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LEI DE POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE – PNUMA E A
AUTONOMIA DO DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO
ENVIRONMENTAL NATIONAL POLICY STATUTE (ENPS) AND THE
AUTHONOMY OF THE BRAZILIAN ENVIRONMENTAL LAW
João Leonardo Mele*
Cristiane Derani**
Fernanda Sola***
Alcione Adame****
RESUMO
A legislação brasileira, durante muitos anos, buscou regulamentar a gestão dos recursos
naturais com a visão voltada ao interesse econômico e ao desenvolvimento. Em 1981, a
Lei de Política Nacional do Meio Ambiente foi editada, alterando profundamente esse
quadro. Com o seu caráter eminentemente de proteção e o escopo de trazer grandes
diretrizes de gestão, modificou e solidificou o Direito Ambiental brasileiro, como um
ramo específico do Direito.
Se de um lado as legislações das décadas de 1930 e 1960 tinham o caráter
desenvolvimentista decorrente de momentos de mudanças políticas históricas peculiares
do Brasil, de outro, a PNMA vem permeada de aspectos relevantes decorrentes da Carta
de Estocolmo de 1972, dentre os quais se destaca a dignidade humana, o
desenvolvimento econômico e social aliado as questões ambientais. Fica também
assegurada a soberania dos povos na gestão de seus recursos,que na PNMA se expressa
sob a titulação da Segurança Nacional.
A PNMA materializa no Brasil a abordagem surgida no cenário internacional do meio
ambiente, como um bem de valor intrínseco que ultrapassa a tutela meramente
* Mestrando do Programa de Mestrado da Universidade Católica de Santos, pesquisador do Projeto de Pesquisa “Direito, Recursos Naturais e Conflitos Ambientais: o Tratado de Cooperação Amazônica”, CNPq. ** Professora Livre Docente do Mestrado em Direito da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e da Universidade Católica de Santos (UNISANTOS), Pesquisadora do Projeto de Pesquisa “Direito, Recursos Naturais e Conflitos Ambientais: o Tratado de Cooperação Amazônica”, CNPq. *** Mestranda do Programa de Mestrado da Universidade Católica de Santos, pesquisadora do Projeto de Pesquisa “Direito, Recursos Naturais e Conflitos Ambientais: o Tratado de Cooperação Amazônica”, CNPq. **** Mestranda do Programa de Mestrado da Universidade Católica de Santos.
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econômica. Sua estrutura como norma de política, fundamenta a atuação do Poder
Público e da sociedade através do estabelecimento de parâmetros, até então inexistentes.
Ao estabelecer e estruturar o Sistema Nacional do Meio Ambiente, distribuindo
competência aos demais entes federativos do Estado em um período que o texto
constitucional não apresentava tal previsão, não só inovou como envolveu o Poder
Público nas várias esferas e a sociedade na gestão ambiental, que se consolidaria mais
adiante no texto constitucional.
O Conselho Nacional do Meio Ambiente, por sua vez mostrou-se um poderoso
instrumento normativo, que também consolidou e legitimou por no sistema por seu
caráter democrático de gestão, com a formação paritária entre administração pública e
segmentos civis da sociedade.
A Lei com seu avançado caráter protecionistas e com os instrumentos de gestão nela
estabelecidos, inspirou outros diplomas legais, com ênfase a Constituição Federal,
particularmente no que concerne a gestão compartilhada, estudo prévio de impacto
ambiental, licenciamento, criação de espaços territorialmente protegidos,
responsabilização civil, penal e administrativa da pessoa física e jurídica, entre outros.
Também inspirada na PNMA encontrar-se-ão preceitos, na Lei de Crimes Ambientais e
na Lei da Ação Civil Pública. Em que pese esse gigantesco avanço alguns instrumentos
como cadastro de atividades potencialmente poluidoras não se efetivaram na forma
como previsto pelo legislador, porém, a existência da previsão legal se caracteriza como
uma garantia de implementação futura.
Pretende-se demonstrar que o Direito Ambiental brasileiro, a partir da edição da PNMA,
estabelece uma sistematização da abordagem ambiental, bem como, confere uma nova
roupagem as leis que lhe antecederam. Aliando a identificação de fontes e métodos
científicos próprios, se consolida como um ramo autônomo do Direito.
PALAVRAS-CHAVE: LEI DE POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE -
AUTONOMIA DO DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO
ABSTRACT
The Brazilian legislation, through several years, has regulated the natural resources
management regarding economic interests and the development. In 1981 the
Environmental National Policy Statute (ENPS) was laid down and this view was deeply
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changed. Its protective and broad managemental guidelines have modified and
cemented the Brazilian Environmental Law as a juridical branch.
On one hand, the statutes from the 1930s to the 1960s hold the developmentist features,
which is a consequence of the particular moments of the Brazilian policies historical
transformation. On the other hand, the ENP is permeated by aspects resulting from the
Stockholm Charter of 1972, including the human dignity, the social and economic
development related to environmental issues. It is also granted the sovereignty of
peoples over the management of their resources, expressed in the ENP under the
denomination of National Security.
The ENP embodies in the Brazilian law the approach developed in the international
environmental scenario, as a good that holds a intrinsic value, which falls out of the
reach of the merely economic protection. Its structure as a norm of policy underpins the
action of the state and the society through the establishment of parameters, which does
not exist formerly.
Through the establishment and structuring of the National Environmental System,
distributing competences among the federate states, before the Constitution poses it, not
only renewed but also enrolled the state, included the three federative instances, and the
society in the environmental management. This structure was consolidated later by the
constitutional order.
The Environmental National Council showed itself a powerful normative toll, also
consolidating and legitimating the system due to its democratic style of management,
considering the evenness of the participation of the public administration and
representatives of civil society.
The Statute has brought na advanced protectionist character and managerial devices,
which inspired other normative texts, specially the Federal Constitution, particularly
concerning the shared management, the previous study of environmental impact, the
territorially protected areas, the regulation of torts, and the criminal and administrative
liability of juridical persons.
The rules of the Environmental Crimes Statute and the Public Civil Claims
Statute were inspired by the ENPS as well. In disregard of this gigantic advance, some
tools, like the potentially polluting activities registry, have not been created as the
legislator provided for. Nevertheless, the mere fact of a statutory prevision should be a
guaranty for future implementation.
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The aim of this article is to demonstrate that the Brazilian Environmental Law,
since the ENPS, establishes a sistematic environmental approach, as well as attributes
new features to the preceding statutes. Bringing together sources and their own
methodological resources, the Environmental Law gained its autonomy.
KEYWORD: ENVIRONMENTAL NATIONAL POLICY STATUTE -
AUTHONOMY OF THE BRASILIAN ENVIRONMENTAL LAW
Introdução
O Direito Ambiental se consolida, cada vez mais, no cenário internacional e
nacional. Isso decorre da necessidade humana de viver em um ambiente sadio e
compatível à sua vida com qualidade, sendo os bens ambientais fundamentais para
atendimento dessa necessidade.
De outro lado, também está solidificado o entendimento de que os bens
ambientais são finitos e que a sua gestão, atendendo às atuais e futuras gerações,
necessita de todos os instrumentos disponíveis, dentre os quais se inclui o Direito.
A legislação brasileira, durante muitos anos, buscou regulamentar a gestão dos
recursos naturais com a visão voltada ao interesse econômico e ao desenvolvimento. Em
1981, a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente - PNMA foi editada, alterando
profundamente esse quadro.
Com o seu caráter eminentemente de proteção e o escopo de trazer grandes
diretrizes de gestão, modificou e solidificou o Direito Ambiental brasileiro, como um
ramo específico do Direito.
O presente trabalho tem por objetivo apresentar as profundas e positivas
mudanças, que a PNMA implementou e continua implementar no arranjo jurídico
ambiental, seus objetivos, instrumentos e princípios normativos que se consolidaram e
inspiraram outras legislações, dentre as quais se destaca a Constituição Federal.
1. Breve histórico da legislação ambiental brasileira e da origem da Lei de
Política Nacional de Meio Ambiente – PNMA
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Desde seu descobrimento, o Brasil teve, em seus recursos naturais, objeto de
atenção, e a partir deles se desenvolveu a economia, com exploração de madeira, ouro,
pedras preciosas, animais silvestres, e outros.
A retirada desses produtos e o estabelecimento das cidades provocaram lesões
ambientais em florestas, corpos d’água, mangues e outras frágeis regiões de costa,
considerando que a ocupação ocorreu no sentido Leste x Oeste a partir do litoral,
fronteiriço ao oceano Atlântico.
Durante séculos, essa estrutura de desenvolvimento foi mantida e muito pouco
se realizou em prol da proteção de recursos ambientais de fauna e flora. As esparsas
legislações tinham seu foco voltado à importância econômica dos bens naturais, como
se verificou nas Ordenações do Reino e na própria legislação imperial, que relacionou
em lei, madeiras nobres, buscando regrar a sua utilização.
O início do Século XX foi marcado pela Primeira Guerra Mundial e o Brasil
também passou por momentos internos de ajustes políticos, que culminaram, em 1932,
com a Revolução Constitucionalista, a partir do Estado de São Paulo.
O movimento foi sufocado rapidamente, porém, dois anos após, efeitos foram
produzidos, sendo promulgada uma nova Constituição. Ainda em 1934, foram editadas
importantes legislações relativas ao meio ambiente natural, quais sejam, o Código de
Caça e Pesca, o Código Florestal, o Código de Águas e a Lei de Proteção dos Animais.
Citadas legislações foram inovadoras e, pela primeira vez, criaram importantes
institutos como:
restrições ao exercício da pesca;
consideração dos animais e vegetais aquáticos como sendo de domínio
público;
proibições para exercício da caça;
responsabilidade civil pelo dano de caça ou pesca;
estabelecimento de responsabilidade penal para atos contra a fauna
silvestre e ictiológica;
criação de espaços territorialmente protegidos por situação geográfica
(florestas protetoras) e por ato do Poder Público (florestas remanescentes);
responsabilidade civil, penal e reparação do dano nos atos praticados
contra a flora;
tutela do Estado sobre os animais; e
ação civil contra o autor de maus tratos a animais, entre outras.
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Em que pese tais instrumentos, referidas legislações entraram em vigor e seu
caráter foi mais regulatório de utilização dos recursos naturais do que propriamente da
sua proteção, até mesmo porque, nenhuma motivação especial produzia mudança de
comportamento da sociedade brasileira da época, fortemente voltada para o
extrativismo.
Poucos anos depois, com o advento da Segunda Guerra Mundial, uma grande
pressão sobre a vegetação nativa ocorreu, pela necessidade desse tipo de material como
fonte energética.
O pós-guerra continuou provocando demanda de utilização dos recursos naturais
para reconstrução das cidades destruídas e o Brasil não ficou imune a essa febre
desenvolvimentista, que evidentemente penalizou sobremaneira recursos e ambientes.
A década de 1960, por sua vez, teve a edição do novo Código Florestal, do
Código de Pesca e da Lei de Proteção à Fauna, que, seguindo o a mesma linha das
previsões dos Códigos da década de 1930, se caracterizaram como legislações que
enfatizavam regular a exploração de recursos, ficando a proteção voltada por uma
espécie de via indireta, às formas de responsabilização a quem descumprisse preceitos
de utilização.
A que se considerar também que, a partir de 1964, ocorreram grandes mudanças
políticas no Brasil. Essas mudanças se direcionavam a alavancar um desenvolvimento
acelerado e uma ocupação estratégica do território.
Ocorreu, nessa expansão, a penalização de recursos naturais, por aberturas de
estrada, realização de grandes obras de infra-estrutura e outras atividades que foram
implantadas sem a necessária avaliação dos impactos ao meio ambiente, até mesmo
porque não havia nessa época previsão legal para esse tipo de situação.
Nesse período, a Constituição Federal vigente de 1967 previa a exclusividade de
legislar sobre recursos naturais apenas para a União. Encontrava-se essa previsão legal
no artigo 8º (competências da União), inciso XVII (legislar), alínea h (jazidas, minas e
ouros recursos minerais, metalurgia, florestas, caça e pesca). Com a Emenda
Constitucional de 1969, essa previsão foi mantida nos mesmos termos, permanecendo
centralizada a administração dos recursos naturais.
Torna-se oportuno lembrar, ainda, que nesse período, não apenas no Brasil, mas
em todo mundo, a proteção do meio ambiente era tratada de outra forma. Medidas
efetivas eram tímidas, diante da gravidade da questão e dos estudos que já
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demonstravam a necessidade de uma mudança de comportamentos imediata no modelo
de desenvolvimento, na velocidade e forma de consumo.
Em 1972, a Conferência da ONU, realizada em Estocolmo na Suécia, conhecida
como a Conferência Sobre Meio Ambiente Humano, trouxe o homem para o centro da
questão ambiental e estabeleceu princípios que deram início a grandes mudanças, dentre
as quais, as de criação e alteração de legislações.
Esse fato é relevante para o presente trabalho, pois a Lei de PNMA é
influenciada por esses princípios, que não têm alcance apenas sobre o meio ambiente
natural e artificial, mas também, sobre a soberania dos povos e, em particular, sobre a
dignidade humana.
Não se pode atribuir a origem da Lei de PNMA apenas por decorrência da Carta
de Estocolmo de 1972, já que outros fatores contribuíram com a sua edição, dentre o
quais, a pressão internacional decorrente de agressões ambientais de muita relevância,
não só ao ambiente, mas também às pessoas, a exemplo dos casos da operação do pólo
industrial de Cubatão, onde até o nascimento de crianças sem cérebro foram registrados,
como conseqüência dos níveis de poluição local.
A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente estabeleceu um marco divisor
que, como será visto adiante, modificou o arranjo jurídico brasileiro no que concerne ao
meio ambiente, não só pelas grandes diretrizes que estabeleceu, mas principalmente, por
oferecer as condições para estruturar o Direito Ambiental como um ramo autônomo do
Direito.
2. Lei nº 6.938, de 1981 - Estrutura, Objetivos, Instrumentos e Inovações de
Política Ambiental
Editada em 1981, a Política Nacional de Meio Ambiente balizou a nova situação
brasileira na gestão do meio ambiente. Ao criar uma política para a questão reconheceu
que o assunto, até então, recebia tratamento compartimentado por tipo de recurso
(fauna, flora, etc) e, sem o caráter específico de proteção.
A legislação vigente privilegiava essa compartimentação, e a administração dos
recursos ambientais era levada a efeito por órgãos distintos, a exemplo do Instituto
Brasileiro de Desenvolvimento Florestal - IBDF, responsável pela gestão de florestas e
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fauna, enquanto a Superintendência do Desenvolvimento da Pesca - SUDEPE, ficava a
responsável pela gestão da pesca interior e marítima.
Dessa forma, dificilmente era possível avaliar influências e interações do
ambiente de maneira integrada, contrariando a realidade que os sistemas ambientais são
conexos e interdependentes.
Não havia, por exemplo, como proceder a análise dos efeitos sobre a fauna
ictiológica (administração SUDEPE), no caso do desmatamento de uma vegetação
ciliar, ou de um manguezal (administração IBDF).
Ao se disponibilizar uma legislação de gestão do meio ambiente como um todo,
há migração da ótica de administração de recurso, para a ótica de administração de
sistema.
Nesse aspecto, torna-se o oportuno citar a própria definição de meio ambiente
prevista no artigo 3 da PNMA, que assim descreve: “meio ambiente, conjunto de
condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que
permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.
A amplitude e, conseqüentemente, o alcance da definição, não deve perder de
vista, que uma das formas de vida referenciada é a vida humana e que ela tem um papel
próprio e fundamental como vetor de utilização e de proteção.
Outro fator de relevância da PNMA é o de que a lei foi concebida com caráter
protecionista e, portanto, buscando alcançar e responsabilizar os autores de delitos
contra o meio ambiente, que até então, usando dos mais variados subterfúgios,
conseguiam se furtar a responder pelos atos praticados.
Em decorrência, as definições de degradação da qualidade ambiental, poluição e
poluidor, constantes do artigo 3º da PNMA circunscreveram, de maneira precisa, as
ações irregulares que podem ocorrer contra o meio ambiente e os agentes por elas
responsáveis. Ao longo do tempo, demonstrou-se o acerto do legislador para
individualizar a responsabilização civil, administrativa e penal do degradador ambiental.
O fechamento do artigo 3º da PNMA veio com a definição de recursos
ambientais e ao relacionar a atmosfera, fauna, flora, solo e o subsolo e outros recursos,
consolidou ao que se direcionava a tutela dos bens, que passavam a ser objeto da
proteção.
A Lei n° 6.938, de 31 de agosto de 1981, que estabeleceu a Política Nacional de
Meio Ambiente inovou ao prever em seu artigo 2°, que “a Política Nacional do Meio
Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade
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ambiental, visando assegurar no país, condições ao desenvolvimento socioeconômico,
aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana.”
O desenvolvimento socioeconômico, a segurança nacional e a proteção da
dignidade da vida humana, inseridos em uma legislação específica de meio ambiente
merece receber comentários, pois esses aspectos não só demonstravam avanço para
época, mas evoluíram em sua abrangência e significado como pode se verificar.
Não é demais relembrar que em 1981 estava-se sobre a égide Constitucional da
década de 1960 e em um regime político de exceção. Nessa situação a segurança
nacional ganhava um papel muito particular enfatizando a soberania nacional e a
integridade territorial.
A ameaça a ordem, ao estado de direito e ao próprio regime, também se viam
permeados pelo contexto internacional da Guerra Fria, onde as ideologias provocavam
conflitos internos e externos.
Se em um primeiro momento esses fatores podem ter incluído os interesses da
segurança nacional na PNMA, mais adiante essa inclusão demonstrou ser preciosa para
correlacionar a segurança nacional à ótica contemporânea de segurança humana dos
cidadãos, de exercício da soberania mediante políticas públicas de proteção coletiva e
principalmente da necessidade de ofertar condições para o exercício da cidadania.
No que se refere ao desenvolvimento socioeconômico e sua influência na
questão ambiental, é oportuno citar que nos princípios estabelecidos na Carta de
Estocolmo de 1972, um deles já fazia especial referência a essa questão assim descrito:
Princípio 8. O desenvolvimento econômico e social é
indispensável para assegurar ao homem um ambiente de vida e
trabalho favorável e para criar na terra condições necessárias de
melhoria de qualidade de vida.1
Essa questão evoluiu e mais adiante no relatório Brundtland, de 1986 foi
estabelecido o conceito de desenvolvimento sustentável, que associado a anterior
previsão da PNMA a potencializou.
No que concerne a proteção da dignidade da vida humana, historicamente está
ela incluída em preceitos internacionais a exemplo da Declaração Universal dos Direitos
do Homem, de 1948. É, entretanto, na Declaração de Estocolmo, de 1972, que se
expressa a vida digna em princípios ambientais, como pode se verificar:
1 Conferência de Estocolmo. Site consultado: < http://www.mma.gov.br > Acesso em 25/02/06.
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Princípio 1. O homem tem o direito fundamental à
liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida
adequadas em um meio ambiente de qualidade tal que lhe
permita levar uma vida digna e gozar de bem estar, tendo a
solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para
as gerações presentes e futuras. A este respeito, as políticas que
promovem ou perpetuam o apartheid, a segregação racial, a
discriminação, a opressão colonial e outras formas de opressão
e dominação estrangeiras são condenadas e devem ser
eliminadas.2
A vida com dignidade é algo historicamente perseguido, para permitir ao
indivíduo desfrutar da liberdade, da integridade física e psíquica, da sua intimidade e de
suas características próprias como ser humano. O entendimento que o componente meio
ambiente é fator para se alcançar essa dignidade, redundando em uma adequada
qualidade de vida, pode ser considerada como um passo gigantesco na relação humana e
nesta com nesta com seu meio.
A PNMA é influenciada pelos preceitos internacionais e apresenta o grande
mérito, de incluir pela primeira vez em uma legislação de meio ambiente brasileira o
componente dignidade humana.
O Direito Ambiental apresenta princípios doutrinários. A PNMA também
relaciona, em seu artigo 2º, princípios. Entretanto, estes são de caráter normatizador e
dos quais partiram novas posturas e entendimentos, cabendo referência aos seguintes
aspectos:
- consideração do meio ambiente como patrimônio público e de uso coletivo;
- o uso racional do solo, subsolo, água e ar, com planejamento e fiscalização do
uso dos recursos;
- a proteção de ecossistemas, o controle e zoneamento de atividades;
- o estudo e pesquisa de novas tecnologias voltadas à proteção;
- recuperação e proteção de áreas, ou ameaçadas de degradação; e, finalmente,
- educação ambiental
2 Conferência de Estocolmo. Site consultado: < http://www.mma.gov.br > Acesso em 25/02/06.
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No que concerne aos objetivos da PNMA, elencados no artigo 4º, e muito
assemelhados aos princípios estabelecidos no artigo 2º, já comentados, destaca-se
particularmente o inciso VII, quando prevê a imposição de recuperar o indenizar os
danos ambientais pelo poluidor, bem como a contribuição da utilização dos recursos
ambientais com finalidade econômica. Presentes, dessa forma, os princípios
doutrinários do poluidor pagador e do usuário pagador.
Dois institutos de relevância, criados na Lei nº 6.938/1981, foram o Sistema
Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA e o Conselho Nacional do Meio Ambiente
CONAMA, que, pela suas especificidades, serão objeto de capítulo próprio, no presente
trabalho.
A Lei passou a prever, em seu artigo 9º, os instrumentos da política nacional,
sendo que alguns deles se efetivaram e se consolidaram na legislação ambiental
nacional, enquanto outros, ainda não atingiram de forma plena os objetivos do
legislador.
Entre os instrumentos consolidados relaciona-se:
- estabelecimento de padrões de qualidade ambiental;
- a avaliação de impactos ambientais;
- o licenciamento; e
- a criação de espaços territorialmente protegidos.
Dos instrumentos que necessitam evoluir, a fim de atender aos objetivos a que se
propõem, pode-se relacionar:
- o Cadastro Técnico Federal, de atividades e defesa ambiental;
- o Cadastro Técnico Federal, de atividades poluidoras;
- instrumentos econômicos, como a concessão florestal, a servidão ambiental e o
seguro ambiental, entre outras.
O Estudo Prévio de Impacto Ambiental - EPIA, previsto no artigo 10 da PNMA,
por sua vez, se transformou, ao longo dos anos, em uma das mais importantes
ferramentas de prevenção e de proteção ambiental.
Em que pese ter, nos últimos vinte e cinco anos, sofrido ajustes, para não ser
utilizado em desacordo com seus objetivos, o estudo de impacto ambiental em nenhum
instante perdeu a sua validade e a sua importância.
A abordagem técnica do EPIA, a produção de informações sobre a atividade a
ser desenvolvida e, mais adiante, a participação popular, deram, no mínimo, a
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possibilidade de mitigação dos impactos e a transparência do processo, que podem ser
consideradas conquistas ambientais e democráticas.
A aplicação de sanções administrativas, previstas no artigo 14 da PNMA, de
grande valor financeiro e indexadas a um referencial econômico (Obrigações
Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTN, à época), em um período de alta inflação,
foi um duro golpe aos infratores contumazes, que se beneficiavam da desvalorização da
moeda, no que se refere à punição monetária.
Essa sistemática inaugurada na PNMA, se solidificou na responsabilização
administrativa das questões de meio ambiente, sendo seguidas pelos demais entes
federativos, desde então.
A Lei, em uma imediata reação positiva, potencializou as normatizações
anteriores, nos seus aspectos preventivos, repressivos, oferecendo melhores condições
para fiscalizar e proteger o meio ambiente.
Ainda no artigo 14, a responsabilidade objetiva, descrita no parágrafo 1º,
reforçou a indenização e a reparação do dano, independente de culpa. Trouxe o
Ministério Público para dentro da questão ambiental, como legítimo na propositura da
ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
A PNMA, abriu as portas para a nova gestão de meio ambiente no Brasil e sua
modernidade, já para a época, inspirou as legislações ambientais a ela supervinientes,a
exemplo da :
- Lei da Ação Civil Publica de 1985;
- Constituição Federal de 1988, particularmente no capítulo do meio
ambiente;
- Constituições Estaduais de 1989;
- Lei de Crimes Ambientais de 1998;
- Lei de Política Nacional de Educação Ambiental de 1999
- Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação de 2000, entre
outras.
Procurou se demonstrar neste capítulo, o grau de importância da PNMA para o
Direito Ambiental brasileiro, pelos institutos e sistemas dela criados ou derivados,
modificando a estrutura legal de proteção e gestão do meio ambiente e dos recursos
naturais.
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3. Ecologia, Economia, Direito e PNMA
Nas últimas décadas, a ecologia emergiu das suas raízes nas ciências biológicas
para se tornar uma nova disciplina integrada que liga as ciências naturais e sociais. Ao
estudo de como os organismos interagem entre si e com o seu ambiente, os ecologistas
alargaram a sua escala de estudo e o seu interesse incluindo níveis mais altos de
organização, como o sistema ecológico ou ecossistema, a paisagem, a região e a
biosfera.3
A melhor maneira de delimitar a ecologia moderna talvez seja considerá-la em
termos do conceito dos níveis de organização. A interação com o ambiente físico
(energia e matéria) a cada nível produz sistemas funcionais característicos. Por sistema
quer significar-se ‘componentes com interação e interdependência regulares formando
um todo unificado’4
Inicialmente esclarecemos que adotaremos a acepção de ecologia como um
estudo dos sistemas biológicos de interdependência atuando o sistema econômico como
um intermediário do meio ambiente com ele mesmo. Considerando a atividade
econômica do homem em retirar da biosfera elementos que posteriormente retornarão a
ela sob diversas formas dejetos ou como bens obsoletos. A clássica matriz de insumo
produto, vem sofrendo adaptações para incorporar a geração de poluentes no processo
de transformação e a sua eventual eliminação total ou parcial5.
Nessas condições, o sistema econômico passa a se inserir numa cadeia de
reações e de processos originadas no sistema ecológico, ao qual acaba por retornar,
implicando a impossibilidade do primeiro deles vir a ser visto como um sistema
totalmente aberto, como era tradicionalmente considerado. Um sistema aberto é aquele
onde se torna irrelevante o conhecimento da origem e do destino dos materiais e energia
nele utilizados e dele extraídos.
Numa economia de sistema fechado, o enfoque básico da atividade humana é
totalmente diverso, o PIB (produto interno bruto) passa a ser relativisado com a
restrição de manter o estoque de satisfação em equilíbrio, isso não quer dizer que o PIB
deve deixar de crescer, mas devera ser feito num ritmo consistente com o crescimento
3 ODUM, Eugene Pleasants, Fundamentos de ecologia, tradução António Manuel de Azevedo Gomes. 7. ed. Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian, 2004. 4 ODUM, op. cit 5 NUSDEO, Fabio. Curso de Economia. São Paulo: RT, 2006. p. 415-430.
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populacional e com a gradual extensão dos benefícios às camadas dele alijadas. Esta
visão levaria a um controle populacional estrito, seguindo um modelo Malthusiano6.
Diante da previsão do relatório do Clube de Roma e das movimentações dos
anos 60, a ONU- Organização das Nações Unidas realizou, em junho de 1972, a
Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, congregando mais de
110 países, entre eles, o Brasil, da qual resultou a Declaração de Estocolmo, peça
fundamental para o estabelecimento dos princípios do Direito Ambiental.
Os reflexos na legislação interna foram sendo sentidos, culminando em 1981
numa mudança estrutural no conteúdo normativo na abordagem do meio ambiente com
a edição da lei n. 6.938, a qual dispôs sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus
fins, mecanismos de formulação e aplicação e dá outras providências.
Pode-se afirmar que a ordem jurídica ambiental, como uma organização básica
dotada de unidade interna formal, tal como viria a ser tratada na Constituição Federal de
1988 (o sistema jurídico estrutura um movimento que já ocorre na sociedade7), já
encontra sua essência organizadora e seu potencial implementador na Lei de Política
Nacional do Meio Ambiente PNMA.
A necessária materialização dos princípios ambientais surgidos no cenário
internacional é ao mesmo tempo origem e produto8 da abordagem ambiental de per si e
não meramente econômica. “A norma incorpora a tarefa de procurar reter no tempo o
que o cotidiano não é ou não foi capaz de perpetuar. Nela estão presentes valores e
idéias que remetem a uma nostalgia coletiva por uma sociedade ideal”9. É nesse mesmo
sentido que a PNMA cristaliza anseios e valores para a concreção da dignidade da vida
humana na medida em que tutela o meio ambiente como um bem de valor intrínseco, o
qual, mesmo ausente das relações de mercado, é reconhecido juridicamente a partir da
instituição normativa, isso pode ser verificado nos artigos 2o, 4o e 5o.
6 “Malthus partiu da observação de Benjamin Franklin de que, nas colônias norte americanas em que os recursos eram abundantes, a população tendia a duplicar de 25 em 25 anos...ele postulou então uma tendência universal da população- excepto quando confrontada com a oferta limitada de alimentos- para crescer exponencialmente, ou através de uma progressão geométrica... argumentou que, dado que a terra é fixa, enquanto os recursos de trabalho aumentam, os alimentos tendem a crescer numa progressão aritmética...concluindo que ‘é como se o globo estivesse a reduzir-se para metade e novamente e novamente para a metade- até finalmente se ter reduzido tanto que a oferta de alimentos se situa abaixo do nível de vida necessário’.” SAMUELSON, Paul A. e NORDHAUS,William D. Economia. 16º edição. Tradução de Elsa Nobre Fontainha. Lisboa: McGraw-Hill, 1999. 7 GRAU, Eros. O direito posto e o direito pressuposto. São Paulo: Malheiros, 1998. 8 “o alvo do sistema jurídico é a ordem social” in DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. São Paulo: Max Limonad, 1997. p.27. 9 DERANI, op cit. P.38.
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A autonomia do Direito Ambiental se verifica nas suas relações ordenadas por
princípios que lhe são próprios e que, por muitas vezes, não compartilha com outros
ramos da ciência jurídica. Isso quer dizer que o Direito Ambiental baseia-se em fontes
que primordialmente lhe são exclusivas, mesmo que guarde certa interdependência com
outros diplomas. Nesse sentido a PNMA inaugura e nos fornece o suporte
epistemológico para se tratar o Direito Ambiental como um ramo autônomo10.
Como todo ramo normativo que surge, o direito ambiental responde a um
conflito interno da sociedade a partir de uma perspectiva que lhe é própria: qualidade de
vida transgeneracional.
A PNMA, atendendo a esses anseios, estrutura uma norma política na medida
em que reconhece a necessidade da concreção futura de valores que representa o
fundamento último da atuação ética do Estado e da sociedade11, fins a serem obtidos,
parâmetros das ações, programas, enfim, instrumentos e caminhos e prescreve condutas.
A norma política deve prever a competência, isto é, a autorização e o seu
respectivo dever. Esta atribui a esferas de poder ou órgãos governamentais o poder para
realizar atos e alcançar objetivos, sendo sua execução um dever que pode ser cobrado
por aqueles a quem os benefícios da realização da norma se destinam.
Uma norma política dispõe sobre objetivos, finalidades, instrumentos, valores.
Podemos chamá-la de lei-quadro sendo que a partir dela decorrem ações positivas
práticas e normativas prescritivas de condutas (imposições, permissões, proibições,
autorizações).12
A sistematização do seu estudo, bem como a nova abordagem de leis anteriores
sobre a matéria, a submissão dos conflitos à Justiça, bem como a identificação das
fontes e método científico próprio, resultaram na determinação da autonomia completa
do Direito Ambiental13, a partir da PNMA.
10 Importante contrapor a crítica de Michel Vivant de que seria meramente acadêmica a discussão sobre a autonomia de determinado ramo do Direito, uma vez que o Direito, é primordialmente existencialista, pois sua existência precede sua essência, ou seja, os fenômenos fáticos passaram a ser objeto do direito antes do surgimento do Direito como ramo. In http://www.alfa-redi.org/rdi-articulo.shtml?x=1270, consultado em 19/10/2006. 11 cf com DERANI, Cristiane. Política pública e a norma política. Mímeo. 12 cf com DERANI, Cristiane. Política pública e a norma política. Mímeo. 13 O direito ambiental, é reformador, uma vez que regula a relação social como um todo; o agenciamento equilibrado das inter-relações da humanidade e sua forma de manutenção da vida dentro de processos ecológico e economicamente otimizados.
16
4.SISNAMA e CONAMA como Instrumentos de Gestão e Regulamentação
A necessidade de se criar instrumentos de gestão e regulamentação do meio
ambiente teve sua gênese, para muitos, como já vimos, com a conferência de estocolmo
(1972), que inseriu no contexto mundial a questão ambiental e a necessidade de se criar
meios de proteção e preservação do meio ambiente.
A edição da Lei n.° 6.938/81 PNMA trouxe em seu bojo a arquitetura do
Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA (art. 6.º), designando um capítulo
específico para explicar seu funcionamento.
Segundo definição de José Affonso da Silva14, o SISNAMA, é “um conjunto
articulado de órgãos, entidades, regras e práticas da União, dos Estados, do Distrito
Federal, dos Territórios, dos Municípios e de fundações instituídas pelo Poder Público,
responsável pela proteção e melhoria da qualidade ambiental”.
Assim sendo, o SISNAMA, é um sistema mecanicamente interligado, mas
independente com competências específicas e próprias, todavia, sem personalidade
jurídica nem qualquer outra identificação.
Por sistema entende-se um conjunto de órgãos que compõe um todo, e nesse
todo é necessário que se tenha uma articulação entre os diversos órgãos, para que cada
um, dentro de suas especificidades possa integrar-se e fazer com que esse todo, funcione
de maneira harmônica e produtiva.
Ao explicar sistema Derani15 identifica duas características lógicas, sendo ordem
e unidade, e faz uma ligação entre eles até chegar ao todo sistêmico.
O SISNAMA é composto de órgãos e instituições de diversos níveis do Poder
Público encarregados da proteção do meio ambiente. É uma estrutura político
14 SILVA, José Affonso da. Direito Ambiental Constitucional. p. 224. 15 Um sistema possui duas características básicas: ordem e unidade. Entende-se por ordem um
conteúdo racional desenvolvido num processo de conseqüência lógica. A unidade de um sistema é a sua formação coesa, onde seus elementos são suficientes para formatar um todo. É uma ordem e unidade de sentido. Com a identificação de sentido na interior do sistema, pode-se extrair, de maneira mais eficiente, o conteúdo dos elementos que compõem o sistema. O operador do sistema torna-se, assim, capacitado para uma orientação seletiva, intencionada, dos elementos que compõe o todo sistêmico, trabalhando a diversidade de construção do possível. (C.f. Cristiane Derani, Estrutura do Sistema Nacional de Unidade de Conservação, in Direito Ambiental das áreas protegidas. 2001 p. 234).
17
administrativa oficial governamental, ainda que aberta à participação de instituições não
governamentais, através dos canais competentes.
No que se refere à sua organização, o SISNAMA apresenta a seguinte
estrutura16:Órgão Superior; Órgão Consultivo e Deliberativo (CONAMA); Órgão
Central; Órgão Executor (IBAMA); Órgãos Setoriais; Órgãos Seccionais; Órgãos
Locais.
A atuação do SISNAMA efetivar-se-á mediante articulação coordenada dos
órgãos e entidades que o constituem, observado o acesso da opinião pública às
informações relativas às agressões ao meio ambiente e às ações de proteção ambiental,
na forma estabelecida pelo CONAMA, cabendo aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios a regionalização das medidas emanadas do SISNAMA, elaborando normas
e padrões supletivos e complementares (art. 14, do Decreto n.º 99.274/90).
O resultado deste esforço conjugado aponta para bases onde a atuação conjunta
do Estado e do Município na administração do meio ambiente brasileiro, tendo a
preocupações com o todo, tem o condão de uma visão ampla das questões ambientais,
dando assim primazia para a formação da consciência ambiental dos cidadãos e,
sobretudo, na ação dos administradores dos recursos naturais e da qualidade ambiental.
Sendo, assim, torna-se desejável que Estados e Municípios estabeleçam,
respectivamente, Sistemas Estaduais de Meio Ambiente (SISEMAS) e Sistemas
Municipais de Meio Ambiente (SISMUMAS), pois a proximidade com o problema leva
a uma melhor solução, e assim, o SISNAMA tem uma visão geral sobre as questões
ambientais e o trabalho regionalizado desses órgãos daria maior ênfase às questões
locais, tendo assim, mais chances de discutir qual a melhor solução para que sejam
resolvidos a contento.
Esses órgãos desempenhariam suas funções sem ferir a competência um dos
outros, pois a Constituição Federal17 estabelece que a proteção do Meio Ambiente seja
de competência comum ou concorrente da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, pois todos podem igualmente dentro do âmbito de seu poder administrativo
16 As atribuições e composição de cada órgão está prevista nos incisos I a VI do artigo 6.º da Lei
6.938/81. 17 Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII – preservar as florestas, a fauna e a flora;
18
criar mecanismos de defesa e preservação do meio ambiente, pois não há hierarquia,
mas há uma distribuição de espaços e de atuação.
Quanto à competência legislativa, é função da União estabelecer normas gerais e
do Estado18 e Municípios19 normas complementares, sendo que na esfera administrativa
cabe aos três poderes tomarem medidas para a proteção ambiental.
Assim, de maneira conjunta poderiam tomar decisões onde o meio ambiente
fosse preservado e de maneira sustentável mantido, já que é esse o objetivo da Lei da
Política Nacional do Meio Ambiente.
Conforme já ressaltado o SISNAMA é um sistema, e como tal, é composto de
órgãos, dentre os quais dar-se-á enfoque ao Conselho Nacional do Meio Ambiente –
CONAMA.
O CONAMA é um órgão consultivo e deliberativo do SISNAMA, e foi
instituído pelo artigo 6.°, inciso II da Lei 6.938/8120, – que dispõe sobre a Política
Nacional do Meio Ambiente – com finalidade de assessorar, estudar e propor ao
Conselho de Governo diretrizes e políticas governamentais para o meio ambiente e os
recursos naturais e deliberar, no âmbito de sua competência, sobre normas e padrões
compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial para a sadia
qualidade de vida.
O artigo 8.º da Lei 6.938/81 estabelece a competência legal do CONAMA, ou
seja, estabelece os sujeitos que irão exercer as funções determinadas na lei. Além das
competências definidas nessa Lei, o Decreto n.º 99.274/90, com nova redação dada pelo
Decreto n.º 3.942/2001, em seu artigo 7.º regulamentou essas competências.
18 Art. 6.º, § 1.º – Lei 6.938/81: Os Estados, na esfera de suas competências e nas áreas de sua jurisdição,
elaborarão normas supletivas e complementares e padrões relacionados com o meio ambiente, observados os que forem estabelecidos pelo CONAMA.
19 Art. 6.º, § 2.º – Lei 6.938/81: Os Municípios, observadas as normas e os padrões federais e estaduais, também poderão elaborar as normas mencionadas no parágrafo anterior.
20 Art. 6.° (...) II – órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), com a
finalidade de assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo, diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais e deliberar, no âmbito de sua competência, sobre normas e padrões compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida; (Redação dada pela Lei n.º 8.028, de 1990).
19
Não raras vezes, a questão da competência do CONAMA para legislar sobre
meio ambiente, foi objeto de discussão com as Casas Legislativas, que se manifestaram
no sentido das restrições, no enunciado de normas, que estariam mais adequadas de
serem baixadas por meio de Leis, e não por Resoluções do CONAMA. Como é o caso
da controvertida resolução CONAMA 237/97, que distribui a competência entre as
esferas do Estado Brasileiro para realizar o licenciamento ambiental.
Uma outra divergência que paira sobre o tema relacionado à competência do
CONAMA é quanto à revogação do artigo 8.° da Lei n.º 6.938/81, pelo artigo 25 dos
Atos das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT21.
Diante desse artigo encontramos uma divergência doutrinária, pois alguns
autores entendem que esse dispositivo, revogou o artigo 8.° de Lei 6.938/81 e outros, ao
contrário, afirmam que o artigo 8.° de Lei 6.938/81 foi recepcionado integralmente pela
Constituição.
Maria Luiza Werneck dos Santos, respaldada de outros autores como Luiz
Roberto Barroso e Diogo de Figueiredo Moreira Neto, entende que o artigo 25 da
ADCT revogou a competência atribuída ao CONAMA pelo artigo 8.º ad Lei n.º
6.938/81.
“A competência que a Lei 6.938/81 delegou ao CONAMA não
consubstancia, a toda evidência, uma competência normativa
destinada a inovar na ordem jurídica, seja impondo obrigações,
seja instituindo direitos ou estipulando sanções. Ademais, ainda
que se pudesse entender nesses termos tal competência
normativa, o art 25 da ADCT da Carta Federal, como já
assinalado, a revogou expressamente. Não pode, portanto, o
CONAMA editar norma que implique intervenção na liberdade
ou propriedade do cidadão, porque essa matéria está reservada a
21 O artigo 25 da ADCT estabelece que: “ficam revogados, a partir de cento e oitenta dias da promulgação
da Constituição, sujeito este prazo à prorrogação por lei, todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional, especialmente no que tange a: I - ação normativa, II - alocação ou transferência de recurso de qualquer espécie”.
20
lei, em razão do princípio da legalidade, consagrado no art 5° do
Estatuto Fundamental”.22
Já Paulo Affonso Leme Machado, entende de maneira diferente e
explica:
A competência do CONAMA não foi atingida pelo disposto no
art 25 da ADCT (...). È necessário verificar as competências
assinaladas pela Constituição ao Congresso Nacional e as
competências do CONAMA prevista no art. 8.° da Lei 6.938/81,
pois somente foram abrangidos os órgãos do Poder Executivo
que estivessem exercendo funções que a Constituição reservou
para o Congresso Nacional.
As atribuições do Congresso Nacional estão inseridas no Titulo
IV, Cap. I – Do Poder Legislativo, Seção II, arts. 48 e 49.
Constata-se que nenhuma das atribuições do Congresso
Nacional são exercidas pelo CONAMA. Alias, a matéria que
tem clara conotação ambiental – “iniciativas do poder Executivo
referente a atividades nucleares” (art 49, XIV, da CF) – é
atribuição do CNEN – Conselho Nacional de Energia Nuclear.
Portando, (...) entendo que o art 25 da ADCT não revogou as
resoluções do CONAMA.23
Diante do exposto, verifica-se a existência de conflito em se tratando da
constitucionalidade e legalidade das competências atribuídas ao CONAMA muito
embora entende-se que essa competência continua preservada pela Constituição, uma
vez que o artigo 8.º da Lei 6.938/81 foi recepcionado por ela, ainda mais porque
necessário se torna que as atribuições do CONAMA sejam exercidas em sua inteireza,
uma vez que o objeto de preservação é o meio ambiente e a qualidade de vida.
A Lei n.º 8.028/90 revogou o dispositivo do art. 7. da Lei n. 6938/81 que definia
a composição do CONAMA, que passou a ser determinada pelos artigos 4.º e 5.º do
Decreto n.º 99.274/90, com nova redação dada pelo Decreto n.º 3.942/2001.
22 SANTOS, Maria Luiza Werneck dos. Considerações sobre os Limites da Competência Normativa do
Conama. p. 8 . 23 MACHADO. Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. p. 147/148
21
Assim, o Sistema Nacional de Meio Ambiente encontra-se estruturado de
maneira integrada, representando um todo, uma articulação de órgãos responsáveis pela
proteção e melhoria da qualidade ambiental. Contando com a ajuda dos Estados e
Municípios para que essa proteção se torne efetiva e eficiente.
Considerações Finais
O Direito Ambiental brasileiro é claramente dividido, no que concerne a
proteção dos recursos naturais e, uma nova ótica de gestão, nela inclusa a
participação humana os ambientes artificiais, o desenvolvimento socioeconômico, a
segurança nacional e especialmente a dignidade humana.
A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente de 1981 é responsável por essa
positiva modificação e os institutos por ela criados permearam outras legislações de
proteção ambiental. Alguns deles foram elevados ao Texto Constitucional,
solidificando-os e garantindo aos mesmos, perenidade na disposição jurídica
nacional.
O objetivo do presente trabalho foi o de demonstrar a situação anterior a Lei,
com um histórico que permita avaliar a profundidade das mudanças e como os
instrumentos disponíveis até a década de 1980, careciam de adequação para
efetivamente se dar a necessária proteção ao meio ambiente como um sistema
integrado e interligado.
Pretendeu-se trazer uma panorâmica geral da PNMA, de forma a ser possível
ter avaliação de sua abrangência, princípios normativos, instrumentos de política e
gestão, instrumentos econômicos e ecológicos , mecanismos de repartição de
responsabilidade pelos entes federativos, como o SISNAMA e ainda de participação
e regulamentação,a exemplo do CONAMA.
As informações coletadas permitem conduzir ao raciocínio, que a Lei 6938 de
1981,pela forma como se apresenta e pelo que nela está contido foi de fundamental
importância para estruturar o Direito Ambiental brasileiro como um ramo autônomo
do Direito.
22
Não se pode perder de vista as suas interfaces com as demais áreas jurídicas,
mas pode se afirmar com certeza, que a PNMA é um dos mais significativos marcos
na proteção de todas as formas de vida, especialmente a humana.
REFERÊNCIAS
Conferência de Estocolmo. Site consultado: < http://www.mma.gov.br > Acesso
em 25/02/06
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. São Paulo: Max Limonad,
1997
DERANI, Cristiane. Política pública e a norma política. Mímeo
GRAU, Eros. O direito posto e o direito pressuposto. São Paulo: Malheiros, 1998
MACHADO. Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro.
NUSDEO, Fabio. Curso de Economia. São Paulo: RT, 2006.
ODUM, Eugene Pleasants, Fundamentos de ecologia, tradução António Manuel de
Azevedo Gomes. 7. ed. Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian, 2004.
SANTOS, Maria Luiza Werneck dos. Considerações sobre os Limites da
Competência Normativa do Conama.
SILVA, José Affonso da. Direito Ambiental Constitucional.