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FACULDADE INTEGRADA DA GRANDE FORTALEZA
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Revista Científica da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza
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REVISTA PERSPECTIVA FGF
FACULDADE INTEGRADA DA GRANDE FORTALEZA
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Revista Perspectiva FGF /Faculdade Integrada da Grande Fortaleza. V. 1, N. 05 Jul./
Dez. 2016. ISSN 2238-524X
Fortaleza – Ceará 2016
Publicação Semestral
1. Periódico científico – Faculdade Integrada da Grande Fortaleza. 2. Artigos diversos.
3. Faculdade Integrada da Grande Fortaleza
Expediente Mantenedora Centro de Educação Universitária e Desenvolvimento Profissional – CEUDESP
Eng. José Liberato Barrozo Filho - Diretor Administrativo Financeiro
Eng. Julio Pinto Neto – Diretor de Infraestrutura
Eng. Adolfo Marinho – Diretor de Expansão
Mantida
Faculdade Integrada da Grande Fortaleza - FGF
Eng. José Liberato Barrozo Filho - Diretor Geral
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Editores Viviane Mamede Vasconcelos (FGF / UFC)
Conselho Editorial Adriana Maria Reboucas do Nascimento
Carlos Jorge Dantas de Oliveira
Cristina Tonin Beneli Fontanezi
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Daniele Cristine Gadelha Moreno
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João Celso Moura de Castro
João Cláudio Nunes Carvalho
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José Eduardo Ribeiro Honório Junior
Maria Coeli Saraiva Rodrigues
Nádia Marques Gadelha Pinheiro
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Renato Alves Vieira de Melo
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Rosane de Almeida Andrade
Tatiana de Lima Rocha
Editora Maria Coeli Saraiva Rodrigues
Taiana Cláudia Nunes Carvalho
Revisão Técnica Maria Coeli Saraiva Rodrigues
Projeto Gráfico Capa
Taiana Cláudia Nunes Carvalho
Diagramação Maria Coeli Saraiva Rodrigues
*As ideias e opiniões emitidas nos artigos são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo,
necessariamente, as opiniões do editor e, ou, da FGF – Faculdade Integrada da Grande Fortaleza
SUMÁRIO
Editorial............................................................................................................................. 04
Artigos
1 – Análise do benefício da pensão por morte – Fagner de Oliveira Matos.......................... 06
2 – Considerações sobre a crítica da religião em Ludwig Feuerbach – Walber Nogueira
da Silva................................................................................................................................
21
3 – O jovem-aprendiz no mundo do trabalho: entre as normas jurídicas e a disciplina –
Alaísa Ferreira Flor e Thiago Menezes de Oliveira................................................................
28
4 – A atuação do professor de educação física no conteúdo da natação escolar – Rafaela
Rodrigues da Silva, Thiago Medeiros da Costa Daniele, Leila Aparecida de Araújo,
Francisco Nataniel Macedo Uchôa e Maria Tatiana de Lima Rocha Féliz.............................
48
5 – Identidades de Gênero e consumo de automóvel em Fortaleza-CE – Francisco Tarcísio
Cavalcante Segundo............................................................................................................
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 - ISSN 2238-524X
Editorial
A ciência vem evoluindo com as contribuições das pesquisas e investimentos em
diversas áreas do saber. O pensamento crítico e os questionamentos acerca da realidade
impulsionam novos conhecimentos e descobertas.
Nesse sentido, a Revista Perspectiva FGF é a publicação científica
multiprofissional da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza - FGF, que objetiva
promover a publicação docente e discente das áreas de Ciências da Saúde, Sociais
Aplicadas, Humanas, Jurídicas e Exatas, podendo haver publicações de artigos originais,
revisões e reflexões, gerando conhecimento amplo, sendo fonte de discussão e de saber
de qualidade. Com o progresso da produção científica brasileira e internacional, a Revista
Perspectiva FGF, periódico científico semestral, cumpre seu papel na disseminação do
conhecimento de acadêmicos, docentes e profissionais.
A Comissão Editorial da Revista Perspectiva FGF agradece aos alunos,
professores, à direção da instituição Faculdade Integrada da Grande Fortaleza - FGF e
parabeniza a todos os autores que escolheram a Revista Perspectiva FGF como veículo
de divulgação de suas pesquisas.
Viviane Mamede Vasconcelos
Coordenadora Científica da FGF
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 - ISSN 2238-524X
ARTIGOS
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ANÁLISE DO BENEFÍCIO DA PENSÃO POR MORTE
Fagner de Oliveira Matos Aluno do Curso de Direito da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza (FGF)
RESUMO: A pesquisa trata da pensão por morte à luz das mudanças de acesso a esse benefício previdenciário, promovida pela Lei Nº 13.135/2015. Para alcançar o objetivo traçado, a metodologia empregada no trabalho consistiu numa investigação bibliográfica e documental entorno da legislação pertinente à temática, que consistiram nas principais referências norteadoras da pesquisa, bem como artigos, teses e dissertações que abordam os assuntos da seguridade social, previdência social, risco social e pensão por morte. A partir da referida análise, foi possível observar que as mudanças no acesso à pensão por morte ocorrida no ano de 2015 no Brasil, suscitam o questionamento sobre o cumprimento do princípio constitucional da seguridade e previdência social em proteger os direitos individuais e coletivos, bem como salvaguardar a família dos riscos sociais. Desse modo, nota-se a necessidade de um acompanhamento por parte da academia das implicações práticas de tais alterações legislatórias no cotidiano da previdência social brasileira. Palavras-chave: Previdência Social; Pensão por morte; Risco Social. ABSTRACT: The research deals with the death pension in the light of the burning of changes to that social security benefits, promoted by Law No. 13,135 / 2015. To achieve the established objective, the methodology used in the study consisted of a literature research and documentation around the relevant to the theme legislation, which consisted in the main guiding references of the research, as well as articles, theses and dissertations that address the issues of social security, social security, social risk and survivorship. From this analysis, it was observed that the changes in access to death benefits during the year 2015 in Brazil, raise the question of compliance with the constitutional principle of welfare and social security to protect individual and collective rights, as well as safeguard the family of social risks. Thus, there is the need for monitoring by the Academy of the practical implications of such legislations changes in daily life of the Brazilian social security. Keywords: Social Security; Pension Death; Social Risk.
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1 INTRODUÇÃO
Este trabalho busca
compreender as modificações do acesso
à pensão por morte. Tal investigação
encontra-se entrelaçada com a análise da
própria situação da previdência social na
atualidade, que se apresentam sob
estruturas possíveis de serem
caracterizadas como injustas e
incompletas, distantes cada vez mais das
necessidades da parcela mais vulnerável
da população.
O caminho percorrido pelo país
nas últimas décadas na busca pela
aceleração do crescimento da economia
brasileira, aliado as pressões dos
defensores do livre mercado,
fortaleceram as pressões em torno de
mudanças do ajuste fiscal, direitos
trabalhistas e modificações
previdenciárias. Argumentos
construídos, quer seja na gestão dos
presidentes Fernando Henrique Cardoso,
Luís Inácio Lula da Silva ou Dilma
Housseff, promoveram a ampliação do
debate sobre as novas necessidades de
modificações do Estado no acesso a
benefícios previdenciários.
Desse modo, a família que por
ventura se defrontar com a morte de
algum ente contribuinte da previdência
social, passa a conviver com uma nova
série de dispositivos que impossibilitam
o acesso a qualquer amparo do Estado,
levantando a questão sobre a
constitucionalidade de tais modificações
das regras previdenciárias diante dos
princípios da previdência social
brasileira.
A escolha do tema da presente
pesquisa encontra-se norteado pelas
modificações empreendidas pela
instância jurídica da legislação referente
à pensão por morte. A atualização das
regras desse benefício previdenciário
surge motivada sobretudo pelo avanço
das fraudes no país, no qual resulta o
aumento da dívida da previdência
pública e coloca em risco o futuro desse
benefício.
Diante dessa situação, as
mudanças das regras de pensão por
morte traz a tona a necessidade de refletir
sobre os impactos de tais alterações no
acesso a esse benefício. Portanto,
proporcionar uma maior clareza sobre o
tema e analisar o papel da pensão por
morte nessa nova dinâmica populacional
de redução da taxa de natalidade e
mortalidade são justificativas que
motivaram o interesse de investigação
dessa temática.
Tais modificações na pensão
por morte resultam numa série
imbróglios sobre a discussão a respeito
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de sua constitucionalidade. Assim,
devido o pesquisador atuar como técnico
do seguro social do Instituto Nacional do
Seguro Social (INSS), desperta-se o
interesse em investigar tais modificações
do ponto de vista jurídico e suas
implicações no cotidiano de seu
ambiente de trabalho.
Partindo dessa premissa, o
trabalho será norteado
metodologicamente por uma
investigação bibliográfica e documental,
de modo a investigar as bases
norteadoras da previdência social e do
benefício da pensão por morte, bem
como a questão da constitucionalidade
das mudanças recentes no acesso ao
referido dispositivo beneficiário.
2. REFERENCIAL TEÓRICO:
PREVIDÊNCIA SOCIAL E PENSÃO
POR MORTE
Ao iniciar o presente trabalho,
preocupamo-nos em saber qual o
conceito de Política que precisamos.
Assim, dirigimo-nos primeiramente ao
Dicionário Aurélio da Língua
Portuguesa que, entre muitas acepções
nos apresenta a definição desse termo
como um “conjunto de objetivos que
informam determinado programa de
ação governamental e condicionam a sua
execução” (FERREIRA, 2010, p. 1653).
A busca por um conceito nos
leva a uma orientação para atingir
determinado fim, havendo uma
hierarquização de ações frente à atuação
concreta, ao trabalho empírico a realizar-
se. Augusto (1989, p. 106) afirma que “a
direção para a qual aponta e os objetivos
que orientam a referida política
manifestar-se-iam, de forma clara, no
interior de projetos e atividades que a
constituem”. Além disso, denotaria um
conjunto articulado de decisões de
governo, visando fins previamente
estabelecidos a serem atingidos de forma
coerente. Clareza de propósitos, ao
atingi-los, qualificariam as políticas
governamentais em geral.
Nesse sentido, Pereira (1986)
define política como instrumento de
controle racional da história, para poder
conduzir ao desenvolvimento econômico
e à autonomia nacional a partir de uma
base de competência técnica. Essa
preocupação com a interferência do
Estado se justifica pelo fato de que
devem estar ligadas ao interesse geral da
população.
Entretanto, o âmbito do que se
qualifica como público, ligado ao
interesse geral, não é delimitado de
maneira isenta, uma vez que o Estado é
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um lugar de domínio e conflitos,
contraditório em sua natureza, e não um
espaço de neutralidade, situado além e
acima das diferenças constitutivas do
social (AUGUSTO, 1989).
O fato social não é homogêneo,
existindo capacidades diferenciadas de
reivindicar e ver satisfeitas as aspirações
e demandas políticas, segundo a força de
pressão e de persuasão dos diversos
sujeitos sociais envolvidos. Por mais
geral e universalizante que sejam as
políticas estatais, sempre haverá uma
forma de hierarquiza-las, numa direção
que privilegia alguns desses sujeitos,
conforme seus interesses, posições e
lugares.
Podemos imaginar que haja
períodos onde as políticas públicas do
Estado não estejam presentes ou se
manifestem de forma mais tênue. Isto
realmente recai para um contraditório,
pois a própria natureza do Estado é
justamente intervir. Trata-se, antes de
constatar que a significativa ampliação
de suas funções conduziu a que
praticamente todas as instituições
sociais, a ele anteriormente não
vinculadas, tivessem diminuída sua
participação e influência, ao mesmo
tempo em que passaram a gravitar em
sua órbita.
No âmbito do poder do Estado,
a previdência social emerge com o papel
de constituir um conjunto “de ações
destinadas a garantir aos indivíduos e a
sociedade contra o perigo da privação,
assegurando-lhes as necessidades
básicas e um mínimo de vida digna”
(RIBEIRO, 2001, p. 67).
No campo do ordenamento
jurídico da previdência social, temos a
construção ao longo da história recente
do nosso país sobre o aporte de uma
gama de prestações previdenciárias,
dentre elas a pensão por morte. De modo
geral, podemos compreender a pensão
por morte como um benefício
previdenciário pago aos dependentes do
segurado que vier a falecer, ao qual tinha
como principal regimento legal a Lei
8.213/91.
Ao longo do processo de
modificações da legislação
previdenciária em curso nos últimos
anos, temos a Lei Nº 13.135/15, ao qual
passa a exigir tempo de carência, bem
como a necessidade de contribuições
mínimas e tempo mínimo de casamento
ou união estável para a concessão do
benefício, havendo mudança no valor
recebido pelo beneficiário.
Assim, o acesso ao recebimento
à pensão por morte ficou mais intricado,
levantando a questão de que tal
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modificação legal provocou um
retrocesso da garantia de um direito
previdenciário conquistado e garantido,
criando-se então óbices, até então
inexistentes, restringindo o alcance da
cobertura.
Com o objetivo de embasar a
presente pesquisa, abordaremos os
aspectos teóricos essenciais correlatos
com as temáticas da previdência social e
pensão por morte. Na literatura
acadêmica é ampla o desenvolvimento
conceitual relacionado a temática da
pensão por morte. Ao tratarmos sobre
esse assunto, cabe a priori
compreendermos de que trata a
previdência social.
Para compreendermos o
significado da previdência social é
necessário primeiramente atentar ao fato
de que previdência social não se
confunde com seguridade social. Para
Balera (1989, p. 34) seguridade social
pode ser compreendida no Brasil como
“o conjunto de medidas constitucionais
de proteção dos direitos individuais e
coletivos concernentes à saúde, à
previdência e a assistência social”.
Semelhante a essa definição, o
ordenamento jurídico brasileiro, por
meio da atual Constituição Federal
Brasileira, define no seu artigo 194 que
seguridade social compreende “um
conjunto integrado de ações de iniciativa
dos Poderes Públicos e da sociedade
destinado a assegurar os direitos
relativos à saúde, à previdência e a
assistência social” (BRASIL, 1988,
grifos nossos). Sobre a inserção da
seguridade social na Constituição de
1988, nos diz a Associação Nacional dos
Auditores Fiscais:
Foi uma ampla conquista política e social, que incorporou à construção democrática, direitos e garantias nas esferas políticas, individuais, coletivas e sociais. Um projeto para construção de uma sociedade livre e solidária, sob o fundamento da cidadania e do pluralismo político, sob os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, do desenvolvimento nacional com redução das disparidades sociais e regionais, para erradicar a pobreza e a marginalização e promover o bem estar geral. Mais do que um simples projeto, esses fundamentos e objetivos da República estão alicerçados em muitos instrumentos que os materializam. Um deles é, seguramente, o Orçamento da Seguridade Social (ANFIP, 2008, p. 7).
A correlação no seio da
seguridade social dessas três pilastras
(previdência, saúde a assistência), se dá
pela interdependência que é possível de
ser observada entre elas. Tendo em vista
que haja mais investimentos em saúde
pública, em contrapartida aumenta a
possibilidade de termos menos pessoas
recorrendo aos benefícios
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previdenciários, sobretudo àqueles
ligados à incapacitação física que o
incapacite para o trabalho. “Se
investirmos na previdência social, mais
pessoas estarão incluídas no sistema, de
forma que, ao envelhecerem, terão
direito à aposentadoria, não necessitando
de assistência social” (KERTZMAN,
2012, p. 31).
A Carta Magna brasileira
estabelece sete princípios norteadores do
seguro social, com o objetivo de embasar
uma rede de proteção social consistente
que assegure o bem-estar dos cidadãos, a
saber: I – universalidade da cobertura e
do atendimento; II – uniformidade e
equivalência dos benefícios e serviços às
populações urbanas e rurais; III –
seletividade e distributividade na
prestação dos benefícios e serviços; IV –
irredutibilidade do valor dos benefícios;
V – equidade na forma de participação
no custeio; VI – diversidade da base de
financiamento; VII – caráter
democrático e descentralizado da
administração, mediante gestão
quadripartite, com participação dos
trabalhadores, dos empregadores, dos
aposentados e do Governo nos órgãos
colegiados (BRASIL, 1988).
Numa análise particularizada da
Seguridade Social a partir da
consolidação da Constituição Federal de
1988, concordamos com a ideia, Ibrahim
(2007, p. 4), ao afirmar que a seguridade
social pode ser compreendida como:
(...) uma rede protetiva formada pelo Estado e por particulares, com contribuições de todos, incluindo parte dos beneficiários dos direitos, no sentido de estabelecer ações positivas no sustento de pessoas carentes, trabalhadores em geral e seus dependentes, providenciando a manutenção de um padrão mínimo de vida.
Complementando essa
construção conceitual, Silva (2004)
afirma que podemos considerar a
seguridade social como o estado do bem-
estar social, definindo-se, de modo geral,
pela busca de uma manutenção mínima
da qualidade de vida “para todos os
cidadãos, como questão de direito social,
por intermédio de um conjunto de
serviços oferecidos pelo Estado, em
dinheiro ou em espécie” (SILVA, 2004,
p. 56).
Tendo em vista que a
Seguridade Social do país passou a se
configurar por três pilares, notoriamente
Saúde, Assistência Social e Previdência,
é possível notar que: a) no caso da Saúde,
a Constituição Federal atenta que o
acesso é independente de contribuição;
b) o acesso à Assistência Social também
é independente de contribuição, devendo
ser prestada a todos aqueles que dela
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necessitam e; c) já o acesso à Previdência
se dá de modo parcial, pois a oferta da
mesma se dá mediante contribuição, à
exceção dos casos previstos em
legislação competente.
Segundo Dugnani (2009), a
Constituição de 1988 garantiu com o
processo de universalização da
Previdência Social para aqueles até então
desprotegidos, estabelecendo um piso
para os benefícios de até um salário
mínimo, tornou igualitário os valores dos
benefícios dos trabalhadores urbanos em
relação aos rurais, ampliando as fontes
de financiamento para garantir um
volume mais adequado de recursos.
Podemos destacar que o acesso à
Previdência Social passa a ser universal,
permitido a qualquer cidadão, mediante
contribuição. Desse modo, mescla-se o
princípio do mérito com o princípio da
cidadania, sob o contexto da repartição e
solidariedade.
Os beneficiários da Previdência
Social são definidos pela Lei Nº 8.213/91
como sendo as pessoas físicas titulares
do direito subjetivo às prestações do
Regime Geral da Previdência Social
(BRASIL, 1991). O Regime Geral
corresponde a toda a população que
exerce atividade econômica lícita, com
exceção dos militares e servidores
públicos, que são salvaguardados por
regimes próprios. De modo geral,
podemos considerar como sendo todas
aquelas pessoas que farão usufruto dos
benefícios da Previdência. Os
beneficiários são classificados em:
- Beneficiário Segurado:
quando o próprio contribuinte
(trabalhador) for usufruir do benefício
(ex: empregada que, com o nascimento
do filho, entra em gozo de licença-
maternidade; contribuinte individual
que, ao ficar doente, entra em gozo de
auxílio-doença; empregada doméstica
que, após cumprir a carência exigida,
venha a aposentar-se);
- Beneficiário Dependente: são
as pessoas que poderão usufruir dos
benefícios, na qualidade de dependentes
dos trabalhadores (ex: esposa que recebe
pensão do marido, que, como empregado
ou contribuinte individual veio a falecer;
pai e mãe do segurado solteiro e sem
companheira ou filhos que vier a
falecer). Os dependentes se subdividem
em 3 classes, quais sejam:
a) Classe I: o cônjuge, a
companheira, o companheiro e o filho
não emancipado de qualquer condição,
menor de 21 anos ou inválido ou que
tenha deficiência intelectual ou mental
que o torne absoluta ou relativamente
incapaz, assim declarado judicialmente;
b) Classe II: os pais;
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c) Classe III: o irmão não
emancipado menor de 21 anos ou
inválido (ANFIP, 2014, p. 14).
Com relação aos benefícios da
Previdência Social, temos: i) Auxílio-
doença; ii) aposentadoria por invalidez;
iii) Aposentadoria por idade; iv)
Aposentadoria por Tempo de
Contribuição; v) Aposentadoria
Especial; vi) Salário-família; vii)
Salário-maternidade; viii) Auxílio-
acidente; ix) Pensão por Morte; x)
Auxílio-reclusão; xi) Serviços de
Habilitação e Reabilitação Profissional;
xii) Benefícios Previdenciários do
Microempreendedor – MEI.
No que corresponde a pensão
por morte, esta se constitui como um dos
mais importantes benefícios
previdenciários do sistema brasileiro,
direcionada para a família, de modo a
ampará-la diante da perda de seu
mantenedor. Para notarmos a
importância da pensão por morte, nos
remetemos ao conceito de risco social,
elemento norteador para a busca pelo
bem-estar social. Que consiste na
ausência de condições que garantam
condições mínimas de vida.
É justamente a proteção do
cidadão diante dos riscos sociais a base
da existência da Previdência Social, no
qual busca garantir o seu tratamento
humano, diante de alguma necessidade
iminente, mas, principalmente, para
buscar o bem-estar universal, que é “o
ideário da Ordem Social, para o qual
deve voltar-se toda a sociedade”
(LADENTHIN, 2007, p. 52).
Complementa Derzi (2004, p. 72):
No momento em que se constitucionalizam regras conhecedoras das necessidades sociais, como verdadeiro acerto histórico, moral, jurídico e cultural de um povo, conquistado ao longo dos embates ideológicos através dos séculos, esse Estado não apenas se torna guardião dos direitos sociais, como assume o dever de agir no sentido de viabilizar os meios idôneos de superá-las.
A situação de risco social é
notada na medida em que se apresenta a
situação de morte de um segurado, que
colaborava com o sustento de sua
família, afetando imediatamente a renda
daquele núcleo familiar, conforme era
observado na Lei Nº 8213/91.
No caso da pensão por morte, os
dependentes eram classificados, por
meio da Lei Nº 8213/91, como: o (a)
cônjuge, a companheira, o companheiro
e o filho não emancipado de qualquer
condição, menor de 21 anos ou inválido
de qualquer idade; os pais, na falta dos
dependentes preferenciais anteriormente
relacionados e o irmão não emancipado,
de qualquer condição, menor de vinte e
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um anos ou inválido, na falta dos dois
anteriores relacionados (ANFIP, 2014, p.
27).
Martins compreende pensão
por morte como sendo “o beneficio
previdenciário pago aos dependentes em
decorrência do falecimento do segurado.
Em sentido amplo, pensão é uma renda
paga a certa pessoa durante toda a sua
vida” (MARTINS, 2004, p. 388).
Fachin e Nascimento (2011)
alertam que a pensão por morte possui
um papel fundamental na salvaguarda do
direito social, pois em muitos casos
torna-se o único meio de renda para a
sobrevivência dos dependentes.
Complementam os autores:
A razão de ser da pensão é amparar os dependentes do segurado falecido para que estes tenham condições de se manterem. A pensão será concedida não apenas quando ocorrer a morte real, natural do segurado (cessação definitiva de todas as funções de um organismo vivo), mas também, quando ocorrer a morte presumida nos casos de desaparecimento do segurado em catástrofe, acidente ou desastre. (FACHIN & NASCIMENTO, 2011, s.p.)
Tratar sobre os estudos da
pensão por morte é tratar sobre a
proteção da família. Importante observar
que a importância da família é tratada
como a base da sociedade na Carta
Magna brasileira, conforme é possível de
observar na passagem abaixo:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...) § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. § 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (BRASIL, 1988, s.p.).
Tendo-se em vista a relevância
social da pensão por morte a partir dos
autores citados, ressalta-se a importância
de trazer em evidência as alterações de
acesso a esse benefício e a consequência
no impacto de salvaguardar a sua
universalização para a população, diante
do enfrentamento dos “riscos sociais” da
família (BRASIL, 1991, s.p.).
3. PROCEDIMENTOS METODO-
LÓGICOS
O presente trabalho foi norteado
pelo método da pesquisa bibliográfica,
que consiste na busca por fontes
primárias e secundárias que versam
sobre as temáticas da pensão por morte e
benefício previdenciário. A partir de uma
análise qualitativa, foram utilizadas
fontes diversificadas, partindo desde o
levantamento de investigações
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científicas empreendidas nessa seara
(retrospectivas ou contemporâneas),
bem como fontes de “primeira mão”
(GERHARDT et al, 2009, p. 69),
notadamente os documentos sem
tratamento analítico, como documentos
oficiais, legislações e dados estatísticos.
Para a construção das bases
conceituais dessa pesquisa, foi abordada
uma investigação bibliográfica focada
no conceito de Previdência Social e
Pensão Por Morte. Para tanto, foram
empreendidos levantamentos em revistas
científicas, por meio da biblioteca
eletrônica Scielo, do portal de periódicos
da CAPES (Coordenação de
Aperfeiçoamento de Nível Superior) e
nas bases de dados do Latindex.
Também foram realizadas buscas por
livros, teses e dissertações que tratem
sob o tema.
A fim de se verificar os marcos
legais da Pensão por Morte no país, foi
abordado a legislação brasileira que
passa a tratar da inserção dos debates
dessa temática, notadamente as leis Nº
13.135/15 e Nº 8.203/91.
As informações coletadas nas
legislações foram organizadas de modo a
verificar a situação da universalidade da
Pensão por Morte no país. De modo a
contribuir nessa análise, também foi
realizado levantamento de dados
estatísticos junto ao INSS, com o
objetivo de coletar informações sobre
pensão por morte no Estado do Ceará.
4. ANÁLISE E DISCUSSÃO
Tratar sobre as alterações nas
regras de acesso ao benefício da pensão
por morte é tratar sobre a crise da
previdência brasileira. Para tanto, é
peculiar observarmos inicialmente que,
apesar do contexto em que se
encontravam os debates políticos a nível
global, com a busca de uma inserção
mais efetiva da lógica do estado mínimo,
a promulgação da Carta Magna de 1988
contradizia tal lógica, reforçando o papel
do Estado na salvaguarda do bem-estar
social, conforme visto na nossa revisão
de literatura.
Porém, ao longo do rearranjo
político no período da retomada da
redemocratização brasileira nos anos
finais da década de 1980 e início da
década de 1990, percebe-se o papel do
realinhamento em volta a um modelo
neoliberal. Assim, passa-se a crescer os
questionamentos a respeito da figura do
Estado enquanto mantenedora da
previdência social, notadamente: a
redução da intervenção do Estado na
oferta de uma rede de assistência de
saúde pública e o sistema previdenciário.
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Os princípios que orientam o
paradigma neoliberal na questão social
eram antagônicos aos da Carta de 1988,
conforme é possível notar no Quadro 1,
tornando a proposição de uma
“constituição cidadã” numa
“constituição anacrônima”, distante no
tempo e no espaço no qual as “novas
necessidades” econômicas emergiam
(FAGNANI, 2007).
Quadro 1 – Princípios da CF/88 e da Reforma Neoliberal
PRINCÍPIOS
CONSTITUIÇÃO FEDERAL (1988) REFORMA NEOLIBERAL
Seguridade Social Seguro Social
Estado do bem-estar social Estado mínimo
Universalização Focalização
Prestação estatal direta dos serviços
sociais Estado regulador e privatização
Direitos trabalhistas Flexibilização
Fonte: Adaptado de Fagnani (2007)
Como principal justificativa
para a busca por reformas no sistema
previdenciário brasileiro, temos a
incapacidade do Estado de financiar a
Previdência Social, associando ao déficit
na relação entre a arrecadação e
despesas, que poderia se agravar na
medida em que aumentasse a
longevidade da população brasileira.
Dugnani (2009) atenta que
nesse contexto de tomada por reformas
previdenciárias, as justificativas do
déficit eram movidas também por
situações como:
(...) a elevação do salário mínimo; as aposentadorias precoces por tempo
de contribuição; os benefícios especiais para trabalhadores rurais, mulheres e professores; o acúmulo dos benefícios de aposentadoria e pensão para um mesmo indivíduo; o valor elevado dos benefícios em montante incompatível com a capacidade produtiva da economia e com as limitações do orçamento público; a renúncia de receita, sonegação e evasão fiscal; e, os custos administrativos elevados (DUGNANI, 2009, p. 155).
Tendo em vista que apenas a
contribuição por meio de desconto em
folha de salário era insuficiente para
subsidiar o sistema de Proteção Social, a
Constituição estabeleceu um Orçamento
de Seguridade Social (OSS). Segundo o
Art. 195 da Carta Magna brasileira, a
seguridade social passou a ser financiada
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por toda a sociedade, de forma direta e
indireta, nos termos da lei, mediante
recursos provenientes dos orçamentos da
União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios, por meio das seguintes
contribuições sociais: a) do empregador,
da empresa e da entidade a ela
equiparada na forma da lei, incidentes
sobre a folha de salários, o lucro, a
receita ou o faturamento; b) do
trabalhador e dos demais segurados da
previdência social; c) sobre a receita de
concursos de prognósticos; e d) do
importador de bens ou serviços do
exterior.
Sob o custeio da Previdência
Social, o mesmo é pautado por meio de
contribuições, como: Fundo de
Previdência e Assistência Social
(FPAS), Programa de Integração Social
(PIS), Programa de Formação do
Patrimônio do Servidor Público (Pasep),
Fundo de Ação Social (FAS), dentre
outros. Desse modo, o financiamento dos
gastos sociais públicos no país apresenta
sob a seguinte estrutura (ver Tabela 1).
Tabela 1 – Previdência Social Brasileira: distribuição do percentual das fontes dos recursos (média de 1999 a 2004)
FONTES MÉDIA
(ANOS DE 1999 – 2004) - %
1. Recursos provenientes de impostos 6,8
2. Contribuições sociais 91,3
2.1 Contribuições dos empregadores e dos
trabalhadores para a Seguridade Social 57,9
2.2 Contribuição sobre o lucro 3,6
2.3 Contribuição para financiamento da seguridade
social 23,3
2.4 Contribuição para o Plano de Seguridade do
Servidor 2,8
2.5 Contribuição para o custeio de pensão dos militares 0,1
2.6 Contribuição Provisória sobre Movimentação
Financeira (CPMF)* 3,6
3. Outras fontes 1,4
Total 100%
Fonte: Adaptado de Boshetti e Salvador (2006)
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Numa análise mais aprofundada
do perfil da carga tributária do
financiamento da Previdência Social nos
apresenta a característica regressiva da
arrecadação por meio de Contribuições
dos empregadores e dos trabalhadores
para a Seguridade Social. Tal situação
resulta por onerar proporcionalmente
mais os cidadãos de menor renda,
evidenciando que a mesma passa a ser a
principal pilastra de sustentação
financeira da Previdência. Levando em
consideração que cerca de 57,9% dos
recursos para o custeio da Previdência
Social Brasileira advém da arrecadação
da contribuição previdenciária, torna-se
notório que são os recursos dos
trabalhadores a principal fonte
alimentadora do sistema.
Tal situação econômica é
latente para observarmos que sob o ponto
de vista prático são os trabalhadores mais
pobres que financiam as políticas da
Previdência Social. Sob essa situação,
Boshetti e Salvador (2006) afirmam que
o Estado brasileiro age como um Robin
Hood às avessas, retirando
majoritariamente dos mais pobres para
sustentar um serviço para os mais ricos.
“A baixa carga de impostos diretos no
Brasil revela que as elites querem ser
sócias do fundo público, mas não querem
ser tributadas” (BOSHETTI E
SALVADOR, 2006, p. 20).
Apesar da presente pesquisa
não se propor em enveredar no viés
econômico, é necessário tal
compreensão a respeito da situação
receita-despesa da Previdência Social,
pois trata-se da principal justificativa
para as alterações nas regras
previdenciárias. Sobre esse tema,
concordamos com Boshetti e Salvador
(2006) ao afirmarem que diante das
possibilidades previstas para o custeio
previdenciário, a geração de déficit
decorre de uma apropriação do fundo
público da seguridade social, passando a
vinculá-lo a dívida pública. Assim, parte
considerável do que é arrecadado é
desvirtuado de sua finalidade,
destinando recursos que sob o ponto de
vista da arrecadação prevê seu uso para
políticas sociais, mas, na prática, acaba
destinado para o pagamento da dívida
pública brasileira.
O caso da Contribuição
Provisória sobre Movimentação
Financeira (CPMF) é emblemático
diante desse retrospecto. A CPMF surgiu
em 1996 sob o objetivo de contribuir
com o custeio da Saúde Pública,
Previdência Social e do Fundo de
Combate e Erradicação da Pobreza. No
final de sua vigência, em 2007, a CPMF
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destinava apenas 47% do total
arrecadado para a tais finalidades, indo o
restante do montante para cobrir dívidas
do Estado (JORNAL O ESTADO DE
SÃO PAULO, 2007).
4.1 A PENSÃO POR MORTE E O
RISCO SOCIAL
No âmbito histórico, a pensão
por morte encontra-se situada como um
dos benefícios mais antigos do sistema
previdenciário brasileiro. A Lei Eloy
Chaves, de 24 de Janeiro de 1923, ao
tempo que consolidou as bases do
sistema previdenciário do país, por meio
da criação da Caixa de Aposentadorias e
Pensões para os empregados das
empresas ferroviárias, trouxe importante
contribuição para a pensão por morte. Na
lei de 1923, foi instituída a concessão de
pensão por morte aos herdeiros dos
ferroviários que viessem a falecer
passado 10 anos de serviços prestados,
ou então que tivessem perdido a vida por
meio de acidente de trabalho (BRASIL,
1923).
Ao longo do século passado,
houve uma série de instituições
normativas que passaram a dar mais
escopo à definição dos beneficiários da
pensão por morte. Assim, partiu-se da
figura da mulher/esposa (Decreto Nº.
26.778/49) como beneficiária quase que
exclusiva, para um conjunto de outras
possibilidades de beneficiários na
atualidade, conforme foi possível
observarmos no capítulo anterior do
presente trabalho.
Essa preocupação inicial
centrada na figura da esposa encontrava-
se embasada pelo contexto social que o
país vivenciava nos anos 1940, no qual a
mulher ainda não tinha pleno espaço no
mercado de trabalho, limitando-se
majoritariamente as atividades do lar. Na
medida em que a mulher passava a
romper as barreiras do patriarcalismo
moderno, a legislação previdenciária
torna-se mais abrangente para as
possibilidades de beneficiários.
A partir da Lei Nº 8.213/91 (e
por suas seguintes revisões), passam a
ser beneficiários:
• o/a cônjuge: respeitando as
definições de cônjuge do
Direito Civil brasileiro, a
Lei Nº 8.213/91 previa que
no caso de morte do
segurado/a, seu cônjuge,
cuja dependência
econômica é presumida,
fazem jus ao benefício de
pensão por morte,
independente do tempo de
matrimônio;
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 - ISSN 2238-524X
• companheiro/a: tendo em
vista que trata-se de uma
“convivência pacífica,
contínua e duradoura e
estabelecida como objetivo
de constituição de família”
(BRASIL, 2002), a situação
do companheiro/a o
caracteriza a partir do Novo
Código Civil Brasileiro os
mesmos impeditivos legais
para o casamento. Assim,
estendem-se os direitos
previdenciários para os
companheiros/as;
• ex-cônjuge e ex-
companheiro: não
encontram-se na relação de
dependentes da Lei Nº
8.213/91. Porém, podem
configurar-se como
beneficiários da pensão por
morte, desde que seja seu
dependente econômico.
Afirma a referida Lei: “O
cônjuge divorciado ou
separado judicialmente ou
de fato que recebia pensão
de alimentos concorrerá em
igualdade de condições com
os dependentes referidos no
inciso I do art. 16 desta Lei”
(BRASIL, 1991, s. p.);
• filho menor ou inválido,
enteado e equiparados: no
qual a dependência
econômica é presumida e
absoluta. Importante atentar
que a Carta Magna equipara
os chamados filhos
legítimos, ilegítimos ou
adotivos, os quais não
podem ser juridicamente
discriminados;
• pais, irmão menor ou
inválido: integram ao rol de
dependentes, mas só podem
ser caracterizados como tal
quando comprovada a
dependência econômica,
que deve ser marcada pela
ajuda ou participação
financeira constante e
necessária para a vida dos
referidos entes familiares.
De modo geral, o conjunto de
beneficiários previstos na Lei Nº
8.213/91 buscavam centralizar-se numa
questão central: a salvaguarda da família
diante da possibilidade de risco social.
Importante atentar também que a partir
da Lei Nº 8.213/91, não havia a
exigência de tempo mínimo de
contribuição para que os dependentes
pudessem ter acesso ao benefício.
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Porém, era necessário que, na data da
morte, o segurado estivesse contribuindo
para a Previdência Social.
Entre o ano de 1991 e o ano de
2015, perpassamos por um período no
qual se reforçou a questão do
estrangulamento da receita do sistema
previdenciário, gerando uma
intensificação no discurso de
necessidade de uma série de alterações
no referido sistema.
Assim, emerge o debate de
algumas “correções” previdenciárias.
Propõe-se a modificação de cálculo para
a aposentadoria, trazendo para o debate o
cálculo progressivo, devido à ampliação
da expectativa de vida do brasileiro. Em
2015, foi sancionada a Lei Nº.
13.134/2015 que altera regras de acesso
ao seguro-desemprego, dentre as quais o
trabalhador passa a ter direito ao seguro-
desemprego se tiver trabalhado por pelo
menos 12 meses nos últimos 18 meses,
imediatamente anteriores à data de
dispensa, quando da primeira solicitação
(BRASIL, 2015). As mudanças podem
ser observadas a Figura 1.
Figura 1 – Modificações do acesso ao seguro-desemprego
Fonte: http://goo.gl/PSl136, visualizado em 20 mar. 2016.
Nesse interim, também é
sancionado pela presidência da república
a Lei Nº 13.135/2015, que altera o acesso
da população à pensão por morte.
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Podemos considerar com as principais
mudanças as idades do pensionista no
momento da morte do segurado e a
condição que o segurado deve atender
para o acesso ao benefício.
Analisando o novo dispositivo
legal, percebe-se que sai de cena o
caráter vitalício para o pensionista
cônjuge ou companheiro, e surgem
regras que limitam o tempo de acesso ao
benefício. As mudanças provocadas pela
Lei Nº 13.135/2015 encontram-se
sintetizadas nos Quadros 2 e 3, a seguir:
Quadro 1 – Classificação de dependentes
Fonte: http://goo.gl/hc6uxU, visualizado em 13 mar. 2016.
Quadro 2 – Regras para os pensionistas
Fonte: http://goo.gl/hc6uxU, visualizado em 13 mar. 2016.
Para além dessas modificações,
cabe observar a possibilidade de
modernização do acesso beneficiário a
partir da referida lei. Exemplo disso vale
destacar que foi introduzida na nova lei a
possibilidade de perda da pensão,
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quando comprovada a fraude no
casamento ou união estável.
Interessante notar, porém, que
apesar da justificativa dada que as
mudanças do acesso à pensão por morte
vinham com o objetivo de alinhar as
regras vigentes no país com aquelas
praticadas no restante do planeta, tal
situação não se observa enquanto uma
situação concreta, questionando-se a sua
veracidade. É possível chegar a essa
conclusão, ao levar em consideração os
demais países da América Latina (mais
próximas da nossa realidade social e
econômica), que não vislumbra o
cerceamento de acesso a esse benefício
tal qual o proposto pela lei em análise
(ver Quadro 3). Nota-se, ainda, que as
mudanças promovidas no acesso à
pensão por morte no Brasil possuem uma
similaridade mais próxima com os países
ditos desenvolvidos, suscitando o
questionamento: um benefício social
brasileiro se adequaria a uma regra
vigente em países com contexto social e
econômico abissalmente distintos?
Quadro 3 - Regras de pensões por morte – América do Sul, G20 e Brasil
Fonte: Adaptado de http://goo.gl/F8y6nB, acessado em 14 mar. 2016.
Apesar desse avanço do ponto
de vista jurídico, levanta-se a questão
prática de tais alterações, onde se reduz
o impacto desse benefício para as
famílias que se encontram em risco
social. É notório o papel que a pensão
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por morte tem no cômputo total dos
benefícios emitidos pelo Regime Geral
da Previdência Social. Dados de 2013
apontam que, no ano de 2013, cerca de
25% do total de benefícios concedidos
foram relacionados à pensão por morte
(ver Figura 3).
Figura 3 – Participação no valor total dos benefícios emitidos do RGPS em dezembro de 2013
Fonte: http://goo.gl/F8y6nB
Tal proporção apresentada
denota a elevada importância da pensão
por morte na sustentação familiar de
milhões de brasileiros na atualidade,
suscitando alguns questionamentos,
como: quais as ações a serem adotadas
para que as famílias que futuramente não
se enquadrem nas atuais regras, de modo
a salvaguardar a garantia constitucional
de proteção da família pelo Estado? As
necessidades de adequar os gastos da
previdência aos ditames do mercado
financeiro suplanta a necessidade de
proteção da família ao risco social?
Tais questionamentos ainda
estão a serem respondidos na medida em
que os primeiros resultados (positivos e
negativos) advindos da vigência da Lei
Nº 13.135/2015 começarem a surgir. A
análise de sua constitucionalidade
necessita, porém, vir a tona a partir de
um amplo debate jurídico nacional.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esse trabalho buscou averiguar
o contexto de formulação da Lei Nº
13.135/2015, sob a ótica dos seus
impactos na garantia constitucional de
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proteção à família. A partir dos objetivos
traçados, foi possível notar que o
surgimento do debate sobre a pensão por
morte encontra-se intimamente ligado à
própria formação da previdência social,
focada em salvaguardar os direitos
sociais. Também foi possível notar o
papel de relevância desse benefício
social na salvaguarda da família diante
dos riscos sociais.
Nesse sentido, observam-se as
mudanças de acesso à pensão por morte,
suscitando o questionamento sobre os
impactos de proteção do núcleo familiar
pelo Estado. A partir dessa análise, é
possível levantar o questionamento se as
mudanças promovidas em 2015 colocam
em xeque o princípio constitucional da
seguridade social de proteger os direitos
individuais e coletivos.
O fato da Lei Nº 13.135/2015
ser ainda muito recente, dificulta uma
análise comparativa da situação empírica
do acesso à pensão por morte e os seus
impactos na previdência social. Porém,
as mudanças promovidas acende o alerta
para a necessidade de uma maior
investigação sobre a constitucionalidade
dessa legislação.
REFERÊNCIAS
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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13134.htm. Acesso em 17 abr. 2016. BRASIL. Lei Nº 8.213, de 24 de Julho de 1991. 1991. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8213cons.htm. Acesso em 20 mar. 2016. BRASIL. Decreto Nº 4.682, de 24 de Janeiro de 1923. 1923. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/Historicos/DPL/DPL4682.htm. Acesso em 12 abr. 2016. DERZI, H. H. Os Benefícios Previdenciários da Pensão por Morte: Regime Geral de Previdência Social. São Paulo: Lex, 2004. DUGNANI, R. A previdência social brasileira sob pressão neoliberal. Disertação (Mestado em Economia Política). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2009. FACHIN, E.; NASCIMENTO, C. C. do. Pensão por morte: aspectos materiais, processuais e jurisprudência dominante. Âmbito Jurídico , Rio Grande, XIV, n. 90, jul 2011. Disponível em: <http://ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9833&revista_caderno=20>. Acesso em 13 abr. 2016. FERREIRA, A. B. de H. Dicionário Aurélio da língua portuguesa. 5.ed. Curitiba, PR: Positivo, 2010. GERHARDT, T. E.; RAMOS, I. C. A.; RIQUINIHO, D. L.; SANTOS, D. L.
Estrutura do Projeto de Pesquisa. In: GERHARDT, T. E. & SILVEIRA, D. T. Métodos de Pesquisa. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009. IBRAHIM, F. Z. Curso de Direito Previdenciário. Niterói: Impetus, 2007. JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO. A CPMF, da origem ao fim. São Paulo, 13 Dez. 2007. Disponível em http://www.estadao.com.br/especiais/a-cpmf-da-origem-aofim,3929.htm. Acesso em 13 abr. 2016. KERTZMAN, I. Curso Prático de Direito Previdenciário. Salvador: JusPodivm, 2012. LADENTHIN, A. B. de C. Aposentadoria por idade no direito previdenciário. Dissertação (Mestrado em Direito Previdenciário). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2007. MARTINS, S. P. Direito da Seguridade Social. São Paulo: Atlas, 2004. PEREIRA, J. C. Planejamento, mudança e democracia. Ciência e Cultura. São Paulo, 38 (9): 1517-1529, set. 1986. RIBEIRO, J. C. G. A Previdência social no regime geral na constituição brasileira. São Paulo. Ed. LTR, 2001. SILVA, V. A. da. A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas relações sociais entre particulares. São Paulo: Malheiros, 2004.
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CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRÍTICA DA RELIGIÃO EM LUDWIG
FEUERBACH
Walber Nogueira da Silva
Mestre em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará e Professor do Curso de Direito da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza (FGF)
RESUMO: O presente artigo tem por objetivo principal analisar, de modo imanente, a crítica religiosa empreendida pelo filósofo alemão Ludwig Feuerbach e a religião como uma forma de alienação. Em sua obra A essência do cristianismo, Feuerbach nos mostra que o conhecimento de Deus é, na verdade, o conhecimento do próprio homem. Escrevendo em uma Alemanha atrasada política e economicamente, onde a religião servia de justificativa ideológica à ordem social vigente, ele evidencia que o homem aliena suas potencialidades em um ser superior, exterior a ele. Assim, aquilo que a religião toma como algo objetivo é, na verdade, a própria essência humana. Basta, portanto, invertê-la e teremos revelada a universalidade da humanidade. Apesar desta crítica contundente, Feuerbach não foi capaz de estender suas ideias antropológicas ao ser humano concreto, ao ser humano histórico-social, não percebendo a dimensão histórica e ativa do homem nem que sentimento religioso é um produto social e que o indivíduo abstrato que ele analisa pertence a uma determinada forma de sociedade. Palavras-Chave: Crítica da Religião; Alienação; Materialismo. ABSTRACT: This article aims to analyze the criticism of religion undertaken by the german philosopher Ludwig Feuerbach and the religion as a way of alienation. In his work The essence of christianity, Feuerbach show us that the knowledge about God is, in fact, the knowledge about the man. He wrote in a Germany political and economic lag, where the religion served to justify the social order. He tells that the man alienates his potentialities in a superior and outside being. Thus, what the religion takes as something objective is, in fact, the human essence. Just inverse it and we have disclosed the universality of mankind. Despite this definite criticism, Feuerbach could not extend his anthropological ideas to the human being historical and social, not realizing the historical and active dimension of man nor that the religious feeling is a social constructions and that the abstract fellow that he analyze belong to a specific society. Keywords: Criticism of the Religion; Alienation; Materialism
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
Em seu principal estudo sobre a
religião1, Feuerbach parte da busca pelo
seu fundamento antropológico: o
conhecimento de Deus como
conhecimento do próprio homem.
Naquele momento, meados do
século XIX, a crítica da religião era
importante porque era necessário criticar
a estrutura feudal que ainda existia na
Alemanha e cujo sistema ideológico se
encontrava na religião. Esta situação
anacrônica2 devia ser superada, mas
como fazê-lo se todo o organismo social
era teologicamente justificado e a injusta
ordem social vigente se colocava como
portadora da vontade e onipotência
divinas e, portanto, como sendo a única
possível? Para a filosofia comprometida
com a transformação da realidade, só
restava a crítica à própria religião, já que
esta era uma forma ideológica de
justificação e manutenção da estrutura
social injusta ora vigente. Uma vez livre
destas supostas determinações divinas, o
homem poderia assumir sua liberdade e
construir a si e à sociedade a partir dele
mesmo.
Buscando os fundamentos
humanos que possibilitam a religião,
Feuerbach principia do fato de que só os
1 Referimo-nos aqui a sua obra A Essência do cristianismo (Das Wesen des Christentums), de 1841.
homens têm religião, os animais, não: "a
religião se baseia na diferença essencial
entre o homem e o animal - os animais
não têm religião" (Feuerbach, 2007, p.
35). Como isso é possível?, pergunta ele.
Para responder a esta pergunta, parte da
constatação de que o ser humano tem
consciência, no sentido rigoroso do
termo, o que significa que os seres
humanos podem, além da consciência da
sua individualidade, ter consciência
também do seu gênero, da espécie como
um todo. Daí ser o homem um ser
genérico (Gattungswesen):
Consciência no sentido rigoroso existe somente quando, para um ser, é objeto o seu gênero, a sua quiquidade. De fato, é o animal objeto para si mesmo como indivíduo - por isso ele tem sentimento de si mesmo - mas não como gênero - por isso falta-lhe a consciência, cujo nome deriva de saber (Feuerbach, 2007, p. 35). Enquanto o animal tem uma vida
simples, o homem possui uma vida
dupla: além de sua existência exterior, o
homem possui uma vida interior,
proveniente de sua relação com o gênero,
com a essência humana. Assim,
enquanto o homem é capaz de pensar, de
ser para si mesmo eu e também tu (ou
seja, o seu gênero pode ser-lhe objeto), o
2 A chamada miséria alemã.
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animal não pode exercer funções de
gênero sem ter um outro fora dele, já que
"vive a dupla limitação de seu ser
restrito que, por ser restrito, o impede
também de ter uma consciência ampla,
universal, infinita: que é, no final das
contas, consciência da própria infinitude
da consciência" (Frederico, 2009, p. 32).
Na religião o homem tem por
objeto essa sua essência genérica, vez
que a consciência fundante da religião
fornece ao mesmo tempo a esta o seu
objeto: a essência humana. Então, aquilo
que aparece como sendo um atributo
divino (onipotência, infinitude, amor,
sabedoria, etc), nada mais é que a
expressão das próprias capacidades da
espécie humana. No fenômeno religioso,
portanto, o homem relaciona-se consigo
mesmo.
Ora, "um ser realmente finito não
possui a mínima ideia, e muito menos
consciência, do que seja um ser finito,
porque a limitação do ser é também a
limitação da consciência" (Feuerbach,
2007, p. 36). Tal afirmação nos leva a
concluir que não se pode pensar algo não
pensável. É desta forma que, segundo
Feuerbach, a religião é a consciência não
finita da própria infinitude do homem.
"Qual é então a essência do
homem, da qual ele é consciente, ou que
realiza o gênero, a própria humanidade
do gênero?" (Feuerbach, 2007, p. 36). O
autor de A essência do cristianismo
responde: a razão, a vontade e o coração.
É exatamente por estas dimensões que o
indivíduo humano transcende a si
mesmo, estabelece sua relação com o
gênero, e se sente, enquanto ser
particular, finito, perante a essência
humana.
Vontade, amor ou coração não são poderes que o homem possui - porque ele nada é sem eles, ele só é o que é através deles -, são pois como os elementos que fundamentam sua essência e que ele nem possui nem produz, poderes que o animam, determinam e dominam - poderes divinos, absolutos, aos quais ele não pode oferecer resistência" (Feuerbach, 2007, p. 37).
Dessa forma, o gênero, que está
contido na razão, vontade e no coração,
enquanto possibilidade da unidade do
homem com o homem, é a própria
essência humana. Portanto, a essência
humana está fora do indivíduo restrito.
Como estas características são atribuídas
a Deus, Ele, o Todo-Poderoso, acaba
sendo a possibilidade de libertação do
homem dos limites da existência
individual, na medida em que, por Ele,
os seres humanos podem, como
indivíduos particulares, darem-se conta
de sua natureza universal.
O homem vai conhecendo sua
essência à medida em que toma
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consciência dos objetos, embora ela
esteja nele mesmo enquanto
potencialidade. O homem, ao tomar
conhecimento dos objetos, conhece a si
mesmo e a suas capacidades. Então, ele
precisa do objeto para alcançar sua
autoconsciência, embora o objeto da
consciência não possa ir além da própria
essência humana. O objeto é a afirmação
da essência humana:
(...) toma o homem consciência de si mesmo através do objeto: a consciência do objeto é a consciência que o homem tem de si mesmo. Através do objeto conhece o homem; nele a sua essência te aparece; o objeto é a sua essência revelada, o seu Eu verdadeiro, objetivo. E isto não é válido somente para os objetos espirituais, mas para os sensoriais também. (Feuerbach, 2007, p. 38).
O homem não pode perceber,
pensar ou sentir algo que esteja além da
sua capacidade de perceber, pensar ou
sentir. Assim, ao pensar o infinito,
confirma a infinitude de sua capacidade
de pensar, afinal, não poderia perceber
sua finitude, suas limitações, se a
infinitude do gênero não fosse objeto
para ele. Por isso que ele não pode sentir
a divindade pelo sentimento se este já
não fosse por si mesmo divino:
Portanto, se pensas o infinito, pensas a infinitude da faculdade de pensar; se sentes o infinito, sentes e confirmas a infinitude da capacidade de sentir. O
objeto da razão é a razão enquanto objeto de si mesma, o objeto do sentimento o sentimento enquanto objeto de si mesmo. (...) O sentimento é, pois, sacralizado meramente por ser sentimento; o motivo de sua religiosidade é sua natureza, é inerente a ele próprio" (Feuerbach, 2007, pp. 41, 42).
Desse modo, se o sentimento faz
parte da essência subjetiva da religião,
outras forças, atividades e potências
também o fazem. Deus é estas
qualidades. A existência delas nos
surpreende tanto que chegamos a pensar
que são uma natureza fora de nós.
Atribuímo-las a um Deus objetivo e
exterior e esta é a alienação religiosa:
atribuir atributos próprios da essência
humana a uma existência imaginária e
estranha, um engano, portanto. A
religião se constitui a partir deste
engano: é nossa própria essência, na
verdade, que temos quando
consideramos a existência Deus.
Feuerbach intenta mostrar que
aquilo que aparece como sendo atributo
divino nada mais é que característica
humana exteriorizada, reduzindo, assim,
a teologia à antropologia, já que é do
homem que trata.
A religião tem como fundamento
as características da humanidade, logo, o
que importa é buscar a essência subjetiva
da religião. O homem aliena suas
potencialidades em um ser superior,
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exterior a ele. Assim, aquilo que a
religião toma como algo objetivo é, na
verdade, a própria essência humana.
Basta, portanto, invertê-la e teremos
revelada a universalidade da
humanidade. A religião é uma forma
indireta do homem se conhecer,
enquanto gênero:
A religião, pelo menos a cristã, é o relacionamento do homem consigo mesmo ou, mais corretamente: com a sua essência; mas o relacionamento com a sua essência como uma outra essência. A essência divina não é nada mais do que a essência humana, ou melhor, a essência do homem abstraída das limitações do homem individual, i. e., real, corporal, objetivada, contemplada e adorada como uma outra essência própria, diversa da dele - por isso todas as qualidades da essência divina são qualidades da essência humana. (Feuerbach, 2007, pp. 45, 46).
O problema principal é que o
homem não reconhece o objeto religioso
como sua própria essência objetivada. A
essência humana projetada em Deus (o
predicado) é a verdade do sujeito, mas
este não a reconhece mais. Assim, na
religião, o homem relaciona-se com a
sua essência como se ela fosse uma outra
que não lhe pertence mais. Isso ocorre
porque a religião transfere para Deus
toda a riqueza do homem, esvaziando-o.
3 Feuerbach considera que a filosofia de Hegel não deixa de ser uma teologia a partir do momento em que ele faz das determinações do homem as determinações divinas. Hegel considera a arte, a religião e a filosofia como
Ao projetar sua essência em Deus o
homem empobrece-se a ponto de não
mais reconhecê-la como sua e
transforma-se de criador em criatura, em
obra de sua obra:
O homem – e este é o segredo da religião – objetiva a sua essência e se faz novamente um objeto deste ser objetivado, transformado em sujeito, em pessoa; ele se pensa, é objeto para si, mas como um objeto de um objeto, de um outro ser. (Feuerbach, 2007, pp. 58, 59).
Portanto, Deus é tudo e o homem,
nada, o que mostra que a teologia cristã
traz em si uma contemplação negativa,
hostil ao homem: “ela torna o homem
pobre para enriquecer deus”. (Chagas,
2014, p. 82).
Com tais considerações,
Feuerbach inverte de maneira
materialista a relação Deus – ser humano
e transforma os problemas teológicos em
problemas antropológicos, além de dar
um impulso decisivo para a dissolução do hegelianismo, livrando as referidas questões do beco sem saída de uma interpretação hegeliana – que, embora por vezes fosse radical do ponto de vista do conteúdo, metodologicamente sempre permaneceu interna a este – e confrontando o sistema hegeliano com a própria realidade. (Lukács, 2012, p. 131)3.
manifestações do Espírito Absoluto, enquanto para Feuerbach são manifestações do próprio homem, da própria comunidade humana. Nisto consiste a viragem ontológica de Feuerbach em
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No entanto, Feuerbach não foi
capaz de estender suas ideias
antropológicas ao ser humano concreto,
ao ser humano histórico-social. Sua
crítica ao idealismo hegeliano e à
teologia conduzem, certamente, a uma
nova orientação ontológica, mas
carecem de uma concepção de homem
como ser histórico e social. Feuerbach é
o único que tem uma relação séria com a
dialética hegeliana e o único que fez
verdadeiras descobertas nesse domínio,
mas ele não percebe a dimensão histórica
e ativa do homem. Sua crítica se insere
nos marcos do ideário iluminista, já que
ele “limita-se a esclarecer, a chamar a
atenção dos homens que não reconhecem
nos tesouros do céu uma propriedade
extraviada a eles pertencente”
(Frederico, 2009, p. 43), ou seja, ele não
vai além de uma crítica esclarecedora
cuja pretensão é mudar as coisas apenas
com a força do pensamento.
Ademais, como Marx mostrou na
sua quinta tese sobre Feuerbach, o autor
de A essência do cristianismo parte do
fato da auto-alienação
[Selbstentfremdung] religiosa e da
duplicação do mundo [Welt] em um
mundo religioso e um mundo mundano
relação a Hegel: o pensar procede do ser, mas o ser não procede do pensar.
[weltliche], mas este mundo religioso só
pode ser explicado a partir do auto-
esfacelamento e do contradizer-a-si-
mesmo do fundamento mundano (Marx,
2007, p. 534). Feuerbach não vê, por
isso, que o sentimento religioso “é um
produto social e que o indivíduo abstrato
que ele analisa pertence a uma
determinada forma de sociedade” (Marx,
2007, p. 534).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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O JOVEM-APRENDIZ NO MUNDO DO TRABALHO:
ENTRE AS NORMAS JURÍDICAS E A DISCIPLINA
Alaísa Ferreira Flor Bacharel em Direito pela Faculdade Integrada da Grande Fortaleza
Thiago Menezes de Oliveira
Professor de Direito da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza
RESUMO: A inserção no mundo do trabalho é um rito de passagem para a vida adulta. Nesse sentido, a Lei N.º 10.097/2000 regulamenta o Contrato de Aprendizagem. Nesse contrato, os adolescentes, a partir dos 14 (quatorze) anos, podem trabalhar como aprendizes. O objetivo foi investigar as normas jurídicas especificas que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei da Aprendizagem dispõem a respeito da inserção do jovem no e trabalho, tendo em vista a importância de garantir o ingresso na atividade laboral. Procurou-se conceituar o sujeito aprendiz e buscou-se identificar as peculiaridades desse contrato de trabalho. Trata-se de pesquisa qualitativa do tipo bibliográfica. Concluiu-se que a aprendizagem pode garantir a exploração de algum potencial de caráter técnico-profissional metódica. Mesmo com alusões ao desenvolvimento integral, o foco do contrato de aprendizagem, com base nas previsões do ECA e da Lei de Aprendizagem, é essencialmente tecnicista e disciplinador. Palavras-chave: Mundo de Trabalho; Disciplina; e Contrato de Aprendizagem. ABSTRACT: Integration into labor`s world is a passage for adulthood. Although, the Law N. 10.097/2000 regulates the Learning Agreement. With this contract, from fourteen (14) years old, they can start to work as an apprentice. The objective of this article is to investigate the specific legal rules the Statute of Children and Adolescents (ECA) and the Learning Law. We try to conceptualize the learner. We ought to identify Learning Agreement. Therefore, the article is a qualitative and a bibliographical research. We concluded that learning could make an effort for professional abilities. Although the focus of the learning contract, based on the ECA`s and Learning Law`s norms, is essentially technical and disciplinarian. Keywords: Labour`s World; Discipline; and Learning Contract.
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1 INTRODUÇÃO
A aprendizagem no Brasil é
regulada pela consolidação das Leis do
Trabalho (CLT) e passou por um
processo de mudanças com a
promulgação das Leis N° 10.097, 19 de
Dezembro de 2000; Lei N° 11.180, de 23
de Setembro de 2005, e Lei N° 11.788 de
25 de Setembro de 2008. Nessa
perspectiva, o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), Lei N° 8.069 de 13
de Julho de 1990, também prevê, nos
seus artigos 60 a 69, o direito à
aprendizagem, de forma a assegurar o
princípio da proteção integral à criança e
ao adolescente.
A aprendizagem é um instituto
que cria possibilidades, tanto para o
aprendiz quanto para as empresas. Tem
um caráter tecnicista que visa à
preparação do jovem para desempenhar
atividades profissionais, ao criar
oportunidade para lidar com diferentes
situações no mundo do trabalho. Ao
mesmo tempo, permite às empreses
qualificar o jovem aprendiz, com idade
entre 14 a 24 anos, matriculando-o em
curso de aprendizagem profissional e
inserindo-o em estabelecimentos onde
vivenciam a prática do trabalho,
conforme rege a CLT.
A participação dos aprendizes se
dá por meio da matrícula em programas
de aprendizagem, observando a
prioridade legal atribuída aos Serviços
Nacionais de Aprendizagem e,
subsidiariamente, às Escolas Técnicas de
Educação e às Entidades sem fins
lucrativos (ESFL), que tenham por
objetivo a assistência ao adolescente,
garantindo-lhe a educação profissional.
Esses programas são registrados no
Conselho Municipal dos Direitos da
Criança e do Adolescente (COMDICA),
em se tratando de aprendizes entre a
faixa de 14 aos 18 anos. Em relação aos
aprendizes com deficiência, acrescenta-
se, ainda, que há o limite de 24 anos para
participar do programa de aprendizagem.
O objetivo geral deste trabalho
foi conceituar o sujeito aprendiz à luz da
legislação e da doutrina e o contrato de
aprendizagem, versando sobre as
peculiaridades deste contrato de trabalho
e ressaltando suas vantagens e
desvantagens. Metodologicamente,
recorreu-se à pesquisa descritiva e
exploratória, fundamentada em uma
revisão bibliográfica, recorrendo a
teóricos que tratam deste tema.
O presente estudo seguirá com o
delineamento do referencial teórico no
qual se define aprendiz e contrato de
trabalho de aprendizagem; identificam-
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se os aspectos da inserção do aprendiz no
mercado de trabalho; apontam-se as
possibilidade de transformar o contrato
de aprendizagem em contrato de trabalho
por tempo indeterminado; aborda-se o
certificado de qualificação profissional
de aprendizagem; são expostos os
aspectos gerais da inserção no mercado
de trabalho com base na Lei de
Aprendizagem e no ECA. Por fim,
apresentam-se os procedimentos
metodológicos e os dados e resultados da
pesquisa.
2 O TRABALHADOR APRENDIZ
Conforme a Consolidação das
Leis Trabalhistas (CLT) o aprendiz é o
adolescente ou o jovem entre 14 e 24
anos, que almeja à inserção no mundo do
trabalho. Esses jovens devem estar
matriculados e frequentando a escola,
caso não tenha concluído o ensino
médio, além da obrigatoriedade de
inscrição em programa de aprendizagem,
conforme o artigo 428, caput e §1º, da
CLT. Se o aprendiz for pessoa com
deficiência não haverá limite máximo de
idade para a contratação, em
consonância como artigo 428, § 5º, da
CLT.
Nas regiões onde não houver o
ensino médio, de acordo com o disposto
no § 1ª do Art. 428 § 7º da CLT, a
contratação do aprendiz poderá ocorrer
sem a frequência à escola, desde que ele
já tenha concluído o ensino fundamental.
Caso não tenha concluído o ensino
fundamental, a matrícula em instituição
regular de Ensino Médio será
obrigatória, pois a contratação só será
válida com a frequência do aprendiz à
escola. Assim, o aprendiz é o sujeito que
está regularmente matriculado no Ensino
Médio, ou que já o concluiu. Nesse
sentido, passa-se a analisar, a seguir, o
trabalho do aprendiz, à luz da CLT e do
ECA.
No ordenamento jurídico
brasileiro vigente, há normas que
regulamentam as condições da inserção
dos adolescentes no mercado trabalhista.
Dentre essas normas destacamos a Lei
Nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do
Adolescente), a Lei 10.097/2000 e o
Decreto nº 5.598/05, que definem a
política pública de governo, referente à
inserção do jovem no mercado de
trabalho: o Programa Jovem Aprendiz.
O Programa Jovem Aprendiz
requer que os jovens estejam
formalmente contratados como
‘aprendizes’ e matriculados nos
chamados cursos de aprendizagem, os
quais são abrangidos pela categoria de
ensino profissional. A previsão advém
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do Decreto Nº 5.154, de 23 de julho de
2004, da Presidência da República, que
disciplina os artigos 39 a 42, da Lei Nº
9.394/96, de 20 de dezembro de 1996,
Lei de Diretrizes e Bases da Educação,
que regulamentam a educação
profissional e tecnológica.
Esses cursos de aprendizagem se
materializam em programas técnico-
profissionais, os quais se desenvolvem
sob a orientação de entidades
qualificadas para proporcionar a
formação profissional inicial com foco
na qualidade dos serviços prestados e em
atitudes empreendedoras e sustentáveis.
Os jovens partícipes são contratados por
empresas do comércio de bens, serviços
e turismo, por meio de programa que
deve organizar, de forma processual e
metódica, as atividades correlatas às
práticas dos aprendizes, decorrentes do
poder disciplinar das empresas
contratantes. Esses jovens aprendizes,
conforme o artigo 2º da Portaria do
Ministério do Trabalho e Emprego
(MTE) Nº 615/2007 “[...] deverão
inscrever-se no Cadastro Nacional de
Aprendizagem, disponível no sítio do
MTE, através de formulário eletrônico”,
bem como optar por programas e cursos
de aprendizagem relacionados no
Cadastro Nacional de Aprendizagem.
Tais programas, por força do art. 8º
do Decreto Nº 5.598, de 1º/12/2005, são
ofertados pelo Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial (SENAI),
Serviço Nacional de Aprendizagem
Comercial (SENAC), Serviço Nacional
de Aprendizagem Rural (SENAR),
Serviço Nacional de Aprendizagem
Serviço Nacional de Aprendizagem
sobre Transporte (SENAT) e Serviço
Nacional de Aprendizagem de
Cooperativismo (SESCOOP), pelas
escolas técnicas de educação (inclusive
agrotécnicas), pelas entidades sem fins
lucrativos que tenham por objetivos à
educação profissional e à assistência ao
adolescente, registradas no Conselho
Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente (COMDICA).
A CLT dispõe em seu artigo 428
que o contrato de aprendizagem nada
mais é do que um contrato especial,
ajustado de forma escrita e por prazo
determinado, cuja duração não pode
exceder a 2 anos, salvo quando se tratar
de aprendiz portador de deficiência. No
contrato de aprendizagem, o empregador
assegura ao adolescente/jovem, com
idade entre 14 e 24 anos, previamente
inscrito em programa de aprendizagem,
uma formação técnico-profissional,
compatível com o seu desenvolvimento
físico, moral e psicológico.
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O aprendiz, doutra parte, se
compromete a executar com diligência e
zelo as tarefas que forem necessárias a
essa formação. Conforme já explicitado,
é importante destacar que a idade
máxima de 24 anos não se aplica a
aprendizes portadores de deficiência,
conforme §5º do artigo 428 da CLT.
Ressalta-se que, tanto a idade como o
tempo de duração do contrato de
aprendizagem, não se aplicam quando o
sujeito for pessoa com deficiência.
A formação técnico-profissional
deve basear-se nos seguintes princípios:
(I) garantia de acesso e frequência
obrigatória ao ensino fundamental; (II)
horário especial para o exercício das
atividades; e (III) capacitação
profissional que se adeque ao mercado
de trabalho. Esses princípios estão
previstos no artigo 7º do Decreto Nº
5.598/05.
Frisam-se, para efeitos didáticos,
as características principais extraídas do
contrato de aprendizagem, a saber: o
jovem deve ser inscrito em programa de
aprendizagem, sendo-lhe assegurada a
formação técnico-profissional.
Consoante disposto no artigo 429
da CLT, todos os estabelecimentos de
qualquer natureza têm a obrigação de
contratar aprendizes no percentual de, no
mínimo, 5% (cinco por cento), e, no
máximo, 15% (quinze por cento), que
incidirá sobre o número de trabalhadores
do respectivo estabelecimento, cujas
funções requeiram formação
profissional. Assim, os estabelecimentos
referidos devem contratar aprendizes,
em percentual de cinco a quinze por
cento dos trabalhadores ali existentes,
para as funções de formação
profissional. Contudo, vale dizer que o
artigo 14, do Decreto Nº 5.598/05, da
Presidência da República, dispõe que
estão desobrigadas dessa incumbência as
empresas de pequeno porte, as
microempresas, as optantes pelo
SIMPLES (artigo 11, da Lei Nº
9.841/99), além das entidades que não
tenham fins lucrativos. Essas últimas
entidades desde que seu objetivo esteja
voltado à educação profissional, em
acordo com a determinação contida no
artigo 11 da Lei nº 9.841/99, conforme
ressaltado no artigo 14 do Decreto nº
5.598/05.
Com efeito, o percentual
anteriormente referido deverá ser
calculado de acordo com cada
estabelecimento. Assim, naquelas
empresas que têm mais de um
estabelecimento, a cota de contratação
deve ser cumprida por cada um deles.
Esse entendimento é discutido na
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doutrina que não define um consenso
(SAASD, 2007).
No que tange aos aspectos formais
do contrato de aprendizagem, este deve
ser efetivado mediante anotação na
Carteira de Trabalho e Previdência
Social. Em anotações gerais, a data de
início e término do contrato de
aprendizagem deverão ser especificadas,
conforme definido no artigo 29 da CLT.
Ressalta-se, com relação às regras
de aprendizagem, que essas devem ser
definidas pela Administração Pública,
conforme informa o ‘Manual de
Aprendizagem: o que é preciso saber
para contratar o jovem
aprendiz’, publicado pelo MTE, no ano
de 2008, o qual explicita que as empresas
públicas e sociedades de economia mista
podem optar pela contratação direta de
aprendizes. Nessa hipótese, devem fazê-
lo por meio de processo seletivo, com
prévio edital, ou, indiretamente, por
meio das entidades que não tenham fins
lucrativos (artigo 16 do Decreto da
Presidência da República, Nº 5.598/05).
Acentua-se que as empresas
públicas e sociedades de economia
mista, exploradoras de atividade
econômica, nos termos do artigo 173,
§1º, II, da CF/88, devem observar a
legislação trabalhista. `É óbvio que não
podia ser diferente no que concerne à
contratação de aprendizes.
Vale ressaltar que, quando as
atividades práticas da aprendizagem
ocorrerem no interior de estabelecimento
sujeito à insalubridade ou à
periculosidade, sem que se possa elidir o
risco ou sem possibilidade de realizá-las
integralmente em ambiente simulado as
empresas deverão preencher a cota por
meio da contratação de jovens na faixa
etária entre 18 e 24 anos, ou com pessoas
deficientes, que tenham acima de 18
anos, em consonância com o parágrafo
único do artigo 11 do Decreto
presidencial Nº 5.598/05. Esse é um
aspecto importante, a respeito da
inserção do aprendiz no mercado de
trabalho, como definem o §único, do art.
91, do ECA e a Lei da Aprendizagem Nº
10.097/2000, ampliada pelo Decreto
Federal nº 5.598/2005.
As empresas ainda estarão
obrigadas a contratar aprendizes com
idade superior a 18 anos em mais duas
situações, conforme disposto nos incisos
II e III do art. 11 do aludido Decreto, in
verbis:
II - a lei exigir, para o desempenho das atividades práticas, licença ou autorização vedada para pessoa com idade inferior a dezoito anos; e III - a natureza das atividades práticas for incompatível com o desenvolvimento físico, psicológico e moral dos
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adolescentes aprendizes. (DECRETO N.º 5.598/05, artigo 11, incisos II e III).
Os contratos de trabalho dos
adolescentes devem ser anotados na
Carteira de Trabalho e Previdência
Social (CTPS), da mesma forma como
ocorre nos demais tipos de contrato
trabalhista. Entretanto, já na parte
denominada Anotações Gerais deverá
constar a informação de que o contrato é
pertinente à aprendizagem (§1º, do artigo
428, da CLT). Essa formalidade é
importante para assegurar a proteção aos
seus direitos trabalhistas e comprovar a
sua inserção no mercado de trabalho.
O contrato de aprendizagem
recebe como incentivo a alíquota
diminuída do depósito ao Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço (FGTS),
que terá redução de 8% (oito por cento)
para 2% (dois por cento) da remuneração
paga ao empregado aprendiz, conforme
reza o artigo 24, em seu parágrafo único,
do Decreto Federal Nº 5.598/05. Vale
ressaltar que, embora a taxa de
contribuição para o FGTS, referente ao
empregado aprendiz, seja fixada em um
nível inferior às taxas dos demais
trabalhadores, são aplicadas, aos
contratos de aprendizagem, as
disposições da Lei nº 8.036, de 11/05/90,
que tratam das regras gerais do FGTS.
Deve ser dito, ainda, que para
validade do contrato de aprendizagem é
preciso não só a anotação na Carteira de
Trabalho e Previdência Social (CTPS).
Em obediência aos termos do artigo 428,
§ 1º, da CLT, o aprendiz também deve
estar matriculado e frequentando escola
para conclusão do ensino médio, caso
não o tenha concluído ainda, e inscrito
em programa de aprendizagem
desenvolvido sob o crivo de entidade
qualificada.
Todos esses requisitos, segundo
Martins (2005) “se não observados,
descaracterizam a validade do negócio
jurídico (art. 104 do CC) para a
especificação do contrato de
aprendizagem” (MARTINS, 2005: 355).
Em relação à jornada de trabalho,
o artigo 432 da CLT (com a redação dada
pela Lei nº 10.097), tem-se que a duração
de trabalho do aprendiz não ultrapassará
06 (seis) horas diárias ou 36 (trinta e seis)
horas semanais. São vedadas a
compensação e a prorrogação de jornada,
salvo, no caso dos aprendizes já terem
concluído o ensino fundamental,
quando, então, esse limite poderá ser de
até 08 (oito) horas diárias ou 40
(quarenta) horas semanais, se nelas
forem computadas as horas reservadas à
aprendizagem teórica do curso de
aprendizagem. Neste caso, é
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recomendado, no mínimo, que duas
horas diárias sejam destinadas à
aprendizagem teórica.
Vale lembrar que, conforme o
Decreto Federal Nº 5.598/05, quando o
jovem com menos de 18 anos estiver
empregado em mais de um
estabelecimento, serão totalizadas as
horas de trabalho que ele tiver em cada
um de forma a não extrapolar a carga
horária de trabalho exigida e não
interferir nas suas horas de estudo
(BRASIL, 2005, artigo 21).
Ao aprendiz será garantido o
salário mínimo-hora, pago de forma
proporcional à sua jornada de trabalho,
com observação do piso estadual, caso
exista. Consigne-se que a convenção ou
acordo coletivo da categoria têm o
arbítrio de garantir ao aprendiz salário
maior do que o mínimo, conforme
disposto no artigo 428, § 2º, da CLT e no
artigo 17, parágrafo único, do Decreto nº
5.598/05. Nesse sentido, a qualificação
profissional é realizada para preparar
para a inserção em setores específicos da
atividade produtiva e consiste em
articular qualificação com elevação da
escolaridade, estágio ou serviços
comunitários.
Em regra, quando se trata do
cálculo da remuneração do aprendiz,
devem-se considerar os seguintes
fatores: total das horas trabalhadas; total
das horas computadas destinadas às
atividades teóricas; e total das horas
referentes ao repouso semanal
remunerado. Assim, pode-se dizer que a
fórmula para esse cálculo é, pelo menos:
Salário Mensal (salário mínimo hora),
multiplicado pelas horas trabalhadas
semanais e pelo número de dias do mês.
De toda forma, o cálculo do salário
mínimo hora será, no mínimo,
equivalente ao valor do salário mínimo
dividido por 220, que representa a carga
horária mensal do empregado celetista.
Para o jovem, essa garantia implica a sua
inscrição no mercado de trabalho.
É vedado efetuar qualquer
desconto no salário do aprendiz,
respeitando-se a regra do art. 462 da
CLT, salvo, quando este desconto
resultar de adiantamento, de dispositivos
de lei ou de convenção ou acordo
coletivo aplicável ao aprendiz.
Verifica-se, ainda, como direito
do aprendiz o recebimento de vale-
transporte nos trajetos que forem
necessários ao deslocamento de sua
residência até a empresa/instituição onde
cursa o programa de aprendizagem,
porquanto o contrato inclui as horas que
passa na instituição que desenvolve o
curso de aprendizagem.
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
No período das férias da fase
teórica do curso de aprendizagem, é
possível a exigência no sentido de que o
aprendiz cumpra a jornada na empresa,
desde que seja garantido pelo menos um
período de férias do programa de
aprendizagem coincida com as férias
escolares, no caso do aprendiz ter menos
de 18 anos, nos termos dos artigos 130 e
136, §2º, ambos da CLT.
Em relação à extinção do
contrato de aprendizagem, em regra, esta
ocorre quando o contrato atinge o seu
prazo final, conforme definido no artigo
428 da CLT, com redação dada pela Lei
Nº 10.097/2000, no momento em que o
aprendiz completar 24 anos de idade
(artigo 433 da CLT, com redação dada
pela Lei Nº 11.180, de
23/09/2005), exceto quando se tratar de
deficiente. Nessas hipóteses, o
adolescente/jovem fará jus a 13º salário
e férias, inclusive proporcionais, saldos
salariais e levantamento dos depósitos do
FGTS, no término normal do contrato.
Vale salientar que a multa
rescisória e o aviso prévio não serão
exigidos. Nos contratos de aprendizagem
com um ano, ou mais de vigência, será
necessária a homologação dessa
rescisão. A referida homologação
deverá, obrigatoriamente, ser efetuada
nos órgãos locais do MTE ou, se o
aprendiz contar com mais de um ano de
contrato com a empresa, no sindicato da
categoria laboral, seguindo a previsão do
art. 477 da CLT.
É preciso observar que, tratando-
se de aprendiz adolescente, o processo de
rescisão contratual de trabalho deverá ser
assistido por seus pais e, na falta ou
impedimento destes, deverão ser
nomeados responsáveis legais, para que
seja possível a quitação das verbas
rescisórias ao empregador. Vê-se que o
adolescente pode rescindir o contrato de
trabalho, entretanto, não poderá dar a
quitação às verbas rescisórias.
O pagamento das verbas
rescisórias será considerado nulo se for
feito sem a observância da assistência ou
representação do adolescente, salvo
quando o próprio aprendiz declarar que
recebeu as verbas rescisórias,
entendimento esse que será pacificado
pela jurisprudência dominante em
nossos tribunais, a exemplo do Tribunal
Regional do Trabalho da 4ª Região
(TRT, 4ª R., RO 15.579/92, Ac. 4ª T., j.
4-594, Rel. Juiz Valdir de Andrade
Jobim).
O instituto da rescisão antecipada
do contrato de aprendizagem será
possível nos casos de desempenho
insuficiente; inadaptação do aprendiz,
falta disciplinar grave; ausência
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
injustificada à escola que implique perda
do ano letivo, conforme incisos I, II, III
do artigo 28do Decreto Federal Nº
5.598/05, respectivamente, a pedido do
aprendiz (inciso IV, do artigo 28 do
Decreto Nº 5.598/05). Se a rescisão
antecipada do contrato se basear em
desempenho insuficiente ou inadaptação
do aprendiz, é obrigatória a manifestação
da entidade que oferece o programa de
aprendizagem. Por ser a empresa
incumbida da supervisão e avaliação,
deve ser garantido ao aprendiz o direito
de recurso ou acesso ao Judiciário. Para
tanto, o aprendiz deverá receber cópia
integral do relatório circunstanciado que
teve por conclusão a rescisão antecipada
de seu contrato de aprendizagem.
Destaca-se que, quando houver
extinção ou rescisão do contrato de
aprendizagem, o empregador deverá
contratar novo aprendiz, para não
incorrer na infração do artigo 429 da
CLT.
Ao aprendiz que tiver concluído
o curso de aprendizagem com
aproveitamento satisfatório, será
concedido certificado de qualificação
profissional (artigo 430, § 2º, da CLT),
fato que garante a valorização do
empregado aprendiz, nos mesmos
termos do empregado por tempo
determinado.
Em caso de rescisão antecipada
do contrato de aprendizagem, sem justa
causa, ou seja, por razão que não esteja
no rol daquelas previstas no art. 433 da
CLT e no Decreto nº 5.598/05, o
empregador será obrigado a pagar ao
aprendiz, a título de indenização, a
metade da remuneração a que teria
direito até o término previsto do contrato
(art. 479 da CLT).
Competirá às superintendências
regionais do trabalho e emprego
fiscalizar rigorosamente as empresas
contratantes dos aprendizes, verificando
se estão cumprindo as cotas de
contratação a que alude o artigo 429 da
CLT, bem como os requisitos que dão
validade aos contratos, tais como as
condições de saúde e proteção dos
trabalhadores, e os aspectos que digam
respeito ao desenvolvimento dos jovens
nos programas de aprendizagem. Os
estabelecimentos que infringirem as
disposições legais que regem a
contratação de aprendizes ficarão
sujeitos à multa administrativa aplicada
tantas vezes quantos forem os aprendizes
empregados sem a observância da lei,
consoante o disposto no art. 434 da CLT.
Tal fiscalização é importante porque
garante a inscrição do aprendiz no
mercado de trabalho.
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3 DA POSSIBILIDADE DE
TRANSFORMAR O CONTRATO
DE APRENDIZAGEM EM
CONTRATO DE TRABALHO POR
TEMPO INDETERMINADO
No caso da empresa optarem ser
mantido o contrato de trabalho entre
empregado e empregador em virtude do
término do período de aprendizagem,
assumirá, normalmente, todas as
disposições contratuais, legais e
convencionais que decorrem do vínculo
empregatício. Assim, o contrato de
aprendizagem se transformará em
contrato de emprego por tempo
indeterminado.
Existe um questionamento que
tem gerado discussão no que redunda
essa opção do contrato de trabalho ser
mantido após o cumprimento do contrato
de aprendizagem (término ou quando o
aprendiz atinge 24 anos de idade). O que
se questiona é: se houver interesse por
parte do empregador em manter o
aprendiz, seria necessário,
primeiramente, a extinção (rescisão) do
contrato de aprendizagem para, só então,
ser efetuada nova admissão? É
importante questionar que esses
questionamentos implicam a própria
inserção no mercado de trabalho, como
aprendiz. Ou seja, indaga-se se, enquanto
aprendiz, o jovem já está no mercado de
trabalho, ou se ele está envolto no
mercado, mas ainda próximo da figura
de estagiário. Tal questionamento
implica, por exemplo, se essa inserção
está mais próxima da figura do
estagiário; da permanência no mercado
de trabalho; ou do empregado. Assim,
será suficiente que o aprendiz permaneça
prestando serviço para que,
automaticamente, o contrato de
aprendizagem se transforme contrato de
trabalho por tempo indeterminado?
A legislação trabalhista é silente
a esse respeito, apenas estando previsto
no caput do artigo 428 da CLT que o
"contrato de aprendizagem é o contrato
de trabalho especial, ajustado por escrito
e por prazo determinado".
Diante dessa omissão, a
jurisprudência vem se manifestando no
sentido de que o contrato de
aprendizagem se sujeita às regras
relativas ao contrato de trabalho por
tempo determinado, não se aplicando a
rescisão obrigatória, sendo bastante a
simples continuidade para que seja
transformado em contrato por prazo
indeterminado.
Todavia, aconselha-se,
preventivamente, que seja elaborado um
adendo no qual constem eventuais
alterações contratuais advindas da
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mencionada transformação e que
comprove a anuência do empregado e do
empregador.
Não obstante o entendimento ora
adotado, importa dizer que existe
posicionamento contrário, ou seja, há
quem comungue da opinião de ser
necessária a rescisão contratual em razão
do término da aprendizagem para,
posteriormente, em havendo vontade das
partes, ser formalizado novo contrato,
admitindo-se novamente o trabalhador.
Assim, em vista da omissão legal
e pelo fato do assunto ainda não estar
pacificado jurisprudencialmente, antes
que a empresa adote o critério mais
conveniente em seu julgamento, é
recomendada uma consulta prévia ao
órgão regional do Ministério do
Trabalho e Emprego, bem assim à
entidade sindical que representa a
respectiva categoria profissional.
Entende-se, de toda forma que é
mais adequado afirmar que o trabalhador
aprendiz se aproxima mais da figura do
trabalhador temporário, pois
proporciona a qualificação profissional
necessária para a inserção em setores
específicos da atividade produtiva e
articula a qualificação com a elevação da
escolaridade, estágio ou serviços
comunitários.
Conforme parágrafo 2º, artigo
430, da CLT, o certificado de
qualificação profissional será concedido
pela entidade qualificada em formação
técnico-profissional metódica àqueles
aprendizes que concluam os programas
de aprendizagem com aproveitamento.
O certificado de qualificação
profissional deverá conter o título e o
perfil profissional para a ocupação em
que o aprendiz tenha sido qualificado.
Por certo, em termos legais, essa
qualificação tem caráter
preponderantemente tecnicista,
afirmação que pode ser inserida com
base na própria terminologia, amparada
pela lei técnico-profissional metódica,
que busca ainda uma prática voltada à
formação necessária à participação em
concursos profissionais técnicos e
olvidando uma formação cidadão crítica
sugerida pela Lei de Diretrizes e Bases
da Educação (LDB, 1996).
4 INSERÇÃO NO MUNDO DO
TRABALHO E A LEI DE
APRENDIZAGEM
No que diz respeito ao Cadastro
Nacional de Aprendizagem, previsto no
artigo 32 do Decreto Federal N°
5.598/05, (BRASIL, 2005), pode ser dito
que “é um banco de dados nacional com
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informações sobre as entidades de
formação técnico-profissional e dos
cursos de aprendizagem que
disponibilizam” (MANUAL DA
APRENDIZAGEM, 2008). Nos precisos
termos do artigo 32 do Decreto Federal
Nº 5.598/05:
Art. 32. Compete ao Ministério do Trabalho e Emprego organizar cadastro nacional das entidades qualificadas em formação técnico-profissional metódica e disciplinar a compatibilidade entre o conteúdo e a duração do programa de aprendizagem, com vistas a garantir a qualidade técnico-profissional.
Aqui, mais uma vez, destaca-se o
caráter tecnicista do trabalho aprendiz.
No que tange ao enquadramento da
contratação de aprendiz, ainda há de se
destacar que se todas as disposições
legais já elencadas não forem atendidas
o respectivo contrato será extinto por
faltar requisitos essenciais ao seu regular
e legal desenvolvimento. Outrossim, a
legislação prevê, inclusive, penalidades
às empresas que não celebrem o contrato
de aprendizagem da forma legalmente
prevista, conforme o art. 434 da CLT.
A multa acima referenciada
poderá ser imposta à empresa que, a
título de exemplo, não faça a anotação da
CTPS, ou o faça em desconformidade
com a lei, tendo de arcar, ainda, com os
custos da emissão de nova via (art. 435,
da CLT).
A Lei da Aprendizagem ressalta
a importância da inserção no mercado de
trabalho, na condição de aprendiz,
contribuindo com o desenvolvimento
educacional do individuo, considerando
que este é um ser portador de direitos
civis e sociais, inclusive o da
profissionalização. A profissionalização
do adolescente e do jovem somente pode
ser composta se inserida num processo
educacional, moderado pelo respeito aos
direitos do aprendiz, não se
desvinculando da educação básica, a
qual deve ser fortalecida.
5 INSERÇÃO NO MUNDO DO
TRABALHO E O ECA
Em verdade, o Estatuto somente
regulamentou situações que já eram
previstas pela CLT (artigo 69 do ECA),
com destaque para a condição em que o
jovem aprendiz se encontra.
Há de se frisar que o trabalho
deve ser propiciado ao adolescente com
respeito aos cuidados inerentes à
condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento, que não se trata só do
físico, como também de aspectos
psicológicos e sociais, de maneira tal que
a sua ulterior maturação não seja
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prejudicada. No Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), os artigos
destinados a tratar da profissionalização
e proteção do trabalho são do 60 ao 69.
Em seu artigo 60 o ECA proíbe esses
jovens com menos de 14 (quatorze) anos
o exercício do trabalho, exceto na
condição de aprendiz. Essa ‘condição de
aprendiz’, a partir dos 14 anos, denota
peculiaridade, uma vez que pressupõe a
frequência regular do adolescente à
escola, bem como o seu bom
aproveitamento escolar, ou seja, o
trabalho não pode prejudicar o bom
desempenho escolar. Outros requisitos
importantes dessa condição são: que
possua carteira assinada com contrato de
aprendiz e, dessa forma, seja remunerado
como tal, tendo seus direitos
previdenciários e trabalhistas
assegurados (art. 65 do ECA); e que o
desenvolvimento social e pessoal, em
sua vida profissional, sejam mais
importantes que o aspecto produtivo.
A proibição a que alude o artigo
60 do Estatuto [a de que pessoas com
menos de 14 anos não poderem exercer
atividade laboral, salvo na condição de
aprendiz] é consequência da Doutrina da
Proteção Integral. Presume-se que até a
idade de 14 (quatorze) anos a/o
criança/adolescente devam ter acesso ao
devido processo educativo e lazer, uma
vez que para trabalhar é importante a
formação integral. Deve-se, ainda,
ressaltar que, por força da Emenda
Constitucional nº 20/98, que alterou o
artigo 7º, inciso XXXIII da Constituição
Federal, proibindo qualquer trabalho a
adolescente, salvo na condição de
aprendiz, a partir dos 14 anos, os termos
do artigo 60 devem ser interpretados
como proíbe o trabalho a pessoas com
menos de 14 anos.
Quanto à definição de
aprendizagem, a Lei 8.069/90 aduz ser a
"[...] formação técnico-profissional
ministrada segundo as diretrizes e bases
da legislação e educação em vigor"
(artigo 62 do ECA). É interessante o
destaque à LDB, uma vez que essa Lei
extrapola o mero caráter tecnicista da
educação.
São princípios que garantem a
aludida formação técnico-profissional:
garantia de acesso e frequência ao ensino
regular, atividade compatível com o
desenvolvimento do adolescente e
horário especial para o exercício das
atividades (artigo 63 do ECA). Isso
implica dizer que o trabalho do
adolescente e jovem deve respeitar suas
limitações e seu nível de
desenvolvimento.
No mesmo diploma legal, mais
precisamente em seu artigo 67, estão
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previstas as proibições, os casos em que
adolescentes não poderão exercer
atividade laborativa, a saber: o trabalho
perigoso, penoso ou insalubre, de acordo
com as definições da lei trabalhista;o
trabalho noturno, sendo considerado
aquele realizado entre 22h de um dia e 5h
do outro dia;o realizado em locais e
horários que impossibilitem ao
adolescente a regular frequência àescola;
e o realizado em locais que prejudiquem
a sua formação e desenvolvimento físico,
psíquico, moral e social.
Outrossim, consoante determina
o artigo 66 do ECA, o trabalho do
adolescente deficiente deverá ser
protegido. Assim, aponta-se que o ECA
estabelece a inserção do adolescente no
mercado de trabalho, desde que respeite
as suas possibilidades e limitações.
6 PROCEDIMENTOS METODOLÓ-
GICOS
Para a elaboração da pesquisa
recorreu-se à pesquisa bibliográfica e
documental, procurando extrair das leis
as bases para uma fundamentação teórica
sobre o tema abordado. A pesquisa é de
natureza qualitativa, uma vez que se
buscou definir o problema em estudo
desconsiderando o universo amostral. A
pesquisa qualitativa tem caráter
exploratório e é utilizada quando se
buscam percepções e entendimentos
sobre a natureza geral de uma questão,
abrindo espaço para a interpretação
(GIL, 1999).
Para Marconi e Lakatos, a
“seleção do instrumental metodológico
está, portanto, diretamente relacionada
com o problema a ser estudado; a escolha
dependerá dos vários fatores
relacionados com a pesquisa”
(MARCONI E LAKATOS, 1992: 163).
As pesquisas que utilizam a
abordagem qualitativa possuem a
facilidade de poder descrever a
complexidade de uma determinada
hipótese ou problema, analisando a
interação de certas variáveis,
objetivando compreender e classificar
processos dinâmicos experimentados por
grupos sociais, apresentar contribuições
no processo de mudança, criação ou
formação de opiniões de determinado
grupo e permitir, em maior grau de
profundidade, a interpretação das
particularidades dos comportamentos ou
atitudes dos indivíduos diante de
situações específicas.
Dessa forma, a presente pesquisa
é qualitativa, por investigar as normas
jurídicas que o ECA e a Lei da
Aprendizagem dispõem a respeito da
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inserção do jovem no mercado de
trabalho.
7 DISCUSSÃO DOS DADOS E
RESULTADOS
Questiona-se se o contrato de
aprendizagem pode ser mantido, sendo
transformado em contrato de trabalho
por tempo indeterminado,
automaticamente, ou se é necessário
extinguir primeiro o contrato de
aprendizagem para, só então, ser
efetuada nova admissão. Em vista da
omissão legal e pelo fato do assunto
ainda não estar pacificado
jurisprudencialmente, antes que a
empresa adote o critério mais
conveniente em seu julgamento, é
recomendada uma consulta prévia ao
órgão regional do Ministério do
Trabalho e Emprego, bem como à
entidade sindical que representa a
respectiva categoria profissional.
A inserção dos adolescentes no
mercado de trabalho acarreta impactos
expressivos à vida desses indivíduos,
mas isso não altera radicalmente suas
condições de vida, nem proporciona
garantias futuras de mobilidade
socioeconômica, pois, para muitos, a
falta de oportunidades conduz ao
trabalho informal e ao abandono dos
estudos, aumentando o quadro de
desigualdades.
Ao final da aprendizagem o
certificado de qualificação profissional
será concedido pela entidade qualificada
em formação técnico-profissional
metódica àqueles aprendizes que
concluam os programas de
aprendizagem com aproveitamento,
devendo conter o título e o perfil
profissional para a ocupação em que o
aprendiz tenha sido qualificado. É
importante destacar que, para além do
caráter tecnicista inserido no modelo de
produtividade capitalista, a experiência
de aprendizagem no trabalho deve
figurar como um exercício da vida
adulta. Corona e Pontón (2001) indicam
que o exercício da cidadania deve advir
desde tenra idade. Aponta-se aqui que a
responsabilidade das atividades laborais
que envolvem o pagamento de impostos
e a imposição de limites no convívio com
os outros é importante como aprendizado
da vida adulta social.
Com relação à proteção
assegurada pelo ECA vimos que, em
verdade, o Estatuto somente
regulamentou situações que já eram
previstas pela CLT. Assim, reiteramos,
conforme dispositivos que
regulamentam o contrato de
aprendizagem, que o adolescente tem
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direito à profissionalização e à proteção
no trabalho. Porém, para que isso seja
possível, alguns aspectos devem ser
observados: capacitação profissional
adequada ao mercado de trabalho e
respeito à condição peculiar de pessoa
humana em desenvolvimento, art. 69 do
ECA. Tais previsões ganham relevo no
ECA, que prescreve ser o direito ao
trabalho extensivo a todos os
adolescentes.
De uma forma geral, aponta-se
que o relevo ao caráter tecnicista e de
preparação para o mercado de trabalho.
Nesse sentido, podemos entender que há
uma busca de disciplina (FOUCAULT:
2010), docilização para que o sujeito seja
produtivo. Ou seja, podemos entender
que, como as normas jurídicas criam
processos de subjetivação
(FOUCAULT: 2003), tanto o ECA como
a Lei de Aprendizagem buscam produzir
subjetividades disciplinadas, aptas a
normalizar os sujeitos para produzirem.
Aqui a produção do sujeito disciplinado
se dá em diversas esferas da
micropolítica (FOUCAULT, 1979):
trabalho, escola e, de forma geral, no
mundo da cidadania (pagamento de
impostos, voto, profissionalização
técnica etc.).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa, com base no
que foi descrito, apontou a possibilidade
de desenvolver algumas potencialidades
definidas pela Lei da Aprendizagem,
especialmente a concernente à
capacitação para o exercício da vida
laboral e produtiva dos jovens.
Acredita-se que, à medida que
adolescentes, que estão em especial
processo de desenvolvimento, têm a
oportunidade de conviver com adultos de
forma mais ou menos responsável, uma
vez que ambos têm responsabilidades, a
experiência da aprendizagem pode trazer
mais oportunidades intergeracionais e,
possivelmente, uma socialização mais
intensiva no mundo do trabalho. A
experiência de aprendizagem pode se
configurar como um estímulo à escolha
de uma formação técnica.
Parece certo que, ao passo que os
adolescentes começam a se tornar
responsáveis em decorrência das
obrigações que lhes são atribuídas na
aprendizagem, eles têm maior potencial
de socialização, tendo em vista o
exercício prático da vida adulta.
A brevíssima revisão
bibliográfica mostrou que quando o
adolescente ou jovem ingressa numa
empresa na condição de aprendiz
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desenvolverá ali atividades profissionais
e concomitantemente aprenderá a
exercer funções típicas de uma área
específica. A aprendizagem assim
contribui de maneira significativa para
que esse jovem desenvolva aptidões
concernentes à área experienciada, fato
que pode possibilitar a busca de uma
graduação em área profissional afim.
Esse fato é importante porque pode
estimular o prosseguimento na formação
profissional, mesmo que em área
distinta.
Por outro lado, embora a Lei
incentive às empresas contratarem
aprendizes, no intuito de contribuir com
a formação de jovens, muitas delas não
procuram auxiliá-los. Para agravar ainda
mais esse quadro, muitas empresas
apenas se aproveitarem da força laboral,
de mão-de-obra barata que os jovens
podem oferecer. Quando isso acontece
será impedida a aprendizagem de
alcançar o objetivo escoimado pelo
ordenamento jurídico, que é o de
proporcionar formação técnica, cidadã
profissional e crítica do jovem – se
considerarmos simultaneamente o ECA
e a Lei de Aprendizagem.
Com efeito, o mercado laboral
tem se tornado cada vez mais seletivo,
pelo qual apenas aqueles que detêm
conhecimentos específicos terão
oportunidade de se empregar. A
aprendizagem, assim, exerce papel
fundamental para que o jovem, tendo
podido explorar parte do seu potencial
profissional técnico, possa se preparar
para a inserção no mundo do trabalho. É
certo que o caráter do contrato de
aprendizagem é preponderantemente
tecnicista e disciplinador para o mundo
do trabalho. Contudo, se considerarmos
as previsões do ECA, deve-se aliar a
formação técnica uma formação crítica,
capaz de estabelecer responsabilidades
da vida adulta, ao se comprometer com o
exercício da cidadania, que em volve a
participação nas coisas públicas.
De uma forma geral, aponta-se
que o relevo ao caráter tecnicista e de
preparação para o mercado de trabalho.
Nesse sentido, podemos entender que há
uma busca de disciplina, docilização
para que o sujeito seja produtivo. Ou
seja, podemos entender que, como as
normas jurídicas criam processos de
subjetivação, tanto o ECA como a Lei de
Aprendizagem buscam produzir
subjetividades disciplinadas, aptas a
normalizar os sujeitos para produzirem.
Aqui a produção do sujeito disciplinado
se dá em diversas esferas da vida numa
dimensão micropolítica.
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A ATUAÇÃO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NO CONTEÚDO DA
NATAÇÃO ESCOLAR
Rafaela Rodrigues da Silva Graduada em Educação Física na Faculdade Integrada da Grande Fortaleza (FGF)
Thiago Medeiros da Costa Daniele Doutorando em ciências médicas-(UFC)
Leila Aparecida de Araújo
Graduada em Educação Física na Faculdade Integrada da Grande Fortaleza (FGF)
Francisco Nataniel Macedo Uchôa Professor mestre do curso de Licenciatura em Educação Física na Faculdade Integrada da Grande
Fortaleza (FGF)
Maria Tatiana de Lima Rocha Félix Professora mestre do curso de Licenciatura em Educação Física na Faculdade Integrada da Grande
Fortaleza (FGF). RESUMO: O estudo teve como objetivo averiguar se os professores de Educação Física atuam na escola com o conteúdo de natação, com o intuito de analisar as dificuldades encontradas no ambiente escolar. Foram entrevistados 15 professores do ensino fundamental I ao médio em 15 escolas na cidade de Fortaleza e na região de Maracanaú – CE. Foi aplicado um questionário com 8 perguntas objetivas. Os resultados mostraram que a maior parte dos entrevistados aplica este conteúdo, tanto com aulas práticas, quanto às aulas teóricas. Contatou-se grande interesse dos alunos e dos pais neste conteúdo. Essa abordagem está sendo crescente nas instituições de ensino, mas, ainda há uma pequena quantidade de educandários que limita o professor a levar essa prática apenas para escolinhas, por mais que se tenha estrutura adequada e que os profissionais sejam capacitados para o ensino. Palavras-chave: natação; educação; educação física escolar. ABSTRACT: The study aimed to establish whether the Physical Education teachers working in schools with swimming contents, in order to analyze the difficulties encountered at school. They interviewed 15 teachers of elementary school to the average in 15 schools in the city of Fortaleza and Maracanaú region - CE. A questionnaire with eight objective questions was applied. The results showed that most respondents apply this content, both with practical lessons, for the lectures. Contacted up great interest from students and parents this content. This approach is being increasingly in educational institutions, but there is still a small amount of educandários which limits the teacher to take this practice only for small schools, no one has adequate structure and that professionals are trained to teach. Keywords: swimming; education; school physical education.
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1 INTRODUÇÃO
A Natação é um dos esportes
mais importantes já praticados no mundo
desde o início da socialização do ser
humano e para a sua sobrevivência.
Muito importante também para o
crescimento e desenvolvimento humano,
tanto que durante os anos foi incluída
como esporte. A iniciação esportiva deve
permitir à exploração de movimento e a
aprendizagem perceptivo-motora, em
que pode ser aprimorada e ampliada as
percepções e os movimentos no
crescimento psicomotor, sendo essas as
características mais marcantes dessa
modalidade esportiva (BAGGINI,
2008).
O esporte é um instrumento
educacional de grande valor, devido suas
vivências recreativas e práticas
estimulantes, para a propiciação do
desenvolvimento físico e psicossocial
dos alunos (ALVES et al. 2007). A
natação é um esporte complexo pelas
suas exigências biomecânicas, isso pode
ser observado pelos benefícios nos
aspectos físicos, psicológicos e sociais
(LUZ et al. 2013), sendo de grande valor
no contexto escolar, cabendo ao
professor estimular essa inclusão nas
aulas, seja de teor desportivo ou
recreativo, mais trabalhando a sócio
pedagógica.
Na Educação Física escolar a
natação deve ser utilizada nas aulas
como conteúdo, segundo os Parâmetros
Curriculares Nacionais os PCNs (1998,
p. 15) há uma forte tendência de as
atividades aquáticas serem inseridas nas
escolas. No âmbito escolar, nota-se que
há novas possibilidades de
favorecimento das relações interpessoais
e consequente aumento dos laços de
socialização e ideais (ROCHA et al.
2010). Há uma semelhança entre os
autores Machado (2011), Oliveira
(2013), Morés (2011) ao descreverem a
importância da prática esportiva pra a
socialização e formação de cidadãos.
Porém pode se observar uma pouca
abordagem, sendo os fatores que causam
essa deficiência: o pouco investimento
em piscinas encontradas nas instituições
de ensino e que quando encontradas
podendo ter materiais insuficientes e de
pouca qualidade para ser utilizado, outro
fator não menos importante é o
profissional de Educação Física
qualificado para a transmissão desse
conhecimento. (GONZALEZ et al.
2010).
Outros fatores observados que
dificultam a inclusão das práticas
aquáticas são turmas numerosas, pais
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
preocupados com a prática na água sem
seus filhos conterem o conhecimento ou,
muitas vezes, nunca terem tido o contato
com o meio aquático, pode fazer com
que o docente exclua o uso das
atividades seguras e lúdicas na água. A
água é utilizada como um adequado meio
lúdico para o aprendizado de destrezas
físicas e benefícios psíquicos existente
na terra, então a água faz com que a
criança aprenda brincando, de forma
lúdica e clara (OLIVEIRA et al 2013), o
contato com a água possibilita a busca
pelo novo movimento, novo jogo,
proporciona a adesão da destreza, do
prazer da diversão.
Por isso a importância desse
estudo, saber se um conteúdo rico e
completo como esse está sendo
transmitido nas escolas e se o seu ensino
está sendo proveitoso para o
desenvolvimento do aluno. O objetivo
geral desse estudo foi analisar a atuação
do professor de Educação Física na
escola quanto ao conteúdo da natação e
o objetivo específico foi averiguar o que
pode levar ao professor a não inclusão da
natação nas aulas: pais, escola ou alunos.
2 METODOLOGIA
2.1 TIPO DE ESTUDO
Este artigo caracteriza-se como
um estudo de campo, de natureza
quantitativa com corte transversal.
2.2 PERÍODO E LOCAL DA PESQUISA
Essa pesquisa ocorreu no
período dos meses de abril a junho de
2015, em escolas públicas e particulares,
nas regionais I, III, IV e V da cidade de
Fortaleza e na região de Maracanaú - CE.
2.3 POPULAÇÃO E AMOSTRA
Foram selecionados 15 escolas
que contem piscinas e feito a entrevistas
com 15 professores graduados em
Licenciatura da Educação Física, sendo
do ensino fundamental I ao ensino médio
da educação básica, com tempo mínimo
de 6 meses e de no máximo 22 anos de
graduados. Aceitando participar do
estudo ao assinar o termo de
consentimento livre e esclarecido o
questionário foi aplicado na própria
instituição escolar onde o professor
trabalha nos horários de intervalo da
escola. A pesquisa foi feita integralmente
por uma avaliadora, em tempo médio de
aplicação em 10 minutos.
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2.4 INSTRUMENTO DE PESQUISA
Foi utilizado um questionário
semiestruturado de caráter objetivo, com
8 perguntas objetivas desenvolvidas
pelos autores, relacionado com o tema do
estudo: A atuação do professor de
Educação Física no conteúdo da natação
escolar, a importância desse conteúdo no
desenvolvimento motor do aluno e as
dificuldades que o professor pode
encontrar.
2.5 ANÁLISE ESTATÍSTICA
Os dados foram tabulados no
software Microsoft Office Excel 2010.
Para a descrição dos dados foi utilizado
valor total e percentual da população.
2.6 ASPECTOS ÉTICOS
Foi solicitada a permissão para
adentrar nas escolas, logo após o parecer
positivo, foi entregue ao participante da
pesquisa um termo de consentimento
assinado pelo mesmo, firmando um
compromisso de resposta ao
pesquisador. No presente termo explica-
se o conteúdo da pesquisa, e informa ao
participante que os dados serão
utilizados apenas para fins acadêmicos
de acordo com a resolução 466/12 do
CNS.
3 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 3.1 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS
A entrevista foi realizada com 11
professores do gênero masculino e 4
professores do gênero feminino, onde 12
dos mesmos tiveram sua graduação em
instituições particulares e 3 tiveram sua
graduação em instituições públicas, das
escolas em que ocorreram as entrevistas
3 tem o ensino público e 12 tem o ensino
particular.
Quando questionados sobre a
inclusão do conteúdo da natação na
Educação Física escolar, foi obtido o
resultado mostrado na figura 1.
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Figura 1: Inclusão da natação na escola realizada pelos professores.
Fonte: Autor
De acordo com os dados
observados 7 (46%) dos professores
inclui o conteúdo da natação nas aulas de
Educação Física teórico e prático, 4
(26%) inclui o conteúdo somente prático,
2 (13%) dos professores inclui o
conteúdo teórico da natação e 2 (13%)
não incluem esse conteúdo em suas
aulas.
Quando os professores foram
perguntados sobre o interesse que os
alunos demonstram em relação a natação
nas aulas de Educação Física, foi obtido
o resultado que vemos na figura 2.
Figura 2: Interesse dos alunos nas aulas pelo conteúdo da natação.
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
50%
46% 26% 13% 13%
Teórico e prático
Teórico
Prático
Não inclui
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
50%
46% 13% 26% 13%
Todos gostam e participam
das aulas teóricas e práticas
Preferem somente aulas
teóricas
Preferem somente aulas
práticas
Não se interessão pelo
conteúdo natação
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Em relação aos resultados, 7
(46%) dos professores observam o
interesse de todos os alunos que gostam
e participam das aulas teóricas e práticas,
2 (13%) observam que os alunos acham
interessantes somente às aulas teóricas, 4
(26%) dos professores observam o
interesse dos alunos somente nas aulas
prática e 2 (13%) dos professores
verificam que os alunos não têm
interesse por esse conteúdo.
Tabela 1. Descrição dos dados avaliados com os professores de Educação Física.
Tabela 1. Descrição das variáveis analisadas com os professores de Educação Física
Variáveis analisadas Resultado N/(%)
Em qual frequência você aborda esse conteúdo?
• Por ano com aulas teóricas e/ ou práticas. 5 (33%) • Por semestre com aulas teóricas e/ ou práticas. 7 (46%) • Quando há jogos olímpicos com aulas teóricas e/ o
práticas. 1 (6%)
• Não aborda esse conteúdo. 2 (13%) Acha a natação um conteúdo importante e que pode ser inserido nas aulas?
• Muito relevante 9 (60%) • Relevante 5 (33%) • Pouco relevante 1 (6%) • Irrelevante 0 (0%)
Como você aborda esse conteúdo nas aulas?
• Aulas práticas e teóricas, para um melhor entendimento dos alunos ao esporte com estilos e regras e alguns de seus elementos
5 (33%)
• Somente aulas teóricas, informando quais são os estilos e mostrando alguns vídeos para analisarem melhor.
4 (26%)
• Aulas práticas, com alguns exercícios simples e atividades livres.
4 (26%)
• Não aborda esse conteúdo nas aulas. 2 (13%) Quanto a Instituição de ensino, como ela age com essa prática pedagógica?
• Permite que seja incluída no PPP da escola e dá suporte ao professor.
9 (60%)
• Não permite que esse conteúdo seja dado, pois acha muito perigoso.
1 (6%)
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• Não permite que seja incluído nas aulas, porém uma vez por semestre faz uma aula recreativa na piscina.
3 (20%)
• Não permite o uso da piscina, é só para a escolinha. 2 (13%) Como os pais reagem com as aulas práticas de natação?
• Gostam e estimulam os filhos para a prática, importando-se com o contato com a água e questões de sobrevivência.
8 (53%)
• Preferem que sejam somente aulas teóricas, pois se preocupam com a segurança dos filhos na água.
1 (6%)
• Não demonstram interesse pelos conteúdos ensinado. 4 (26%) • Acham desnecessário esse tipo de conteúdo em aula, pois
é mais preferível matricula-los em escolinhas para isso. 2
(13%) Você se sente apto para esse ensino?
• Sim, pois na graduação tive um ensino de qualidade necessária para transmitir a disciplina em questão.
9 (60%)
• Não, pois na graduação não tive um ensino de qualidade necessária para transmitir a disciplina em questão.
0 (0%)
• Sim, pois procuro sempre atualizar e aperfeiçoar minha didática desse conteúdo.
6 (40%)
• Não, pois não me familiarizo com esse esporte. 0 (0%)
Tabela de Avaliação descritivas dos professores (N=15)
Ao serem questionados sobre a
frequência com que o conteúdo é
trabalhado, foi visto que 5 (33%)
abordam o conteúdo por ano, 7 (46%)
dos professores abordam o conteúdo por
semestre, 1 (6%) dos professores
abordam quando há olimpíadas, 2 (13%)
dos professores não aborda esse
conteúdo nas suas aulas.
Quando indagados sobre a
relevância desse conteúdo a ser inserido
nas aulas, obteve-se o resultado de 9
(60%) dos professores consideram o
conteúdo de natação muito relevante
para as aulas de Educação Física, 5
(33%) acham esse conteúdo útil, 1 (6%)
consideram esse conteúdo pouco
relevante para as aulas de Educação
Física escolar.
Quando interrogados sobre a
abordagem dos conteúdos nas aulas, 5
(33%) dos professores aborda esse
conteúdo com aulas práticas e teóricas,
para um melhor entendimento dos alunos
ao esporte com estilos e regras e alguns
de seus elementos, 4 (26%) dos
professores só abordam aulas teóricas,
informando quais são os estilos e
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
mostrando alguns vídeos para
analisarem melhor, 4 (26%) dos
professores abordam as aulas práticas,
com alguns exercícios simples e
atividades livres e 2 (13%) dos
professores não abordam esse conteúdo.
Quanto a instituição e sua ação na
aplicação da prática, foi verificado que 9
(60%) dos professores informam que a
instituição de ensino permite que seja
incluída no PPP da escola e dá suporte ao
professor, 1 (6%) que a escola não
permite que esse conteúdo seja dado,
pois acha muito perigoso. 3 (20%) dos
professores informam que as instituições
não permite que seja incluído nas aulas,
porém uma vez por semestre faz uma
aula recreativa na piscina e 2 (13%) dos
professores informam que a instituição
de ensino não permite o uso da piscina, é
só para a escolinha.
Na visão dos pais e suas
preocupações, 8 (53%) dos professores
verificam que os pais dos alunos com
relação a esse conteúdo gostam e
estimulam os filhos para a prática,
importando-se com o contato com a água
e questões de sobrevivência, 1 (6%)
verificam que os pais preferem que
sejam somente aulas teóricas, pois se
preocupam com a segurança dos filhos
na água, 4 (26%) dos professores
verificam que os pais não demonstram
interesse pelos conteúdos ensinado e 2
(13%) dos professores verificam que os
pais dos alunos acham desnecessário
esse tipo de conteúdo em aula, pois é
mais preferível matricula-los em
escolinhas para isso.
Com relação aos professores
serem aptos a ensinarem esse conteúdo,
9 (60%) dos professores entrevistados
responderam que sim, pois na graduação
tive um ensino de qualidade necessária
para transmitir a disciplina em questão e
6 (40%) dos professores acham que sim,
pois procuro sempre atualizar e
aperfeiçoar minha didática desse
conteúdo.
3. 2 DISCUSSÃO
A partir do resultado do
questionário aplicado, as
respostas afirmam que os professores
inserem o conteúdo natação nas escolas
e que são apoiados pelas instituições,
pais e alunos. Acham muito relevante
para o desenvolvimento do aluno, pois
essa atividade traz muitos benefícios,
proporcionando bem estar, tanto físico
como mental. Costumam ministrar suas
aulas a cada semestre de forma teórica e
prática, na qual essa é mais executada.
Essa pesquisa corrobora com
Luz et al. (2013) quando informa nos
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nossos achados que vem crescendo
a inserção dessas atividades no processo
educacional, através das práticas das
atividades físicas pelo meio
aquático. Esse conteúdo não só vem
ajudar no desenvolvimento psicomotor
como auxiliar o desempenho escolar, é
nesse ambiente que o aluno tem uma
maior interação e integração, e a
Educação física tem grande
responsabilidade para esse aspecto, pois
ela é voltada para a formação.
Oliveira et al (2013), fala que as
atividades psicomotoras na água para
crianças constitui um dos principais
objetivos para que consiga um
desenvolvimento em busca da saúde e
equilíbrio, concordando assim com Luz
(2013), e colocam que atividades
lúdicas trazem prazer, e fazem com os
alunos tenham mais vontade de
participarem das aulas e que continue
praticando.
Fazendo parte do planejamento
escolar quanto conteúdo como vemos
nos Parâmetros Curriculares Nacionais
os PCNs, pode ser inserida nas
instituições com uma frequência
adequada, onde o aluno possa ter o
conhecimento contínuo, da mesma
forma que ele vê com frequência outros
esportes, como o futsal, podendo ser
acompanhada pelas práticas aquáticas,
semestralmente ou anualmente e não
somente quando houver eventos como
jogos olímpicos que ocorre em um longo
espaço de tempo. Os professores
entrevistados confirmam essa frequência
quando afirma ministrar suas aulas de
natação semestral ou anual, incluindo
aulas teóricas e práticas, o que podemos
constatar que esse assunto não é
desprezado.
Em relação à procura dos pais
para esse esporte, Oliveira (2013), diz
que eles acham que há um
desenvolvimento físico, psicológico nas
crianças, com a prática do mesmo, além
de ajuda-las na socialização
infantil. Baggini (2008) também
concorda que na questão dos pais
procurarem a natação para seus filhos,
pois ele também diz que é pelo
desenvolvimento da criança e ainda
acrescenta outros motivos pela procura,
como: a qualidade de vida; segurança
contra afogamentos e prevenção e a
melhoria de doenças respiratórias.
Já com a questão da abordagem
do professor com esse conteúdo, mas
precisamente nas aulas
práticas, Morés (2010), acha necessário
que os docentes construam um processo
pedagógico diferenciado para cada
aluno, dando importância às atividades
lúdicas e recreativas, despertando o
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
interesse natural dos alunos em aprender
determinado conteúdo sem a pressão do
fazer corretamente. Almeida (2010)
discorda de Morés (2011) que aborda
que se deva trabalhar exclusivamente
com a individualização do aluno, para
ele o trabalho em grupo garante a
diferenciação do ensino/adequação do
nível de dificuldade dos exercícios de
cada um. Por outro lado ele concorda
com Morés (2011), quando fala que a
prática dessa modalidade deva ser lúdica,
recreativa, diferenciada e de forma
agradável, para que assim possa
incentivar e estimular os alunos, fazendo
com criem gosto pelo esporte.
Valadão et al. (2015) afirma
que “O lúdico na relação pedagógica em
meio líquido alcança uma dimensão
humana que vai além do simples
entretenimento ou como recompensa por
cumprimento de tarefas durante as aulas
de natação, ele possibilita desvelar
emoções e sensações, assim como
aspectos relacionados à afetividade.
As aulas de natação motivam a
relação pedagógica, subentendendo-se
que nessa relação existe um adulto que
pode se permitir brincar com o aluno por
meio da fantasia, da música, das histórias
contadas, das dramatizações e dos jogos
cooperativos, como
corrobora Valadão et al. (2015). Com
isso, cabe ao professor o processo de
crescimento formativo, de capacitação,
podendo sempre aperfeiçoar-se para que
o ensino seja de qualidade o que
acontece pouco se compararmos a
pesquisa, onde só uma pequena parte
(40%) tem se preocupado em estar
sempre fazendo cursos e se capacitando
para melhorar suas aulas. Infelizmente,
60% dos professores acham que por
serem graduados não existe a
necessidade de procurar um modo de
aperfeiçoamento, pois já sabem de tudo.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com os resultados obtidos, foi
observado, como objetivo geral que a
maioria dos professores atua com o
conteúdo da natação em suas aulas, no
mínimo uma vez ao ano, por considerar
esse conteúdo muito relevante para o
desenvolvimento dos alunos. Sendo
conscientes da relevância que esse
esporte tem como conteúdo escolar.
Mais infelizmente a minoria dos
docentes pesquisados procura
aperfeiçoar-se para melhor transmissão
dessa atividade, o que pode gerar
preocupação, pois percebe se que alguns
fatores, como aulas repetitivas e a falta
de qualificação dos mesmos, podem
causar entre os discentes um desinteresse
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pela prática da aula relacionado a esse
esporte, por se tornar sistemático e
monótono.
Já em relação aos objetivos
específicos, constatou-se que os
educandos quanto ao conteúdo prático,
sentem-se interessados em participar das
aulas, não havendo problemas em
habituar-se ao meio aquático, sendo
observado que, só não há interesse dos
alunos nessa prática quando o conteúdo
é somente teórico, podendo ser pela falta
de contato. Em relação aos pais, poucos
são os que não se preocupam com os
conteúdos ensinados nas aulas, tendo
relevância para o ensino a maioria que
estimula e aprova a inclusão da natação
na Educação Física escola.
Dificuldades foram encontradas
em algumas escolas na inclusão dessa
atividade, preferindo abranger a natação
somente como desporto, mas sabemos
que sem a vivência não temos o
conhecimento, então não podemos forçar
as crianças e os jovens a criar um
interesse pela mesma sem que tenha
havido um contato anterior. Porém na
maior parte das escolas em que foi
realizada as entrevistas, de acordo com
os professores, é crescente e oferecida o
desporto natação como conteúdo escolar,
permitindo aos educadores que levem
esse contexto as aulas proporcionando
todos os benefícios indicado nessa
pesquisa.
Por fim, os objetivos propostos
foram conferidos, então que possamos
buscar melhores medidas e soluções a
fim de fazer com que esse assunto seja
incluído ao máximo no ambiente escolar
é o princípio para acabar com a
deficiência desse conteúdo.
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
IDENTIDADES DE GÊNERO E CONSUMO DE AUTOMÓVEL EM
FORTALEZA-CE
Francisco Tarcísio Cavalcante Segundo
Mestre em Ciências Sociais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ e professor do curso de Administração da Faculdade Integrada da Gramde Fortaleza
RESUMO: O presente artigo apresenta os resultados de um estudo sobre o consumo de automóveis entre homens e mulheres na cidade de Fortaleza. Seu principal objetivo consiste em discutir questões referentes às identidades e aos papeis de gênero no momento atual, através do consumo de automóveis, um dos bens mais simbólicos e presentes na vida dos indivíduos na contemporaneidade (LUDD, 2004). Como metodologia, realizamos uma abordagem de base qualitativa. O procedimento de coleta de dados foi realizado através de entrevistas com vendedores de algumas revendedoras de automóveis na capital cearense, no período de março a abril de 2015. O procedimento de análise de dados utilizou como suporte teórico a análise e a discussão das teorias feministas, da publicidade, e a transferência de significados simbólicos existentes na nossa cultura para os bens de consumo. Como a pesquisa constatou, os homens, ao buscarem no carro o signo de conquistador, viril e aventureiro, através do consumo de carros cada vez mais potentes, radicais e robustos, demonstraram grande preocupação em atender às demandas sociais do modelo hegemônico de masculinidade. As mulheres, ao comprarem carros que possuem grandes porta-malas para as compras do supermercado ou vidros-fumê e alarmes para garantir uma maior segurança sua e de seus filhos (quando as tinham), ainda retrataram o foco em seus papeis femininos tradicionais, relacionados sobretudo ao discurso da maternidade e ao lar. As representações da virilidade e da maternidade correspondem aos padrões discursivos da cultura patriarcal e suas concepções hegemônicas das identidades masculinas e femininas. Convém esclarecer ainda que ambos são muito influenciados pela imposição da sociedade e da publicidade nesse sentido. Palavras-Chave: Identidades de gênero. Consumo de automóvel. Publicidade. ABSTRACT: This article presents the results of a study on the consumption of cars between men and women in the city of Fortaleza-Brazil. Its main purpose is to discuss issues related to gender identity and roles over these days, through the automobile consumption, one of the most symbolic and present goods in people’s life nowadays (LUDD, 2004).We conducted a qualitative basic approach as methodology. The datum collection procedure was performed through interviews with salesman of some car dealerships in Fortaleza, from March to April 2015. The datum analysis procedure used as a theoretical support the analysis and discussion of feminist theories, advertising campaigns, and the transfer of existing symbolic meanings in our culture to consumable goods. As the survey found, mentend to use cars as a symbol of power and virility, always looking for a more powerful vehicle and showing a great concern to attend social demands of the hegemonic model of masculinity. Women, by buying cars that have large trunk for market groceries or tinted windows and alarms to provide safetytothem and their children (when that’s the case),still portray their focus on traditional female roles, related especially to the motherhood and housewife duties. The representations of virility and maternity correspond to discursive patterns of patriarchal culture and its hegemonic conceptions of male and female identities. It should be clear that both are very influenced by the imposition of society and advertising accordingly. Key words: Gender identity. Consumption of cars. Advertising campaigns.
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1 INTRODUÇÃO
A temática referente ao estudo de
gênero é algo recente no campo das
Ciências Sociais. A antropologia foi a
ciência que primeiro estudou tal
temática. Aliás, a antropologia foi a
pioneira no estudo das 'minorias'
existentes na sociedade, sempre
marginalizada pelos estudiosos.
Em nossa cultura, podemos
facilmente constatar a existência de dois
mundos distintos: o mundo masculino e
o mundo feminino. Há uma educação
diferenciada para homens e mulheres
que se inicia desde a tenra idade no seio
familiar, contemplando desde aspectos
como a divisão das cores no vestuário até
atitudes como a proibição e a punição de
comportamentos tidos como não
condizentes com cada um dos sexos.
Essa sociedade de caráter puramente
desigual, que delimitou os espaços
masculinos e femininos, sendo o espaço
masculino o espaço público por
excelência e o feminino o espaço
privado, é a mesma sociedade que instiga
o consumo para ambos os sexos de forma
excessiva. Portanto, podemos dizer que
vivemos numa cultura onde existe, além
de uma distinção significativa de gênero,
uma educação voltada para o consumo
como sinônimo de felicidade, como
podemos observar constantemente nas
propagandas expostas na televisão e em
outros meios de comunicação de massa.
O ser humano atualmente,
independentemente do sexo, recebe
influências de várias instâncias para
consumir muito além do necessário para
a sua sobrevivência. Para manter essa
voracidade pelo consumo nos
indivíduos, a publicidade se encarrega de
dotar os bens de consumo de uma
simbologia, através de suas propagandas
cada vez mais apelativas, produzindo e
reproduzindo discursos que também
ressaltam alguns bens de consumo como
mais apropriados para ser consumido por
homens e outros como mais apropriados
para mulheres. Nos dias atuais, a
publicidade exerce a função de
socialização que anteriormente somente
pertencia aos grupos primários. É esse
surgimento da publicidade que explica
também, em larga medida, no caso do
consumo moderno, o fato de o próprio
desejo passar a ser socialmente educado
por instituições extra-familiares.
A respeito do significado
simbólico do automóvel, que vai além de
seu valor de uso, McCracken (2003)
ressalta que tal significado possui uma
trajetória tradicional que garante o
sucesso de seu movimento. Assim é que
o autor (2003, p.99-100) nos esclarece
que:
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Usualmente ela parte de um mundo culturalmente constituído e se transfere para o bem de consumo. Em seguida, este significado se afasta do objeto e se transfere para o consumidor individual. Em outras palavras, há três localizações para o significado: o mundo culturalmente constituído, o bem de consumo e aquele consumidor individual, bem como dois momentos de transferência: mundo-para-bem e bem- para-indivíduo.
Noutros termos, podemos
resumir o movimento do simbolismo que
sabemos existir em um bem como o
automóvel da seguinte maneira: temos
um mundo cultural, que, em nosso caso,
está assentado em valores capitalistas e
em nítida diferenciação e desigualdade
de gênero. A partir daí a publicidade,
sabedora plena destes valores, as
transferem para os bens de consumo, no
nosso caso o veículo automotivo. Após
esse processo concluído, os próprios
seres humanos transferem tais valores
para eles próprios.
Como o automóvel é um dos bens
mais consumidos e importantes na vida
diária dos indivíduos (LUDD, 2004),
resolvemos investigar como se
configuram às distinções de gênero no
consumo de automóveis na cidade de
Fortaleza-CE no momento atual,
buscando objetivamente discutir
questões referentes às configurações dos
papeis e das identidades de gênero na
cidade de Fortaleza através do consumo
de automóveis. Para coletarmos os dados
empíricos deste trabalho, utilizamos a
metodologia qualitativa, realizando
entrevistas com questões abertas com
vendedores em algumas revendedoras da
cidade. Juntamente a isto, fazemos uso
de pesquisas bibliográficas, através de
leituras condizentes com o tema
estudado por autores nacionais e
estrangeiros.
Devemos ressaltar que os relatos
aqui apresentados junto aos vendedores
acerca do consumo de homens e
mulheres, não pretendem representar
todo o universo feminino e masculino da
cidade de Fortaleza. Nossa maior
contribuição aqui é apresentar um olhar
privilegiado acerca das desigualdades e
diferenças de gênero, mais
especificamente a partir do consumo de
um bem extremamente simbólico: o
automóvel.
Na primeira seção deste artigo
optamos por fazer uma revisão das
questões de gênero, com uma análise de
como o termo surgiu no meio acadêmico,
seu conceito, e identificando as
diferenças e desigualdades de gênero
existentes em nossa cultura; Na segunda,
analisamos a temática do consumo.
Trabalhamos aqui o conceito de
consumo conforme vários autores.
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Fazemos uma contextualização histórica
desde os primórdios do sistema
capitalista até sua atual roupagem,
configurando a sociedade de consumo
vivida por nós hoje em dia, refletindo
sobre seus valores consumistas,
hedonistas e segregadores responsáveis
por constituir nossa cultura
contemporânea. Por último,
investigamos o caráter simbólico do
automóvel, este bem de consumo que
adquiriu nos últimos anos o simbolismo
a que nos referimos, e que muitas vezes
supera seu valor de uso.
Na terceira seção analisamos a
instituição publicidade. Nesta,
procuramos enfatizar seu papel como um
importante instrumento de transferência
de significados simbólicos existentes na
nossa cultura para os bens de consumo.
Mostramos que as mensagens contidas
nas propagandas de automóveis são
repletas de simbologia e de valores
atrelados à diferença dos gêneros e que,
por esta razão, acabam influenciando
homens e mulheres a consumirem carros
que avaliam serem mais condizentes
com os seus papeis sociais e com suas
respectivas identidades de gênero; Na
quarta e última seção demonstramos na
prática (através dos dados de nossa
entrevista), dialogando com conceitos
desenvolvidos em nossa fundamentação
teórica, como se configuram os papeis e
identidades de gênero no momento atual
através do consumo de automóveis em
Fortaleza-CE.
2 REVENDO AS QUESTÕES DE
GÊNERO: CONCEITO,
DIFERENÇAS E DESIGUALDADES
A problemática gênero trata-se de
assunto recente entre cientistas sociais e
outros estudiosos das ciências humanas
em geral. Entre o sexo feminino, depois
de muito tempo de submissão e de
injustiças sociais é que as mulheres
resolvem se unirem coletivamente para
repensarem suas condições e, a partir daí,
começarem a moverem-se.
Consoante Louro (1999), o conceito
de gênero que se pretende ressaltar não
pode de maneira alguma está dissociado
do feminismo, pois que tal conceito está
diretamente ligado às conquistas
feministas contemporâneas.
Segundo a autora citada acima, é na
chamada 'segunda onda' do movimento
feminista que as mulheres focarão sua
atenção para as construções de âmbito
teórico. Do debate que se trava entre
estudiosas e militantes, de um lado, e
seus críticos (as) de outro, é que será
engendrado e problematizado o conceito
de gênero. A intenção que se tem logo
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entre as feministas anglo-saxãs é dirigir
o foco para o caráter social da questão,
desviando, assim, determinismos
biológicos e possibilitando que o
conceito de gênero sirva não só para
análises puramente teóricas mas
também, e principalmente, como uma
poderosa ferramenta política, segundo
Louro (1999).
Quando as estudiosas feministas
decidem enfatizar o caráter social da
problemática em questão, não é que seja
eliminada a parte biológica, mas sim
valorizada de forma intencional e
deliberada a construção social e histórica
produzida sobre as características
biológicas, consoante Louro (1999, p.
23). A autora afirma que:
Na medida em que o conceito afirma o caráter social do feminismo e do masculino, obriga aquelas (es) que o empregam a levar em consideração as distintas sociedades e os distintos momentos históricos de que estão tratando. Afasta-se (ou se tem a intenção de afastar) proposições essencialistas sobre os gêneros; a ótica está dirigida para um processo, para uma construção, e não para algo que exista a priori.
No Brasil, foi no final dos anos
80 que as feministas passaram a utilizar
o termo gênero, para Louro (1999). Tal
termo é mais um atributo a ser
identificado nos sujeitos, por exemplo: o
sujeito é negro, brasileiro e homem, ou
ainda: a pessoa é branca, brasileira e
mulher.
O caráter social em questão, que
se opõe ao caráter natural, deve
permanecer em nossos 'olhares'
especialmente sobre as práticas
cotidianas em que se envolvem os
sujeitos. Afinal, conforme a autora
citada, são essas práticas rotineiras e
comuns, juntamente com os gestos e as
palavras banalizados, que precisam se
tornar alvo de atenção, de
questionamento e, principalmente, de
desconfiança. Aliás a ingente tarefa seja
talvez exatamente essa: a de desconfiar
do que é tomado como natural. Como
exemplo do que acabamos de comentar,
poderíamos indagar se, por exemplo, no
caso de uma escola, as professoras das
séries iniciais dos estabelecimentos de
ensino precisariam aceitar que os
meninos são naturalmente mais agitados
do que as meninas. Para pessoas do senso
comum, isto poderia representar uma
tarefa muito simples, mas isto pode gerar
dúvidas na mente daquelas professoras.
A linguagem que faz parte do
nosso cotidiano e que atravessa a maioria
de nossas práticas, caracteriza-se como
uma das formas de desigualdades
existentes que por muitas vezes nos
parece natural. A este respeito,
retornamos à autora (1999, p. 61) que é
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categórica ao comentar sobre a
linguagem:
Mas a linguagem institui e demarca os lugares dos gêneros não apenas pelo ocultamento do feminino, e sim, também pelas diferenciadas adjetivações que são atribuídas aos sujeitos, pelo uso (ou não) do diminutivo, pela escolha dos verbos, pelas associações e pelas analogias feitas entre determinadas qualidades, atributos ou comportamentos e os gêneros (do mesmo modo como utiliza esses mecanismos em relação às raças, etnias, classes, sexualidades etc).
Para Santos (2002), foi da busca
incessante por explicações a várias
questões como, por exemplo, a partir do
limitado conceito de patriarcado, que não
dá conta da imensa diversidade cultural e
que exclui outras formas de relação que
não sejam pautadas na dominação
masculina, que fizeram com que as
feministas fizessem novas inferências
acerca da realidade. Tais inferências
trouxeram como resultado a construção
de um conceito central, a saber, o
conceito de gênero. Inúmeras foram as
contribuições que a utilização do termo
gênero trouxe para o campo das Ciências
Sociais, termo este que não se encontra
de forma alguma fechado. Trata-se
realmente de uma grande aquisição para
o conhecimento, segundo Santos (2002).
A autora (2002) supracitada traz uma
conceituação de gênero toda especial.
Para ela, o conceito de gênero envolve,
pelo menos, duas dimensões: o
comportamento diferenciado masculino
e feminino observado nas sociedades, e a
distribuição desigual de poder entre os
sexos. A primeira, conforme a autora,
focaliza gênero como produto social,
aprendido, representado,
institucionalizado e transmitido ao longo
das gerações. A segunda coloca em
evidência a posição subalterna das
mulheres na organização social, a partir
da desigualdade de poder nas relações de
gênero.
A televisão, as revistas em
quadrinhos, através de seu conteúdo
aparentemente inocente, a publicidade e
os meios de comunicação de um modo
geral têm frequentemente sido objetos de
investigação por parte de estudiosos que
neles examinam as representações dos
gêneros. Muitas dessas análises têm
apontado para a concepção de dois
universos distintos: um mundo público
masculino e um mundo doméstico
feminino, ou ainda para a indicação de
atividades características de homens e
atividades características de mulheres.
O que comentamos aqui, acerca
da hegemonia masculina ao representar a
norma em relação à mulher, pode ser
aplicado de igual modo em relação aos
próprios homens. Louro (1999, p.48)
ressalta que "aqueles homens que se
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afastam da forma de masculinidade
hegemônica são considerados diferentes,
são representados como o outro e,
usualmente, experimentam práticas de
discriminação ou subordinação".
O que ocorre é que os discursos
ou narrativas convencionais adotam uma
das formas de masculinidade, dentre as
várias outras possíveis, para definir a
masculinidade em geral. A partir daí,
este tipo de masculinidade é transmitido
para os indivíduos do sexo masculino
desde a sua tenra idade. Não precisa
muito esforço para identificarmos que
este tipo de identidade masculina
dominante define comumente o ser
homem como um ser viril, poderoso,
forte e que não pode chorar. Aliás, quem
nunca ouviu a famosa expressão de que
homem que é homem não chora?
Vesentini (1996) nos diz que, de fato, as
diferenças entre homens e mulheres se
baseiam especialmente no campo social,
afinal é na própria sociedade que se
observa a diferença baseada em uma
subordinação feminina. Estas diferenças
em que as mulheres são comumente
discriminadas se configuram em três
dimensões: econômica, política e
simbólica.
Conforme o autor (1996, p.221):
Basta olharmos em torno e constatarmos que em nossa sociedade as mulheres não têm acesso às mesmas profissões que os
homens ou não progridem tanto quanto eles na mesma profissão. No plano político, as mulheres, que formam um pouco mais da metade da nação, possuem menos de 10% dos representantes na assembleia nacional. Enfim, no plano simbólico, cada dia os meios de comunicação de massa nos mostram imagens contrastadas do homem e da mulher, do homem-sujeito e da mulher-objeto.
Embora o trabalho feminino não
cesse de aumentar a cada ano, tal
trabalho ainda está distante de se igualar
ao masculino principalmente com
relação aos rendimentos. Se um homem
ou se uma mulher exercem a mesma
profissão, as mulheres costumam receber
salários de 40% a 60% mais baixos do
que os homens. Isto decorre
principalmente de uma visão
estereotipada do homem e da mulher que
coloca esta última como inferior ao
homem, segundo afirma o autor citado.
A força destes estereótipos fazem-se
presente na própria forma como as
mulheres são educadas pela família, que
é bem distinta da dos homens, conforme
Vesentini (1996). Quando o autor (1996)
argumenta acerca da educação recebida
pelas mulheres, ele ressalta que tal
educação ensina-as a terem uma
'natureza feminina', isto é, a serem
dóceis, submissas, conformistas e a
desenvolverem um raciocínio mais
intuitivo do que lógico. Quanto à
educação masculina, o que normalmente
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são transmitidos para os homens são
ideias relacionadas a atitudes de não
levar desaforos para a casa, de ser
agressivo, forte e dominador.
Características estas relacionadas ao
modelo hegemônico de homem, como já
fora ressaltado anteriormente.
2. O CONSUMO NA SOCIEDADE
ATUAL
2.1. Conceito de consumo
Holanda (1999), em seu
dicionário, nos traz dois conceitos de
consumo. Num primeiro momento, o
autor mencionado acima destaca o
consumo como o ato ou efeito de
consumir; um gasto. Num segundo
momento, ressalta que é a utilização de
mercadorias e serviços para satisfação
das necessidades humanas. O que nos
causou uma grande curiosidade foi o fato
de no mesmo dicionário acima citado,
existir uma diferença conceitual entre
consumo e consumismo. Quando o autor
se refere a consumo, como vimos, não
fala nada além do ato de consumir ou se
satisfazer consumindo mercadorias ou
produtos de acordo com suas
necessidades. Todavia, o termo
consumismo possui uma outra
significação, pois está relacionado ao
sistema que favorece o consumo
exagerado. Assim, para Holanda (1999),
uma pessoa favorável ao consumismo é
aquela que tende a comprar qualquer
coisa de forma exagerada, isto é, para
muito além de suas necessidades.
Baudrillard (2006) ressalta que
só faz sentido conceber o consumo como
uma modalidade característica de nossa
sociedade ou civilização industrial com a
condição de o livrar da acepção que
frequentemente tem sido usada: a de um
processo de satisfação das necessidades.
Tal crítica a esta forma de conceber o
termo é uma das principais análises que
guia o pensamento do sociólogo francês
acerca do tema. Segundo o mesmo, no
consumo não são as coisas ou qualquer
outro produto material que são objetos de
consumo, isto é ilusão, pois estes são
apenas objetos da necessidade e da
satisfação. A relação que existe entre os
indivíduos e os objetos de um modo
geral não costuma ser de ordem concreta,
como a de alguém que, por exemplo,
compra um tênis que contém um
amortecedor com uma função essencial
para a prática de alguma atividade física
mais forçada ou como a de um músico
que adquire um metrônomo para permitir
a este indicar com exatidão os
andamentos das peças musicais.
Ademais, mesmo que se quisesse obter
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mais de um tênis com tais ou mais
funções não se poderia afirmar que o que
houve neste caso foi uma prática de
consumo. Não é simplesmente assim que
se define o consumo. A este respeito
Baudrillard (2006, p. 206) é
contundente: “Nem o volume dos bens
nem a satisfação das necessidades são
suficientes para definir o conceito de
consumo: constituem somente uma sua
condição prévia”.
Notamos que aqui o termo
consumo é visto de forma mais profunda,
subjetiva e, portanto, distinta da forma
como está em alguns dicionários que
elucidam o termo. Devido, em boa
medida, a incessante multiplicação dos
objetos, bem como de seu consumo por
parte dos indivíduos em nossa sociedade
contemporânea, é que podemos
compreender que aquilo que se constitui
como vital em um objeto deixa de ser
protagonista. Daí é que não seja estranho
o fato de o consumo não poder ser
definido como uma prática material.
Nem mesmo pode ser definido pelo
alimento que se digere, pelo vestuário
que se veste e pelo carro que se dirige,
mas sim pela organização de tudo isto
em substância significante. Ainda,
podemos afirmar que o consumo, pelo
fato de possuir um sentido, pode ser
definido de forma sucinta como uma
atividade de manipulação sistemática de
signos (BAUDRILLARD, 2006).
2.2. Dos primórdios do capitalismo à
sociedade de consumo
De acordo com Severiano (2001),
como nos primórdios do capitalismo a
produção ocorria de forma massiva,
precisava haver um grande contingente
de pessoas dispostas a consumir, sob o
risco de um colapso geral do sistema. Por
isso, a produção voltada para o consumo
objetivava atender não as necessidades
dos indivíduos mas sim resolver uma
crise de superprodução. Portanto, foi
necessário buscar estratégias a fim de
que gerassem nas massas um novo
sistema de necessidades que as fizessem
consumir para além de suas
necessidades. Para a efetivação destes
objetivos citados, a criação da
publicidade foi crucial. Esta (a
publicidade) passa a ter a função de
socialização que anteriormente somente
pertencia aos grupos primários. É esse
surgimento da publicidade que explica
em larga medida, no caso do consumo
moderno, o fato de o próprio desejo
passar a ser socialmente educado por
instituições extra-familiares. Era
necessário, pois, que novos valores
fossem cultivados no espírito dos
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indivíduos de uma forma geral, valores
estes que fossem capazes de abrigar uma
ideologia de consumo de massa,
marcados pela supervalorização da
estética ao invés da funcionalidade do
objeto, pela dependência aos ditames da
moda e, de um modo geral, por um
consumo acrítico. Valores estes que
cabiam à publicidade promover.
Severiano (2001, p.69) afirma de
uma vez por todas as características do
novo ethos presente na sociedade
capitalista de consumo:
O que se observa é, portanto, o surgimento de um novo ethos, não mais orientado pela moral puritana e racional do “capitalismo de mercado”, mas baseado num modelo hedonista e lúdico, próprio de uma “ética do consumo”, cujos valores fundamentam-se na “auto realização” e na “felicidade”, buscadas no próprio ato de consumir.
Com todo o aparato publicitário
ao seu lado, juntamente com a inovação
incessante de mercadorias que
rapidamente se tornam obsoletas, a
sociedade contemporânea fez com que
todos os bens comercializados
ganhassem um significado simbólico.
Daí ter se tornado comum as pessoas
ficarem fascinadas pela estética do
produto e pelo poder subjetivo que existe
dentro de uma dada mercadoria. Assim,
os indivíduos passaram a, por exemplo,
comprar um determinado automóvel
mais interessados no símbolo de status
ou de qualquer outra adjetivação que o
veículo possa proporcionar do que na
importância do mesmo enquanto um
transporte de locomoção.
Agindo pela égide do consumo
contemporâneo, podemos perceber que o
que os indivíduos mais buscam nos bens
ou nas mercadorias é a aquisição de uma
identidade, uma personalidade, e isso é o
que consideramos como uma das
características mais relevantes da
sociedade de consumo.
No que diz respeito ao
automóvel, bem de consumo
privilegiado em nossa pesquisa, Ludd
(2004, p.45) ressalta a importância do
mesmo na vida de homens e mulheres
em nossos dias quando diz que:
O americano médio consagra mais de 1600 horas por ano ao seu automóvel: sentado dentro dele, andando ou parado, trabalhando para pagá-lo e para pagar gasolina, os pneus, os pedágios, o seguro, as multas e os impostos para estradas federais e para os estacionamentos públicos.
Além desta presença constante
do carro em nosso cotidiano, as
propagandas expostas na televisão e em
outros meios de comunicação
contribuem para o enaltecimento do
mesmo. Mensagens generalistas são
comuns, e se tomarmos como exemplo o
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comercial de uma determinada rede de
posto de combustível no qual afirma que
todo brasileiro é apaixonado por carro,
podemos ter uma noção palpável do que
fora dito. A respeito do significado
simbólico do automóvel que vai além de
seu valor simplesmente utilitário,
McCracken (2003) relata que tal
significado possui uma trajetória
tradicional que garante o sucesso do seu
movimento. Assim é que tal autor (2003,
p.99-100) nos esclarece que:
Usualmente ela parte de um mundo culturalmente constituído e se transfere para o bem de consumo. Em seguida, este significado se afasta do objeto e se transfere para o consumidor individual. Em outras palavras, há três localizações para o significado: o mundo culturalmente constituído, o bem de consumo e aquele consumidor individual, bem como dois momentos de transferência: mundo-para-bem e bem- para-indivíduo.
Noutros termos, podemos
resumir o movimento do simbolismo que
sabemos existir em um bem como o
automóvel da seguinte maneira: Temos
um mundo cultural, que, em nosso caso,
está assentado em valores capitalistas e
em nítida diferenciação e desigualdade
de gênero. A partir daí a publicidade,
sabedora plena destes valores, as
transferem para os bens de consumo, no
nosso caso o veículo automotivo. Após
esse processo concluído os próprios
seres humanos transferem tais valores
para eles próprios.
3. A PUBLICIDADE:
IMPORTANTE FATOR NA
ESCOLHA DO AUTOMÓVEL
Como já ressaltamos
anteriormente, a publicidade
desempenha um papel fundamental na
transferência do significado simbólico
do mundo cultural para o bem de
consumo, tanto para homens como para
mulheres. Seja em anúncios,
propagandas ou por outros meios, a
publicidade constantemente anuncia um
determinado bem de consumo
caracterizado dentro dos valores
existentes na coletividade.
Na transferência de significados,
ela utiliza-se de vários mecanismos.
Assim é que imagens visuais, fotografias
e materiais verbais assumem uma
relação muito particular e mesmo
imprescindível neste processo de
transferência. Os diretores de marketing
não são ingênuos, tem objetivos nas suas
ações e por conta disso fazem uso das
falas, das imagens e das fotos a fim de
conduzir o leitor ou o expectador às
propriedades simbólicas que se tem a
intenção de transferir, em conformidade
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com o pensamento de McCracken
(2003).
Devido à nossa condição de país
subdesenvolvido e capitalista, não
precisa muito esforço para entendermos
que os modelos masculinos e femininos
que estão contidos nas propagandas são
segregados e distintos. Aliás, tal
segregação e distinção pode ocorrer em
todo o mundo, até mesmo em nações
desenvolvidas, com diferenças apenas
quanto à intensidade. Um texto que
Baudrillard (1995, p. 87) extraiu do
jornal francês Le Monde é um forte
exemplo de como os publicitários podem
engendrar homens e mulheres como
seres que possuem objetivos distintos
quando da aquisição de um veiculo
particular:
Não há mulher, por mais exigente que seja, que não consiga satisfazer os gostos e os desejos da própria personalidade com um Mercedes Benz! Desde a cor do couro ao guarnecimento e a cor da carroceria até aos tampões das rodas e às inúmeras comodidades que os equipamentos estandardizados ou preferenciais oferecem. Quanto ao homem, embora se preocupe sobretudo com as qualidades técnicas e com os resultados do carro, prestará de boa vontade atenção aos desejos da mulher, porque também é motivo de satisfação ver-se felicitado pelo bom gosto.
A publicidade, como podemos
observar, divulga com muita
frequência modelos de masculinidade e
de feminilidade que estão inseridos não
somente nos automóveis mas também
em outras mercadorias. Em outras
palavras, a publicidade reforça os
valores de nossa cultura e as transferem
para variados bens de consumo, na
maioria das vezes dirigindo alguns
deles com maior intensidade para ser
consumido pelo público masculino e
outros para serem consumidos pelo
público feminino. Isso que foi exposto
pode ser também identificado pelo
apelo, por parte da mídia, para cada um
dos sexos. As mensagens publicitárias
dirigidas ao público feminino remetem-
se a um padrão de mulher que é
responsável não só pelo consumo de
produtos tidos como femininos, como
artigos de moda (roupas, sapatos,
maquilagens, perfumarias etc.), mas
também como um ser humano que é
responsável pelo consumo da família:
alimentos, produtos de higiene e de
limpeza, brinquedos e doces para as
crianças e roupas para seus maridos.
Ainda em relação às mulheres, o apelo
da publicidade, através de suas
propagandas, elabora, além deste tipo
de mulher como protetora da família,
também uma visão de mulher que
precisa ser bela, jovem e atraente para
se obter sucesso ou felicidade na vida,
consoante Carvalho (1998). A
publicidade dirigida para o público
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masculino costuma ser menos exigente
e mais prática. As mensagens lançadas
pela publicidade para tal público o
convidam à virilidade, à praticidade e
ao mundo externo, mundo onde
tradicionalmente o homem reina. É por
isso que o automóvel, por ter uma
predominância nas ruas, avenidas e,
portanto, por predominar para além da
domesticidade, é sempre ou quase
sempre explorado pela publicidade
como um bem atrelado ao homem,
especialmente os mais robustos.
Portanto, por conta de todas essas
pressões, mesmo que muitas vezes de
forma sutil, é que a publicidade acaba
por direcionar e/ou influenciar homens e
mulheres na escolha do automóvel que
representa suas respectivas identidades
sociais forjadas pela própria publicidade
e pela sociedade convencional de um
modo geral.
4. O CAMPO EM ALGUMAS
REVENDORAS DE AUTOMÓVEL
DA CIDADE
Passaremos agora para a parte da
análise das entrevistas, onde, nessa
ocasião, teremos a oportunidade de
analisá-las, a partir de dados coletados
junto aos nossos informantes.
Revendedores foram por nós
abordados através de entrevistas dotadas
de questões abertas que nos dirigimos a
eles (as). Vale salientar também que
ocultamos os nomes de nossos
informantes por questões éticas, pois
assim mantemos preservados os nomes
destas pessoas. Ao invés de divulgarmos
os nomes dos entrevistados nas citações,
resolvemos por colocar o simples nome
de entrevistado (a) ou revendedor (a).
Resolvemos não entrevistar os clientes,
pois estes poderiam ficar inibidos ao
relatar assuntos de fórum íntimo.
O primeiro local que nós
visitamos foi a Formasa, que é uma
revendedora especializada em veículos
da Ford. Lá, como em todas as
revendedoras que visitamos, existem
todos os estilos de carros: sedan,
utilitário, esportivo, dentre outros. Ao
chegarmos fomos recebidos por um
vendedor de meia idade que com muita
gentileza e tranquilidade respondia a
todas as nossas indagações. Além da
Formasa, visitamos a Codisman, uma
revendedora especializada na venda de
automóveis da marca chevrolet, e a
concessionária denominada Renove
veículos, que comercializava carros de
variadas marcas e tipos: veículos da
Volksvagem, da Fiat e da Ford.
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Quando indagado acerca do
estilo de carro a que cada um dos gêneros
dá preferência, o funcionário da primeira
revendedora visitada por nós (a
Formasa), nos respondeu que "a mulher,
por sua preocupação em cuidar de suas
crias, tende a escolher o carro que tenha
bons equipamentos de segurança e ainda,
por sua preocupação em cuidar das
compras de casa, dá notável preferência
a automóveis que possuam grandes
bagageiros".
Quanto ao estilo de carro mais
procurado entre os homens, ele nos
respondeu da seguinte forma: “Os
homens procuram mais o caráter
aventureiro do carro e que tenham um
visual mais arrojado e radical”. Os
equipamentos e acessórios de
preferência entre os homens são a
potência do motor e outros fatores
relacionados à parte técnica do carro que,
segundo o próprio entrevistado, está
inteiramente atrelado ao espírito
masculino de demonstrar sua força e
virilidade. Para as mulheres, "o que
importa no carro são os equipamentos
que trazem mais segurança, acima de
tudo é isso que eu vejo".
Esses relatos atestam não só a
preocupação em atender seus papeis de
gênero na sociedade, pelo consumo de
carros de determinados estilos e com
determinados equipamentos para
atenderem funções diferenciadas, como
também a influência da educação
imposta pela sociedade e das mensagens
publicitárias produzidas e difundidas
tanto para o público masculino como
para o público feminino no tocante ao
consumo de bens de consumo (em
especial o automóvel e seus
equipamentos e acessórios),
representando uma concordância com
estes padrões de identidade de gênero.
Isso representou uma constante nas falas
de todos os nossos informantes.
Notamos aqui que para as
mulheres, por exemplo, aplica-se muito
bem à teoria trabalhada por Baudrillard
(1995), de que para o sexo feminino a
cobrança maior da sociedade é pela sua
beleza física. Parafraseando o sociólogo
francês, se em nossa sociedade a mulher
for bonita poderá perfeitamente, por
exemplo, ser escolhida pelo sexo oposto
ou entrar na concorrência com grandes
chances de sucesso neste quesito, sem
precisar utilizar o automóvel como uma
'ferramenta' para seduzir ou atrair os
olhares masculinos.
Para nosso segundo informante,
da revendedora Codisman, o estilo do
automóvel preferido e mais comprado
entre as mulheres "são aqueles carros de
estilo Hatch, pois é bem mais fácil de
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estacionar. Os homens, pelo que constato
aqui, compram mais carros no estilo
sedan, pelo fato de ser um estilo mais
tradicional. Os homens gostam de
comprar carro, né? Eles não querem
saber apenas se o automóvel tem um
bom custo-benefício ou se é seguro, eles
querem um que tenha um visual todo
imponente, sabe? Acho que as
propagandas fazem muito marketing na
cabeça dos homens sobre esse negócio
de ter um carrão potente, radical ou que
mostre alguma promoção de auto
imagem de um homem forte e garanhão.
Dá pra notar isso, sabe?".
Esta nítida preferência do gênero
masculino pelo bem de consumo,
especialmente o automóvel, para fins de
sedução e poder, conforme Baudrillard
(2006), pode também ser explicado pela
tradicional predominância do homem no
mundo exterior ao lar, mundo cujo signo
eficaz vem a ser o automóvel. A respeito
dos equipamentos e acessórios mais
vendidos para homens e mulheres, o
entrevistado nos relatou que as mulheres
preferem equipamentos de segurança do
veículo. Ele nos esclareceu que:
A mulher, por ser mais frágil fisicamente do que o homem, dá essa preferência aos equipamentos que possam lhe dar mais segurança. Por isso, ela exige que se coloque vidro fumê ou vidro elétrico, como forma de não a deixar tão exposta aos bandidos e
assaltantes. Quanto aos homens, estes compram os acessórios ligados à imponência do carro.
Para nosso terceiro informante,
da revendedora denominada Renove
Veículos, que dizia-nos constantemente
que o homem quando vem acompanhado
de sua esposa costuma dar a palavra final
porque "as próprias mulheres não se
acham muito entendidas de carro", nos
relatou que as mulheres avaliam o carro
para fins completamente distintos dos
homens, preferindo comprar "os
menorzinhos, que são mais fáceis de
estacionar, ou os que tenham grandes
bagageiros para guardarem as compras
do supermercado. E ela tá certa, né?
muitas mulheres demonstram se
preocupar mais consigo e com os filhos.
Eu vejo pelos carros que elas procuram,
né? Já o homem quer um carro no estilo
imponente, grandão, que passe uma
imagem de poder, entendeu? Se um
homem for comprar um carro pequeno e
acanhado muito provavelmente vão
achar ele meio efeminado. O carro, para
o homem, representa uma extensão de
si". Ainda, nos disse que embora muitas
vezes comprem um carro aparentemente
simples ou frágil, os homens procuram
personalizar seu veículo afim de garantir
um visual bem mais imponente do que
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quando o automóvel se encontrava na
loja antes de sua aquisição.
Quando indagamos ao vendedor
desta concessionária acerca dos
equipamentos e acessórios preferenciais
dos gêneros, ele foi categórico:
A mulher adora ar-condicionado, direção hidráulica, enfim, ela quer ter conforto e se sentir bem dentro do carro. Já o homem, como adora aparecer e demonstrar virilidade, busca comprar equipamentos como som, aro, aerofólio etc. Raramente você vai encontrar aqui alguma coisa diferente disso que eu te estou dizendo.
CONCLUSÃO
Este trabalho teve como escopo
identificar e, a partir daí, analisar como
se configuram atualmente os papeis e
identidades masculinas e femininas
através do consumo de automóveis na
cidade de Fortaleza. O consumo de
automóvel trouxe grande contribuição
nesse sentido, pelo fato de seu poder
enquanto um bem de consumo que é
utilizado para determinados fins,
especialmente, pelo que vimos aqui, para
atender demandas sociais atribuídas para
cada um dos sexos. Além disso, o
automóvel possui grande importância na
vida diária dos indivíduos na
contemporaneidade.
A cidade de Fortaleza está
situada numa região onde ainda perdura
uma significativa diferença de poder
entre os gêneros. As diferenças podem
ser identificadas numa maior
remuneração masculina para trabalhos
iguais, numa maior presença feminina
em profissões de status social menos
elevado, numa cultura feminina marcada
pela sua relação com o lar, a
maternidade, com os cuidados com a
saúde das crianças e com sua extrema
vaidade com a aparência física. Em
contraposição a este universo, temos
uma cultura masculina notadamente
marcada pela associação com o trabalho
exclusivamente público (ou externo ao
lar), com a frieza e com a virilidade. A
publicidade, na condição de uma
instituição da sociedade, a partir dos
valores de nossa cultura, transfere os
valores culturais femininos e masculinos
para os bens de consumo em forma de
símbolos subjetivos. A partir daí,
homens e mulheres, através de seus
rituais de posse, transferem tais símbolos
para eles. Bens de consumo como
produtos de beleza e do lar se ligam
comumente à identidade social feminina
de cuidar de sua aparência física, da
saúde e de uma maior propensão a cuidar
de suas crias. Assim é que, relacionado
ao consumo de automóveis, concluímos
que as mulheres, segundo relato dos
vendedores que trabalhavam nas
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revendedoras, ao procurarem obter
carros com bons equipamentos de
segurança afim de garantirem maior
proteção para si e para os filhos (quando
as tinham), com grandes bagageiros para
guardar as compras do supermercado e
até com modelos de veículos mais fáceis
de estacionar, demonstraram grande
preocupação em atender as demandas do
tradicional modelo de feminilidade
relacionado ao lar e à maternidade. Isto
ficou notório e reforçado devido ao tipo,
estilo ou equipamento do automóvel
comumente escolhido por elas.
Quanto aos homens, podemos
afirmar que os resultados de nossa
pesquisa são distintos. Assim posto, os
homens, quando buscaram comprar um
carro, revelaram extrema preocupação
em transmitir imagens relacionadas à
identidade masculina hegemônica, tais
como a virilidade (especialmente quando
valorizam à potência do motor ou o
visual imponente); e o poder de
conquista (quando adquirem
equipamentos que valorizam sobretudo a
estética do veículo). Estes papeis estão
tradicionalmente atrelados aos homens, e
são produzidos e reproduzidos pela
sociedade e pela publicidade, enquanto
uma de suas instituições.
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SILVA et al., Benedicto. Dicionário de ciências sociais. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1986. VESENTINI, J. Wiliam. Sociedade e espaço. Geografia geral e do Brasil. São Paulo, Ática, 1996.
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Editorial
A ciência vem evoluindo com as contribuições das pesquisas e investimentos em
diversas áreas do saber. O pensamento crítico e os questionamentos acerca da realidade
impulsionam novos conhecimentos e descobertas.
Nesse sentido, a Revista Perspectiva FGF é a publicação científica
multiprofissional da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza - FGF, que objetiva
promover a publicação docente e discente das áreas de Ciências da Saúde, Sociais
Aplicadas, Humanas, Jurídicas e Exatas, podendo haver publicações de artigos originais,
revisões e reflexões, gerando conhecimento amplo, sendo fonte de discussão e de saber
de qualidade. Com o progresso da produção científica brasileira e internacional, a Revista
Perspectiva FGF, periódico científico semestral, cumpre seu papel na disseminação do
conhecimento de acadêmicos, docentes e profissionais.
A Comissão Editorial da Revista Perspectiva FGF agradece aos alunos,
professores, à direção da instituição Faculdade Integrada da Grande Fortaleza - FGF e
parabeniza a todos os autores que escolheram a Revista Perspectiva FGF como veículo
de divulgação de suas pesquisas.
Viviane Mamede Vasconcelos
Coordenadora Científica da FGF
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ARTIGOS
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ANÁLISE DO BENEFÍCIO DA PENSÃO POR MORTE
Fagner de Oliveira Matos Aluno do Curso de Direito da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza (FGF)
RESUMO: A pesquisa trata da pensão por morte à luz das mudanças de acesso a esse benefício previdenciário, promovida pela Lei Nº 13.135/2015. Para alcançar o objetivo traçado, a metodologia empregada no trabalho consistiu numa investigação bibliográfica e documental entorno da legislação pertinente à temática, que consistiram nas principais referências norteadoras da pesquisa, bem como artigos, teses e dissertações que abordam os assuntos da seguridade social, previdência social, risco social e pensão por morte. A partir da referida análise, foi possível observar que as mudanças no acesso à pensão por morte ocorrida no ano de 2015 no Brasil, suscitam o questionamento sobre o cumprimento do princípio constitucional da seguridade e previdência social em proteger os direitos individuais e coletivos, bem como salvaguardar a família dos riscos sociais. Desse modo, nota-se a necessidade de um acompanhamento por parte da academia das implicações práticas de tais alterações legislatórias no cotidiano da previdência social brasileira. Palavras-chave: Previdência Social; Pensão por morte; Risco Social. ABSTRACT: The research deals with the death pension in the light of the burning of changes to that social security benefits, promoted by Law No. 13,135 / 2015. To achieve the established objective, the methodology used in the study consisted of a literature research and documentation around the relevant to the theme legislation, which consisted in the main guiding references of the research, as well as articles, theses and dissertations that address the issues of social security, social security, social risk and survivorship. From this analysis, it was observed that the changes in access to death benefits during the year 2015 in Brazil, raise the question of compliance with the constitutional principle of welfare and social security to protect individual and collective rights, as well as safeguard the family of social risks. Thus, there is the need for monitoring by the Academy of the practical implications of such legislations changes in daily life of the Brazilian social security. Keywords: Social Security; Pension Death; Social Risk.
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1 INTRODUÇÃO
Este trabalho busca
compreender as modificações do acesso
à pensão por morte. Tal investigação
encontra-se entrelaçada com a análise da
própria situação da previdência social na
atualidade, que se apresentam sob
estruturas possíveis de serem
caracterizadas como injustas e
incompletas, distantes cada vez mais das
necessidades da parcela mais vulnerável
da população.
O caminho percorrido pelo país
nas últimas décadas na busca pela
aceleração do crescimento da economia
brasileira, aliado as pressões dos
defensores do livre mercado,
fortaleceram as pressões em torno de
mudanças do ajuste fiscal, direitos
trabalhistas e modificações
previdenciárias. Argumentos
construídos, quer seja na gestão dos
presidentes Fernando Henrique Cardoso,
Luís Inácio Lula da Silva ou Dilma
Housseff, promoveram a ampliação do
debate sobre as novas necessidades de
modificações do Estado no acesso a
benefícios previdenciários.
Desse modo, a família que por
ventura se defrontar com a morte de
algum ente contribuinte da previdência
social, passa a conviver com uma nova
série de dispositivos que impossibilitam
o acesso a qualquer amparo do Estado,
levantando a questão sobre a
constitucionalidade de tais modificações
das regras previdenciárias diante dos
princípios da previdência social
brasileira.
A escolha do tema da presente
pesquisa encontra-se norteado pelas
modificações empreendidas pela
instância jurídica da legislação referente
à pensão por morte. A atualização das
regras desse benefício previdenciário
surge motivada sobretudo pelo avanço
das fraudes no país, no qual resulta o
aumento da dívida da previdência
pública e coloca em risco o futuro desse
benefício.
Diante dessa situação, as
mudanças das regras de pensão por
morte traz a tona a necessidade de refletir
sobre os impactos de tais alterações no
acesso a esse benefício. Portanto,
proporcionar uma maior clareza sobre o
tema e analisar o papel da pensão por
morte nessa nova dinâmica populacional
de redução da taxa de natalidade e
mortalidade são justificativas que
motivaram o interesse de investigação
dessa temática.
Tais modificações na pensão
por morte resultam numa série
imbróglios sobre a discussão a respeito
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de sua constitucionalidade. Assim,
devido o pesquisador atuar como técnico
do seguro social do Instituto Nacional do
Seguro Social (INSS), desperta-se o
interesse em investigar tais modificações
do ponto de vista jurídico e suas
implicações no cotidiano de seu
ambiente de trabalho.
Partindo dessa premissa, o
trabalho será norteado
metodologicamente por uma
investigação bibliográfica e documental,
de modo a investigar as bases
norteadoras da previdência social e do
benefício da pensão por morte, bem
como a questão da constitucionalidade
das mudanças recentes no acesso ao
referido dispositivo beneficiário.
2. REFERENCIAL TEÓRICO:
PREVIDÊNCIA SOCIAL E PENSÃO
POR MORTE
Ao iniciar o presente trabalho,
preocupamo-nos em saber qual o
conceito de Política que precisamos.
Assim, dirigimo-nos primeiramente ao
Dicionário Aurélio da Língua
Portuguesa que, entre muitas acepções
nos apresenta a definição desse termo
como um “conjunto de objetivos que
informam determinado programa de
ação governamental e condicionam a sua
execução” (FERREIRA, 2010, p. 1653).
A busca por um conceito nos
leva a uma orientação para atingir
determinado fim, havendo uma
hierarquização de ações frente à atuação
concreta, ao trabalho empírico a realizar-
se. Augusto (1989, p. 106) afirma que “a
direção para a qual aponta e os objetivos
que orientam a referida política
manifestar-se-iam, de forma clara, no
interior de projetos e atividades que a
constituem”. Além disso, denotaria um
conjunto articulado de decisões de
governo, visando fins previamente
estabelecidos a serem atingidos de forma
coerente. Clareza de propósitos, ao
atingi-los, qualificariam as políticas
governamentais em geral.
Nesse sentido, Pereira (1986)
define política como instrumento de
controle racional da história, para poder
conduzir ao desenvolvimento econômico
e à autonomia nacional a partir de uma
base de competência técnica. Essa
preocupação com a interferência do
Estado se justifica pelo fato de que
devem estar ligadas ao interesse geral da
população.
Entretanto, o âmbito do que se
qualifica como público, ligado ao
interesse geral, não é delimitado de
maneira isenta, uma vez que o Estado é
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um lugar de domínio e conflitos,
contraditório em sua natureza, e não um
espaço de neutralidade, situado além e
acima das diferenças constitutivas do
social (AUGUSTO, 1989).
O fato social não é homogêneo,
existindo capacidades diferenciadas de
reivindicar e ver satisfeitas as aspirações
e demandas políticas, segundo a força de
pressão e de persuasão dos diversos
sujeitos sociais envolvidos. Por mais
geral e universalizante que sejam as
políticas estatais, sempre haverá uma
forma de hierarquiza-las, numa direção
que privilegia alguns desses sujeitos,
conforme seus interesses, posições e
lugares.
Podemos imaginar que haja
períodos onde as políticas públicas do
Estado não estejam presentes ou se
manifestem de forma mais tênue. Isto
realmente recai para um contraditório,
pois a própria natureza do Estado é
justamente intervir. Trata-se, antes de
constatar que a significativa ampliação
de suas funções conduziu a que
praticamente todas as instituições
sociais, a ele anteriormente não
vinculadas, tivessem diminuída sua
participação e influência, ao mesmo
tempo em que passaram a gravitar em
sua órbita.
No âmbito do poder do Estado,
a previdência social emerge com o papel
de constituir um conjunto “de ações
destinadas a garantir aos indivíduos e a
sociedade contra o perigo da privação,
assegurando-lhes as necessidades
básicas e um mínimo de vida digna”
(RIBEIRO, 2001, p. 67).
No campo do ordenamento
jurídico da previdência social, temos a
construção ao longo da história recente
do nosso país sobre o aporte de uma
gama de prestações previdenciárias,
dentre elas a pensão por morte. De modo
geral, podemos compreender a pensão
por morte como um benefício
previdenciário pago aos dependentes do
segurado que vier a falecer, ao qual tinha
como principal regimento legal a Lei
8.213/91.
Ao longo do processo de
modificações da legislação
previdenciária em curso nos últimos
anos, temos a Lei Nº 13.135/15, ao qual
passa a exigir tempo de carência, bem
como a necessidade de contribuições
mínimas e tempo mínimo de casamento
ou união estável para a concessão do
benefício, havendo mudança no valor
recebido pelo beneficiário.
Assim, o acesso ao recebimento
à pensão por morte ficou mais intricado,
levantando a questão de que tal
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modificação legal provocou um
retrocesso da garantia de um direito
previdenciário conquistado e garantido,
criando-se então óbices, até então
inexistentes, restringindo o alcance da
cobertura.
Com o objetivo de embasar a
presente pesquisa, abordaremos os
aspectos teóricos essenciais correlatos
com as temáticas da previdência social e
pensão por morte. Na literatura
acadêmica é ampla o desenvolvimento
conceitual relacionado a temática da
pensão por morte. Ao tratarmos sobre
esse assunto, cabe a priori
compreendermos de que trata a
previdência social.
Para compreendermos o
significado da previdência social é
necessário primeiramente atentar ao fato
de que previdência social não se
confunde com seguridade social. Para
Balera (1989, p. 34) seguridade social
pode ser compreendida no Brasil como
“o conjunto de medidas constitucionais
de proteção dos direitos individuais e
coletivos concernentes à saúde, à
previdência e a assistência social”.
Semelhante a essa definição, o
ordenamento jurídico brasileiro, por
meio da atual Constituição Federal
Brasileira, define no seu artigo 194 que
seguridade social compreende “um
conjunto integrado de ações de iniciativa
dos Poderes Públicos e da sociedade
destinado a assegurar os direitos
relativos à saúde, à previdência e a
assistência social” (BRASIL, 1988,
grifos nossos). Sobre a inserção da
seguridade social na Constituição de
1988, nos diz a Associação Nacional dos
Auditores Fiscais:
Foi uma ampla conquista política e social, que incorporou à construção democrática, direitos e garantias nas esferas políticas, individuais, coletivas e sociais. Um projeto para construção de uma sociedade livre e solidária, sob o fundamento da cidadania e do pluralismo político, sob os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, do desenvolvimento nacional com redução das disparidades sociais e regionais, para erradicar a pobreza e a marginalização e promover o bem estar geral. Mais do que um simples projeto, esses fundamentos e objetivos da República estão alicerçados em muitos instrumentos que os materializam. Um deles é, seguramente, o Orçamento da Seguridade Social (ANFIP, 2008, p. 7).
A correlação no seio da
seguridade social dessas três pilastras
(previdência, saúde a assistência), se dá
pela interdependência que é possível de
ser observada entre elas. Tendo em vista
que haja mais investimentos em saúde
pública, em contrapartida aumenta a
possibilidade de termos menos pessoas
recorrendo aos benefícios
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previdenciários, sobretudo àqueles
ligados à incapacitação física que o
incapacite para o trabalho. “Se
investirmos na previdência social, mais
pessoas estarão incluídas no sistema, de
forma que, ao envelhecerem, terão
direito à aposentadoria, não necessitando
de assistência social” (KERTZMAN,
2012, p. 31).
A Carta Magna brasileira
estabelece sete princípios norteadores do
seguro social, com o objetivo de embasar
uma rede de proteção social consistente
que assegure o bem-estar dos cidadãos, a
saber: I – universalidade da cobertura e
do atendimento; II – uniformidade e
equivalência dos benefícios e serviços às
populações urbanas e rurais; III –
seletividade e distributividade na
prestação dos benefícios e serviços; IV –
irredutibilidade do valor dos benefícios;
V – equidade na forma de participação
no custeio; VI – diversidade da base de
financiamento; VII – caráter
democrático e descentralizado da
administração, mediante gestão
quadripartite, com participação dos
trabalhadores, dos empregadores, dos
aposentados e do Governo nos órgãos
colegiados (BRASIL, 1988).
Numa análise particularizada da
Seguridade Social a partir da
consolidação da Constituição Federal de
1988, concordamos com a ideia, Ibrahim
(2007, p. 4), ao afirmar que a seguridade
social pode ser compreendida como:
(...) uma rede protetiva formada pelo Estado e por particulares, com contribuições de todos, incluindo parte dos beneficiários dos direitos, no sentido de estabelecer ações positivas no sustento de pessoas carentes, trabalhadores em geral e seus dependentes, providenciando a manutenção de um padrão mínimo de vida.
Complementando essa
construção conceitual, Silva (2004)
afirma que podemos considerar a
seguridade social como o estado do bem-
estar social, definindo-se, de modo geral,
pela busca de uma manutenção mínima
da qualidade de vida “para todos os
cidadãos, como questão de direito social,
por intermédio de um conjunto de
serviços oferecidos pelo Estado, em
dinheiro ou em espécie” (SILVA, 2004,
p. 56).
Tendo em vista que a
Seguridade Social do país passou a se
configurar por três pilares, notoriamente
Saúde, Assistência Social e Previdência,
é possível notar que: a) no caso da Saúde,
a Constituição Federal atenta que o
acesso é independente de contribuição;
b) o acesso à Assistência Social também
é independente de contribuição, devendo
ser prestada a todos aqueles que dela
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necessitam e; c) já o acesso à Previdência
se dá de modo parcial, pois a oferta da
mesma se dá mediante contribuição, à
exceção dos casos previstos em
legislação competente.
Segundo Dugnani (2009), a
Constituição de 1988 garantiu com o
processo de universalização da
Previdência Social para aqueles até então
desprotegidos, estabelecendo um piso
para os benefícios de até um salário
mínimo, tornou igualitário os valores dos
benefícios dos trabalhadores urbanos em
relação aos rurais, ampliando as fontes
de financiamento para garantir um
volume mais adequado de recursos.
Podemos destacar que o acesso à
Previdência Social passa a ser universal,
permitido a qualquer cidadão, mediante
contribuição. Desse modo, mescla-se o
princípio do mérito com o princípio da
cidadania, sob o contexto da repartição e
solidariedade.
Os beneficiários da Previdência
Social são definidos pela Lei Nº 8.213/91
como sendo as pessoas físicas titulares
do direito subjetivo às prestações do
Regime Geral da Previdência Social
(BRASIL, 1991). O Regime Geral
corresponde a toda a população que
exerce atividade econômica lícita, com
exceção dos militares e servidores
públicos, que são salvaguardados por
regimes próprios. De modo geral,
podemos considerar como sendo todas
aquelas pessoas que farão usufruto dos
benefícios da Previdência. Os
beneficiários são classificados em:
- Beneficiário Segurado:
quando o próprio contribuinte
(trabalhador) for usufruir do benefício
(ex: empregada que, com o nascimento
do filho, entra em gozo de licença-
maternidade; contribuinte individual
que, ao ficar doente, entra em gozo de
auxílio-doença; empregada doméstica
que, após cumprir a carência exigida,
venha a aposentar-se);
- Beneficiário Dependente: são
as pessoas que poderão usufruir dos
benefícios, na qualidade de dependentes
dos trabalhadores (ex: esposa que recebe
pensão do marido, que, como empregado
ou contribuinte individual veio a falecer;
pai e mãe do segurado solteiro e sem
companheira ou filhos que vier a
falecer). Os dependentes se subdividem
em 3 classes, quais sejam:
a) Classe I: o cônjuge, a
companheira, o companheiro e o filho
não emancipado de qualquer condição,
menor de 21 anos ou inválido ou que
tenha deficiência intelectual ou mental
que o torne absoluta ou relativamente
incapaz, assim declarado judicialmente;
b) Classe II: os pais;
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c) Classe III: o irmão não
emancipado menor de 21 anos ou
inválido (ANFIP, 2014, p. 14).
Com relação aos benefícios da
Previdência Social, temos: i) Auxílio-
doença; ii) aposentadoria por invalidez;
iii) Aposentadoria por idade; iv)
Aposentadoria por Tempo de
Contribuição; v) Aposentadoria
Especial; vi) Salário-família; vii)
Salário-maternidade; viii) Auxílio-
acidente; ix) Pensão por Morte; x)
Auxílio-reclusão; xi) Serviços de
Habilitação e Reabilitação Profissional;
xii) Benefícios Previdenciários do
Microempreendedor – MEI.
No que corresponde a pensão
por morte, esta se constitui como um dos
mais importantes benefícios
previdenciários do sistema brasileiro,
direcionada para a família, de modo a
ampará-la diante da perda de seu
mantenedor. Para notarmos a
importância da pensão por morte, nos
remetemos ao conceito de risco social,
elemento norteador para a busca pelo
bem-estar social. Que consiste na
ausência de condições que garantam
condições mínimas de vida.
É justamente a proteção do
cidadão diante dos riscos sociais a base
da existência da Previdência Social, no
qual busca garantir o seu tratamento
humano, diante de alguma necessidade
iminente, mas, principalmente, para
buscar o bem-estar universal, que é “o
ideário da Ordem Social, para o qual
deve voltar-se toda a sociedade”
(LADENTHIN, 2007, p. 52).
Complementa Derzi (2004, p. 72):
No momento em que se constitucionalizam regras conhecedoras das necessidades sociais, como verdadeiro acerto histórico, moral, jurídico e cultural de um povo, conquistado ao longo dos embates ideológicos através dos séculos, esse Estado não apenas se torna guardião dos direitos sociais, como assume o dever de agir no sentido de viabilizar os meios idôneos de superá-las.
A situação de risco social é
notada na medida em que se apresenta a
situação de morte de um segurado, que
colaborava com o sustento de sua
família, afetando imediatamente a renda
daquele núcleo familiar, conforme era
observado na Lei Nº 8213/91.
No caso da pensão por morte, os
dependentes eram classificados, por
meio da Lei Nº 8213/91, como: o (a)
cônjuge, a companheira, o companheiro
e o filho não emancipado de qualquer
condição, menor de 21 anos ou inválido
de qualquer idade; os pais, na falta dos
dependentes preferenciais anteriormente
relacionados e o irmão não emancipado,
de qualquer condição, menor de vinte e
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um anos ou inválido, na falta dos dois
anteriores relacionados (ANFIP, 2014, p.
27).
Martins compreende pensão
por morte como sendo “o beneficio
previdenciário pago aos dependentes em
decorrência do falecimento do segurado.
Em sentido amplo, pensão é uma renda
paga a certa pessoa durante toda a sua
vida” (MARTINS, 2004, p. 388).
Fachin e Nascimento (2011)
alertam que a pensão por morte possui
um papel fundamental na salvaguarda do
direito social, pois em muitos casos
torna-se o único meio de renda para a
sobrevivência dos dependentes.
Complementam os autores:
A razão de ser da pensão é amparar os dependentes do segurado falecido para que estes tenham condições de se manterem. A pensão será concedida não apenas quando ocorrer a morte real, natural do segurado (cessação definitiva de todas as funções de um organismo vivo), mas também, quando ocorrer a morte presumida nos casos de desaparecimento do segurado em catástrofe, acidente ou desastre. (FACHIN & NASCIMENTO, 2011, s.p.)
Tratar sobre os estudos da
pensão por morte é tratar sobre a
proteção da família. Importante observar
que a importância da família é tratada
como a base da sociedade na Carta
Magna brasileira, conforme é possível de
observar na passagem abaixo:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...) § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. § 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (BRASIL, 1988, s.p.).
Tendo-se em vista a relevância
social da pensão por morte a partir dos
autores citados, ressalta-se a importância
de trazer em evidência as alterações de
acesso a esse benefício e a consequência
no impacto de salvaguardar a sua
universalização para a população, diante
do enfrentamento dos “riscos sociais” da
família (BRASIL, 1991, s.p.).
3. PROCEDIMENTOS METODO-
LÓGICOS
O presente trabalho foi norteado
pelo método da pesquisa bibliográfica,
que consiste na busca por fontes
primárias e secundárias que versam
sobre as temáticas da pensão por morte e
benefício previdenciário. A partir de uma
análise qualitativa, foram utilizadas
fontes diversificadas, partindo desde o
levantamento de investigações
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científicas empreendidas nessa seara
(retrospectivas ou contemporâneas),
bem como fontes de “primeira mão”
(GERHARDT et al, 2009, p. 69),
notadamente os documentos sem
tratamento analítico, como documentos
oficiais, legislações e dados estatísticos.
Para a construção das bases
conceituais dessa pesquisa, foi abordada
uma investigação bibliográfica focada
no conceito de Previdência Social e
Pensão Por Morte. Para tanto, foram
empreendidos levantamentos em revistas
científicas, por meio da biblioteca
eletrônica Scielo, do portal de periódicos
da CAPES (Coordenação de
Aperfeiçoamento de Nível Superior) e
nas bases de dados do Latindex.
Também foram realizadas buscas por
livros, teses e dissertações que tratem
sob o tema.
A fim de se verificar os marcos
legais da Pensão por Morte no país, foi
abordado a legislação brasileira que
passa a tratar da inserção dos debates
dessa temática, notadamente as leis Nº
13.135/15 e Nº 8.203/91.
As informações coletadas nas
legislações foram organizadas de modo a
verificar a situação da universalidade da
Pensão por Morte no país. De modo a
contribuir nessa análise, também foi
realizado levantamento de dados
estatísticos junto ao INSS, com o
objetivo de coletar informações sobre
pensão por morte no Estado do Ceará.
4. ANÁLISE E DISCUSSÃO
Tratar sobre as alterações nas
regras de acesso ao benefício da pensão
por morte é tratar sobre a crise da
previdência brasileira. Para tanto, é
peculiar observarmos inicialmente que,
apesar do contexto em que se
encontravam os debates políticos a nível
global, com a busca de uma inserção
mais efetiva da lógica do estado mínimo,
a promulgação da Carta Magna de 1988
contradizia tal lógica, reforçando o papel
do Estado na salvaguarda do bem-estar
social, conforme visto na nossa revisão
de literatura.
Porém, ao longo do rearranjo
político no período da retomada da
redemocratização brasileira nos anos
finais da década de 1980 e início da
década de 1990, percebe-se o papel do
realinhamento em volta a um modelo
neoliberal. Assim, passa-se a crescer os
questionamentos a respeito da figura do
Estado enquanto mantenedora da
previdência social, notadamente: a
redução da intervenção do Estado na
oferta de uma rede de assistência de
saúde pública e o sistema previdenciário.
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Os princípios que orientam o
paradigma neoliberal na questão social
eram antagônicos aos da Carta de 1988,
conforme é possível notar no Quadro 1,
tornando a proposição de uma
“constituição cidadã” numa
“constituição anacrônima”, distante no
tempo e no espaço no qual as “novas
necessidades” econômicas emergiam
(FAGNANI, 2007).
Quadro 1 – Princípios da CF/88 e da Reforma Neoliberal
PRINCÍPIOS
CONSTITUIÇÃO FEDERAL (1988) REFORMA NEOLIBERAL
Seguridade Social Seguro Social
Estado do bem-estar social Estado mínimo
Universalização Focalização
Prestação estatal direta dos serviços
sociais Estado regulador e privatização
Direitos trabalhistas Flexibilização
Fonte: Adaptado de Fagnani (2007)
Como principal justificativa
para a busca por reformas no sistema
previdenciário brasileiro, temos a
incapacidade do Estado de financiar a
Previdência Social, associando ao déficit
na relação entre a arrecadação e
despesas, que poderia se agravar na
medida em que aumentasse a
longevidade da população brasileira.
Dugnani (2009) atenta que
nesse contexto de tomada por reformas
previdenciárias, as justificativas do
déficit eram movidas também por
situações como:
(...) a elevação do salário mínimo; as aposentadorias precoces por tempo
de contribuição; os benefícios especiais para trabalhadores rurais, mulheres e professores; o acúmulo dos benefícios de aposentadoria e pensão para um mesmo indivíduo; o valor elevado dos benefícios em montante incompatível com a capacidade produtiva da economia e com as limitações do orçamento público; a renúncia de receita, sonegação e evasão fiscal; e, os custos administrativos elevados (DUGNANI, 2009, p. 155).
Tendo em vista que apenas a
contribuição por meio de desconto em
folha de salário era insuficiente para
subsidiar o sistema de Proteção Social, a
Constituição estabeleceu um Orçamento
de Seguridade Social (OSS). Segundo o
Art. 195 da Carta Magna brasileira, a
seguridade social passou a ser financiada
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por toda a sociedade, de forma direta e
indireta, nos termos da lei, mediante
recursos provenientes dos orçamentos da
União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios, por meio das seguintes
contribuições sociais: a) do empregador,
da empresa e da entidade a ela
equiparada na forma da lei, incidentes
sobre a folha de salários, o lucro, a
receita ou o faturamento; b) do
trabalhador e dos demais segurados da
previdência social; c) sobre a receita de
concursos de prognósticos; e d) do
importador de bens ou serviços do
exterior.
Sob o custeio da Previdência
Social, o mesmo é pautado por meio de
contribuições, como: Fundo de
Previdência e Assistência Social
(FPAS), Programa de Integração Social
(PIS), Programa de Formação do
Patrimônio do Servidor Público (Pasep),
Fundo de Ação Social (FAS), dentre
outros. Desse modo, o financiamento dos
gastos sociais públicos no país apresenta
sob a seguinte estrutura (ver Tabela 1).
Tabela 1 – Previdência Social Brasileira: distribuição do percentual das fontes dos recursos (média de 1999 a 2004)
FONTES MÉDIA
(ANOS DE 1999 – 2004) - %
1. Recursos provenientes de impostos 6,8
2. Contribuições sociais 91,3
2.1 Contribuições dos empregadores e dos
trabalhadores para a Seguridade Social 57,9
2.2 Contribuição sobre o lucro 3,6
2.3 Contribuição para financiamento da seguridade
social 23,3
2.4 Contribuição para o Plano de Seguridade do
Servidor 2,8
2.5 Contribuição para o custeio de pensão dos militares 0,1
2.6 Contribuição Provisória sobre Movimentação
Financeira (CPMF)* 3,6
3. Outras fontes 1,4
Total 100%
Fonte: Adaptado de Boshetti e Salvador (2006)
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Numa análise mais aprofundada
do perfil da carga tributária do
financiamento da Previdência Social nos
apresenta a característica regressiva da
arrecadação por meio de Contribuições
dos empregadores e dos trabalhadores
para a Seguridade Social. Tal situação
resulta por onerar proporcionalmente
mais os cidadãos de menor renda,
evidenciando que a mesma passa a ser a
principal pilastra de sustentação
financeira da Previdência. Levando em
consideração que cerca de 57,9% dos
recursos para o custeio da Previdência
Social Brasileira advém da arrecadação
da contribuição previdenciária, torna-se
notório que são os recursos dos
trabalhadores a principal fonte
alimentadora do sistema.
Tal situação econômica é
latente para observarmos que sob o ponto
de vista prático são os trabalhadores mais
pobres que financiam as políticas da
Previdência Social. Sob essa situação,
Boshetti e Salvador (2006) afirmam que
o Estado brasileiro age como um Robin
Hood às avessas, retirando
majoritariamente dos mais pobres para
sustentar um serviço para os mais ricos.
“A baixa carga de impostos diretos no
Brasil revela que as elites querem ser
sócias do fundo público, mas não querem
ser tributadas” (BOSHETTI E
SALVADOR, 2006, p. 20).
Apesar da presente pesquisa
não se propor em enveredar no viés
econômico, é necessário tal
compreensão a respeito da situação
receita-despesa da Previdência Social,
pois trata-se da principal justificativa
para as alterações nas regras
previdenciárias. Sobre esse tema,
concordamos com Boshetti e Salvador
(2006) ao afirmarem que diante das
possibilidades previstas para o custeio
previdenciário, a geração de déficit
decorre de uma apropriação do fundo
público da seguridade social, passando a
vinculá-lo a dívida pública. Assim, parte
considerável do que é arrecadado é
desvirtuado de sua finalidade,
destinando recursos que sob o ponto de
vista da arrecadação prevê seu uso para
políticas sociais, mas, na prática, acaba
destinado para o pagamento da dívida
pública brasileira.
O caso da Contribuição
Provisória sobre Movimentação
Financeira (CPMF) é emblemático
diante desse retrospecto. A CPMF surgiu
em 1996 sob o objetivo de contribuir
com o custeio da Saúde Pública,
Previdência Social e do Fundo de
Combate e Erradicação da Pobreza. No
final de sua vigência, em 2007, a CPMF
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destinava apenas 47% do total
arrecadado para a tais finalidades, indo o
restante do montante para cobrir dívidas
do Estado (JORNAL O ESTADO DE
SÃO PAULO, 2007).
4.1 A PENSÃO POR MORTE E O
RISCO SOCIAL
No âmbito histórico, a pensão
por morte encontra-se situada como um
dos benefícios mais antigos do sistema
previdenciário brasileiro. A Lei Eloy
Chaves, de 24 de Janeiro de 1923, ao
tempo que consolidou as bases do
sistema previdenciário do país, por meio
da criação da Caixa de Aposentadorias e
Pensões para os empregados das
empresas ferroviárias, trouxe importante
contribuição para a pensão por morte. Na
lei de 1923, foi instituída a concessão de
pensão por morte aos herdeiros dos
ferroviários que viessem a falecer
passado 10 anos de serviços prestados,
ou então que tivessem perdido a vida por
meio de acidente de trabalho (BRASIL,
1923).
Ao longo do século passado,
houve uma série de instituições
normativas que passaram a dar mais
escopo à definição dos beneficiários da
pensão por morte. Assim, partiu-se da
figura da mulher/esposa (Decreto Nº.
26.778/49) como beneficiária quase que
exclusiva, para um conjunto de outras
possibilidades de beneficiários na
atualidade, conforme foi possível
observarmos no capítulo anterior do
presente trabalho.
Essa preocupação inicial
centrada na figura da esposa encontrava-
se embasada pelo contexto social que o
país vivenciava nos anos 1940, no qual a
mulher ainda não tinha pleno espaço no
mercado de trabalho, limitando-se
majoritariamente as atividades do lar. Na
medida em que a mulher passava a
romper as barreiras do patriarcalismo
moderno, a legislação previdenciária
torna-se mais abrangente para as
possibilidades de beneficiários.
A partir da Lei Nº 8.213/91 (e
por suas seguintes revisões), passam a
ser beneficiários:
• o/a cônjuge: respeitando as
definições de cônjuge do
Direito Civil brasileiro, a
Lei Nº 8.213/91 previa que
no caso de morte do
segurado/a, seu cônjuge,
cuja dependência
econômica é presumida,
fazem jus ao benefício de
pensão por morte,
independente do tempo de
matrimônio;
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• companheiro/a: tendo em
vista que trata-se de uma
“convivência pacífica,
contínua e duradoura e
estabelecida como objetivo
de constituição de família”
(BRASIL, 2002), a situação
do companheiro/a o
caracteriza a partir do Novo
Código Civil Brasileiro os
mesmos impeditivos legais
para o casamento. Assim,
estendem-se os direitos
previdenciários para os
companheiros/as;
• ex-cônjuge e ex-
companheiro: não
encontram-se na relação de
dependentes da Lei Nº
8.213/91. Porém, podem
configurar-se como
beneficiários da pensão por
morte, desde que seja seu
dependente econômico.
Afirma a referida Lei: “O
cônjuge divorciado ou
separado judicialmente ou
de fato que recebia pensão
de alimentos concorrerá em
igualdade de condições com
os dependentes referidos no
inciso I do art. 16 desta Lei”
(BRASIL, 1991, s. p.);
• filho menor ou inválido,
enteado e equiparados: no
qual a dependência
econômica é presumida e
absoluta. Importante atentar
que a Carta Magna equipara
os chamados filhos
legítimos, ilegítimos ou
adotivos, os quais não
podem ser juridicamente
discriminados;
• pais, irmão menor ou
inválido: integram ao rol de
dependentes, mas só podem
ser caracterizados como tal
quando comprovada a
dependência econômica,
que deve ser marcada pela
ajuda ou participação
financeira constante e
necessária para a vida dos
referidos entes familiares.
De modo geral, o conjunto de
beneficiários previstos na Lei Nº
8.213/91 buscavam centralizar-se numa
questão central: a salvaguarda da família
diante da possibilidade de risco social.
Importante atentar também que a partir
da Lei Nº 8.213/91, não havia a
exigência de tempo mínimo de
contribuição para que os dependentes
pudessem ter acesso ao benefício.
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Porém, era necessário que, na data da
morte, o segurado estivesse contribuindo
para a Previdência Social.
Entre o ano de 1991 e o ano de
2015, perpassamos por um período no
qual se reforçou a questão do
estrangulamento da receita do sistema
previdenciário, gerando uma
intensificação no discurso de
necessidade de uma série de alterações
no referido sistema.
Assim, emerge o debate de
algumas “correções” previdenciárias.
Propõe-se a modificação de cálculo para
a aposentadoria, trazendo para o debate o
cálculo progressivo, devido à ampliação
da expectativa de vida do brasileiro. Em
2015, foi sancionada a Lei Nº.
13.134/2015 que altera regras de acesso
ao seguro-desemprego, dentre as quais o
trabalhador passa a ter direito ao seguro-
desemprego se tiver trabalhado por pelo
menos 12 meses nos últimos 18 meses,
imediatamente anteriores à data de
dispensa, quando da primeira solicitação
(BRASIL, 2015). As mudanças podem
ser observadas a Figura 1.
Figura 1 – Modificações do acesso ao seguro-desemprego
Fonte: http://goo.gl/PSl136, visualizado em 20 mar. 2016.
Nesse interim, também é
sancionado pela presidência da república
a Lei Nº 13.135/2015, que altera o acesso
da população à pensão por morte.
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Podemos considerar com as principais
mudanças as idades do pensionista no
momento da morte do segurado e a
condição que o segurado deve atender
para o acesso ao benefício.
Analisando o novo dispositivo
legal, percebe-se que sai de cena o
caráter vitalício para o pensionista
cônjuge ou companheiro, e surgem
regras que limitam o tempo de acesso ao
benefício. As mudanças provocadas pela
Lei Nº 13.135/2015 encontram-se
sintetizadas nos Quadros 2 e 3, a seguir:
Quadro 1 – Classificação de dependentes
Fonte: http://goo.gl/hc6uxU, visualizado em 13 mar. 2016.
Quadro 2 – Regras para os pensionistas
Fonte: http://goo.gl/hc6uxU, visualizado em 13 mar. 2016.
Para além dessas modificações,
cabe observar a possibilidade de
modernização do acesso beneficiário a
partir da referida lei. Exemplo disso vale
destacar que foi introduzida na nova lei a
possibilidade de perda da pensão,
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quando comprovada a fraude no
casamento ou união estável.
Interessante notar, porém, que
apesar da justificativa dada que as
mudanças do acesso à pensão por morte
vinham com o objetivo de alinhar as
regras vigentes no país com aquelas
praticadas no restante do planeta, tal
situação não se observa enquanto uma
situação concreta, questionando-se a sua
veracidade. É possível chegar a essa
conclusão, ao levar em consideração os
demais países da América Latina (mais
próximas da nossa realidade social e
econômica), que não vislumbra o
cerceamento de acesso a esse benefício
tal qual o proposto pela lei em análise
(ver Quadro 3). Nota-se, ainda, que as
mudanças promovidas no acesso à
pensão por morte no Brasil possuem uma
similaridade mais próxima com os países
ditos desenvolvidos, suscitando o
questionamento: um benefício social
brasileiro se adequaria a uma regra
vigente em países com contexto social e
econômico abissalmente distintos?
Quadro 3 - Regras de pensões por morte – América do Sul, G20 e Brasil
Fonte: Adaptado de http://goo.gl/F8y6nB, acessado em 14 mar. 2016.
Apesar desse avanço do ponto
de vista jurídico, levanta-se a questão
prática de tais alterações, onde se reduz
o impacto desse benefício para as
famílias que se encontram em risco
social. É notório o papel que a pensão
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por morte tem no cômputo total dos
benefícios emitidos pelo Regime Geral
da Previdência Social. Dados de 2013
apontam que, no ano de 2013, cerca de
25% do total de benefícios concedidos
foram relacionados à pensão por morte
(ver Figura 3).
Figura 3 – Participação no valor total dos benefícios emitidos do RGPS em dezembro de 2013
Fonte: http://goo.gl/F8y6nB
Tal proporção apresentada
denota a elevada importância da pensão
por morte na sustentação familiar de
milhões de brasileiros na atualidade,
suscitando alguns questionamentos,
como: quais as ações a serem adotadas
para que as famílias que futuramente não
se enquadrem nas atuais regras, de modo
a salvaguardar a garantia constitucional
de proteção da família pelo Estado? As
necessidades de adequar os gastos da
previdência aos ditames do mercado
financeiro suplanta a necessidade de
proteção da família ao risco social?
Tais questionamentos ainda
estão a serem respondidos na medida em
que os primeiros resultados (positivos e
negativos) advindos da vigência da Lei
Nº 13.135/2015 começarem a surgir. A
análise de sua constitucionalidade
necessita, porém, vir a tona a partir de
um amplo debate jurídico nacional.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esse trabalho buscou averiguar
o contexto de formulação da Lei Nº
13.135/2015, sob a ótica dos seus
impactos na garantia constitucional de
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proteção à família. A partir dos objetivos
traçados, foi possível notar que o
surgimento do debate sobre a pensão por
morte encontra-se intimamente ligado à
própria formação da previdência social,
focada em salvaguardar os direitos
sociais. Também foi possível notar o
papel de relevância desse benefício
social na salvaguarda da família diante
dos riscos sociais.
Nesse sentido, observam-se as
mudanças de acesso à pensão por morte,
suscitando o questionamento sobre os
impactos de proteção do núcleo familiar
pelo Estado. A partir dessa análise, é
possível levantar o questionamento se as
mudanças promovidas em 2015 colocam
em xeque o princípio constitucional da
seguridade social de proteger os direitos
individuais e coletivos.
O fato da Lei Nº 13.135/2015
ser ainda muito recente, dificulta uma
análise comparativa da situação empírica
do acesso à pensão por morte e os seus
impactos na previdência social. Porém,
as mudanças promovidas acende o alerta
para a necessidade de uma maior
investigação sobre a constitucionalidade
dessa legislação.
REFERÊNCIAS
ANFIP. Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal. Análise da Seguridade Social em 2008. Brasília: ANFIP, 2008. ANFIP. Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal. Cartilha dos benefícios da previdência social. Brasília: ANFIP, 2014. AUGUSTO, M. H. O. O. Políticas Públicas, Políticas Sociais e Políticas de Saúde: algumas questões para reflexão e debate. Tempo soc., São Paulo, v. 1, n. 2, p.105-119, Dez. 1989. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ts/v1n2/0103-2070-ts-01-02-0105.pdf. Acesso em 20 Abr. 2016. BALERA, W. A seguridade social na Constituição de 1988. São Paulo: Revistas dos tribunais, s/e 1989. BOSHETTI, I.; SALVADOR, E. O Financiamento da Seguridade Social no Brasil no Período 1999 a 2004: Quem Paga a Conta? In: MOTA, A. E. S. (orgs.). Serviço Social e Saúde: Formação e Trabalho Profissional. São Paulo: Cortez, 2006. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em 23 mar. 2016. BRASIL. Lei Nº 13.135, de 17 de Junho de 2015. 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13135.htm. Acesso em 20 mar. 2016. BRASIL. Lei Nº 13.134, de 16 de Junho de 2015. 2015. Disponível em:
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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13134.htm. Acesso em 17 abr. 2016. BRASIL. Lei Nº 8.213, de 24 de Julho de 1991. 1991. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8213cons.htm. Acesso em 20 mar. 2016. BRASIL. Decreto Nº 4.682, de 24 de Janeiro de 1923. 1923. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/Historicos/DPL/DPL4682.htm. Acesso em 12 abr. 2016. DERZI, H. H. Os Benefícios Previdenciários da Pensão por Morte: Regime Geral de Previdência Social. São Paulo: Lex, 2004. DUGNANI, R. A previdência social brasileira sob pressão neoliberal. Disertação (Mestado em Economia Política). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2009. FACHIN, E.; NASCIMENTO, C. C. do. Pensão por morte: aspectos materiais, processuais e jurisprudência dominante. Âmbito Jurídico , Rio Grande, XIV, n. 90, jul 2011. Disponível em: <http://ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9833&revista_caderno=20>. Acesso em 13 abr. 2016. FERREIRA, A. B. de H. Dicionário Aurélio da língua portuguesa. 5.ed. Curitiba, PR: Positivo, 2010. GERHARDT, T. E.; RAMOS, I. C. A.; RIQUINIHO, D. L.; SANTOS, D. L.
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CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRÍTICA DA RELIGIÃO EM LUDWIG
FEUERBACH
Walber Nogueira da Silva
Mestre em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará e Professor do Curso de Direito da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza (FGF)
RESUMO: O presente artigo tem por objetivo principal analisar, de modo imanente, a crítica religiosa empreendida pelo filósofo alemão Ludwig Feuerbach e a religião como uma forma de alienação. Em sua obra A essência do cristianismo, Feuerbach nos mostra que o conhecimento de Deus é, na verdade, o conhecimento do próprio homem. Escrevendo em uma Alemanha atrasada política e economicamente, onde a religião servia de justificativa ideológica à ordem social vigente, ele evidencia que o homem aliena suas potencialidades em um ser superior, exterior a ele. Assim, aquilo que a religião toma como algo objetivo é, na verdade, a própria essência humana. Basta, portanto, invertê-la e teremos revelada a universalidade da humanidade. Apesar desta crítica contundente, Feuerbach não foi capaz de estender suas ideias antropológicas ao ser humano concreto, ao ser humano histórico-social, não percebendo a dimensão histórica e ativa do homem nem que sentimento religioso é um produto social e que o indivíduo abstrato que ele analisa pertence a uma determinada forma de sociedade. Palavras-Chave: Crítica da Religião; Alienação; Materialismo. ABSTRACT: This article aims to analyze the criticism of religion undertaken by the german philosopher Ludwig Feuerbach and the religion as a way of alienation. In his work The essence of christianity, Feuerbach show us that the knowledge about God is, in fact, the knowledge about the man. He wrote in a Germany political and economic lag, where the religion served to justify the social order. He tells that the man alienates his potentialities in a superior and outside being. Thus, what the religion takes as something objective is, in fact, the human essence. Just inverse it and we have disclosed the universality of mankind. Despite this definite criticism, Feuerbach could not extend his anthropological ideas to the human being historical and social, not realizing the historical and active dimension of man nor that the religious feeling is a social constructions and that the abstract fellow that he analyze belong to a specific society. Keywords: Criticism of the Religion; Alienation; Materialism
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Em seu principal estudo sobre a
religião1, Feuerbach parte da busca pelo
seu fundamento antropológico: o
conhecimento de Deus como
conhecimento do próprio homem.
Naquele momento, meados do
século XIX, a crítica da religião era
importante porque era necessário criticar
a estrutura feudal que ainda existia na
Alemanha e cujo sistema ideológico se
encontrava na religião. Esta situação
anacrônica2 devia ser superada, mas
como fazê-lo se todo o organismo social
era teologicamente justificado e a injusta
ordem social vigente se colocava como
portadora da vontade e onipotência
divinas e, portanto, como sendo a única
possível? Para a filosofia comprometida
com a transformação da realidade, só
restava a crítica à própria religião, já que
esta era uma forma ideológica de
justificação e manutenção da estrutura
social injusta ora vigente. Uma vez livre
destas supostas determinações divinas, o
homem poderia assumir sua liberdade e
construir a si e à sociedade a partir dele
mesmo.
Buscando os fundamentos
humanos que possibilitam a religião,
Feuerbach principia do fato de que só os
1 Referimo-nos aqui a sua obra A Essência do cristianismo (Das Wesen des Christentums), de 1841.
homens têm religião, os animais, não: "a
religião se baseia na diferença essencial
entre o homem e o animal - os animais
não têm religião" (Feuerbach, 2007, p.
35). Como isso é possível?, pergunta ele.
Para responder a esta pergunta, parte da
constatação de que o ser humano tem
consciência, no sentido rigoroso do
termo, o que significa que os seres
humanos podem, além da consciência da
sua individualidade, ter consciência
também do seu gênero, da espécie como
um todo. Daí ser o homem um ser
genérico (Gattungswesen):
Consciência no sentido rigoroso existe somente quando, para um ser, é objeto o seu gênero, a sua quiquidade. De fato, é o animal objeto para si mesmo como indivíduo - por isso ele tem sentimento de si mesmo - mas não como gênero - por isso falta-lhe a consciência, cujo nome deriva de saber (Feuerbach, 2007, p. 35). Enquanto o animal tem uma vida
simples, o homem possui uma vida
dupla: além de sua existência exterior, o
homem possui uma vida interior,
proveniente de sua relação com o gênero,
com a essência humana. Assim,
enquanto o homem é capaz de pensar, de
ser para si mesmo eu e também tu (ou
seja, o seu gênero pode ser-lhe objeto), o
2 A chamada miséria alemã.
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animal não pode exercer funções de
gênero sem ter um outro fora dele, já que
"vive a dupla limitação de seu ser
restrito que, por ser restrito, o impede
também de ter uma consciência ampla,
universal, infinita: que é, no final das
contas, consciência da própria infinitude
da consciência" (Frederico, 2009, p. 32).
Na religião o homem tem por
objeto essa sua essência genérica, vez
que a consciência fundante da religião
fornece ao mesmo tempo a esta o seu
objeto: a essência humana. Então, aquilo
que aparece como sendo um atributo
divino (onipotência, infinitude, amor,
sabedoria, etc), nada mais é que a
expressão das próprias capacidades da
espécie humana. No fenômeno religioso,
portanto, o homem relaciona-se consigo
mesmo.
Ora, "um ser realmente finito não
possui a mínima ideia, e muito menos
consciência, do que seja um ser finito,
porque a limitação do ser é também a
limitação da consciência" (Feuerbach,
2007, p. 36). Tal afirmação nos leva a
concluir que não se pode pensar algo não
pensável. É desta forma que, segundo
Feuerbach, a religião é a consciência não
finita da própria infinitude do homem.
"Qual é então a essência do
homem, da qual ele é consciente, ou que
realiza o gênero, a própria humanidade
do gênero?" (Feuerbach, 2007, p. 36). O
autor de A essência do cristianismo
responde: a razão, a vontade e o coração.
É exatamente por estas dimensões que o
indivíduo humano transcende a si
mesmo, estabelece sua relação com o
gênero, e se sente, enquanto ser
particular, finito, perante a essência
humana.
Vontade, amor ou coração não são poderes que o homem possui - porque ele nada é sem eles, ele só é o que é através deles -, são pois como os elementos que fundamentam sua essência e que ele nem possui nem produz, poderes que o animam, determinam e dominam - poderes divinos, absolutos, aos quais ele não pode oferecer resistência" (Feuerbach, 2007, p. 37).
Dessa forma, o gênero, que está
contido na razão, vontade e no coração,
enquanto possibilidade da unidade do
homem com o homem, é a própria
essência humana. Portanto, a essência
humana está fora do indivíduo restrito.
Como estas características são atribuídas
a Deus, Ele, o Todo-Poderoso, acaba
sendo a possibilidade de libertação do
homem dos limites da existência
individual, na medida em que, por Ele,
os seres humanos podem, como
indivíduos particulares, darem-se conta
de sua natureza universal.
O homem vai conhecendo sua
essência à medida em que toma
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consciência dos objetos, embora ela
esteja nele mesmo enquanto
potencialidade. O homem, ao tomar
conhecimento dos objetos, conhece a si
mesmo e a suas capacidades. Então, ele
precisa do objeto para alcançar sua
autoconsciência, embora o objeto da
consciência não possa ir além da própria
essência humana. O objeto é a afirmação
da essência humana:
(...) toma o homem consciência de si mesmo através do objeto: a consciência do objeto é a consciência que o homem tem de si mesmo. Através do objeto conhece o homem; nele a sua essência te aparece; o objeto é a sua essência revelada, o seu Eu verdadeiro, objetivo. E isto não é válido somente para os objetos espirituais, mas para os sensoriais também. (Feuerbach, 2007, p. 38).
O homem não pode perceber,
pensar ou sentir algo que esteja além da
sua capacidade de perceber, pensar ou
sentir. Assim, ao pensar o infinito,
confirma a infinitude de sua capacidade
de pensar, afinal, não poderia perceber
sua finitude, suas limitações, se a
infinitude do gênero não fosse objeto
para ele. Por isso que ele não pode sentir
a divindade pelo sentimento se este já
não fosse por si mesmo divino:
Portanto, se pensas o infinito, pensas a infinitude da faculdade de pensar; se sentes o infinito, sentes e confirmas a infinitude da capacidade de sentir. O
objeto da razão é a razão enquanto objeto de si mesma, o objeto do sentimento o sentimento enquanto objeto de si mesmo. (...) O sentimento é, pois, sacralizado meramente por ser sentimento; o motivo de sua religiosidade é sua natureza, é inerente a ele próprio" (Feuerbach, 2007, pp. 41, 42).
Desse modo, se o sentimento faz
parte da essência subjetiva da religião,
outras forças, atividades e potências
também o fazem. Deus é estas
qualidades. A existência delas nos
surpreende tanto que chegamos a pensar
que são uma natureza fora de nós.
Atribuímo-las a um Deus objetivo e
exterior e esta é a alienação religiosa:
atribuir atributos próprios da essência
humana a uma existência imaginária e
estranha, um engano, portanto. A
religião se constitui a partir deste
engano: é nossa própria essência, na
verdade, que temos quando
consideramos a existência Deus.
Feuerbach intenta mostrar que
aquilo que aparece como sendo atributo
divino nada mais é que característica
humana exteriorizada, reduzindo, assim,
a teologia à antropologia, já que é do
homem que trata.
A religião tem como fundamento
as características da humanidade, logo, o
que importa é buscar a essência subjetiva
da religião. O homem aliena suas
potencialidades em um ser superior,
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exterior a ele. Assim, aquilo que a
religião toma como algo objetivo é, na
verdade, a própria essência humana.
Basta, portanto, invertê-la e teremos
revelada a universalidade da
humanidade. A religião é uma forma
indireta do homem se conhecer,
enquanto gênero:
A religião, pelo menos a cristã, é o relacionamento do homem consigo mesmo ou, mais corretamente: com a sua essência; mas o relacionamento com a sua essência como uma outra essência. A essência divina não é nada mais do que a essência humana, ou melhor, a essência do homem abstraída das limitações do homem individual, i. e., real, corporal, objetivada, contemplada e adorada como uma outra essência própria, diversa da dele - por isso todas as qualidades da essência divina são qualidades da essência humana. (Feuerbach, 2007, pp. 45, 46).
O problema principal é que o
homem não reconhece o objeto religioso
como sua própria essência objetivada. A
essência humana projetada em Deus (o
predicado) é a verdade do sujeito, mas
este não a reconhece mais. Assim, na
religião, o homem relaciona-se com a
sua essência como se ela fosse uma outra
que não lhe pertence mais. Isso ocorre
porque a religião transfere para Deus
toda a riqueza do homem, esvaziando-o.
3 Feuerbach considera que a filosofia de Hegel não deixa de ser uma teologia a partir do momento em que ele faz das determinações do homem as determinações divinas. Hegel considera a arte, a religião e a filosofia como
Ao projetar sua essência em Deus o
homem empobrece-se a ponto de não
mais reconhecê-la como sua e
transforma-se de criador em criatura, em
obra de sua obra:
O homem – e este é o segredo da religião – objetiva a sua essência e se faz novamente um objeto deste ser objetivado, transformado em sujeito, em pessoa; ele se pensa, é objeto para si, mas como um objeto de um objeto, de um outro ser. (Feuerbach, 2007, pp. 58, 59).
Portanto, Deus é tudo e o homem,
nada, o que mostra que a teologia cristã
traz em si uma contemplação negativa,
hostil ao homem: “ela torna o homem
pobre para enriquecer deus”. (Chagas,
2014, p. 82).
Com tais considerações,
Feuerbach inverte de maneira
materialista a relação Deus – ser humano
e transforma os problemas teológicos em
problemas antropológicos, além de dar
um impulso decisivo para a dissolução do hegelianismo, livrando as referidas questões do beco sem saída de uma interpretação hegeliana – que, embora por vezes fosse radical do ponto de vista do conteúdo, metodologicamente sempre permaneceu interna a este – e confrontando o sistema hegeliano com a própria realidade. (Lukács, 2012, p. 131)3.
manifestações do Espírito Absoluto, enquanto para Feuerbach são manifestações do próprio homem, da própria comunidade humana. Nisto consiste a viragem ontológica de Feuerbach em
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No entanto, Feuerbach não foi
capaz de estender suas ideias
antropológicas ao ser humano concreto,
ao ser humano histórico-social. Sua
crítica ao idealismo hegeliano e à
teologia conduzem, certamente, a uma
nova orientação ontológica, mas
carecem de uma concepção de homem
como ser histórico e social. Feuerbach é
o único que tem uma relação séria com a
dialética hegeliana e o único que fez
verdadeiras descobertas nesse domínio,
mas ele não percebe a dimensão histórica
e ativa do homem. Sua crítica se insere
nos marcos do ideário iluminista, já que
ele “limita-se a esclarecer, a chamar a
atenção dos homens que não reconhecem
nos tesouros do céu uma propriedade
extraviada a eles pertencente”
(Frederico, 2009, p. 43), ou seja, ele não
vai além de uma crítica esclarecedora
cuja pretensão é mudar as coisas apenas
com a força do pensamento.
Ademais, como Marx mostrou na
sua quinta tese sobre Feuerbach, o autor
de A essência do cristianismo parte do
fato da auto-alienação
[Selbstentfremdung] religiosa e da
duplicação do mundo [Welt] em um
mundo religioso e um mundo mundano
relação a Hegel: o pensar procede do ser, mas o ser não procede do pensar.
[weltliche], mas este mundo religioso só
pode ser explicado a partir do auto-
esfacelamento e do contradizer-a-si-
mesmo do fundamento mundano (Marx,
2007, p. 534). Feuerbach não vê, por
isso, que o sentimento religioso “é um
produto social e que o indivíduo abstrato
que ele analisa pertence a uma
determinada forma de sociedade” (Marx,
2007, p. 534).
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O JOVEM-APRENDIZ NO MUNDO DO TRABALHO:
ENTRE AS NORMAS JURÍDICAS E A DISCIPLINA
Alaísa Ferreira Flor Bacharel em Direito pela Faculdade Integrada da Grande Fortaleza
Thiago Menezes de Oliveira
Professor de Direito da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza
RESUMO: A inserção no mundo do trabalho é um rito de passagem para a vida adulta. Nesse sentido, a Lei N.º 10.097/2000 regulamenta o Contrato de Aprendizagem. Nesse contrato, os adolescentes, a partir dos 14 (quatorze) anos, podem trabalhar como aprendizes. O objetivo foi investigar as normas jurídicas especificas que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei da Aprendizagem dispõem a respeito da inserção do jovem no e trabalho, tendo em vista a importância de garantir o ingresso na atividade laboral. Procurou-se conceituar o sujeito aprendiz e buscou-se identificar as peculiaridades desse contrato de trabalho. Trata-se de pesquisa qualitativa do tipo bibliográfica. Concluiu-se que a aprendizagem pode garantir a exploração de algum potencial de caráter técnico-profissional metódica. Mesmo com alusões ao desenvolvimento integral, o foco do contrato de aprendizagem, com base nas previsões do ECA e da Lei de Aprendizagem, é essencialmente tecnicista e disciplinador. Palavras-chave: Mundo de Trabalho; Disciplina; e Contrato de Aprendizagem. ABSTRACT: Integration into labor`s world is a passage for adulthood. Although, the Law N. 10.097/2000 regulates the Learning Agreement. With this contract, from fourteen (14) years old, they can start to work as an apprentice. The objective of this article is to investigate the specific legal rules the Statute of Children and Adolescents (ECA) and the Learning Law. We try to conceptualize the learner. We ought to identify Learning Agreement. Therefore, the article is a qualitative and a bibliographical research. We concluded that learning could make an effort for professional abilities. Although the focus of the learning contract, based on the ECA`s and Learning Law`s norms, is essentially technical and disciplinarian. Keywords: Labour`s World; Discipline; and Learning Contract.
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1 INTRODUÇÃO
A aprendizagem no Brasil é
regulada pela consolidação das Leis do
Trabalho (CLT) e passou por um
processo de mudanças com a
promulgação das Leis N° 10.097, 19 de
Dezembro de 2000; Lei N° 11.180, de 23
de Setembro de 2005, e Lei N° 11.788 de
25 de Setembro de 2008. Nessa
perspectiva, o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), Lei N° 8.069 de 13
de Julho de 1990, também prevê, nos
seus artigos 60 a 69, o direito à
aprendizagem, de forma a assegurar o
princípio da proteção integral à criança e
ao adolescente.
A aprendizagem é um instituto
que cria possibilidades, tanto para o
aprendiz quanto para as empresas. Tem
um caráter tecnicista que visa à
preparação do jovem para desempenhar
atividades profissionais, ao criar
oportunidade para lidar com diferentes
situações no mundo do trabalho. Ao
mesmo tempo, permite às empreses
qualificar o jovem aprendiz, com idade
entre 14 a 24 anos, matriculando-o em
curso de aprendizagem profissional e
inserindo-o em estabelecimentos onde
vivenciam a prática do trabalho,
conforme rege a CLT.
A participação dos aprendizes se
dá por meio da matrícula em programas
de aprendizagem, observando a
prioridade legal atribuída aos Serviços
Nacionais de Aprendizagem e,
subsidiariamente, às Escolas Técnicas de
Educação e às Entidades sem fins
lucrativos (ESFL), que tenham por
objetivo a assistência ao adolescente,
garantindo-lhe a educação profissional.
Esses programas são registrados no
Conselho Municipal dos Direitos da
Criança e do Adolescente (COMDICA),
em se tratando de aprendizes entre a
faixa de 14 aos 18 anos. Em relação aos
aprendizes com deficiência, acrescenta-
se, ainda, que há o limite de 24 anos para
participar do programa de aprendizagem.
O objetivo geral deste trabalho
foi conceituar o sujeito aprendiz à luz da
legislação e da doutrina e o contrato de
aprendizagem, versando sobre as
peculiaridades deste contrato de trabalho
e ressaltando suas vantagens e
desvantagens. Metodologicamente,
recorreu-se à pesquisa descritiva e
exploratória, fundamentada em uma
revisão bibliográfica, recorrendo a
teóricos que tratam deste tema.
O presente estudo seguirá com o
delineamento do referencial teórico no
qual se define aprendiz e contrato de
trabalho de aprendizagem; identificam-
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se os aspectos da inserção do aprendiz no
mercado de trabalho; apontam-se as
possibilidade de transformar o contrato
de aprendizagem em contrato de trabalho
por tempo indeterminado; aborda-se o
certificado de qualificação profissional
de aprendizagem; são expostos os
aspectos gerais da inserção no mercado
de trabalho com base na Lei de
Aprendizagem e no ECA. Por fim,
apresentam-se os procedimentos
metodológicos e os dados e resultados da
pesquisa.
2 O TRABALHADOR APRENDIZ
Conforme a Consolidação das
Leis Trabalhistas (CLT) o aprendiz é o
adolescente ou o jovem entre 14 e 24
anos, que almeja à inserção no mundo do
trabalho. Esses jovens devem estar
matriculados e frequentando a escola,
caso não tenha concluído o ensino
médio, além da obrigatoriedade de
inscrição em programa de aprendizagem,
conforme o artigo 428, caput e §1º, da
CLT. Se o aprendiz for pessoa com
deficiência não haverá limite máximo de
idade para a contratação, em
consonância como artigo 428, § 5º, da
CLT.
Nas regiões onde não houver o
ensino médio, de acordo com o disposto
no § 1ª do Art. 428 § 7º da CLT, a
contratação do aprendiz poderá ocorrer
sem a frequência à escola, desde que ele
já tenha concluído o ensino fundamental.
Caso não tenha concluído o ensino
fundamental, a matrícula em instituição
regular de Ensino Médio será
obrigatória, pois a contratação só será
válida com a frequência do aprendiz à
escola. Assim, o aprendiz é o sujeito que
está regularmente matriculado no Ensino
Médio, ou que já o concluiu. Nesse
sentido, passa-se a analisar, a seguir, o
trabalho do aprendiz, à luz da CLT e do
ECA.
No ordenamento jurídico
brasileiro vigente, há normas que
regulamentam as condições da inserção
dos adolescentes no mercado trabalhista.
Dentre essas normas destacamos a Lei
Nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do
Adolescente), a Lei 10.097/2000 e o
Decreto nº 5.598/05, que definem a
política pública de governo, referente à
inserção do jovem no mercado de
trabalho: o Programa Jovem Aprendiz.
O Programa Jovem Aprendiz
requer que os jovens estejam
formalmente contratados como
‘aprendizes’ e matriculados nos
chamados cursos de aprendizagem, os
quais são abrangidos pela categoria de
ensino profissional. A previsão advém
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do Decreto Nº 5.154, de 23 de julho de
2004, da Presidência da República, que
disciplina os artigos 39 a 42, da Lei Nº
9.394/96, de 20 de dezembro de 1996,
Lei de Diretrizes e Bases da Educação,
que regulamentam a educação
profissional e tecnológica.
Esses cursos de aprendizagem se
materializam em programas técnico-
profissionais, os quais se desenvolvem
sob a orientação de entidades
qualificadas para proporcionar a
formação profissional inicial com foco
na qualidade dos serviços prestados e em
atitudes empreendedoras e sustentáveis.
Os jovens partícipes são contratados por
empresas do comércio de bens, serviços
e turismo, por meio de programa que
deve organizar, de forma processual e
metódica, as atividades correlatas às
práticas dos aprendizes, decorrentes do
poder disciplinar das empresas
contratantes. Esses jovens aprendizes,
conforme o artigo 2º da Portaria do
Ministério do Trabalho e Emprego
(MTE) Nº 615/2007 “[...] deverão
inscrever-se no Cadastro Nacional de
Aprendizagem, disponível no sítio do
MTE, através de formulário eletrônico”,
bem como optar por programas e cursos
de aprendizagem relacionados no
Cadastro Nacional de Aprendizagem.
Tais programas, por força do art. 8º
do Decreto Nº 5.598, de 1º/12/2005, são
ofertados pelo Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial (SENAI),
Serviço Nacional de Aprendizagem
Comercial (SENAC), Serviço Nacional
de Aprendizagem Rural (SENAR),
Serviço Nacional de Aprendizagem
Serviço Nacional de Aprendizagem
sobre Transporte (SENAT) e Serviço
Nacional de Aprendizagem de
Cooperativismo (SESCOOP), pelas
escolas técnicas de educação (inclusive
agrotécnicas), pelas entidades sem fins
lucrativos que tenham por objetivos à
educação profissional e à assistência ao
adolescente, registradas no Conselho
Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente (COMDICA).
A CLT dispõe em seu artigo 428
que o contrato de aprendizagem nada
mais é do que um contrato especial,
ajustado de forma escrita e por prazo
determinado, cuja duração não pode
exceder a 2 anos, salvo quando se tratar
de aprendiz portador de deficiência. No
contrato de aprendizagem, o empregador
assegura ao adolescente/jovem, com
idade entre 14 e 24 anos, previamente
inscrito em programa de aprendizagem,
uma formação técnico-profissional,
compatível com o seu desenvolvimento
físico, moral e psicológico.
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O aprendiz, doutra parte, se
compromete a executar com diligência e
zelo as tarefas que forem necessárias a
essa formação. Conforme já explicitado,
é importante destacar que a idade
máxima de 24 anos não se aplica a
aprendizes portadores de deficiência,
conforme §5º do artigo 428 da CLT.
Ressalta-se que, tanto a idade como o
tempo de duração do contrato de
aprendizagem, não se aplicam quando o
sujeito for pessoa com deficiência.
A formação técnico-profissional
deve basear-se nos seguintes princípios:
(I) garantia de acesso e frequência
obrigatória ao ensino fundamental; (II)
horário especial para o exercício das
atividades; e (III) capacitação
profissional que se adeque ao mercado
de trabalho. Esses princípios estão
previstos no artigo 7º do Decreto Nº
5.598/05.
Frisam-se, para efeitos didáticos,
as características principais extraídas do
contrato de aprendizagem, a saber: o
jovem deve ser inscrito em programa de
aprendizagem, sendo-lhe assegurada a
formação técnico-profissional.
Consoante disposto no artigo 429
da CLT, todos os estabelecimentos de
qualquer natureza têm a obrigação de
contratar aprendizes no percentual de, no
mínimo, 5% (cinco por cento), e, no
máximo, 15% (quinze por cento), que
incidirá sobre o número de trabalhadores
do respectivo estabelecimento, cujas
funções requeiram formação
profissional. Assim, os estabelecimentos
referidos devem contratar aprendizes,
em percentual de cinco a quinze por
cento dos trabalhadores ali existentes,
para as funções de formação
profissional. Contudo, vale dizer que o
artigo 14, do Decreto Nº 5.598/05, da
Presidência da República, dispõe que
estão desobrigadas dessa incumbência as
empresas de pequeno porte, as
microempresas, as optantes pelo
SIMPLES (artigo 11, da Lei Nº
9.841/99), além das entidades que não
tenham fins lucrativos. Essas últimas
entidades desde que seu objetivo esteja
voltado à educação profissional, em
acordo com a determinação contida no
artigo 11 da Lei nº 9.841/99, conforme
ressaltado no artigo 14 do Decreto nº
5.598/05.
Com efeito, o percentual
anteriormente referido deverá ser
calculado de acordo com cada
estabelecimento. Assim, naquelas
empresas que têm mais de um
estabelecimento, a cota de contratação
deve ser cumprida por cada um deles.
Esse entendimento é discutido na
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
doutrina que não define um consenso
(SAASD, 2007).
No que tange aos aspectos formais
do contrato de aprendizagem, este deve
ser efetivado mediante anotação na
Carteira de Trabalho e Previdência
Social. Em anotações gerais, a data de
início e término do contrato de
aprendizagem deverão ser especificadas,
conforme definido no artigo 29 da CLT.
Ressalta-se, com relação às regras
de aprendizagem, que essas devem ser
definidas pela Administração Pública,
conforme informa o ‘Manual de
Aprendizagem: o que é preciso saber
para contratar o jovem
aprendiz’, publicado pelo MTE, no ano
de 2008, o qual explicita que as empresas
públicas e sociedades de economia mista
podem optar pela contratação direta de
aprendizes. Nessa hipótese, devem fazê-
lo por meio de processo seletivo, com
prévio edital, ou, indiretamente, por
meio das entidades que não tenham fins
lucrativos (artigo 16 do Decreto da
Presidência da República, Nº 5.598/05).
Acentua-se que as empresas
públicas e sociedades de economia
mista, exploradoras de atividade
econômica, nos termos do artigo 173,
§1º, II, da CF/88, devem observar a
legislação trabalhista. `É óbvio que não
podia ser diferente no que concerne à
contratação de aprendizes.
Vale ressaltar que, quando as
atividades práticas da aprendizagem
ocorrerem no interior de estabelecimento
sujeito à insalubridade ou à
periculosidade, sem que se possa elidir o
risco ou sem possibilidade de realizá-las
integralmente em ambiente simulado as
empresas deverão preencher a cota por
meio da contratação de jovens na faixa
etária entre 18 e 24 anos, ou com pessoas
deficientes, que tenham acima de 18
anos, em consonância com o parágrafo
único do artigo 11 do Decreto
presidencial Nº 5.598/05. Esse é um
aspecto importante, a respeito da
inserção do aprendiz no mercado de
trabalho, como definem o §único, do art.
91, do ECA e a Lei da Aprendizagem Nº
10.097/2000, ampliada pelo Decreto
Federal nº 5.598/2005.
As empresas ainda estarão
obrigadas a contratar aprendizes com
idade superior a 18 anos em mais duas
situações, conforme disposto nos incisos
II e III do art. 11 do aludido Decreto, in
verbis:
II - a lei exigir, para o desempenho das atividades práticas, licença ou autorização vedada para pessoa com idade inferior a dezoito anos; e III - a natureza das atividades práticas for incompatível com o desenvolvimento físico, psicológico e moral dos
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
adolescentes aprendizes. (DECRETO N.º 5.598/05, artigo 11, incisos II e III).
Os contratos de trabalho dos
adolescentes devem ser anotados na
Carteira de Trabalho e Previdência
Social (CTPS), da mesma forma como
ocorre nos demais tipos de contrato
trabalhista. Entretanto, já na parte
denominada Anotações Gerais deverá
constar a informação de que o contrato é
pertinente à aprendizagem (§1º, do artigo
428, da CLT). Essa formalidade é
importante para assegurar a proteção aos
seus direitos trabalhistas e comprovar a
sua inserção no mercado de trabalho.
O contrato de aprendizagem
recebe como incentivo a alíquota
diminuída do depósito ao Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço (FGTS),
que terá redução de 8% (oito por cento)
para 2% (dois por cento) da remuneração
paga ao empregado aprendiz, conforme
reza o artigo 24, em seu parágrafo único,
do Decreto Federal Nº 5.598/05. Vale
ressaltar que, embora a taxa de
contribuição para o FGTS, referente ao
empregado aprendiz, seja fixada em um
nível inferior às taxas dos demais
trabalhadores, são aplicadas, aos
contratos de aprendizagem, as
disposições da Lei nº 8.036, de 11/05/90,
que tratam das regras gerais do FGTS.
Deve ser dito, ainda, que para
validade do contrato de aprendizagem é
preciso não só a anotação na Carteira de
Trabalho e Previdência Social (CTPS).
Em obediência aos termos do artigo 428,
§ 1º, da CLT, o aprendiz também deve
estar matriculado e frequentando escola
para conclusão do ensino médio, caso
não o tenha concluído ainda, e inscrito
em programa de aprendizagem
desenvolvido sob o crivo de entidade
qualificada.
Todos esses requisitos, segundo
Martins (2005) “se não observados,
descaracterizam a validade do negócio
jurídico (art. 104 do CC) para a
especificação do contrato de
aprendizagem” (MARTINS, 2005: 355).
Em relação à jornada de trabalho,
o artigo 432 da CLT (com a redação dada
pela Lei nº 10.097), tem-se que a duração
de trabalho do aprendiz não ultrapassará
06 (seis) horas diárias ou 36 (trinta e seis)
horas semanais. São vedadas a
compensação e a prorrogação de jornada,
salvo, no caso dos aprendizes já terem
concluído o ensino fundamental,
quando, então, esse limite poderá ser de
até 08 (oito) horas diárias ou 40
(quarenta) horas semanais, se nelas
forem computadas as horas reservadas à
aprendizagem teórica do curso de
aprendizagem. Neste caso, é
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
recomendado, no mínimo, que duas
horas diárias sejam destinadas à
aprendizagem teórica.
Vale lembrar que, conforme o
Decreto Federal Nº 5.598/05, quando o
jovem com menos de 18 anos estiver
empregado em mais de um
estabelecimento, serão totalizadas as
horas de trabalho que ele tiver em cada
um de forma a não extrapolar a carga
horária de trabalho exigida e não
interferir nas suas horas de estudo
(BRASIL, 2005, artigo 21).
Ao aprendiz será garantido o
salário mínimo-hora, pago de forma
proporcional à sua jornada de trabalho,
com observação do piso estadual, caso
exista. Consigne-se que a convenção ou
acordo coletivo da categoria têm o
arbítrio de garantir ao aprendiz salário
maior do que o mínimo, conforme
disposto no artigo 428, § 2º, da CLT e no
artigo 17, parágrafo único, do Decreto nº
5.598/05. Nesse sentido, a qualificação
profissional é realizada para preparar
para a inserção em setores específicos da
atividade produtiva e consiste em
articular qualificação com elevação da
escolaridade, estágio ou serviços
comunitários.
Em regra, quando se trata do
cálculo da remuneração do aprendiz,
devem-se considerar os seguintes
fatores: total das horas trabalhadas; total
das horas computadas destinadas às
atividades teóricas; e total das horas
referentes ao repouso semanal
remunerado. Assim, pode-se dizer que a
fórmula para esse cálculo é, pelo menos:
Salário Mensal (salário mínimo hora),
multiplicado pelas horas trabalhadas
semanais e pelo número de dias do mês.
De toda forma, o cálculo do salário
mínimo hora será, no mínimo,
equivalente ao valor do salário mínimo
dividido por 220, que representa a carga
horária mensal do empregado celetista.
Para o jovem, essa garantia implica a sua
inscrição no mercado de trabalho.
É vedado efetuar qualquer
desconto no salário do aprendiz,
respeitando-se a regra do art. 462 da
CLT, salvo, quando este desconto
resultar de adiantamento, de dispositivos
de lei ou de convenção ou acordo
coletivo aplicável ao aprendiz.
Verifica-se, ainda, como direito
do aprendiz o recebimento de vale-
transporte nos trajetos que forem
necessários ao deslocamento de sua
residência até a empresa/instituição onde
cursa o programa de aprendizagem,
porquanto o contrato inclui as horas que
passa na instituição que desenvolve o
curso de aprendizagem.
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
No período das férias da fase
teórica do curso de aprendizagem, é
possível a exigência no sentido de que o
aprendiz cumpra a jornada na empresa,
desde que seja garantido pelo menos um
período de férias do programa de
aprendizagem coincida com as férias
escolares, no caso do aprendiz ter menos
de 18 anos, nos termos dos artigos 130 e
136, §2º, ambos da CLT.
Em relação à extinção do
contrato de aprendizagem, em regra, esta
ocorre quando o contrato atinge o seu
prazo final, conforme definido no artigo
428 da CLT, com redação dada pela Lei
Nº 10.097/2000, no momento em que o
aprendiz completar 24 anos de idade
(artigo 433 da CLT, com redação dada
pela Lei Nº 11.180, de
23/09/2005), exceto quando se tratar de
deficiente. Nessas hipóteses, o
adolescente/jovem fará jus a 13º salário
e férias, inclusive proporcionais, saldos
salariais e levantamento dos depósitos do
FGTS, no término normal do contrato.
Vale salientar que a multa
rescisória e o aviso prévio não serão
exigidos. Nos contratos de aprendizagem
com um ano, ou mais de vigência, será
necessária a homologação dessa
rescisão. A referida homologação
deverá, obrigatoriamente, ser efetuada
nos órgãos locais do MTE ou, se o
aprendiz contar com mais de um ano de
contrato com a empresa, no sindicato da
categoria laboral, seguindo a previsão do
art. 477 da CLT.
É preciso observar que, tratando-
se de aprendiz adolescente, o processo de
rescisão contratual de trabalho deverá ser
assistido por seus pais e, na falta ou
impedimento destes, deverão ser
nomeados responsáveis legais, para que
seja possível a quitação das verbas
rescisórias ao empregador. Vê-se que o
adolescente pode rescindir o contrato de
trabalho, entretanto, não poderá dar a
quitação às verbas rescisórias.
O pagamento das verbas
rescisórias será considerado nulo se for
feito sem a observância da assistência ou
representação do adolescente, salvo
quando o próprio aprendiz declarar que
recebeu as verbas rescisórias,
entendimento esse que será pacificado
pela jurisprudência dominante em
nossos tribunais, a exemplo do Tribunal
Regional do Trabalho da 4ª Região
(TRT, 4ª R., RO 15.579/92, Ac. 4ª T., j.
4-594, Rel. Juiz Valdir de Andrade
Jobim).
O instituto da rescisão antecipada
do contrato de aprendizagem será
possível nos casos de desempenho
insuficiente; inadaptação do aprendiz,
falta disciplinar grave; ausência
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
injustificada à escola que implique perda
do ano letivo, conforme incisos I, II, III
do artigo 28do Decreto Federal Nº
5.598/05, respectivamente, a pedido do
aprendiz (inciso IV, do artigo 28 do
Decreto Nº 5.598/05). Se a rescisão
antecipada do contrato se basear em
desempenho insuficiente ou inadaptação
do aprendiz, é obrigatória a manifestação
da entidade que oferece o programa de
aprendizagem. Por ser a empresa
incumbida da supervisão e avaliação,
deve ser garantido ao aprendiz o direito
de recurso ou acesso ao Judiciário. Para
tanto, o aprendiz deverá receber cópia
integral do relatório circunstanciado que
teve por conclusão a rescisão antecipada
de seu contrato de aprendizagem.
Destaca-se que, quando houver
extinção ou rescisão do contrato de
aprendizagem, o empregador deverá
contratar novo aprendiz, para não
incorrer na infração do artigo 429 da
CLT.
Ao aprendiz que tiver concluído
o curso de aprendizagem com
aproveitamento satisfatório, será
concedido certificado de qualificação
profissional (artigo 430, § 2º, da CLT),
fato que garante a valorização do
empregado aprendiz, nos mesmos
termos do empregado por tempo
determinado.
Em caso de rescisão antecipada
do contrato de aprendizagem, sem justa
causa, ou seja, por razão que não esteja
no rol daquelas previstas no art. 433 da
CLT e no Decreto nº 5.598/05, o
empregador será obrigado a pagar ao
aprendiz, a título de indenização, a
metade da remuneração a que teria
direito até o término previsto do contrato
(art. 479 da CLT).
Competirá às superintendências
regionais do trabalho e emprego
fiscalizar rigorosamente as empresas
contratantes dos aprendizes, verificando
se estão cumprindo as cotas de
contratação a que alude o artigo 429 da
CLT, bem como os requisitos que dão
validade aos contratos, tais como as
condições de saúde e proteção dos
trabalhadores, e os aspectos que digam
respeito ao desenvolvimento dos jovens
nos programas de aprendizagem. Os
estabelecimentos que infringirem as
disposições legais que regem a
contratação de aprendizes ficarão
sujeitos à multa administrativa aplicada
tantas vezes quantos forem os aprendizes
empregados sem a observância da lei,
consoante o disposto no art. 434 da CLT.
Tal fiscalização é importante porque
garante a inscrição do aprendiz no
mercado de trabalho.
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
3 DA POSSIBILIDADE DE
TRANSFORMAR O CONTRATO
DE APRENDIZAGEM EM
CONTRATO DE TRABALHO POR
TEMPO INDETERMINADO
No caso da empresa optarem ser
mantido o contrato de trabalho entre
empregado e empregador em virtude do
término do período de aprendizagem,
assumirá, normalmente, todas as
disposições contratuais, legais e
convencionais que decorrem do vínculo
empregatício. Assim, o contrato de
aprendizagem se transformará em
contrato de emprego por tempo
indeterminado.
Existe um questionamento que
tem gerado discussão no que redunda
essa opção do contrato de trabalho ser
mantido após o cumprimento do contrato
de aprendizagem (término ou quando o
aprendiz atinge 24 anos de idade). O que
se questiona é: se houver interesse por
parte do empregador em manter o
aprendiz, seria necessário,
primeiramente, a extinção (rescisão) do
contrato de aprendizagem para, só então,
ser efetuada nova admissão? É
importante questionar que esses
questionamentos implicam a própria
inserção no mercado de trabalho, como
aprendiz. Ou seja, indaga-se se, enquanto
aprendiz, o jovem já está no mercado de
trabalho, ou se ele está envolto no
mercado, mas ainda próximo da figura
de estagiário. Tal questionamento
implica, por exemplo, se essa inserção
está mais próxima da figura do
estagiário; da permanência no mercado
de trabalho; ou do empregado. Assim,
será suficiente que o aprendiz permaneça
prestando serviço para que,
automaticamente, o contrato de
aprendizagem se transforme contrato de
trabalho por tempo indeterminado?
A legislação trabalhista é silente
a esse respeito, apenas estando previsto
no caput do artigo 428 da CLT que o
"contrato de aprendizagem é o contrato
de trabalho especial, ajustado por escrito
e por prazo determinado".
Diante dessa omissão, a
jurisprudência vem se manifestando no
sentido de que o contrato de
aprendizagem se sujeita às regras
relativas ao contrato de trabalho por
tempo determinado, não se aplicando a
rescisão obrigatória, sendo bastante a
simples continuidade para que seja
transformado em contrato por prazo
indeterminado.
Todavia, aconselha-se,
preventivamente, que seja elaborado um
adendo no qual constem eventuais
alterações contratuais advindas da
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mencionada transformação e que
comprove a anuência do empregado e do
empregador.
Não obstante o entendimento ora
adotado, importa dizer que existe
posicionamento contrário, ou seja, há
quem comungue da opinião de ser
necessária a rescisão contratual em razão
do término da aprendizagem para,
posteriormente, em havendo vontade das
partes, ser formalizado novo contrato,
admitindo-se novamente o trabalhador.
Assim, em vista da omissão legal
e pelo fato do assunto ainda não estar
pacificado jurisprudencialmente, antes
que a empresa adote o critério mais
conveniente em seu julgamento, é
recomendada uma consulta prévia ao
órgão regional do Ministério do
Trabalho e Emprego, bem assim à
entidade sindical que representa a
respectiva categoria profissional.
Entende-se, de toda forma que é
mais adequado afirmar que o trabalhador
aprendiz se aproxima mais da figura do
trabalhador temporário, pois
proporciona a qualificação profissional
necessária para a inserção em setores
específicos da atividade produtiva e
articula a qualificação com a elevação da
escolaridade, estágio ou serviços
comunitários.
Conforme parágrafo 2º, artigo
430, da CLT, o certificado de
qualificação profissional será concedido
pela entidade qualificada em formação
técnico-profissional metódica àqueles
aprendizes que concluam os programas
de aprendizagem com aproveitamento.
O certificado de qualificação
profissional deverá conter o título e o
perfil profissional para a ocupação em
que o aprendiz tenha sido qualificado.
Por certo, em termos legais, essa
qualificação tem caráter
preponderantemente tecnicista,
afirmação que pode ser inserida com
base na própria terminologia, amparada
pela lei técnico-profissional metódica,
que busca ainda uma prática voltada à
formação necessária à participação em
concursos profissionais técnicos e
olvidando uma formação cidadão crítica
sugerida pela Lei de Diretrizes e Bases
da Educação (LDB, 1996).
4 INSERÇÃO NO MUNDO DO
TRABALHO E A LEI DE
APRENDIZAGEM
No que diz respeito ao Cadastro
Nacional de Aprendizagem, previsto no
artigo 32 do Decreto Federal N°
5.598/05, (BRASIL, 2005), pode ser dito
que “é um banco de dados nacional com
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informações sobre as entidades de
formação técnico-profissional e dos
cursos de aprendizagem que
disponibilizam” (MANUAL DA
APRENDIZAGEM, 2008). Nos precisos
termos do artigo 32 do Decreto Federal
Nº 5.598/05:
Art. 32. Compete ao Ministério do Trabalho e Emprego organizar cadastro nacional das entidades qualificadas em formação técnico-profissional metódica e disciplinar a compatibilidade entre o conteúdo e a duração do programa de aprendizagem, com vistas a garantir a qualidade técnico-profissional.
Aqui, mais uma vez, destaca-se o
caráter tecnicista do trabalho aprendiz.
No que tange ao enquadramento da
contratação de aprendiz, ainda há de se
destacar que se todas as disposições
legais já elencadas não forem atendidas
o respectivo contrato será extinto por
faltar requisitos essenciais ao seu regular
e legal desenvolvimento. Outrossim, a
legislação prevê, inclusive, penalidades
às empresas que não celebrem o contrato
de aprendizagem da forma legalmente
prevista, conforme o art. 434 da CLT.
A multa acima referenciada
poderá ser imposta à empresa que, a
título de exemplo, não faça a anotação da
CTPS, ou o faça em desconformidade
com a lei, tendo de arcar, ainda, com os
custos da emissão de nova via (art. 435,
da CLT).
A Lei da Aprendizagem ressalta
a importância da inserção no mercado de
trabalho, na condição de aprendiz,
contribuindo com o desenvolvimento
educacional do individuo, considerando
que este é um ser portador de direitos
civis e sociais, inclusive o da
profissionalização. A profissionalização
do adolescente e do jovem somente pode
ser composta se inserida num processo
educacional, moderado pelo respeito aos
direitos do aprendiz, não se
desvinculando da educação básica, a
qual deve ser fortalecida.
5 INSERÇÃO NO MUNDO DO
TRABALHO E O ECA
Em verdade, o Estatuto somente
regulamentou situações que já eram
previstas pela CLT (artigo 69 do ECA),
com destaque para a condição em que o
jovem aprendiz se encontra.
Há de se frisar que o trabalho
deve ser propiciado ao adolescente com
respeito aos cuidados inerentes à
condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento, que não se trata só do
físico, como também de aspectos
psicológicos e sociais, de maneira tal que
a sua ulterior maturação não seja
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prejudicada. No Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), os artigos
destinados a tratar da profissionalização
e proteção do trabalho são do 60 ao 69.
Em seu artigo 60 o ECA proíbe esses
jovens com menos de 14 (quatorze) anos
o exercício do trabalho, exceto na
condição de aprendiz. Essa ‘condição de
aprendiz’, a partir dos 14 anos, denota
peculiaridade, uma vez que pressupõe a
frequência regular do adolescente à
escola, bem como o seu bom
aproveitamento escolar, ou seja, o
trabalho não pode prejudicar o bom
desempenho escolar. Outros requisitos
importantes dessa condição são: que
possua carteira assinada com contrato de
aprendiz e, dessa forma, seja remunerado
como tal, tendo seus direitos
previdenciários e trabalhistas
assegurados (art. 65 do ECA); e que o
desenvolvimento social e pessoal, em
sua vida profissional, sejam mais
importantes que o aspecto produtivo.
A proibição a que alude o artigo
60 do Estatuto [a de que pessoas com
menos de 14 anos não poderem exercer
atividade laboral, salvo na condição de
aprendiz] é consequência da Doutrina da
Proteção Integral. Presume-se que até a
idade de 14 (quatorze) anos a/o
criança/adolescente devam ter acesso ao
devido processo educativo e lazer, uma
vez que para trabalhar é importante a
formação integral. Deve-se, ainda,
ressaltar que, por força da Emenda
Constitucional nº 20/98, que alterou o
artigo 7º, inciso XXXIII da Constituição
Federal, proibindo qualquer trabalho a
adolescente, salvo na condição de
aprendiz, a partir dos 14 anos, os termos
do artigo 60 devem ser interpretados
como proíbe o trabalho a pessoas com
menos de 14 anos.
Quanto à definição de
aprendizagem, a Lei 8.069/90 aduz ser a
"[...] formação técnico-profissional
ministrada segundo as diretrizes e bases
da legislação e educação em vigor"
(artigo 62 do ECA). É interessante o
destaque à LDB, uma vez que essa Lei
extrapola o mero caráter tecnicista da
educação.
São princípios que garantem a
aludida formação técnico-profissional:
garantia de acesso e frequência ao ensino
regular, atividade compatível com o
desenvolvimento do adolescente e
horário especial para o exercício das
atividades (artigo 63 do ECA). Isso
implica dizer que o trabalho do
adolescente e jovem deve respeitar suas
limitações e seu nível de
desenvolvimento.
No mesmo diploma legal, mais
precisamente em seu artigo 67, estão
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previstas as proibições, os casos em que
adolescentes não poderão exercer
atividade laborativa, a saber: o trabalho
perigoso, penoso ou insalubre, de acordo
com as definições da lei trabalhista;o
trabalho noturno, sendo considerado
aquele realizado entre 22h de um dia e 5h
do outro dia;o realizado em locais e
horários que impossibilitem ao
adolescente a regular frequência àescola;
e o realizado em locais que prejudiquem
a sua formação e desenvolvimento físico,
psíquico, moral e social.
Outrossim, consoante determina
o artigo 66 do ECA, o trabalho do
adolescente deficiente deverá ser
protegido. Assim, aponta-se que o ECA
estabelece a inserção do adolescente no
mercado de trabalho, desde que respeite
as suas possibilidades e limitações.
6 PROCEDIMENTOS METODOLÓ-
GICOS
Para a elaboração da pesquisa
recorreu-se à pesquisa bibliográfica e
documental, procurando extrair das leis
as bases para uma fundamentação teórica
sobre o tema abordado. A pesquisa é de
natureza qualitativa, uma vez que se
buscou definir o problema em estudo
desconsiderando o universo amostral. A
pesquisa qualitativa tem caráter
exploratório e é utilizada quando se
buscam percepções e entendimentos
sobre a natureza geral de uma questão,
abrindo espaço para a interpretação
(GIL, 1999).
Para Marconi e Lakatos, a
“seleção do instrumental metodológico
está, portanto, diretamente relacionada
com o problema a ser estudado; a escolha
dependerá dos vários fatores
relacionados com a pesquisa”
(MARCONI E LAKATOS, 1992: 163).
As pesquisas que utilizam a
abordagem qualitativa possuem a
facilidade de poder descrever a
complexidade de uma determinada
hipótese ou problema, analisando a
interação de certas variáveis,
objetivando compreender e classificar
processos dinâmicos experimentados por
grupos sociais, apresentar contribuições
no processo de mudança, criação ou
formação de opiniões de determinado
grupo e permitir, em maior grau de
profundidade, a interpretação das
particularidades dos comportamentos ou
atitudes dos indivíduos diante de
situações específicas.
Dessa forma, a presente pesquisa
é qualitativa, por investigar as normas
jurídicas que o ECA e a Lei da
Aprendizagem dispõem a respeito da
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inserção do jovem no mercado de
trabalho.
7 DISCUSSÃO DOS DADOS E
RESULTADOS
Questiona-se se o contrato de
aprendizagem pode ser mantido, sendo
transformado em contrato de trabalho
por tempo indeterminado,
automaticamente, ou se é necessário
extinguir primeiro o contrato de
aprendizagem para, só então, ser
efetuada nova admissão. Em vista da
omissão legal e pelo fato do assunto
ainda não estar pacificado
jurisprudencialmente, antes que a
empresa adote o critério mais
conveniente em seu julgamento, é
recomendada uma consulta prévia ao
órgão regional do Ministério do
Trabalho e Emprego, bem como à
entidade sindical que representa a
respectiva categoria profissional.
A inserção dos adolescentes no
mercado de trabalho acarreta impactos
expressivos à vida desses indivíduos,
mas isso não altera radicalmente suas
condições de vida, nem proporciona
garantias futuras de mobilidade
socioeconômica, pois, para muitos, a
falta de oportunidades conduz ao
trabalho informal e ao abandono dos
estudos, aumentando o quadro de
desigualdades.
Ao final da aprendizagem o
certificado de qualificação profissional
será concedido pela entidade qualificada
em formação técnico-profissional
metódica àqueles aprendizes que
concluam os programas de
aprendizagem com aproveitamento,
devendo conter o título e o perfil
profissional para a ocupação em que o
aprendiz tenha sido qualificado. É
importante destacar que, para além do
caráter tecnicista inserido no modelo de
produtividade capitalista, a experiência
de aprendizagem no trabalho deve
figurar como um exercício da vida
adulta. Corona e Pontón (2001) indicam
que o exercício da cidadania deve advir
desde tenra idade. Aponta-se aqui que a
responsabilidade das atividades laborais
que envolvem o pagamento de impostos
e a imposição de limites no convívio com
os outros é importante como aprendizado
da vida adulta social.
Com relação à proteção
assegurada pelo ECA vimos que, em
verdade, o Estatuto somente
regulamentou situações que já eram
previstas pela CLT. Assim, reiteramos,
conforme dispositivos que
regulamentam o contrato de
aprendizagem, que o adolescente tem
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
direito à profissionalização e à proteção
no trabalho. Porém, para que isso seja
possível, alguns aspectos devem ser
observados: capacitação profissional
adequada ao mercado de trabalho e
respeito à condição peculiar de pessoa
humana em desenvolvimento, art. 69 do
ECA. Tais previsões ganham relevo no
ECA, que prescreve ser o direito ao
trabalho extensivo a todos os
adolescentes.
De uma forma geral, aponta-se
que o relevo ao caráter tecnicista e de
preparação para o mercado de trabalho.
Nesse sentido, podemos entender que há
uma busca de disciplina (FOUCAULT:
2010), docilização para que o sujeito seja
produtivo. Ou seja, podemos entender
que, como as normas jurídicas criam
processos de subjetivação
(FOUCAULT: 2003), tanto o ECA como
a Lei de Aprendizagem buscam produzir
subjetividades disciplinadas, aptas a
normalizar os sujeitos para produzirem.
Aqui a produção do sujeito disciplinado
se dá em diversas esferas da
micropolítica (FOUCAULT, 1979):
trabalho, escola e, de forma geral, no
mundo da cidadania (pagamento de
impostos, voto, profissionalização
técnica etc.).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa, com base no
que foi descrito, apontou a possibilidade
de desenvolver algumas potencialidades
definidas pela Lei da Aprendizagem,
especialmente a concernente à
capacitação para o exercício da vida
laboral e produtiva dos jovens.
Acredita-se que, à medida que
adolescentes, que estão em especial
processo de desenvolvimento, têm a
oportunidade de conviver com adultos de
forma mais ou menos responsável, uma
vez que ambos têm responsabilidades, a
experiência da aprendizagem pode trazer
mais oportunidades intergeracionais e,
possivelmente, uma socialização mais
intensiva no mundo do trabalho. A
experiência de aprendizagem pode se
configurar como um estímulo à escolha
de uma formação técnica.
Parece certo que, ao passo que os
adolescentes começam a se tornar
responsáveis em decorrência das
obrigações que lhes são atribuídas na
aprendizagem, eles têm maior potencial
de socialização, tendo em vista o
exercício prático da vida adulta.
A brevíssima revisão
bibliográfica mostrou que quando o
adolescente ou jovem ingressa numa
empresa na condição de aprendiz
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
desenvolverá ali atividades profissionais
e concomitantemente aprenderá a
exercer funções típicas de uma área
específica. A aprendizagem assim
contribui de maneira significativa para
que esse jovem desenvolva aptidões
concernentes à área experienciada, fato
que pode possibilitar a busca de uma
graduação em área profissional afim.
Esse fato é importante porque pode
estimular o prosseguimento na formação
profissional, mesmo que em área
distinta.
Por outro lado, embora a Lei
incentive às empresas contratarem
aprendizes, no intuito de contribuir com
a formação de jovens, muitas delas não
procuram auxiliá-los. Para agravar ainda
mais esse quadro, muitas empresas
apenas se aproveitarem da força laboral,
de mão-de-obra barata que os jovens
podem oferecer. Quando isso acontece
será impedida a aprendizagem de
alcançar o objetivo escoimado pelo
ordenamento jurídico, que é o de
proporcionar formação técnica, cidadã
profissional e crítica do jovem – se
considerarmos simultaneamente o ECA
e a Lei de Aprendizagem.
Com efeito, o mercado laboral
tem se tornado cada vez mais seletivo,
pelo qual apenas aqueles que detêm
conhecimentos específicos terão
oportunidade de se empregar. A
aprendizagem, assim, exerce papel
fundamental para que o jovem, tendo
podido explorar parte do seu potencial
profissional técnico, possa se preparar
para a inserção no mundo do trabalho. É
certo que o caráter do contrato de
aprendizagem é preponderantemente
tecnicista e disciplinador para o mundo
do trabalho. Contudo, se considerarmos
as previsões do ECA, deve-se aliar a
formação técnica uma formação crítica,
capaz de estabelecer responsabilidades
da vida adulta, ao se comprometer com o
exercício da cidadania, que em volve a
participação nas coisas públicas.
De uma forma geral, aponta-se
que o relevo ao caráter tecnicista e de
preparação para o mercado de trabalho.
Nesse sentido, podemos entender que há
uma busca de disciplina, docilização
para que o sujeito seja produtivo. Ou
seja, podemos entender que, como as
normas jurídicas criam processos de
subjetivação, tanto o ECA como a Lei de
Aprendizagem buscam produzir
subjetividades disciplinadas, aptas a
normalizar os sujeitos para produzirem.
Aqui a produção do sujeito disciplinado
se dá em diversas esferas da vida numa
dimensão micropolítica.
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A ATUAÇÃO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NO CONTEÚDO DA
NATAÇÃO ESCOLAR
Rafaela Rodrigues da Silva Graduada em Educação Física na Faculdade Integrada da Grande Fortaleza (FGF)
Thiago Medeiros da Costa Daniele Doutorando em ciências médicas-(UFC)
Leila Aparecida de Araújo
Graduada em Educação Física na Faculdade Integrada da Grande Fortaleza (FGF)
Francisco Nataniel Macedo Uchôa Professor mestre do curso de Licenciatura em Educação Física na Faculdade Integrada da Grande
Fortaleza (FGF)
Maria Tatiana de Lima Rocha Félix Professora mestre do curso de Licenciatura em Educação Física na Faculdade Integrada da Grande
Fortaleza (FGF). RESUMO: O estudo teve como objetivo averiguar se os professores de Educação Física atuam na escola com o conteúdo de natação, com o intuito de analisar as dificuldades encontradas no ambiente escolar. Foram entrevistados 15 professores do ensino fundamental I ao médio em 15 escolas na cidade de Fortaleza e na região de Maracanaú – CE. Foi aplicado um questionário com 8 perguntas objetivas. Os resultados mostraram que a maior parte dos entrevistados aplica este conteúdo, tanto com aulas práticas, quanto às aulas teóricas. Contatou-se grande interesse dos alunos e dos pais neste conteúdo. Essa abordagem está sendo crescente nas instituições de ensino, mas, ainda há uma pequena quantidade de educandários que limita o professor a levar essa prática apenas para escolinhas, por mais que se tenha estrutura adequada e que os profissionais sejam capacitados para o ensino. Palavras-chave: natação; educação; educação física escolar. ABSTRACT: The study aimed to establish whether the Physical Education teachers working in schools with swimming contents, in order to analyze the difficulties encountered at school. They interviewed 15 teachers of elementary school to the average in 15 schools in the city of Fortaleza and Maracanaú region - CE. A questionnaire with eight objective questions was applied. The results showed that most respondents apply this content, both with practical lessons, for the lectures. Contacted up great interest from students and parents this content. This approach is being increasingly in educational institutions, but there is still a small amount of educandários which limits the teacher to take this practice only for small schools, no one has adequate structure and that professionals are trained to teach. Keywords: swimming; education; school physical education.
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1 INTRODUÇÃO
A Natação é um dos esportes
mais importantes já praticados no mundo
desde o início da socialização do ser
humano e para a sua sobrevivência.
Muito importante também para o
crescimento e desenvolvimento humano,
tanto que durante os anos foi incluída
como esporte. A iniciação esportiva deve
permitir à exploração de movimento e a
aprendizagem perceptivo-motora, em
que pode ser aprimorada e ampliada as
percepções e os movimentos no
crescimento psicomotor, sendo essas as
características mais marcantes dessa
modalidade esportiva (BAGGINI,
2008).
O esporte é um instrumento
educacional de grande valor, devido suas
vivências recreativas e práticas
estimulantes, para a propiciação do
desenvolvimento físico e psicossocial
dos alunos (ALVES et al. 2007). A
natação é um esporte complexo pelas
suas exigências biomecânicas, isso pode
ser observado pelos benefícios nos
aspectos físicos, psicológicos e sociais
(LUZ et al. 2013), sendo de grande valor
no contexto escolar, cabendo ao
professor estimular essa inclusão nas
aulas, seja de teor desportivo ou
recreativo, mais trabalhando a sócio
pedagógica.
Na Educação Física escolar a
natação deve ser utilizada nas aulas
como conteúdo, segundo os Parâmetros
Curriculares Nacionais os PCNs (1998,
p. 15) há uma forte tendência de as
atividades aquáticas serem inseridas nas
escolas. No âmbito escolar, nota-se que
há novas possibilidades de
favorecimento das relações interpessoais
e consequente aumento dos laços de
socialização e ideais (ROCHA et al.
2010). Há uma semelhança entre os
autores Machado (2011), Oliveira
(2013), Morés (2011) ao descreverem a
importância da prática esportiva pra a
socialização e formação de cidadãos.
Porém pode se observar uma pouca
abordagem, sendo os fatores que causam
essa deficiência: o pouco investimento
em piscinas encontradas nas instituições
de ensino e que quando encontradas
podendo ter materiais insuficientes e de
pouca qualidade para ser utilizado, outro
fator não menos importante é o
profissional de Educação Física
qualificado para a transmissão desse
conhecimento. (GONZALEZ et al.
2010).
Outros fatores observados que
dificultam a inclusão das práticas
aquáticas são turmas numerosas, pais
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preocupados com a prática na água sem
seus filhos conterem o conhecimento ou,
muitas vezes, nunca terem tido o contato
com o meio aquático, pode fazer com
que o docente exclua o uso das
atividades seguras e lúdicas na água. A
água é utilizada como um adequado meio
lúdico para o aprendizado de destrezas
físicas e benefícios psíquicos existente
na terra, então a água faz com que a
criança aprenda brincando, de forma
lúdica e clara (OLIVEIRA et al 2013), o
contato com a água possibilita a busca
pelo novo movimento, novo jogo,
proporciona a adesão da destreza, do
prazer da diversão.
Por isso a importância desse
estudo, saber se um conteúdo rico e
completo como esse está sendo
transmitido nas escolas e se o seu ensino
está sendo proveitoso para o
desenvolvimento do aluno. O objetivo
geral desse estudo foi analisar a atuação
do professor de Educação Física na
escola quanto ao conteúdo da natação e
o objetivo específico foi averiguar o que
pode levar ao professor a não inclusão da
natação nas aulas: pais, escola ou alunos.
2 METODOLOGIA
2.1 TIPO DE ESTUDO
Este artigo caracteriza-se como
um estudo de campo, de natureza
quantitativa com corte transversal.
2.2 PERÍODO E LOCAL DA PESQUISA
Essa pesquisa ocorreu no
período dos meses de abril a junho de
2015, em escolas públicas e particulares,
nas regionais I, III, IV e V da cidade de
Fortaleza e na região de Maracanaú - CE.
2.3 POPULAÇÃO E AMOSTRA
Foram selecionados 15 escolas
que contem piscinas e feito a entrevistas
com 15 professores graduados em
Licenciatura da Educação Física, sendo
do ensino fundamental I ao ensino médio
da educação básica, com tempo mínimo
de 6 meses e de no máximo 22 anos de
graduados. Aceitando participar do
estudo ao assinar o termo de
consentimento livre e esclarecido o
questionário foi aplicado na própria
instituição escolar onde o professor
trabalha nos horários de intervalo da
escola. A pesquisa foi feita integralmente
por uma avaliadora, em tempo médio de
aplicação em 10 minutos.
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2.4 INSTRUMENTO DE PESQUISA
Foi utilizado um questionário
semiestruturado de caráter objetivo, com
8 perguntas objetivas desenvolvidas
pelos autores, relacionado com o tema do
estudo: A atuação do professor de
Educação Física no conteúdo da natação
escolar, a importância desse conteúdo no
desenvolvimento motor do aluno e as
dificuldades que o professor pode
encontrar.
2.5 ANÁLISE ESTATÍSTICA
Os dados foram tabulados no
software Microsoft Office Excel 2010.
Para a descrição dos dados foi utilizado
valor total e percentual da população.
2.6 ASPECTOS ÉTICOS
Foi solicitada a permissão para
adentrar nas escolas, logo após o parecer
positivo, foi entregue ao participante da
pesquisa um termo de consentimento
assinado pelo mesmo, firmando um
compromisso de resposta ao
pesquisador. No presente termo explica-
se o conteúdo da pesquisa, e informa ao
participante que os dados serão
utilizados apenas para fins acadêmicos
de acordo com a resolução 466/12 do
CNS.
3 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 3.1 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS
A entrevista foi realizada com 11
professores do gênero masculino e 4
professores do gênero feminino, onde 12
dos mesmos tiveram sua graduação em
instituições particulares e 3 tiveram sua
graduação em instituições públicas, das
escolas em que ocorreram as entrevistas
3 tem o ensino público e 12 tem o ensino
particular.
Quando questionados sobre a
inclusão do conteúdo da natação na
Educação Física escolar, foi obtido o
resultado mostrado na figura 1.
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Figura 1: Inclusão da natação na escola realizada pelos professores.
Fonte: Autor
De acordo com os dados
observados 7 (46%) dos professores
inclui o conteúdo da natação nas aulas de
Educação Física teórico e prático, 4
(26%) inclui o conteúdo somente prático,
2 (13%) dos professores inclui o
conteúdo teórico da natação e 2 (13%)
não incluem esse conteúdo em suas
aulas.
Quando os professores foram
perguntados sobre o interesse que os
alunos demonstram em relação a natação
nas aulas de Educação Física, foi obtido
o resultado que vemos na figura 2.
Figura 2: Interesse dos alunos nas aulas pelo conteúdo da natação.
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
50%
46% 26% 13% 13%
Teórico e prático
Teórico
Prático
Não inclui
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
50%
46% 13% 26% 13%
Todos gostam e participam
das aulas teóricas e práticas
Preferem somente aulas
teóricas
Preferem somente aulas
práticas
Não se interessão pelo
conteúdo natação
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Em relação aos resultados, 7
(46%) dos professores observam o
interesse de todos os alunos que gostam
e participam das aulas teóricas e práticas,
2 (13%) observam que os alunos acham
interessantes somente às aulas teóricas, 4
(26%) dos professores observam o
interesse dos alunos somente nas aulas
prática e 2 (13%) dos professores
verificam que os alunos não têm
interesse por esse conteúdo.
Tabela 1. Descrição dos dados avaliados com os professores de Educação Física.
Tabela 1. Descrição das variáveis analisadas com os professores de Educação Física
Variáveis analisadas Resultado N/(%)
Em qual frequência você aborda esse conteúdo?
• Por ano com aulas teóricas e/ ou práticas. 5 (33%) • Por semestre com aulas teóricas e/ ou práticas. 7 (46%) • Quando há jogos olímpicos com aulas teóricas e/ o
práticas. 1 (6%)
• Não aborda esse conteúdo. 2 (13%) Acha a natação um conteúdo importante e que pode ser inserido nas aulas?
• Muito relevante 9 (60%) • Relevante 5 (33%) • Pouco relevante 1 (6%) • Irrelevante 0 (0%)
Como você aborda esse conteúdo nas aulas?
• Aulas práticas e teóricas, para um melhor entendimento dos alunos ao esporte com estilos e regras e alguns de seus elementos
5 (33%)
• Somente aulas teóricas, informando quais são os estilos e mostrando alguns vídeos para analisarem melhor.
4 (26%)
• Aulas práticas, com alguns exercícios simples e atividades livres.
4 (26%)
• Não aborda esse conteúdo nas aulas. 2 (13%) Quanto a Instituição de ensino, como ela age com essa prática pedagógica?
• Permite que seja incluída no PPP da escola e dá suporte ao professor.
9 (60%)
• Não permite que esse conteúdo seja dado, pois acha muito perigoso.
1 (6%)
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• Não permite que seja incluído nas aulas, porém uma vez por semestre faz uma aula recreativa na piscina.
3 (20%)
• Não permite o uso da piscina, é só para a escolinha. 2 (13%) Como os pais reagem com as aulas práticas de natação?
• Gostam e estimulam os filhos para a prática, importando-se com o contato com a água e questões de sobrevivência.
8 (53%)
• Preferem que sejam somente aulas teóricas, pois se preocupam com a segurança dos filhos na água.
1 (6%)
• Não demonstram interesse pelos conteúdos ensinado. 4 (26%) • Acham desnecessário esse tipo de conteúdo em aula, pois
é mais preferível matricula-los em escolinhas para isso. 2
(13%) Você se sente apto para esse ensino?
• Sim, pois na graduação tive um ensino de qualidade necessária para transmitir a disciplina em questão.
9 (60%)
• Não, pois na graduação não tive um ensino de qualidade necessária para transmitir a disciplina em questão.
0 (0%)
• Sim, pois procuro sempre atualizar e aperfeiçoar minha didática desse conteúdo.
6 (40%)
• Não, pois não me familiarizo com esse esporte. 0 (0%)
Tabela de Avaliação descritivas dos professores (N=15)
Ao serem questionados sobre a
frequência com que o conteúdo é
trabalhado, foi visto que 5 (33%)
abordam o conteúdo por ano, 7 (46%)
dos professores abordam o conteúdo por
semestre, 1 (6%) dos professores
abordam quando há olimpíadas, 2 (13%)
dos professores não aborda esse
conteúdo nas suas aulas.
Quando indagados sobre a
relevância desse conteúdo a ser inserido
nas aulas, obteve-se o resultado de 9
(60%) dos professores consideram o
conteúdo de natação muito relevante
para as aulas de Educação Física, 5
(33%) acham esse conteúdo útil, 1 (6%)
consideram esse conteúdo pouco
relevante para as aulas de Educação
Física escolar.
Quando interrogados sobre a
abordagem dos conteúdos nas aulas, 5
(33%) dos professores aborda esse
conteúdo com aulas práticas e teóricas,
para um melhor entendimento dos alunos
ao esporte com estilos e regras e alguns
de seus elementos, 4 (26%) dos
professores só abordam aulas teóricas,
informando quais são os estilos e
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mostrando alguns vídeos para
analisarem melhor, 4 (26%) dos
professores abordam as aulas práticas,
com alguns exercícios simples e
atividades livres e 2 (13%) dos
professores não abordam esse conteúdo.
Quanto a instituição e sua ação na
aplicação da prática, foi verificado que 9
(60%) dos professores informam que a
instituição de ensino permite que seja
incluída no PPP da escola e dá suporte ao
professor, 1 (6%) que a escola não
permite que esse conteúdo seja dado,
pois acha muito perigoso. 3 (20%) dos
professores informam que as instituições
não permite que seja incluído nas aulas,
porém uma vez por semestre faz uma
aula recreativa na piscina e 2 (13%) dos
professores informam que a instituição
de ensino não permite o uso da piscina, é
só para a escolinha.
Na visão dos pais e suas
preocupações, 8 (53%) dos professores
verificam que os pais dos alunos com
relação a esse conteúdo gostam e
estimulam os filhos para a prática,
importando-se com o contato com a água
e questões de sobrevivência, 1 (6%)
verificam que os pais preferem que
sejam somente aulas teóricas, pois se
preocupam com a segurança dos filhos
na água, 4 (26%) dos professores
verificam que os pais não demonstram
interesse pelos conteúdos ensinado e 2
(13%) dos professores verificam que os
pais dos alunos acham desnecessário
esse tipo de conteúdo em aula, pois é
mais preferível matricula-los em
escolinhas para isso.
Com relação aos professores
serem aptos a ensinarem esse conteúdo,
9 (60%) dos professores entrevistados
responderam que sim, pois na graduação
tive um ensino de qualidade necessária
para transmitir a disciplina em questão e
6 (40%) dos professores acham que sim,
pois procuro sempre atualizar e
aperfeiçoar minha didática desse
conteúdo.
3. 2 DISCUSSÃO
A partir do resultado do
questionário aplicado, as
respostas afirmam que os professores
inserem o conteúdo natação nas escolas
e que são apoiados pelas instituições,
pais e alunos. Acham muito relevante
para o desenvolvimento do aluno, pois
essa atividade traz muitos benefícios,
proporcionando bem estar, tanto físico
como mental. Costumam ministrar suas
aulas a cada semestre de forma teórica e
prática, na qual essa é mais executada.
Essa pesquisa corrobora com
Luz et al. (2013) quando informa nos
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nossos achados que vem crescendo
a inserção dessas atividades no processo
educacional, através das práticas das
atividades físicas pelo meio
aquático. Esse conteúdo não só vem
ajudar no desenvolvimento psicomotor
como auxiliar o desempenho escolar, é
nesse ambiente que o aluno tem uma
maior interação e integração, e a
Educação física tem grande
responsabilidade para esse aspecto, pois
ela é voltada para a formação.
Oliveira et al (2013), fala que as
atividades psicomotoras na água para
crianças constitui um dos principais
objetivos para que consiga um
desenvolvimento em busca da saúde e
equilíbrio, concordando assim com Luz
(2013), e colocam que atividades
lúdicas trazem prazer, e fazem com os
alunos tenham mais vontade de
participarem das aulas e que continue
praticando.
Fazendo parte do planejamento
escolar quanto conteúdo como vemos
nos Parâmetros Curriculares Nacionais
os PCNs, pode ser inserida nas
instituições com uma frequência
adequada, onde o aluno possa ter o
conhecimento contínuo, da mesma
forma que ele vê com frequência outros
esportes, como o futsal, podendo ser
acompanhada pelas práticas aquáticas,
semestralmente ou anualmente e não
somente quando houver eventos como
jogos olímpicos que ocorre em um longo
espaço de tempo. Os professores
entrevistados confirmam essa frequência
quando afirma ministrar suas aulas de
natação semestral ou anual, incluindo
aulas teóricas e práticas, o que podemos
constatar que esse assunto não é
desprezado.
Em relação à procura dos pais
para esse esporte, Oliveira (2013), diz
que eles acham que há um
desenvolvimento físico, psicológico nas
crianças, com a prática do mesmo, além
de ajuda-las na socialização
infantil. Baggini (2008) também
concorda que na questão dos pais
procurarem a natação para seus filhos,
pois ele também diz que é pelo
desenvolvimento da criança e ainda
acrescenta outros motivos pela procura,
como: a qualidade de vida; segurança
contra afogamentos e prevenção e a
melhoria de doenças respiratórias.
Já com a questão da abordagem
do professor com esse conteúdo, mas
precisamente nas aulas
práticas, Morés (2010), acha necessário
que os docentes construam um processo
pedagógico diferenciado para cada
aluno, dando importância às atividades
lúdicas e recreativas, despertando o
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interesse natural dos alunos em aprender
determinado conteúdo sem a pressão do
fazer corretamente. Almeida (2010)
discorda de Morés (2011) que aborda
que se deva trabalhar exclusivamente
com a individualização do aluno, para
ele o trabalho em grupo garante a
diferenciação do ensino/adequação do
nível de dificuldade dos exercícios de
cada um. Por outro lado ele concorda
com Morés (2011), quando fala que a
prática dessa modalidade deva ser lúdica,
recreativa, diferenciada e de forma
agradável, para que assim possa
incentivar e estimular os alunos, fazendo
com criem gosto pelo esporte.
Valadão et al. (2015) afirma
que “O lúdico na relação pedagógica em
meio líquido alcança uma dimensão
humana que vai além do simples
entretenimento ou como recompensa por
cumprimento de tarefas durante as aulas
de natação, ele possibilita desvelar
emoções e sensações, assim como
aspectos relacionados à afetividade.
As aulas de natação motivam a
relação pedagógica, subentendendo-se
que nessa relação existe um adulto que
pode se permitir brincar com o aluno por
meio da fantasia, da música, das histórias
contadas, das dramatizações e dos jogos
cooperativos, como
corrobora Valadão et al. (2015). Com
isso, cabe ao professor o processo de
crescimento formativo, de capacitação,
podendo sempre aperfeiçoar-se para que
o ensino seja de qualidade o que
acontece pouco se compararmos a
pesquisa, onde só uma pequena parte
(40%) tem se preocupado em estar
sempre fazendo cursos e se capacitando
para melhorar suas aulas. Infelizmente,
60% dos professores acham que por
serem graduados não existe a
necessidade de procurar um modo de
aperfeiçoamento, pois já sabem de tudo.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com os resultados obtidos, foi
observado, como objetivo geral que a
maioria dos professores atua com o
conteúdo da natação em suas aulas, no
mínimo uma vez ao ano, por considerar
esse conteúdo muito relevante para o
desenvolvimento dos alunos. Sendo
conscientes da relevância que esse
esporte tem como conteúdo escolar.
Mais infelizmente a minoria dos
docentes pesquisados procura
aperfeiçoar-se para melhor transmissão
dessa atividade, o que pode gerar
preocupação, pois percebe se que alguns
fatores, como aulas repetitivas e a falta
de qualificação dos mesmos, podem
causar entre os discentes um desinteresse
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pela prática da aula relacionado a esse
esporte, por se tornar sistemático e
monótono.
Já em relação aos objetivos
específicos, constatou-se que os
educandos quanto ao conteúdo prático,
sentem-se interessados em participar das
aulas, não havendo problemas em
habituar-se ao meio aquático, sendo
observado que, só não há interesse dos
alunos nessa prática quando o conteúdo
é somente teórico, podendo ser pela falta
de contato. Em relação aos pais, poucos
são os que não se preocupam com os
conteúdos ensinados nas aulas, tendo
relevância para o ensino a maioria que
estimula e aprova a inclusão da natação
na Educação Física escola.
Dificuldades foram encontradas
em algumas escolas na inclusão dessa
atividade, preferindo abranger a natação
somente como desporto, mas sabemos
que sem a vivência não temos o
conhecimento, então não podemos forçar
as crianças e os jovens a criar um
interesse pela mesma sem que tenha
havido um contato anterior. Porém na
maior parte das escolas em que foi
realizada as entrevistas, de acordo com
os professores, é crescente e oferecida o
desporto natação como conteúdo escolar,
permitindo aos educadores que levem
esse contexto as aulas proporcionando
todos os benefícios indicado nessa
pesquisa.
Por fim, os objetivos propostos
foram conferidos, então que possamos
buscar melhores medidas e soluções a
fim de fazer com que esse assunto seja
incluído ao máximo no ambiente escolar
é o princípio para acabar com a
deficiência desse conteúdo.
5 REFERENCIAL BIBLIOGRÁ-
FICO
ALMEIDA, T,A,F. O ensino da natação no contexto da disciplina de educação física. Acqua – revista portuguesa de natação, Nº3, Dez. de 2010. ALVES, M; JUNGER, W; PALMA, A; MONTEIRO, W; RESENDE, H. Motivos que justificam a adesão de adolescentes à prática da natação: qual o espaço ocupado pela saúde? Revista Brasileira de Medicina do Esporte, Vol. 13, Nº 6. Rio de Janeiro, 2007. BAGGINI, F.C. S. Caracterização do processo ensino/aprendizagem da natação para diferentes faixas etárias. Monografia apresentada Universidade Estadual Paulista, campos de Bauru, como requisito parcial para obtenção do título de licenciado em educação física. Bauru, 2008. GONZALEZ, D. H.; MATHEUS, S. C.; LIMA JUNIOR, M. R.; MORAES, E. Z. C. Natação e Educação Física escolar: perfil de aptidão física relacionado ao desempenho motor e a saúde de escolares nadadores. Efdesportes.com
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IDENTIDADES DE GÊNERO E CONSUMO DE AUTOMÓVEL EM
FORTALEZA-CE
Francisco Tarcísio Cavalcante Segundo
Mestre em Ciências Sociais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ e professor do curso de Administração da Faculdade Integrada da Gramde Fortaleza
RESUMO: O presente artigo apresenta os resultados de um estudo sobre o consumo de automóveis entre homens e mulheres na cidade de Fortaleza. Seu principal objetivo consiste em discutir questões referentes às identidades e aos papeis de gênero no momento atual, através do consumo de automóveis, um dos bens mais simbólicos e presentes na vida dos indivíduos na contemporaneidade (LUDD, 2004). Como metodologia, realizamos uma abordagem de base qualitativa. O procedimento de coleta de dados foi realizado através de entrevistas com vendedores de algumas revendedoras de automóveis na capital cearense, no período de março a abril de 2015. O procedimento de análise de dados utilizou como suporte teórico a análise e a discussão das teorias feministas, da publicidade, e a transferência de significados simbólicos existentes na nossa cultura para os bens de consumo. Como a pesquisa constatou, os homens, ao buscarem no carro o signo de conquistador, viril e aventureiro, através do consumo de carros cada vez mais potentes, radicais e robustos, demonstraram grande preocupação em atender às demandas sociais do modelo hegemônico de masculinidade. As mulheres, ao comprarem carros que possuem grandes porta-malas para as compras do supermercado ou vidros-fumê e alarmes para garantir uma maior segurança sua e de seus filhos (quando as tinham), ainda retrataram o foco em seus papeis femininos tradicionais, relacionados sobretudo ao discurso da maternidade e ao lar. As representações da virilidade e da maternidade correspondem aos padrões discursivos da cultura patriarcal e suas concepções hegemônicas das identidades masculinas e femininas. Convém esclarecer ainda que ambos são muito influenciados pela imposição da sociedade e da publicidade nesse sentido. Palavras-Chave: Identidades de gênero. Consumo de automóvel. Publicidade. ABSTRACT: This article presents the results of a study on the consumption of cars between men and women in the city of Fortaleza-Brazil. Its main purpose is to discuss issues related to gender identity and roles over these days, through the automobile consumption, one of the most symbolic and present goods in people’s life nowadays (LUDD, 2004).We conducted a qualitative basic approach as methodology. The datum collection procedure was performed through interviews with salesman of some car dealerships in Fortaleza, from March to April 2015. The datum analysis procedure used as a theoretical support the analysis and discussion of feminist theories, advertising campaigns, and the transfer of existing symbolic meanings in our culture to consumable goods. As the survey found, mentend to use cars as a symbol of power and virility, always looking for a more powerful vehicle and showing a great concern to attend social demands of the hegemonic model of masculinity. Women, by buying cars that have large trunk for market groceries or tinted windows and alarms to provide safetytothem and their children (when that’s the case),still portray their focus on traditional female roles, related especially to the motherhood and housewife duties. The representations of virility and maternity correspond to discursive patterns of patriarchal culture and its hegemonic conceptions of male and female identities. It should be clear that both are very influenced by the imposition of society and advertising accordingly. Key words: Gender identity. Consumption of cars. Advertising campaigns.
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1 INTRODUÇÃO
A temática referente ao estudo de
gênero é algo recente no campo das
Ciências Sociais. A antropologia foi a
ciência que primeiro estudou tal
temática. Aliás, a antropologia foi a
pioneira no estudo das 'minorias'
existentes na sociedade, sempre
marginalizada pelos estudiosos.
Em nossa cultura, podemos
facilmente constatar a existência de dois
mundos distintos: o mundo masculino e
o mundo feminino. Há uma educação
diferenciada para homens e mulheres
que se inicia desde a tenra idade no seio
familiar, contemplando desde aspectos
como a divisão das cores no vestuário até
atitudes como a proibição e a punição de
comportamentos tidos como não
condizentes com cada um dos sexos.
Essa sociedade de caráter puramente
desigual, que delimitou os espaços
masculinos e femininos, sendo o espaço
masculino o espaço público por
excelência e o feminino o espaço
privado, é a mesma sociedade que instiga
o consumo para ambos os sexos de forma
excessiva. Portanto, podemos dizer que
vivemos numa cultura onde existe, além
de uma distinção significativa de gênero,
uma educação voltada para o consumo
como sinônimo de felicidade, como
podemos observar constantemente nas
propagandas expostas na televisão e em
outros meios de comunicação de massa.
O ser humano atualmente,
independentemente do sexo, recebe
influências de várias instâncias para
consumir muito além do necessário para
a sua sobrevivência. Para manter essa
voracidade pelo consumo nos
indivíduos, a publicidade se encarrega de
dotar os bens de consumo de uma
simbologia, através de suas propagandas
cada vez mais apelativas, produzindo e
reproduzindo discursos que também
ressaltam alguns bens de consumo como
mais apropriados para ser consumido por
homens e outros como mais apropriados
para mulheres. Nos dias atuais, a
publicidade exerce a função de
socialização que anteriormente somente
pertencia aos grupos primários. É esse
surgimento da publicidade que explica
também, em larga medida, no caso do
consumo moderno, o fato de o próprio
desejo passar a ser socialmente educado
por instituições extra-familiares.
A respeito do significado
simbólico do automóvel, que vai além de
seu valor de uso, McCracken (2003)
ressalta que tal significado possui uma
trajetória tradicional que garante o
sucesso de seu movimento. Assim é que
o autor (2003, p.99-100) nos esclarece
que:
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Usualmente ela parte de um mundo culturalmente constituído e se transfere para o bem de consumo. Em seguida, este significado se afasta do objeto e se transfere para o consumidor individual. Em outras palavras, há três localizações para o significado: o mundo culturalmente constituído, o bem de consumo e aquele consumidor individual, bem como dois momentos de transferência: mundo-para-bem e bem- para-indivíduo.
Noutros termos, podemos
resumir o movimento do simbolismo que
sabemos existir em um bem como o
automóvel da seguinte maneira: temos
um mundo cultural, que, em nosso caso,
está assentado em valores capitalistas e
em nítida diferenciação e desigualdade
de gênero. A partir daí a publicidade,
sabedora plena destes valores, as
transferem para os bens de consumo, no
nosso caso o veículo automotivo. Após
esse processo concluído, os próprios
seres humanos transferem tais valores
para eles próprios.
Como o automóvel é um dos bens
mais consumidos e importantes na vida
diária dos indivíduos (LUDD, 2004),
resolvemos investigar como se
configuram às distinções de gênero no
consumo de automóveis na cidade de
Fortaleza-CE no momento atual,
buscando objetivamente discutir
questões referentes às configurações dos
papeis e das identidades de gênero na
cidade de Fortaleza através do consumo
de automóveis. Para coletarmos os dados
empíricos deste trabalho, utilizamos a
metodologia qualitativa, realizando
entrevistas com questões abertas com
vendedores em algumas revendedoras da
cidade. Juntamente a isto, fazemos uso
de pesquisas bibliográficas, através de
leituras condizentes com o tema
estudado por autores nacionais e
estrangeiros.
Devemos ressaltar que os relatos
aqui apresentados junto aos vendedores
acerca do consumo de homens e
mulheres, não pretendem representar
todo o universo feminino e masculino da
cidade de Fortaleza. Nossa maior
contribuição aqui é apresentar um olhar
privilegiado acerca das desigualdades e
diferenças de gênero, mais
especificamente a partir do consumo de
um bem extremamente simbólico: o
automóvel.
Na primeira seção deste artigo
optamos por fazer uma revisão das
questões de gênero, com uma análise de
como o termo surgiu no meio acadêmico,
seu conceito, e identificando as
diferenças e desigualdades de gênero
existentes em nossa cultura; Na segunda,
analisamos a temática do consumo.
Trabalhamos aqui o conceito de
consumo conforme vários autores.
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Revista Perspectiva Jurídica 2016.2 – ISSN 2238-524X
Fazemos uma contextualização histórica
desde os primórdios do sistema
capitalista até sua atual roupagem,
configurando a sociedade de consumo
vivida por nós hoje em dia, refletindo
sobre seus valores consumistas,
hedonistas e segregadores responsáveis
por constituir nossa cultura
contemporânea. Por último,
investigamos o caráter simbólico do
automóvel, este bem de consumo que
adquiriu nos últimos anos o simbolismo
a que nos referimos, e que muitas vezes
supera seu valor de uso.
Na terceira seção analisamos a
instituição publicidade. Nesta,
procuramos enfatizar seu papel como um
importante instrumento de transferência
de significados simbólicos existentes na
nossa cultura para os bens de consumo.
Mostramos que as mensagens contidas
nas propagandas de automóveis são
repletas de simbologia e de valores
atrelados à diferença dos gêneros e que,
por esta razão, acabam influenciando
homens e mulheres a consumirem carros
que avaliam serem mais condizentes
com os seus papeis sociais e com suas
respectivas identidades de gênero; Na
quarta e última seção demonstramos na
prática (através dos dados de nossa
entrevista), dialogando com conceitos
desenvolvidos em nossa fundamentação
teórica, como se configuram os papeis e
identidades de gênero no momento atual
através do consumo de automóveis em
Fortaleza-CE.
2 REVENDO AS QUESTÕES DE
GÊNERO: CONCEITO,
DIFERENÇAS E DESIGUALDADES
A problemática gênero trata-se de
assunto recente entre cientistas sociais e
outros estudiosos das ciências humanas
em geral. Entre o sexo feminino, depois
de muito tempo de submissão e de
injustiças sociais é que as mulheres
resolvem se unirem coletivamente para
repensarem suas condições e, a partir daí,
começarem a moverem-se.
Consoante Louro (1999), o conceito
de gênero que se pretende ressaltar não
pode de maneira alguma está dissociado
do feminismo, pois que tal conceito está
diretamente ligado às conquistas
feministas contemporâneas.
Segundo a autora citada acima, é na
chamada 'segunda onda' do movimento
feminista que as mulheres focarão sua
atenção para as construções de âmbito
teórico. Do debate que se trava entre
estudiosas e militantes, de um lado, e
seus críticos (as) de outro, é que será
engendrado e problematizado o conceito
de gênero. A intenção que se tem logo
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entre as feministas anglo-saxãs é dirigir
o foco para o caráter social da questão,
desviando, assim, determinismos
biológicos e possibilitando que o
conceito de gênero sirva não só para
análises puramente teóricas mas
também, e principalmente, como uma
poderosa ferramenta política, segundo
Louro (1999).
Quando as estudiosas feministas
decidem enfatizar o caráter social da
problemática em questão, não é que seja
eliminada a parte biológica, mas sim
valorizada de forma intencional e
deliberada a construção social e histórica
produzida sobre as características
biológicas, consoante Louro (1999, p.
23). A autora afirma que:
Na medida em que o conceito afirma o caráter social do feminismo e do masculino, obriga aquelas (es) que o empregam a levar em consideração as distintas sociedades e os distintos momentos históricos de que estão tratando. Afasta-se (ou se tem a intenção de afastar) proposições essencialistas sobre os gêneros; a ótica está dirigida para um processo, para uma construção, e não para algo que exista a priori.
No Brasil, foi no final dos anos
80 que as feministas passaram a utilizar
o termo gênero, para Louro (1999). Tal
termo é mais um atributo a ser
identificado nos sujeitos, por exemplo: o
sujeito é negro, brasileiro e homem, ou
ainda: a pessoa é branca, brasileira e
mulher.
O caráter social em questão, que
se opõe ao caráter natural, deve
permanecer em nossos 'olhares'
especialmente sobre as práticas
cotidianas em que se envolvem os
sujeitos. Afinal, conforme a autora
citada, são essas práticas rotineiras e
comuns, juntamente com os gestos e as
palavras banalizados, que precisam se
tornar alvo de atenção, de
questionamento e, principalmente, de
desconfiança. Aliás a ingente tarefa seja
talvez exatamente essa: a de desconfiar
do que é tomado como natural. Como
exemplo do que acabamos de comentar,
poderíamos indagar se, por exemplo, no
caso de uma escola, as professoras das
séries iniciais dos estabelecimentos de
ensino precisariam aceitar que os
meninos são naturalmente mais agitados
do que as meninas. Para pessoas do senso
comum, isto poderia representar uma
tarefa muito simples, mas isto pode gerar
dúvidas na mente daquelas professoras.
A linguagem que faz parte do
nosso cotidiano e que atravessa a maioria
de nossas práticas, caracteriza-se como
uma das formas de desigualdades
existentes que por muitas vezes nos
parece natural. A este respeito,
retornamos à autora (1999, p. 61) que é
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categórica ao comentar sobre a
linguagem:
Mas a linguagem institui e demarca os lugares dos gêneros não apenas pelo ocultamento do feminino, e sim, também pelas diferenciadas adjetivações que são atribuídas aos sujeitos, pelo uso (ou não) do diminutivo, pela escolha dos verbos, pelas associações e pelas analogias feitas entre determinadas qualidades, atributos ou comportamentos e os gêneros (do mesmo modo como utiliza esses mecanismos em relação às raças, etnias, classes, sexualidades etc).
Para Santos (2002), foi da busca
incessante por explicações a várias
questões como, por exemplo, a partir do
limitado conceito de patriarcado, que não
dá conta da imensa diversidade cultural e
que exclui outras formas de relação que
não sejam pautadas na dominação
masculina, que fizeram com que as
feministas fizessem novas inferências
acerca da realidade. Tais inferências
trouxeram como resultado a construção
de um conceito central, a saber, o
conceito de gênero. Inúmeras foram as
contribuições que a utilização do termo
gênero trouxe para o campo das Ciências
Sociais, termo este que não se encontra
de forma alguma fechado. Trata-se
realmente de uma grande aquisição para
o conhecimento, segundo Santos (2002).
A autora (2002) supracitada traz uma
conceituação de gênero toda especial.
Para ela, o conceito de gênero envolve,
pelo menos, duas dimensões: o
comportamento diferenciado masculino
e feminino observado nas sociedades, e a
distribuição desigual de poder entre os
sexos. A primeira, conforme a autora,
focaliza gênero como produto social,
aprendido, representado,
institucionalizado e transmitido ao longo
das gerações. A segunda coloca em
evidência a posição subalterna das
mulheres na organização social, a partir
da desigualdade de poder nas relações de
gênero.
A televisão, as revistas em
quadrinhos, através de seu conteúdo
aparentemente inocente, a publicidade e
os meios de comunicação de um modo
geral têm frequentemente sido objetos de
investigação por parte de estudiosos que
neles examinam as representações dos
gêneros. Muitas dessas análises têm
apontado para a concepção de dois
universos distintos: um mundo público
masculino e um mundo doméstico
feminino, ou ainda para a indicação de
atividades características de homens e
atividades características de mulheres.
O que comentamos aqui, acerca
da hegemonia masculina ao representar a
norma em relação à mulher, pode ser
aplicado de igual modo em relação aos
próprios homens. Louro (1999, p.48)
ressalta que "aqueles homens que se
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afastam da forma de masculinidade
hegemônica são considerados diferentes,
são representados como o outro e,
usualmente, experimentam práticas de
discriminação ou subordinação".
O que ocorre é que os discursos
ou narrativas convencionais adotam uma
das formas de masculinidade, dentre as
várias outras possíveis, para definir a
masculinidade em geral. A partir daí,
este tipo de masculinidade é transmitido
para os indivíduos do sexo masculino
desde a sua tenra idade. Não precisa
muito esforço para identificarmos que
este tipo de identidade masculina
dominante define comumente o ser
homem como um ser viril, poderoso,
forte e que não pode chorar. Aliás, quem
nunca ouviu a famosa expressão de que
homem que é homem não chora?
Vesentini (1996) nos diz que, de fato, as
diferenças entre homens e mulheres se
baseiam especialmente no campo social,
afinal é na própria sociedade que se
observa a diferença baseada em uma
subordinação feminina. Estas diferenças
em que as mulheres são comumente
discriminadas se configuram em três
dimensões: econômica, política e
simbólica.
Conforme o autor (1996, p.221):
Basta olharmos em torno e constatarmos que em nossa sociedade as mulheres não têm acesso às mesmas profissões que os
homens ou não progridem tanto quanto eles na mesma profissão. No plano político, as mulheres, que formam um pouco mais da metade da nação, possuem menos de 10% dos representantes na assembleia nacional. Enfim, no plano simbólico, cada dia os meios de comunicação de massa nos mostram imagens contrastadas do homem e da mulher, do homem-sujeito e da mulher-objeto.
Embora o trabalho feminino não
cesse de aumentar a cada ano, tal
trabalho ainda está distante de se igualar
ao masculino principalmente com
relação aos rendimentos. Se um homem
ou se uma mulher exercem a mesma
profissão, as mulheres costumam receber
salários de 40% a 60% mais baixos do
que os homens. Isto decorre
principalmente de uma visão
estereotipada do homem e da mulher que
coloca esta última como inferior ao
homem, segundo afirma o autor citado.
A força destes estereótipos fazem-se
presente na própria forma como as
mulheres são educadas pela família, que
é bem distinta da dos homens, conforme
Vesentini (1996). Quando o autor (1996)
argumenta acerca da educação recebida
pelas mulheres, ele ressalta que tal
educação ensina-as a terem uma
'natureza feminina', isto é, a serem
dóceis, submissas, conformistas e a
desenvolverem um raciocínio mais
intuitivo do que lógico. Quanto à
educação masculina, o que normalmente
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são transmitidos para os homens são
ideias relacionadas a atitudes de não
levar desaforos para a casa, de ser
agressivo, forte e dominador.
Características estas relacionadas ao
modelo hegemônico de homem, como já
fora ressaltado anteriormente.
2. O CONSUMO NA SOCIEDADE
ATUAL
2.1. Conceito de consumo
Holanda (1999), em seu
dicionário, nos traz dois conceitos de
consumo. Num primeiro momento, o
autor mencionado acima destaca o
consumo como o ato ou efeito de
consumir; um gasto. Num segundo
momento, ressalta que é a utilização de
mercadorias e serviços para satisfação
das necessidades humanas. O que nos
causou uma grande curiosidade foi o fato
de no mesmo dicionário acima citado,
existir uma diferença conceitual entre
consumo e consumismo. Quando o autor
se refere a consumo, como vimos, não
fala nada além do ato de consumir ou se
satisfazer consumindo mercadorias ou
produtos de acordo com suas
necessidades. Todavia, o termo
consumismo possui uma outra
significação, pois está relacionado ao
sistema que favorece o consumo
exagerado. Assim, para Holanda (1999),
uma pessoa favorável ao consumismo é
aquela que tende a comprar qualquer
coisa de forma exagerada, isto é, para
muito além de suas necessidades.
Baudrillard (2006) ressalta que
só faz sentido conceber o consumo como
uma modalidade característica de nossa
sociedade ou civilização industrial com a
condição de o livrar da acepção que
frequentemente tem sido usada: a de um
processo de satisfação das necessidades.
Tal crítica a esta forma de conceber o
termo é uma das principais análises que
guia o pensamento do sociólogo francês
acerca do tema. Segundo o mesmo, no
consumo não são as coisas ou qualquer
outro produto material que são objetos de
consumo, isto é ilusão, pois estes são
apenas objetos da necessidade e da
satisfação. A relação que existe entre os
indivíduos e os objetos de um modo
geral não costuma ser de ordem concreta,
como a de alguém que, por exemplo,
compra um tênis que contém um
amortecedor com uma função essencial
para a prática de alguma atividade física
mais forçada ou como a de um músico
que adquire um metrônomo para permitir
a este indicar com exatidão os
andamentos das peças musicais.
Ademais, mesmo que se quisesse obter
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mais de um tênis com tais ou mais
funções não se poderia afirmar que o que
houve neste caso foi uma prática de
consumo. Não é simplesmente assim que
se define o consumo. A este respeito
Baudrillard (2006, p. 206) é
contundente: “Nem o volume dos bens
nem a satisfação das necessidades são
suficientes para definir o conceito de
consumo: constituem somente uma sua
condição prévia”.
Notamos que aqui o termo
consumo é visto de forma mais profunda,
subjetiva e, portanto, distinta da forma
como está em alguns dicionários que
elucidam o termo. Devido, em boa
medida, a incessante multiplicação dos
objetos, bem como de seu consumo por
parte dos indivíduos em nossa sociedade
contemporânea, é que podemos
compreender que aquilo que se constitui
como vital em um objeto deixa de ser
protagonista. Daí é que não seja estranho
o fato de o consumo não poder ser
definido como uma prática material.
Nem mesmo pode ser definido pelo
alimento que se digere, pelo vestuário
que se veste e pelo carro que se dirige,
mas sim pela organização de tudo isto
em substância significante. Ainda,
podemos afirmar que o consumo, pelo
fato de possuir um sentido, pode ser
definido de forma sucinta como uma
atividade de manipulação sistemática de
signos (BAUDRILLARD, 2006).
2.2. Dos primórdios do capitalismo à
sociedade de consumo
De acordo com Severiano (2001),
como nos primórdios do capitalismo a
produção ocorria de forma massiva,
precisava haver um grande contingente
de pessoas dispostas a consumir, sob o
risco de um colapso geral do sistema. Por
isso, a produção voltada para o consumo
objetivava atender não as necessidades
dos indivíduos mas sim resolver uma
crise de superprodução. Portanto, foi
necessário buscar estratégias a fim de
que gerassem nas massas um novo
sistema de necessidades que as fizessem
consumir para além de suas
necessidades. Para a efetivação destes
objetivos citados, a criação da
publicidade foi crucial. Esta (a
publicidade) passa a ter a função de
socialização que anteriormente somente
pertencia aos grupos primários. É esse
surgimento da publicidade que explica
em larga medida, no caso do consumo
moderno, o fato de o próprio desejo
passar a ser socialmente educado por
instituições extra-familiares. Era
necessário, pois, que novos valores
fossem cultivados no espírito dos
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indivíduos de uma forma geral, valores
estes que fossem capazes de abrigar uma
ideologia de consumo de massa,
marcados pela supervalorização da
estética ao invés da funcionalidade do
objeto, pela dependência aos ditames da
moda e, de um modo geral, por um
consumo acrítico. Valores estes que
cabiam à publicidade promover.
Severiano (2001, p.69) afirma de
uma vez por todas as características do
novo ethos presente na sociedade
capitalista de consumo:
O que se observa é, portanto, o surgimento de um novo ethos, não mais orientado pela moral puritana e racional do “capitalismo de mercado”, mas baseado num modelo hedonista e lúdico, próprio de uma “ética do consumo”, cujos valores fundamentam-se na “auto realização” e na “felicidade”, buscadas no próprio ato de consumir.
Com todo o aparato publicitário
ao seu lado, juntamente com a inovação
incessante de mercadorias que
rapidamente se tornam obsoletas, a
sociedade contemporânea fez com que
todos os bens comercializados
ganhassem um significado simbólico.
Daí ter se tornado comum as pessoas
ficarem fascinadas pela estética do
produto e pelo poder subjetivo que existe
dentro de uma dada mercadoria. Assim,
os indivíduos passaram a, por exemplo,
comprar um determinado automóvel
mais interessados no símbolo de status
ou de qualquer outra adjetivação que o
veículo possa proporcionar do que na
importância do mesmo enquanto um
transporte de locomoção.
Agindo pela égide do consumo
contemporâneo, podemos perceber que o
que os indivíduos mais buscam nos bens
ou nas mercadorias é a aquisição de uma
identidade, uma personalidade, e isso é o
que consideramos como uma das
características mais relevantes da
sociedade de consumo.
No que diz respeito ao
automóvel, bem de consumo
privilegiado em nossa pesquisa, Ludd
(2004, p.45) ressalta a importância do
mesmo na vida de homens e mulheres
em nossos dias quando diz que:
O americano médio consagra mais de 1600 horas por ano ao seu automóvel: sentado dentro dele, andando ou parado, trabalhando para pagá-lo e para pagar gasolina, os pneus, os pedágios, o seguro, as multas e os impostos para estradas federais e para os estacionamentos públicos.
Além desta presença constante
do carro em nosso cotidiano, as
propagandas expostas na televisão e em
outros meios de comunicação
contribuem para o enaltecimento do
mesmo. Mensagens generalistas são
comuns, e se tomarmos como exemplo o
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comercial de uma determinada rede de
posto de combustível no qual afirma que
todo brasileiro é apaixonado por carro,
podemos ter uma noção palpável do que
fora dito. A respeito do significado
simbólico do automóvel que vai além de
seu valor simplesmente utilitário,
McCracken (2003) relata que tal
significado possui uma trajetória
tradicional que garante o sucesso do seu
movimento. Assim é que tal autor (2003,
p.99-100) nos esclarece que:
Usualmente ela parte de um mundo culturalmente constituído e se transfere para o bem de consumo. Em seguida, este significado se afasta do objeto e se transfere para o consumidor individual. Em outras palavras, há três localizações para o significado: o mundo culturalmente constituído, o bem de consumo e aquele consumidor individual, bem como dois momentos de transferência: mundo-para-bem e bem- para-indivíduo.
Noutros termos, podemos
resumir o movimento do simbolismo que
sabemos existir em um bem como o
automóvel da seguinte maneira: Temos
um mundo cultural, que, em nosso caso,
está assentado em valores capitalistas e
em nítida diferenciação e desigualdade
de gênero. A partir daí a publicidade,
sabedora plena destes valores, as
transferem para os bens de consumo, no
nosso caso o veículo automotivo. Após
esse processo concluído os próprios
seres humanos transferem tais valores
para eles próprios.
3. A PUBLICIDADE:
IMPORTANTE FATOR NA
ESCOLHA DO AUTOMÓVEL
Como já ressaltamos
anteriormente, a publicidade
desempenha um papel fundamental na
transferência do significado simbólico
do mundo cultural para o bem de
consumo, tanto para homens como para
mulheres. Seja em anúncios,
propagandas ou por outros meios, a
publicidade constantemente anuncia um
determinado bem de consumo
caracterizado dentro dos valores
existentes na coletividade.
Na transferência de significados,
ela utiliza-se de vários mecanismos.
Assim é que imagens visuais, fotografias
e materiais verbais assumem uma
relação muito particular e mesmo
imprescindível neste processo de
transferência. Os diretores de marketing
não são ingênuos, tem objetivos nas suas
ações e por conta disso fazem uso das
falas, das imagens e das fotos a fim de
conduzir o leitor ou o expectador às
propriedades simbólicas que se tem a
intenção de transferir, em conformidade
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com o pensamento de McCracken
(2003).
Devido à nossa condição de país
subdesenvolvido e capitalista, não
precisa muito esforço para entendermos
que os modelos masculinos e femininos
que estão contidos nas propagandas são
segregados e distintos. Aliás, tal
segregação e distinção pode ocorrer em
todo o mundo, até mesmo em nações
desenvolvidas, com diferenças apenas
quanto à intensidade. Um texto que
Baudrillard (1995, p. 87) extraiu do
jornal francês Le Monde é um forte
exemplo de como os publicitários podem
engendrar homens e mulheres como
seres que possuem objetivos distintos
quando da aquisição de um veiculo
particular:
Não há mulher, por mais exigente que seja, que não consiga satisfazer os gostos e os desejos da própria personalidade com um Mercedes Benz! Desde a cor do couro ao guarnecimento e a cor da carroceria até aos tampões das rodas e às inúmeras comodidades que os equipamentos estandardizados ou preferenciais oferecem. Quanto ao homem, embora se preocupe sobretudo com as qualidades técnicas e com os resultados do carro, prestará de boa vontade atenção aos desejos da mulher, porque também é motivo de satisfação ver-se felicitado pelo bom gosto.
A publicidade, como podemos
observar, divulga com muita
frequência modelos de masculinidade e
de feminilidade que estão inseridos não
somente nos automóveis mas também
em outras mercadorias. Em outras
palavras, a publicidade reforça os
valores de nossa cultura e as transferem
para variados bens de consumo, na
maioria das vezes dirigindo alguns
deles com maior intensidade para ser
consumido pelo público masculino e
outros para serem consumidos pelo
público feminino. Isso que foi exposto
pode ser também identificado pelo
apelo, por parte da mídia, para cada um
dos sexos. As mensagens publicitárias
dirigidas ao público feminino remetem-
se a um padrão de mulher que é
responsável não só pelo consumo de
produtos tidos como femininos, como
artigos de moda (roupas, sapatos,
maquilagens, perfumarias etc.), mas
também como um ser humano que é
responsável pelo consumo da família:
alimentos, produtos de higiene e de
limpeza, brinquedos e doces para as
crianças e roupas para seus maridos.
Ainda em relação às mulheres, o apelo
da publicidade, através de suas
propagandas, elabora, além deste tipo
de mulher como protetora da família,
também uma visão de mulher que
precisa ser bela, jovem e atraente para
se obter sucesso ou felicidade na vida,
consoante Carvalho (1998). A
publicidade dirigida para o público
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masculino costuma ser menos exigente
e mais prática. As mensagens lançadas
pela publicidade para tal público o
convidam à virilidade, à praticidade e
ao mundo externo, mundo onde
tradicionalmente o homem reina. É por
isso que o automóvel, por ter uma
predominância nas ruas, avenidas e,
portanto, por predominar para além da
domesticidade, é sempre ou quase
sempre explorado pela publicidade
como um bem atrelado ao homem,
especialmente os mais robustos.
Portanto, por conta de todas essas
pressões, mesmo que muitas vezes de
forma sutil, é que a publicidade acaba
por direcionar e/ou influenciar homens e
mulheres na escolha do automóvel que
representa suas respectivas identidades
sociais forjadas pela própria publicidade
e pela sociedade convencional de um
modo geral.
4. O CAMPO EM ALGUMAS
REVENDORAS DE AUTOMÓVEL
DA CIDADE
Passaremos agora para a parte da
análise das entrevistas, onde, nessa
ocasião, teremos a oportunidade de
analisá-las, a partir de dados coletados
junto aos nossos informantes.
Revendedores foram por nós
abordados através de entrevistas dotadas
de questões abertas que nos dirigimos a
eles (as). Vale salientar também que
ocultamos os nomes de nossos
informantes por questões éticas, pois
assim mantemos preservados os nomes
destas pessoas. Ao invés de divulgarmos
os nomes dos entrevistados nas citações,
resolvemos por colocar o simples nome
de entrevistado (a) ou revendedor (a).
Resolvemos não entrevistar os clientes,
pois estes poderiam ficar inibidos ao
relatar assuntos de fórum íntimo.
O primeiro local que nós
visitamos foi a Formasa, que é uma
revendedora especializada em veículos
da Ford. Lá, como em todas as
revendedoras que visitamos, existem
todos os estilos de carros: sedan,
utilitário, esportivo, dentre outros. Ao
chegarmos fomos recebidos por um
vendedor de meia idade que com muita
gentileza e tranquilidade respondia a
todas as nossas indagações. Além da
Formasa, visitamos a Codisman, uma
revendedora especializada na venda de
automóveis da marca chevrolet, e a
concessionária denominada Renove
veículos, que comercializava carros de
variadas marcas e tipos: veículos da
Volksvagem, da Fiat e da Ford.
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Quando indagado acerca do
estilo de carro a que cada um dos gêneros
dá preferência, o funcionário da primeira
revendedora visitada por nós (a
Formasa), nos respondeu que "a mulher,
por sua preocupação em cuidar de suas
crias, tende a escolher o carro que tenha
bons equipamentos de segurança e ainda,
por sua preocupação em cuidar das
compras de casa, dá notável preferência
a automóveis que possuam grandes
bagageiros".
Quanto ao estilo de carro mais
procurado entre os homens, ele nos
respondeu da seguinte forma: “Os
homens procuram mais o caráter
aventureiro do carro e que tenham um
visual mais arrojado e radical”. Os
equipamentos e acessórios de
preferência entre os homens são a
potência do motor e outros fatores
relacionados à parte técnica do carro que,
segundo o próprio entrevistado, está
inteiramente atrelado ao espírito
masculino de demonstrar sua força e
virilidade. Para as mulheres, "o que
importa no carro são os equipamentos
que trazem mais segurança, acima de
tudo é isso que eu vejo".
Esses relatos atestam não só a
preocupação em atender seus papeis de
gênero na sociedade, pelo consumo de
carros de determinados estilos e com
determinados equipamentos para
atenderem funções diferenciadas, como
também a influência da educação
imposta pela sociedade e das mensagens
publicitárias produzidas e difundidas
tanto para o público masculino como
para o público feminino no tocante ao
consumo de bens de consumo (em
especial o automóvel e seus
equipamentos e acessórios),
representando uma concordância com
estes padrões de identidade de gênero.
Isso representou uma constante nas falas
de todos os nossos informantes.
Notamos aqui que para as
mulheres, por exemplo, aplica-se muito
bem à teoria trabalhada por Baudrillard
(1995), de que para o sexo feminino a
cobrança maior da sociedade é pela sua
beleza física. Parafraseando o sociólogo
francês, se em nossa sociedade a mulher
for bonita poderá perfeitamente, por
exemplo, ser escolhida pelo sexo oposto
ou entrar na concorrência com grandes
chances de sucesso neste quesito, sem
precisar utilizar o automóvel como uma
'ferramenta' para seduzir ou atrair os
olhares masculinos.
Para nosso segundo informante,
da revendedora Codisman, o estilo do
automóvel preferido e mais comprado
entre as mulheres "são aqueles carros de
estilo Hatch, pois é bem mais fácil de
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estacionar. Os homens, pelo que constato
aqui, compram mais carros no estilo
sedan, pelo fato de ser um estilo mais
tradicional. Os homens gostam de
comprar carro, né? Eles não querem
saber apenas se o automóvel tem um
bom custo-benefício ou se é seguro, eles
querem um que tenha um visual todo
imponente, sabe? Acho que as
propagandas fazem muito marketing na
cabeça dos homens sobre esse negócio
de ter um carrão potente, radical ou que
mostre alguma promoção de auto
imagem de um homem forte e garanhão.
Dá pra notar isso, sabe?".
Esta nítida preferência do gênero
masculino pelo bem de consumo,
especialmente o automóvel, para fins de
sedução e poder, conforme Baudrillard
(2006), pode também ser explicado pela
tradicional predominância do homem no
mundo exterior ao lar, mundo cujo signo
eficaz vem a ser o automóvel. A respeito
dos equipamentos e acessórios mais
vendidos para homens e mulheres, o
entrevistado nos relatou que as mulheres
preferem equipamentos de segurança do
veículo. Ele nos esclareceu que:
A mulher, por ser mais frágil fisicamente do que o homem, dá essa preferência aos equipamentos que possam lhe dar mais segurança. Por isso, ela exige que se coloque vidro fumê ou vidro elétrico, como forma de não a deixar tão exposta aos bandidos e
assaltantes. Quanto aos homens, estes compram os acessórios ligados à imponência do carro.
Para nosso terceiro informante,
da revendedora denominada Renove
Veículos, que dizia-nos constantemente
que o homem quando vem acompanhado
de sua esposa costuma dar a palavra final
porque "as próprias mulheres não se
acham muito entendidas de carro", nos
relatou que as mulheres avaliam o carro
para fins completamente distintos dos
homens, preferindo comprar "os
menorzinhos, que são mais fáceis de
estacionar, ou os que tenham grandes
bagageiros para guardarem as compras
do supermercado. E ela tá certa, né?
muitas mulheres demonstram se
preocupar mais consigo e com os filhos.
Eu vejo pelos carros que elas procuram,
né? Já o homem quer um carro no estilo
imponente, grandão, que passe uma
imagem de poder, entendeu? Se um
homem for comprar um carro pequeno e
acanhado muito provavelmente vão
achar ele meio efeminado. O carro, para
o homem, representa uma extensão de
si". Ainda, nos disse que embora muitas
vezes comprem um carro aparentemente
simples ou frágil, os homens procuram
personalizar seu veículo afim de garantir
um visual bem mais imponente do que
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quando o automóvel se encontrava na
loja antes de sua aquisição.
Quando indagamos ao vendedor
desta concessionária acerca dos
equipamentos e acessórios preferenciais
dos gêneros, ele foi categórico:
A mulher adora ar-condicionado, direção hidráulica, enfim, ela quer ter conforto e se sentir bem dentro do carro. Já o homem, como adora aparecer e demonstrar virilidade, busca comprar equipamentos como som, aro, aerofólio etc. Raramente você vai encontrar aqui alguma coisa diferente disso que eu te estou dizendo.
CONCLUSÃO
Este trabalho teve como escopo
identificar e, a partir daí, analisar como
se configuram atualmente os papeis e
identidades masculinas e femininas
através do consumo de automóveis na
cidade de Fortaleza. O consumo de
automóvel trouxe grande contribuição
nesse sentido, pelo fato de seu poder
enquanto um bem de consumo que é
utilizado para determinados fins,
especialmente, pelo que vimos aqui, para
atender demandas sociais atribuídas para
cada um dos sexos. Além disso, o
automóvel possui grande importância na
vida diária dos indivíduos na
contemporaneidade.
A cidade de Fortaleza está
situada numa região onde ainda perdura
uma significativa diferença de poder
entre os gêneros. As diferenças podem
ser identificadas numa maior
remuneração masculina para trabalhos
iguais, numa maior presença feminina
em profissões de status social menos
elevado, numa cultura feminina marcada
pela sua relação com o lar, a
maternidade, com os cuidados com a
saúde das crianças e com sua extrema
vaidade com a aparência física. Em
contraposição a este universo, temos
uma cultura masculina notadamente
marcada pela associação com o trabalho
exclusivamente público (ou externo ao
lar), com a frieza e com a virilidade. A
publicidade, na condição de uma
instituição da sociedade, a partir dos
valores de nossa cultura, transfere os
valores culturais femininos e masculinos
para os bens de consumo em forma de
símbolos subjetivos. A partir daí,
homens e mulheres, através de seus
rituais de posse, transferem tais símbolos
para eles. Bens de consumo como
produtos de beleza e do lar se ligam
comumente à identidade social feminina
de cuidar de sua aparência física, da
saúde e de uma maior propensão a cuidar
de suas crias. Assim é que, relacionado
ao consumo de automóveis, concluímos
que as mulheres, segundo relato dos
vendedores que trabalhavam nas
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revendedoras, ao procurarem obter
carros com bons equipamentos de
segurança afim de garantirem maior
proteção para si e para os filhos (quando
as tinham), com grandes bagageiros para
guardar as compras do supermercado e
até com modelos de veículos mais fáceis
de estacionar, demonstraram grande
preocupação em atender as demandas do
tradicional modelo de feminilidade
relacionado ao lar e à maternidade. Isto
ficou notório e reforçado devido ao tipo,
estilo ou equipamento do automóvel
comumente escolhido por elas.
Quanto aos homens, podemos
afirmar que os resultados de nossa
pesquisa são distintos. Assim posto, os
homens, quando buscaram comprar um
carro, revelaram extrema preocupação
em transmitir imagens relacionadas à
identidade masculina hegemônica, tais
como a virilidade (especialmente quando
valorizam à potência do motor ou o
visual imponente); e o poder de
conquista (quando adquirem
equipamentos que valorizam sobretudo a
estética do veículo). Estes papeis estão
tradicionalmente atrelados aos homens, e
são produzidos e reproduzidos pela
sociedade e pela publicidade, enquanto
uma de suas instituições.
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