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Enciclopédia VERBO das Literaturas de Língua Portuguesa 1 VERBO

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Page 1: Enciclopédia - Estudo Geral · 513 BALADA do, a B., mercê do esquema de repetição circular que a caracteriza, com exigências cornpositivas bem mais elementares, está destinada

EnciclopédiaVERBO

das Literaturasde Língua Portuguesa

1

VERBO

Page 2: Enciclopédia - Estudo Geral · 513 BALADA do, a B., mercê do esquema de repetição circular que a caracteriza, com exigências cornpositivas bem mais elementares, está destinada

Edição realizadasob o patrodnio da

SOCIEDADE CIENTÍFICADA UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

Direcçãojosâ AUGUSTO CARDOSO BERNARDES

(da Faculdade de Letras - Universidade de Coimbra)

ANÍBAL PINTO DE CASTRO(da Faculdade de Letras - Universidade de Coimbra)

MARIA DE LOURDES A. FERRAZ(da Faculdade de Letras - Universidade Clássica de Lisboa)

GLADSTONE CHAVES DE MELO(da Faculdade de Letras - Universidade Federal do Rio de Janeiro)

MARIA APARECIDA RIBEIRO(da Faculdade de Letras - Universidade de Coimbra)

Secretaria-Geral

A cargo doDepartamento de Enciclopédias da Editorial Verbo

sob a direcção de João Bigotte Chorão

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BALADAComposição ancestralmente associada

à coreografia, formada por um conjuntode estâncias com refrão, cuja origem ébastante controversa. Talvez se encontrerelacionada com as saltatiunculae ou osballistea romanos, que se prolongamatravés de certas formas métricas da poe-sia latina medieval. As opiniões acercados seus sucedâneos românicos dividem--se: alguns críticos dizem-na de origempopular e genuinamente italiana, ou me-lhor, centro-italiana; outros concedemprimazia ao balar provençal, representa-do, entre nós, pelas bailias ou bailadasda lírica galego-portuguesa.

As mais antigas baladas italianas quese conhecem remontam ao séc. XIII, e si-tuam-se em área cultural bolonhesa eumbra, as primeiras lavradas no espaçodeixado em branco em livros de actosnotariais, as segundas integradas no«laudário» de ]acopone da Todi. O fe-cho da quinta jornada do Decameronilustra dois tipos de balada muito .difun-didos ao longo de todo o Trecento, o po-pular, ligado à esfera do quotidiano e eu-jos temas tocam, por vezes, as raias doescabroso, e o cortês, dotado de maiordelicadeza e graciosidade, que foi o cul-tivado pelos poetas stilnovistas. Mas é

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do terreno cultural francês que brotamos mais sólidos contributos para a esta-bilização das normas cornpositivas queregulamentam esta forma, tais como ofamoso tratado de Eustache Deschamps,Art de dictier et fere ballades et chantsroyaux, composto em 1392, ou o Livredes cents ballades, compilação dos poe-mas redigidos entre 1388 e 1399 porquatro senhores franceses feitos prisio-neiros no Cairo. Com Villon, esta formalírica atinge um dos seus pontos altos.Embora a balada obedeça a normas decomposição bastante variáveis, o quemuito terá a ver com a sua estrita ligaçãoao canto e à dança, será já possível indi-viduar, a partir deste momento, algunsprincípios de tendência.

Entre as várias estâncias é interpostoum refrão, a entoar por um coro de dan-çarinos, geralmente constituído por duaspartes com o mesmo ritmo, acompanha-das por um movimento coreográfico deavanço e outro de recuo. A estrofe re-parte-se em pés, dois, na maior parte dasvezes, cada um dos quais pode ter um,dois, ou três versos, e volta, também elasubdivisível em dois tempos, cujas rimasvoltam às do refrão. Repetem-se, de es-trofe para estrofe, não só o mesmo es-quema rimático, como também as pró-prias rimas. Spongano distingue seistipos específicos de B., a saber: 1) A B.grande, cujo refrão é formado por qua-tro versos de dez sílabas acentuadas, oudecassílabos e senários: XY.YX I AB.ABBC.CX I XY.YX I ...2) A B. média, cu-jo refrão é formado por três versos de-cassilábicos, ou decassílabos e senários:YXX I AB.AB BXX I YXX/ ... 3) A B.menor, com refrão de dois decassílabos,ou decassílabos e senários: XX I AB.ABBX I XXI ... 4) A B. pequena, com re-frão de um só verso de dez sílabas: X IA.A X I XXI ... ; ou X I a.aX I XI ...5) A B. mínima, com refrão de um sóverso, de sete, seis ou quatro sílabas: x Ia.a. x I xl ... 6) A B. extravagante, que éaquela em que o refrão tem mais de qua-tro versos: V xxyyz I AB.AB Bccddz IVxxyyz/ ...

Se a .l'canção, dados os requisitos téc-nicos do seu modelo construtivo, se vaiconvertendo num tipo de poema de fei-ção individualizante muito especializa

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do, a B., mercê do esquema de repetiçãocircular que a caracteriza, com exigênciascornpositivas bem mais elementares, estádestinada a um amplo sucesso. As refi-nadas cortes da Itália renascentista con-ferirão particular apreço a esta forma lí-rica, que encontra em Ariosto um dosseus mais elegantes cultores, pois a sualeveza musical combina a perfeição com

. o gosto lúdico, face ao espectáculo co-reográfico, próprio do ambiente corte-são. A expressão da interioridade fica di-luída, contudo, no dramatismo do jogomusical. De grande delicadeza algumasdas B. que nos foram legadas por Perode Andrade Caminha. Em França, com aPléiade, este tipo de composição cai emdesuso.

os países do orre da Europa, aB. nunca se dissociou de uma tradiçãofolclórica, transmitida oralmente, quedesconhece qualquer tipo de artificiosi-dade deliberada. Em The minstrelsy aftbe scattish border, q-ue começa a ser pu-blicado em 1802, Walter Scott empreen-de a recolha da produção escocesa, numaatitude que se faz sinal do interesse, noperíodo romântico, pelas tradições po-pulares remotas. A normatividade corte-sã fica, assim, definitivamente superada.O início do Romantismo inglês é ernble-matizado, aliás, por The lyrical ballads,publicadas em 1798 por William Words-worth e Samuel Taylor Coleridge, comuma segunda edição acrescida de umprefácio, datada de 1800. O primeirodestes poetas faz delas expressão do sen-timento da natureza, ao passo que o se-gundo transmite, nos seus versos, a ex-trema atracção que o fantástico e olendário sobre ele exercem. Mas já Bür-ger, na Alemanha, emprestara à B. a in-tensidade trágica característica dosSturm und Drang; Schiller fá-la mais lí-rica do que descritiva; Uhland confere--lhe notas de verdadeira emoção, ao pas-so que Goethe se coloca entre exaltaçâoda fantasia e troça.É também na Alemanha, com Carl

Lowe, que a B. romântica reencontra amúsica. as B. vocais de Mendelsohnintervêm solistas, coros e orquestra.Schumman escolhe o piano como instru-mento que acompanha a B. declamada.Em Portugal, tiveram grande voga as

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versões musicadas das B. de Soares dePassos, muito apreciadas por um gostoultra-rornântico que Eça caricatura, noCrime da Padre Amara, quando sentaAmeliazinha ao piano. Sem perder assuas características narrativas, esta formavai ganhando ressonâncias líricas cadavez mais profundas. É então que começaa designar, em sentido translato, umagrande variedade de peças de carácter ín-timo; assim as B. de Chopin, Liszt, ouBrahms.

Actualmente, designam-se como B.poemas muito simples, de estrutura re-petitiva e de grande investimento lírico,tais como a Chansan du mal-aimé, deApollinaire, ou a Balada da neve, deAugusto Gil. Os baladeiros dos anos 60associaram este tipo de composições atextos musicais, com intuitos de inter-venção social. Os estudantes de Coimbrade há muito lhe dão voz, com as guitar-ras do fado que vai sendo entoado pelassucessivas gerações de jovens que neledesafogam as saudades da cidade doMondego, e do tempo que não volta.BIBLIOGRAFIA: R. Spongano, Nozioni ed esem-pi di métrica italiana, Bolonha, '1974.

Rita M«moto