roy wagner - a pessoa fractal

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Ponto Urbe:Traduções A pessoa fractal (http://www.pontourbe.net/edicao8traducoes/168a pessoafractal) WAGNER, Roy. “The Fractal Person”. In: Marilyn Strathern e Maurice Godelier (org.). Big Men and Great Men: Personifications of Power in Melanesia. Cambridge: Cambridge University Press, 1991. Roy Wagner Tradução: Christiano Key Tambascia e Iracema Dulley Revisão técnica: Ariel Rolim Oliveira e Daniela Ferreira Araújo Silva [Comentário dos organizadores:] Wagner revisita o material das terras altas [da Papua Nova Guiné] com base em sua própria perspectiva austronésia da Nova Irlanda. Ele coloca em questão os diferentes tipos de compreensão antropológica utilizados para retratar os great men e os big men [1] . Os últimos são vistos como modelos de atividade sociológica, como forças sociais mobilizadoras, pois parecem mudar a escala das ações dos homens de uma dimensão do indivíduo para uma do grupo devido aos contingentes que lideram. Mas os sistemas de great men obrigamnos a compreender uma socialidade – e uma totalidade – preexistentes, da qual qualquer agregado só pode ser uma realização parcial. Essa totalidade não é nem um indivíduo, nem um grupo, mas uma pessoa “fractal”, uma entidade cujas relações (externas) com os outros são parte integrante de si (internas). Não importa o quão reduzida ou ampliada seja, a pessoa fractal, ao manter sua escala, reproduz apenas versões de si mesma. O great man, assim, representa a “escala” de sua cultura, e não uma mudança de escala para acomodar as tentativas antropológicas de fundamentála em princípios para além de si mesma. Se temos aqui uma ciência social nativa, a questão passa a ser como, então, conceber os big men do ponto de vista dos entendimentos desse tipo que os sistemas de great men são capazes de eliciar dos cientistas sociais ocidentais. Devemos ao marxista italiano Antonio Gramsci a noção de ideias hegemônicas (1971), de conceitos que passaram a ser tomados de tal maneira como dados que parecem ser a própria voz da razão. Ideias desse tipo não são subconscientes, nem passam despercebidas, pela mesma razão pela qual sua validade não está sujeita a questionamento; elas são a própria forma que nossa consciência assume em relação a um problema ou a uma questão. As ideias hegemônicas, assim, não estão mais sujeitas a prova ou refutação do que os paradigmas kuhnianos, pois em ambos os casos, adentrar o discurso equivale a substituir a questão de se as coisas funcionam de uma determinada maneira pela questão de como elas funcionam desse modo. Assim, podese esperar dos antropólogos que investem seu interesse de pesquisa no tema hegemônico, digamos, na dinâmica necessariamente social do pensamento humano, que falhem e compreendam mal um desafio a esse tema no que diz respeito ao seu fracasso em fornecer um “como” convincente, sem perceber a irrelevância de

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A pessoa Fractal

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PontoUrbe:TraduesApessoafractal(http://www.pontourbe.net/edicao8traducoes/168apessoafractal)WAGNER,Roy.TheFractalPerson.In:MarilynStratherneMauriceGodelier(org.). Big Men and Great Men: Personifications of Power in Melanesia. Cambridge:CambridgeUniversityPress,1991.RoyWagnerTraduo:ChristianoKeyTambasciaeIracemaDulleyRevisotcnica:ArielRolimOliveiraeDanielaFerreiraArajoSilva[Comentriodosorganizadores:]Wagnerrevisitaomaterialdasterrasaltas[daPapuaNovaGuin]combaseemsuaprpriaperspectivaaustronsiadaNovaIrlanda.Elecolocaemquestoosdiferentestiposdecompreensoantropolgicautilizadospararetratarosgreatmeneosbigmen[1].Osltimossovistoscomomodelosdeatividadesociolgica,como foras sociais mobilizadoras, pois parecem mudar a escala das aes dos homens deuma dimenso do indivduo para uma do grupo devido aos contingentes que lideram. Masossistemasdegreatmenobrigamnosacompreenderumasocialidadeeumatotalidadepreexistentes,daqualqualqueragregadospodeserumarealizaoparcial.Essatotalidadeno nem um indivduo, nem um grupo, mas uma pessoa fractal, uma entidade cujasrelaes(externas)comosoutrossoparteintegrantedesi(internas).Noimportaoquoreduzidaouampliadaseja,apessoafractal,aomantersuaescala,reproduzapenasversesdesimesma.Ogreatman,assim,representaaescaladesuacultura,enoumamudanadeescalaparaacomodarastentativasantropolgicasdefundamentlaemprincpiosparaalm de si mesma. Se temos aqui uma cincia social nativa, a questo passa a ser como,ento,conceberosbigmendopontodevistadosentendimentosdessetipoqueossistemasdegreatmensocapazesdeeliciardoscientistassociaisocidentais.Devemos ao marxista italiano Antonio Gramsci a noo de ideias hegemnicas(1971), de conceitos que passaram a ser tomados de tal maneira como dados que parecemser a prpria voz da razo. Ideias desse tipo no so subconscientes, nem passamdespercebidas,pelamesmarazopelaqualsuavalidadenoestsujeitaaquestionamentoelassoaprpriaformaquenossaconscinciaassumeemrelaoaumproblemaouaumaquesto.Asideiashegemnicas,assim,noestomaissujeitasaprovaourefutaodoqueosparadigmaskuhnianos,poisemambososcasos,adentrarodiscursoequivaleasubstituiraquestodeseascoisasfuncionamdeumadeterminadamaneirapelaquestodecomoelasfuncionam desse modo. Assim, podese esperar dos antroplogos que investem seuinteressedepesquisanotemahegemnico,digamos,nadinmicanecessariamentesocialdopensamento humano, que falhem e compreendam mal um desafio a esse tema no que dizrespeitoaoseufracassoemfornecerumcomoconvincente,semperceberairrelevnciadesuasobjees.Aoposioentreindivduoesociedade,produtodajurisprudnciaedaideologiapoltica ocidentais, no s coincide com a hegemonia do pensamento social, como idnticaaele.Elasebaseiananoonecessariamenteideal,epraticamenteirrealizvel,doconceito de social, bem como na noo necessariamente substantiva, fsica e material dapessoa como objeto. Assim, o ideal de corporatividade, fuso ostensiva de indivduos emumnicocorposocial,tornase,emseufracassoemalcanarplenarealizao,umgruposubstantivodeindivduos.Eanoodeumaculturaderepresentaocoletivatotalmenteintegrada no interior do indivduo tornase, ao fracassar em sua realizao, um meroconceitodecultura, um ideal. A questo no simplesmente que uma oposioequivocada e no realista entre pensamento e substncia reproduzse como um fato socialmensurvel,queosgrupossociaiseasculturasidealizadassoproduzidosemmassacomoum mapa de variao e problemtica sociocultural. Mais importante, a questo que umadependnciaingenuamentehegemnicaemrelaoindividualidadeepluralidadesubjazearticulaamaneiracomooconceitoidealizadoeoobjetosubstantivosocolocadosem relao. Essa dependncia faz com que os fracassos do conceito, produtores de fatos eproblemas,sejamtotalmenterealizados,doobjetosubstantivoaoconceitualmentetratvelfaz com que eles paream um fato irredutvel, constituindo o prprio tecido da realidadesocial.Assim, enunciar uma proposio como nenhuma sociedade funciona de formaperfeita,oumesmoarazopelaqualnenhumasociedadefuncionadeformaperfeitaqueseus membros esperam que ela o faa descrever as expectativas dos prpriosantroplogos,enoasdeseussujeitosdepesquisa.Poisoquedescritoamaneiracomoos cientistas sociais operam para tornar seus sujeitos interessantes, estatisticamentevariveis e problemticos. No est de modo algum claro que os sujeitos pensam sobre simesmosdessamaneira,ouquepensamquesuasinteraessociaissointeressantesporquepodemsermapeadasemparadigmasdeagrupamentossociaisevariabilidadeindividual.A ideia de um mecanismo social, ou aquela do indivduo e sua resistncianatural, no surgiu de forma nativa na Melansia ela foi levada para l junto com outrosmecanismos por indivduos autoconscientes. Assim, a proposio de que uma sociedadepode ou no funcionar causa, em termos nativos, o mesmo tipo de surpresa que causa aproposiodequeummotordeautomvelpodeounofuncionar.Masafalhadeummotorde automvel, ou da sociedade conforme a construo ocidental, no leva a uma revisocompletadenossossupostossobremecnicaelaenvolveumarevisodomotor,domodelo,antes de a mecnica comear a funcionar. Uma hegemonia da mecnica doindivduo/sociedade, com seus fundamentos no particular/geral, deslocaseautomaticamentedequestessobreoporqu?paraquestessobreocomo?.Portanto,umadescobertadeque,aomenosparaalgunsmelansios,adistinoparte/todo e sua implicao sistemtica so inaplicveis no implica automaticamente queaquelesmelansiospertencemaumaraadesbiosmatemticos.Seumadescobertadessetipo sugere que o fracasso do conceito de social, produtor de indivduos e pessoas, e ofracasso da autonomia individual, produtora de sistema, so construes teimosas domotor errado, isso pode significar simplesmente que o pensamento melansio elegantementesimplesdemais,enocomplexodemais,paraasexpectativasocidentais.Ummotorsempartesmveisaomenosevitaanmesedoatrito.Eoatritobempodeseroefeitoqueoscientistassociaiserroneamentetomamcomovantagemsocial.Ou ao menos isso que a concepo de big man que nos chega sugeriria: umimperadordoatritosocialqueusaasociedadecontraelamesmapararestauraroindivduoessencial ao pice. Em sua identificao do fenmeno do great man, Godelier props umprofundodesafioaonossoentendimentodassociedadesmelansias.Apresentadocomoumtipo ou outra espcie de lder, o greatman fornece um contraexemplo ao bigman que afamiliaridade e o excesso de uso inflaram muito alm da sofisticada caracterizao deSahlins (1972). Mas a mera tipologia s pode trivializar o desafio, que adquire relevncia eautoridadeemgrandemedidaapartirdocontextodaetnografiabaruya.PoisTheMakingofGreatMenpropeumavvidaanttesenooautojustificantedesociedadesfrouxamenteestruturadas que absorveu a especulao etnogrfica por muitos anos. O maior desafioconsiste em chegar a um modo de pensamento mais holista do que aquele implicado pelaestrutura,eogreatmansuacontraparteholista.Ser o big man seu equivalente em um outro tipo de sociedade, mais aberta,competitiva e frouxamente organizada? Ou ser essa tipificao do big man ela mesma oerro de uma outra forma de abordar a sociedade, e portanto no um contraste tipolgico,emabsoluto?Consideremosolocusclassicusetnogrfico.Nemindivduo,nemgrupoOs antroplogos sempre se viram obrigados a e mesmo se sentiram satisfeitos em construir foras sociais a partir da evidncia de um big man que reunia, digamos, seusrecursos para uma moka[2]. Contanto que ele possa ser visto realizando algum tipo desolidariedade, ajudando o grupo a acontecer, a sociologia imputada a ele adquire umarealizaoimediataebvia.Aquestoqueaideiadogreatmancolocaoquefazerquandoasociedadeesuasolidariedadejestopostas.Ento,claro,osesforosdobigman tmde ser reconsiderados ou renomeados ele no est encenando a resposta a uma questosociolgica, pois esta j foi respondida. Mas se sugerssemos que ele est realizando suasprprias aspiraes individuais, a projeo da economia poltica ocidental forneceria umaoutra resposta fcil: vse a sociologia emergir dos efeitos associados competioindividual.Qualquerumquejtenhatentadodeterminarolocusdefinitivodoindivduoedo grupo corporado no planejamento e na realizao dessas trocas competitivas logopercebequeindivduoegruposoalternativasfalsas,assimduplamenteimplicadasporqueuma remete outra. Afinal, difcil ou impossvel definir o empreendedor bemsucedido(oumalsucedido)damokacomoumindivduoouumgrupo,poisobigmanaspiraaalgoqueasduascoisasaomesmotempo.Podesedizerqueobigmanhagenaspiraaostatusdegreatmanequeamokaproduzexemplosvariveisdegreatman,igualmentevlidosa despeito de quo bemsucedidos ou malsucedidos sejam. Tratase da realizao de algoquejestl,assimcomoosporcoseasconchasjestol.Faria alguma diferena, ento, argumentar que o status e a sociedade nuncaesto realmente l, que a imagem sempre realizada pela primeira vez, ou mesmo que elapode nunca ser realizada de fato? Absolutamente nenhuma. A sociedade hagen est l ouno,sejaamokarealizadaounoobigmanpermaneceumbigman a despeito da formadesuarealizao.Seaquestofossefazerasociedade,entoofracassodeumamokafariadiferena.Tomei emprestada uma ilustrao da sociedade hagen (cf. [Strathern, 1991]), epropositadamente tornei nossa projeo normal da motivao e da agncia sobre seusatores oblqua e difcil, com um propsito muito especfico: desenvolver, no decorrer desteensaio,oconceitodepessoadeMarilynStrathern,quenonemsingular,nemplural.Aoapresentarsuaideia,Strathern(1990)tomouemprestadadeHaraway(1985)umaaplicaoextremamente engenhosa do termo clssico da fico cientfica, ciborgue o ser integralquepartehumano,partemquina.Noquetangeaosmeuspropsitos,eporrazesquesetornaro evidentes aqui, darei um novo ttulo ao conceito, denominandoo pessoa fractal,segundo a noo matemtica de uma dimensionalidade que no pode ser expressa emnmerosinteiros.Nomeocuparei,aqui,dograudefractalidade,nemdostermosdarazoou frao simplesmente definirei o conceito de uma pessoa fractal em contraposio singularidadeoupluralidade.Emboraaideiadefractalidadepossaparecerabstrata,naverdadenoomaisdoqueaideiadesingularidadeoupluralidade,oudeanliseestatstica.Seusefeitossopordemais familiares ao pesquisador de campo como o problema, por exemplo, de asaspiraesdobigmanseremaomesmotempoindividuaisecorporativas.desteproblemaque se trata, apreendido como soluo. Ele tambm reside na raiz do que costuma sererroneamente interpretado como a extenso dos termos de parentesco, exemplificado nouso siane (Salisbury, 1964), em que qualquer filha de uma unidade para a qual a classe dopai doou uma noiva se torna uma hovorafo (filha da irm do pai), uma esposa empotencial. Como foi corretamente deduzido por Salisbury, o pai, aqui, no necessariamenteidentificadoaumditotermodeparentescoprimrio,enonemsingular,nemplural.Otermotemumaimplicaofractal,igualmenteaplicvelaambasassituaes.Uma pessoa fractal nunca uma unidade em relao a um agregado, ou umagregado em relao a uma unidade, mas sempre uma entidade cujas relaes estointegralmente implicadas. Talvez a ilustrao mais concreta da relao integral venha danoo generalizada de reproduo e genealogia. As pessoas existem do ponto de vistareprodutivo ao serem gestadas como parte de outra pessoa, e gestam ou engendramoutrasaosetornaremfatoresgenealgicosoureprodutivosdessasoutras.Umagenealogia, pois, um encadeamento de pessoas, como, de fato, as pessoas seriam vistas brotandoumas das outras em uma representao cinemtica acelerada da vida humana. A pessoacomo ser humano e a pessoa como linhagem ou cl so igualmente seccionamentos ouidentificaesarbitrriosdesseencadeamento,diferentesprojeesdesuafractalidade.Masdisso decorre que o encadeamento por meio da reproduo corporal , ele mesmo, apenasuma entre as inmeras instanciaes[3] da relao integral, que tambm se manifesta, porexemplo,nocartercomumdalinguagemcompartilhada.No ser isto, ento, apenas algo genrico, uma fico matemtica como apersonalidademodal?Defatooseriaseeuestivessepreocupado,aqui,emgeneralizarouparticularizar a relao entre o geral e o particular. Mas a relao integral no umaquesto de geral e particular, nem de como um pode ser transformado no outro. Oargumento no diz respeito realidade comparativa ou praticalidade, mas a como asrealidades ou questes prticas de algum se situam no que diz respeito relao. A nicaquestosobreaqualprecisamosnosdetercomoosprpriosmelansiosparecemsitulas.Aquestorequerevidncias,eamelhorevidnciaemqueconsigopensarvemdomodo como os melansios, de forma nativa, exprimem, ordenam e conceitualizam aexistnciacomoidentidade.Essanomeaodaexistncia,muitosimplesmente,aqueladanominao[4], pois afinal so os nomes, e no os indivduos ou os grupos, que ascendemnamoka, que suscitam reverncia, ateno e responsabilidade no Kula, que servem, comograndes ou pequenos, s identidades daquilo que estamos predispostos a chamar degrupos linhagens, cls ou o que quer que seja. A despeito da amplitude de suadenominao, seja ela pessoal ou coletiva, nomes so apenas nomes mas se trata de umnome que ao mesmo tempo a aspirao individual e coletiva dos big men. Um amigodaribiumavezobservou:Quandovocvumhomem,elepequenoquandovocdizseunome,elegrande.O exemplo que utilizarei o da nominao daribi. Um nome daribi, nogi, sempre uma instanciao, e tambm uma simplificao, da relao designada peloparticpio,poai,doverbopoie, ser congruente com. Duas pessoas, ou uma pessoa e umacoisa,quepartilhamomesmonomesotedelinogipoai,congruentesporumnome.Doisseresquepartilhamomesmotipodepelesotedelitigiwarepoae,congruentesporumaepiderme.Qualquercoisaquepossaserdesignadaporumapalavraestemrelaodepoaipormeiodequalquerpontodesemelhanaconcebvel.Ademais,quaisquerduaspessoasoudoisobjetosquepartilhem,cadaqualporsuavez,qualquerpontodesemelhanaconcebvelcom um terceiro, esto relacionados como poai por meio desse terceiro. O poai universalmente comutativo, e porque uma relao de poai pode simplesmente serimputada, por meio da atribuio de um nome, por qualquer motivo, ela tambm universalmente aplicvel. O poai devora o mundo, e tambm devora a si mesmo. Poisquando uma criana permanece no nomeada por um perodo inaceitvel de tempo apsseunascimento,elaadquiriradesignaopoziawai,nonomeada,geralmentedevidoaomedodeconsequnciasindesejveis.Acrianaentoadquireumarelaodepoaiimediatacom todas as coisas no nomeadas (no congruentes), mas, claro, como poziawai umnome,adquireumaoutrarelaocomtodasascoisasnomeadas.Acriana,emresumo,tornaseumadobradiacorporificadaentreomundodosnomeseomundodascoisasnonomeadas.Eemborapoziawainoseja,deformaalguma,um nome incomum em Karimui, no h razo alguma para acedermos s elucubraesprivadas de um certo oficial de patrulha de que os Daribi so um timo exemplo depensamento negativo, pois a designao poai quase to popular como nome pessoalquanto poziawai. A despeito de quo confusos esses exemplos possam ser, servem paradirigir nossa ateno ao reconhecimento social do nome, nico ponto de apoio a que osDaribipodemrecorreremumasuperfciedeoutromodoisentadeatrito.Essencialmente,qualquerreconhecimentoouatribuiodeumnomesempreafixao de um ponto de referncia em meio a uma gama de relaes potencialmenteinfinitas,umadesignaoqueinerentementerelacional.Comoumainstanciaodepoai,ela sempre implica, por meio dessa relao, algo que tanto menos (uma das muitasrelaes potenciais) quanto mais (uma classe, uma gama de objetos ou seres) do que apessoa designada. Um homem que recebeu o nome do casuar, por exemplo, podereivindicar palavras como tori, kebi e ebi como seus nomes, pois todas elas tambm sonomes do casuar. Alm disso, como o casuar potica e coloquialmente o ebihaza, oanimalcasuar, em virtude de suas propenses no avirias, esse homem bem poderiareivindicar haza, animal, como pagerubo nobi, alcunha depreciativa (algo cmica) ouapelido. E se, como geralmente ocorre, o homem recebeu seu nome de outra pessoa, oualguma outra pessoa recebeu seu nome, o nome, como a pessoa ou corpo conceitual, sempreumseccionamentotomadodeumacadeiagenealgicaeimplicaessacadeia.Portanto,ospontosdeconvergnciaparticularesqueoutrosregimesmelansiosde nominao podem ou no partilhar com a nominao daribi so, de certa forma,irrelevantes.Namedidaemqueaspalavrassopolissmicas(e,claro,anominaoasfazassim)easpessoasserelacionampormeiodereproduo,qualquersistemadeidentidadesdesenvolvido pelo seccionamento e referenciamento de um campo relacional desse tipo intrinsecamente fractal (diferenciao aparente desenvolvida com base na congruncia eintercambialidade universais). E como a denominao nosso mapa ou modelo maiscerteiroparaaapreensodaidentidade,oargumentoemproldaconceitualizaonativadeunidades fractais evidente. O indivduo e o grupo que so arbitrrios, impostos eartificiais.O conceito de moeda, dinheiro que exige contabilidade em termos desingularidade e pluralidade, tambm uma imposio no fractal sobre um regime detrocas baseado em seccionamentos tomados da produtividade e da reprodutividadehumanas. Porcos, conchas de madreprola, machados e mantos de cascas de rvore j sorelacionais e esto implicados na congruncia que subjaz recriao da forma, dosentimentoedarelaohumanos.Asconchaseariquezaemformadeconchas(asquaissopensadas pelos Daribi como sendo ovos por meio dos quais os seres humanos sereproduzem) esto implicadas na reciprocidade de subjetivos envolvidos na exibio e noocultamento, assim como os machados, a carne e outros acessrios da produo e dareproduo colocam o sustento e a replicao humanos em relao de troca recproca.Quandoessespontosrelacionaissotratadoscomosendodaordemdarepresentao,comoagregados de mercadorias com base no modelo da moeda, ou quando a moeda que ossubstituitomadaliteralmente,arelaointegralnegadaedistorcida.Umavezsuprimidaa congruncia que mantm a escala de sua unidade essencial por meio de todas aspermutaes de categorizao, os nomes convertemse em meras categoriasrepresentacionais de designao social e classificao. E excludo o sentido de sua unidadeessencial com o corpo e o processo vital (em seu aprimoramento tanto subjetivo quantoobjetivo), os itens trocados tornamse meros objetos de riqueza de uma categorizaosemelhante uma representao dos valores humanos por meio da utilidade, umaclassificaodasutilidadespormeiodovalorhumano.O dinheiro, como vanguarda do sistema mundial, implica a contagem de umabasederecursos.Ondeorecursoelemesmorelacional,amercadoria,porassimdizer,darelao, ele exercer seu prprio efeito reflexivo sobre os termos da avaliao. Assim, opreo da noiva e o preo das crianas so imensamente inflacionados na tentativa detransformar a avaliao em uma forma de relacionar, investindo literalidaderepresentacionalemproldoquefundamentalmenteumaretricadaassero.Seraimagemeconmicadobigmanmeramenteefeitodessaretricaquandomaximizadapormeiodacomensuraoliteralizantedosobjetosedesuaavaliao?Assim,nossaprpriaimagemdobigmaninflacionaoaolheimputarsuaprpriainflao,aopassoquesuaatribuionativadistintivaadeumretrico(Reay,1959:11330).Poisnolimite,orbitro final do dinheiro, assim como da lei e dos casos judiciais, da etnografia e do statusnativo,afala.Eafala,umconceitoquegeralmenteincluialinguagemparaosmelansios,no de modo algum o mesmo que descrio, avaliao, informao ou a prprialinguagem. Ela o meio de sua fractalidade, aquilo que expande ou contrai a escala dereconhecimento e articulao para se adaptar a todas as exigncias, fazendo com que alinguagemsejaigualatodasasocasiesaotransformaressasocasiesemfala.Afala,pois,como uma relao de poai intrnseca ao pensamento. Esperase que a Lei e o Dinheiro, osingulareoplural,oindivduoeogrupo,emesmoaetnografia,sejamoslugaresnosquaisa fala vem repousar mas a fala sobre a Lei e o Dinheiro, e mesmo a etnografia, nuncarepousaeafalaelamesma,comoexemplificaoestudorecentedeGoldman(1983)sobrearetrica huli, nunca morre. esta a fractalidade da pessoa melansia: a fala formada pormeiodapessoaqueapessoaformadapormeiodafala.Nemsingular,nempluralQuando os seccionamentos arbitrrios recortados na totalidade do tecido da congrunciauniversal so tomados literalmente como dados, eles se tornam as categorias sociais queidentificamos como nomes, indivduos, grupos, objetos de riqueza e sentenas ouafirmaes portadoras de informaes. Assim tomados a partir de seu valor nominal, elesperdem qualquer senso de fractalidade e se fundem com a hegemonia ocidental de ordenssociais formadas por elementos substantivos, sistemas culturais feitos de categoriasrepresentacionais.Istonosignificaqueaspossibilidadesfractaisderetenodeescalanoestejam l, pois elas so evidenciadas pela relao de poai e seus vrios equivalentes. Masimplicadefatoumafortegarantiadequeaconscinciaeousonativosdessaspossibilidadessero desconsiderados, negligenciados ou malinterpretados como tentativas rsticas deconstruosocial.Nos termos estruturalistas que se tornaram um jargo do ofcio dosantroplogos sociais, permanece a possibilidade de que os fenmenos sociais e culturaispossamserdesmembradosemvrioseixosdemodoaobterentendimentosquepreservemsua escala com elegncia e fora insuspeitadas: as formas generalizantes de conceito epessoaquenosonemsingular,nemplural.IstoimplicariaadimensionalidadefractaldeBenoit Mandelbrot, talvez o caso geral da holografia, como uma dimenso fracionria ouremanescente dimensional que replica sua figurao como parte do tecido do campo,atravs de todas as mudanas de escala. A fractalidade, assim, relacionase ao todo,convertese nele e o reproduz, e algo to diferente de uma soma quanto de uma parteindividual.Umaformahologrficaouqueestabelecesuaprpriaescaladifere,portanto,deumaorganizaosocialoudeumaideologiaculturalnamedidaemqueelanoimpostademodoaordenareorganizar,explicarouinterpretar,umconjuntodeelementosdspares.Elaumainstanciaodosprprioselementos.Afenomenalidadedosignificadoforneceumparaleloadequadonoexistealgocomo uma parte de um significado. Ainda que possamos nos convencer, por meio degramticas, sistemas de signos, estratagemas desconstrutivos e similares, de que os meiospelos quais ns eliciamos significado podem ser eminentemente partveis, os significadosassimeliciadosnotmenopodemterpartes.Nosetratasimplesmentedoclichdequeostodossomaioresdoqueassomasdesuaspartes,poisseumsignificadonotempartes,no h soma que se possa comparar com a totalidade. Tambm se poderia concluir que otodomenosdoqueasoma,jqueeleapenasum.Quandoumtodosubdivididodessaforma ele segmentado em hologramas dele mesmo ainda que nem a segmentao, nemtampouco seu oposto, equivalham a uma funo ordenadora. O que denominamos umaordempertenceaomundodapartibilidadeedaconstruo.Issoevocaumexemplomelansiomaisamplo:onotvelestudodeMimicasobrea matemtica conceitual dos Iqwaye, uma populao falante de angan que vive prxima aMenyamya.Mimica(1988)descreveumsistemadecontagemessencialmenterecursivo,queincluiapenasdoisnmeros,umedois,ecomputadonosdgitosdasmosedosps.Umaspectocrucialdessamatemticaqueseentendequeosdgitossoassimiladosaonmerofinal obtido, um sentido holstico de soma ou totalidade para o qual Mimica tomaemprestado o termo alemo Anzahl (1988: 102). Assim, por exemplo, os cinco dgitos damo se tornam um, no sentido de uma mo, porque eles so assimilados ao um finalna srie umdoisumdoisum. Dez, o um ao final da segunda mo, tambm, claro,um,emboraestasejaamonmerodois.Ospssodiferenciadosdamesmaforma(ump, dois ps), a no ser pelo fato de que a unidade ao final do segundo p se torna, deforma bastante estranha para um nmero par, um: duas mos, dois ps: um homem.Ento recomeamos com o primeiro dedo da primeira mo, contandoo como vinte, ouum homem ao invs de um dedo. Quando houvermos contado vinte desses vintes, ou400,oAnzahlsernovamenteumomesmovalepara8000,eassimpordiante.De fato, o infinito tambm um, nem tanto por algum acesso privilegiado danumerao, mas simplesmente porque ele sempre contado no corpo, que sempre seencerra em um. Mas a razo para isso tambm se encerra na cosmologia e no tipo decongruncia universal ou relao integral evidenciado na relao de poai e na genealogia.Segundo Mimica (1981), o cosmos iqwaye era originalmente corporificado como um shomem, Omalyce, dobrado sobre si mesmo, com os dedos da mo entrelaados com osdedos dos ps e um pnis/umbigo conectando seu abdome boca. Apenas quando oligamentofoicortado,eOmalycedesdobrado,foiqueapluralidade/reproduo,bemcomoosdedosdasmoseosdedosdospscomosquaissecontaapluralidade,vieramaexistir.Nodeveriacausarsurpresa,portanto,saberqueanumeraoeagenealogiatmamesmabase congruente para os Iqwaye, e que eles costumam nomear sua prole (em ordem)conformeosdgitosdamo.Mas suponhamos que um demgrafo ocidental tenha ido realizar um censopreciso dos Iqwaye. O censo ser invariavelmente deficiente pelos parmetros iqwaye, adespeito do nmero que possa ser obtido e de quo meticulosa e precisamente sejaconduzido pois a totalidade iqwaye, o Anzahl do qual Omalyce uma instanciao, incluitambm todos os Iqwaye que viveram no passado, assim como todos aqueles que aindaesto por nascer (Mimica, 1988: 74). A despeito de quo elevado for o nmero, ele sersempre menor do que o nmero corporificado por Omalyce, que , claro, um. Assim, cadapessoa iqwaye uma totalidade, Omalyce instanciado, mas qualquer nmero de pessoas menor do que este. Para os Iqwaye, em outras palavras, a contagem/reproduo mantmsua escala humana, o que no de forma alguma comparvel com a abstrao do nmeroocidental.A holografia da reproduo fundamenta outro exemplo ampliado: aquele dosGimidasTerrasAltasOrientais,descritos[emGillison(1991)].Gillisoncomeapordelinearessa holografia por meio de uma espcie de conjuno metonmica do feto contido com opniscontidonacopulao.Comoopnis,ofetotemumaaberturanotopo,afontanelanofechada, ao passo que sua boca coberta por uma membrana (Gillison, 1987: 177) o fetocresce no tero como o pnis intumesce e fica ereto no ato sexual, e ele come o smenexpelido atravs da fontanela (Gillison, 1987: 178). Mas a substncia que ele ingere flui dacabeadopaieleprprioumfetomaduroe,portanto,umpnisatravsdesuauretra,demodoqueacabeadofetocomeacabeametonmicadopai.OsGimiobservamquetodoocorpomasculinosetornaflcido,maneiradeumpnis,depoisdarelaosexual.Um Homem , pois, um pnis com um pnis mas uma mulher tambm o , deacordocomGillison,squeseupnisestdentrodeseucorpo,mesmoantesdafecundao.IssoporqueosGimiacreditamqueumfetofemininofecundadoporseupaienquantoeleformado,queosmeiospelosquaisamulhergimiconcebidaenutridadentrodoterosoosmesmosdesuafecundao()elaestcongenitamentegrvidadaprolemortadeseupai(Gillison,1987:186).Esseabortoincestuososeupnisinterno,aserdeslocadopelasvisitas mensais do pnis gigante da lua, que causam a expulso sangrenta da substnciaabortada, e depois pelo pnis do marido ou do amante, instanciandose metonimicamentecomoumoutrofeto.Oconjuntodesubstituiesqueconstituiopnisinternodeumamulher,dofetohologrficodentrodeumfetomenarca,fertilizaoegravidez,tambmoviraserdaprocriao legtima e da relao de parentesco a partir de seu oposto incestuoso. Sualegitimaosocialnocasamentopassaporumcrculofamiliar,poisjuntocomanoivaeseupnis interno implcito, seu pai secretamente entrega um pnis externo. Este assume aformadeumtubodebambuococheiodecarnecozida,comumorifciobucaldelineado,mas no cortado, que decorado com o mesmo padro tatuado em volta da boca da noivaantes do casamento [(Gillison, 1991)]. O noivo deve extrair a carne cozida, alimentar suaesposa com ela e ento soar o orifcio bucal e tocar o tubo como uma flauta o tubo, umpnisqueumfetofemininojgestandoasubstnciadopaidanoiva,foialimentadoatravs de sua fontanela, o orifcio em sua extremidade, enquanto sua boca embrionriapermanecerevestidaporumamembrana.Eotubo,produzidopelopaidanoivacomoumarplica de sua prpria flauta, sua me, que ele toca em sua prpria casa dos homens, identificadocomanoivaaosercortado,avaginaequivalendoaoorifciobucal.Arecompensaadequadaaestefetogestanteexternalizadoumpagamentoquesefazpelacabeadeumacriananaocasiodeseunascimento.Tratase,voltandoaoinciodoexemplo,novamentedacabeametonmicadopai,aindaque,comootubodebambu,ela tenha carregado diversas estirpes analgicas equipotentes, todas elas aspectosdivergentesdeumnicotema.NaspalavrasdeGillison:Em outras palavras, o parentesco gimi criado por um rduo processo dediferenciaodeuma coisa que d a vida. E esta coisa ou est viva e se move para cima,comoolquidoseminal,ouestmortaefluiparabaixo,comoosanguemenstrual,maselasemprederivadopnisdoPaiesinnimodele(1987:198). importante ter em mente que o rduo processo de diferenciao faz parte daholografia como o pnis que se transforma em feto para substituir um outro fetodentrode um feto aumentado tanto quanto o prprio tema. Isso pode ser observado em umterceiro exemplo, retirado de meu trabalho entre os Usen Barok da Nova Irlanda Central(1986). Os Barok constituem cada uma de suas metades matrilineares exogmicas emtermos da relao entre elas: uma metade contm a criao[5] da paternidade professadapelaoutraegera,penetraecriaacontinnciadaoutra.essarelao,enoasmetadeselasmesmas, enquanto corpos sociais permutados por meio da transformao do ciclo defestividades,queconferelegitimidadeatodasastransfernciasdestatusoupropriedade.Osorong barok, lderes tradicionais das festividades, afirmam que duas coisasso replicadas de forma recorrente em tudo que fazem: kolume e gala. Kolume acontinncia,comooterocontmumfetoouaterracontmumcadver,econcretizadoritualmentenoptioamuradodepedrasdotaun,oucasadoshomens.Galaaeliciaodaconcepoedacriao,assimcomoopnispenetraparafertilizar,ouafacaparadistribuir,erealizadoritualmentenaformadeumarvoreenraizada.Masestaimagticaemsi,umaiconografiaqueosBarokdenominamirilolos,poderacabado,okolume,continncia,dotodo como festividade, o processo eliciador por meio do qual seus significados sorealizados,comosuagala.Otermobarokparafestividadecortaroporco.arelaoentrekolumeegala,portanto,quetantoconstituiasmetadesquantoas relaciona. Entretanto, compreendidos no sentido mais amplo, kolume como umaiconografiacontinente,galacomooprotocoloeliciadordafestividade,claroquecadaumdesses modos , por sua vez, constitudo pela relao entre eles. Isso porque a iconografiacontm tanto imagens de kolume quanto de gala, e cada um deles pode ser ainda maisplenamente resolvido como kolume/gala por meio da ao do outro. Desta maneira, umtronco de rvore (a tora limiar da casa dos homens) divide, no interior do cercado taun,oterreno nos espaos reservados para as festividades e para os enterros, ao passo que otronco de rvore vertical seccionado pelo terreno em uma metade subterrnea (desepultamento) e uma metade acima da superfcie que d frutos (nutriz). Ora, o protocolodas festividades se inicia com um kolume dos convivas rodeando a comida e segue para ogaladadivisodosporcosedoconsumoumformatobsicoaserencenadotantoemumavariantekolume(fechada)quantogala(aberta).A relao kolume/gala mantm sua escala, conforme a matemtica dosfractais, a despeito do nvel de maximizao. Kolume e gala so temas fractais que, deformamuitosemelhanteaosgneros,ficamentreotodoeapartedemaneiraquecadaumpossa englobar igualmente a relao total. A demonstrao culminante sobrevm com afestividade morturia transformacional final, o Kaba Una Ya (sendo Una Ya base darvore).Aimagemgaladarvoreinvertidaeosporcosreservadosparaafestividadesodistribudos sobre a seo funerria (as razes) sobre os porcos, na posio da raizmestra(a ancestral apical da rvore), fica em p o winawu, ou orong nefito kolume e galamostramse igualmente eficientes quando seus papis se invertem, e portanto idnticosconformase uma nica imagem do englobamento apical das pessoas do passado pelaancestral, bem como do englobamento dessas pessoas pelo winawu em seu futuropotencial.Emcertosentido,owinawuumgreatman, um lder antes englobante do queestatstico,quetomaamemriadeassaltoapartirdeumaposiofutura.Ostrsexemplosdeholografiaforamretiradosdediferentesfamliaslingusticase representam localidades geogrficas distintas na Papua Nova Guin. H considervelevidncia de que o fenmeno disseminado. Um exemplo notvel o estudo de Moskosobre os Bush Mekeo (1985) [Mosko (1991)] mostra que para eles, assim como entre osBarok, uma nica relao replicada durante todo um formato ritual. Mas se a holografiaimporta para esta discusso, no como fenmeno etnogrfico, mas antes como modo deentendimento.Nemparte,nemsomaEm caso algum a holografia uma questo de apresentao direta ela no to bempercebida no plano material quanto repercebida como o sentido da inteno nativa demostrar os fenmenos em sua autoconstituio. Assim, os Iqwaye fazem pessoas aocontar,e,damesmamaneira,paraeles,fazerpessoasumacontabilizao,instanciaoourenumerao de Omalyce. O embrio feminino gimi j est gestando um holograma dopnisdeseupai,comatransitividadedareplicaoque,pormeiodesuastransformaes,tornase continuidade. O gala da festividade ritual barok elicia e cria a continncia de suaprpria relao com kolume, e portanto a relao entre as metades, a qual se torna asimultaneidadedamemriaedareproduo.Nadaconstrudoenadadissecadonessesexemplos eles no so nem construo, nem desconstruo, mas simplesmente umareplicaoadicionaldafractalidadenoentendimentodoetngrafo.Poderseiadizerqueaholografia nativa um reinterpretar das ideias do antroplogo e, no processo, umreinterpretardaprpriainterpretao.A repercepo implica que a holografia no ser visvel no tipo de pensamentoorgnico que distingue a terminologia de parentesco como social (ou cognitiva), ofacciosismo como poltico e a horticultura como tecnolgica, ou que postula umaintegrao dos grupos, funes ou categorias em um tecido social mais amplo. O elementocrucial a fractalidade que impede a diferenciao entre a parte e o todo, que evita que asimagticas do entendimento se desintegrem nos indivduos, grupos e categorias que oconstrucionismo aglomera em todos maiores do que as somas de suas partes. Assim, muito importante que sigamos aqui as modalidades nativas, as seces transversaisanalgicaspormeiodasquaisotodonutreasimesmo.SemainstanciaodoAnzahleumsentido especial do corpo, a contagem iqwaya no seno um equvoco matemtico seignorarmos a transitividade de sua fertilizao e as transformaes a ela infligidas, areproduo gimi apenas um conjunto ordenado de categorias nativas se no atentarmospara os rigorosos protocolos da festividade, o kastam barok meramente uma festividadede solidariedade durkheimiana, um acontecimento que poderia assumir inmeras outrasformas.Atotalizaohologrficadomundoconceitualevidenciadanessestrsexemplosequivale a um reconhecimento da fractalidade pessoal por meio da realizao de suasimplicaes relacionais. Como tal, ela no uma construo, nem mesmo umainterpretao,noplanodaexplicao,poiselanomobilizadacomoumaunioforadade elementos dspares, uma realizao do significado por meio da inexplicvel mgicametodolgicadamudanadeescala.Umbigman,noclichantropolgicopadroeinflado,tornaseoorganizadordaforasociolgicaemsuaaglomeraodosdbitosdosoutroscomostatus,sejaessestatusvistocomoodeumintegradorou,simplesmente,odeumpoderosointermediriodopoder.Elesubmetidoaumamaximizaopessoalquandopassadeumaescaladoindivduoparauma escala sociolgica. O que frequentemente denominado sociologia das sociedades depequenaescalaproduzseuobjeto,bemcomosuassolues,pormeiodamudanadeescala,do agrupamento sucessivo dos indivduos e da individuao dos grupos. Cada aspecto dasupostaestruturaouorganizaosocialenvolveumdeslocamentodessetipodoindivduoougrupodomsticoparaalinhagemoualdeia,dalinhagemparaafratriaousociedade,daregioparaumaintegraoentreasreas.Eumavezqueesteprincpioestabelecidocomobsico,comoestratgiaanaltica,comobigmancomointegradornativoetransformadordeescalas, fixase um fundamento lgico para a mudana de escala como estratgia tericalegtima.Empregamseterminologiasespecficasparadirigiraatenoformadereduooumudanadeescalaquesepretende:comportamental,psicolgica,simblica,econmicaouecolgica.Comoresultado,tantasformasdeordemheursticasovinculadasaoobjetoquantasforemasheursticasdemudanasdeescalaimaginveis:umavezquesesupequeo que a sociedade est fazendo sistema e ordem, o antroplogo recebe carta branca paraproporheursticasalternativas.Desse modo, as formas nativas de pensamento e ao deixam de ser seusprprios objetos no processo de se tornarem muitos objetos, um caleidoscpio virtual demudanas de escala. No mago dessa estratgia est o dogma hegemnico da qualidadedspar e distintiva do indivduo em relao a qualquer forma de generalizao ouagrupamento, a qualquer sistema que possa ser aplicado. Ele subscreve e garante asistematizaocomoatarefabsicadoantroplogo,bemcomodosujeitodapesquisa.Mas as evidncias aqui apresentadas indicam que ao menos para alguns povosmelansios as formas de conceitualizao social e cultural mantm sua escala atravs detodas as permutaes rituais e pragmticas. Isso porque em uma conceitualizao dessetipo, fractal ou que mantm sua escala, o prprio conceito se funde com o espao de suaconcepo,erefazeromapadosdadoscombaseemescalasartificiaiseexternasnoresultaem nenhum ganho. Se a maior parte dos problemas sociais e culturais depende dahegemoniaocidentalparaquesejammeramenteimaginados,issosugerequeasexignciasdeviverepensaremmuitasculturasmelansiassobastantediferentesdaformacomooscientistassociaisasentenderam.Assim, a tarefa do great man, no seria, portanto, aumentar a escala dosindivduos para gerar agrupamentos, mas manter uma escala que pessoa e agregado aomesmo tempo, solidificando uma totalidade em acontecimento. A forma social no emergente, mas imanente. Se isso lembra a poderosa evocao do holismo no sistema decastashinduporLouisDumont,comsuafractalidadedaunidadebrmane,tambmressoao conceito de divduo de Marriott: a pessoa, como a sociedade, que todo e parte aomesmotempo.Em ltima instncia, tratase de pedaos que so recortados do tecido daexperincia diferentemente do que ns poderamos esperar. A fractalidade lida comtotalidades, no importa quo finos sejam os cortes, e por esta razo que eu insisti nostemasdamudanadeescalaedamaximizao.Poisaquestodosgreatmenebigmen,em ltima anlise, uma questo de maximizao. O big man como produto da inflaoetnogrficaoresultadodamaximizaoestatsticaesociolgica,umaparentecongregadore dispersor de pessoas. Mas a concepo fractal de um greatman comea com a premissade que a pessoa uma totalidade, e qualquer acrscimo a ela no mais do que umarealizao parcial. A totalidade , em outras palavras, conceitual, e no estatstica. O greatman, sem especificidade de gnero, tornase grande por uma instanciao ou configuraoparticular de uma totalidade conceitual possvel haver tiposdegreatmen assim como possvelhavervariaesdeummito.O estudo de Godelier sobre os Baruya nos forneceu diversos exemploseloquentes desta questo, mas eu gostaria de concluir com um exemplo final dos UsenBarok da Nova Irlanda. O orong barok, que comea como um winawu nefito, um lderdasfestividades,articuladordociclopormeiodoqualatotalidadehologrficadosirilolostornada manifesta para que todos a testemunhem. De fato, a festividade Kaba, na qual amanifestaorealizada,spodeacontecerporqueoorongodeseja,epornenhumoutromotivo.Ditodemaneiramaissimples,oorongmataporcosparaocortedosporcosquedefine a festividade. O umri, lder guerreiro tradicional barok, mata homens para umoutro tipo de festividade: o ararum taun, uma variao fechada ou kolume do ciclo defestividades pblicas. As festividades ararum, realizadas em um espao definido pelaconvergnciadefunesfestivasefunerrias,sorestritasaossalup,homensformalmentedefinidoscomojfalecidosporterempassadopelasfestasmorturiasenquantoaindaeramvivos.Elesjsoancestrais,greatmencomooorongeoumri,eporissovariantesdeumnicomitoouholografia.RefernciasbibliogrficasGILLISON,G.IncestandtheAtomofKinship:TheRoleoftheMothersBrotherinaNewGuineaHighlandsSociety.In:Ethos,v.15,pp.166220,1987.GILLISON, G. The Flute Myth and the Law of Equivalence: Origins of aPrincipleofExchange.In:MarilynStratherneMauriceGodelier(org.).BigMenandGreatMen: Personifications of Power in Melanesia. Cambridge: Cambridge University Press,1991.GOLDMAN, L. Talk Never Dies: The Language of Huli Disputes. Londres:Tavistock,1983.GRAMSCI, A. Selections from the Prison Notebooks. Nova York: InternationalPublishers,1971.HARAWAY, D. A Manifesto for Cyborgs: Science, Technology, and SocialistFeminisminthe1980s.In:SocialistReview,v.80,pp.65107,1985.MIMICA, J. F. 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Vale notar ainda que o big man aponta, na argumentao wagneriana, para aescala que este assume nas cincias sociais, ao passo que o great man faz referncia concepomelansia.(N.T.)[2]MantivemosotermomokanofemininodeacordocomseuusonastraduesbrasileirasdaobradeMarilynStrathern.(N.T.)[3] Optamos por traduzir instantiation por instanciao, termo usado emportugus, especialmente no jargo da matemtica, embora ausente dos dicionrios. Paraalm de estabelecer um vnculo com outras disciplinas, assim como ocorre com afractalidade, o termo faz referncia ao arcabouo conceitual da fenomenologia, dilogoconstante na obra wagneriana. Outras tradues possveis seriam manifestao ouexemplificao, que podem aqui ser entendidas como sinnimos do termo. Instantiationremete a instance, exemplo. Os exemplos devem, aqui, ser entendidos comomanifestaesdafractalidadedequefalaWagner.(N.T.)[4] Traduzimos entitlement por nomeao e naming por nominao,seguindo a ideia de que nomeao referese tambm a um ttulo ao qual se relacionamprerrogativasnominao,aqui,refereseimediatamentequestodosnomes.[5] Optamos por traduzir nurturanceenurture, que fazem referncia ao debatesobrenaturezaeculturaemtermosdenature/nurture,porcriaoecriar.(N.T.)