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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO A MATEMÁTICA NA ENGENHARIA MECÂNICA NA UFES LUANA POLTRONIERI DE SOUZA VITÓRIA 2008

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

A MATEMÁTICA NA ENGENHARIA MECÂNICA NA UFES

LUANA POLTRONIERI DE SOUZA

VITÓRIA

2008

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LUANA POLTRONIERI DE SOUZA

A MATEMÁTICA NA

ENGENHARIA MECÂNICA NA UFES

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito para a obtenção do grau de Mestre em Educação na linha de pesquisa Educação e Linguagens, sublinha Linguagem Matemática vinculada ao campo científico de Educação Matemática. Orientadora: Profª. .Drª. Circe Mary Silva da Silva Dynnikov

VITÓRIA MAIO/2008

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3

AGRADECIMENTOS

A Deus, por essa vida e por todas as oportunidades de aprendizado.

Á Diana e Lara que suportaram tantas ausências e nervosismos, com aquele

olharzinho de “o que foi que eu fiz mamãe?”, mas com um enorme sorriso quando

olhava para elas e dizia, “mamãe está ocupada, mas ama muito vocês”.

À querida Professora Circe Mary Silva da Silva Dynnikov, que foi mais mãe que

orientadora.

Ao meu primo Eduardo Vianna Gaudio, pois sem seu incentivo eu não estaria aqui

escrevendo estas linhas.

Aos colegas de mestrado Hélio, Eliane, Cláudia e Ritinha, que engravidaram comigo

e suportaram todas as minhas queixas sempre com palavras e abraços carinhosos.

Aos colegas da UFES Bohland, Geraldo Bull, Laudicéia e Sandra, companheiros de

viagens, que com sua alegria sempre minimizaram a saudade de casa.

Aos meus amigos Amarildo e Aloísio Sfalsin que receberam inúmeros e-mails e

telefonemas ora desesperados, ora efusivos, que relataram os altos e baixos de uma

pesquisa e sempre retornaram palavras de incentivo.

Aos queridos engenheiros da Aracruz, que me receberam de braços abertos e

contaram suas histórias.

Aos professores e amigos depoentes, pela sua atenção e alegria.

À Coordenadoria de Aperfeiçoamentos Pessoal de Nível Superior – CAPES pela

bolsa de estudo concedida.

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“A arte de interrogar não é tão fácil como se pensa.

É mais uma arte de mestres do que de discípulos;

é preciso ter aprendido muitas coisas para saber

perguntar o que não se sabe.”

Jean Jacques Rousseau

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RESUMO

É sabido que para ser um engenheiro precisa-se saber matemática. O que se discute é qual matemática é necessária para a engenharia e como esta matemática está sendo trabalhada. Esta é a questão principal desta pesquisa que investiga as modificações e/ou permanências nas disciplinas matemáticas no curso de engenharia mecânica desde a criação do mesmo em 1966 até 2006, ano da última reforma curricular. Entrevistas, análises de documentos e revisão de literatura, foram metodologias utilizadas para a investigação. Poucas e pouco significativas foram as mudanças ocorridas no período analisado. A matemática dos engenheiros é ministrada por matemáticos, os livros ainda são dos da década de 60, poucos sendo acrescentados às ementas, a prática de sala de aula ainda não absorve as novas tecnologias disponíveis, enfim, isto é uma questão séria que envolve a formação dos docentes e o modelo seguido pela universidade. Palavras-chave: Ensino Superior da Matemática, Engenharia Mecânica, Educação Matemática.

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ABSTRACT

It is known that to become an engineer you must know mathematics. The discussion here is that if mathematics is needed in engineering and how it has been wordked . This is the main issue in this research that investigates the changings and/or the staying of this matters in the course of mechanical engeneering in UFS since its creation – from 1966 – to 2006 the last year of the curricular changes. Interviews, document analysis, literary reviews where methods used to answer the questions. They were few and less meaning the changings that happened during the period. Mathematics of engineers is taught by mathematicians. The books are from the 1960’s being few of them added to the amendments, and the practice in the classrooms does not absorb the new available technologies being few of them added to the amendments, and the practice in the classrooms does not absorb the new available technologies. This is a serious question that involves teacher’s a graduation and the model followed by the university. Key Words: Teaching of mathematical in higher education, mechanic engineering, mathematical education.

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RÉSUMÉ

On sait que pour être un ingénieur on doît savoir mathématique. Ce qui est en discussion, c’est quel est la mathématique nécessaire pour l’ingénierie et comme on travaille cette mathématique. Ceci c’est la principal question de ce recherché qui fait l’vestigation des changements et/ou permanences des disciplines mathématiques dans le cours d’ingénierie mécanique dans l’Universidade Federal do Espírito Santo, aux période de 1966, l’année de création du cours, jusqu’a 2006, l’année de la dernière modification de la grille curriculaire. J’ai évaluée les pendent le période étudié, dans ce que se rapporte au contenu curriculaire. Des entrevues avec quelques professeurs du secteur Ingénierie Mécanique et du secteur Mathématique et aussi avec quelques ex-élèves de divers périodes; analyses des documents de l’École Politechnique du Espírito Santo, du secteur Ingénierie Mécanique et du secteur Mathématique; révision de litérature; était des méthodes utilizées dans cette recherche. Les permanences sont plus grandes que les changements, dans le période analysé. la mathématique des ingénieurs, est donnée par des mathématiciens; les livres sont encores ceux des années 1960; la pratique des salles de classes n’absorbe pas les nouveaux technologies, enfin, c’est ça, une question très serieuse parce qu’elle embrasse la formation des professeurs et le modèle suivi par l’université. Mots clé: Enseignement supérieur de mathématique, Ingénierie Mécanique, Education Mathématique.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Ilustração 1. Academia Real Militar............................................................... 46

Ilustração 2. Eng. Áureo Machado Neto ....................................................... 50

Ilustração 3. Eng. Ângelo Wellington Giacomim ........................................... 51

Ilustração 4. Eng. Fabrício Luis Stange ........................................................ 52

Ilustração 5. Prof. Geraldo Rossoni Sisquini................................................. 53

Ilustração 6. Eng. José Guilherme de Carvalho............................................ 54

Ilustração 7. Profa. Lígia Arantes Sad ........................................................... 55

Ilustração 8. Ementa da disciplina de Estatística da Escola Politécnica

de 1971............................................................................................................. 65

Ilustração 9. Currículo de Engenharia Mecânica de 1970 ............................ 70

Ilustração 10. Ementa da disciplina de Geometria Analítica e Álgebra Linear

de 1970............................................................................................................. 71

Ilustração 11. Programa da década de 80 com cálculo da média................... 73

Ilustração 12. Plano de Curso de Cálculo de 1988 com metodologia ............ 74

Ilustração 13. Registro em ata de uma prova de Mecânica dos Fluidos

de 1967............................................................................................................. 75

Ilustração 14. Registro em ata de uma prova de Mecânica dos Fluidos

de 1967............................................................................................................. 76

Ilustração 15. Prova de Cálculo Diferencial e Integral da Escola Politécnica

em 1971............................................................................................................ 78

Ilustração 16. Prova de Cálculo Diferencial da Profª. Mirtha Fayet em 1967.. 79

Ilustração 17. Prova de Cálculo Integral da Profª. Fayet de 1966................... 81

Ilustração 18. Prova de Cálculo Diferencial de 1966 ...................................... 84

Ilustração 19. Prova de Cálculo Diferencial de 1966 ...................................... 85

Ilustração 20. Lista de Exercícios de Álgebra Linear I da Profa. Sad de

1980.................................................................................................................. 86

Ilustração 21. Prova de Cálculo de 1957 ........................................................ 90

Ilustração 22. Caderno de Aluno da Profª. Fayet década de 60 ..................... 91

Ilustração 23. Caderno de Aluno da Profª. Fayet década de 60 ..................... 92

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LISTA DOS QUADROS

Quadro 1. Ciclo Básico (disciplinas do ciclo básico do currículo de engenharia

mecânica da UFES em 1966)................................................................64

Quadro 2. Ciclo de Formação Profissional (disciplinas técnicas do currículo de

engenharia mecânica da UFES em 1966).............................................64

Quadro 3. Evolução das Disciplinas (disciplinas matemáticas ao longo do período

de pesquisa) ..........................................................................................66

Quadro 4. Disciplinas e Pré-Requisitos ..................................................................68

Quadro 5. Ciclo Básico do Currículo Atual .............................................................72

Quadro 6. Ciclo de Formação Profissional do Currículo Atual ...............................72

Quadro 7. Disciplinas das décadas de 1960 e 1970 e bibliografia sugerida ..........98

Quadro 8. Disciplinas das décadas de 1980 e bibliografia sugerida ......................98

Quadro 9. Disciplinas das décadas de 1990 e 2000 e bibliografia sugerida ..........99

Quadro 10. Referências sobre a aplicação da matemática nos livros

pesquisados ........................................................................................101

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LISTA DE SIGLAS

ABMES – Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior

ANDES – Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições Superiores

ANUP – Associação Nacional das Universidades Particulares

ARBED - Aciéries Réunies Burbach-Eich-Dudelange

CNE – Conselho Nacional de Educação

CONAES – Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior

CT – Centro Tecnológico

DEM – Departamento de Engenharia Mecânica

ES – Espírito Santo

GBS – Guilherme Batista da Silva

IMPA – Instituto de Matemática Pura e Aplicada

INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

IP – Instituto Polytechnico

MEC - Ministério da Educação e Cultura

QI – Quociente de Inteligência

SESu – Secretaria de Ensino Superior

UCP – Universidade Católica de Petrópolis

UFES – Universidade Federal do Espírito Santo

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura

VPL – Valor Presente Líquido

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SUMÁRIO

RESUMO.................................................................................................................... 5

LISTA DE ILUSTRAÇÕES......................................................................................... 8

LISTA DOS QUADROS ............................................................................................. 9

LISTA DE SIGLAS................................................................................................... 10

INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 14

RELEVÂNCIA ....................................................................................................................................... 14

OBJETIVOS .......................................................................................................................................... 14

JUSTIFICATIVA .................................................................................................................................... 15

ESTRUTURA DA PESQUISA............................................................................................................... 15

REVISÃO DE LITERATURA................................................................................................................. 17

1. EMBASAMENTO TEÓRICO E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS........... 32

1.1 HISTÓRIA........................................................................................................................................ 32

1.2 CURRÍCULO ................................................................................................................................... 36

1.3 BREVE HISTÓRICO ....................................................................................................................... 38

1.3.1 Livros utilizados nos cursos de Engenharia no Brasil Colônia.............................................40

1.3.2 A República..........................................................................................................................................40

1.3.3 As Escolas de Engenharia no Brasil.............................................................................................41

1.3.4 A Engenharia no Brasil .....................................................................................................................42

1.4. MATEMÁTICA............................................................................................................................... 45

1.4.1 A Matemática no currículo de engenharia no Brasil Colônia ...............................................46

2. PROCEDIMENTOS E INSTRUMENTOS UTILIZADOS NA COLETA DE DADOS

................................................................................................................................. 48

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2.1 O ACERVO...................................................................................................................................... 48

2.2 – OS SUJEITOS.............................................................................................................................. 49

2.3 – RECURSOS DE OBSERVAÇÃO: ............................................................................................... 56

2.4 PROCEDIMENTOS UTILIZADOS .................................................................................................. 57

3. A MATEMÁTICA NA ENGENHARIA MECÂNICA............................................... 60

3.1 COMENTÁRIOS SOBRE O CURRÍCULO ..................................................................................... 60

3.2 AS DISCIPLINAS MATEMÁTICAS NA ENGENHARIA MECÂNICA ............................................ 63

4. A EVOLUÇÃO DAS DISCIPLINAS MATEMÁTICAS .......................................... 65

5. ALTERAÇÕES CURRICULARES ....................................................................... 70

6. AVALIAÇÕES ...................................................................................................... 75

7. A PRÁTICA DE SALA DE AULA......................................................................... 91

8. MATERIAL DIDÁTICO......................................................................................... 96

9. CONCLUSÕES .................................................................................................. 102

9.1 – CURRÍCULO .............................................................................................................................. 102

9.2 – AVALIAÇÃO .............................................................................................................................. 103

2.3 – PRÁTICA DE SALA DE AULA.................................................................................................. 104

9.4 – MATERIAL DIDÁTICO............................................................................................................... 105

9.5 – CONCLUSÕES FINAIS.............................................................................................................. 105

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 107

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA............................................................................ 111

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ANEXO I: ROTEIRO DE PERGUNTAS UTILIZADO PARA REALIZAÇÃO DAS

ENTREVISTAS COM OS PROFESSORES DO DEPARTAMENTO DE

MATEMÁTICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO.............. 113

ANEXO II: ROTEIRO DE PERGUNTAS UTILIZADO PARA REALIZAÇÃO DAS

ENTREVISTAS COM OS PROFESSORES DO DEPARTAMENTO DE

ENGENHARIA MECÂNICA DA UFES................................................................... 114

ANEXO III: ROTEIRO DE PERGUNTAS UTILIZADO PARA REALIZAÇÃO DAS

ENTREVISTAS COM ALUNOS JÁ FORMADOS EM ENGENHARIA MECÂNICA

NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO ....................................... 116

ANEXO IV: CESSÃO DE DIREITOS SOBRE DEPOIMENTO ORAL.................... 117

ANEXO V - QUADRO DE SIGNIFICADOS PARA ANÁLISE DOS LIVROS -....... 118

ANEXO VI - ENTREVISTA COM ENGENHEIROS EX-ALUNOS DA UFES ......... 119

ANEXO VII - LIVROS DO ACERVO DA BIBLIOTECA CENTRAL DA UFES

ANALISADOS COMO MATERIAL DIDÁTICO ...................................................... 213

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INTRODUÇÃO

RELEVÂNCIA

As disciplinas matemáticas têm sido, ao longo da história, consideradas

como difíceis, elitistas e tantos outros adjetivos cabíveis. Mas também reconhecidas

como necessárias, imprescindíveis mesmo para tantas outras disciplinas se

desenvolverem. Nas engenharias de forma geral e particularmente na engenharia

mecânica, que é o meu objeto de pesquisa, a matemática se faz presente com

grande força, seja servindo de base para as físicas, seja em aplicações diretas ou

indiretas nas disciplinas técnicas. Ao longo de minha trajetória seja enquanto

estudante de engenharia mecânica ou como docente de matemática e informática,

algumas questões que hoje investigo nesta pesquisa estiveram presentes. Uma

questão que me retira da zona de conforto refere-se à forma como as disciplinas de

matemática são ministradas nos cursos de engenharia e por quem. Como o currículo

foi construído e para quê? Algo mudou ao longo de quarenta anos? Se sim, o que

terá sido? O que terá motivado a mudança ou não? Que matemática é esta que se

ensinava em 1966 e qual se ensina hoje? Como era e como é a prática de sala de

aula? E as avaliações? E o material didático? E o desenvolvimento tecnológico, o

que trouxe para as matemáticas? Tantas são as questões motivadoras de uma

pesquisa. Trago aqui algumas destas respostas, as possíveis, dentro de um prazo

de pesquisa de mestrado. E deixo outras tantas, para mais tarde ou para outros, que

assim como eu procuram alcançar a mestria da arte de saber perguntar o que não

se sabe.

OBJETIVOS

O objetivo desta pesquisa é investigar a ocorrência de mudanças ou

permanências das disciplinas de matemática constantes do currículo de engenharia

mecânica da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) desde a criação do

curso em 1966 até 2006, quando houve a última modificação curricular.

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JUSTIFICATIVA

O interesse pelo tema vem do misto da vivência como estudante de

engenharia e da prática de professora de matemática, em busca do sentido das

disciplinas matemáticas no futuro escolar e profissional. A pesquisa histórica tornou-

se atraente no momento em que se completa quarenta anos de existência do curso

de Engenharia Mecânica na UFES, conjugado a uma mudança curricular. Unindo a

oportunidade do momento histórico que se apresenta com a vontade de aprimorar o

fazer didático, trazemos a lume esta pesquisa.

Não se faz uma pesquisa histórica sem procurar conhecer história e não se

trabalha com várias fontes sem conhecer sobre suas possibilidades. Assim foi

necessário leitura, ainda que básica de Jacques Le Goff, com a História Nova para

adquirir o mínimo de compreensão acerca deste assunto. Também para

compreender como “ler” corretamente o depoimento dos entrevistados nesta

pesquisa, busquei dialogar com Verena Alberti e Paul Richard Thompson, acerca da

História Oral. Por se tratar de um currículo, recorri a J. Gimeno Sacristán e Tomaz

Tadeu da Silva, para compreender como se dá a formação dos mesmos. Assim

como fui buscar em Pedro C. da Silva Telles, as origens da engenharia no Brasil.

Em Cipriano C. Luckesi e Helena Noronha Cury, pude obter suporte para analisar as

avaliações e as práticas atuais no ensino superior. Fiz também uma revisão de

literatura com os trabalhos que forneceram uma base acerca do que foi investigado

a respeito do ensino da matemática nos cursos de engenharia e temas afins ao meu

objeto de pesquisa.

ESTRUTURA DA PESQUISA

No Capítulo 1, encontra-se o embasamento teórico e os procedimentos

metodológicos, onde procuro definir como vejo a história, o currículo, a matemática e

a engenharia mecânica, através de pesquisa sobre esses assuntos na literatura a

que tive acesso.

No Capítulo 2, apresento os procedimentos e instrumentos utilizados na

coleta de dados, detalho como realizei a pesquisa no acervo, como foram feitas as

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entrevistas, os critérios de análise adotados e como fiz o tratamento das

informações obtidas.

No Capítulo 3, analiso as disciplinas matemáticas no currículo do curso de

engenharia mecânica, verificando qual a matemática considerada importante para o

currículo.

No Capítulo 4, apresento as relações da Matemática com as disciplinas

técnicas no período delimitado, analiso a grade curricular do curso ao longo dos 40

anos pesquisados, verificando as modificações e/ou permanências ocorridas.

No Capítulo 5, abordo as alterações curriculares e analiso as modificações

macro ocorridas no currículo e procurando identificar o que motivou estas

modificações.

No Capítulo 6, analiso as avaliações no período estudado e se elas visavam a

aprendizagem do aluno ou eram mais classificatórias.

No Capítulo 7, analiso como era a prática de sala de aula, a relação

professor-aluno e como isso evoluiu ao longo do período analisado.

No Capítulo 8, descrevo o material didático utilizado pelos professores e faço

a análise de alguns livros sugeridos como bibliografia ou livro-texto nas ementas de

algumas disciplinas.

No Capítulo 9 trago minhas conclusões. Pontuo as que pude extrair deste

trabalho de pesquisa.

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REVISÃO DE LITERATURA

Ao iniciar essa pesquisa histórica utilizando fontes documentais de primeira

ordem (Le Goff, 1998) e depoimentos orais, pus-me em busca de leituras que

pudessem fornecer embasamento e que viessem a auxiliar na análise dessas

informações. Assim, procurei artigos, dissertações e textos que se relacionassem

com o assunto estudado e trago aqui o resumo daqueles que considerei mais

pertinentes ao meu trabalho.

Soares, Lima e Sauer (2004) em seu artigo “Discutindo alternativas para

ambientes de aprendizagem de matemática para cursos de engenharia”, propõem

atividades que possam ser aplicadas às disciplinas de matemática nos cursos de

engenharia, visando promover uma atitude mais crítica e analítica dos educandos,

superando a prática ainda dominante de que aula de matemática é feita de

explicação e exercícios exaustivos, ou seja, uma mera busca de modelos para

resolução de problemas.

As autoras relatam sua prática que traz como recursos metodológicos:

trabalho em grupo; valorização da comunicação através de explanação dos recursos

e métodos utilizados para resolução de problemas; análise de erros; auto-avaliação

e incentivo à reflexão, uma vez que os alunos são instigados a embasarem-se na

teoria discutida em sala para justificar sua resolução.

As análises feitas concluem que os educandos estão acostumados com o

modelo tradicional de “aula” e avaliação do tipo exame1, e que apresentam

“dificuldades em habilidades como: tomada de decisão, reflexão, exploração e

dedução” (Soares, Lima e Sauer, p. 3). Apesar destas dificuldades, as atividades

têm sido bem sucedidas no sentido de despertar nos educandos a atenção para a

auto-gestão de seu processo de aprendizagem. Destacam alguns outros pontos

positivos, como o:

[...] desenvolvimento da capacidade de interpretar, explorar, decidir; seguir de acordo com ritmo próprio de

1 Conceituado segundo Luckesi (2005).

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trabalho; gerenciar sua aprendizagem, desenvolver "auto-estudo", esperar menos do professor pois pode descobrir sozinho algumas alternativas para resolver problemas; o professor não é a única fonte de informação e de orientação. (id. p. 3).

As autoras apontam como desafios aos professores de matemática que

atuam em cursos de engenharia a construção de estratégias de aprendizagem que

promovam o desenvolvimento autônomo dos educandos e do seu próprio, na

medida em que deverão aprender como lidar com a matemática sem se restringirem

somente à linguagem matemática. Mas que também passem a desenvolver saberes

pesquisando sobre o seu próprio fazer, examinando, pesquisando e refletindo sobre

a sua atuação.

Cury (2001) em seu artigo “Diretrizes curriculares para os cursos de

engenharia e disciplinas matemáticas” aponta o alto índice de reprovações nas

disciplinas matemáticas dos cursos de engenharia e busca nas novas tecnologias e

na modelagem matemática, maneiras alternativas para se trabalhar com essas

disciplinas. Propõe mudanças que atendam em sentido amplo as diretrizes

curriculares propostas que ela analisa, tais como MEC, ABENGE, e algumas outras

no mundo como a ABET (EUA)2 e na Escócia, citadas por Wilkinson3.

A formação dos engenheiros hoje ainda é tradicional, baseada

principalmente na reprodução de conhecimentos, onde as disciplinas de matemática

são tratadas como ferramentas para resolução de problemas; segundo Cury se

exige dos engenheiros não somente a resolução dos problemas, mas também

“menos domínio de conteúdos e mais capacidade de resolver problemas, tomar

decisões, trabalhar em equipe e comunicar-se” (id. p. 2), é necessário cada vez mais

uma atitude crítica e o verbo relacionar fica cada vez mais forte. O estudante assim

como o engenheiro deve aprender a relacionar os conteúdos matemáticos com as

2 Confome citado em sua revisão de literature: CRITERIA for accrediting engineering programs. Disponivel em

<http://www.abet.org/ images/eac_criteria_b.pdf >. Acesso em: 27 out. 2001.

3 Conforme citado em sua revisão de literatura: WILKINSON, J.; MATTHEW, B.; EARNSHAW, H. Engineers

need mathematics but can we make it interesting? In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON ENGINEERING

EDUCATION, 2001, Oslo. Proceedings...Oslo, Noruega, Aug. 2001. CD.

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situações reais que se apresentam. É preciso relacionar-se com aqueles com os

quais estuda, trabalha ou gerencia e também relacionar as novas tecnologias com

os conteúdos matemáticos e com a solução dos problemas reais.

As disciplinas matemáticas assumem um papel mais crítico, como apontado

por Cury quando comenta a matemática crítica de Skovsmose, e aponta para a

relação dos conteúdos matemáticos com a realidade, com os problemas que serão

enfrentados na prática do engenheiro.

Como opção ela analisa experiências realizadas por educadores da área de

ciências exatas, cita pesquisas feitas visando à melhoria da qualidade do ensino de

matemática para engenharias como o trabalho de Passos, Silveira e Wilkinson4 e

destaca como itens inovadores:

[...] emprego da modelagem matemática para solução de

problemas específicos da área; uso de computadores no

ensino; disciplinas ministradas em conjunto por professores

de Unidades diversas; distribuição de disciplinas

introdutórias ao curso em questão desde os primeiros

semestres; turmas únicas para as disciplinas específicas

de cada curso; diminuição do número de alunos por

disciplina. (id. p. 2)

Conclui dizendo que a aplicação destas alternativas nas propostas

curriculares, permitem ao professor “investir na busca de problemas da vida real,

trazidos pelo professor ou pelos estudantes, e que lhes permitam fazer frente às

necessidades de criar modelos para formulação e solução dos mesmos” (id. p. 8).

Eliana Soares (1997), em sua tese de doutorado intitulada

“Comportamentos matemáticos e o ensino de matemática para cursos de

engenharia”, investiga os comportamentos matemáticos necessários aos

engenheiros mecânicos e o ensino desses comportamentos nos cursos de

engenharia.

4 Citadas na revisão bibliográfica em seu artigo.

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Soares procurou delimitar os objetos de pesquisa a partir de critérios que

pudessem abranger uma amostra significativa considerando quatro pontos: a)

empresas representativas da região; b) engenheiros que além de atuarem no

mercado, lecionaram/lecionam no curso de engenharia mecânica; c) engenheiros

recém-formados já atuando no mercado e d) alunos concludentes que atuaram em

estágios.

Ela realizou entrevistas com vinte e dois engenheiros atuantes em várias

áreas como, por exemplo: mercado de trabalho regional, pesquisa/formação de

engenheiros e engenheiros formandos. Foi feito um roteiro de entrevista e a partir da

transcrição das mesmas, foram montadas tabelas com os significados extraídos da

fala dos entrevistados. Analisando os dados coletados, Soares mapeou as

atividades que os engenheiros relacionam com a matemática na sua atuação, as

dificuldades relacionadas com a matemática, os conceitos matemáticos utilizados

por eles e as situações nas quais eles indicam ser necessário o conhecimento de

matemática. Com base neste mapeamento, ela conclui que

[...] para planejar um programa de ensino de matemática,

no âmbito dos cursos de engenharia, é preciso que seja

definido com clareza e precisão que comportamentos, no

âmbito da matemática, são necessários ensinar para

capacitar engenheiros a se comportarem diante de seu

contexto profissional construindo modificações relevantes e

de valor do ponto de vista profissional, tecnológico e social,

considerando as modificações rápidas pelas quais está

passando a sociedade no final do século XX. Esses

comportamentos são descritos e caracterizados a partir da

análise e exame de informações acerca das situações com

as quais os engenheiros lidam ou se defrontam em seu

ambiente profissional, permitindo derivar ‘comportamentos-

objetivo’ para um programa ou plano de ensino de

matemática. (Soares, 1997, p. 200)

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Soares fala da avaliação deste programa, sem, entretanto detalhar como ela

deve ser feita dizendo que é “[...] preciso avaliar o comportamento do aprendiz após

o processo de ensinar; essa avaliação não é objeto de exame, nesse trabalho, mas

constitui importante etapa no processo de ensinar a aprender.” (id. p. 201)

O trabalho enfatiza as mudanças, principalmente no que se refere ao foco

do ensino-aprendizagem, retirando o mesmo do ‘ensinar’, para ‘o ensinar a

aprender’ e neste caso, o professor também deve mudar o seu comportamento de

“[...] comportamento de quem resolve problemas [..]”, para “[...] comportamento de

quem capacita alguém a resolver problemas [...].” (id. p. 203)

Soares ao contrário de encerrar o assunto, termina provocando um

sentimento de quero mais, instigando as tantas possibilidades de pesquisa e

trabalho.

André Luis Mattedi Dias (2002) nos apresenta em sua tese sob o título

“Engenheiros, mulheres, matemáticos”, a construção da história da matemática na

Bahia desde a Escola Polytechnica da Bahia em 1896 até a criação da Universidade

da Bahia em 1968. Como ele mesmo diz no resumo, esta pesquisa dedica-se aos

“[...] problemas da difusão, recepção, apropriação e institucionalização da

matemática moderna de raízes européias no contexto sócio-cultural brasileiro

[...]”(resumo) e levanta perguntas como “Quando e como os matemáticos ocuparam

o lugar dos engenheiros no exercício da matemática? Quais estratégias, quais

alianças, quais interesses foram mobilizados para que conseguissem ocupar um

território até então exclusivo dos engenheiros?” (resumo).

Salientando os fatores determinantes para a fundação da Escola

Polytechnica da Bahia, Dias fala dos interesses da elite e dos engenheiros da época;

os professores que lá atuaram, citando alguns dos catedráticos e ressaltando a

importância desses professores que atuavam também como engenheiros. Considero

este fato importante pois, verifiquei também em Telles (1984-1993) e Montenegro

(1995), que os professores que lecionaram para as primeiras escolas de engenharia

no Brasil, o faziam com dificuldade e orgulho, às vezes até sem remuneração, o que

hoje creio não mais existir.

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Quanto às disciplinas matemáticas, Dias faz um comentário que confirma o

que tenho verificado na minha pesquisa:

as ciências matemáticas, físicas e naturais ocupavam lugar destacado dentre as especialidades que eram consideradas como parte da competência dos engenheiros na época da fundação do IP e da EP. (Dias, 2002, p. 61)

Dias salienta ainda a criação da Faculdade de Filosofia da Bahia e a

presença das mulheres no corpo docente desta faculdade e posteriormente no

Instituto de Matemática e Física e conclui respondendo de forma resumida as

perguntas principais feitas, quando diz que

[...] é possível agora pensar num lugar para os discursos e práticas de ‘modernização científica’ – ao menos no que se refere à matemática – ao lado daqueles discursos e práticas de modernização cultural, social e econômica que fizeram dos anos 50-60 um dos mais movimentados e dinâmicos da história recente da Bahia. (id. p. 230)

A contribuição de Dias para minha pesquisa está na consistência que dá às

informações que tenho levantado quanto à criação das Escolas Politécnicas no

Brasil, quanto à formação dos professores que atuavam nas cadeiras de matemática

dos cursos de engenharia, e mais ainda, quando fala sobre os momentos político-

sociais que permeiam a educação, pois que estes, como tenho verificado, são

causadores de grandes impactos.

Ana Teresa Colenci (2000) em sua dissertação de mestrado intitulada “O

ensino de engenharia como uma atividade de serviços”, trata no seu projeto de

pesquisa do ensino de engenharia voltado para a produção. Ela inicia sua

dissertação traçando um histórico da engenharia e do ensino de engenharia no

Brasil e levanta como problema de investigação as perguntas: “Que instrumentos de

análise seriam adequados para apontar as deficiências do atual modelo de ensino

de engenharia e o que pode ser feito para melhorá-lo qualitativamente?” e traz

também como objetivo “[...] propor uma estrutura de referência, a partir da ótica de

serviços [...].” (Colenci, 2000, p. 6)

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Ela inicia sua discussão com algumas definições: o termo engenharia,

engenheiro, o perfil do engenheiro e diz que “[...] as preocupações se estendem

além do aspecto cognitivo, abrangendo os aspectos comportamentais e atitudinais

[...]” (id. p. 14), preocupação esta que também encontramos em Soares (1997).

Traça também um histórico do ensino da engenharia no Brasil e aborda a

situação atual do ensino da engenharia, apontando o que também percebi nas

entrevistas, que “uma primeira avaliação exploratória mostra que em muitos casos, a

universidade não acompanha as mudanças do mercado de trabalho, principalmente

no mercado brasileiro, onde se verifica um alto nível de dependência tecnológica”

(Colenci, 2000, p. 24).

Discute ainda sobre a engenharia de produção (manufatura) e as exigências

que o mercado traz com relação à atuação acadêmica a partir da globalização.

Aponta para mudanças de paradigma que introduz novo foco do ensino, trazendo-o

para dentro das organizações. Ela expressa a contribuição de Senge5 dizendo que a

aprendizagem dentro das organizações é de grande importância e é “[...] a única

forma a partir da qual as pessoas ampliam continuamente a sua capacidade de criar

em direção aos resultados que realmente desejam [...].” (id. p. 44)

Considera o momento atual como um período de mudanças e enfatiza a

pesquisa e o aprender a aprender como comportamentos fundamentais nesse

processo de mudança como Soares. Conceitua serviços apontando suas

características; fala de qualidade de serviços e de modelos de qualidade; relaciona

estes conceitos e depois traça um paralelo entre o ensino de engenharia e o

conceito de serviço, apontando esse enfoque como eixo principal de sua proposta

de estrutura.

Colenci relaciona os conceitos discutidos anteriormente propondo uma

“estrutura de referência para investigar a qualidade no ensino de engenharia sob a

ótica de serviços” (id. p. 92), onde aborda a qualidade do ensino de engenharia,

projeto pedagógico e a estrutura de referência proposta. Diz que

5 Peter Senge estudioso no assunto a partir de 1990.

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o desafio em termos de qualidade do ensino de engenharia está baseado em buscar um novo modelo que incorpore as mudanças tecnológicas e sociais e ofereça alternativas que valorizem o processo de ensino-aprendizagem. (id. p. 3)

Conclui discutindo perspectivas para o futuro, no que diz respeito à

qualidade do ensino de engenharia, dizendo que

o trabalho desenvolvido traz uma contribuição ao tema uma vez que propõe a sistematização de um modelo que permite analisar a qualidade do ensino de engenharia de forma global e não apenas propor ações fragmentadas, afastadas da realidade vista como um todo. (id. p. 119)

A contribuição de Colenci para a minha pesquisa está principalmente na

categorização que faz das abordagens do ensino e no histórico que traz sobre as

origens da engenharia no Brasil.

Giselle Cristina Martins Real (2006) em sua tese “A qualidade revelada na

educação superior” investiga os impactos que a política de avaliação do ensino

superior adotada a partir de 1995 teve na concepção de qualidade do ensino junto

às instituições de ensino superior.

A metodologia utilizada é a análise documental de documentos oficiais

divulgados pelo MEC, tais como:

• legislação e normas sancionadas e publicadas no período em tela;

• material gráfico produzido para divulgação da política de avaliação;

• informações constantes em sites dos órgãos gestores da política de educação superior, tanto públicos como privados, nacionais e internacionais, como: MEC, CNE, CONAES, SESu, INEP, ABMES, ANDES, ANUP, Banco Mundial, e UNESCO;

• artigos de jornais e revistas impressos e on-line que focavam as temáticas da educação superior e avaliação;

• livros e artigos que expressam discursos dos agentes da política de educação superior. (Real, 2006, p. 19)

Observa como resultados de sua pesquisa que de 1968 a 1995, a

concepção de qualidade de ensino estava ligada à relação entre quantidade e

qualidade; a avaliação era utilizada “como um mecanismo de restrição da qualidade”

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(id. p. 6). Ela verifica também que houve um impacto positivo, mas que apesar dele,

as evidências encontradas apontam para um “esgotamento do poder indutor da

avaliação na melhoria da qualidade do ensino” (id. p. 7). Salienta que ainda não foi

atingido o tratamento da avaliação como forma de garantir qualidade de ensino.

Célia Peitl Miller (2003) em sua dissertação de mestrado intitulada “O

doutorado em matemática no Brasil” realiza uma pesquisa histórica, a partir do início

do doutorado em matemática no Brasil em 1842 e sua trajetória atravessa a história

da engenharia, daí a importância desta leitura para a minha pesquisa. A pesquisa de

Miller baseia-se em quatro pilares por ela descritos: “[...] as origens do ensino da

Matemática; o ambiente acadêmico em que o doutorado se firmou; a documentação

da época (Decretos e Teses) e a biografia dos autores [...]” (Miller, 2003, p. V).

Pesquisou documentos originais, muitas vezes dispersos, fez extensa pesquisa

bibliográfica em busca de fontes primárias. Esteve em várias cidades, deparou-se

com dificuldades e até impossibilidade de acesso a alguns documentos e organizou

os dados o melhor que pode.

Miller fala da evolução histórica do ensino e pesquisa da matemática e da

engenharia em Portugal, onde pesquisa o ensino da matemática em Portugal

iniciando com a Companhia de Jesus; a expulsão dos Jesuítas de Portugal pelo

Marquês de Pombal, o que determinou novos rumos para o ensino da matemática; o

início do ensino da engenharia na França e a disseminação do mesmo pela Europa

e em Portugal.

Em seguida a evolução histórica do ensino e pesquisa da matemática e da

engenharia no Brasil, onde investiga a origem do ensino da matemática no Brasil; a

vinda dos Jesuítas, os reflexos da reforma de Pombal; a origem do ensino da

engenharia e as academias. Depois se ocupa com a criação do doutorado no Brasil

e das teses que vão de 1848 a 1937, passando pela Academia Real Militar, Escola

Militar, Escola Central e Escolas Politécnicas.

Conclui constatando que “[...] o doutorado em Matemática no Brasil foi

instituído em 1842, sendo regulamentado em 1846, quando foram titulados os

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primeiros doutores por meio de decreto [...]” (id. p. 439), sendo somente em 1848

que as titulações passaram a exigir apresentação de defesa de tese.

Jorge R. V. Domingos e José Antonio S. Bordeira (2003) em seu artigo

“Novas abordagens para o ensino de equações diferenciais em cursos básicos de

engenharia” avaliam as dificuldades encontradas nas disciplinas de Cálculo,

especificamente no ensino das equações diferenciais e as dificuldades encontradas

nas disciplinas técnicas, tais como Mecânica dos Fluidos e Transferência de Calor

que utilizam as equações diferenciais.

A proposta do trabalho é relatar a experiência dos autores na construção de

um processo que “[...] pudesse construir uma ‘ponte’ entre as aulas de equações

diferenciais e sua utilização nas cadeiras fundamentais das várias especialidades

dos cursos de engenharia” (Domingos e Bordeira, 2003, p. 2) da Escola de

Engenharia da Universidade Católica de Petrópolis. Em sua fundamentação teórica,

os autores conceituam o professor tradicional que centraliza a aprendizagem na sua

pessoa, no seu conhecimento, e o professor cooperativo que atua como incentivador

da auto-produção de conhecimento dos educandos.

O projeto construído pelos autores baseia-se no conceito de professor

cooperativo: os educandos da disciplina de Equações Diferenciais, divididos em

grupos estudavam as aplicações das equações diferenciais na resolução dos

problemas propostos. Esses problemas faziam parte das cadeiras de Mecânica dos

Fluidos, Transferência de Calor, Circuitos e Vibrações. O objetivo do trabalho era

minimizar a distância entre as disciplinas de matemática das disciplinas técnicas e

os autores colocam como principais questões

as grandes dificuldades do ensino e do aprendizado das cadeira básicas; a busca de motivação para os alunos dos cursos de Engenharia, ainda em fase inicial de seus cursos; e, não menos importante, a visualização do encadeamento global e da implicação dos conteúdos básicos para a compreensão e solidez dos conteúdos específicos que serão ministrados nas fases mais adiantadas dos cursos. (id. p. 4)

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No início do semestre os alunos eram apresentados aos professores de

todas as disciplinas pelo professor de Equações Diferenciais, organizavam-se em

grupos e escolhiam o tema. A partir do tema, eram orientados pelo professor da

disciplina correspondente ao mesmo e juntos traçavam o programa de trabalho. Era

estabelecido um cronograma de três apresentações intermediárias e os educandos

eram encorajados a utilizar técnicas modernas de apresentação. O programa de

trabalho ia se transformando no problema prático à medida que o semestre

avançava, quando a teoria ia sendo discutida e as apresentações intermediárias iam

sendo feitas.

Quando publicado, o projeto já estava em prática há três anos e os autores

relatam algumas conclusões:

- alguns educandos ao finalizarem a disciplina de Equações Diferenciais

concluíram que a mesma apresenta poderosas ferramentas para a

solução de problemas de engenharia;

- foram minimizadas as reclamações dos professores das disciplinas

técnicas quanto à utilização das equações diferenciais na solução dos

problemas pertinentes à sua disciplina;

- o trabalho em laboratório em paralelo com a teoria na solução de

questões cotidianas de engenharia, desperta no educando maior

interesse em se aprofundar no estudo;

- ao construir a solução e apresentação do trabalho, houve um aumento

de interesse dos educandos pela pesquisa científica.

Considero este trabalho de grande relevância para o meu projeto, pois vem

confirmar algumas dificuldades no ensino de engenharia que verifiquei nas

entrevistas e na minha prática enquanto estudante.

Maria Salett Biembengut (1997), em sua tese “Qualidade no ensino de

matemática na engenharia”, deixa à mostra toda a sua experiência enquanto

professora e pesquisadora, preocupada com o ensino da matemática. Ela nos conta

a trajetória percorrida até o seu projeto e as várias direções tomadas em busca de

respostas.

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O objetivo principal deste trabalho é segundo suas próprias palavras, “(...)

fornecer meios para melhorar o ensino de matemática dos Cursos de Engenharia,

com o fim de torná-lo um instrumento eficiente para formação de engenheiros”

(Biembengut, 1997, p. 12).

Para isso ela busca conhecer e fundamentar-se teoricamente nos modelos

matemáticos clássicos e analisa sua utilização como método de ensino e

aprendizagem de matemática. Pesquisa também as origens da engenharia e da

matemática na engenharia e realiza trabalhos experimentais com educandos, ora

atuando como orientadora diretamente, ora indiretamente com o auxílio de

professores favoráveis à sua proposta.

Biembengut relata um trabalho que fez com cerca de trinta professores

de oito estados onde realizou trabalhos experimentais e propôs um método que

denominou Modelação Matemática, trabalho este que lhe rendeu o título de Mestre

em Educação. Segue breve descrição do método conforme ela mesma relata:

[...] o método propõe que os alunos escolham um tema de interesse (tema único por turma), levantem questões, façam pesquisa e o professor desenvolva o conteúdo programático, à medida em que vão (alunos e professor) elaborando um modelo matemático para responderem questões levantadas no tema original. (id. p. 2)

A autora aponta questões já vistas em outros trabalhos e na minha pesquisa

acerca das dificuldades do ensino da matemática nos cursos de engenharia,

relativas à: aplicabilidade das disciplinas de matemática nas disciplinas técnicas,

altos índices de reprovação; alta rotatividade dos professores; falta de conexão entre

as próprias disciplinas de matemática, como Cálculo, Álgebra e Geometria;

bibliografia deficiente na aplicação da matemática para engenharia, entre outros. Ela

analisa também a reforma universitária decorrente da lei 5.540/68 e sua relação com

a qualidade do ensino, apontando a opinião de vários autores como sendo esta

reforma uma das causadoras da baixa qualidade do ensino superior hoje em dia.

Como resultados, Biembengut salienta os benefícios que a utilização do

recurso da Modelação trouxe em relação ao ensino tradicional de Cálculo:

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• provocou um maior interesse, por parte dos alunos, frente à aplicação da matemática no desenvolvimento dos seus próprios cursos;

• estimulou um sensível aumento na participação em sala de aula (perguntas e respostas durante a exposição do conteúdo);

• aumentou o número de pesquisas, realizadas e apresentadas, periodicamente, em forma de seminário;

• levou a um crescimento na média geral das notas das avaliações escritas; e

• resultou numa sensível redução no número de desistências ou reprovações. (id. p. 3)

Ainda como resultados, ela mostra que a Modelação Matemática sendo

utilizada nas disciplinas matemáticas dos cursos de engenharia como método de

ensino-aprendizagem:

• melhora a apreensão dos conceitos, pelo fato de

fazer emergir o conteúdo matemático de modelos matemáticos da Engenharia;

• estimula a participação e a criatividade, devido ao processo de questionamentos, de pesquisas e de elaboração de modelos;

• aponta ao aluno a importância da Matemática, não apenas para aplicação (instrumento) na Engenharia, como também a teoria que a sustenta;

• aproxima o aluno, ainda no ciclo básico, das disciplinas específicas do Curso de Engenharia, propriamente dito;

• propicia ao professor de matemática uma interação com os problemas da Engenharia, contribuindo, sobremaneira, para um contínuo aperfeiçoamento;

• abre uma perspectiva de interação entre professores do ciclo básico com o ciclo profissionalizante, e

• permite um estreitamento entre as novas tecnologias levando a rever, periodicamente, questões relativas ao currículo. (id. p. 229)

Sem dúvida a pesquisa de Biembengut é importante para o meu projeto, seja no que

se refere à pesquisa feita sobre as origens da matemática na engenharia, seja na

própria estruturação da tese.

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Ana Regina Lanner de Moura e Rute Cristina Domingos da Palma

(2006) no artigo intitulado “A avaliação em matemática: lembranças da trajetória

escolar de alunos de Pedagogia” estudam avaliação em matemática na pedagogia

na Universidade Estadual de Campinas e analisam como a avaliação, através da

lembrança dos entrevistados, influenciou a formação matemática destes.

A questão de investigação desta pesquisa é “Como a avaliação escolar é

lembrada e como pode ter influenciado a formação matemática do aluno e a relação

que ele estabelece com este conhecimento?” (Moura e Palma, 2006, p. 1). As

autoras investigam os procedimentos, instrumentos e os conteúdos das avaliações e

as lembranças que permanecem na memória dos entrevistados acerca desses

momentos.

Foram entrevistados com questionário 75 alunos de pedagogia e foi

solicitado a eles que escrevessem sobre o que lembravam das aulas de matemática

destacando: “[...] Concepção de conhecimento matemático e postura do professor,

metodologia e material didático, tipo e procedimentos de avaliação [...]” (id. p. 4).

Elas discutem sobre o papel político-social da avaliação, baseando-se em

Maciel6 e destacam alguns pontos em seus resultados que merecem destaque:

- prova como único procedimento de avaliação;

- exigência de memorização, pouca reflexão e insignificante estímulo ao

raciocínio;

- valorização negativa e excessiva do erro;

- sentimentos de tensão, sofrimento, apreensão, sensação de fracasso.

Considerando esses aspectos citados e outros mais detalhados ao longo da

pesquisa, as autoras destacam que mais de 50% dos entrevistados construíram uma

6 Segundo referência bibliográfica das autoras: MACIEL, Domício Magalhães. A avaliação no

processo ensino-aprendizagem de matemática, no ensino médio: uma abordagem formativa sócio-

cognitivista. 2003. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual de Campinas –

Campinas, 2003.

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relação de “rejeição, medo, incapacidade e até mesmo ‘raiva’ da matemática” (id. p.

14).

Concluem apontando como necessário a continuidade das pesquisas sobre

a avaliação dos conteúdos matemáticos a fim de contribuir para que a mesma seja

parte de “[...] uma relação de confiança, autonomia e instigação do aluno” (id. p. 14).

A importância desta leitura para a minha pesquisa está na construção do

entendimento do papel da avaliação no conhecimento e da herança que os

educandos trazem em relação às disciplinas matemáticas.

Ao findar estas leituras e outras mais não relacionadas aqui, por não terem

uma relação tão estreita com esta pesquisa, concluo que:

- não foram encontradas muitas pesquisas referentes às disciplinas de

matemática nos cursos de engenharia, no que se refere ao contexto histórico.

Dentre as encontradas, os aspectos mais abordados são: o emprego de novas

tecnologias e as práticas de sala de aula;

- os contextos histórico-políticos dominantes na época de criação dos

cursos de engenharia no Brasil e a motivação para sua criação, são abordados de

forma superficial e não consegui encontrar muita literatura sobre este assunto, como

por exemplo, a criação das escolas Politécnicas, que se espelharam nas de Paris e

Zurich.

Apesar de saber das dificuldades, é interessante ressaltar a relevância da

história oral como fonte de pesquisa, dada a riqueza de informações que ela

fornece. Foram realizadas várias reformas visando à melhoria na qualidade do

ensino superior, principalmente nas engenharias, mas o discurso que ainda

permanece é o de que existe uma lacuna entre as disciplinas matemáticas e as

disciplinas técnicas.

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CAPÍTULO 1

EMBASAMENTO TEÓRICO E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Ao pensar na matemática inserida no currículo de engenharia mecânica,

surgiram várias possibilidades de investigação que poderiam fazer parte de um

projeto de mestrado. Optei por investigar se ocorreram mudanças ou permanências

nas disciplinas de matemática, presentes no currículo de engenharia mecânica da

Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), ao longo dos seus primeiros

quarenta anos de existência. Ainda neste contexto dentro das várias opções,

investigo conteúdo, metodologia, prática de sala de aula, avaliação e material

didático.

Para investigar melhor estes pontos citados, creio ser necessário,

inicialmente, relacionar e examinar algumas concepções referentes à história,

currículo, matemática e engenharia mecânica a fim de definir com clareza a

pesquisa a que me propus.

1.1 HISTÓRIA

Nesta pesquisa estou me valendo do conceito de história cultural e me

baseio em Jacques Le Goff. Para melhor compreensão do pensamento do autor,

traço um panorama do surgimento da História Nova.

A Escola dos Annales marca o nascimento da História Nova. Quando Lucien

Febvre e Marc Bloch lançaram em Estrasbrugo, em 1929, uma revista chamada

Annales d’histoire économique et sociale, tiveram a intenção de questionar a história

política tradicional que se preocupava com os fatos, documentos, sem considerar a

representação dos personagens que faziam essa história.

O comportamento dos historiadores foi criticado por Bloch e Febvre.

Encontramos esta evidência em Le Goff (1998) quando diz que o historiador

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como todo homem de ciência, este, conforme a expressão de Marc Bloch, deve, ‘diante da imensa e confusa realidade’, fazer a ‘sua opção’ – o que, evidentemente, não significa nem arbitrariedade, nem simples coleta, mas sim construção científica do documento cuja análise deve possibilitar a reconstituição ou a explicação do passado. (p. 32)

Os Annales vinham então, propor uma modificação na forma de conduzir e

produzir a história, passando a considerar e analisar elementos antes

desconsiderados, mas considerados por Bloch e Febvre como relevantes. Eles

queriam problematizar a história, fazer a história não como algo estático, imóvel,

pois a história é instável, o que permite ao analisar o passado compreender o

presente na instabilidade que este presente se encontra.

O foco dos Annales estava numa história econômica e social que foi

chamada de História Nova, que como define Le Goff (1998, p. 27) é “[...] história

global, total, e reivindica a renovação de todo o campo da história”.

Ela vem mostrar que os grandes acontecimentos (priorizados na história

política) são apenas o desfecho de vários pequenos acontecimentos. Estes é que

devem ser analisados pela história nova, para se construir uma história mais

verossímil, mais próxima da realidade da época.

Uma história que leva em conta as diversas histórias individuais que

acontecem simultaneamente e não podem ser desprezadas. Histórias estas que

formam o contexto em que o acontecimento antes unicamente considerado pela

história política acontece. Logo as histórias política, diplomática, militar, econômica,

social e cultural são também consideradas, constituindo assim uma “história total”,

termo bastante utilizado por Le Goff.

O nascimento da história nova não se deu instantaneamente somente com

a publicação da revista de Febvre e Bloch, mas como diz Le Goff (1998, p. 28), “a

história nova nasceu em grande parte de uma revolta contra a história positivista do

século XIX, tal como havia sido definida por algumas obras metodológicas por volta

de 1900.”

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Quando Marc Bloch morre em 1944 e Lucien Febvre em 1956, Fernand

Braudel junto com Robert Mandrou, e depois com Marc Ferro, despontam como

principais inspiradores dos Annales. Em 1958, Braudel publica o artigo “História e

ciências sociais: a longa duração”, que consolida a história nova. Em 1969,

assumem novos personagens dessa história: André Burguière, Jacques Le Goff,

Emmanuel Le Roy Ladurie e Jacques Revel. E assim, ao assumir junto com os

companheiros a bandeira da história nova, Le Goff oferece ao mundo uma extensa

obra que continua influenciando os historiadores no mundo.

A história nova não aconteceu somente na França, mas houve movimentos

em torno do mundo. Como exemplo, podemos citar na Inglaterra, a revista “Past and

Present” (desde 1952), a revista anglo-americana “Comparative Studies in Sociology

and History” (desde 1957), a historiadora Americana Natalie Zemon Davis, o

historiador italiano Carlo Ginzburg, os historiadores poloneses Bronislaw Geremek e

Witold Kula.

A importância de Le Goff para este projeto se dá inicialmente com relação

às fontes. Como analiso a matemática na engenharia mecânica, me deparo com

fontes diversas como resoluções, ofícios, atas de conselho departamentais,

avaliações, listas de livros sugeridas para a biblioteca, entre outros. Ainda considero

o depoimento de professores e ex-alunos para identificar o contexto em que as

modificações curriculares referentes às disciplinas de matemática na engenharia

mecânica ocorreram, característica marcante na história nova, onde analiso os

dados históricos encontrados nos depoimentos dos entrevistados. E encontro apoio

para melhor compreender como “ler/ouvir” o que estas fontes falam no pensamento

de Le Goff (1998) acerca dos documentos a serem considerados, quando ele diz

que

a história nova ampliou o campo do documento histórico; ela substituiu a história de Langlois e Seignobos, fundada essencialmente nos textos, no documento escrito, por uma história baseada numa multiplicidade de documentos: escritos de todos os tipos, documentos figurados, produtos de escavações arqueológicas, documentos orais, etc. Uma estatística, uma curva de preços, uma fotografia, um filme, ou, para um passado mais distante, um pólen fóssil, uma ferramenta, um ex-voto são, para a história nova, documentos de primeira ordem. (id. p. 28)

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Muitas das respostas para os meus questionamentos, se encontram nos

documentos e nos fatos que reconstruí a partir do acesso à memória daqueles que

entrevistei e que foram os personagens da história que construí, pois me interessava

saber, por exemplo, porque a Álgebra não aparece na grade curricular de 1966.

Interessava-me saber por que ela não está lá, e a partir de que momento ela passou

a fazer parte da grade curricular do curso e por que motivo. Que fatos provocaram

esta mudança. Pois

[...] há fatos visíveis, como as batalhas, as guerras, os atos oficiais dos governos; há fatos morais, ocultos, que nem por isso são menos reais; há fatos individuais, que têm um nome próprio; há fatos gerais, sem nome, aos quais é impossível atribuir uma data precisa, que é impossível encerrar em limites rigorosos e que nem por isso deixam de ser fatos como os outros. Le Goff (1998, p. 40)

Em busca destes porquês, alguns dos quais encontrei nas entrevistas,

utilizei como suporte a história nova, no que se considera a história imediata.

História esta, segundo Lacouture (1998, p. 216), “ao mesmo tempo rápida na

execução e produzida por um ator ou uma testemunha vizinha do acontecimento, da

decisão analisada.”, uma história que “quer se elaborar a partir desses arquivos

vivos que são os homens”. (id. p. 217)

Evoquei, portanto, considerando essas fontes e fatos, esses personagens

produtores da história que ainda não findou, tentando construir, utilizando uma

expressão de Lacouture (id. p. 222), com “arte e cor, as particularidades do tempo e

as singularidades dos seus heróis”.

Recorri ao auxílio de Verena Alberti (2005), para compreender e trabalhar

com a História Oral. Alberti me auxiliou a compreender como extrair da fala dos

entrevistados os significados para análise e como analisar e concluir a partir destas

falas.

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1.2 CURRÍCULO

O termo currículo “implica, pois, a idéia de regular e controlar a distribuição

do conhecimento” (Sacristán, 1998, p. 125), conhecimento este que é direcionado

segundo o contexto em que se encontra inserido e que representa.

Como as escolas de engenharia no Brasil foram criadas nos mesmos

moldes das existentes na Europa, principalmente as Escolas Politécnicas, e sendo

estas baseadas no modelo tecnocrático (Belhoste, 2003), os currículos dos cursos

de engenharia, seguiram o modelo tecnocrático. Modelo este discutido por Bobbitt e

Taylor no início do século XX, cujo argumento era a cientificidade da educação, o

que tornava mais fácil mensurar a aprendizagem. Eles contestavam com sua teoria

o modelo humanista, herdado da educação Clássica da Antiguidade. Bobbitt e

Taylor consideravam que a escola tinha que funcionar como uma empresa,

moldando o trabalhador.

A década de 60 foi meio turbulenta no mundo todo, pois houve vários

movimentos de independência de colônias européias e no Brasil, com o golpe militar

de 1964, outros movimentos civis e movimentações sociais produziram efeitos na

educação, que começaram a ser sentidos no final da década de 60, início da década

de 70. No Espírito Santo o movimento estudantil foi pouco representativo em relação

a outros estados, “pois até 1967, os movimentos eram bastante reduzidos dentro da

UFES, destacando-se como centros geradores a Medicina, depois a Filosofia, e

finalmente a Engenharia”. (Neto, 1996, p. 147). Mas ainda assim, foram suficientes

para iniciar as discussões sobre os objetivos do currículo, e neste aspecto, os cursos

de engenharia estão na linha de frente, visto que assim como na França, também no

Brasil, os engenheiros estão entre os grupos dominantes das sociedades.

A partir dos anos 80, há uma modificação no pensamento científico acerca

do currículo (Sacristán, 1998). As discussões no campo sociológico aumentam e a

preocupação passa a ser com o tipo de sociedade que se quer formar através do

currículo em vigor; o currículo é visto no seu papel de molde e não mais somente de

forma técnica (Moreira, 2001). Passa a ser importante considerar também “o

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contexto social, econômico, político e cultural que o currículo representa, este foi

considerado [...] o primeiro referencial em relação a como analisar e avaliar um

currículo.” (Sacristán, 1998. p. 129)

É esta concepção de currículo que assumo nesta pesquisa. Vejo currículo

não somente como o conteúdo, ou a metodologia, ou atividades, mas o conjunto de

todos estes elementos e a forma como eles interagem e assumindo essa

concepção, analiso as grades curriculares, avaliações, livros-texto e de apoio e

prática de sala de aula no que tange às referências feitas nas aulas de matemática

com relação às disciplinas técnicas da engenharia. As entrevistas servem como

complemento aos documentos encontrados sobre o assunto.

Procura-se com a análise das grades curriculares do curso de Engenharia

Mecânica do Centro Tecnológico da Universidade Federal do Espírito Santo

(CT/UFES) identificar as modificações ocorridas e com as entrevistas entender as

motivações, porque

quando pensamos em currículo pensamos apenas em conhecimento, esquecendo-nos de que o conhecimento que constitui o currículo está inextricavelmente, centralmente, vitalmente envolvido naquilo que somos, naquilo que nos tornamos: na nossa identidade, na nossa subjetividade. (Silva, 2005, p. 15)

Esta pesquisa afina-se com este pensamento uma vez que estou

interessada na opinião das pessoas, na forma com que os entrevistados lidaram

com o currículo com o qual mantiveram contato. Meu interesse vai além do que está

nos papéis, passa pelas “marcas” que ficaram a partir da atuação deste currículo na

formação da subjetividade dos entrevistados.

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1.3 BREVE HISTÓRICO

O motivo de restringir a pesquisa ao curso de engenharia mecânica vem do

fato de eu ter sido estudante deste curso na UFES na década de 80, o que me torna

mais familiarizada com ele.

Para entender a criação dos cursos de engenharia mecânica no Brasil e

chegar ao Espírito Santo, fui buscar ajuda em Telles (1984, 1993). Iniciei a busca no

séc. XVIII com os primórdios, indo até a segunda guerra mundial, analisando como

eram os cursos de formação de engenheiros e a matemática estudada nesses

cursos. Verifiquei que a engenharia no Brasil iniciou-se antes da própria

denominação “engenharia”, sendo esta utilizada pela primeira vez no Brasil em

1705, na carta régia escrita ao Rei de Portugal pelo Governador da Capitania do Rio

de Janeiro.

Devido aos riscos que o Brasil corria de ter suas terras invadidas pelos

franceses, apesar do Tratado das Tordesilhas, os colonizadores portugueses viram-

se obrigados a criar mecanismos de controle da terra. Foram criadas então as

Capitanias Hereditárias e neste caso, necessário se fazia que fossem construídas as

moradias e as fortificações. O foco era a construção de estradas, pontes e

fortificações.

A partir do séc. XVIII surgiram cursos nas capitanias mais importantes,

como a Aula de Fortificação ministrada pelo Capitão Gregório Gomes Henriques, em

Salvador, em 1710, e a Aula de Geometria em 1770, no Convento de São Francisco

em São Paulo, ministrada pelo Governador da Capitania.

Note-se aqui, um fato curioso, que se repetiu ao longo da história da

engenharia e do seu ensino no Brasil: os “professores” das aulas de

matemática/engenharia eram muitas vezes os próprios governadores das

Capitanias, militares ou padres jesuítas, o que reforça a idéia de que havia

necessidade de preservação do patrimônio.

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Em 1792, no Rio de Janeiro, na então denominada Real Academia de

Artilharia, Fortificação e Desenho, havia um Curso Matemático com duração de seis

anos, pois os militares necessitavam dos conhecimentos matemáticos para as

construções, desenhos e confecção dos mapas do território brasileiro.

Enquanto isso, em Paris, em 1794, nascia a École Politechnique, fundada

no período ainda da Revolução Francesa. Era altamente tecnocrata (Belhoste, 2003)

e responsável por formar a elite de engenheiros para serem os dirigentes

intelectuais das atividades principais na França, fossem elas técnicas, industriais ou

materiais. Esta escola serviu de modelo para inúmeras escolas de engenharia em

todo o mundo, inclusive das brasileiras. Lá a matemática, ministrada por

matemáticos, era o pilar dos estudos, mais no que se refere às suas aplicações, do

que à análise. Sua utilidade se justificava principalmente para os serviços de

Marinha, Artilharia e Fortificação, o que confere alta aderência às necessidades do

início da engenharia no Brasil (Telles, 1984, 2003).

Os avanços culturais ocorridos na Europa não se refletiram imediatamente

no Brasil. A primeira Escola Politécnica brasileira, com este nome, foi criada no Rio

de Janeiro em 1874; em 1810 ela chamava-se Academia Real Militar e

posteriormente foi desmembrada em Escola Central e Escola Militar. A Academia

era responsável pela formação dos militares, formação esta voltada para a defesa

do território e construção de estradas, pontes e fortificações. Esta escola sofreu

várias reformas e trocas de nomes, como Academia Imperial Militar em 1823,

Academia Militar e de Marinha, em 1831, Escola Central em 1858, e Escola

Politécnica em 1874.

No séc. XIX, o Brasil já “produzia” professores para os cursos de

engenharia, pois alguns alunos dos primeiros cursos foram estudar na Europa e

retornaram para ministrar as aulas, como Joaquim Gomes de Souza e André

Rebouças. Aqui no Brasil, diferente da Europa, os professores que ministravam as

aulas de matemática eram engenheiros. Na Europa, os matemáticos-engenheiros é

que ministravam as aulas.

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1.3.1 Livros utilizados nos cursos de Engenharia no Brasil Colônia

Nos séculos XVIII e XIX conforme Telles (1984) a predominância era de

livros franceses. Destaco aqui alguns livros utilizados nos cursos de formação,

notadamente aqueles de matemática:

Os livros de Bernard Forest de Bélidor foram usados em Geometria Prática

em 1793. Bélidor publicou vários livros entre os quais, Nouveau cours de

mathématiques (Paris, 1725) e La science des ingénieurs dans la conduite des

travaux des fortifications et des bâtiments civils (1729-1734). Ainda em 1793,

encontramos os livros de Étienne Bézout. Bézout escreveu algumas obras como, por

exemplo, Cours de mathématiques à l'usage de l'artillerie, Cours de mathématiques

à l'usage de la marine, e Théorie générale des équations algébriques (Paris, 1779),

que tiveram muita repercussão no ensino francês.

Já no fim do século XVIII, início do século XIX, aparecem os livros de

Sylvestre François Lacroix , que publicou Traité élémentaire de calcul differéntiel et

du calcul integral (1802), Traité élémentaire d'arithmétique (1797), Traité élémentaire

de trigonométrie (1798), Elémens de géométrie (1799), e Complément des élémens

d'algèbre (1800). Estes livros foram muito usados na Real Academia Militar do Rio

de Janeiro no início do século XIX, tanto na versão francesa quanto em traduções

para o português. Ainda neste período aparecem os livros de Adrien-Marie

Legendre, como Eléments de Géometrie, traduzido para o português. No século

XIX, temos Jean-Baptiste-Joseph Delambre com o livro Système Métrique Décimal

(Paris, 1810) e Gaspard Monge com Géométrie Descriptive (Paris, 1811).

1.3.2 A República

No final do século XIX, alguns fatores, tais como a libertação dos escravos,

a proclamação da República, a conseqüente descentralização político-administrativa

e ainda o aumento do custo da agricultura causando mudanças na mentalidade

brasileira, provocam o início da atividade industrial brasileira. Outro fator motivador

foi o barateamento do ferro e do aço na Europa e Estados Unidos.

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Houve então, um movimento de criação de indústrias e em 1889 existiam

636 empresas industriais com 54.000 operários, para uma população de 14.333.915

habitantes no Brasil7 . Aos poucos a força de tração animal foi sendo substituída

pelas máquinas a vapor. A expansão da indústria foi significativa neste início de

século e em 1901, somente São Paulo já contava com 170 fábricas, mas poucas

eram nesta época as indústrias mecânicas e metalúrgicas. E menos ainda as que

empregavam engenheiros. Uma que podemos citar é a Companhia Mecânica e

Importadora (SP), que possuía oficinas de fundição, mecânica, ferraria e carpintaria,

a qual empregava quatro engenheiros.

1.3.3 As Escolas de Engenharia no Brasil

O movimento industrial provocou a expansão das escolas de engenharia.

Destaco algumas e sua relação com a mecânica, objeto de nosso estudo:

Escola Politécnica do Rio de Janeiro, criada em 1874 – nesta escola foi

criado o primeiro curso de Engenharia Mecânica no Rio de Janeiro em 1896. Com a

reforma imposta pela Lei Rivadávia Corrêa em 1911, o curso passou a denominar-se

Engenharia Mecânica-Eletricista.

Escola Politécnica de São Paulo, criada em 1893 – esta escola não seguia o

modelo da escola francesa, como algumas criadas anteriormente. Antes, seguia o

modelo da Escola Politécnica de Zurich, onde estudou o prof. Paula Souza8, primeiro

diretor da escola. Desde a sua criação, já possuía o curso de “artes mecânicas” com

três anos de duração. O laboratório de Resistência dos Materiais, embrião do

Instituto de Pesquisas Tecnológicas, teve importância fundamental no

desenvolvimento da engenharia do Brasil, pois ali houve grande desenvolvimento

das atividades de engenharia mecânica no Brasil. Existem registros do ensino do

7 Dados de 1890 segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, disponível em

<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censohistorico/1872_1920.shtm > acesso em abril/2008.

8 Paulista de Itú, ele foi o fundador e primeiro diretor da Escola Politécnica de São Paulo. Estudou na

Alemanha e retornou ao Brasil, contribuindo enormemente para a Engenharia.

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concreto armado em 1908, material este que causou grande avanço na engenharia

nacional.

Escola de Engenharia de Pernambuco, criada em 1895. Esta foi a quarta

escola de engenharia a ser fundada no Brasil. Em 1919, criou o curso de

engenheiros mecânicos-eletricistas.

Escola de Engenharia Mackenzie, criada em 1896. Até 1927 foi ligada à

Universidade de New York, que expedia os diplomas. Foi uma das primeiras a

introduzir o ensino do concreto armado no Brasil.

Instituto Eletrotécnico de Itajubá, criado em 1913. Formava engenheiros

mecânicos-eletricistas. Este instituto contratou professores da Bélgica, como Armand

Bertholet, Victor Van Helleputte e Arthur Tolbeck. Na seção de inauguração do

Instituto, houve um embate entre o Dr. Theodomiro Santiago e o Eng. Paulo de

Frontin9. Esta discussão é vista por alguns como um marco na evolução da

tecnologia brasileira, por ter sido um confronto entre o aspecto prático do ensino

defendido pelo Dr. Theodomiro e o aspecto científico defendido por Frontin.

Escola de Engenharia de São Carlos em São Paulo, criada em 1948. Seu

currículo de engenharia mecânica serviu de base para o mesmo curso na UFES.

Escola de Engenharia Militar (RJ), criada em 1928, hoje denomina-se

Instituto Militar de Engenharia. Teve muitos professores estrangeiros, vindos da

Áustria, Thecoeslováquia e Estados Unidos.

1.3.4 A Engenharia no Brasil

No início do século XX, predominava a engenharia voltada para as estradas

de ferro e o urbanismo, as construções feitas com madeira de lei e alvenaria de

9 grande nome da Engenharia no Brasil, considerado Patrono da Engenharia Brasileira e presidente

perpétuo do Clube de Engenharia e o Dr. Theodomiro Santiago (fundador do Instituto Eletrotécnico de

Itajubá – MG).

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pedra. Um dos marcos de construção deste período foi o Teatro Municipal do Rio de

Janeiro, concluído em 1909.

O número de engenheiros especialistas ainda era pequeno nesta época. O

de engenheiros nacionais era ainda menor, pois com a imigração, as indústrias

contratavam os técnicos estrangeiros. A formação de mão de obra também era

deficiente, sendo deixada em sua maioria a cargo das indústrias. Com a expansão

da borracha na Amazônia e o café em várias partes do país, foram construídos

vários portos no Brasil. Neste tipo de construção, houve grande aumento da

participação dos engenheiros brasileiros, fato que coincide com a utilização em larga

escala do concreto armado.

A utilização do concreto armado no Brasil provocou de início muita

desconfiança por parte dos mestres de obra e também dos engenheiros.

Posteriormente, passou a ser utilizado em quase todas as obras. Os cálculos

inicialmente não eram feitos no Brasil, pois quase nenhum engenheiro possuía

conhecimento necessário para realizá-los. Uma das “escolas” onde se formaram

vários engenheiros foi a firma Wayss & Freytag, com o escritório de projeto e cálculo

fundado pelo Eng. Emílio Henrique Baumgart10. O uso do concreto causou a

valorização do engenheiro e do ensino de engenharia, pois exigia certa

complexidade de cálculos matemáticos.

Marco na nossa engenharia, a criação da siderúrgica Belgo-Mineira, que se

deu em 1918, quando a Companhia Siderúrgica Mineira, foi absorvida pela firma

belgo-luxemburguesa ARBED (Aciéries Réunies Burbach-Eich-Dudelange). Esta

empresa trouxe ao Brasil vários engenheiros que introduziram conhecimentos e

técnicas até então desconhecidos no país.

Em 1919, Maurício Joppert da Silva, engenheiro formado pela Escola

Politécnica do Rio de Janeiro em 1915, tornou-se professor catedrático nesta escola.

Ele é um importante personagem na história das obras portuárias e públicas do

10 Nascido em Blumenau, estudou na Politécnica (RJ), foi professor e posteriormente trabalhou com

L.Riedlinger, que foi um dos nomes mais importantes do concreto armado no Brasil

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Brasil, como, por exemplo, o Arsenal da Marinha da Ilha das Cobras, saneamento da

Baixada de Sta. Cruz, o aeroporto Santos Dumond e outras no Rio de Janeiro.

Até o fim da Segunda Guerra Mundial, predominavam no Brasil as indústrias

leves de transformação, que atendiam as necessidades imediatas existentes. Já em

1944, predominavam as indústrias de transformação, ainda fabricando artigos para o

consumo imediato de pequeno e médio porte. Ainda em 1944, surgiu a Associação

Brasileira de Metais, que se preocupava com o progresso das técnicas em

metalurgia e com os processos de produção.

Com a situação político-econômica criada pela Segunda Guerra Mundial o

Presidente Getúlio Vargas conseguiu financiamento junto ao Governo Americano

para instituir a Companhia Siderúrgica Nacional, que entrou em funcionamento em

1946. Também durante a segunda Guerra Mundial as indústrias brasileiras se

expandiram devido à dificuldade de importação. Nesta época também, a eletricidade

começou a ser utilizada no país e chegou às fábricas substituindo as máquinas a

vapor, o que causou grande avanço tecnológico.

No Espírito Santo os registros históricos encontrados referem-se a algumas

construções tais como, em 1927, a Ponte Florentino Ávidos em Vitória. Sua

importância está no sistema de construção empregado, em seis vãos, de estrutura

metálica, foi considerado rápido, prático, simples e econômico e inédito na América

do Sul. A ponte se encontra em uso até os dias de hoje. Em Colatina, a construção

da ponte sobre o Rio Doce em 1928 é um fato digno de nota na engenharia, devido

ao fato de ter sido projetado e construído um aparelho denominado “dinossauro”,

especialmente para auxiliar na construção da ponte. Tal aparelho, com guindaste,

caldeira a vapor e contrapeso, deslocava-se sobre trilhos na estrutura já montada. A

ponte tem 700m de comprimento e possui 26 vãos (Telles, 2004). Ainda uma

construção no Espírito Santo considerada marco da engenharia é a ponte sobre o

Rio Doce em Linhares, com 633 metros que foi concluída no governo Jones dos

Santos Neves, entre 1951 e 1954.

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1.4. Matemática

Quando se fala em matemática num curso de engenharia, a opinião

daqueles com quem conversei a respeito é unânime de que ela é necessária,

fundamental, indispensável, etc. Na literatura consultada encontro também a fala de

que a matemática deve oportunizar o relacionamento da teoria com as aplicações

práticas. Barbosa (2004, p. 65-66).

Desde os primórdios da engenharia, notadamente com as Escolas

Politécnicas da Europa no século XVI (Belhoste, 2003), a matemática é a base do

curso, seja por suas aplicações práticas nas atividades de defesa e bélicas, seja por

servir de suporte para a manutenção do poder, visto que na França, a École

Polytechnique era responsável pela formação intelectual da elite dominante, e o seu

currículo era totalmente baseado nas matemáticas, consideradas no topo das

ciências por Augusto Comte. A matemática lá ensinada era baseada nas

Geometrias, só vindo aparecer a Análise por volta de 1800.

Penso que a grande questão das matemáticas, diz respeito à sua relação

com as disciplinas técnicas do curso de engenharia. Como esta relação é abordada

no currículo? Esta é uma questão de ontem e de hoje, que fazem os alunos e

também os pesquisadores como Cury (2004), que afirma que

tais disciplinas, muitas vezes não conseguem estabelecer relações com as demais atividades do curso, com a futura atuação profissional dos alunos e o exercício da cidadania. Neste caso, tais disciplinas tornam-se ilhas no currículo, sem que os alunos e, muitas vezes os professores, percebam sua raison d’être. (p. 64)

Reflieti sobre esta questão durante a pesquisa, analisando os documentos

encontrados e a fala dos depoentes.

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1.4.1 A Matemática no currículo de engenharia no Brasil Colônia

Ilustração 1. Academia Real Militar Fonte: Disponível em <<http://www.senado.gov.br/comunica/historia/imagens/escola2.jpg>>. Acesso em maio/2008.

Com a criação da Academia Real Militar, em 1810, formalizaram-se os

currículos dos cursos, e a base de formação dos engenheiros eram as matemáticas,

sendo estas ensinadas nos primeiros anos dos cursos. Destacamos aqui, as

disciplinas de matemáticas, e sua evolução, até a Escola Politécnica, em sua

reforma de 1937(Telles, 1984):

1811 – Na Academia Real Militar:

1º ano: Aritmética, Álgebra (até equações do 3º e 4º graus),

Geometria, Trigonometria Retilínea, Trigonometria Esférica;

2º ano: Resolução de Equações (Álgebra superior), Geometria

Analítica, Cálculo Diferencial e Integral, Geometria Descritiva;

3º ano: Não eram ministradas disciplinas de matemática.

4º ano: Trigonometria Esférica.

1842 – Na então Academia Militar e de Marinha:

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1º ano - Aritmética, Álgebra Elementar, Trigonometria Plana,

Geometria.

2º ano - Álgebra Superior, Geometria Analítica, Cálculo Diferencial e

Integral.

3º ano - Trigonometria Esférica.

1858 - Currículo da Escola Central.

1º ano - Álgebra Superior, Trigonometria Plana e Geometria Analítica.

2º ano - Geometria Descritiva, Cálculo Diferencial, Integral, das

Probabilidades, das Variações e Diferenciais Finitas.

4º ano - Trigonometria Esférica.

Certamente houve outras propostas curriculares no início do século XX, mas

como não consegui informações, retomo aqui a partir de 1937 com a Escola

Politécnica do Rio de Janeiro.

1937 - O Currículo da Escola Politécnica do Rio de Janeiro:

Curso Geral:

1º ano - 1ª cadeira - Álgebra (teoria geral das equações, teoria e

uso dos logaritmos), Geometria no Espaço, Trigonometria Retilínea,

Geometria Analítica.

2º ano - 1ª cadeira - Cálculo Diferencial e Integral.

2ª cadeira - Geometria Descritiva.

Curso de Ciências Físicas e Matemáticas:

1º ano - 1ª cadeira - Séries, Funções Elípticas, continuação do

Cálculo Diferencial e Integral, Cálculo das Variações e das

Probabilidades.

3ª cadeira - Geometria Descritiva e Aplicada (perspectiva,

sombras, estereotomia11).

11 Segundo Ferreira (s.d), “arte de dividir e cortar materiais de construção”.

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CAPÍTULO 2

PROCEDIMENTOS E INSTRUMENTOS UTILIZADOS

NA COLETA DE DADOS

2.1 O ACERVO

Tendo em vista um projeto de organização dos documentos da Escola

Politécnica do Espírito Santo e do Departamento de Engenharia da UFES que foi

realizado no período da pesquisa, foi possível ter acesso a algumas fontes de

primeira ordem, segundo o conceito de Le Goff.

Os documentos que ali se encontram como livros de atas de provas finais,

dossiês de ex-alunos, cópias de atas de reunião, pedidos de compra de livros, entre

outros, auxiliaram enormemente nesta pesquisa. Gostaria de ressaltar que trabalhar

com fontes de primeira ordem traz também algumas lacunas que resultam em

decepções por vezes, visto que encontramos uma informação, que leva a outra, e

vamos seguindo por essa “trilha”, e de repente, não há a informação seguinte. Um

exemplo foi com relação às ementas das disciplinas; encontrei dos primeiros anos

(fim da década de 60) até 72 e depois somente da década de 90, ficando uma

lacuna na década de 80. O encanto que os documentos originais trazem,

transforma-se em decepção, por vezes, quando falta o próximo documento.

Há também o aprendizado que vem das histórias de pessoas contadas

através daqueles documentos que manipulamos, detalhes e minúcias que vejo da

nossa própria história ali entrelaçada, enquanto participantes da sociedade viva,

principalmente, levando-se em conta o período em análise em que ocorreram várias

“turbulências” políticas no estado.

Enfim, essa possibilidade que me foi apresentada de manipular este acervo,

é ímpar na minha trajetória de pesquisadora, e trouxe grande aprendizado.

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2.2 – OS SUJEITOS

Para abranger todo o período delimitado e ao mesmo tempo viabilizar a

pesquisa, realizei algumas entrevistas. A seguir, breve curriculum dos entrevistados

e a relevância de sua entrevista.

Prof. Dr. Vladimir Ivanovitch Dynnikov, do Departamento de Engenharia

Mecânica (DEM) - Graduado em Engenharia Eletro Mecânica (Sistemas de Controle)

pela Escola Técnica Superior Estatal Bauman em Moscou (1973), doutorou-se em

Automação Industrial e Robótica (1986) e Livre Docência em Mecatrônica (1993)

pela Universidade Tecnológica Estatal em Moscou Stankin, fez pós-doutorado em

Sistemas Ressonantes pelo Instituto de Automática Industrial em Madri (2005).

Atualmente leciona na UFES. Suas áreas de atuação são: Automação e Engenharia

Biomédica (com ênfase em Tecnologia de Próteses incluindo construção de

próteses, sensoreamento, controle, materiais e atuadores).

O Prof. Dynnikov nos concedeu uma entrevista piloto a fim de alinhar o

roteiro de perguntas. Nesta entrevista, foi possível traçar um panorama que

considero ideal para cobrir o período delimitado.

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Engenheiro Áureo Machado Neto, graduado em Engenharia Mecânica pela

Universidade Federal do Espírito Santo (1980), trabalha na Aracruz Celulose há 26

anos na área de manutenção. O Eng. Neto freqüentou a Universidade em um

período importante na minha pesquisa (1975 – 1980), visto que este(1975) foi o

último ano em que a especialidade da engenharia era definida somente a partir do 4º

período. Trabalhou numa fábrica de baterias, em mineradora, sendo admitido como

trainee na Aracruz no final da década de 80. Atuou na área de projetos com

desenhos, sendo transferido no início da década de 90 para a manutenção, e foi o

primeiro engenheiro de manutenção a ser Coodernador de Área, assumindo então

função de gestão, que exerce até hoje, ocupando um cargo de gestão na área de

manutenção.

Ilustração 2. Eng. Áureo Machado Neto

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Engenheiro Ângelo Wellington Giacomim, fez curso técnico de Mecânica na

cidade de Aracruz, onde nasceu, graduou-se em Engenharia Mecânica pela

Universidade Federal do Espírito Santo em 1986 e especialista em Engenharia de

Qualidade pela UFES. Lecionou a disciplina Materiais e Serviços nesta instituição

por três turmas nos cursos de engenharia da qualidade e engenharia de

mantunação. Hoje é o responsável pelas atividades industriais da unidade da Barra

do Riacho da Aracruz Celulose, tendo o cargo de Gerente Industrial da Aracruz

Celulose, sendo funcionário da empresa desde 1987, tendo função mais de gestor

que de técnico.

Ilustração 3. Eng. Ângelo Wellington Giacomim

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Engenheiro Fabrício Luis Stange, fez curso técnico em Mecânica, gradou-se

em Engenharia Mecânica na UFES em 1980 e trabalha como Consultor na Aracruz

Celulose desde que se formou. Está fazendo mestrado em Engenharia Mecânica na

Universidade Federal do Espírito Santo, sendo orientado pelo Prof. Geraldo Rossoni

Sisquini, pesquisando Riscos Industriais na linha de Mecânica dos Solos. Iniciou na

Aracruz na oficina central (responsável pela manutenção da fábrica) atuando em

diversas áreas do processo de fabricação da celulose. Na época a manutenção era

realizada na própria fábrica e exercia uma função mais técnica, porém hoje exerce

uma função mais gerencial.

Ilustração 4. Fabrício Luis Stange

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Prof. Geraldo Rossoni Sisquini possui graduação em Engenharia Mecânica

pela Universidade Federal do Espírito Santo (1982) , graduação em Engenharia Civil

pela Universidade Federal do Espírito Santo (1988) , especialização em Engenharia

Mecânica com ênfase em Engenharia Nuclear pela Universidade Federal do Rio de

Janeiro (1983), mestrado em Engenharia Mecânica pela Universidade Federal do

Rio de Janeiro (1993) e doutorado em Engenharia Oceânica pela Universidade

Federal do Rio de Janeiro (2001). Atualmente é Professor Adjunto da Universidade

Federal do Espírito Santo, no departamento de Engenharia Mecânica. Tem

experiência na área de Engenharia Civil, com ênfase em Estruturas. Atuando

principalmente nos seguintes temas: Dinâmica de estruturas, Elementos Finitos,

Mecânica da Fratura, Estados do Mar, Propagação de Trinca de Fadiga e

Confiabilidade Estrutural. É também coordenador do curso de Engenharia Mecânica

da Universidade Federal do Espírito Santo.

O prof. Sisquini foi meu professor no curso de Engenharia Mecânica e pela

sua participação primeiro como aluno nesta universidade e depois como professor

nas disciplinas técnicas desde a década de 80 até os dias de hoje e ainda como

atual coordenador do curso, muito acrescentou a esta pesquisa.

Ilustração 5. Prof. Dr. Geraldo Rossoni Sisquini

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Eng. José Guilherme de Carvalho, graduado em Engenharia Mecânica pela

UFES em 1997, Mestre em Engenharia Mecânica pela UFES em 2000 e

Especialista em Engenharia de Equipamentos com ênfase em Produção e Refino

pela Petrobrás em 2001. Atuando como Engenheiro de Equipamentos a Petrobrás

desde 2002. Exerce de especialista no suporte técnico de engenharia de

manutenção e inspeção. Já atuou em Indústria Metalmecânica e Metalúgicas,

exercendo função de Engenheiro Mecânico, planejando execução de serviços,

elaborando propostas técnico-comerciais e acompanhando serviços.

Ilustração 6. Eng. José Guilherme de Carvalho

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Profa. Dra. Lígia Arantes Sad, professora do Departamento de Matemática da

UFES, possui graduação em Matemática pela Universidade Federal do Espírito

Santo (1976) , especialização em Matemática pela Universidade Federal do Espírito

Santo (1986) e doutorado em Educação Matemática pela Universidade Estadual

Paulista Júlio de Mesquita Filho (1998). É professora titular da Universidade Federal

do Espírito Santo. Sua área de atuação é a Educação, com ênfase em Formação e

Práxis Político Pedagógica do Professor. Atuando principalmente nos seguintes

temas: Ensino-aprendizagem, Cálculo, Epistemologia, produção de significado,

campo semântico e estipulações. A Profª. Sad tem importância ímpar neste trabalho,

visto que fui sua aluna no curso de Engenharia Mecânica e me encantava com sua

forma de atuar.

Ilustração 7. Profª. Lígia Arantes Sad

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Profª. Myrtha Saloquer Fayet, possui bacharelado (1953) e licenciatura

(1954) em Matemática pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, certificado

de aperfeiçoamento do IMPA (RJ) nos cursos em nível de pós-graduação no

Instituto de Matemática Pura e Aplicada: Tópicos de Álgebra Linear, Topologia

Geral, Álgebra 1, Álgebra 2, Análise no RM, Variáveis Complexas, Equações

Diferenciais Ordinárias, Geometria Diferencial e Formas Diferenciais (1974). Possui

ainda Certificado de aperfeiçoamento por ter sido aprovada em nove disciplinas

(acima citadas) em nível de pós-graduação no Instituto de Matemática Pura e

Aplicada (1991), Certificado de conclusão curso de especialização em matemática,

pela Universidade Federal Fluminense (RJ - 1992). Foi professora do departamento

de Matemática da Universidade Federal do Espírito Santo. A Profª. Myrtha foi minha

professora no curso de Engenharia Mecânica em 1982 e traz com sua memória e

suas histórias grande contribuição para esta pesquisa.

Considero com muito cuidado essa etapa, pois como diz Alberti (2005,

p.35), “como [...] a realização de entrevistas constitui o centro de um trabalho de

história oral, todo o planejamento de um programa depende de um certo grau de

definição da quantidade de entrevistas que se pretende realizar.”

2.3 – RECURSOS DE OBSERVAÇÃO

a) roteiros de entrevistas – o foco foi entrevista temática, visto que meu

interesse está em dados específicos acerca das disciplinas matemáticas. Para tanto

utilizei roteiros gerais de entrevista: um para os professores do departamento de

matemática (Anexo I); um para os professores do departamento de engenharia

mecânica (Anexo II); um para os ex-alunos do curso de engenharia (Anexo III).

b) Registro da entrevista – como estou interessada em reconstruir a história

através da memória dos entrevistados, escolhi as entrevistas e não questionários,

pois considero importante manter o registro dessas falas, com todas as suas

características. Atualmente a tecnologia nos permite facilidades para registro das

entrevistas. Portanto utilizei um gravador digital. Utilizei também a carta de cessão

de direitos de depoimento (Anexo IV), que os depoentes preencheram e assinaram

formalizando sua concordância.

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c) ambiente da entrevista – o local onde foram realizadas as entrevistas

ficou a critério dos entrevistados. Alguns escolheram o local de trabalho (sala na

Universidade, sala na empresa) e outros sua residência. As entrevistas ocorreram

em ambiente tranqüilo sem muitas interrupções e com certa descontração por parte

dos entrevistados.

2.4 PROCEDIMENTOS UTILIZADOS

Selecionei alguns temas de interesse quando da preparação do roteiro de

entrevistas: a) disciplinas matemáticas; b) prática de sala de aula; c) livros-texto; d)

modificações curriculares. O roteiro da entrevista foi elaborado com perguntas

considerando estes temas. Elaborei os roteiros para servir como base para a

condução das entrevistas, porém não me prendi a eles, deixando livre a fala dos

entrevistados.

Roteiro de entrevista dos professores do departamento de matemática:

Neste roteiro, a primeira pergunta “Quais disciplinas de matemática que ministra(ou)

para os estudantes engenheiros?”, está relacionada à investigação da grade

curricular e serviu também de base para investigar as modificações ocorridas nesta

grade curricular.

A segunda pergunta “Faz(ia) uso de algum livro didático? Utilizava ou

sugeria algum livro que se encontra nesta lista?” relaciona-se ao material didático e

serviu de base para facilitar a pesquisa na biblioteca e posterior análise dos livros

utilizados.

A terceira pergunta “Fale um pouco sobre a sua prática de sala de aula. Que

metodologia utilizava? Como fazia as avaliações?” investiga as avaliações através

da oralidade, que foram confrontadas com a fundamentação teórica vista acerca das

avaliações.

A quarta pergunta “Participou de alguma modificação de currículo que teve

impacto nas matérias que lecionava para a engenharia? Fale um pouco sobre isso.”,

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serviu como facilitador para busca de documentos sobre as reformas ocorridas, além

de fornecer pistas ou mesmo fatos motivadores dessas mudanças.

Roteiro de entrevista dos professores do departamento de engenharia:

Neste roteiro, a primeira e a segunda perguntas “Quais disciplinas ministra(ou) na

engenharia mecânica?” e “Quais conteúdos matemáticos considera essenciais para

o ensino-aprendizagem das suas disciplinas?”, estão relacionadas à investigação da

aplicabilidade da matemática nas disciplinas técnicas.

A terceira pergunta “Participou de alguma modificação na grade curricular

do curso de engenharia referente às matérias de matemática? Fale um pouco sobre

isso.”, relaciona-se às modificações curriculares e foi confrontada com os

depoimentos dos professores do departamento de matemática.

A quarta pergunta “Quais conteúdos matemáticos utilizava nos exemplos

em sala de aula e nas avaliações?”, investiga as avaliações e a aplicabilidade da

matemática nestas avaliações das disciplinas técnicas.

A quinta pergunta “Fale um pouco sobre sua prática de sala de aula. Que

metodologia utilizava? Como fazia as avaliações?”, investiga as dificuldades

encontradas pelos professores das disciplinas técnicas com relação às disciplinas

matemáticas.

Roteiro de entrevista dos professores do departamento de engenharia:

Neste roteiro, a primeira e a segunda perguntas “Quais disciplinas de

matemática cursou na engenharia mecânica?” e “Quais os professores ministraram

estas disciplinas?”, investiga se há algum fato relevante que ainda não foi detectado

nas entrevistas com os professores e também auxilia no cruzamento de

informações, se os professores depoentes tiverem sido professores deste aluno.

A terceira pergunta “Lembra se havia algum livro didático ou bibliografia

sugerida pelos professores relativos à matemática?”, auxilia na filtragem das

informações acerca da bibliografia e análise do material didático.

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A quarta pergunta “Como eram as avaliações desses professores?”,

preocupa-se com a opinião do educando sobre a avaliação, e servirá de base para

confrontar com a opinião dos professores depoentes.

A quinta pergunta “Como era a prática dos professores em sala de aula?”,

investiga as dificuldades encontradas pelos educandos nas disciplinas técnicas com

relação às disciplinas matemáticas.

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CAPÍTULO 3

A MATEMÁTICA NA ENGENHARIA MECÂNICA

3.1 COMENTÁRIOS SOBRE O CURRÍCULO

No início da década de 60, as atividades predominantes no estado

relacionavam-se com a cultura do café e eram a maior fonte de renda e emprego no

estado, absorvendo cerca de 92% da mão de obra ativa (Moraes 2002). Após o

golpe militar de 1964, o governo implantou programas de erradicação dos cafezais12

a partir de 1962 em todo o país, e o impacto no Espírito Santo foi de grandes

proporções, principalmente no período de 1966/67. Com essa crise no meio rural,

cerca de 120.000 pessoas vieram para as cidades.

Neste mesmo ano de 1966 foi inaugurado o Porto de Tubarão em Vitória,

com a instalação da Companhia Vale do Rio Doce já existente desde 1942. Em 1967

iniciam-se as operações de plantio de eucalipto e a construção da fábrica de

celulose Aracruz Celulose que é inaugurada em 1978. Em 1976, é criada a

Companhia Siderúrgica do Tubarão. Tais fatos vêm auxiliar na compreensão e

justificativa para a criação do curso de Engenharia Mecânica na UFES, visto que

estas empresas trariam grande desenvolvimento para o estado e absorveriam a

mão-de-obra especializada que a UFES disponibilizaria, como de fato ocorreu,

conforme constatado nas entrevistas.

Voltei às origens da Escola Politécnica do Espírito Santo, que foi criada em

1951 e começou a funcionar em 1952, sendo incorporada à Universidade do Espírito

Santo criada em 1954 por lei, mas que não na prática, passando a existir de fato

12 Programa criado pelo Grupo Executivo de Racionalização da Cafeicultura para erradicação dos

cafezais situados em regiões brasileiras inaptas e que representavam produtividade inferior a 6 sacas

beneficiadas/1.000 pés, consideradas anti-econômicas. Como resultado, 235 milhões de pés foram

destruídos e 239 mil hectares de terra estavam liberadas. Disponível em

<http://www.revistacafeicultura.com.br/index.php?tipo=ler&mat=3904>. Acesso em maio/2008.

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quando federalizada pela Lei 3.868 em 1961. Este é considerado o último ato

praticado pelo presidente Juscelino Kubitschek. O curso de Engenheiros Mecânicos

na UFES só foi criado em 1966, pela Resolução nº 8/66 do Conselho Universitário.

Seguindo o modelo da Escola de Engenharia de São Carlos, que como a

maioria das politécnicas do Brasil, seguia o modelo das Européias, a do Espírito

Santo possuía seu currículo com bases tecnocratas, e é voltada para a elite

dominante e este modelo

[...] consiste precisamente em transformar esses saberes da escola em recursos operatórios [...] (Belhoste, 2003, p. 160-161)

No Espírito Santo o Curso de Engenheiros Mecânicos também foi criado

visando o provimento da necessidade emergente, decorrente do desenvolvimento

industrial já citado, de forma que a maior preocupação era a formação profissional

dos engenheiros.

No depoimento dos entrevistados verificamos que o currículo deixa a

desejar neste aspecto, como fica claro, através da fala do Eng. Ângelo Giacomin,

quando ele diz que

a importância da formação básica em engenharia na gestão é representativa, pois trabalho muito mais na função de gestão, mas a base de raciocínio utilizada é oriunda do aprendizado obtido na engenharia. A fábrica é totalmente automatizada e para tomar uma decisão você precisa verificar se o balanço de vapor-energia está correto, avaliar as alternativas e tendências, etc. Na minha função, não faço o cálculo do balanço de energia ou do balanço de vapor. A equipe faz isso. Mas tenho que ter o discernimento para saber se aquelas informações têm profundidade, ter capacidade de questionar e verificar se não está deixando de considerar algo, para poder tomar a decisão. Na realidade trabalhamos em equipe e um conjunto de pessoas participa de uma decisão. A base da engenharia dá a sustentação para esta análise e decisão. Então a aplicação direta de conhecimentos matemáticos ou de engenharia não é muito grande, mas a base de formação que eu tive é o que me permite agilidade na tomada de decisão. A função é muito mais de análise de dados, avaliar um resultado e verificar se tem lógica. (Giacomin, 2007)

Ou seja, em sua formação de base técnica, o currículo cumpre seu papel,

mas na sua função de “molde” (Belhoste, 2003), para a elite dominante, que é

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aquela que vai gerir, deixa a desejar. Esta opinião se reflete ao longo do período

analisado, visto que encontramos a mesma fala na entrevista do Eng. Áureo Neto,

que se formou em 1980 quando diz que “notava uma distância muito grande da

faculdade para a vida de uma empresa”. Fica aqui a questão de a quem o currículo

serve, se aos engenheiros gestores, aos engenheiros projetistas ou aos engenheiros

produtores de tecnologia. Fica clara esta questão na fala dos depoentes, como

nessa do Eng. Stange, que se formou em 2000, quando comenta da dificuldade de

se tratar com a tecnologia existente hoje e coloca como pauta de discussão,

como ensinar ciência utilizando a tecnologia que tem hoje, como exemplificar isso com a tecnologia que tem hoje. Como usar os laboratórios nesse sentido. Não é tornar o ensino tecnológico. Como ensinar ciência de uma forma mais focada. Esse é um ponto que eu acho que a gente peca muito. Nossa formação peca muito, Poderia ser melhor. (Stange, 2007)

Encontramos a mesma realidade na Avaliação Institucional do CT de 1995,

onde apesar de os alunos perceberem o

curso muito mais voltado para a formação do profissional-engenheiro do que para professores/pesquisadores e muito menos para o professor que vai atuar nos 1º e 2º graus,

existe uma insatisfação de 45% dos entrevistados, quanto a “adequação

dos pré-requisitos e da seqüência da oferta de disciplina” o que “parece indicar que

a estruturação do curso não obedece a uma ordenação lógica”. Os alunos ainda

percebem (62%) que o curso é “excessivamente teórico, considerando que os

aspectos práticos são relegados a 2º plano”. Consideram, (50% dos entrevistados),

que “são feitas restritas ou mínimas associações entre as questões técnicas e

teóricas e o contexto sócio-político local, nacional e internacional durante o

desenvolvimento das disciplinas. Apenas 25% consideram este aspecto enfatizado

de maneira ampla”.

De 1995 para cá houve mais uma modificação curricular na Engenharia

Mecânica, agora em 2006, onde algumas disciplinas técnicas foram criadas como

Introdução à Engenharia e são ministradas nos períodos iniciais do curso, o que

espero traga uma realidade mais satisfatória para os que nele ingressam. Mas nesta

pesquisa não terei como verificar os reflexos desta mudança, deixando aqui em

aberto a questão para novas pesquisas.

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3.2 AS DISCIPLINAS MATEMÁTICAS NA ENGENHARIA MECÂNICA

Considero importante analisar também a relação das disciplinas de

matemática com as disciplinas técnicas do curso de engenharia mecânica e

pensando nesta relação, analisei primeiramente as alterações ocorridas na grade

curricular considerando a nomenclatura das disciplinas, a partir das ementas e

programas de curso encontradas no CT/UFES. Tive dificuldade de conseguir

informações em todo o período. No acervo do CT/UFES tem material até 1975 e no

departamento de matemática só encontrei material da década de 90 e dos anos

2000.

Não encontrei também as ementas de todas as disciplinas que pude

constatar como constantes do currículo em alguns anos. Como o tempo de pesquisa

de mestrado é bastante limitado, trabalhar com fontes de primeira ordem apresenta

uma dificuldade a mais, que é a continuidade da informação. Talvez, com mais

tempo, pudesse fazer mais entrevistas e recolher documentos em poder dos

entrevistados e que poderiam preencher as lacunas deixadas pela falta de

documentos, ou mesmo ir a outras fontes que tivemos acesso.

Nos quadros abaixo (1 e 2) detalho as disciplinas que compunham o

currículo do curso na época de sua criação. Verifico que no quadro 1, onde estão as

disciplinas do Ciclo Básico, predominam as matemáticas e que a Álgebra não está

presente, o que será discutido no próximo capítulo.

No quadro 2, estão as disciplinas técnicas, que embora não explicitado aqui,

têm em sua maioria, têm como pré-requisito as disciplinas do Ciclo Básico, sendo

portanto, as disciplinas matemáticas a base do curso.

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Ciclo Básico – Disciplinas do ciclo básico do currículo

de engenharia mecânica da UFES em 1966

Calculo Diferencial e

Integral

Geometria Analítica e

Cálculo Vetorial

Cálculo e Análise

Vetorial

Cálculo Numérico e

Estatística

Física I (Mecânica,

Acústica e Termologia)

Física II (Estática)

Física III (Eletricidade) Física IV (Mecânica

Racional)

Mecânica dos Corpos

Elásticos

Química Descritiva (Geometria) Desenho

Quadro 1. Ciclo Básico

Ciclo de Formação Profissional – Disciplinas técnicas do

currículo de engenharia mecânica da UFES em 1966.

Resistência dos

Materiais

Mecânica dos Fluidos Metalografia e

Metalurgia Física

Mecânica Aplicada às

Máquinas

Elementos de Máquinas Tecnologia Mecânica

Eletrotécnica Termodinâmica Aplicada

à Transmissão de Calor

Hidráulica Geral

Materiais de Construção Siderurgia e

Conformação de

Materiais

Máquinas de Elevação e

Transporte

Estruturas Metálicas Máquinas Elétricas Máquinas de Fluxo

Máquinas Térmicas Arquitetura e

Planejamento Industrial

Máquinas Operatrizes

de Conformação

Máquinas Operatrizes

de Usinagem

Regulação e Sistema de

comando nas máquinas

operatrizes

Custos industriais e

Finanças das empresas

Noções Gerais de

Direito

Economia Organização Industrial

Administração e

Relação Humanos

Planejamento e Controle

da Produção

Lubrificação de

Máquinas

Quadro 2. Ciclo de Formação Profissional

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CAPÍTULO 4

A EVOLUÇÃO DAS DISCIPLINAS MATEMÁTICAS

Ilustração 8. Ementa da disciplina de Estatística da Escola Politécnica de 1971.

Começo minha análise montando um quadro com as disciplinas

matemáticas oferecidas no período delimitado, mas coloco na primeira coluna do

quadro 3 abaixo, as disciplinas citadas para o curso de engenheiros no Brasil

Colônia, para melhor exemplificar a análise feita.

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Evolução das disciplinas

Disciplina Séc. XIX 1966-1969

1970-1979

1980-1989

1990-2006

Álgebra (Básica, Elementar, Superior) X

Álgebra Linear X X X

Análise Vetorial X

Cálculo Diferencial e Integral X X X

Cálculo I X X X

Cálculo II X X X

Cálculo III X X X X

Cálculo Numérico X X X X

Cálculo Vetorial X X

Equações Diferenciais X

Estatística X

Geometria Analítica X X

Geometria Analítica e Álgebra Linear X Geometria Analítica e Elementos de Cálculo Vetorial X Geometria Descritiva e Elementos de Geometria Projetiva X X

Matemática Básica I X

Matemática Básica II X

Probabilidade e Estatística x X X

Trigonometria X

Aritmética X Quadro 3. Evolução das Disciplinas

Considerando o quadro 3, constato que as disciplinas Álgebra, Aritmética e

Trigonometria, constantes do currículo do período colonial não faziam parte do

currículo nem como disciplina, nem inseridas como tópicos de outras disciplinas,

conforme pude constatar pela análise das ementas dos cursos das décadas de

1960-1970.

A disciplina Matemática Básica I contempla basicamente o estudo de

funções e é considerada um pré-Cálculo13 a disciplina de Matemática Básica II

estuda as coordenadas cartesianas no plano e no espaço, sendo portanto uma

13 segundo a ata da décima reunião da comissão de reformulação do curso de matemática realizada

em 17/08/2004.

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disciplina de Geometria Analítica, o que me leva a concluir que Trigonometria e a

Aritmética não fazem parte do programa.

No final da década de 60 a análise era basicamente vetorial, inclusive com

os livros utilizados, como um dos citados: o Pablo & Meryno (Curso de Cálculo

Diferencial), segundo a Profa. Sad (depoente). No início da década de 1970, houve

uma grande reforma que criou algumas disciplinas como os Cálculos I, II, III e

Numérico e dissociou outras, como a Geometria Analítica e a Álgebra Linear, que

passaram a existir separadas. A Profa. Lígia explica que a Álgebra Linear veio então

substituindo uma parte da Geometria Analítica, que tinha uma ênfase mais vetorial.

A vantagem de se ter a análise de forma menos vetorial, segundo ela está no fato de

a análise passar a “ser mais específica, porque antes, ficava meio misturada e

escondida no meio do Cálculo. Depois não, havia a liberdade de se trabalhar com

vetores, depois com as transformações lineares, que vieram ajudar noutras partes

da engenharia”. Seria interessante aqui aprofundar nessa questão histórica

buscando outras fontes, para saber então, na própria história da matemática como

se deu esta questão e como isso se propagou nas escolas politécnicas no mundo e

no Brasil, mas como não será possível dar conta nesta pesquisa, fica aqui em aberto

a questão, para um estudo posterior.

A Geometria Analítica é uma disciplina que se mantém durante todo o

período embora às vezes esteja associada a outras como, o Cálculo Vetorial na

década de 1960, Álgebra Linear na década e 1970 e depois sozinha de 1980 em

diante.

A Estatística também é uma disciplina que se mantém em todo o período,

passando a ser associada à Probabilidade a partir da reforma de 1970 e se

mantendo assim.

De acordo com os documentos a que tive acesso, verifico que as disciplinas

de matemática no período analisado se mantém como pilares do curso de

engenharia mecânica sendo consideradas como pré-requisito para as disciplinas

técnicas.

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Como exemplo, temos em 197114 as disciplinas de cálculo como pré-

requisito para as disciplinas de Mecânica, como segue no Quadro 4:

Disciplinas e Pré-requisitos

Ano Disciplina Pré-requisito

Cálculo I

Cálculo II Cálculo I

Cálculo III Cálculo II

Mecânica II Cálculo III

1971

Mecânica Aplicada I Mecânica II

Elementos de Máquinas Mecânica Aplicada I

Máquinas Operatrizes Elementos de Máquinas

Vibrações Mecânicas Mecânica Aplicada

Máquinas Hidráulicas Mecânica Aplicada

Cálculo IV Cálculo III

Termodinâmica Cálculo IV

Transmissão de Calor Termodinâmica

Máquinas Térmicas Transmissão de Calor

Regulação de Sistemas Cálculo IV

Desenho de Máquinas Geometria Descritiva

Elementos de Máquinas Desenho de Máquinas

1973

Máquinas Operatrizes Elementos de Máquinas

Quadro 4. Disciplinas e pré-requisitos

Embora sejam pré-requisito para as disciplinas técnicas, as disciplinas de

matemática, pela forma como são ministradas deixam uma lacuna entre o

embasamento teórico a que se propõem e a sua aplicação nas disciplinas práticas,

fala esta que encontramos o Eng. Fabrício Stange, que se queixa da falta de

associação entre a matemática e as disciplinas técnicas, quando diz que o currículo

é feito de

14 Conforme ata do conselho departamental do CT/UFES de 29/12/71.

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forma que você não associa a matemática aos problemas físicos, às cadeiras de engenharia. Chega lá no início, você estuda Cálculo I, Cálculo II, Cálculo III, Cálculo Numérico e em momento nenhum tentam associar essa matemática - que é pura nesse momento - aos problemas que você vai enfrentar de engenharia lá na frente. Você estuda, por exemplo, diferenciais e para que serve aquilo? Você só vai saber para que serve aquilo, lá na frente, quando pegar por exemplo a disciplina Mecânica dos Fluidos. E aí, você não faz nem correlação. Quando você percebe... “pôxa”, aquilo que eu estudei lá atrás me faz falta agora. Só que eu poderia ter utilizado isso de forma muito mais interessante, se eu tivesse uma associação tipo: você está aprendendo, porque no contexto da engenharia você vai utilizar isso desta forma. Se no começo os cursos de matemática já fossem voltados para isso. Não que você vá simplificar as disciplinas de matemática para atender a engenharia. Mas que já focasse.

Já houve modificações neste sentido, como por exemplo, na reforma de

2006 (que entrou em vigor em nov/2007), em que as disciplinas de matemática

aproximaram-se mais das disciplinas técnicas como nos conta o Prof. Dynnikov e

verificamos no novo currículo de que este está “aproximando as disciplinas pesadas

que necessitam de matemática para períodos iniciais”.

Gostaria ainda de comentar também sobre a disciplina Estatística que não

aparece no Séc. XIX, mas está no currículo inicial do curso, sendo acrescida em

1980 da Probabilidade e permanece em todo o período analisado. Esta disciplina é

de suma importância para a função de gestão, está presente em todo o período e

ainda assim, não é reconhecida como deveria, como nos diz o Eng. Áureo Neto

falando de sua prática e dizendo que no dia-a-dia, “um colega que vai fazer um

sistema de manutenção preventiva ou preditiva precisa conhecer e usar estatística”

e que

a Curva ABC, por exemplo, muita gente conhece, mas pouca gente sabe aplicar e é uma das ferramentas mais simples que existe no mundo da matemática e da estatística... pouca gente sabe usar e se soubesse diminuiria com certeza o esforço que faz para resolver os problemas.

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CAPÍTULO 5

ALTERAÇÕES CURRICULARES

Ilustração 9. Currículo de Engenharia Mecânica de 1970

Através dos documentos analisados e das entrevistas, verificamos três

mudanças significativas no currículo (1971, 1982 e 2006), sem contar algumas

modificações de ementa e de nomenclatura de disciplinas.

Em 1971, o Conselho Universitário em sessão extraordinária de 16/03/71,

alterou o programa de algumas disciplinas de matemática do currículo de

engenharia mecânica, conforme registrado na ata:

(...) tendo deliberado o Conselho que: 1 – o programa de ‘Análise Vetorial e Cálculo Numérico’ deverá ser revisto pelo Professor da disciplina, a fim de que sejam satisfeitas as exigências da resolução 6/70 do Conselho Universitário, que alterou o Regimento desta escola; 2 – seja excluída a parte de ‘Nomografia’(Ilustração XXX) do programa de ‘Geometria Analítica e Álgebra Linear’ e 3 – retorne o programa de ‘Geometria Descritiva e Elementos de Geometria Projetiva’ do

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Regente desta disciplina, para adaptação do critério de verificação de aproveitamento à Resolução baixada pelo Conselho Departamental sobre o assunto, aprovados os demais programas e planos de ensino.

Ilustração 10. Ementa da disciplina de Geometria Analítica e Álgebra Linear de 1970.

Esta foi uma grande mudança, pois ocorreu para satisfazer as exigências da

reforma universitária de 1968. O Plano Institucional de modificação inclusive

estrutural da UFES desta data e como mostra o quadro 3, alterou várias

disciplinas. Não foi possível pontuar as pequenas modificações de ementas e

nomenclaturas ocorridas, visto que no acervo da Politécnica, não foram

encontrados documentos de todos os anos e no departamento de matemática, só

encontramos disponível algum material que foi digitalizado, estando os arquivos

em papel indisponíveis para consulta no momento da pesquisa.

Houve uma reforma em 1982, como nos relata o Prof. Geraldo Sisquini

(depoente), onde já foram aproximadas algumas disciplinas técnicas dos

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primeiros períodos, mas pelo que pudemos perceber, foi mais a nível

departamental.

A última reforma aconteceu 2006, e entrou em vigor em 30/11/2007 como

nos relatam os Profs. Wladimir Dynnikov e Geraldo Sisquini e resulta no seguinte

currículo:

Ciclo Básico do Currículo Atual - 1º e 2º anos Programação Básica de

Computadores Cálculo I, II e III A Álgebra Linear

Desenho Técnico Mecânico I e II

Introdução à Engenharia Mecânica

Química Tecnológica

Algoritmos Numéricos I Probabilidade e Estatística

Quadro 5. Ciclo Básico do Currículo Atual

Ciclo de Formação Profissional do Currículo Atual – 3º ao 5º anos Eletricidade Aplicada Mecânica I, II e III Termodinâmica I, II

Ótica Aplicada Metrologia Dimensional Princípios de Ciência dos Materiais

Eletrônica Básica Laboratório de Materiais I e II

Laboratório de Sistemas Mecânicos I II e III

Mecânica dos Fluidos I e II

Resistência dos Materiais I e II

Tecnologia dos Materiais de Construção Mecânica I eII

Economia da Engenharia I e II

Fundamentos de Usinagem

Mecanismos

Vibrações Mecânicas I Elementos de Máquinas I e II

Fundição e Soldagem

Modelagem de Sistemas Dinâmicos

Processos de Usinagem Seleção de Materiais

Transferência de Calor I e II

Elementos de Automação e Instrumentação

Laboratório de Engenharia Térmica I e II

Máquinas de Fluxo Processos de Conformação Mecânica

Sistemas Hidráulicos e Pneumáticos

Aspectos Legais e Éticos da Engenharia

Organização Industrial Máquinas Térmicas

Refrigeração e Ar Condicionado I

Sistemas de Controle Sistemas de Produção e Automação de Manufatura

Fundamentos da Engenharia Ambiental

Equipamentos Mecânicos Industriais

Estágio Supervisionado I e II

Lubrificação Industrial Manutenção Industrial Quadro 6. Ciclo de Formação Profissional do Currículo Atual

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Conforme análise do currículo atual em comparação com o currículo inicial,

verifico que houve várias modificações nas disciplinas técnicas e poucas nas

disciplinas matemáticas. A Geometria Analítica que aqui não aparece como

disciplina está inserida no programa de Cálculo II, permanecendo portanto.

Ilustração 11. Programa da década de 80 com cálculo da média.

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Ilustração 12. Plano de Curso de Cálculo de 1988, com metodologia de trabalho.

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CAPÍTULO 6

AVALIAÇÕES

Ilustração 13. Registro em ata de uma prova de Mecânica dos Fluidos de 1967.

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lI

Ilustração 14. Registro em ata de uma prova de Mecânica dos Fluidos de 1967.

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Avaliar significa, segundo Ferreira (s.d), valorar e é nesse sentido que vêm

sendo feitas as avaliações de aprendizagem dos alunos. É uma herança que

trazemos de vários séculos. Pois segundo Luckesi (2005, p. 21),

os exames escolares que conhecemos hoje em nossas escolas, foram sistematizados nos séculos XVI e XVII, com as configurações pedagógicas produzidas pelos padres jesuítas (séc. XVI) e pelo bispo protestante John Amós Comênio (fins do séc. XVI e primeira metade do XVII). Somos herdeiros dessa história.

Ainda no início do século XX, sob a influência de Tyler e Bobbit, a avaliação

da aprendizagem era vista de uma forma totalmente quantitativa, pois a visão era

completamente tecnicista. A característica era de mensuração, a fim de identificar se

havia aprovação/reprovação ou classificação. Aqui no Brasil não foi diferente e no

início do período delimitado pela pesquisa (fim da década de 60), a visão ainda era

essa.

Principalmente na engenharia, onde as matemáticas dominavam e ainda

dominam o currículo de formação básica a idéia de mensuração era/é forte. As

questões que aparecem nos exames referem-se a um conteúdo específico, sendo

pontuais e não medindo, portanto, a aprendizagem do aluno, mas sim a retenção

daquele conteúdo específico. Os depoimentos dos engenheiros de pernambuco

exemplificam esta idéia, como esse de Arlindo Pontual (Montenegro, 1995, p. 95),

eu aplicava os três exercícios escolares no primeiro período. No segundo eu não passava nenhum exercício escolar. Partia do conceito, que era explanado bem aos alunos, sobre o que eles, amanhã, como engenheiros, iriam ser solicitados a fazer: calcular uma ponte com sistema estrutural, com local para atravessar o rio, ou mesmo calcular as ferragens.

Podemos ver que ele aplicava exercícios no primeiro período e em seguida

partia do conceito que havia sido “explanado” aos alunos sem, no entanto, no

segundo período se preocupar em aplicar exercícios para conferir se o conceito

havia sido “compreendido” e “aprendido” pelos alunos. Temos ainda outro

depoimento deste mesmo professor que, falando da década de 70, diz que

até que pró-reitora proibiu que se colocasse mais de uma nota por projeto. Em 1971, o projeto foi facultativo, fazendo-se os

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três exercícios escolares no segundo período. Evidentemente não havia condições de os alunos fazerem. (id, p. 96)

Na UFES, no final da década de 60 e início da década de 70, existia prova

oral (veja Ilustração 14, item 3.4). Encontramos algumas evidências no acervo

pesquisado, como por exemplo de que na disciplina Geometria Analítica e

Elementos de Nomografia em 196815, eram aplicadas 2 provas escritas por período

sendo uma considerada como recuperação e uma prova escrito-oral e era feita a

média aritmética das duas.

Ilustração 15. Prova de Cálculo Diferencial e Integral da Escola Politécnica em 1971

Na disciplina Cálculo III (1972) eram permitidos a critério do professor,

exercícios de reforço e os mesmos poderiam ser utilizados para acrescentar até 0,3

décimos na nota final do aluno. Embora não fosse oficial, era permitida a revisão de

prova, “a pedido verbal ou escrito do aluno, diretamente ao professor, para

15 Acervo CT –UFES - Pasta “Sobras de Programas”

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verificação de ‘erros de soma’, ‘erros de correção’, lapsos de correções ou ausência

de notas.

Ilustração 16. Prova de Cálculo Diferencial da Profª. Mirtha Fayet em 1967

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Na disciplina de Cálculo Vetorial de 1974, eram aplicadas duas provas

escritas, uma de recuperação e uma prova final. O aluno poderia solicitar revisão de

prova.

Na disciplina Estatística, em 1974, eram aplicados dois ‘exercícios escolares

práticos’, um ‘exercício de recuperação’ e uma ‘prova final escrita, desmembrada em

duas partes: Teórica e Prática’. Era permitida revisão de prova, desde que solicitada

logo após a entrega.

Na disciplina Geometria Analítica e Álgebra Linear de 1970-71, eram

realizadas três provas escritas, sendo uma de recuperação e uma prova de natureza

escrito-oral.

O que entendemos por avaliação difere conceitualmente dessa idéia, visto

que concordando com Luckesi (2005), o ato de avaliar tem como sinônimo

diagnosticar, a fim de identificar possíveis dificuldades e intervir para sanar essas

dificuldades, visando produção de conhecimento por parte do educando. Nesse ato

de diagnosticar, é fundamental o ato de acolher, de prestar atenção no aluno. E se

faz necessária a utilização de instrumentos adequados a este diagnóstico, porque

quaisquer que sejam os instrumentos – questionário, teste, redação, monografia, dramatização, participação em seminário, argüição... – necessitam de manifestar qualidades satisfatórias como instrumentos para serem utilizados na coleta de dados para a avaliação da aprendizagem escolar [...] (Luckesi, 2005, p. 51)

Se forem utilizados instrumentos inadequados, não se terá um diagnóstico

correto e poderão ser tomadas ações incorretas, não atingindo-se, portanto, o

objetivo principal da avaliação que é auxiliar na produção de conhecimento dos

educandos.

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Ilustração 17. Prova de Cálculo Integral da Profa. Fayet de 1966.

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Algumas exceções são vistas no que se refere à prática individual de alguns

professores, por exemplo, com relação à revisão da “prova”, pois encontrei na

prática deles esta preocupação com o aluno. Esse trecho da entrevista com o Prof.

Geraldo Sisquini do DEM, ilustra bem esta idéia. Ele nos conta que quando tem

“turmas com poucos alunos, faço uma avaliação mais dirigida. Conheço o aluno, vou

passando trabalhos, verifico onde errou, vamos corrigindo, passo de novo”. Este

conhecer o aluno é que faz a diferença entre avaliação e exame e com muitos

alunos na turma não é viável na prática um acompanhamento mais próximo. Como

ele mesmo nos relata um pouco adiante na entrevista, dizendo que “quando é uma

turma grande com quarenta... é marcar uma prova de cinco questões, quatro

questões, três... eu faço um gabarito, corrijo, procuro padronizar o gabarito para que

ninguém reclame que o outro foi beneficiado.”

No departamento de matemática, também encontramos professores que

não avaliavam somente pela nota, como nos conta a Profa. Lígia Sad, falando de sua

prática, dizendo que “do lado da avaliação de um modo geral, eu olhava aqueles

alunos que estavam sempre presentes, os que participavam mais, e aí estar aferindo

isso também na hora de avaliar”, o que demonstra que existia uma preocupação

com a aprendizagem do aluno, embora isso não se refletisse diretamente na nota,

visto que os critérios de avaliação baseavam-se nas provas, como foi dito

anteriormente. A Profa. Mirtha Fayet também relata que se preocupava com a

avaliação e “achava abominável dar uma questão longa numa prova pra nota,

porque não havia necessidade.”

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Ilustração 18. Prova de Cálculo Diferencial de 1966

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Ilustração 19. Prova de Cálculo Diferencial de 1966

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Durante todo o período delimitado noto a presença de provas descritivas

conforme nos relata o Prof. Geraldo Sisquini, quando diz que todas as suas provas

são descritivas e que “a maioria das provas do curso de engenharia são descritivas.

Tem uma ou outra avaliação que algum professor faz, às vezes, objetiva, mais por

uma questão de momento, quer dar uma avaliação mais leve, mas a maioria é

descritiva”. E não somente descritivas, mas também sem relação direta com a

aplicação daqueles conteúdos nas disciplinas técnicas. Alguns exemplos de

questões que ilustram este pensamento:

� Prova de Estatística (1967) – Uma urna contém 2 bolas brancas e 2

bolas pretas. Outra urna contém 2 bolas brancas e 4 pretas. a) Tira-

se uma bola de cada urna. Calcular a probabilidade de serem da

mesma cor; b) Escolhe-se uma das urnas, ao acaso, depois, tira-se

uma bola. Calcule a probabilidade de ser ela branca. c) Escolhe-se

uma das urnas, ao acaso e tiram-se duas bolas. Qual a probabilidade

de serem da mesma cor?

� Prova de Elementos de Máquina (1968) – Consulta permitida a livros

e apontamentos do aluno; não são permitidos empréstimos.

� Lista de exercícios de Álgebra Linear (1980) – Provar que a

superfície é simétrica em relação a cada um dos planos coordenados

então ela é também simétrica em relação à origem. A recíproca é

verdadeira?

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Ilustração 20. Lista de Exercícios de Álgebra Linear I da Profa. Lígia Sad de 1980

Com relação a recursos que poderiam ser utilizados nas avaliações e

também com relação à caligrafia e apresentação, verifico que havia maior cobrança

de apresentação no início do período como ilustra esta prova de segunda época de

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Cálculo Diferencial de 1969, onde está descrito o critério de avaliação da prova e é

atribuído 0,5 ponto para apresentação, disposição e orientação e mais 0,5 ponto

para rascunhos orientados e apresentáveis. O rigor se mantém no período analisado

e até bem pouco tempo atrás não era permitido nem o uso de calculadoras, como se

pode ver através de algumas evidências encontradas no acervo pesquisado e na

fala dos depoentes.

Havia um maior rigor com relação à caligrafia, organização, rascunhos como

ilustra uma prova de Cálculo Diferencial de 1967, onde após as questões, o

professor coloca algumas orientações aos alunos, que ele chama de observações:

1) O aluno deverá resolver em ordem numérica as questões apresentadas;

2) A primeira questão deverá ser resolvida na primeira e segunda páginas;

3) A segunda questão deverá ser resolvida na terceira, quarta e quinta páginas;

4) A terceira questão deverá ter o resultado na sexta e sétima páginas;

5) A última página será reservada para contas, rascunhos e análises das questões;

6) Preste atenção, faça uma boa prova e Feliz Natal e Próspero 1968. (Acervo CT/UFES)

E ter um natal feliz fica sendo este mais um item a ser cumprido. Mas hoje

este rigor não é mais percebido, tendo o aluno a liberdade de seguir seu raciocínio

na ordem que melhor lhe convier.

Encontrei, porém, na prática de alguns professores, que embora severos e

expositivos, permitiam ao aluno questionamentos. Nesse trecho a seguir temos

exemplo claro deste comportamento, quando o Eng. Áureo Neto, nos conta sobre

um professor da disciplina Termodinâmica do final da década de 70, início da

década de 80,

- Nossa senhora, o bicho era o cão! mas eu gostava muito de estudar, gostava muito de estudar aquela matéria... Termodinâmica para mim era muito legal, eu achava interessante calcular os trocadores de calor, porque tinha mesmo a parte prática, tinha equipamentos que eu mais ou menos já conhecia. E aí eu fui fazer uma prova, terminei a prova, cheguei para ele e falei assim: “- Eu escrevi uma observação aqui, depois você dá uma olhada.” e no dia da correção da prova, ele disse: “- Você é muito cara de pau.” Eu

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disse: “- Por quê?” Ele disse: “- Você foi lá e fez os cálculos, a sua lógica estava toda certa, mas seus números eram um absurdo, não tinha nada a ver!” E ai você vem e escreve: “favor desconsiderar o resultado final, porque eu nunca vi um trocador de dois quilômetros de comprimento, então devo ter errado em alguma coisa no meio. Me dê um tempo que vou fazer as contas de novo.” Ele disse: “- Pôxa, você é muito cara de pau! Mas está bom, pelo seu raciocínio e pela sua lógica também, você tem razão, não existe equipamentos deste.” Então, bom senso é muito interessante, até porque você pode ter erros nos cálculos matemáticos e se você não tiver uma correlação, se não souber em cada etapa do projeto que você está fazendo... pôxa vida, isso aqui está muito fora, é absurdo, assim não dá, vou voltar aqui... ou confirma mesmo. (Eng. Áureo Neto, depoente)

Noto que apesar das questões serem discursivas, o que verificamos

permanecer durante todo o período pesquisado, o professor considerou o raciocínio

do aluno, não se prendendo apenas à resposta, ou seja, aos números.

Na década de 70, já começa a haver alguma mudança e verifico algumas

tentativas como relatado nos documentos do acervo onde na disciplina Cálculo

Numérico em 197216 verifiquei que eram aplicadas 3 avaliações e consideradas as 2

maiores e que o professor (Robson Sarmento) considerava a possibilidade de

passar exercícios de reforço. No início da década de 80, aparecem outras práticas

que traduzem a vontade dos professores de modificar esta forma de examinar e

passar a avaliar, conforme depoimento da Profa. Lígia Sad do departamento de

matemática,

as avaliações eram pautadas em testes e provas. No início nós dávamos 4 (quatro) provas. Na década de 80, nós introduzimos os testes, então, diminuíamos a quantidade de prova e colocávamos os testes. Os testes eram para serem feitos em uma hora. Uma coisa mais rápida, mais localizada em termos de conteúdo também. E as provas de um modo mais abrangente. E nós tínhamos também lista de exercícios. Só que essas listas de exercícios não tinham uma nota direta para o aluno. Era mais no sentido de apoio ao aluno, para que eles revissem a matéria para a prova. E nós procurávamos colocar algum exercício da lista ou mesmo parecido na prova para beneficiar aqueles que se debruçavam na lista de exercícios. Era basicamente uma avaliação do lado somativo em cima das provas. Do lado da avaliação de um modo geral, eu olhava aqueles alunos que estavam sempre presentes, os

16 Acervo CT –UFES – Programas de Disciplinas “Seriado” 1971 a 1973

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que participavam mais, e aí estar aferindo isso também na hora de avaliar. (Profa. Sad, depoente)

Encontrei algumas tentativas de questões vinculadas à aplicação, no final

da década de 80, mas que considero tímidas, como nessa prova de Cálculo I:

- Prova de Cálculo I (1985) – Enuncie e interprete geometricamente o

teorema de valor médio.

- Prova de Cálculo I (1989) – Um sitiante deve cercar um terreno com forma

de um setor circular. Ele dispõe de 360m para cercá-lo, dando 3 (três) voltas. Qual

deve ser o raio do setor para que a área seja a maior possível? Qual é a área

máxima?

Na década de 90, já houve uma abertura maior, conforme este outro

depoimento da Profa. Lígia Sad, onde vemos uma preocupação maior com o

conhecimento do aluno e não somente com a retenção de conteúdos expostos pelo

professor.

Inclusive nas turmas depois de 1990, que já eram feitas atividades em grupo, era muito comum eu pegar alguns alunos melhores, digamos assim, mais desenvolvidos, e eles tornavam-se monitores dos outros. Essa era uma metodologia que nem sempre era bem vista por outros professores, mas que funcionava. (Profa. Lígia Sad, depoente)

Esta preocupação era presente na prática de alguns professores, não

constituindo regra geral, como nos mostra a Avaliação Institucional do Centro

Tecnológico feita pela UFES em 1995, em que

os aspectos percebidos como mais problemáticos na avaliação são: ‘medidas que ajudam a prevenir a ansiedade estudantil na avaliação’, ‘identificação continuada do progresso dos estudantes através de formas de avaliação que não sejam provas e testes’ e ‘variedade de instrumentos de avaliação utilizados’, vistos respectivamente por 70%, 55% e 50% dos alunos, atendidos, no máximo, de forma restrita.

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Ilustração 21. Prova de Cálculo de 1957

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CAPÍTULO 7

A PRÁTICA DE SALA DE AULA

A partir dos relatos encontrados em Montenegro (1995) acerca da escola de

Engenharia de Pernambuco e a partir das entrevistas, considerando as atitudes17 do

professor perante a turma; como o professor propunha os exercícios das disciplinas

matemáticas, se fazia ou não alguma ligação ou referência com as disciplinas

técnicas; se o professor permitia ou não atividades em grupo, ou se as aulas eram

preferencialmente expositivas; se os educandos tinham ou não voz em sala; se no

decorrer do período analisado, analiso se estas práticas modificaram-se em

decorrência do momento político vivido, por motivos pessoais, ou não se

modificaram.

Verifiquei que no final da década de 1960, início da década de 1970 existia

uma disciplina bem rígida, não sendo permitidas conversas durante a exposição do

professor. Vejo esta postura no depoimento de um engenheiro e professor de

Pernambuco (Montenegro, 1995) da década de 60, Ivan de Albuquerque Loureiro ao

relatar sua prática de sala de aula, assumindo sua postura severa, dizendo que ele

era um professor muito exigente. Todo professor de matemática os alunos achavam exigente. Eles reclamavam, eu dizia: ‘Pode reclamar, meu filho, pode reclamar à vontade, mas você só vai passar se fizer a prova certa, não adianta falar, falar, falar, se você não resolver as questões você não vai passar. Não tem conversa’. Sempre o meu regime foi esse. (Montenegro, 1995, p. 156)

Outro depoimento que confirma essa postura austera é o do professor

Arlindo José Pontual, que ingressou na Faculdade de Pernambuco como professor

em 1954 e relata a prática de um professor e da sua própria quando conta que

nós tínhamos o professor Newton da Silva Maia, que era um homem austero, justo, cumpridor de seus deveres, o maior didata que conheci até hoje, sem nenhum exagero. Se alguém fotografasse o quadro negro, em todas as aulas dele, teria um

17 Não é de meu interesse aprofundar-me em conceituações acerca de comportamento e atitude,

então estou considerando aqui o que foi citado nas entrevistas, a respeito do professor, como por

exemplo: com o professor “X”, não se podia conversar.; o professor “Y” era muito severo.

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livro do curso que ele dava. Copiei todas as aulas de cálculo integral, e ele fez a revisão, principalmente do português. Dr. Newton era um homem que, quando examinava oralmente um aluno, procurava descobrir, procurava saber o que o aluno sabia[...] Passei a ensinar na Escola de Engenharia e, já naquela época, usava o método de dar aula de pé. Começava a escrever no canto esquerdo, em cima, no quadro-negro, que passou a ser verde, e ia descendo até terminar no canto direito em baixo. Eu me movimentava bastante, modificando o timbre da voz e a altura. De modo que o aluno, ora estava fazendo um esforço para me ouvir, ora estava me ouvindo com vontade de tapar os ouvidos. E isso movimentava a aula. (id. p. 76)

Ilustração 22. Caderno de Aluno da Profª. Fayet década de 60.

As aulas eram baseadas em explanação e exercícios, não havendo

discussão a respeito de aplicações práticas, como vemos no depoimento da profa.

Fayet quando diz que as “aulas práticas eu sempre caprichei... eu dava exercícios

longos, porque eu achava que o aluno tinha que desenvolver a atenção” (Profª

Mirtha Fayet, depoente).

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Analisando o depoimento dos professores, uma coisa que chama a atenção,

embora as aulas fossem teóricas e avaliações do tipo exame, é que os professores

tinham preocupação com o desenvolvimento dos alunos e com a aplicação da sua

disciplina. Isto é percebido no depoimento da Profa. Lígia Sad, quando diz que os

professores da época tinham a “metodologia de passar no quadro toda a teoria,

todos os exercícios, e os alunos estarem ali junto, trabalhando, embora eu prezasse

muito atividades feitas em grupo”. O Prof. Geraldo Sisquini também em seu

depoimento apresenta postura semelhante e relata que “quando você está dando

uma aula que requer mais tempo, você interfere onde tiver mais dificuldade, você

procura pegar exercícios mais pontuais, para cobrir aquela lacuna. Isso aí eu

sempre fiz nas matérias que eu dei aula”. Também a Profª. Mirtha Fayet conta que

nas minhas aulas, não só práticas, mas em todas, é que eu acho uma presunção de qualquer professor, de qualquer pessoa achar que está ensinando, está desenvolvendo um aluno. Ele tem é que despertar no aluno o interesse de realmente fazer o melhor por ele que é estudar, ler, se aperfeiçoar. Claro que a gente tem que ensinar alguma coisa, mas se não despertar isto, é uma tolice você pensar que em uma aula você vai desenvolver aqueles conhecimentos, ainda mais matemática que eu reputo uma matéria facílima, que você entende, mas não apreende, para aprender, você tem que fazer exercícios, tem que ter reflexões, o que nem todo mundo faz, aí ela se torna difícil, agora ela é fácil na hora que ela é exposta, porque ela é muito lógica. Então aquilo é banal, é fácil. (Fayet, depoente)

Outro fato marcante refere-se aos horários, não sendo permitido que os

alunos tivessem acesso às salas após o horário (alguns professores trancavam,

inclusive, as salas). Não havia praticamente nenhuma atividade de grupo. O

conteúdo era exposto em quadro negro e em seguida faziam-se exercícios para

“fixação”. Concluo, pelas fontes analisadas, que esta era uma prática adotada no

país e isto teve um impacto muito forte no fazer de professores e alunos.

Este comportamento começa e modificar-se, porém não muito nas décadas

de 70 e 80, após a reforma universitária promovida pela Lei 5.540/68, quando

aparecem os professores substitutos e a disciplina foi ficando menos rígida, e alguns

professores adotaram atitudes mais liberais, porém não havendo na UFES diretriz

neste sentido. Ilustro esta idéia com o depoimento da Profa. Lígia Sad contando

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sobre sua prática de sala de aula. Ela relata a evolução desta prática ao longo do

período pesquisado, começando

no final da década de 70 e na década de 80 também, quando eu comecei a dar aula, era muito espelhado naquilo que os meus professores tinham feito. Era uma metodologia como a gente chama do tipo “cuspe e giz”, em que nós tínhamos salas - principalmente da engenharia - muito cheias, com 45 (quarenta e cinco) a 50 (cinqüenta) alunos, e nós tínhamos esta metodologia de passar no quadro toda a teoria, todos os exercícios, e os alunos estarem ali junto, trabalhando, embora eu prezasse muito atividades feitas em grupo. Isso começou já na década de 90, um pouco, quando eu me dediquei, principalmente quando eu voltei do doutorado, que eu já tinha aquelas técnicas mais ligadas à parte da didática e os alunos faziam mais atividades em grupo. Mas no final da década de 70 e década de 80, eram mesmo aulas mais expositivas, com perguntas sempre dos alunos, nunca deixei de dar voz ao aluno, ele podia perguntar quando quisesse, tinha toda a abertura para isso. Interrompia a aula. Estou falando isso, porque muitos professores nem isso admitiam. (Profa. Sad, depoente)

Na década de 1980 e 1990, houve portanto um relaxamento, por assim

dizer desta disciplina rígida, como conta ainda a Profa. Lígia Sad que ainda era

“muito rígida essa questão de horário. Alguns professores até fechavam a porta para

o aluno não entrar fora de hora. Mas eu não, não cheguei a fazer nada disso e nem

essa questão do aluno não poder falar. Podia falar, levantar, perguntar...”, e o Prof.

Geraldo Sisquini, que relata que havia um colega que “gostava muito de ficar

conversando. Conversava sobre um assunto que não tem nada a ver com a matéria”

e aqui aparece a questão política como fator influenciador na prática da sala de aula,

porque segundo o Prof. Geraldo Sisquini,

tinha época que o pessoal tinha problemas políticos maiores, discutia às vezes algumas coisas em sala de aula, mas eu nunca gostei muito de misturar essas coisas em sala de aula não. Ficar conversando sobre assuntos filosóficos, políticos, sociais em sala de aula. (Prof. Sisquini, depoente)

Percebe-se que a prática, nesta década ficava mesmo por conta do

professor, não havendo um rigor acentuado como nos primeiros anos do período

analisado, mas também não havendo a ausência de disciplina.

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A década de 1990 e 2000, com a expansão das universidades e

presentemente com políticas que fomentam a popularização do ensino universitário,

percebo que a disciplina volta a preocupar, pois os alunos chegam muito cedo e por

vezes imaturos à universidade, e os professores vêem-se às voltas com essas

questões. A utilização cada vez maior de recursos tecnológicos como diz o Eng.

Áureo, “porque os computadores apareceram, porque as coisas estão vindo mais

mastigadas, porque antes você usava régua de cálculo, depois passou para a HP e

agora um mega-notebook”. O uso de tecnologia força a uma modificação de atitude,

no que se refere à forma de discutir o conteúdo, havendo mais atividades de grupo,

mais diálogo em sala e uma postura mais de orientador do que de transmissor, por

parte do professor, e também a busca por novas formas de ensinar a matemática

nos cursos de engenharia e superiores de forma geral como mostram pesquisas

recentes (Cury, 2004) como, por exemplo, as que estão sendo feitas sobre

modelagem matemática, computação algébrica, sistemas digitais, tecnologias

síncronas e assíncronas, computadores, enfim, novos horizontes estão sendo

buscados para a melhoria do ensino e aprendizagem da matemática.

Ilustração 23. Caderno de Aluno da Profa. Mirtha Fayet década de 60.

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CAPÍTULO 8

MATERIAL DIDÁTICO

No início do período delimitado, verificamos pequena quantidade de livros

didáticos. O material didático restringia-se ao que o professor escrevia no quadro,

como diz este depoimento do Eng. Pontual18 (Montenegro, 1975, p. 76), falando

sobre o Prof. Nilton Maia, que “se alguém fotografasse o quadro negro, em todas as

aulas dele, teria um livro do curso que ele dava”.

Na UFES encontrei material didático confeccionado por professores e

inclusive na Bibliografia da disciplina Estatística de 1974 era sugerida a apostila do

Centro Tecnológico. Encontramos no acervo da Escola Politécnica apostilas

confeccionadas por professores, como a de Tabelas de Mecânica Aplicada que

contém tipos usuais de rolamento; espécies de máquinas e vida dos equipamentos;

natureza das vias; seleção de correias U de acordo com as condições de serviço;

etc. Essas apostilas eram datilografadas, e há mais de um exemplar desta na

biblioteca. Encontrei também uma apostila de Economia e Matemática Financeira,

do Prof. Zorzanelli19, de 1967, com as mesmas características.

Foi na década de 70 que começaram a ser usados mais sistematicamente

livros como material didático. E estes, eram em sua grande maioria estrangeiros,

traduzidos ou não. A Profa. Lígia Sad, em sua entrevista nos conta que “desde 1976

nós tínhamos livro-texto”, época em que inicia sua prática didática e diz que sempre

adotava livro didático.

18 Arlindo José Pontual, um dos depoentes de Montenegro (2005) 19 Arildo Zorzanelli, um dos depoentes do livro de Montenrgro (2005)

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Analisando as ementas das disciplinas, selecionei, quando possível um livro

de cada disciplina em cada década. A partir da sua referência, procurei o livro na

Biblioteca e analisei-o, verificando os seguintes aspectos:

- disciplina em que é referenciado;

- língua de origem;

- língua de publicação;

- ano de publicação da primeira edição;

- número de exemplares na biblioteca (aqui gostaria de esclarecer, que este

número refere-se ao que pude verificar pessoalmente, não considerando possíveis

exemplares emprestados);

- a presença ou não de referência à engenharia na introdução do livro ou

prefácio;

- a presença ou não de referência à engenharia nos exercícios do livro.

Para realizar esta análise montei um quadro de significados (ANEXO V) e

em seguida, os livros analisados, considerando as décadas. Quando encontrado

mais de um exemplar no acervo, utilizei os seguintes critérios para escolher o

exemplar a ser analisado:

- mais antigo;

- possuidor do carimbo da escola politécnica;

- publicado em português.

Na década de 60-70, nas disciplinas Cálculo II, Cálculo Diferencial e

Integral e Geometria Analítica não aparece nenhuma referência bibliográfica na

ementa. Algumas disciplinas possuíam bibliografia sugerida, embora não explicitado

como material didático obrigatório. Utilizei esta bibliografia como base de pesquisa

na Biblioteca para análise dos livros. Segue quadro abaixo com as disciplinas e suas

bibliografias:

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Disciplina Livro

Cálculo Dif e Int Não tem ref.

Cálculo II Não tem ref.

Cálculo III Curso de Cálculo Integral – Pablo Miguel y Merino (*)

Cálculo Vetorial Cálculo Vectorial – Bento de Jesus Caraça (*)

Cálculo Numérico

Handbook of Mathematical Functions – Abramowitz e Stegun Introduction to Numerical Analysis – Carl Erik Froberg (*) Introdução ao Cálculo Científico – Giulio Massarani(*) Cálculo numérico : aproximações, interpolação, diferenças finitas, integração numérica e ajustamento de curvas – William Edmund Milne(*)

Estatística Estatística - Murray Ralph Spiegel Geometria Analítica e Álgebra Linear Não tem ref. Quadro 7. Disciplinas das décadas de 1960 e 1970 e bibliografia sugerida

(*) Livro Analisado.

Na década de 1980, só tive acesso a poucas ementas, pois não havia no

arquivo da Politécnica e no departamento de matemática, este período não está

digitalizado, estando os documentos em papel e de difícil acesso. Como as que

consegui não se referem às mesmas disciplinas, não é possível concluir a

permanência ou não dos mesmos livros.

Quadro 8. Disciplinas da década de 80 e bibliografia sugerida

(*) Livro Analisado. (**) Livro não encontrado no acervo da Biblioteca Central da UFES.

Disciplina Livro

Álgebra Linear

Álgebra Linear – José Luiz Boldrini (**) Álgebra Linear – Seymour Lipschutz (**) Álgebra Linear – Anton Howard

Cálculo I

Cálculo com Geometria Analítica - Earl William Swokowski (*) O Cálculo com Geometria Analítica – Louis Leithold (*) Cálculo 1: funções de uma variável – Geraldo Ávila (*)

Geometria Analítica e Álgebra Linear

Elementos de Geometria Analítica – Nikolay Efimov (*) Problemas de Geometria Analítica – D. Kletenik(*) Geometria Analítica: com uma introdução ao calculo vetorial e matrizes – David C. Murdoch (*)

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Nas décadas de 1990 e 2000 permanece o livro de Boldrini20 para a Álgebra

Linear, embora não tenha encontrado nenhum exemplar no acervo disponível para

análise. No Cálculo I notamos modificação nos livros, com exceção do Swokowski21,

que era utilizado no Cálculo I e depois passou a ser utilizado no Cálculo II. Na

Geometria Analítica permanece o livro de Kletenik22.

Disciplina Livro

Álgebra Linear Álgebra Linear – José Luiz Boldrini (**)

Álgebra linear e suas aplicações – David C. Lay

Cálculo I Cálculo – George Brinton Thomas

Cálculo II Cálculo com Geometria Analítica - Earl William

Swokowski (*)

Cálculo III

Cálculo e Geometria Analítica – George Brinton Thomas Equações diferenciais elementares e problemas de valores de contorno - William E. Boyce & Richard C.

DiPrima

Geometria Analítica e Álgebra Linear

Geometria analítica : um tratamento vetorial – Paulo Boulos

Problemas de Geometria Analítica – D. Kletenik(*) Vetores e matrizes – Nathan Moreira dos Santos (*)

Quadro 9. Disciplinas da década de 1990 e 2000 e bibliografia sugerida (*) Livro Analisado. (**) Livro não encontrado no acervo da Biblioteca Central da UFES.

Os detalhes dos livros analisados (Anexo VII), encontram-se nos quadros de

significado. Desta análise posso concluir que dos 13 livros analisados:

� Cinco foram publicados na década de 1960, quatro na década de 1970 e

quatro na década de 1980, e desses, quatro tiveram sua primeira edição na

década de 1960, um na década de 1950, três na década de 1930 e 1940 e

um no século passado, o que me leva a concluir que não houve mudança

significativa no material didático em termos de bibliografia de referência;

20 Refere-se ao livro de Álgebra Linear de José Luiz Boldrini 21 Refere-se ao livro Cálculo com Geometria Analítica de Earl William Swokowski 22 Refere-se ao livro Problemas de Geometria Analítica de D. Kletenik

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� Os livros adotados eram do início do século XX, ou até mesmo do século

XIX, como o de Milne para Cálculo Numérico (Milne, William Edmund.

Cálculo Numérico: aproximações, interpolação, diferenças finitas, integração

numérica e ajustamento de curvas), cuja segunda edição data de 1850 e

que traz em seu prefácio, como objetivo, “preencher o vazio que existe entre

a matemática de sala de aula e as aplicações numéricas”, mas que em seus

exemplos e exercícios se voltam para a aplicação da matemática para a

matemática, não havendo contextualização para a engenharia.

� a maioria dos livros teve sua edição original Inglês (sete), tendo outros três

em Português, dois em Francês e um em Espanhol, o que considero objeto

de pesquisas mais detalhadas, pois se as nossas Escola Politécnicas

tiveram suas bases nas da Europa, seria interessante pesquisar pela

biografia dos autores se a origem era americana ou européia;

� a maioria dos livros (onze) foi traduzida para o Português, o que não me

surpreende, visto que nos depoimentos não há comentários sobre a

necessidade de se saber outras línguas;

� a maioria dos livros não possui o carimbo da Escola Politécnica, o que

também não me surpreende, pois embora não tenha analisado, tive acesso

a uma lista de cerca de cem livros sugeridos para compra pelo

departamento de engenharia mecânica e que foram em quase sua

totalidade adquiridos pela UFES e desses, grande número possui o carimbo

da politécnica, porém não foram adotados formalmente (em ementas) como

referência pelos professores do departamento de matemática;

� embora a maioria dos livros faça referência (oito) à aplicações na área

técnica, não trazem exemplos e exercícios com contextos de problemas

encontrados na prática dos engenheiros (dez) e os que trazem algum

exemplo contextualizado (três), estão voltados para a física. No quadro 10

abaixo seguem alguns dos exemplos encontrados nas referências:

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Livro Exemplos na Referência Curso de Cálculo Integral de Pablo Miguel y Merino

1ª. parte do curso de cálculo diferencial e integral que se ministra nesta universidade [...]

Introdução ao Cálculo Científico de Giulio Massarani

A finalidade deste livro é apresentar os fundamentos empregados em Cálculo Numérico. Destina-se aos alunos das Escolas Superiores que tenham tido o primeiro curso de Cálculo e de Equações Diferenciais Ordinárias.

O Cálculo com Geometria Analítica de Louis Leithold

[...] para curso de Cálculo a nível universitário.

Cálculo Diferencial e Integral de R. Courant

Esta obra se destina a todo aquele que, tendo concluído um curso ordinário de matemática secundária, deseja dedicar-se ao estudo da matemática ou suas aplicações à engenharia, quer se trate de estudos universitários ou de escolas técnicas, quer se professores ou engenheiros.

Cálculo Numérico de William Edmund Milne

O objetivo deste livro é ajudar a preencher o vazio que existe entre a matemática de sala de aula e as aplicações numéricas.

Quadro 10 – Referências sobre a aplicação da matemática nos livros pesquisados.

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CAPÍTULO 9

CONCLUSÕES

A pesquisa traz material para várias conclusões. Divido aqui as conclusões

por tópicos conforme foram os capítulos.

9.1 – CURRICULO

No início do período pesquisado, verificamos que o curso de engenharia

mecânica foi criado para atender o mercado de trabalho. As matemáticas eram a

base do Ciclo Básico do currículo e isto permanece durante todo o período

analisado. A forma como são ministradas e por quem é que considero motivo de

discussão.

A importância da matemática na engenharia é indiscutível, mas apesar das

modificações e também das permanências que ocorreram no período estudado,

ainda há muito a fazer para se chegar às matemáticas ideais para a engenharia. Ou

talvez à forma ideal de se trabalhar com elas nos cursos de engenharia, campo este

vasto para nós, pesquisadores da educação.

No início do período, as disciplinas de matemática eram ministradas por

engenheiros (Montenegro, 1995) e pelos depoimentos a que tive acesso, eram mais

contextualizadas para as aplicações da engenharia porque eles se utilizavam mais

de exemplos de sua prática profissional.

Depois da reforma de 1968, que se refletiu aqui em 70/71, em que houve a

departamentalização, as disciplinas de matemática passaram a ser ministradas por

docentes licenciados em matemática. Além disso apareceu a figura do professor

substituto que na opinião de alguns dos entrevistados não possuía bagagem

suficiente em engenharia e isto permanece assim até hoje.

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9.2 – AVALIAÇÕES

Existem vários pesquisadores tratando deste assunto como Soares, Cury e

Luckesi e me considero otimista em relação ao futuro. Espero que as avaliações

aconteçam visando à produção de conhecimento e não somente classificação como

ainda está ocorrendo, embora reconheça que o caminho a ser percorrido ainda seja

longo e difícil.

No início do período delimitado, as avaliações eram descritivas, o que se

mantém até o final, baseadas em conhecimento específico e voltadas mais para a

matemática em si do que para as suas aplicações, o que está sendo aos poucos

modificado, pois hoje (com a reforma de 2006) já se aproximou as disciplinas

básicas das técnicas e estão ocorrendo mudanças nesse sentido.

Havia no início do período um rigor maior que hoje em termos de critérios de

correção de prova, e até mesmo de elaboração. Prevalecia a visão que o curso de

engenharia era difícil e quanto mais difícil fosse a prova, melhor era o professor. Os

índices de reprovação eram altos. Hoje o rigor diminuiu um pouco com relação à

postura do professor, mas continuam existindo provas e sendo estas descritivas e os

índices de reprovação ainda estão altos. O professor está mais aberto a rever as

provas e a discutir as respostas dos alunos. Mas ainda estamos longe de praticar a

avaliação segundo Luckesi (2005). O ensino de engenharia ainda é tido como difícil

e bem técnico.

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9.3 – PRÁTICA DE SALA DE AULA

Nas entrevistas com os professores e ex-alunos verifiquei que na prática

cotidiana das disciplinas de matemática no curso de Engenharia Mecânica na UFES

em todo o período delimitado, ocorre com mais freqüência até os dias de hoje o que

Luckesi chama de exame e muito pouco de avaliação, diagnóstico, tomada de

decisão, ações visando não uma aprovação/reprovação, mas sim a aprendizagem.

A prática dos professores em sala de aula, mudou em relação à rigidez de

disciplina, pois no início do período quase não se podia conversar em sala. Hoje o

diálogo é uma prática mais comum entre os professores e alunos. Há a utilização de

outros recursos auxiliares como os laboratórios e os computadores. Há trabalhos em

grupo e apresentações.

É necessário cada vez mais uma atitude crítica e o verbo relacionar fica

cada vez mais forte. O estudante assim como o engenheiro deve aprender a

relacionar os conteúdos matemáticos com as situações reais que se apresentam. É

preciso relacionar-se com aqueles com os quais estuda, trabalha ou gerencia e

também relacionar as novas tecnologias com os conteúdos matemáticos e com a

solução dos problemas. O foco do ensino-aprendizagem deve que mudar para do

“ensinar”, para o “ensinar a aprender” e neste caso, o professor também deve mudar

o seu comportamento para capacitar os alunos a resolverem problemas. (Cury,

2001) Mas existem desafios a serem vencidos pelos professores como a construção

de estratégias de aprendizagem que promovam o desenvolvimento autônomo dos

educandos e do seu próprio. (Soares, Lima e Sauer, 2004)

Segundo pesquisas recentes (Soares, Lima e Sauer, 2004), a aula de

matemática ainda é feita de explicação e exercícios exaustivos, ou seja, mera busca

de modelos para resolução de problemas. Isto encontro durante todo o período

pesquisado. As autoras propõem utilização de recursos metodológicos tais como:

trabalho em grupo; valorização da comunicação através da explanação dos recursos

e métodos utilizados para resolução de problemas; análise de erros; auto-avaliação

e incentivo à reflexão.

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A utilização das novas tecnologias está ainda distante das salas de aula. A

própria informática está ainda tímida na UFES. Assim, a prática de sala de aula fica

muito teórica e distante da realidade que o engenheiro encontra no mercado de

trabalho.

9.4 – MATERIAL DIDÁTICO

No início do período, como não havia quase nenhum livro, o material didático

era basicamente composto de apostilas confeccionadas pelos próprios professores.

O professor escrevia o conteúdo no quadro negro e os alunos copiavam.

Verifiquei durante todo o período pesquisado e se mantém ainda hoje

bibliografia deficiente na aplicação da matemática para a Engenharia (Biembengut,

1997). Os livros sugeridos na UFES até hoje são os das décadas de 1960 a 1980 e

encontrei um do século XIX.

Penso que é necessário pesquisar mais profundamente este assunto, é

necessário minimizar as dificuldades do ensino da matemática nos cursos de

engenharia, melhorar significativamente o material didático que se encontra tão

deficiente de aplicações.

9.5 – CONCLUSÕES FINAIS

Percebo que as evoluções que estão ocorrendo no mundo e no Brasil com

relação ao ensino da matemática (Cury, 2004), ainda não estão se refletindo na

UFES, o que imagino que ainda irá ocorrer.

Existem muitas dificuldades a serem vencidas como por exemplo:

aplicabilidade das disciplinas de matemática nas disciplinas técnicas; altos índices

de reprovação; alta rotatividade dos professores; falta de conexão entre as próprias

disciplinas de matemática como Cálculo, Álgebra e Geometria.

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Como pude constatar na avaliação institucional de 1995 e também nos

depoimentos, ainda há muito descontentamento com relação ao ensino das

disciplinas matemáticas no currículo de engenharia.

O vasto período analisado e as análises feitas não foram muito profundas, em

função do tempo e do material encontrado, mas são quarenta anos e anos estes de

mudanças políticas, sociais, tecnológicas. As mudanças encontradas na pesquisa

foram menores que as permanências, para um período tão extenso. Há ainda um

longo caminho a se trilhar neste campo.

Longe de ter a pretensão de julgar ou concluir, fico mais à vontade para

deixar aqui em aberto espaço para maiores questionamentos e pesquisas, e mais

ainda, muito, muito trabalho.

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matemática para cursos de Engenharia . Rio Grande do Sul:1997. 257p. Tese

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SOARES, E. M. S., LIMA, I. G., SAUER, L. Z. Discutindo Alternativas para

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de Janeiro: Clavero Editoração, 1993.

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<http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/BernaFor.html>. Acesso em agosto, 2006.

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<http://www.maisondefrance.org.br/mediateca/Bibliogr.%20Le%20Goff.pdf >.

Acesso em 15/10/06.

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ANEXO I

Roteiro de perguntas utilizado para realização das entrevistas com os

professores do Departamento de Matemática da Universidade Federal do

Espírito Santo

Identificação da Pesquisa: Esta pesquisa tem como objetivo obter informações

para caracterizar a relação entre as disciplinas matemáticas e as disciplinas técnicas

da grade curricular do curso de engenharia mecânica da UFES. Assim, esperamos

obter o máximo de informações possíveis. Esses dados serão gravados e

transcritos. As informações aqui registradas, serão utilizadas apenas pelo

entrevistador e orientadora. (Será solicitada permissão para utilização do gravador).

Identificação do Informante:

Formação acadêmica:

Cursos de extensão/pós graduação:

Experiência profissional:

Atividades acadêmicas:

Atividades em empresas:

Outras:

Roteiro de Perguntas:

1) Quais disciplinas de matemática que ministra(ou) para os estudantes

engenheiros?

2) Faz(ia) uso de algum livro-texto? Utilizava ou sugeria algum livro que se encontra

nesta lista?

3) Fale um pouco sobre a sua prática de sala de aula. Que metodologia utilizava?

Como fazia as avaliações?

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4) Participou de alguma modificação de currículo que teve impacto nas matérias que

lecionava para a engenharia? Fale um pouco sobre isso.

ANEXO II

Roteiro de perguntas utilizado para realização das entrevistas com os

professores do Departamento de Engenharia Mecânica da UFES.

Identificação da Pesquisa: Esta pesquisa tem como objetivo obter informações

para caracterizar a relação entre as disciplinas matemáticas e as disciplinas técnicas

da grade curricular do curso de engenharia mecânica da UFES. Assim, esperamos

obter o máximo de informações possíveis. Esses dados serão gravados e

transcritos. As informações aqui registradas serão utilizadas apenas pelo

entrevistador e orientadora. (Será solicitada permissão para utilização do gravador).

Identificação do Informante:

Formação acadêmica:

Cursos de graduação, extensão/pós graduação, ano em que se formou:

Atuou como engenheiro em alguma empresa? Qual(is) e por quanto tempo?:

Roteiro de Perguntas:

1) Quais disciplinas ministra(ou) na engenharia mecânica?

2) Quais conteúdos matemáticos considera essenciais para o ensino-aprendizagem

das suas disciplinas?

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3) Participou de alguma modificação na grade curricular do curso de engenharia

referente às matérias de matemática? Fale um pouco sobre isso.

4) Quais conteúdos matemáticos utilizava nos exemplos em sala de aula e nas

avaliações?

5) Fale um pouco sobre sua prática de sala de aula. Que metodologia utilizava?

Como fazia as avaliações?

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ANEXO III

Roteiro de perguntas utilizado para realização das entrevistas com alunos já

formados engenharia mecânica na Universidade Federal do Espírito Santo

Identificação da Pesquisa: Esta pesquisa tem como objetivo obter informações

para caracterizar a relação entre as disciplinas matemáticas e as disciplinas técnicas

da grade curricular do curso de engenharia mecânica da UFES. Assim, esperamos

obter o máximo de informações possíveis. Esses dados serão gravados e

transcritos. As informações aqui registradas serão utilizadas apenas pelo

entrevistador e orientadora. (Será solicitada permissão para utilização do gravador).

Identificação do Informante:

Quando se formou em Engenharia Mecânica na UFES?

Roteiro de Perguntas:

1. Quais disciplinas de matemática cursou na engenharia mecânica?

2. Quais os professores ministraram estas disciplinas?

3. Lembra se havia algum livro-texto ou bibliografia sugerida pelos professores

relativos à matemática?

4. Como eram as avaliações desses professores?

5. Como era a prática dos professores em sala de aula?

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ANEXO IV

CESSÃO DE DIREITOS SOBRE DEPOIMENTO ORAL

PARA A UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

1. Pelo presente documento,

..................................................................................(nome),

...................................................(nacionalidade), .........................................(estado

civil), carteira de identidade nº ......................emitida por

..........................................................., CPF nº............................................., residente

e domiciliado em ....................................... ...............................................................

cede e transfere neste ato, gratuitamente, em caráter universal e definitivo à

Universidade Federal do Espírito Santo a totalidade de seus direitos patrimoniais de

autor sobre o depoimento oral prestado no dia ......../........./2007, na cidade de

......................................, perante a pesquisadora Luana Poltronieri de Souza.

2. Na forma preconizada pela legislação nacional e pelas convenções internacionais

de que o Brasil é signatário, o DEPOENTE, proprietário originário do depoimento de

que trata este termo, terá, indefinidamente, o direito ao exercício pleno dos seus

direitos morais sobre o referido depoimento, de sorte que sempre terá seu nome

citado por ocasião de qualquer utilização.

3. Fica pois, a Universidade Federal do Espírito Santo plenamente autorizada a

utilizar o referido depoimento, no todo ou em parte, editado ou integral, inclusive

cedendo seus direitos a terceiros, no Brasil e/ou exterior.

Sendo esta forma legítima e eficaz que representa legalmente os nossos interesses,

assinam o presente documento em 02 (duas) vias de igual teor e para um só efeito.

Vitória, ......../........./2007

______________________________ __________________________________

Entrevistado Luana Poltronieri de Souza

Pesquisadora da UFES

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ANEXO V

QUADRO DE SIGNIFICADOS PARA ANÁLISE DOS LIVROS

Título:

Autor:

Disciplina:

Ano publicação:

Edição:

Língua de Origem:

Língua de Publicação: Número de Exemplares:

Tem carimbo da Escola Politécnica?

Referência na Biblioteca UFES:

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio?

Traz alguma referência à engenharia no sumário?

Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios?

Observações adicionais:

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ANEXO VI

ENTREVISTA COM ENGENHEIROS EX-ALUNOS DA UFES

Aureo Machado Neto(AN) da Aracruz Celulose na área de Engenharia, no dia

12/03/2007 na Aracruz Celulose, em uma sala de reunião.

LP –Áureo, fale um pouco sobre sua formação acadêmica.

AN – Antes de tudo eu sou capixaba de Castelo, me formei na UFES, passei no

vestibular em 1975. Este foi o último ano em que a gente fazia engenharia e definia

a especialização em Mecânica, Elétrica ou Civil a partir do 4º período. Acabou

mudando e no segundo período me forçaram a decidir, embora eu já estivesse

decidido desde que era criancinha, que queria ser engenheiro mecânico e acabou.

Se não fosse engenheiro mecânico, seria mecânico ou qualquer coisa deste tipo. Eu

me formei na UFES em 1980/2. Minha vida acadêmica em termos de faculdade foi

sempre muito simples. Na minha cabeça eu sempre quis fazer faculdade e aprender

alguma coisa de engenharia mecânica, que é uma coisa que eu sempre gostei. Meu

pai é mecânico, dono de uma oficina de máquinas pesadas de pedreira, essas

coisas lá do interior (de Castelo) e eu sempre gostei muito disso. Nunca gostei de

carro nem de caminhão. Mas dessa parte de mecânica pesada sempre gostei. Eu

sempre foquei muito essa parte de aprendizado prático. Tanto é que na verdade, na

verdade, gostar mesmo de matemática, nunca foi meu forte não. Aliás, nenhuma

dessas matérias que não fossem técnicas me entusiasmava muito. Eu gostava muito

mais da parte técnica, mais além de técnica... mais para o lado da prática. Daí a

grandes cálculos.... eu nunca gostei muito de trabalhar em engenharia focada em

projeto, então na minha época de faculdade eu procurava entender um pouco mais

das matérias que falavam de manutenção e isso naquela época – 1975 até 1980 –

não era o direcionador da faculdade. Tanto que a faculdade de engenharia mudou

no final dos anos 80, quando começaram a aparecer alguns cursos de extensão em

engenharia de manutenção. Algumas matérias tipo Lubrificação, com o professor

Márcio Gama e o Guilherme Laux, foram professores que começaram a focar um

pouco mais as necessidades que você tem do lado de fora. Eu ficava muito invocado

de ter que fazer uma série de cálculos e não entender as coisas práticas que

estavam acontecendo. Eu notava uma distância muito grande da faculdade para a

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vida de uma empresa. Então eu tive muita dificuldade neste sentido. Não tive mais,

porque já comecei a fazer estágio no terceiro ano. Já comecei a me virar em

empresas pequenas onde eu tinha que fazer tudo. Então para mim foi muito mais

fácil. A parte mais difícil foi o primeiro e o segundo ano mesmo, digamos assim, não

que eu não me adaptava, mas eu não gostava muito. Nunca fui muito de estudar.

LP – De lá para cá, você fez algum curso de extensão?

AN – Não. A não ser dentro do negócio da Aracruz. Dentro do negócio da Aracruz

eu fiz.

LP – E a nível de trabalho, de atuação profissional. Você falou que fez estágio a

partir do terceiro ano e de lá para cá você já veio direto para a Aracruz?

AN – Meu histórico de trabalho...

LP – Pode falar rapidamente...

AN – Rapidamente, foi assim: nos últimos dois anos da faculdade eu fazia estágio

na Baterias Júpiter, uma fábrica de baterias que, cá entre nós, agradeço a Deus que

fechou, porque era muito ruim de bateria, era horrível. [risos] Depois eu voltei para

Castelo. Fui trabalhar na Mineração Nemer e era o responsável por reativar uma

empresa de moagem de pedra chamada Provale no município de Itaoca, mas eu

tinha muito pouca experiência, conhecia muito pouco. Foi quando surgiu a Aracruz.

A Aracruz chamou os formandos de 1980/2 para fazer prova, porque tinha vaga de

trainee. E eu não conhecia nem Aracruz (cidade), nunca tinha vindo aqui. E olha

como é que essas distâncias hoje são muito menores. É impossível você falar de um

estudante que não conheça a Aracruz. Eu tinha amigos que formaram junto comigo,

inclusive, que depois foram meus colegas aqui, que trabalharam aqui. E eles

falavam da Aracruz como uma distância enorme. Então eu vim para cá. Fiz a prova e

passei. Estou aqui há vinte e seis anos, faz em abril agora. A minha experiência

profissional é a Aracruz.

LP – E você entrou como trainee.

AN – Entrei como trainee.

LP – Na área de manutenção?

AN – Na área de manutenção. Naquela época você entrava para ser um trainee e já

era escolhido onde ficar. Só que o primeiro ano, você rodava em todas as áreas, por

todas as áreas entenda-se engenharia e manutenção. E eu comecei vindo para cá.

Meus primeiros seis meses foram na engenharia. Só que eu detestava fazer

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desenho. Minha mão suava muito e naquela época você fazia desenho com régua T,

essas coisas, coisa velha mesmo.

LP – Eu trabalhei aqui de 1987 a 1994 e fiz muita coisa na mão.

AN – Você trabalhou onde?

LP – Na Diretoria Administrativa...

AN – Com quem?

LP – Na verdade o primeiro chefe que tive foi o Guilherme Batista.

AN – GBS.

LP – Isso. Fui para Suprimentos, depois fui para a DA (Diretoria Administrativa) e

fiquei com Zenóbio Zorzal, depois fui para a Florestal, que mudou para o Torre da

Praia...

AN – Isso.

LP – Depois fui para o Meio Ambiente, e o Meio Ambiente mudou para a fábrica.

AN – Eu também comecei naquela época na engenharia, mas nunca gostei, porque

eu gostava de fazer as coisas funcionarem.

LP – Você preferia a parte prática, mesmo.

AN – Sempre gostei muito de manutenção. E depois desses seis meses eu fui para

a manutenção. No início de 90, comecei com uma experiência aqui da Aracruz, fui o

primeiro engenheiro de manutenção a ser Coordenador de Área. Antigamente você

tinha engenheiro elétrico, engenheiro civil, engenheiro de instrumentação,

engenheiro de automação. Era tudo separado. Hoje você tem um gestor da área. O

engenheiro de operação, de manutenção é que faz tudo. Ele não tem tempo para

pensar, mas que faz, faz. [risos]

LP – Dá um jeito.

AN – É verdade, mas também sua função não requer que ele pense muito e sim

tome decisões rápidas.

LP – para resolver.

AN – e resolver o problema do momento.

LP – Essa parte muito me interessa. Porque a idéia é falarmos um pouco das

atividades que você foi desenvolvendo na área, como você falou, na parte da

engenharia trabalhava muito com desenho, embora não gostasse, gostaria de

trabalhar mais com a prática. E para fazer essa prática, aquilo que você aprendeu na

faculdade lhe ajudou?

AN – Está muito longe.

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LP – Você acha que a matemática tem alguma influência, ou se você não tivesse

aprendido nada de matemática conseguiria fazer da mesma forma?

AN – Eu considero o seguinte: eu particularmente usei muito pouco matemática, a

matemática aplicada, derivada, integral, cálculo vetorial....

LP – Geometria analítica?

AN – Geometria analítica um pouco menos, mas a principal coisa que me ajudou

muito foi Geometria descritiva. Para mim foi a coisa mais interessante... o que abriu

a cabeça. Essa questão de pensar em três dimensões não é fácil. Eu tive muita

dificuldade no início e a faculdade ajudou, até porque eu fiquei reprovado na

matéria, fiz de novo e daquela vez eu aprendi. Eu comecei a carregar aramezinhos

para fazer isométrico, repartimento de linha de diedro “não sei das quantas” e

aprendi bastante com aquilo. A parte de cálculo propriamente dito, eu usei muito

pouco. E sinceramente, para o meu trabalho, principalmente voltado para

manutenção, a necessidade não foi tanta. Não senti falta. Na verdade, não é que

não senti falta e sim que não precisei muito O profissional que vai trabalhar numa

carreira técnica, necessariamente tem que saber mais coisas de engenharia pura do

que um gestor. Ele tem que saber calcular uma viga, tem que saber calcular um

balanço de produção, se ele vai projetar uma bomba, aí consequentemente ele tem

que saber toda a matemática aplicada na dinâmica de fluidos e tudo o mais. Já para

o gestor, esses requerimentos são menores. Para isto o seu conhecimento tem que

ser mais administrativo e de RH, pois ele vai gerenciar pessoas e trabalhos. Minha

vida profissional sempre foi gerenciar trabalho, de fazer, por exemplo, com que uma

parada de uma fábrica fosse feita no menor tempo possível, com o menor custo,

distribuindo os recursos nos seus corretos lugares... eu sempre trabalhei muito com

isso. Então, na hora que envolvia a técnica, ela era muito mais na prática do que

precisar fazer contas matemáticas.

LP – Quando precisava fazer uma conta, tinha alguém pra fazer...

AN – Aliás essa é uma das coisas que eu considero importante em qualquer

profissional, é saber pedir ajuda. E aí nesta hora, se dá melhor quem tem uma boa

agenda de telefones, agora já tem o celular, não precisa tanto da agenda, e quem

conhece as pessoas. Quem conhece o que as pessoas conhecem, não

necessariamente saber fazer o que as pessoas fazem. Ou seja, eu sei que aquele

profissional é bom nisso... Eu sempre gostei muito de trabalhar com Valter Lopes

que é um projetista mais experiente. Nunca tive dúvida... “-Valter, estou fazendo esta

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tubulação, será que vai dar certo? eu não sei, acho que não vai dar certo... vamos

calcular?” E junto com ele calculávamos e chegávamos à melhor decisão.

LP – Ia mais na intuição, no empirismo.

AN – Eu ia na intuição e na experiência para fazer um projeto, por conta do que eu

achava certo. Mas eu nunca fiz sem calcular. Só que nem sempre eu fazia. Aliás,

raramente era eu que fazia. E hoje, cada vez mais, essas informações são

inerentes, elas estão no rótulo.... Ou ela vem com, digamos, uma receita de bolo

quase preparada ou ela já vem com o cara que vai fazer o cálculo “a tiracolo”. Se eu

estou gerenciando algum projeto eu não preciso fazer nenhuma conta, se aquela

viga passa, se não passa, se aquele projeto da base vai agüentar, se não vai

agüentar, não preciso fazer isso.

LP – Isso é terceirizado?

AN – Na maioria dos casos é terceirizado.

LP – Isso é feito no Brasil ou no exterior?

AN – Tanto faz, pois hoje já não existem distâncias com a internet. Geralmente o

detalhamento da engenharia é feito no Brasil, enquanto a engenharia básica vem

com o detentor da tecnologia como a Serenge em Vitória e a Poyry em São Paulo

que são empresas típicas de engenharia. Antigamente tínhamos poucos modelos

matemáticos e difícil acesso aos mesmos. Hoje tem centenas.Hoje calcular bases de

equipamentos, tais como bombas , motores etc, é muito mais simples e tem quase

tudo em programas de computadores com profissionais altamente entendidos no

assunto. Então, o que a gente faz? O engenheiro aqui na Aracruz trabalha muito

mais comprando e administrando esse serviço, o que eu considero uma coisa que

poucos sabem fazer. Administrar é mais difícil do que fazer... porque se eu estudar

um pouco sobre como fazer base aqui eu vou saber fazer, agora, tem muita gente

que pode estudar bastante sobre como gerenciar uma obra, ou qualquer coisa desse

tipo, e se ele não tiver habilidade para isso, se ele não souber traçar um

cronograma, fazer um planejamento, descobrir qual o caminho crítico do trabalho,

fazer sistemas de controle para atuar em cada ponto desses, não terá um bom

resultado. Então eu acho que a matemática para a engenharia, no caso do

gerenciamento, ela não precisa ser tão pesada assim... para mim ela não fez falta. E

eu confesso a você que não era bom em matemática não. Fiquei reprovado em

Cálculo I, Mecânica I, Física I... [risos]

LP – Probabilidade e Estatística.

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AN – Também fiquei reprovado. Mas isso foi porque eu dei cola ´pra um colega meu

na época. [risos]

LP – Mas você acha que para o gerenciamento....

AN – É importante... eu diria que a probabilidade e estatística hoje está presente na

maioria dos programas que a gente tem.. Por exemplo, um colega que vai fazer um

sistema de manutenção preventiva ou preditiva precisa de conhecer e usar

estatística. Aliás, eu gosto muito de falar sobre manutenção preditiva e preventiva,

porque eu sempre achei que a manutenção preventiva é a manutenção preditiva no

futuro. Manutenção preventiva é quando se abre um equipamento periodicamente

mesmo que ele não apresente indícios de falha. A preditiva é quando você monitora

o equipamento e sabe quando ele começa a falhar, dando tempo assim de

programar sua recuperação. Acontece que a partir de inúmeras inspeções você

acaba criando um banco de dados, que permitirá determinar estatisticamente o

período em que haverá uma falha e assim poderá programar preventivamente a

manutenção daquela família de equipamentos. A Curva ABC, por exemplo, muita

gente conhece, mas pouca gente sabe aplicar e é uma das ferramentas mais

simples que existe no mundo da matemática e da estatística... pouca gente sabe

usar e se soubesse diminuiria com certeza o esforço que faz para resolver os

problemas. Se tudo for alta prioridade na sua casa e você ficar “buzinando” na

orelha da sua empregada o tempo todo, com certeza seu esforço será enorme para

conseguir resultados. Se você priorizar os assuntos, 20% de esforço(ou buzinadas)

serão suficientes para você obter 80% do resultado anteriormente obtido. Não é uma

boa relação de custo x benefício? Outro dia estava lendo um artigo muito antigo

sobre esse assunto, que me chamou a atenção: como o engenheiro usa pouco a

curva ABC e como ele se esforça tanto para fazer tão pouco.

LP – Penso que falta um pouco a formação administrativa para o engenheiro.

Porque eu fiz administração também e como é importante, porque curva ABC, você

aprende na administração. Você não aprende na engenharia.

AN – E eu vim aprender aqui.

LP – Nos cursos de gestão.

AN – Fiz “trocentos”23 deles: Análise de Problema Potencial, Grid... acho que tenho

uns três MBA’s24 nesse negócio sem ter o MBA. Fiz dois anos de curso em São

23 Palavra utilizada na linguagem coloquial significando muitos.

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Paulo, toda semana e não tenho o MBA. Depois fiz um ano de curso aqui e não foi

considerado MBA. Se somarmos todos os meus cursos, deve dar uns três MBA, mas

não é considerado.

LP – Não tem o título.

AN – Eu acho que a formação do engenheiro hoje não pode vir dissociada de

disciplinas fundamentais tais como: administração, custos e economia. Sem ser Tio

Patinhas, tudo hoje gira em torno de dinheiro, no bom sentido... o camarada está

fazendo isso e pensa “quanto estou ganhando? Se eu não fizer isso aqui, quanto

estou ganhando?”... se você não souber quanto custa... e para saber quanto custa,

tem que montar seus modelos, montar suas tabelas, e consequentemente seus

controles. A maioria das funções dos nossos engenheiros é administrar, quer seja

obras ou operações e isto requer fundamentalmente o conhecimento e controle de

custos. Não é somente saber quanto custa e sim quanto vale. Em uma indústria nem

sempre o mais barato é o melhor negócio e portanto é fundamental para um

engenheiro conhecer o custo ao longo do tempo ou seja a relação custo x benefício

e a matemática financeira é a ferramenta mais eficaz para isto. Você não precisa

saber calcular o VPL ou TIR de uma determinada compra ou projeto, mas é

fundamental que saiba o que ela significa e sua importância na tomada de decisão.

Pode ser engenheiro ou o que quiser, mas tem que conhecer.

Hoje a necessidade do engenheiro que calcula(projetos) nas indústrias está sendo

cada vez menor. Porque os computadores apareceram, porque as coisas estão

vindo mais mastigadas, porque antes você usava régua de cálculo, depois passou

para a HP e agora um mega-notebook e se você estiver on-line você descobre

aquele negócio lá na Finlândia... então a matemática hoje não é que seja

desnecessária não, acho que ela está muito mais popular.

LP – Ela é necessária para quem faz esses programas...

AN – Isso sim... e aí esses caras nas empresas, não têm mais lugar, não têm tantas

coisas que precisam fazer. Na engenharia mesmo, só temos gestores de projeto,

não temos engenheiros. Temos alguns engenheiros químicos, que fazem balanço de

uma fábrica ou de uma operação, o que não é fácil, pois são muitas contas e

variáveis. Minha filha está fazendo engenharia química e um dia desses, me pegou

para ajudar a calcular um balanço de uma fábrica e eu disse: “- calma aí! sem

24 Sigla de Master of Business Administration que é o grau máximo conferido em Administração de Negócios.

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ofensa, não dá ‘pra mim não. É muito complicado!” balanço químico, térmico, é

muito complicado.

Hoje eu acho que a necessidade dos engenheiros com relação à matemática, de

saber matemática e de saber como calcular está diminuindo porque o engenheiro

está sendo formado mais para ser gestor, do que para ser o engenheiro calculista...

mesmo os engenheiros que vão trabalhar em construção, em montagem, calculam

pouco. Como hoje está tudo concentrado no computador que tem um bilhão de

informações, um profissional dá conta do que antes precisava de vinte, trinta

engenheiros. Um cálculo de estabilidade de tubulação hoje, por exemplo, um

engenheiro faz isso num minuto a partir de um programa de computador.

Com inserção de alguns dados no programa ele consegue o desenho, a lista de

materiais, os suportes, etc. Alguém desenvolveu aquilo naturalmente... montou um

modelo matemático e pôs no computador. Eu diria que a matemática hoje está

sendo substituída por um dicionário de matemática ao mesmo tempo complexo, mas

com muito mais facilidade de usar. Uma coisa só eu gostaria de

complementar..sempre me perguntei: - Para quê a empresa me paga? O que ela

espera de mim? E sempre procurei dar o máximo possível nessa direção. Por que

estou falando isso? Porque tive dezenas de amigos, colegas de trabalho, que

adoravam informática. Eram gestores como eu e na hora que precisavam de

controlar alguma coisa ao invés comprar o programa , insistiam em desenvolvê-lo. E

eu sempre fui contra isso, porque você é pago para administrar uma determinada

área ou projeto e não para desenvolver os modelos matemáticos ou programas. Se

você perde tempo com este desenvolvimento, não será capaz de fazer o mais

importante , que é analisar os dados e tomar as decisões no momento certo. Cansei

de ver profissionais se perderem nesse ponto. Eles queriam ser gestores mas ao

mesmo tempo queriam fazer essas coisas, lá do fundo do baú... que no final das

contas lhes dava um prazer enorme.

LP – Vamos lembrar um pouquinho do curso de engenharia...

AN – Ih! Agora pegou, hein!

LP – Foi ontem...

AN – Ô! [risos] Pegou fundo agora, hein! [muitos risos]

LP – Quando estávamos lá fazendo mecânica dos fluidos, termodinâmica, aquelas

coisas todas, naquele momento, aquilo que você aprendeu na matemática você

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acha que foi importante? Reformulando... sem aquilo você conseguiria aprender

mecânica dos fluidos ou você acha que também não fez muita falta?

AN – É. Ficaria muito difícil se você não soubesse pelo menos o que é integral, o

que é derivada, e aprender velocidade de fluidos, e aprender cálculo de volume,

cálculo de vazões... seria muito difícil fazer isso. Mas mesmo naquela época... há

pouco tempo atrás, 1978, 1979, mais ou menos, mesmo naquela época, boa parte

das fórmulas matemáticas que eu usava em mecânica dos fluidos e termodinâmica,

elas já eram simplificadas, mas o significado daquilo é que era importante. Mas eu

não precisava ficar resolvendo equação diferencial de quarto grau para chegar no

cálculo de um trocador de calor. Eu me lembro disso porque eu sempre tive bom

senso. Eu me lembro que termodinâmica era uma matéria muito difícil. Ubiratan

era... você fez aula com ele? Nossa senhora, o bicho era o cão. Mas eu gostava

muito de estudar, gostava muito de estudar aquela matéria... termodinâmica para

mim era muito legal, eu achava interessante calcular os trocadores de calor, porque

tinha mesmo a parte prática, tinha equipamentos que eu mais ou menos já conhecia.

E aí eu fui fazer uma prova, terminei a prova, cheguei para ele e falei assim: “- Eu

escrevi uma observação aqui, depois você dá uma olhada.” e no dia da correção da

prova, ele disse: “- Você é muito cara de pau.” Eu disse: “- Por quê?” Ele disse: “-

Você foi lá e fez os cálculos, a sua lógica estava toda certa, mas seus números eram

um absurdo, não tinha nada a ver!” E ai você vem e escreve: “favor desconsiderar o

resultado final, porque eu nunca vi um trocador de dois quilômetros de comprimento,

então devo ter errado em alguma coisa no meio. Me dê um tempo que vou fazer as

contas de novo.” [muitos risos] Ele disse: “- Pôxa, você é muito cara de pau! Mas

está bom, pelo seu raciocínio e pela sua lógica também, você tem razão, não existe

equipamentos destes.” Então, bom senso é muito interessante, até porque você

pode ter erros nos cálculos matemáticos e se você não tiver uma correlação, se não

souber em cada etapa do projeto que você está fazendo... pôxa vida, isso aqui está

muito fora, é absurdo, assim não dá, vou voltar aqui... ou confirma mesmo. Então eu

considero que uma etapa de checagem, uma metodologia de checar cada ponto é

muito importante. Então, de novo, a matemática naquela época e a termodinâmica

ajudaram a fixar conceitos. Sem saber conceitos de derivada e integral, um

engenheiro terá dificuldades em entender algumas disciplinas técnicas, agora ele

não precisa saber resolver equações diferenciais e integrais para ter sucesso na

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profissão mas a noção ele precisa ter. Como vai trabalhar com uma coisa que não

sabe de onde veio?

LP – A matemática no curso de engenharia, é dada por matemáticos. O que você

me fala dessa afirmação?

AN – A minha opinião é que ela fica muito acadêmica. Ela fica com uma cara de

cientista. Eu não tenho nada contra um engenheiro ter uma especialidade em

matemática, até para ele conhecer mais a fundo. Mas acho que o aluno, se ele já

conseguisse saber lá na engenharia, o que ele está aprendendo e para quê, eu acho

que tem uma boa chance de melhorar e “antenar” o que ele realmente precisa

aprender.

Se ele já soubesse que aquela derivada que ele está estudando vai servir para as

fórmulas futuras e preferencialmente já for mostrando exemplos práticos.

LP – Talvez até o interesse seria maior de aprender...

AN – Eu tenho certeza! Eu tenho certeza!

LP – E como você falou... sempre gostou da parte prática.

AN – Isso!

LP – Talvez, se você começasse a ouvir a parte prática lá na matemática...

AN – verdade...

LP – Talvez tivesse maior interesse pela matemática. e talvez maior proveito na

parte prática.

AN – Na resistência dos materiais, por exemplo, tem matemática.... o cálculo

daquelas vigas, tensões... não tem como não saber. Embora, tantas coisas que

aparecem lá, já são as resoluções das derivadas, das integrais, mas é base... aquilo

ali... olha, quando você calculava distribuição de carga, vigas e balanças, estruturas

isostáticas, essas coisas são muito interessantes... se alguém tivesse falado isso

comigo lá antes, talvez eu tivesse prestado mais atenção, talvez eu tivesse me

envolvido mais... ao passo que eu tinha professores....você conheceu a Myrtha?

LP – Sim, tive aula com ela. Não precisa saber demonstrar a Transformada de

Fourier...

AN – Não.

LP - Precisa saber para quê ela existe.

AN – E onde vai usar...se um dia você quiser se aprofundar nisso é para lá que você

vai. Se você quiser ser um engenheiro projetista, um engenheiro que vai projetar

algum equipamento...

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LP – Que vai desenvolver até mesmo um programa de engenharia....

AN – Você vai ter que saber isso. Aí você pega e escolhe o seu caminho. E naquela

época o curso de engenharia nosso estava voltado especificamente para um

engenheiro de engenharia, mas não é engenharia de execução de projeto, não, é de

fazer projeto. Eu me lembro que aprendi com o Ayres (meu professor de maquinas

hidráulicas) como calcular uma pá de um rotor de bomba. Ele falava das curvas

teóricas, mas nunca levou um catálogo de uma ABS ou Sulzer(fabricante de

bombas) para nós. Nunca me mostrou que uma bomba tinha um selo mecânico. E a

primeira coisa que meu chefe veio aqui para me falar, foi: “- Olha, a partir de amanhã

você vai ser o responsável por selo mecânico desta fábrica. Isso é um “pepino”, nós

gastamos milhões de dólares por ano!” Eu disse: “- É comigo mesmo!” e quando eu

desci, pensei: “Se eu tropeçar num selo mecânico aqui, não sei o que é! Não sei o

que esse cara está falando, eu nunca tinha visto um!” aí, estudei durante seis meses

aqui na fábrica, fiz visitas em São Paulo e em outros lugares, aprendi todos os tipos

e no final de seis meses, todo mundo me chamava para resolver problema de selo.

Eu era o expert... na verdade eu tinha estudado seis meses só.

LP – Teve uma mudança que está sendo implementada agora em 2007, onde já

aproximaram algumas disciplinas técnicas da matemática, nos períodos... aquelas

disciplinas sugeridas. Não fica fazendo dois anos de Cálculo para ver a disciplina

técnica. Já houve mudança no currículo.

AN – Isso é bom. O consumidor da engenharia é a indústria.

LP – O mercado mudou.

AN – Verdade.

LP – Tem alguma coisa que você não viu no curso de engenharia, com relação à

matemática, que você teve que estudar, ir atrás?

AN – No meu caso foi muito pouco, porque a minha aplicação é pequena. Penso

que a matemática financeira deveria ser um foco ainda. De novo, quem dava aula

era um lá da economia que devia pensar assim: “vou dar aula para aqueles caras lá

da engenharia, ninguém vai querer ouvir falar desse negócio e eu não terei muita

dificuldade".

LP – E ele também não se preocupava em conversar com um engenheiro e pegar

exemplos.

AN – Isso.

LP – De engenharia para aplicar na disciplina dele.

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AN – Como se faz controle de custos, quais as ferramentas, um estudo de

viabilidade de um projeto o que é um VPL, como vou aprovar um projeto desses

numa diretoria? Em cada disciplina o professor deveria começar a mostrar o aluno a

importância do "quanto custa" , da viabilidade comercial e no projeto de graduação

deveria ter uma ênfase forte neste assunto. Se aprender com pequenas doses, na

hora que chegar nas grandes, sabe como fazer, pelo menos ter noção do que fazer.

O não conhecimento e uso da matemática financeira é um mal do Brasil. Todo

mundo tem que saber. O camarada não quer saber quanto paga, quer saber se dá

para pagar a prestação... não faz o menor sentido. O negócio custa dez , mas à

prestação custa vinte, mas bom, dá para eu pagar um real, dois reais, isso eu posso

pagar. Então eu pago... mas espera aí, você está pagando cem por cento a mais...

ah! mas dá pra eu pagar... Nós temos que ensinar aos nossos filhos, aos nossos

funcionários, nossas empregadas, que não é assim... o valor das coisas tem que

fazer sentido. Acho também que algumas matérias tem sua hora para ser cursada.

No meu caso fiz matérias tais como Administração Industrial (não sei se era assim o

nome), no quinto período que na época não faziam o mínimo sentido para mim, pois

não tinha maturidade suficiente para isso lá.

Os melhores professores que eu tive na faculdade foram aqueles engenheiros que

viviam dentro das indústrias e tinham prazer de dar aula, o Marreco, Ubiratan, o

professor Marcio Gama, camaradas que realmente davam aula por prazer.

LP – Era muito mais proveitoso.

AN – Nossa! Uns dos melhores momentos na faculdade.. o professor Vladislau

também era gerente da CVRD em João Neiva, na área de locomotiva e ensinava

coisas práticas, e ensinava com paixão. Acho que tudo na sua vida, se você fizer,

tem que fazer com paixão.

LP – Ouvi uma frase interessante, esses dias, que se você quiser parar de trabalhar

é só fazer o que gosta. Achei interessante.

AN –Para mim um profissional tem que estar feliz com o que esta fazendo. Para

mim, segunda-feira é prazer... porque o dia que não for...não vou ficar aqui não...

senão eu vou morrer... não faz sentido... eu trabalho, trabalho e gosto... gosto da

sexta-feira, porque o dia seguinte é sábado, porque vou ficar em casa, gosto de

dosar as coisas.

Meu pai me falava uma coisa, meu pai tem umas tiradas interessantes. Ele dizia: “-

Meu filho, nunca ande nos extremos. Nunca. Procura sempre o meio do caminho

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que é sempre o melhor. Nunca trabalhe demais, como aquele maluco que trabalha

sábado, domingo, mas nunca deixe de trabalhar. Nunca beba demais, mas não

precisa deixar de beber. Procure não exagerar, nem para cima, nem para baixo,

procura o equilíbrio, o equilíbrio existe.” trabalhar sim, pôxa, sexta-feira é dia de ir

com a família, no sábado passear e no domingo, legal. E não ter nenhum remorso

nisso. E na segunda-feira trabalhando direto. Então eu acho que o segredo é o

equilíbrio. Nem para cima, nem para baixo. Os dois são muito ruins. É isso aí.

LP – Eu te agradeço...

AN – Espero ter ajudado na sua pesquisa...

LP – Com certeza...

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Fabrício Luiz Stange(FS), consultor da Aracruz Celulose na área de Engenharia, no

dia 05/03/2007 na Aracruz Celulose, em uma sala de reunião.

LP – Fabrício, fale um pouco sobre sua formação acadêmica.

FS – Fiz curso técnico em Mecânica, na Escola Ativa de Coqueiral, que hoje não

existe mais. Da Escola Ativa fui para a UFES, fiz cinco anos de engenharia,

consegui formar em cinco anos.

LP – Difícil. (fiz o comentário devido à expressão do depoente)

FS – Muito difícil... consegui me formar em cinco anos e neste processo fiz alguns

estágios, inclusive aqui (refere-se à Aracruz Celulose), aqui e em outras empresas.

Logo depois que saí da faculdade, seis, sete meses depois eu vim para a Aracruz.

Já na Aracruz eu fiz pós-graduação em Engenharia de Manutenção e estou fazendo

atualmente Mestrado em Engenharia Mecânica na UFES. Esta foi minha formação

acadêmica.

LP – Qual a sua linha de pesquisa?

FS – Mecânica dos solos e devo escrever sobre riscos industriais.

LP – Quem está orientando?

FS – Geraldo Sisquini.

LP – Vou entrevistá-lo também.

FS – Legal.

LP – Vai ser bom que vamos trocando idéias. E aqui na empresa, em que área está

atuando?

FS – Vou falar um pouquinho do meu circuito aqui. Eu entrei aqui no final de 2000,

na oficina central, que é a parte responsável por centralizar toda a manutenção da

fábrica, que não é responsável por fazer a manutenção, mas fornecer informações,

sistemas de manutenção inclusive. Passei pela central, fiquei pouco tempo, depois

fui fazer parada geral na área de caustificação25 e forno26. Fiquei lá uns três anos,

25 A reação de caustificação tem como função recuperar o hidróxido de sódio para ser utilizado na digestão dos

cavacos de madeira.

26 Refere-se ao Forno de Cal, onde ocorrerá a calcinação do material sólido resultante do processo de

caustificação para a produção de cal virgem que será reutilizado no processo.

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nesta área, de lá fui para uma área chamada secagem27, que é onde faz a secagem

da celulose.

LP – Deixa eu interromper um pouquinho...eu conheço todo o processo da fábrica,

trabalhei sete anos aqui, e na época eu trabalhava na área administrativa e fizemos

descrição de cargo da fábrica inteira. Então pode ficar à vontade com o processo,

não precisa tecer muitas explicações, pois eu conheço.

FS – “Tá”. Daí eu fui para a secagem, lá eu trabalhei um pouco diferente do que eu

estava trabalhando, porque lá eu me envolvi muito mais com o processo do que me

envolvi aqui, sempre trabalhando com manutenção e processo, até então. Aí me

envolvi um pouco mais com processo, fiquei lá um ano e dois meses... de lá fui para

o digestor28, e fiquei um ano, um ano e dois meses também.

LP – com manutenção.

FS – manutenção, e sempre trabalhando também com o processo, porque apesar

de trabalhar em manutenção, respondia para o gerente de produção, neste processo

inteiro. Em novembro do ano passado (2006), eu voltei para a Central de

Manutenção, e aí sim, respondendo para o gerente de manutenção, e estou nesta

área até hoje. Estou na Central de Manutenção, que é uma das gerências aqui da

industrial29.

LP – E você entrou na carreira em Y, partindo para Consultor.

FS – É. Entrei como Engenheiro Jr, de Engenheiro Jr para Consultor e hoje

Consultor Pl.

LP – Hoje que atividades você desenvolve?

FS – Hoje não temos manutenção própria, toda a nossa manutenção é terceirizada.

Temos treze grandes contratos de manutenção aqui na industrial e a minha função é

fazer a gestão destes treze contratos de manutenção. Então esses contratos, são

responsáveis por todo o processo de manutenção: levantamento, planejamento,

programação, execução e report de atividades. A minha função é gerir os resultados

27 Secagem é um processo onde a água da pasta de celulose é retirada e intensifica-se a fase de prensagem dessa

pasta para formar as folhas de celulose.

28 No digestor, os cavacos (eucalipto descascado e picado) é cozido quimicamente, para separar da madeira a

celulose industrial.

29 Refere-se à Diretoria Industrial da Aracruz Celulose.

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que estes contratos estão trazendo para nós: o que está planejado versus o que é

executado.

LP – Você fala de manutenção preventiva ou corretiva?

FS – Manutenção de uma forma geral, toda a manutenção.

LP – E você atua na análise desses dados para pensar em manutenção preventiva

ou eles já pensam nisso também?

FS – Pois é. O processo está desenhado para que os próprios contratos pensem

nisso. Incluído nesses contratos já existe também engenharia de manutenção. Então

eles estariam fazendo todo esse processo e mais análise e discussão desses dados,

com propostas de melhorias ou de ações para melhorar os resultados. A minha

função é justamente verificar se esse sistema de gestão garante que isso seja feito.

Então na minha rotina eu tenho algumas ferramentas de gestão como: reunião

mensal, reunião semestral, reunião de análise crítica, acompanhamento de

indicadores, e nestas reuniões a gente discute. A minha função não é analisar se

aquela ação é a melhor ou o que se vai fazer, mas discutir: o que está sendo feito?

vocês estão pensando dessa forma? vocês se integraram com a empresa tal para

analisar isso? isto foi feito em conjunto?. A minha função é fazer com que esse

modelo de gestão conduza o trabalho no sentido do resultado que a gente desenhou

lá no começo. A gente tem um parâmetro de indicadores que a gente define

anualmente, qual a nossa condição atual, onde a gente quer chegar, quais são as

principais ações que a gente vai fazer nesse período e a gente vai acompanhando.

LP – Até mesmo pelo processo de qualidade. Vocês já tem a certificação.

FS – Temos.

LP – Tem os indicadores da qualidade que precisam ser atingidos anualmente.

FS – Sim, sim...só que o meu processo vai além do processo da qualidade. Porque

nós temos os indicadores de qualidade, que vão para o processo de qualidade, são

os indicadores do meu processo, que é utilizar performance no processo da

manutenção. Então eu levo indicadores macro para aquele processo. Só que para

suportar aqueles indicadores macro, eu tenho que ter um desdobramento muito

maior de indicadores para ver onde tem desvio e onde não tem. E esse

desdobramento não é só da Aracruz, é um desdobramento por empresa contratada.

Tem um monte de indicadores de manutenção mecânica, manutenção de

instrumentação, manutenção elétrica, e por aí vai.

LP – E problema não falta, não é?

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FS – Não, não falta (risos). Tem todo dia um diferente.

LP – Que tipo de problemas você enfrenta aqui? Estou pensando e tentando

conduzir o pensamento para a área da matemática. Estou pensando em alguns

problemas que você possa me trazer e se vai usar a matemática, ou o que aprendi

no curso.

FS – Na minha rotina diária eu não uso matemática. A minha rotina é uma rotina de

gestão. É uma gestão técnica, não é uma gestão de pessoas, mas é gestão. Não

faço nada diferente de gestão. Meu conhecimento de matemática eu aplico em

algumas análises, mas ela não é sempre, por exemplo, vou fazer um estudo de

confiabilidade sobre um determinado problema. E aí normalmente não sou eu que

faço... alguém faz, e o meu conhecimento de matemática é para entender a análise

estatística daquilo que está sendo aplicado. Mas aplicação direta da matemática que

eu aprendi, associada às disciplinas da engenharia, eu não uso no meu dia a dia.

LP – Você acha que poderia fazer o que faz hoje sem aqueles conhecimentos

matemáticos?

FS – Não, porque ele é básico. Eu não preciso para desempenhar as minhas

atividades, mas ele serviu de formação, então, para qualquer assunto que eu vou

discutir ele serve como base.

LP – Subjetivamente ele está incluído.

FS – Justamente. Eu discuto tecnicamente o tempo inteiro. Normalmente eu não

discuto questões de projeto, se está bem dimensionado, mal dimensionado, não é

isso. Mas na discussão técnica eu tenho que ter embasamento, até para que eu

tenha segurança no que estou discutindo.

LP – Eu vou citar para você alguns conceitos matemáticos, e você me diz quais são

os importantes, no contexto que você falou até agora, quais aqueles que nem de

suporte serviram, por exemplo. Ou seja, quero saber qual o grau de importância que

eles possuem no seu trabalho: Geometria plana e espacial.

FS – Necessário.

LP – Trigonometria.

FS – Também.

LP – Logaritmos.

FS – Pouco.

LP – Traçado de curvas e superfícies.

FS – Pouco.

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LP – Probabilidade e estatística.

FS – Bastante.

LP – Vetores.

FS – Indiretamente sim. Vou explicar. Está na área, por exemplo, numa área de

parada geral. Vamos fazer uma pega de um equipamento qualquer. Você tem que

saber indiretamente sobre vetores, senão você pode derrubar o equipamento.

LP – Derivadas e integrais.

FS – Não.

LP – Séries numéricas.

FS – Também não.

LP – Transformadas de Laplace e Fourier.

FS – Indiretamente. A gente usa as transformadas em vibração, só que você usa o

conceito. Toda a parte de transformada, os próprios coletores de dados hoje já

fazem. Então você tem os dados, eles pegam em espectro de tempo e já

transformam para espectro de freqüência internamente.

LP – Você sabe que foi utilizado para chegar ali...mas não usa diretamente.

FS – Eu sei que utilizou uma transformada. Não uso diretamente na mão. Não tem.

O coletor vai lá, coleta o dado de vibração, em espectro de tempo e ele transforma

aquilo em espectro de freqüência, que é onde se consegue analisar os problemas

que podem estar associados àquela vibração.

LP – Você tem consciência que ali está sendo utilizado uma transformada.

FS – Tem uma transformada de Fourier ali. Agora, como é que foi feita... mesmo

porque ela é uma transformada discreta.

LP – Coordenadas polares, cilíndricas e esféricas.

FS – Nunca usei.

LP – Quando você começou a trabalhar, teve alguma dificuldade em lidar com esses

conceitos matemáticos? O que estou querendo saber é se o que você aprendeu lá

foi suficiente ou você teve que estudar mais matemática....

FS – Não. Nunca precisei estudar matemática para o que eu precisei fazer aqui. A

minha função sempre foi muito mais de gestão, não uma gestão técnica. Sempre fiz

uma gestão técnica de manutenção. Projeto, por exemplo, nunca participei. De

detalhamento de projeto, nada disso. Então, a matemática que precisa em projeto de

engenharia - claro, sei os conceitos que estão envolvidos ali, até para que eu possa

discutir - agora, efetivamente ter feito, que transformada que ele usou, se estava

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difícil trabalhar em sistema cartesiano e ele passou para polar, isso não interessa,

nunca me interessou. Interessa o resultado.

LP – Vamos pensar na formação acadêmica, agora, no curso da UFES.

FS – Eu formei em 2000.

LP – Tem algum conhecimento que não foi ensinado lá e que você acha que fez

falta?

FS – Eu não diria conhecimento. Acho que a formação de engenharia é feita de uma

forma que você não associa a matemática aos problemas físicos, às cadeiras de

engenharia. Chega lá no início, você estuda Cálculo I, Cálculo II, Cálculo III, Cálculo

Numérico e em momento nenhum tentam associar essa matemática - que é pura

nesse momento - aos problemas que você vai enfrentar de engenharia lá na frente.

Você estuda, por exemplo, diferenciais e para que serve aquilo? Você só vai saber

para que serve aquilo, lá na frente, quando pegar por exemplo a disciplina Mecânica

dos Fluidos. E aí, você não faz nem correlação. Quando você percebe... “pôxa”,

aquilo que eu estudei lá atrás me faz falta agora. Só que eu poderia ter utilizado isso

de forma muito mais interessante, se eu tivesse uma associação tipo: você está

aprendendo, porque no contexto da engenharia você vai utilizar isso desta forma. Se

no começo os cursos de matemática já fossem voltados para isso. Não que você vá

simplificar as disciplinas de matemática para atender a engenharia. Mas que já

focasse. (Deu um exemplo) Essa aplicação, está associada aqui. Auto-valores e

auto-vetores, onde vai usar isso? Vai usar em vibração. Esse é o contexto que

estará utilizando. Você vai poder usar isso numa cadeira de engenharia lá na frente.

LP – Você acha que isso se deve a quê? Por que está assim hoje?

FS – Eu acho que é um pouco a departamentalização. Tem o departamento de

matemática, que não conhece ninguém da engenharia, sai da matemática, vem dá o

curso dele de matemática, como se estivesse dando aula para a matemática e não

está muito interessando no que você vai fazer depois. Ele quer cumprir a cadeira

dele de matemática. Não estou questionando a validade do curso que ele dá de

matemática. Sem dúvida ele é muito bom, só que falta um pouco o foco. É foco que

ele precisa dar. Tive sim, professores na faculdade que tinham essa preocupação e

diziam: “- Isso aqui está contextualizado dessa forma. A gente está estudando isso e

isso puro você não vai usar em lugar nenhum, mas vai usar em tal disciplina e lá vai

ser aplicado dessa forma. Então, vamos ver como fazer”. Isso dava até uma

tranqüilidade para a gente.

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LP – Até uma motivação. Você vê que um curso técnico, você já estava mexendo

com mecânica e se depara com a matemática que naquele momento...

FS – não tem nenhum sentido e que depois faz falta, é óbvio que faz. Quando você

está lá na frente, lhe faz falta. Falta a base. Até você perceber e fazer a correlação

que o que você está vendo é aquela matemática que você viu lá atrás, você já

perdeu um caminho. Acho que poderia ser muito mais otimizado esse processo.

LP – Talvez a exemplificação do curso de matemática mais voltada para as áreas de

engenharia facilitasse.

FS – Eu não sei como fazer, mas acho que o professor que fosse dar aula na

engenharia tivesse essa sensibilidade de perceber para que está ensinando essa

matemática para esses alunos. Vai servir para quê? Eles vão ser pesquisadores de

matemática? Se sim, é outra estória. Mas não é. Eu vou usar a matemática como

ferramenta. Não vou estudar a matemática para ser pesquisador de matemática. Eu

vou usar a matemática como ferramenta. E aí faz falta, porque se ensina como se

fosse para cientista. E aí tem uma outra questão, uma outra questão da matemática.

Ensina-se a matemática aqui no começo e aqui na frente a cadeira técnica... onde

eu uso obrigatoriamente a matemática.

LP – Por exemplo a Mecânica dos Fluidos.

FS – Mecânica dos Fluidos. Como eu faço uma modelagem física, para em cima da

modelagem física, criar uma modelagem matemática para resolver o problema?

Então eu aprendi a matemática, aprendi (na disciplina técnica) a aplicação dessa

matemática, mas em momento nenhum eu fiz uma modelagem matemática. Aí,

quando você chega no mercado de trabalho, vamos colocar um exemplo, eu preciso

fazer um dimensionamento de um sistema hidráulico qualquer. Eu conheço a

matemática, conheço o sistema hidráulico, mas como eu faço a associação disso?.

Para resolver o problema, eu tenho que fazer uma modelagem física, da modelagem

física uma modelagem matemática, resolver a modelagem matemática e voltar para

a resolução física. Isso não é feito. Daí eu acho que falta essa correlação. Por isso a

percepção de que para ser engenheiro não precisa de matemática. Você sai da

faculdade com essa percepção, quando você entra no mercado de trabalho. Eu sou

engenheiro e não preciso de matemática. Por que não precisa de matemática?

Porque você não correlaciona aquilo que você está fazendo com a engenharia e a

matemática, você nunca estudou a forma de fazer isso, que seriam os modelos.

Acho que isso é uma falha grave.

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LP – Atualização profissional. Que tipo de atividade você tem desenvolvido aqui, ou

por conta própria, você já citou o mestrado e eu sei, por ter trabalhado aqui que a

Aracruz facilita a atualização profissional. Então, além do mestrado a empresa lhe

proporcionou algum outro curso, o mestrado foi você que perseguiu?

FS – Sim, fui eu. A empresa não fica - isso eu acredito - dizendo, “faça esse curso”,

isso não existe mais. O que existe é total liberdade de dizer: “preciso disso” para

minha profissão. Preciso treinar, ou preciso me especializar, preciso de qualquer

ação nessa área aqui, porque preciso disso para a minha atividade. A gente tem

total liberdade de: ou fazer um curso fora, ou fazer um curso dentro da própria

empresa, que a gente utiliza pouco, é uma questão nossa, mas que é muito

interessante. No meu caso, eu preciso de algumas questões que são jurídicas, onde

é que vou fazer esse curso? Posso ir ao setor jurídico. Preciso de algumas questões

que são contábeis, de tributos, por exemplo. Posso fazer aqui com o pessoal de

controladoria. Não tem ninguém lhe falando, faça isso, faça aquilo, vem cá, olha,

deixa eu te explicar. Não existe isso. O que tem é: total liberdade de... o que é que

você precisa para se desenvolver? E aí, tendo isso do profissional...

LP – E você tem feito algum curso além do mestrado?

FS – Não.

LP – Não dá tempo, não é?

FS – É (risos). Na verdade você tem que estar lendo alguma coisa, vendo alguma

coisa, discutindo, que às vezes a gente pensa que não é um pouco isso de

treinamento, mas é, você encontrar alguém de outra empresa, discutir como está

sendo feito, como não está sendo feito. Eu tenho algumas atividades que não são

propriamente de gestão de contratos, exemplo: variabilidade de processos, uma

atividade que eu não conhecia. Então entrei no grupo de variabilidade de processos

e tive que estudar isso, tive que estudar, ler um pouco, dialogar, pegar aquele livrão

de controle de processo30, fui fazer um curso sobre variabilidade de processo.

Converso com os operadores, converso com os consultores que vem de fora. Eu

estou sempre fazendo isso. Agora, cursos se estou fazendo? Não. O curso está no

dia-a-dia, está na troca de experiência, está na necessidade de marcar aqui e fazer

alguma coisa internamente alguma coisa, esse é o processo.

30 Não falou o nome do livro.

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LP – Tem algo que gostaria de acrescentar? Com relação à matemática, às

tendências...a tecnologia, o que você acha que vai mudar...comentários com relação

à formação acadêmica.

FS – Eu acho que a formação acadêmica, pelo menos a minha, foi coerente. Eu

achava que não, até que um professor me falou uma coisa que foi muito

interessante. A gente questionava muito o seguinte: “- Professor, chega lá fora a

gente não vê nada disso, existem equipamentos diversos.” Ele falou assim: “- Ótimo,

a faculdade não está aqui para ensinar tecnologia, está aqui para ensinar ciência.” E

acho que ele foi muito feliz na fala dele. Porque a tecnologia, você saiu de lá ela já

mudou. Não dá tempo nem de você chegar no mercado. E o embasamento científico

que você tem lá, é o mesmo sempre. Então, acho que a faculdade é feliz nesse

sentido. Pelo menos a minha formação foi assim e é feliz nesse sentido. E eu já vi o

outro lado. Tenho alguns colegas que formaram em outros lugares em que tinha um

foco muito mais tecnológico e aí, quando você vai discutir alguma coisa, falta

informação, e o “cara” fala besteira. Isso acontece. Então eu fui feliz nesse sentido.

Por outro lado, acho que tem uma distância grande do mercado. Apesar de eu não

achar que a engenharia está lá para ensinar tecnologia, também acho que tem que

ter uma aproximação com o mercado. Até para dizer como ensinar essa ciência,

relacionado com isso que tem no mercado, não é ensinar tecnologia, é diferente.

LP – De repente uma disciplina, tipo Novas Tecnologias ou Questões Atuais da

Engenharia.

FS – Até assim: como ensinar ciência utilizando a tecnologia que tem hoje, como

exemplificar isso com a tecnologia que tem hoje. Como usar os laboratórios nesse

sentido. Não é tornar o ensino tecnológico. Como ensinar ciência de uma forma

mais focada. Esse é um ponto que eu acho que a gente peca muito. Nossa

formação peca muito, poderia ser melhor. Por outro lado a gente tem uma formação

sólida. A questão que falta mesmo é a correlação de como eu associo as questões

matemáticas com as questões tecnológicas. E aí é, como eu monto um modelo

físico, um modelo matemático, e resolvo o modelo matemático para voltar.

Ferramentas hoje você tem aos milhares, a maioria delas através de computador. Só

que como é que você faz isso? Vai ter que montar modelos. Pelo menos eu não

conheço nenhuma cadeira na UFES que tenha isso. Esse é um ponto que eu acho

que falta muito. E aí cria essa falsa idéia de que o engenheiro não precisa de

matemática. E quando você precisa, você acaba resolvendo de outra forma. Você

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não vai lá e monta um problema de engenharia. Acaba optando pelo bom senso,

sendo que poderia usar e acaba não usando da melhor forma. Você resolve o

problema, mas poderia haver uma forma muito mais correta talvez, usando as

ferramentas de engenharia, mas você acaba não usando, usa os conceitos de

engenharia, as ferramentas não.

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José Guilherme de Carvalho(JC), Engenheiro de Manutenção Pleno da Petrobrás

no dia 01/03/2007 na Petrobrás, em uma sala de reunião.

[Houve um problema técnico na gravação do cabeçalho da entrevista e retomamos

para o depoente o que já havia falado de início]

LP – Então, você se formou em engenharia mecânica na UFES, em 2000 terminou o

mestrado nesta área de... repete para mim, por favor.

JC – Mestrado em engenharia mecânica mesmo, na área de materiais e processo

de fabricação. Trabalhei por...

LP – na Metalúrgica Carapina.

JC – trabalhei na Metalúrgica Carapina por oito meses, foi quando eu entrei... eu

tinha passado no concurso da Petrobrás já em maio, e eu só fui ser chamado, só fui

entrar na Petrobrás em fevereiro de 2001. E desde 2001 trabalho na Petrobrás.

Trabalhei... tem um curso também, um curso que é chamado... é como se fosse uma

especialização, então é um curso da Petrobrás, que a própria universidade-

Petrobrás31 ministra, chamado Engenharia de Equipamentos, então, dentro da

Petrobrás eu ocupo o cargo de Engenheiro de Equipamentos. Então para isso,

quando entrei na Petrobrás fiz o curso de um ano, um curso de especialização em

engenharia de equipamentos, especificamente sobre a área de Petróleo. Trabalhei

dois anos na bacia de Campos, na operação e agora...

LP – Na plataforma mesmo?

JC – Não eu trabalhava na base. E hoje tem três anos que eu trabalho aqui no

suporte técnico do Espírito Santo.

LP – Que bom que pode ficar em Vitória! [risos] A família é daqui também... E aí

nessas áreas que hoje está atuando, fala um pouquinho do seu trabalho aqui. Em

que área está atuando, quais atividades você desenvolve nesse seu trabalho.

JC – Aqui a gente trabalha no suporte técnico de engenharia de manutenção e

inspeção. Eu trabalho especificamente em engenharia de manutenção. Então a

gente trabalha com diretrizes de manutenção, definição de diretrizes de

31 A Universidade Petrobras tem dois núcleos de formação de profissionais um no Rio de Janeiro e um em

Salvador.

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manutenção, definição de estratégias de manutenção, definição de gestão da

manutenção, para a UN32 do Espírito Santo.

LP – Manutenção que você fala é manutenção da... aqui já tem plataforma?

JC – Tem plataforma e tem unidade terrestre também. Tem estação de tratamento

de Petróleo...

LP – Em São Mateus...

JS – unidade de tratamento de gás. E tem plataforma só de gás, tem plataforma, já

agora produzindo óleo, em Jubarte, a P34, que estava aqui no porto de Vitória, que

agora já está produzindo...

LP – Já terminou a reforma dele aqui...

JC – Já terminou e já está produzindo. Tem a plataforma afretada, duas plataformas

afretadas, o Seillean e o FPSO Capixaba, que está produzindo também...

LP – FPSO?

JC – Floating Production Storage Oil. Então a gente trabalha nessa área de gestão

da manutenção, e consultoria em algumas áreas, por exemplo, eu, me especializo

especificamente em confiabilidade e bombas. Sistema de bombeamento e

confiabilidade. São as duas áreas mais específicas em que eu trabalho. Tem outras

pessoas na mesma gerência, que tem outra área específica que estaria apto a

prestar consultoria para os ativos nesta área específica.

LP – E qual o seu cargo aqui?

JC – Meu cargo é Engenheiro de Equipamentos Pleno. O cargo da Petrobrás na

carreira técnica, se divide em (no meu caso): Engenheiro de Equipamentos Júnior,

Pleno, Sênior e podendo chegar a Consultor Técnico. Tem um outro degrau.

LP – Tipo carreira em Y...

JC – Exatamente, carreira em Y. Você pode ir pela linha gerencial ou pela linha

técnica.

LP – Perfeito. E essas atividades que você faz? Especificamente é só prestar

consultoria para quem está em campo... ou tem alguma outra coisa? Você faz algum

projeto? Porque as máquinas (me corrija se estiver errada), a tecnologia que nós

temos na Petrobrás, é uma tecnologia que é feita aqui ou vem do exterior, por

exemplo, os seus equipamentos, vocês fazem projetos e os modificam, ou vocês só

fazem manutenção? Ou fazem utilização desses equipamentos?

32 Unidade de Negócios.

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JC – Na Petrobrás tem as duas linhas. Muito mais, nós usamos equipamentos de

fabricantes reconhecidos no mercado. Por exemplo, na área de bombas, tem a

Sulzer, a KSB, a gente dá manutenção nesses equipamentos. A Petrobrás compra

esses equipamentos, alguns desses equipamentos são engenheirados, quer dizer, a

KSB tem que fazer um projeto específico para o uso da Petrobrás, mas quem faz

esse projeto é a KSB. Isso é uma linha. Existe uma outra linha, alguns equipamentos

que a Petrobrás desenvolve, por exemplo, uma bomba multifásica, não é um

equipamento que exista no mundo, comercialmente... então a Petrobrás, em

parceria com algumas empresas, aí sim, participa do projeto do equipamento. Mas

muito mais, é feito um projeto, é feita a construção, a compra desse equipamento,

depois a montagem, e a gente participa da... não do projeto do equipamento, mas da

especificação do equipamento, e manutenção desse equipamento. O grande serviço

aqui, basicamente, especialmente no meu caso, a gente participa do projeto, com a

intenção de dar um feedback para o projeto do pessoal de manutenção, e em toda a

operação, a gente trabalha na manutenção desse equipamento.

LP – Perfeito. E nessa atividade, que tipo de problemas você enfrenta?

[o depoente faz pequena pausa para refletir e sorri]

LP – Estou pensando (problema), estou pensando dentro da matemática. Estou

desenvolvendo um raciocínio no sentido... que tipo de problemas irá enfrentar, que

tipo de solução, onde está a solução desse problema, se precisa de matemática

para resolver isso... é mais ou menos nessa linha que estou querendo ir.

JC – Por exemplo, onde a gente vai entrar, nós aqui da manutenção? Ocorreu uma

falha no equipamento, não é? A gente precisa saber por que ocorreu aquela falha.

Aí entra a matemática, tem que calcular quais esforços, o que aconteceu... quer

dizer... por exemplo, teve uma falha no ventilador. Aquele material ali está

adequado... qual foi o fenômeno dinâmico que aconteceu ali que poderia ter

acarretado aquela falha? Para a gente tentar... ou até alterar o projeto, se for o caso,

para bloquear aquela falha, para que ela não aconteça de novo. Às vezes está

subdimensionado, às vezes a forma do componente não é adequada, deve estar

causando algum fenômeno dinâmico ali, que está inserindo alguma tensão que

aquele componente ali não estaria preparado para suportar.

LP – Você está falando de manutenção corretiva. Pensando em qualidade também,

tem alguma manutenção que vocês fazem preventiva e que pode estar acarretando

algum tipo de serviço desses para vocês? Vocês têm qualidade, tem o projeto de

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qualidade ISO implantado não é? Certamente no projeto de qualidade ISO vocês

tem inspeções que são feitas preventivamente...

JC – Sim.

LP – Numa dessas inspeções pode estar detectando alguma falha... alguma coisa

assim... vai acontecer.

JC – um defeito.

LP – Um defeito que possa vir. Isso é passado para vocês e aí entra toda essa

questão de projeto antes que “quebre”?

JC – Sim, além da manutenção preventiva que é essa que você colocou, de

inspeção, a gente tem a manutenção preditiva, a gente usa alguns instrumentos

para tentar monitorar a condição de alguns equipamentos, não são todos, os mais

críticos, mais importantes. Então a gente usa a análise de vibração, a gente usa a

ferrografia, a gente usa a termografia, tentando captar sinais do equipamento, sinais

que mostram que ele está...

LP – perdendo a capacidade...

JC – Exatamente, está próximo de uma falha.

LP – Está num momento crítico do equipamento.

JC – Sim.

LP – E aí, que conceitos matemáticos, o que você poderia de imediato lembrar para

mim, que usa?

JC – Exatamente no caso da preditiva, não é minha área especifica, mas o que está

por trás, no pouco que eu entendo é matemática pura. É transformada de Fourier...

LP – Laplace...

JC – Exatamente, todo aquele... você pegar aquele sinal que é uma onda no tempo,

transformá-la em freqüência, para você poder analisar a freqüência, comparar com a

freqüência do equipamento. Então a pessoa que trabalha com vibração, precisa

muito da matemática para poder entender esses fenômenos e estar podendo fazer o

diagnóstico do que está acontecendo.

LP – Vou citar alguns conceitos, e você vai me falar se usa ou não33, se está em

contato com esse tipo de conceito. Geometria plana e espacial.

JC – Usa.

33 modifiquei na escrita sem prejuízo do que foi falado para retirar a informalidade utilizada na pergunta, o que

não trará nenhum prejuízo na pesquisa.

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LP – Bastante não é?

JC - Nessa área de análise de falha precisa... da... do...

[o depoente está construindo o raciocínio, então, sugeri a palavra]

LP – Desenho... do equipamento.

JC – Exatamente.

LP – Trigonometria.

JC – Usa também.

LP – Logaritmo.

JC – Também.

LP – Traçado de curvas e superfície.

JC – Também.

LP – Probabilidade e estatística.

JC – Por exemplo, na área que eu falei com você que eu atuo, que é de

confiabilidade, é estatística... pura.

LP – Direto

JC – Exatamente. Essa área especifica de confiabilidade tem uma base muito forte

de estatística.

LP – E o que você aprendeu de estatística na faculdade. Ajudou ou você precisou ir

em busca de ler mais...

JC – Não, precisa, precisa até para relembrar, porque tem muita coisa... na

realidade, o que acontece? na faculdade a gente tem a base, mas se você for por

um caminho, por exemplo, desses, de você estar estudando, estar tratando de

problemas reais, você com certeza vai precisar se aprofundar bem mais nesse

assunto.

LP – E aí, você fez curso ou recorreu à literatura? Ou ambas as coisas?

JC – Ambas as coisas.

LP – Teve que estudar de novo...

JC – Sim.

LP – Ok. Vetores no plano e no espaço.

[silêncio]

JC – Podia te falar muito de mim.

LP – Eu estou falando de você mesmo.

JC – Eu só sei o que estou te falando.

LP – Porque dependendo da área, vai ser diferente.

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JC – Como eu te falei, o meu trabalho aqui é muito específico.

LP – Não tem problema, pode citar no seu trabalho.

JC – E tem outra coisa: pode ser que eu vá usar, talvez não tenha tido um caso real,

uma oportunidade que me levasse a usar...

LP – por enquanto não...

JC – Mas acho que é passível estar usando, é possível.

LP – Ok. Derivadas. Estou falando das várias: ordinárias, direcionais, parciais.

Aquela parte que vimos em Cálculo I, Cálculo II,

[Silêncio]

JC – Outra coisa, então, quer dizer, derivada. Eu... muito pouco eu deduzo alguma

equação que tenha derivada para chegar a... na realidade eu já pego a....

LP – a fórmula pronta...

JC – Exatamente. Mas eu sei que para chegar naquilo ali, tem todo um

desenvolvimento, onde foi usada uma derivada.

LP – Você tem uma utilização subjetiva da coisa, você sabe que está usando...

JC – Exatamente.

LP – Mas você não tem que chegar lá e ficar fazendo processo de derivação e

integração, que no caso integral também é semelhante.

JC – Exatamente.

LP – Mas aquilo que você está utilizando, você utiliza computador para isso?

Programas de computador que fazem esse tipo de derivação?

JC – Não.

LP – Ou vocês pegam a fórmula nos livros e fazem a aplicação delas na mão?

JC – É. Exatamente, exatamente.

LP – É dessa forma, desse jeito.

JC – É.

LP – Vocês pegam as fórmulas prontas e aplicam, colocando as variáveis que têm à

disposição, para chegar ao resultado. Uma utilização mais subjetiva.

[o depoente confirmou com a cabeça]

LP – Séries.

[silêncio]

LP – Séries numéricas, de funções, de potência...

[silêncio]

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JC – A gente não chegou a usar especificamente, mas já chegou a estudar. A série

de Fourier... para.... espera aí... como é?

LP – Fourier é transformada.

JC – Ah! Esqueci. Série... para questão de tentar dimensionar, prever o uso de

sobressalentes.

LP – Transformada de Laplace e Fourier, você falou que já utiliza mais

objetivamente.

JC – É a mesma coisa, não eu, mas existe, nessa área de análise de vibração, é

utilizada a transformada para poder... migrar do espaço-tempo para o espaço da

freqüência.

LP – Equações a gente já falou, diferenciais e integrais. Coordenadas polares. Por

que estou falando de coordenadas polares? Estou pensando na situação da peça.

Se a gente for analisar a peça, a gente tem que olhar o desenho da peça numa

coordenada cartesiana, ou você vai estar utilizando também as outras dimensões,

você vai estar trabalhando com ela no espaço, então estará utilizando coordenadas

polares para avaliar, por exemplo, uma tensão que esteja ocorrendo ali que no plano

você não vai conseguir ver. Existe isso? Estou falando besteira ou isso é aplicado,

porque já vi em outras áreas que existe esse tipo de aplicação.

JC – Tem. Eu trabalho com máquinas dinâmicas que giram, então...

LP – Pois é, você tem que avaliar esta questão.

JC – Exatamente.

LP – Pois é. Então polares, cilíndricas e esféricas. E a utilização delas, também é

nesse nível subjetivo ou você precisa botar a mão na massa?

[pequeno silêncio]

JC – O que eu utilizei até hoje, no nível que eu utilizei até hoje não é preciso....

LP – Sair desenvolvendo.

JC – desenvolvendo.

LP – E para lidar com esses conceitos que você colocou, tem alguma dificuldade?

Em que sentido eu estou perguntando isso... por exemplo... você tem à disposição

literatura, se existe literatura disponível, se tem acesso a cursos que você precisa

fazer, ou você encontra alguma dificuldade? Precisa resolver este problema, sei que

vai resolver com uma transformada de Laplace, por exemplo, mas não a tenho à

disposição aqui. Tem dificuldade de conseguir utilizar esse conceito matemático.

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JC – Não, não vejo dificuldade não. Tem literatura, e o nível que a gente tem

também na engenharia, é muito, acredito que seja muito menor do que na

matemática, onde você tem que saber o desenvolvimento, tem que entender como

aquilo ali ocorreu, o que está influenciando, tudo o mais, não precisa ser um negócio

tão a fundo.

LP – Acho que na Petrobrás também, como é uma empresa de ponta, de tecnologia

de ponta, não existe esse tipo de dificuldade, de acesso a essa informação se você

precisa dela.

JC – Exatamente. A Petrobrás tem essa facilidade e tem gente na Petrobrás,

especialista para praticamente todas as áreas, então a gente não tem dificuldade...

você tem dúvida em alguma área específica, você pode ter certeza que vai ter

alguém. A gente tem algumas comunidades técnicas, onde você pode estar

discutindo e vai ter uma pessoa que vai estar te dando apoio...

LP – Na internet?

JC – Intranet.

LP – E agora vamos pensar lá no curso de engenharia... não faz tanto tempo assim,

foi ontem...

[risos]

JC – Que eu me formei, dez anos.

LP – Você lembra de alguma coisa que você não aprendeu e que faz falta, alguma

coisa da matemática que você não viu lá e quando chegou a trabalhar, você se deu

conta... nunca vi isso.

[silêncio]

JC – No meu caso, o que eu sinto falta é da estatística. Pela área que eu trabalho.

Lembro de ter tido a matéria, estatística, mas...

LP – É uma carga horária pequena...

JC – Exatamente, quer dizer, uma coisa que talvez se eu não estivesse nessa área

não estaria fazendo falta nenhuma, não é? Mas...

[silêncio]

LP – Você sentiu um pouco de dificuldade nisso, não é?

[silêncio]

LP – E, na sua atualização profissional? Você fez uma especialização, que você

falou aqui dentro da Petrobrás... e o que você está pensando? Existe alguma coisa

que você faz rotineiramente para se especializar? Alguma assinatura de revista

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técnica, por exemplo... como está? Estou falando da sua carreira mesmo, como

você está pensando nessa questão sua de estar se atualizando com as novas

tecnologias?

JC – É. Aqui a gente tem um programa de cursos, formação contínua, quer dizer, a

cada ano, no início do ano, a gente faz uma programação daqueles cursos que

seriam importantes para você estar se atualizando, estar revendo, alguma coisa que

você acha importante, que vai te ajudar no seu trabalho... tem essas comunidades,

que a gente tem livros, a gente freqüenta congressos para ver o que está

acontecendo na comunidade de manutenção, então tem o congresso brasileiro de

manutenção, por exemplo, tem o congresso espírito-santense de manutenção, onde

você se mantém atualizado com as tecnologias e do que está acontecendo.

LP – E nesses cursos, congressos que você assiste, você encontra a matemática

ali?

[silêncio]

LP – O que estou querendo dizer? Você vai num congresso sobre manutenção.

Nesse congresso, as pessoas vão estar falando sobre as máquinas, sobre, vamos

dizer, lubrificantes... fala sobre matemática, fala sobre novidades ocorridas na área

ou novas formas de trabalhar com esse tipo de coisa.

JC – Não que eu me lembre, não. O que tem é matemática implícita. Na realidade,

na maioria dos trabalhos...

LP – Você se depara com alguma fórmula?

JC – Exatamente. Para chegar naquele resultado, ele utilizou conceitos...

LP – Então subjetivamente você percebe que está presente ali.

JC – Está presente. Inclusive nesses congressos acaba que você não... até pelo

tempo não coloca explicitamente a matemática do trabalho... já chega com...

LP – Resultado.

JC – Coloca da onde que veio e o resultado a que ele chegou.

LP – Tem alguma coisa que você gostaria de acrescentar? Alguma tendência,

alguma coisa em relação à sua formação acadêmica... o que a UFES deixou a

desejar...

[silêncio]

JC – O que eu achei do curso, agora vendo do lado de cá, de quem já está

utilizando aquilo que foi colocado lá, é que você sai do curso de engenharia,

sabendo pouco de muita coisa, e agora eu estou do outro lado e estou tendo que

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saber muito de pouca coisa. Então tem aquela carência de... às vezes, não ter

aprofundado tanto em alguns assuntos que hoje são importantes para mim. Isso é

que... como se estivesse começando tudo de novo, começando quase do zero.

LP – É. Isso é meio complicado.

JC – Na realidade, você...

LP – Você foi para uma área, mas quantas áreas tem?

JC – Exatamente

LP – Vai atuar na mecânica, como vai saber tudo de tudo?

JC – Não, exatamente, estou colocando assim...

LP – É uma dificuldade.

JC – Dificuldade, mas essa questão de você saber pouco de muita coisa, tem o seu

valor, porque você tem a cabeça aberta e você conhece vários... não é? Conhece

de...

LP - Tem um leque de conhecimento grande.

JC – Exatamente, você tem um conhecimento de todas as áreas. Mas por outro lado

é ruim, porque você sai da faculdade com a sensação de que você não tem domínio

sobre nenhum daqueles assuntos. Você conhece, sabe que existe, mas você não

domina. Então você fica... talvez, se desse essa visão geral, mas também desse

oportunidade de uma maneira mais efetiva da pessoa conhecer bem um... uma

área... não sei, talvez até aqui tivesse um currículo mais generalista, você

conhecesse de tudo, mas a pessoa fizesse siderurgia, petróleo, não é... não sei.

LP – Ter uma extensão em determinadas áreas.

JC – Exatamente.

LP – Mas aqui não tem curso de especialização... tem petróleo...

JC – Nas faculdades particulares não sei qual é o nível desses cursos.

[silêncio]

JC – E até um dos fatores que me deixava ansioso que me fez fazer o mestrado, era

essa questão de querer conhecer, dominar algum assunto.

LP – Aí, você foi atrás por sua conta mesmo.

JC – Depois do curso de graduação, eu tive que escolher que curso, numa área que

precisa.

LP – Perfeito. Algo mais que gostaria de acrescentar?

JC – Não.

LP – Matemática então está aí, presente.

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JC – Sim.

LP – Então está jóia, seria só isso, isso tudo. Vamos então encerrar.

Lígia Arantes Sad(LS), professora de Matemática da Universidade Federal do

Espírito Santo, no dia 21/09/2007.

LP – Professora Lígia, fale um pouco sobre sua formação acadêmica.

LS – Bom Dia Luana, é um prazer estar falando para você sobre o trabalho aqui na

universidade. A minha formação acadêmica começou aqui na UFES na graduação,

depois eu fiz um pedaço em Brasília, depois eu retornei e fiz uma pós-graduação em

matemática pura, que foi em convênio com o INPA, onde fiz uma monografia sobre a

teoria da curva de Jordan, com o professor Valdecy Santos Daher do departamento

de matemática. E depois disso, como eu era casada, não podia sair facilmente para

fazer pós-graduação, eu fiquei no departamento até o ano de 1993, quando já

buscava mesmo uma pós, um mestrado e em 93/2, eu saí e fui para a UNESP, a

convite de um professor, o Rômulo Lins para ver se eu me adaptava ao sistema lá

de pós-graduação. Fiz um semestre como aluno especial e ingressei no segundo

semestre no doutorado diretamente por causa do meu memorial, eles viram que eu

teria condições de fazer direto o doutorado em Educação Matemática. Foi lá que eu

terminei em 1999. Eu comecei na realidade o curso em 1994. Entrei, fiz a prova de

ingresso, fiz a prova de língua... entrei em 1994 e em 1999 eu terminei. Eu já voltei

em 1998 para cá porque terminou o meu afastamento aqui da UFES e eu retornei

dando aulas e terminando a minha tese. Minha tese é de ensino e aprendizagem de

cálculo e justamente por causa da minha vivência aqui na UFES durante anos e

anos, lecionando não só Cálculo I, mas Cálculo de todos os níveis e outras

disciplinas mais. Então essa é minha formação.

LP – Quais são as disciplinas que você lecionava?

LS – Cálculo I até o IV. Cálculo Numérico não. Era o único que eu não dava porque

tinha um grupo especial no departamento que ministrava esta disciplina. Também

Álgebra Linear, Geometria Analítica, outras disciplinas também que eram referentes

não só ao Departamento de Matemática, mas de Engenharia, Arquitetura,

Economia, Administração, etc.

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LP – Essa seria a outra pergunta. No departamento de matemática, você lecionava

não só para alunos da matemática...

LS – Não. Desde janeiro de 1977, eu já dava aula em outros cursos também, porque

a matemática é um departamento que serve a muitos outros cursos.

LP – Havia alguma turma especial para Engenharia? Ou dentro da sua turma de

Cálculo você tinha engenheiros, arquitetos, matemáticos, administradores...

LS – Quando eu estudei era misturado ainda. Foi no início de 1970, mas quando eu

comecei a dar aula, já estava aqui no Campus, a partir de 1977, e já eram

separados os cursos.

LP – Então quem fazia engenharia, fazia um tipo de aula, quem fazia administração,

por exemplo, era outra matemática. Essa diferença tinha algum reflexo na prática?

LS – Tinha sim, porque nós procurávamos nas aplicações dirigir um pouco mais.

Não era ainda tão voltado especificamente para cada curso como é agora, depois de

1990 para cá. Mas havia alguma diferença, principalmente quando nós

conversávamos em encontros de professores, porque essa disciplina tinha muitas

turmas, Cálculo I, por exemplo, tinha mais de 10 (dez) turmas, então nós fazíamos

uma certa divisão.

LP – Na sua disciplina você fazia uso de algum livro-texto ou você sugeria leituras?

LS – Desde 1976 nós tínhamos livro-texto. Nós sempre adotávamos livro-texto, eu

trouxe até alguns documentos aqui que mostram isso. Sim, eu lembro, era o Thomas

& Finney (Cálculo Diferencial e Integral), foi o primeiro que nós adotamos. Depois foi

o Swokowski (Cálculo com Geometria Analítica) durante muito tempo, depois nós

tivemos um pouco do Stewart (Cálculo). Então nós tínhamos livros-texto, embora

traduzidos.

LP – Você tem alguma idéia se a origem desses livros era preferencialmente

alemães, ingleses, franceses... como eram analisados?

LS – Eram livros que vinham sendo adotados em outras universidades. E como o

pessoal daqui estava em contato com o pessoal do Rio, de São Paulo, traziam. E

chegava através também das editoras principalmente FTD, Mac Graw Hill.

LP – Isso a partir de 1990?

LS – Não. Isso já nos anos 80. Em 70, já por indicação de algumas universidades.

LP – Nós tivemos acesso a uma lista de cerca de 100 (cem) livros que foram

sugeridos para serem comprados para a engenharia mecânica, relacionados à

matemática. E desses livros, encontrei praticamente todos na biblioteca. Você pode

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dar uma olhada na lista e marque se foi utilizado algum ou se compraram por

comprar.

[Lígia olhou a lista e marcou alguns]

LS – Esse livro aqui do Mauer (Curso de cálculo diferencial e integral), tinha na

biblioteca, mas não era muito usado. Não sei porque a engenharia comprou esse

aqui. Não usava, nem como referência. Do Pablo Merino (Curso de calculo

diferencial e Curso de calculo integral) sim, mas era um livro muito antigo. Foi da

época que eu estudei, que a matemática era junto com os outros cursos.

O livro do Ayres sim, inclusive ele foi adotado na época em que eu estudei, no

começo dos anos 70 como referência para Cálculo.

LP – Inclusive tem vários exemplares na biblioteca.

LS – Tinha na biblioteca, os alunos usavam. Gozado, tem matemática para

engenharia....e era um livro usado.

LP – Também achei interessante.

LS – Era a nível de segundo grau, mas os alunos faziam muita consulta, os que

vinham com deficiência, com alguma falha.

LP – Veja que interessante. Achei alguns direcionados para engenharia, mas acho

que era mais para consulta, não?

LS – Sim.

LP – Esse Caraça(Cálculo Vetorial) nós tínhamos mas era para consulta, nunca foi

adotado. Courant (Cálculo diferencial e integral) era um livro de referência, mas nós

não o adotávamos, porque era um livro muito caro.

LP – E tem um número grande de exemplares na biblioteca. Seis exemplares. São

poucos livros que tem seis exemplares na biblioteca.

LS – E ele é um livro que vinha só em Inglês. Não tinha acesso ao Courant como a

gente tem agora traduzido.

LP – Esse é um dado interessante. Foram comprados todos os sugeridos, mas nem

todos foram usados. Da lista do CT, vi que quase 100% dos livros foram comprados.

Mas a lista não é do departamento de matemática. Fale para mim agora um pouco

sobre sua prática de sala de aula. Quero saber sobre metodologia.

LS – De que época?

LP – Quando você deu aula aqui na UFES?

LS – No final da década de 70 e na década de 80 também, quando eu comecei a dar

aula, era muito espelhado naquilo que os meus professores tinham feito. Era uma

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metodologia como a gente chama do tipo “cuspe e giz”, em que nós tínhamos salas -

principalmente da engenharia - muito cheias, com 45 (quarenta e cinco) a 50

(cinqüenta) alunos, e nós tínhamos esta metodologia de passar no quadro toda a

teoria, todos os exercícios, e os alunos estarem ali junto, trabalhando, embora eu

prezasse muito atividades feitas em grupo. Isso começou já na década de 90, um

pouco, quando eu me dediquei, principalmente quando eu voltei do doutorado, que

eu já tinha aquelas técnicas mais ligadas à parte da didática e os alunos faziam mais

atividades em grupo. Mas no final da década de 70 e década de 80, eram mesmo

aulas mais expositivas, com perguntas sempre dos alunos, nunca deixei de dar voz

ao aluno, ele podia perguntar quando quisesse, tinha toda a abertura para isso.

Interrompia a aula. Estou falando isso, porque muitos professores nem isso

admitiam.

LP – É. Eu ia perguntar a questão da disciplina. Tenho alguns indícios que na

década de 70, essa questão da disciplina era muito forte. O aluno não podia falar,

levantar-se, não podia uma porção de coisas.

LS – Tínhamos muito rígido essa questão de horário. Alguns professores até

fechavam a porta para o aluno não entrar fora de hora. Mas eu não, não cheguei a

fazer nada disso e nem essa questão do aluno não poder falar. Podia falar, levantar,

perguntar...

LP – E as avaliações?

LS – As avaliações eram pautadas em testes e provas. No início nós dávamos

4(quatro) provas. Na década de 80, nós introduzimos os testes, então, diminuíamos

a quantidade de prova e colocávamos os testes. Os testes eram para serem feitos,

em vez de em duas horas, em uma hora. Uma coisa mais rápida, mais localizada em

termos de conteúdo também. E as provas de um modo mais abrangente. E nós

tínhamos também lista de exercícios. Só que essas listas de exercícios não tinham

uma nota direta para o aluno. Era mais no sentido de apoio ao aluno, para que eles

revissem a matéria para a prova. E nós procurávamos colocar algum exercício da

lista ou mesmo parecido na prova para beneficiar aqueles que se debruçavam na

lista de exercícios. Era basicamente uma avaliação do lado somativo em cima das

provas. Do lado da avaliação de um modo geral, eu olhava aqueles alunos que

estavam sempre presentes, os que participavam mais, e aí estar aferindo isso

também na hora de avaliar.

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LP – Você não pensava só no exame... a prova reprova...olhava o aluno. O que é

difícil numa turma grande.

LS – Com certeza. Inclusive nas turmas depois de 1990, que já eram feitas

atividades em grupo, era muito comum eu pegar alguns alunos melhores, digamos

assim, mais desenvolvidos, e eles tornavam-se monitores dos outros. Essa era uma

metodologia que nem sempre era bem vista por outros professores, mas que

funcionava.

LP – E com relação ao currículo de matemática para a engenharia, você participou

de alguma modificação desse currículo? Interessa também o que motivou essa

modificação.

LS – Você fala a matemática na engenharia?

LP – Sim.

LS – A primeira modificação que eu senti lá foi essa questão do trabalho em equipe.

Porque como a gente tinha a equipe de cálculo no final dos anos 70(setenta), ficava

um pouco engessado a gente estar olhando a especificidade de cada curso. Então,

por mais que a gente quisesse fazer uma coisa mais voltada para aquele curso,

como todos deveriam ter o mesmo tipo de avaliação e aí fazíamos aquelas

avaliações em conjunto, isso amarrava em termos do conteúdo. A primeira vez que

nós sentamos no colegiado do departamento para fazer uma modificação para esse

curso de Cálculo, de Geometria Analítica principalmente e de Álgebra Linear, que

havia muitas turmas, foi no sentido de não ter mais esta equipe funcionando assim,

mas por curso. Então, quem dava aula para Engenharia Mecânica, Engenharia Civil,

tinha uma equipe. Quem dava aula para a Engenharia Elétrica tinha outra equipe.

LP – Quando foi isso?

LS – No final dos anos 80. Foi quando teve também reforma no colegiado de

matemática. E de lá para cá, houve maior espaço pro professor estar se

movimentando em relação a olhar para o curso e saber o que o colegiado também

queria em relação ao curso. Quanto às mudanças que os cursos pediam, nas

disciplinas de matemática eram mais no sentido de ter vaga sempre, não colocar

professor que não fosse efetivo – porque começaram a aparecer substitutos - e

eram chamados para opinar no colegiado, lá junto com eles nas questões internas

de divisão das disciplinas. Teve época que Cálculo I, pegava desde a parte de

derivada até o final todo de integração, num curso mais longo, porque eram 90

(noventa) horas, depois passou a ser 75(setenta e cinco). Então houveram

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mudanças de carga horária que indicavam também mudanças de conteúdo. O

representante do colegiado de matemática na engenharia participava. Teve umas

três modificações, pelo menos, que eu me lembre de 80 até 90. E essas

modificações eram por isso. Porque os cursos sofriam modificações na sua grade

curricular como um todo e as disciplinas tinham que se adaptar.

LP – E na época que você estudou isso não existia, não é? No final da década de

60, início da década de 70.

LS – Na década de 70 não era assim. As disciplinas eram anuais e elas eram em

conjunto. Nós tivemos disciplinas de matemática na década de 80 que eram juntas,

mas era assim: do curso de matemática com o curso de física, ou duas turmas da

engenharia. Era possível um aluno da engenharia civil fazer junto com um da

engenharia mecânica, mas era o máximo. Já era periódico, semestral.

LP – Foi com a Lei 5520 de 1968.

LS – Em 1970 ainda era anual.

LP – Acho que foi implementado em 1972...

LS – De 1972 para 1973 é que passou a ser semestral.

LP – Algo mais que você queira acrescentar?

LS – Talvez na questão da Álgebra Linear.

LP – Isso é uma coisa que me interessa. Eu comecei minha pesquisa desde o

século XVI, para conteúdo, apesar de não estar no meu período delimitado. Notei

que naquela época existia Álgebra, não era Linear. Existia Álgebra no currículo da

Engenharia, quando surgiram os cursos de engenharia no Brasil. E quando eu

verifiquei o primeiro currículo de engenharia da UFES, vi isso. Aí fiquei com essa

lacuna. Não consegui preencher. Por que saiu a Álgebra. Depois veio a Álgebra,

veio a Álgebra Linear, então, por que houve essa mudança? Não consegui descobrir

ainda.

LS – Sabe aquele livro do Pablo & Meryno, que falei que é antigo? A escola de

engenharia ainda tinha aulas por ele. Meu cunhado que estudava engenharia e

matemática, tinha aula lá e suavam o livro. Eu lembro que os meninos falavam. Aula

com Árabe Filho, para dar conta desse livro, justamente porque ele tinha um

enfoque bastante vetorial. Então o Cálculo, abrangia um Cálculo Vetorial. E aí,

quando chegava na análise, era análise vetorial, e análise algébrica, era separado. E

aí, quando veio a questão da Álgebra Linear, ela veio tomar uma parte da Geometria

Analítica, com ênfase vetorial. E o Cálculo Vetorial praticamente – não desapareceu,

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mas - tomou uma outra ênfase, através de limites e epsons e deltas. Uma ênfase

menos vetorial. Essa parte ficou com a Geometria Analítica e Álgebra Linear. E a

Álgebra Linear começou a se destacar forte a partir dos anos 70, quando eu

comecei a dar aula ela já existia como disciplina, em 77, já existia até Álgebra

Multilinear, em 82.

LP – E o que você acha que isso trouxe de impacto, o que melhorou?

LS – Eu acho que melhorou inclusive para a engenharia, em termos de ser mais

específico, porque antes, ficava meio misturado e escondido no meio do Cálculo.

Agora não, você tinha uma liberdade de estar trabalhando com vetores, depois com

as transformações lineares, que vieram ajudar noutras partes da engenharia.

Principalmente para a engenharia elétrica. Do currículo de mecânica não sei muito

bem, mas acho que também tem disciplinas que dependem.

LP – Acho que sim, porque tem muito modelo. Eles pegam uma situação física,

geram um modelo matemático, resolvem a situação e pegam essa resolução e

aplicam na parte física novamente.

LS – Eu acho que sim. A parte de transformações, auto-valores, auto-vetores para a

Álgebra Linear e que antes não aparecia no Cálculo.

LP – Era tudo feito lá.

LS – Era feito lá, mas não tudo. Essa parte, por exemplo, das transformações já é

nova. Não aparecia no Cálculo Vetorial.

LP – Muito obrigada pela entrevista...

LS – De nada.

Geraldo Rossoni Sisquini(GS), professor efetivo do Departamento de Engenharia

Mecânica da UFES, no dia 19/09/2007 no Centro Tecnológico da UFES, em sua

sala.

LP – Professor, gostaria que falasse um pouco sobre sua formação acadêmica.

GS – Até hoje?

LP – Até hoje.

GS – Superior?

LP- Fique à vontade. Se quiser contar alguma história.

GS – Eu sou daquela época que o pessoal começava a estudar e não fazia o pré.

Não existia. Fiz o primário em Colatina, em escola pública, de primeira a quarta

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série. Na época tinha que fazer uma prova para evitar de fazer o quinto ano. Era de

primeira a quarta série e tinha a quinta série – não sei qual a equivalência agora – e

para evitar de fazer a quinta série. Então você fazia uma prova. Se passasse ia

direto para a outra...

LP – Era ginasial na época?

GS – O ginásio, exatamente. Dali eu fui para o Marista, colégio de padre até o

segundo ano.

LP – Marista aqui (em Vitória) ou lá (em Colatina)?

GS – Marista de Colatina até o segundo ano. E tem uma formação...mais rígida de

disciplina, apesar de a gente ter sido sempre moleque, tive uma infância rica, porque

tive oportunidade... praticava esporte, vivia mais solto... os filhos da gente vivem

mais presos, não é? Então tive uma infância rica. Depois eu vim para Vitória, fiz um

bolsão, ganhei uma bolsa no Nacional, e fiz o terceiro ano aqui em Vitória no

Nacional, na época. Naquela época não tinha nem o nome, saiu com o nome de

uma escola pública que tinha aqui do lado do estádio da Desportiva. Não me lembro

o nome. É o nome até de uma pessoa. E aí, passei bem no vestibular...

LP – Você já fez para engenharia mecânica.

GS – É. Eu já sabia que ia passar, pelo desempenho nos simulados. Fiquei

despreocupado. Passei bem na época, em segundo lugar e fiquei aqui até o quinto

ano. Entrei em 1978 e saí em 1982. Fiz um concurso na Petrobrás, na Marinha e na

Nuclebrás. Passei na Nuclebrás, para trabalhar no programa nuclear brasileiro. Na

época estava previsto no projeto nuclear brasileiro, a criação de cinco usinas: Angra

I, II e III e Periube I e II. Naquele ano, o governo, por um motivo qualquer que não

me lembro agora, não sei se econômico, não sei se de política energética,

desacelerou o programa. O programa era em conjunto com a Alemanha. Até estudei

alemão na época, porque era previsto para a gente ir à Alemanha fazer treinamento,

e a gente chegou a fazer um treinamento de um ano, de especialização...

LP – Você chegou a ir à Alemanha?

GS – Não. Alguns até deram prosseguimento naquela época, alguns poucos. A

maioria se debandou para outras opções que apareceram no mercado. No final do

ano eu fiz dois concursos, um na Cosipa e na Universidade Federal do Espírito

Santo. Foi quando passei no concurso da Universidade Federal no início de 1984 e

assumi aqui em março e estou dando aula desde 84. [risos] Então, o programa foi

desacelerado, Periube I e Periube II, o local previsto virou uma área de preservação

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ambiental protegida por lei, não pode mais fazer isso lá, por causa da

desaceleração, que na época já estava aprovada e aí não deu continuidade. Angra

I...enrolou, saiu. Angra II saiu agora e agora o governo está querendo implantar

Angra III. Já está previsto e deve sair. E aí você vê, desde 1984... vinte e três anos.

Depois disso eu vim para cá em 1984, fiz mestrado de 1989 a 1991 e voltei em 1995

para fazer doutorado...

LP – Fez aqui?

GS – No Rio.

LP – Na PUC?

GS – É. Mestrado na área de Dinâmica de Estrutura e fiz o doutorado em

Oceanografia, voltado para estruturas oceânicas, lá na UFRJ de novo. De 1995 a

1999. E minha formação seria essa. A Universidade permitiu que a gente se

treinasse dessa forma, titulando em mestrado e doutorado.

LP – Pensando nas disciplinas que ministrou/ministra aqui, como você vê a

necessidade da matemática que é vista no início do curso dentro da sua disciplina e

como você vê que os alunos chegam para você?

GS – Nós temos uma série de disciplinas que não precisam, vamos dizer assim, de

uma base forte de matemática e física, que é a parte tecnológica. Por trás dela

sempre tem. Para conhecer os processos, de usinagem, por exemplo, você não

precisa. Mas para entendê-los, você precisa, porque por detrás disso você precisa

saber como é a interação das ferramentas com o material, onde tem forças de

contato com o material, as reações contém cálculo, então você precisa de

matemática nessa parte de conhecimento mesmo daquilo que está por trás do

processo industrial. Você vai operar o equipamento, mas até chegar até ali, projetar,

fazer funcionar tem uma base matemática por trás disso. A maioria das disciplinas

sempre precisou de um conhecimento bom, porque na realidade, o que caracteriza a

diferença entre um engenheiro e um tecnólogo de nível superior, é que o engenheiro

tem uma boa base matemática e física e o tecnólogo não tem. O tecnólogo pode ter

até uma boa bagagem de formação na área tecnológica, mas não tem uma base

boa de formação em matemática e física. Isso permite que o tecnólgo desenvolva,

projete, vá mais profundamente em um assunto qualquer que ele queira se

aventurar. São detalhes que realmente, o engenheiro, numa questão de

formação....[pausa]

LP – Se não tivesse, faria falta.

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GS – Faria não, faz falta. Pode não fazer depois de formado em função da atividade

que a pessoa for desenvolver. Mas mesmo assim, as pessoas às vezes não

percebem, mas elas sempre vão precisar... podem até evitar, mas sempre vão

precisar.

LP – Como os alunos estão chegando aqui?

GS – Hoje eu acho que estão chegando melhor. Eu assumi a Coodernação34 em

2001 e o problema maior que nós tínhamos era a rotatividade de professores

substitutos. Alguns bons, alguns muito ruins. Esses ruins, colaboravam para que os

alunos tivessem dificuldade no nosso básico profissional. Quando os professores

que dão os cursos são professores do quadro efetivo ou são professores substitutos

de boa qualificação, eles chegam muito bem, com uma formação muito boa. Essa

parceria é importante, da física, matemática, o básico, com a parte básica

profissional dos cursos de engenharia.

LP – Então você considera que a base hoje em dia está melhor estruturada do que

era antigamente.

GS – Na minha época era melhor ainda. Aí que está a questão! na minha época não

existia a figura do professor substituto, quando eu me formei. Então era bem mais

forte, melhor, os alunos saíam melhores ainda. Hoje eu diria que eles saem um

pouquinho piores do que na minha época – a universidade como um todo passa por

esse processo de precariedade do trabalho do professor, com carga horária muito

grande, com um esforço muito grande, têm contratado professor substituto para

atender e às vezes eles não atendem como deveriam – então, nós temos essa

dificuldade hoje que não tínhamos no passado. No passado era professor efetivo e

pronto. A qualidade do ensino era boa. Você poderia ter um professor que exigia

mais que outro, mas a qualidade sempre foi boa.

LP – Já ouvi boas estórias.

GS – É. Tem uns professores antigos com umas estórias interessantes. Eu mesmo

já tive várias quando fui aluno... mas a diferença de hoje é essa. Você tem hoje um

básico que comparado com a minha época, o básico hoje deixa um pouco a desejar

em função do momento. Não quer dizer que daqui a dois, três, quatro anos possa

estar melhor que hoje. Depende de como o governo vai se comportar com relação à

34 Coordenador do Centro...

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contratação de pessoas... se trocar todo o quadro de professores substitutos e

colocar efetivos, com certeza muda bastante isso.

LP – E em relação às avaliações? Na minha pesquisa estou preocupada em analisar

o que ocorreu ao longo do tempo. Se ocorreram mudanças ou se permanecem. O

objetivo não é julgar o que era pior ou melhor. Quero analisar como era no passado

e como é hoje.

GS – Eu diria que as avaliações antigamente eram mais pesadas do que hoje. As

avaliações que nós fazíamos antigamente exigiam muito mais... você não tinha

recursos de computador como tem hoje, que você pode fazer simulações e enxergar

algumas coisas com mais facilidade, antigamente você não tinha facilidade... as

demonstrações que você consegue fazer hoje com o computador ou outros

recursos... está bem melhor que antigamente, quando o grau de exigência era maior

nas avaliações, se for comparar.

Hoje o aluno está chegando menos preparado que antigamente, ele sente mais o

impacto das avaliações que antigamente. Mas isso muda de período para período,

porque, por exemplo, tem uma coisa que influencia muito. Na minha época era dez

por um35, então você selecionava melhor também. Depois caiu para seis por um, por

um tempo e agora voltou a ficar na casa dos dez por um – o curso de engenharia

mecânica – isso faz com que você selecione melhor. Temos duas entradas, na do

primeiro semestre, os alunos são excelentes – o histórico -, na turma do segundo, já

cai bastante. Mas a tendência agora é o nível ser melhor em função da relação

aluno por vaga ter crescido. Tem outros cursos por aí, como medicina, por exemplo,

que segundo alguns colegas, propõem o que querem para os alunos e eles

assimilam com facilidade, porque o nível é alto. Outra questão importante também é

que quanto maior o nível dos alunos, de formação intelectual, você pode aumentar a

exigência e eles não sentem tanto. A gente percebe isso quando dá um curso

noturno. Os alunos que têm aulas à noite... a avaliação que você dá à noite tem que

ser um pouquinho inferior do que a que você dá para os alunos do curso diurno. A

clientela também determina o grau nível. Então o professor tem que ter cuidado

nisso. Dependendo da turma você tem que saber até onde pode ir com ela, se não

quiser reprovar em grande escala.

35 Refere-se à quantidade de alunos por vaga no vestibular.

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LP – As avaliações aqui permitem a utilização de recursos, como computador,

calculadora...

GS – Não. O computador permite que você enxergue melhor, porque você faz uma

simulação... por exemplo, eu pego um cálculo aqui de um parâmetro qualquer e no

computador eu faço rapidinho, calculo, e não calculo um ponto... posso calcular

vários pontos e enxergar como que um e outro vão dar resposta. Quando você faz

na mão, fica muito grande, você só faz uma vez e não procura entender.

LP – Então você acha que o computador auxilia na compreensão do

desenvolvimento do conhecimento.

GS – Exatamente.

LP – E isso facilita para eles fazerem a avaliação depois.

GS – Também. Porque você já enxergou o caminho, já conhece várias situações,

chega a uma resposta mais segura.

LP – E a calculadora é utilizada na avaliação?

GS – Depende do curso. Dependendo da avaliação é.

LP – E como é a sua avaliação?

GS – Depende. Quando tenho turmas com poucos alunos, faço uma avaliação mais

dirigida. Conheço o aluno, vou passando trabalhos, verifico onde errou, vamos

corrigindo, passo de novo.

LP - Então você faz avaliação, não exame. Para mim, exame é: você faz uma prova

e tem uma nota que aprova ou reprova. Avaliação é quando vai conduzindo, se ele

não está bem...

GS – Com pouco aluno dá para fazer isso... agora, quando é uma turma grande com

quarenta... é marcar uma prova de cinco questões, quatro questões, três... eu faço

um gabarito, corrijo, procuro padronizar o gabarito para que ninguém reclame que o

outro foi beneficiado.

LP – Você tem então um critério determinado e isso é passado para eles.

GS- É.

LP- E você aceita recursos?

GS – Aceito.

LP – Se alguém quiser discutir alguma coisa...

GS – Até me prova final. Isso depende muito do professor. O professor não tem

obrigação de atender aluno na prova final... pegar, fazer, olhar como está a prova.

Não tem essa obrigação.

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LP – Na prova final. Mas durante o curso...

GS – Durante o curso sempre faz.. pega, olha e tal...tira a dúvida. Porque às vezes

tem... eu mesmo já passei por isso...um problema pode ser resolvido de várias

maneiras e às vezes a que você colocou não foi aquela do gabarito e você não

enxergou. Aí o aluno vem e mostra e você vai e corrige. Ou você pode ter cometido

algum erro e quanto faz esse feed-back com o aluno é que vê quem tem razão ou

não. Se ele não tem você mostra e ele sai satisfeito porque vê que realmente estava

errado e pronto. Até na prova final eu faço isso... quando não é problemático.

Quando aparecem alguns problemas de cola, aí eu já não... eu sou... tem cola aqui..

e a nota é essa... se quiser vai no departamento e entra com requerimento...

LP – A tolerância cai, com certeza.

GS – É. Aí eu já não tenho muita paciência, não [entre risos]

LP – E você sempre procedeu assim, ou foi aprendendo ao longo do tempo? Vamos

pensar. Você começou em 1984, estamos em 2007, são vinte e três anos. Como

você analisa, pensando no seu comportamento como professor?

GS – Na realidade eu fiz o curso de engenharia mecânica, logo depois o curso de

engenharia civil, mestrado e doutorado. Então você tem a experiência de aluno e de

professor por um bom tempo. E aí você tem vários estilos de dar aula, de

avaliações, de postura na sala de aula e você vai tirando, talvez intimamente, um

pouquinho de cada coisa e vai desenvolvendo o seu perfil. Eu acho que é um pouco

disso.

LP – Como isso foi ocorrendo ao longo do tempo. No início você não fazia como faz

hoje?

GS – Na época até que não era muito diferente não. Pelo menos nessa parte de

exame. Eu sempre dei aula para muitos alunos então sempre fui liberal nesse

aspecto de atendimento para reclamação de questão. Na realidade não tinha nada

para esconder, não é? Tem professor que o aluno nem vê a prova. Não sabe nem o

que errou. Não gosto disso não. Eu gosto que o professor veja que estava errado o

que estava certo, te convença. Acho que isso é importante.

LP – Fala agora um pouquinho sobre sua prática na sala de aula. Como você

costuma agir na sala de aula?

GS – Eu não gosto de entra e sai na aula...

LP - Você costuma conversar, você costuma fazer dinâmicas de grupo...ou sua aula

já é mais tradicional...

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GS – É mais tradicional mesmo. Nas matérias que eu leciono... isso também

depende do tipo de aula que você dá. Ás vezes as pessoas confundem muito. Se

você dá uma aula de cálculo, física, algumas matérias do básico, você tem um livro

texto, a teoria e exercícios. O foco é aquele ali. A teoria, que eu procuro demonstrar,

abro um exercício para poder o aluno tirar a dúvida que ele poderia ter da teoria...

mais ou menos assim o fechamento. E quando você está dando uma aula que

requer mais tempo, você interfere onde tiver mais dificuldade, você procura pegar

exercícios mais pontuais, para cobrir aquela lacuna. Isso aí eu sempre fiz nas

matérias que eu dei aula. A gente percebe isso... qual o exercício mais adequado

para aquele assunto. Eu acho que a dificuldade maior é essa. Saber selecionar o

exercício adequado para o assunto. Isso eu aprendi a fazer. Mas é mais tradicional.

Porque a gente encontra professores da antiga aqui mesmo, que na minha época

gostava muito de ficar conversando. Conversava sobre um assunto que não tem

nada a ver com a matéria. Matava a aula todinha... eu me lembro de um colega

nosso aí, que o livro são dez capítulos. Ele só deu seis. Então o que acontece? Você

tem um programa para cumprir e tem um tempo. Esse professor provavelmente,

acho que nunca cumpriu aquele programa. Se cumpriu, eu não sei. [risos]

Entendeu? Acho que tem que ter essa noção de tempo para dar um curso. Na

primeira vez você pode até errar na dosagem. Na segunda você acaba acertando.

Você sabe quando pode estar atrasado, quando pode estar adiantado. Isso depende

também muito de época. Tinha época que o pessoal tinha problemas políticos

maiores, discutia às vezes algumas coisas em sala de aula, mas eu nunca gostei

muito de misturar essas coisas em sala de aula não. Ficar conversando sobre

assuntos filosóficos, políticos, sociais em sala de aula. [sorriso]

Na verdade demanda tempo e a pessoa tem que ter leitura sobre esse assunto e

nem sempre os alunos também gostam disso. De uns tempos para cá, as turmas

que vêm do cursinho, vêm com outra dinâmica. Alguns cursinhos são muito... como

eu diria... liberais na disciplina. Não sei se continua assim, na minha época e há

algum tempo atrás, e eles acham que aqui tem que ter a mesma... é um entra e sai,

uma conversa, começa a conversar na aula...esse tipo de reclamação...tinha uma

turma assim muito pesada nesse sentido. Eu já tive turma assim, mas eu sempre

soube me impor, não é? Então na primeira chamada, “nego” já....

LP – Tamanho não falta, não é? [risos].. quando o aluno olha para cima assim...

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GS – É.... [risos]. Quando você enquadra logo no início, pronto. Eu não tenho...

nunca tive... e quando tem nós vamos lá. Mas aqui a gente tem que fazer esses

acertos... disciplinar...tem uns alunos que entram muito abusados,

LP – Eles entram muito novos também...

GS – Imaturos. Mas ao mesmo tempo se a pessoa deixa, vira uma bagunça na sala

de aula. A verdade é que na universidade, os professores não foram treinados e

nem têm interesse de ficar contando piada, sentando no colo de aluno, fazendo

gracinha...

LP – Em cursinho tem muito show...

GS – Tem muito show. Então, pega um violão, toca uma música pra poder o aluno

aprender uma seqüência... [risos] ...esse tipo de coisa não existe na universidade.

LP – E nem pode ter... aqui é um outro nível de conhecimento.

GS – Exatamente.

LP – Tem que se ter outra postura.

GS – É isso que eu falo. Então, às vezes, - como a gente não está lá vendo como as

aulas estão sendo conduzidas – se for dessa forma como eu já vi nesses cursinhos,

chega aqui o professor tem outra postura. Chega, já vai passando matéria e o aluno

quando vê já está tendo uma prova e... aí que ele começa a perceber que a coisa

mudou. No cursinho a prova é objetiva, não sabe, marca um x. Agora está tendo

mais objetiva, antigamente nem tinha.

LP – As suas são mais descritivas...

GS – Todas. A maioria das provas do curso de engenharia são descritivas. Tem uma

ou outra avaliação que algum professor faz, às vezes, objetiva, mais por uma

questão de momento, quer dar uma avaliação mais leve, mas a maioria é descritiva.

LP – Você teria alguma avaliação que eu poderia ver?

GS – Aqui?

LP – Ou até em casa, se quiser trazer...Até talvez alguma que você tenha feito.

GS – Eu devo ter... acho que eu tenho.

[levantou-se e foi procurar o que tinha disponível em sua sala]

LP – Pois é, joguei muita coisa fora antes de começar a estudar história.

[Ele mostrou algumas provas e os comentários que se seguem são meio

desordenados por conta dos papéis que estavam sendo analisados. Ficaram mais

pontuais, mas ainda assim decidi mantê-los]

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LP – É interessante a questão da caligrafia. Antigamente tinha uma exigência de se

manter a caligrafia mais trabalhada.

GS – Isso aqui é um gabarito.

LP – Interessante!

GS – Aqui a prova.

LP – Isso é interessante. Você faz a resolução da prova para depois comparar com

a resposta deles?

GS – É. Exatamente, porque serve de referencial para eu tirar dúvida no caso do

aluno querer fazer uma revisão, você tem ela toda. Olha... aqui estão os valores de

cada... só eu que vou entender, lógico...[risos]

LP – Não, dá para entender. Muito legal isso!

GS – Aqui tem uma outra prova. Aqui a resolução daquela ali.

LP – Todas essas são provas recentes, não é?

GS – Sim. Essa aqui foi recente, porque semestre passado eu tive que substituir um

professor.

LP – Antiga você teria alguma? De quando você começou a dar aula?

GS – Não. Devo ter de uns seis anos atrás.

LP – Estou olhando aqui... De novo, vou explicar que não estou julgando e sim

comentando... o objetivo, inclusive na minha pesquisa, não vou comentar sobre se é

bom ou ruim, certo ou errado... só estou analisando o que é. As disciplinas de

mecânica I e II são requeridas em outros conhecimentos técnicos.

GS – Isso.

LS – Elas são pré-requisito inclusive para outras disciplinas. Você acha que esse

tipo de trabalho – aqui estamos vendo... uma caixa de peso, uma bola de aço, enfim

– na aplicação do conhecimento que o engenheiro vai necessitar na atuação

profissional dele. Você se preocupa com isso? Porque só por aqui não dá para ter

essa noção.

GS – Tem umas questões aqui... por exemplo... isso aqui... no controle de

qualidade. Tem aquela esferinha no rolamento, ela sai de uma canaleta e tem um

recipiente, o que cair dentro dele passou no controle de qualidade, o que cair fora

não passou.

LP – Na sua prática de sala de aula você comenta isso, ou eles têm que chegar a

essa conclusão?

GS – Isso aqui, por exemplo, é um mecanismozinho...

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LP – Sabe por que pergunto?

GS – Isso aqui... é um mecanismo para aplicar a força com a mão, mas eu poderia

estar puxando com um cabo, uma engrenagem. Aqui é uma viga apoiada num cabo

e você tem aí passarelas, pontes, algumas marquises com cabo de aço. Tudo isso

aqui você encontra. Deve usar na prática. Eu procuro colocar normalmente, em

mecânica principalmente, primeiro exemplos que façam a revisão da teoria e que dê

para o aluno ver que aquilo ali...porque aqui, por exemplo, eu calculo as forças,

depois eu posso calcular o diâmetro desse eixo... numa outra disciplina: Resistência

dos Materiais que vai tratar isso: selecionar o material, especificar os materiais, etc...

certificar o tipo de rolamento, lá em Elementos de Máquinas. Na verdade, a

Mecânica faz parte do currículo para aprender a calcular as forças que compõem o

sistema. Com isso você usa em Resistência dos Materiais para, para projetar,

dimensionar a espessura da chapa, o diâmetro do eixo, a área da seção da viga,

enfim... esse cabo aqui, qual o diâmetro dele... essas coisas, através desses

exemplos aqui você vai aproveitar.

LP – Isso é muito importante. Inclusive, foi um questionamento, pois fiz entrevista

não só com o Fabrício, mas com outros que se formaram aqui e foi um

questionamento, que o curso universitário é muito teórico e fica longe da prática.

GS – O que ocorre é que depende do momento. Às vezes a pessoa não consegue

fazer o link. Então o professor precisa falar: “tá vendo, aquilo que fizeram lá estão

usando aqui!” O que falta, às vezes, no aluno é perceber isso.

LP – Mas será que ele tem maturidade para perceber isso?

GS – É. Também ele tem que ter um entendimento. Alguns tem facilidade para

entender, outros, o professor precisa mostrar: vou calcular isso, mas isso aqui você

já viu na matéria tal... Vou dar um exercício aqui para vocês revisarem o que viram

lá. Agora, vamos aplicar o que eu ensinei aqui...para ver o link...

LP – Você tem essa preocupação.

GS – Eu não dou essas matérias na frente, mas se eu desse eu mostraria: “em

mecânica, vocês já viram isso!”. Eu sei que a maioria não faz isso, porque na

realidade o que acontece...eu diria que nem todo mundo, nem o engenheiro tem

uma noção global do curso de engenharia, ou seja, de pensar porque essa disciplina

está aqui. Ele não está preocupado. Está preocupado em dar aula da disciplina

dele... especializei nisso aqui, estou trabalhando nisso...

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Esse tipo de preocupação não é todo mundo que tem. Eu posso mostrar para

qualquer pessoa... você viu lá na disciplina tal... eu consigo fazer... tenho

conhecimento das disciplinas. Para ver isso aqui, você precisa disso, e isso, e

isso...pronto. Está aí! Nem todo mundo tem essa facilidade.

LP – O que você pensa a respeito disso? De não ter essa preocupação?

GS – Eu acho que é uma questão individual. Eu tenho alguns conhecimentos

específicos bem aprofundados, mas tenho um conhecimento geral bom em todas as

matérias. Não é todo mundo que tem isso. São poucos. Não é todo mundo que

percebe isso, ou se percebe não dá importância. O aluno meu, Fabrício, ele está lá

na empresa... ele tem lá eixo... ele aprendeu como calcular... – é por isso que eu

falo, você está na empresa, deu um problema lá qualquer, você pode não precisar

resolver, mas precisa saber como encaminhar aquilo para resolver... ah! quebrou um

equipamento... você tem que saber como fazer um relatório, ver o que vai ser

importante verificar, verificar material, encaminhar para alguém fazer análise, tem

que saber interpretar isso tudo e para isso, você passa pelas matérias básicas

todas. Se não tiver, não vai saber preparar o relatório, não vai saber pedir... eu

quero o quê?... quero que você faça isso... o cara traz e você tem que saber o

quê?... saber ler e interpretar aquilo ali. Isso passa por todas aquelas matérias que o

individuo teve. Às vezes ele acha que porque está numa empresa, mais na parte de

administração, ele usa pouco a base, aquela parte de matemática ele acaba usando

pouco. Quem trabalha em projeto é que mexe mais com isso. Quem está mais em

trabalho de campo, em especificação, em solicitação de serviços, verificação de

inspeção, troca ou não de equipamento... essa parte, você vê em algumas

disciplinas. Ás vezes acaba nem vendo, dependendo se ela é optativa, como Direito,

então às vezes, ele não fez a disciplina que era optativa e agora está trabalhando

mais nela. Tem isso, não é? Mas o básico, nós mudamos o currículo agora

recentemente para contemplar mais ainda.

LP- Isso é uma coisa que me interessa também. Quais as mudanças que ocorreram

no currículo e o que provocou essa mudança?

GS – Antigamente, até o quarto período as disciplinas eram só básicas. Hoje você

começa a fazer já desde o primeiro período, disciplinas do profissional, como

Introdução à engenharia, o que é engenharia, no segundo você já vê ensaio dos

materiais, termodinâmica, mecânica I no terceiro, resistência dos materiais no

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quarto, tem uma série de disciplinas do profissional desde o primeiro período, coisa

que não se fazia antigamente.

LP – Isso aconteceu agora em 2006?

GS – Não. No nosso curso já existia e nós melhoramos.

LP – Quando ocorreu essa mudança?

GS – Em 1992. Isso já foi feito em 92, mas foi melhorado agora para 2008 e agora

nós introduzimos uma carga horária maior para as disciplinas em laboratório, que

era uma falha.

[o depoente atende o telefone]

GS – Mais alguma coisa?

LP – Não. Era para tentar entender essas mudanças e porque ocorreram.

GS – É. A última mudança... nós temos disciplinas aqui que têm uma parte teórica e

uma parte laboratorial, uma parte de experimentos em laboratório, vamos dizer

assim. Nós desacoplamos porque percebemos que alguns professores não estão

cumprindo. A partir do momento que criamos a disciplina Laboratório tal, aquele

programa vai ter que ser cumprido, vai ter um professor responsável. A teoria quem

dá é outro ou pode ser até o mesmo, mas tem outra disciplina. Tínhamos o conteúdo

do laboratório não cumprido por alguns. Depois nós ampliamos o leque também

para contemplar outros assuntos que a gente precisava contemplar para permitir que

o aluno tenha a formação forte de matemática e física aplicada também em

experimentos para ele ir tirando as conclusões, vendo como a coisa funciona na

realidade.

LP - E a de 1992, você lembra o que desencadeou essa mudança?

GS – A de 1992, quando eu fiz, ela não tinha essa mistura de profissional com o

básico. Os quatro primeiro períodos, era todo de disciplinas do básico. Tinha Cálculo

I, II, III e IV, Física I, II, III, IV...

LP – Física Experimental.

GS – Física Experimental I e II.

LP – Cálculo Numérico.

GS - Cálculo Numérico, Geometria Analítica, tinha Geometria descritiva, tinha

desenho técnico, química tecnológica, probabilidade e estatística, processamento de

dados. Hoje nós temos Cálculo I, II e III, com 90 horas, Álgebra Linear I, Geometria I.

A parte de física toda veio para o departamento, por causa das dificuldades que

tivemos em Física para cumprir...

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LP – Então a Física vai ficar por aqui.

GS – É. Antigamente era tudo I, II, III e IV. Física I virou a disciplina Fundamentos,

Física II virou Termodinâmica I dada por nós, Física III virou Eletromagnetismo e

Produção dada pela Elétrica, e Física IV virou Ótica e Introdução à Física Moderna.

Hoje vamos dar Mecânica I, II e III a partir do segundo período, e aí nós temos a

parte de laboratório, que a gente chama de Física de Laboratório I, II e III, onde a I

aborda a Física Instrumental... a Elétrica junto com a gente continua dando... eles

fizeram uma mudança lá e dão essa parte introdutória, introdução ao

eletromagnetismo, circuitos eletrônicos e eletrotécnica. Tem ainda a ótica aplicada.

E nós estamos resolvendo os problemas aqui.

LP – Por enquanto é só. Algo mais que você queira acrescentar?

GS – Não.

LP – Obrigada pela entrevista.

Myrtha Saloquer Fayet(MF) professora do departamento de matemática, no dia

02/05/08, em sua residência em Vitória.

LP – Bom dia Professora Myrtha, é um prazer imenso estar aqui com a senhora.

nessa entrevista. Gostaria que a senhora falasse um pouco sobre a sua formação.

MF – Bom dia, o ginasial foi no Júlio de Castilhos36, me lembro eu e a Vera Lígia

Lima... ah sim, eu com meu vestido de formatura daqui, me lembro branco, muito

bonito, estava na instalação da assembléia legislativa em Porto Alegre. Eu tenho a

fotografia que saiu na primeira folha da Folha da Tarde.. é um dos periódicos de lá

na ocasião. Depois, freqüentando o científico, eu e a Vera Lígia, eu tenho até por

acaso o postal, a gente subindo a ladeira e a pé, para assistir os discursos do

Fernando Ferrari37 e do Mem de Sá38. E muita gente outro dia perguntando se

36 Refere-se ao Colégio Estadual Júlio de Castilhos, fundado em 23 de março 1900, com o nome de Gimnásio do

Rio Grande do Sul, em Porto Alegre- RS, ainda em funcionamento.

37 Político trabalhista Gaúcho, atuante no final da década de 50, fundador do Movimento Trabalhista Renovador,

morreu em 63, vitimado de um acidente aéreo, e tem várias obras públicas que levam seu nome, como o Centro

Administrativo do Estado do Rio Grande do Sul, que se chama Centro Administrativo Fernando Ferrari e aqui no

Espírito Santo, uma das principais avenidas da capital Vitória leva o seu nome.

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Fernando Ferrari viveu aqui...um excelente deputado, um deputado forjado com

inteligência, um ideal maravilhoso, e perdeu a vida muito cedo. E nessa ocasião lá

em Porto Alegre, ele era Deputado Estadual, o Mem de Sá depois se tornou

Senador, já o Fernando Ferrari faleceu Deputado Federal, não chegou a ser

Senador... uma morte muito prematura... um excelente deputado como agora

desperta esse Onyx Lorenzoni39 lá no Rio Grande do Sul. E... uma inconfidência...

não é bom chefe de família, mas um excelente político [risos]... incrível não é? como

acontece... bom... a formação... o curso de matemática foi o que se tinha na época,

não é? Eu creio que o IMPA, o Instituto de Matemática Pura e Aplicada era

freqüentado num porão, que foi o que eu encontrei depois que eu me formei e eu fui

em Botafogo. A gente lá no Sul nem tinha notícia do Instituto de Matemática Pura e

Aplicada, nem se falava em pós-graduação. O curso de pós-graduação era possível

no Brasil historicamente para poucas disciplinas. Só as pessoas mais abastadas é

que podiam ir ao estrangeiro procurar uma pós-graduação.

LP – E os livros? Havia livros? Eles vinham de onde? Qual a origem? Europa ou

Estados Unidos?

MF – Na matemática teve a época da Itália, depois França, depois a época

Americana e agora com a globalização, não se pode definir... vai pro computador e

aí se têm todas as informações.

LP – Na década de 70 já tinha a influência americana?

MF – È. Tanto assim que tenho livros em Italiano, Francês, Inglês... em alemão não

passa... mas claro, não podemos nos esquecer de Leibniz.. Newton na Inglaterra e

Leibniz, que era advogado e estava encarregado de fazer as pesquisas por causa

do interesse da família alemã por outro reino, então ele pesquisava essas famílias e

enquanto isso desenvolvia cálculo, não é? E o Newton... e um não sabia do outro,

era muito difícil. Então agora, a gente conhece os cérebros... desponta um aqui,

outro ali... depois do curso de bacharelado eu fiz a licenciatura e a gente saiu com

aquela idéia muito humilde de que pouco a gente sabia e que a gente jamais iria

almejar ser professora de uma escola superior. A gente almejava passar num

concurso para escola secundária. Isto nunca passou pela minha idéia.

38 Mem de Azambuja Sá, nascido em 1905 em Porto Alegre, foi Deputado Estadual de 1947 a 1954 e Senador

de 1956 a 1963 e faleceu em 1989.

39 Deputado pelo PFL-RS.

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LP – Essa era uma idéia que existia no curso de matemática? O curso de

matemática era voltado para a formação de professores mesmo? Ou de

matemáticos pesquisadores...

MF – Não. Era um curso superior, não tinha nada disso. Nem havia necessidade

como há agora de formação de professores para o ensino fundamental, mesmo até

superior. Vai faltar professores pro ensino superior, se continuarem com essa

política de carreira pavorosa... imagina, o professor adjunto com salário de

quinhentos , não é possível.. isso aí não resiste...daqui a pouco vão procurar

professores especializados e eles estão na iniciativa privada, estão nas grandes

empresas e não estarão necessariamente dentro das universidades que deveria

alojá-los. E da qual, deveriam ser expulsos, personalidades como esse Reitor lá de

Brasília, Deus que me perdoe...é outro crime... mas lá a gente estudava por estudar,

por ter o anseio de cursar o curso superior e talvez eu quisesse me formar em

química, sei lá... mas eu fui pelo mais fácil, pra mim era as exatas. [risos] O

vestibular era mais fácil... eu me lembro que descritiva, a gente nem conhecia. Meu

irmão que me deu umas aulas, e eu tirei dez, mas você pode imaginar, aqueles

rebatimentos todos, pra quem nunca viu, estudar num fim de semana, não é? Já se

imagina que tive uma boa formação. Não adianta QI sem uma base, a inteligência é

muito importante, mas o suor e a disciplina valem bastante, porque as inteligências

se perdem e eu insisto em falar que sem uma disciplina, uma orientação, a gente

deixa de ter muita gente competente por aí exercendo uma bonita profissão... agora,

quanto à profissão de professor, é sacerdócio.

LP – E como era a sua prática? O que pode falar da senhora enquanto professora?

MF – Engraçado que a minha primeira aula, o nosso centro acadêmico tinha o nome

de Franklyn Delano Roosevelt e os que podiam davam algumas aulas para os que

iam fazer vestibular, porque não tinha os cursinhos. Eu entrei antes do advento dos

cursinhos. E os meus professores no Júlio de Castilhos, ainda eram professores do

curso secundário. Depois, afamados como eram, começaram a fundar cursinhos.

Então esses grandes professores passaram a ser professores de cursinhos e não de

colégios estaduais. Isto aconteceu lá no sul e acho que em outras capitais também.

E eu... falando de prática, no meu curso, nós não tínhamos praticamente aula

prática... era um ou outro evento, um exercício que o professor dava. Todo o curso

era muito teórico, não tinha prática. A primeira aula que eu dei pelo Franklyn Delano

Roosevelt foi à noite numa sala, num porão da engenharia para personalidades. Eu

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tenho a impressão que dei a aula toda em cinco minutos, parei e aí falei a aula outra

vez.

LP – Quando foi isso?

MF – Eu era estudante, foi antes de 1954. Mas pior do que eu, eu me lembro em

didática, uma colega nossa muito inteligente, precisava vê-la dando a primeira aula

dela... os olhos voltados para o teto da sala de aula e ela dizendo as coisas. Coisa

incrível não é? A gente nem imagina a posição. Agora eu tive muita sorte. Acho que

eu nunca tive uma palavra que eu repetisse, você lembra? Não, não é?

LP – Não.

MF – Eu só me lembro de uma quando eu dava aula aqui no Colégio Estadual...

uma experiência muito boa, eu pedi pro Arabelo40 e levei quatro turmas de primeira a

quarta série. Não terminaram em quatro, terminaram em duas, mas no terceiro ano

do ginásio, o Pedreira me demonstrava o teorema sem eu precisar fazer a

demonstração, porque eu seguia uma orientação...

LP – Quem é Pedreira?

MF – Tem dois Pedreiras que foram meus alunos. Este infeliz, ele saiu daqui. Fez o

primeiro ano e foi pra Volta Redonda. E que se saiba tinha aqueles ideais todos,

democráticos. O que eu soube dele, que é desabonador, é que ele orientou o

governo, não sei de do Geizel ou anterior, pra trazer as usinas atômicas para Angra.

Isto é um pecado. Eram dois Pedreira. Um mais velho que não saiu daqui e este que

saiu. Freqüentava aquele bloco de Ipanema, enfim, teve o que um bom estudante

faz, uma atividade política boa. Depois prestou pra ser mentor de trazer essas

usinas... tem uma terceira que ainda não foi instalada, tomara que não seja... e as

minhas aulas práticas eu sempre caprichei... eu dava exercícios longos, porque eu

achava que o aluno tinha que desenvolver a atenção, agora, achava abominável dar

uma questão longa numa prova pra nota, porque não havia necessidade. Mas

durante as aulas práticas, eu fazia exercícios bem longos, porque eu queria a

atenção dos alunos, porque a gente na vida real tem todas essas experiências.

Outra coisa também nas minhas aulas, não só práticas, mas em todas, é que eu

acho uma presunção de qualquer professor, de qualquer pessoa achar que está

ensinando, está desenvolvendo um aluno. Ele tem é que despertar no aluno o

interesse de realmente fazer o melhor por ele que é estudar, ler, se aperfeiçoar.

40 Um dos diretores do Colégio Estadual

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Claro que a gente tem que ensinar alguma coisa, mas se não despertar isto, é uma

tolice você pensar que em uma aula você vai desenvolver aqueles conhecimentos,

ainda mais matemática que eu reputo uma matéria facílima, que você entende, mas

não apreende, para aprender, você tem que fazer exercícios, tem que ter reflexões,

o que nem todo mundo faz, aí ela se torna difícil, agora ela é fácil na hora que ela é

exposta, porque ela é muito lógica. Então aquilo é banal, é fácil.

LP – É de fácil compreensão para todo mundo, na hora que ele vai fazer fica difícil.

MF – Fica difícil se não tiver a disciplina de exercício e tudo... por isso eu dava valor

de fazer mais prática e tudo. E quanto às aulas práticas na engenharia propriamente

dita, como eu disse, o meu curso foi muito teórico, os exercícios eram teóricos, e foi

muito diferente quando eu encontrei essa realidade, fui convidada para ser

assistente do Árabe e os exercícios tinham mais valor prático. Inclusive ele dava

questões em provas orais e dava pouca importância à definição correta, da parte

teórica correta... eram mais exercícios como chifróides, uma circunferência cujo raio

vai de zero a 1 e desenvolve exatamente o formato da metade de um chifre. Isto é

um exercício de integral tripla. E eu era obrigada a dar os exercícios que ele

marcava, não era uma coisa que dependia de mim e com relação ao objetivo que

você me falou antes e não disse até agora, que é a matemática para o curso de

mecânica. Eu estou aqui com o relatório de fevereiro de 1965, é a comissão de

implantação do curso de engenharia mecânica. Quanto à matemática era a mesma

pra todos os cursos. A Civil, aí vem a Mecânica, depois a Elétrica, ou qualquer outra,

sempre foi a mesma.

LP – Para engenharia era diferente da matemática ou não?

MF – Não. Mesma coisa. Eu tive uma idéia que para o curso de matemática para

formar professores as aulas práticas deveriam ser diferentes das aulas práticas de

engenharia. Foi uma coisa que ficou na minha idéia, mas nunca foi colocada em

realização.

LP – Em todo o período que você deu aula foi assim?

MF – Sempre foi assim, o mesmo tipo de exercício. E aqui estou com o relatório da

comissão.

LP – A senhora tem alguma avaliação?

MF – Tenho. Mas deixe-me citar aqui... [Leu o nome dos que assinaram a comissão.

Estão na foto]. Eu acho que o currículo era diferente do currículo de engenharia civil,

mas quanto à matemática era exatamente a mesma coisa. Para comprovar, eu

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tenho aqui a chamada de 1970, onde os nomes são colocados e não se sabe o

curso. Isto foi sempre assim, desde a instalação do curso de mecânica, até 1991,

quando eu saí.

LP – A senhora lecionou quais disciplinas

MF – Quando eu iniciei na escola Politécnica estadual, eu era assistente da cadeira

de Cálculo Diferencial e Integral, mas também era assistente da cadeira de Cálculo

Vetorial. E com isso eu lecionei pra o prof. Máximo Borgo. Ele foi meu aluno e foi

reitor depois. Fui professora de dois reitores, o Máximo Borgo41, que depois foi

diretor da Politécnica e eu a professora e depois o Abi-Zaid42. E agora eu gostaria

que a Maria Estela fosse reitora, mas inventaram o segundo mandato e o negócio foi

para o brejo. Mas eu tenho aqui nesta lista como eu te disse, não se sabe quem

freqüentava o quê. Tenho aqui as provas do professor Árabe, de 1970, que é uma

avaliação anterior às minhas como professora. Uma vez o Árabe foi para Goiás e eu

fiquei com a direção da cadeira, tanto com a parte teórica como prática. E depois

tudo mudou, quando houve uma mudança de disciplina em 1972, quando houve a

mudança pro Campus, que não foi a mudança da Politécnica, isso foi depois. Foi o

departamento de matemática da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, o único

departamento que mostrou como seria o departamento de matemática com a junção

de todos os departamentos de matemática das faculdades que constituíam a

faculdade estadual. Por exemplo, o curso de Belas Artes, o curso de engenharia, o

curso de matemática na FAFI, todos eles tinham um departamento de matemática.

Nesta época eu fui fazer um curso de pós-graduação no IMPA.

[Leu o texto de introdução do documento]: Departamento de matemática, Faculdade

de Filosofia, Ciências e Letras. Subsídio para a reestruturação do plano de ensino

do departamento de matemática. Então aqui estão listadas quais seriam as

disciplinas, condições gerais, os cursos, as disciplinas que seriam oferecidas, o

levantamento, inclusive a nomenclatura da disciplina e assinam o trabalho. [paro a

gravação para tirar fotos].

[Reinicio a gravação, falando sobre prática de sala de aula].

MF - Eu me lembro quando eu dava equações diferenciais, me apareceram alunos

que ficaram reprovados pela terceira ou quarta vez e no primeiro dia de aula eu

41 Máximo Borgo Filho, nomeado reitor em 1971.

42 José Antônio Saadi Abi-Zaid, nomeado reitor em 1983.

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disse a eles: - Vocês esqueçam isso, porque todos vão passar. Prestem atenção à

aula, freqüentem a aula que todos vão passar. Não vejo aqui ninguém com o olhinho

de quem não tem inteligência. Todos são olhares de pessoas inteligentes. Se eu

aprendi, vocês aprendem.

Aí eu dei uma prova e apareceram notas muito baixas. Aí eu falei: - Vou mostrar

para vocês os horrores que vocês cometeram nas provas. E fiz a primeira lista dos

horrores e dei nova prova e aconteceram novamente erros pavorosos, que intitulei

de horrorosos e fiz nova lista dos horrores e ficou destrato o que eu tinha trato [risos]

alguns iriam ficar reprovados. E essa era a maneira de eu me portar. Eu nunca

humilhei um aluno. Se eu via alguém colando eu tirava do lugar o que dava cola.

Nunca fiz estardalhaço, o aluno não pode ser humilhado. Se o aluno me permitia, eu

falava do vestuário, do cabelo, de tudo o que eu achava que tinha direito, eu falava.

Principalmente dos erros de português. Eu vi no domingo, o Faustão falar o Brasil

“reveu”. O verbo Ver... reveu ou reviu? [risos]

LP – Sou chata com isso também. Não gosto de erro de português.

MF – E eu também. Recordo-me agora da personalidade que me entrevista. Eu por

três vezes no curso de matemática, eu tenho trinta e um anos só na federal, fora o

Estadual, eu por três vezes pedi que me fizessem uma redação. É claro que não

gostaram. Eu me lembro que na sua turma você teve a petulância de perguntar se

poderia fazer a redação em francês. Eu disse: - Perfeitamente, eu leio, pode fazer.

[risos]. Só não me lembro qual foi o tema. Eu tenho algumas aqui.

LP – Naquela época eu estava empolgada com o francês. Eu estava estudando

empolgadíssima.

MF – Eu tenho de 88, esse tema aqui é o quê? [estava olhando a redação]

LP – Eu me lembro que era um tema atual da época.

MF – Esse aqui foi o seguinte: a Constituição... olha o que este escreve.. [ela lê a

redação, mas não vou transcrever a pedido da depoente]

MF – E eu não me repetia. Ah! Uma repetição que eu me recordo, comecei a contar

e não terminei, é no Estadual que tinha o Lincoln Bicalho, um aluno que fez até a

quarta série. E eu me lembro que eu me repetia. Lá na terceira, quarta série do

ginásio eu dava um exercício e falava: “- O Lincoln já percebeu!”, a palavra era

percebeu. E às vezes os alunos diziam: “- D. Myrtha, nem o Lincoln percebeu!”

[risos]. Depois eu citei isso num momento muito emocionado, numa reunião

pequena que o Vitor, o Governado Vitor Buaiz, estávamos reunidos lá e ele foi

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convidado pelos líderes políticos, e ele estava muito emocionado, então ele estava

lá, inclusive um ex-aluno meu, que foi meu aluno na engenharia, inclusive a filha foi

minha aluna e Hercilinho falava dos que alçam vôo, lá do colégio estadual e eu me

lembrei do Lincoln [a depoente se emociona], que foi para o Rio, foi para o D. Pedro

II, passou na Filosofia e no ITA, mas preferiu a Filosofia por causa da política e foi

morto em São Paulo. Ele não alçou vôo. E a menina dele é professora de

matemática. E eu me lembro, que o vocábulo que eu repetia é que o Lincoln

percebeu e eles me retribuíam, se a questão era muito difícil, “- D. Myrtha, nem o

Lincoln percebeu!”. E aí eu pergunto a você, como eram as aulas, D. Luana? Diga.

LP – Na minha motivação da época, meu curso de engenharia e o meu prazer pela

matemática, que sempre tive muito, até pela minha formação, eu gostava muito da

sua aula. A palavra que eu colocaria seria instigante, me levava a querer saber mais.

Era desafiador.

MF – Eu deixava em aberto. Eu acho que eu deixava claro que só chega lá se você

faz um esforço maior, não é? E a importância de ser cidadão, ter um papel de bem,

que não importava o conhecimento, isso eu repetia em todas as aulas, eu dizia que

engenheiro é uma vírgula. Fulano é brasileiro vírgula, casado vírgula, engenheiro

vírgula, e precisava outras qualidades para que se fizesse dele uma pessoa de bem.

Isso é muito importante. E numa época muito imprópria, às vezes o aluno eu sabia

que dentro de casa não tinha exemplo de mãe, nem de pai, nem de governo, que

era um esforço muito grande daqueles adolescentes, de procurar um caminho que

fosse não só de egoísmo, por seus próprios pés. E outras ocasiões também eu me

lembro que eu não gostaria de ter os meus alunos heróis como Jesus e Guevara,

que eu gostaria que eles fizessem o curso, formassem com um amigo e

reconhecessem os pais, que naquela ocasião eles não davam satisfação, nem se

iam voltar ou não, a que horas iriam voltar, que eles então já desenvolviam amor

pelos pais, amizade por um amigo, que eles não deveriam vender. Me lembro que

numa ocasião em que diziam que no futuro só teria emprego aqueles cujo pai

tivesse um escritório de engenharia ou muita sorte, qualquer coisa assim. Eu me

lembro que na caixa econômica, chegou um ex-aluno já formado e disse: “- D.

Myrtha, nunca vi o futuro chegar tão rápido.” [risos]... realmente estava difícil, porque

em tempos anteriores, um engenheiro era capaz de formar o lar dele, saber que ele

poderia ter a casa, o carro, dar assistência médica para a família... a situação atual

não é essa. Eu me recordo alguém aqui da rua de trás falando: “- Se não fosse

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muito esforço meu, eu não conseguiria dar à minha família os benefícios que eu

quero dar... um plano de saúde para a minha mãe, a casa própria para a minha

família, tudo isso é muito difícil...”. Estamos chegando numa época que faltarão os

engenheiros, vai ser uma época de ouro daqui para frente, por casa do

desenvolvimento. Mesmo assim o que vai faltar? Vai faltar competência desses

alunos, porque não tem professores à altura. Locais onde eles possam ser

guindados ao ensino, a um estudo melhor, a uma formação prioritária e melhor. Isso

é sempre com muito sacrifício, com muito custo. Em todo setor, já está havendo e

vai haver a dificuldade na formação. Não por culpa dos alunos, porque nesses anos

todos, foram trinta e um, aqueles primeiros alunos que vinham com uma educação

melhor, formação melhor, com desenho, que eu não precisava dar 0,05 pra formar

uma nota melhor, porque eu me recordo que ultimamente, que se colocassem um x,

um y, um z numa curva ou qualquer outra notação era 0,05. No entanto,

antigamente, era o desenho e eles tinham que fazer e acabou. Nem por isso os que

chegaram deixaram de pegar... todos eles responderam com muita presteza. Então

eu acho que o professor, a ele cabe um ensino melhor e pronto. Agora tem que dar

condição não é? Não são as escolas particulares pagam bem e ficam à mercê dos

alunos que pagam, que vão ter uma ambiente para um professor deste. Exigem...

precisa ter muito jogo de cintura para um professor se portar num educandário

particular, como ele se portaria num educandário público, onde há essa esperança.

E eu faço votos que as escolas públicas não venham cedendo, cedendo como essas

cotas... outra coisa de horror, as cotas... cota para negro, cota para aluno de escola

pública, não... quem for mais experiente, que tenha a melhor nota e faça melhor.

Teve um caso interessante. Nós abrimos o curso de matemática ali na FAFI, e

tivemos um aluno que fez o primeiro ano. No ano seguinte ele fez exame para

engenharia e passou em primeiro lugar e o bobalhão do diretor (não sei que era), dá

uma medalha. A medalha era nossa, não é? Ele fez todo um primeiro ano de

matemática e eu fiquei muito gratificada... essa medalha, eu comuniquei a todos os

professores e todos os alunos, é nossa. Aquele fulano tinha recebido a medalha e o

mérito era nosso. E me lembro de um aluno meu o Murillo Morgado Horta, que já

faleceu, ele achava um absurdo que eu dizia para eles fazerem no terceiro

científico. É preciso muito... para passar no vestibular... é coisa incrível. Mas eu acho

que é viável, estamos aqui, com muitas histórias, com uma menina que está lá no

passado, e que agora está fazendo uma dissertação.

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LP – Eu estou estudando a matemática no curso de engenharia, ao longo de todo o

curso, desde 1966 até 2006.

MF – Mas esta dissertação vai fazer parte de que curso seu?

LP – Mestrado em educação matemática.

MF – Pois é, é uma coisa importante, você se esforça em ir buscar lá no passado os

elementos que você acha interessante e que são válidos. Falando ainda sobre livros,

no Ginásio os livros que eu lia eram os romances e toda a biblioteca que o meu tio

Oswaldo tinha, porque no Colégio Estadual não havia livros. No científico havia a

apostila e havia livros. Eu me lembro que eu copiava as aulas e isso me bastou. E

no curso de matemática eu não tinha dinheiro para comprar bons livros, as minhas

notas nem sempre eram dez, porque as minhas respostas não eram acrescidas,

como a de outros alunos certos elementos que tiravam de livros que eu não

conseguia comprar. Eu estudava na Biblioteca Pública. Nesta ocasião eu morava

num quarto e fazia as lições na Casa do Estudante. O almoço, eu trabalhava até à

uma, eu só encontrava salsicha e ovo, a aula começava às três da tarde, pega

ônibus e bonde, os ônibus eram muito feios, até Reis. Não tinha como. Se o ensino

não fosse gratuito, eu provavelmente não teria feito o curso. Isto é muito importante.

Não com cotas, não é? Agora quanto à politização no Colégio Estadual, eu sempre

desenvolvia esse senso crítico, eu sempre instiguei os alunos a pensarem em ser

brasileiros, cidadãos e terem respeito pela coisa pública, enfim, por um crescimento

digno.

LP – Eu tenho um carinho enorme pela senhora. Agradeço imensamente por esta

entrevista... tem algo mais a acrescentar?

MF – Eu só quero que você tenha bons resultados, continue estudando, seja feliz,

esqueça a moto e o capacete, eu você preserve a sua vida... e chegue a um lugar

ao sol. Fico muito orgulhosa de alunos que não terminaram a engenharia mas

trilharam outros caminhos e tiveram êxito. Eu acho isso muito importante.

LP – Obrigada.

Wellington Ângelo L. Giacomin, Gerente Industrial da Aracruz Celulose, no dia

05/03/2007 na Aracruz Celulose, na sala do gerente.

LP – Wellington, fale um pouco sobre sua formação acadêmica.

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WG – Sou natural da cidade de Aracruz, estudei aqui até a oitava série em escola

púbica, em 1978 passei na escola técnica, técnico em mecânica até 1980, em 81

estagiei na Companhia Vale do Rio Doce, complementando o curso técnico da

escola técnica. Passei na UFES em Engenharia Mecânica, onde estudei de 82 a 86.

Durante o ano de 86,estagiei aqui na Aracruz com estágio de férias, estágio em

engenharia, e no dia 13/01/87, passei a ser funcionário da Aracruz onde estou até

hoje. Depois disso fiz curso de especialização em engenharia de qualidade na UFES

e fui professor de três turmas do curso de engenharia de qualidade e também do

curso de engenharia de manutenção, dando a cadeira “Materiais e Serviços” na

UFES. Fiz um MBA em Gestão Empresarial pelo IBMEC, durante o período de

trabalho na Aracruz. Na Aracruz trabalhei na área de materiais, com planejamento

de estoque, depois na área de suprimentos como um todo, e participei praticamente

de todos os projetos da empresa de implantação de novas unidades nos últimos

anos.

LP – Hoje em qual área você atua?

WG – Desde agosto de 2005, sou responsável pelas atividades industriais da

unidade da Barra do Riacho. Uma planta que produz duas mil e cem toneladas por

ano e este ano estamos com uma estimativa de produzir duas mil e duzentas

toneladas. São três unidades, uma de 1978, uma de 1992 e outra de 2002.

LP – Dentro da sua área de atuação, quais atividades desenvolve?

WG – Devo considerar a carreira profissional como um todo?

LP – Atualmente...

WG – Atualmente minha principal responsabilidade é a gestão da unidade, que inclui

toda a área de produção, manutenção, controle técnico, composto da parte

ambiental e de controle de qualidade da polpa.

LP – Que problemas você encontra nas suas atividades? Ou algo diferente que

tenha encontrado nas outras atividades...

WG – É uma mudança muito grande. Como tive a minha formação técnica em

Suprimentos, de 1987 até 2005. Ocorreu uma grande mudança de 2005 para cá já

que atualmente a área atuação tem uma atividade estritamente industrial. Na gestão

da Unidade temos que controlar a produção efetiva, então tem controle de custo,

gestão de qualidade, volume de produção, gestão de pessoas. O quadro de

empregados é de 495 pessoas. A grande dificuldade é a adaptação na nova função.

É um desafio e uma oportunidade de crescimento. É como se estivesse

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recomeçando minha carreira profissional na mesma empresa, o que é uma

vantagem muito grande, pois você conhece a estrutura e a cultura da companhia,

numa atividade totalmente diferente daquela que eu fazia até 2005.

LP – Que problemas específicos você encontra? O foco será a matemática, então

estou querendo conduzir o nosso pensamento nesta direção... para resolver os

problemas do dia a dia, que tipo de conhecimento é necessário? Utiliza a

matemática?

WG – Se fizermos uma leitura e voltarmos atrás no passado, tem uma diferença

muito grande. A importância da formação básica em engenharia na gestão é

representativa, pois trabalho muito mais na função de gestão, mas a base de

raciocínio utilizada é oriunda do aprendizado obtido na engenharia. A fábrica é

totalmente automatizada e para tomar uma decisão você precisa verificar se o

balanço de vapor-energia está correto, avaliar as alternativas e tendências, etc. Na

minha função, não faço o cálculo do balanço de energia ou do balanço de vapor. A

equipe faz isso. Mas tenho que ter o discernimento para saber se aquelas

informações têm profundidade, ter capacidade de questionar e verificar se não está

deixando de considerar algo, para poder tomar a decisão. Na realidade trabalhamos

em equipe e um conjunto de pessoas participa de uma decisão. A base da

engenharia dá a sustentação para esta análise e decisão. Então a aplicação direta

de conhecimentos matemáticos ou de engenharia não é muito grande, mas a base

de formação que eu tive é o que me permite agilidade na tomada de decisão. A

função é muito mais de análise de dados, avaliar um resultado e verificar se tem

lógica .

LP – E no passado...

WG – Se considerar que no passado eu trabalhava diretamente como técnico de

materiais, executando o planejamento de materiais, tinha a necessidade de usar

cálculo estatístico, levantando situação, verificando possibilidade de atendimento.

Tinha uma base estatística muito maior. Naquela época não tinha a velocidade que

os softwares nos dão hoje, mas trabalhávamos com SAS43, fazíamos análise

estatística e tomávamos a decisão baseado nisso. Hoje mudou muito. Você vai

evoluindo dentro da companhia e isso vai mudando. O próprio mundo industrial

mudou muito. Uma fábrica igual a nossa hoje é 100% automatizada, então a base

43 Linguagem de programação para Mainframe, utilizada nas décadas de 80/90.

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de definição de um operador, a base estatística está dentro da máquina. O operador

entra naquilo que é alarmado, naquilo que de alguma maneira, o modelo diz: “Saiu

do parâmetro normal, atua, porque tem que corrigir!” a base para chegar naquele

modelo matemático lá dentro e definir se dá o alarme ou não, foi feita por alguém,

antes do operador operar.

LP – Uma curiosidade... aqui na empresa tem alguma parte da manutenção que

vocês fazem o projeto ou vem tudo de fora?

WG – Não. A Aracruz trabalha desde 1992, com um conceito muito forte de

terceirização e 100% das nossas atividades de manutenção são terceirizadas. O

nosso quadro de manutenção hoje é composto de um gerente, dois coordenadores,

e sete assistentes. Este equipe gerencia as atividades das empresas terceirizadas

cujo quadro é de 543 pessoas na área de manutenção. No desenvolvimento de

projeto, mesmo quando falamos de projeto de grande porte, o conceito utilizado é de

contratar empresas de engenharia especializadas. O que o nosso grupo faz é

checagem de balanço, pequenos projetos, bem pequenos. Empresas de engenharia

prestam serviço para a Aracruz, na área de manutenção e de projetos de

engenharia.

LP – Vamos falar um pouquinho de matemática agora...Vou citar alguns conceitos

matemáticos e você me responde se lembra, se usa, se serve de base para tomada

de decisão ou não. Geometria Plana e Espacial.

WG – Fundamental quando você está tratando em um projeto, no caso de layout por

exemplo, na definição da melhor localização de uma linha de polpa ou de vapor. A

diferença é que você não executa mais o calculo, hoje com os modelos de

simulação, projetamos uma área, verificamos o layout existente com as coordenadas

e em cima disso definimos qual a melhor solução. O próprio sistema lhe permite

fazer isso, mas o conceito aprendido na faculdade existe dentro do modelo.

LP – um sistema local?

WG – Normalmente quem executa isto é uma empresa de engenharia. Nós temos

aqui dentro modelos matemáticos da nossa planta., que são adquiridos junto com a

compra uma planta nova. Se eu tivermos que fazer um projeto de melhoria de uma

área, conseguimos entrar num AutoCad ou num sistema desses de modelagem

matemática e instalar uma nova linha de tubulação.

LP – E a base disso é a Geometria.

WG – É. Tanto plana quanto espacial. As duas ficam nessa base.

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LP – Trigonometria.

WG – O conceito é mais ou menos o mesmo. Está relacionado. A base conceitual é

a mesma.

LP – Logaritmos

WG – Aí já muda o foco. Usamos logaritmo em séries histórico-estatísticas para

gerenciamento de parâmetros de qualidade bem como nas atividades de

manutenção elétrica. Quando um técnico da ABB, que é uma empresa terceira

nossa, está avaliando um desvio de um inversor de freqüência, por trás daquele

desvio tem a análise de uma série logarítmica que definia qual o diferencial de

potência. Esse tipo de coisa a gente usa calculando, mas não no papel. Quando eu

trabalhei com planejamento de estoque chegamos a fazer isso manualmente, mas

isso mudou muito.

LP – Loucura...

WG – É. O que eu acho relevante aí, é que, às vezes a garotada sai da faculdade,

ou então questiona muito por que tem que estudar isso. Isso fica cada vez mais

difícil de ser entendido, porque quando ele chega para trabalhar numa planta, ele

senta na frente do computador e tem tudo montado. Mas alguém precisou fazer

aquilo e precisou usar os conceitos básicos para fazer aquilo.

LP – Isso é um ponto importante na minha pesquisa. Quero saber se o que é

estudado lá precisa para eu entender, por exemplo, de termodinâmica...

WG – Eu lhe diria o seguinte: quem não souber nada, consegue operar. Ele

consegue trabalhar numa empresa hoje. O que vai mudar muito é como ele

interpreta o fato. Não posso garantir que ele vai ser um bom profissional. A minha

geração precisava bastante, a geração dos anos 90 precisa ainda ter essa base. Eu

não sei se a geração do meu filho vai precisar. A base é fundamental, mas não sei

se a forma como se ensina essa base deve ser a mesma que eu aprendi nos anos

80. Era uma forma exaustiva de estudar, de fazer exercício, de pegar um livro de

Cálculo III e calcular a derivada, integral do livro todo... pegar uma Física IV e

calcular derivada, integral, série histórica, série estatística... verificar isso tudo. Não

sei se vai ser necessário, porque essa garotada hoje tem uma base de informática

muito grande. Só que independente disso alguém vai precisar fazer. Cada vez mais

vão existir especialistas que tem a capacidade de fazer isso. Não dá para dissociar.

LP – Vamos parar para pensar...Se tem um programa no computador, alguém teve

que fazer. E quem vai fazer tem que ter uma base boa.

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WG – O que eu não sei dizer é se isso é uma função do engenheiro. A grande

diferença que eu vejo é, não sei se existirá uma engenharia especializada em

matemática ou alguma coisa assim, ou se todo mundo recebe toda a base e depois

só alguns vão usar. Eu acho que não pode cortar a base, porque a base ajuda a

melhorar o raciocínio. Atualmente existe uma grande discussão sobre porque a

maioria dos gestores são engenheiros e não administradores, já que a principal

função da gestão é administrar. Eu diria que a Aracruz é um bom exemplo disso.

Somos uma empresa de engenheiros. Se você olhar o corpo diretivo da companhia,

boa parcela dele é formada de engenheiros. Temos engenheiros na fábrica, em

projeto, em RH, finanças, enfim, uma base muito grande de engenharia. Então,

somos uma empresa de engenheiros. Isso por um lado é bom. Uma empresa tem

que perseguir o resultado o tempo todo pois custo é algo que tem que ser

acompanhado detalhadamente e isso é fundamental. Em contrapartida, essa base

de engenheiros não teve formação nenhum na área de humanas e isso dificulta a

capacidade individual de gestão desse grupo. Eu acho que a educação no Brasil tem

que mudar o foco “quadrado” de que o engenheiro não estuda elementos humanos e

o administrador não estuda conhecimentos matemáticos. Isto está errado. É isso

que tem que mudar. Não acho que seja simples, principalmente porque no caso das

universidades públicas, o quadro de professores não evolui na velocidade do

mercado. É um quadro antigo, estagnado, que não está vivendo o que o mercado

impulsionou, o quero dizer é que existem professores que estão dando aula na

faculdade igual a que tive há vinte anos atrás. Acho que esse conflito é que vai

definir como é que esse país vai ser no futuro. Não concordo muito com a filosofia

americana de que você não precisa estudar determinadas coisas para ser alguém,

mas também acho que a gente não pode continuar estudando coisas do passado

sem evoluir, a gente tem que dar uma mexida nisso.

LP – Só queria citar mais um que considero fundamental: probabilidade e estatística.

WG – Todo dia o dia todo... as decisões...

LP – O que você viu lá foi suficiente ou você teve que estudar mais?

WG – A base inicial para quem entra, na minha época era o suficiente. Hoje isto

mudou em função da informática. Quando eu estudei na engenharia na UFES, nós

tínhamos um IBM, e trabalhávamos com cartão perfurado. Na época era minha vida.

Cálculo Numérico foi feito na base do cartão perfurado, só que isso mudou. Não é

que a base foi ruim, mas o mundo mudou e eu tive que me adequar. Não podemos

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cobrar ou botar a culpa naquilo que tivemos a oportunidade de aprendizado. Acho

que isso não valia para os meus vinte anos atrás, nem vale para quem está

estudando hoje. Você nunca vai ter capacidade de aprender numa faculdade tudo

aquilo que é necessário para “tocar” a sua vida profissional.

LP – Mesmo porque o mercado é muito amplo. Podemos ser engenheiros

mecânicos e trabalharmos em empresas diferentes que requerem conhecimentos

totalmente diferentes.

WG – Uma área é totalmente diferente da outra. Vamos pegar um caso específico

aqui nosso. Tem uma área de engenharia e uma área de produção de celulose.

Temos engenheiros nos dois quadros. São demandas diferentes para cada um. O

principal aprendizado que fica foi o que me deixou um professor da própria

universidade: “Você não deve sair da faculdade com a visão de que sabe tudo, tem

que sair sabendo onde pesquisar e quem são as pessoas ou os livros, ou material

que podem lhe servir de referência para quando você tiver dúvida. O aprendizado é

contínuo.” Se acompanharmos um garoto que sai da faculdade hoje, daqui a cinco

anos o que ele aprendeu não serve para nada. Imagina para quem está no mercado

profissional há trinta, quarenta anos. Se você não “re-estudou”, reaprendeu, re-

valorizou-se nos últimos dez, vinte anos, você está estagnado...

LP – Acho que em três, cinco anos...

WG – Cinco anos já mudou...

LP – E aqui na Aracruz , a empresa disponibiliza essa evolução ou você que tem

que perseguir?

WG – Nós temos uma característica bastante interessante. A empresa privilegia o

auto-desenvolvimento e dá suporte para aquelas competências que são necessárias

e padrões para todo mundo. Se estamos precisando alavancar competências

gerenciais, desenvolvemos programas tipo PDGA(Programa de Desenvolvimento

Gestão Aracruz). Já tivemos programas de gerenciamento com a Fundação Getúlio

Vargas, com a Fundação Dom Cabral. Mas suponha que você seja um engenheiro

de manutenção e precise se especializar numa análise de falhas de uma máquina e

para isso chega a conclusão que necessita de um aprendizado específico de

estatística. Se na avaliação da empresa isto for importante voce fará este

treinamento. O que a empresa não faz, é fazer por fazer. Ninguém vai dar

treinamento porque a moda está dizendo que tem que fazer treinamento. É sempre

focado dentro das necessidades.

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LP – E como você falou em auto-desenvolvimento...

WG – Se o profissional acha que está com essa deficiência, ele tem que procurar. A

empresa tem um programa de avaliação que é feita a qualquer momento, mas uma

vez por ano é feita formalmente, onde o gestor passa um “feedback” para o

funcionário e mostra para ele os pontos de oportunidades de melhoria e baseado

nos resultados desse programa é definido o nosso programa de treinamento, que

pode ser compartilhado para todos os membros da companhia ou pode ser

individualizado.

LP – Tem algum conhecimento matemático que não foi ensinado e que fez falta para

você?

WG – Teve, mas foi em função do tempo. Cinco, dez anos depois, a análise de

séries temporais passaram a ser muito mais relevantes na atividade que eu

desenvolvia, e eu não tinha aprendido isso com profundidade lá atrás.

LP – Algo que aprendeu e que não serviu para nada?

WG – Difícil de falar...

LP – Vou citar alguns: vetores no plano e no espaço, derivadas ordinárias,

direcionais, simples, integrais...

WG – Eu nunca trabalhei com integral e derivada. Eu tenho plena consciência que

muitas das atividades que são feitas por determinados equipamentos são baseadas

no conhecimento matemático dessas funções. Eu não usei, não me serviu para

nada, mas sei que é usado o dia todo. Se eu fosse um engenheiro elétrico em

determinada atividade, provavelmente teria usado. Se eu estivesse hoje trabalhando

numa empresa de engenharia como a ABB ou numa Siemens, estaria usando.

Por isso que não dá para dizer que esse conhecimento não serve para nada. Ele

pode não ser aplicado, mas no mínimo serviu para minha formação, para a

preparação do desenvolvimento do raciocínio lógico. A grande sacada é...aquela

fase inicial dos primeiros anos da engenharia que são difíceis de levar,

principalmente num caso igual ao meu que vinha de uma formação de técnico em

mecânica e já tinha vivido a parte prática todinha, permitiu o desenvolvimento do

raciocínio e analise.

LP – Já houve uma mudança de currículo na UFES e aproximaram as disciplinas

técnicas das de matemática.

WG – Isso é fundamental, porque na minha época era muito longe.

LP – Algo mais a acrescentar? Pensando nas tendências...

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WG – Acho que a primeira coisa que temos que pensar para a formação acadêmica

é... de alguma maneira, na fase inicial, usar exemplos que tenham vínculo com

alguma coisa que vai ser estudada lá na frente. Ou seja, preparar a cadeira básica...

não com aqueles exemplos básicos de... calcula essa derivada, calcula essa

integral... mas com exemplos que estejam vinculados com motor elétrico, com um

inversor...

LP – Mesmo que sejam em linhas diferentes, pois tem gente da elétrica...

WG – Exatamente... mas o cara tem que saber que aquilo ali tem uma correlação.

Isso é uma coisa que tem que ser pensada e para isso as pessoas têm que viver os

problemas... os professores têm que viver as indústrias. Eles não podem ficar

fechados dentro da academia. E outra coisa é como encaixar a nova informática,

dessa garotada que vai estar chegando, neste novo modelo. Porque, não tenha

dúvida... a garotada que vai chegar na faculdade daqui a cinco anos, vai entrar em

desespero se pegar um curso de engenharia nos padrões antigos....

LP – Como a gente pegou...

WG – Acho que nem como a gente pegou...como a gente pegou eles vão abandonar

a profissão, não vão fazer...mas sem uma visão integrada de computador. Eu não

consigo imaginar um aluno fazendo um curso hoje numa faculdade sem ter um

computador para ele trabalhar. Esses garotos hoje brincam com o computador como

a gente brincava de carrinho. E voltar com esse cara para uma prancheta para ele

fazer um desenho na mão, vai matar o cara. Nós vamos perder a capacidade de

gerar engenheiros porque eles vão ser frustrados. Não interessa achar que vai

mudar isso só quando o cara entrar nas matérias técnicas. Tem que mudar na base,

senão você perde. É mais ou menos o que a medicina fez. Hoje o cara que faz

medicina já entra direto numa anatomia com cadáveres, ele já entra num posto de

ambulatório para ver como é feita uma análise de amostra de sangue, ele já faz uma

aula experimental no pronto-socorro... com isso vai “caindo a ficha”. E a engenharia

não evoluiu, o quadro da engenharia continua o mesmo. Acho que essa é a grande

mudança que tem que ter. A outra é: para você ser engenheiro, você precisa de

alguma maneira ser formado em aspectos de gestão. Não dá para fazer o curso,

achando que você vai aprender gestão na fábrica, porque não vai aprender e vai ser

muito difícil, você vai ter muita dificuldade. Nós sofremos muito, porque saímos sem

nenhum tipo de aprendizagem.

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LP- Os próprios engenheiros que não estão em cargos como o seu, também

precisam, porque estarão lidando com os técnicos.

WG – Não tem jeito...eu diria que relacionamento é algo que não dá pra dizer: não

sei mais, é mandatário em qualquer profissão. Relacionamento hoje é mais de

cinqüenta por cento das nossa atividades. Os gênios, não têm espaço em empresas,

os espaços são extremamente restritos para quem não sabe se relacionar. Você até

aprende a parte técnica numa empresa, mas se não tiver capacidade de

relacionamento... você não vai aprender nada... nem vai para a frente.

LP – Obrigada.

WG – Resolvido?

Entrevista com a Profª Lígia Arantes Sad, professora de Matemática da Universidade

Federal do Espírito Santo, no dia 21/09/2007.

LP – Professora Lígia, fale um pouco sobre sua formação acadêmica.

LS – Bom Dia Luana, é um prazer estar falando para você sobre o trabalho aqui na

universidade. A minha formação acadêmica começou aqui na UFES na graduação,

depois eu fiz um pedaço em Brasília, depois eu retornei e fiz uma pós-graduação em

matemática pura, que foi em convênio com o INPA, onde fiz uma monografia sobre a

teoria da curva de Jordan, com o professor Valdecy Santos Daher do departamento

de matemática. E depois disso, como eu era casada, não podia sair facilmente para

fazer pós-graduação, eu fiquei no departamento até o ano de 1993, quando já

buscava mesmo uma pós, um mestrado e em 93/2, eu saí e fui para a UNESP, a

convite de um professor, o Rômulo Lins para ver se eu me adaptava ao sistema lá

de pós-graduação. Fiz um semestre como aluno especial e ingressei no segundo

semestre no doutorado diretamente por causa do meu memorial, eles viram que eu

teria condições de fazer direto o doutorado em Educação Matemática. Foi lá que eu

terminei em 1999. Eu comecei na realidade o curso em 1994. Entrei, fiz a prova de

ingresso, fiz a prova de língua... entrei em 1994 e em 1999 eu terminei. Eu já voltei

em 1998 para cá porque terminou o meu afastamento aqui da UFES e eu retornei

dando aulas e terminando a minha tese. Minha tese é de ensino e aprendizagem de

cálculo e justamente por causa da minha vivência aqui na UFES durante anos e

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anos, lecionando não só Cálculo I, mas Cálculo de todos os níveis e outras

disciplinas mais. Então essa é minha formação.

LP – Quais são as disciplinas que você lecionava?

LS – Cálculo I até o IV. Cálculo Numérico não. Era o único que eu não dava porque

tinha um grupo especial no departamento que ministrava esta disciplina. Também

Álgebra Linear, Geometria Analítica, outras disciplinas também que eram referentes

não só ao Departamento de Matemática, mas de Engenharia, Arquitetura,

Economia, Administração, etc.

LP – Essa seria a outra pergunta. No departamento de matemática, você lecionava

não só para alunos da matemática...

LS – Não. Desde janeiro de 1977, eu já dava aula em outros cursos também, porque

a matemática é um departamento que serve a muitos outros cursos.

LP – Havia alguma turma especial para Engenharia? Ou dentro da sua turma de

Cálculo você tinha engenheiros, arquitetos, matemáticos, administradores...

LS – Quando eu estudei era misturado ainda. Foi no início de 1970, mas quando eu

comecei a dar aula, já estava aqui no Campus, a partir de 1977, e já eram

separados os cursos.

LP – Então quem fazia engenharia, fazia um tipo de aula, quem fazia administração,

por exemplo, era outra matemática. Essa diferença tinha algum reflexo na prática?

LS – Tinha sim, porque nós procurávamos nas aplicações dirigir um pouco mais.

Não era ainda tão voltado especificamente para cada curso como é agora, depois de

1990 para cá. Mas havia alguma diferença, principalmente quando nós

conversávamos em encontros de professores, porque essa disciplina tinha muitas

turmas, Cálculo I, por exemplo, tinha mais de 10 (dez) turmas, então nós fazíamos

uma certa divisão.

LP – Na sua disciplina você fazia uso de algum livro-texto ou você sugeria leituras?

LS – Desde 1976 nós tínhamos livro-texto. Nós sempre adotávamos livro-texto, eu

trouxe até alguns documentos aqui que mostram isso. Sim, eu lembro, era o Thomas

& Finney (Cálculo Diferencial e Integral), foi o primeiro que nós adotamos. Depois foi

o Swokowski (Cálculo com Geometria Analítica) durante muito tempo, depois nós

tivemos um pouco do Stewart (Cálculo). Então nós tínhamos livros-texto, embora

traduzidos.

LP – Você tem alguma idéia se a origem desses livros era preferencialmente

alemães, ingleses, franceses... como eram analisados?

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LS – Eram livros que vinham sendo adotados em outras universidades. E como o

pessoal daqui estava em contato com o pessoal do Rio, de São Paulo, traziam. E

chegava através também das editoras principalmente FTD, Mac Graw Hill.

LP – Isso a partir de 1990?

LS – Não. Isso já nos anos 80. Em 70, já por indicação de algumas universidades.

LP – Nós tivemos acesso a uma lista de cerca de 100 (cem) livros que foram

sugeridos para serem comprados para a engenharia mecânica, relacionados à

matemática. E desses livros, encontrei praticamente todos na biblioteca. Você pode

dar uma olhada na lista e marque se foi utilizado algum ou se compraram por

comprar.

[Lígia olhou a lista e marcou alguns]

LS – Esse livro aqui do Mauer (Curso de cálculo diferencial e integral), tinha na

biblioteca, mas não era muito usado. Não sei porque a engenharia comprou esse

aqui. Não usava, nem como referência. Do Pablo Merino (Curso de calculo

diferencial e Curso de calculo integral) sim, mas era um livro muito antigo. Foi da

época que eu estudei, que a matemática era junto com os outros cursos.

O livro do Ayres sim, inclusive ele foi adotado na época em que eu estudei, no

começo dos anos 70 como referência para Cálculo.

LP – Inclusive tem vários exemplares na biblioteca.

LS – Tinha na biblioteca, os alunos usavam. Gozado, tem matemática para

engenharia....e era um livro usado.

LP – Também achei interessante.

LS – Era a nível de segundo grau, mas os alunos faziam muita consulta, os que

vinham com deficiência, com alguma falha.

LP – Veja que interessante. Achei alguns direcionados para engenharia, mas acho

que era mais para consulta, não?

LS – Sim.

LP – Esse Caraça(Cálculo Vetorial) nós tínhamos mas era para consulta, nunca foi

adotado. Courant (Cálculo diferencial e integral) era um livro de referência, mas nós

não o adotávamos, porque era um livro muito caro.

LP – E tem um número grande de exemplares na biblioteca. Seis exemplares. São

poucos livros que tem seis exemplares na biblioteca.

LS – E ele é um livro que vinha só em Inglês. Não tinha acesso ao Courant como a

gente tem agora traduzido.

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LP – Esse é um dado interessante. Foram comprados todos os sugeridos, mas nem

todos foram usados. Da lista do CT, vi que quase 100% dos livros foram comprados.

Mas a lista não é do departamento de matemática. Fale para mim agora um pouco

sobre sua prática de sala de aula. Quero saber sobre metodologia.

LS – De que época?

LP – Quando você deu aula aqui na UFES?

LS – No final da década de 70 e na década de 80 também, quando eu comecei a dar

aula, era muito espelhado naquilo que os meus professores tinham feito. Era uma

metodologia como a gente chama do tipo “cuspe e giz”, em que nós tínhamos salas -

principalmente da engenharia - muito cheias, com 45 (quarenta e cinco) a 50

(cinqüenta) alunos, e nós tínhamos esta metodologia de passar no quadro toda a

teoria, todos os exercícios, e os alunos estarem ali junto, trabalhando, embora eu

prezasse muito atividades feitas em grupo. Isso começou já na década de 90, um

pouco, quando eu me dediquei, principalmente quando eu voltei do doutorado, que

eu já tinha aquelas técnicas mais ligadas à parte da didática e os alunos faziam mais

atividades em grupo. Mas no final da década de 70 e década de 80, eram mesmo

aulas mais expositivas, com perguntas sempre dos alunos, nunca deixei de dar voz

ao aluno, ele podia perguntar quando quisesse, tinha toda a abertura para isso.

Interrompia a aula. Estou falando isso, porque muitos professores nem isso

admitiam.

LP – É. Eu ia perguntar a questão da disciplina. Tenho alguns indícios que na

década de 70, essa questão da disciplina era muito forte. O aluno não podia falar,

levantar-se, não podia uma porção de coisas.

LS – Tínhamos muito rígido essa questão de horário. Alguns professores até

fechavam a porta para o aluno não entrar fora de hora. Mas eu não, não cheguei a

fazer nada disso e nem essa questão do aluno não poder falar. Podia falar, levantar,

perguntar...

LP – E as avaliações?

LS – As avaliações eram pautadas em testes e provas. No início nós dávamos

4(quatro) provas. Na década de 80, nós introduzimos os testes, então, diminuíamos

a quantidade de prova e colocávamos os testes. Os testes eram para serem feitos,

em vez de em duas horas, em uma hora. Uma coisa mais rápida, mais localizada em

termos de conteúdo também. E as provas de um modo mais abrangente. E nós

tínhamos também lista de exercícios. Só que essas listas de exercícios não tinham

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uma nota direta para o aluno. Era mais no sentido de apoio ao aluno, para que eles

revissem a matéria para a prova. E nós procurávamos colocar algum exercício da

lista ou mesmo parecido na prova para beneficiar aqueles que se debruçavam na

lista de exercícios. Era basicamente uma avaliação do lado somativo em cima das

provas. Do lado da avaliação de um modo geral, eu olhava aqueles alunos que

estavam sempre presentes, os que participavam mais, e aí estar aferindo isso

também na hora de avaliar.

LP – Você não pensava só no exame... a prova reprova...olhava o aluno. O que é

difícil numa turma grande.

LS – Com certeza. Inclusive nas turmas depois de 1990, que já eram feitas

atividades em grupo, era muito comum eu pegar alguns alunos melhores, digamos

assim, mais desenvolvidos, e eles tornavam-se monitores dos outros. Essa era uma

metodologia que nem sempre era bem vista por outros professores, mas que

funcionava.

LP – E com relação ao currículo de matemática para a engenharia, você participou

de alguma modificação desse currículo? Interessa também o que motivou essa

modificação.

LS – Você fala a matemática na engenharia?

LP – Sim.

LS – A primeira modificação que eu senti lá foi essa questão do trabalho em equipe.

Porque como a gente tinha a equipe de cálculo no final dos anos 70(setenta), ficava

um pouco engessado a gente estar olhando a especificidade de cada curso. Então,

por mais que a gente quisesse fazer uma coisa mais voltada para aquele curso,

como todos deveriam ter o mesmo tipo de avaliação e aí fazíamos aquelas

avaliações em conjunto, isso amarrava em termos do conteúdo. A primeira vez que

nós sentamos no colegiado do departamento para fazer uma modificação para esse

curso de Cálculo, de Geometria Analítica principalmente e de Álgebra Linear, que

havia muitas turmas, foi no sentido de não ter mais esta equipe funcionando assim,

mas por curso. Então, quem dava aula para Engenharia Mecânica, Engenharia Civil,

tinha uma equipe. Quem dava aula para a Engenharia Elétrica tinha outra equipe.

LP – Quando foi isso?

LS – No final dos anos 80. Foi quando teve também reforma no colegiado de

matemática. E de lá para cá, houve maior espaço pro professor estar se

movimentando em relação a olhar para o curso e saber o que o colegiado também

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queria em relação ao curso. Quanto às mudanças que os cursos pediam, nas

disciplinas de matemática eram mais no sentido de ter vaga sempre, não colocar

professor que não fosse efetivo – porque começaram a aparecer substitutos - e

eram chamados para opinar no colegiado, lá junto com eles nas questões internas

de divisão das disciplinas. Teve época que Cálculo I, pegava desde a parte de

derivada até o final todo de integração, num curso mais longo, porque eram 90

(noventa) horas, depois passou a ser 75(setenta e cinco). Então houveram

mudanças de carga horária que indicavam também mudanças de conteúdo. O

representante do colegiado de matemática na engenharia participava. Teve umas

três modificações, pelo menos, que eu me lembre de 80 até 90. E essas

modificações eram por isso. Porque os cursos sofriam modificações na sua grade

curricular como um todo e as disciplinas tinham que se adaptar.

LP – E na época que você estudou isso não existia, não é? No final da década de

60, início da década de 70.

LS – Na década de 70 não era assim. As disciplinas eram anuais e elas eram em

conjunto. Nós tivemos disciplinas de matemática na década de 80 que eram juntas,

mas era assim: do curso de matemática com o curso de física, ou duas turmas da

engenharia. Era possível um aluno da engenharia civil fazer junto com um da

engenharia mecânica, mas era o máximo. Já era periódico, semestral.

LP – Foi com a Lei 5520 de 1968.

LS – Em 1970 ainda era anual.

LP – Acho que foi implementado em 1972...

LS – De 1972 para 1973 é que passou a ser semestral.

LP – Algo mais que você queira acrescentar?

LS – Talvez na questão da Álgebra Linear.

LP – Isso é uma coisa que me interessa. Eu comecei minha pesquisa desde o

século XVI, para conteúdo, apesar de não estar no meu período delimitado. Notei

que naquela época existia Álgebra, não era Linear. Existia Álgebra no currículo da

Engenharia, quando surgiram os cursos de engenharia no Brasil. E quando eu

verifiquei o primeiro currículo de engenharia da UFES, vi isso. Aí fiquei com essa

lacuna. Não consegui preencher. Por que saiu a Álgebra. Depois veio a Álgebra,

veio a Álgebra Linear, então, por que houve essa mudança? Não consegui descobrir

ainda.

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LS – Sabe aquele livro do Pablo & Meryno, que falei que é antigo? A escola de

engenharia ainda tinha aulas por ele. Meu cunhado que estudava engenharia e

matemática, tinha aula lá e suavam o livro. Eu lembro que os meninos falavam. Aula

com Árabe Filho, para dar conta desse livro, justamente porque ele tinha um

enfoque bastante vetorial. Então o Cálculo, abrangia um Cálculo Vetorial. E aí,

quando chegava na análise, era análise vetorial, e análise algébrica, era separado. E

aí, quando veio a questão da Álgebra Linear, ela veio tomar uma parte da Geometria

Analítica, com ênfase vetorial. E o Cálculo Vetorial praticamente – não desapareceu,

mas - tomou uma outra ênfase, através de limites e epsons e deltas. Uma ênfase

menos vetorial. Essa parte ficou com a Geometria Analítica e Álgebra Linear. E a

Álgebra Linear começou a se destacar forte a partir dos anos 70, quando eu

comecei a dar aula ela já existia como disciplina, em 77, já existia até Álgebra

Multilinear, em 82.

LP – E o que você acha que isso trouxe de impacto, o que melhorou?

LS – Eu acho que melhorou inclusive para a engenharia, em termos de ser mais

específico, porque antes, ficava meio misturado e escondido no meio do Cálculo.

Agora não, você tinha uma liberdade de estar trabalhando com vetores, depois com

as transformações lineares, que vieram ajudar noutras partes da engenharia.

Principalmente para a engenharia elétrica. Do currículo de mecânica não sei muito

bem, mas acho que também tem disciplinas que dependem.

LP – Acho que sim, porque tem muito modelo. Eles pegam uma situação física,

geram um modelo matemático, resolvem a situação e pegam essa resolução e

aplicam na parte física novamente.

LS – Eu acho que sim. A parte de transformações, auto-valores, auto-vetores para a

Álgebra Linear e que antes não aparecia no Cálculo.

LP – Era tudo feito lá.

LS – Era feito lá, mas não tudo. Essa parte, por exemplo, das transformações já é

nova. Não aparecia no Cálculo Vetorial.

LP – Muito obrigada pela entrevista...

LS – De nada.

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Entrevista piloto com o Prof. Vladimir Ivanovitch Dynnikov, professor do Centro

Tecnológico da UFES, ocorrida no dia 26/02/07 em sua sala no Centro Tecnológico

da UFES às 14:30h, com duração de 01:10h.

Possui graduação em Engenharia Eletromecânica p/Sistemas de Controle pela

Escola Técnica Superior Estatal Bauman em Moscou (1973), doutorado em

Automação Industrial e Robótica (1986) e Livre Docência em Mecatrônica (1993)

pela Universidade Tecnológica Estatal em Moscou Stankin, pós-doutorado em

Sistemas Ressonantes pelo Instituto de Automática Industrial em Madri (2005).

Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal do Espírito Santo. Tem

experiência na área de Automação e Engenharia Biomédica, com ênfase em

Tecnologia de Próteses, atuando principalmente nos seguintes temas: construção de

próteses, sensoreamento, controle, materiais e atuadores.

Formação Acadêmica:

1993 - Livre-docência: Universidade Tecnológica Estatal Em Moscou Stankin,

STANKIN, Rússia.

Título: Desenvolvimento das Ferramentas educacionais para o Planejamento e

Controle Operacional do Sistema de transporte robotizado num Sistema de

Manufatura Flexivel de producao metal-mecanica,

1987 - Doutorado em Automação Industrial e Robótica. Universidade Tecnológica

Estatal Em Moscou Stankin, STANKIN, Rússia.

Título: Desenvolvimento das Ferramentas Matemáticas para Controle Operacional

de Funcionamento de um Grupo de Robôs Móveis de transporte de um

Sistema de Manufatura Flexível.

1973 - Graduação em Engenharia Eletro Mecânica p/Sistemas de Controle. Escola

Técnica Superior Estatal Bauman Em Moscou, MVTU BAUMAN, Rússia.

LS – O sr. poderia falar um pouco sobre sua formação acadêmica?

VD – Sou engenheiro eletromecânico pela Universidade Tecnológica, chama-se

Bauman, antigamente o nome foi Escola Técnica Superior, localizada em Moscou, lá

na Rússia. Isso foi num período bastante remoto, de 67 a 73 e naquela ocasião a

gente tinha formação tanto na parte elétrica como na parte mecânica. Com tudo

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estava incluído quase sete mil horas de aula. Nesse sentido como se fosse o estudo

básico, que serve tanto para a elétrica quanto para a mecânica, e a partir daí, o

estudo já profissional, também tanto para a parte elétrica quanto para a mecânica.

LP- Naquela época os cursos não eram separados, não existia curso só de

mecânica era elétrica junto.

VD – Não, exatamente.

LP – Era de elétrica junto?

VD- Não, tinha cursos separados por perfil. Como eu estudava num país de

planejamento, e tudo estava vinculado com o desenvolvimento do país... um plano

para cinco anos, e para cada cinco anos o governo programava, bom, eu preciso

construir tantos novos empregos, então, nessa empresa eu vou precisar de tantos

engenheiros com esse perfil, então, nosso estudo foi financiado pelo governo, tanto

que inicialmente ganhamos bolsa... Nós tivemos na época hum!, acho que um terço

de um salário do engenheiro.

[pequeno trecho ininteligível, foi falado muito baixo] acho, dava para se virar...

LP – Era suficiente para viver.

VD – Era suficiente para comida, para as primeiras necessidades era suficiente. Não

dava para comprar muitas coisas, mas transporte alimentação. Devido a esse

vínculo com planejamento, nós tivemos que trabalhar durante três anos, depois de

nossa formatura, numa empresa indicada pelo governo. Você não podia largar e ir

para outra não. Tudo foi programado.

LP – E depois desse curso, certamente fez alguns outros cursos de extensão,

especialização...

VD – Não exatamente. Como a estrutura do nosso curso é diferente, ela incluía as

especializações (pela carga horária), vários dos meus colegas que trabalham...

colegas da época, conseguem aprovar os seus cursos como mestrado, com diploma

de mestrado no Brasil.

LP – Então aqui no Brasil esse curso que é feito lá já tem o reconhecimento a nível

de mestrado.

VD – Pelo menos várias pessoas fizeram isso. O mais complicado é o diploma de

engenheiro, devido à exigência de programas. Mas programa a gente não acha

daquela época. Não tem mais arquivo... tem prazo. Não usou, aquele arquivo,

depois realmente não é possível. E é uma universidade muito grande. Hoje tem

dezoito mil estudantes e três mil professores. É uma universidade de engenheiros.

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Dentro dessa universidade tem várias faculdades. Por exemplo no nosso caso foi

faculdade de engenharia de máquinas. Na faculdade de engenharia de máquinas foi

projeto de sistemas de engenharia de mísseis, então esse foi um nome genérico:

máquinas. Departamento lá é equivalente ao colegiado, o colegiado gera o próprio

curso. Nossa faculdade tinha nove departamentos, então significa nove cursos

incorporados só nessa faculdade.

LP – OK. E como profissional, o Sr. atuou aqueles três anos, e como foi sua

passagem para professor....

VD – Sim, aqueles três anos... mais mais do que três anos, na verdade três anos

obrigatórios. Mas eu comecei como engenheiro no Instituto Central de Pesquisa de

Engenharia de máquinas de precisão. Não tem nada a ver com a realidade, tudo que

era segredo do estado agora está na internet. Na época você não podia divulgar,

não podia comentar nada. Agora você entra na internet e pega o perfil. O perfil foi

exatamente projeto de armamento: de fuzis, de canhões, etc.

LP – Naquela época estava bem pós-guerra, estava toda uma situação política...

VD – [interrompe] Não, era época de guerra fria, então tudo foi segredo de estado.

Eu trabalhei lá bastante tempo, oito anos, e depois eu pedi transferência dentro da

mesma estrutura, da indústria bélica, para outra instituição localizada em outro lugar

e trabalhei mais um ano. Desde 82, eu resolvi sair da indústria bélica. Não estava

mais interessado neste assunto, e, mesmo perdendo salário, (eles pagavam bem),

eu saí para trabalhar numa empresa de automação de siderúrgica, como CST, Vale

do Rio Doce. Tem várias empresas espalhadas na Rússia e a necessidade de

empregados era muito grande. Nós acompanhávamos esses processos siderúrgicos

em vários locais do país. Lá eu comecei a trabalhar em 82 e, no mesmo ano, meu

professor ainda da época da faculdade (da graduação), me convidou para começar

o curso de doutorado. Doutorado sem dedicação exclusiva. Então, eu continuava

trabalhando nesta empresa de automação siderúrgica e em paralelo comecei a

estudar. O curso chamava-se robótica industrial, dentro de automação industrial.

Quando eu estava bem no final do doutorado, isso já foi em 86, surgiu a proposta

para fazer concurso como professor assistente.

LP – Para a universidade de Moscou?

VD – O nome universidade surgiu depois. Isso já é coisa mais recente. Como foi

dito, eu estudei, Escola Técnica superior Bauman, que agora se chama

Universidade . E essa universidade onde eu fui trabalhar com os meus colegas

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chamava-se Instituto de Máquinas e Ferramentas. Comecei a trabalhar como

professor, desde 86. Então de 73 até 86, treze anos, um pouco mais de treze anos,

eu trabalhei como engenheiro. Não segui todas aquelas etapas de carreira:

engenheiro, engenheiro sênior, engenheiro líder, chefe de grupo de projeto. Depois

comecei tudo de novo: professor assistente, professor adjunto, livre docente.

Lecionei até 93, quando recebi o convite do CNPq para trabalhar aqui no Brasil.

LP – Aí você fez as malas e veio.

[risos]

VD – Que! Na verdade não, não tive muitas malas porque foram permitidos os vinte

quilos de bagagem. Quatorze quilos foram livros e o resto, objetos pessoais.

[risos e comentários entre risos]

LP – O resto pode comprar aqui...

[risos e comentários entre risos]

LP – E como professor atualmente, o Sr. atua na formação de professores e

engenheiros. Também na Engenharia Mecânica?

VD – Sim, eu trabalhei aqui também na elétrica. Quando fui convidado como

professor visitante, isso foi de 95 a 99, aceitei o convite do departamento de

engenharia elétrica. O acordo inicial foi para dois anos, renováveis para mais dois

anos. No final eu trabalhei quatro anos dando aulas na engenharia elétrica. Depois

surgiu essa vaga no Departamento de Engenharia Mecânica. Na época tinha greve,

então não tinha intervalo entre períodos letivos. Então aconteceu que dando aula na

sexta-feira, por exemplo, Circuitos Elétricos I, já na segunda comecei a lecionar os

Processos de Usinagem [entre risos]. Coisas completamente distintas. Mas isso

ajuda... da formação, aquela formação.

LP – E atualmente quais atividades o Sr. desenvolve nessa formação de

engenheiros?

VD – Eu trabalhei nessa área de processos de fabricação, em particular processos

de usinagem, inclusive a gente conseguiu desenvolver uma pesquisa aplicada com

um dos meus alunos do mestrado. Ele terminou a dissertação exatamente ligada

nesta área. A ênfase dada na formação da época era Engenharia de Sistemas de

Controle. Chamava-se Engenheiro Eletromecânico, ênfase em Sistemas de

Controle. Nos últimos anos, eu trabalho dando aula para esta disciplina obrigatória,

Sistemas de Controle. Um dos nossos alunos mestrandos estava dando aula como

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substituto, foi embora para a Petrobrás, e desde então eu sigo dando esta disciplina

Sistemas de Controle, que é na realidade matemática aplicada. (AQUILU)

LP – Fora este que o Sr. já citou, o Sr. tem noção de onde estão trabalhando os

alunos que se formam aqui? Dentro do nosso estado para onde estão indo? Eles se

formam aqui e vão para onde, para estatais, vão para fora do estado?

VD – Isso é o seguinte: saiu aquela tendência de grande expansão de siderúrgica,

tanto que eles triplicaram44 a produção desde que eu mudei para cá. E agora a

grande demanda é por parte da indústria siderúrgica, tenho alunos que trabalham na

CST, alunos que trabalham na Vale do Rio Doce, alunos que trabalham na Samarco,

que na verdade faz parte da Vale do Rio Doce, tem vários alunos que trabalham na

Petrobrás, inclusive em empreiteiras, não exatamente na Petrobrás, devido a

expansão petrolífera no estado. Tenho inclusive alunos que trabalham nas

plataformas, e estão estudando conosco. Tem alunos que trabalham nas

prestadoras de serviço da Petrobrás, como Flexibrás. A Flexibrás que fica lá em Vila

Velha.

LP – Elas estão absorvendo esta mão de obra.

VD – Sim, tem alunos nossos na Aracruz Celulose, e recentemente, acho que temos

quatro alunos na Embraer, acho que os melhores alunos em termos de notas. Então

a área de atuação é bastante ampla.

LP – Nosso estado é rico nesta parte.

VD – Rico em termos de demanda na parte de engenharia mecânica. Tanto que eu

sempre falo para os alunos que o nosso trabalho é mais sujo, sempre tem essas

coisas45 que tem que tocar, um monte de óleo, sujeira, fumaça... É diferente da

engenharia eletro-eletrônica, programador. Mas por outro lado tem muito mais

demanda. Mas na construção civil quem é responsável, por exemplo, pela

montagem de um elevador, é o engenheiro mecânico, não elétrico. O Elétrico é sub-

contratado. A responsabilidade de montagem é da engenharia mecânica.

LP – Como estamos vendo que existe uma amplitude grande de trabalho, e tipos de

trabalho diferentes, porque a Aracruz Celulose tem um tipo de trabalho diferente do

que o da CST e da Vale. Quais atividades o Sr. percebe que eles estão

desenvolvendo. O Sr. citou uma, montagem de elevador.

44 tenho a impressão que está falando das expansões ocorridas na CVRD, Aracruz, CST, mas deverá ser checado.

45 Apontou alguns equipamentos que estavam no chão de sua sala.

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VD – Isso é só uma parte pequena. Como temos uma expansão de obras, alguém

tem que assumir.

LP – Montagem de máquinas pesadas...

VD – A parte de montagem, sim. Como nós temos uma certa tradição de importar

tecnologia, então não tem tanto serviço para os alunos em novos projetos, como

tinha na época da minha formação. Por outro lado tem as coisas mais avançadas

que eles têm que acompanhar.

LP – Então eles trabalham tanto em montagem quanto em projeto.

[Neste momento tocou o celular da pesquisadora, que não o atendeu e desligou]

VD – A parte de projeto é limitada, devido a importação da tecnologia. Cada um

recebe um tipo de caixa preta, ou seja, você sabe como fazer manutenção, mas não

tem com modificar esse projeto. Existem algumas possibilidades de evolução mas é

muito restrito.

LP – Então basicamente as atividades que estão sendo desenvolvidas, estão

concentradas na parte de montagem, não é um desenvolvimento novo.

VD – Eu diria...

LP – É adaptação...

VD – A adaptação já exige mais conhecimento em engenharia mecânica, mas no

momento tem demanda muito maior na parte de manutenção.

LP – E que tipo de problemas eles estão enfrentando?

[Como foi feita uma pausa, a pesquisadora lançou nova pergunta, mas o depoente

ignorou a mesma e seguiu o raciocínio anterior]

VD – Diferente de Petrobrás, porque Petrobrás, agora como está evoluindo muito,

eu diria que representa uma concentração de novidades. A perfuração em águas

profundas, é uma concentração de topo de tecnologia na parte de mecânica. Como

descer até o fundo do mar a três mil metros? Só que é três mil metros só abaixo do

nível do mar, a partir daí começa a perfuração46, que pode chegar até seis mil

metros.

LP – E o Brasil é bem avançado nesta tecnologia.

VD – Exatamente.

LP – Eu estive lendo sobre isso. Pouquíssimos países...

[ O depoente interrompe]

46 Refere-se três mil metros de água do mar, para chegar ao fundo.

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VD – Pouquíssimos! Até que eles poderiam desenvolver tecnologia mas não tinha

precedente. Agora com a Petrobrás abriu os campos de exploração para

estrangeiras como a Shell por exemplo.

LP – Já precisa atuar.

VD – Vai aparecer a tecnologia também de ponta, mas forte.

LP – E para desenvolver esse tipo de atividade, quais problemas eles têm que

enfrentar? Eles comentam, o Sr. tem alguma idéia?

VD – Bom...

LP – Estou pensando dentro da matemática, estou querendo chegar lá...

VD – É, mas... vamos pensar.... olha só... o que é escoamento, um problema de

escoamento, você tem sistema de dutos, você deve manter uma pressão. Essa

pressão, por exemplo, na hora da extração do petróleo, não é aquela imaginação

que a gente tem o petróleo está aqui como se fosse uma bolsa e você rompe o

buraco e o líquido já está subindo direitinho como a gente enxerga.

LP – Não, tem que ter bombas....

VD – Aí que está! Como nas grandes profundidades, lá é como se fossem

pedacinhos, gotas de petróleo espalhadas dentro de uma esponja. Então você deve

perfurar, injetar lá um líquido misturado com.... um líquido gasoso, para soltar, para

absorver esse petróleo acumulado. Depois você deve manter esse processo. Não

pode ficar muito viscoso, porque nas grandes profundidades a temperatura é muito

baixa.

LP – E há grande pressão também.

VD – É. Grande pressão vai romper o duto. E se você vai manter grande densidade,

vai entupir. Então, sempre a resolução de um problema on-line, que exige... os

problemas por exemplo, essas equações parciais, equações não lineares, os

problemas de controle... recentemente estou lendo um artigo sobre elementos

finitos, é uma técnica muito aplicada, tanto que eles exigem agora esse

conhecimento e essa disciplina já faz parte obrigatória do nosso mestrado, uma

introdução de elementos finitos. Mas basicamente qualquer característica dos

problemas mecânicos está baseada na descrição, na forma das equações

diferenciais. Sistemas de Controle básicos é puramente as equações diferenciais

lineares, aquele curso que a gente está dando.

LP – Quais seriam então, além desse que o Sr. citou, os conceitos matemáticos

necessários? Por exemplo, vou citar alguns e o Sr. vai me falar, dentro da atuação

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deles e dentro do curso mesmo. Quais são nas matérias técnicas, a importância que

têm, se eles vão utilizar objetivamente ou subjetivamente esses conceitos.

Geometria plana.

VD – Bom, Geometria Plana, obviamente, tanto que apesar da existência de

programas do CAD47, que desenha-se no computador, a gente tem desenho técnico.

E desenho técnico que gera uma imaginação de toda a máquina. Desenho técnico, é

interpretação plana de figuras, projeções.

LP – Geometria espacial.

VD – Geometria espacial também.

LP – Trigonometria.

VD – Trigonometria obviamente para descrever. Infelizmente... aqui, essa

máquina48, qualquer uma dessas máquinas que você está observando, necessita da

ferramenta não linear. Girou a manivela... aqui o que você vai utilizar é ângulo em

função de ângulo de rotação49. É equação completamente de trigonometria. Aqui a

mesma coisa. Todos equipamentos que lidam com transformação de movimentos,

movimento linear, por exemplo em movimento rotacional, necessitam...

LP – Trigonometria...

VD – E as equações são muito complexas na verdade.

LP – Logaritmo.

VD – Bom, logaritmo à parte.

LP – Mas ele vai ser utilizado objetivamente, ou...

VD – Em sistemas de controle usa-se tanto logaritmo natural, como logaritmo

decimal. Por exemplo, tem o famoso Diagrama de Bode, que envolve a escala

logarítmica. Logaritmo tanto na escala de freqüência, ou escala de magnitude. E

quando se caracteriza a relação de sinais, usamos a escala logarítmica. Assim é

mais fácil caracterizar e interpretar o comportamento dinâmico, tanto de sistema

elétrico como sistema mecânico. É uma ferramenta muito usada. Bode conseguiu

aplicar as propriedades de logaritmo.

47 Refere-se ao programa AutoCad, de desenho no computador.

48 Mostrou algumas máquinas em sua sala.

49 Movimentou uma máquina que possui uma manivela que ao ser girada, rotaciona um braço em um

determinado ângulo que por sua vez eleva um componente.

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LP – Traçado de curvas e de superfície. Dentro da matéria de desenho

provavelmente...

VD – Desenhos e além de tudo, você deve imaginar um pouco o que vai acontecer

dentro do processo, que não tem aquela abstração. O engenheiro mecânico deve

sentir o que está acontecendo com a máquina, com o processo. Se ele vai se

concentrar somente na interpretação do computador, se afasta. Vários de nossos

colegas não gostam de trabalhar dando aula com o powerpoint, preferem só na

parte ilustrativa. Quando você interpreta um processo, é melhor desenhar mesmo

com traçado de superfície. Vai se pensar no processo como um todo.

LP – Probabilidade e estatística.

VD – Bom, cada vez mais aplicado. Nos cursos da Rússia, tivemos uma disciplina

que se chama Controle Probabilístico. É, por exemplo, baseada nas probabilidades.

Uma empresa como a Aracruz Celulose tem controle de processo, processo

químico, processo... que não necessariamente envolve informação contínua. Você

tem uma idéia de como é que tem que evoluir o processo mas você não tem como

avaliar permanentemente. Então você faz amostragem, captura o sinal, gera a

interpolação de pontos. Por exemplo, utilizando o famoso filtro de Kalman50, esse

filtro é baseado em informações incompletas. Você gera um modelo que idealiza o

processo e compara com aqueles dados que entram no filtro. Assim consegue

corrigir o comportamento.

LP – Vetores no plano e no espaço.

VD – Bom, hoje temos a mecânica vetorial, uma ferramenta universal. E como

nossas máquinas são volumosas, você precisa trabalhar com sistema de vetores

[pequeno trecho ininteligível, mas é somente um reforço no pensamento].

LP – O Sr. já citou as derivadas e as integrais que estão inclusive nas disciplinas. Só

para confirmar, as derivadas ordinárias, direcionais, as integrais simples, duplas, de

linha e de superfície. Todas essas são utilizadas também?

VD – E triplas também.

LP – Triplas também.

VD – Triplas também, por que você trabalha no espaço tridimensional.

LP – São utilizadas em várias matérias técnicas objetivamente, ou seja, para

conseguir cursar mecânica dos fluidos, por exemplo, eu vou...

50 método amplamente usado para fusão sensorial em aplicações de robótica móvel.

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[o depoente interrompe]

VD – Sim, mecânica dos fluidos, na realidade...

[o pesquisador interrompe]

LP – Estou dando um exemplo, pode ser outra...

VD – sim, sim, sim, é um topo de concentração, a mecânica dos fluidos, que é a

parte mais difícil, a parte pesada da matemática para os nossos alunos, concentra-

se agora lá.

LP – É uma matéria que fiquei apaixonada...

VD - Com a chegada dos novos professores, os que estão chegando agora, e estão

cobrando mais, essas matérias se tornaram mais concentradas para estudar. Mas

como é que você vai caracterizar o comportamento por exemplo de fluidos dentro de

tubos de Petrobrás? E lá não só um processo linear, não é fluxo linear, o fluxo é

parcialmente linear, tem fluxo turbulento, tem modificação de viscosidade, etc.

LP – E as séries? Séries numéricas, de funções, potências...

VD – Séries, onde a gente usa... é... presente em vibrações, nesta parte... e tal...

porque como é que você vai caracterizar as vibrações desse conjunto51? Tanto que

os próprios equipamentos, analisadores de espectro, estão baseados na

transformada de Fourier, Aplicam na expansão de séries.

LP – E Laplace? Também?

VD – A Transformada de Laplace é mais usada na teoria de controle.

LP – OK. Coordenadas? Polares, cilíndricas, esféricas...

VD – Bom, essa matéria, ela entra de forma mais aguda eu diria, na disciplina

Robótica Industrial. Para ~caracterizar a posição e orientação de um objeto de um

modo geral no espaço, você precisa de seis coordenadas. Três são responsáveis

pela posição, e três sobre orientação. Os três primeiros graus de liberdade num robô

industrial são responsáveis pelo alcance de posição, o restante é orientação.

Máquinas-ferramentas na realidade são uma espécie de robô, não tem grande

diferença. Nos dias de hoje, um centro de usinagem não é diferente de um robô.

Quando você quer economizar espaço, você já está fugindo de x, y, z, seria para um

esquema cilíndrico por exemplo, então perde a orientação original. Ou polar, os

primeiros robôs industriais foram construídos a partir da idéia de torre de um tanque

de guerra, levantamento de canhão, orientação, (rotação em termo de eixo vertical).

51 Mostrou um equipamento no chão da sala.

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Então, isso, tem assim uma distorção de coordenadas, por exemplo, esta caixinha52

possui uma orientação inicial, quando você está deslocando pra cá, já não tem

aquela orientação, já perdeu de novo a orientação, então comparando com aquela

orientação inicial, você criou a distorção. Então, os três outros graus de liberdade,

vêm casar a orientação desejada naquele primeiro ponto com a orientação que foi

obtida pelos primeiros três movimentos. Então, aqui você envolve a geometria,

trigonometria, ainda você tem que desenvolver tudo isso on-line. Nem sempre isso é

possível. Tem aquelas que geram a singularidade, quando você esta procurando a

resolução das equações diferenciais, mas o determinante é zero, e você não pode

dividir, necessita daquele conhecimento, aquelas coisas que as pessoas passam

estudando nas disciplinas de cálculo, e não tem noção infelizmente na época de

estudo de quando você vai precisar daquilo tudo.

LP – Isso é um ponto fundamental dessa minha pesquisa.

VD – O problema que... inclusive a gente sugeriu aqui... tem essa tendência, de

repassar o ensino de algumas disciplinas de matemática, essa parte de matemática,

matemática aplicada para os professores do centro mesmo. Cada um que já tem

experiência com, por exemplo, circuitos. Como é que ele vai exemplificar? Ele vai

exemplificar usando circuitos elétricos. Como professor de mecânica, se eu vou usar

transformada de Laplace, eu vou usar dispositivos mecânicos. Historicamente, a

análise de circuitos elétricos é desenvolvida de forma mais profunda. Então, é mais

fácil criar um equivalente elétrico do sistema mecânico, resolver tudo, e voltar no

domínio mecânico já com o resultado pronto. Recentemente os meus colegas usam

esta opção para cálculo de corrosão, parece que interpretar processos de corrosão é

mais fácil com os elementos eletro-mecânicos.

LP – Hoje as matérias de matemática são dadas por matemáticos...

VD – Sim..

LP – que não tem nenhuma ligação com engenharia.

VD – Não, de repente, eles têm assim... eles têm noção. Eles estudaram na época

física, mas... é difícil, porque ele está afastado, ele está trabalhando nessa área de

concentração muito aguda, estreita, e outro problema é o fluxo de alunos. O fluxo é

grande... que nós temos aqui, observando quando chega turma é composta de 70

52 Pegou um estojo em cima da mesa e movimentou mantendo fixa a altura e rotacionando de um lado para o

outro enquanto falava.

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alunos, 60 alunos. Então é difícil de trabalhar com essas turmas enormes. Agora na

minha época eu tinha mais sorte, porque nós já tivemos uma relação bem diferente

entre quantidade de alunos e professores. Tanto que por exemplo, você tem dezoito

mil alunos de engenharia naquela universidade onde eu estudei, e tem três mil

professores. Então a relação é de seis alunos por professor. Aqui nós temos mais ou

menos três mil alunos, seis vezes menos alunos que lá, só que nós temos só cento

e cinqüenta professores em todo o centro tecnológico. Então nós temos a relação

vinte a um. E tem disciplinas que não podem ser dadas para grupos grandes. A

parte prática não pode ser dada, por exemplo. Outra técnica que foi usada nos

grandes auditórios que cabia até duzentos alunos, como se fosse um teatro. E o

professor de física, de matemática, de química, estava dando só a parte teórica.

Depois, toda essa turma enorme era dividida em grupinhos de no máximo vinte e

seis, o padrão era vinte e cinco alunos, e estava resolvendo exercícios com outro

professor, para acompanhar as aulas teóricas que foram dadas. E sempre tinha o

casamento a aula teórica em seguida exercícios e um terceiro professor que estava

dando aulas práticas no laboratório. E o nível de professores foi equivalente tanto

na parte teórica, como na parte prática. Isto estou tentando implantar na minha

disciplina.

LP – Já houveram algumas modificações de currículo da engenharia aqui na UFES.

O Sr. presenciou alguma? Esteve próximo de alguma modificação dessas...

VD –Agora nós estamos implantando...

LP – Teve uma agora...

VD – Recente, isso. Nós demoramos um pouquinho para fazer as modificações nos

currículos de engenharia mecânica. Que é bem tradicional, embora o que é que

mudou? O conteúdo. O conteúdo mudou muito, embora a disciplina seja a mesma.

Isso não são só minhas palavras, mas dos alunos. Estou trabalhando com alunos de

penúltimo, último período (às vezes de nono, décimo período). Eles falam mesmo

que nos últimos dois anos, o estudo da mecânica ficou mais pesado. Obviamente,

pois os professores estão tentando repassar as novidades das matérias.

LP – E a motivação foi essa mudança no mercado que está tendo..

VD – Exatamente.

LP – Com a vinda da Petrobrás, novas tecnologias estão sendo absorvidas.

VD – Sim, estão ligadas mais à parte mecânica. Processos de fabricação, processos

metalúrgicos, processos dinâmicos, por exemplo, num de trem de carga. É um

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objeto dinâmico bem sofisticado. Imagina se você tem oitenta vagões. Você freou.

Como frear? Deve começar pela cabeça, ou você deve começar pelo fim do trem?

Suponha que exista só uma opção de abrir as válvulas. Se você freou demais na

parte dianteira....

LP – Vai encavalar.

VD – Vai escorregar. Bom, se você freou mais na parte traseira, vai romper. Então é

um processo bem interessante. Depois... por exemplo, a locomotiva elétrica a diesel.

Ela gera a própria força elétrica. Já assisti, por exemplo, passando quatro

locomotivas, carregando somente vinte e seis vagões de carga numa região

montanhosa. Porque na subida, está perdendo potência. Então o que você tem que

fazer? Um compressor ajuda nesta situação e vai igualar a potência.

LP – Mas essa parte de trem, já existe há bastante tempo. A motivação que ocorreu

para essa mudança agora foi qual?

VD – Trabalho de ajuste automático de compressores para manter potência, foi

executado, faz tempo, na engenharia elétrica, num projeto de pesquisa. Agora você

está recebendo nova locomotiva que já tem isso dentro da tecnologia importada. Um

engenheiro mecânico, responsável pela oficina de locomotivas, por exemplo, da

Vale do Rio Doce, deve saber de tudo. Agora temos a fusão de conhecimento, na

verdade você precisa de formação ampla e multidisciplinar. Outro exemplo é

automóvel. Basta olhar o procedimento de testes numa oficina automotiva. Tem um

computador, um tipo de laptop, tem um soquete no carro e começam a testar de

tudo, porque quem controla tudo é o computador de bordo: a ingnição, o nível de

combustível, etc. O sistema de instrumentação e processamento que vai gerar a

curva de ignição que se quer. Não tem mais aquela parte mecânica de borboleta.

Por exemplo, em 93, já tinha máquinas de lavar roupa com processador com essa

lógica. Agora já tem exemplos de uso de turbinas. Então, não basta só aquela

matemática precisa que estudamos, ou a técnica de elementos finitos. Surgiu

também a técnica de Lógica Nebulosa que está baseada nas equações parciais, nas

equações de contorno. Então é impossível dizer: não, você vai estudar só essa parte

da matemática e o resto não precisa. Precisa de tudo. Não pode dizer que existe

uma parte de matemática que não servirá posteriormente. Num determinado

momento você vai precisar da parte de repente, para caracterizar as deformações

dinâmicas dos objetos.

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LP – E quais são as dificuldades que os alunos estão enfrentando dessa

matemática?

VD – Uma dificuldade. Os períodos de matemática, estão concentrados no início. A

minha disciplinas é no penúltimo período. Os alunos vão precisar usar transformada

de Laplace mais no final do estudo, aí eles não lembram mais o que é transformada

de Laplace. Então a gente começa a dizer, explicando, exemplificando, e assim, ao

mesmo tempo relatando... bom, tinha tal propriedade na transformada de Laplace, o

que que é na prática essa transformada.

LP – E aí ele consegue recordar? Ou fica só interessado... [o depoente interrompe]

VD – Eles conseguem, porque já têm uma certa habilidade de recuperar

conhecimento. Na realidade eles não precisam lembrar todo aquele curso. Aquele

curso conteúdo abstrato. Eles precisam das propriedades isoladas. Quando você

mostra os exemplos, é muito mais fácil aprender o uso do que lembrar daquela

matemática seca.

LP – E nesse caso então, o que está faltando....[o depoente interrompe]

VD –Estamos aproximando as disciplinas pesadas que necessitam de matemática

para períodos iniciais.

LP – Para ficar mais próximo do que ele aprendeu na matéria teórica.

VD –Para não deixar ele esquecer. Não tem como fazer muito próximo, todas as

matérias simultaneamente.

LP – Isto está nesta modificação de currículo de agora.

VD – Sim, sim. Já esse que é a partir de 2007. Agora vai entrar. Ainda temos aquele

currículo antigo, mas o currículo novo já está muito bem estruturado, e muito mais

pensado.

LP – E tem algum conceito matemático que está faltando ser ensinado na parte de

matemática? Por exemplo, o que está sendo feito lá é suficiente ou está faltando

alguma coisa?

VD – Na verdade a matemática clássica não mudou muito. Você abre os livros da

época de 70 e já tem tudo. Talvez a parte de topologia, parte de teoria de conjuntos,

evoluiu um pouco mais. Essa lógica nebulosa, por exemplo, os alunos aprendem no

nível de mestrado, mas no nível de graduação, não. Não precisa porque é suficiente

conhecer bem a matemática clássica daquela forma que estudávamos.

LP – Tem alguma coisa que está ultrapassada na parte de matemática? Tipo, que

poderia tirar esta matéria? Ou tudo que é dado lá é necessário?

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VD – Bom, eu acho que ao longo do tempo, o foco de matemática no curso mudou

um pouquinho. Não é mais aquela demonstração de teorema. É resolução de

problemas. No final das contas o que você deve fazer é formular o problema. A

maior dificuldade é formular. Até que você pode achar a resolução do problema

pronta. Mas a arte é exatamente enquadrar esse problema, deduzir numa forma

conhecida. Ou criar um novo problema para o qual você deve inventar a solução.

LP – Algo mais a acrescentar?

VD –Nunca se sabe o que vai precisar daqui para a frente. Eu não pensei que vou

ensinar processo de usinagem um dia, mas o próprio processo de usinagem

também evoluiu bastante: a tecnologia, as velocidades de corte, corte super rápido,

por exemplo, não existiam na época.

[Levantou-se da mesa para pegar um livro e falou, mas o som ficou ininteligível. Foi

anotado que ele estava falando sobre o livro, disse que iria pegar para exemplificar]

VD – Usaremos, por exemplo, este livro: Teoria de usinagem, elasticidade e teoria

de corte dos metais. Veja bem aqui na frente53 temos a geometria plana para

caracterizar tudo isso, a álgebra vetorial, aqui... olha só...

LP – Derivada.

VD – Derivada parcial, mista, aqui ainda mistura de derivada parcial e derivada

normal. Então tudo isso só para caracterizar o processo de deformação. Aqui...

trigonometria.

LP – Aplicação direta mesmo, objetivamente.

VD – Claro que é! Seria interessante desde o início usar o termo tensor, por

exemplo, dando exemplo diretamente ligado à mecânica para o curso de

engenharia mecânica. Isso que faz falta.

LP – Mas neste caso teria que ter uma matemática para cada engenharia...

VD – Não, só exemplos diferentes. Porque a fórmula é a mesma. Só que é difícil

quando ele está estudando...

LP – Ele (o professor), daria um exemplo de elétrica, de física...

VD – Vejamos aqui é hiperbolóide, esquema de hiperbolóide direcionada e tensor de

tensões no ponto a54. Então você precisa de geometria analítica, mecânica vetorial,

53 Mostrou no livro (um livro em russo) por várias vezes a partir deste ponto, fórmulas matemáticas enquanto

falava.

54 leu no livro, traduzindo.

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resistência dos materiais, tem que saber de tudo, só para caracterizar esta parte do

processo de usinagem. Isso é um livro sobre teoria de corte. Quando eu estudava

não tinha essa profundidade. Se você quer melhorar o processo, deve saber mais.

Aqui temos a equação integral (não diferencial), então essa expressão é com fator,

então são exemplos...

LP – É. O exemplo está no próprio exemplo.

VD – Vamos ver... aqui temos tangente.

LP - Mesmo o livro estando em russo, a gente vê que isso é uma tangente. Porque

na verdade é linguagem universal.

VD – Linguagem... não importa qual linguagem... russo, alemão... tudo...

LP – A fórmula é a mesma.

VD – E a caracterização do problema. Aqui temos a integral e derivadas, uma, duas,

três, quatro. A integral definida, integral indefinida. Aqui nós temos as equações

térmicas durante o processo de deformação, temos equações trigonométricas muito

sofisticadas, ainda em diferenças...não necessariamente de forma contínua.

LP – Tudo isso num único pequeno livro.

VD – Sim, um livrinho... então quem diz que não precisa nada disso... olha só... as

fórmulas. É só fotografar estas fórmulas para exemplificar, já dá pra entender que

precisa de tudo. Geometria analítica, logaritmo...

LP – Repete para mim o nome do livro.

VD – “Plasticidade e corte dos metais”. Esse seria o nome mais correto. Nele você

encontra toda a matemática que você queria.

LP – Perfeito.

VD – Não tem lógica nebulosa, isso já é outra coisa, mas o resto está aqui. Toda a

matemática básica, talvez não tenha séries, pode ser que não tenha.

LP – Olha! Logaritmo.

VD – Logaritmo, sim, equação logarítmica. Aqui para caracterizar essa linearidade, a

linearização, porque você tem a curva não linear, caracterizar de forma...então...

bem... acho que nós estamos... cobrando dos alunos...e ainda.. olha só, a partir

desta matriz de tensor de tensões, em cada direção, aí eles começam a construir, a

teoria de elementos finitos. Que lá é quadradinho, bobinho, três cubinhos, como é

que ele vai formar... então você deve caracterizar, você deve escrever, a base das

equações.

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LP – Então está sendo sempre necessário voltar um pouquinho nos conceitos, nas

propriedades que eles aprenderam lá no início, para eles conseguirem compreender

essa matéria aqui.

VD – sim, claro, exatamente.

LP – Essa que é a grande dificuldade, não é? Porque estudar eles estudaram, mas

esquecem.

VD –O estudo na forma abstrata! Mas, na realidade, é difícil de incorporar os

exemplos na início.

LP – Seria o ideal.

VD – Sim, seria o ideal quando um professor que está dominando os exemplos da

área. Eu tinha sorte, os meus livros da época estão aqui, alguns livros são

fundamentados basicamente na parte de matemática. Um dos nossos professores

continua atuando, com oitenta anos. Escrevendo livros, etc, etc. Bom, ele tem três

formações: oficial de marinha, engenheiro eletromecânico, (terminou nossa

faculdade), e ainda cursou a matemática aplicada na Universidade de Lomonosov

em Moscou. A maioria dos nossos professores teve formação de matemática

adicional, e isso seria ideal55. Nem estou tocando no assunto de energia nuclear!

Agora vai ser retomado de novo essa parte de construção de usinas nucleares, já

tem um certo nível de enriquecimento de urânio, já tem produção... acabei de ler um

livro de uma historiadora [pequeno trecho muito baixo].. toda a história da evolução.

Bom, a matemática para aquela área é pesada. E além de tudo precisa de

conhecimento em várias áreas diferentes. LP – Perfeito, muito bem então. Agradeço

muito...

VD – Já respondemos tudo?

LP – Já respondemos tudo, mostrou ainda, não só respondeu como mostrou.

VD – Não achamos fórmula de Taylor, fórmula de Taylor é uma forma de expansão,

em série.

LP – Perfeito.

55 Refere-se a ser ideal que os professores daqui tivessem formação variada como os da Rússia.

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ANEXO VII

Livros do acervo da Biblioteca Central da UFES analisados como Material

Didático

Título: Curso de Cálculo Integral

Autor: Pablo Miquel y Merino

Disciplina: Cálculo III

Ano publicação: 1964

Edição: s.ed. A primeira edição em espanhol data de 1944.

Língua de Origem: Espanhol

Língua de Publicação: Português

Número de Exemplares: 10

Tem carimbo da Escola Politécnica? Sim

Referência na Biblioteca UFES: 517.2.M669C

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? “1ª. Parte do curso de cálculo diferencial e integral que se ministra nesta universidade[...]” OBS: Não fala qual é a Universidade. Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Não. Os exercícios são voltados para a matemática, sem relacionar com engenharia. Observações adicionais:

Título: Cálculo Vectorial

Autor: Bento de Jesus Caraça

Disciplina: Cálculo Vetorial

Ano publicação: 1960

Edição: 3ª. Ed. A primeira data de 1937.

Língua de Origem: Português (Lisboa)

Língua de Publicação: Português (Brasil)

Número de Exemplares: 04

Tem carimbo da Escola Politécnica? Não

Referência na Biblioteca UFES: 517.2/3 C858C

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? Não. Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Não. Os exercícios são voltados para a matemática, sem relacionar com engenharia. Observações adicionais:

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Título: Introduction to Numerical Analysis

Autor: Carl Erik Froberg

Disciplina: Cálculo Numérico

Ano publicação: 1973

Edição: 2.ed. A primeira em inglês data de 1965.

Língua de Origem: Inglês

Língua de Publicação: Inglês

Número de Exemplares: 02

Tem carimbo da Escola Politécnica? Não

Referência na Biblioteca UFES: 518.61 F923i

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? Para a área técnica. Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Não. Exemplos e exercícios voltados para a matemática. Observações adicionais:

Título: Introdução ao Cálculo Científico

Autor: Giulio Massarani

Disciplina: Cálculo Numérico

Ano publicação: 1967

Edição: s.ed.

Língua de Origem: Português

Língua de Publicação: Português

Número de Exemplares: 03

Tem carimbo da Escola Politécnica? Não

Referência na Biblioteca UFES: 517.392 M414i

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? “A finalidade deste livro é apresentar os fundamentos empregados em Cálculo Numérico. Destina-se aos alunos das Escolas Superiores que tenham tido o primeiro curso de Cálculo e de Equações Diferenciais Ordinárias”. Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Não. Exemplos e exercícios voltados para a matemática. Observações adicionais:

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Título: Cálculo Numérico: aproximações, interpolação, diferenças finitas, integração numérica e ajustamento de curvas

Autor: William Edmund Milne

Disciplina: Cálculo Numérico

Ano publicação: 1968

Edição: 2.ed. Original em inglês data de 1850.

Língua de Origem: Inglês

Língua de Publicação: Português

Número de Exemplares: 04

Tem carimbo da Escola Politécnica? Não

Referência na Biblioteca UFES: 517.392 M659c

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? “O objetivo deste livro é ajudar a preencher o vazio que existe entre a matemática de sala de aula e as aplicações numéricas”. Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Não. Exemplos e exercícios voltados para a matemática. Observações adicionais: Ele diz em preencher o vazio entre a teoria e a prática, mas o contexto permanece dentro da matemática.

Título: Cálculo com Geometria Analítica

Autor: Earl William Swokowski

Disciplina: Cálculo I

Ano publicação: 1983

Edição: s.ed. A primeira em inglês data de 1926.

Língua de Origem: Inglês

Língua de Publicação: Português (Brasil)

Número de Exemplares: 05

Tem carimbo da Escola Politécnica? Não

Referência na Biblioteca UFES: 517 S979C

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? “[...] destina-se aos dois primeiros anos básicos dos cursos de graduação na área de ciências exatas (Matemática, Física e Engenharia)[...]” Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Foi encontrado um exercício com aplicação para a engenharia na pag. 273, ex. 34: “Uma caçamba de elevador de um silo tem a forma de um cone circular reto de 2 pés de raio, superposto por um cilindro circular reto. Se o volume deve ser de 100 pés cúbicos, determine as alturas h e k do cilindro e do cone, respectivamente, que minimizem a área da superfície plana.” Observações adicionais:

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Título: O Cálculo com Geometria Analítica

Autor: Louis Leithold

Disciplina: Cálculo I

Ano publicação: 1977

Edição: 1.ed. A primeira em inglês data de 1968.

Língua de Origem: Inglês

Língua de Publicação: Português (Brasil)

Número de Exemplares: 13

Tem carimbo da Escola Politécnica? Não

Referência na Biblioteca UFES: 517 S979C

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? “[...] para curso de Cálculo a nível universitário[...]” Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Não. Exemplos e exercícios voltados para a matemática. Observações adicionais:

Título: Cálculo 1: funções de uma variável

Autor: Geraldo Ávila

Disciplina: Cálculo I

Ano publicação: 1981

Edição: 4.ed.

Língua de Origem: Português

Língua de Publicação: Português (Brasil)

Número de Exemplares: 17

Tem carimbo da Escola Politécnica? Não

Referência na Biblioteca UFES: 517.2/3. A958C 4.ed.

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? “[...] para Cálculo Diferencial e Integral[...]” Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Não. Exemplos e exercícios voltados para a matemática. Observações adicionais:

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Título: Problemas de Geometria Analítica

Autor: D. Kletenik

Disciplina: Geometria Analítica

Ano publicação: 1984

Edição: 3.ed.

Língua de Origem: Francês

Língua de Publicação: Português (Brasil)

Número de Exemplares: 07

1 ex. em francês, s.d., impressa em Moscou. 2 ex. em Inglês, s/d., impressos em Moscou.

Tem carimbo da Escola Politécnica? Não

Referência na Biblioteca UFES: 516 K64P 3.ed.

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? Não tem introdução, nem prefácio, nem sumário. Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Não. Exemplos e exercícios voltados para a matemática. Observações adicionais:

Título: Elementos de Geometria Analítica

Autor: Nicolay Efimov

Disciplina: Geometria Analítica

Ano publicação: 1981

Edição: s.ed. 1ª. Ed em francês de 1969, impressa em Moscou.

Língua de Origem: Francês

Língua de Publicação: Português (Brasil)

Número de Exemplares: 34

Tem carimbo da Escola Politécnica? Não

Referência na Biblioteca UFES: 516 E27e EFI

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? Não tem introdução, nem prefácio, nem sumário. Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Não. Exemplos e exercícios voltados para a matemática. Observações adicionais:

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Título: Geometria Analítica: com uma introdução ao cálculo vetorial e matrizes

Autor: David C. Murdoch

Disciplina: Geometria Analítica

Ano publicação: 1971

Edição: 2ª.

Língua de Origem: Inglês

Língua de Publicação: Português (Brasil)

Número de Exemplares: 01

Tem carimbo da Escola Politécnica? Não

Referência na Biblioteca UFES: 516 M974G 2.ed.

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? Não. Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Não. Exemplos e exercícios voltados para a matemática. Observações adicionais: Ele explica na introdução que faz uma relação entre a Geometria Analítica e a Álgebra Linear.

Título: Vetores e Matrizes

Autor: Nathan Moreira dos Santos

Disciplina: Geometria Analítica e Álgebra Linear

Ano publicação: 1977

Edição: 2ª.

Língua de Origem: Inglês

Língua de Publicação: Português (Brasil)

Número de Exemplares: 01

Tem carimbo da Escola Politécnica? Não

Referência na Biblioteca UFES: 512.83 S237V

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? Não. Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? Não. Exemplos e exercícios voltados para a matemática. Observações adicionais:

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Título: Cálculo Diferencial e Integral

Autor: R. Courant

Disciplina: Cálculo

Ano publicação: 1965

Edição: 1.ed. A primeira em alemão data de 1952.

Língua de Origem: Inglês

Língua de Publicação: Português (Brasil)

Número de Exemplares: 04

Tem carimbo da Escola Politécnica? Sim

Referência na Biblioteca UFES: 517.2/3 C858c

Traz alguma referência à engenharia na introdução/prefácio? "Esta obra se destina a todo aquele que, tendo concluído um curso ordinário de matemática secundária, deseja dedicar-se ao estudo da matemática ou suas aplicações à ciência e à engenharia, quer se trate de estudos univesitários ou de escolas técnicas, quer de professores ou engenheiros.” Traz alguma referência à engenharia nos exemplos/exercícios? "Uma partícula parte da origem com a velocidade 4, e sob a influência da gravidade desliza, por um fio reto, até atingir a linha vertical x = 2. Qual deve ser a inclinação da trajetória, para que o ponto atinja a linha vertical no menor tempo possível? R. Horizontal." Ex. 3, p. 298 Observações adicionais: Há alguns outros exemplos com aplicações mais voltadas para a física nos outros capítulos.