universidade federal do sul e sudeste do parÁ ......À turma de ciências biológicas 2014, que...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO SUL E SUDESTE DO PARÁ - UNIFESSPA
INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE E BIOLÓGICAS
FACULDADE DE BIOLOGIA
Wilson Ribeiro Nogueira Junior
PADRÃO DE ATIVIDADE DE MAMÍFEROS TERRESTRES DE MÉDIO E
GRANDE PORTE DA RESERVA BIOLÓGICA DO TAPIRAPÉ
Marabá – PA 2018
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO SUL E SUDESTE DO PARÁ - UNIFESSPA
INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE E BIOLÓGICAS
FACULDADE DE BIOLOGIA
Wilson Ribeiro Nogueira Junior
PADRÃO DE ATIVIDADE DE MAMÍFEROS TERRESTRES DE MÉDIO E
GRANDE PORTE DA RESERVA BIOLÓGICA DO TAPIRAPÉ
Trabalho de conclusão de curso
apresentado à banca examinadora
da Universidade Federal Do Sul e
Sudeste do Pará para obtenção do
grau de Bacharel em Ciências
Biológicas, sob a orientação da
Professora Dra. Raquel Ribeiro.
MARABÁ
2018
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AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, e a minha mãe Dona Marcia, que é meu exemplo
do que é ser uma pessoa forte e batalhadora, que nunca desistiu e acreditou em
mim todos os dias da sua vida, até nas vezes que eu mesmo não acreditei.
À professora e orientadora Dra. Raquel Ribeiro que é exemplo a ser
seguido como pessoa e profissional, por todos os ensinamentos e discussões ao
longo de todos esses anos. Gostaria de agradecer, também pela convivência,
aprendizado, amadurecimento e pelo seu amor e entusiasmo com tudo
relacionado a ecologia e meio ambiente, enfim a natureza de forma geral, o que
sem dúvida nenhuma, fez com que eu me tornasse uma pessoa e um profissional
melhor nessa grande área que sempre fez o coração bater mais forte sendo o
meu grande foco e afinidade.
À minha equipe do Só Borax, composta por duas meninas maravilhosas,
Lorena Paz e Camila Maciel que caminharam junto comigo nesses anos
trabalhando nos projetos relacionados à nossa ecologia. Agradecer pela ajuda
nas instalações e campanhas, pela paciência, pelos conselhos, por sempre
estarem ao meu lado.
Ao professor Dr. Danilo Oliveira que sempre atuou como um verdadeiro
co-orientador, estando disponível sempre que precisei com sua experiência e
redirecionamento, além de sempre disponibilizar os seus alunos (a quem eu
agradeço de coração também), para ajudar nas campanhas, formando assim
uma parceria entre equipes que sempre deu muito certo.
À todos os professores do IESB que sempre deram e dão seu máximo
para que o curso de forma geral crescesse e se tornasse cada vez melhor, por
todas as vezes que estiveram disponíveis pra ouvir e aconselhar, até mesmo em
problemas pessoais quando necessário. De maneira especial à minha
orientadora que sempre cuidou e orientou como uma verdadeira mamãe Raquel.
Aos puxões de orelha do Diógenes, a extrema ética e companheirismo do Danilo
e por fim, as chamadas de atenção do Sidnei, todos seguidos de abraços sempre
que preciso. Vocês são meus maiores exemplos do que é ser um homem, do
que é ser um Biólogo. A grande amiga Zan, o jeito doce de ser da Cibelle, a ética
e cuidado conosco de sempre da Alessandra, e por último cada um dos que
chegaram depois e já se tornaram tão importantes em pouco tempo. Detalhes
que me farão lembrar de cada um não apenas como grandes mestres e
professores, mas também muitos serão lembrados como verdadeiros amigos.
Obrigado por depositarem a semente do que é ser um grande profissional e
demonstrarem todo o amor de vocês por nossa amada Biologia.
À Unifesspa por ter cedido o apoio necessário de maneira geral nesses
anos de graduação.
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Agradeço à banca por todo o empenho e dedicação na revisão do
trabalho.
Ao ICMBIO e toda a equipe da REBIO Tapirapé, por terem cedido todo o
apoio para as realizações das campanhas, como alojamento, recursos, logísticas
e dados. Ao Façanha e a Wal por sempre terem nos acolhido com braços abertos
junto com a equipe de guardas florestais, que foram de extrema importância para
a realização dessa pesquisa, em especial ao meu grande amigo Sr Desivaldo
que forneceu toda a sua experiência e apoio nas instalações das câmeras, e ao
grande cozinheiro Sr Maciel, que sempre se dedicou em cuidar das nossas
recargas de energia após o dia cansativo de campanhas.
Aos meus amigos pessoais de forma geral e também aos colegas do
curso de biologia que sempre estão no dia a dia, nas conversas de bar, nas
festas, nas horas boas e felizes, e nas horas ruins e tristes dando apoio
emocional ou de qualquer outro tipo.
Aos amigos que me ajudaram de qualquer forma nesse trabalho. Klivia,
Raianne, Vanessa, Daniela, Athos, Renan, Matheus, Lorena e Camila. Obrigado
por todas horas dedicadas, pelas dicas, ou por simplesmente me ouvir.
À turma de Ciências Biológicas 2014, que passou por todos os desafios
de ser a primeira turma de Biologia da Unifesspa e cresceu junto com o curso,
que sempre esteve comigo nas brincadeiras, nas brigas, nos momentos difíceis
e pessoais, nas horas mais felizes e nos choros e desesperos pré avaliações.
E finalmente, e de maneira especial, aos “Discriminados” compostos pelos
meus irmãos Gabriel Felício, Laís Krhistina e Mylena Diniz, eu não sei se eu
conseguiria se vocês não estivessem do meu lado, e que nossa amizade não se
diminua depois que cada um ir atrás dos seus sonhos em lugares diferentes. Eu
vou lembrar de cada um de você com muito carinho e prometo protege-los numa
caixinha de amor dentro do meu guarda roupa.
A todos... Muito obrigado!
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1: Mapa mosaico Carajás ....................................................................... 122
Figura 2: Imagens de satélite das áreas antropizadas em torno da Reserva
Biológica do Tapirapé ........................................................................................ 144
Figura 3: Gráfico da temperatura (ºC) e precipitação média (mm) do ano de 2016
na cidade de Marabá PA. .................................................................................. 155
Figura 4: Gráfico de pluviosidade e temperatura média do ano de 2017 em
Tucuruí-PA. ........................................................................................................ 155
Figura 5: Mapa do Brasil, estado do Pará e Reserva Biológica do Tapirapé,
respectivamente, com os pontos onde as câmeras fotográficas foram instaladas.
............................................................................................................................ 177
Figura 6: Instalação de armadilhas fotográficas na Rebio Tapirapé em uma das
campanhas realizadas conforme a metodologia, buscando maior sucesso de
captura. ................................................................................................................. 18
Figura 7: Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Mazama
nemorivaga registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de
2016-2017/18. .................................................................................................... 233
Figura 8: Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Mazama
americana registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de
2016-2017/18. .................................................................................................... 244
Figura 9: Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Tayassu
pecari registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-
2017/18. .............................................................................................................. 255
Figura 10: Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Pecari
tajacu registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-
2017/18. .............................................................................................................. 266
Figura 11: Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Dasypus
kappleri registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-
2017/18. .............................................................................................................. 277
Figura 12: Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Dasypus
novemcinctus registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de
2016-2017/18. .................................................................................................... 278
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Figura 13: Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Tapirus
terrestris registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-
2017/18. ............................................................................................................ 2829
Figura 15: Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Cuniculus
paca registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-
2017/18. .............................................................................................................. 290
Figura 16: Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Dasyprocta
leporina registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-
2017/18. .............................................................................................................. 301
Figura 17: Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Dasyprocta
prymnolopha registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de
2016-2017/18. .................................................................................................... 312
Figura 18: Gráfico de sobreposição entre as espécies Mazama americana e
Tapirus terrestris na Reserva biológica do tapirapé, indicando um alto nível de
sobreposição (Dhat = 0,78). .............................................................................. 334
Figura 19: Gráfico de sobreposição entre as espécies Tayassu pecari e Pecari
tajacu indicando um alto nível de sobreposição (Dhat = 0,76). ....................... 345
Figura 20: Gráfico de sobreposição entre as espécies Dasyprocta
prymnolomorpha e Dasyprocta leporina indicando um alto nível de sobreposição
(Dhat = 0,76)....................................................................................................... 346
Figura 21: Gráfico de sobreposição entre as espécies Cuniculus paca e Tapirus
terrestris indicando um médio nível de sobreposição (Dhat = 0,68). ............... 357
Figura 22: Gráfico de sobreposição entre as espécies Dasypus novemcinctus e
Dasypus kappleri indicando um médio nível de sobreposição (Dhat = 0,68). . 367
Figura 23: Gráfico de sobreposição entre as espécies Mazama americana e
Mazama nemorivaga indicando um nível menor de sobreposição (Dhat = 0,53).
............................................................................................................................ 378
Figura 24: Gráfico de sobreposição entre as espécies Mazama nemorivaga e
Tapirus terrestris indicando um médio nível de sobreposição (Dhat = 0,46). . 389
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Número de armadilhas fotográficas e duração das campanhas durante
os períodos de amostragem de médios e grandes mamíferos na Reserva
Biológica do Tapirapé. ....................................................................................... 166
Tabela 2: Espécie, número de registros, índice de abundância relativa (IAR) e
porcentagem de registros nas classificações de horários. ............................... 200
Tabela 3: Espécies registradas na reserva biológica do Tapirapé nos anos de 2016 e 2017/2018, nome popular, classificação por horário e grau de ameaça segundo a IUCN 2014.................................................................................................................211
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................. 9
2. MATERIAL E MÉTODOS .............................................................................. 12
2.1. ÁREA DE ESTUDO ....................................................................................... 12
2.2. AMOSTRAGEM DOS MÉDIOS E GRANDES MAMÍFEROS .................................. 16
2.3. ANÁLISE DE DADOS .................................................................................... 18
3. RESULTADOS ............................................................................................... 20
3.1. PADRÃO DE ATIVIDADE .................................................................................. 22
3.2. SOBREPOSIÇÃO TEMPORAL ........................................................................... 32
4. DISCUSSÃO .................................................................................................... 39
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 47
6. REFERÊNCIAS ................................................................................................ 48
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1. INTRODUÇÃO
O padrão de atividade é a relação de como e quando os animais realizam
suas atividades básicas durante o dia, esse horário é um importante aspecto da
vida de um animal, refletindo suas interações com o ambiente e com outros
animais. Assim a descrição do padrão de atividade proporciona a compreensão
de componentes importantes do nicho ecológico das espécies, sendo eles o
nicho temporal, nicho trófico e o nicho espacial (Graipel & Glock, 2003).
Segundo Duré et al. (2009), o estudo das relações tróficas entre
espécies simpátricas é crucial para a compreensão das interações
interespecíficas. Um exemplo sobre a importância de conhecer as relações entre
espécies é o experimento clássico de Gause (1934), que deu origem ao princípio
da exclusão competitiva. O princípio da exclusão competitiva prevê que duas
espécies não podem sobreviver, indefinidamente, utilizando o mesmo recurso
limitante, pois a competição pelo recurso eliminaria uma das espécies. Para que
sobrevivam, há a necessidade de adaptações de nichos que permita essa
coexistência, o que normalmente acontece na natureza, segundo Cassini (2005).
Essas adaptações podem ser representadas por diferenças nas dimensões do
nicho, como dieta, horário de forrageamento, período do dia em que estão mais
ativos, uso do espaço, etc. Para Schoener (1974) tal diferenciação é o que
permite que haja sobreposição de nicho, onde indivíduos ainda que
morfologicamente ou filogeneticamente semelhantes consigam coexistir.
MacArthur & Pianka (1966) explicam, pela teoria do forrageamento
ótimo, como os indivíduos ajustam seu orçamento temporal ao uso de recursos
alimentares. Essa teoria postula que, por meio da seleção natural, os indivíduos
desenvolvem estratégias que otimizam sua eficiência de forrageamento. Outra
hipótese, de acordo com Maffei et al., (2004), aponta que o predador pode
adaptar o seu padrão de atividades conforme o de suas presas. Estratégias
como ajuste no forrageamento e escolha de presas de acordo com os horários
de atividade, são mecanismos desenvolvidos por espécies simpátricas, cuja
dieta e padrão de atividade se sobrepõem. Chillo et al., (2010), demonstraram
ajustes deste tipo entre caviídeos herbívoros simpátricos da Patagônia, onde as
espécies ajustaram sua dieta e uso do espaço (temporal e espacialmente) para
evitar interações competitivas intensas.
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O estudo sobre horários de atividades dos animais tem um papel
importante nos estudos ecológicos, principalmente quando se trata de espécies
com sobreposição de hábitos alimentares. Nestes casos, a simples diferença nos
horários de atividade pode ser uma das estratégias para evitar competição
interespecífica. Grandes carnívoros, por exemplo, desenvolveram estratégias e
recursos para que possam viver em simpatria e evitar competição direta através
de segregação de nicho trófico, espacial ou temporal (Pereira, 2010). Schoener
(1974), afirma que a maneira como as espécies utilizam o espaço disponível e
suas preferências na dieta são os principais fatores para determinar a separação
de nicho entre espécies.
Os animais possuem ritmos circadianos que atuam de forma involuntária
e sem a necessidade de qualquer intervenção externa. O ritmo circadiano,
segundo Sousa et al. (2008), é um ritmo biológico que persiste mesmo sob
condições ambientais constantes como luz e temperatura e com um período de
duração de aproximadamente 24 horas. Estes ciclos determinam seus ritmos
naturais de comportamentos como fome e sono, que se repetem de forma cíclica.
Os mamíferos apresentam padrões de atividade cíclicos de 24 horas,
caracterizados pela execução de atividades como forrageamento, busca por
abrigos, comportamento de corte, repouso, entre outros (Ciocheti, 2007). A
ritmicidade circadiana é mantida por mecanismos de temporização, que
constituem um conjunto de processos fisiológicos produzidos por estruturas e
sistemas diferentes de maneira integrada (Sousa et al., 2008).
De um modo geral, as atividades dos mamíferos são classificadas como
diurnas, noturnas, crepusculares (ativos ao amanhecer e/ou entardecer) ou
catemerais (ativos ao longo de todo o dia), de acordo Bennie et al., (2014). Para
Beier & Mccullough, (1990), Linkie & Ridout, (2011) e Díaz et al., (2016), este
padrão pode mudar em resposta às modificações ambientais ou antrópicas, tais
como disponibilidade de luz e temperatura, duração do dia, precipitação,
competição, predação, e atividades humanas, tais como desmatamento e caça.
O sistema responsável pela geração e regulação dos ritmos biológicos é
o sistema de cronometragem circadiano que se encontra no cérebro, em um
pequeno núcleo do hipotálamo anterior chamado supra-quiasmático (Rivkees,
2007). Segundo Richter et al., (2004), este relógio recebe sinais do ambiente
11
principalmente por foto recepção pela retina e transmite essas informações por
vias eferentes neurais e humorais. Sabe-se que os fatores externos não
produzem o ciclo circadiano nos animais, porém, estes fatores podem alterar e
regular estes ciclos. Este sistema temporal é o que permite que os animais
possam se adaptar se preparando e antecipando mudanças físicas no ambiente,
que estão associadas com o período diurno e noturno. Assim, o organismo pode
se adaptar das duas formas; tanto biologicamente, quanto fisicamente,
resultando em uma sincronização entre o animal e o ambiente externo, diz Turek,
(1998).
Os padrões de atividade dos mamíferos tem sido estudados utilizando
diferentes metodologias (Roberts, 2011). No entanto, a metodologia que vem
ganhando destaque é o uso de armadilhas fotográficas ou câmera- trap,
principalmente quando o grupo estudado compreende os médios e grandes
mamíferos (Munari et al ,. 2011). Diferentes trabalhos utilizam essa metodologia
para atingir os mais diversos objetivos, como estudo de registros de padrões de
atividades (Nodari, 2016), riqueza de espécies (Tobler et al ., 2008), abundância
relativa (Kasper et al ., 2007), preferências por presas e sobreposição de nicho
(Pereira-tirelli, 2010). Por não ser invasivo, esse método é eficaz e ideal para
registros de espécies raras, além de possibilitar o registro de espécies que
possuem características solitárias, que se deslocam por grandes distâncias,
possuem pouca quantidade de indivíduos ou vivem em pequenos grupos.
A segregação temporal é um mecanismo viável como forma de evitar a
competição na exploração pelos mesmos recursos alimentares. Desse modo,
investigar comportamentos que permitem a coexistência de espécies que
utilizam os mesmos recursos potenciais possibilita a compreensão de
mecanismos ecológicos mais complexos como por exemplo, a diferenciação de
horários de forrageamento de espécies simpátricas, os padrões ou preferências
de distribuição espacial das espécies simpátricas.
O presente trabalho tem como objetivo descrever o padrão de atividade
dos mamíferos de médio e grande porte presentes na Reserva Biológica do
Tapirapé, Sudeste do Pará, identificando suas estratégias de segregação
temporal.
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2. MATERIAL E MÉTODOS
2.1. Área de Estudo
A pesquisa foi realizada na Reserva Biológica do Tapirapé, a única
unidade de conservação de proteção integral existente no Sudeste Paraense.
Gerida pelo Instituto Chico Mendes da Biodiversidade (ICMBIO), a REBIO
Tapirapé faz parte do mosaico de Carajás (Figura 1) e está situada no sudeste
do estado do Pará, tendo a sua área inserida, quase em sua totalidade, no
município de Marabá. Apenas uma porção no extremo oeste da Unidade está
inserida no município de São Félix do Xingu. Além destes, o município de
Parauapebas encontra-se em área limítrofe ao sul da reserva. Foi instituída pelo
Decreto Federal nº. 97.719, em 05 de maio de 1989, com o objetivo de proteger
amostras de ecossistemas amazônicos, em especial, a região dos castanhais
(Ministério do Meio Ambiente; ICMBIO e Ambiental Consulting, 2009).
Figura 1: Mapa mosaico Carajás.
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As extensas florestas presentes na região de Carajás possuem
fisionomias vegetais variadas, tais como o predomínio de florestas de terra firme,
representadas por floresta ombrófila aberta e ombrófila densa, que ocorrem
principalmente em ambientes de morro e montanhas. Além dessas formações,
ainda existem na REBIO Tapirapé a canga, também chamada de savana
metalófila, encontrada em pequenas áreas elevadas onde há afloramento
rochoso de minério de ferro. Em seu entorno se encontram áreas de florestas
secundárias, resultado da regeneração de áreas anteriormente utilizadas como
pastagem ou para agricultura (Ministério do Meio Ambiente, ICMBIO e Ambiental
Consulting, 2009).
De acordo com o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC
- Lei nº 9.985/00), as unidades de conservação compostas pelo mosaico Carajás
devem ter uma área de entorno onde as atividades humanas estejam sujeitas a
normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos
negativos sobre a UC, tal área é conhecida como cinturão de amortecimento. O
entorno da reserva possui uma paisagem extremamente diversificada, com um
conjunto heterogêneo de formações vegetais e características fisiográficas de
todo o complexo Carajás (sul, sudoeste e oeste), além de uma extensa área com
significativas intervenções antrópicas dinamizadas por todo o processo de
ocupação da região. A Figura 2 apresenta duas imagens de satélite, de 1984 e
2008, da região de abrangência da Reserva Biológica do Tapirapé, ilustrando o
processo acelerado de desmatamento e ocupação humana do entorno da
unidade de conservação (Ministério do Meio Ambiente, ICMBIO e Ambiental
Consulting, 2009).
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Figura 2: Imagens de satélite das áreas antropizadas em torno da Reserva Biológica do
Tapirapé.
Fonte: Ministério do Meio Ambiente, ICMBIO e Ambiental Consulting, 2009.
O entorno da Rebio Tapirapé abrange parte da FLONA do Tapirapé-Aquiri
e uma área mínima da FLONA de Carajás e da APA do Igarapé Gelado. Fora do
raio de 10 km, mas com tamanha relevância, tem-se na região a FLONA de
Itacaiúnas e as Terras Indígenas Bacajá e Xikrin Cateté, ressaltando a
importância do resguardo da reserva em um contexto regional. Também é
importante no contexto de propostas de implementação de corredores de
Biodiversidade da Amazônia, que possuem o propósito de garantir a
sobrevivência do maior número de espécies e do equilíbrio dos ecossistemas
(Ministério do Meio Ambiente, ICMBIO e Ambiental Consulting, 2009).
Com relação aos aspectos climáticos, a região possui uma sazonalidade
bem marcada, com períodos chuvosos, denominados como inverno amazônico
durante os meses de novembro a maio, e o período seco, ocorrendo de julho a
setembro (Figura 3). A região apresenta regularidade térmica anual com média
variando em torno dos 33ºC. Os dados de pluviosidade e temperatura foram
obtidos no site do Instituto Nacional de Meteorologia – INMET
(http://www.inmet.gov.br), utilizando como base a estação meteorológica de
Marabá para o ano de 2016 e de Tucuruí para o ano de 2017. Dados de
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temperatura da estação meteorológica de Marabá não estão disponíveis para o
ano de 2017, utilizamos, portanto, os dados da estação da região mais próxima
(Tucuruí PA).
Figura 3. Gráfico da temperatura (ºC) e precipitação média (mm) do ano de 2016 na cidade de Marabá PA.
Fonte: INMET, Instituto nacional de meteorologia. http://www.inmet.gov.br. Acessado em
02/03/2017.
Figura 4. Gráfico da temperatura (ºC) e precipitação média (mm) do ano de 2017 na cidade de Tucuruí-PA.
Fonte INMET, Instituto nacional de meteorologia. http://www.inmet.gov.br acessado em
02/03/2017.
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2.2. Amostragem dos Médios e Grandes Mamíferos
Os animais foram amostrados com o uso de armadilhas fotográficas,
denominadas camera-trap. As armadilhas fotográficas são aparelhos compostos
por uma câmera fotográfica digital e sensores de calor e/ou movimento para
detecção no ambiente. São frequentemente utilizadas para fins
conservacionistas, em especial para estudos populacionais ou de comunidades
de mamíferos terrestres de médio e grande porte, segundo O’Connell et al.,
(2011).
Ao longo do trabalho, foram utilizadas armadilhas fotográficas leves,
resistentes a chuva e impactos e que apresentassem perfeita detectabilidade
para registro, ampla opção de configuração dos níveis de regulagem de sensor,
quantidade de disparos por detecção, regulagem de sensor de ambiente, tempo
de operação, registros de data, hora e temperatura.
Foram realizadas três campanhas de coleta de dados, sendo uma no ano
de 2016 nos meses de março a maio, outra no ano de 2017, nos meses de abril
a junho, e por fim, setembro de 2017 a janeiro de 2018.
O período de amostragem foi de aproximadamente dois meses por
campanha, e o número de armadilhas fotográficas efetivas variou de três a onze
ao longo dos anos de estudo ver Tabela 1.
Tabela 1. Número de armadilhas fotográficas e duração das campanhas durante os períodos
de amostragem de médios e grandes mamíferos na Reserva Biológica do Tapirapé.
Ano Período Números de
armadilhas
Tempo de
campanha
2016 março/maio 11 58 dias
2017 abril/junho 3 96 dias
2017/2018 outubro/janeiro 10 112 dias
Foram utilizados dois modelos de armadilhas fotográficas (Moultrie® M-
550 Gen2 e Bushnell®). As câmeras foram instaladas próximas a trilhas já
demarcadas na reserva (Figura 5), de acordo com a facilidade de acesso às
áreas e obedecendo a uma distância mínima de 1 km entre uma câmera e outra.
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Figura 5. Mapa do Brasil, estado do Pará e Reserva Biológica do Tapirapé, respectivamente, com os pontos onde as câmeras fotográficas foram instaladas.
Para aumentar a probabilidade de encontros foram selecionados locais
que apresentavam algum tipo de evidência de comportamento animal (trilha de
animais, locais de passagem, pontos de possível alimentação). Cada ponto de
amostragem continha uma câmera, cuja localização geográfica foi registrada
com o auxílio de um GPS. As armadilhas fotográficas foram posicionadas a uma
altura de 30 a 50 cm em relação ao solo (Figura 6), de modo a registrar a maior
quantidade de espécies possível, abrangendo desde espécies de tamanho
menor como, por exemplo, Didelphis sp, até mamíferos de maior porte, como
Tapirus terrestris (Trolle et al., 2008).
Conforme Tobler et al., (2008) e Srbek-Araujo & Chiarello, (2013), foram
consideradas como amostras independentes, os registros de cada espécie em
cada câmera dentro de um intervalo de uma hora. As câmeras permaneceram
em operação 24 horas por dia durante todo o período de amostragem.
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Figura 6: Instalação de armadilhas fotográficas na REBIO Tapirapé em uma das campanhas realizadas demonstrando a altura e posicionamento da câmera.
2.3. Análise de Dados
As análises de padrão de atividade foram realizadas utilizando a
estimativa de densidade Kernel para estimar as funções de densidade de
probabilidade de uma espécie estar ativa em um determinado horário do dia.
Também calculamos os índices de sobreposição dos padrões de atividade de
duas espécies, a fim de determinar o grau de sobreposição temporal nos padrões
de atividade entre espécies potencialmente competidoras. O índice varia de 0 a
1, onde valores mais próximos a 1 indicam maior sobreposição. Todas as
análises foram realizadas no software RStudio (Rstudio team, 2016), utilizando
o pacote activity (Rowcliff, 2016).
As análises de padrão de atividade incluíram todas as espécies acima
de 1kg de massa corporal cujo número de registros foi igual ou superior a seis
(Rowcliff, 2016). As informações de data e horário de cada registro foram
utilizadas para determinar os padrões de atividade das espécies.
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Registros fotográficos durante a instalação e manutenção foram
desconsiderados, da mesma forma que fotos de outros animais que não se
enquadram no foco da pesquisa como, por exemplo, aves e pequenos
mamíferos.
Os registros independentes foram classificados e quantificados de
acordo com os períodos de atividade definidos por Jiménez et al., (2010)
conforme se segue: espécies diurnas (quando o número de registros for inferior
a 10% durante os períodos escuros), espécies noturnas (número de registros
superior a 90% durante os períodos escuros), espécies com tendências diurnas
(entre 10% e 30% dos registros durante o período escuro), espécies com
tendência noturna (de 70 a 90% dos registros durante os períodos escuros),
espécies crepusculares (pelo menos 50% das observações durante períodos
crepusculares), espécies catemerais (atividades regularmente distribuídas entre
os períodos claro e escuro).
Os dados dos fotoperíodos para a área (Hemisfério Sul) foram obtidos a
partir de registros do observatório nacional (www.on.com.br). Foram utilizadas
as horas exatas do alvorecer e entardecer da data exata do registro para
determinar os eventos do nascer do sol e pôr-do-sol com maior precisão.
Foram considerados como dia (uma hora após o nascer do sol até uma
hora antes do pôr do sol), noite (uma hora depois pôr do sol até uma hora antes
do nascer do sol), crepúsculo (a partir de uma hora antes e uma hora depois do
nascer e do pôr do sol), como indicam Theuerkauf et al., (2003).
O esforço amostral foi calculado seguindo a fórmula adotada por Srbek-
Araujo, & Chiarello, 2013: número de armadilhas fotográficas multiplicado pelo
número de dias que as câmeras operaram (1d= 24h). Foi calculado o Índice de
Abundância Relativa (IAR) = Si /(N/100), onde Si é o número de registros
fotográficos independentes da espécie i, e N o esforço total e efetivo de
amostragem em armadilhas-dia (Nunes, Lessa, & Scoss, 2012).
Para preservar a independência das amostras, consideramos como
registro válido, apenas uma fotografia de cada espécie por câmera dentro de um
período de uma hora, isto é, se a mesma espécie foi registrada mais de uma vez
20
em sequência, na mesma câmera, dentro de um intervalo de uma hora, então
apenas um registro é considerado válido.
Os dados foram analisados em conjunto, sem separação de estações do
ano. Desse modo, foi utilizado o esforço total de câmeras para as análises dos
períodos de atividade.
3. RESULTADOS
Com um esforço total de 1160 câmeras/dia, foram obtidos 477 registros
de 18 espécies de médios e grandes mamíferos, pertencentes à 10 famílias
(Tabela 3) na Reserva Biológica do Tapirapé, entre os anos de 2016-2017/2018.
Das espécies que entraram na análise, a espécie com maior número de registros
foi Cuniculus paca, e a espécie com menor número de registros foi Nasua nasua,
ver Tabela 2.
Tabela 2. Espécie, número de registros, índice de abundância relativa (IAR) e porcentagem de
registros nas classificações de horários.
Espécie Nº de
registros (IAR) % Diurno % Crepuscular % Noturno
Cuniculus paca 96 8,27 1,04 96,88 2,08
Dasyprocta leporina 94 8,10 71,28 26,60 2,13
D. prymnolopha 28 2,41 67,8 28,5 3,5
Dasypus kappleri 15 1,29 0 13,3 86,6
D. novemcinctus 18 1,55 0 13,3 88,8
Leopardus tigrinus * 03 0.25
Mazama americana 66 5,68 25,76 21,21 53,03
Mazama nemorivaga 13 1,12 61,54 23,08 15,38
M. tridactyla* 02 0.17
Nasua nasua 06 0.51
Panthera onca* 04 0.34
Pecari tajacu 48 4,13 66,67 18,75 14,58
Priodontes maximus* 02 0.17
Puma concolor* 03 0.25
21
Espécie Nº de registros (IAR) % Diurno % Crepuscular % Noturno
Puma yagoauroundi* 01 0.08
S. brasiliensis* 02 0.17
Tapirus terrestris 29 2,50 24,1 17,2 58,6
Tayassu pecari 47 3,53 68,29 19,51 19,51
Espécies com (*) não entraram no cálculo do padrão de atividade por não terem número mínimo
de registros igual a seis.
O resultado das campanhas realizadas possibilitou conhecer as espécies
presentes na área de estudo (Tabela 3). Dentre as espécies amostradas, cinco
aparecem sob algum grau de ameaça na lista de animais ameaçados de
extinção. São elas: Panthera onca, Tayassu pecari, Tapirus terrestris,
Myrmecophaga tridactyla, Priodontes maximus.
Tabela 3. Espécies registradas na reserva biológica do Tapirapé nos anos de 2016 e
2017/2018, nome popular, classificação por horário e grau de ameaça segundo a IUCN 2014.
LC = Pouco preocupante; DD = Dados insuficientes; VU = Vulnerável; NT= Quase ameaçada.
Ordem Espécie Nome popular Classificação
de horário
Grau de
ameaça –
IUCN 2014
Artiodactyla Mazama
nemorivaga
Veado Roxo Tendência
diurna
LC
Artiodactyla Mazama
americana
Veado mateiro Catemeral DD
Artiodactyla Tayassu pecari Queixada Tendência
diurna
VU
Artiodactyla Pecari tajacu Caititu Tendência
diurna
LC
Carnivora Puma concolor* Onça Parda X LC
Quati de cauda
anelada
X LC
Carnivora Puma
yagoauroundi*
Gato Mourisco X LC
Carnivora Leopardus
tigrinus *
Gato Maracajá X VU
22
Cingulata Dasypus kappleri Tatu de 15
quilos
Tendência
noturna
LC
Cingulata Priodontes
maximus*
Tatu-canastra X VU
Cingulata
Dasypus
novemcinctus
Tatu-galinha Tendência
noturna
LC
Lagomorpha Sylvilagus
brasiliensis*
Tapiti – Coelho
do mato
X LC
Carnivora Panthera onca* Onça Pintada X NT
Perissodactyla Tapirus terrestris Anta Catemeral VU
Pilosa Myrmecophaga
tridactyla*
Tamanduá
Bandeira
X VU
Rodentia Cuniculus paca Paca Noturno LC
Rodentia Dasyprocta
leporina
Cutia Diurna LC
Rodentia Dasyprocta
prymnolopha
Cutia Diurno LC
Espécies com (*) não entraram no cálculo do padrão de atividade por não terem número mínimo
de registros igual a seis
3.1. Padrão de Atividade
A espécie Mazama nemorivaga, conhecida popularmente como veado
roxo, teve um total de 13 registros, sendo que destes, oito foram no período
diurno, 3 em períodos crepusculares e apenas 2 em período noturno. M.
nemorivaga possui um total de 15,38% (entre 10 e 30%) dos registros durante o
período escuro, caracterizando-a assim, segundo a classificação de Jiménez et
al (2010) como uma espécie com tendência diurna. As estimativas de densidade
Kernel para o padrão de atividade da espécie demonstram que esta espécie
possui maior probabilidade de estar ativa em dois horários distintos, um entre
6:00h e 11:00h e outro no período vespertino, entre 16:00h-18:00h (Figura 7),
corroborando sua tendência diurna.
23
Figura 7. Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Mazama nemorivaga
registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-2017/18.
Mazama americana, outra espécie de cervídeo conhecida como veado
mateiro, foi registrada 66 vezes, sendo 17 registros no período diurno, 14 em
períodos crepusculares e 35 no período noturno. A espécie não mostrou
nenhuma porcentagem dos registros que se enquadrasse nos critérios utilizados
para defini-la como diurna, noturna ou crepuscular, desde modo, a espécie se
classifica como catemeral, por estar ativa em diversos horários ao longo do dia.
Entretanto, ao analisarmos a probabilidade da densidade, é possível
observar que a espécie, apesar de estar ativa ao longo de todo o dia, possui uma
maior probabilidade de atividade durante os períodos crepuscular/ noturno
(Figura 8). Portanto, com base nas densidades de probabilidade e na maior
quantidade de registros concentrados entre períodos crepusculares/noturnos,
classificamos M. Americana, como uma espécie com tendência noturna.
24
Figura 8. Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Mazama americana registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-2017/18.
A espécie Tayassu pecari (queixada) teve um total de 47 registros sendo
que 34 são diurnos, 5 nos períodos crepusculares e 8 no noturno. A maior
concentração de registros ocorreu entre 11:00h e 14:00h. A espécie teve um total
de 19,51% de registros no período noturno caracterizando-a como uma espécie
com tendências diurnas. As estimativas de densidade de probabilidade
demonstram que T.pecari apresenta um pico de atividade no período
compreendido entre 11:00h e 14:00h, reduzindo sua atividade durante os
períodos noturno e crepusculares (Figura 9).
25
Figura 9. Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Tayassu pecari registrado
na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-2017/18.
Pecari tajacu, conhecido popularmente como caititu ou cateto é uma
espécie pertencente à mesma família de T. pecari (Tayassuidae) e, deste modo,
espera-se que suas atividades sejam semelhantes às de T. pecari. Conforme a
proporção de registros e os critérios definidos, P. tajacu pode ser classificado
como uma espécie com tendências diurnas. O número total de registros obtidos
foi de 48, sendo sete de registros no período noturno , 32 no período diurno e
nove no período crepuscular. De acordo com as estimativas de probabilidade de
densidade, verificamos dois picos de atividade desta espécie (Figura 10), sendo
um concentrado entre o início da manhã (7:00h) e meio-dia e outro ao final do
dia (18:00h). A espécie reduz consideravelmente suas atividades durante o
período noturno.
26
Figura 10. Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Pecari tajacu registrado
na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-2017/18.
As espécies de tatus, pertencentes à família Dasypodidae, Dasypus
kappleri (tatu quinze quilos) e Dasypus novemcinctus (tatu-galinha) possuem,
ambas, tendências noturnas. Dasypus kappleri foi registrada 15 vezes durante o
período de estudo, sendo dois destes registros no período crepuscular e 13 no
período noturno. Dasypus novemcinctus, por sua vez, apresentou 88,8% dos
registros durante o período noturno (16 registros) e apenas dois registros no
período diurno.
As estimativas de densidade das duas espécies revelam picos de
atividade entre os períodos crepusculares e noturnos. Algumas diferenças
podem ser notadas no padrão de atividade destas espécies. D. kappleri
apresenta dois picos de atividade, principalmente no início da manhã, entre
5:00h e 6:00h, e no final do dia, entre 18:00h e 20h (Figura 11). O animal mantém
sua atividade concentrada nos horários noturnos, reduzindo ou quase cessando
as atividades durante o dia.
O tatu galinha (D. novemcinctus), entretanto, tem seu pico de atividade
concentrado nos horários da madrugada, aumentando sua atividade após as
18:00h e seguindo bastante ativo até o final da madrugada (4:00h – 5:00h)
27
(Figura 12). Os dois registros desta espécie durante o período diurno podem ser
considerados uma exceção no padrão de atividade da mesma.
Figura 11. Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Dasypus kappleri registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-2017/18.
Figura 12. Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Dasypus novemcinctus
registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-2017/18.
28
A anta é uma espécie da Ordem Perissodactyla, família Tapiridae e é o
maior mamífero terrestre das Américas. Considerada pela IUCN como
Vulnerável, essa espécie tem ampla distribuição geográfica e suas principais
fontes de ameaça são a caça e perda de habitat (Naveda et al., 2015).
Tapirus terrestris foi classificada, de acordo com o número de registros
apresentados durante o período de estudo, como uma espécie catemeral. O que
significa que realiza atividades em diversos horários do dia. Tal espécie foi
registrada 29 vezes, sendo sete registros durante o dia (24,1%), cinco nos
períodos crepusculares (17,2%) e 17 nos períodos noturnos (58,6%) com o pico
de atividade durante os horários de 18:00 as 22:00. As estimativas de densidade
apontam dois picos de atividade dessa espécie, concentrados, especialmente
nos períodos noturnos entre 18:00h e 22:00h e 2:00h e 5:00h (Figura 13)
Figura 13. Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Tapirus terrestris
registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-2017/18.
29
Cuniculus paca, vulgarmente conhecida como paca, é a espécie que
apresenta o maior número de registros (96). Destes, apenas um ocorreu no
período diurno, dois em período crepuscular e 93 registros no período noturno.
Por ter 96,88 % dos registros durante a noite, a espécie é classificada como
noturna. As estimativas de probabilidades de ocorrência, demonstram que C.
paca possui um pico de atividade bastante duradouro, que se estende das
18:00h até o início do dia (5:00h), cessando suas atividades nos horários diurnos
entre 7:00h e 17:00h (Figura 14).
Figura 14. Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Cuniculus paca
registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-2017/18.
As duas espécies de cutias (Dasyprocta leporina e D. prymnlomopha),
registradas na Reserva Biológica do Tapirapé durante o período de estudo,
apresentam um padrão de atividade diurno, diferenciando-se quanto aos
horários de maior intensidade nas atividades. Dasyprocta leporina foi registrada
um total de 94 vezes, sendo 67 dos registros concentrados no período diurno
(74,2%), 25 nos períodos crepusculares (26,60%) e apenas dois (2,13%) no
período noturno. A espécie alcançou um total de menos de 10% dos registros
em períodos noturnos, o que a caracteriza como espécie diurna. Esta espécie
30
apresenta, de acordo com as probabilidades de densidade, dois picos de
atividade; um no início da manhã, entre 6:00h e 10:00h e outro durante o
período vespertino, entre 12:00h e 18:00h (Figura 15).
Com relação à Dasyprocta prymnlomopha, os picos de atividade
demonstrados pela probabilidade de densidade são das 6:00h as 11:00h e das
16:00h as 18:00h, reduzindo muito suas atividades nos períodos mais quentes
do dia, entre 12:00h e 15:00h (Figura 16). Dasyprocta prymnolopha foi registrada
um total de 28 vezes, dos quais, apenas um ocorreu no período noturno, oito no
período crepuscular e 19 no período diurno. Essa espécie apresentou apenas
3,5 % dos registros noturnos, o que caracteriza um comportamento diurno.
Figura 15. Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Dasyprocta leporina
registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-2017/18.
31
Figura 16. Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Dasyprocta prymnolopha
registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-2017/18.
A espécie Nasua nasua conhecida popularmente como quati de cauda
anelada foi a espécie com o menor número de registros das espécies análisadas,
com apenas seis. O padrão foi exclusivamente demonstrado no período diurno,
com os registros chegando a totalidade de 100%. O pico de atividade é
registrado no período a partir das 08:00h até as 12:00h.
Figura 17. Gráfico da densidade de Kernel de padrão de atividade de Nasua nasua registrado na Reserva Biológica do Tapirapé durante os anos de 2016-2017/18.
32
3.2. Sobreposição Temporal
Para Frey e colaboradores (2017), as análises de sobreposição temporal
entre espécies simpátricas são frequentemente utilizadas para determinar a
sobreposição de nicho entre espécies ou demonstrar adaptações no nicho, de
modo a evitar a competição por recursos.
Análises de sobreposição nos padrões de atividades das espécies foram
realizadas utilizando as estimativas de probabilidade de densidade e o índice
Dhat 1, que reflete a probabilidade de duas espécies estarem ativas durante o
mesmo período do dia. Os resultados demonstram um alto índice de
sobreposição entre as espécies Mazama americana e Tapirus terrestris (Dhat =
0,78), Tayassu pecari e Pecari tajacu (Dhat = 0,76), Dasyprocta prymnolopha e
Dasyprocta leporina (Dhat = 0,76). Esses pares de espécies apresentaram maior
índice Dhat 1, onde valores mais próximos a 1 indicam maior sobreposição. As
espécies Cuniculus paca e Tapirus terrestris (Dhat = 0,68), Dasypus
novemcinctus e Dasypus kappleri (Dhat = 0,65) apresentaram índices
intermediários de sobreposição temporal. E por fim, os menores valores de
índices de sobreposição entre as espécies analisadas foram encontrados entre
Mazama americana e Mazama nemorivaga (Dhat = 0,53), Mazama nemorivaga
e Tapirus terrestris (Dhat = 0,46) e Cuniculus paca x Dasyprocta leporina (Dhat =
0,15).
O alto índice de sobreposição entre Mazama americana e Tapirus
terrestris evidencia um compartilhamento temporal do uso do espaço. A figura
18 demonstra que as duas espécies se mostram ativas durante o período
noturno, entre 0:00h e 6:00h reduzindo suas atividades entre 7:00h e 17:00h e
voltando a aumentar suas atividades, ainda que de modo diferencial, a partir das
18:00h.
33
Figura 18: Gráfico de sobreposição entre as espécies Mazama americana e Tapirus terrestris na Reserva biológica do tapirapé, indicando um alto nível de sobreposição (Dhat = 0,78).
O alto índice de sobreposição (Dhat 1 = 0,76) entre as espécies Tayassu
pecari e Pecari tajacu demonstra que essas, espécies realizam suas atividades
durante os mesmos horários do dia. A figura 20 revela que as duas espécies se
mostram mais ativas durante o período diurno, entre as 06:00h e 12:00h tendo
uma redução nas atividades entre 13:00h e 17:00h, e voltando a aumentar as
suas atividades a partir das 17:00h para depois reduzir até quase cessar as
atividades, das 18:00h as 00:00h.
34
Figura 19. Gráfico de sobreposição entre as espécies Tayassu pecari e Pecari tajacu indicando um alto nível de sobreposição (Dhat = 0,76).
O alto índice de sobreposição entre Dasyprocta prymnolomorpha e
Dasyprocta leporina demonstra que estes animais também compartilham do
mesmo espaço e tempo em um determinado período. A figura 20 demonstra que
as espécies possuem hábitos que se sobrepõe por volta das 06:00h até as 11:00,
reduzindo suas atividades a partir das 12:00h. Por volta das 13:00h as 18:00 a
espécie Dasyprocta prymnolomorpha exibe o maior pico de atividade, enquanto
o período de maior atividade de sua congênere ocorre no início da manhã. As
duas espécies cessam suas atividades durante o período noturno, diferente de
outros roedores que são, em sua maioria, noturnos.
Figura 20. Gráfico de sobreposição entre as espécies Dasyprocta prymnolomorpha e Dasyprocta leporina indicando um alto nível de sobreposição (Dhat = 0,76).
35
Cuniculus paca e Tapirus terrestris apresentam um índice de
sobreposição temporal Dhat1 = 0,68 (Figura 21), demonstrando que estes
animais sobrepõem suas atividades em determinados períodos do dia. Ambos
possuem seus picos de atividades em períodos do anoitecer. Entretanto,
enquanto C. paca aumenta suas atividades ao longo da madrugada, T. terrestris
parece reduzir.
Figura 21. Gráfico de sobreposição entre as espécies Cuniculus paca e Tapirus terrestris
indicando um médio nível de sobreposição (Dhat = 0,68).
Os tatus (Dasypus novemcinctus e Dasypus kappleri) são espécies de
porte e dieta semelhantes. As duas espécies apresentam sobreposição em seus
períodos de atividades, dividindo espaço no ambiente nos mesmos horários.
Ambos são mais ativos nos períodos noturnos com picos de atividade a partir
das 18:00h até as 06:00h ainda que em proporções diferentes. Durante o dia
(06:00h as 18:00h) os animais chegam a praticamente cessar suas atividades
atividade (Figura 22).
36
Figura 22: Gráfico de sobreposição entre as espécies Dasypus novemcinctus e Dasypus kappleri indicando um nível médio de sobreposição (Dhat = 0,68).
As espécies Mazama americana e Mazama nemorivaga, assim como os
tatus, apresentaram um grau intermediário de sobreposição. Embora exerçam
suas atividades de forrageamento durante boa parte do dia, as duas espécies
diferem quanto à preferência por alguns horários. Mazama nemorivaga possui
um pico intenso de atividade no período de 06:00h com uma queda por volta de
12:00h com crescimento logo em seguida das 13 até as 17:00h com pouca
atividade nos períodos que antecedem o anoitecer e o amanhecer (Figura 23).
Já a espécie Mazama americana possui picos de atividade por volta de 00:00 e
04:00 com flutuação média de atividade durante o dia, até outro pico que se inicia
as 20:00h.
37
Figura 23: Gráfico de sobreposição entre as espécies Mazama americana e Mazama nemorivaga indicando um nível de sobreposição igual a Dhat = 0,53.
A análise de sobreposição para Mazama nemorivaga e Tapirus terrestris
demonstra que as espécies apresentam pouca sobreposição, ocorrendo
apenas em alguns períodos do dia. Mazama nemorivaga possui um pico
intenso de atividade de maneira geral nos períodos compreendidos entre 06:00
e 11:ooh e 15:00h-18:00h, com pouca atividade nos períodos após o anoitecer
e antes do amanhecer. Já Tapirus terrestris, possui pico de atividade por volta
de 00:00h até as 05:00h, com pouca atividade durante o dia. As duas espécies
são herbívoras e compartilham o mesmo espaço, segregando suas atividades
temporalmente.
38
Figura 24: Gráfico de sobreposição entre as espécies Mazama nemorivaga e Tapirus terrestris
indicando um médio nível de sobreposição (Dhat = 0,46).
As espécies de roedores Cuniculus paca e Dasyprocta leporina,
mostraram o menor índice de sobreposição tendo dhat = 0,15, mostrando que
estes animais praticamente não se sobrepõe tendo em vista que os padrões de
atividade são bem distintos com D. leporina sendo classificada como diurna e C.
paca sendo classificada como noturna.
Figura 25: Gráfico de sobreposição entre as espécies Cuniculus paca e Dasyprocta leporina
indicando um médio baixo de sobreposição (Dhat = 0,15).
39
4. DISCUSSÃO
Este foi o primeiro estudo com dados diretos a investigar a fauna de
mamíferos de médio e grande porte da REBIO Tapirapé. No ano de 2009, um
estudo realizado com dados indiretos estimou a ocorrência de 22 espécies de
médios e grandes mamíferos nesta Unidade de Conservação (Ministério do Meio
Ambiente, ICMBIO e Ambiental Consulting, 2009).
O presente trabalho demonstrou alta eficiência no método de
armadilhamento fotográfico pra inventariar médios e grandes mamíferos. Com
um esforço total de 1160 câmeras/dia, obtivemos 477 registros de 18 espécies
de médios e grandes mamíferos terrestres, pertencentes à 10 famílias na
Reserva Biológica do Tapirapé. Carvalho e colaboradores (2014) registraram 21
espécies de médios e grandes mamíferos na Floresta Nacional de Carajás, área
que faz parte do mosaico onde a REBIO Tapirapé está inserida. É importante
ressaltar que no trabalho de Carvalho et al (2014), vários métodos foram
utilizados para amostrar os mamíferos que incluem, não só os mamíferos
terrestres, como também os primatas arborícolas e mamíferos aquáticos.
Botelho et al. (2012), utilizando camera-traps para inventariar espécies na
Amazônia Ocidental, registrou dez espécies (17%) de mamíferos com um
esforço de 850 cameras/dia. Um estudo subsequente, realizado por Negrões et
al (2012) que demonstra a importância de áreas privadas para proteger a fauna
nativa de uma região de ecótono Cerrado-Amazônia no Sudeste do Pará (450Km
de distância da REBIO), registrou 23 espécies de médios e grandes mamíferos,
utilizando um esfoço de 4746 cameras/dia. O sucesso de Negrões e
colaboradores em registrar 23 espécies de mamíferos fora de uma Unidade de
Conservação, reafirma a relação direta entre esforço/riqueza e, mesmo o
presente trabalho registrando 82% da fauna de médios e grandes mamíferos
prevista (segundo o primeiro levantamento realizado na área) para a REBIO
Tapirapé, há várias espécies representadas apenas por uma ou duas fotografias,
demonstrando a dificuldade de capturar espécies raras
40
É importante levar em consideração que o resultado dos registros
depende do grau de detectabilidade, que varia de acordo com o tamanho e
padrão de atividade dos animais, por exemplo, espécies maiores tendem a ser
mais fotografadas do que menores (Anile & Devillard, 2016). Outros fatores a
serem considerados, dizem respeito à habilidade de locomoção, área de vida e
densidades populacionais das espécies. Espécies com extensas áreas de vida,
como a onça-pintada (Panthera onca) e a onça parda (Puma concolor), além de
apresentarem hábitos bastante inconspícuos e baixas densidades
populacionais, percorrem extensas áreas dentro do habitat, o que dificulta sua
detectabilidade (Azevedo & Murray, 2007). O número de espécies de médios e
grandes mamíferos terrestres presentes na REBIO Tapirapé parece ainda não
ter sido completamente amostrado, visto que após dois anos de monitoramento,
continuamos acrescentando espécies à lista. Uma das espécies mais recentes
registradas na reserva foi o tamanduá-bandeira (Myrmecophada tridactyla). Este
fato ressalta a importância de trabalhos de longo prazo para a aquisição de
dados robustos e confiáveis sobre as espécies e seus hábitats.
De acordo com Van Schaik & Griffiths (1996), o padrão de atividade dos
mamíferos pode estar relacionado com seus tamanhos corporais. Mamíferos
menores, tendem a apresentar hábitos noturnos, como forma de estratégia anti-
predação, enquanto mamíferos maiores apresentam tendências mais diurnas ou
catemerais, devido aos seus requerimentos energéticos mais elevados. Os
resultados do presente trabalho demonstram que os grandes mamíferos
amostrados (Tapirus terrestris, M.americana, M.nemorivaga, T.pecari. P.tajacu)
corroboram essa afirmativa. Conforme apresentado por Talamoni & Assis
(2009), grandes herbívoros como a anta apresentam um padrão de consumo
semelhante à da maioria dos herbívoros não ruminantes, consumindo uma
grande proporção de matéria orgânica vegetal, de baixa qualidade energética.
Tal fato, faz com que esses grandes herbívoros forrageiem durante uma elevada
quantidade de tempo para suprir seus requisitos energéticos. Além do fator
tamanho corpóreo ou estratégias para evitar a predação, outro fator que deve
ser levado em consideração por poder influenciar nos padrões de atividade dos
mamíferos, é a competição por recursos (Gómez et al., 2005).
41
A espécie Mazama nemorivaga por muito tempo foi confundida com
Mazama gouazoubira até que Rossi (2000), diferenciou estas espécies,
apontando que os cariótipos de populações de Mazama gouazoubira da Mata
Atlântica e Cerrado diferiam daqueles das populações da Amazônia. Desse
modo, os veados roxos da Amazônia foram separados das populações de M
gouazoubira encontrados nas regiões Sudeste e reclassificados, como uma
espécie distinta, restrita à porção amazônica, agora chamada de Mazama
nemorivaga. Por sua recente classificação e inconsistências taxonômicas entre
populações do leste e oeste amazônico (Duarte et al, 2008), esta espécie ainda
apresenta poucos estudos a respeito de sua história natural. No presente estudo,
Mazama nemorivaga foi classificado como uma espécie de tendência diurna,
com o maior número de registros durante esse período, o que é corroborado pelo
trabalho feito por Espinosa & Salvador, 2017. Por outro lado, M.americana
apresenta atividade durante todo o período do dia, sendo classificado como
catemeral, assim como apontado por Gómez et al (2005).
Azevedo (2008) aponta ainda, que M. nemorivaga apresenta um
padrão de segregação temporal, quando em simpatria com M. americana, fato
que parece ocorrer na REBIO Tapirapé, onde as espécies parecem segregar
seus períodos de atividade. Outros autores também verificaram sobreposição
temporal parcial, ocorrendo em alguns períodos específicos. Por exemplo,
Rivero et al. 2005, demonstram que entre as duas espécies de Mazama, só não
houve sobreposição nas atividades no intervalo de 14:00 às 18:00h. Tobler et al.
2009 também relatam que não houve sobreposição durante os períodos de
atividade de M.americana e M. nemorivaga, nos intervalos de 10:00 a 11:00h e
22:00 a 23:00h.
Apesar de suas semelhanças, a espécie Mazama americana é maior e
mais forte do que Mazama nemorivaga (Varela et al.,2010 ). Desse modo, a
opção de M.nemorivaga concentrar suas atividades horários mais quentes do
dia, pode ser uma estratégia para evitar o encontro com M. americana, e
consequentemente, um confronto ou competição direta pelo recurso. De acordo
com Ferrari (2005), as espécies que possuem parentesco filogenético e
compartilham de semelhança morfológica e ecológica tendem a diferir no uso
dos seus recursos para evitar confronto ou competição por interferência
42
Dos animais estudados no presente trabalho, três apresentaram comportamento
com tendência diurna, sendo dois deles os porcos (Tayassu pecari e Pecari
tajacu). Os porcos apresentaram padrão de atividade de espécies com
tendências diurnas. Esse resultado está de acordo com Gómez et al (2005), que
mostra que esses animais em áreas preservadas apresentam uma predileção
pelo período diurno.
Pecari tajacu apresentou dois picos de atividade durante o dia, um
próximos as 09:00h e outro as 18:00, evitando então as horas mais quentes do
dia, se assemelhando ao padrão observado por Rowcliffe et al. (2014.) Este
animal geralmente é diurno porém podem apresentar alguma atividade durante
a noite (Gómez et al 2005, Rowcliffe et al. 2014, Luna, 2014).
O alto índice de sobreposição nos períodos de atividade entre T. Pecari
e P. tajacu (Dhat1 = 0,76) na REBIO Tapirapé estão relacionados à história
evolutiva das espécies, que se adaptaram de forma parecida ao ambiente
(temperatura, luz, disponibilidade de comida) fazendo com que assim, se
assemelhem em relação às dimensões de seus nichos (Luiz, 2008)
Trabalhos recentes avaliaram os padrões de sobreposição de nicho
entre T. pecari e P. tajacu, baseados na sua dieta (Desbiez et al., 2009). As duas
espécies alimentam-se preferencialmente de frutos, raízes e folhas (Olmos,
1993). Entretanto, P.tajacu apresenta uma dieta mais ampla do que T.pecari,
podendo, inclusive associar-se a quatis e bugios (Allouata caraya) para se
alimentar dos frutos derrubados por estes.
O trabalho de Desbiez e colaboradores (2009) aponta que as duas
espécies de porcos do mato, como são comumente chamadas, apesar de
apresentarem semelhanças na dieta e período de atividade, segregam seus
nichos apresentando preferências com relação aos itens alimentares
consumidos e comportamentos ecológicos. Por exemplo, catetos cavam buracos
que podem chegar a 50cm de profundidade e restringem suas atividades de
forrageamento a uma área menor, ao passo que queixadas (T.pecari) andam em
grupos numerosos, forrageando superficialmente sobre a serapilheira e por
áreas maiores. Além disso, outra estratégia para evitar a competição é a
exploração do habitat em diferentes escalas espaciais. Keuroghlian & Eaton
(1993) concluíram que os catetos respondem às diferenças na vegetação em
43
pequena escala, concentrando suas atividades em locais onde há maior
concentração de palmeiras, enquanto T.pecari responde às mudanças na
disponibilidade de alimentos em larga escala, especialmente relacionadas à
disponibilidade de frutos da palmeira Attalea phalerata.
O padrão noturno apresentado por Dasypus novemcinctus na REBIO
Tapirapé é corroborado por outros trabalhos (Rowcliffe et al. 2014; Norris et al.
2010). Assim como reportado neste estudo, essa espécie de tatu também pode
ser observada durante o dia, dependendo da temperatura do ambiente e da
classificação etária, conforme relatado por MacDonough & Loughry (1994). Esta
espécie alimenta-se principalmente de invertebrados (Sikes, 1990), mas pode
consumir vegetais, carniça, ovos e pequenos vertebrados (Anacleto, 2007;
Loughry et al, 2014).
Dasypus kappleri é a maior espécie do gênero Dasypus, endêmica na
América do Sul, está estritamente associada ao bioma Amazônico, dentro do
qual se estende pela Venezuela, Colômbia, Peru, Equador, norte da Bolívia e
Brasil (Wetzel et al. 2008). Seus padrões de atividade e dieta se assimilam com
o de Dasypus novemcinctus (Barreto, Barreto, Alessandro, Url, & Morrison,
2013).
A alta sobreposição nos horários de atividade entre D.novemcinctus e
D.kappleri está ligada a fatores evolutivos, pois as duas espécies são
filogeneticamente próximas, o que faz com que tenham hábitos bastante
semelhantes (Feijó et al., 2018). Pouco se sabe a respeito da biologia de
D.kappleri, o que torna difícil inferir padrões de diferenciação de nicho.
Entretanto, alguns aspectos de sua história natural descritos por (Szeplaki et al,
1998, Röeh, 2007), como a preferência por hábitats primários, pouca tolerância
a alterações antrópicas, hábitos noturnos e solitários e dieta composta por
insetos, pequenos vertebrados e eventualmente matéria vegetal nos permitem
inferir que a coexistência entre D.novemcinctus e D.kappleri pode estar
relacionada com o uso restrito do hábitat de D.kappleri e com suas habilidades
de escavar túneis com profundidade maior do que os escavados por
D.novemcinctus.
O padrão de atividade de Tapirus terrestris foi classificado como
catemeral, e não noturno, por não entrar nos 90% de registros durante a noite.
44
Porém, o que se pode notar é que a espécie tem preferencia por atividades
noturnas, onde as horas de pico de movimento são após o pôr do sol e antes do
nascer do sol, assim como reportado por Noss et al., (2003) e o de Tobler,
(2013). Os resultados do presente trabalho, vão de acordo com os já reportados
por Van Schaik & Griffiths (1996) que afirmam que os mamíferos de grande porte
tendem a ser catemerais devido à grande necessidade energética. Entretanto,
diferemente da maioria dos grandes mamíferos que geralmente possuem
hábitos bem mais regulares durante as 24h, a anta tem preferência por horários
mais escuros, o que, segundo Medici (2010) e Foerster & Vaughan, (2002), pode
ser explicado pela sua baixa relação superfície/ volume, que favorece a
dispersão de calor corporal.
Tapirus terrestres apresentou uma alta sobreposição temporal com
M.americana (Dhat1 = 0,78) e com M.nemorivaga (Dhat1 = 0,46), o que pode ser
explicado pela guilda trófica que ambos ocupam e pela relação do tamanho
corporal com a aquisição energética. Apesar de ambos pertencerem à mesma
guilda dos herbívoros, suas dietas são bastante distintas, o que reduz a
sobreposição de nicho entre as espécies. A anta, por exemplo, possui uma
grande plasticidade alimentar podendo se alimentar de plantas herbáceas,
arbustivas e palmeiras, além de folhas, brotos e ramos jovens, frutos e até
cascas de arvores (Bachand, Trudel, & Ansseau, 2009). Por outro lado, a espécie
Mazama americana possui dieta basicamente composta em frutos, fungos e
plantas. Tal dieta diferenciada implica que estes animais conseguem
compartilhar o espaço em busca de alimento ao mesmo tempo, explicando assim
o alto índice de sobreposição, assim como pra M.nemorivaga que possui nicho
semelhante ao de M.americana.
Os registros evidenciaram alguns padrões de atividades que já
esperados, como o de Cuniculus paca, que demonstra um padrão quase
exclusivamente noturno, como dito por Michalski & Norris, 2011. As pacas são
animais frugívoros, excelentes dispersores de sementes, solitários e noturnos
(Eisemberg & Redford, 1999). As pacas possuem um sofisticado e especializado
sistema visual, composto por uma estrutura que aumenta a sensibilidade da
retina (tapetum lucidum), aumentando sua habilidade visual nos períodos
escuros (Silveira et al., 1989). Esta habilidade visual permite que esta espécie
45
de roedor evite a competição por recursos com outros roedores, como as cutias,
que não apresentam tal estrutura em sua morfologia ocular. Deste modo, as
diferenças morfológicas moldadas pelas histórias evolutivas de possíveis
competidores (Cuniculus paca) e (Dasyprocta spp.) (Lambert et al., 2009),
parece ser o fator que melhor explica a baixa sobreposição de nicho entre estas
duas espécies.
A sobreposição temporal entre Cuniculus paca e Tapirus terrestris
revelou-se relativamente alta (Dhat1 = 0,68). As duas espécies concentram uma
parte considerável de suas atividades nos períodos noturno e/ou crepuscular.
Entretanto, apesar de sua elevada sobreposição temporal, ambas diferem com
relação à dieta e uso do espaço, conforme já abordado anteriormente. A
segregação de nicho, neste caso, ocorre por fatores ecológicos como dieta e uso
do espaço, ainda que haja sobreposição parcial nos períodos de atividade.
Os roedores do gênero Dasyprocta (cutias) pertencem à família
Dasyproctidae sendo esta, dividida em dois gêneros Dasyprocta (cutia) e
Myoprocta (cotiara). As cutias normalmente são de hábitos diurnos, mas podem
reverter para uma atividade noturna ou crepuscular quando submetidas à
extrema interferência humana ou predação (MERITT JR, 1983).
Dasyprocta leporina apresentou um padrão de atividade
predominantemente diurno, sendo mais ativa no início da manhã e final da tarde,
padrão corroborado pela literatura (Reis et al., 2010). Assim como Dasyprocta
prymnolopha, que possui mesmo padrão de atividade, ainda que com picos
dessas atividades em horários diferentes.
Como muitas espécies de roedores, as cutias são frugívoras, com
hábitos escavadores de esconder e procurar reservas de sementes para uso
futuro ou quando houver escassez de sementes (Vander wall, 1990). Essa
estratégia permite a diminuição da competição por recurso. Quando os frutos
tornam-se escassos, as cutias passam menos tempo descansando e mais tempo
forrageando, procurando por sementes que enterraram anteriormente (Smythe,
1978).
46
Os roedores do gênero Dasyprocta apresentaram elevada sobreposição
em seus períodos de atividade. Ambos são muito próximos filogeneticamente e
possuem hábitos e nichos muito semelhantes, então a sobreposição indica que
estes animais disputam alimento e espaço ao mesmo tempo. Por ser uma
unidade de conservação de uso integral e de difícil acesso à população, a
Reserva Biológica do Tapirapé conta com uma grande disponibilidade de
recursos alimentícios para esses roedores, o que pode contribuir em influenciar
diretamente nessa sobreposição de nicho entre estas duas espécies, reduzindo
o impacto competitivo. Além disso, ambas possuem picos de atividades em
horários distintos, o que reduz um pouco essa competição. Outro fator que pode
reduzir a sobreposição de nicho entre D.leporina e D. prymnlomopha está no fato
de cutias serem espécies bastante territoriais e restritas à sua área. Smythe
(1978) estudou Dasyprocta punctata no Panamá e verificou que os indivíduos
vivem em pares permanentes, restritos a territórios de 2 a 3ha, com áreas fixas
de alimentação e repouso, tornando-se mais agressivas quando o alimento é
escasso.
Nasua nasua por sua vez apresentou um padrão de atividade
totalmente diurno, com os registros chegando a uma totalidade de 100%. A
espécie apresentou dois picos de atividade, um no início da manhã e outro no
fim da tarde, padrão este semelhante ao que Bianchi (2009) demonstrou em seu
trabalho. Outros trabalhos (Rowcliffe et al., 2014), (Gómez et al., 2005) também
corroboram com o resultado de padrão diurno apresentado por Nasua nasua.
47
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho é pioneiro na confirmação de possíveis registros das
espécies de médios e grandes mamíferos na REBIO Tapirapé. É ainda, pioneiro
quando tratamos de monitoramento a longo prazo destas espécies, identificando
padrões de atividade dos médios e grandes mamíferos de uma região altamente
impactada por atividades antrópicas. O fato de 18 espécies de médios e grandes
mamíferos terem sido registradas com sucesso e confiabilidade demonstra a
importância da manutenção dessa área para a preservação de processos
ecológicos locais e regionais. Adicionalmente, aproximadamente 1/3 das
espécies está sob algum grau de ameaça de extinção. São elas: Panthera onca,
Tayassu pecari, Tapirus terrestris, Myrmecophaga tridactyla, Priodontes
maximus. Diante deste quadro, fica clara a importância da Reserva Biológica do
Tapirapé para a manutenção das populações destas espécies e,
consequentemente, de todos os serviços ecológicos a elas associados.
Notadamente, apesar do elevado número de registros de todas as
espécies, um pequeno número de espécies com ocorrência potencial na área
ainda não foi registrada. Sabendo que há uma forte correlação entre esforço e
riqueza, faz-se necessário continuar o monitoramento de espécies na região,
ampliando as espécies-alvo e variando metodologias, para que seja possível
confirmar a presença de espécies arborícolas e aquáticas.
O presente trabalho evidenciou que espécies potencialmente
competidoras demonstram diferentes mecanismos e estratégias de coexistência,
que variam entre segregação temporal parcial/total e segregação espacial ou
uso diferencial do espaço. Estudos adicionais com foco nas densidades
populacionais, uso diferencial do espaço e preferências de habitat e dieta das
espécies podem complementar a elucidação das estratégias de coexistência das
espécies na REBIO Tapirapé.
Algumas espécies importantes para a manutenção da complexa cadeia
ecológica, como os grandes felinos foram pouco registradas. A ampliação do
esforço amostral associada a um trabalho com foco em espécies específicas
podem responder questões como relação predador/presa, padrão de atividade
de grandes predadores e preferências alimentares de grandes carnívoros.
48
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