o tabaco no rs
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SULFACULDADE DE CINCIAS ECONMICAS
DEPARTAMENTO DE CINCIAS ECONMICAS
RENATA DE LACERDA ANTUNES BORGES
O tabaco no Rio Grande do Sul: anlise da cadeia agroindustrial e dos possveis
impactos das polticas derivadas da Conveno-Quadro para o Controle do Tabaco
sobre a economia fumageira
PORTO ALEGRE - RS2011
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RENATA DE LACERDA ANTUNES BORGES
O tabaco no Rio Grande do Sul: anlise da cadeia agroindustrial e dos possveis
impactos das polticas derivadas da Conveno-Quadro para o Controle do Tabaco
sobre a economia fumageira
Trabalho de concluso submetido aoCurso de Graduao em Economia, daFaculdade de Cincias Econmicas daUFRGS, como quesito parcial paraobteno do ttulo de Bacharel emCincias Econmicas.
Orientador: Prof. Dr. Leonardo Xavier daSilva.
PORTO ALEGRE - RS2011
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RENATA DE LACERDA ANTUNES BORGES
O tabaco no Rio Grande do Sul: anlise da cadeia agroindustrial e dos possveis
impactos das polticas derivadas da Conveno-Quadro para o Controle do Tabaco
sobre a economia fumageira
Trabalho de concluso submetido aoCurso de Graduao em Economia, daFaculdade de Cincias Econmicas daUFRGS, como quesito parcial paraobteno do ttulo de Bacharel emCincias Econmicas.
Orientador: Prof. Dr. Leonardo Xavier da
Silva.
Aprovado em: Porto Alegre, ______ de _____________ de 2011.
____________________________________________________Prof. Dr. Leonardo Xavier da SilvaUniversidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
____________________________________________________Prof. Dr. Paulo Dabdab WaquilUniversidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
____________________________________________________Prof. Dr. Sabino da Silva Porto JniorUniversidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
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AGRADECIMENTOS
Os meus agradecimentos vo para os meus pais, Nelson e Maria, ao meu padrasto,
Nilo, aos meus irmos, Diogo e Thiago, e ao Luam pelo o amparo, pacincia e amor queme dedicam sempre. Agradeo tambm a minha cadela, Vida, que agenta e compartilha
todos os dias as variaes do meu humor. No posso deixar de agradecer s minhas
amigas, Caroline, Cristina e Ktia, pelos anos maravilhosos de convvio e amizade que,
com certeza, fizeram com que o meu aprendizado fosse muito mais agradvel.
Tambm gostaria de agradecer ao professor Leonardo Xavier da Silva por todos os
ensinamentos, cientficos ou no, transmitidos nos dois anos de convivncia, de pesquisa e
elaborao do trabalho de concluso. Aproveito para agradecer a Pr-Reitoria de Pesquisada UFRGS pelo apoio financeiro durante o perodo que fui bolsista. Agradeo, tambm,
aos professores Sabino Porto Jr. e Paulo Waquil por aceitarem participar desse momento
importante da minha formao acadmica.
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RESUMO
O objetivo do trabalho analisar a cadeia agroindustrial do tabaco no estado do Rio
Grande do Sul e os impactos do novo contexto internacional causado pela Conveno-
Quadro para o Controle do Tabaco sobre a economia do fumo gacha. O trabalho usa
como metodologia uma reviso bibliogrfica da literatura acerca das cadeias
agroindustriais e de trabalhos empricos que auxiliam na interpretao histrica do tabaco e
caracteriza sua atual configurao, alm de analisar possveis efeitos de polticas pblicas
sobre o produto da cadeia fumageira. Como resultados da anlise, podemos dizer que as
principais microrregies gachas produtoras do fumo so Santa Cruz do Sul, Pelotas e
Camaqu; a relao entre os agentes produtivos da cadeia do fumo regido por contratos e
pelo Sistema Integrado de Produo, o que gera uma situao de dependncia financeira,
comercial e tecnolgica com as fumageiras; o mercado do fumo oligopsnico;
predomina as empresas de capital estrangeiro; e a produo brasileira de cigarros
destinada ao consumo interno enquanto que a produo de folhas in natura tem como
destino o comrcio externo. Como concluses, os modelos gerados pelas variveis
crdito, produtores e rea plantadamostram que para que se tenha um bom desempenho
das polticas de diversificao de culturas necessrio diminuir essas variveis em pelo
menos 30%, porm os projetos da Embrapa e de Dom Feliciano/RS j em vigor no RioGrande do Sul possuem o potencial de reduzir em, aproximadamente, 2% o volume
produzido de fumo no Estado.
Palavras-chaves: Cadeia agroindustrial. Tabaco. Conveno-Quadro para o Controle doTabaco. Rio Grande do Sul. Economia do fumo.
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ABSTRACT
The objective of this work is to analyze the tobacco agro industrial chain in the
state of Rio Grande do Sul and the impacts of the new international context caused by the
Framework Convention on Tobacco Control on the economics of tobacco in this State. Thepaper uses as methodology a bibliographic review of the literature about the agro industrial
chains and empirical studies that help the historical interpretation of tobacco and
characterizes its present configuration, in addition to examining possible effects of public
policies on the product in the chain. As conclusions, we can say that the main Rio Grande
do Suls regions that producing tobacco are Santa Cruz do Sul, Pelotas and Camaqua; the
relationship between the actors of the chain is governed by contracts and the Integrated
Production System, and that creates a situation of financial and trade dependence with the
industry of the tobacco; the tobacco market is oligopsonic; predominates the foreign capital
companies; and the brazilian production of cigarettes is for the domestic consumption
while the production the tobacco in natura is destined to foreign trade. The models
generated by the variablescredit, producers and planted areashow that to have a good
performance of the policies of diversification crops is necessary to reduce these variables
at least 30%, but the projects from EMBRAPA and Dom Feliciano/RS already in force in
the state of Rio Grande do Sul have the potential to reduce by, approximately, 2% of the
volume produced of tobacco in the state.
Keywords:Agro industrial chain. Tobacco. Framework Convention on Tobacco Control.Rio Grande do Sul. Tobacco economy.
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LISTA DE ILUSTRAES
Figura 1:Esquema das operaes de cadeias de produo agroindustrial. .......................... 6
Figura 2: Emprego de defensivos em culturas selecionadas Brasil 2006 (kg deingrediente ativo por hectare) .............................................................................................. 24
Figura 3: Distribuio da ocupao fundiria da propriedade rural fumicultora sul-
brasileira (% da rea total). .................................................................................................. 25
Figura 4: Mercados compradores do tabaco produzido no sul do Brasil 2010 (% do
volume total exportado). ...................................................................................................... 34
Figura 5:Consumo per capita mundial de cigarros2010................................................ 35
Figura 6:Cadeia Agroindustrial do Tabaco ....................................................................... 37
Figura 7:Polticas pblicas direcionadas para a Agricultura Familiar que colaboram com o
Programa Nacional de Diversificao em reas cultivadas com tabaco. ............................ 49
Grfico1: Evoluo das reas plantadas e colhidas do estado do Rio Grande do Sul1999
a 2009. ................................................................................................................................. 18
Grfico 2:Evoluo do nmero de famlias produtoras de fumo no sul do Brasil (1999-
2010). ................................................................................................................................... 27
Grfico 3:Correlograma dos resduos ao quadrado do Modelo 5...................................... 82
Grfico 4:Histograma dos resduos do Modelo 5. ............................................................. 82
Grfico 5:Plotagem dos resduos do Modelo 5. ................................................................ 83
Grfico 6:Correlograma dos resduos ao quadrado do Modelo 7...................................... 83
Grfico 7:Histograma dos resduos do Modelo 7. ............................................................. 83
Grfico 8: Plotagem dos resduos do Modelo 7. ................................................................ 84
Grfico 9:Correlograma dos resduos ao quadrado do Modelo 9...................................... 84
Grfico 10:Histograma dos resduos do Modelo 9. ........................................................... 84
Grfico 11: Plotagem dos resduos do Modelo 9. .............................................................. 85
Quadro 1:Tipos de agrotxicos e pragas que controlam. .................................................. 21
Quadro 2:Agrotxicos liberados para a cultura do fumo no Brasil2005. ..................... 21
Quadro 3:Principais mquinas e equipamentos utilizados no cultivo de fumo. ............... 23
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Produo Agrcola de Santa Cruz em 1864. ....................................................... 15
Tabela 2:Ranking de 2009 dos dez maiores municpios produtores de fumo, sua produo
e a microrregio que pertencem........................................................................................... 18
Tabela 3:Rendimento mdio (kg/ha) da produo de tabaco no Estado do Rio Grande do
Sul1999 a 2009. ............................................................................................................... 18
Tabela 4:Produtos qumicos utilizados no cultivo do fumo no municpio de Santa Cruz do
Sul em 2009 e sua frequncia. ............................................................................................. 22
Tabela 5:Produo de propriedades fumicultoras no sul do Brasil. .................................. 26
Tabela 6:Evoluo da produo do tabaco no estado do Rio Grande do Sul2000 a 2009.
............................................................................................................................................. 31
Tabela 7: Produo e Consumo de Cigarros no Brasil - 20072009 ................................ 36
Tabela 8:Tabela resumo das aes das Partes da CQCT sobre o combate ao tabagismo
passivo. ................................................................................................................................ 41
Tabela 9:Ranking dos maiores produtores e exportadores mundiais de tabaco da safra
2008/2009. ........................................................................................................................... 53
Tabela 10: Sries temporais completas do volume (t), crdito (capital, em Reais),
produtores (famlias produtoras) e rea plantada (hectares) de 1985 a 2010. ..................... 65
Tabela 11:Resultados dos testes bsicos para a validao do modelo de regresso. ........ 68
Tabela 12: Dados para produtores, rea plantada, capital e volume no ano de 2009;
simulaes de baixas de 10 a 50% dessas variveis; e os resultados de volume produzido
gerados pelos modelos 5, 7 e 9. ........................................................................................... 69
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SUMRIO
RESUMO
ABSTRACT
LISTA DE ILUSTRAES
LISTA DE TABELAS
INTRODUO ................................................................................................................... 1
APRESENTAO E APLICAES DO CONCEITO DE CADEIASAGROINDUSTRIAIS ......................................................................................................... 4
2.1 Cadeias Agroindustriais .......................................................................................... 42.2 Evidncias empricas de anlise quantitativa de cadeias produtivas da economia...... 7
A CULTURA DO FUMO ................................................................................................. 10
3.1 Histrico da produo do fumo ............................................................................ 10
3.2 Principais regies produtoras de fumo no estado do Rio Grande do Sul (RS) ..... 173.3 Estrutura da cadeia do tabaco brasileira ............................................................... 19
3.3.1 Fornecedores de fatores e insumos ................................................................ 193.3.2 Fumicultores .................................................................................................. 243.3.3 Indstria fumageira: usinas de beneficiamento ............................................. 283.3.4 Indstria de cigarros ...................................................................................... 323.3.5 Mercado consumidor do tabaco em folha e seus derivados e Importao decigarros ........................................................................................................................33
CONVENO-QUADRO PARA O CONTROLE DO TABACO ............................... 38
4.1 Discusses anteriores Conveno-Quadro para o Controle do Tabaco .................. 384.2 Caracterizao e as Aes Pblicas das partes para a introduo dos artigos daConveno-Quadro para o Controle do Tabaco .............................................................. 404.3 Polticas administrativas e legislativas do Brasil para a introduo da CQCT no pas......................................................................................................................................... 45
POLTICAS DE COMBATE AO TABACO E SEUS IMPACTOS SOBRE ACADEIA DO TABACO .................................................................................................... 48
5.1 Projetos para Diversificao das reas com tabaco no Rio Grande do Sul .......... 485.2 Situao atual das polticas de diversificao de culturas no Mundo ................... 53
5.2.1 Argentina ............................................................................................................ 545.2.2 China .............................................................................................................. 555.2.3 Estados Unidos da Amrica ........................................................................... 565.2.4 ndia ............................................................................................................... 575.2.5 Indonsia ........................................................................................................ 595.2.6 Itlia ............................................................................................................... 605.2.7 Malawi ........................................................................................................... 605.2.8 Turquia .......................................................................................................... 615.2.9 Zimbbue ....................................................................................................... 62
5.3 Possveis impactos da CQCT sobre a produo de tabaco no Rio Grande do Sul:uma abordagem baseada em modelos de regresso......................................................... 63
5.3.1 Apresentao do modelo de regresso........................................................... 66
5.3.2 Anlise dos resultados dos modelos de regresso .............................................. 67CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................ 72
REFERNCIAS ................................................................................................................ 74
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APNDICE A - Forma matemtica dos doze modelos estimados por MnimosQuadrados atravs do software Eviews 5. ....................................................................... 80
ANEXO A Correlogramas dos resduos ao quadro, grficos de normalidade eplotagens dos resduos dos modelos 5, 7 e 9 gerados pelo software Eviews 5. ............. 82
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INTRODUO
A planta do fumo originria das Amricas e surgiu nos vales orientais da Bolvia.
Atravs de migraes, difundiu-se chegando, tambm, ao Brasil. Portanto, calcados em
autores que defendem essa teoria histrica, podemos afirmar que antes mesmo da chegada
dos colonizadores o fumo j fazia parte do cotidiano dos habitantes nativos do Brasil. A
propagao do tabaco pelo mundo, segundo Nardi (1996), ocorreu por meio de
deslocamentos de marinheiros que faziam uso do fumo, tambm houve a propagao com
o fumo usado como ornamentao em jardins europeus e por crenas de usos medicinais.
Inicialmente, o cultivo do tabaco era do tipo escuro e as primeiras reas que o
cultivaram, no Brasil, foram as faixas litorneas dos estados de Pernambuco e Bahia. A
partir de 1751, essa solancea passou a ser utilizada para o pagamento do comrcio de
escravos, alm de abastecer o mercado europeu e interno. Com essa evoluo do mercado
tabaqueiro, comearam a surgir as primeiras fbricas de rap e depois a de charutos e, por
fim, as indstrias de cigarros que colaboraram com a queda das fbricas de charutos e com
a ascenso do uso de fumos claros.
A imigrao alem foi um grande propulsor da atividade fumageira nos estados do
Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Entre os motivos, est a tradio teuta em
agriculturas em pequenas reas e de tcnicas mais elaboradas para trabalhar com a terra.Aps 1918, h o incio do Sistema Integrado de Produo (SIP) que, segundo SindiTabaco
(2011), proporciona vantagens para produtores; como a garantia de venda da produo,
para empresas; como a garantia do fornecimento; e para clientes, como a qualidade do
produto garantida.
A Organizao Mundial da Sade (OMS) preocupada com a expanso do
tabagismo no mundo comea, em 1970, debates nas suas assembleias sobre esse tema, que
evoluram para a criao do acordo internacional de combate ao tabaco, a Conveno-Quadro para o Controle do Tabaco (CQCT). Elaborado em 2003, primeiramente, foi
assinado por 168 pases e, hoje, conta com 172 pases-membros e trata de restries ao
produto em todas as suas etapas de confeco, nos seus 38 artigos divididos em 11 partes.
Esses membros so obrigados a enviar relatrios para a OMS relatando suas polticas e
conquistas no combate ao tabagismo em seus territrios.
No Brasil, os rgos governamentais j aprovaram leis, decretos, instrues
normativas e resolues com o objetivo de cumprir com as obrigaes acordadas no textoda conveno. O Ministrio do Desenvolvimento Agrrio (MDA) o grande responsvel
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pelo cumprimento dos artigos 17 e 18 que se referem, especificamente, produo de
tabaco em sua fase agrcola. Para isso, criou o Programa de Diversificao de Culturas do
Fumo, em 2005, que conta com a colaborao de associaes, cooperativas, universidades,
prefeituras e outros programas do governo federal para cumprir com seus objetivos
(BRASIL, 2011g).Segundo o World Bank (1999), so cinco os principais fatores que impossibilitam a
migrao dos produtores da produo de fumo para outra cultura: (1) preo do fumo,
relativamente, estvel possibilitando maiores condies de planejamento, alm da garantia
de compra pelas fumageiras; (2) fornecimento gratuito de assistncia e orientaes
tcnicas; (3) indstria fumageira se posiciona como avalizadora dos produtores junto s
instituies financeiras; (4) tabaco pouco perecvel se comparado com outros produtos;
(5) indstria se compromete em transportar e comercializar o fumo. E, para completar,Dorneles (2009) destaca que os produtores so frgeis, descapitalizados e possuem baixa
qualificao tcnica para bancar essa reconverso sem apoio do governo.
A cultura do fumo possui grande importncia scio-econmica no Brasil e envolve
interesses de vrios agentes de produo como: fumicultores, indstria fumageira,
entidades ligadas sade, entidades ligadas ao setor ambiental e o Governo. A produo
do fumo, no pas, caracterizada pelo emprego intensivo e elevado valor de produo,
alm, claro, de ser uma importante fonte de receita para os governos federal e estadual
(Konzen e Rohr, 1988).
A atividade fumageira na safra 2009/2010, segundo dados da Afubra (2011) na
regio sul-brasileira, envolveu 185.160 mil famlias produtoras, sendo 25% destas no
possuem terra e trabalham em regime de parceira, cultivando uma rea total de 370.830 mil
hectares que produziu 687.180 mil toneladas de folha de tabaco com produtividade por
hectare de 1.853 kg (Afubra, 2011). O valor de produo gerado foi de R$ 4.384.208.400 e
uma renda per capita de R$ 9.630,00. Segundo o Anurio Brasileiro do Tabaco (2010), se a
rea ocupada pelo tabaco fosse destinada a outras culturas/atividades a renda gerada seria
de 705 milhes de reais, o que representa R$ 3,7 bilhes inferior obtida com o fumo.
Nessa ltima safra, o sul do Brasil foi responsvel por 96% da produo nacional e a renda
do tabaco representou 64% do valor produzido em cada propriedade (Afubra, 2011).
O Brasil ocupa o segundo lugar no ranking dos maiores produtores de tabaco e o
primeiro lugar no ranking dos maiores exportadores. Em 2009, foram exportados 672 mil
toneladas da folha, gerando um valor de US$ FOB 3.020 milhes, que corresponde a 2%
do total das exportaes brasileiras (Afubra, 2011). Segundo SindiTabaco (2011), os
motivos que propiciaram essa liderana so: produo de grandes volumes, diversidade nos
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tipos de tabaco, alta qualidade da folha, integridade do produto, Sistema Integrado de
Produo, servios diferenciados e regulamentados pela ISO e o mercado domstico.
A partir desta identificao inicial da cadeia do tabaco e da CQCT, temos como
objetivo deste trabalho analisar sua estrutura, sua dinmica e os possveis impactos
provocados pela aplicao de polticas derivadas da conveno sobre a economiatabaqueira, especialmente a gacha. Para isso, o trabalho far uso de uma reviso
bibliogrfica que auxiliar na descrio e interpretao histrica do tabaco, bem como de
sua atual configurao, e na compreenso do tratado internacional que vem transformando
o ambiente desse setor no Pas e internacionalmente.
A caracterizao da cultura do fumo ser baseada no estudo das cadeias
agroindustriais, que foi desenvolvido, primeiramente, por Goldberg e Davis (1957). E os
possveis impactos causados pela introduo das medidas CQCT na cadeia fumageira serocaptados por modelos de regresses mltiplas com dados de rea, produtores e crdito.
Este trabalho foi dividido em seis partes. Alm desta introduo, a segunda parte
faz uma reviso terica das cadeias agroindustriais e dos trabalhos empricos que
analisaram quantitativamente as relaes das cadeias agroindustriais na economia
utilizando, muitas vezes, metodologias diversas para demonstrar os impactos de suas
mudanas. No terceiro item apresentado um histrico sobre a cultura do fumo, relatando
seus antecedentes, delimitao da rea de estudo, que ser o estado do Rio Grande do Sul,
e uma caracterizao completa das partes que compe a cadeia do tabaco. Na quarta parte
feito um relato sobre a evoluo dos debates que envolvem o tabagismo na OMS e uma
caracterizao dos princpios norteadores e artigos do texto da Conveno-Quadro para o
Controle do Tabaco (CQCT). Na quinta parte sero abordadas as polticas de
diversificao de culturas introduzidas no Brasil e no Mundo, uma anlise para buscar o
melhor modelo de regresso mltipla para os dados de sries temporais (volume, capital,
produtores e rea) e uma simulao de possveis cenrios advindos com as polticas
brasileiras de diversificao. A sexta parte coloca algumas consideraes finais sobre o
tema.
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APRESENTAO E APLICAES DO CONCEITO DE CADEIAS
AGROINDUSTRIAIS
Para atender ao propsito da pesquisa, este captulo trata de caracterizar os
elementos norteadores das cadeias agroindustriais. Aliado a isso, h a descrio deexperincias empricas do uso do conceito de cadeia de produo.
2.1Cadeias Agroindustriais
Na anlise cientfica h diferentes configuraes agroindustriais1, porm no
presente trabalho optou-se por empregar a estrutura analtica baseada nas cadeias
agroindustriais ou filires. A razo para essa escolha que se pode compreender, a partirdesse conceito, os segmentos envolvidos na produo, transformao e comercializao do
produto agropecurio, at chegar ao consumidor final (Farina, 1997). Leite (1996) 2apud
Oashi (1999) diz que o estudo das cadeias produtivas fornece informaes com elementos
dinmicos aos agentes pblicos e/ou privados na hora da tomada de decises.
O conceito de cadeias agroindustriais surgiu na Frana e na Inglaterra na dcada de
1930. Ray Goldberg e John Davis foram os precursores na anlise de filire sob um
enfoque agroalimentar. Para eles, cadeia agroindustrial seria uma sequncia de operaes
fsicas, tecnicamente complementares, relacionadas com a produo, distribuio e
consumo (Zylberstajn, 2000).
Apesar das discusses j existirem nos Estados Unidos e na Europa, s a partir dos
anos 1980 o conceito de cadeia produtiva passou a ser discutida nos meios acadmicos,
empresariais e polticos no Brasil. Os motivos que levaram a essa renovao dos estudos
do agronegcio nacional podem ser: abertura comercial; desregulamentao de vrias
cadeias agroindustriais; a importncia da agroindstria na balana comercial; exigncia de
produtos mais elaborados e qualificados devido concorrncia externa; e exigncia de
prticas mais eficientes na logstica nacional (Oliveira, 2011).
Muitos estudos surgiram com o intuito de definir o conceito de cadeias de
produo, entre eles temos Morvan (1985) 3apud Zylberstajn (2000, p.9):
1 Configuraes tais como: complexos agroindustrais (CAIs), cluster, supply chain management (SCM),sistemas agroalimentares (SAGs).2
LEITE, L. et. Al. Estudo da cadeia produtiva como subsdio para pesquisa e desenvolvimento doagronegcio.Fortaleza: EMBRAPA, 1996.3MORVAN, Y. F il ire de production, in fondaments deconomie industrielle econmica.pp. 199-231.1985.
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Cadeia uma sequncia de operaes que conduzem produode bens. Sua articulao amplamente influenciada pela fronteirade possibilidades ditadas pela tecnologia e definida pelasestratgias dos agentes que buscam a maximizao dos seus lucros.As relaes entre os agentes so de interdependncia oucomplementariedade e so determinadas por foras hierrquicas.
Em diferentes nveis de anlise a cadeia um sistema, mais oumenos capaz de assegurar sua prpria transformao.
Alguns pesquisadores do Programa de Estudos dos Negcios do Sistema
Agroindustrial (PENSA), da Universidade de So Paulo (USP), definem filirecomo uma
soma de operaes de produo, logstica e de comercializao. Etapas essas necessrias
para que a matria-prima de base (indstria a montante) se transforme no produto que
possa ser utilizado pelo consumidor final, seja este um particular ou uma organizao
(indstria a jusante) (Salto, Figueiredo e Batalha, 1999).O enfoque tradicional de cadeias agroindustrias considera trs subsistemas: de
produo, de industrializao e de comercializao/consumo. O primeiro engloba o estudo
da indstria de insumos e produo agropastoril que fornecem a matria prima para que o
processo de produo avance; o segundo focaliza a transformao agroindustrial do
produto bruto em produto final destinado ao consumo, estocagem e transporte; o terceiro
permite o estudo das foras de mercado (distribuio e venda) (Zylberstajn, 2000; Oliveira,
2011). Os agentes de produo que compem a cadeia produtiva esto ligados por umconjunto de relaes mercantis e no-mercantis que fazem parte de uma estrutura
organizacional e institucional (Carvalho Jnior, 1995).
Uma cadeia de produo constituda a partir da identificao do produto final.
Depois as operaes tcnicas, comerciais e logsticas so definidas de jusante
(comercializao/consumidor final) a montante (produo de matria-prima/empresas
agrcolas) (Oliveira, 2011). Abaixo, a figura 1 mostra a lgica de encaminhamento das
operaes de uma cadeia de produo agroindustrial.
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Figura 1:Esquema das operaes de cadeias de produo agroindustrial.Fonte:Oliveira, 2011.
Segundo Oliveira (2011, p.18), a literatura descreve cinco principais utilizaes
para o conceito de cadeia de produo, so eles: 1. Metodologia de diviso setorial do
sistema produtivo; 2. Formulao e anlise de polticas pblicas e privadas; 3. Ferramenta
de descrio tcnico-econmica; 4. Metodologia de anlise da estratgia das firmas; 5.
Ferramenta de anlise das inovaes tecnolgicas e apoio a tomada de deciso em novas
tecnologias.
Para a anlise econmica de indstrias agrcolas e alimentares (IAA), Combris &
Nefussi (1984) 4citados por Takitane e Souza (1995), avaliam que o conceito de cadeias
agroindustriais bastante til, pois delimitam trs problemas distintos, a saber: insero da
agricultura em economias industrializadas, processamento de alimentos e desenvolvimento
das relaes capitalistas no campo. Devido interdependncia e complementariedade dos
diferentes nveis da cadeia produtiva, interessante analisar de que maneira e com que
intensidade modificaes em um estgio podem se propagar em toda a filire. Entre as
causas dessas possveis perturbaes podem ser mudanas nas quantidades de matrias-
primas disponveis em decorrncia de motivos de ordem econmica, tecnolgica ou
poltica (Carvalho Jnior, 1995).
4 COMBRIS, Pierre; NEFUSSI, J. Leconcept dagro-alimentaire: intret et limites. Economie Rurale. n.160, p. 22-27, mars/avr. 1984.
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2.2 Evidncias empricas de anlise quantitativa de cadeias produtivas da economia
A seguir iremos descrever alguns trabalhos empricos que serviram de base e
inspirao para esse trabalho. Eles buscam explicar os impactos econmicos de um setor
na economia como um todo ou estabelecer uma relao entre os vrios setores da economia
seja em mbito regional, nacional ou internacional. Porm, importante salientar que esse
no o objetivo do presente trabalho, j que vamos explicar como possveis mudanas em
variveis que influenciam a produo da cadeia do tabaco podem impactar a prpria
produo fumageira, sem relao com outros setores ou agentes produtivos da economia.
Outro ponto importante a ser esclarecido, que a descrio terica da Conveno-Quadro
para o Controle do Tabaco e a caracterizao da cadeia produtiva do tabaco tero captulos
prprios de discusso e caracterizao.
Souza (1997) publicou a pesquisa Projeo e regionalizao da matriz de insumo-
produto: impacto do aumento da produo de gros no RS e no Brasil no ano 2000 que
tinha como objetivo avaliar qual o impacto que um aumento da produo de gros na
ordem de 6 e 30 milhes, provocaria no produto e emprego no estado gacho e em mbito
nacional no ano 2000. Para fazer esse exerccio, o autor utilizou a matriz de insumo-
produto brasileira e a metodologia de projeo e regionalizao de matrizes. Os impactos
desses aumentos de produo de gros provocariam na economia brasileira um aumento de
1,15% do PIB e na economia gacha uma elevao de 7,32%. Porm, o autor ressaltou que
isso possvel se o governo adotar uma poltica de juros mais baixos e estimular novas
prticas de manejo do solo. Com esse aumento da gerao de renda, o nvel de vida da
populao rural melhoraria consideravelmente.
O estudo de cadeias produtivas foi, tambm, realizado por Colle (1998) no trabalho
intitulado A cadeia produtiva do trigo no Brasil: contribuio para a gerao de emprego e
renda. A pesquisa analisou as caractersticas da cadeia produtiva do trigo no pas,
descrevendo a evoluo da produo, consumo e gerao de emprego e renda. Para mediras relaes inter-setoriais e quantificar o nmero de empregos gerados nessa cadeia
produtiva foi utilizada a matriz insumo-produto que apontou como resultados a
necessidade de se ampliar o cultivo do cereal, pois uma atividade que absorve bastante
mo-de-obra e, portanto, reduz o xito rural (Colle, 1998).
Fochezatto e Porto Jr., em 1999, publicaram o trabalho A cadeia da economia do
Vale do Rio Pardo um exerccio de insumo-produto. Essa pesquisa apresenta uma
anlise da cadeia produtiva do Vale do Rio Pardo no estado do Rio Grande do Sul, que seapresenta pouco diversificada e, portanto, vulnervel a alguns setores da economia, dentre
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os quais podemos citar a fumicultura. A metodologia adotada foi uma adaptao simples
da matriz-insumo nacional para o mbito regional. Uma constatao que vai de encontro ao
que as entidades ligadas indstria do tabaco publicam e baseiam seus argumentos que o
setor fumageiro no o setor mais dinmico na gerao de emprego e renda da regio,
ficando atrs de setores como os: metalrgico, madeireiro e de vesturio (Fochezatto ePorto Jr., 1999).
Podemos citar, tambm, a dissertao O impacto da legislao vigente sobre a
indstria da erva-mate chimarro na regio do Alto Uruguai, de Santos (2002), que teve
como objetivo verificar se a legislao vigente era um entrave ou no para o
funcionamento de dez empresas da cadeia de erva-mate situadas no Alto Uruguai no estado
do RS. Nesta pesquisa utilizou-se a aplicao de questionrios para essas empresas do setor
e realizou-se uma pesquisa bibliogrfica, de registros escritos e de relatrios. A conclusoque a autora chega que, para as empresas entrevistadas, a legislao no um empecilho
para o andamento das firmas, porm como h falta de fiscalizao de seu cumprimento as
que obedecem ficam em desvantagem competitiva em relao as que negligenciam as
normas (Santos 2002).
O trabalho Os impactos dos novos acordos de livre comrcio sobre o mercado de
arroz no Brasil: um modelo de alocao espacial e temporal, de Alvim (2003), estudou os
reflexos dos novos acordos de livre comrcio sobre o mercado de arroz em regies
arrozeiras no Brasil e no Mundo. Para isso, simulou cenrios que estariam sob a influncia
dos acordos internacionais de livre comrcio com o objetivo de quantificar as variveis
como: volume produzido e consumido, fluxos de comrcio, preos de equilbrio e
excedentes do produtor e consumidor. O modelo utilizado foi o de Equilbrio Parcial, pois
com ele possvel uma compreenso do comportamento do mercado de arroz frente s
alteraes em termos de polticas comerciais (Alvim, 2003, p. 108). A principal concluso
que o autor dessa tese chega que a melhor estratgia para os produtores de arroz
brasileiros se associar ao governo do pas na posio a favor do livre comrcio o que vai
de encontro s posies defendidas pelas entidades representativas dos produtores de arroz.
O artigo de Conte e Ferreira Filho (2007), denominado Substituio de fatores
produtivos na produo de soja no Brasil, teve como objetivo identificar a estrutura da
demanda de fatores de produo da soja, caracterizar a interdependncia desse mercado e
analisar as possibilidades de substituio dos recursos no processo produtivo da sojicultura
nos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Gois, Paran e Rio Grande do Sul. A
metodologia adotada foi a estimao da funo de custo, que estabelece que as
informaes economicamente relevantes referentes ao processo de produo podem ser
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obtidas a partir da funo custo (Conte e Ferreira Filho, 2007, p.477), atrav s da forma
funcional flexvel translog (analisa o custo de produo como funo dos preos dos
insumos e da quantidade produzida). As principais concluses que o estudo chega so:
despesas com capital e produtos qumicos representam as maiores parcelas dos custos
dessa produo, 67%; elasticidades-preos diretas indicam demanda inelstica dos fatores;elasticidades-preos cruzadas mostraram complementaridade entre mo-de-obra e capital;
as elasticidades de Allen apontaram substituio entre a maior parte dos fatores de
produo de soja, principalmente entre qumicos e mo-de-obra; e na elasticidade de
Morishima, capital e mo-de-obra so complementares quando o preo de capital varia e
substitutos quando varia o preo da mo-de-obra.
Em 2009, Satolo e Bacchi publicaram o trabalho Dinmica das flutuaes na
produo de cana-de-acar que tinha como finalidade explicar quais os verdadeirosestmulos que predominam na produo sucroalcooleira no Brasil, porm dando nfase ao
estado de So Paulo. Os autores fizeram uso da metodologia VEC estrutural, o qual torna
possvel a estimao dos impactos de choques de oferta e demanda nas variveis do
modelo. Os principais resultados que a pesquisa encontrou que o aumento de rea
cultivada com cana-de-acar, em So Paulo, no perodo de interveno estatal no
explicado por choques de oferta nem de demanda. Aps, esse perodo, ocorreu a
liberalizao do setor, e para este momento, a pesquisa concluiu que o preo da cana foi a
varivel que mais explicou o crescimento da produo (choques de oferta).
Podemos citar, ainda, o trabalho Dficit habitacional e impactos econmicos do
programa Minha Casa Minha Vida no Rio Grande do Sul, de Drum (2010), que teve
como objetivo avaliar os impactos diretos, indiretos e induzidos sobre emprego e renda de
uma possvel reduo do dficit habitacional no RS, provocado pelo programa Minha Casa
Minha Vida do governo federal. Para alcanar suas metas foi utilizada a metodologia da
matriz insumo-produto, que possui grande importncia para o planejamento econmico e
serviu para comparar os impactos dessa poltica no estado gacho (Drum, 2010). Para o
autor, o setor imobilirio ser o grande propulsor da economia brasileira e comprova que
quanto maiores os investimentos na rea de habitao, maiores sero os benefcios
advindos.
Enfim, os trabalhos descritos acima nos mostram uma gama de possibilidades que
podem existir para tentarmos explicar a dinmica econmica das cadeias agroindustriais e
suas ligaes com a economia em geral. Os mesmo contribuem, assim, para a construo
do mtodo de anlise do objeto abordado no presente trabalho.
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A CULTURA DO FUMO
Com o objetivo de entender melhor como funciona e como se comporta a cadeia do
tabaco optamos, nesse captulo, por realizar um estudo sobre a origem do fumo e descrever
a relao dos agentes produtivos envolvidos nessa cadeia de produo, desde osfumicultores at os consumidores do produto final os cigarros. Tambm, identificamos
quais as principais regies produtoras da folha no estado do Rio Grande do Sul.
3.1Histrico da produo do fumo
Na literatura, existem dois grupos de autores que especulam sobre qual a origem do
fumo: o primeiro, composto por Vogt (1997) e Collins e Hawks Jnior (1993), defende aideia de que a planta surgiu no territrio Asteca e Maia; e o segundo acredita que a folha
originria dos vales orientais dos Andes bolivianos e difundiram-se atravs de migraes
indgenas, inclusive para o Brasil.
Esse segundo grupo parece ser o mais convincente e abrangente em relao
questo de territrio. Como autores que fazem parte dessa corrente, podemos citar: Costa
(2007), Souza Cruz (2001), Nardi (1996) e Seffrin (1985). Resumindo a linha de raciocnio
dos autores supracitados, podemos dizer que o fumo uma planta originria das Amricas,provavelmente dos vales orientais aborgines que se espalhou pela Amrica Central e
depois chegou ao Brasil atravs de migraes indgenas e foi descoberta pelos europeus em
1492.
No incio, as principais formas de uso da solancea eram: cachimbo na Amrica do
Norte ou cigarros feitos de folhas secas enroladas na Amrica Central e na Amrica
Meridional. No Brasil, o fumo, alm do carter sagrado quando usado nos rituais
religiosos, tinha uma origem mtica (Silva, 2002) e foi bastante importante para as tribos
dos tupis-guaranis, sobretudo daqueles grupos que viviam pela costa brasileira que tambm
os cultivavam (Nardi, 1996). Enfim, podemos dizer que o fumo era parte do cotidiano dos
habitantes americanos antes mesmo da chegada dos europeus e, portanto, qualquer um
deles que entrasse em contato com as tribos indgenas descobriria a planta, assim como
aconteceu com companheiros de Cristovo Colombo quando chegaram a Ilha de Cuba em
1492 e com Cabral no Brasil em 1500, os quais encontraram ndios cultivando e usando o
tabaco (Nardi, 1996).
O incio do cultivo do fumo datado de 1531, no Haiti, realizado pelos espanhis
com sementes originrias do Mxico, chegou a Cuba em 1580 e depois foi s Guianas e ao
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Brasil (Silva, 2002). Segundo Collins e Hawks Jnior (1993), os colonizadores espanhis
desde a sua chegada em solo americano se dedicaram a produo para exportao do
tabaco ao Velho Mundo e a Holanda seria a principal responsvel pela expanso do tabaco
para a sia e Oriente Mdio devido ao seu carter de intermediria comercial. Logo, essa
atividade passou a ser importante para os cofres pblicos dos pases produtores eexportadores, assim como passou a participar decisivamente na balana comercial dessas
naes (Souza Cruz, 2001).
Porm, para Nardi (1996), o principal propagador do fumo pelo mundo est ligado
ao fator social e completa dizendo que o aspecto comercial apenas foi consequncia. Essa
propagao ocorreu de duas formas: a primeira foi um movimento realizado pelos
marinheiros e soldados que viajavam pelas rotas das ndias Ocidentais com o fumo nos
bolsos como forma de ajudar a passar o tempo e descansar; o segundo foi o movimentodirecionado Europa com a finalidade de utilizar a planta para ornamentao e medicina.
Tambm houve a propagao realizada por Jean Nicot que introduziu o hbito do uso do
fumo nas cortes francesas e nas naes europeias.
Para o estudo da Souza Cruz (2001), a expanso mundial do uso do tabaco se deu
devido ligao entre Portugal e o Brasil. Por volta de 1530, Lus de Gis levou da ento
colnia sementes da planta que, no momento, acreditava-se que tinha poderes medicinais
capazes de curar dores de cabea, males do estmago e lceras cancerosas. Com isso, o
tabaco foi se espalhando da Holanda para: Alemanha, Rssia e toda a sia. Depois se
espalhou pela Grcia, Hungria e Polnia. E estima-se que em meados do sculo XVII o
mundo inteiro j havia entrado em contato com o tabaco.
Os portugueses, no Brasil, conseguiam o fumo, assim como outros produtos
exticos, dos ndios por meio de permuta durante os trs primeiros quartos do sculo XVI.
Porm, como os ndios nem sempre estavam dispostos a realizar essa troca, surgiu a
necessidade de que fossem criadas as primeiras lavouras de tabaco formadas pelos colonos.
No incio, essa produo seria para o consumo prprio, porm devido ao aumento da
procura pelo fumo na Europa logo, apareceram compradores para o excedente dessa
produo.
No perodo colonial brasileiro, o fumo iniciou-se sendo cultivado na faixa litornea,
principalmente nas reas que hoje so os estados de Pernambuco e Bahia. O tipo produzido
era o escuro para a fabricao do rap, dos cigarros e dos charutos e se tornou o segundo
produto de maior importncia no perodo colonial (Silva, 2002). No princpio, a produo
era basicamente domstica e s a partir de 1751 que os produtores aumentaram a sua
capacidade produtiva, assim o fumo passou a ter trs destinos importantes. O primeiro era
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o comrcio de escravos com a frica (Costa da Mina), no qual eram utilizadas folhas de
terceira qualidade como moeda de troca, esse comrcio chegou a representar 30% das
exportaes do tabaco brasileiro no perodo colonial. O segundo destino era para abastecer
o comrcio europeu, sendo esse o destino da produo de folhas de melhores qualidades; e
terceiro destinado para o comrcio interno (Souza Cruz, 2001).O estado da Bahia foi o bero da produo fumageira e manteve-se sob liderana
at o incio da dcada de 1950. No perodo colonial, as reas destinadas no estado baiano
produo de fumo eram chamadas de Campos da Cachoeira que engloba as regies de
Cachoeira, Feira de Santana, So Gonalo dos Campos, So Pedro da Muritiba, Outeiro
Redondo e Santo Estevo do Jacupipe. Eram reas de pequenos povoados e foram
fundadas no final do sculo XVI (Nardi, 1996). Aps a dcada de 1960, a fumicultura
baiana entra em declnio, passando para, em 2002, o quinto lugar no ranking da produonacional e para o segundo lugar em importncia na produo nordestina, perdendo para
Alagoas (Mesquita e Oliveira, 2003).
No estado de Pernambuco, h relatos de que o fumo era cultivado do rio So
Francisco at a cidade de Natal, porm com a invaso holandesa essa cultura foi alvo de
pouca ateno, no se desenvolvendo o tanto que a regio teria como potencial. O estado
de Minas Gerais, por sua vez, chegou a ser a segunda maior regio fumageira do Brasil,
responsvel pelo abastecimento do mercado interno, porm foi ultrapassada pela produo
do estado do Rio de Janeiro que se desenvolveu nas regies de Ilha Grande e Parati e no
estado de So Paulo na Ilha de So Sebastio (Nardi, 1996).
As primeiras indstrias fumageiras que surgiram foram as fbricas de rap, logo
aps o alvar de D. Joo VI liberando a instalao de indstrias no territrio brasileiro em
1808. Porm, essas fbricas no resistiram introduo de charutos nos mercados e, com
isso, foram substitudas por fbricas desse novo produto. Em 1842, os alemes de So
Leopoldo do Sul, que haviam se unido para fabricar charutos, j comercializavam 21,2 mil
unidades mensais do produto, alcanando altos lucros (Souza Cruz, 2001).
A produo de cigarros teve incio no sculo XX, nos estados de So Paulo, Rio de
Janeiro e Rio Grande do Sul, e colaborou com a queda do consumo de charutos e
consequentemente a falncia de muitas dessas fbricas. As fbricas de cigarros estavam
divididas em dois processos: as que desfiavam o fumo e as que o beneficiavam para a
exportao. Em 1880, em Pelotas, j havia uma manufatura de fumo (Souza Cruz, 2001).
Segundo Afubra (2001), o ano de 1918 pode ser considerado um marco para o tabaco, pois
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foi quando se instalou a primeira indstria de processamento de fumo no Brasil, assim
como a instalao de estufas que proporcionaram a introduo dos fumos claros5.
A vinda de imigrantes alemes para as Amricas pode ser atribuda s questes
como o processo de desagregao da propriedade feudal, incio da industrializao alem,
restries religiosas e pssimas condies econmicas e polticas. Os primeiros imigranteschegaram em 1824 para colonizar as terras onde hoje est situada a cidade de So
Leopoldo e desde o incio os produtores dessa regio j empenhavam-se em plantar
sementes de fumo de alto padro (Souza Cruz, 2001; Costa, 2007).
Os objetivos que norteavam a imigrao para o sul do pas eram diferentes daqueles
do centro do Brasil. Segundo Costa (2007, p. 7), o principal objetivo sulista era
proporcionar uma sedentarizao, na qual estes pudessem constituir uma agricultura
voltada para o mercado interno, ocupao provincial, e a formao de uma classe depequenos e mdios proprietrios no ligados, poltica e ideologicamente, aos interesses dos
grandes estancieiros.
A colnia de Santa Cruz foi a primeira a ser fundada, em 1850, pelo governo da
Provncia de So Pedro (hoje Rio Grande do Sul) com os objetivos, segundo Vogt (1997)
de povoar a recm aberta estrada que ligava a cidade de Rio Pardo com Cruz Alta e
assegurar que as mercadorias chegassem ao porto de Porto Alegre atravs de Rio Pardo.
Em 1849, Santa Cruz recebeu a primeira leva de imigrantes alemes, os quais receberam as
terras situadas na encosta inferior da serra, na depresso central, que tinham, em mdia, 77
hectares. Aps a Lei de Terras de 1850, os lotes no eram mais doados e sim vendidos,
tendo o imigrante um prazo de cinco anos para realizar o pagamento da terra e dos
insumos6que recebiam (Costa, 2007).
Na microrregio fumicultora de Santa Cruz do Sul, o cultivo do fumo foi
implantado, primeiramente, na cidade de Santa Cruz do Sul e depois irradiou para as
colnias de Venncio Aires, Candelria, Sobradinho e Cachoeira (distrito de Agudo)
(Spies, 2000). Uma questo importante a ser respondida nesse momento : como Santa
Cruz do Sul tornou-se especializada em fumo?
Para Vogt (1997) e Costa (2007), iniciou com a questo de no poder concorrer
com os produtores das regies que possuam portos, estradas, enfim, meios de escoar sua
produo sem grandes custos j que as culturas produzidas possuam baixo valor agregado,
condies essas que Santa Cruz do Sul no gozava. Depois tiveram fatores como: cultivo
5Tipo de fumo utilizado para a produo de cigarros.6Esses insumos eram: sementes, instrumentos de trabalho e dinheiro que recebiam como ajuda de viagem ede custos.
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do tabaco ser mais rentvel que o cultivo do feijo, do milho, da batata, da banha, entre
outros; qualidade da folha plantada, que era o Havana, Lngua-de-vaca e Crioulo; e o
transporte facilitado devido forma simples como se podia acondicionar o produto mesmo
com condies de estradas no satisfatrias. Apesar de ter havido tentativas anteriores
fracassadas de plantar fumos claros em solo baiano, s a partir de 1870 que comeou aplantao desse tipo de fumo, como oAmarelinho, importado da China e, em 1920, o fumo
tipo Virgnia, mas j em solo gacho na cidade de Santa Cruz do Sul (Souza Cruz, 2001).
Esse fato pode ser explicado por pelo menos dois motivos: condies edafoclimticas e
tcnicas conhecidas pelos imigrantes.
Segundo essa mesma fonte, os alemes no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina
foram os responsveis pelo impulso da transformao da regio sul-brasileira em maior
produtora de tabaco do pas, pois trouxeram para a regio tcnicas mais elaboradas e tiposde fumos escuros at ento desconhecidas como:flor branca;flor roxa;fumo pinho; entre
outros. A estrutura das terras em minifndios e a organizao da lavoura e do comrcio so
outros fatores favorveis que contriburam ainda mais para o desenvolvimento dessa
cultura. Para Vogt (1997), a cultura do tabaco pode ser considerada como uma das mais
importantes contribuies dos imigrantes teutos para a economia gacha. Em 1870, o
tabaco j era o principal produto da economia local de Santa Cruz e j se podia notar sua
especializao no cultivo do fumo.
Apesar dessa especializao, a policultura era absolutamente necessria e foi a base
da riqueza econmica regional, pois ela garantia a subsistncia dos produtores no prprio
lote, j que muitas das propriedades ficavam isoladas, sem um comrcio prximo e
precrios meios de transportes (Vogt, 1997). Isso obrigou os colonos criao de uma
economia de subsistncia que lhes provessem desde alimentos at roupas e utenslios
(Spies, 2000). E, ao contrrio do que Vogt (1997) afirma, a regio de Santa Cruz do Sul,
em meados do sculo XIX, ainda era uma regio diversificada. Conforme pode ser visto na
tabela 1 e pela declarao de Bartholomay (1992) 7ao Conselho Municipal de Santa Cruz
retirados do trabalho de Spies (2000):
na agricultura intensiva ou, melhor, na policultura que repousa abase da riqueza econmica de Santa Cruz. No se conhecem aquias grandes lavouras em que so exploradas em larga escala asculturas de um nico produto: nem o permitiria a configuraotopogrfica do solo do municpio, nem recompensa teria o trabalhoem que o machado precisa desbravar os matos como preparo
preliminar para o amanho das terras. Assim, por fora das
7BARTHOLOMAY, Gaspar. Mensagem apresentada ao Conselho Municipal de Santa Cruz.Santa Cruzdo Sul: Typographia Lamberts & Riedl, 1922.
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circunstncias, sendo a agricultura intensiva a nica praticvelproveitosamente no municpio, tambm esse modo de cultiv-latalvez o mais racional e conveniente para o nosso Estado. Comefeito, sendo to instveis as condies climatrias do Rio Grande eno menos variveis as qualidades do seu solo, no j de distrito
para distrito, mas, muitas vezes, mesmo dentro de distncia
limitada, esse modo de explorar a agricultura no ser tambm omais racional e remunerador? A prosperidade dos municpioscoloniais como Santa Cruz parece responder pela afirmativa(Bartholomay, 1922, p. 110 apud Spies, 2000).
Tabela 1: Produo Agrcola de Santa Cruz em 1864.
Produto Quantidade
Milho 100.000 alqueiresFeijo 32.000 alqueires
Batatas 10.000 alqueiresErvilhas 520 alqueiresCevada 290 alqueiresArroz 200 alqueiresTrigo 100 alqueiresCanas 800.000 psFumo 17.300 arrobasAlgodo 20 arrobasleo e linhaa 2.000 medidas
Fonte:Spies (2000) - retirado do Relatrio apresentado pelo presidente da provncia de So Pedro do RioGrande do Sul, Dr. Espiridio Eloy de Barros Pimentel, na 4 sesso da 11 legislatura da Assemblia
Provincial. Porto Alegre: Typographia do Correio do Sul, 1864 p.86.
S a partir de 1860 que se inicia uma economia de mercado na regio de Santa Cruz
do Sul, devido insero do comrcio e do artesanato. Em 1872, j havia instalaes de
atividades artesanais como: moinhos, ferrarias, alfaiatarias, sapatarias, engenho de erva,
fbricas de cordas, de sabo, de velas, de tamancos, de charutos, de tijolos, de aguardente,
de cerveja e padarias conforme Krause (1994) 8apud Spies (2000).
Porm, com o surgimento da indstria e do comrcio urbano a fabricao domstica
foi sendo substituda pelos produtos industrializados que eram de melhor qualidade e de
menores preos. Com isso, o artesanato dividiu-se em dois ramos: o fornecimento dos
artigos necessrios vida local e a transformao dos produtos agrcolas para torn-los
exportveis (Spies, 2000).
Em 1918, a British American Tobacco (BAT) instalou-se em Santa Cruz do Sul e
trouxe consigo novas tcnicas de produo tanto na indstria, com inovaes tecnolgicas
no beneficiamento do fumo, como na produo agrcola, com o uso de adubos e mtodo de
8 KRAUSE, Silvana. Economia, poltica e religio em Santa Cruz do Sul na Repblica Velha.Dissertao de Mestrado. Porto Alegre: UFRGS, 1991.
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secagem das folhas em estufa. A partir de 1918, podemos dizer que foi um perodo
marcado pela concentrao e consolidao da indstria de fumo na regio santa-cruzense e
implanta-se o Sistema Integrado de Produo (SIP), elemento que hoje levantado como
um dos principais instrumentos que levaria a produo de fumo ao sucesso (Spies, 2000).
A produo de fumo cresceu 106%, segundo Vogt (1997), no estado do Rio Grandedo Sul com um aumento de 64,5% da rea cultivada no perodo de 1915 a 1930. Aps esse
perodo de auge, a fumicultura passou por uma crise que durou 20 anos, no ps - Segunda
Guerra Mundial, pois o nvel de estoque mundial estava alto o que provocou uma queda
das exportaes. A partir de 1956, incentivado pelas polticas do presidente Juscelino
Kubitschek atravs do Plano de Metas, o capital local comea a perder espao para o
capital internacional no setor fumageiro e a regio, consequentemente, passa a depender do
capital oligopolista multinacional (Spies, 2000).Por fim, de acordo com Seffrin (1995), na dcada de 1960 j se podia perceber uma
tendncia a monocultora em Santa Cruz do Sul e um processo de dependncia dessa regio
e dos produtores ao tabaco. Como resumo dos principais motivos que levaram a
especializao regional, podemos destacar, de acordo com Spies (2000):
Poltica de crdito rural: antes de 1965, os produtores se uniam s empresas
fumageiras para que essas financiassem a produo e a compra dos insumos
necessrios. Aps 1965 houve a criao do Sistema Nacional de Crdito Rural,
direcionando 40% do crdito para o custeio da produo fumageira no Rio Grande do
Sul;
O preo do fumo superior aos demais produtos agrcolas;
Garantia de comercializao por parte do produtor de toda a sua produo ao final da
safra para as empresas fumageiras;
Assistncia tcnica oferecida pelas empresas aos produtores;
Melhoria nos meios de transportes;
Adaptao aos minifndios e utilizao intensiva da mo-de-obra familiar;
Cobertura contra granizo, vendaval e queima de estufa pelo seguro oferecido pela
Associao dos Fumicultores do Brasil (Afubra), o que reduz os riscos ao agricultor;
Entrada de empresas multinacionais, na regio, que trouxeram inovaes no sistema
de produo, o que provocou melhorias na qualidade e produtividade do fumo
regional.
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3.2Principais regies produtoras de fumo no estado do Rio Grande do Sul (RS)
A Fundao de Economia e Estatstica (FEE) divide o estado do RS em
Mesorregio, Microrregio e Conselhos Regionais de Desenvolvimento (Coredes), com o
objetivo de tornar as anlises territoriais mais eficientes. Neste trabalho, optamos peladenominao de microrregies que, segundo a FEE, definida como:
(...) parte das mesorregies que apresentam especificidades quanto organizao do espao. Essas especificidades referem-se estrutura deproduo, agropecuria, industrial, extrativismo mineral ou pesca. Aorganizao do espao microrregional tambm identificada pela vida derelaes em nvel local, isto , pela interao entre as reas de produo elocais de beneficiamento e pela distribuio de bens e servios deconsumo freqente. Assim, a estrutura da produo para identificao dasmicrorregies considerada em sentido totalizante, envolvendo aproduo propriamente dita, distribuio, troca e consumo, incluindoatividades urbanas e rurais. (FEE DADOS, 2011).
Dentre as 35 microrregies existentes no Estado, percebemos que a produo do
fumo est presente em todas. Porm, prioritariamente em 10 delas, que so: Cachoeira do
Sul, Camaqu, Frederico Westphalen, Guapor, Lajeado-Estrela, Pelotas, Restinga Seca,
So Jernimo, Soledade e Santa Cruz do Sul. Essas regies produzem, desde 1999, cerca
de 90% da produo fumageira total do estado.
A quantidade produzida de fumo, segundo a FEE (2011), no estado, em 2009, foi
de 443.813 mil toneladas. A microrregio de Santa Cruz do Sul a que possui maior
importncia na produo dessa cultura, seguida por Camaqu e Pelotas. As trs regies
citadas foram responsveis por 56,08% de toda a produo da folha do estado em 2009.
Os municpios que mais se destacaram nos ltimos dez anos so: Agudo, Arroio do
Tigre, Camaqu, Candelria, Canguu, Dom Feliciano, Santa Cruz do Sul, Vale do Sol,
Venncio Aires. A tabela 2 mostra os dez maiores municpios produtores, a quantidade
produzida por eles e a microrregio que pertencem:
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Tabela 2:Ranking de 2009 dos dez maiores municpios produtores de fumo, sua produoe a microrregio que pertencem.
Municpios Qtd. Produzida (t) Microrregio
Venncio Aires 25.200 Santa Cruz do Sul
So Loureno do Sul 19.550 PelotasCandelria 19.360 Santa Cruz do Sul
Camaqu 17.600 Camaqu
Canguu 17.255 Pelotas
Santa Cruz do Sul 16.673 Santa Cruz do Sul
Vale do Sol 14.575 Santa Cruz do Sul
Dom Feliciano 13.595 Camaqu
Arroio do Tigre 13.338 Santa Cruz do Sul
Agudo 12.050 Restinga Seca
Fonte:Elaborada pela autora a partir de FEE DADOS (2011).
A partir da listagem acima, podemos perceber que os municpios pertencentes
microrregio de Santa Cruz do Sul produzem 20,09% do total do estado gacho e Pelotas e
Camaqu, com duas cada, produzem, juntas, 15,32% do total.
A tabela 3 ilustra os valores dos rendimentos mdios e o grfico 1 mostra a
evoluo das reas plantadas e colhidas:
Tabela 3:Rendimento mdio (kg/ha) da produo de tabaco no Estado do Rio Grande doSul1999 a 2009.1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
Rendimentomdio (kg/ha) 2.020 2.029 2.008 2.066 1.642 2.110 1.780 1.945 2.060 2.066 2.008
Fonte:FEE DADOS (2011).
Grfico1: Evoluo das reas plantadas e colhidas do estado do Rio Grande do Sul1999
a 2009.Fonte:FEE DADOS (2011).
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Em relao s reas plantadas e colhidas, percebemos, a partir da tabela e do
grfico acima, que houve uma tendncia de crescimento at atingir o pico em 2006, a partir
da houve quedas sucessivas at 2008. Em 2009, as duas variveis tiveram um sensvel
aumento. Porm, ao pegarmos a varivel rendimento mdio (kg/ha) de 2006 a 2008percebemos um movimento contrrio, pois em 2008 foi alcanado o valor mximo do
perodo analisado, o que nos mostra um alto aproveitamento das terras cultivadas pelo
tabaco.
3.3Estrutura da cadeia do tabaco brasileira
Nesse momento, iremos descrever a cadeia do tabaco, pois para entender melhor asua dinmica necessrio compreender como se relacionam e interagem os agentes
produtivos nela envolvidos. O primeiro agente a ser descrito ser os fornecedores de
fatores e insumos, depois passaremos para os fumicultores e usinas de beneficiamento.
Aps, falaremos sobre a indstria de cigarros e em seguida a exportao da folha in natura
e a importao de cigarros; e, para finalizar, falaremos sobre logstica de distribuio e
comercializao do produto final (cigarro) at ao mercado consumidor.
3.3.1 Fornecedores de fatores e insumos
A cadeia do tabaco acontece de forma integrada, atravs do chamado SIP, que
apontado como o principal responsvel pelo sucesso, bom desempenho e crescimento do
setor fumageiro no Brasil e no Mundo. Essa integrao acontece atravs de relaes
financeiras, de produo e compra/venda, sendo os contratos o principal meio de ligao.
Suas relaes so regidas por contratos estabelecidos entre as partes e esto presentes em
todas as etapas de produo da referida cadeia de produo.
Como primeira evidncia da forma integrada de composio da cadeia produtiva do
tabaco est o capital financeiro. A integrao empresa-produtor acontece na pr-safra, no
qual feito um financiamento para bancar os custos de fornecimento de mudas, sementes,
adubos, corretivos e equipamentos necessrios a produo do fumo. Esses insumos so
fornecidos e definidos pelas grandes empresas integradoras e os emprstimos so feitos
juntos s instituies bancrias, como Banco do Brasil, por influncia e intermdio das
companhias fumageiras que avalizam o financiamento obtido pelos produtores agrcolas.
Conforme descrito por Silva (2002), o contrato de financiamento entre o fumicultor e o
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banco realizado pelos orientadores agrcolas, agentes produtivos vinculados indstria
do tabaco que, entre outras atribuies9, cuidam da parte burocrtica do pedido de recursos.
A contrapartida que os agricultores, na prtica, acabam por perder o poder de
gerenciar os recursos obtidos nos bancos, algo feito pelas fumageiras, pois esse
financiamento no chega ao fumicultor, indo direto as empresas, por conta dos insumosfornecidos e pagamento do seguro feito junto Afubra contra eventos da natureza.
Segundo Silva (2002), as empresas fumageiras planejam a produo total do
complexo ao controlar o tipo e a quantidade de insumos recebidos e utilizados pelos
fumicultores, sendo esses certificados e direcionados ao uso na fumicultura, o que gera
uma especializao das atividades da cadeia fumageira. A justificativa usada para esse
controle a necessidade de manter o padro tecnolgico e a qualidade final da folha
(Vargas, Santos Filho, Alievi, 1999). Porm, o que se pode notar que dessa forma afumageira consegue controlar a oferta do produto e, tambm, manter seus preos em
patamares que lhe assegurem vultosos lucros.
Esses insumos, que so escolhidos de acordo com as especificidades das terras e
caractersticas definidas pelo interesse comercial da fumageira, podem ser comprados da
indstria de insumo que pertencem a terceiros ou de capital prprio. Como exemplos de
empresas fumageiras que tambm so proprietrias de indstria de insumos, temos: a
Phillip Morris do Brasil S/A que dona da PROFIGEN, uma empresa especializada em
gentica e na produo de sementes do tabaco (Anurio Brasileiro do Tabaco, 2009); e a
Souza Cruz que possui um Centro de Melhoramento de Fumo (CMF), em Rio Negro (PR),
onde desenvolve novas variedades de fumo e busca melhorar a qualidade, produtividade e
resistncia a pragas e doenas (Souza Cruz, 2011). Essa relao empresa-indstria de
insumo tambm outra evidncia da forma integrada que trabalha a cadeia do tabaco.
O uso dos agrotxicos acontece em todas as etapas do processo de cultivo do fumo.
O mtodo mais utilizado para cultivar o tabaco o sistema floating(fluente), no qual as
sementes so semeadas em bandejas de poliestireno e colocadas em uma espcie de piscina
de lona, ficando todo o perodo na gua, onde so aplicados os agrotxicos. Depois do
crescimento das mudas, elas so transplantadas para a terra, solo este que preparado com
adubao, qumica, esterco e mais uma aplicao de defensivos agrcolas, que so
utilizados com o objetivo de inibir o crescimento de ervas daninhas, as quais podem
prejudicar ou diminuir o bom desenvolvimento das folhas de tabaco. Durante o
crescimento dos ps de fumo efetuada a capina e mais uma aplicao de agrotxicos,
agora com a finalidade de deixar a terra sem matos o que diminui o trabalho de uma nova
9Tipo de vnculo: empregatcio. Sobre essas outras atribuies, ver Silva (2002).
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limpeza. Aps a poda, que a quebra das flores e dos brotos necessria para que as folhas
cresam e fiquem grossas, aplicado um herbicida, para evitar que novos brotos e flores se
desenvolvam nas plantas (Troian et alii, 2009). Nesse momento, um insumo largamente
utilizado o salitre do Chile ou nitrato de potssio (Silva, 2002). O quadro 1 mostra quais
os agrotxicos que so utilizados na plantao do fumo e as pragas que combatem:
Agrotxicos Pragas Agrotxicos Pragas
Acaricidas caros HerbicidasErvas
daninhasAvicidas Aves Inseticidas Insetos
Bactericidas Bactrias Larvicidas LarvasCarrapaticidas Carrapatos Molusquicidas MoluscosColumbicidas Pombos Nematicidas VermesCupinicidas Cupins Piolhicidas PiolhosFormicidas Formigas Predacidas Vertebrados
Fungicidas Fungos Purguicidas Pulgas
Quadro 1:Tipos de agrotxicos e pragas que controlam.
Fonte:Heemann (2009) adaptado a partir de Almeida (1995).
Abaixo, o Quadro 2 especifica quais so os defensivos agrcolas utilizados nas
lavouras de fumo, caracterizados por seus nomes comerciais, sua toxidade, sustncia ativa
e seus respectivos fabricantes:
Marca Comercial Substncia Ativa Toxicidade Fabricante
Acefato Fersol 750 SP Acefato IV Fersol Indstria e Comrcio Ltda.
Cefanol Acefato III Sipcam Agro S.A.
Dimetoato CE Dimetoato I Milenia Agro Cincias S.A.
Doser Clorpirifos II DowElanco
Lorsban 480 BR Clorpirifos II Basf S.A.
Mentox 600 CE Paration metlico I Fersol/Prentiss Qumica Ltda.
Nufos 480 CE Clorpirifos III Cheminova Brasil Ltda.
Orthene 750 BR Acefato IV Hokko/Arysta Life ScienceDiafuran 50 Carbofuran I Hokko/Arysta Life Science
Furadan 350 SC Carbofuran I FMC Agricultural Products
Furadan 50 G Carbofuran I FMC Agricultural Products
Marshal 50 G Carbofuran III FMC Agricultural Products
Ralzer 50 GR Carbofuran I Fersol Indstria e Comrcio Ltda.
Sevin 480 SC Carbaryl II Rhodia-Agro S.A.
Sevin 850 PM Carbaryl II Rhodia-Agro S.A.
Lebaycid 500 Fenthion II Bayer S.A.
Quadro 2:Agrotxicos liberados para a cultura do fumo no Brasil2005.Fonte:Elaborado por Carvalho Jnior, Binotto e Pereira(2005), a partir de DESER (2005).
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Nota: A toxidade dos agrotxicos, conforme nomenclatura utilizada na tabela acima classifica em quatro classes: (I) extremamente txico; (II) altamente txico; (III)mediamente txico; e (IV) muito pouco txico (Carvalho Jnior, Binotto e Pereira, 2005).
Uma informao importante, captada a partir desse quadro, a predominncia de
empresas multinacionais no fornecimento de agrotxicos. Diante desta conjuntura, infere-se que, primeiro, h uma relao contratual entre as companhias fumageiras, que
encontram empresas fornecedoras de insumos agrcolas de perfil similar, ou seja,
aliceradas em capital multinacional. A Matriz Insumo-Produto do Vale do Rio Pardo
(RS), de 1996, mostra que 54,43% dos insumos utilizados pelo setor fumageiro so
importados. Segundo Spies (2000), a internalizao da produo destes insumos na Regio
seria invivel dado que o setor exige altos investimentos iniciais e a escala de produo
seria incompatvel com a demanda regional.Outras empresas fornecedoras de insumos so: Basf (plstico), Klabin (substrato),
Potabrasil (sulfato de potssio), Serrana (fertilizantes), SQM (fertilizante), Adubos Trevo,
EPS (bandejas) (Silva, 2002).
A tabela 4 indica quais so os produtos qumicos utilizados no cultivo do tabaco no
municpio de Santa Cruz do Sul e sua freqncia, de acordo com uma pesquisa de campo
realizada por Heemann (2009).
Tabela 4:Produtos qumicos utilizados no cultivo do fumo no municpio de Santa Cruzdo Sul em 2009 e sua frequncia.
Produtos qumicos Frequncia
Adubo 100,00%Uria 100,00%Calcrio 100,00%Herbicida Gamit 97,12%Inseticida - Orthene 81,73%Herbicida Boral 54,81%Herbicida Roundup 53,85%Inseticida - Confidor 53,85%Inseticida Actara 22,12%Inseticida Decis 12,50%Inseticida Karate 28,80%Inseticida - Lorsban 19,20%Fungicida Rovral 19,20%Fungicida - Antracol 9,60%Fungicida - Ridomil 9,60%
Fonte:Heemann (2009).
Os ativos utilizados na produo do fumo so, basicamente, os mesmos em todas as
unidades produtivas e, na sua maioria, so considerados altamente especficos, o que
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acarretaria altos custos de transao caso houvesse uma quebra contratual. Como exemplo
de alguns destes ativos temos: as estufas, que constituem um alto investimento e tm como
nica finalidade a curagem e secagem do fumo em folha; as sementes (Virgnia e Burley),
especficas para o cultivo do fumo, no tendo outras aplicaes; as tecedeiras, que servem
para atar o fumo antes de coloc-lo para secar nas estufas, que no possuem outras funesfora da cultura do fumo; entre outros (Barrero et alii, 2003). No quadro 3, esto as
principais mquinas e os equipamentos utilizados no cultivo do fumo:
Adubadeira ManualAleirador (trao animal)Aleirador (trao mecnica)AradoBalana mecnica 100 kgBandeja semeadora de fumo
Bandejas isopor para mudasCarreto (puxado por trator)CarroaEnxadaFoiceGrade (18 discos - trao mecnica)Grade de trao animalPlantadeira ManualPrensa para fumoPulverizador 200 litros (traomecnica/animal)Pulverizador costal 5 litrosPulverizador costal 10 litrosPulverizador costal 20 litrosPulverizador manual (a gasolina)Rolo-faca (trao animal)TratorTecedeira com esteiraTecedeira de duas varas
Quadro 3:Principais mquinas e equipamentos utilizados no cultivo de fumo.
Fonte:Heemann (2009).
O estudo de Troian et alii (2009) mostra que a maioria dos produtores agrcolas
pesquisados considerava o uso de agrotxicos benfico e necessrio para a produo da
solancea, pois alm de aumentar a produtividade poupa mo-de-obra. Portanto, os autores
concluem que a questo do dinheiro aparece em primeiro lugar na escala de valores dos
fumicultores entrevistados, em detrimento da sade.
Como resultado de presses exercidas pela sociedade atravs de campanhas
antitabagistas, que exaltam os j comprovados malefcios do cigarro provocados aos seus
usurios, aos chamados fumantes passivos e, tambm, aos produtores de fumo, a
indstria do tabaco vem reduzindo os nveis de toxidade do cultivo da folha. O Anurio
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Brasileiro do Tabaco (2009) considerou o fumo a cultura comercial que menos consome
agrotxicos no Brasil. A figura 2 ilustra a posio do tabaco no ranking do uso de
defensivos agrcolas, por parte de culturas ditas comerciais:
Figura 2: Emprego de defensivos em culturas selecionadas Brasil 2006 (kg deingrediente ativo por hectare)
Fonte:SindiTabaco (2011).
Os dados expressam que a cultura da ma a que mais usa defensivos agrcolas. A
queda no uso dos agrotxicos (ou, ingredientes ativos), caiu, na cultura do tabaco, de 6,6
kg/ha, em 1990, para 1,3 kg/ha, na safra 2008/09. Porm, importante salientar que h
outras culturas comerciais no listadas pela figura e, tambm, no h uma descrio sobrequal os tipos de ingredientes ativos usados, se so mais ou menos txicos que os demais.
Enfim, diante da descrio feita percebemos uma sincronia entre as empresas
fumageiras e o fornecimento de insumos de acordo com o referencial tecnolgico proposto
por elas para alcanar seus objetivos de mercado, como o controle da quantidade produzida
e consequentemente estoques e preos.
3.3.2 Fumicultores
A caracterstica do fumicultor da regio sul do Brasil de possuir pequena
propriedade e, em sua maioria, de origem alem, conforme j vimos anteriormente. As
regies de ocupao teuta que se destacaram na especializao do cultivo e manufatura do
fumo em folha foi Santa Cruz do Sul (RS), que ganhou o ttulo de capital do fumo (Vogt,
1997). Quando a indstria fumageira adere ao modo de produo capitalista ocorre
melhoria na qualidade da folha e, portanto, gera um aumento da demanda pelo fumo. Esse
processo provoca a necessidade de se ampliar as reas destinadas ao plantio do tabaco em
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detrimento quelas ocupadas pelos produtos de subsistncia do produtor e sua famlia
(Spies, 2000).
A figura 3 descreve a diviso da propriedade do produtor, que, na safra de
2009/2010, tinha tamanho mdio de 16,3 hectares sendo 2,69 hectares, ou 16,5% da rea,
utilizados para o cultivo da folha no sul do Brasil (SindiTabaco, 2011).
Figura 3: Distribuio da ocupao fundiria da propriedade rural fumicultora sul-brasileira (% da rea total).
Fonte:SindiTabaco (2011).
Ao comparar com os dados da safra 2008/2009, vimos que houve um aumento nas
reas destinadas ao cultivo do tabaco, de mata nativa e de mata reflorestada e diminuio
das reas: de audes e reas de descanso; de pastagens; de cultivos de outras culturas e de
milho. Essa ltima, principalmente, mostra a especificidade da produo e a situao de
dependncia do fumicultor para com a cultura do tabaco. A tabela 5 detalha a produo de
uma propriedade fumicultora do sul do pas:
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Tabela 5:Produo de propriedades fumicultoras no sul do Brasil.
CULTURA HECTARES PLANTADOS %PRODUO (kg) VALOR (R$)
Arroz 0,16 1,0 990 554,00
Batatinha 0,04 0,3 251 341,00
Cebola 0,02 0,1 146 150,00
Feijo 0,39 2,4 616 832,00
Tabaco 2,68 16,5 4.974 31.734,00
Horti-frutigranjeiros 0,13 0,8 1.077 646,00
Mandioca 0,08 0,5 2.003 901,00
Milho 3,01 18,5 14.529 4.068,00
Soja 0,45 2,8 1.097 625,00Outras 0,14 0,8 1.087 652,00
Audes 0,15 0,9 - -
rea em descanso 1,03 6,3 - -
Mata Nativa 2,61 16,0 - -
Mata reflorestada 1,68 10,3 - -
Pastagens 3,72 22,8 - -
SUB-TOTAL 16,3 100 20.770 40.503,00
CRIAES Kg R$
Aves, bovinos, sunos, peixes, etc. 8.300 8.788,00
TOTAL GERAL 35.070 49.291,00
Fonte:Afubra (2011).
Inferindo da tabela acima podemos confirmar a nossa hiptese de que h uma alta
dependncia a monocultura do fumo, essa agricultura se configura como a principal fonte
de renda dos fumicultores, pois responsvel por 64,38% do valor total produzido em uma
propriedade mdia de 16,3 hectares, enquanto que as demais culturas e atividades, quando
produzidos excedentes, respondem pelos outros 35,62%.De acordo com dados do SindiTabaco (2011), podemos ver que o nmero de
famlias produtoras vem seguindo uma tendncia positiva, nos ltimos 40 anos, saindo de
94.840, em 1980, para 185.160 na safra 2009/2010. Em 2006, atingiu-se o pico, chegou a
196.952 o nmero de famlias produtoras, nos dois anos posteriores houve uma ligeira
queda e nos ltimos dois anos houve uma oscilao entre queda e subida, conforme mostra
o grfico 2. Esse auge do nmero de famlias produtoras envolvidas na cultura pode ser
entendido como resultado da expanso que o setor fumageiro estava passando no perodo
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sendo os principais motivos o sucesso do SIP e tambm a avanos tecnolgicos (Anurio
Brasileiro do Tabaco, 2007).
Grfico 2:Evoluo do nmero de famlias produtoras de fumo no sul do Brasil (1999-
2010).Fonte:Elaborado pela prpria autora a partir de SindiTabaco (2011).
A mo-de-obra utilizada na produo do fumo, no sul do Brasil, tem por tradio
ser de origem familiar, o tamanho mdio de uma famlia produtora de 4,7 membros,
sendo que 2,9 trabalham na produo de fumo; 0,9 so independentes; e 0,9 so menores
(crianas e colegiais). Na safra 2009/2010, a renda per capita/famlia foi de R$ 9.630,00 e
totalizou 1.251.640 pessoas que dependem do tabaco. Sendo que dessas 648.270 so
adultos que trabalham na lavoura do tabaco e 402.370 de pessoas contratadas para
empregos sazonais, principalmente durante a colheita do fumo (Afubra, 2011).
Dados da ltima safra mostram que a cultura do tabaco est presente em 719
municpios na regio sul do Brasil, envolvendo 138.150 propriedades que produziram
687.180 toneladas de fumo. Como j vimos, houve perda na produtividade por hectare em
relao safra de 2008/2009, porm no houve diminuio na renda per capita, pois o
preo mdio do tabaco aumentou de R$ 5,90 para R$ 6,34 (Afubra, 2011).
A relao de compra e venda entre os fumicultores e as empresas fumageiras
tambm regida pelo SIP e outra forma de integrao entre os elos produtivos da cadeia
do tabaco. A relao acontece atravs de um contrato entre as partes, no qual a empresa se
compromete em comprar toda a produo daquela safra e o produtor se compromete em
vender somente para ela. Diante desse quadro, podemos perceber que esse tipo de contrato
gera pouco oportunismo por parte dos agricultores em infligirem as regras contratadas,
pois gerar mais malefcios do que benefcios.
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Para concluir, segundo Buainain et alli10apud Souza (2009, p.08-09) os motivos
que levam os produtores a aderirem ao SIP so fatores microeconmicos e sistmicos:
(...) os fatores micro dizem respeito s caractersticas dos fumicultores doSul do pas, que so pequenos agricultores familiares, com baixo nvel deinstruo, que tm na produo de tabaco a principal, e quase sempre,
nica, fonte de renda monetria. So descapitalizados e necessitam decrdito para custear gastos com a produo. Tm elevada averso aorisco, em particular o associado perda da pequena propriedade (...). Ascaractersticas sistmicas relevantes (...) dizem respeito ao funcionamentoimperfeito dos mercados de crdito, produtos agrcolas e insumos, quecomo conhecido, oferecem elevadas dificuldades para a insero dosagricultores familiares, em geral, e dos agricultores pobres e sem terra,em particular (...) tambm se conhecem as incertezas que caracterizam osmercados de produtos agrcolas, sujeitos s restries associadas dependncia da natureza, aleatoriedade climtica e variaes daconjuntura econmica.
Alm disso, existem os entraves das prprias caractersticas da produo do fumo.Entre outros, podemos citar a falta de polticas pblicas ou do mercado aos agricultores
para amenizar possveis riscos associados produo e comercializao de produtos
agrcolas e o difcil acesso aos insumos que, para isso, dependem de recursos monetrios
(crdito) que no esto disponveis facilmente para a maioria dos agricultores familiares.
3.3.3 Indstria fumageira: usinas de beneficiamento
Devido ao aumento da integrao da agricultura local economia nacional e
estrangeira, principalmente ao sucesso do processo produtivo do fumo; ao processo de
acumulao de capitais nas mos de alguns comerciantes monopolizadores; e melhorias na
infraestrutura das rodovias, ferrovias e comunicaes fez surgir em Santa Cruz do Sul um
processo de industrializao. De um lado, desenvolveram-se as agroindstrias de
beneficiamento do fumo. De outro, iniciaram-se as instalaes de novas unidades fabris
com maior aparato tecnolgico (Lima, 2000).
Como j mencionado, em 1918 houve a instalao da Souza Cruz j sob o controle
acionrio da empresa inglesa British American Tobacco (BAT) em Santa Cruz do Sul.
Com o objetivo de se tornar competitiva frente aos produtos importados, devido ao trmino
da Primeira Guerra Mundial, a empresa introduziu novas tcnicas de produo industrial
(com inovaes tecnolgicas no beneficiamento do fumo) e de produo agrcola (com a
introduo do fumo tipo Virgnia, que acabou tornando-se o principal tipo de fumo do
mercado mundial; uso de adubos e secagem das folhas em estufas) (Spies, 2000). No
10 BUAINAIN, A. M. et ali. Organizao e funcionamento do mercado de fumo no sul do Brasil.Campinas: Relatrio de pesquisa, dez./2005.
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mesmo ano, seis estabelecimentos beneficiadores do fumo se uniram para formar a
Companhia de Fumos Santa Cruz, devido necessidade de se fortalecerem, tambm, para
enfrentar a competio e novas exigncias dos mercados (Silva e Tillmann, 2009).
A partir dos anos sessenta e setenta, houve um processo de entrada de capital
multinacional no Brasil que proporcionou um ciclo de concentrao do mercado do fumoem poucas empresas. A fumicultura da regio sul brasileira virou, nesse perodo, uma nova
fonte de abastecimento de tabaco para o mundo devido aos problemas polticos que os
pases produtores tradicionalmente da folha estavam enfrentando, como Moambique e
Zimbbue (Vogt, 1997). Como explicitado em Vogt (1997, p. 128): a produo tabaqueira
gacha, at meados da dcada de 60, destinava-se majoritariamente ao mercado interno
(...). Era o fumo de secagem em galpo, especialmente o nordestino, que compunha o
grosso das exportaes brasileiras. Nos anos 1970, a regio de Santa Cruz do Sul emunicpios adjacentes possuam o maior parque industrial do fumo do mundo, o que
proporcionou regio uma competitividade internacional (Vogt, 1997).
No final dos anos 1970 e nos anos 1980, devido hegemonia do capital
internacional na economia regional percebeu-se um aumento significativo da produtividade
da lavoura de fumo, uma dinamizao no ramo agrofumageiro e uma especializao
produtiva do fumo. Os complexos agroindustriais so formados por uma interligao de
compra e venda entre as indstrias fornecedoras para a agricultura (a montante), a
agricultura e as agroindstrias processadoras de produtos agrcolas (a jusante) (Spies,
2000, p. 77).
Nos anos noventa, a cadeia agroindustrial fumageira do sul do Brasil era fundada
em grandes grupos empresariais, que estavam ligados produo, compra e
beneficiamento do produto, alm da fabricao de cigarros. Em 1994, eram quatro
empresas que controlavam o setor do fumo no sul do Brasil: British American Tobacco,
Dibrell Brothers Inc., Monk Austin Inc. e Universal Leaf, sendo a primeira de capital
anglo-americano e as demais de capital norte-americano (Vogt, 1997).
Apesar de haver novos rearranjos na estrutura dos mercados desse setor, podemos
dizer que atualmente as indstrias de beneficiamento continuam com uma estrutura de
mercado estruturada em oligoplio (Silva e Tillmann, 2009). Hoje cinco empresas
concentram os negcios da cadeia tabaqueira. A Souza Cruz S/A subsidiria da British
American Tobacco (BAT); Phillip Morris Brasil; Universal Leaf Corporation, Alliance
One Brasil Exportadora de Tabacos Ltda., originada de uma sequncia de fuses da Dibrell
Brothers Inc. e Monk Austin Inc. e Japan Tobacco Internacional (JTI).
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Podemos dizer que as relaes comerciais entre os fumicultores e a indstria
fumageira brasileira so caracterizadas por um oligopsnio, ou seja, poucas empresas
compradoras e vrios produtores ofertantes. Essa lgica de mercado faz com que os
oligopsonistas tenham um poder de mercado, pois podem manipular os preos e
quantidades de acordo com as suas pretenses.As usinas de beneficiamento, claro, tambm fazem parte do SIP e possuem vrias
funes na cadeia produtiva do fumo, que so: fornecedoras de insumos aos produtores,
avalizadoras de financiamentos perante aos bancos, transportadoras do fumo da
propriedade do produtor s usinas, receptoras do fumo para beneficiamento, exportadora
da folha in natura e/ou fabricante de cigarros e varejista do produto j acabado, como
veremos depois.
As usinas de beneficiamento da Souza Cruz S/A esto localizadas em Santa Cruzdo Sul (RS), Blumenau (SC), Rio Negro (PR) e Patos (PB) e se relacionam de maneira
integrada com 40 mil fumicultores (DESER, 2010). A capacidade de processamento da
usina de Santa Cruz do Sul (RS) de 120 mil toneladas/ano; de Blumenau (SC) de 55 mil
toneladas/ano e em Rio Negro (PR) de 60 mil toneladas/ano (Souza Cruz, 2011). A sua
produo de fumo, em 2009, foi de 169.566 toneladas e desse total exportou,
aproximadamente, 69% (DESER, 2010).
A Phillip Morris est localizada na cidade de Santa Cruz do Sul (RS) e em 2010,
pela primeira vez na sua histria, comprou contratos da Universal Leaf Tobaccos e
Alliance One e, portanto, passa a ter 17 mil produtores na regio sul-brasileira integrados
empresa. Com isso, a subsidiria brasileira passa a fornecer insumos para outras unidades
da empresa e se torna responsvel por cerca de 10% da demanda global de tabaco em folha
(DESER, 2010). Portanto, a empresa est iniciando um processo de verticalizao de seus
processos, como