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Orientações técnicas Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades

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Orientações técnicas

Lepra/Hanseníase:

Gestão das reacções e

prevenção das incapacidades

A lepra (hanseníase) é uma doença infecciosa causada pelo Mycobacterium leprae. Mais de 200.000 novos casos ocorrem todos os anos. A terapia multidrogas constitui a principal estratégia de tratamento. Durante o curso da doença, quase 50% dos pacientes experimentam reações imunológicas, caracterizadas por danos nos nervos. Se não for tratado ou gerenciado corretamente, isso pode levar a deformidades e deficiências visíveis. A prevenção de deficiências é um componente importante do manejo da lepra e um meio de melhorar a qualidade de vida da pessoa afetada.

A identificação e o tratamento precoces das reações continuam sendo desafios para os profissionais de saúde da linha de frente. Esta orientação técnica visa enfrentar esses desafios. Os algoritmos simples incluídos nes te documento des tacam como reconhecer e gerenciar reações na lepra.

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ISBN 978-92-9022-762-5

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e

prevenção das incapacidades

Orientações técnicas

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades. Orientações técnicas

ISBN: 978-92-9022-762-5

© Organização Mundial da Saúde 2020

Alguns direitos reservados. Este trabalho está disponível sob a licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-Licença ShareAlike 3.0 IGO (CC BY-NC-SA 3.0 IGO; https://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/3.0/eu vou).

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Citação sugerida. Hanseníase/Lepra: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades. Orientações técnicas. Nova Delhi: Organização Mundial da Saúde, Escritório Regional para o Sudeste Asiático; 2020. Licence: CC BY-NCSA 3.0 IGO.

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Impresso na Índia.

Orientações técnicas iii

Índice

Colaboradores.............................................................................................................. v

Abreviações ................................................................................................................ vi

Prefácio .......................................................................................................................vii

Resumo executivo ......................................................................................................viii

1. Introdução às reacções da lepra e à neurite.........................................................1

1.1 Contexto ....................................................................................................1

1.2 Definições de termos .................................................................................2

1.3 Reacções de Tipo 1 e neurite .....................................................................4

1.4 Reacção de Tipo 2 .....................................................................................8

1.5 Dor neuropática ......................................................................................10

1.6 Anos de vida ajustados à incapacidade na lepra .......................................11

2. Avaliação da função dos nervos na lepra ...........................................................12

2.1 Introdução à avaliação da função dos nervos ..........................................12

2.2 Testes sensoriais .......................................................................................14

2.3 Testes musculares voluntários ...................................................................16

3. Gestão médica das reacções e da neurite na lepra ............................................19

3.1 Tratamento da reacção de Tipo 1 e neurite ..............................................19

3.2 Tratamento da reacção de Tipo 2 ............................................................23

3.3 Tratamento das reacções: resumo ............................................................27

4. Gestão das reacções e neurite: Abordagem progressiva .....................................28

4.1 Princípios de gestão das reacções e neurite ..............................................28

4.2 As quatro etapas na gestão das reacções da lepra .....................................30

4.3 Aconselhamento e promoção da saúde ....................................................32

5. Algoritmos para a gestão de pessoas afectadas pela lepra num ambiente clínico .34

5.1 Algoritmo 1: Reconhecer quando está presente uma reacção ...................34

5.2 Algoritmo 2: Saber se uma reacção é de Tipo 1 ou de Tipo 2 ...................35

5.3 Algoritmo 3: Testes das funções dos nervos ..............................................36

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidadesiv

5.4 Algoritmo 4: Tratamento da reacções de Tipo 1 e neurite .........................37

5.5 Algoritmo 5: Acompanhamento de doentes com reacção de Tipo 1 e neurite .......................................................................................38

5.6 Algoritmo 6: Início do tratamento para reacção de Tipo 2 ........................40

5.7 Algoritmo 7: Acompanhamento de doentes com reacções de Tipo 2 .......42

6. Factos fundamentais a ter em conta ..................................................................43

7. Referências .......................................................................................................45

Anexos

1. Escala de Gravidade ENLIST ENL ......................................................................53

2. Modelo de Cartão do Doente com Lepra ..........................................................57

3. Orientações adicionais sobre a talidomida para o tratamento de reações de ENL .................................................................................................65

Orientações técnicas v

N. Agebigo (Papua Nova Guiné)

M. Balagon (Filipinas)

T. Bauru (Kiribati)

A. Beshah (Congo)

J. Brandão (Brasil)

T. Budiawan (Indonésia)

J. Chukwu (Nigéria)

E. Cooreman (Índia)

M. Da Palma Caldas (Angola)

J. Darlong (Índia)

S. Dogra (Índia)

F. D. H. Estrada (Filipinas)

O. Faye (Mali)

A. Fomba (Mali)

M. D. Gupte (Índia)

K. Itoh (Japão)

K. Jetton (Ilhas Marshall)

A. John (Índia)

R. C. Johnson (Benim)

J. Joshua (Índia)

E. Keller (Estados Federados da Micronésia)

S. Lambert (Etiópia)

L. Lehman (Brasil)

D. Lockwood (Reino Unido)

A. Maghanoy (Filipinas)

M. Murhekar (Índia)

V. Narsappa (Índia)

A. Ndeve (Moçambique)

M. Nobre (Brasil)

Colaboradores

S. K. Noordeen (Índia)

V.V. Pai (India)

T. T. Pakasi (Indonésia)

V. Pannikar (Índia)

S. Paul (Índia)

V. R. R. Pemmaraju (Índia)

S. Pennini (Brasil)

M. Puri (Nepal)

B. Quao (Gana)

K. Rahevar (Filipinas)

J. Richardus (Países Baixos)

Y. Rie (Japão)

I. Roger (Brasil)

M. Roses (Argentina)

P. Saunderson (Noruega)

S. Sermrittirong (Tailândia)

V. Shetty (Índia)

G. Sridevi (Índia)

R. S. Nicholls (United States of America)

A. Srikantam (Índia)

K. Stanley (Índia)

T. Tadesse (Etiópia)

A. Tobiki (Japão)

S. Warusavithana (Egipto)

S. L. S. Watdhani (Indonésia)

N. Vera (Colombia)

C. Wiens (Paraguai)

Zaw Lin (Índia)

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidadesvi

Abreviações

DALY disability-adjusted life year (anos de vida ajustados à incapacidade)

ENL erythema nodosum leprosum (eritema nodoso da lepra)

ENLIST ENL International Study Group

IB índice bacilar

ILEP Federação Internacional das Associações de Luta Contra a Lepra

LD lepra dimorfa

LL lepra lepromatosa

M. leprae Mycobacterium leprae

MB multibacilar

MRC Medical Research Council (Conselho de Investigação Médica, Reino Unido)

PB paucibacilar

PNF perturbações neurológicas funcionais

PQT poliquimioterapia

STEPS System for Thalidomide Education and Prescribing Safety (Sistema para Educação sobre Talidomida e Segurança de Prescrição)

TMV testes musculares voluntários

TNFα factor de necrose tumoral alfa

TS testes sensoriais

Nota especial

A palavra “lepra” foi usada neste documento. Pode ser substituído por “hanseníase” sempre que necessário.

Orientações técnicas vii

Prefácio

A poliquimioterapia (PQT) tem sido a principal estratégia para o controlo da lepra há quase 40 anos. Esta estratégia reduziu drasticamente a prevalência registada da lepra, de mais de 5 milhões de casos quando a PQT foi introduzida pela primeira vez, para menos de 200.000 actualmente. O tratamento tem sido amplamente aceite, em grande parte porque tem poucos efeitos colaterais, na sua maioria controláveis. A resistência antimicrobiana a mais de um dos medicamentos raramente foi documentada. A detecção precoce de casos e o início imediato da PQT são cruciais para controlar a lepra, prevenir a deformidade e a incapacidade e reduzir a futura incidência da doença.

A lepra é frequentemente caracterizada por reacções imunológicas, desencadeadas pela resposta imunitária do corpo contra o Mycobacterium leprae. Essas reacções podem ocorrer antes, durante e após a PQT. Se não forem reconhecidas ou geridas de forma inadequada, essas reacções geralmente evoluem para lesões e deformidades irreversíveis dos nervos.

Este documento fornece orientações actualizadas sobre como reconhecer e abordar reacções numa fase precoce para evitar lesões nervosas irreversíveis. Na avaliação periódica da função dos nervos, as lesões nervosas podem ser reconhecidas precocemente, mesmo antes de se manifestar clinicamente. Proporcionar um tratamento atempado evitará danos adicionais e protegerá o doente de manifestações de incapacidades. A realização de avaliações periódicas da função dos nervos é parte integrante das boas práticas clínicas para o tratamento da lepra. Esses serviços devem estar disponíveis em qualquer unidade onde os doentes com lepra sejam tratados.

É melhor prevenir do que remediar. Ao evitar que as lesões nervosas se transformem em incapacidade permanente, os médicos melhorarão a qualidade de vida das pessoas afectadas pela lepra. Reduzirão também o fardo colocado nos sistemas de saúde e bem-estar de um país, reduzindo a necessidade de intervenções de reabilitação.

Estou certa de que este documento irá ajudar os profissionais de saúde a cuidar de doentes com lepra, especialmente em ambientes periféricos, e assegurar que estão dotados das competências necessárias para reconhecer as reacções da lepra e tomar medidas imediatas para prevenir as incapacidades.

Dr Poonam Khetrapal SinghDirectora RegionalRegião da OMS para o Sudeste Asiático

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidadesviii

Resumo executivo

A lepra é uma doença pouco comum, mas generalizada, com mais de 200.000 novos casos por ano, a nível mundial. A lepra é pouco comum na medida em que muitas das complicações mais problemáticas ocorrem como resultado da resposta imunológica do hospedeiro ao organismo infectante, o Mycobacterium leprae. Estes episódios inflamatórios intermitentes e recorrentes são conhecidos como reacções da lepra. Surgem em duas formas distintas, com diferentes características imunopatológicas, clínicas e requisitos de tratamento subjacentes. O envolvimento de certos nervos periféricos (neurite) leva muitas vezes à incapacidade e a consequências psicossociais devastadoras.

As reacções ocorrem com uma frequência e gravidade variáveis. Em alguns contextos, até 50% dos doentes podem ser afectados. Como a lepra é uma doença da pobreza, muitas vezes não é possível o acesso a cuidados especializados nos centros de referência.

No entanto, subsistem várias tarefas importantes na luta contra as incapacidades causadas pela lepra. A primeira prioridade continua a ser a detecção precoce dos casos, para que o tratamento possa começar o mais cedo possível após o aparecimento dos sintomas. Em segundo lugar, é importante reconhecer e tratar as reacções da lepra e a neurite de forma eficaz, para que a função dos nervos seja preservada. Uma terceira tarefa é a prevenção primária da lepra, que está a ser gradualmente desenvolvida como uma possibilidade de trabalho. Todas essas tarefas devem ser realizadas a nível periférico, para que possam ser vantajosas para a população em risco.

O objectivo das presentes Orientações Técnicas é rever as práticas actuais de gestão das reacções da lepra e da neurite e descrever formas de as melhorar, para que os programas nacionais possam alcançar os seus objectivos de prevenção e minimização das incapacidades causadas pela lepra.

As reacções são exacerbações agudas dos sinais e sintomas da lepra que ocorrem durante o curso natural da doença, bem como durante ou após o tratamento. Resultam da resposta imunitária do organismo à M. leprae. Podem afectar a pele, os nervos, os olhos ou os membros. Se não forem tratadas ou forem mal geridas, as reacções podem levar a graves perturbações neurológicas funcionais e, subsequentemente, a incapacidades. As reacções constituem a principal via através da qual a lepra causa danos nos nervos e incapacidades. Uma gestão eficaz das reacções é essencial para a prevenção das incapacidades. O diagnóstico de reacções requer determinadas capacidades clínicas; um tratamento eficaz requer um julgamento cuidadoso, uma vez que a evolução clínica raramente é simples.

A gestão das reacções envolve normalmente as quatro etapas seguintes:

Orientações técnicas ix

(1) Reconhecer que uma reacção está a ocorrer numa pessoa afectada pela lepra, lembrando que uma reacção já pode existir no momento do diagnóstico.

(2) Avaliar a situação com precisão, nomeadamente testar a função dos nervos.

(3) Prescrever e iniciar o tratamento correctamente.

(4) Fazer o acompanhamento, monitorização e ajustamento do tratamento, de acordo com a resposta.

Este documento apresenta orientações actualizadas sobre o diagnóstico e a gestão de reacções nos diferentes cenários. Atenção especial deve incidir nos nervos periféricos e no seu funcionamento. O objectivo dos programas nacionais deve ser melhorar o nível de avaliação da função nervosa em todas as unidades onde a lepra é tratada, nomeadamente em áreas remotas, onde os padrões provavelmente serão mais baixos.

Orientações técnicas 1

1Introdução às reacções da lepra e à neurite

1.1 Contexto

Embora a lepra se manifeste geralmente como uma doença de pele e muitas vezes seja tratada por dermatologistas, está a ser considerada muito mais como uma doença dos nervos periféricos (Lockwood, 2012) – uma neuropatia cujas consequências a longo prazo se relacionam particularmente com a perda da função dos nervos que apoiam os olhos, as mãos e os pés. Estudos sugerem que o envolvimento dos nervos na lepra é mais generalizado do que se pensava anteriormente e muitas vezes não é detectado (Smith, 2009). O dano insidioso que causa poucos sintomas é um fenómeno bem reconhecido e muitas vezes é referido como “neurite silenciosa” ou “neurite discreta”.

Este envolvimento nervoso e perda de função aplicam-se em diferentes graus para todas as três modalidades do sistema nervoso periférico: as funções sensorial, motora e autonómica. Conduz a sequelas bem conhecidas:

• A função sensorial é constituída por diferentes modalidades (toque leve, pressão, calor e frio, dor, etc.). A perda dessas funções, especialmente a perda da sensação de protecção, permite a ocorrência de traumatismos e danos com poucos sintomas, levando à ulceração, infecção e inflamação crónica. É o elevado fluxo sanguíneo relacionado com a inflamação crónica que causa a reabsorção do tecido, com encurtamento e eventual perda de dígitos.

• Quando a função motora é comprometida, os músculos ficam fracos ou paralisados, causando deformidades típicas características da lepra: lagoftalmia, vários tipos de mão em garra, dedos em garra, pé caído, etc.

• Os nervos autónomos têm várias funções de controlo, incluindo a transpiração e o fluxo sanguíneo. As lesões muitas vezes tornam a pele seca, o que mais facilmente provoca fissuras e úlceras. O elevado fluxo sanguíneo contribui para a reabsorção dos tecidos, como mencionado acima.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades2

lagoftalmia mão em garra pé caído

O bacilo da lepra tem uma predilecção pela pele e pelos nervos, e também pelas partes mais frias do corpo. Os nervos mais gravemente afectados e com maior frequência são os que se encontram perto da superfície da pele, geralmente mais frios do que os órgãos internos. O nervo ulnar no cotovelo é o principal exemplo. A presença de bacilos da lepra nos nervos, particularmente nas células de Schwann, é o precursor de danos subsequentes.

Os mecanismos através dos quais o M. leprae causa lesões nos nervos são variados e complexos. É sobejamente conhecido que as lesões nos nervos muitas vezes ocorriam de forma bastante repentina como parte de uma reacção da lepra. A resposta inflamatória imunomediada do hospedeiro era considerada como a principal causa de qualquer neuropatia clínica (Hastings, 1985). Ao longo das décadas seguintes, uma série de mecanismos moleculares e bioquímicos foram propostos para descrever como o M. leprae interage com células hospedeiras, especialmente a célula de Schwann (Rambukkana, 2002, Serrano-Coll, 2018), com a sugestão de que nem todas as lesões nervosas relacionadas com a lepra se devem a uma resposta imunológica. Até agora, no entanto, isso não acarretou nenhuma nova abordagem terapêutica. Embora os esteróides continuem a ser o único tratamento comprovado para a neurite aguda na lepra, outros medicamentos que actuam no sistema imunológico estão a ser analisados, nomeadamente como potencial tratamento para reacções de Tipo 2 (Cogen, 2020; Hatemi, 2019).

1.2 Definições de termos

Muitos dos termos utilizados neste documento para descrever lesões nos nervos são gerais e muitas vezes são utilizados indiscriminadamente. “Lesão nervosa” abrange qualquer dano à estrutura ou função de um nervo. Reconhece-se que na lepra muitos nervos são afectados ou danificados, mesmo que a lesão seja muito ligeira para ser avaliada. “Neuropatia” é outro termo que engloba danos à função dos nervos por qualquer causa. “Neurite” significa estritamente inflamação do nervo, implicando o envolvimento do sistema imunitário do hospedeiro. Este ainda é considerado o principal mecanismo de lesão nervosa na fase aguda da doença.

Orientações técnicas 3

Do ponto de vista clínico, o essencial é a concentração no que pode ser avaliado. A função dos nervos é analisada por vários meios a serem descritos mais tarde, colectivamente designados “avaliação da função dos nervos”. Qualquer perda de função é chamada de perturbação, ou mais especificamente “perturbação neurológica funcional” (PNF). A terminologia relativa às perturbações e deficiências está descrita na Classificação Internacional de Funcionamento, Deficiência e Saúde (OMS, 2001). Uma deficiência pode levar à dificuldade na realização de determinadas actividades (limitações de actividades). Estas podem ter algumas implicações sociais, originando nomeadamente estigma e discriminação (restrições de participação), que geralmente afectam a vida das pessoas com lepra.

Reacções da lepra são episódios de inflamação imunomediados que muitas vezes são autolimitados, mas que também podem ser graves e prolongados. As reacções da lepra são consideradas como a causa subjacente à maior parte das incapacidades na lepra e, portanto, de muitas das consequências psicossociais que se possam seguir. São reconhecidos dois tipos principais de reacção: Reacção de Tipo 1 e de Tipo 2. As características distintas de cada tipo são descritas abaixo.

Muito depois de a lepra ter sido tratada, podem existir várias causas para uma recorrência de dores nervosas, que devem ser levadas em conta durante o acompanhamento:

• Uma recaída da lepra pode levar a outras reacções e neurite. É gerida da mesma forma que uma primeira experiência de lepra.

• A dor é uma característica proeminente da dor neuropática, que é uma causa significativa de morbidade tardia nas pessoas que foram afectadas pela lepra.

• Pode também ocorrer uma neuropatia compressiva, em que o nervo (talvez um pouco aumentado por causa da lepra) fica preso num dos túneis fibro-ósseos do corpo, como o túnel cubital no cotovelo ou o túnel do carpo no pulso. Os sintomas incluem dor e perda de função. A imobilização com tala pode ser útil, caso contrário recomenda-se a cirurgia.

É necessária uma breve observação sobre a classificação da lepra. Novos casos apresentam uma vasta gama de características clínicas. Podem ser agrupados de acordo com os sinais clínicos e os resultados histopatológicos ao longo de um espectro da doença, que corresponde bem à resposta imunológica do hospedeiro e à carga bacilar (Ridley, 1966; Lockwood, 2012). A posição de um doente nesse espectro da doença é um factor importante na determinação do risco de complicações, incluindo o risco de desenvolver uma reacção. A classificação de 5 grupos de Ridley-Jopling foi simplificada em dois grupos pela OMS para fins de tratamento quando a poliquimioterapia foi introduzida em 1981, uma vez que foram utilizados dois regimes distintos, para a doença paucibacilar (PB) e multibacilar (MB), respectivamente (OMS, 1982). Posteriormente surgiu uma dificuldade prática, na medida em que as definições operacionais para a classificação PB/MB mudaram várias vezes, dificultando a comparação dos resultados publicados de diferentes épocas. Em geral, cada vez mais doentes são agora classificados e tratados como casos MB, quando anteriormente podiam ter sido previamente classificados como PB.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades4

1.3 Reacções de Tipo 1 e neurite

Importantes estudos clínicos precoces sobre as reacções de Tipo 1: ocorrência e factores de risco

Foram realizados vários grandes estudos clínicos sobre as reacções de Tipo 1 e a neurite, como a seguir se enumera. O quadro clínico das reacções é variável. Foram necessários grandes estudos com acompanhamento prolongado para identificar os factores de risco e compreender a diversidade clínica e o prognóstico de longo prazo da doença.

Estudo retrospectivo:

• Índia (Risk of facial nerve damage) (Hogeweg M et al., 1991)

Estudos de coorte prospectivos:

• Tailândia (programa de rotina) (Schreuder P, 1998),

• Bangladesh Acute Nerve Damage Study (BANDS), Bangladeche (Croft R et al., 1999 & 2000),

• ALERT MDT Field Evaluation Study (AMFES), Etiópia (Saunderson P et al., 2000),

• ILEP Nerve Function Impairment and Reactions study (INFIR), Índia (van Brakel W et al., 2005; Smith W et al., 2009)

Hogeweg et al. mostraram que 85% dos casos com início recente de lagoftalmia tinham uma lesão cutânea de lepra no rosto, permitindo que esses casos fossem observados com mais cuidado para a detecção precoce dos danos nos nervos. Qualquer sinal de reacção na pele deve alertar para o potencial envolvimento dos nervos próximos (van Brakel, 2005). Schreuder et al. acompanharam 640 novos casos (66% PB) na Tailândia durante cinco a oito anos. Durante o acompanhamento, poucos doentes de PB (3,7%) tinham piorado, enquanto o mesmo número tinha melhorado. Para os casos de MB, a alteração foi maior: 19% melhoraram, enquanto 18% pioraram. Uma elevada proporção de casos de MB com nova deficiência da função dos nervos melhorou no tratamento com prednisolona: 47/62 casos (76%).

Em Bangladeche, onde 83% dos casos foram de PB, Croft et al. indicaram que a maioria das novas PNF ocorreu no primeiro ano após o diagnóstico. Os principais factores de risco foram a classificação de MB e a presença de PNF no momento do diagnóstico (Croft, 2000). Na Etiópia, uma proporção muito maior (50%) dos casos foi de MB (neste caso, significando baciloscopia positiva), com taxas de incidência de PNF muito mais elevadas. No entanto, tratando-se de uma nova PNF, os resultados após o tratamento com prednisolona foram bons (Saunderson, 2000).

O tratamento com esteróides será discutido de forma mais aprofundada no Capítulo 3. Convém salientar que o grau de melhoria relatado nos diferentes estudos é muito variável e bastante dependente de factores operacionais (Walker, 2008; Croft, 2000; Saunderson,

Orientações técnicas 5

2000). Entre os factores que tendem a diminuir a eficácia do tratamento (indicando um bom resultado em menos de 50% dos casos, por exemplo) constam:

• Inclusão de casos com lesões nos nervos de duração desconhecida (alguns terão danos antigos);

• Utilização da plena recuperação da função como resultado necessário, em vez de “melhoria”;

• Utilização de um teste mais sensível da função dos nervos, que pode mostrar alguma perda residual.

Os estudos que demonstram uma elevada eficácia (65-80% de melhoria) apresentam algumas ou todas as seguintes características:

• Apenas a inclusão de casos em que a aparição de novas lesões nervosas é precisamente documentada;

• Utilização de “melhoria” (seja qual for a definição) como um parâmetro, em vez de recuperação completa;

• Utilização de um teste menos sensível para avaliar a perda sensorial (como a caneta esferográfica ou um monofilamento de 10 g) que pode não detectar um baixo nível de perda sensorial residual.

O estudo INFIR na Índia seguiu 303 casos de MB durante dois anos, com uma pesquisa mais intensiva dos factores de risco para a PNF. Isso também foi avaliado por uma gama mais ampla de métodos, incluindo estudos de condução nervosa (van Brakel, 2005). No diagnóstico, 38% tiveram uma reacção ou lesão nervosa recente ou nova. O principal factor de risco para a PNF foi uma lesão cutânea causada pela lepra sobre um tronco nervoso (o risco aumentou três a quatro vezes). A presença de sinais de inflamação nessa mancha cutânea duplicou o risco de PNF. O estudo constatou que os estudos de condução nervosa sensorial e para detecção do limiar ao calor permitiam identificar a neuropatia mais cedo, até 12 semanas antes de as alterações serem observadas no teste de monofilamento (van Brakel, 2008). Surpreendentemente, estudos subsequentes de tratamento profiláctico de todos os novos casos com esteróides, ou tratamento de neuropatia muito precoce, não levaram a melhores resultados. Isso será descrito de forma mais aprofundada no Capítulo 3 sobre a gestão médica de reacções e da neurite.

O estudo de INFIR também avaliou uma série de anticorpos e citocinas na busca de marcadores úteis de reacções e de PNF. Os efeitos da antiga PNF tendem a encobrir as alterações recentes (Jadhav, 2011). Análises posteriores revelaram que os níveis de vários marcadores de inflamação aumentaram no mês anterior ao início clínico de uma reacção e depois diminuíram com o tratamento com esteróides, embora houvesse uma variação considerável entre os indivíduos (Raju, 2014).

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades6

Reacções de Tipo 1 e neurite: características clínicas e história natural

As reacções de Tipo 1 são causadas por uma resposta inflamatória ao M. leprae nos tecidos. Ocorrem devido a uma súbita alteração na imunidade mediada pelas células, uma reacção de hipersensibilidade de tipo retardado (Britton W, 1998). A reacção de Tipo 1 também é conhecida como reacção reversa, porque a resposta imunológica inicialmente parece estar a diminuir e, em seguida, “reverte” para se tornar mais intensa. Pode ser uma característica presente da lepra ou pode ocorrer durante o tratamento com PQT ou mesmo durante três ou quatro anos após a conclusão do tratamento (Rose, 1991). Iniciar o uso da PQT muitas vezes parece precipitar uma reacção de Tipo 1, talvez porque a morte rápida de bacilos permite que o sistema imunitário se recupere.

Consideram-se características típicas da inflamação: inchaço, vermelhidão, calor, dor e perda de função. A principal característica clínica de uma reacção de Tipo 1 é a inflamação em torno de bacilos nas lesões cutâneas causadas pela lepra. Isto raramente é um problema sério, uma vez que a reacção é auto-limitante. O tratamento sintomático é necessário até que a resolução ocorra durante um período de algumas semanas. Nos casos graves, as lesões cutâneas inflamadas podem desenvolver úlceras.

Reacção de Tipo 1 ou reacção reversa

Uma questão mais importante, no entanto, é que uma reacção na pele é muitas vezes acompanhada de inflamação num ou mais nervos, conhecida como neurite. Isso pode ter sérias consequências, incluindo danos permanentes nos nervos, perturbações e incapacidades. Uma reacção de Tipo 1 na pele pode, por conseguinte, ser tomada como um possível indicador da neurite iminente (van Brakel, 2005; Nery, 2013). Atenção especial deve ser dada às lesões reaccionais localizadas no rosto, porque estão associadas a um maior risco de danos no nervo facial, resultando em lagoftalmias e suas consequências (Hogeweg, 1991).

As reacções estão frequentemente presentes no momento do diagnóstico: cerca de 22% de todos os novos casos têm alguma forma de reacção, com base nos dados de um estudo em três países: Brasil, Nepal e Filipinas (Scollard, 2015). Se a reacção for ligeira e não houver evidências de neurite, os medicamentos anti-inflamatórios não esteróides, como ácido acetilsalicílico, ibuprofeno ou paracetamol são geralmente suficientes para controlar os sintomas.

Orientações técnicas 7

A avaliação regular da função dos nervos reveste-se de importância crucial no tratamento de todos os doentes com lepra. Isso permite a detecção de PNF, seja por causa de um evento inflamatório óbvio (como uma reacção) ou devido à chamada neurite silenciosa. Por conseguinte, é essencial efectuar uma avaliação regular da função dos nervos durante o tratamento da lepra, a fim de detectar novas PNF e iniciar um tratamento anti-reacção específico com esteróides. Os testes da função sensorial e motora devem ser feitos regularmente. Os métodos são descritos pormenorizadamente no Capítulo 2. Há duas razões importantes para a realização regular dos testes em todos os doentes com lepra que se encontram em tratamento: (i) a PNF pode ocorrer sem qualquer sinal evidente (por exemplo, dor) que indique uma reacção; (ii) Se a PNF permanecer sem tratamento por seis meses ou mais, a recuperação é improvável.

Além desses conhecidos factores de risco epidemiológicos e clínicos, vários grupos procuraram biomarcadores que possam sinalizar uma reacção iminente de Tipo 1, incluindo o estudo INFIR acima referido. Foram registados alguns progressos (Tio-Coma, 2019), mas os testes propostos ainda não estão prontos para uma utilização generalizada. Uma grande dificuldade com esses testes seria a selecção dos doentes e o calendário dos testes, quando – por definição – não há outra sugestão de uma reacção iminente.

Reacção de Tipo 1 e neurite: procedimentos de diagnósticos e testes laboratoriais

O diagnóstico de uma reacção de Tipo 1 é essencialmente clínico, com a descoberta de lesões cutâneas inflamadas. A presença de febre ou ulceração das lesões cutâneas indicaria uma reacção reversa mais grave. Há dois tipos específicos de procedimento de diagnóstico que são indicados em doentes com uma reacção de tipo 1: (i) Testes da função dos nervos para identificar qualquer neurite que os acompanhe; e (ii) Testes para procurar qualquer contra-indicação ao tratamento com esteróides.

Os testes da função dos nervos são a seguir analisados. A mensagem simples é que qualquer PNF que esteja presente há menos de seis meses pode potencialmente ser revertida com o tratamento com esteróides, prevenindo assim a incapacidade permanente.

Os testes laboratoriais que são indicados antes da prescrição de esteróides são os seguintes:

• Testes de rotina do estado de saúde normalmente praticados (por exemplo, hematologia, bioquímica, serologia do VIH);

• Testes para excluir a tuberculose, conforme indicado (por exemplo, teste da saliva, radiografia do tórax);

• Testes para avaliar a possibilidade de diabetes (por exemplo, urina/açúcar no sangue, teste de tolerância à glicose);

• Exame das fezes;

• Quaisquer testes indicados para identificar suspeitas de infecção, incluindo cultura de sangue/amostra de feridas.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades8

Reacção de Tipo 1 e neurite: gestão

Os medicamentos utilizados no tratamento de uma reacção de Tipo 1 são analisados no Capítulo 3. Existem importantes medidas não farmacêuticas que devem ser tomadas em paralelo. Embora este trabalho seja geralmente gerido pelo departamento de fisioterapia dos centros de referência, pode ser realizado em qualquer lugar onde os doentes com lepra estejam a ser atendidos.

• O repouso do membro afectado na fase aguda pode ser auxiliado pela utilização de tala, especialmente à noite.

• Uma vez reduzida a dor da fase aguda, o alongamento passivo de qualquer músculo enfraquecido preserva a mobilidade articular; os exercícios activos ajudam então a fortalecer os músculos enfraquecidos.

• A imersão e a oleosidade da pele seca ajudam a prevenir fissuras e preservam a integridade da epiderme.

A cirurgia é por vezes indicada na fase aguda para aliviar a pressão sobre o nervo e no interior do mesmo. Isso só está disponível nos centros especializados. Foram realizados muito poucos ensaios clínicos de cirurgia descompressiva (van Veen N et al., 2012). A cirurgia de reabilitação desempenha um papel importante no tratamento posterior dos doentes com lesões nervosas permanentes, mas ultrapassa o âmbito deste documento.

1.4 Reacção de Tipo 2

Reacção de Tipo 2: grandes estudos e factores de risco

A reacção de Tipo 2, também conhecida como eritema nodoso da lepra (erythema nodosum leprosum, ENL), é um transtorno multissistémico, com recidiva e remissão que ocorre nos doentes com lepra lepromatosa (LL) e lepra dimorfa (LD), e uma elevada carga bacilar. A incidência varia em diferentes grupos. Uma análise dos dados publicados indicou que 1,2% de todos os casos de lepra e 15,4% dos casos de LL desenvolveram uma reacção de Tipo 2 (Voorend, 2013). Algumas séries de casos relatam até 50% dos casos de LL afectados (Kumar, 2004; Pocaterra, 2006). Voorend et al. descobriram que vários episódios foram relatados em 39-77% dos casos, com uma média de 2,6 episódios por doente. Em todas as séries, as reacções de Tipo 2 estão associadas a um elevado índice bacilar (IB) no momento do diagnóstico, tipicamente acima de 4.0.

O próprio eritema nodoso é uma doença imunológica rara que pode ser devida a várias causas subjacentes, como tuberculose, sarcoidose, doença de Crohn e como um efeito adverso de vários medicamentos. Na lepra, pensa-se que o ENL esteja relacionado com complexos imunológicos circulantes com efeitos generalizados em todo o corpo, e não apenas na pele (Kahawita, 2008).

Orientações técnicas 9

O consórcio ENLIST1 foi constituído em 2014 e contribuiu significativamente para o nosso conhecimento das reacções de Tipo 2. Uma razão importante para a formação do consórcio foi a realização de estudos em muitos centros, tendo em conta que as reacções de Tipo 2 são geralmente raros.

Estudos importantes sobre reacções de Tipo 2 incluem:

• Systematic review of ENL epidemiology (Voorend C et al., 2013);

• Mortality associated with ENL (Walker S et al., 2014);

• Cross-sectional study of clinical features (Walker S et al., 2015);

• The ENL Severity Scale (Walker S et al., 2017).

Reacção de Tipo 2: características clínicas

A primeira actividade do Consórcio ENLIST foi recolher dados exaustivos sobre as características clínicas das reacções de Tipo 2 (Walker S, 2015). Com base nisso, foi desenvolvida uma Escala de Gravidade (Walker S, 2017). Isso permite que cada caso seja avaliado objectivamente e que o progresso seja medido com precisão. Esta forma de reacção vem e vai de forma recorrente. O tratamento muitas vezes não é simples. É importante ser capaz de detectar tanto uma boa resposta ao tratamento como qualquer agravamento da doença.

A principal característica de diagnóstico de uma reacção de Tipo 2 é a presença de nódulos inflamados na pele, o chamado eritema nodoso. Os nódulos podem estar em qualquer parte do corpo e não estão relacionados com as lesões cutâneas da lepra. Os nódulos encontram-se nos tecidos subcutâneos e medem normalmente 1-2 cm de diâmetro. Nos casos graves, os nódulos podem apresentar úlceras. Outras características clínicas típicas fazem parte da Escala de Gravidade:

• Dor;

• Febre;

• Número e extensão das lesões ENL;

• Edema periférico;

• Dor óssea;

• Inflamação de articulações ou dedos;

• Linfadenopatia;

• Sensibilidade dos nervos.

1 ENLIST ou ENL International Study Group: um consórcio mundial que visa melhorar a compreensão e o tratamento do ENL com representantes de Bangladeche, Brasil, Etiópia, Filipinas, Índia, Indonésia e Nepal.

Reacção de Tipo 2 ou erythema nodosum leprosym

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades10

O curso natural de um episódio agudo de ENL é de uma a duas semanas. Registaram-se múltiplas ocorrências em muitos doentes durante meses (Scollard et al., 2006). Foram descritos três tipos de ENL:

• ENL agudo: episódio de ENL com duração inferior a seis meses em que o tratamento foi lentamente retirado sem nenhuma recorrência de ENL durante o tratamento;

• ENL recorrente: pelo menos mais um episódio de ENL que ocorra 28 dias ou mais após a retirada do tratamento para ENL;

• ENL crónico: episódios de ENL com duração superior a seis meses durante o qual o doente está em tratamento contínuo de ENL ou quaisquer períodos sem tratamento são inferiores a 28 dias.

É provável que os doentes com ENL tenham uma qualidade de vida prejudicada e enfrentem custos económicos domésticos catastróficos (Chandler, 2015). Os doentes devem ser alertados para o facto de que o ENL pode durar mais de um ano ou até mais. Devem ser aconselhados sobre o controlo dos sintomas. Devem receber um folheto de informações sobre esteróides e um Steroid Card. Devem ser alertados contra a compra de esteróides sem prescrição para o tratamento dos seus sintomas. É importante que sejam monitorizados por um clínico experiente no tratamento de doentes com ENL. Podem desenvolver depressão devido à sua doença e medicação que estão a tomar. Deve ser igualmente dada especial atenção a este aspecto durante as visitas clínicas.

Reacção de Tipo 2: procedimentos de diagnósticos e testes laboratoriais

As investigações laboratoriais não são necessárias para confirmar o diagnóstico de ENL. São, contudo, necessárias para monitorizar as complicações que podem ocorrer como resultado dos medicamentos imunossupressores que são administrados. É também indicada a avaliação regular da função dos nervos.

1.5 Dor neuropática

Os doentes com lepra tratados podem sentir formigueiros ou ardor nas lesões cutâneas tratadas, bem como nas mãos e pés. Podem ser mal diagnosticados como reacções. Na ausência de sensibilidade nervosa e de nova PNF, o diagnóstico de dor neuropática deve ser considerado, particularmente se o diagnóstico original da lepra tiver sido feito mais de 3-5 anos antes.

Os doentes devem ser tratados utilizando uma escala analgésica, começando com paracetamol como um primeiro passo, depois, utilizando um medicamento não esteróide como ibuprofeno, se o alívio for inadequado. Muitos doentes necessitarão de tratamento com amitriptilina. Embora seja um medicamento antidepressivo, as doses utilizadas para

Orientações técnicas 11

a dor neuropática são menores e parece haver um efeito estabilizador directo nos nervos periféricos. A gabapentina também pode ser utilizada em doentes com dores que não são aliviadas por outras medidas. Os esteróides não são recomendados para a dor neuropática na lepra.

1.6 Anos de vida ajustados à incapacidade na lepra

Anos de vida ajustados à incapacidade (disabiity-adjusted life year, DALY) é uma medida da carga mundial da doença, expressa como o número de anos perdidos devido à doença, incapacidade ou morte precoce. Desenvolveu-se na década de 1990 como uma forma de comparar a saúde mundial e a esperança de vida de diferentes países, bem como a carga mundial das diferentes doenças. DALY é uma medida social do peso da doença ou da incapacidade nas populações.

DALY é a soma dos anos vividos com incapacidade e dos anos de vida perdidos. Os resultados de DALY na lepra mostram um fardo mínimo, uma vez que a mortalidade por lepra é muito baixa, e as mortes que ocorrem podem não ser notificadas como sendo relacionadas com a lepra (por exemplo, morte por disenteria em alguém com lepra que esteve a ser tratado com esteróides). Uma mortalidade significativa relacionada com a lepra pode ocorrer devido ao ENL, à medicação com esteróides, à síndrome de hipersensibilidade à dapsona ou ao suicídio. Os DALY também não avaliam bem as questões de saúde mental, nem os efeitos angustiantes do estigma ou os efeitos incapacitantes da úlcera plantar.

Um estudo realizado na Índia (Rao P, 2013) mostrou que há uma redução de 13,4 anos em relação ao período ideal de trabalho produtivo da vida. O estudo observou que, em média, 30% da vida profissional de uma pessoa afectada pela lepra se deve à incapacidade.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades12

2 Avaliação da função dos nervos na lepra

2.1 Introdução à avaliação da função dos nervos

Para melhorar a gestão das reacções e da neurite na lepra em toda a parte, este capítulo tem dois objectivos fundamentais relacionados com a avaliação da função dos nervos:

• Todos os programas e clínicas que tratam casos de lepra devem aumentar consideravelmente os testes de rotina da função dos nervos, utilizando ferramentas disponíveis, quer se trate de caneta esferográfica ou de monofilamentos de nylon.

• Todos os programas e clínicas devem melhorar gradualmente tanto a precisão como a utilidade dos testes que estão a ser realizados, através de mais formação, melhor manutenção de registos e utilização de monofilamentos, sempre que possível.

Este capítulo descreve testes sensoriais e testes musculares voluntários, que podem ser realizados em qualquer contexto em que as pessoas sejam tratadas da lepra (Becx-Bleumink M, 1990). Outros testes, como a detecção ao calor ou ao frio, testes de função autónoma dos nervos e estudos de condução dos nervos são feitos em alguns centros, mas estão fora do âmbito deste documento.

A perturbação neurológica funcional é definida como uma perturbação neurológica clinicamente detectável que necessita de intervenção. A gravidade da PNF clinicamente detectável depende da sensibilidade da ferramenta utilizada e das gradações que podem ser relatadas. Quando a PNF não é tratada nos seis meses após o início dos sintomas, a lesão nervosa pode tornar-se irreversível e pode causar incapacidade permanente. Portanto, a avaliação periódica é uma parte essencial da gestão adequada dos casos de lepra.

O objectivo da avaliação da função dos nervos é quadruplicado:

• Diagnosticar a lepra (um dos três sinais cardeais) e classificar para a PQT (dois ou mais nervos do tronco (não cutâneos) afectados classificados como MB);

• Estabelecer a ocorrência de perturbações neurológicas funcionais num doente individual durante ou após a PQT e decidir sobre as intervenções adequadas para prevenir danos nervosos permanentes;

Orientações técnicas 13

• Monitorar as alterações (recuperação, deterioração) na função dos nervos após a terapia (medida do resultado primário); e

• Evitar que as pessoas afectadas sejam submetidas à identidade social da lepra, reduzindo assim o estigma e a discriminação.

Para avaliar a função dos nervos, o pessoal de saúde necessita de ferramentas fiáveis, acessíveis e fáceis de utilizar, juntamente com métodos de rastreio normalizados para detectar a neuropatia precoce no terreno. As ferramentas devem ser suficientemente sensíveis (ou seja, baixo número de falsos-negativos) para o diagnóstico correcto de perturbações neurológicas funcionais, mas também suficientemente específicas (ou seja, baixo número de falsos-positivos) a fim de não se exagerar no diagnóstico de PNF. Estudos indicam que as competências e os níveis de experiência do pessoal de saúde afectam a fiabilidade dos testes. Os métodos estabelecidos para a avaliação da função dos nervos são a palpação de nervos, testes sensoriais e testes musculares voluntários. A caneta esferográfica (facilmente disponível) ou o monofilamento de nylon são normalmente utilizados para testes sensoriais. Para os testes musculares voluntários (TMV), são utilizados três graus (como sugerido por J Watson) ou a escala modificada do Conselho de Investigação Médica Medical Research Council, MRC) com seis graus (0–5).

Antes de a PNF ser clinicamente detectável, a maioria dos nervos já mostra alguma neuropatia subclínica que pode ser detectada com métodos mais sensíveis. Os estudos para detecção do limiar ao calor e de condução nervosa foram capazes de detectar neuropatia subclínica até 12 semanas antes da neuropatia ser clinicamente detectável com testes de monofilamento ou testes musculares voluntários (van Brakel, 2008). Foi observada uma correlação significativa entre parâmetros clínicos – espessamento nervoso (por palpação), perda sensorial e fraqueza muscular – e anomalias da ecotextura nervosa, fluxo sanguíneo endoneural e área da secção transversal (por diagnóstico ecográfico). A lesão nervosa detectada por ecografia foi mais extensa e foi observada mesmo nos nervos considerados clinicamente normais (Jain S et al.).

As dados factuais sugerem que a utilização de monofilamentos de nylon Semmes-Weinstein é mais sensível do que o teste com canetas esferográficas. Foram observados níveis substanciais de sub-diagnóstico da perda sensorial com o teste com canetas esferográficas (Koelewijn L et al., 2003). Contudo, de uma perspectiva prática, a detecção de perda sensorial ligeira com os monofilamentos mais sensíveis num grupo de sujeitos não conduziu a melhores resultados a longo prazo, em comparação com os sujeitos avaliados pela esferográfica (van Brakel, 2003).

A função dos nervos deve ser avaliada no diagnóstico (base de referência) e repetida de três em três meses durante a PQT (se possível, pode ser feita todos os meses para os doentes com maior risco de neurite, por exemplo, doentes de MB que já tenham lesões nervosas) e após a conclusão do tratamento. A função dos nervos também deve ser avaliada sempre que o doente se queixar de dor, dormência ou fraqueza. Quando a PNF é detectada, a função dos nervos deve ser avaliada mensalmente durante a terapia com

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades14

esteróides e, depois, de três em três meses após a terapia com esteróides. O doente deve ser envolvido através de aconselhamento adequado sobre neuropatia e suas consequências, explicando a importância da avaliação da função dos nervos e da detecção de sintomas de neuropatia.

Considera-se que um doente tem maior risco de desenvolver PNF se:

• Há mais de seis lesões cutâneas com ou sem envolvimento nervoso (ou seja, apenas o nervo aumentado sem PNF existente);

• Há uma mancha cutânea no rosto ou perto do olho ou nas áreas supridas por um nervo do tronco palpável ou visivelmente aumentado sem PNF existente;

• Há evidências de uma reacção (de Tipo 1 ou 2) incluindo neurite aguda, nova ou tratada nos últimos seis meses sem PNF existente;

• A baciloscopia realizada é positiva;

• O doente é diagnosticado como tendo lepra MB.

Deve ser efectuada a avaliação da função dos nervos:

• Em qualquer unidade de saúde que trate doentes com lepra;

• Durante as campanhas de sensibilização e rastreio da comunidade;

• Em casa (auto-exame por pessoas afectadas pela lepra).

A avaliação da função dos nervos deve ser realizada por qualquer profissional de saúde qualificado ou qualquer pessoa devidamente formada afectada pela lepra.

2.2 Testes sensoriais

Esta secção descreve os testes de toque leve, utilizando uma caneta esferográfica, um único monofilamento ou um conjunto de monofilamentos classificados. Os testes sensoriais de rotina limitam-se ao exame das palmas das mãos e das plantas dos pés. Os testes de perda de sensibilidade na córnea não devem ser feitos sistematicamente. O número de locais de teste em cada mão ou pé não é essencial, mas geralmente é entre 4 e 10.

Ao testar, certifique-se de que o indivíduo compreende o que é necessário, demonstrando o procedimento. Para o teste real, certifique-se de que o indivíduo não pode ver a parte que está a ser testada e peça-lhe que aponte para o local que está a ser tocado. A identificação do ponto, com um erro inferior a 2 cm, mostra que a sensação está presente.

Orientações técnicas 15

A documentação de cada resultado é importante para que seja possível identificar as alterações ao longo do tempo (a amostra do Cartão do Doente é apresentada no Anexo 2). É, portanto, normal que cada programa teste um conjunto padrão de locais.

Quando utilizar a caneta esferográfica, pratique primeiro em si mesmo para ver como é um toque leve: o objectivo é utilizar o toque mais leve que consegue sentir por si próprio. A caneta esferográfica tem a vantagem de estar sempre disponível. Se for utilizada com cuidado, pode melhorar muito o tratamento de doentes com lepra. A falta de monofilamentos nunca deve ser utilizada como desculpa para não testar a função dos nervos, quando indicada.

Se for utilizado um único monofilamento de nylon, este irá dobrar e dar uma força padronizada, medida como um peso em gramas, o que o torna mais preciso do que a esferográfica. Normalmente, é utilizado um monofilamento de 2 g ou 10 g. O monofilamento de 2 g é preferido por alguns, uma vez que pode dar uma indicação anterior de PNF. Há preocupação, no entanto, de que possa não ser sentido pela pele normal dos pés onde as pessoas estão habituadas a andar descalças, dando assim uma falsa indicação positiva de perda sensorial. O monofilamento de 10 g é utilizado como padrão em clínicas de diabetes e pode indicar uma neuropatia mais estabelecida. Um estudo em indivíduos indianos e nepaleses saudáveis, revelou que 4 g é o limiar normal para a sensação no pé, talvez aumentando para 10 g naqueles que fazem trabalho pesado; o limiar para os nervos ulnar e mediano na mão foi de 200 mg (Wagenaar, 2014).

Estas constatações sugerem que, se for utilizado um único monofilamento, é preferível o filamento de 10 g. Se as clínicas quiserem utilizar mais monofilamentos, o passo seguinte seria utilizar 10 g para o pé e 2 g para a mão.

Os monofilamentos graduados são fabricados como um conjunto padrão (Sorri-Bauru, São Paulo, Brasil), com forças de flexão que variam de 70 mg a 300 mg (Quadro 1, Wagenaar, 2014; reproduzido com permissão). Se forem utilizados os seis monofilamentos, é prática normal passar do mais leve (70 mg) para o mais pesado (300 g), testando até um máximo de três vezes com cada filamento, em cada local; o filamento mais leve que é sentido é registado. Este é um exercício bastante demorado, que deve ser feito numa sala tranquila sem interrupção, o que pode não ser possível em todos os lugares.

Testes sensoriais com caneta esferográfica

com monofilamento

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades16

Quadro 1: Características do conjunto padrão dos monofilamentos Semmes-Weinstein (de leve a pesado)

FilamentoNúmero de Índice de

Filamento*

Força de flexão (gramas)

Kit de teste de monofilamento de Semmes-Weinstein

Verde 2,83 0,07

Azul 3,61 0,2

Púrpura 4,31 2

Vermelho 4,56 4

Laranja 5,07 10

Rosa 6,65 300

* O número do índice de filamento é calculado a partir da força de flexão em mg: Número do índice de Filamento = log (força * 10)

A interpretação dos resultados é uma parte fundamental do exame. Se a sensação for definitivamente reduzida desde o teste anterior, foi identificada uma nova PNF e deve ser tratada. Se dez locais forem testados em cada mão e pé, é razoável exigir uma perda significativa de sensibilidade de pelo menos dois locais para diagnosticar nova PNF. Se apenas quatro locais forem testados, a perda de sensibilidade de um local confirma o diagnóstico.

Se for utilizado apenas um instrumento (a esferográfica ou o monofilamento de 10 g, por exemplo), a nova perda sensorial é mais simples de identificar – em qualquer local específico, há uma mudança do estímulo a ser sentido, para não ser sentido. Os monofilamentos graduados podem mostrar um limiar de alteração da percepção sensorial. O monofilamento é padronizado e, portanto, dará resultados semelhantes entre diferentes observadores; a esferográfica é mais variável e dependente do examinador. Se for utilizada a esferográfica, os resultados serão mais fiáveis, se o mesmo examinador testar o doente de cada vez.

2.3 Testes musculares voluntários

Quatro músculos de cada lado do corpo são testados regularmente. O indivíduo é solicitado a mover um músculo específico e o examinador testa a força do movimento contra a resistência. Embora duas escalas sejam utilizadas, o exame é o mesmo. A diferença é que a escala mais simples tem apenas três categorias, enquanto a Escala MRC mais complexa tem seis categorias (Quadro 2).

Orientações técnicas 17

Quadro 2: Teste muscular voluntário: escalas em uso

Escala simples Escala MRC Interpretação

Forte (“F”) 5 Força total

4 Ligeiramente abaixo da força total (em comparação, por exemplo, com o outro lado)

Diminuída (“D”) 3 Gama completa de movimentos, mas sem resistência a uma força contrária

2 Algum movimento, mas menos do que a gama completa; nenhuma resistência

Paralisado (“P”) 1 Uma oscilação do movimento pode ser sentida pelo examinador

0 Sem nenhum movimento

Como acontece com os testes sensoriais, a Escala MRC mais precisa é frequentemente utilizada nos centros de referência, enquanto a escala simples é mais amplamente utilizada no terreno. O ponto chave é que os testes devem ser feitos regularmente e os resultados registados, para que qualquer alteração seja facilmente notada. Uma alteração de dois níveis na Escala MRC ou um nível na escala simples confirma a perda de força muscular, indicando a necessidade de tratamento.

Os quatro músculos testados regularmente são:

• Fechamento ocular (incapacidade de fechar totalmente o olho, ou lagoftalmia, sendo causado pela fraqueza do músculo orbicularis oculi):

– Observar e medir (em mm) qualquer espaço entre as pálpebras no fechamento suave;

– Tentar separar suavemente as pálpebras, enquanto o indivíduo fecha os olhos com firmeza.

• Para testar os músculos na mão, peça ao indivíduo que estenda uma mão de cada vez; a mão deve ser estendida para a frente, com as palmas para cima:

– Nervo ulnar na mão: Segure na mão do indivíduo e peça-lhe para mover o dedo mindinho para fora, contra a resistência; o examinador pode fornecer resistência na base do dedo;

– Nervo mediano na mão: Segure na mão do indivíduo e peça-lhe para apontar o polegar para cima em direcção ao seu próprio nariz (isto assegura que o polegar está a ser abduzido [nervo mediano] em vez de estendido [nervo radial]); o examinador pode fornecer resistência empurrando verticalmente para baixo na base do polegar.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades18

• Nervo peronial na perna/pé:

– Pode-se notar um pé caído à medida que o sujeito caminha; a parte da frente do pé arrasta-se ao longo do chão;

– Com o joelho direito, peça ao sujeito para levantar o pé no tornozelo (dorsiflexão), enquanto o examinador pressiona para baixo.

Orientações técnicas 19

3Gestão médica das reacções e da neurite na lepra

3.1 Tratamento da reacção de Tipo 1 e neurite

Esteróides: indicações e dose

O tratamento com esteróides é indicado nas seguintes circunstâncias:

• Reacções de Tipo 1 que são suficientemente graves para causar ulceração da pele ou não são controladas por paracetamol ou medicamentos anti-inflamatórios não esteróides (como ibuprofeno);

• Neurite, como mostra a emergência de uma nova deficiência da função nervosa.

– A neurite pode acompanhar uma reacção de Tipo 1, suave ou grave;

– Pode estar associado à dor num ou mais nervos;

– O doente pode queixar-se de PNF, por exemplo, perda de sensibilidade ou fraqueza muscular;

– Pode ser em silêncio, ou seja, sem sintomas claros.

Tradicionalmente, a prescrição de esteróides seria feita por um médico assistente num centro de referência. Alguns autores observaram, no entanto, que a maioria dos doentes encaminhados nunca compareceu para tratamento posterior, por uma razão ou outra, levando ao desenvolvimento de protocolos para gerir doentes com esteróides em clínicas periféricas (Becx-Bleumink M, 1990).

Prednisolona oral é o esteróide normalmente utilizado. No tratamento com prednisolona, os principais parâmetros são a dose inicial e a duração do tratamento. Existe um compromisso entre dar o suficiente para proporcionar um tratamento eficaz, evitando dar demasiado e arriscando os eventos adversos dos medicamentos.

Em geral, a dose inicial deve ser entre 0,5 e 1,0 mg por kg de peso corporal por dia. Na maioria dos casos 0,5 mg/kg diários, seria uma dose inicial apropriada para uma primeira dose, o que significa 30 ou 40 mg diários para a maioria dos adultos. Estudos recentes sugerem que um tratamento com uma duração de 20 semanas dá os melhores resultados, começando com 30 mg ou 40 mg, dependendo do peso corporal (Quadro 3).

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades20

Quadro 3: Cronograma de tratamento para a gestão da reacção de Tipo 1 com esteróides

DoseSemana

1–2 3–4 5–8 9–12 13–16 17–20

40 mg

30 mg

25 mg

20 mg

10 mg

5 mg

Esteróides: Eventos adversos

A lista de eventos adversos associados aos esteróides é longa. Todos são agravados pelo tratamento prolongado em doses elevadas (ILEP, 2002). São sugeridos testes e estratégias adequados para a gestão desses eventos. Note-se que os dois primeiros problemas enumerados são os mais frequentemente encontrados.

• Imunossupressão: Podem ocorrer problemas associados à tuberculose, septicemia e osteomielite não reconhecidas. Podem ser indicados testes radiológicos e microbiológicos relevantes. Várias infecções e infestações intestinais podem ser exacerbadas, nomeadamente com Strongyloides e várias causas de disenteria. A microscopia e a cultura das fezes podem ser úteis. É normal administrar albendazol (dose para adultos: 400 mg duas vezes por dia durante três dias) a qualquer pessoa que se inicie com esteróides para a neurite.

• Diabetes: A possibilidade de um tratamento com esteróides precipitar ou piorar a diabetes deve ser tida em conta. O açúcar na urina e um exame aleatório de açúcar no sangue são os testes mais básicos; um único nível de açúcar no sangue feito duas horas após uma bebida de glucose é também um teste de rastreio útil e é mais simples de organizar do que um teste de tolerância total à glucose. Se a diabetes ocorrer, pode ser tratada da forma normal, mas pode resolver-se quando os esteróides são interrompidos.

• Osteoporose, necrose avascular da cabeça femoral: Trata-se principalmente de um problema numa população idosa e sedentária.

• Distúrbios mentais, euforia: Alguns sentimentos de euforia são comuns e podem explicar o facto de alguns doentes não quererem parar a medicação.

• Dispepsia, ulceração péptica: Não é geralmente um problema grave e pode ser facilmente administrado com antiácidos, um bloqueador de receptor H2 (por exemplo, famotidina) ou um inibidor da bomba de protões (por exemplo, omeprazol).

Orientações técnicas 21

• Síndrome de Cushing: Consiste num conjunto de sinais e sintomas provocados por uma elevada ingestão de esteróides e inclui: inchaço do rosto (a chamada face da lua cheia), acne, hirsutismo e aumento de peso. Resolve-se quando os esteróides são interrompidos.

• Supressão do crescimento: O uso prolongado de esteróides em crianças pode limitar o crescimento devido à supressão do córtex adrenal e do eixo pituitário.

• Atraso do crescimento intra-uterino: Por razões semelhantes, o crescimento do feto pode ser retardado quando são utilizados esteróides durante a gravidez.

• Atrofia adrenal (doença de Addison): Os esteróides imitam a acção dos glicocorticóides produzidos pela glândula adrenal, de modo que a actividade da glândula pode ser suprimida quando é administrada a medicação com esteróides. É por isso que a dose de esteróides é reduzida gradualmente após qualquer curso de mais de três semanas, para dar tempo à recuperação da função adrenal. A doença de Addison pode levar ao colapso e à hipotensão se a medicação com esteróides for interrompida de repente.

• Hipertensão, glaucoma, cataratas: O uso de esteróides não é um factor causal importante nessas condições, mas pode agravá-las. A tensão arterial e a visão devem ser regularmente controladas.

Estudos sobre o tratamento da neurite

Ensaios prospectivos, aleatorizados e controlados:

• TRIPOD 1 – prevenção da neurite, Nepal e Bangladeche (Smith W et al., 2004)

• TRIPOD 2 – tratamento de PNF leve, Nepal e Bangladeche (van Brakel W et al., 2003)

• TRIPOD 3 – tratamento de uma antiga PNF, Nepal e Bangladeche (Richardus J et al., 2003)

• Índia – comparação de três regimes de esteróides (Rao P et al., 2006)

• Nepal – metilprednisolona (Walker S et al., 2011)

• Etiópia – ciclosporina (Lambert S et al., 2016)

• AZALEP – azatioprina, Índia (Lockwood D et al., 2017)

• TENLEP – 20 versus 32 semanas de prednisolona, multicêntrica (Wagenaar I et al., 2017)

Avaliações de Cochrane:

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades22

• Cirurgia descompressiva para tratamento de lesões nos nervos da lepra (van Veen N et al., 2012)

• Corticosteróides no tratamento de lesões nervosas da lepra (van Veen N et al., 2016)

No início do século XXI, o tratamento da neurite com prednisolona tinha-se tornado razoavelmente normalizado, embora não tivessem sido realizados ensaios controlados aleatórios. Estudos subsequentes analisaram a possibilidade de prevenção da neurite e procuraram também definir mais claramente as indicações para o tratamento com prednisolona. Foram igualmente estudados medicamentos alternativos ou esteróides, a fim de reduzir os eventos adversos associados ao tratamento com esteróides de longa duração.

Uma avaliação de Cochrane (van Veen, 2012) sobre a utilização de corticosteróides para o tratamento de lesões nervosas na lepra analisou cinco estudos publicados antes de 2012. Três deles deram resultados negativos:

• O tratamento de PNF leve não trouxe benefícios duradouros sobre o placebo (van Brakel W, 2003); neste estudo, a “perda sensorial leve” foi definida como a perda sensorial detectada pelo uso cuidadoso de monofilamentos graduados, mas onde a sensação foi considerada normal quando a esferográfica foi utilizada;

• O tratamento das PNF que ocorreram há mais de seis meses não foi benéfico (Richardus J, 2003);

• A utilização inicial de metilprednisolona IV em doses elevadas não melhorou os resultados (Walker S, 2011).

Os outros dois estudos – infelizmente ambos com várias falhas metodológicas – mostraram um efeito benéfico dos esteróides. Sugeriram que um tratamento mais longo com prednisolona era mais importante do que uma dose inicial elevada (Rao P, 2006; Garbino J, 2008).

Uma razão importante pela qual a função nervosa pode não recuperar quando tratada com esteróides é que o problema pode ter estado presente durante mais de seis meses, altura em que os esteróides são ineficazes (Richardus J, 2003). Isto pode ocorrer sobretudo nos novos casos que apresentam PNF, quando pode ser difícil obter informações precisas sobre a duração. O ideal seria que todos os doentes com PQT fossem avaliados regularmente (pelo menos de três em três meses, muitas vezes todos os meses) para que, quando ocorrer uma nova PNF, esta possa ser facilmente identificada por comparação com registos anteriores e tratada atempadamente.

O melhor regime de esteróides para tratar reacções e a neurite continua a ser debatido, tanto em termos de dose como de duração. O ensaio TENLEP mostrou que o prolongamento do tratamento para 32 semanas proporcionou poucos benefícios adicionais (Wagenaar, 2017). O tratamento com esteróides actualmente recomendado dura 20 semanas (Rao, 2006).

Orientações técnicas 23

No estudo TENLEP, o regime de 20 semanas começou com uma dose mais elevada (1 mg/kg, até 60 mg) durante uma semana. Em outros aspectos, foi muito semelhante com um período médio de 8 semanas a 20 mg por dia (Wagenaar, 2017). Convém salientar que cerca de 15% dos doentes de ambos os grupos deste ensaio (ou seja, tratamentos de 20 e 32 semanas) necessitaram de prednisolona extra devido à falta de melhoria ou ao agravamento da função nervosa uma vez terminada a evolução normal. As reacções foram eventualmente bem controladas com este tratamento adicional.

O estudo TRIPOD 1 analisou o possível efeito de uma dose profiláctica de prednisolona (20 mg por dia) administrada durante os primeiros três meses (mais uma diminuição gradual da dose no mês 4) da PQT: houve um efeito profiláctico a curto prazo, mas este não se manteve. Ambos os grupos de intervenção e de controlo apresentaram níveis semelhantes de reacção e neurite num ano (Smith W, 2004).

Os medicamentos de segunda linha utilizados no tratamento da neurite incluíram azatioprina e ciclosporina (Lockwood D et al., 2017; Lambert S et al., 2016). A ciclosporina pode ser uma alternativa segura para doentes com neurite que não estejam a melhorar com prednisolona ou que estejam a ser afectados por eventos adversos relacionados com prednisolona e onde a azatioprina não é recomendada.

As provas de ensaios controlados aleatorizados não mostram um benefício adicional significativo da cirurgia apenas em relação ao tratamento com esteróides (van Veen N, 2009).

3.2 Tratamento da reacção de Tipo 2

Tratamento recomendado

Os estudos relevantes incluem:

• Avaliações de Cochrane – Interventions for ENL (van Veen N et al., 2009);

• Thalidomide versus prednisolone (Kaur I et al., 2009);

• Additional clofazimine to prevent ENL (Balagon M et al., 2011; Maghanoy A et al., 2017).

O ENL leve é tratado com analgésicos (aspirina, indometacina, ibuprofeno, diclofenaco, acetaminofeno, tramadol). Se houver agravamento e aumento na Pontuação da Escala de Gravidade de ENLIST para 8 ou mais, o ENL deve ser reclassificado como ‘grave’ e gerido em conformidade. A monitorização deve ser feita de duas em duas semanas, utilizando a Escala de Gravidade e testes de função nervosa.

O ENL grave é melhor tratado inicialmente com doses moderadas de 30-40 mg de prednisolona (para um adulto) por dia. Esta tem uma acção terapêutica rápida e definida (Mahajan et al., 2003; van Veen et al., 2009).

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades24

Os ENL recorrente e crónico requerem doses aumentadas ou prolongadas de esteróides para controlar a inflamação e os sintomas. Os doentes com ENL crónico podem tornar-se dependentes de esteróides. Foram relatados efeitos colaterais graves de um longo curso de tratamento com esteróides. Walker et al., 2014 encontraram uma mortalidade de 9% em doentes etíopes que fizeram tratamento com esteróides para o ENL; isso foi causado por complicações relacionadas com os esteróides, como a sépsis, e ocorreu principalmente em pessoas jovens.

A Avaliação de Cochrane (van Veen, 2009) analisou 13 estudos envolvendo 445 participantes. A qualidade geral dos estudos foi fraca e o tamanho das amostras muitas vezes pequeno. Prednisolona, talidomida e clofazimina deram geralmente melhores resultados do que outros tratamentos (como os medicamentos anti-inflamatórios não esteróides e pentoxifilina).

As indicações para o uso de talidomida ou clofazimina como medicamentos adicionais ou de segunda linha são as seguintes:

• Não respondentes a esteróides: os que requerem doses mais elevadas de esteróides em cada episódio de ENL;

• Dependência de esteróides: os que ficam muito afectados com a diminuição gradual da dose de esteróides;

• Doentes com uma comorbidade grave.

Talidomida é uma alternativa eficaz, que permite um controlo rápido dos sintomas. Kaur et al. mostraram que a talidomida proporciona um melhor controlo dos sintomas do que a prednisolona. Nabarro et al., 2016 mostraram que a utilização da talidomida reduziu a dependência da prednisolona. A talidomida não é útil na gestão da neurite, que é menos frequente nas reacções de Tipo 2 em comparação com as reacções de Tipo 1. É útil na gestão do mal-estar geral, da febre e da dor de ENL grave. A dose para adultos varia entre 100 mg e 400 mg diariamente, em doses divididas. Um regime típico utilizado na Índia começou com 300 mg por dia, em doses divididas, diminuindo para 100 mg por dia durante duas a três semanas, dependendo da resposta (Kaur, 2009). Uma dose de manutenção pode ser necessária nos casos crónicos, sendo a dose determinada pela resposta.

Existem eventos adversos reconhecidos com a talidomida, incluindo sedação, neuropatia periférica e trombose venosa. Aspirina de baixa dose poderia ser utilizada para reduzir o risco de trombo-embolia (van Veen, 2009; Mahmoud, 2019). A talidomida pode iniciar efeitos teratogénicos quando ingerida no início da gravidez. As mulheres podem tomar talidomida, mas apenas quando são supervisionadas no âmbito de um programa de prevenção da gravidez. Isto inclui o facto de os doentes serem observados de 28 em 28 dias, terem testes negativos de gravidez e utilizando dois métodos diferentes de contracepção, antes de receberem uma prescrição de talidomida.

Clofazimina é largamente utilizada na gestão de ENL. Contudo, os dados de apoio são geralmente de má qualidade e são necessários mais estudos para mostrar como pode

Orientações técnicas 25

ser utilizada de forma mais eficaz. São necessárias quatro a seis semanas para se tornar eficaz. A dose necessária para controlar o ENL é superior à dose (50 mg diários) utilizada na PQT (van Veen et al., 2009). Um regime amplamente utilizado é o seguinte:

• 300 mg, diariamente, durante 1 mês;

• 200 mg, diariamente, durante 3–6 mês;

• 100 mg, diariamente, enquanto persistirem os sintomas de ENL.

Não tem nenhum efeito nos episódios agudos, mas pode ser eficaz na mitigação dos ENL crónico e recorrente. A pigmentação da pele associada pode ser estigmatizante (van Veen et al., 2009). Um pequeno estudo nas Filipinas, em que os doentes foram aleatoriamente escolhidos para tomar 100 mg de clofazimina por dia ou placebo, não mostrou nenhum benefício de clofazimina na redução da frequência ou gravidade de ENL (Maghanoy, 2017).

Outros medicamentos têm sido utilizados como tratamentos de segunda linha para ENL. Todos têm sido utilizados em estudos de pequena escala. São: pentoxifilina, metotrexato, ciclosporina e azatioprina. A eficácia do metotrexato neste sentido está a ser actualmente testada num grande ensaio aleatório controlado.

Os inibidores do factor de necrose tumoral alfa (tumor necrosis factor-alpha, TNFĐ) (por exemplo, infliximab em um caso (Faber, 2006) e etanercepte em três casos (Ramien, 2011; Santos, 2017; Thangaraju, 2016)) têm sido utilizados para tratar doentes com ENL recorrente (Cogen, 2020). Esta é uma área que irá passar por uma expansão nos próximos anos à medida que os agentes biológicos se tornarem mais baratos e mais utilizados. Os perigos são a imunossupressão grave e as infecções oportunistas

Outra classe de medicamentos promissores são os inibidores da fosfodiesterase-4 que evitam a degradação do monofosfato de adenosina cíclica, diminuindo assim a produção de citocinas pró-inflamatórias. Por exemplo, apremilast é utilizado no tratamento da psoríase e síndrome de Behcet (Hatemi, 2019). Um análogo de apremilast está actualmente a ser estudado em doentes com ENL, com resultados iniciais promissores.

Disponibilidade de talidomida para o tratamento de reacções de Tipo 2

A talidomida foi produzida pela primeira vez em 1957 e foi retirada em 1961 devido aos seus efeitos teratogénicos quando administrada no início da gravidez. É, no entanto, útil para o tratamento do ENL grave.

O Sétimo Comité de Especialistas da OMS sobre Lepra (OMS 1997) declarou: “A talidomida também é eficaz para o tratamento do ENL grave. Deve-se ressaltar, porém, que devido aos seus efeitos teratogénicos, a talidomida nunca deve ser administrada a mulheres em idade fértil. A talidomida só deve ser utilizada em doentes do sexo masculino ou feminino pós-menopausa que tenham ficado dependentes de corticosteróides; só deve ser administrada sob estreita supervisão médica no centro de referência mais próximo.”

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades26

Em 1998, a Food and Drug Administration dos Estados Unidos aprovou a utilização da talidomida para o ENL, no âmbito de um programa global de controlo da prescrição, distribuição e uso do medicamento (Zeldis, 1999).

Em 2003, a OMS produziu um documento intitulado “Nenhum papel da talidomina na lepra”. O documento argumentava que o ENL grave é agora uma ocorrência rara, e que, uma vez que a talidomida não tratava a neurite, era pouco benéfica; alertava para uma nova geração de bebés deformados, caso a talidomida fosse promovida para a gestão de ENL.

O Oitavo Comité de Especialistas da OMS sobre Lepra (OMS 2012) declarou: “Embora vários estudos tenham demonstrado a utilidade da talidomida no tratamento de reacções agudas de ENL, a sua utilização é restrita devido aos seus efeitos teratogénicos e a considerações éticas e legais. Além disso, a disponibilidade de talidomida é limitada por restrições à sua importação e fornecimento em muitos países endémicos. Por conseguinte, a OMS recomenda a sua utilização apenas sob estrita supervisão médica em instalações de referência especializadas”.

Dois desenvolvimentos intensificaram a discussão sobre a utilização da talidomida. Um grande estudo retrospectivo na Etiópia indicou a natureza crónica da doença, que persistiu durante mais de 24 meses em 50% dos doentes diagnosticados com ENL, e durante mais de quatro anos em 14%; além disso, os doentes com ENL crónico apresentaram uma taxa de mortalidade significativamente maior, o que na maioria dos casos poderia ser atribuído ao uso prolongado de esteróides (Walker, 2014). Isto demonstrou claramente a necessidade de tratamento moderado com esteróides na gestão de ENL grave e prolongado, sendo a talidomida o medicamento mais eficaz neste sentido.

O segundo desenvolvimento envolve uma maior familiaridade do pessoal de saúde a nível mundial com o uso de medicamentos potencialmente perigosos; e a utilização de protocolos mais sólidos para a gestão de prescrições e fiscalização de medicamentos, para que um medicamento perigoso (como a talidomida) possa ser utilizada com segurança, quando indicada. Os protocolos nacionais podem ser derivados dos desenvolvidos nos Estados Unidos em 1998 (Zeldis, 1999). Os elementos-chave são:

• Registo de prescritores, farmacêuticos e doentes, para o controlo do acesso; meios adequados para manter a talidomida num local seguro, como acontece com outros medicamentos perigosos;

• Educação de prescritores, farmacêuticos e doentes, relativamente a medidas contraceptivas e testes de gravidez (por exemplo, o uso de dois métodos diferentes de contracepção e a necessidade de um teste de gravidez mensal, bem como a disponibilidade de contracepção de emergência). É também aconselhável que a contracepção seja utilizada quando o parceiro masculino está a utilizar talidomida. Fornecimento adequado de suprimentos relevantes;

• Monitorização da conformidade e apresentação de relatórios.

Orientações técnicas 27

A prescrição de talidomida para pacientes individuais deve seguir as etapas descritas no Quadro 1. Um protocolo mais preciso para reservar o uso de talidomida para casos mais graves, por exemplo envolvendo o uso obrigatório da Escala de Severidade do ENL, deve ser considerado. Também pode ser aprovado em consulta com profissionais de saúde, médicos, Ministérios da Saúde e representantes de pessoas afetadas pela hanseníase.

Quadro 1: Prescrição de talidomida no programa STEPS2 programme

1. O prescritor deve garantir que o paciente compreenda os riscos do tratamento com talidomida.

2. Mulheres em idade fértil devem concordar em usar duas formas confiáveis de contracepção, começando quatro semanas antes do início da terapia com talidomida e continuando até quatro semanas após a interrupção do tratamento.

3. Mulheres em idade fértil devem concordar em fazer testes de gravidez mensais durante o tratamento.

4. Não se sabe se a talidomida está presente no espermatozóide ou no sêmen, ou se há algum risco para o desenvolvimento fetal dessa fonte, portanto, os homens que tomam a talidomida devem usar preservativos ao ter relações sexuais com mulheres em idade reprodutiva.

5. Os pacientes não devem doar sangue ao tomar talidomida.

6. Os pacientes nunca devem compartilhar os medicamentos com qualquer outra pessoa, mesmo que tenham sintomas semelhantes.

7. Qualquer paciente que esteja recebendo a prescrição de talidomida deve assinar um formulário de consentimento informado.

8. Os comprimidos não utilizados devem ser devolvidos à unidade de saúde para eliminação.

9. Deve ser assegurado um acompanhamento rigoroso dos pacientes em talidomida.

Mais informações sobre o uso da talidomida são fornecidas no Annexo 3.

3.3 Tratamento das reacções: resumo

Os esteróides continuam a ser o medicamento preferido para as reacções de Tipo 1 e Tipo 2. Proporcionam benefícios significativos, tanto no alívio dos sintomas como na restauração da função nervosa. Existem, contudo, eventos adversos significativos, especialmente quando a utilização dos esteróides é prolongada, incluindo um risco de mortalidade. Devem ser envidados todos os esforços para reduzir a dependência dos esteróides através da utilização dos chamados medicamentos com esteróides reduzidos.

Actualmente, a talidomida é o medicamento com esteróides mais utilizado na luta contra a lepra, embora só seja aplicável à reacção de Tipo 2. Deverão ser feitos outros esforços para aumentar a disponibilidade de talidomida para as pessoas com ENL, tomando as precauções necessárias para evitar também os incidentes adversos desse medicamento.

2 STEPS: System for Thalidomide Education and Prescribing Safety ™ (Celgine Corporation, New Jersey, USA); Sistema para Educação sobre Talidomida e Segurança de Prescrição

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades28

4 Gestão das reacções e neurite: Abordagem progressiva

4.1 Princípios de gestão das reacções e neurite

Reacções e neurite frequentemente ocorrem em conjunto. A incapacidade na lepra é causada em grande parte por danos nos nervos periféricos. Para evitar isso, é essencial que os profissionais de saúde tenham uma compreensão básica da função nervosa e da forma de a avaliar: a perda da função dos nervos é um sinal de lesão nervosa e é a indicação mais importante para o tratamento com esteróides.

A prednisolona é o medicamento esteróide mais utilizado e é a base do tratamento de reacções e neurite. A inflamação que ocorre durante as reacções é impulsionada pelo sistema imunitário, respondendo à presença de M. leprae na pele e nos nervos. Há muitas características de inflamação. Uma das características mais importantes neste contexto é o edema ou inchaço dos tecidos. Os nervos periféricos estão cobertos por uma bainha fibrosa que não se expande muito; quando o edema ocorre, a pressão no interior do nervo aumenta, levando rapidamente à perda da função das próprias fibras nervosas. Os esteróides têm um amplo efeito anti-inflamatório, que inclui uma rápida redução do edema. Quando utilizados em reacções de lepra com neurite, o efeito é muitas vezes uma melhoria drástica. Os medicamentos anti-inflamatórios não esteróides, como o ibuprofeno, não têm esse efeito sobre o edema. Embora possam reduzir parte da dor associada às reacções, não ajudam a restabelecer a função dos nervos.

Infelizmente, os esteróides produzem acontecimentos adversos bastante complexos, particularmente se tomados por longos períodos. Estes são aqui resumidos e discutidos mais aprofundadamente no capítulo anterior. Deve-se realçar, nesta fase, que há sempre um equilíbrio a encontrar entre a utilização de esteróides pelo seu efeito benéfico na prevenção de lesões nervosas incapacitantes e o uso excessivo que conduz a complicações graves.

O reconhecimento e a gestão das reacções e das lesões nos nervos variam consideravelmente em todo o mundo. Um grande número de casos de lepra, talvez mesmo uma maioria em termos globais, são tratados com PQT em clínicas que não são actualmente capazes de avaliar ou gerir as reacções no local: os doentes com sintomas que sugerem uma reacção devem ser encaminhados para um nível mais elevado. Outro grupo

Orientações técnicas 29

de doentes é gerido por profissionais de saúde que são capazes de utilizar ferramentas básicas para avaliar a função nervosa, e que são depois capazes de administrar tratamento com esteróides. Em algumas clínicas, o pessoal é formado na utilização de ferramentas mais complexas, incluindo monofilamentos de nylon, que são mais precisos e permitem identificar as lesões nos nervos numa fase mais precoce.

Embora fosse ideal que todos os doentes fossem avaliados e tratados com os melhores instrumentos, isso não acontece actualmente por várias razões: em particular, a falta de formação nas competências necessárias e a falta dos instrumentos ou medicamentos necessários. Neste guia técnico, estes níveis de cuidados são explicados de forma mais pormenorizada (Quadro 4). Este guia tem como objectivo ajudar o pessoal da saúde a melhorar a sua compreensão e desempenho no seu nível actual; e, depois, se as condições o permitirem, a subir para o nível seguinte de cuidados. Factores limitativos cruciais na gestão das reacções no terreno são a disponibilidade de corticosteróides, como prednisolona, e monofilamentos de nylon para testar com precisão a perda sensorial.

Os níveis dependem, em primeiro lugar, da disponibilidade de prednisolona para tratar a neurite. O albendazol deve normalmente ser administrado quando se inicia um tratamento com prednisolona, por isso este medicamento também deve estar disponível. Da mesma forma, os monofilamentos de nylon são um método mais preciso para detectar lesões nervosas precoces. Se os programas nacionais de luta contra a lepra forem capazes de disponibilizar esses itens onde quer que a PQT seja usada para o tratamento dos doentes com lepra, é possível uma melhor gestão das reacções. Um segundo requisito é a formação e supervisão adicionais do pessoal que gere os casos de lepra, para que compreenda a função nervosa e esteja mais aptos a testar as perturbações neurológicas funcionais.

A todos os níveis, é agora muito mais fácil consultar um colega mais experiente por telefone ou mensagem, e esta oportunidade deve ser aproveitada ao máximo, para gerir eficazmente cada caso. Do mesmo modo, a prática da utilização das ferramentas disponíveis, talvez sobre si próprio ou sobre um amigo, pode dar uma confiança adicional no método.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades30

Quadro 4: Os níveis de cuidados dependem do equipamento e da medicação disponíveis na clínica

Ambiente clínicoNível 1

Identificar possíveis reacções e analisar

Nível 2Utilizar ferramentas simples para avaliar o doente e iniciar o

tratamento

Nível 3Utilizar ferramentas mais complexas e

mais precisas para a detecção precoce da

neurite

O pessoal dispõe de tempo, formação e monofilamentos de nylon para uma avaliação mais precisa

Utilizar ferramentas disponíveis para verificar se há lesões nervosas precoces e tratar com prednisolona

A prednisolona está disponível; os monofilamentos de nylon não estão disponíveis

Utilizar uma esferográfica para testar a perda sensorial; tratar novos episódios de neurite com prednisolona

A prednisolona e o albendazol não estão regularmente disponíveis

Compreender os sintomas e sinais de reacções e neurite; consultar e analisar

4.2 As quatro etapas na gestão das reacções da lepra

Reconhecimento: Saber quando está presente uma reacção

O doente corre um risco elevado de reacção?

No momento de fazer um diagnóstico da lepra, é muitas vezes possível determinar se essa pessoa tem um risco elevado de desenvolver uma reacção da lepra:

Risco elevado Risco médio - baixo risco

Caso multibacilarcom incapacidade de grau 2

Todos os outros casos

Os doentes com elevado risco de reacção devem ser cuidadosamente monitorizados durante a PQT.

Orientações técnicas 31

O doente tem sintomas de uma reacção?

Seguem-se possíveis sintomas de reacção:

• Dor nas lesões cutâneas ou nos nervos;

• Dormência nas mãos ou nos pés;

• Fraqueza dos músculos das mãos ou dos pés;

• Incapacidade de fechar bem os olhos.

Há sinais de inflamação na pele?

As lesões cutâneas podem parecer vermelhas e inflamadas.

Pode haver uma ligeira febre.

Dois tipos de reacção: Tipo 1 e Tipo 2

• Reacção de Tipo 1:

– As lesões cutâneas da lepra estão inflamadas;

– Pode haver uma ligeira febre, mas o doente não se sente muito mal.

• Reacção de Tipo 2:

– Há vários nódulos vermelhos e inflamados de 1-2 cm na pele;

– As lesões da lepra em si são menos inflamadas;

– A febre é muitas vezes elevada; o doente sente-se mal; e tem dores.

Perguntas para os doentes sobre os seus nervos

Podem ser feitas as seguintes perguntas ao doente em que se presume uma reacção leprosa:

• “Tem dores recentes em algum dos seus membros?”

• “Tem alguma dormência ou perda de sensibilidade nas mãos ou nos pés?”

• “Há alguma fraqueza nas mãos ou nos pés?”

• “Tem dificuldade em fechar os olhos?”

O problema da neurite silenciosa

Por vezes, os nervos podem ficar danificados sem sintomas óbvios, o que é chamado de “neurite silenciosa”. Para detectar isso, é aconselhável verificar regularmente o funcionamento dos nervos durante a PQT. Deve ser feito pelo menos de três em três meses.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades32

Testes das funções dos nervos

Os testes das funções dos nervos envolvem:

(a) Teste de sensibilidade nas mãos e nos pés (explicação completa de esferográfica e monofilamentos);

(b) Teste de força muscular nos olhos, mãos e pés;

(c) Registo dos resultados;

(d) Interpretação dos resultados: o que significam os resultados?

(e) Periodicidade dos testes: com que frequência deve ser feita a avaliação?

Tratamento para prevenir a incapacidade

(a) Tratamento de uma reacção suave limitada à pele;

(b) Tratamento de lesões nervosas precoces: esteróides e a necessidade de albendazol;

(c) Tratamento de uma reacção de Tipo 2;

(d) Registo do tratamento.

Acompanhamento: Garantir a realização de bons progressos

(a) Monitorização do tratamento e verificação dos efeitos colaterais dos esteróides;

(b) Monitorização da função dos nervos e outros sinais da reacção;

(c) Quando são necessários esteróides adicionais?

(d) Acompanhamento das reacções de Tipo 2, utilizando a Escala de Gravidade para o ENL;

(e) Gestão das lesões nervosas de longa duração;

(f) Notificação das reacções: um ponto ideal para notificar os casos de reacção é a conclusão do tratamento. O grau de incapacidade no final do tratamento deve ser registado, com indicação (Sim/Não) da ocorrência de uma reacção em qualquer momento.

4.3 Aconselhamento e promoção da saúde

Informar os doentes sobre a sua doença e sobre o que esperar durante o tratamento está a tornar-se cada vez mais importante, à medida que a sensibilização para a saúde aumenta e os doentes são bombardeados com mensagens de saúde de todos os lados. Enquanto a

Orientações técnicas 33

promoção da saúde fornece informações e procura orientar um comportamento saudável, o aconselhamento procura compreender as pressões específicas que cada doente está a enfrentar e ajudá-los a desenvolver estratégias eficazes de resposta próprias.

O aconselhamento por pares está a revelar-se um instrumento eficaz para o atendimento aos doentes: os doentes curados que foram afectados pela doença podem demonstrar maior empatia e compreensão. O aconselhamento no momento do diagnóstico pode assegurar ao novo doente que o tratamento é eficaz e que qualquer agravamento dos sintomas também pode ser tratado com tratamento adicional. Uma maior tranquilidade enquando ocorrer uma reacção pode ajudar o doente a prosseguir com o tratamento.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades34

5 Algoritmos para a gestão de pessoas afectadas pela lepra num ambiente clínico

5.1 Algoritmo 1: Reconhecer quando está presente uma reacção

Sim

Sim

Não

Não

Acolher os doentes e contribuir para que se sintam à vontade

Há alguns sintomas de uma

reacção, como vermelhidão nas lesões cutâneas ? Existe alguma dor nos membros, dormência,

formigueiro ou fraqueza ?

Foi efectuado um teste de funções dos nervos últimos

3 meses ?

Não tomar nenhuma outra medida

Providenciar testes de funções

dos nervos

Orientações técnicas 35

5.2 Algoritmo 2: Saber se uma reacção é de Tipo 1 ou de Tipo 2

Sim

Sim

Não

Não

Se houver sintomas, saber que tipo de reacçao está a

ocorrer é importante, porque o tratamento é diferente

As antigas lesões cutâneas da lepra estão

inflamadas?

Há novos nódulos inflamados

além das antigas lesões cutâneas?

Testar as funçoes dos nervos e discutir cum o

supervisor. Pode ser uma neurite silenciosa

Isto é tipico de uma reacçao de

Tipo 1

Isto é tipico de uma reacçao de Tipo 2

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades36

5.3 Algoritmo 3: Testes das funções dos nervos

O teste da função dos nervos implica examinar primeiro a função sensorial e, depois, a função motora dos nervos que podem ser danificados na lepra.

Sim

SimNão

Não

Teste de sensibilidade em quatro locais em ambas as

mãos e ambos os pés

Há algum ponto onde a

pessoa possa não ter nenhuma

sensaçao?

Existe alguma fraqueza

de qualquer músculo ?

NEURITE... É uma boa ideia refazer os testes, para

confirmar os resultados. Convém registrar os resulta-

dos na ficha do doente.Função muscular

normalSensaçao normal

Testes sensoriais de 3 nervos:• Nervos ulnar e mediano

na mão• Nervo tibial posterior no

péTestes motores de 4 nervos:• Nervo facial – fechamento dos

olhos• Nervo ulnar – dedo minimo

para fora• Nervo mediano – polegar para

cima• Nervo popliteo – pé para cima

Orientações técnicas 37

5.4 Algoritmo 4: Tratamento da reacções de Tipo 1 e neurite

Sim

Não

Não

Sim

As reacçoes de Tipo 1 e a neurite ocorrem muitas vezes em conjunto e são tratadas de forma semelhante. Se tiver sido identificada

perda da função nervosa (perda sensorial ou fraqueza motora), é importante saber a duração da ocorrência. Não é eficaz para o

tratamento de lesões nervosas antigas – deficiência que existe há mais de 6 meses. O ideal seria analisar os registos anteriores para

confirmar se a actual lesão é nova.

Há novas lesões nervosas, de duração inferior a 6 meses ?

Há alguma inflamaçao grave de

manchas na pele, com ulceração ?

Esta é uma reacçao ligeira de Tipo 1, que pode ser

tratade com medicamentos anti-inflamatórios não

esteroides

Uma reacção grave de Tipo 1 pode ser tratada com o mesmo

regime de esteroides que a neurite

É uma neurite que requer tratamento

com estoroides

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades38

5.5 Algoritmo 5: Acompanhamento de doentes com reacção de Tipo 1 e neurite

SimNão

Embora muitos doentes reajam bem ao uso padronizado de esteroides, cerca de 15% podem ter algum agravamento dos

sintomas ou da função dos nervos. Por este motivo, é aconselhável testar a função dos nervos de 2 em 2 semanas, enquanto o

doente estiver a tomar esteroides. Pode ser necessário modificar a dose para gerir eficazmente a neurite.

Avaliação de 2 em 2 semanas: Há dor contínua ou danos

adicionais aos nervos ?

Discutir com o supervisor. Considerar a possibilidade

de aumentar a dose de prednisolona

Continuar com o tratamento padronizado de

esteroides, com redução gradual das doses

Outros tratamentos : Na fase aguda, o repouso e a imobilização do membro afectado podem ajudar a aliviar a dor. À medida que começa a recuperação, o alongamento e a terapia baseada na prática de exercícios podem reduzir a dor e melhorar a função muscular. A cirurgia pode ser

utilizada para descompomprimir um nervo na fase aguda.

Orientações técnicas 39

Acompanhamento de doentes com reacções de Tipo 1 ou neurite

Na maioria dos doentes, a função dos nervos danificados recupera rapidamente, mas podem ocorrer outros episódios de reacção.

Se um doente sofrer um agravamento da função dos nervos enquanto ainda estiver a reduzir as doses de esteróides, é aconselhável aumentar a dose para 30 mg diários novamente, e depois reduzir por outro período de 20 semanas, de acordo com o plano padrão. Se um doente já tiver completado um ciclo de esteróides, mas sofrer um novo episódio de comprometimento da função nervosa, o mesmo ciclo pode ser reiniciado desde o início.

Dor de longa duração nos nervos ou membros: dor neuropática

Embora a neurite apresente frequentemente dores, esses episódios inflamatórios tornam-se muito menos comuns após três anos ou mais, uma vez que a lepra subjacente tenha sido curada. A dor que ocorre mais tarde pode ser devido a uma de duas razões:

(1) Recaída da lepra. As mesmas reacções inflamatórias podem ocorrer de novo; se a recaída puder ser confirmada, as reacções e a neurite podem ser tratadas da mesma forma que anteriormente.

(2) Dor neuropática. Nesta afecção, um nervo que tenha sido anteriormente afectado por doença ou trauma, actua como um locus da dor. Os sintomas incluem formigamento ou sensações de ardor. A inflamação é mínima, por isso o tratamento com esteróides é ineficaz, embora alguns outros medicamentos possam ser úteis. Os doentes com dor neuropática devem iniciar o tratamento com paracetamol, e, se necessário, utilizar um não-esteróide como ibuprofeno; outros medicamentos possíveis incluem amitriptilina e gabapentina.

É importante evitar o uso contínuo de esteróides na lepra, por causa dos eventos adversos. As reacções e a neurite podem ser tratadas com o ciclo padrão de 20 semanas, que pode ter de ser prolongado por algumas semanas, em alguns casos.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades40

5.6 Algoritmo 6: Início do tratamento para reacção de Tipo 2

Na reacção de Tipo 2, são por vezes necessários ciclos mais longos de esteróides, mas deve sempre procurar-se uma dose reduzida, usando medicamentos adicionais como clofazimina ou talidomida. As dores nervosas em doentes tratados há anos podem ser causadas pelas dores neuropáticas, que requerem medicamentos diferentes.

Sim

Não

Não

Sim

Qualquer novo caso de reacção de Tipo 2 deve ter avaliações da função dos nervos e da Escala de Gravidade

Há novas lesões nervosas, de duração

inferior a 6 meses, bem como uma reacção

de Tipo 2 ?

O doente sente algum desconforto grave ?

Esta é uma reacção ligeira de Tipo 2, que pode ser tratada

com medicamentos anti-inflamatórios não esteroides

Uma reacção mais grave de Tipo 2 pode ser tradada inicialmente com

esteroides, mas é necessário um acompanhamento rigoroso

Iniciar o tratamento com o mesmo regime de

esteroides que a neurite e uma reacção de Tipo 1

As reacções de Tipo 2 são bastante variáveis e podem continuar a repetir-se durante vários anos. A Escala de Gravidade de ENL é uma

forma útil de monitorizar o progresso. Os esteroides são eficazes, mas o uso prolongado nos casos crónicos constitui um problema. A talidomida

é eficaz e reduz a necessidade de tratamento prolongado com esteroides. Os efeitos teratogénicos da talidomida implicam que ela não esteja

disponível para utilização em muitos países. Quando a talidomida não pode ser utilizada, a clofazimina é uma alternativa mais fraca.

Orientações técnicas 41

Lesões nos nervos

É importante monitorizar a função nervosa nas reacções de Tipo 2. As lesões nos nervos são menos comuns do que numa reacção de Tipo 1. Se ocorrerem danos nos nervos, devem ser tratados exactamente como indicado no Algoritmo 4.

Primeiro episódio de uma reacção de Tipo 2

O primeiro episódio deve ser tratado com analgésicos ou esteróides, de acordo com a gravidade. Muitas vezes, não há mais episódios e não é necessário nenhum tratamento adicional.

Se a resposta ao tratamento for fraca, ou a reacção de Tipo 2 for recorrente, são necessários medicamentos adicionais.

A Escala de Gravidade do ENL

A Escala de Gravidade do ENL é apresentada no Anexo 1 e inclui um Guia do Utilizador.

Dez itens recebem uma pontuação de 0-3 pontos, pelo que a pontuação máxima possível é de 30.

Os dez itens são: dor; febre; número de lesões; nível de inflamação; extensão das lesões cutâneas sobre o corpo; edema; dor óssea; inflamação das articulações/dedos; linfadenopatia; e sensibilidade nervosa.

Qualquer pessoa com uma pontuação igual ou superior a 8 precisa de tratamento.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades42

5.7 Algoritmo 7: Acompanhamento de doentes com reacções de Tipo 2

SimNão

Embora muitos doentes com reacções de Tipo 2 reajam bem ao tratamento de curta duração com esteroides, cerca de 50 % podem ter

ataques recorrentes, de gravidade variável. Na ocorrência de um segundo ataque, particularmente se for grave, é aconselhável acrescentar

um outro medicamento, ou talidomida, se estiver disponivel, ou clofazimina, para reduzir a necessidade de esteroides.

Avaliação de 2 em 2 semanas: Testar a função dos nervos e utilizar a Escala de

Gravidade. Há algum agravamento ?

Discutir com o supervisor. Certificar-se de que o dose de clofazimina ou talidomida está

correcta. Considerar a manutenção ou aumento da

dose e esteroides

Continuar com a utilização padronizada de esteroides, reduzindo gradualmente as doses. Se o doente estiver a

tomar clofazimina ou talidomida, deverá continuar

com o tratamento, diminuindo no entanto a dose de esteroides

Orientações técnicas 43

6Factos fundamentais a ter em conta

• As reacções da lepra são eventos clínicos importantes (que ocorrem antes, durante e mesmo após a conclusão do tratamento). Podem influenciar o tratamento e afectar a qualidade de vida das pessoas afectadas pela lepra.

• Uma reacção pode ocorrer como um único episódio que é auto-limitativo, mas em muitos casos ocorrem episódios recorrentes, especialmente nas reacções de Tipo 2.

• Todos os pacientes com reacções e neurite devem ser avaliados regularmente, com documentação da função nervosa, e medições da Escala de Gravidade para reacções de Tipo 2.

• Os eventos adversos devidos à PQT ou aos medicamentos utilizados para o tratamento de reacções também devem ser documentados e comunicados.

• A mortalidade associada a reacções (muitas vezes relacionadas com o tratamento com esteróides) deve ser documentada e comunicada.

• Os esteróides (prednisolona oral) continuam a ser a principal escolha para o tratamento das reacções de Tipo 1 e de Tipo 2 e a neurite. Os profissionais de saúde na linha de frente devem receber formação para reconhecer essas afecções e iniciar eles próprios o tratamento ou encaminhar os doentes para outros centros.

• A reacção de Tipo 2 deve ser reconhecida nos doentes e a sua gravidade medida. Os doentes devem ser avisados de que esta pode ser uma complicação crónica. Precisam de tratamento com esteróides, mas medicamentos de segunda linha devem estar disponíveis para que a morbidade e mortalidade associadas ao tratamento com esteróides possam ser reduzidas. Os programas nacionais de luta contra a lepra devem desenvolver recomendações para o tratamento de segunda linha do ENL. A utilização de talidomida no tratamento do ENL deve ser considerada de acordo com a Série 968 do Relatório Técnico da OMS, Oitavo Relatório de 2012 do Comité de Especialistas da OMS sobre a Lepra.

• A neurite silenciosa (também referida como Paralisia Nervosa Silenciosa) é uma causa importante de incapacidade e é tratada exactamente da mesma forma que a neurite mais evidente.

• A avaliação regular da função dos nervos é necessária para a prevenção de deficiências. Deve ser introduzida em todas as unidades de saúde que tratem a lepra. Deve ser feita no início e no fim da PQT, de três em meses durante a PQT e em qualquer altura em que haja queixas que sugiram reacções e neurite.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades44

• Os doentes com elevado risco de desenvolver deficiências devem ser avaliados pelo menos de três em três meses durante a PQT e até um ano após a PQT (pelo menos 9 vezes ao longo de 24 meses).

• Os doentes com PNF de duração inferior a seis meses devem ser tratados com esteróides e avaliados após duas semanas e depois mensalmente até ao final do ciclo de esteróides.

• É apresentado um formato simples para a realização da avaliação da função dos nervos para utilização pelos profissionais de saúde na linha de frente, a fim de assegurar um rastreio regular dos doentes para detectar as deficiências o mais cedo possível.

• Deve haver uma maior compreensão do cálculo de DALY na lepra para finalizar uma pontuação considerando as incapacidades, a mortalidade devido a reacções e a discriminação contra as pessoas afectadas pela lepra.

Orientações técnicas 45

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Orientações técnicas 53

Anexo 1

Escala de Gravidade ENLIST ENL

Classificação da dor: Escala analógica visual (assegurar que a linha tem 100 mm de comprimento)

Qual é a gravidade da sua dor hoje? Marque a linha a seguir com um X para indicar o grau de intensidade da sua dor hoje.

Sem dor __________________________________________________ Pior dor possível

SI N.º Item de escala

Pontuação Pontuação obtida0 1 2 3

1 Escala Analógica Visual - Dor (mm)

0 1–39 40–69 70–100

2 Febre (°C) Inexistente 1–39 40–69 70–100

3 (≤ 37,5 °C) Sem febre agora

1–10 11–20 ≥ 21

4 Inflamação de lesões cutâneas devido ao ENL

Não sensível Vermelhidão Doloroso Complexo

5 Extensão das lesões cutâneas devido ENL

0 1–2 regiões 3–4 regiões 5–7 regiões

6 Edema periférico Inexistente 1 local – mãos ou pés ou

rosto

2 locais Os três locais (mãos, pés e

rosto)

7 Dor óssea Inexistente Presente no exame, mas não limita a actividade

Perturbações do sono ou de

actividades

Incapacitante

8 Inflamação de articulações e/ou dedos por causa do ENL

Inexistente Presente no exame, mas não limita a actividade

Perturbações do sono ou de

actividades

Incapacitante

9 Linfadenopatia por causa do ENL

Inexistente Alargado Dor ou sensibilidade num grupo

Dor ou sensibilidade

em ≥ 2 grupos

10 Sensibilidade dos nervos por causa do ENL

Inexistente Ausente se a atenção for desviada

Presente mesmo se a atenção for desviada

O doente retira membro

em análise

Pontuação total

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades54

Guia do utilizador

A pontuação para cada item deve ser adicionada para obter a pontuação da Escala de Gravidade ENLIST ENL (“pontuação total”).

O ENL Leve é classificado como uma pontuação da Escala de Gravidade ENLIST ENL ≤ 8.

A Diferença Mínima Importante da pontuação da Escala de Gravidade ENLIST ENL é de 5

SI N.º Item de escala Notes

1 Escala Analógica Visual – Dor

Instruir o doente a apontar para a posição na linha para indicar a intensidade da dor que está a sentir actualmente. A extremidade mais à esquerda indica “Sem dor” e a extremidade mais à direita indica “Pior dor possível”.

Efectuar a medição (em mm) utilizando uma régua desde a extremidade ESQUERDA da linha até ao centro da cruz.

Assegurar-se de que a linha quando reproduzida a partir deste documento tem 100 mm de comprimento.

2 Febre Medir a temperatura (em °C) utilizando um termómetro.

Se a temperatura for Đ 37,5 °C, então o doente tem febre. Se a temperatura for ≤ 37,5 °C, então o doente tem uma pontuação 0 para este item, A MENOS QUE tenha um histórico de febre nos últimos 7 dias, nesse caso tem uma pontuação 1. Não é necessário estabelecer a causa da febre.

3 Número de lesões cutâneas devido ao ENL

Só devem ser consideradas as lesões cutâneas decorrentes do ENL.

4 Inflamação de lesões cutâneas devido ao ENL

Só devem ser consideradas as lesões cutâneas decorrentes do ENL.

“Complexo” refere-se ao seguinte tipo de lesões cutâneas: vesiculosas, bolhosas, com pús, eritema multiforme, paniculite, necróticas, ulceradas.

Se o participante cumprir os critérios para mais do que uma pontuação, então devem ser aplicados os critérios de pontuação mais elevados (por exemplo, se houver lesões cutâneas vermelhas devido ao ENL e algumas estiverem ulceradas ou vesiculosas ou com pús, o paciente tem a pontuação 3, porque estão presentes lesões “complexas”).

5 Extensão das lesões cutâneas devido ENL

Só devem ser consideradas as lesões cutâneas decorrentes do ENL.

As regiões distintas são: a) cabeça e pescoço; b) membro superior esquerdo; c) membro superior direito; d) frente do tronco (incluindo genitais); e) dorso do tronco (incluindo nádegas); f) membro inferior esquerdo; g) membro inferior direito.

Orientações técnicas 55

SI N.º Item de escala Notes

6 Edema periférico devido ao ENL

Os três locais a serem considerados são o rosto, as mãos e os pés. Ambos os pés contam como um local. Ambas as mãos contam como um local.

Os edemas considerados decorrentes dos tratamentos como corticosteróides ou talidomida não devem ser tidos em conta.

7 Dor óssea A dor óssea é distinta da dor ou sensibilidade das articulações. É geralmente provocada pela palpação da borda subcutânea da tíbia.

8 Inflamação de articulações e/ou dedos por causa do ENL

Só deve ser considerada a inflamação das articulações causada pelo ENL.

A inflamação da articulação estará presente se houver alguma das seguintes situações: dor ou sensibilidade, vermelhidão, inchaço ou calor. Deve-se determinar se alguma delas é suficientemente grave para satisfazer os critérios das pontuações. Se mais de uma articulação for afectada, a articulação mais gravemente afectada é utilizada para determinar a pontuação.

9 Linfadenopatia por causa do ENL

Os grupos de linfonodos a serem examinados são: (a) cabeça e pescoço (incluindo as fossas supraclaviculares); (b) axilar; (c) inguinal.

Os grupos de linfonodos nos diferentes lados do corpo são separados, por exemplo: axilar esquerdo e axilar direito. Portanto, existem seis grupos de linfonodos para fins da escala.

10 Sensibilidade dos nervos por causa do ENL

Qualquer sensibilidade nervosa periférica ou cutânea devido ao ENL deve ser considerada.

Se o doente preencher critérios para mais de um nervo, então deve ser utilizado o nervo de maior pontuação.

Deve ser utilizado o nervo mais gravemente afectado.

Se o examinador suspeitar que a dor neuropática está a ser desencadeada, nesse caso não deve ser tomado em consideração.

Lesões cutâneas complexas

• Bulla (ou bolha): um acúmulo visível de fluido dentro ou abaixo da epiderme superior a 0,5 cm;

• Lesões multiformes de eritema: lesões causadas pelo ENL atípicas semelhantes às de eritema multiforme; incluem lesões maculares, papulares ou urticárias, bem como as lesões íris clássicas ou “lesões alvo”.

• Paniculite: inflamação do tecido adiposo subcutâneo;

• Pústula: acumulação de pus;

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades56

• Lesões-alvo: definem-se como lesões que têm menos de três cm de diâmetro e com três ou mais zonas, geralmente uma área central de eritema escura ou púrpura, uma zona média mais pálida de edema e um anel externo de eritema com uma borda bem definida;

• Ulceração: uma ruptura na superfície epitelial (a epiderme na pele);

• Vesícula: uma acumulação visível de fluido dentro ou abaixo da epiderme, com diâmetro igual ou inferior a 0,5 cm.

Orientações técnicas 57

Anexo 2

Modelo de Cartão do Doente com Lepra[ País ] Programa nacional de Luta contra a Lepra

1. Dados de registo

País

Estado/Província

Distrito/Condado

Unidade de saúde (nome e endereço)

Número de registo do doente

Data de inscrição

2. Dados pessoais

Nome do doente

Nome do pai/marido

Sexo Masculino Feminino

Ano de nascimento (ou idade)

Local de nascimento

Endereço actual

Número de anos de residência no endereço actual

Endereço permanente

Nacionalidade

Número de telefone/telemóvel

Profissão

Estado civil Solteiro Casado Divorciado Viúvo

Pessoa de contacto (nome, endereço, telefone/telemóvel)

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades58

Modo de detecção Voluntário Encaminhado Outros

Inquérito aos contactos Outros inquéritos

Informações pormenorizadas do tratamento anterior

(especificar regime de medicamentos, duração, ano de tratamento)

Tipo de doente Novo Transferido

Recaída após PQT para PB Recaída após PQT para MB

Reinternamento após monoterapia de dapsona

Tratamento após incumprimento

Algum caso conhecido de lepra na família?

Sim Não

Dados dos contactos domiciliares

SI N.º Nome Sexo

Ano de nascimento (ou idade)

Relação com o doente

1

2

3

4

5

6

3. Situação da doença (Inicial)

Apresentação de sintoma(s) Mancha(s) Dano visível Reacção

Outros (especificar):

Duração da apresentação de sintoma(s) _______ meses/anos

Número de manchas na pele 1 2–5 >5

Reacção Não

Sim Reacção de Tipo 1 (reacção de reversão)

Reacção de Tipo 2 (ENL)

Orientações técnicas 59

Estado dos nervos

EstadoUlnar/Cubital Mediano Radial Poplíteo lateral Tibial posterior

Direito Esquerdo Direito Esquerdo Direito Esquerdo Direito Esquerdo Direito Esquerdo

Espessamento

Dor

Sensibilidade

Classificação de incapacidade da OMS Pontuação do OMP Tipo de doença

Olho Mão Pé PB

Direito MB

Esquerdo

Mapeamento do corpo (Date: ____ / ____ / 20____)

esquerdoesquerdodireito direito

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades60

4. Dados de outras afecções

Histórico clínico Diabetes Hepatite Tuberculose VIH/SIDA

Outras doenças (especificar):

Outras afecções Gravidez

Alergia a medicamentos

Exame médico geral

Peso corporal _________kg

5. Informações pormenorizadas do tratamento

Prescrição de medicamentos PQT para PB PQT com 3 medicamentos

PQT com 2 medicamentos

PQT para MB (PQT com 3 medicamentos)

Outros regimes (especificar)

Atendimento mensal de tratamento

Dose (pulso) 1 2 3 4 5 6

Data

Dose (pulso) 7 8 9 10 11 12

Data

Resultados do tratamento

Tipo de tratamento Tratamento concluído

Padronizado

Mortos

Transferência

Alteração da classificação

Data ______ / ______ / 20 ____

Orientações técnicas 61

Mapeamento do corpo (após a conclusão do tratamento). Data: _____ / _____ / 20 ___

esquerdoesquerdodireito direito

6. Exame bacteriológico (baciloscopia)

Data

Número de locais afectados

Resultado da baciloscopio

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades62

7. Avaliação de incapacidades e da função dos nervos

Testes musculares voluntários

Direito Esquerdo

Data

Visão (0 / 1 / 2)

Ligeiro espaço entre as pálpebras no fechamento

(em mm)

Reflexo de pestanejar (presente / ausente)

Dedo minimo para fora

Polegar para cima

Extensão do punho

Pé para cima

Grau de incapacidade das mãos

Grau de incapacidade dos pés

Grau de incapacidade dos olhos

Força muscular: F = forte; D = Diminuída; P = paralisiaPontuação da visão (contagem de dedos a 6 metros): 0 = normal; 1 = visão desfocada; 2 = incapaz de contar os dedos

Data

Grau máximo de deficiência

Pontuação do EHF

Assinatura do avaliador

Orientações técnicas 63

Testes sensoriais

Data/Avaliador

Palma PlantaComentários

Direito Esquerdo Direito Esquerdo

Chave: (coloque essas marcas / ícones no local onde a lesão é vista)

Sensação presente num raio de 3 cm Contracção S Cicatriz/calo

Anestesia X Ferida Nível de encurtamento Fissura

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades64

8. Observações

Registar as reacções (Tipo 1 ou Tipo 2), complicações, recaída, etc.

Data Notas (sinais, sintomas, diagnóstico, dados do tratamento) assinatura

Orientações técnicas 65

Anexo 3

Orientações adicionais sobre a talidomida para o tratamento de reações de ENL

A talidomida é uma droga importante no manejo das reações de ENL. Este anexo não discute sua eficácia terapêutica ou as indicações para seu uso, mas enfoca questões de suprimento e as salvaguardas necessárias para prevenir a ocorrência de seus conhecidos efeitos teratogênicos.

A história inicial do uso da talidomida é bem documentada. Em resumo, depois de ser sintetizado pela primeira vez em 1954 na Alemanha, foi considerado um sedativo seguro e eficaz com o mínimo de efeitos adversos. A partir de 1957, ele foi vendido sob diferentes marcas e incluído em muitas preparações sem receita. Foi comercializado em mais de 40 países, embora menos na África, onde as empresas farmacêuticas se concentraram mais em antibióticos. Relatos de malformações em bebês recém-nascidos começaram a aparecer a partir de 1959, mas o medicamento só foi gradualmente retirado do mercado durante 1961-63, quando nasceram aproximadamente 10.000 crianças afetadas (de Jesus et al, 2020; Samel et al, 2019 ; Parle et al, 2018). Uma série de artigos examinou a qualidade de vida dos sobreviventes da talidomida, que atingiram a meia-idade (Shiga et al, 2015; Newbronner et al, 2017; Jahani et al, 2017; Newbronner et al, 2018; Samel et al, 2019; Newbronner et al, 2019).

O valor terapêutico da talidomida no ENL foi anotado no início (Sheskin, 1965) e confirmado por meio de um ensaio clínico controlado randomizado patrocinado pela OMS (Iyer et al, 1971). A aprovação pela Food and Drug Administration dos Estados Unidos para seu uso em ENL foi concedida em 1998, com base na experiência no gerenciamento de acesso a outras drogas potencialmente teratogênicas, como a isotretinoína, usada para tratar acne muito grave (Zeldis et al, 1999). Artigos que descrevem protocolos robustos para administração de talidomida foram publicados pela equipe da Celgene Corporation (Summit, New Jersey, EUA), que é o principal fornecedor na América do Norte (Zeldis et al, 1999; Brandenburg et al, 2017). Esses protocolos estão resumidos nos quadros 2 e 3:

Quadro 2: Educação sobre talidomida e segurança na prescrição (STEPS)

O Sistema para Educação sobre Talidomida e Segurança de Prescrição (STEPS) inclui três elementos principais:

1. Manutenção de bancos de dados eletrônicos de prescritores, farmacêuticos e pacientes registrados e em conformidade para controlar o acesso aos medicamentos.

2. Educação de prescritores, farmacêuticos e pacientes sobre os riscos associados à terapia com talidomida e a necessidade de medidas anticoncepcionais adequadas e testes de gravidez para mulheres com potencial para engravidar.

3. Monitoramento contínuo da conformidade por meio de pesquisas obrigatórias do paciente, relatórios para um comitê de gerenciamento central e auditorias regulares em todo o sistema.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades66

Quadro 3: Prescrição de talidomida no programa STEPS

1. O prescritor deve garantir que o paciente compreenda os riscos do tratamento com talidomida.

2. Mulheres em idade fértil devem concordar em usar duas formas confiáveis de contracepção, começando quatro semanas antes do início da terapia com talidomida e continuando até quatro semanas após a interrupção do tratamento.

3. Mulheres em idade fértil devem concordar em fazer testes de gravidez mensais durante o tratamento.

4. Não se sabe se a talidomida está presente no espermatozóide ou no sêmen, ou se há algum risco para o desenvolvimento fetal dessa fonte, portanto, os homens que tomam a talidomida devem usar preservativos ao ter relações sexuais com mulheres em idade reprodutiva.

5. Os pacientes não devem doar sangue ao tomar talidomida.

6. Os pacientes nunca devem compartilhar os medicamentos com qualquer outra pessoa, mesmo que tenham sintomas semelhantes.

7. Qualquer paciente que esteja recebendo a prescrição de talidomida deve assinar um formulário de consentimento informado.

8. Os comprimidos não utilizados devem ser devolvidos à unidade de saúde para eliminação.

9. Deve ser assegurado um acompanhamento rigoroso dos pacientes em talidomida.

Com o tempo, descobriu-se que a talidomida era útil no controle da anorexia e da debilidade associada a várias doenças, incluindo HIV / AIDS, tuberculose e várias doenças malignas. Um possível papel no tratamento de doenças malignas foi identificado quando se descobriu que previnia a angiogênese (formação de novos vasos sanguíneos), que é uma característica fundamental no crescimento de muitos tumores (D’Amato et al, 1994). Provou-se eficaz no tratamento do mieloma múltiplo (Singal et al, 1999) e agora é a principal indicação da talidomida para tratar outras doenças além da hanseníase (Zhou et al, 2013).

Uma pesquisa abrangente e uma análise do acesso à talidomida no Canadá em 2010 não menciona a hanseníase e o ENL, mas concentra-se inteiramente nas necessidades dos pacientes com mieloma múltiplo, com mais de 2.000 novos casos relatados por ano (Minuk et al, 2010), a maioria dos quais seria esperado que recebessem talidomida em algum momento. Embora a prescrição da talidomida não fosse ilegal, a droga não era licenciada no Canadá e, portanto, não estava geralmente disponível na época em que o artigo foi escrito. É um produto genérico fabricado por várias empresas, mas a Celgene era o único fornecedor aprovado para o Canadá (no âmbito de um ‘Programa de Acesso Especial’) e seus preços estavam fora do alcance de muitos pacientes. Um número significativo de pacientes adquiriu o medicamento de outros fabricantes. O documento recomenda mudanças para permitir um acesso mais fácil e a situação no Canadá provavelmente mudou desde que o artigo foi escrito.

O acesso controlado à talidomida para uso por pacientes com câncer é exemplificado pelas diretrizes da Agência Europeia de Medicamentos (2008, atualizado em 2020) (Quadro 4).

Orientações técnicas 67

Quadro 4: Pontos-chave das Diretrizes para a talidomida, Agência Europeia de Medicamentos

1. A talidomida nunca deve ser usada por:

• mulheres grávidas;

• mulheres que podem engravidar, a menos que tomem todas as medidas necessárias para garantir que não engravidem antes do tratamento e que não engravidem durante ou logo após o tratamento;

• pacientes que não conseguem seguir ou cumprir os requisitos de uso de anticoncepcionais.

2. A empresa que comercializa a talidomida estabelecerá um programa de prevenção da gravidez em cada Estado Membro. Ele fornecerá kits educacionais para profissionais de saúde e brochuras para pacientes, detalhando as etapas que devem ser seguidas para que o medicamento seja usado com segurança. Ele também fornecerá cartões para os pacientes, a fim de garantir que todas as medidas de segurança apropriadas sejam tomadas por cada paciente. Cada Estado-Membro também assegurará que os materiais educacionais e os cartões do paciente sejam fornecidos, conforme necessário, aos prescritores e aos pacientes.

3. A empresa também irá coletar informações sobre se o medicamento é usado fora de sua indicação aprovada. As caixas contendo as cápsulas de talidomida incluirão um aviso de que a talidomida é prejudicial para o feto.

Um importante artigo de Jesus et al (2020) examina o uso da talidomida no Brasil, onde uma série de leis foram promulgadas para controlar seu uso. O medicamento é fabricado pela Fundação Ezequiel Dias (Fundação Ezequiel Dias), laboratório público, e só está disponível no serviço público de saúde. Setenta por cento da produção vai para o tratamento de ENL. Cerca de 4 milhões de comprimidos de 100 mg são usados atualmente por pacientes com hanseníase anualmente, o que resulta em mais de 100.000 pacientes-semana de tratamento com 100 a 400 mg por dia (Brasil, 2016). De acordo com a legislação (RDC nº 11, de 22/03/2011; Anvisa - Brasil, 2015), o Ministério da Saúde deve estabelecer um Registro Nacional de uso de talidomida por paciente. Aproximadamente 300 casos de embriopatia devido à talidomida ocorreram no Brasil antes de 1965 e outros 33 casos foram relatados entre 1969 e 1995. Três casos foram relatados em 2007 e duas das mulheres haviam tomado talidomida prescrita para outra pessoa. Mais cinco casos foram relatados desde 2015. O documento também relata que muitos centros de saúde envolvidos no fornecimento da talidomida não possuem o credenciamento apropriado ou um farmacêutico qualificado.

O Ministério da Saúde brasileiro publicou um livro sobre a talidomida, contendo diversos aspectos da droga, desde a história até a legislação, incluindo protocolos clínicos para ENL, HIV / AIDS, lúpus eritematoso sistêmico e mieloma múltiplo (Brasil, 2014).

A experiência recente no uso da talidomida para ENL em um centro de referência na Índia foi documentada, sugerindo que o controle efetivo da droga é viável (Upputuri et al., 2020). O estudo retrospectivo de cinco anos analisou 102 pacientes tratados com talidomida, com bons resultados. Vinte e oito pacientes eram mulheres em idade fértil e, apesar das precauções rigorosas, uma delas engravidou; esta é uma indicação permissível

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades68

para interrupção da gravidez na Índia, que foi realizada neste caso. O uso da talidomida é recomendado sob condições estritas pelo documento NLEP do Governo da Índia sobre Prevenção de Deficiências e Reabilitação Médica: Diretrizes para Cuidados de Nível Primário, Secundário e Terciário, datado de 2012, e instituições individuais e ONGs podem ter suas próprias diretrizes. O medicamento é fabricado na Índia pela Hetero Pharma e está disponível em embalagens blister; as cápsulas têm cores distintas em azul claro e escuro, o que evita confusão com outros medicamentos. Os autores deste estudo forneceram as seguintes informações sobre o fornecimento na Índia: A talidomida está disponível no mercado aberto, mas apenas algumas farmácias licenciadas vendem o medicamento. É classificado como um medicamento ‘Schedule H’ pelos reguladores de medicamentos da Índia, o que significa que pode ser vendido apenas com a prescrição de um médico registrado e apenas na quantidade prescrita. As vendas de medicamentos da Tabela H também são auditadas pelas autoridades regulatórias (Srikantam A, 2020)

Em resumo, os seguintes pontos se destacam:

• A talidomida não foi aprovada para uso em muitos países com hanseníase endêmica, o que é semelhante à situação no Canadá em 2010. Portanto, permanece indisponível para muitos pacientes que poderiam se beneficiar dela. Freqüentemente, é ilegal importar e prescrever.

• Brasil e Índia aprovaram o uso da talidomida para ENL. O medicamento é fabricado localmente, portanto a disponibilidade não é um grande problema.

• A prescrição de talidomida para pacientes individuais deve seguir as etapas descritas no Quadro 3. Um protocolo mais preciso para reservar o uso de talidomida para casos mais graves, por exemplo envolvendo o uso obrigatório da Escala de Severidade de ENL, deve ser considerado. Isso pode ser aprovado em consulta com profissionais de saúde, médicos, Ministérios da Saúde e representantes de pessoas afetadas pela hanseníase.

• O registro gerenciado centralmente de prescritores, farmacêuticos e pacientes, exigido na Europa e na América do Norte, não está disponível em muitos países onde a hanseníase é endêmica. Nesses países, portanto, a responsabilidade pela prescrição e controle do uso da talidomida recai sobre os médicos que lidam diretamente com os casos de hanseníase. Eles também são responsáveis por garantir que os pacientes estejam totalmente cientes dos riscos relacionados ao uso da talidomida.

• A realização de um teste de gravidez mensal em mulheres em idade fértil tomando talidomida permite a possibilidade de interrupção da gravidez em países onde isso é permitido em casos de falha contraceptiva.

Orientações técnicas 69

• Para melhorar a segurança do medicamento e evitar o uso inadequado e reações adversas à talidomida, o seguinte deve ser considerado:

– A embalagem e a apresentação dos comprimidos de talidomida devem ser claramente distintos de outros medicamentos;

– A talidomida deve ser disponibilizada apenas mediante receita médica; isso melhorará a segurança do medicamento para os usuários e reduzirá o risco de uso inadequado no campo.

• Recomenda-se a realização de pesquisas adicionais para explorar as possibilidades de desenvolver e usar uma formulação injetável de talidomida.

Lepra/Hanseníase: Gestão das reacções e prevenção das incapacidades70

Quadro 5: O que fazer e o que não fazer em relação ao uso da talidomida

Para farmacêuticos

• Compreenda a situação do medicamento talidomida em seu país - por exemplo, ‘Tabela H’ na Índia - e quais regras devem ser seguidas ao fornecer o medicamento aos pacientes.

• Garantir um fornecimento legal e confiável de talidomida.

• Assegure-se de que as mulheres em idade fértil compreendam os riscos de tomar talidomida e a necessidade de prevenir a gravidez usando dois métodos eficazes de contracepção. Discuta quais métodos de contracepção serão usados e certifique-se de que a mulher saiba como usá-los e tenha os suprimentos necessários.

• Assegurar que todos os pacientes recebendo talidomida conheçam seus riscos potenciais e que seu tratamento nunca seja compartilhado com ninguém; os comprimidos não utilizados devem ser devolvidos à farmácia para eliminação.

Para prescritores

• Compreender as indicações e contra-indicações para o uso da talidomida.

• Assegure-se de que as mulheres em idade fértil compreendam os riscos de tomar talidomida e a necessidade de prevenir a gravidez usando dois métodos eficazes de contracepção. Discuta quais métodos de contracepção serão usados e certifique-se de que a mulher compreenda como usá-los e tenha as prescrições necessárias

• Certifique-se de que todos os pacientes recebendo talidomida conheçam seus riscos potenciais e que seu tratamento nunca seja compartilhado com ninguém; os comprimidos não utilizados devem ser devolvidos à farmácia para descarte.

• A necessidade de administrar a talidomida para tratar o ENL deve ser antecipada, para que as mulheres em idade fértil possam começar a contracepção um mês antes de começar; quando a talidomida vai ser iniciada, um teste de gravidez negativo deve ser documentado.

• Testes de gravidez mensais devem ser feitos quando uma mulher está tomando talidomida, assumindo que a interrupção da gravidez é legal no caso de falha contraceptiva.

Para pacientes e familiares

• Compreender que a talidomida é uma droga importante no tratamento do ENL grave; é usado quando os sintomas não são controlados por outros tratamentos.

• A talidomida tem efeitos colaterais, como neuropatia periférica, que geralmente desaparecem quando o tratamento termina.

• O efeito colateral mais importante da talidomida, entretanto, são danos graves e permanentes ao feto, se for tomada no início da gravidez. Portanto, é essencial evitar a talidomida na gravidez e prevenir a gravidez durante o uso do medicamento.

• Discuta os métodos anticoncepcionais com o seu profissional de saúde e escolha dois métodos que você se sinta confortável para usar.

• Certifique-se de que seus medicamentos são mantidos em um local seguro e não são usados por ninguém. Devolva os comprimidos não usados à farmácia.

Orientações técnicas

Lepra/Hanseníase:

Gestão das reacções e

prevenção das incapacidades

A lepra (hanseníase) é uma doença infecciosa causada pelo Mycobacterium leprae. Mais de 200.000 novos casos ocorrem todos os anos. A terapia multidrogas constitui a principal estratégia de tratamento. Durante o curso da doença, quase 50% dos pacientes experimentam reações imunológicas, caracterizadas por danos nos nervos. Se não for tratado ou gerenciado corretamente, isso pode levar a deformidades e deficiências visíveis. A prevenção de deficiências é um componente importante do manejo da lepra e um meio de melhorar a qualidade de vida da pessoa afetada.

A identificação e o tratamento precoces das reações continuam sendo desafios para os profissionais de saúde da linha de frente. Esta orientação técnica visa enfrentar esses desafios. Os algoritmos simples incluídos nes te documento des tacam como reconhecer e gerenciar reações na lepra.

9 7 8 9 2 9 0 2 2 7 6 2 5

ISBN 978-92-9022-762-5