resumo abstract resumen objetivo:...

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COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):160-166 Uso da prótese vertical expansível de titânio para costela (VEPTR) como opção na instrumentação sem fusão para tratamento da escoliose neuromuscular The vertical expandable prosthetic titanium rib device (VEPTR) as option in spine instrumentation without arthrodesis in the treatment of neuromuscular scoliosis Uso de la prótesis vertical expansible de titanio para costilla (VEPTR como opción en la instrumentación sin fusión para tratamiento de la escoliosis neuromuscular Élcio Landim 1 Paulo Tadeu Maia Cavali 2 Marcus Alexandre Mello Santos 3 Wagner Pasqualini 4 Rodrigo Castello Branco Manhães Boechat 5 Sergio Murilo dos Santos Andrade 6 ABSTRACT Objective: report results of vertical expandable prosthetic titanium ribs (VEPTR) surgery in the treatment of neuromuscular scoliosis without spinal fusion. Methods: a total of 17 patients (mean age 8 years; 3 to 13 years) with neuromuscular scoliosis exceeding 40° of scoliosis measured using the Cobb method and presenting a Risser grade of 1 and 2 before VEPTR surgery. The degree of spinal curve was measured using the Coob method before and after surgery. Results: the postoperative mean correction ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE Trabalho realizado no Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente - AACD- São Paulo (SP), Brasil e Serviço de Cirurgia da Coluna da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil. 1 Professor do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil; Chefe do Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente - AACD – São Paulo (SP), Brasil. 2 Cirurgião de Coluna do Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente – AACD – São Paulo (SP), Brasil e Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil. 3 Cirurgião de Coluna do Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente - AACD – São Paulo (SP), Brasil. 4 Cirurgião de Coluna do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil. 5 Ortopedista, Grupo de Cirurgia de Coluna - Hospital XV – Curitiba (PR), Brasil. 6 Cirurgião do Grupo de Coluna do HUPES – Universidade Federal da Bahia – Salvador (BA), Brasil. Não há conflitos de interesse. Recebido: 11/03/2007 Aprovado: 15/01/2008 RESUMO Objetivo: demonstrar a experiência do uso de prótese vertical expansível de titânio (VEPTR) como opção para tratamento sem fusão da coluna, em pacientes com escoliose neuromuscular. Métodos: o estudo envolveu 17 pa- cientes (com média de idade de oito anos; variando de três a 13 anos) que apresentavam escoliose neuromuscular com medida pelo método de Cobb, superior a 40° e potencial de crescimento (Risser 1 e 2), tratados com VEPTR, pelo Grupo de Escoliose da AACD de São Paulo e Grupo de Cirurgia da RESUMEN Objetivo: demostrar la experiencia del uso de la prótesis vertical expansible de titanio (VEPTR) como opción, para el tratamiento sin fusión de la columna, en pacientes con Escoliosis neuromuscular. Métodos: el estudio involucró 17 pa- cientes (con promedio de edad de 8 años, variando de 3 a 13 años) que presentaron escoliosis neuromuscular medida por el método de Cobb superior a 40° y potencial de crecimiento (Risser 1 y 2), tratados con VEPTR, por el Grupo de Escoliosis de la AACD de São Paulo y el Grupo de Cirugía de la ao_52_160_166.indd 1 08-07-2008 18:14:52

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COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):160-166

Uso da prótese vertical expansível de titânio para costela (VEPTR) como opção na instrumentação sem fusão para

tratamento da escoliose neuromuscularThe vertical expandable prosthetic titanium rib device (VEPTR)

as option in spine instrumentation without arthrodesis in the treatment of neuromuscular scoliosis

Uso de la prótesis vertical expansible de titanio para costilla (VEPTR como opción en la instrumentación sin fusión para

tratamiento de la escoliosis neuromuscular

Élcio Landim1

Paulo Tadeu Maia Cavali2

Marcus Alexandre Mello Santos3

Wagner Pasqualini4

Rodrigo Castello Branco Manhães Boechat5

Sergio Murilo dos Santos Andrade6

ABSTRACT Objective: report results of vertical expandable prosthetic titanium ribs (VEPTR) surgery in the treatment of neuromuscular scoliosis without spinal fusion. Methods: a total of 17 patients (mean age 8 years; 3 to 13 years) with neuromuscular scoliosis exceeding 40° of scoliosis measured using the Cobb method and presenting a Risser grade of 1 and 2 before VEPTR surgery. The degree of spinal curve was measured using the Coob method before and after surgery. Results: the postoperative mean correction

ARTigo oRiginAL / oRiginAL ARTiCLE

Trabalho realizado no Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente - AACD- São Paulo (SP), Brasil e Serviço de Cirurgia da Coluna da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil.

1Professor do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil; Chefe do Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente - AACD – São Paulo (SP), Brasil. 2Cirurgião de Coluna do Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente – AACD – São Paulo (SP), Brasil e Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil. 3Cirurgião de Coluna do Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente - AACD – São Paulo (SP), Brasil. 4Cirurgião de Coluna do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil. 5Ortopedista, Grupo de Cirurgia de Coluna - Hospital XV – Curitiba (PR), Brasil.6Cirurgião do Grupo de Coluna do HUPES – Universidade Federal da Bahia – Salvador (BA), Brasil.

Não há conflitos de interesse.

Recebido: 11/03/2007 Aprovado: 15/01/2008

RESUMoObjetivo: demonstrar a experiência do uso de prótese vertical expansível de titânio (VEPTR) como opção para tratamento sem fusão da coluna, em pacientes com escoliose neuromuscular. Métodos: o estudo envolveu 17 pa-cientes (com média de idade de oito anos; variando de três a 13 anos) que apresentavam escoliose neuromuscular com medida pelo método de Cobb, superior a 40° e potencial de crescimento (Risser 1 e 2), tratados com VEPTR, pelo Grupo de Escoliose da AACD de São Paulo e Grupo de Cirurgia da

RESUMEn Objetivo: demostrar la experiencia del uso de la prótesis vertical expansible de titanio (VEPTR) como opción, para el tratamiento sin fusión de la columna, en pacientes con Escoliosis neuromuscular. Métodos: el estudio involucró 17 pa-cientes (con promedio de edad de 8 años, variando de 3 a 13 años) que presentaron escoliosis neuromuscular medida por el método de Cobb superior a 40° y potencial de crecimiento (Risser 1 y 2), tratados con VEPTR, por el Grupo de Escoliosis de la AACD de São Paulo y el Grupo de Cirugía de la

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161Uso da prótese vertical expansível de titânio para costela (VEPTR) como opção na instrumentação sem fusão para tratamento de escoliose neuromuscular

coluna da Universidade Estadual de Campinas. Foi realizada avaliação da curva pelo método de Cobb no pré e pós-operatório para avaliar o grau de correção. Resultados: as correções ob-tidas com o uso do VEPTR, medidas pelo método de Cobb, foi em média de 40,5º em relação à deformidade pré-operatória e, uma diminuição média, de 60,6º na obliqüidade pélvica. Conclusão: o mé-todo mostrou-se útil, com correções significativas, no tratamento provisório das Escolioses neuromusculares.

DESCRITORES: Escoliose/terapia; Fusão vertebral/métodos; Fusão vertebral/ instrumentação; Próteses e implantes

rate in spinal curve degrees achieved by the patients treated with VEPTR measured with the Coob method was 40, 5° and the mean reduction of the pelvic obliquity was 60, 6° compared to the degree of preoperatory postural evaluation. Conclusion: patients who underwent VEPTR surgery demonstrated significantly improved postural correc-tion and health-related quality of life for the provisory treatment of congenital neuromuscular scoliosis.

KEYWORDS: Scoliosis/therapy; Spinal fusion/methods; Spinal fusion/instrumentation; Prostheses and implants

columna de la Universidad Estadual de Campinas. Fue realizada una evaluación de la curva por el método de Cobb en el pre y postoperatorio para evaluar el grado de corrección. Resultados: las correcciones resultantes con el uso del VEPTR, medidas por el método de Cobb fue en promedio de 40.5º en relación a la deformidad preoperatorio y una disminución promedio de 60.6º en la oblicuidad pélvica. Conclusión: el método se mostró útil, con correcciones significativas, en el tratamiento provisorio de las Escoliosis neuromusculares.

DESCRIPTORES: Escoliosis/terapía; Fusión vertebral/métodos; Fusión vertebral/instrumentación; Prótesis e implantes

inTRoDUÇÃoA escoliose neuromuscular acomete um grupo particular de pacientes, que, devido suas doenças de base, apresentam deformidades vertebrais de comportamento distinto da escoliose idiopática. A progressão é freqüente e precoce, com curvaturas que pioram mesmo após a maturidade esquelética. Deixados sem tratamento, esses pacientes são muito prejudicados, apresentando diminuição de seu nível funcional e disfunção respiratória1.

Estudos mais recentes têm demonstrado que o encurtamento do tronco e a hipoplasia da caixa torácica não são as únicas conseqüências das deformidades de coluna severas que acometem as crianças com menos de dez anos de idade. Sabe-se que o crescimento dos pulmões é determinado pelos limites anatômicos do tórax e, portanto, qualquer deformidade da caixa torácica ou da coluna torácica, que reduza o volume do tórax, pode afetar o tamanho dos pulmões na maturidade. A diminuição volumétrica do parênquima pulmonar também significa redução da quantidade de alvéolos, que, ao longo dos anos, levará à Síndrome de Insuficiência Torácica e óbito por cor pulmonale2.

A escoliose é uma deformidade complexa e tridi-mensional da coluna que pode ser tratada com órteses (coletes) ou cirurgia com fusão espinhal para evitar a progressão da deformidade3-4. O tratamento conservador com órtese não é invasivo e mantém o movimento da coluna e sua mobilidade. Entretanto, não permite a correção das curvas e previne, modestamente, a sua progressão, sendo ainda menos efetivo nas deformidades neuromusculares e oferecendo riscos, inclusive, como lesões cutâneas em crianças com déficit de sensibilidade.

O tratamento cirúrgico das escolioses, baseado na instrumentação da coluna e fusão, permite a adequada correção da deformidade e prevenção de progressão.

Porém, é uma modalidade de tratamento que apresenta riscos, os quais estão ligados à morbidade da cirurgia e risco anestésico5-6. Além disso, os estudos de Campbell2 indicam que uma artrodese espinhal, em crianças de até 5 anos de idade, comprometem a capacidade pulmonar ao final do crescimento em torno de 50%.

A cirurgia de correção de escoliose sem fusão pode oferecer vantagens que não são conseguidas nos tratamentos convencionais, com o objetivo de interromper a progressão da doença e permitindo o crescimento da coluna. Trata-se de um princípio de tratamento que pode ser realizado de diferentes modos, incluindo: grampos de inserção endoscópica, plicaturas nas convexidades das curvas e modulação do crescimento. Tais sistemas foram bem demonstrados em estudos experimentais7-9.

A estabilização da coluna vertebral sem fusão, aplicada em pacientes, foi inicialmente descrita por Harrington10 e apresentou resultados precários devido à fusão parcial resultante da dissecção subperiosteal da musculatura paravertebral, por ocasião do acesso cirúrgico à coluna vertebral. A ausência de suporte externo protegendo as hastes nessa técnica descrita também provocava deslocamento dos ganchos e quebras nas hastes, levando à falha do procedimento.

Relatos e descrições de outros autores sugeriam a utilidade desta técnica em pacientes menores de dez anos de idade, com graves deformidades vertebrais, que não respondiam ao tratamento conservador com órteses e ainda muito jovens para serem submetidos à artrodese de coluna vertebral11-12.

Esse princípio de tratamento cirúrgico mostrou-se útil nas deformidades espinhais de etiologia neuromuscular e congênita acometendo crianças de baixa idade.

A fim de tratar pacientes com escoliose congênita em baixa idade e restrição do desenvolvimento do tórax em

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162 Landim E, Cavali PTM, Santos MAM, Pasqualini W, Boechat RCBM, Andrade SMS

virtude da deformidade e de fusão de arcos costais foi desenvolvido o dispositivo Vertical Expandable Prosthetic Titanium Rib (VEPTR), (Synthes Spine Co®., West Chester, Pennsylvania, USA) ou Prótese Vertical Expansível de Titânio. Tal implante permite a estabilização indireta de deformidades espinhais sem artrodese, com fixação nas costelas, lâminas e pelve, permitindo até mesmo alongamentos.

Campbell2 sugere a aplicação do VEPTR em deformidades espinhais neuromusculares em crianças, funcionando como uma instrumentação indireta da coluna, sem artrodese13. Hell et al. trataram seis pacientes demonstrando bons resultados na aplicação do VEPTR em escoliose neuromuscular14.

No presente estudo, o objetivo é demonstrar a experiência inicial do uso do VEPTR como um tutor interno para o tratamento de escoliose sem fusão espinhal em crianças portadoras de doenças neuromusculares.

MÉToDoSDe Janeiro de 2005 a Maio de 2006, foram tratados pelo Grupo de Escoliose da AACD de São Paulo e Grupo de Cirurgia de Coluna da Universidade Estadual de Campinas, 31 pacientes portadores de deformidade espi-nhal com o VEPTR (dispositivo em seu desenho de quarta geração, desenvolvido pela Synthes Spine®, West Chester, Pennsylvania). Nesse estudo, foram incluídos 17 casos que preencheram os critérios: deformidades com Cobb superior a 40º ou escoliose neuromuscular progres- siva documentada; imaturidade esquelética (Risser menor que 2); pacientes com insuficiência respiratória associada e comprovada clinicamente ou por exames laboratoriais (gasometria, provas de função pulmonar) ou de imagem (tomografia de tórax indicando reduzido espaço pulmonar). Excluiu-se pacientes com defor-midades graves no plano sagital.

Avaliação pré-operatória e pós-operatóriaOs dados a serem obtidos incluíram idade, tipo de doença neuromuscular, magnitude da deformidade pelo método de Cobb, flexibilidade da curva, obliqüidade pélvica, freqüência de infecções respiratórias graves, dificuldade respiratória prévia à cirurgia, necessidade de suporte ventilatório, valor da correção obtido após a primeira cirurgia e nas sucessivas distrações do sistema, melhorias no padrão respiratório após cirurgia e complicações ocorridas com o dispositivo. O tempo de seguimento mínimo foi de oito meses.

As avaliações pré-operatória, pós-operatória imediata e pós-operatória tardia das deformidades de coluna foram realizadas com radiografias para escoliose, em duas posições (frente e lateral), em posição ortostática ou sentada, como de habitual no exame das deformidades vertebrais.

Técnica cirúrgicaTodos os pacientes foram submetidos à cirurgia sob anestesia geral inalatória com colocação do VEPTR com uma ou duas hastes, em montagens com fixações do tipo costela-costela ou Costela-

ilíaco (Figura 1). O pós-operatório imediato foi realizado em unidade de terapia intensiva com fisioterapia respiratória. Em todos os pacientes foi feita profilaxia antibiótica com Cefalotina 100 mg/kg/dia por 48 horas e Amicacina 15mg/kg/dia por 24 horas. Os alongamentos do sistema foram realizados a cada quatro meses, também em ambiente hospitalar, sob anestesia geral e com 48 horas de profilaxia antibiótica. Em nenhum paciente foi utilizada proteção externa ou órtese no pós-operatório da cirurgia primária ou distrações. Todos mantiveram seu programa habitual de reabilitação, apenas não sendo recomendados exercícios que envolvessem flexão do tronco. As transferências dos pacientes de leito, cadeiras, ou deambulação foram mantidos da maneira habitual após a colocação do VEPTR. A cada quatro meses era realizado alongamento do sistema com os pacientes internados, a fim de obter melhora das correções obtidas ou evitar sua piora (Figura 2).

Figura 1Montagem habitualmente realizada na concavidade da escoliose

Fonte: Campbell RM Jr et al.2

Figura 2Alongamento do sistema

Fonte: Campbell RM Jr et al.2

RESULTADoS Do total de 17 pacientes, seis eram do sexo masculino e 11 do sexo feminino. A média de idade encontrada no grupo foi de oito anos, variando de 3 a 13 anos. As doenças neuromusculares encontradas incluíram: mielomeningocele torácica, mielomeningocele lombar, paralisia cerebral, artrogripose e mielite transversa (Tabela 1).

Com relação a doenças respiratórias secundárias às patologias neuromusculares primárias, observou-se dois casos de pacientes com dispnéia e infecções respiratórias graves repetidas, que necessitavam de máscara de O2 constante. Em um caso, a doença de base era mielite transversa e, em outro, paralisia cerebral.

A média dos valores de Cobb encontrada foi de 80o variando de 40º a 147º. O valor médio de Cobb obtido nas radiografias em tração foi de 61,3º com variação de 30º a 105º Em média, portanto, a flexibilidade das curvas foi de 23,4% e as variações de Cobb sem tração e com tração podem ser verificadas no Gráfico 1 e Tabela 1. Onze pacientes apresentavam obliqüidade pélvica, com média de 24,1º (12º - 50º), conforme exemplo do paciente 16 (Figuras 3 e 4).

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COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):160-166

Caso e

doença

(1) Mielo torácica

(2)Mielo torácica

(3)Paralisia cerebral

(4)Paralisia cerebral

(5)Mielo lombar

(6)Mielo torácica

(7)Mielo torácica

(8)Paralisia cerebral

(9)Mielo lombar

(10)Mielo torácica

(11)Artrogripose

(12)Mielo torácica

(13)Mielite transversa

(14)Mielo torácica

(15)Mielo torácica

(16)Mielo torácica

(17)Paralisia cerebral

idade

6

13

7

7

9

11

9

4

10

12

10

13

8

7

10

3

11

Cobb

inicial

76º (T11-L3)

40º (T2-T11)

147º (T4-L2)

65º (T5-L4)

73º (T9-L5)

65º (T10-L5)

48º (T1-T10)

72º (T6-L4)

72 (T10-L5)

48 (T1-T10)

57º (T8-L5)

52º (T2-T11)

80º (T7-L4)

100º (T7-L4)

103º(T5-L4)

108º(T4-L5)

52º (T8-L4)

63º (T5-T10)

95º(T6-L4)

50º (T4-L2)

Cobb

r-X

tração

30º

30º

105º

50º

35º

60º

50º

50º

60º

45º

35º

30º

37º

60º

87º

47º

43º

60º

45º

30º

Cobb

Pós-op

40º

30º

110º

50º

38º

55º

50º

48º

68º

50º

25º

21º

50º

55º

78º

30º

48º

45º

35º

26º

Cobb 1ª.

Alongamento

ou retirada

65º

40º (retirada)

140º (retirada)

-

35º

50º

48º

55º

65º

50º

-

-

45º

55º

78º

28º

28º

40º

-

-

obliqüidade

pélvica inicial

15º

50º

-

28º

22º

22º

22º

-

30º

12º

-

-

22º

18º

45º

-

obliqüidade

pélvica final

15º

12º

-

16º

14º

14º

-

-

-

12º

10º

20º

-

Tabela 1 – Variação de Cobb e obliqüidade pélvica

Fonte: Hospital Abreu Sodré – AACD – Hospital as Clínicas da UNICAMP

163Uso da prótese vertical expansível de titânio para costela (VEPTR) como opção na instrumentação sem fusão para tratamento de escoliose neuromuscular

gráfico 1 - Variação do Cobb raio-X ortostático e raio-X sob tração

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Os valores de Cobb, obtidos com o uso do sistema em radiografias de controle no pós-operatório imediato, corresponderam em média a um ângulo de 47,6º (21º a 110º), perfazendo uma correção média de 32,4º ou de 40,5% em relação à deformidade original e em alguns casos com uma correção superior, como exemplo do paciente 16 (Figuras 5 e 6). Cada caso pode ter sua correção imediata e tardia (primeiro alongamento) avaliado no Gráfico 2. Os valores angulares no pós-operatório imediato aproximaram-se dos valores das radiografias com tração na maioria dos casos, havendo tendência à diminuição do potencial de correção das curvas em fase tardia e no primeiro alongamento com quatro meses.

As complicações incluíram infecção profunda em três pacientes, sendo que todos os pacientes foram tratados em regime hospitalar com antibioticoterapia endove-nosa e desbridamento da ferida no centro cirúrgico. Em dois casos não houve resolução do quadro e ocorreu exposição do im-plante, que foi retirado com resolução da infecção, sendo optado aguardar pa-ra realizar fusão espinhal definitiva. O terceiro paci-ente com infecção também apresentou exposição do implante, que foi resolvido com procedimento de ci-rurgia plástica de rotação de retalho miocutâneo. Outra complicação foi a fratura de costela no ponto de inserção da parte proximal

Figura 3Paciente # 16, masculino, três anos de idade, mielomeningocele. Valor do ângulo de Cobb 95º(45º sob tração)

Figura 4Paciente # 16, masculino, três anos de idade, mielomeningocele. Observar que no plano sagital do paciente não apresenta curvaturas acentuadas

Figura 5Paciente# 16, masculino, três anos de idade, mielomeningocele. Pós-operatório imediato, realizadas duas montagens com o VEPTR tipo costela-ilíaco corrigindo, significativamente, a deformidade espinhal e a obliqüidade pélvica. O paciente apresentou melhora no equilíbrio de tronco e habilidade para sentar

Figura 6Paciente # 16, masculino,

três anos de idade, mielomeningocele. A imagem demonstra o posicionamento

dos dispositivos no perfil

gráfico 2 - Variação do Cobb no pré-operatório, r-X sob tração, pós-operatório imeiato e pós-operatório tardio

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do dispositivo. Ocorreu na primeira semana de pós-operatório com paciente apresentando dor intensa em região posterior da costela e perda da correção obtida. Houve necessidade de reintervenção com colocação do gancho de costela do dispositivo em arco costal mais proximal e resistente, havendo boa evolução. Os casos em que houve remoção do implante correspondem ao paciente # 1 e ao paciente # 2, e as deformidades retornaram aos valores iniciais, antes das intervenções. A taxa de complicação observada foi, portanto, de 23,5%.

DiSCUSSÃoEstudos já demonstraram a aplicação do VEPTR na Síndrome de Jarcho-Levin, que envolve escoliose congênita e fusão de costelas e que as distrações na concavidade das curvas produziam crescimento de barras ósseas (não segmentadas). Logo, sua indicação em deformidades congênitas é bem fundamentada12-13.

O sistema VEPTR também encontrou sua aplicação como tutor interno no tratamento da escoliose neuromuscular14. Experiências recentes em pacientes portadores de doenças neuromusculares foram publicadas, com casuística de seis pacientes, demonstrando que o tratamento com esse implante provocava melhorias significativas dos valores angulares das deformidades e da habilidade de sentar desses pacientes14.

Nos 17 pacientes do presente estudo, as correções obtidas no primeiro pós-operatório foram semelhantes ou superiores aos valores angulares nas radiografias com tração na maior parte dos casos, ou seja, treze deles. Todos esses pacientes apresentaram melhora na habilidade de sentar obtendo-se resultados semelhantes à literatura14. Os casos que apresentaram piora nas deformidades angulares na evolução tardia se explicam pela remoção das montagens devido quadros de infecção local sem resposta ao tratamento. Casos onde a correção obtida não foi semelhante ou superior aos valores de radiografias com tração podem ser explicados pela curva de aprendizado da técnica. Essas variações podem ser vistas no Gráfico 2.

Vantagens observadas nesta técnica, em relação às demais formas de insturmentação sem fusão, incluíram o acesso paravertebral sem desperiostização da coluna, o que, em crianças, por si só, produzia fusão espinhal. A técnica também é pouco invasiva, leva a sangramento não significativo e permite a realização das distrações por meio de pequeno acesso, apenas sobre uma parte do dispositivo. Além disso, em nenhum momento há a necessidade de uso de órtese ou algum outro tipo de suporte externo.

A técnica de instrumentação sem fusão de Harrington, Marchetti et al. e Moe et al.10-12 envolvia a dissecção subperiostal nas vértebras da extremidade da curva, com colocação de ganchos. A haste para unir esses dois ganchos era inserida no subcutâneo. O paciente era mantido em alguma imobilização externa e em intervalos de quatro ou seis meses era realizado novo procedimento

de alongamento com acesso limitado ao ponto de distração do implante. As distrações eram realizadas enquanto fosse necessário até o crescimento do tronco do paciente e maturidade esquelética, quando, então, era realizada a fusão espinhal definitiva. Muitos casos evoluíram com fusão espinhal espontânea devido à desperiostização e, além de ser freqüente a soltura dos ganchos nos pontos distais da instrumentação e de infecções10. Outros estudos demonstraram o elevado índice de complicações com quebra dos implantes e soltura em 15 casos de 16 pacientes operados (93,75%) e que foram acompanhados por dois anos. A freqüência de infecção atingiu 25% dos casos tratados15.

As desvantagens do VEPTR incluem a baixa capa-cidade do implante de se moldar em contornos sagitais exagerados, contra-indicando o seu uso nesses casos, por impossibilidade técnica. A desperiostização da costela também deve ser evitada, pois isso facilita a fratura da costela onde se prendem os ganchos. Nessa série, um caso sofreu fratura de costela com necessidade de reintervenção na primeira semana de pós-operatório, não prejudicando o grau de correção obtido.

Os resultados prévios da aplicação do método foram satisfatórios, uma vez que se obteve uma correção média de 40,5% nas deformidades, superando os valores obtidos nas radiografias sob tração. Houve também melhora média de 60,6% na obliqüidade pélvica, que resultou numa melhoria da habilidade de sentar de todos os pacientes. As correções obtidas nas cirurgias tardias para alongamento do sistema foram menos significativas, podendo indicar que as curvas estão próximas do limite de correção sem a intervenção direta na coluna vertebral. Cada caso pode ter sua correção imediata e tardia (primeiro alongamento) avaliada no Gráfico 2. Os valores angulares no pós-operatório imediato superaram, portanto, os valores das radiografias sob tração na maioria dos casos, havendo tendência à diminuição do potencial de correção das curvas em fases de alongamento, que permaneceram numa média de Cobb de 54,8º, valor próximo ao obtido na primeira cirurgia.

A taxa global de complicações no presente estudo é de 23,5%, incluindo três casos com infecção e um caso com fratura da costela proximal em que se fixava o dispositivo. Campbell2 apresenta 27 pacientes em uso do VEPTR com seguimento mínimo de três anos havendo 1,9% de infecção em média nos seus procedimentos cirúrgicos. Entretanto, o referido autor apresentou apenas cinco pacientes sem nenhum tipo de complicação e a mais comum foi a soltura do gancho fixo à costela proximal. Neste estudo, houve um menor índice de soltura do implante por fratura de costela, provavelmente devido ao fato de o tempo de seguimento ser restrito a oito meses. Os maiores índices de infecção desse estudo podem ser explicados pelo perfil de pacientes, uma vez que os portadores de mielomeningocele são sabidamente um grupo que apresenta maior risco de desenvolver infecções pós-operatórias.

165Uso da prótese vertical expansível de titânio para costela (VEPTR) como opção na instrumentação sem fusão para tratamento de escoliose neuromuscular

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Page 7: RESUMo ABSTRACT RESUMEn Objetivo: Métodosplataformainterativa2.com/coluna/html/revistacoluna/volume7/160... · 1Professor do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade

COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):160-166

Correspondência

Sérgio Murilo dos Santos Andrade

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E-mail: [email protected]

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166 Landim E, Cavali PTM, Santos MAM, Pasqualini W, Boechat RCBM, Andrade SMS

ConCLUSÃoO VEPTR mostrou-se útil no tratamento provisório das escolioses neuromusculares e na função de um tutor interno temporário. Correções significativas foram obtidas com cirurgia de baixa morbidade e sustentadas por período de oito meses. Estudos futuros com maior amostragem e maior tempo de seguimento poderão demonstrar a aplicação do sistema por tempo prolongado, até a maturidade esquelética.

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