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Ectoscopia Ectoscopia Coloração

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Page 1: Ebook Ectoscopia - Coloração · depósito anormal de bilirrubinas. Esse depósito tem três principais causas: he-mólise anormal, obstrução de vias biliares, insuficiência hepatocelular

Ectoscopia

Ectoscopia

Coloração

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CASO CLÍNICO

Paciente feminina de 12 anos, sem comorbidades conhecidas procura atendi-mento médico devido à queixa de estafa de evolução crônica e progressiva principalmente nas últimas semanas. Diz ainda que sente palpitação, sonolên-cia excessiva, insônia e falta de concentração que tem atrapalhado o desempe-nho escolar. Além disso os familiares afirmam que nos últimos meses filha está cada vez mais pálida e apresentou períodos em que os olhos ficaram “amarela-dos na parte branca”. Suspeitando-se de icterícia, qual tipo de bilirrubina esta-ria predominantemente aumentada nesse caso? Direta ou indireta?

• Introdução

A coloração do paciente é notada de forma rápida e quase inconsciente à pri-meira vista.

Para uma coloração normal o paciente deve apresentar tanto produção e oxige-nação quanto metabolização adequada das células vermelhas sanguíneas, além de uma vascularização subdérmica normal.

Para definirmos um paciente como normocorado é necessário que ele apre-sente níveis normais de células vermelhas sanguíneas, que garantem a aparên-cia rosada de mucosas e pele, principalmente em regiões onde a vascularização subdémica é mais visível. Essas células oxigenadas dão a aparência vermelha ao sangue, e aquelas desoxigenadas inferem coloração azulada devido a deso-xihemoglobina.

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Neste parágrafo está a explicação sucinta, porém completa da base de tudo que você precisa saber para dar o diagnóstico sindrômico e realizar o diagnós-tico diferencial das condições que levam ao acúmulo de bilirrubinas (icterícia). As hemácias circularão pelo corpo até que após, em média 120 dias, serão de-gradadas. As hemácias são fagocitadas, então, principalmente no baço, meta-bolizando a hemoglobina em grupamento heme e globina. A globina é dirigida para ciclos metabólicos e utilizada na forma de aminoácidos. Enquanto o gru-pamento heme sofre ação pela enzima heme oxigenasse sendo dividido em ferro e biliverdina. Esta última, por sua vez, é transformada na bilirrubina indi-reta (=não conjugada =apolar) pela enzima biliverdina redutase. Justamente por ser apolar precisa se ligar à albumina para ser transportada no plasma. Ao che-gar no fígado, finalmente ocorre a famosa conjugação, catalisada pelo ácido glucorônico, dando origem à bilirrubina direta (=conjugada =polar). Agora sim, a bilirrubina direta pode ser excretada dos hepatócitos para a árvore biliar, des-cendo pelo canal colédoco, passando pela ampola de Water até a 2ª porção do duodeno. A bilirrubina excretada primeiramente no intestino delgado, alcança o cólon enquanto diversas bactérias a transformam em urobilinogênio e esterco-bilinogênio que, em última instância, produzem a estercobilina. Este composto é o que dá a coloração mais amarronzada das fezes. Paralelamente, 10 a 15% desses compostos são reabsorvidos (recirculação enterohepática) e ainda uma diminuta quantidade é filtrada nos rins na forma de urobilina, a qual também dá uma coloração mais escura a urina. Ufa! Agora sim abacou. Quando esse pig-mento se acumula, seja pela incapacidade hepática de metabolização, seja por obstrução da excreção, esse pigmento é reabsorvido e se deposita em pele e mucosas levando à icterícia.

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• Semiotécnica

A avaliação da coloração é geralmente feita com a observação da mucosa con-juntival palpebral, dos lábios e da própria pele. No início pode ser difícil reco-nhecer os graus de coloração, mas com a experiência o examinador é capaz in-clusive de graduar em cruzes (quanto mais pálido, mais cruzes o paciente irá apresentar. Ex: “hipocorado 2+ em 4+”), o que se torna interessante em uma avaliação horizontal com análises comparativas do mesmo paciente ao longo do tempo. Uma dica é comparar a coloração vista no paciente com outro hígido ou com a própria coloração no examinador para discernir um exame alterado de um normal.

Para avaliar a presença de icterícia examinamos principalmente esclera ocular e frênulo de língua já que são os locais primeiramente acometidos com a eleva-ção de bilirrubina sérica. Conforme os níveis de bilirrubina vão se elevando, pode-se notar uma coloração amarelada ou amarelo-alaranjada em toda a pele do paciente. A quantificação é normalmente estabelecida por critério de cruzes de 1-4, o que torna subjetivo, e baseado no roll de pacientes já examinados por cada médico. Em crianças essa correlação entre topografia amarelada e níveis séricos de bilirrubina é ainda mais fidedigno. Nesse tipo de paciente refere-se às zonas de Kramer, conforme esquema abaixo:

ZONA 1: Icterícia de cabeça e pescoço (BT = 6mg por dL)

ZONA 2: Icterícia até umbigo (BT = 9mg por dL)

ZONA 3: Icterícia até joelhos (BT = 12mg por dL)

ZONA 4: Icterícia até tornozelos ou antebraço (BT = 15mg por dL)

ZONA 5: Icterícia até região plantar ou palmar (BT = 18mg por dL)

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Na avaliação da presença ou não de cianose examina-se palmas e pontas dos dedos, bem como lábios, mucosa oral e língua. Caso haja uma coloração azu-lada a pesquisa é considerada positiva. Neste quesito há apenas uma denomi-nação qualitativa (cianótico ou acianótico). Uma vez presente, a cianose deve ter sua etiologia investigada, podendo ser periférica ou central.

ACHADOS E CORRELAÇÕES CLÍNICAS

• Anemia

Anemia ocorre devido à baixa concentração de hemácias no sangue, devido a perda excessiva, baixa produção ou destruição. Essa comorbidade se manifesta em forma de descoloração tanto da pele quanto das mucosas do paciente, e vem associada a quadros mais floridos (perfazendo a síndrome anêmica) como aumento da frequência cardíaca, fadiga, dispneia, sopros sistólicos funcionais. Quanto ao principal sinal tem-se a palidez percebida principalmente na conjun-

tiva ocular.

• Icterícia

Denomina-se icterícia a coloração amarelada em mucosas e pele decorrente do depósito anormal de bilirrubinas. Esse depósito tem três principais causas: he-mólise anormal, obstrução de vias biliares, insuficiência hepatocelular.

O diagnóstico diferencial de cada uma dessas icterícias vai ser fechado com o restante do exame físico e história do paciente. Pacientes com hemólise apre-sentarão comemorativos de anemia com hipocoloração de mucosas, taquicar-dia, queixa de fadiga. Já pacientes com icterícia obtrutiva terão um quadro com

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colúria/acolia fecal, vesícula palpável. E, por último, aqueles com insuficiência hepática apresentarão estigmas de insuficiência hepática e ou hipertensão por-tal como telangectasias, eritema palmar, atrofia muscular, flapping, baço palpá-vel, circulação colateral, ginecomastia além de uma história compatível com eti-ologias prováveis como alcoolismo, uso de medicação, hepatites virais etc.

Importante lembrar que pacientes com hiperbetacarotenemia apresentam colo-ração de pele semelhante a paciente ictéricos, podendo causar sobrediagnósti-cos equivocados. A maneira de diferenciar essas duas condições através do exame físico é examinando com cuidado a conjuntiva ocular. Na icterícia verda-deira, a coloração amarelada surge primeiramente na esclera dos olhos, frênulo da língua e progride para a pele. Na hiperbetacaronemia, a coloração amarelada está presente na pele, palmas das mãos, mas poupa a esclera.

Outra situação bastante comum que pode fazer com que o examinador tenha a falsa impressão de que o paciente apresente icterícia é em indivíduos negros. Estes possuem naturalmente a esclera mais amarelada. Por isso é aconselhável examinar as regiões da esclera acima e abaixo da íris, além de utilizar o frênulo da língua a fim de evitar avaliações equivocadas.

• Cianose

A cianose se define pela coloração azulada percebida principalmente em áreas de grande vascularização como mucosas. Esse processo decorre normalmente do acumulo de hemoglobina desoxigenada decorrente de eventos que causam hipoxemia. Como a coloração depende da quantidade de hemácias, constata-se que quanto mais hemácias houver, mais fácil será de observar cianose. Pacien-tes com policitemia (excesso de hemoglobina) apresentam cianose com

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mínimos estados de hipoxemia, enquanto que aqueles anêmicos (falta de he-moglobina) necessitam de grande privação de oxigênio para mostrarem-se cia-

nóticos.

Cianose periférica: ocorre quando a coloração azulada de restringe a extremi-dades do corpo e é melhor avaliada onde a pele é mais fina e mais vasculari-zada como: polpas digitais e lobo da orelha. Esse quadro diz respeito a condi-ções relacionadas a aumento do consumo de oxigênio pelos tecidos periféricos ou redução da oferta por obstrução arterial local que acabam por acumular de-soxihemoglobina em circulações terminais. Exemplos são a doença arterial obs-trutiva periférica e a trombose venosa profunda extensa, entre outros.

Cianose central: ocorre quando a coloração azulada é verificada em cavidade oral, na parte inferior da língua, lábios e ponta de nariz. Esse quadro pode de-correr de situações de hipoxigenação a nível pulmonar e necessitam de aborda-gem rápida para correção dos níveis séricos de oxigênio. Exemplos são insufici-ência respiratória aguda, tromboembolismo pulmonar, edema agudo de pul-

mão, entre outros.

DESFECHO DO CASO CLÍNICO

Trata-se de uma paciente feminina, jovem sem comorbidades aparantes que começa a desenvolver uma síndrome de fadiga, palpitação, insônia que pode abrir caminho para a suspeita de uma síndrome anêmica. A palidez cutânea descrita pelos pais somente fortalece essa suspeita uma vez que a hipocolora-ção de peles e mucosas é um dos maiores indicadores de baixa concentração de hemoglobina sérica (anemia). Quanto ao “amarelado na parte branca dos olhos”, deve-se suspeitar de icterícia. E nesse caso, icterícia com anemia a

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primeira hipótese que deve surgir é de algum tipo de hemólise. E se as hemá-cias estão sendo degradadas, a primeira bilirrubina que começa a ser produzida em excesso é a indireta (=não conjugada =apolar) não havendo tempo para a conversão proporcional em bilirrubina direta. Portanto, nesse caso a bilirrubina predominantemente aumentada seria a indireta.