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VALUE STREAM MAPPING: UM ESTUDO DE CASO EM UMA CERVEJARIA DE GRANDE PORTE Diego Damasio de Lima (UNISINOS) [email protected] MATEUS GIRARDI TEGNER (UNISINOS) [email protected] Douglas Rafael Veit (UNISINOS) [email protected] Secundino Luis Henrique Corcini Neto (UNISINOS) [email protected] Este artigo tem como objetivo apresentar uma aplicação do uso da ferramenta VSM (Value Stream Mapping) em uma Cervejaria de grande porte instalada na região nordeste do Brasil. A análise aconteceu em uma planta industrial composta por 7 linhas de produção e mais de 600 funcionários, com grande representatividade econômica na região. Trazendo uma breve revisão do tema abordado, o trabalho demonstra a implantação de iniciativas Lean em um sistema de produção não enxuto, abordando uma família de produtos da empresa estudada. Por fim, é desenvolvida uma análise que compreende no entendimento do sistema, como um todo, além de pontuar especificamente onde devem ser eliminados os desperdícios do sistema. Palavras-chave: VSM, Mapeamento do Fluxo de Valor, cervejaria, lean, manufatura enxuta XXXV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Perspectivas Globais para a Engenharia de Produção Fortaleza, CE, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2015.

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VALUE STREAM MAPPING: UM

ESTUDO DE CASO EM UMA

CERVEJARIA DE GRANDE PORTE

Diego Damasio de Lima (UNISINOS)

[email protected]

MATEUS GIRARDI TEGNER (UNISINOS)

[email protected]

Douglas Rafael Veit (UNISINOS)

[email protected]

Secundino Luis Henrique Corcini Neto (UNISINOS)

[email protected]

Este artigo tem como objetivo apresentar uma aplicação do uso da

ferramenta VSM (Value Stream Mapping) em uma Cervejaria de

grande porte instalada na região nordeste do Brasil. A análise

aconteceu em uma planta industrial composta por 7 linhas de

produção e mais de 600 funcionários, com grande representatividade

econômica na região. Trazendo uma breve revisão do tema abordado,

o trabalho demonstra a implantação de iniciativas Lean em um sistema

de produção não enxuto, abordando uma família de produtos da

empresa estudada. Por fim, é desenvolvida uma análise que

compreende no entendimento do sistema, como um todo, além de

pontuar especificamente onde devem ser eliminados os desperdícios do

sistema.

Palavras-chave: VSM, Mapeamento do Fluxo de Valor, cervejaria,

lean, manufatura enxuta

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1. Introdução

O mercado de consumo de cerveja brasileiro é praticamente delineado por um monopólio.

Sendo que uma grande empresa tem participação de marketshare de mais de 70%, enquanto

as demais, se espremem nos 30% restantes. A empresa objeto dessa pesquisa está inserida na

faixa dos 30% de participação de mercado. Mas essa realidade nem sempre foi assim. Em

meados dos anos 90, haviam pelo menos duas grandes marcas de forte atuação no mercado

cervejeiro brasileiro, com uma concorrência ampla e de forma igual em termos de força de

atuação. Entretanto, um processo de fusões consolidou uma gigante cervejeira que, na

sequência, se tornaria a maior cervejaria em termo de volumes de produção do mundo

(CORRÊA e PROCHNO, 1998; HIGUTHI e GRACIOSO, 2002; CAMARGOS e

BARBOSA, 2001).

Diante desse cenário de dificuldade de penetração e voracidade na concorrência, o Value

Stream Mapping (VSM) auxilia no entendimento das oportunidades da empresa em eliminar

suas perdas e assim poder, de alguma forma, adquirir forças econômicas e táticas para brigar

de maneira competitiva nesse mercado tão desigual. O mapeamento de fluxo de valor ajuda,

entre outros, na redução de desperdícios. Isso acontece em parte pelo processo de

identificação das 7 perdas descritas por Shigeo Shingo (1996), sendo classificadas as perdas

por Superprodução, Transporte, Estoque, Espera, Processamento, Retrabalho e

Movimentação. Além das sete perdas anteriormente descritas, existe outra perda de

importante relevância para o resultado da corporação, mas que por muitas vezes é

negligenciada. Essa perda é denominada perda por intelecto e está definida como a

incapacidade do indivíduo membro da organização utilizar totalmente o seu tempo e talento

em prol da melhoria dos resultados da organização (ANTUNES et al. 2008; LIKER e MEIER,

2007; NAGA e SHARNA, 2014).

Além disso, esta metodologia pretende entender quais são as participações de cada

departamento no processo como um todo. Para tal, utilizou-se a técnica de mapear o estado

atual de trabalho desses departamentos, com o objetivo de uma proposta de mapeamento

futuro, eliminando as perdas e tornando a planta como um todo mais eficiente (BEER, 2003).

O estudo de caso descrito nesse artigo foi desenvolvido em uma cervejaria de grande porte de

atuação nacional localizadas no estado da Bahia, porém esta mesma empresa possui plantas

industriais espalhadas por todo território nacional. Por se tratar de uma planta com diversas

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linhas de produção, dos mais variados formatos, o critério utilizado para definir qual produto

a ser realizado esse mapeamento foi o de maior representatividade e impacto no resultado da

empresa como um todo, seja esse impacto financeiro ou produtivo (LEWIS, 2000).

Portanto, em função do acirramento desse mercado de cervejas brasileiro, surge esse

importante tema de pesquisa. A importância do mapeamento do fluxo de valor atual de uma

empresa cervejeira, e sua colaboração, entre outros, na competitividade da organização.

2. Referencial Teórico

Uma perspectiva de fluxo de valor significa que você olha o todo e não apenas os processos

ou operações isoladas. O objetivo é otimizar o todo e não cada componente, assim como

analisar não somente as operações e materiais envolvidos no processo, mas também as

informações que esses processos necessitam ou enviam.

2.1 Mapeamento do fluxo de valor

O Mapeamento do Fluxo de Valor (VSM) pode ser definido como uma ferramenta que tem a

capacidade de analisar de forma horizontal os processos que realmente agregam valor a

organização/cliente. Para isso, se faz necessário desvincular o velho olhar sobre as operações

em si, largamente difundido com a evolução da revolução industrial, em termos gerais, e com

o progresso do fordismo, em específico. Para que de forma concreta seja desenvolvido, o

VSM precisa acompanhar o fluxo da transformação das matérias primas em produtos finais.

Esse fluxo precisa mapear não somente as matérias em termos físicos, mas sim as

informações geradas nesse processo e evolução de suas conexões no sentido de criar valor e

fazê-lo fluir, desde os fornecedores até os clientes (PEPPER e SPEDDING, 2009; VINODH

et al, 2010; KERHALKAR e NANDURKAR, 2012). A Figura 1 descreve essas etapas.

Figura 1: Etapas de Evolução do VSM

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Fonte: Os Autores (2015)

Nesse sentido, as atividades que são mapeadas durante o levantamento do VSM são definidas

em três grupos de acordo com os critérios definidos por Rother e Shook (1999).

Das diversas atividades levantadas durante o mapeamento do fluxo de valor da empresa,

algumas são de relevância para os clientes, pois geram pleno valor no produto final. Existem

também outras atividades que não geram valor diretamente, mas são necessárias para o

andamento da corporação e/ou suportam as atividades que geram valor. Entretanto existem

ainda algumas outras atividades que além de não gerar valor ao cliente, não são necessárias.

Essas atividades são descritas como perdas e, na maioria das vezes, estão escondidas em meio

ao cipoal de tarefas diariamente executadas e somente com mapeamentos mais robustos são

detectadas.

2.2 As oito perdas

Como o foco do fluxo de valor inclui entender completamente as etapas que trabalham de

forma conjunta para gerar valor ao cliente, há uma clara necessidade de estender a remoção de

perdas para esse fluxo de forma completa não somente na manufatura, mas sim na cadeia

completa (HINES e RICH, 1997). Shigeo Shingo (1996) elencou as 7 perdas por

superprodução, espera, transporte, processamento, estoques, movimentação e retrabalho. As

sete perdas de Shingo foram ampliadas por Liker e Meier (2007), que disseminaram o

oitvado desperdício, descrito como perda por intelecto.

Diferentemente das sete demais perdas, descritas de forma exaustiva na literatura, a perda por

intelecto tem uma concepção contemporânea. Nesse conceito são descritas as perdas pela não

utilização da inventividade dos funcionários. Para minimizar essa perda, grupos de kaizen,

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CCQ – Círculo de controle de qualidade, assim como BIS – Banco de Ideias e Soluções são

boas iniciativas para envolver os funcionários (LIKER e MEIER, 2007).

3. Metodologia

Segundo Lacerda et. al (2009) a comunidade cientifica distingue por um conjunto de regras os

métodos de pesquisa. São eles os responsáveis pelo processo de construção do conhecimento

de forma estruturada. Dessa forma, a correta definição do método de pesquisa é determinante

para o progresso de uma determinada área da ciência.

3.1 Método de Trabalho

Assim sendo, o Estudo De Caso foi a metodologia proposta para analisar a implantação do

Value Stream Mapping (VSM) em um cervejaria de grande porte. Conceitualmente, o Estudo

de Caso tem aplicações amplas em várias áreas da ciência. Objetivando proporcionar uma

experiência concreta, ou seja, um problema vivido na prática, o entendimento dos por quês e

como determinada situação se formou ao longo do tempo. Aplicado, em geral, para situação

onde o pesquisador tem certo domínio das variáveis estudadas, e essas estão assim

preservadas de alguma intromissão externa. Além disso, é importante que se defina um

esquema a fim de proporcionar de forma clara a percepção da evolução das etapas propostas

pela pesquisa (FIALHO e NEUBAUER FILHO, 2008; MARCONI e LAKATOS, 2003). Para

isso, a Figura 2 ilustra o método de trabalho utilizado:

Figura 2: Método de Trabalho

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Fonte: Os Autores (2015)

Para a etapa de projeto de pesquisa foi necessário a consulta a revisão literária rica em

informações de modelos de implantação do Value Stream Mapping. Também foi nessa etapa

em que desenvolveu o objetivo de pesquisa e outros aspectos necessários para a pesquisa. Em

seguida, o referencial teórico foi elaborado, assim como a verificação das particularidades de

implantação do estudo em termos de realidade da planta fabril. Na sequência, foi iniciado o

levantamento do VSM atual, e essa etapa precisa ter a parcimônia de entender o fluxo atual e

não o desejado pelos participantes do projeto. Além de iniciar conceitualmente o

levantamento do fluxo de informações no sentido do cliente, passando pelo produtor, até o

fornecedor, conforme descrito na Figura 3.

Figura 3: Levantamento do VSM Atual

Fonte: Os Autores (2015)

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De posse dos dados, iniciou-se a análise do levantamento dos dados coletados. Por se tratar de

dados que envolvem diversas áreas da empresa, com diferentes gerências, e muitas vezes

inclusive diretorias distintas, geralmente são informações muito ricas em termos de valor e

complexidade. É interessante destacar que o processo de implementação efetiva do VSM

futuro não será executado. Portanto, como fruto desse projeto surge uma proposição de VSM

futuro a ser implementado, com sua complexidade intrínseca ao processo produtivo.

4. Aplicação

A empresa objeto dessa pesquisa é uma cervejaria de grande porte localizada na região

nordeste do país. As plantas industriais de bebidas instaladas nas regiões mais tropicais do

país produzem de forma plena praticamente o ano todo, diferentemente das plantas

localizadas na região sul e sudeste do país, que sofrem nas suas operações os efeitos

climáticos do inverno. Esse efeito, muitas vezes rigoroso, ocasiona sazonalidade na demanda

de procura pela bebida, transferindo assim seus impactos, consequentemente, para a produção.

Para iniciar o mapeamento fora escolhida uma família de produtos, focando na produção de

um único produto do começo ao fim. Nesse caso é importante que seja um produto que tenha

relevância produtiva para a fábrica, sendo um produto que representa a organização de

maneira considerável tanto em volume quanto monetariamente, para que o mapeamento seja

de fato uma representação da realidade estudada.

Seguindo os conceitos básicos estabelecidos na metodologia, fora agendado para que se

efetivasse uma visita no ponto de consumo do produto, para entender a lógica por trás da

geração do pedido de venda. Esse pedido é construído ao longo de uma semana de consumo

de bebidas, sendo que ao final do ciclo de uma semana, o vendedor visita o cliente

presencialmente e faz o pedido. Essa lógica é atualmente existente para um determinado tipo

de cliente. Sendo que alguns clientes potenciais possuem maior infraestrutura de informática e

tecnologia da informação, esse pedido é feito via sistema interligado entre as duas

companhias. Esses clientes que abastecem os consumidores têm seus estoques abastecidos

geralmente por revendas terceirizadas. Entretanto, algumas áreas de menor interesse

comercial, mas de importante posicionamento para a marca, obrigando assim que a própria

empresa produtora da bebida abasteça esses pontos. Esse abastecimento é feito então por CDP

(Centro de Distribuição Própria) com gestão realizada por integrantes da própria empresa. A

Figura 4 ilustra as relações desenhadas desde a geração do pedido, passando pela distribuição,

pela manufatura, até a produção da cerveja nos tanques de fermentação.

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Figura 4: VSM do Macroprocesso de Manufatura/Pedido

Fonte: Os Autores (2015)

Seguindo, procurou-se entender a sistemática do fluxo de valor para os centros de

distribuição, sejam esses terceirizados ou não. Essa sistemática da evolução da informação,

desde a geração do pedido para a formação de lotes para geração do pedido de compra para a

fábrica foi uma das análises feitas. Isto, inclusive, gerou uma série de discussões por parte das

revendas, uma vez que existe um conflito nessa relação no que tange o tamanho do lote. As

revendas, por sua vez, querem comprar em lotes fraccionados ao máximo e a planta fabril, por

suas características de produção, gera seus lotes mínimos muitas vezes maiores que o

desejado.

O mapeamento no interior da planta seguiu pelo sistema de abastecimento dos caminhões das

revendas. Esse abastecimento fica caracterizado pelo descarregamento das garrafas vazias,

que, na sequência, alimenta a linha da produção. Em seguida, já com os caminhões vazios,

esses são abastecidos com produtos acabados. Em suma são esses abastecimentos que geram

as receitas para a empresa. Assim, quanto mais caminhões forem carregados diariamente,

mais receitas a empresa gera. Esse entendimento foi fundamental para que fossem revistos os

processos de carregamento a fim de dar mais agilidade nesse sentido.

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Os vasilhames saídos das carretas abastecem a linha de produção no seu início. Esse

abastecimento é feito por empilhadeiras pilotadas por motoristas treinados. Seguindo o fluxo,

uma série de equipamentos se encarregam do processo de lavagem, enchimento, pasteurização

e rotulagem das garrafas. A Figura 5 demonstra os tempos levantados para o mapeamento do

fluxo de valor da linha de produção de garrafas retornáveis de 600 ml em unidades de hora.

Figura 5: Medição dos Tempos atuais

Fonte: Os Autores (2015)

Assim, procurou-se entender o que acontece com os materiais, assim como as informações

que necessitam ser recebidas e enviadas, para que o fluxo do produto e da informação ao

longo do tempo e do espaço seja da melhor forma. Uma das vantagens do mapeamento, que

ficou claramente em evidência nesse projeto, é a sua interface com áreas de outras gerencias

da mesma fábrica. Exemplo disso está descrito no eixo horizontal da Figura 6. Onde as

empilhadeiras, sabidamente pertencentes a área de logística, tem sua eficácia diretamente

mensurada no mapeamento de fluxo de valor. Desta forma, tempos de espera foram uma das

mensurações analisadas. Mas esses tempos de espera não foram analisados acerca da linha de

produção em si, pois existe uma cobrança muito grande para que a linha de produção jamais

seja parada. Esse tempo de espera se refere a esperas do carregamento, pois são fundamentais

para o faturamento de empresa, visto que equipamentos parados geram custo e não agregam

valor.

De posse dessas informações coletadas, procurou-se analisar qual seria o melhor desenho para

ter uma visão de onde se poderia chegar em termos de fluxo de valor Lean. Além disto, é

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preciso entender que essa visão de futuro necessita ser algo que, dentro da realidade da

empresa em determinado período de tempo, seja possível de ser implementado. Detalhando o

mapeamento, é feita a divisão do mapa geral em ciclos onde as gerencias atuam, permitindo

uma melhor implementação das oportunidades encontradas, visto que é destacado onde cada

departamento tem responsabilidade para atuar.

5. Análise e considerações finais

A iniciativa de fazer um Value Stream Mapping, inicialmente, teve apoio de todas as áreas.

Entretanto, este é um projeto que está sob o guarda-chuva da diretoria de operações e, assim

sendo, à medida que o trabalho evoluía, aspectos políticos dessa natureza ficaram evidentes.

As iniciativas que demandavam carga de trabalho eram muito mais aceitas nas áreas que

respondiam para a diretoria de operações, do que aceitas pela área comercial, por exemplo.

Essa questão serviu inclusive para a implantação dos projetos levantados pelo VSM. Assim,

um ponto de fragilidade na metodologia perpassa essa relação de poder intraorganizacional

(NAGA e SHARNA, 2014).

Basicamente, com este estudo de caso, foi possível descrever a metodologia de implantação

da filosofia Lean em um ambiente onde não se tem implementado uma manufatura enxuta.

Entretanto, muitas vezes, projetos dessa natureza são patrocinados pela alta direção, que não

tem conhecimento e domínio técnico das características do uso da ferramenta VSM, em

específico, e dos conceitos que direcionam a um sistema Lean, de forma geral. Sabendo disso,

uma das causas para o insucesso de uma filosofia dessa natureza está na forma de contratação

das empresas de consultoria facilitadoras dessa iniciativa (KERHALKAR e NANDURKAR,

2013).

Segundo Lewis (2000) a implantação efetiva de iniciativas Lean não asseguram de imediato

uma melhoria automática do resultado financeiro da corporação. Também é preciso

considerar que o modelo de implantação e contratação da organização tem influência direta no

êxito do projeto. Modelos de contratação que atrelam participações percentuais financeiras

nos possíveis resultados projetos geram, em um primeiro momento, motivação por parte dos

integrantes diretos da execução do projeto. Entretanto, quem paga essa conta, seja o acionista

ou o proprietário da empresa, quer ver esse ganho na sua forma convencional de análise e

visualização, ou seja, a última linha do DRE – Demonstrativo do Resultado do Exercício da

Empresa, e isso não tem muitas vezes essa relação direta (HARWINDER e AMANDEEP,

2013; MATT, 2014).

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Contudo, é de senso comum que iniciativas dessa natureza trazem melhorias, mesmo que

indiretas, para a corporação. Esse valor não se encontra apenas com a atividade de mapear o

fluxo de valor, e sim aumentar o entendimento do sistema como um todo e das operações e

processos que fazem parte dele, fornecendo uma linguagem de entendimento comum a todos

que atuam no sistema estudado. Desta maneira, é possível reduzir os tamanhos de lotes

produzidos, reduzir os estoques, além de atuar nos desperdícios levantados. O exercício

também traz como benefício o conhecimento gerado aos colaboradores envolvidos a

pensarem com a mentalidade enxuta de identificação e eliminação das perdas. Com a

mentalidade destes princípios, aumenta-se a competitividade da empresa, como um todo, para

sua melhor atuação em mercado tão voraz.

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