desde o remoto período da coloni-zação, um sentido de brasilidadepara o nosso povo (REIS, 1999, p.111).

6 Lendas medievais sempre estive-ram presentes no imaginário dosertão, como herança ibérica:Amadis de Gaula, a PrincesaMagalona, Roberto do Diabo, aImperatriz Porcina. As proezas doImperador Carlos Magno e seusDoze Pares também sempreforam cantadas pelos sertanejos elidas por Lampião. Este tambémtinha predileção especial por Avida do Imperador Napoleão.

7 Hobsbawn (1990), sobretudo oúltimo capítulo: "O nacionalismo nofinal do século XX".

8 Sobre a sociabilidade, na concepçãode Georges Simmel, consultarMoraes Filho (1983), Capítulo 11:Sociabilidade — um exemplo desociologia pura ou formal.

9 Capítulo primeiro: "Le cinéma,l'avion".

10 "La fiction, le nom Vindique, n'estpas la réalité, oft plutôt sa réalitéfictive n'est autre que l'irréalitéimaginaire". "A ficção, o próprionome já indica, não é a realidade,

ou, antes, sua realidade fictícia nãoé outra que a irrealidade imaginária"(MORIN, 1958, p.137).

11 "[...] todo sistema de ficção é, porsi mesmo, um produto histórico esocial determinado."

12 "Esta crise é resultante, por suavez, de uma conjuntura histórica ede uma atitude espiritual que seinfluenciam aliás reciprocamente."

13 No original: "Aucune époque n'amultiplié, comme la nôtre, lessources et les moyens de diver-tissement" (LEIRENS, 1960,p.10).

14 A chamada Era Collor foi o períodomarcado pelo governo deFernando Collor de Mello, que vaide 1989 até o afastamento doPresidente, em 1992, mediante umimpeachment.

15 Quando tratamos de identidadecultural, na verdade estamosfalando de uma instância polívocae híbrida, na qual transitam"identidades".

16 A Lei Rouanet ou Lei n. 8.313 datade 23 de dezembro de 1991.

17 A Lei do Audiovisual ou Lei n.8.685 data de 20 de julho de 1993.

Adriano Messias de [email protected]

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