lucas justiniano roberto - lucas... · 2020-05-26 · universidade federal fluminense instituto de...

49
Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO ROBERTO CRACK NO CAMPO CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO Niterói 2018

Upload: others

Post on 29-Jul-2020

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

Universidade Federal FluminenseInstituto de Ciências Humanas e Filosofia

Curso de Graduação em Antropologia

LUCAS JUSTINIANO ROBERTO

CRACK NO CAMPO

CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO

Niterói

2018

Page 2: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

Universidade Federal FluminenseInstituto de Ciências Humanas e Filosofia

Curso de Graduação em Antropologia

LUCAS JUSTINIANO ROBERTO

CRACK NO CAMPO

CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO

Monografia apresentada ao Curso de Graduaçãoem Antropologia da Universidade FederalFluminense, como requisito parcial para aobtenção do título de Bacharel Licenciado emEspecialidade.

Orientador: Prof. Dr. Antônio Carlos Rafael BarbosaCo-orientador: Prof. Dr. João Resende Santos

Niterói

2018

Page 3: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO
Page 4: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

Universidade Federal FluminenseInstituto de Ciências Humanas e Filosofia

Curso de Graduação em Antropologia

LUCAS JUSTINIANO ROBERTO

CRACK NO CAMPO

CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO

BANCA EXAMINADORA

.............................................................Prof. Dr. Antônio Carlos Rafael Barbosa

Universidade Federal Fluminense

.............................................................Prof.ª Dr.ª Ana Cláudia da Silva

Universidade Federal Fluminense

.............................................................Prof. Dr. Valdeci Ribeiro dos SantosUniversidade Federal Fluminense

Niterói

2018

Page 5: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

DEDICATÓRIA

Dedico esta monografia as pessoas que sempre estiveram comigo nesse

período de estudos e as pessoas que contribuíram de forma direta pra que isso

pudesse acontecer.

Page 6: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

AGRADECIMENTO

Eu gostaria de agradecer a M E A L Z O A I R Z E A L L E, minha mãe.

Uma com devir mãe, supermãe e outra que me deu tudo até a dor de cabeça,

através delas eu aprendi e aprendo todos os dias. Não poderia deixar de colocá-las

na mesma linha na mesma palavra. Agradeço a Meu pai ele é foda. Minha tia Hilda

que sempre está a meu lado. Ao Jhonny se não fosse sua boa vontade nem a

matrícula teria feito. Obrigado.

Eu quero agradecer meu Filho Raziel por ser um cara que mudou minha vida,

lindo, intenso, dizer que te amo é minimizar muito meus sentimentos por você filho; a

mãe dele também de alguma forma me ensinou bastante coisa.

A senhora Maria do Céu, Xandi e João Henrique essas pessoas estão sempre

comigo

Meu irmão. Ele é astrofísico. (GB)

Antro.

Em especial agradeço ao Prof. (amigo) Antônio Carlos Rafael Barbosa

quaisquer elogios que faça pra ele reduziria a um ser humano e esse cara

transcende a nós meros mortais, palavras como essa estendo a Ana Cláudia, Daniel

Bitter, Ana Lúcia, Débora Broaz, João Resende. Valdeci Ribeiro do Santos quero ser

como você.

Aos amigos Estevão, Kepli (Luiz), Luan Pacheco, Ícaro Marinho e Torres,

Ricardo Gaúcho, Rodrigo esse mano é parceiro, Augusto Fontes, Tarço, aos

apóstolos: João, Thiago a Ruana* (linda), Para os manos Alexandres sabedoria até

o último fio de cabelo. Certificada.

Agradeço ao povo brasileiro norte,centro, sul inteiro onde nasceu o baião…

Ao amigo Rosinha que esteve presente falando as coisas erradas nas horas

certas, obrigado por você ter passado por minha vida.

Agradecer ao Thiago na moral, vulgo Thiago de Castro esse mano me salvou

sem querer quando eu mais precisei. Obrigado. Ao Saara. Mano Pedro SP

Agradeço o Zezinho evitou muitas caminhadas.

Av. Brasil, B2, Morro do Palácio, Cavalão, Grota, Estado, a Penha e sua

gaiola. Dentre outros lugares.

Page 7: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

As pessoas que contribuiram muito pra minha vida ser bacana, Sr. Raimundo

e Francisco. Sueli, Hésio e família. Paulo. Sr. Barriga que não é mole não. A

Princesa Fátima. Roberta ascoltami Ritorna ancor ti prego Con te ogni istante era

felicità. Ao mano Vinícius esse cara me persegue, antes mesmo da UFF ele esteve

próximo.

Aos amigos de MG: Tatu Cú de Frango, Godô, Iris. Betão. D. Divina. Idari pela breve

visita. “Robihud,” netinho e Brexó pela moral.

As putas do passado. Amo vocês todos obrigado.

Page 8: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

EPÍGRAFE

...Larguei minha família, a escola, você sabe

Parei com a maconha, tô usando crack

Tô usando crack

No copo de guaravita eu fico suave

Tô usando crack

A maconha te engorda use crack que é mais light

Tô usando crack

Vou perder os meus amigo, se prostituir faz parte

Tô usando crack

MC Carol

Page 9: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

RESUMO

Este trabalho visa demostrar um renovado e intensificado interesse no

consumo do crack em centros urbanos e nas lavouras de café, essa contribuição

reside certamente em arejar o debate, abrindo-o para pontos de vista mais

complexos e matizados, capazes de desafiar e complementar criticamente os

discursos médicos, farmacológicos, policiais e religiosos que se apropriaram da

legitimidade de discorrer sobre o tema.

Longe de promover uma nova doutrina ou panacéia teórica, produtora de

novos reducionismos e simplificações, seu espírito é o de incorporar perspectivas

que confrontem o conhecimento convencional e questionar verdades impostas por

um senso comum midiático explorado por diversos setores da sociedade.

. Esse é um passo indispensável para a elaboração mais refinada dos

próprios problemas teóricos e práticos que estão em jogo em terreno tão polêmico.

O uso de “drogas” e mais especificamente o crack, como meio laboral.

Page 10: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

ABSTRACT

This paper aims to demonstrate a renewed and intensified interest in the use

of crack in urban centers and coffee plantations. This contribution certainly lies in

opening up the debate, opening it up to more complex and nuanced points of view,

capable of critically challenging and complementing medical, pharmacological, police

and religious discourses that have appropriated the legitimacy of discourse on the

subject. This is an indispensable step towards the more refined elaboration of the

very theoretical and practical problems at stake in such controversial terrain. The use

of "drugs" and more specifically crack, as a working environment

Page 11: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO
Page 12: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................13

2 ESTUDOS EMPÍRICOS...................................................................................16

3 CORPO ABJETO..............................................................................................19

4 CRACK NO CAMPO........................................................................................26

5 A SALIVA NÃO GRUDA, REDUZIR USO OU DANOS?..................................35

6 CONSIDERAÇÕES..........................................................................................38

7 ENTREVISTAS.................................................................................................39

8 CONCLUSÃO...................................................................................................42

9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................45

Page 13: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

13

1. INTRODUÇÃO

Pensando em um trabalho de conclusão de curso, optei por pesquisar o uso

de crack no meio social, público e privado, urbano e rural, em um primeiro momento

nas ruas do grande Rio de Janeiro, e depois - buscando um contraste com esse

local por não estar à vontade com a situação a que usuários eram tratados pelo

Estado e o “Estado paralelo” estabelecido pela criminalidade fluminense - descrevo

o uso nas propriedades produtoras de café na região de Carangola, Caparaó e

Manhuaçu em Minas Gerais. Gostaria de contar o que apreendi durante o período

da pesquisa. O consumo sistemático de um grande conjunto de substâncias

capazes de alterar o comportamento, a consciência e o humor dos seres humanos é

comprovadamente milenar, as ditas “drogas”

Em grego, tókson quer dizer: arco e flecha, e a forma adjetiva toksikons,

assim toksikon pharmacon é veneno pra flecha. Curiosamente, o significado de

pharmacon estendeu-se a toksikon; com o passar do tempo o termo envenenamento

quer dizer intoxicação.

Depois ainda o que é tóxico passou a ser sinônimo de droga. De alguma

forma transformamos em droga tudo aquilo de que fazemos mal uso, seja pela falta

ou excesso. Nosso corpo quando estimulado de forma equivocada pode nos afetar,

como se por uma substância psicoativa ausente em nosso organismo.

A droga está relacionada a sujeira. Na minha pesquisa no meio urbano as

relações são difíceis pois pude perceber que a droga por si não exclui tanto quanto

a sujeira corporal, expondo uma parte de nós, humanos, a outra condição. A fuga

pela não humanidade é um processo doloroso, só com altas doses de dopamina1

para substituir as mazelas sociais que conduz a tal exposição.

1A dopamina é um neurotransmissor importante que participa de funções especificas. Oferece a sensação de bem estar, de prazer e felicidade .

Page 14: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

14

Outra forma de sujeira ou estar sujo é estar envolvido diretamente com uso ou

comércio de drogas ilícitas. E da mesma forma quando se está no meio de usuários

e se aproxima quem não é, ele é o “sujeira”, nesse caso a polícia é “sujo demais”.

Quando decidi escrever o trabalho de conclusão de curso já havia passado

por um processo de desconstrução, havia uma visão errada que a droga só poderia

existir para meios recreativos e em tratamentos médicos e da proibição e

regulamentação.

Mas desde já tento demostrar que um padrão de vida social pode ser

considerado droga, atualmente se fizer uma breve analogia com as fake news2,

estas podem ser consideradas drogas virtuais, que de alguma forma pode perturbar

o que pensamos e desejamos, confundindo nossos sentidos.

Atualmente, nas praças de cidades de médio e grande porte, e nas

metrópoles podemos ver pessoas concentradas com luz direta nos olhos, sem

perceber nada ao redor, cultivando a si mesmo e vivendo por muito tempo fora da

razão.

2Usado para se referir a notícias fabricadas. O termo fake news originou-se nos meios tradicionais decomunicação, mas já se espalhou para mídia online. Este tipo de notícia, encontrada em meios tradicionais,mídias sociais ou sites de notícias falsas, não tem nenhuma base na realidade, mas é apresentado comosendo factualmente correta.

Page 15: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

15

Sobre os usuários do crack, fui percebendo através da pesquisa, que quando

entrei em campo logo aparece uma espécie de “neoevolucionismo”, impondo como

premissas nossas próprias noções de como cuidar do corpo e a própria noção

corporal, construídas ao longo de um processo histórico e civilizador (Elias, 1994) no

qual a própria modernidade foi caracterizada pela entrada do corpo na vida política e

social (Foucault, 1988), e pela ideia de que o corpo pode ser construído, fabricado e

de que as identidades podem ser alteradas e permutadas (Haraway, 2000; Butller,

2003). Ou seja, pelo avesso, tais noções eram constantemente reforçadas.

Nesse plano, estamos falando de substâncias tão diferentescomo a cerveja, o crack, a cocaína, a jurema e o diazepam.“Psicoativo” é um dos termos cunhados para referir àssubstâncias que modificam o estado de consciência, humorou sentimento de quem as usa – modificações essas quepodem variar de um estímulo leve, como o provocado poruma xícara de café, até alterações mais intensas napercepção do tempo, do espaço ou do próprio corpo, comoas que podem ser desencadeadas por alucinógenos vegetais,como a ayahuasca, ou “anfetaminas psicodélicas” sintéticas,como o MDMA, popularmente conhecido como ecstasy. Aolado das significações atuais mais costumeiras de“medicamento” e de “psicoativo”, encontra-se nas línguaseuropéias uma utilização mais antiga do termo para designaringredientes empregados não só na medicina, mas tambémna tinturaria e na culinária, provenientes de terrasestrangeiras distantes, como as especiarias do Oriente e,posteriormente, o açúcar, o chá, o café e o chocolate(Goody, 2001).

Page 16: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

16

2. ESTUDOS EMPÍRICOS

O texto de Marcel Mauss (2003a[1934]) sobre “as técnicas corporais” é

considerado um marco nas reflexões teóricas sobre o corpo nas ciências sociais. Tal

estudo abriu caminhos para autores como Mary Douglas (1978[1970]) e Pierre

Clastres (2003[1973]) chamarem atenção para o problema da corporalidade

equacionado às representações coletivas que envolvem o corpo e que fazem dele o

resultado de uma “construção social”.

No entanto, esses textos têm sido revisados por autores contemporâneos

(Csordas, 2001; Vargas, 2001; Frangella, 2004; Pontes, 2004; Silva, 2004) que os

criticam por mostrar o corpo como superfície onde o mundo social se inscreve.

Segundo eles, esta perspectiva resulta na renúncia de se levar em conta muitos

processos que se desenvolvem com a materialidade dos corpos, mas que nem por

isso são menos simbólicos.

Este é o caso do consumo de “drogas”. E é neste sentido também que

Vargas (2001) considera que o consumo de “drogas” ilícitas a partir do ponto de vista

dos usuários, põe em jogo processos de alteração material e simbólica da

percepção e que envolve o agenciamento de modos singulares de encorporação e

de subjetivação. Em outras palavras, isto equivale a dizer que o consumo de

“drogas” oferece um campo privilegiado para problematizar a partilha entre a

materialidade dos corpos e imaterialidade dos espíritos tão dominante na teoria

social. Empiricamente, optei por realizar o estudo tendo como principal marcador o

recorte de “classe social, estrato ou grupo de status”. Tal opção se deu

especialmente após a leitura de “Nobres e Anjos”, livro de Gilberto Velho.

Já entre os autores que optaram pelo estudo empírico do tráfico de drogas,

também há variações de abordagem. Alba Zaluar (2000), com seu pioneiro “A

máquina e a revolta”, apreende o tema em meio a um quadro mais amplo de

aumento da violência urbana e, por conseguinte, de exposição midiática que visa

criminalizar a pobreza. Em meio a essa proliferação de discursos, a antropóloga

mostra que, quando vistas de bem perto, as categorias bandido, trabalhador,

malandro e mesmo policiais, longe de se mostrarem estanques ou indicarem tipos

sociais e morais específicos – como querem os noticiários –, são, na verdade,

Page 17: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

17

cotidianamente formuladas a partir de oposições e misturas de representações,

valores e condições objetivas que constituem toda uma vida social local. Também o

trabalho de Daniel Hirata (2010) inova ao abordar o tráfico de drogas à luz de sua

correlação com outros tantos ilegalismos populares que, desde há muito, compõem

o rol de ação das populações mais pobres para encontrar meios de “sobreviver na

adversidade”.

O estudo de Antônio Rafael Barbosa (1998), por sua vez, considera que as

temáticas da violência e das criminalidades urbanas não recobrem de todo o

fenômeno do tráfico de drogas. Com isso, o autor propõe que uma etnografia do

tráfico de drogas precisa, antes de tudo, relativizar o que é o crime e a violência (em

vez de tomá-los como dados) e concentrar-se na busca de perspectivas

metodológicas e descritivas que se orientem fundamentalmente pela escuta do que

os atores sociais têm a dizer. Também com relação ao estudo do tráfico não se pode

naturalizar importantes diferenças e desigualdades sociais, mesmo que se admita

sua difusão na cidade. (Carolina Grillo 2008a, 2008b), pesquisando jovens cariocas

de classe média que fazem parte das redes de tráfico de drogas “da pista” (em

contraposição aos “do morro”), revela que “o repúdio ao emprego da violência” é,

nas falas de seus entrevistados, um dos principais elementos diacríticos do tipo de

atividade no qual se engajam – o que, segundo ela, só é possível mediante a

condução de negociações marcadas sob a égide da “amizade”, pela existência de

redes relacionais “pulverizadas”, possibilitadas porque ocorrem sem uma

demarcação territorial. As formas de autorreconhecimento também são significativas

e revelam distinções hierárquicas muito relevantes.

Desse modo, diante de um mesmo marco legal, a desigualdade presente na

sociedade brasileira é fator constitutivo e de suma relevância para apreender

distintas possibilidades de concepção das substâncias, do seu consumo, do seu

tráfico, bem como do rótulo impetrado a seus participantes (inclusive antes e após

qualquer tipificação penal). Mais que isso, ela implica e resulta em modos variados

de aproximação com os diversos níveis de violência aí envolvidos. Diante dessa

brevíssima revisão bibliográfica (parcial, como todas as revisões), expresso o

desafio que me proponho enfrentar: falar do consumo abusivo de crack a partir do já

aprendido, isto é, sem, de um lado, recair em diagnósticos depreciativos ou

Page 18: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

18

generalizantes, considerando a pluralidade de experiências; e de outro lado, tendo

em conta os efeitos reais dos privilégios sociais. Em outras palavras: uma vez

inserido em tal campo de discussão e visando contribuir com ele. Ainda assim,

reconheço a especificidade da minha investigação.

Entre muitas possibilidades de uso e de experiências com drogas,

certamente eu estou olhando para a mais extrema delas, no duplo sentido de uso

intenso da substância e de um tipo de experiência realizada apenas por uma

pequena parcela dentre todos os usuários de drogas, o que me impede de

generalizar o que se passa aí e certamente me deixa ciente de que é a partir deste

lugar que falarei do assunto. Com todos os riscos políticos e analíticos envolvidos

nesta opção, acredito que ao menos ela tem a vantagem de trazer tais temáticas

para o debate antropológico.

Page 19: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

19

3. CORPO ABJETO

Seguindo a perspectiva do corpo abjeto (Taniele Rui 2012) fui direto a avenida

Brasil na altura da passarela número dez, no Parque União, onde os usuários de

crack ficam expostos entre os carros e as obras do BRT Brasil. Fui recebido pelos

usuários de crack que ali se encontravam estabelecidos com pedidos de cigarros e

algo pra se alimentarem . Durante a pesquisa de campo isso era de praxe. Ressalto

que a minha introdução no campo foi direta, sem a participação de nenhum grupo de

redução de danos (Taniele Rui 2012), igreja ou instituição que participam de

elaboração de políticas que atendem essa população de rua.

Através da inserção direta no campo, no Rio de Janeiro, pude receber e

perceber como o espaço geográfico vai se adaptando aos usuários e as políticas

são criadas entre os usuários pertencentes àquele lugar.

Além da Avenida Brasil, fui às obras do programa de aceleração do

crescimento PAC em Manguinhos e Jacarezinho e por último, na região do Grande

Rio, às proximidades da favela Gogo da Ema em Belford Roxo, onde os usuários

estavam se aglomerando num fluxo maior que nos locais anteriores.

Na região metropolitana do Grande Rio, os usuários de crack se aglomeram

perto de favelas que estão sob a tutela moral do Comando Vermelho CV e Amigos

dos Amigos ADA. Apesar de serem distribuidoras de crack em tal região, essas

facções possuem políticas de vendas distintas, elaborada por ordens transmitidas

através de redes estabelecidas rizomaticamente em presídios cariocas (Barbosa,

2012).

Nessa pesquisa quero demostrar a importância do meio social mais próximo,

familiar ou não, para fazer a pessoa se transformar em um usuário de crack, ou em

um “cracudo”, “nóia” ou quaisquer modos pejorativos que a população fluminense,

ou não, trata os usuários de crack que fazem um uso mais radical ou que estão em

situação de morarem em locais insalubres nas ruas de metrópoles.

Page 20: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

20

Se da perspectiva das interações concretas trata-se de uma categoria

bastante plástica; é instigante o fato de que tal plasticidade some quando se fala

publicamente do uso de crack: imediatamente é essa figura que emerge e justifica

todo o aparato repressivo, assistencial, religioso, midiático, sanitário e moral.

Portanto, é o corpo do nóia que radicaliza a alteridade, na medida em que

materializa um tipo social fundado a partir da exclusão (Taniele Rui 2012).

Diferente dos locais ocupados por pessoas em situação de abjeção social,

como a cracolândia em São Paulo, nas visitas que fiz aos locais de concentração de

usuários no Grande Rio, percebi que são exclusivamente usuários de crack.

Em São Paulo basicamente existe uma só facção que distribui a pedra de

crack, o Primeiro Comando da Capital, PCC, facção que iniciou a venda de crack em

grande escala no Brasil. Os funcionários dessa facção se misturam entre os

usuários de crack, tratados pela categoria “noia”, e pessoas em situação de

estabelecidos nas ruas, fazendo desses corpos escudos contra a ação direta das

policias.

A defesa do território não é feita por armas bélicas, mas por corpos que são

usados como armas contra a ação do Estado que atua em desfavor da mercância de

drogas naquele local. Apesar de que são as micropolíticas oriunda dos presídios que

prevalecem nesse contexto social (Foucault 1988).

O PCC se estende através dos “noias”, mesmo que essa categoria seja

desumanizada socialmente, mas membros dessa facção não podem pertencer a

essa categoria. Nesse ambiente de pesquisa urbana percebi que o uso da pedra

de crack é mais coletivo que individual, apesar das pessoas não se reunirem e

marcarem na cracolândia para fumar uma pedra de crack, normalmente..

Nessas observações interagi com usuários em diferentes fases de contato

com o crack, e com outros usuários. As categorias Noia, Cracudos são destinadas

sempre ao outro como forma de adjetivar pejorativamente a pessoa que se encontra

Page 21: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

21

nas mesmas condições sociais daquele espaço geográfico que relato, porém

cracolândia não é um substantivo concreto.

Em meio urbano seja Rio de Janeiro ou São Paulo os usuários de crack com

um contato mais radical com a pedra, estão expostos a generalizações sociais, que

acabam influenciando o modo de vida desse indivíduo. Na ótica do Estado, eles se

transformam em um grupo de corpos em coma social, improdutivos e incapazes de

associar o crack a sua vida cotidiana, imposta por uma sociedade hierarquizada e

excludente (Louis Dumont, 1996).

Nas favelas da região metropolitana do Rio de Janeiro, a defesa do espaço

geográfico é feita por soldados armados das facções, que determinam onde os

usuários podem consumir o crack e até mesmo circular sem a posse do mesmo.

Socialmente o cracudo só incomoda quando circula por ambientes onde ele

não faz parte do contexto. Ou que essa categoria não exista. Em todas as

favelas do Comando Vermelho na grande Rio de Janeiro há a mercância de crack,

mas a categoria cracudo só é enunciada nas comunidades periféricas longe da zona

sul do Rio de Janeiro. Nessa parte da cidade há sim usuários de crack, que por mais

que tenham contato radical com a droga assumem outra postura social na busca por

adquiri-la.

Com postura parecida, os Amigos dos Amigos, ADA, também impõe limites

morais aos cracudos e usuários que residem e circulam por espaços sob sua

jurisdição.

Quando esses corpos se opõem às normas morais, eles podem sofrer

consequências capitais, perda da casa, com expulsão do convivo familiar, e de tudo

aquilo o que constitui socialmente, a perda de suas características e de seu habitus

(Bourdieu 1979).

Dentro da estigmatização do corpo abjeto e pensando as políticas que esses

corpos produzem entre si, cheguei à Avenida Brasil, na altura do Parque União,

Page 22: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

22

conhecido popularmente como P.U. Era terça-feira por volta de dez da manhã,

então me dirigi até o canteiro central, onde estavam um grupo de usuários. Sentei e

abri um maço de cigarros, e antes mesmo de acender um, um usuário me pediu um

cigarro, então se aproximou e começamos a dialogar, isso por alguns minutos.

Então, outro que estava perto, também pediu cigarro.

Os cigarros são usados para a combustão da pedra de crack, ou melhor as

cinzas dele. Que são colocadas sobre um copo de suco, coberto por uma camada

de alumínio. Então com um palito de fósforo ou algo similar fazem micro furos,

depositam as cinzas e pedra sobre elas, e a queima com isqueiro, a pedra vira um

liquido que gruda nas cinzas e em pouco tempo transforma as reações das pessoas.

Como já ressaltei, a minha entrada no campo foi de modo direto sem

intervenção de grupo de auto ajuda, igreja ou instituição filantrópica ou estatal. Isso

me possibilitou ter contato direto e acesso irrestrito às informações dos atores da

cena crack de rua, os usuários de contato radical com a pedra conhecidos como

cracudos. Esta palavra guarda o sentido da junção das palavras crack e imundo.

Designam um grupo de pessoas que fazem trabalhos informais como catar papelão,

latinhas de alumínio dentre outros, e também pequenos delitos patrimoniais. Para

poderem comprar a pedra, percebo que podem fazer quase tudo.

Cracudo é só mais uma categoria, como a destinada a usuários de maconha

a tempos atrás, vista como droga de pobre. O maconheiro por algum tempo foi o

cracudo da sociedade.

No Rio de Janeiro o comando vermelho é o maior distribuidor de crack, e com

toda certeza se só os cracudos fossem o mercado final da pedra a mercância não

existiria, estar em situação de rua não leva o uso da pedra, mas a pedra leva a

constância nas ruas. Se estabelecer próximo de onde há mercância de pedra com

mais facilidade e tentar sobreviver por ali fazem dessa população alvo de

abordagens de todos os tipos.

Page 23: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

23

Tentarei descrever algumas interações que pude presenciar no trabalho de

campo, dos usuários com as agências estatais (polícia e assistência social) ,as

igrejas e os agentes que fazem a mercância da pedra. A venda de crack é feita junto

com qualquer outra substância como maconha, cocaína dentre outras. Mas o

tratamento destinado aos usuários de maconha e cocaína é distinto, na compra de

maconha os usuários podem tocar, sentir o cheiro escolher o tamanho. São tratados

como clientes.

Já quando o usuário é de crack, ele tem que manter uma certa distância da

mesa onde são comercializadas as drogas. Dar o dinheiro e o responsável pela

distribuição entrega a pedra. Ou muitas vezes jogam no chão quando a pessoa se

encontra mais suja ou desagradem simplesmente por estarem ali.

As pessoas que consumem crack naquela comunidade não o podem fazer

nas ruas, como já pude presenciar as pessoas fumando maconha. Vale ressaltar que

alguns deles geralmente não compram a pedra na “loja” mais próxima, por temerem

serem expostos em seu meio social como usuários de crack.

Já para os cracudos, a circulação é totalmente controlada dentro da

comunidade. Somente podem ir até a “loja” mais próxima, ir e voltar rapidamente;

dentro das ruas internas da comunidade a circulação é proibida com pena de serem

espancados e até mesmo mortos com tal descumprimento.

O crack não é a principal causa de morte entre usuários, a violência imposta a

eles, sim, faz vítimas como em toda sociedade, mas muito mais essa população. E a

exposição social deixa características impostas por julgamentos de todos que

passam pela avenida Brasil.

Em paralelo a uma das ruas de acesso á favela da Nova Holanda, no

Complexo da Maré, todos os sábados existe a oferta de serviço por parte de uma

instituição religiosa que atendem a essa população: distribuindo sopa, cortes de

cabelo e convidando algumas pessoas a ingressarem na igreja, oferecendo abrigo e

tratamento contra a dependência do crack. Isso com a supervisão das pessoas que

Page 24: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

24

controlam a área. Não direi o nome dessa Igreja mas afirmo que ela está em todos

os lugares possíveis, como se fosse “universal”.

Muitos que ali estavam oferecendo uma força aos ditos cracudos relatam que

eram como eles, que foi a força de Deus e da igreja que os permitiu se livrarem do

espírito do mal do vício da pedra. A princípio, quando o usuário aceita, ele é

encaminho para uma instituição, nos moldes de uma clínica e passam por um

processo de higienização. Mais tarde, se ele resiste ao desejo de consumir a pedra,

ele é encaminhado para casa, convertido. E o pastor da igreja mais próxima faz a

integração dessa pessoa às atividades da igreja, ocupando o seu tempo quase que

integralmente.

A pedra física deixa de existir e agir, então entra em cena a pedra

psicossocial; o uso agora fica através das palavras como se elas os mantivessem

afastados do uso. A vigilância social é a maior arma contra as recaídas, a exposição

direta na igreja faz com que seguidores possam vigiar seus atos e condutas morais

e éticas.

Os que recaem ao uso e são descobertos passam por uma análise de

conduta e acabam perdendo suas funções dentro da igreja. Um dos fatores que

podem influenciar a aglomeração de usuários nas ruas é a fuga dessa vigilância

social.

Devido as minhas características corporais, pude estar entre os usuários

como se fosse um deles, em um dos dias da pesquisa foi abordado pelo serviço

social e quase fui internado compulsoriamente... Quero deixar claro que ainda não

fiz uso de crack, o que se tivesse feito não me desabonaria em nada em minha vida.

Então, percebi que além do cinza que é o presente daquela paisagem o preto é o

que prevalece, o racismo está instituído em todas as camadas da sociedade.

Depois de explicar que cursava antropologia na Universidade Federal

Fluminense, ainda não acreditaram segurando no meu braço, só depois de me

Page 25: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

25

exaltar, tirar minha carteira do bolso, e mostrar a carteira da universidade fui

liberado.

Isso acontece com base na lei 2967/2017 que institui a internação

compulsória de dependentes químicos no Estado do Rio de Janeiro. Como

justificativa, o consumo de crack. São levados às instituições e albergues em

cidades da região metropolitana. Essas políticas têm como objetivo principal a

limpeza social, não o tratamento contra a dependência das pessoas que se

encontram em situação de rua. Conforme se deixa ver em seu artigo terceiro:

Art. 3º- A Política instituída por esta Lei tem os seguintes objetivos:I- Receber a demanda acerca do dependente químico que, por conta do vício, aparenta perda da capacidade do juízo de realidade e autonomia da vontade;II- Realizar de forma ágil estudo técnico do caso concreto e emitir laudo conclusivo, fundamentado de forma transversal e interdisciplinar, com o objetivo de auxiliar a fundamentação judicial de internação compulsória;III- Promover a qualificação, a capacitação e o acompanhamento de equipe técnica interdisciplinar, responsável pelo atendimento ao dependente químico;IV- Articular os entes públicos para viabilizar a internação involuntária e a compulsória de dependentes químicos que deixaram de dispor de autonomia davontade.

Uma outra intervenção do Estado que é constante é a da polícia militar

causadora de atos de humilhação contra os usuários de crack. Xingamentos e

abordagens ríspidas e truculentas marcam sua ação. Sem nenhum preparo. Isso

acontece porque na maioria das vezes quando essa abordagem acontece é porque

estão à procura de pessoas que cometeram algum delito como se os usuários

fossem os culpados por estarem ali. Uma violação de direitos partindo dos que

deveriam preservá-los em todos os aspectos.

Page 26: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

26

4. CRACK NO CAMPO

Na busca por um comportamento distinto ao encontrado no meio urbano, que

pude visitar durante a pesquisa, onde os corpos não são parcimoniosos e estão

postos na categoria de “abjeto”, encontrei pessoas que encontram outras formas de

usar a pedra de crack no interior de Minas Gerais, na mesorregião de Carangola,

lugar onde o comércio de crack se estabeleceu a pouco tempo.

Assim, pude ter acesso a informações que contribuíram de forma importante,

porque possibilitou um contraste entre aspectos de todos os atores e das relações

sociais dos envolvidos radicalmente com o crack, seja no consumo ou na mercancia.

Assim como sobre o Estado, na figura da polícia militar e também o posicionamento

da sociedade elaborando micropolíticas individuais para lidar com os usuários de

crack, especialmente depois que se torna público o seu contato com a pedra - dos

bastidores ao público (Goffman 2012).

Em uma cidade economicamente agrária basicamente usufruindo se da

monocultura do café, as relações sociais são mais coesas e as pessoas assumem

papéis marcados dentro da estrutura social. Dentro desse contexto das lavouras de

café, dessa região, que demonstrarei como a pedra se integra a economia de

algumas propriedades produtoras de café.

Não existe ninguém no mundo melhor que osselvagens, os camponeses e os provincianospara estudar profundamente e em todos ossentidos os seus próprios afazeres; assim,quando passam do Pensamento ao Fato,podeis encontrar as coisas completas.

Honoré de Balzac Le Cabinetdes antiques Bibl. de la Plêiade vol.

Page 27: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

27

Deste modo, através dessa pesquisa pude encontrar pessoas que não

pertencem a nenhuma categoria imposta socialmente, ou que pertence a várias

categorias. Como algo que vai além do indivíduo, e sua subjetividade.

Nesse contexto não posso falar de crack sem mencionar o desejo que ele

provoca nos usuários e a transformação que esse indivíduo provoca em seu meio

social, assim como sobre nossos processos de subjetivação através da noção de

linhas na esquizoanálise.

Segundo as concepções de Deleuze e Guattari, somos formados por três

tipos de linhas segmentares, duras, maleáveis e de fuga. As linhas duras nos

compõem através de dualidades sociais, que nos fatiam, no sentido forte do termo.

São as grandes divisões na sociedade: rico ou pobre, trabalhador ou vagabundo,

normal ou patológico, homem ou mulher, culto ou inculto, branco ou negro, etc. As

linhas maleáveis possibilitam variações, ocasionando desestratificações e

desterritorializações relativas, e não marcadas divisões

E as linhas de fuga representam desterritorializações absolutas, no sentido

em que rompem totalmente com os limites das estratificações estabelecidas. Para o

entendimento desse processo é importante perceber o corpo e o desejo.

Nesse caso, exponho a abstinência, a fissura como desejo. Apesar do

substantivo ser “crack” (som de quebra), as reações dessa falta ou excesso são

demostradas de formas distintas dea acordo com o meio de uso e perfil dos

usuários. A “fissura” é frequentemente referida como uma necessidade

imprescindível para o corpo, indispensável à vida e descrita como uma vontade “pior

que a fome”.

A abstinência causa grande sofrimento físico e psíquico; o indivíduo é tomado

por grande ansiedade e pensamentos obsessivo sobre as maneiras de obter a

droga, e de alguma forma obter mais produtividade no caso das lavouras.

Page 28: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

28

Para demostrar como isso acontece vou expor como o crack é usado como

meio de aumentar a produção e contrastar a automação agrária em paralelo à

substituição de analgésicos e anti-inflamatórios, por ultrapassarem os limites do

corpo.

Nos territórios em que pesquisei, de fazendeiros e trabalhadores rurais, o

consumo de crack só perde para o do álcool.

A pedra entra na equação como um fenômeno para fazer com que eles

pertençam a um grupo, mesmo que seja o pior diante de um cenário estranho, o

agronegócio. Ela tem forte influência nesse movimento em que as pessoas se

deslocam em busca de trabalho e renda por um período temporário, restritos aos

polos de produção agrária, mas depois retornam à localidade de origem e não

fazem mais o uso do crack. Todavia, há os que não conseguem abandonar o hábito

adquirido no lavor. Esse tipo de migração do vício acaba, portanto, sendo uma

especificidade do setor.

Assim, existe o corpo viciado que já não serve mais para o negócio, já que

alguns hábitos adquiridos por esses corpos não condizem mais com o meio rural,

que prima por algumas regras sociais que excluem corpos em estado de abjeção.

Neste caso, tais sujeitos se deslocam para centros públicos de uso de pedra de

crack, ou, por vezes, passam a frequentar casas de consumo. Casas e lares onde o

dono é usuário e alugam espaços para usuários consumirem a pedra.

Considere-se ainda que a automação agrária, imposta pela industrialização

do campo com objetivo de implementar novas tecnologias aos meios de produção,

expõe o ser humano a níveis de exaustão e trabalho analogicamente aos de

máquinas.

Vejamos o quadro de forma detalhada. O dia de trabalho no campo começa

às seis horas da manhã e termina com o pôr do sol, com poucos momentos de

pausa, até mesmo para se alimentar. O dia começa com a reunião dos

trabalhadores na fazenda. Alguns trabalhadores ficam alojados na propriedade, são

Page 29: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

29

oriundos de cidades do interior do país e também imigrantes, e outros são

transportados por ônibus e caminhões, esses são moradores de cidades próximas

às lavouras. Alguns desses trabalhadores também fazem o uso de motocicletas para

chegarem, e é o modo como a pedra de crack chega até os meios de colheita. No

período da “derriça” há uma grande migração de pessoas que comercializam

“drogas” em busca de usuários nas lavouras, a venda fica condicionada ao trabalho

do “traficante”, por que se ele não contribui com a “derriça” de alguma forma ele não

fará a venda nessa lavoura.

Para demostrar como o comércio de crack se aderiu ao meio de produção nas

lavouras fui observar de forma direta um grupo de trabalhadores que consome crack

e uma pessoa que comercializa a pedra de crack no meio da lavoura,

exclusivamente nesse local. Não posso afirmar se isso é de conhecimento dos

administradores da propriedade, o fato é que o consumo nas lavouras aderiu

econômica e socialmente à produtividade e ao meio rural.

A colheita de café acontece no período entre o outono e inverno, é feita com

as mãos e com máquinas. Os trabalhadores estendem um pano sob a árvore de

café e retiram os grãos de café (Derriça) com auxílio de meias e luvas nas mãos,

então retiram o café do pano estendido derramando os grãos num balaio (60 litros)

geralmente feio de taquara, um tipo de bambu verde. O balaio é a medida que se

aplica ao preço da colheita. Ao iniciar-se a colheita do café, todos os cuidados

devem ser tomados, a fim de preservar a qualidade dos frutos. Uma forma de

colheita largamente utilizada no Brasil é a derriça total no pano.

Devem-se evitar danos excessivos aos ramos e às folhas, não só para

preservar a produção seguinte, como também para evitar ferimentos que constituirão

uma porta de entrada para agentes patogênicos (fungos e bactérias).

Outra forma de se colher o café manualmente é a colheita seletiva que é feita

no pano somente dos frutos cereja. Os frutos verdes serão colhidos mais adiante

quando estiverem maduros. Nesse caso, poderão ser necessárias duas a três

colheitas por planta ou talhão devido à não uniformidade do processo de maturação

do café. Esta é influenciada por diversos fatores como clima, altitude, número de

Page 30: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

30

floradas, adensamento da lavoura, entre outros. Por ser uma operação que

necessita de maior mão de obra, é mais empregada por alguns cafeicultores com o

objetivo de se obter um café superior, uma vez que cereja é a matéria prima

adequada.

A colheita acontece de forma gradual, a cada balaio colhido se paga em

média cinquenta Reais, a contabilidade é feita por um trabalhador incumbido de

anotar e contabilizar quantos balaios de café foram colhidos durante o dia.

A comercialização da pedra de crack nas lavouras acontece da seguinte

forma: o comerciante da pedra chega na lavoura um tempo antes do início da derriça

e esconde as pedras de crack e aguarda os fregueses. As lavouras na zona da mata

mineira se localizam em montanhas, e a distância entre o vendedor e quem quer

comprar é longa, e a comunicação é feita através de palavras ou sons, que fazem as

partes se encontrarem na lavoura.

Tal assunto nos remete ao texto de Franz Boas, “Sobre sons alternantes”,

onde o autor parte de uma patologia auditiva para provar que a percepção também é

determinada pela cultura. Aprendemos a produzir e captar sons a partir de um longo

uso da língua.

A percepção é gerada a partir da semelhança com sons que já se ouviu

anteriormente. O autor define então seu conceito de limiar diferencial, que é o limite

que distingue uma percepção de outra, o que não é um limite preciso. Por isso, duas

sensações sonoras se assemelham mais quando há um grande intervalo de tempo

entre elas, e se a atenção for pouca. Sensação “corresponde a uma certa série de

estímulos ligeiramente diferentes”. Por isso a prática tem uma influência tão grande,

para definir os limites entre tais estímulos. E as novas sensações são sentidas a

partir das já existentes – são classificadas conforme esta semelhança, ainda que

sejam diferentes.

Em acordo no ponto de encontro traçado pelo som, as pedras são

comercializadas pelo preço do balaio colhido ou a metade dele se for pagar em

dinheiro. O balaio de café colhido custa cinquenta reais, e a pedra pode ser paga

pelo balaio de café.

Page 31: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

31

Dessa forma uma pedra de crack pode ser trocada por um balaio de café

colhido, o dinheiro fica em segundo plano, já que os usuários tendem a preferir uma

pedra maior e só precisar usar sua mão de obra para consegui-la. O trabalhador

usuário ao terminar de colher e encher o balaio chama o responsável e mostra o que

colheu e pede para anotar aquele balaio colhido na conta da pessoa que o havia

vendido a pedra de crack. Esse pagamento é feito por dia trabalhado, no fim de

semana, ou se o trabalhador preferir no fim do dia trabalhado. A pedra de crack

diminui o valor da mão de obra do trabalhador pela metade, haja vista que o valor

real financeiro dela é a metade do balaio de café derriçado. Dessa forma, de um

ponto de vista cruel, todos ganham e só um perde, o trabalhador usuário.

Em um caso isolado dos que eu tive conhecimento na pesquisa, numa

propriedade de porte menor, depois que o dono descobriu que a comercialização da

pedra de crack era feita em sua lavoura, ele identificou a pessoa que estava fazendo

a comercialização, e não o proibiu, pedindo que não fizesse a comercialização ou

ameaçando de chamar a polícia. Apenas disse que: “na hora do pagamento

subtrairia dez reais de cada pedra comercializada em sua propriedade” - no

momento da contabilidade em que são apresentados dados sobre a derriça e da

qualidade dos grãos. Sendo que para o comerciante de pedras existem duas

anotações, as que ele fez o escambo de trabalho por pedra, e outra do trabalho de

derriça do mesmo.

O trabalhador que serve como contador de café tem uma atuação discreta no

controle da venda de crack, apesar de não coibir, também não aceita abusos. O

consumo é permitido perante a prática do lavor. Quem não trabalha não pode

consumir a pedra dentro da lavoura. E até mesmo vendê-la, como disse acima

O consumo da pedra de crack nas lavouras está diretamente ligado a

automação industrial agrária. Transformar a agricultura em agroindústria penaliza

diretamente o trabalhador rural, já que sua subsistência está diretamente ligada ao

trabalho no campo. E com o passar do tempo vê suas forças se esvaindo diante de

políticas que penalizam a classe, com a introdução das máquinas que pressionam

os trabalhadores a manterem altas taxas de produtividade. E além disso, manter-se

de alguma forma produzindo, evita que outros rótulos se instalem. Num lugar onde

grande parte das pessoas se conhecem, ser tratado como nóia, cracudo ou algo que

Page 32: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

32

pejora o usuário de crack pode influenciar diretamente o convívio social, dificultando

a forma como vai se socializar. Tal comportamento implica até mesmo na compra do

crack ou qualquer tipo de “droga”.

Volto a insistir nesse ponto. Por se tratar de um espaço geográfico reduzido, a

comercialização fora das lavouras de café é feita de forma discreta, e na maioria das

vezes só no período noturno e, às vezes, dependendo do comerciante, até as vinte e

duas horas.

A lavoura tem esse aspecto social peculiar, o aumento da produção é a

prioridade entre os fazendeiros e trabalhadores, para atingirem metas e garantir

qualidade ao café, não existem limites morais e éticos. Mas mesmo com essa

peculiaridade, não posso afirmar que o comércio de “drogas” na propriedade é feito

de forma delibera pelo proprietário, como também não posso afirmar que o comércio

acontece sem a anuência do mesmo. Em média, numa propriedade de porte médio,

pode haver quatrocentos mil pés de café, com trezentas pessoas trabalhando na

derriça. Em um mesmo lugar pode haver milhares de pés de café e trabalhadores

convivendo e estabelecendo regras de convívio entre eles. Há uma divisão entre os

que usam o alojamento da propriedade e os que vão dormir em casa. Entre os

moradores da região e os que vêm de fora do município e do estado e às vezes até

de fora do Brasil, no caso, imigrantes de países como Haiti e Venezuela, que se

estabeleceram em grandes metrópoles e acabaram migrando para regiões

produtoras de café e açúcar no interior de Minas Gerais e São Paulo.

Pessoas sempre utilizaram “drogas” pelos motivos mais diversos, nas

circunstâncias mais variadas, e não há razões para pensarmos que de repente

viveremos em um mundo sem drogas, principalmente em tempos de abusos e cortes

dos direitos socais dos cidadãos, expondo-os às mazelas impostas por um Estado

que ignora fatores humanísticos inerentes às políticas de ações afirmativas no

campo e nos perímetros urbanos de pequenas e grandes cidades. Cada vez mais o

“negócio” é supervalorizado, seja ele lícito ou não, enquanto a situação de trabalho

e do trabalhador ficam em segundo plano de desenvolvimento, sendo agregada de

forma direta a outros meios de produção, que de alguma forma intervêm na

sociedade, seja no campo ou no meio urbano.

Page 33: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

33

É importante, compreender a interpretação que os corpos dão à experiência

com as “drogas”, e suas ressignificações de seu estado, da motivação que os impele

a um consumo repetido de determinada substância, dos sentidos e razões pelas

quais a consideram importante ou indispensável para satisfação de determinadas

metas e necessidades.

Cito um exemplo que virou notícia na mídia nacional. No final do ano de 2009,

o jogador Jobson estava jogando o fino da bola. Seu time, o Botafogo Futebol e

Regatas da cidade do Rio de Janeiro, estava passando por um momento delicado

no campeonato brasileiro daquele ano e precisava de um jogador que se destacasse

e retirasse o time da situação que se encontrava. Fazendo gols e chamando o jogo

pra si. E Jobson assumiu esse papel.

Ao fim do campeonato, Jobson havia obtido êxito na missão de retirar o

Botafogo da situação em que se encontrava, preste a ser realocado na segunda

divisão do futebol, mas foi pego em dois jogos no exame antidoping. A vinculação do

uso de substâncias para melhorar a performance é uma prática constante no

esporte. No caso do futebol, quando falamos de doping relembramos a copa do

mundo de futebol em que o Brasil foi campeão nos Estados Unidos e nessa mesma

competição o craque argentino Maradona foi pego no exame por uso de cocaína e

foi expulso daquela copa. Uma das imagens marcantes daquela copa foi o agora

“crack” comemorando um gol no jogo em que foi pego no exame antidoping, com

olhos e boca grande como o lobo mal. Aquele que foi um gênio da bola, um craque.

No início do ano seguinte Jobson foi julgado pelo Tribunal de Justiça

Desportiva e surpreendeu a todos quando assumiu que não havia usado cocaína e

sim crack. Jobson foi flagrado duas vezes no exame antidoping, após as partidas do

Botafogo contra o Coritiba e Palmeiras, pelo Campeonato Brasileiro de 2009. Foi

punido preventivamente após a competição nacional. A defesa de Jobson foi calcada

no aspecto social do atleta, que poderia até ser banido do esporte por ter sido

flagrado em dois testes, e os auditores levaram isso em consideração.

O atacante deu apenas um curto depoimento, em que confessou ser usuário

de crack desde 2008. “Usei crack, mas não cocaína. Uso desde 2008, fiz até um

exame antidoping em 2008 pelo Brasiliense e ele não apontou nada. Por isso, nem

Page 34: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

34

sabia que era doping”, afirmou Jobson3, que disse não saber se era ou não viciado e

que nunca comunicou à diretoria do clube de que era usuário.

O crack é capaz de aderir socialmente e correr lado a lado com a vida e se

torna um problema direto quando o uso é revelado por alguma circunstância e não é

aceito. E a pessoa fica no meio da disputa entre o crack e os valores imposto pelo

meio social direto.

3 https://www.terra.com.br/esportes/futebol/estaduais/jobson-admite-uso-de-crack-e-e-suspenso-por-dois-anos,e4385f5cf874d310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html

Page 35: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

35

5. A SALIVA NÃO GRUDA, REDUZIR O USO OU DANOS?

Reduzir danos é controlar efeitos de um problema sem eliminar sua causa.

Aplica-se a diversos eventos, de um desastre natural a crises empresariais,

passando por questões de saúde pública. Foi neste último aspecto que o termo

começou a ser usado. Pensando numa qualidade de vida melhor para as pessoas

com HIV positivo.

Em outra perspectiva na área da saúde são as estratégias para reduzir

malefícios relacionados ao uso de “drogas” lícitas ou ilícitas que provocam

dependência. Nesse, caso as primeiras experiências foram feitas na Inglaterra no

início do século passado, em um período próximo a Grande Guerra.

Soldados tratados com morfina ficaram dependentes de opioides. O programa

começou com a alegação que os soldados desenvolveram o vício na luta pelo seu

país, o argumento foi de que o “Estado tinha obrigação de fornecer a substância

para minimizar os ricos da retirada brusca. Apesar de apelar para o patriotismo,

heróis de guerra, a estratégia não foi aceita por questões culturais. Sem respaldo

esse programa ficou por um período de 50 anos em um plano paralelo”. (Unifesp

Dartiu Xavier)

O conceito começou a ter respaldo quando a “Junkiebond”, uma associação

holandesa chamou atenção na década de oitenta para o alto número de

contaminação de hepatite pelo compartilhamento de seringas contaminadas. Os

danos não ficariam restritos aos usuários de drogas injetáveis, afetariam também a

sociedade como um todo.

Na mesma década houve um seminário em São Paulo, na cidade de Santos,

e um dos desdobramentos desse seminário foi justamente a troca de seringas para

conter a disseminação do HIV. Foi lamentável que apenas na década seguinte, já

nos anos noventa, esse tipo de programa realmente começasse a ser tratado com o

devido respeito aqui no Brasil.

Page 36: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

36

Em se tratando de redução de danos tive contato com um trabalhador rural,

usuário que tentou abandonar o crack sem auxílio de clínicas, terceiros, instituições

estatais ou igrejas.

No primeiro dia, ele saiu e foi trabalhar, e pegou tão pesado que ao chegar

em casa acabou tomando banho, jantando e dormindo.

Ao acordar ele diz que teve uma vontade muito grande de fumar a pedra,

porém o ônibus que o levava junto com outros trabalhadores havia chegado no

ponto marcado de embarque. Ao chegar do trabalho não se conteve e saiu em

busca da pedra, mas não encontrou e acabou comprando maconha. Ao chegar em

casa fissurado foi fazer o cigarro com a erva e começou a fumar quando o cigarro se

abriu e caiu toda a maconha do cigarro. Mas como não consumia “droga alguma há

mais de vinte quatro horas, logo o efeito bateu e ele nem precisou fumar outro.

No outro dia ele fez o mesmo processo, e a maconha caiu toda novamente,

então ele enrolou outro cigarro, foi então que ele começou a perceber que sua saliva

estava muito mais fina ou mais líquida, inconsistente, pelo excesso de uso da pedra

de crack. E por mais que ele mudasse a face do papel ele continuava a não fechar o

cigarro.

Desejando continuar sem fumar o crack, sempre que ele ia fumar maconha

pedia alguém que enrolasse o cigarro pra ele, e isso foi gerando um determinado

estresse. Durante o período de recuperação de sua saliva.

Ele ficou sem usar crack durante um período em que ele tinha maconha, entre

20 e 25 dias. Quando a maconha acabou, ele teve que comprar mais e acabou não

resistindo e comprou crack com o dinheiro da maconha e mais duzentos reais que

havia economizado durante os dias que ele estava longe do consumo de crack. Não

foi trabalhar, ficando fumando a pedra durante dois dias seguidos. Voltando a uma

rotina de consumo intenso novamente. Fumando todos os dias, “fumo todos os dias,

só o dia que o Jhony (traficante) não tem”.

Page 37: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

37

Do ponto de vista individual, a perspectiva da redução de danos aumenta as

possibilidades de autocuidado. Como uma estratégia pensada para ir além do

discurso “pare com tudo”, ou continue com tudo. As estratégias que são adaptáveis

ao indivíduo e que não envolvem abstinência, usam recursos que vão de

comunidades terapêuticas à substituição de uma “droga” psicoativa por outra que

cause menos danos. Lembrando que as iniciativas nessa área, vão do tratamento

individual as políticas públicas. Por exemplo: “Se beber não dirija”,

Page 38: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

38

6. CONSIDERAÇÕES

Quero expor mais dois aspectos que moldam a sociedade e o indivíduo, com

exemplos distintos do uso de crack. O primeiro é quando o uso e usuário de crack se

tornam públicos e por causa dessa exposição o seu meio social se reduz fazendo

com que o indivíduo adquira posturas que vão se afastando das suportadas pela

sociedade de uma cidade pequena.

Além do afastamento, as pessoas passam a esconder seu próprio dinheiro

em suas carteiras ou em bolsos diferentes. Porque o usuário pede dinheiro

emprestado e as pessoas se sentem acuadas e de alguma forma acabavam

“emprestando”. A forma com que se pede o dinheiro às vezes caí no tom de

ameaças, e às vezes são mesmo.

O crack nas pequenas cidades expõe um problema ainda maior que o uso, a

falta de informações ou uso de informações midiáticas falsas colocando os usuários

em uma categoria de “pré-bandido”.

Outro tipo de usuário que identifiquei foi o que teve contato com a cocaína

nos anos 80 e 90 quando o processo de fabricação ainda era artesanal. Quando

ainda estava industrializando o processo de fabricação de cocaína. Os efeitos eram

mais intensos, o processo pra se consumir era distinto dos atuais. Com o passar do

tempo e do uso, ele não encontra mais os efeitos que encontravam com a cocaína, e

no primeiro contato com a pedra de crack, adere, gosta. Os efeitos dele são

“maravilhosos” capaz de substituir coisas insubstituíveis, que se colocam no lugar de

outros tempos. Uma pessoa vende maconha para poder ter a sua maconha sem

custos para usar, acontece também com a cocaína. Mas com o crack essa regra é

quebrada como o som da pedra queimando, que origina o nome da droga.

O crack não é a causa da exclusão, é um elemento a mais, que reforça a

exclusão social, processo que é anterior à droga, no entanto, é reversível.

Page 39: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

39

7. ENTREVISTAS

Eu fiz três perguntas a quatro diferentes pessoas as quais, de forma direta e

indireta, são envolvidas com a pedra de crack e o consumo dela.

Tais pessoas são um trabalhador usuário, que consome crack há cinco anos;

um ex usuário; um policial militar e uma pessoa que conhece usuários e de forma

indireta está presente no meio social da pedra de crack, a quem chamarei de

cidadão.

1 – Qual impacto direto do crack na sua vida?

Usuário:

“Comecei a fumar crack do nada. Um dia o fulano apareceu com a pedra em

casa, eu estava muito cansado e com muita dor no corpo. Eu trabalho com lenha.

Pego toras de madeira com mais de 50 Kg. O óleo4 me ajuda a me recuperar pra

outro dia. Minha mulher não gosta, mas não deixo faltar nada em casa. Aqui quem

não fuma, chera, quem não chera, bebe cachaça. E quem não faz nada disso é

fofoqueiro.

Polícia:

“Na minha direta só que tenho que apreendê-la e tirar de circulação os

traficantes. A pedra de crack não faz mal se ninguém vender. O crack é a pior droga

que eu tenho conhecimento. A pessoa perde tudo que tem. Vira zumbi. Escravo da

droga.”

Ex usuário:

“Agora nenhum. Nem gosto muito de falar sobre isso.” Já fumei demais, você

sabe.

Cidadão:

4 Óleo é como o crack é conhecido entre usuários e traficantes que acham que crack é pejorativo. E também um método de disfarçar o uso.

Page 40: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

40

“As vezes aparece uns ai me pedindo dinheiro, você sabe quem, os mesmos

de sempre, eu vejo gente que vai no mercado compra as coisa na conta e troca pela

maldita pedra. Fulano, nem quer vender mais pra ele mais. Tem um amigo que

chega da lavoura e a primeira coisa é dá uma pedra no trem.

2- Usar crack atrapalha seu trabalho? Por que?

Usuário:

Não. Até hoje não. Porque só me ajuda. È foda ficar pegando peso o dia todo

dói tudo. Mas já faltei uns dia por causa de fuma pedra, mas eu trabalho, não deixo

de trabalhar, não, tenho que pagar as coisa em casa e pensão do meu filho.”

Polícia:

“Não. Eu não uso drogas. Mas os usuários, sim. E principalmente quem

vende. O traficante afeta a sua vida, a vida de todo mundo que mora aqui na cidade,

uma parte das ocorrências acontece por causa da droga. Mais de cinquenta por

cento.”

Ex usuário:

“Sim. Eu achava que não até perder algumas oportunidades de trabalho. Aqui

as pessoas dão moral pra ladrão, mas pra usuário de crack, eles querem que morra,

pras pessoas usuário de crack não come, não bebe, fui tratado igual lixo por muita

gente.”

Cidadão:

“Sim. Tem amigo que fuma essa merda e tão acabado”

3 -Por que você acha que o crack não é aceito na sociedade como as outras

drogas?

Usuário:

“Não sei, o trem é bão demais. Ruim que é caro. Os outros falam mais eu não

devo nada pra ninguém eu compro com meu dinheiro, não roubo pra comprar. O

Page 41: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

41

crack é mal falado por causa dos vagabundo que rouba pra comprar, pra manter seu

vício.”

Polícia:

“O crack é a pior droga pra nós aqui. Como já te disse as ocorrências de

roubo daqui são todas pra comprar droga, e noventa por cento é de crack. Não tem

como aceitar essa desgraça na vida das pessoas. A maconha e o pó ainda dá pra

levar uma vida mais ou menos, a pedra destrói tudo”

Ex usuário:

“Porque as pessoas roubam pra comprar” Se não fosse por conta dessas

coisas seria igual maconha, pinga. Rapaz sujeito tá usando a pedra junto com você,

daí você percebe que sumiu um dinheiro aqui, um rádio ali, ai você vai ver o mesmo

cara que tá fumando com você tá te roubando, e acaba que fumei as minhas coisa

que estavam me roubando. E traficante nem quer saber pega tudo, só não pega a

alma do sujeito. Porque se pegasse já tinha vendido por uma pedra de dez. E

quando fosse pagar pra devolver seria vinte. (Risos)

Cidadão:

Nem pode, né? Você já pensou se do jeito que tá parece que já é liberado.

Alá tá vendo já tão indo fumar a desgraça. Olha a hora meio dia.(Risos) (nesse

momento avistamos pessoas fazendo consumo de pedra embaixo de uma árvore as

margens da BR 116)

Page 42: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

42

8. CONCLUSÃO

O realce no estudo do consumo, a partir de grupos que fazem uso laboral,

recreativo, controlado ou não abusivo de substâncias, visa questionar as ideias

simplistas de que todo usuário de drogas é (ou pode se tornar) um dependente

químico e de que o uso de drogas pode vir a se constituir um problema para

qualquer pessoa que experimente alguma substância, independente da sua

trajetória de uso. Tais estudos mostram a heterogeneidade de modos de se

relacionar com as substâncias, de classificá-las e dialogam fundamentalmente com

modelos médicos de pesquisa, questionam o diagnóstico generalizante acerca

desse uso, assim como a autoridade do campo da medicina em falar sobre o

assunto. Expressam claramente o debate no qual a questão está situada. Para eles.

Assim, os estudos voltados às muitas formas de usos controlados e laborais

ou recreativos enfocam sua discussão na crítica às generalizações de um modelo

médico de pesquisa apressado em conferir diagnósticos e “destinos”. Ou seja, tais

estudos se edificaram na oposição a outra área do conhecimento: as chamadas

ciências da saúde, principalmente a medicina e, mais que tudo, opondo-se ao seu

foco na dependência química (talvez por isso mesmo haja, nessa literatura, lacunas

no que diz respeito ao consumo abusivo de substâncias). Para tanto, orientam suas

investigações focando os modos como os indivíduos usam as substâncias à luz dos

aspectos sócioculturais presentes na experiência.

Apenas pondero que levar a sério o que se chama de contexto sociocultural

supõe considerar relações desiguais e mais ou menos hierárquicas presentes na

sociedade brasileira, do mesmo modo que implica ter em conta a proximidade (ou

não) com as muitas formas de violência aí envolvidas. Pois não se pode esquecer

que tanto o tráfico quanto o consumo de drogas estão encapsulados por uma

política proibicionista atravessada por desigualdades sociais – o que impõe

fronteiras significativas entre os grupos e implica distintos tratamentos jurídicos,

díspares negociações com policiais, e, ainda, diferentes aproximações com o

chamado “mundo do crime” No que diz respeito ao modo como essa desigualdade

se apresenta em relação ao consumo.

Page 43: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

43

Assim, por outros caminhos, cheguei a aspectos que eram relevantes

inclusive aos próprios usuários. E então fiz as pazes com esses escritos e com

minha escolha metodológica. Foi quando eu constatei que, para falar daquilo que

move e toca as pessoas, nem sempre é preciso ficar escarafunchando suas histórias

de vida. Às vezes, é só olhar, com bastante seriedade e respeito, para as relações

que elas estabelecem com outras pessoas, com substâncias, com corpos, com

sensações, com objetos, com instituições, com ideias e com espaços.

Acredito que precisamos encontrar uma via analítica que possa fazer com que

usos tão diferentes sejam igualmente inteligíveis; e não abordar a questão de uma

forma que às vezes parece cair em visões etnocêntricas que julgam alguns usos

como melhores, mais racionais e, portanto, mais justificados que outros.

Chegamos então ao principal problema do desvio: que é o problema de quem

pode ou não, quem tem legitimidade ou não, quem tem segurança ou não de

exercer determinadas formas de interação social. No caso específico das “drogas”,

isto se traduz em quem consome, em qual contexto e de que modo. Nessas

“disputas” classificatórias entre grupos consumidores de “drogas”, o que está em

jogo é também quem detém a possibilidade de vida na “fantasia” ou retirar os

resquícios da dor e a existência da experiência diversificadora, em que o corpo

aparece como a grande porta de entrada.

Há uma tensão constitutiva, principalmente no âmbito das ciências sociais, na

distinção entre problema social e problema teórico, já que o primeiro não

necessariamente se constitui no segundo. Embora não esperemos resolvê-la, tal

tensão pode ser, se tomada de modo absoluto, imobilizadora e pouco produtiva.

Não se pode negar que problemas sociais têm movido a humanidade,

notadamente as ciências sociais, em sua curta história de vinculação às disciplinas

científicas.

Através de diversos referenciais teóricos capazes de distanciar observador e

objeto, os problemas sociais são historicamente contextualizados e

desnaturalizados, o que não deve implicar, em hipótese alguma, a negação de sua

importância enquanto tal.

Page 44: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

44

Não fosse assim, como explicar a importância política e teórica da

contribuição das ciências humanas ao estudo das classes sociais, da identidade

racial ou cultural e das separações de gênero, citando apenas três exemplos entre

dezenas de outros possíveis? A questão das “drogas”, portanto, se estabelece

enquanto um campo de pesquisa não apenas porque se configura num problema

social relevante, mas também porque o fenômeno do consumo sistemático de

substâncias psicoativas vai muito além do contato físico entre indivíduos e

determinadas substâncias.

Page 45: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

45

9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Acselrad, Gilberta (Org.). Avessos do prazer : drogas, Aids e direitos humanos. 2. ed.

Rio de

Janeiro: Fiocruz, 2005.

Baptista, Marcos; CRUZ, Marcelo Santos; MATIAS, Regina (Org.). Drogas e pós-

modernidade.

Rio de Janeiro: EdUERJ, 2003. (2 v.)

Baptista, Marcos; INEM, Clara (Org.). Toxicomanias: abordagem multidisciplinar. Rio

de

Janeiro: NEPAD-UERJ; Sette Letras, 1997.

Barbosa, Antônio Rafael. Um abraço para todos os amigos: algumas considerações

sobre o tráfico de drogas no Rio de Janeiro. Niterói, EDUFF, 1998.

Bastos, Francisco Inácio; GONÇALVES, Odair Dias (Org.). Drogas, é legal um

debate autorizado. Rio de Janeiro: Imago, 1993.

Becker, Howard. “Como se llega a ser fumador de marihuana”. Los extraños:

sociologia de la desviácion. Buenos Aires, Tempo Contemporâneo: 1971 [1963].

________________.“Consciência, poder e efeito da droga”. Uma Teoria da Ação

Coletiva. RJ: Zahar ed, 1977.

_______________. “A Escola de Chicago”. Revista Mana, vol.2, n.2, 1996.

Benchimol, Jaime. Pereira Passos: Um Haussmann tropical. A renovação urbana na

cidade do Rio de Janeiro no início do século XX. Rio de Janeiro: Secretaria

Municipal de Cultura, Turismo e Esporte. Dpto. Geral de Documentação e

Informação Cultural. Divisão de Editoração, 1992.

Page 46: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

46

Benjamin, Walter. Charles Baudelaire: um lírico no auge do capitalismo. São Paulo:

Brasiliense, 2000.

Bourdieu, Pierre. “La démission de l’État”. La misère du monde. Paris. Éditions du

Seuil, 1993. ________________. “Espaço social e espaço simbólico”. Razões

Práticas. Campinas, SP, Papirus, 1996.

_________________. “A ilusão biográfica” in: Amado, Janaína. Ferreira, Marieta M.

Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro. Editora da FGV, 1998.

________________. O Poder Simbólico. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2000.

________________. “O conhecimento pelo corpo”. Meditações Pascalianas. RJ:

Bertrand Brasil, 2001.

Deleuze, Gilles. Presentación de Sacher-Masoch. Lo frio y lo cruel. Amorrortu,

Buenos Aires, 2001.

Escohotado, Antonio. O livro das drogas . São Paulo: Dynamis Editorial, 1997.

Foucault, Michel. História da Loucura. São Paulo, Ed. Perspectiva, 1978.

________________. Isto não é um cachimbo. Rio de Janeiro, Ed. Paz e Terra, 1988.

________________. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro, Ed. Graal, 1990.

________________. História da Sexualidade. Vol. I (A vontade de saber). Rio de

Janeiro, Ed. Graal, 1999 (13ª edição)

________________. O nascimento da clínica. Rio de Janeiro: Forense Universitária,

2004 (6ª edição).

________________. Em defesa da sociedade. SP, Martins Fontes, 2005.

________________. Vigiar e Punir. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009 (37ª edição)

Frangella, Simone Miziara. Capitães do asfalto: a itinerância como construtora da

sociabilidade de meninos e meninas “de rua” em Campinas. Campinas – SP.

Dissertação de Mestrado. IFCH/Unicamp, 1996.

________________. “Fragmentos de corpo e gênero entre meninos e meninas de

rua”. Cadernos Pagu, 14, 2000.

Page 47: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

47

_________________. Corpos urbanos errantes: uma etnografia da corporalidade de

moradores de rua em São Paulo. São Paulo: Anablume, Fapesp, 2009.

Frúgoli Jr, Heitor. São Paulo: espaços públicos e interação social. São Paulo, Marco

Zero, 1995. __________________. “O urbano em questão na antropologia:

interfaces com a sociologia”. Revista de Antropologia, São Paulo, USP, V. 48 Nº 1,

2005.

__________________.Centralidade em São Paulo: trajetórias, conflitos e

negociações na metrópole. SP: edusp, 2006.

__________________. “Roteiro pelo bairro da Luz”. Ponto urbe, ano 2, fev.2008.

__________________e Sklair, Jessica. “O bairro da Luz em São Paulo: questões

antropológicas sobre o fenômeno da gentrification”. Cuadernos de Antropologia

Social, UBA, n.30, 2009. __________________e Aderaldo, Guilhermo. “Abordagens

etnográficas no bairro da Luz (SP): frentes articuladas de investigação”. Paper

apresentado na 27ª. RBA, 2010.

__________________e Spaggiari, Enrico. “Da “cracolândia” aos nóias: percursos

etnográficos no bairro da Luz”. Nau-USP, Ponto Urbe, n.6, 2010.

Grillo, Carolina Christoph. Fazendo o Doze na Pista: um estudo de caso do mercado

ilegal de drogas na classe média. Rio de Janeiro- RJ. Dissertação de Mestrado.

IFCS/ UFRJ, 2008a. ___________________________. “O ‘morro’ e a ‘pista’: um

estudo comparado de dinâmicas do comércio ilegal de drogas”. N.1, vol.1, 2008b.

Grillo, Carolina C. Policarpo, Frederico. Veríssimo, Marcos. A “dura” e o “desenrolo”:

efeitos práticos da Nova Lei de drogas no Rio de Janeiro. Revista de Sociologia e

Política. Vol.19, n.40, 2011.

Grund, Jean-Paul C. Drug use as a social ritual: functionality, symbolism and

determinants of self-regulation. Rotterdam: Institut voor Verslavingsondersoek (IVO),

1993

Hamburger, Esther. “Violência e Pobreza no Cinema Brasileiro Recente: Reflexões

sobre a idéia de espetáculo”. Revista Novos Estudos Cebrap, n.78, 2007.

Page 48: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

48

Haraway, Donna. “Manifesto ciborgue: ciência, tecnologia e feminismo-socialista no

final do século XX”. In: Silva, Tomaz T. (org). Antropologia do ciborgue: as vertigens

do pós-humano. Ed. Autêntica, Belo Horizonte, 2000.

Hirata, Daniel. Sobreviver na Adversidade: entre o mercado e a vida. USP, tese de

doutorado, 2010.

Henman, Anthony; PESSOA JR. (Org.). Diamba sarabamba: coletânea de estudos

brasileiros

sobre a maconha. São Paulo: Ground, 1986.

Labate, Beatriz Caiuby. A reinvenção do uso da ayahuasca nos centros urbanos.

Campinas:

Mercado de Letras, 2004.

Labate, Beatriz Caiuby; GOULART, Sandra Lucia (Org.). O uso ritual das planas de

poder .

Campinas: Mercado de Letras, 2005.

Labate, Beatriz Caiuby; SENA ARAÚJO, Wladimyr (Org.). O uso ritual da ayahuasca.

2. ed.

Campinas: Mercado de Letras, 2004.

Macrae, Edward. Guiado pela Lua . São Paulo: Brasiliense, 1992.

Macrae, Edward; SIMÕES, Júlio Assis. Rodas de fumo: o uso da maconha entre

camadas médias urbanas 2. ed. Salvador: EDUFBA, 2004.

Maria Sabina (Org.). Maconha em debate . São Paulo: Brasiliense, 1985.

Page 49: LUCAS JUSTINIANO ROBERTO - Lucas... · 2020-05-26 · Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Curso de Graduação em Antropologia LUCAS JUSTINIANO

49

Becker, Howard. Les drogues: que sont-elles?. In : BECKER, Howard. Qu’est-ce

qu’une drogue?

Anglet: Atlantica, 2001.

______. Becoming a marihuana user; Marihuana use and social control. In:

Becker,Howard

Outsiders : studies in the sociology of deviance.Londres: Free Press of Glencoe,

1966.

Carneiro, Henrique. Pequena enciclopédia da história das drogas e bebidas

.Rio deJaneiro: Elsevier; Campus, 2005.

Chesnais, J. C. Histoire de la violence . Paris: Éditions de Seuil, 1981.

Coelho, Vera Penteado (Org.). Os alucinógenos e o mundo simbólico

. São Paulo: EPU/ EDUSP, 1976.

Fiore, Mauricio. Uso de drogas

: controvérsias médicas e debate público. São Paulo: Mercado de Letras, 2007.

Goody, Jack. Drogue: um point de vue anthropologique. In: BECKER, Howard.

Qu’est-ce qu’une drogue? Anglet: Atlantica, 2001.

Grass. Direção: Ron Mann. Roteiro: Solomon Vesta. Canadá: Sphinx Productions,

c1999. 1

DVD (80 min), color.

Grund, Jean-Paul C. Drug use as a social ritual: functionality, symbolism and

determinants

of self-regulation Rotterdam: Institut voor Verslavingsondersoek (IVO), 1993.

https://www.youtube.com/watch?v=TmgjMmQDTL4