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8/17/2019 O AVESSO DA POLÍTICA. A CATEGORIA DO POLÍTICO E AS ESTRATÉGIAS DA FINITUDE NA OBRA DE CARL SCHMITT
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIROINSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FILOSOFIADOUTORADO EM FILOSOFIA
O AVESSO DA POLÍTICA. A CATEGORIA DO POLÍTICO E ASESTRATÉGIAS DA FINITUDE NA OBRA DE CARL SCHMITT
DEYVISON RODRIGUES LIMA
Texto para o exame de qualificação de teseapresentado ao Programa de Pós-graduaçãoem Filosofia do Instituto de Filosofia eCiências Sociais da Universidade Federal doRio de Janeiro sob a orientação do Prof. Dr.José Maria Arruda
Linha de pesquisa: Filosofia Política
Rio de Janeiro
Dezembro – 2015
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LISTA DE ABREVIATURA DAS OBRAS DE CARL SCHMITT
Der Begriff des Politischen – BP
Die Diktatur – DD
Ex Captivitate Salus – ECS
Die geistesgeschichtliche Lage des heutigen Parlamentarismus – GLhP
Gesetz und Urteil - GU
Glossarium – GL
Der Hüter der Verfassung – HV
Land und Meer – LM
Legalität und Legitimität – LL
Der Leviathan in der Staatslehre des Thomas Hobbes – LSTH
Das Nomos der Erde – NE
Politischen Romantik – PR
Politische Theologie – PT
Positionen und Begriffe – PuB
Staat, Grossraum, Nomos – SGN
Theorie des Partisan – TPÜber die drei Arten des rechtswissenschaftlichen Denkens – DarD
Verfassungslehre – VL
Verfassungsrechtliche Aufsätze – VA
Volksentscheid und Volksbegehren – VV
Das Zeitalter der Neutralisierungen und Entpolitisierungen – ZNE
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RESUMO
O problema da relação entre racionalidade e ação política, isto é, a possibilidade da
ordem legítima e da unidade da política diante da finitude e da pluralidade do corpo
político constitui o tema central das discussões desta pesquisa. Este problema põe em
questão a relação entre afetos e normas e seus papéis na organização da vida política
concreta. A presente tese tem por objetivo propor uma compreensão des4te problema no
contexto da obra de Carl Schmitt através da reinterpretação de seus argumentos com
ênfase na categoria do político. As principais reivindicações desta pesquisa são: elaborar
um status quaestionis sobre Carl Schmitt; sustentar que o pensamento schmittiano é
orientado pelo argumento da finitude desde o período pré-weimariano até o tardo-weimariano; demonstrar que esta estratégia finitista provoca a tentativa de ruptura da
dicotomia entre transcendência e imanência; e, além disso, apresentar a categoria
schmittiana do político a partir da noção de relação como uma reflexão sobre a
constituição da ordem através dos afetos e antagonismos, portanto, como um monismo e
imanentismo em teoria política. Por fim, após elaborar uma análise crítica das teses
schmittianas, desenvolvemos a categoria do político como abertura através da qual
propomos a efetiva ruptura entre imanência e transcendência ao tratar da diferença entre político e política, isto é, do conflito e da ordem a partir do caráter antagônico como
dado último da ação política.
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SUMÁRIO
Introdução – Sobre o político e a obra política
Capítulo 1 – Interpretação e Política: leituras paradigmáticas sobre Carl Schmitt
1.1. Leo Strauss: diálogo entre conservadores?1.2. A querela sobre a secularização e a teologia política: Erik Peterson e Karl Löwith
1.3. Hasso Hofmann: uma interpretação clássica sobre legitimidade
1.4. Heinrich Meier e o paradigma gnóstico e cristão
1.5. Carl Schmitt: um hegeliano às avessas? A interpretação de Jean-François Kervégan
1.6. A exceção como desafio. A tese de George Schwab ou Carl Schmitt na América
1.7. Carlo Galli: Schmitt e a mediação moderna como problema político
1.8. Carl Schmitt, democracia e liberalismo: John P. McCormick e W. Scheuerman1.9. Chantal Mouffe: o político revisitado e o agonismo de baixa intensidade
1.10. Políticas da amizade de Jacques Derrida
1.11. Do político ao impolítico: a leitura (anti)schmittiana de Roberto Esposito
Intermezzo – Carl Schmitt e as interpretações nazistas
Capítulo 2 – Política entre transcendência e imanência
2.1. O argumento da finitude contra a metafísica política
2.2. Política da transcendência: a mediação racionalista como metafísica política
2.3. Política da exceção: o problema teológico-jurídico como a questão pela ordem
2.4. Política da imanência: os antagonismos do político e a política contra os
antagonismos
Excurso – O pensamento da ordem concreta e a teoria no nomos
Capítulo 3 – Político e abertura: o pathos da contradição e a ruptura da dicotomia
entre imanência e transcendência
3.1. A Destruktion do pensamento político moderno através de Carl Schmitt: a distinção
entre política e político revisitada
3.2. A estratégia pós-fundacional do político: a noção de abertura
3.3. Ação política e antagonismo na pós-política: a noção de hegemonia
3.4. Político como comunidade: ausência e conflito
Conclusão
Referências Bibliográficas
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INTRODUÇÃO
Esta tese surgiu da observação de um problema central em filosofia política:
como pensar o conceito de poder sem reduzir a pluralidade à unidade, excluir o conflito pela ordem ou apelar para um princípio ou fundamento normativo? As dificuldades
encontradas ao tratar da relação entre poder e violência referem-se, em última instância,
à questão do lugar da racionalidade na ação política. Entretanto, a questão de fundo é
como distinguir entre violência e autoridade. O ponto de partida que assumimos nesta
pesquisa trata da discussão da análise da política como instauração do corpo social
através dos afetos (diferença e antagonismos) ao invés de compreendê-la como sistema
de normas ou formas de organização e controle da vida social. Com base na
argumentação schmittiana, esta tese propõe analisar a ruptura ou curto-circuito na
relação entre imanência e transcendência, além de rejeitar a semântica moderna,
sobretudo, a noção de representação e de legitimidade em teoria política. Para isso,
apresentamos as teses de Carl Schmitt como uma tentativa, mesmo não desenvolvida
completamente pelo autor, de elaboração de uma espécie de pós-política ou politica pós-
estatal capaz de servir como potente argumento para as teorias política contemporâneas
por sua crítica à metafísica política e, por exemplo, possibilitar uma narrativa do
político que não despreze a noção de transformação ou conflito.
A compreensão da categoria do político como relação e conflito e, por
conseguinte, como diferença provoca a impossibilidade da articulação transcendente da
ordem: a questão da constituição da ordem reside na finitude e na flutuação dos afetos,
mais especificamente, a partir da leitura de Carl Schmitt, nos antagonismos do corpo
social. Assim, a ordem ou a política teria como impulso inicial não uma fundamentação
normativa ou uma vinculação a um bem ou dever, mas sim um desejo ou afeto, mais
precisamente, um antagonismo. A filosofia política, desde Platão, possui como função
primordial o homoíotes (equilíbrio), isto é, a imunização da pólis contra o perigo da
stasis (subversão). Neste contexto, parece-nos que a política surgiu com base em dois
axiomas: sacrifício dos afetos e homogeneização do corpo político, numa palavra,
imunização contra o conflito. Ao esboçar uma relação entre político e política, Schmitt
parece entrever que se, por um lado, há uma ordem institucionalizada; por outro, há a
ameaça constante da stasis, mesmo com a pretensão de neutralização da ordem. Isto
significa que ao lançar a categoria do político, Schmitt considera que o político é aquela
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relação ineliminável e ininstitucionalizável que a ordem política pressupõe, pois
constitutiva desta, porém, ao mesmo tempo, percebe-se que mesmo ao se retirar ou se
recolher, quando da estabilização normativa, permanece como relação de abertura. A
questão que perseguimos não é a clássica questão entre céu e terra, mas, precisamente,
este entre-tempos, esta relação entre político e política que denominamos de abertura.
Dessa forma, o político nada mais seria do que uma forma de avesso da política: como
um porão de coisas antiquíssimas e não tão belas, o político revela que a origem da
política não é outra senão ela mesma, ou seja, não há bem, justiça ou norma como
fundamento, mas afetos, como diferença e conflito, uma origem sempre presente da
ordem que não se estabelece como bloqueio dos afetos e hipostasiação do político, mas
assume o papel dos múltiplos antagonismos como um papel caracterizado pela
negatividade e perspectivismo na constituição da ordem política mesmo que, haja a
tendência ao enrijecimento e estabilização institucional. Portanto, constitui objeto das
investigações não apenas a diferença e o antagonismo que o político revela, mas a
diferença e o antagonismo entre política e político, ou seja, a diferença enquanto
diferença política.
Nesta pesquisa de tese, trata-se de uma análise da teoria política e social que
não privilegia a compreensão da sociedade como um sistema de normas ou de leis nem
a política como cálculo ou representação através do Estado (soberania, autoridade, etc.).
Trata-se de compreender a política como constituição dos afetos e, sobretudo, como eles
operam ou interditam, possibilitam a transformação ou a estabilidade e o lugar da razão
e da liberdade da ação política nesta arquitetônica política dos afetos. Pretendemos
demonstrar que Carl Schmitt assume a multiplicidade e finitude na constituição da
política e não sua eliminação ou ordenação/hierarquização jurídica. Esta abordagem
significa escapar do caráter normativo dos discursos éticos, da certeza apodítica da
ciência política e, inclusive, das fronteiras entre ciência, filosofia e literatura. Trata-sede uma abordagem indisciplinada em sentido estrito, o que não significa que não tenha
método ou que seja realizada a despeito dos modelos descritivos ou normativos vigentes
nas disciplinas filosóficas.
Assim, elaboramos uma leitura de Schmitt que coloca como ponto cardeal o
problema dos afetos e da diferença enquanto antagonismos ao invés da filosofia política
standart que põe na origem do poder uma forma e unidade como imunização dos afetos
através das normas: trata-se, por isso, de uma teoria que considera a política e o políticocomo relações imanentes e qualquer transcendência (instituição) como algo escavado a
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partir desta imanência, pois apenas como avesso um do outro. Este movimento das
relações e antagonismos não demanda uma mediação, mas uma simples alternância ou
dialética (negativa), pois cada episódio histórico apenas re-marca e de-limita o dentro e
o fora, o equilíbrio e o externo, em termos mais conhecidos, o amigo e o inimigo, como
num jogo de hegemonias: considerar a teoria política por este plano é abdicar de um
discurso sobre a justificação da ordem substancial, uma vez que não é decidida
(deduzida) de uma norma anterior ou instaurada como mera explicitação por uma
dialética entre ser e aparência, infinito e finito, mas sim como relação de conflito
( polémos), cuja medida ou razão não se dá a partir de um ideal ou fundamento. A
questão não é “por que a ordem é válida?”, mas sim “quem domina?”, o que implica
necessariamente relação. A resposta que provoca o curto-circuito no parti pris filosófico
é, segundo Schmitt, dada por um antagonismo imanente à efetividade do mundo (que
denominamos aqui como o das Politische), pois reside nas oposições concretas, no
caráter antagônico da existência como faticidade, ou melhor, como forma de vida, sem
reverter-se num dualismo metafísico ou num positivismo vulgar. Afirma-se, nas
investigações a seguir, a realidade como um continuum, ou seja, o fato último como
relação e, por conseguinte, diferença na imanência e não separação de níveis entre
universal e particular. O político como desconstrução da metafísica aponta para esta
postura monista ou imanentista: qualquer transcendência é da ou na imanência, no
máximo como diferença – ou como propomos no último capítulo, como abertura – uma
vez que se, por um lado, para as teses que se apoiam nas cisões e nos dualismos
metafísicos a ação política é válida apenas quando se refere a um fundamento normativo
nos molde da bipolaridade transcendência-imanência; por outro lado, para a categoria
do político, pensar a transcendência é pensar fora da relação e dos antagonismos, é
pensar, afinal, a ausência de relação e não a relação como ausência de substância como
é proposto. No entanto, Schmitt não se aventura na categoria do político desta forma:
apesar da anomalia do político proposto no período tardo-weimariano, o autor ainda
participa e utiliza as categorias da modernidade. Tentamos apresentar esta pertença ao
realizar o percurso do pensamento schmittiano durante as décadas de 1910 e 1920. A
tese propõe uma chave de leitura para o pensamento político de Schmitt ao elaborar uma
reconstrução dos argumentos da obra schmittiana marcado por 3 momentos: políticas da
transcendência, políticas da exceção, políticas da imanência e, a partir desses, segundo aleitura que propomos, esboça outro paradigma em teoria política que denominamos, por
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fim, como políticas da abertura, estimulado pelo argumento da finitude e pela ruptura
das cisões e dualidades em teoria política. O pensamento de Schmitt considera um
abismo que ele próprio escava demasiadamente fundo entre constituição da ordem e
ordem normativa, ou melhor, entre imanência e transcendência: o golpe desferido
garante-lhe o momento, sem dúvidas a contragosto, do fim da representação moderna e,
por conseguinte, fim da política moderna. Se com Hobbes a modernidade política inicia
com o conceito de representação, ela conhece em Schmitt seu ocaso. Esta concepção do
político como mediação é denominado de políticas da transcendência, pois a face oculta
do conflito escamoteada como negação re-negada pela política, desempenha um
fantasioso fundamento para além, utilizando-se os conceitos de bipolaridade,
mediações, dualismos ou normativismo. A concepção do político como relação, ao
contrário, é uma negação imanente: sem dúvidas, um realismo político – não há nada
além do que essa relação e conflito, diferença – e, por isso, um monismo ou
imanentismo que sempre se refere ao âmbito horizontal e histórico e leva à suspeita o
paradigma moderno da mediação e da representação.
Em muitos aspectos, o jurista tedesco vale-se desta suspeita ou antagonismo
como método de conhecimento: ao utilizar conceitos como ordem, unidade, justiça,
representação, soberania, etc., torna-se necessário indicar, segundo ele, certas escolhas e
recusas, pressupostos e antagonismos que os termos utilizados possuem como se
tivessem uma face oculta, um avesso. Por isso, o título da tese: o avesso da política.
Notemos: neste momento, não se refere à destruição ou crítica da política, mas à
suspeita, isto é, partimos da indicação dada pelo próprio autor ao perceber que a face
oculta das palavras e discursos, instituições e normas se referem a antagonismos
concretos. Esta relação entre a política que nega o conflito ao propor uma ordem e
unidade sem fissuras e o político que, ao contrário, denuncia as rupturas e antagonismos
das relações como constitutivos ainda não recebeu atenção devida pelos intérpretes. Afilosofia política, em geral, ou bem aposta na fratura horizontal do corpo político, ou
bem na absoluta verticalização como garantia do poder e da ordem, ou ainda em uma
solução de mediação normativa ou institucional através de direitos, procedimentos ou
democracia. Enquanto aquela é característica de um realismo político, estas podem ser
classificadas, em geral, como normativistas.
Nesse sentido, antecipamos a seguir algumas hipóteses da pesquisa que
sustentam os argumentos gerais da tese proposta acerca da reconstrução de algunsconceitos da política moderna: (I) no período tardo-weimariano não é a exceção,
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decisão ou sequer a inimizade, mas o que define o político é uma distinção, mais
especificamente, uma relação marcada por um antagonismo. Esta leitura do político
como relação e, por isso, como diferença, é utilizada como desconstrução da metafísica
política (contra as noções de substância ou identidade política) a partir do argumento do
finitismo, entendido com uma reação ou influência das teses neokantianas de Hans
Vaihinger; (II) esta virada finitista ou imanentista que provoca uma desconstrução da
metafísica política, mais especificamente, atinge a noção de representação e, por
conseguinte, a semântica política moderna, uma vez que a representação pressupõe uma
forma (transcendente – de direito) a partir da qual dá unidade e identidade à ordem
política: unidade e identidade não são mais consideradas a partir de algo externo, mas
sim como relação e imanência, no caso, a partir de um afeto mais intenso; (III) a política
e o político são considerados da seguinte forma: enquanto este é atravessado por
conflito; aquele é compreendido como momento hegemônico e, portanto, provisório da
acomodação das forças em conflito, por isso tanto a noção de conflito quanto a noção de
ordem são acessadas sem apelo à transcendência; (IV) há uma ruptura entre imanência e
transcendência: como a origem da política se refere aos afetos e não às normas, a
distinção metafísica entre o corpo político e um fundamento ou princípio normativo não
desempenha nenhum papel, pois os antagonismos do corpo político servem como o
fundamento não normativo que se expressa como uma ausência ou perda, pois sempre
se refere ao outro, à relação destituída de substância: sem metafísica ou teologia
política; (V) o papel da indeterminação e contingência na experiência política expõe o
conflito como ineliminável: a ordem instaurada (política) não abole o conflito (político);
assim, nem mesmo a possibilidade de uma identidade comunitária supre esta ausência
de fundamento: é a relação que determina a constante diferença entre conflito e ordem,
ou seja, considera-se a diferença e movimento numa perspectiva pós-fundacional; (VI) o
corpo social atravessado – ou, se preferir, paradoxalmente fundado pelo conflito – experimenta sua própria indeterminação, isto é, a impossibilidade em última instância
da institucionalização: ao invés de propor uma Vermittlung , propomos através da obra
schmittiana uma teoria política que leva em conta uma permanente Verwandlung contra
a identidade autofundada do poder; (VII) já que não é possível uma mediação
(fundamentação) tampouco seria possível uma autofundamentação: uma pós-política ou
uma política pós-fundacional, em todo caso, uma política pós-estatal é esboçada como
uma movimento pendular entre politica e político: uma abertura da ordem (e não
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fechamento) a partir do antagonismo ineliminável e ininstitucionalizável dessas
instâncias originárias.
Com base nestas hipóteses, inicialmente, propomos uma leitura da obra de Carl
Schmitt como auxílio para solucionar o problema da relação entre finito e infinito em
teoria política: através do argumento do finitismo, ressaltamos a ruptura schmittiana das
políticas da transcendência e da exceção (normativismo e realismo fraco,
respectivamente) e expomos a categoria do político como diferença (realismo forte – o
externo imanente se configura como algo interior e co-instituição na própria identidade,
por isso, relacional e marcada pela ausência de substância); após isso, porém, deixamos
Schmitt mesmo ao apostar com seus conceitos no desenvolvimento da dialética entre
político e política não como escolha de um dos polos (realismos ou normativismo), mas
sim como proposta de superação dos polos: com a política da abertura, o que estava fora
é compreendido como centro e, a rigor, não é mais compreendido como dividido ou
separado, mas como relação ou instâncias co-extensivas, a rigor, como um entre. A
distinção não é entre uma abordagem realista ou monista que descreve fatos ou afetos e
outra abordagem normativista ou dualista que fundamenta a ordem em direitos: nem
absoluto realismo, nem absoluto normativismo, mas como corpo político definido pelo
movimento ou diferença que não privilegia nem a instância da transcendência nem a
instância da imanência, nem fato nem direito, nem mediação nem imediação uma vez
que a política da abertura mostra a relação entre política e político, expõe o déficit
político das teorias políticas. Como não há mediação, mas sempre relação e
antagonismo (diferença), não há apaziguamento ou sacrifício dos afetos na constituição
da ordem, pelo contrário, a stasis é mantida no interior de uma condição pós-política
(leia-se: política pós-estatal ou pós-fundacional) que apresenta um estado hegemônico
sempre suscetível à relação contra-hegemônica, pois o poder político não recebe uma
validade por seus atributos próprios ou substanciais, mas a partir das relações e dosafetos que o constituem: não há poder que não se refira ao conflito, assim como não há
conflito que não remeta à relação e, por conseguinte, à diferença. Assim, contra a
hipótese hobbesiana, por exemplo, segundo a qual, há efetiva despolitização do corpo
social em favor do soberano; Schmitt, após ter elaborado uma defesa do conceito de
representação no final do período weimariano, ataca este conceito ao decretar sub-
repticiamente sua exaustão: se Hobbes abre a história da modernidade política
(mecanismo de representação) já impulsionado pelo processo de imanentização darepresentação – pois representa-se não mais uma ideia, mas o corpo político em uma
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relação interna – pode-se afirmar que Schmitt assume uma postura monista e libera o
político da identidade com o Estado e de conceitos, tais como, validade, legitimidade e
justificação.
A leitura realizada nesta pesquisa procura mais traçar linhas de fugas e
desenvolvimentos a partir do pensamento político de Carl Schmitt do que elaborar uma
exegese dos seus conceitos. A visão de conjunto que, num primeiro momento o leitor
talvez espere encontrar, logo se desfaz: o texto é montado sob o problema já apontado
da relação entre imanência e transcendência ou entre ação e racionalidade. Apesar de
expor as viradas do pensamento schmittiano, propomos uma leitura filosófica e
prospectiva, evitando o mero comentário ou uma abordagem retrospectiva do autor.
Algumas tarefas básicas se somam à proposta de tese, tais como, a reinserção do
pensamento schmittiano no século XX e dos seus efeitos, mesmo que subjacentes, bem
como o esclarecimento das propostas e conceitos, interpretações e movimentos em seu
pensamento, além de, evidentemente, apresentar ao leitor um quadro de interpretações
acerca da obra, tendo em vista a inconsistência ou má consciência de vários intérpretes.
Sobre estes, esperamos que a pesquisa demonstre que eles combatem uma noção de
“exceção”, “soberania” ou “político”, por exemplo, que o próprio Schm itt teria sido o
primeiro a contestar. Atacam por meio de simplificações sem perceber que, na verdade,
suas interpretações desafiam um fantasma. No entanto, se, por um lado, a crítica aborda
ideias inexistentes do autor; por outro, o autor que apresentamos também parece um
fantasma, ou melhor, de tantas matizes e possibilidades expostas a partir de suas
contradições e utilizadas pelas colorações políticas mais diversas, também criamos
nosso autor: por exemplo, dissociamos Carl Schmitt da metafísica e da modernidade
política mesmo que, ao final, perceba-se o parentesco íntimo entre eles e,
necessariamente, tenhamos que abandoná-lo e seguir no percurso que ele indicou. Em
todo caso, demonstramos as escolhas semânticas que a filosofia política realiza vistoque também ela é parcial, oculta seus pressupostos e toma posições e conceitos como
escolhas, no limite, infra-racionais.
Tendo isso em vista, a estrutura deste trabalho reflete tal pretensão: no capítulo
1, realizamos uma reconstrução do estado da pesquisa acerca da obra de Schmitt e
analisamos os comentadores já considerados standarts. O capítulo consiste numa
abordagem das interpretações acerca de Schmitt como uma reconstituição do status
quaestionis. Talvez apenas especialistas tenham paciência de passar a limpo os lancesda recepção de um pensamento, mesmo assim, é importante tal revisão que mais se
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assemelha a uma pequena história de um mal-entendido ou a tentativa de desfazê-lo,
mesmo ao preço de criar outro mal-entendido. A seleção dos autores se deu por
relevância reconhecida nos meios acadêmicos e cada seção possui, por tema, os autores
que dialogam e constroem a obra schmittiana. Em geral, serve como padrão para
delimitar como a obra foi pensada e realçar a interpretação proposta nesta tese.
No capítulo 2, propomos uma leitura de Carl Schmitt, elegendo como central o
tratamento finitista da instauração da ordem entre imanência e transcendência: se a
questão metafísica por excelência pode ser descrita como “por que há ser e não nada?”,
a questão da filosofia política seria “por que há ordem e não o caos?”, porém mesmo
assumindo a questão da ordem como um problema central em Schmitt, percebe-se que o
surgimento desta ordem não é pacífico e refere-se à contingência. Esta questão presente
desde o texto Der Wert des Staates und die Bedeutung des Einzelnen (WSBE ) até
culminar no Der Begriff des Poltiischen ( BP ) é a chave para compreender a relação
entre ser e aparecer que ganha contornos bastante peculiares na filosofia política
schmittiana ao ponto de provocar um ceticismo ou um pragmatismo político e, a partir
da porta deixada entreaberta, possibilitar a exploração dos argumentos apresentados em
meados da década de 1920. Carl Schmitt considera uma tese sobre o político que não
articula mais a ação à essência do Estado ou da política como mediação, mas que visa a
política como tal, isto é, rompe a articulação com a metafísica e com a teologia política
– vinculadas ao argumento da secularização – ao considerar o político como relação e
antagonismo. Esta ruptura da ordem do pensamento político provocou uma primeira
reação nos âmbitos católicos, por isso as acusações de que Schmitt teria adotado no
final da década de 1920 um “imanentismo”, “monismo”, “irracionalismo”,
“existencialismo político”, entre outr os. No entanto, também encontramos problemas
insolúveis nesta proposta, especialmente, a unilateralidade da solução ao paradoxo entre
imanência e transcendência através de um realismo forte que apenas inverte os termosem questão e não percebe a diferença enquanto diferença: não diferença do
antagonismo, mas entre político e política.
O paradigma da mediação racionalista moderna é analisado por Schmitt
inicialmente em WSBE . Neste momento, trata-se de uma reconstrução da forma
concreta vinculada à exigência da Ideia de direito abstrata a partir de um momento da
contingência. A tese do WSBE pode ser exposta na afirmação de que “o direito como
norma pura, possui valor, independentemente de qualquer justificação fática” (WSBE, p. 10). A partir disso, Schmitt desenvolve o problema da relação entre normas de direito
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( Rechtsnorm) e normas de realização do direito ( Rechtsverwirklichung ) com o intuito de
dar conta da legitimação racional do poder. Neste sentido, o direito precede o Estado,
pois este ao se manifestar enquanto poder necessita qualificar-se como legítimo através
da referência àquele, alcançando dessa forma sua justificação ( Rechtfertigung ). Schmitt
propõe o Estado como a instância concreta que possui a tarefa da realização do direito
ao torná-lo efetivo na história. Assim, ele afirma a tese do primado do direito sobre o
Estado ao justificá-lo pela relação com a norma pura que o precede (WSBE, p. 50). Na
fase pré-weimariana, há uma teoria normativa da legitimidade do poder através de um
medium concreto que representa a forma jurídica: afirma-se que “entre cada concreto e
cada abstrato há um abismo insuperável (unüberwindliche Kluft )” (WSBE, p. 80), pois
há originalmente uma ausência de forma e de ordem que só pode ser suprida na
referência à ideia de direito. O Estado é considerado o realizador do direito e possui a
função de mediação entre quaestio facti e quaestio juri, uma vez que é compreendido
estritamente como organização fática da força que carece a priori da autorização da
esfera jurídica, pois “a autoridade do Estado reside não no poder, mas sim no direito,
que o traz e o realiza ( Ausführung )” (WSBE, p. 71).
No entanto, Schmitt lança um argumento que inverte o primado do universal
para o particular: ao investigar a forma da mediação concreta, ele afirma que a tarefa da
realização do direito é possível apenas em uma situação de estabilidade fática da ordem
pública. Ora, neste momento, há a inversão para sua tese exposta em Die Diktatur ( DD)
e, de forma definitiva, em Politische Theologie ( PT ): destruídas as condições fáticas
para a constituição da ordem jurídica, faz-se necessário que o poder pusesse de lado a
medida ideal para intervir na situação desordenada com o intuito de reconstituir a
ordem. Essa transformação inverte o primado do ideal ao real, do universal ao
particular: a instância determinante da ordem jurídica passa a ser concreta, porém, ainda
refere-se à forma abstrata como locus da legitimidade, daí nota-se a estratégia dafinitude em ação mesmo com a ressalva legitimista. Segundo Schmitt, seria necessário
buscar em uma forma concreta o nexo entre particularidade e universalidade que
estariam co-implicados naquilo que se pode denominar de excesso e exceção através da
figura da Souveranität (soberania) como se a imanência necessitasse da referência de
algo além, pois apenas captando a forma abstrata de direito seria legítima. A partir de
então, a decisão estatal que ordena a realidade de modo a possibilitar a
Rechtsverwirklichung joga um papel importante: a instância determinante da ordem jurídica passa a ser concreta, mesmo que se refira ainda à forma abstrata como locus da
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legitimidade. A hipótese da estratégia da finitude é confirmada pela ação guiada por
critérios contextualistas ou particularistas, embora ainda postule a noção do político
como mediação, ou seja, reconheça a estrutura teológico-político como forma jurídica
(representação) que se deve realizar.
Após a elaboração da teoria da Entscheidung nos primeiros escritos, Schmitt
desenvolve a teoria da ditadura perseguindo ainda o problema da mediação
(Vermittlung ). O que está em jogo para Schmitt durante a década de 1910 não é tanto a
resolução do abismo entre quaestio facti e quaestio iuris, mas sim a proposta de uma
mediação que torne possível uma forma concreta e a organização legítima do poder. No
Rahmentheorie schmittiano, não há vinculação necessária entre as esferas do ser e do
dever-ser, sendo a realidade empírica marcada por um desamparo normativo originário,
isto é, pelo domínio da contingência e da não-juridicidade. Entretanto, a justificação da
ordem não se dá a partir da esfera fática – pressuposto – mas apenas da relação ainda
buscada entre normas de direito e normas de realização de direito que, afinal, funciona
como fundamento racionalista, mesmo adotando a decisão como característica do poder.
Denominamos esta estrutura teórica de realismo fraco ou moderado ao apostar em uma
validade ou perspectiva externa da ordem, como se o finito se lançasse continuamente
ao infinito.
A importância do DD é que no texto o pressuposto fático da efetivação do
direito é problematizado e a contingência originária da ordem jurídica é demonstrada,
isto é, transforma a contraposição entre normas de direito (ideal) e normas de realização
de direito (positivas) na oposição entre normas de realização do direito e normas de
ação técnica ( sachtechnische Aktionsregel ). A ditadura é o conceito jurídico que
reconhece uma Aktionskommission: uma autorização limitada para executar aquilo que
for necessário desde que se alcance determinado fim na realidade empírica (DD, p.
XVIII). Dessa argumentação, decorre o paradoxo da exceção segundo o qual para arealização das normas de direito é necessária à ação soberana na realidade empírica que
suspende tais normas para torná-las efetivas depois do reestabelecimento da ordem
fática. O problema da ditadura torna-se o problema da exceção concreta (DD, p. XVII).
A ditadura é uma “comissão de ação determinada pela situação das coisas (Sachlage)”
(DD, p. 134), por isso, a ação do ditador não é determinada por normas de direito, mas
sim pela necessidade imediata que se depara para eliminar a obliteração ao direito.
Nesse ponto, ao invés de relações estritamente jurídicas, tem-se relações políticas, pois já no texto DD, a exceção é um estado do conflito que inviabiliza qualquer esquema
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normativo. Assim, há uma legitimação da autoridade a partir do estabelecimento da
exceção concreta, portanto, justificada por uma grandeza política e não por uma norma.
No DD, é o ditador soberano que encerra a discussão entre direito e poder, porém ainda
em função das normas de direito. Assim, percebe-se o desenvolvimento germinativo de
1914 a 1921 entre legitimidade e poder que dá origem à PT e a sua específica teoria da
soberania revisitada como decisão sobre o estado de exceção.
A tese da PT refere-se à relação que se estabelece entre exceção e norma
através do paradoxo da soberania (Souveräntiät ) que soluciona o problema da
legitimação da ordem através da Rechtsverwirklichung . Nesse contexto, Schmitt elabora
seu conceito de Ausnahmenzustand , isto é, uma situação na qual fático e normativo não
são distintos, tornando-se, entretanto, a condição de possibilidade concreta para a
efetivação da ordem. Utiliza-se a teoria da Ausnahmenzustand na tentativa de
problematizar a mediação provocada pelo racionalismo: ressalta-se o elemento fático ao
inserir o conceito de exceção no interior da ordem jurídica como mediação originária
entre forma jurídica e realidade concreta pelo conceito de Entscheidung (de-cisão) que
se constitui como origem não-jurídica da ordem, como uma decisão pela ordenação do
estado de coisas. A exceção torna-se a condição de possibilidade do direito, pois, seja na
manutenção seja na criação, o soberano estabelece a ordem na qual tem validade
normas, legitimando a posteriori o poder.
Embora haja um primado das configurações fáticas na constituição da ordem
jurídica, tal ação técnica visando o (re)estabelecimento da ordem fática é praticada com
o intuito de tornar possível a ação do Estado naquela relação entre normas de direito e
normas de realização de direito de onde, aliás, adquire sua legitimidade. Por conta desse
último elemento, Schmitt, apesar da ênfase no contexto pragmático, preserva uma
perspectiva normativista em sede de teoria da legitimação do poder, ou seja, a
justificação do poder é efetivada ainda a partir da ideia de direito, mesmo concebendotal ideia vinculada à sua origem não-racional, qual seja, a exceção concreta,
configurando ainda um realismo fraco ao adotar uma validade externa do poder,
mantendo um dualismo em teoria política. O desinflacionamento ocorrerá na fase
posterior quando a questão sobre a legitimidade será considerada a partir da afirmação
do caráter não normativo do poder como determinante do direito por meio das teses do
existencialismo político que, por isso, se caracteriza como uma teoria monista ou
imanentista uma vez que rejeita a separação entre ação e racionalidade (validade): avalidade é dada na própria ação.
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Neste contexto, a tese proposta no Der Begriff des Politische ( BP ) afirma o
político (das Politisch) como uma polemiologia: o antagonismo entre amigo-inimigo
expressa a estrutura original do poder – a oposição e a heterogeneidade de formas de
vida – e apresenta outro critério para a justificação do poder – a diferença ou a
polemicidade. O polémos representa a nova perspectiva através da qual o poder se
articula: normas de direito, normas de realização de direito, normas de ação técnica ou
decisão sobre a exceção não constituem mais a forma de legitimação do poder, mas sim
o político como relação concreta. Portanto, na fase tardo-weimariana, há uma virada na
filosofia do poder que privilegia a problemática imanentista. De modo geral, o
argumento finitista aplicado à reflexão sobre a relação entre poder e normas força
Schmitt a inserir o monismo no seu realismo político: a diferença transcendente perde
sua função legitimadora e, partir de então, a dualidade torna-se diferença na imanência,
ou seja, a referência na constituição da norma é contingente. Nesta pesquisa, analisa-se
a virada existencial no BP e VL como uma reavaliação e abandono do realismo fraco da
teoria da decisão e da representação no DD, PT e RK : se na teoria da exceção, a ordem
possui uma origem concreta, porém submetida à exigência da forma abstrata para ser
legítima; na teoria do político, a ordem se estabelece apenas na relação concreta sem a
exigência da forma, ou melhor, a ordem é constituída de maneira contingencial e nisso
reside sua legitimidade denominada aqui de existencial e a proposição de uma teoria da
ação política dotada de um realismo forte, pois propugna uma validade interna do
poder. Entre universal e particular, Schmitt aposta na seguinte tese: a originariedade
particular da ordem articula sua legitimidade a partir de um ato de vontade entendido
como um fundamento existencial , um afeto, digamos assim, originário que dá a medida
( seinsmäßige Ursprünglichkeit ). Ao invés de analisar a legitimação do poder, ou seja,
sua adequação a algum padrão ou tipo ideal, exige-se investigar se, de fato, existe ou
não existe, pois nenhum procedimento racional ou jurídico pode justificar um fato umavez que “não se pode falar de legitimidade de um poder público (Staatsgewalt ). Um
Estado, isto é, a unidade política de um povo, existe na esfera do político; este, muito
menos, admite uma justificação, juridicidade, legitimidade ( Rechtfertigung,
Rechtmäßigkeit, Legitimität )” (VL, p. 89), ou seja, não é possível uma justificação a
partir de normas, mas apenas a partir do político compreendido não mais como
mediação, conforme a tese da teologia política, mas sim como antagonismos.
Para Schmitt, há uma contiguidade imediata entre existência e legitimidade quedesvela nem tanto um fundamento da ordem como uma instância não racional e
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contingente, mas uma estratégia de fundamentação como ficção. Tal fundamento – se é
adequado utilizar este termo – não está vinculado a formas jurídicas ou procedimentos,
pois “não necessita de justificação ( Rechtfertigung ) em uma norma ética ou jurídica;
tem seu sentido na própria existência política. Uma norma não seria adequada para
fundamentar nada aqui. O específico modo da existência política não necessita nem
pode ser legitimado” (VL, p. 87). A legitimidade é resolvida na qualidade do poder, ou
seja, quanto à existência do poder e, dessa forma, a antítese entre ser e dever-ser
resolve-se em outra: ser ou não-ser. Segundo Schmitt, seria um erro afirmar “o poder é
legítimo”; melhor seria: “o poder é ou não é” ou “existe ou não existe”, pois seu
fundamento de validade é sua existência ou aquela seinsmäßige Ursprünglichkeit que
resolve a distinção entre quaestio iuris e quaestio facti, ressaltando a origem da ordem a
partir desta última, assumindo uma legitimação existencial em detrimento de uma
legitimação racionalista. Entretanto, diagnostica-se a derradeira virada no pensamento
schmittiano quando ele enfatiza uma legitimidade histórica do poder e a co-
originariedade entre fato e norma, entre imanência e transcendência, na tentativa de
afirmar ambos os polos.
A partir da teoria do nomos, Schmitt elabora uma nova estratégia na solução da
teoria da legitimidade moderna: trata-se de demonstrar que não há um modus
intermediário entre norma e fato, nem passagem válida entre as instâncias. A
Nomostheorie radicaliza o movimento do existencialismo político e investiga não uma
mediação, mas a "imediatidade (Unmittelbarkeit ) de uma força jurídica não mediada por
leis (vermittelten Rechtskraft )" ( NE , p. 47). A partir de um acontecimento histórico
constitutivo (ein konstituierendes geschichtliches Ereignis) dá-se um ato de
legitimidade: Schmitt assume a historicidade das práticas sociais como fundamento
concreto de uma ordem, desvencilhando-se das armadilhas do paradoxo
mediação/imediação e fundamentando a legitimidade na ação; nesse sentido, nomosseria o "ato originário que funda o direito (rechtbegründenden Ur-Aktes )" ( NE , p. 16)1.
1 Em sede de teoria da democracia, sobretudo, no período conhecido como konkretes Ordnungsdenken, Schmitt propõe uma democracia sem mediações (unmittelbare Demokratie), ou seja, uma democraciaimediata ou radical na qual a identidade e igualdade do povo seja estabelecida de maneira substancial enão apenas jurídica ou formal: "die Unterscheidung von repräsentativer und unmittelbare Demokratie
beruht darauf, daß der Begriff der Repräsentation noch personalistische Elemente beibehält, während dieunmittelbare Demokratie eine sachliche Identität zu realisieren sucht" p. 28, Der Begriff der modernen
Demokratie in seinem Verhältnis zum Staatsbegriff, pp. 22-28, in PuB. A investigação do problema daimediação torna-se uma preocupação constante em Schmitt, não apenas na estrutura prático-política –
como na formulação de teoria da democracia contra o liberalismo ou a estatalidade moderna – mastambém na estruturação teórico-política – por exemplo, na sua crítica às posturas racionalistas enormativistas que impedem um pensamento político autêntico.
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No entanto, a tese pretende desenvolver a relação originária entre imanência e
transcendência na tentativa de superar a Trennung racionalista e propor um movimento
ou abertura como co-instituição da ordem a partir da diferença enquanto diferença: o
argumento da finitude implica a questão da relação e esta, por sua vez, a categoria do
político que, porém, só ganha sentido ao observar a relação com seu avesso. Dessa
forma, perseguimos este problema da mediatidade/imediatidade em termos de co-
originariedade: a perda da autoridade provocada pelo argumento do político implica na
dissolução da transcendência (entendida aqui como o paradigma teológico-político ou
resolução da secularização) e, por conseguinte, na impossibilidade da fundamentação
moderna do poder (legitimidade ou justificação) via mecanismo de representação:
haveria uma indistinguibilidade entre mediação e imediação, inaugurando outra forma
de abordagem das questões político-jurídicas no qual o fora (transcendência), ao qual o
político como mediação remetia, está agora efetivamente no interior do político como
antagonismo (imanência). A origem da política compreende ainda uma diferença, porém
não transcendência-imanência, mas sim a diferença da relação, como exposição desde a
imanência.
Daí a necessidade do capítulo 3 para compreender que a dialética entre conflito e
ordem não pressupõe uma instância fora de si, mas apenas a origem como um apartar-se
de si ou ausência, ambas através da relação e dos antagonismos dados no corpo social
como diferença: em busca nem tanto de soluções para salvar a teses schmittianas, mas
sim como um desenvolvimento della ulteriorità não autorizados pelo autor e até com
certo requinte e perversão deliberada ao transformar um autor maldito em uma
referência fundamental para o pensamento pós-político contemporâneo. Nesse último
capítulo, exploramos alguns fios soltos da reflexão do jurista e desenvolvemos a partir
da sua posteridade, uma categoria do político que se pretende até certo ponto autônoma
das teses schmittianas, embora reconheça uma íntima filiação: a noção do políticoreinterpretada como abertura, isto é, compreendida como relação, conflito,
ininstitucionalizável, ilimitado, nunca plenamente realizado, pois sempre presente-
ausente, provocador de um achatamento entre imanência e transcendência, pois as
considera como instâncias co-extensivas. Neste contexto, a categoria do político é
pensada no período do fim da estatalidade moderna, desteologizada, dessecularizada,
após a dissolução do racionalismo e da metafísica política, afinal de contas, da
semântica política moderna, inaugurando uma narrativa pós-fundacionista e pós-políticaque encerramos com a noção de comunidade atravessada pela diferença e ausência.
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Em geral, na prática de comentários, encontra-se nada mais do que os
problemas de interpretação do próprio autor e, portanto, limita-se à percepção da
coerência interna do discurso, da pertinência ou consistência dos argumentos já tão bemanalisados por inúmeros scholars. O que distingue esta pesquisa dos demais
comentários acerca da obra do jurista tedesco é, na verdade, o modo de interrogar a obra
como uma questão ainda em processo de construção. A partir de uma leitura filosófica,
acentuamos a centralidade da categoria do político como relação e antagonismo e não
simplesmente como conflito entre amigo e inimigo: esta estratégia se revelou como um
potente argumento na desconstrução da metafísica política, sobretudo, quanto aos
conceitos de Estado, ordem e representação. A partir disso, o percurso desde as primeiras obras até o final da República de Weimar não vem por acaso: partimos da
hipótese de que o itinerário tomado pelo jurista se deve à intensificação do argumento
do finitismo contra a estrutura de mediação racionalista. Esta radicalização altera a
noção do político como mediação para a imediação como constitutiva da ordem. Neste
momento, assumimos a ponta de lança e tomamos a pretensão de “terminar” a virada
imanentista ou finitista em teoria política ao instrumentalizar os conceitos schmittianos
em direção a uma pós-política ou política pós-fundacional compreendida não mais
como imanência, mas como abertura: a abertura do antagonismo político que une e
separa como fronteira, mas também como diferença entre política e político, como um
avesso que é, no final das contas, o mesmo no qual se dá o pensamento da comunidade,
qual seja, como antagonismo, mas também como ausência.
Dessa forma, a perspectiva que se imprime nesta análise não seria a da
releitura, mas sim a da reescrita assumida: não pretendemos banir qualquer
indeterminação da obra ou fixar os limites para a interpretação, embora no segundo
capítulo seja elaborado em grande parte do texto, estritamente, um comentário. Na
verdade, o trabalho consiste em uma modulação e exame crítico do discurso, levando
em conta a distribuição, classificação e organização dos problemas, os planos e valores
pressupostos. Ainda assim, a atividade hermenêutica nesta pesquisa se aproxima mais
da usurpação do que do mero comentário: precisamente, a atenção está voltada não
apenas para aquilo que Schmitt afirma – os argumentos do autor, bem como dos
principais intérpretes, todavia, são devidamente expostos – , mas também para aquilo
que ele não diz: este é o segredo ou arcano da obra, inventado ou não, apresentamos
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Schmitt para além dele mesmo, ou melhor, re-trabalhamos seus conceitos. Um exemplo
típico deste procedimento utilizado na pesquisa pode ser dado pelo seguinte: no BP , o
autor afirma acerca da relação entre amigos e inimigos. Os comentadores repetem
corretamente os critérios do político, inclusive com a denominação que o simplifica
demasiadamente: a “teoria do amigo-inimigo”, alvo de crítica do próprio Schmitt no
prefácio à edição italiana de 1963. Em nossa leitura, deslocamos a ênfase dos polos e
lançamos nosso olhar para a relação e para o antagonismo. Então, ressaltamos a
importância dos afetos na constituição da ordem ao invés da narrativa que se perde na
tentativa de explicar-se diante do adversário que exige regras de comportamento e de
fundamentação da ação. Ao produzir desvios ou linhas de fugas interpretativas deste
tipo, com controle e rigor acadêmico, permite-nos pensar a partir do texto schmittiano
sem se fixar nele: nem dentro nem fora, o que pretendemos é a partir do fim do seu
discurso, no vazio e no não-dito, desdobrando outras fronteiras. Ao invés de reforçar a
já caricatural imagem de Carl Schmitt como um criador de fórmulas brilhantes e
interpretações contraditórias ou episódicas, pretendemos desenvolver as contradições do
seu pensamento: de um normativismo para um realismo que se recusa a enquadrar o
político em um esquema normativo; de uma postura representacionalista e teológico-
política para uma rejeição da transcendência e pós-estatal, de uma exigência de ordem e
de forma para uma ausência de fundamento da ação até afirmar o conflito como
pressuposto do Estado. Estas contradições são buscadas na obra, bem como por quais
percursos e argumentos o autor considerou para as alterações do itinerário.
Estas considerações torna necessária uma explicitação metodológica: a questão
do sentido da obra, ou melhor, o espaço da obra que, em nossa concepção, não tem
como objetivo redescobrir suas origens, mas explorar novos discursos. Neste sentido,
deliberadamente, realizamos uma interpretação heterodoxa com o intuito de levar para a
filosofia política o torvelinho desconstrutivo que já exerceu influência em todos osoutros âmbitos do saber quanto à possibilidade de discussão do objeto da enunciação
como algo positivo. A pretensão da pesquisa não é apenas estabelecer um paradigma de
interpretação da obra de Carl Schmitt, mas, sobretudo, dar vazão ao pensamento de
Schmitt e permitir que seus argumentos ganhem força na criação. O leitor já advertido
do caráter heterodoxo da pesquisa em curso, também pode perceber mais uma
idiossincrasia da escrita que se apresenta: um exercício de buscar na obra schmittiana
instrumentos categoriais para pensar a teoria política. A rigor, no limite, não nosinteressa quem foi ou como viveu, embora alguns dados biográficos sejam
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apresentados, mas o que importa é a tradição ou os intérpretes que se ocupam da obra
como algo a ser consumido ou assimilado: decifrar como Schmitt foi incorporado e de
quais elementos penetraram, talvez sem aviso prévio, na escrita e prática política do
século XX. Para isso, tomamos como paradigmático o procedimento sobre o trabalho da
obra que Claude Lefort nos apresenta.
A pretensão inicial do projeto colocaria dois clássicos da filosofia política
moderna em perfil: Maquiavel e Schmitt. E a partir da discussão em torno da questão
sobre o político que pode ser vista nestes autores, elaborar a tese acerca das políticas da
abertura. No entanto, o tema schmittiano ganhou maior vulto, sobretudo, após a leitura
do importante texto de Claude Lefort sobre Maquiavel. Desta leitura fundamental,
assumimos em parte a estrutura do trabalho e a proposta de elaborar uma interpretação
sobre um autor controverso que ainda carece, apesar de variados esforços, maior volume
crítico. Evidentemente, guardadas as devidas proporções com o pensador francês,
propusemos com esta pesquisa ao mesmo tempo consolidar o status e importância de
Schmitt como pensador político, mas também, como efeito colateral, elaborar uma
interpretação standart sobre o autor que sirva de referência aos estudos sobre sua obra.
A pretensão seria abarcar todo o período do seu vasto pensamento, selecionando os
momentos mais importantes e, sem dar margem à vexata quaestio sobre sua vida, não
tematizar assuntos prosaicos. O que resta, parece-nos, é muito mais uma interpretação
criativa do que a pretensão de retirar o sentido autêntico do pensamento de Schmitt.
A metodologia desta pretensão segue de perto a proposta por Claude Lefort. Segundo o
autor do Le Travail de l’oeuvre Machiavel (Paris: Gallimard, 1986, 2ª edição) para
compreender um pensamento, é necessário compreender o campo que ele instaura, isto
é, a obra e, por isso, torna-se preciso a reconstrução das críticas que ela desperta ou
como ele afirma “J'apprends à lire une oeuvre dans le sillage des autres (...) le dialoge
s’est noué avec les commentateurs et a modifié la relation qu’il avait instaurée avec ele,changé ses questions, il em a tué certaines et fait surgir d’autres, il a déplacé l’objet de
son désir de savoir ” (LEFORT, 1986, p. 24)2. Daí o capítulo inicial de contextualização
das interpretações que a obra schmittiana despertou no discurso crítico: esta seria a
“presença da obra”, como Lefort considera. O pensamento de Schmitt, da mesma forma
2 “Le fait à penser est que je décide, que nul ne décide d'écrire sur une oeuvre du passé sans s'être enquisde ce qui fut écrire sur elle. Le fait est encore que la fréquentation des interprètes ne donne pas seulement
l'occasion de puiser des informations utiles, de faire l'économie de certaines recherches ou s'assurer del'originalité de ses propres théses, mais qu'elle introduit à un debat dont l'enjeu, au fur et à mesure qu'il se précise, fait mieux entrevoir ce que l'oeuvre met en jeu” (LEFORT, 1986, p. 24).
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que o de Maquiavel, abre (mais precisamente, encerra ao esboçar algo novo) um
horizonte de reflexão sobre o político. Para compreendê-lo, é necessário reportar-se ao
trabalho crítico despertado por ele, assumindo ou desdobrando suas teses, mas com a
atenção de que a obra não se encerra sobre si mesma. Adotando este critério lefortiano
metodológico de escrita, demonstramos as diferentes interpretações de Schmitt e como
dizem respeito ao “campo de questão aberto pela obra” como desdobramentos e modos
de interrogar o pensamento schmittiano. Assim, “avec le séjour dans la littérature
critique un pouvoir s'acquiert, une sensibilité riche de nouveaux organes s'éveille dont
l'effet est de multiplier la présence de l'oeuvre au-delà de toute attente, de faire sortir du
discours (...) une variété de mouvements, une profusion de signes imprévisibles”
(LEFORT, 1986, p. 25). Da mesma maneira que Lefort, pretendemos investigar o
campo de trabalho da obra que se faz e refaz continuamente e reverbera a presença da
obra schmittiana no pensamento e experiência política do século XX.
Apesar das alterações de curso, esta pesquisa de doutorado revisita a pesquisa
de dissertação de mestrado, na qual concluímos que o pensamento de Schmitt esboçaria
uma espécie de pragmatismo político caracterizado, sobretudo, pela superação da
relação entre mediação-imediação ao optar pela finitude como lugar do político.
Revisamos em parte alguns resultados daquela tese precoce ao perceber que a opção
pela finitude gera problemas maiores do que a manutenção da dualidade. Reformamos
no Capítulo 2 o debate sobre uma possível – e acreditamos mais acertada – chave de
leitura, certamente para compreensão da obra schmittiana: a estratégias da finitude que
não tinham ainda sido cogitada na pesquisa anterior e que fora de grande valia. A leitura
de Hans Vaihinger, complementando o debate sobre mediação em Kant e Hegel,
mostrou-se fundamental para elaborar esta perspectiva. Este tese interpretativa também
parte de uma pista dada por Schmitt. No texto, Die Lage der europäischen
Rechtswissenschaft , no período do Konkreten Ordnungsdenken, ele afirma que “afilosofia não consiste para mim em um vocabulário de termos, tratado como um sistema
filosófico dado, aplicado a questões jurídicas, mas no desenvolvimento de conceitos
concretos a partir da imanência de um concreto ordenamento jurídico e social” (p. 427).
Nas últimas décadas, o volume de interpretações consagradas à obra e vida de
Carl Schmitt cresceu consideravelmente. A seleção de interpretações aqui elencadas não
pretende ser exaustiva nem reconstituir a imensa quantidade de trabalhos sobre as
questões que envolvem o autor. Neste caso, os autores escolhidos partem de doiscritérios muito simples: em primeiro lugar, as interpretações já clássicas; em segundo
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lugar, as interpretações que abrem espaço para outras interpretações. Pode-se afirmar
que as primeiras são mais “fieis” e as segundas menos “fieis”, porém esta tese, por sinal,
se enquadra no segundo tipo de interpretação, aquele que pretende deliberadamente
errar e ler nas entrelinhas para dizer o que o autor não disse. Assim, como esta tese se
encontra no interior da Renaissence schmittiana das últimas décadas, talvez já na sua
última estação. Parece-nos que resta criar a partir do autor que não existe, esta já não
seria, de partida, uma tese fora do prumo?
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Capítulo 2 – Política entre transcendência e imanência
2.1. Introdução: o argumento da finitude contra a metafísica política
As investigações expostas neste capítulo dizem respeito à tentativa de ruptura
do liame entre imanência e transcendência a partir da categoria do político na obra de
Carl Schmitt. A proposta de leitura é considerar em alguns textos schmittianos, desde o
período pré-weimariano até o período tardo-weimariano, um papel cada vez mais
importante dado à noção de finitude em teoria política. Nesta análise, propomos uma
interpretação da teoria tardo-weimariana como uma teoria finitista, isto é, afirma-se que
as condições de justificação da ação não são exteriores à própria ação (imanentismo),
pois assumem uma validade in re e rejeitam a estrutura política baseada na distinção
metafísica entre ser e aparecer (monismo). Tanto a permanência ou estabilização
(unidade) quanto a separação ou verticalização (transcendência) do poder são criticadas
como uma produção teológico-política a partir da separação entre imanência e
transcendência, ou seja, postulam a validade da ação através de uma instância diferente
do corpo social, negando a autonomia do político ao tentar um enquadramento
normativo da contingência e não considerando o elemento pragmático do político.
Pretendemos demonstrar, ao final, que as dicotomias ordem-desordem, ideal-empírico,validade-faticidade, racionalidade-ação política são consideradas duplicações
desnecessárias e sofrem um processo de achatamento: o poder possui um caráter
relacional e a diferença não é com algo além ou sequer distante, mas imanente, pois o
que concede validade, para utilizar um termo ainda marcado pela semântica política
moderna da relação imanência-transcedência, à ação política não é o fundamento ou
princípio normativo nem mesmo o procedimento formal, legal ou democrático, mas a
relação de antagonismo: o que Schmitt afirma é que as relações de poder só podem sercompreendidas se remetidas à dimensão dos conflitos. O que garante ou constitui o
corpo político? Schmitt afirma com outras palavras e um tanto hesitante: um afeto e não
uma norma. Esta concepção afasta a noção da Trennungsthese entre ser e dever-ser, por
exemplo, e garante à imanência a textura de um continnum, evidentemente, marcado
pelas rupturas e fragmentações dos antagonismos e contradições incessantes, mas sem
referências externas. Este capítulo apresenta uma leitura de como Schmitt desconstroi a
cisão através do argumento do finitismo e, além disso, o que essa escolha implica e
quais as consequência que o próprio autor não assume.
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Para demonstrar esta leitura, apresentamos uma interpretação da solução
schmittiana ao problema da legitimidade através da passagem do seu peculiar
normativismo, sobretudo, no texto Der Wert des Staates und die Bedeutung des
Einzelnen (O valor do Estado e o significado do indivíduo) de 1914 – denominado
como política da transcendência por conta de seu caráter meta-político, isto é, as
condições da validade da ação política são normativas, portanto, são consideradas em
referência externa à ação – para o decisionismo ou, mais especificamente, para o
realismo fraco expresso nos textos Die Diktatur (A ditadura) de 1921, Politische
Theologie (Teologia Política) de 1922 e, de certa forma, no Römischer Katholizismus
und politischer Form (Catolicismo Romano e forma política) de 1923. Neste trabalho,
denominamos esta leituracomo política da exceção, pois a questão da validade da ação
se transforma na relação da ação concreta do soberano, tendo em vista a forma de
direito, representação e constituição da ordem. Neste ponto, o conceito a ser
considerado é o de mediação, pressuposto metafísico que retira a autonomia do político
e assegura, ao mesmo tempo, a articulação entre racionalidade e ação e a cisão entre
transcendência e imanência, determinada pela querela acerca da secularização. Após
isso, demonstramos a compreensão do político como crítica à metafísica e
desconstrução da lógica da representação e da transcendência (considerada como
neutralização ou imunização contra o conflito) da política moderna, bem como a relação
entre político e política e a tese da diferença como antagonismo em Der Begriff des
Politischen (O conceito do político) de 1927-1932 e alguns argumentos colhidos na
Verfassungslehre (Teoria da Constituição). Neste aspecto, a tese reivindica uma
elaboração nova do problema sobre o político: a ênfase não recai nem sobre o amigo
nem sobre o inimigo, mas sobre a relação e o antagonismo constitutivos da ordem e da
política. Os termos “normativismo”, “realismo fraco” e “realismo forte” são utilizados
para apontar os deslocamentos na obra de Schmitt que atribuímos à intensificação dofinitismo. Esta estratégia finitista na relação entre ação política e racionalidade é a chave
de leitura que propomos para compreender a obra schmittiana.
Apesar de parecer trivial, esta interpretação passou despercebida pelos
intérpretes da obra que ressaltam um dos polos. Pretendemos demonstrar que torna-se
mais profícuo não interpretar Schmitt como apenas um teórico da política (ordem) ou do
político (antagonismo), mas compreender a categoria do político como relação e
abertura, afinal, co-instituintes da ordem. No entanto, esta observação funciona comocrítica às teses schmittianas: não haveria apenas a política como representação ou
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mediação e, por conseguinte, como apaziguamento da stasis e constituição da ordem,
nem mesmo apenas o político como relação e antagonismo finitista sem a possibilidade
da estabilização hegemônica; nesta pesquisa, a categoria do político, a despeito do
próprio Schmitt, pode ser interpretada como abertura ou movimento entre política e
político conforme demonstramos no capítulo 3. Isso implica não apenas em abandonar a
opção pela compreensão do político como mediação (transcendência) como
demonstramos que Schmitt realiza no Der Begriff des Politischen, mas também rejeitar
a simples inversão, ou seja, a compreensão do político como relação de conflito
(imanência ou finitismo), pois teria ou bem a forma de um positivismo e de uma
faticidade problemáticos, ou bem uma espécie de finitismo absoluto que faria retornar o
infinitismo no interior da própria finitude, tornando o político absoluto. Da mesma
forma, utilizamos esta chave de leitura para elaborar uma crítica às teses schmittianas e
esboçar o que no capítulo seguinte apresentamos como sendo a política da abertura ou
uma concepção alargada da categoria do político.
A categoria do político apresentada por Schmitt provoca uma paradoxal
intensificação da política uma vez que define toda a realidade em termos políticos, ou
seja, não existe entidade, força ou relação que não seja passível de tornar-se política. Ao
realizar a virada política na tese sobre o pressuposto necessário do político diante do
estatal, Schmitt tem em vista os processos de despolitização e neutralização da política
que possuem a função de excluir o conflito e instaurar ordem: a política moderna surgiu,
então, como antipolítica. Isto significa que a categoria do político não se contrapõe à
política nem mesmo esta pode ser considerada como apolítica ou não-política, pois
seria, mais precisamente, o outro da política, aquilo que não é representado, isto é, o não
pensado ou esquecido por ela: se a política moderna surge como antipolítica – melhor
seria, antipolítico – , pois como um conflito administrável sob a forma da ordem contra o
conflito insustentável da violência anárquica da origem sempre presente, o político nãorejeita o conflito nem nega a política, mas sim considera que não há outra política que a
política mesma, isto é, não há uma realidade ou substrato político fora das relações, mas
sim aponta a realidade imanente como a única realidade, ou seja, não existe fora nem
anti- ou ante-, mas apenas política sem possibilidade da transcendência e, por
conseguinte, o político demonstra sua abertura constitutiva na ruptura da simetria entre
imanência e transcendência ou entre finito e infinito, uma vez que não há ponto de vista
externo ou universal como se pudesse ser conduzido a um fim distinto e diferente de si,tal como uma transcendência ou finalidade externa: é neste momento que faz sentido o
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incômodo ou a anomalia do político, pois enquanto a política não traz no seu discurso a
finitude constitutiva, ou deliberadamente esquece, a categoria do político reafirma a
condição de ausência de fundamento externo, tomando o externo como diferença do
antagonismo. Assim, a categoria do político contradiz não apenas a distinção entre
essência e aparência, mas também os discursos de dualidades ou simetrias ao reinventar
o realismo político uma vez que não há presença de uma substância, natureza ou
essência e, dessa forma, paradoxalmente, coincide com a própria política, sendo apenas
seu avesso: enquanto a política nega o conflito, o político nega esta negação ao
demonstrar seu rasto.
Embora não responda diretamente, a pretensão schmittiana na categoria do
político é sustentar uma leitura da política como algo que trata dos assuntos terrenos e
não se articula com aspirações celestiais ou metafísicas, ou seja, rejeitam-se as
distinções entre políticas da transcendência e metapolíticas ou de qualquer relação entre
céu e terra, assumindo o poder sem pecado. Na tradição do pensamento político,
distingue-se uma via política antigua – desde a concepção agostiniana (patrística)
segundo a qual as sociedades seculares emergem como decorrência do pecado até a
ênfase tomásica na capacidade de compreensão da lei natural pelos homens como base
moral para as repúblicas – e sua versão concebida pelos tomistas que influenciou os
contratualistas modernos como o modo de fazer valer no mundo concreto a lei moral
que todos possuiriam na consciência: este caráter de legalidade e validade da política,
qual seja, uma política de matriz transcendente, mesmo não pressupondo a autoridade
como ordenada diretamente por Deus, afirma que, embora as sociedades políticas sejam
criadas pelos homens, devem fundamentar-se no direito natural; a outra perspectiva, a
via moderna desde Guilherme de Occam e Marsílio de Pádua e, posteriormente,
Maquiavel, rejeita esta estrutura moral para a vida política e defende a ragione di stato
como capacidade de conservação do estado sem apelos à categorias metafísicas, taiscomo consciência moral ou lei natural. Dessa forma, numa arqueologia da categoria do
político desde sua configuração pré-moderna3, afirma-se que a política não pode
transcender a si mesma, não há nada exterior ou uma finalidade transcendente nem uma
lei natural universal a partir da qual se concede autoridade, mas o político seria
considerado como o fim do fim da política, portanto, como uma desconstrução da
metafísica política que, ao contrário, não apenas mostra os limites e separa dentro e
3 A reconstrução das discussões entre via antiga e via moderna é elaborada, entre outros, em SKINNER,2006, capítulo 14.
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fora, mas torna-se limite da política como seu avesso. Ao invés de substância,
dualidade, simetrias, objeto ou sujeito, finalidade ou bem, considera-se relação e
diferença, portanto contra a separação da hipótese gnóstica uma vez que qualquer
transcendência é sempre da ou na imanência o que desfaz a necessidade da separação e
resolve a querela da secularização como um impulso para fora da analogia entre
conceitos teológicos e conceitos político-jurídicos e dá como referencial da ação apenas
a diferença como antagonismo.
Nesta desconstrução da metafísica através do político, há uma negação da
teologia política tradicional como representação ou como conexão entre poder e bem,
entre terra e céu, mas também rejeição da estrutura específica da teologia política
schmittiana. Após atribuir à secularização uma função de transferência entre conteúdo
teológico e conceitos jurídico-políticos, como demonstramos na seção 2.3, bem como
uma teoria genealógica da soberania que articula decisão soberana à coação ordenativa,
poder à ordem ou forma política, mesmo que esvaziada qualquer representação
substancial, Schmitt altera seu pensamento, acentua o papel do finitismo e não repete a
postura da filosofia política moderna de pressupor uma origem ou fundamento pleno
seguido por uma cisão ou crise provocada pela técnica que determinaria a reflexão
nostálgica sobre fundamento perdido ou a realização da forma de direito. Pode-se
afirmar que, segundo Schmitt, numa formulação ainda imprecisa, a essência da política
consistiria em uma falta de essencialidade que não se pode solucionar, pois referente à
relação concreta. Ele assume o político, afinal de contas, como um desfundamento: se
não há queda nem origem, então princípio e precipício são originários, tal como um
descentramento, sem dúvidas, uma desconstrução da lógica moderna, mesmo que
partindo do interior da própria modernidade, como fronteira, como limite do limite ou
avesso da representação. Assim, Schmitt não considera um movimento ou processo
histórico determinado por algo anterior como uma causa, substância ou umaexplicitação da história, ao contrário, analisa a política precisamente naquilo que não é
exposto, como que desocultando seus pressupostos e tomadas de posições, revelando o
parti pris ou as condições especificamente políticas da política: mostra que não é
possível dar a volta por trás e encontrar algo como essência ou fundamento, pois dar a
volta por trás é como dar uma volta em torno de uma mesa já que, após o retorno,
encontra-se no mesmo lugar de antes. A origem seria sempre secundária, ou seja, é não-
origem uma vez que é diferença de si mesma ou, numa formulação mais precisamenteheideggeriana, articulação in/originária daquilo que se origina e como não é possível dar
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a volta por trás para desvelar algo como um fundamento fixo ou origem plena, mas ao
tentar realizar este movimento a reflexão política encontra uma origem não originária,
pois relacional e antagonística, ou seja, percebe que a origem coincide com a não
origem. Schmitt considera que precisamente nisto consiste o político: uma enunciação
da origem (diferença e conflito) que é contemporânea à co-instituição da ordem e, por
isso, apesar de hegemônica, sempre crise-principio, pois mostra não apenas por sua
formação finitista e polêmica o caráter de contingência, mas também a cada tentativa de
tratamento científico experimenta um retrair-se contínuo, não como algo que está fora
ou além, mas sim como um limite ininstitucionalizado, como uma margem ou vazio
exterior (de substância) que a política não determina, mas que é ela mesma enquanto
diferença de si.
A chave interpretativa para este capítulo é resumida no seguinte: tendo em
vista o processo de perda do político como mediação (por exemplo, na estrutura
institucional tanto do capitalismo quanto do socialismo, opções vigentes na década de
1920 que podem ser compreendidos como teorias contra a noção de mediação), Schmitt
teria proposto uma alternativa imanentista como contra-ataque, diante da crise do
moderno, através de um renovado conceito do político que se configura de maneira pós-
política e pós-estatal, superando as neutralizações e despolitizações, inclusive
demonstrando como estas são também modos do político. A secularização teria levado
Schmitt à imanência, portanto, a uma secularização (acabada) que determina uma
liquidação e não apenas transferência da esfera da religião, mesmo que o autor revise
suas teses, sob outro contexto, após os anos 1930. Parece-nos que assim como Hobbes,
no início do pensamento político moderno, já provoca uma ruptura no conceito de
representação, tornando-a como uma estrutura de referência interior/exterior e não
imanente/transcendente; Schmitt, já no ocaso da modernidade, deixa de considerar a
autoridade como matriz transcendente: a virada do político faz com que decisão(exceção) e ordem (excesso) não sejam mais articuladas pela mediação política. A partir
de então, fazendo divergir os planos de imanência e transcendência, Schmitt abandona o
princípio bipolar da mediação católica e propõe o que pode ser denominado de
monismo: a oposição é realocada no nível da imanência, situada na diferença existencial
entre amigos e inimigos que, em todo caso, refere-se à relação e antagonismo do
político que, todavia, a política, a todo custo, tenta relativizar escamoteando conceitos
ou levantando poeira com diferenças metafísicas: o que interessa para compreender o
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político é que a contradição ou oposição, antes entre transcendência e imanência, foi
transferida ao nível da imanência como antagonismo.
O oxímoro da representação da pluralidade, isto é, a afirmação da
ininstitucionalidade ou irrepresentabilidade do político significa, mais precisamente, a
conpeção da política não de forma positiva, tal como um objeto passível de
determinação, mas sim como negatividade, constituindo seu fundo e reverso.
Demonstra-se a impossibilidade de determinação afirmativa do político, bem como a
tentativa de ruptura das simetrias entre transcendência e imanência, tarefa que, segundo
nossa interpretação, Schmitt dá ensejo: o político é o modo da imanência que, mesmo
que se refira à transcendência, compreende esta transcendência (por exemplo, a ordem
jurídica ou unidade política) escavada na imanência: não há fora ou além, pois o vazio
ou ausência de substância do político revoga a possibilidade de uma estabilização ou
ordem compreendida como saída ou externo; para o político, não há transcendência
externa, mas a diferença surge dentro da imanência. No limite impensável, a categoria
do político como relação e antagonismo é terrenal, desliga céu e terra não escolhendo
algum dos elementos, mas assumindo a tarefa de ruptura das dicotomias, ou seja, uma
postura anti-metafísica e anti-teológica, por isso o curto-circuito que dá primado à
noção de relação concreta. Se, por um lado, pensar apenas transcendência significa
pensar a ausência e, portanto, uma metapolítica; então, por outro lado, pensar apenas a
imanência também não se mostra a solução mais adequada: Schmitt, em nossa
interpretação, não escapa da unilateralidade, pois o plano de imanência seria absoluto ou
infinito e, se for este o caso, restaria da mesma forma a identidade metafísica. Dessa
forma, não é o caso de afirmação de um ou outro, mas da diferença como abertura,
como um rasgo que desfaz a dicotomia entre imanência e transcendência que Schmitt,
embora não o afirme explicitamente, pode ser interpretado como relação de
contraposição tornada imanente pela troca da dualidade imanência-transcendência pelade amigo-inimigo com ênfase no momento da relação e do antagonismo.
*
Nesta parte da pesquisa, sustentamos a tese interpretativa de que a escrita de
Carl Schmitt sofre deslocamentos devido à intensificação do argumento da finitude em
teoria política, ou seja, o fio condutor cada vez mais importante que assume a ação na
contingência sem determinações racionais prévias. Dessa forma, propomos 3 momentos
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que podem ser denominados como: política da transcendência (seção 2.2): uma teoria
normativista apoiada na teoria tradicional da legitimidade estatal não positivista; política
da exceção (seção 2.3): um realismo fraco marcado pelos conceitos de exceção e
decisão, mas também pela secularização e mediação; e como políticas da imanência
(seção 2.4): uma ruptura da dicotomia entre imanência e transcendência, tomando
aquela instância como constitutiva da ordem, de maneira distinta da redução do político
ao econômico ou da recusa à qualquer autoridade (transcendência). Esta última análise
é, deliberadamente, uma interpretação não ortodoxa da obra de Schmitt: os intérpretes
consideram que mesmo no período tardo-weimariano ainda persiste a luta contra a
imediação e a referência da forma política ou ideia de direito à noção de representação.
Ao contrário, como se demonstra na última seção deste capítulo, interpretamos este
período como o fim da representação e, por conseguinte, da política moderna através da
proposta de um realismo forte com uma noção de validade in re, pois se refere à relação
e aos arranjos de forças e afetos. O desenvolvimento, porém, será feito apenas no
capitulo 3, ao tratar da pós-política e da proposta de indistinção entre imanência e
transcendência em teoria política, o