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237 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 62(2): 237-242, abr. jun. 2009 Pedro Amade et al. Abstract Based on sustainable development principles, this paper evaluates artisanal gold mining activity in Engenho Podre. This study followed the hypothesis that the implementation of environmental management according to a conduct adjustment agreement firmed by the Cooperativa dos Garimpeiros de Mariana (COOPERGAMA), associated with operational performance improvement would permit continuation of this activity in a sustainable way from the environmental, socioeconomic and cultural point of view. Although still illegal, from the technical point of view, the artisanal mining at Engenho Podre is adopting environmentally-accepted strategies to promote reasonable socioeconomic development. However, administrative issues and lack of investments still affect the sustainability of such practices in the long-term. This paper shows that when good administrative and environmental practices are adopted, it is possible to meet the sustainable development principles in an artisanal mining activity. Keywords: Sustainable development, artisanal gold mining, Environment. Mineração Desenvolvimento sustentável e garimpo - O caso do Garimpo do Engenho Podre em Mariana, Minas Gerais (Sustainable development and garimpo - The case of the Engenho Podre Garimpo in Mariana, Minas Gerais) Pedro Amade Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP/PPGEM E-mail: [email protected] Hernani Mota de Lima Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP/DEMIN E-mail: [email protected] Resumo Esse artigo avalia uma atividade garimpeira, garim- po de ouro do Engenho Podre, com base nos princípios de desenvolvimento sustentável. Esse estudo partiu da hipótese de que a implementação de um sistema de ges- tão ambiental, compromisso assumido pela Cooperativa dos Garimpeiros de Mariana (COOPERGAMA), na assi- natura de um termo de ajuste de conduta, associado a uma melhora no desempenho técnico operacional, é pos- sível, sendo que tal atividade pode ser levada adiante de forma sustentável com foco no tripé ambiental, econômi- co e social. Embora ainda marginal, do ponto de vista técnico, a COOPERGAMA adotou, durante o período de estudo, práticas ambientais e socio-econômicas em aten- dimento aos princípios de desenvolvimento sustentável. Entretanto aspectos administrativos, falta de investimen- tos e desorganização da cooperativa, entre outros fato- res, ainda afetam a sustentabilidade de tais práticas a longo prazo. Esse artigo mostra que, uma vez adotadas as boas práticas ambientais e administrativas, é possível atender aos princípios de desenvolvimento sustentável numa atividade garimpeira. Palavras-chave: Desenvolvimento sustentável, garimpo de ouro, meio ambiente.

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Page 1: Pedro Amade et al. Mineração - · PDF filepo de ouro do Engenho Podre, ... (PRAD), de Controle Ambiental (PCA) e Relatório de Controle Ambiental (RCA) à FEAM. Em adição aos consultores

237REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 62(2): 237-242, abr. jun. 2009

Pedro Amade et al.

Abstract

Based on sustainable development principles, this

paper evaluates artisanal gold mining activity in

Engenho Podre. This study followed the hypothesis that

the implementation of environmental management

according to a conduct adjustment agreement firmed

by the Cooperativa dos Garimpeiros de Mariana

(COOPERGAMA), associated with operational

performance improvement would permit continuation

of this activity in a sustainable way from the

environmental, socioeconomic and cultural point of

view. Although still illegal, from the technical point of

view, the artisanal mining at Engenho Podre is adopting

environmentally-accepted strategies to promote

reasonable socioeconomic development. However,

administrative issues and lack of investments still affect

the sustainability of such practices in the long-term.

This paper shows that when good administrative and

environmental practices are adopted, it is possible to

meet the sustainable development principles in an

artisanal mining activity.

Keywords: Sustainable development, artisanal gold

mining, Environment.

Mineração

Desenvolvimento sustentável e garimpo - O

caso do Garimpo do Engenho Podre em

Mariana, Minas Gerais

(Sustainable development and garimpo - The case of the

Engenho Podre Garimpo in Mariana, Minas Gerais)

Pedro Amade

Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP/PPGEME-mail: [email protected]

Hernani Mota de Lima

Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP/DEMINE-mail: [email protected]

Resumo

Esse artigo avalia uma atividade garimpeira, garim-po de ouro do Engenho Podre, com base nos princípiosde desenvolvimento sustentável. Esse estudo partiu dahipótese de que a implementação de um sistema de ges-tão ambiental, compromisso assumido pela Cooperativados Garimpeiros de Mariana (COOPERGAMA), na assi-natura de um termo de ajuste de conduta, associado auma melhora no desempenho técnico operacional, é pos-sível, sendo que tal atividade pode ser levada adiante deforma sustentável com foco no tripé ambiental, econômi-co e social. Embora ainda marginal, do ponto de vistatécnico, a COOPERGAMA adotou, durante o período deestudo, práticas ambientais e socio-econômicas em aten-dimento aos princípios de desenvolvimento sustentável.Entretanto aspectos administrativos, falta de investimen-tos e desorganização da cooperativa, entre outros fato-res, ainda afetam a sustentabilidade de tais práticas alongo prazo. Esse artigo mostra que, uma vez adotadasas boas práticas ambientais e administrativas, é possívelatender aos princípios de desenvolvimento sustentávelnuma atividade garimpeira.

Palavras-chave: Desenvolvimento sustentável, garimpode ouro, meio ambiente.

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Desenvolvimento sustentável e garimpo - O caso do Garimpo do Engenho Podre em Mariana, Minas Gerais

1. Desenvolvimento

sustentável e

mineraçãoA definição de desenvolvimento

sustentável é multidimensional. A primei-ra dimensão enfatiza a sustentabilidadedo ambiente natural, que inclui a quali-dade ambiental e o estoque dos recur-sos naturais. A segunda destaca a sus-tentabilidade econômica dos padrões devida da sociedade. Segundo Eggert(2000), sustentabilidade econômica, noque diz respeito às atividades de minera-ção, envolve a transformação de capitalmineral em capital humano. A ONU ado-ta o Índice de Desenvolvimento Huma-no (IDH), que incorpora dados da rendabruta doméstica, do nível de educação,da expectativa de vida e de outros fato-res relacionados com o desenvolvimen-to econômico. A terceira dimensão res-salta a sustentabilidade social e cultural.Mais difícil de medir, essa dimensão en-volve o que é justo ou ético - conceitossobre os quais há maior dificuldade deconcordância entre as partes envolvidas.Eggert (2000) foca essa dimensão emduas questões principais - distribuiçãoe processo. A distribuição dos benefíci-os e custos de uma mineração, por exem-plo, pode não ser justa ou equitativa.Especificamente, os benefícios vão paraos acionistas e para os governos (taxas)e, por outro lado, os custos associadossão transferidos para a comunidade lo-cal na forma de rupturas sociais, riscosambientais ou perda da identidade cul-tural. Processo, por outro lado, refere-seao modo como decisões são tomadas eo papel das várias partes interessadasnuma negociação. Nesse contexto, o pro-cesso de consulta e envolvimento daspartes interessadas na tomada de deci-são é fundamental para alcançar resulta-dos socialmente e culturalmente susten-táveis.

Para promover o desenvolvimentosustentável, as empresas de mineraçãodevem integrar as dimensões econômi-ca, social e ambiental a suas atividades(Mikesell, 1994). Precisam mudar o focode uma resposta ambiental end-of-pipe

para um tratamento mais socialmente res-ponsável. Devem forjar uma parceria com

a comunidade com base no reconheci-mento do potencial produtivo, social ecultural da comunidade, buscando umamelhoria do padrão de vida e de rendada comunidade envolvida, criando mei-os para a preservação de seus valoressociais e culturais (Epps & Brett, 2000).Finalmente, visto que as minas não du-ram para sempre, empresas de minera-ção têm sido orientadas em usar sua ca-pacidade técnica/financeira para estimu-lar governos locais no desenvolvimentode novos negócios não ligados à mine-ração (Khanna, 2000). Tal atitude, certa-mente, poderá propiciar aumento nosserviços de infraestrutura e maior ocu-pação da mão-de-obra existente, redu-zindo a pressão econômica e social so-bre a mina.

Cragg (1998) defende a adoção dosprincípios de desenvolvimento susten-tável no planejamento, operação e fecha-mento de uma mina como forma de tor-nar a atividade defensável e acreditávela longo prazo. James (2000), por sua vez,ressalta que, para a mineração atenderaos princípios do desenvolvimento sus-tentável, seus negócios devem ser trata-dos com foco no tripé - preservação am-biental, crescimento econômico e social- dentro de sua estratégia de negócios.

A difusão dos princípios de desen-volvimento sustentável trouxe três gran-des conseqüências para a mineração.Primeiro, levou à inclusão dos aspectosculturais, econômicos e sociais de umprojeto de mineração para as comunida-des locais, desde a fase de exploração,até o pós-fechamento de uma mina(Clark & Clark, 1996; Miller, 1997;Munchenberg, 1998). Atualmente, a con-sideração ambiental envolve não somen-te a preservação de um ecossistema e agarantia de segurança da comunidade.O foco mudou para uma visão mais am-pla do bem-estar humano e dos direitosdos habitantes locais, passando a se pre-ocupar com a qualidade de suas vidas ecom as gerações futuras. Segundo, osprincípios de desenvolvimento susten-tável demandam a consideração de cres-cimento econômico e preservação ambi-ental desde o início de um projeto pro-posto. Terceiro, incluem a avaliação, emnível de projeto, dos valores morais e de

ética, bem como levando em considera-ção valores subjetivos da comunidade,ao invés de apenas, enfatizar o tradicio-nal valor econômico.

Os elementos anteriormente lista-dos são intrinsecamente ligados e suge-rem que o desenvolvimento sustentávelseja avaliado numa escala mais ampla doque no nível de uma mina individual. Amineração deve, portanto, maximizar suacontribuição ao desenvolvimento sus-tentável numa escala maior. Em termospráticos, significa minimizar os impactosambientais e maximizar os ganhos eco-nômicos e sociais obtidos da explotaçãode um recurso mineral. A questão críticaestá em se atingir um equilíbrio susten-tável. Simplesmente maximizar os retor-nos econômicos e sociais não contribui-rá para o desenvolvimento sustentável.O progresso nestes três itens varia con-sideravelmente, especialmente na ques-tão social, ainda pouco desenvolvida,como exemplificado por Warhurst,Macfarlane al. (1999).

2. Estudo de casoO garimpo do Engenho Podre é

operado pela Cooperativa Regional Ga-rimpeira de Mariana - COOPERGAMA,criada em 17/04/2004 para extração deouro por draga no Rio Gualaxo do Norte(Figuras 1). Em 2005, após paralisaçãode suas atividades pela FEAM, aCOOPERGAMA conseguiu reabrir o ga-rimpo através de um Termo de Ajuste deConduta (TAC), o qual envolveu aFEAM, o IGAM, o DNPM e o MinistérioPúblico. O TAC incluía, entre outras medi-das a serem tomados pela COOPERGAMA,a elaboração e apresentação do Relató-rio de Pesquisa e do Plano de Aproveita-mento Econômico (PAE) ao DNPM e dosPlanos de Reabilitação de Degradadas(PRAD), de Controle Ambiental (PCA) eRelatório de Controle Ambiental (RCA)à FEAM. Em adição aos consultores con-tratados para elaboração dos referidosplanos, a COOPERGAMA foi tambémassistida pelo Departamento de Enge-nharia da Minas da Universidade Fede-ral de Ouro Preto, via projetos de pes-quisa financiados pela Fundação deAmparo à Pesquisa do Estado de Minas

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Gerais (FAPEMIG), com base nos edi-tais de demanda induzida para formaliza-ção de Aglomerados Produtivos Locais(APL's).

A atividade garimpeira na regiãoexiste desde a chegada dos Bandeiran-tes há mais de 300 anos. Intensa entre1700 e 1750, pode-se afirmar que, desdeentão, o garimpo tem demonstrado sus-tentabilidade enquanto atividade impor-tante para a economia e cultura da re-gião. Embora historicamente minimizadorde pressão social, o garimpo, dado aoconjunto de práticas administrativas eambientais inadequadas, está distante deatender aos princípios de desenvolvi-mento sustentável. Desse modo, o pre-sente estudo buscou avaliar a contribui-ção do garimpo de ouro para o desen-volvimento sócio-econômico e culturalde Monsenhor Horta (Mariana - MG) esuas implicações ambientais e tecer asrelações entre Desenvolvimento Susten-tável e a atividade garimpeira.

3. Metodologia

O presente trabalho consistiu emduas etapas. Uma envolveu o levanta-mento de dados sócio-econômicos doGarimpo do Engenho Podre, por meio deentrevistas com garimpeiros, cooperados(proprietários das dragas), visitas à Pre-

feitura de Mariana para coleta de infor-mações sobre o Distrito de MonsenhorHorta, de forma a permitir uma avaliaçãoda importância do garimpo no Distrito eseu impacto econômico e social. A outraconsistiu na análise dos procedimentosoperacionais e de gestão do garimpo esuas implicações no aproveitamento dorecurso mineral e no meio ambiente.

4. Resultados e

discussão

4.1 Diagnóstico sócio-

econômico

Uma análise dos dados coletadosno garimpo demonstrou:

Baixa faixa etária dos garimpeiros.A idade média de 25 anos, inferior à mé-dia nacional (33 anos), segundo BAR-RETO (2000). Os garimpeiros de Monse-nhor Horta começam mais cedo que osdo quadro nacional. A proximidade dogarimpo do Distrito de Monsenhor Hor-ta e a atratividade do ganho fácil que talatividade desperta nos jovens do localpodem se constituir na razão pelo referi-do fato. A outra é cultural - a atividadegarimpeira faz parte da cultura local hámais de 300 anos (75% dos garimpeirosdo Engenho Podre são de gerações degarimpeiros).

Baixo grau de escolaridade. Osanalfabetos representam 23% do total degarimpeiros, sendo os demais distribuí-dos em primário (62%), médio (14%) esuperior incompleto (1%). Embora Mon-senhor Horta também possua ensinomédio noturno, a baixa escolaridade dosgarimpeiros é justificada pela dificulda-de de acesso à escola (os garimpeirospassam a semana no garimpo, distante30 km do Distrito). A baixa escolaridade,por outro lado, pode justificar a atraçãopelo garimpo. De um modo geral, o ga-rimpo não requer mão-de-obra qualifica-da, tampouco melhor nível educacional.Mais ainda, a grande oferta de vagasgeradas nas mineradoras da região tempouca influência no garimpo, visto ser aexigência de segundo grau completopara tais vagas um ponto de corte consi-derável.

Renda média mensal alta dos

garimpeiros. No período do estudo, aCOOPERGAMA possuía 22 cooperados,que operavam 26 dragas no rio Gualaxodo Norte, com cinco a seis funcionáriosem cada, os quais recebem 5% da produ-ção bruta de ouro. A produção da COO-PERGAMA contabilizada de 15 de mar-ço a 15 de novembro de 2006 é apresen-tada na Tabela 1. A produção média men-sal do Garimpo do Engenho Podre cor-

Figura 1 - Mapa de localização do Garimpo do Engenho Podre (esquerda) e vista aérea do garimpo (direita).

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Desenvolvimento sustentável e garimpo - O caso do Garimpo do Engenho Podre em Mariana, Minas Gerais

respondeu a 9,1 kg de Au. Considerou-se, para os cálculos da receita gerada, ovalor do grama de ouro em R$ 40,00 (va-lor de venda no garimpo). Dessa forma,pode-se chegar a uma renda líquida mé-dia de R$ 624,28 por garimpeiro por mês.Os garimpeiros pesquisados têm em mé-

dia três anos na atividade, com um turnode trabalho de 8 horas e 5,5 dias de ser-viço por semana. Aproximadamente, 85%dos garimpeiros são responsáveis pelarenda familiar e corresponde a 26% dapopulação do distrito de MonsenhorHorta.

Pode-se, também, observar a parti-cipação da COOPERGAMA em projetossociais via doação financeira para cons-trução da igreja na localidade de Pontedo Gama, manutenção da ambulância dodistrito, ajuda à banda local nas festivida-des de comemoração dos 170 anos de suafundação e apoio aos eventos religiosos.

Tabela 1 - Resultados da Produção de ouro no garimpo do Engenho Podre.

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4.2 Diagnóstico operacional

da atividade garimpeira

O processo de extração de ouroadotado no Garimpo do Engenho Podreé rudimentar e predatório, com perdasconsideráveis na recuperação do ouro,decorrentes da ausência de uma pesqui-sa mineral sistemática, e da falta de pla-nejamento de extração e do uso de equi-pamentos rudimentares e mal dimensio-nados (Figura 2). Estudos conduzidosno Departamento de Engenharia de Mi-nas da UFOP demonstraram que a recu-peração de ouro no garimpo varia entre30 a 35%. Razões para a baixa recupera-ção incluem a utilização de equipamen-tos rudimentares (sluices), o baixo níveleducacional dos garimpeiros, o amado-rismo administrativo com implicações nadisponibilidade de peças para reparo,manutenção e reposição de motores e bom-bas e a falta de suporte técnico. Esses as-pectos implicam uma utilização predatóriae não sustentável, do ponto de vista técni-co e econômico da reserva mineral.

4.3 Diagnóstico ambiental da

garimpagem no rio Gualaxo

do Norte

O diagnóstico ambiental possibili-tou concluir que, em todo o processo deextração, separação, concentração, amal-

gamação e queima do amálgama, há inú-meros impactos ambientais e considerá-veis riscos à segurança e à saúde dosgarimpeiros. Os impactos ambientais in-cluem a supressão da mata ciliar, assore-amento do rio Gualaxo do Norte e au-mento da turbidez decorrente do lança-mento do rejeito das calhas diretamenteno leito do rio, vazamento de óleo e gra-xas, perda de mercúrio na amalgamaçãoe queima do amálgama ao ar livre semutilização de retortas. A almagamação ea queima do amálgama, em adição à au-sência de condições higiênicas adequa-das (instalações sanitárias, bebedourosetc.), além da presença de alojamentosinsalubres constituem os itens de riscosà saúde e segurança dos garimpeiros.

Mudanças no processo produtivoforam executadas durante a vigência dosprojetos de pesquisa apoiados pelaFAPEMIG e geraram resultados positi-vos, tanto na produção, como na mini-mização dos impactos ambientais e naredução dos riscos à saúde e à seguran-ça. Entre essas mudanças, destacam-sea criação de um laboratório para amalga-mação, a coleta seletiva de lixo, a instala-ção de caixas com espuma para capta-ção de óleos e graxas, que vazavam dosmotores e reservatórios e o lançamentodos rejeitos dos sluices em catas desati-vadas.

Tais mudanças, cujos objetivos fo-ram amenizar os impactos ambientais e

atender às solicitações constantes noTAC, foram plenamente aprovadas e ado-tadas no garimpo. A construção do la-boratório de amalgamação buscou aten-der a duas solicitações. Uma ambiental,que visava a minimizar o lançamento demercúrio nas margens do rio, e a outravisava a concentrar a produção em de-terminado local, de forma a melhorar ocontrole da produção por parte daCOOPERGAMA e maximizar o recolhi-mento do percentual da cooperativa.Uma secretária foi contratada para essetrabalho.

As demais mudanças tiveram focona minimização dos impactos ambientaisda atividade. Vistorias ambientais pos-teriores, executadas pela FEAM, com-provaram o sucesso dessas medidas.

Uma alteração no processo produ-tivo, entretanto, faz-se necessária paraaumentar a recuperação do ouro. No en-tendimento dos pesquisadores envolvi-dos, o que realmente ocorre no garimpoé uma mudança do ouro de local, umavez que os sluices apresentavam baixarecuperação. Entretanto modificaçõesno processo envolvem recursos finan-ceiros para aquisição de equipamentostecnologicamente mais adequados e trei-namento dos garimpeiros. Outro projetosubmetido e aprovado pela FAPEMIG,que inclui a substituição dos equipamen-tos, está sendo adotado no garimpo.

Figura 2 - Processos de desmonte hidráulico do minério e bombeamento (esquerda) deste aos sluices para concentração do ouro

em carpetes (direita). Notar descarte do rejeito diretamente no leito do rio.

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Desenvolvimento sustentável e garimpo - O caso do Garimpo do Engenho Podre em Mariana, Minas Gerais

5. Conclusões

A atividade garimpeira é vista comodegradadora do meio ambiente e do re-curso mineral, por ser predatória e rudi-mentar, além de não dispor de um plane-jamento das operações de extração dominério. As instalações de tratamento/concentração são pouco eficientes, pos-sibilitando baixa recuperação do bem mi-neral. O mesmo se faz sentir no Garimpodo Engenho Podre, onde, além dos pro-blemas ambientais inerentes da opera-ção, ocorrem perdas superiores a 40%na recuperação, segundo estudos efe-tuados no Departamento de Engenhariade Minas da UFOP.

Segundo Barreto (2001), os princi-pais impactos gerados, na etapa de pro-dução do ouro em garimpos, são: des-matamento de mata ciliar; turbidez, as-soreamento dos rios, poluição por mer-cúrio nos solos, nos sedimentos, naságuas dos rios e no ar, com conseqüên-cias na saúde ocupacional, na biota e naflora. Esses impactos foram verificadosno Garimpo do Engenho Podre, emboraa poluição por mercúrio tenha sido con-trolada, após a implantação de um pro-grama de gestão ambiental, que incluiu aconstrução de um laboratório de amal-gamação, queima do amálgama em retor-ta e disposição controlada do rejeito daamalgamação. O programa de gestão am-biental aplicado ao Garimpo do EngenhoPodre constitui uma das etapas em bus-ca da sustentabilidade ambiental da ati-vidade na região.

Embora marginal, do ponto devista técnico, a atividade garimpeiradesenvolve um papel importante comogeradora de emprego e aumento derenda, conforme dados econômicosapresentados. Os garimpeiros ligadosà COOPERGAMA representam apenas10% da população de MonsenhorHorta, mas, por outro lado, a atividade éforte geradora de riquezas para o distritocom grande impacto no comércio local,além do apoio financeiro da cooperativaem projetos sociais e culturais no local.

O desenvolvimento sustentável in-corpora estratégias ambientalmente ade-quadas para promover um desenvolvi-

mento sócio-econômico mais eqüitativo. No Garimpo do Engenho Podre, verifica-seque os funcionários envolvidos, mesmo aqueles menos alfabetizados, possuem umpoder de compra alto, quando comparados com os dados do quadro nacional, ondeaqueles com o mesmo nível de educação ganham apenas o correspondente a umsalário mínimo.

Está em andamento um projeto, na FAPEMIG, de transferência de tecnologia,aprovado dentro do Edital de Arranjos Produtivos Locais - APL's de base mineral.Esse projeto está sob a coordenação de professores do Departamento de Engenha-ria de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto e visa, além de montagem deinstalações de beneficiamento mais eficientes, ao planejamento de extração do bemmineral e à implantação de um sistema de gestão ambiental.

Paralelamente, o Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Fede-ral de Viçosa está envolvido num projeto de revegetação de mata ciliar na área doGarimpo, o qual também obteve apoio financeiro da FAPEMIG. Os projetos da UFOPe, agora, da UFV, em parceria com a COOPERGAMA, demonstram uma mudança dementalidade dos garimpos em prol de uma atividade mais satisfatória do ponto devista ambiental e sócio-econômico - ferramentas imprescindíveis para o desenvolvi-mento sustentável da atividade.

6. Agradecimentos

Os autores agradecem a FAPEMIG, pelo financiamento do projeto EDT2526/06“Agregação de valor tecnológico, funcional e ambiental na extração de ouro pordraga no rio Gualaxo do Norte” que possibilitou tal trabalho.

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Artigo recebido em 15/05/2008 e aprovado em 03/02/2009.