ministÉrio da educaÇÃo universidade federal do piauÍ...
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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE/ DEPARTAMENTO DE ENFERMAGEM PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM ENFERMAGEM
ERONICE RIBEIRO DE MORAIS
OS SABERES E AS PRÁTICAS DE CUIDADORES FAMILIARES DE IDOSOS COM ALZHEIMER
TERESINA (PI), 2009
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ERONICE RIBEIRO DE MORAIS
OS SABERES E AS PRÁTICAS DE CUIDADORES FAMILIARES DE IDOSOS COM ALZHEIMER
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Mestrado em Enfermagem da Universidade Federal do Piauí, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Enfermagem.
Orientadora: Profª. Drª. Maria do Livramento Fortes Figueiredo
Área de Concentração: Enfermagem no contexto social brasileiro
Linha de pesquisa: Processo de cuidar em saúde e enfermagem
TERESINA (PI), 2009
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ERONICE RIBEIRO DE MORAIS
OS SABERES E AS PRÁTICAS DE CUIDADORES FAMILIARES DE IDOSOS
COM ALZHEIMER
Dissertação de Mestrado submetida à Banca Examinadora do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Enfermagem, da Universidade Federal do Piauí-UFPI, como parte dos requisitos necessários para obtenção do título de Mestre em Enfermagem.
Aprovada em: ___/___/ 2009.
Profª. Drª. Maria do Livramento Fortes Figueiredo Universidade Federal do Piauí (UFPI) - Presidente
Profª. Drª. Célia Pereira Caldas Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) - 1ª Examinadora
Profª. Drª. Maria Helena Barros Araújo Luz Universidade Federal do Piauí (UFPI) - 2ª Examinadora
Suplente:
Profª. Drª. Benevina Maria Vilar Teixeira Nunes Universidade Federal do Piauí (UFPI)
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Dedico este estudo aos meus pais, Osmina e Francisco, pelo amor incondicional e sabedoria transmitida de modo incessante e por sempre me fazerem acreditar no meu potencial e me sentir amada. Amo-os muito!
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AGRADECIMENTOS
A Deus, pela minha vida e pela luz que sempre ilumina o meu caminho e me
dá coragem para prosseguir.
À Universidade Federal do Piauí, na pessoa do Magnífico Reitor, Profº. Dr.
Luis de Sousa Santos Júnior, pela realização do Programa de Pós-Graduação
Mestrado em Enfermagem.
À Coordenação do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Enfermagem
da Universidade Federal do Piauí – UFPI, em nome das Professoras Doutoras
Claudete Ferreira de Sousa Monteiro e Telma Maria Evangelista de Araújo, pela
competência e dedicação no gerenciamento do curso.
A minha orientadora, Profª. Drª. Maria do Livramento Fortes Figueiredo, pelo
incentivo, dedicação e companheirismo. Sua ajuda foi essencial na construção deste
estudo, pois aproximou-me da obra de um dos homens mais sábio deste país, que
foi Paulo Freire, o que me possibilitou um enorme aprendizado.
Às professoras do Programa de Mestrado em Enfermagem, pelo estímulo ao
crescimento profissional.
Às componentes da Banca de Qualificação, Profª Drª Maria Helena Barros
Araújo Luz, Benevina Maria Vilar Teixeira Nunes, Inêz Sampaio Nery e Célia Pereira
Caldas, por suas valiosas contribuições e reflexões.
À Associação Brasileira de Alzheimer regional Piauí, na pessoa do Dr. João
Carvalho, pela sua disponibilidade em colaborar com este estudo.
Aos cuidadores familiares participantes desta investigação, pelo carinho e
atenção com que me receberam em seus domicílios.
Aos meus pais Francisco e Osmina, pelo o amor, dedicação, carinho e apoio
incondicional em todas as minhas conquistas.
Aos meus adoráveis filhos Matheus e Isadora pela compreensão, paciência
e preocupação que tiveram comigo ao longo desta caminhada.
Ao meu grande amor Carlos Augusto, pelo companheirismo e incentivo em
todos os momentos desta trajetória. Meu pequeno grande homem, essa conquista é
nossa.
Aos meus irmãos, Edilson, Eliane e Caline, pela força, apoio, refúgio e
fortaleza que representam em minha vida.
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Às colegas do Mestrado, pelo compartilhamento de experiências. Em
especial Laurimary Caminha Veloso, Sandra Marina e Jaqueline Carvalho e Silva,
pelas mãos amigas e consolo durante os momentos difíceis e pelos momentos de
felicidades que tivemos durante esta trajetória.
A todos os enfermeiros do SAMU, pela ajuda e compreensão na
concretização deste sonho.
A todos servidores do Departamento de Enfermagem, em especial
Reginaldo, Valdira Tajra e José Ribamar, pela disponibilidade e colaboração em
atender.
Ao colega Fernando Guedes Júnior, pela colaboração na formatação da
pesquisa.
A todos que contribuíram de alguma forma para a construção deste estudo,
o meu muito obrigada.
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Como uma Onda
Nada do que foi será
de novo do jeito que já foi um dia. Tudo passa
tudo sempre passará. A vida vem em ondas
como um mar num indo e vindo infinito.
Tudo que se vê não é igual ao que a gente
viu há um segundo tudo muda o tempo todo
no mundo. Não adianta fugir
nem mentir pra si mesmo agora há tanta vida lá fora aqui dentro sempre
como uma onda no mar.
(Lulu Santos/ Nelson Motta)
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RESUMO
O Brasil vive atualmente um acelerado crescimento da população idosa, elevando-se a ocorrência de doenças crônico-degenerativas, como a Doença de Alzheimer, que apresenta um caráter progressivo e incapacitante, afetando inicialmente a memória recente e, posteriormente, outras funções cognitivas, levando à dependência, demandando cuidados e serviços diversos, tanto por parte dos profissionais de saúde, como dos cuidadores familiares, que irão necessitar de suporte assistencial na execução do cuidado ao idoso e na promoção de sua própria saúde. Partindo dessa problemática, esta pesquisa teve como objeto de estudo os saberes e práticas de cuidadores familiares de idosos com Alzheimer, cujos objetivos foram: descrever os saberes e práticas dos cuidadores familiares de idosos com Alzheimer e discutir à luz do referencial dialógico de Paulo Freire os saberes e práticas dos cuidadores familiares de idosos com Alzheimer. Trata-se de uma pesquisa descritiva, qualitativa, que contou com a participação de 14 cuidadores familiares como sujeito e teve como cenário os domicílios dos participantes localizados em Teresina – PI. Os dados foram coletados através da entrevista semi-estruturada e produzidos e analisados a partir da concepção teórica de Freire, mediante a técnica de análise de conteúdo de Bardin, através da qual emergiram as seguintes categorias: os saberes sobre a Doença de Alzheimer na voz dos cuidadores familiares; a essencialidade e a individualidade do cuidado familiar do idoso com Doença de Alzheimer; as necessidades e os sentimentos que envolvem a prática do cuidador familiar de idoso com Alzheimer e a influência das questões de gênero na determinação do cuidado familiar. Este estudo, que se originou de uma rica produção de dados, irá contribuir na assistência e servir de base para pesquisas congêneres em enfermagem, revelou saberes resultantes da construção sociocultural, fruto das experiências que envolvem esta relação de cuidados, e práticas individualizadas e essenciais à sobrevivência desses idosos. Além disso, manifestou necessidades e sentimentos de diversos matizes, desde as demandas financeiras até a própria aceitação do diagnóstico, gerando emoções variadas como: amor, carinho, raiva e revolta. As mulheres predominaram como cuidadoras, sendo possível identificar a influência das questões de gênero na determinação deste cuidado. Palavras-chaves: Enfermagem. Cuidador. Idoso. Doença de Alzheimer
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ABSTRACT
Brazil is currently witnessing a dramatic growth of the elderly population, with the rising occurrence of chronic degenerative diseases such Alzheimer's disease that has a progressive and disabling power, affecting, initially, the recent memory and, later, other cognitive functions, leading to dependence, demanding care and other services, both from health professionals as well as from family care-givers, who will need support in the execution of elderly care and in promoting their own health. Based on this problem, this research had as main goal to study the object of knowledge and practice of family care of elderly patients with Alzheimer's, whose objectives were: to describe the knowledge and practices of family caregivers of elderly with Alzheimer and discuss, in light of the dialogic reference of Paulo Freire, the knowledge and practices of family caregivers of elderly with Alzheimer. This is a descriptive, qualitative research, which had 14 family caregivers as the subject and had as scenario the households of participants located in Teresina-PI. Data were collected from structured interviews and produced and analyzed based on the theoretical concepts of Freire, by means of Bardin´s technique of content analysis, through which emerged the following categories: knowledge about Alzheimer's disease in the voice of family caregivers; the essence and individuality of the family care of older persons with Alzheimer disease: the needs and feelings surrounding the practice of family caregivers of elderly with Alzheimer and the effect of gender in determining family care. This study, which arouse with a rich production of data will contribute to the assistance and be the groundings for similar research in nursing, revealed knowledge resulting from socio-cultural construction, the fruit of experiments involving the relationship of care and individualized practices essential to the survival of the elderly. In addition, it revealed needs and feelings of various sorts, including financial demands and the acceptance of the diagnosis, as well, which generated various emotions such as love, affection, anger and revolt. Women predominated as caregivers, and it is possible to identify the effect of gender in the determination of this care. Keywords: Nursing. Caregiver. Elderly. Alzheimer
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RESUMEN
Brasil está viviendo hoy un rápido crecimiento de la población de adultos mayores, con elevación de la incidencia de enfermedades crónico-degenerativas como la enfermedad de Alzheimer que tiene un carácter progresivo e incapacita la persona, que afecta inicialmente la memoria reciente y, posteriormente, otras funciones cognitivas, que conduce a la dependencia y que requieren la atención y otros servicios, tanto de los profesionales de la salud como del cuidador de la familia, que necesitarán el apoyo en la ejecución del cuidado de los ancianos y en la promoción de su propia salud. Basado en este problema, esta investigación tuvo como objetivo: estudiar el conocimiento y la práctica del cuidado familiar de pacientes ancianos con Alzheimer, cuyos objetivos fueron: describir los conocimientos y prácticas de los cuidadores familiares de ancianos con Alzheimer y examinar a la luz de la estructura dialógica de Paulo Freire los conocimientos y prácticas de los cuidadores familiares de ancianos con Alzheimer. Este es un estudio descriptivo, cualitativo, que tuvo la participación de 14 proveedores de cuidado de la familia como sujeto y tuvo como escenario los hogares de los participantes ubicados en Teresina-PI. Los datos fueron obtenidos de entrevistas estructuradas y producidos y analizados desde el concepto teórico de Freire por la técnica de análisis de contenido de Bardin, que hicieran surgir las siguientes categorías: conocimiento sobre la enfermedad de Alzheimer en la voz de los cuidadores familiares; la esencia y la individualidad del cuidado de la familia de las personas mayores con enfermedad de Alzheimer: las necesidades y sentimientos en torno a la práctica de los cuidadores familiares de ancianos con Alzheimer y la influencia del género en la determinación de atención de la familia. Este estudio, que se originó de una rica producción de datos ayudará en la asistencia y servirá de base para la investigación en investigaciones similares de enfermería, ha revelado los conocimientos, resultantes de la construcción socio-cultural, fruto de la experiencia que involucra esta relación de la atención e prácticas individualizadas, esencial para la supervivencia de los ancianos. Por otra parte, expresaron las necesidades y sentimientos de diversos tipos, desde las exigencias financieras hasta la aceptación del diagnóstico, lo que genera diversas emociones como el amor, el afecto, la ira y la revuelta. Predomina la mujer como cuidadora, y es posible identificar la influencia del género en la determinación de este cuidado. Palabras claves: Enfermería. Cuidador. Ancianos. Alzheimer
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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ABRAZ Associação Brasileira de Alzheimer
CEP Comitê de Ética e Pesquisa
DA Doença de Alzheimer
ESF Estratégia Saúde da Família
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
OPAS Organização Panamericana de Assistência a Saúde
PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PNI Política Nacional do Idoso
PNSI Política Nacional de Saúde do Idoso
SUS Sistema Único de Saúde
UFPI Universidade Federal do Piauí
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO 12
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS 14
1.1 Contextualização do Problema e Construção do Objeto de Estudo
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1.2 Questão Norteadora e Objetivos do Estudo 19
1.3 Justificativa e Relevância da pesquisa 19
2 REFERENCIAL TEMÁTICO 23
2.1 O envelhecimento populacional brasileiro e doença de Alzheimer
24
2.2 A Prática do Cuidador Familiar de Idoso com Alzheimer no Domicílio
27
2.3
2.4
As Políticas Públicas de Atenção à Pessoa Idosa Intervenções de Enfermagem Junto aos Cuidadores Familiares de Idosos com Alzheimer
31
34
3 REFERENCIAL TEÓRICO- METODOLÓGICO 37
3.1 A Teoria Dialógica Libertadora de Paulo Freire 38
3.2 Tipo de Pesquisa 42
3.3 Os Sujeitos da Pesquisa 44
3.4 O Cenário da Pesquisa 46
3.5 A Produção dos Dados 46
3.6 A Análise dos Dados 47
3.7 Aspectos éticos e legais 48
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DAS CATEGORIAS TEMÁTICAS 50
4.1 Os Saberes Sobre a Doença de Alzheimer na Voz dos Cuidadores Familiares
51
4.2 A Essencialidade e a Individualidade do Cuidado Familiar do Idoso com Doença de Alzheimer
58
4.3 As Necessidades e os Sentimentos que Envolvem a Prática do cuidador Familiar de Idoso com Alzheimer
64
4.4 A influência das questões de gênero na determinação do Cuidado Familiar
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
77
REFERÊNCIAS 83
APÊNDICES
ANEXOS
12
APRESENTAÇÃO ___________________________________________________________________
13
Este estudo se insere no Programa de Pós Graduação Mestrado em
Enfermagem da Universidade Federal do Piauí, na linha de pesquisa - O processo
de cuidar em saúde e enfermagem. Desta forma, para compreender os
pressupostos deste estudo serão apresentadas cinco seções textuais:
considerações iniciais; referencial temático; referencial teórico- metodológico;
análise e discussão dos dados; e, considerações finais.
Na primeira seção: Considerações Iniciais, foi realizada uma
contextualização do problema e delimitação do objeto de estudo, além da
construção das questões norteadoras, objetivos do estudo e da justificativa.
A segunda seção intitulada: Referencial Temático, apresenta-se subdividida
em quatro subseções que expressam a relação entre o fenômeno do
envelhecimento populacional brasileiro e a Doença de Alzheimer, focalizando, para
tanto, uma breve trajetória evolutiva das Políticas Públicas direcionadas à pessoa
idosa e seus cuidadores familiares. Além disso, descreveu-se a
multidimensionalidade da prática de cuidar do portador de Alzheimer no âmbito
domiciliar, bem como o papel do enfermeiro na assistência aos cuidadores familiares
e ao idoso que vivenciam tal agravo.
A terceira seção: Referencial teórico-metodológico é composta por sete
subseções em que são explicitados todos os passos realizados para o
desenvolvimento deste estudo e, ainda, os pressupostos teóricos de Freire (1979;
1980; 1983; 1987; 1994; 1997; 1999) sobre a Teoria Dialógica Libertadora.
Na quarta seção: Análise e discussão dos dados, apresenta-se os resultados
deste estudo através da construção de quatro categorias semânticas intituladas: os
saberes sobre a doença de Alzheimer na voz dos cuidadores familiares; a
essencialidade e a individualidade do cuidado familiar do idoso com doença de
Alzheimer; as necessidades e os sentimentos que envolvem a prática do cuidador
familiar de idoso com Alzheimer; e, a influência das questões de gênero na
determinação do cuidado familiar. Cumpre referir que os resultados apresentados
foram discutidos sob à luz do referencial teórico de Paulo Freire.
Finalmente, na quinta seção: considerações finais, constatou-se que os
objetivos propostos foram alcançados e que o estudo se configurou em uma riqueza
de informações, que contribuirá para o desenvolvimento de novas pesquisas.
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1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ___________________________________________________________________
15
1.1 Contextualização do Problema e Construção do Objeto de Estudo
O envelhecimento populacional proporcionou mudanças significativas no
quadro de morbi-mortalidade mundial, caracterizado pelo aumento da incidência e
morte por doenças crônico-degenerativas típicas de idades mais avançadas, como
as demências, que apresentam efeitos devastadores com altos custos afetivos e
financeiros para o indivíduo e sua família.
Dentre as demências, a Doença de Alzheimer (DA) é a de maior incidência,
acometendo milhões de pessoas em todo o mundo, tendo sido eleita como o
principal foco de pesquisas sobre as demências que afetam o cérebro nas últimas
duas décadas (CANINEU, 2003).
Estima-se que este agravo atinja mais de 15 milhões de pessoas no mundo,
e no Brasil existem aproximadamente cerca de 1 milhão de indivíduos portadores da
doença, muitos dos quais ainda sem diagnóstico, porque geralmente é aguardado
um determinado tempo para tomar providências, quando se tem um idoso com
“problemas de memória” no domicilio (CAOVILLA; CANINEU, 2002).
Pesquisadores como Caramelli e Barbosa (2002), afirmam que esta
desordem neurológica possui um caráter degenerativo, progressivo e incapacitante,
que inicialmente afeta a memória recente, mas com a evolução da doença outras
funções cognitivas são alteradas, como a orientação, linguagem, julgamento, função
social e habilidades de realizar tarefas motoras, levando a perda da autonomia e a
instalação da dependência.
Vale ressaltar que a prevalência da DA na velhice extrapola o evento
biológico em si, uma vez que tem diferentes representações e repercussões no
contexto econômico, político, social e cultural das pessoas e famílias por elas
afetadas, especialmente porque a família ainda é o lócus preferencial no processo
de cuidar dos idosos, sejam eles dementes ou não (SANTOS; RIFIOTIS, 2003).
Contudo, para esses autores, o que difere, no caso dos idosos com
Alzheimer, é o fato de esses idosos requererem cuidados integrais diuturnamente,
uma vez que perdem a autonomia e a independência, necessitando de pessoas que
os auxiliem nas atividades de vida diária como: tomar banho, vestir-se, alimentar-se,
dentre outras ações.
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Nesse cenário emerge na família a figura do cuidador, que conviverá
diariamente com o enfermo, e assumirá os cuidados e as atividades relacionadas ao
idoso, tornando-se o principal apoio para auxiliar na manutenção da identidade e
autonomia, configurando-se em um importante elo entre o idoso e o mundo, sendo
constituídos, entre outros, na sua maioria, por familiares, amigos e vizinhos,
(LUZARDO, 2006).
Assim, a função de cuidador familiar de idoso com Alzheimer não é um papel
transitório, porque na maioria dos casos o portador irá viver 10 a 20 anos em
situação de crescente dependência, requerendo atenção ininterrupta durante as 24
horas do dia. As formas como as famílias lidam e se organizam para assumir esses
cuidados são muito variadas e eventualmente envolvem outras pessoas que fazem
parte do entorno familiar (SANTOS; RIFIOTIS, 2003).
Desse modo, vivenciar uma experiência de cuidar de um familiar, que na
evolução da doença chega a não reconhecer o seu ente querido, proporciona no
cuidador familiar desenvolvimento de sentimentos ambíguos e contraditórios que,
necessariamente, terão que buscar apoio em crenças e valores e na própria fé para,
assim, manter o equilíbrio e a energia capaz de propiciar a realização do cuidado.
A esse respeito, Luzardo e Waldman (2004) levantaram sentimentos
manifestados pelos cuidadores familiares dos mais variados matizes, estando
presentes em suas mensagens a culpa, o medo, a ansiedade, o pesar diante de
uma doença totalmente incapacitante, o mergulho na insegurança do caos do
desconhecido, a estranheza frente à troca inevitável de papéis sociais, o sentimento
de impotência frente à evolução da doença, a tristeza diante da falta de infra-
estrutura e de condições financeiras, além da raiva originada pela sensação de
chegada lenta da morte. Contudo, também estavam presentes sentimentos de
aceitação da vontade de Deus, de amor e de solidariedade para com seu idoso, que
se apresentava tão fragilizado.
O cuidador familiar foi considerado pelas autoras como um herói anônimo,
pois sua ação se dá no espaço doméstico, onde parte significativa da vida das
pessoas transcorre e onde se mantém segredos, verdades, mentiras, memórias,
fatos, fotos e relações importantes. Dessa forma, esses sujeitos escondidos em sua
grandeza, são heróis invisíveis e solitários, pois nem sempre são percebidos como
fundamentais ou valorizados como cuidadores, quer seja pela própria família, quer
seja pelos serviços de saúde.
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Fonseca e Soares (2006) revelam também que os dilemas, conflitos, dúvidas,
medos e inseguranças que permeiam a prática de cuidados prestada aos portadores
de Alzheimer também podem ser provenientes de orientações prescritivas,
verticalizadas dos profissionais de saúde, nas quais pouco se privilegia ou estimula
a participação da família nas ações de cuidado, tendo como conseqüências, muitas
vezes, incompreensão do processo evolutivo da doença, contribuindo para o
desgaste físico e psicológico nessa relação de cuidado.
Nessa perspectiva, é preciso compreender que os cuidadores não se
configuram como “quadros em branco”, em que o profissional pode imprimir suas
conclusões e prescrições, pois esses cuidadores trazem para o serviço de saúde
suas concepções, valores e crenças em práticas alternativas de cuidados. Desse
modo, a contextualização social e cultural do cliente que procura as instituições de
saúde vem tornando-se uma exigência para os profissionais de saúde que
pretendem oferecer uma assistência melhor qualificada em saúde (SIQUEIRA et al.,
2006).
Assim, é fundamental que o profissional de saúde, em particular o enfermeiro,
em sua prática assistencial, busque conhecer o contexto social, cultural e histórico
no qual cuidador e idoso encontram-se inseridos. Para tanto, é essencial para este
profissional, integrar-se ao ambiente familiar e identificar as potencialidades e
limitações, significados e vivências permeadas nessa relação de cuidados. E, dessa
forma, viabilizar em parceria com a família a produção de novos conhecimentos, de
caráter emancipador, constituídos a partir do movimento de troca e construção entre
os saberes científico e popular.
Esse conhecimento emancipador, para Santos (2001), seria aquele no qual a
relação sujeito-objeto é substituída pela reciprocidade entre os sujeitos e onde a
solidariedade e a participação estão presentes. Essa forma de pensar a ciência e a
produção de conhecimentos propõe a idéia de um saber não apenas voltado para as
necessidades do mercado, mas abre-se para a importância da experiência, do
compartilhamento de saberes, ampliando os cenários de geração de novos
conhecimentos.
Nesse sentido, Acioli (2008) aponta que o enfermeiro deve ir à busca de
práticas de educação em saúde que se baseiam em um enfoque crítico e
emancipador, o que implica no reconhecimento do caráter histórico dos
determinantes sociais, culturais, políticos e econômicos do processo saúde/doença.
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Para a autora, essa proposta pressupõe a compreensão do outro como
sujeito, detentor de um determinado conhecimento e não mero receptor de
informações, o que resulta no respeito ao universo cultural dos participantes e,
principalmente, na ideia de saberes popular e científico pensados de forma
dinâmica. Pois, nesse processo contínuo de interação, a “escuta atenta” e a abertura
ao saber do outro, possibilitará a construção compartilhada do conhecimento e de
formas de cuidado diferenciadas a partir dessa construção.
Nesse enfoque, ao buscar conhecer os saberes e práticas dos cuidadores de
idosos com Alzheimer, fundamentou-se o estudo na teoria dialógica libertadora de
Paulo Freire, pois na concepção desse teórico, todas as pessoas são dotadas de
saberes e esses conhecimentos provêm da reflexão que o homem faz do contexto
concreto, isto é, das experiências vividas na realidade na qual está inserido,
cumprindo também a função de analisar e refletir essa realidade, no sentido de
apropriar-se de um caráter crítico sobre ela (FREIRE, 1979).
Na compreensão de Freire (1979; 1980), é necessário não só conhecer o
mundo é preciso transformá-lo. Em outras palavras, saber/conhecer é uma atitude
ativa do homem frente ao mundo, é, antes de tudo, conscientização, envolve
intercomunicação, intersubjetividade, que pressupõe a educação dos homens entre
si mediatizados pelo mundo, tanto da natureza como da cultura.
A prática, na visão de Freire (1980), não pode se restringir à leitura
descontextualizada do mundo, ao contrário, vincula o homem nessa busca
consciente de ser, estar e agir no mundo, num processo que se faz único e
dinâmico, melhor dizendo, é apropriar-se da prática, dando sentido à teoria. Assim,
este autor expressa a práxis como o ato de ação e reflexão dos homens sobre o
mundo para transformá-lo. Nesse sentido, deve-se ressaltar que a função da prática
é a de agir sobre o mundo para transformá-lo.
E assim, refletindo, pois, sobre as necessidades, limitações, possibilidades e
estratégias de enfretamento que os cuidadores familiares vivenciam na sua rotina
diária, ao cuidar de um idoso dependente, foi focalizado como objeto deste estudo:
os saberes e práticas de cuidadores familiares de idosos com Alzheimer.
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1.2 Questão Norteadora e Objetivos do Estudo
Diante da problematização acerca do objeto delimitado neste estudo, foi
elaborada a seguinte questão que serviu para nortear e estruturar este estudo:
Quais os saberes e práticas dos cuidadores familiares de idosos com Alzheimer?
Tomando como base a questão norteadora, que conduziu na elaboração
desta pesquisa, bem como sobre o enfoque de que o sujeito é um pensador ativo,
que age de acordo com as suas necessidades, concepções e experiências
históricas, pessoais, sociais e culturais, constituíram objetivos deste estudo:
Descrever os saberes e práticas dos cuidadores familiares de idosos com
Alzheimer;
Discutir à luz do referencial dialógico de Paulo Freire os saberes e práticas dos
cuidadores familiares de idosos com Alzheimer.
1.3 Justificativa e Relevância do Estudo
A inserção na temática “cuidadores de idosos portadores de Alzheimer”
emergiu a partir da vivência e experiência profissional, como enfermeira da
Estratégia Saúde da Família (ESF) no município de Teresina, por um período de
quatro anos, onde desenvolvi ações assistenciais de Enfermagem dirigidas à
promoção da saúde do idoso na família e na comunidade.
Ao realizar o diagnóstico situacional da área, a equipe da qual participava,
identificou um alto índice de idosos portadores desse agravo que se apresentavam
dependentes dos cuidados da família. Este fato permitiu a programação de visitas
domiciliares a estes idosos, conforme as ações preconizadas pela Estratégia Saúde
da Família.
As visitas domiciliares possibilitaram ouvir depoimentos de familiares acerca
das dificuldades enfrentadas, como, por exemplo: a falta de informação para o
desempenho do cuidado, a incompreensão das orientações prescritas pelos
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profissionais de saúde, a sobrecarga de trabalho para um único indivíduo, a
disponibilidade da família na sociedade atual, dificuldades financeiras e o fato de
muitas vezes a cuidadora também ser idosa.
Nessa perspectiva, foi possível observar, empiricamente, que essas
dificuldades vivenciadas pelo núcleo familiar submetiam, particularmente, os
cuidadores familiares a uma sobrecarga psicológica acompanhada de depressão,
estresse, queda da resistência física e problemas de ordem conjugal. Paralelamente
a isso, o idoso apresentava declínio nas condições de vida que sinalizavam, muitas
vezes, dentre outros, negligência e maus-tratos.
Assim, ao interagir com essas situações e me relacionar com essas
pessoas, senti que precisava compreendê-las para assim buscar desenvolver um
cuidado integrado ao contexto das crenças e valores que são relevantes para elas.
Dessa forma, comecei a interessar-me pelos saberes que fundamentam as suas
práticas de cuidados com esse idoso, pois é notório que estes conhecimentos,
aceitos socialmente, transcendem as práticas biomédicas.
Além disso, foi possível perceber que esse universo que me era
desconhecido, era também ignorado pelo sistema formal de saúde, exigindo do
profissional de saúde, sobretudo, do enfermeiro, olhares que revelam uma
preocupação e motivem investigações voltados para a prática de cuidado orientados
pelos próprios saberes e práticas dos sujeitos envolvidos.
Atualmente, como docente da disciplina Atenção à Saúde do Idoso no Curso
de Graduação em Enfermagem, desenvolvo atividades práticas voltadas à
assistência a esta clientela, tanto na área ambulatorial como na hospitalar. Neste
contexto, observa-se que muitos profissionais de saúde, inclusive o enfermeiro,
ainda continuam prestando orientações técnicas, fragmentadas e prescritivas, sem
levar em consideração a multidimensionalidade do cuidado, principalmente em
relação aos aspectos sociais, culturais e históricos do idoso, da família e dos
próprios cuidadores.
Essa postura dos profissionais de saúde, provavelmente, está ancorada em
sua formação acadêmica, baseada no modelo biomédico, que não valoriza as
atitudes, costumes, e crenças da população, reforçando, desse modo, a
dependência aos serviços de saúde.
Baseada nessas observações, procurou-se discutir sobre quais saberes e
práticas os cuidadores familiares utilizam no seu cotidiano ao cuidar de um idoso
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com Alzheimer. Questionou-se também se esses conhecimentos foram adquiridos a
partir de vivências e experiências de cuidados com outros membros da família, de
amigos e/ou de vizinhos, ou seja, saberes provenientes da própria prática, do senso
comum, ou ainda se este cuidado se faz baseado em informações provenientes dos
serviços de saúde ou veiculados pela mídia.
Esta problemática tornou-se ainda mais instigadora a partir da minha
inserção no Programa de Pós-Graduação Mestrado em Enfermagem da
Universidade Federal do Piauí (UFPI). Após sucessivas leituras e reflexões acerca
do tema, compreendi que os cuidadores familiares de idosos com Alzheimer
apresentam uma sobrecarga física e psicológica mais significativa do que os demais
cuidadores de idosos com outras doenças crônicas, uma vez que a DA proporciona
ao portador uma perda da autonomia com instalação da dependência, necessitando
de um cuidador vigilante às 24 horas do dia, sendo estes essenciais a sobrevivência
do idoso.
Assim, ao consultar literatura internacional e nacional referente a esse tema,
foi possível constatar a existência de diversos trabalhos realizados junto aos
cuidadores familiares de idosos com Alzheimer. Embora conhecê-los tenha sido
muito importante, não se pode esquecer que as realidades nas quais eles foram
desenvolvidos são bastante diferentes do contexto piauiense.
Neste sentido, no município de Teresina já foram desenvolvidas algumas
pesquisas acadêmicas relevantes junto aos cuidadores familiares. Mas ainda se
possui um corpo de conhecimentos insuficientemente consistente, que permita saber
o que pensam esses cuidadores, como se organizam no grupo doméstico para
exercer essas funções, quais são as tensões e os conflitos experienciados por eles,
quais são suas principais queixas e seus desejos, suas estratégias para resolver
problemas cotidianos do cuidado, suas necessidades de auxílio no exercício dessas
atividades e tantas outras questões que, possivelmente, eles possuem e ainda
desconhecem.
Portanto, este estudo teve a intenção de contribuir para que se amplie o corpo
de conhecimentos acerca do processo de cuidar de idosos com Alzheimer na esfera
doméstica, segundo a ótica dos próprios cuidadores familiares e considerando seus
referenciais culturais. Desse modo, esta investigação, poderá instrumentalizar a
prática assistencial do Enfermeiro dirigida aos cuidadores na atenção básica,
através de informações e orientações fundamentais para o cuidado dos portadores
22
desta patologia, e, como conseqüência da habilitação dos cuidadores, será possível
o alcance na melhoria da qualidade de vida dos idosos e de suas famílias.
Além da contribuição assistencial, acredita-se que esta investigação poderá
colaborar significativamente na área do ensino, especialmente, referente à educação
em saúde voltada para os cuidadores que são efetivos parceiros da assistência de
Enfermagem no domicílio. Também, acredita-se que a partir do conhecimento
produzido neste estudo poderão emergir bases de subsídios para Políticas Públicas
Estaduais e/ou Municipais, pois retratará uma realidade vivenciada por uma parcela
significativa da população idosa e suas famílias, que sofrem os impactos
epidemiológicos desta morbidade crônico-degenerativa e incapacitante.
Finalmente, considerando a relevância desta temática na área de
Enfermagem, e a emergência do fenômeno do envelhecimento associado a uma
patologia contemporânea como a Doença de Alzheimer, acredita-se que esta
Dissertação de Mestrado servirá de base para futuras pesquisas congêneres.
Embora tenha sido uma investigação com um limitado número de sujeitos, deu-se
voz, valorizando-se as informações dos mesmos, através de uma abordagem
qualitativa, e assim, foi possível identificar saberes e práticas repletos de
significados, sentimentos e vivências que poderão subsidiar a assistência, o ensino
e a produção de novos conhecimentos.
23
2 REFERENCIAL TEMÁTICO ___________________________________________________________________
24
Para contextualizar sobre os saberes e as práticas dos cuidadores de idosos
com Alzheimer no domicílio, tornou-se imperativo apresentar o fenômeno do
envelhecimento populacional brasileiro e a Doença de Alzheimer, focalizando, para
tanto, uma breve trajetória evolutiva das Políticas Públicas direcionadas à pessoa
idosa e seus cuidadores familiares. Além disso, mostrou-se necessário, nesta
construção, descrever a multidimensionalidade da prática de cuidar do portador de
Alzheimer no âmbito domiciliar, bem como enfocar o papel do enfermeiro na
assistência aos cuidadores familiares e ao idoso que vivenciam tal agravo.
2.1 O Envelhecimento Populacional Brasileiro e a Doença de Alzheimer
O envelhecimento é um processo inerente a todo ser vivo que inicia-se após
a maturidade sexual e finaliza-se com a morte. Conforme a Organização
Panamericana de Saúde (OPAS) é um processo dinâmico, progressivo, individual,
acumulativo, irreversível, não patológico, de deterioração de um organismo maduro,
próprio a todos os membros de uma espécie (BRASIL, 2006a).
No Brasil, o envelhecimento da população acontece de forma rápida,
manifestando um comportamento semelhante aos países em desenvolvimento.
Segundo as constatações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD),
a população brasileira, no ano de 2007, era constituída por 189,8 milhões de
pessoas e os idosos representavam 10,6% dessa população (IBGE, 2008).
Essa pesquisa também aponta que a faixa etária com 80 anos ou mais, é o
segmento populacional que mais cresce atualmente. Para se ter uma visualização
desse crescimento, é válido destacar que em 1940 existiam 166 mil pessoas idosas
e em menos de um século esse contingente chegou a atingir quase 1,6 milhões em
2007. Isto leva a uma heterogeneidade do segmento idoso e aumenta a demanda
por cuidados de longa permanência (IBGE, 2008).
Vale ressaltar que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ao
realizar a Síntese de Indicadores Sociais em 2008, constatou uma “feminização da
população idosa”, visto que houve uma proporção de 100 mulheres para cada 79
homens na zona urbana brasileira no ano de 2007. Essa predominância do sexo
25
feminino é atribuída à redução da mortalidade feminina que vem ocorrendo nas
últimas décadas (IBGE, 2008).
Essas mudanças no perfil demográfico da população brasileira são
perceptíveis desde 1940, e são resultantes da queda da mortalidade,
concomitantemente, com a redução da taxa de fecundidade que elevou as outras
faixas etárias, repercutindo assim no aumento da expectativa de vida, sendo que em
2000 a esperança de vida ao nascer era de 65 anos para os homens e 73 anos para
as mulheres (CHAIMOWICZ, 2005).
Além das modificações populacionais, o Brasil tem vivenciado uma
transição epidemiológica, com alterações relevantes nos índices de morbi-
mortalidade. Para melhor se perceber essa transição epidemiológica, destaca-se
que em 1950, as doenças cardiovasculares causavam 12% das mortes e,
atualmente, representam mais de 40% dos óbitos. Essa inversão do perfil
epidemiológico no Brasil é fruto dos avanços tecnológicos na área da saúde, da
melhoria nas condições sócio-econômicas, do controle parcial das doenças
preveníveis por imunizações e da incorporação do saneamento básico ao espaço
urbano (GORDILHO et al., 2000).
Essa transição epidemiológica evidenciada no Brasil é visualizada também
mundialmente, como mostra o relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS)
para os agravos crônicos, que são responsáveis por 60% de todo o ônus decorrente
de doenças do mundo. O crescimento é tão significativo que, as projeções para o
ano de 2020, apontam que 80% da carga de doenças dos países desenvolvidos
devem advir das morbidades crônicas (OMS, 2003).
Dentre os agravos crônicos existentes no mundo atualmente, cabe ressaltar
as demências que vêm se destacando em função da sua incidência e prevalência,
as quais aumentam exponencialmente com a idade, dobrando, a cada 5 anos, a
partir dos 60 anos de idade. Desse modo, após 65 anos, a prevalência é de cerca de
5 a 10%, e a incidência anual é em torno de 1 a 2%, aumentando progressivamente,
após os 75 anos, respectivamente para 15 a 20% e 2 a 4% (MACHADO, 2002).
As demências acometem principalmente a memória, mas pode-se observar
prejuízo de pelo menos uma das seguintes capacidades de cognição: atenção,
imaginação, compreensão, concentração, raciocínio, julgamento, afetividade,
percepção, bem como, também pode se verificar afasia, apraxia, agnosia e
26
perturbações nas funções de execução como, planejamento, organização,
seqüência e abstração por um período superior a seis meses (AMERICAN
PHYCHIATRIC ASSOCIATION, 2002; CANINEU, 2003).
A causa mais comum de demência em idoso é a doença de Alzheimer,
responsável por mais de 50% dos casos em vários países. Este agravo é
caracterizado clinicamente por sintomas de debilidade mental progressiva e,
anatomicamente, pela presença de placas de “Redlich-Fisher” no córtex cerebral. É
uma enfermidade neurológica, lenta e degenerativa, que leva à perda progressiva
das habilidades domésticas diárias e de todas as funções até chegar ao final, com a
perda total da fala e dos movimentos, ausência do pensamento e da capacidade de
comunicação (GUTERMAN, 2002).
Esse tipo de demência apresenta-se em três estágios: o inicial, que é leve e
o individuo manifesta confusões e perda da memória, desorientação espacial,
dificuldade progressiva no cotidiano, mudanças na personalidade e na capacidade
de julgamento; o segundo, considerado moderado, evoluindo para incapacidade na
realização dos atos de vida diária, ansiedade, delírios, alucinações, agitação
noturna, alterações do sono, dificuldades de reconhecimento de amigos e familiares;
e, por fim, o terceiro e mais grave estágio, caracterizado pela redução acentuada do
vocabulário, diminuição do apetite e do peso, descontrole esfincteriano e
posicionamento fetal (CAOVILLA; CANINEU, 2002).
Embora a etiologia da DA ainda não tenha sido elucidada, fatores genéticos
são extremamente relevantes, pois, além da idade, a existência de membro da
família com demência é o único fator sistematicamente associado, presente em
32,9% dos casos diagnosticados (BRASIL, 2002a).
Além de dificuldades em precisar a etiologia, o diagnóstico da DA também é
complicado, ou seja, considerando que é feito por exclusão. Os critérios para o
diagnóstico clínico provável deste agravo são: presença de demência estabelecida
por teste objetivo; prejuízo da memória e de pelo menos outra função cognitiva;
piora progressiva da sintomatologia; ausência de distúrbio do nível de consciência;
início dos sintomas entre 40 e 90 anos; ausência de distúrbios sistêmicos e/ou outra
doença do sistema nervoso central que poderiam acarretar déficit cognitivo
progressivo, como, por exemplo, hipotireoidismo (BRASIL, 2002a).
27
Em relação ao tratamento, nos dias atuais, são instituídos dois tipos de
terapias: o medicamentoso, que visa corrigir os déficits cognitivos e os distúrbios
psicocomportamentais. E as terapias não-medicamentosas, consideradas um
grande avanço em relação ao retardo da progressão da doença, que são
executadas por uma equipe multiprofissional. A combinação dessas terapias
demonstra resultados satisfatórios tanto no cuidar do idoso como da família
(CAOVILLA; CANINEU 2002)
Portanto, compreender a doença no seu aspecto biológico e clínico, de certa
forma, já está sendo buscado pela ciência e vem contribuindo nas estratégias para a
terapêutica medicamentosa desses doentes. No entanto, saber lidar com o doente
inserido no seu contexto social é o que se precisa melhor investir e, assim, anunciar
que o diálogo com a família cuidadora acerca das estratégias de cuidar, a partir de
suas vivências, pode sinalizar as diferentes maneiras de cuidar do doente de
Alzheimer e produzir discussões sobre a implementação de políticas de cuidados a
esse grupo (COELHO, 2004).
2.2 A Prática do Cuidador de Idoso Portador de Alzheimer no Domicílio
Ao refletir sobre as práticas dos cuidadores de idosos com Alzheimer no
domicílio foi imprescindível buscar embasamento teórico acerca do cuidar,
considerando se tratar de uma temática que se configura como fonte de
conhecimento aplicadas a inúmeras áreas do saber humano, sobretudo, da saúde, e
aqui, especificamente, a área da Enfermagem.
Na concepção de Boff (1999, p.33):
Cuidar é mais que um ato: é uma atitude. Portanto, abrange mais que um momento de atenção, de zelo e de desvelo. Representa uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro.
Esse autor afirma que o cuidado somente surge quando a existência de
alguém tem importância para o outro, quando passa a dedicar-se a ele, dispor-se a
28
participar do seu destino, de suas buscas, de seus sucessos e de sua vida. Tudo
que existe e vive necessita de cuidado para continuar existindo. Uma planta, uma
criança, um idoso, o planeta Terra.
Boff (1999) ressalta que o cuidado é mais fundamental que a razão e o
desejo, e que o ser humano coloca cuidado em tudo que executa. Nesse sentido,
passa a significar a própria essência da vida humana, precisando, assim, ser
constantemente alimentado, entre outros, com ternura, amor, carinho.
Waldow (2008, p. 87) afirma que “o Ser Humano é um Ser de cuidado, o Ser
nasce com este potencial, portanto todas as pessoas são capazes de cuidar e
necessitam, igualmente de serem cuidadas”. Entretanto, o desenvolvimento desta
capacidade sofre intervenções de diversos fatores como as relações interpessoais,
bem como da cultura, ambiente, economia, religião, dentre outros.
Leininger (1991) definiu cuidar/cuidado, como um ato que se encontra em
todas as culturas no mundo e que diz respeito a modos naturais de ser e estar. O
ato de cuidar, independentemente do seu grau de complexidade ou
profissionalização implica nas ações humanas úteis para as pessoas e que se
baseiam em modos de ajudar os indivíduos culturalmente definidos.
Para a autora, cuidar é indispensável à vida do indivíduo e à própria
manutenção de toda a sociedade, permitindo a sua continuidade. O cuidar e os
cuidados são essenciais à sobrevivência dos homens, assim como para o seu
crescimento, saúde, bem-estar, cura e capacidade de lidar com as deficiências e a
morte.
Leininger (1991) afirma que os homens são considerados capazes de cuidar
e de preocupar-se com as necessidades, o bem-estar e a sobrevivência dos outros.
O cuidado humano é universal, ou seja, está presente em todas as culturas. Assim,
os homens são universalmente seres cuidadores que sobrevivem em uma
diversidade de culturas pela sua capacidade de proporcionar a universalidade do
cuidado de várias maneiras e de acordo com os diferentes contextos, necessidades
e situações.
Esse cuidado, na perspectiva de Caldas (2003), tem um caráter existencial,
considerando que emerge quando o cuidador compreende a sua subjetividade e a
do outro, vivenciando essa relação e expressando-a de tal forma que a
individualidade, a autonomia e a liberdade do outro seja respeitada.
29
E nesse enfoque, cujo cuidado existencial transcende o tempo e o espaço,
como afirma essa autora, bem como independe de sociedades e culturas, é
importante acrescentar que o ser humano sempre necessita de cuidados.
Considerando certos estágios de sua vida, esse cuidado deve corresponder, dentre
outros aspectos, a uma melhor e maior interação com o outro que, por sua vez,
busca uma assistência mais ampla de seus problemas. Pode-se citar como exemplo
disso a velhice, a qual quando acompanhada de doenças passa a exigir ainda mais
cuidado.
O envelhecimento populacional conduziu a uma crise dos sistemas de
proteção social e de saúde, recaindo unicamente sobre as famílias a
responsabilidade de cuidar dos seus idosos. Esse cuidado desenvolvido no contexto
domiciliar, fez ressurgir no núcleo familiar, os cuidadores familiares, que são
pessoas que oferecem cuidados para suprir a incapacidade funcional temporária ou
definitiva do individuo.
Neste estudo, foram focalizados os cuidadores familiares de idosos com
Alzheimer, cujas tarefas envolvem o acompanhamento das atividades diárias do
idoso e seu auxílio na alimentação, higiene pessoal, medicação de rotina e outras
práticas necessárias, excluídas aquelas para as quais sejam requeridas técnicas ou
procedimentos identificados com profissões legalmente estabelecidas,
particularmente na área de Enfermagem (CAMPINAS, 2005).
Esses cuidadores recebem denominações conforme o vínculo com a pessoa
que dispensam o cuidado. Dessa forma, entende-se por cuidadores formais os
profissionais de saúde que prestam cuidados e são remunerados por estes serviços,
ao passo que os cuidadores informais são todos aqueles que prestam cuidados no
âmbito domiciliar, mas não recebem nenhuma remuneração, podem ser familiares,
amigos, vizinhos e membros da comunidade (SOMMERHALDER, 2001).
Em seu estudo sobre o impacto nas relações familiares causadas pelo
Acidente Vascular Cerebral, Karsch (2003) mostra que em 98% dos casos
pesquisados, o cuidador informal era alguém da família, predominantemente do
sexo feminino (92,9%). A maioria eram esposas (44,1%), seguida de filhas (31,3%);
as noras e as irmãs não foram freqüentes.
Para a autora, o cuidador familiar se revelou o ator social principal nos
cuidados aos idosos incapacitados, sendo que 67,9% desses indivíduos prestavam
cuidados sem nenhum tipo de ajuda. É importante destacar que a faixa etária de 50
30
anos foi a mais freqüente, com 59% contra 41% daqueles que tinham idade superior
a 60 anos. Os dados mostram também que 39,3% de cuidadores, entre 60 e 80
anos, cuidavam de 62,5% de pacientes da mesma faixa etária, o que se conclui que
pessoas idosas estão cuidando de idosos.
No contexto familiar, a função de cuidador tende a ser assumida por uma
única pessoa, denominada de ”cuidador principal”, o qual se responsabiliza pelas
tarefas de cuidados, sem contar com ajuda de outros membros da família. Essa
posição é assumida geralmente, por esposas, filhas e noras. Assim, a mulher
evidencia-se como a “grande cuidadora”, a quem foi atribuída esse papel cultural e
socialmente, ao cuidar dos filhos, do marido, dos doentes e dos velhos (DIOGO;
CEOLIM; CINTRA, 2005; NERI et al., 2002).
Entretanto, Karsch (2003) alerta que cuidar de um idoso dependente em
casa é certamente uma condição que deve ser preservada e estimulada. Todavia,
estes cuidados não podem restringi-se somente aos encargos da família, tendo em
vista que atualmente as mesmas sofrem mudanças significativas em seus papéis,
ocasionadas por diversos motivos como: divórcios e novas uniões; instabilidade
econômica e migrações em busca de oportunidades de trabalho; maior tempo de
vida das gerações e um aumento do contingente de viúvas; idosos exercendo
chefias de famílias; e a participação da mulher no mercado de trabalho.
Essa mesma autora ressalta a importância de se analisar o envelhecimento
com dependência dentro de um contexto histórico, social, político, econômico e
cultural a fim de que sejam implementadas políticas públicas mais eficazes e viáveis
de suporte aos cuidadores de idosos com dependência.
Estudos científicos revelam duas concepções sobre as experiências dos
cuidadores familiares no domicílio. A primeira se baseia no enorme impacto de
conviver com o doente, que cada vez torna-se mais dependente, o que provoca uma
série de alterações na saúde física, emocional e social deste cuidador, pois o
cuidado é contínuo, exige conhecimento específico e habilidades. A outra concepção
revela os aspectos positivos que envolvem essa relação de cuidados, que se mostra
como uma experiência enriquecedora, na qual se faz uma auto-avaliação a cerca
dos conceitos e concepções de vida, ganhando-se em aprendizado e
reconhecimento social, além de renovação espiritual e fortalecimento da fé (SENA;
GONÇALVES, 2008; SOMMERHALDER, 2001; LAHAM, 2003).
31
A esse respeito autores como Néri e Carvalho (2002), apontam que o cuidar
envolve questões financeiras, motivações e afetos, fazendo emergir conflitos e
ambivalências. No início do exercício desta prática, as exigências parecem mais
fortes, mas ao longo do tempo, em virtude de processos adaptativos e da variedade
de processos que ocorrem na vida do familiar que cuida, o senso de sobrecarga
pode se estabilizar ou diminuir. Nesse sentido, não se deve pensar no cuidado como
uma atividade que necessariamente traz efeitos nocivos. Apesar de ser tarefa
onerosa em muitos aspectos, nem todos os cuidadores ficam sobrecarregados,
doentes ou estressados, bem como existe a possibilidade de transformar
cognitivamente a situação de modo a lidar com o ônus.
Assim, enquanto prestadora de cuidados ao seu familiar idoso com DA, a
família constitui-se em matriz cuidadora que merece apoio e valorização por parte
dos profissionais de saúde, representando sua importante aliada. A valorização do
processo de cuidar, conduzido pelas famílias, representa uma contrapartida para o
profissional de saúde trabalhar em parceria, atendendo-a como cliente também em
suas necessidades de saúde, minimizando, assim, a vulnerabilidade tanto dos
idosos quanto dos seus familiares cuidadores. Assim, é possível prevenir a
institucionalização desses idosos e orientar os cuidadores para que possam lidar
melhor com os desafios que a doença de Alzheimer determina (PELZER, 2005).
Desse modo, conforme destaca Guterman (2002), é fundamental preparar o
cuidador e habilitá-lo ao exercício dessa função e ajudá-lo na missão que lhe cabe,
que é a de estar ao lado do idoso dando-lhe o apoio necessário, servindo-lhe de
suporte para minimizar os seus problemas. Também é necessário preparar os
demais familiares, pois embora seja individual, esta doença, pelos seus efeitos
econômicos e sociais, acomete o próprio núcleo familiar do idoso, ou seja, a todos
aqueles que fazem parte do seu ambiente domiciliar.
2.3 As Políticas Públicas de Atenção à Pessoa Idosa
Considerando a realidade do envelhecimento populacional, o Brasil tem
investido em Políticas Públicas de acolhimento à pessoa idosa, assim como em
projetos de proteção social que assegurem os direitos a esses indivíduos. Um marco
32
importante dessa trajetória foi a Constituição Federal de 1988, que introduziu em sua
disposição o conceito de seguridade social, modificando o enfoque da rede de
proteção social, antes estritamente assistencialista, passando a ter um caráter
ampliado de cidadania e responsabilizando as famílias a oferecer acolhimento e
cuidado aos idosos.
Assim, a Constituição Brasileira de 1988, em seu artigo 229, relata que “os
pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os seus filhos
maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou
enfermidade”. E Acrescenta que “os programas de amparo ao idoso serão
executados preferencialmente em seus lares”. Então, é possível perceber que no
âmbito das Políticas Públicas existe uma forte tendência em reconfigurar a
institucionalização do cuidado e seu retorno à esfera doméstica. Dessa forma, a
família é percebida como cuidadora ideal, embora, na realidade concreta, conforme
apontam as pesquisas, esse núcleo de cuidados permaneça desassistido por essas
políticas e tendo que assumir sozinho mais essa responsabilidade (BRASIL, 1994).
Nesse sentido, foi estabelecida, em 1994, através da Lei 8.842, (BRASIL,
1994), a Política Nacional do Idoso (PNI), que considera idosa toda pessoa com
idade maior ou igual a 60 anos e prioriza em suas diretrizes o atendimento a esse
grupo populacional por intermédio de suas próprias famílias em detrimento do
atendimento asilar. Contudo, é valido lembrar que a família necessita de uma rede
de amparo social e de saúde que se constitua em um suporte para lidar com o idoso
à proporção que este se torne mais dependente.
Foi nessa política que, pela primeira vez, viram-se efetivamente
contemplados os direitos dos idosos de uma maneira mais ampla, buscando
envolver todos os segmentos da esfera federal, estadual e municipal com o intuito
de garantir o bem-estar físico, emocional e social do idoso em todo o território
nacional. (BRASIL, 1994)
Como um detalhamento da PNI, foi criada em dezembro de 1999 a Política
Nacional de Saúde do Idoso (PNSI), regulamentada através da portaria ministerial nº
1.395. O foco central dessa política é a promoção do envelhecimento saudável
através da manutenção da capacidade funcional, isto é, valorizando a autonomia e
preservando a independência física e mental do idoso (BRASIL, 1999).
Uma das diretrizes da PNSI propõe o apoio à formação dos cuidadores
informais. Desse modo, o governo brasileiro, no intuito de atender integralmente o
33
idoso e seus familiares, instituiu, em 7 abril de 1999, a portaria interministerial nº
5.153, tendo, entre outros, o objetivo de instituir o Programa Nacional de Cuidadores
de Idosos, cujo o foco é formar cidadãos que ofereçam cuidados adequados aos
idosos, bem como conceder suporte aos familiares cuidadores (BRASIL, 1999).
A Política Nacional de saúde do Idoso foi também responsável pela criação
do Programa de Assistência aos Portadores de Alzheimer, através da portaria
ministerial nº 703, que entrou em vigor a partir de 12 abril de 2002. Esse programa
foi implantado no âmbito do SUS, o que determinou que sua abrangência se estenda
em todo território nacional. Conforme a portaria, os Centros de Referências em
Assistência à saúde do idoso passam a ser responsáveis pelo diagnóstico,
tratamento, distribuição gratuita de medicamentos, acompanhamento dos pacientes,
além da orientação a familiares e cuidadores (BRASIL, 2002b).
Outro dispositivo que nasceu dos anseios da sociedade foi o Estatuto do
Idoso, aprovado em setembro de 2003 e sancionado pela lei 10.741, mais
abrangente que a PNI, institui penas severas para quem desrespeitar e abandonar o
idoso. Esse estatuto incentiva a permanência desses cidadãos no domicílio, junto à
família e na comunidade, desestimulando as internações em serviços de longa
permanência, casas de apoio e afins (BRASIL, 2003).
Vale ressaltar como um marco no Sistema Único de Saúde (SUS), em
relação atenção à pessoa idosa, a portaria ministerial nº 399, de fevereiro de 2006,
que divulgou as Diretrizes do Pacto pela Saúde, o qual agrega três eixos: o Pacto
em Defesa do Sistema Único de Saúde, o Pacto em Defesa da Vida e o Pacto de
Gestão (BRASIL, 2006b).
No Pacto em Defesa da Vida, a saúde do idoso é contemplada como uma
das prioridades pactuadas entre as três esferas do governo, sendo apresentadas
uma série de ações que objetivam a implementação de algumas das diretrizes da
Política Nacional de Atenção à Saúde do Idoso (BRASIL, 2006c).
No decorrer do processo de pactuação, foi assinada uma nova portaria
ministerial, a de nº 2.528, de 19 de outubro de 2006, que estabeleceu a Política
Nacional de Saúde da Pessoa Idosa, que teve como um dos grandes diferenciais a
orientação dos serviços públicos de saúde a identificar o nível de dependência do
idoso e atribuir um acompanhamento diferenciado para cada situação. Assim, os
serviços de saúde, para fornecer um atendimento adequado, devem fazer a
34
distinção entre idosos independentes daqueles que apresentam algum nível de
fragilidade (BRASIL, 2006c).
Neste sentido, os profissionais da saúde devem avaliar as pessoas idosas
de acordo com a sua capacidade funcional. E vale ressaltar que aos idosos frágeis
ou dependentes serão destinadas ações de reabilitação, prevenção secundária e
atenção domiciliar, ao passo que aos considerados independentes caberá receber
ações de prevenção e promoção da saúde, reabilitação preventiva, atenção básica e
suporte social (BRASIL, 2006c).
2.4 Intervenções de Enfermagem junto aos Cuidadores Familiares de Idoso
com Doença de Alzheimer
Cuidar de um idoso com Alzheimer no domicilio é certamente uma tarefa
árdua para o cuidador e sua família, uma vez que este cuidado se circunscreve em
uma pluralidade de necessidades e especificidades, sejam elas relativas às
condições sociais, econômicas e biológicas, sejam de ordem psicológica e
emocional.
Partindo dessa concepção, deve-se ressaltar que cuidar do idoso e do
cuidador familiar configura-se atualmente em um dos mais novos desafios para os
serviços de saúde e, por conseguinte, para os profissionais, tendo em vista que o
envelhecimento populacional tem proporcionado um elevado número de idosos
dependentes dos cuidados da família.
Esses desafios impõem aos profissionais de saúde, em particular, o
Enfermeiro, o desenvolvimento de práticas de educação em saúde que se esforçam
em interelacionar saberes, resgatar conhecimentos e restabelecer diálogos entre
culturas que permitam ampliar a capacidade de conhecer a realidade e intervir com
responsabilidade sobre ela, para garantir a vida com qualidade a todos, em sua
relação com o ambiente (ERDMANN; SCHLINDWEIN; SOUSA, 2006).
Nessa perspectiva, cabe ao enfermeiro ao assistir os cuidadores familiares
de idoso com Alzheimer, facilitar a expressão dos problemas, dificuldades e
constrangimentos sentidos, valorizando o trabalho desenvolvido pelos mesmos.
Estes profissionais deverão mostrar disponibilidade e abertura para o diálogo e
35
ajudar os cuidadores a enfrentar e resolver os conflitos resultantes do processo de
cuidar, demonstrando respeito pelas suas crenças e valores. (DUARTE; DIOGO,
2000)
Essa postura, segundo Acioli (2008), resulta na construção de um novo
saber, que nasce do entrelaçamento do conhecimento científico com o saber
popular, fruto da reflexão do cotidiano e da práxis individual ou coletiva, com
possibilidade de transformá-la, que é denominada de conhecimento compartilhado.
Essa prática educativa fomenta a interdisciplinaridade, a autonomia e a cidadania, e
privilegia a interação dialógica, na qual os sujeitos detentores dos diferentes saberes
transformam-se e vão transformando a sua realidade.
A enfermagem, pela proximidade que tem com a população, assume um
papel fundamental no apoio desses cuidadores, constituindo-se como o elo entre os
mesmos e a equipe multidisciplinar. Contudo, a prática evidencia que essa relação
nem sempre é observada, considerando que em muitas situações não há essa
interação entre o enfermeiro e os cuidadores. O projeto de manter um doente no
domicílio é necessariamente pluridisciplinar, existindo a necessidade de articular os
saberes de diferentes grupos profissionais (PEREIRA, 2008).
Para essa autora, o apoio no domicílio ao idoso e ao cuidador deve centrar-
se em uma perspectiva holística, no sentido de manter o doente o mais
independente possível, minimizando as perturbações comportamentais, em um
ambiente pouco restritivo, tendo como referência as seguintes linhas orientadoras:
manter a máxima qualidade de vida; apoiar as famílias e os doentes nas suas casas;
minimizar a mobilidade; diminuir o sofrimento; melhorar a autoestima e a integridade
pessoal; otimizar a papel da família e dos cuidadores na prestação de cuidados.
O cuidador não deve ser objeto de intervenção, ser submetido a um
tratamento, mas sim sujeito de intervenção, desenvolvendo sinergias com os
serviços de saúde. Eles devem ser encarados como aliados na recuperação e
manutenção da saúde das pessoas de quem cuidam, detentores de um potencial
determinado pelas percepções das experiências vividas, que irão influenciar os seus
comportamentos quando da gestão dessas mesmas experiências (MENDES, 2005).
Essa perspectiva passa de um paradigma, cujos sujeitos assumem um papel
passivo e de simples receptor de cuidados, conferindo-lhes um papel ativo na
vivência do cuidado e na tomada de decisões. Mendes (2005) considera que as
intervenções dos profissionais de saúde devem ser dirigidas para os cuidadores,
36
encarando-os não unicamente como receptores de cuidados, mas também e
principalmente como parceiros do cuidar.
Tais condutas permitem ao enfermeiro trabalhar com os cuidadores
familiares em diversas estratégias como os grupos de auto-ajuda, palestras,
consultas de enfermagem, entre outros, no sentido de investir no apoio emocional
das pessoas que cuidam para fortalecê-las, melhorando a sua qualidade de vida e
do idoso com Alzheimer.
A esse respeito Caldas (2002) relata sua experiência em uma instituição
pública ao cuidar de pessoas idosas com demência e sua família ao nível
ambulatorial. A autora revela que se reúne com o cuidador familiar no início do
tratamento para esclarecer acerca da patologia, estabelecer estratégias de cuidado
e orientar para necessidades de adaptação da dinâmica familiar, levando em conta
as necessidades do idoso e da familia.
Caldas (2002) ressalta que continua acompanhando e reunindo-se com o
cuidador sempre que necessário, para esclarecer alterações que possam ocorrer na
evolução da doença. Os cuidadores familiares são também encaminhados ao grupo
de apoio à família, através do qual se reúnem semanalmente com a equipe
multiprofissional para esclarecimento de dúvidas e questões relativas ao cuidado.
Os cuidadores destacam a melhoria no desempenho em lidar com o idoso
demenciado, através da busca de novas estratégias para lidar com o seu ente
querido, fazendo ajustes no seu dia-a-dia, na tentativa de não se anular enquanto
ser com as suas possibilidades de continuar vivendo a sua própria vida. Nesse
sentido, essa abordagem de cuidado reafirma a preocupação dos profissionais
nessa área, na tentativa de não somente compreender a complexidade dessa
questão, mas, sobretudo, de buscar soluções e estratégias que irão ajudar as
pessoas que cuidam a enfrentarem essa condição com prazer e alegria de viver
(CALDAS, 2002).
Em vista disso, enfatiza-se que para Pereira (2008) nenhuma ação resultará
em benefício para o idoso, se o cuidador não for devidamente apoiado e integrado à
equipe de saúde. Estes atores necessitam que os profissionais de saúde atuem
como supervisores e potencializem as suas habilidades pessoais para que
aprendam não só a cuidar do seu doente, mas também a cuidar de si.
37
3 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO ___________________________________________________________________
38
3.1 A Teoria Dialógica Libertadora de Paulo Freire
Ao refletir sobre as experiências e histórias de vida que permeiam a relação
entre cuidadores e idosos portadores de Alzheimer a partir dos seus saberes e
práticas, buscou-se sustentação na teoria dialética de Paulo Freire (1997), a qual
tem como pilar o caráter dialógico e problematizador das relações e da inconclusão
dos homens, que se encontra em permanente processo de aprendizagem para
atingirem as transformações.
A dialética do diálogo libertador de Freire (1980) é uma teoria que expressa
a constante capacidade de transformação, na qual o conhecimento é entendido
como inacabado, contínuo e progressivo, e o homem assume o papel de sujeito com
atitudes: crítica, reflexiva e histórica.
Deve-se destacar que, na Teoria da Conscientização de Freire (1980), por
meio da crença em si mesmo, o homem é capaz de dominar os instrumentos de
ação à sua disposição. Em outras palavras, o homem, por suas práticas, torna-se
agente transformador de seu universo sócio-cultural e histórico.
Vale ressaltar que, considerando as práticas como derivadas da
transformação ou da reconstrução dos saberes, vários estudiosos no Piauí, na área
de Enfermagem, adotaram as idéias e conceitos de Freire (1980) para subsidiar
suas produções científicas, como Figueiredo (2005), Carvalho (2009) e Brito (2009),
as quais identificam na obra desse autor um referencial temático e teórico que pode
significar um poder de ação gerador de novas práticas.
Figueiredo (2005) revela que as concepções e conceitos freirianos serviram
para dar suporte às argumentações de sua tese, que teve como pressuposto,
afirmar que as mulheres idosas sofrem com a perda de sua autonomia imposta pela
ação opressora da sociedade capitalista e globalizada na qual estão inseridas, mas
que também reconquistam essa autonomia a partir do processo de conscientização
vivenciada em espaços sócio-educacionais e democráticos, como o PTIA, nos quais
ocorrem verdadeiras mudanças, especialmente através da valorização do
envelhecer.
Carvalho (2009) enfatiza que as contribuições freireanas se definem como
importantes fontes de conhecimento e motivação para os estudos nas diversas
áreas do saber humano. Segundo a autora, trata-se de conceitos e concepções que
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embasaram a construção de sua pesquisa, considerando que constitui de uma teoria
cujo ponto de sustentação é o diálogo problematizador no processo de ensino
aprendizagem com o objetivo de fazer com que o homem atinja uma consciência
transformadora da sua realidade, buscando melhorar sua condição de vida.
Já Brito (2009) constrói seu estudo com base no pressuposto de que as
concepções filosóficas da teoria de Freire podem servir como apoio teórico
fundamental para a análise e a discussão dos saberes e das práticas sobre a
prevenção do câncer de mama, constituintes do universo do senso comum das
pessoas idosas.
Nesse sentido, afirmando, conforme Freire (2005), que a consciência do
mundo e a consciência de si crescem juntas e em razão direta, em que uma está
comprometida com a outra, ressalta-se que foi possível identificar na obra de Paulo
Freire (1980) conceitos que deram suporte às análises dos achados desta
investigação. Pois, na visão do autor, o homem é um ser inconcluso, histórico e,
como tal, contextualizado.
Cabe enfatizar que em todo homem existe um ímpeto criador que nasce da
sua inconclusão, assim, o indivíduo deve participar e buscar a transformação de sua
realidade para ser mais, passando a se constituir sujeito e não objeto de sua própria
realidade (FREIRE, 1980).
Baseado nesses princípios, Freire apóia sua teoria em seis pressupostos
designados por ele como idéias-força: toda ação educativa deve estar precedida de
reflexão sobre o homem e de uma análise do seu meio; o homem só será sujeito a
partir da reflexão de sua situação e do seu ambiente; a educação deve levar o
individuo a uma tomada de consciência e atitude crítica no sentido de haver
mudança da realidade; através da integração do homem com o seu contexto, haverá
a reflexão, o comprometimento, construção de si mesmo e o ser sujeito; à medida
que o homem se integrar às condições de seu contexto de vida realiza reflexão e
obtém respostas aos desafios que se lhe apresentam, criando cultura; o homem é
criador de cultura e fazedor da história, pois, na medida em que ele cria e decide, ele
a transforma; a educação deve pressupor que o homem chegue a ser sujeito,
construir-se como pessoa, transformar o mundo, estabelecer relações de
reciprocidade, fazer cultura e história.
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Dessas idéias-forças, propostas por Freire, emergiram alguns conceitos que
são utilizados na área da saúde, dentre elas a Enfermagem. Para nortear este
estudo houve uma aproximação com alguns conceitos propostos por este autor, que
se julgou imprescindíveis para a análise do objeto de investigação, como: o diálogo,
a cultura, a história, a conscientização e a libertação:
Para Freire (1997), o diálogo é entendido como a própria palavra, que possui
suas dimensões de ação e reflexão. É o encontro fraterno em que há troca de idéias
sobre essas experiências, a partir do saber que cada cidadão/cliente é portador. É o
encontro em que se solidarizam a ação, a reflexão e a ação de seus sujeitos
direcionados ao mundo a ser transformado e humanizado.
Nessa perspectiva, Freire (1997, p. 43) afirma que “o diálogo é uma
necessidade existencial, é o encontro amoroso dos homens que, mediatizados pelo
mundo, o „pronunciam‟, isto é, o transformam, e, transformando-o, o humanizam
para a humanização de todos”.
O diálogo é uma comunicação verdadeira entre os homens, é ação e
reflexão. E com base nesse conceito, deve-se considerar que não há palavra
verdadeira que não seja práxis, que por sua vez significa ação transformadora que
desvela a realidade, permitindo a sua compreensão. É importante lembrar que a
compreensão serve de instrumento de releitura coletiva da realidade, onde acontece
a relação entre os homens. E, assim, para se manter o diálogo é necessário amor,
humildade, fé no homem, criatividade, criticidade e esperança (ESPINOZA, 2007).
Com base nesse enfoque, foi importante a articulação do diálogo libertador
de Freire com os cuidadores de idosos com Alzheimer, pois foi possível estabelecer,
através dessa comunicação, uma relação de reciprocidade, de trocas de ideias e de
interatividade. Além disso, permitiu buscar no universo histórico-social e cultural dos
cuidadores, saberes e práticas de cuidados na perspectiva de contribuir para a
transformação da realidade.
Nesse aspecto, deve-se tomar como um dos princípios orientadores para
esta investigação, as dimensões cultural, social e histórica dos sujeitos, que
permeiam suas práticas e saberes, uma vez que o contexto no qual estes indivíduos
se encontram inseridos é constituído, dentre outras, por desigualdades políticas,
sociais, econômicas, éticas, religiosas, construídas através de diversos olhares, em
diferentes épocas históricas e por isso compreendidas de várias formas por estes
atores, conforme seus interesses nas relações sociais (FIGUEIREDO, 2005).
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Nesse contexto, Freire (1980) define cultura como todo o resultado da
atividade humana, do esforço criador e recriador do homem, de seu trabalho por
transformar e estabelecer relações de diálogo com outros homens. Resultado da
aquisição crítica, criadora e sistemática da experiência humana, a cultura não pode
ser interpretada como a justaposição de informações armazenadas na inteligência
ou na memória e não “incorporadas” no ser total e na vida plena do homem.
Atrelada à cultura, deve-se destacar a história, a qual, na compreensão de
Freire (1980, p. 38), é vista a partir do princípio de que:
Um homem faz história na medida em que, captando os temas próprios de sua época, pode cumprir tarefas concretas que supõe a realização destes temas. Também faz história quando, surgirem os novos temas, ao se buscarem valores inéditos, o homem sugere uma nova formulação, uma mudança na maneira de atuar, nas atitudes e nos comportamentos. Insistamos em que o homem, para fazer a história, tem de haver captado os temas. Do contrário, a história o arrasta, em lugar dele fazê-la.
Partindo da busca pela compreensão do contexto histórico, social e cultural
dos cuidadores de idosos com Alzheimer, que se faz necessária para a interpretação
das práticas e dos saberes desses sujeitos, foi de fundamental importância enfocar
outros conceitos de Freire (1980), como o da conscientização, que supõe a ação de
transformar, parte de situações vividas e implica em um retorno crítico à realidade
em que se inserem os indivíduos.
A conscientização é a capacidade que o homem tem de distanciar-se das
coisas para fazê-las presentes, imediatamente presentes. É a presença que tem o
poder de presentificar. Nas palavras do próprio Freire (2005, p. 13), “não é
representação, mas condição de apresentação”. E orientado por este conceito foi
que a conscientização se mostrou essencial para a análise do objeto deste estudo,
uma vez que considerada um compromisso histórico, passa a expressar a inserção
crítica na história, assumindo o homem uma posição de sujeito, podendo transformar
o mundo.
Deve-se incorporar à essencialidade da conscientização para a análise
nesta pesquisa, o fato de que o desenvolvimento crítico da tomada de consciência
significa um ir além da fase espontânea da apreensão até chegar a uma fase crítica
na qual a realidade se torna um objeto cognoscível e se assume uma posição
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epistemológica, procurando conhecer e, em outras palavras, tomar posse da
realidade (FREIRE, 1980).
A conscientização são os olhares mais críticos possíveis da realidade, que
propiciam o seu desvelamento e permitem conhecê-la para, a partir daí, conhecer os
mitos que enganam e que ajudam a manter a realidade da estrutura dominante. A
conscientização só pode existir na práxis, ou seja, no ato ação-reflexão-ação. Pois é
uma atitude crítica dos homens na história, com conseqüente engajamento no papel
de sujeito que faz e refaz o mundo, um processo contínuo que não terminará jamais
(ESPINOZA, 2007).
A liberdade é outro pressuposto adotado por Freire (1997; 1999), que
possibilita a interrelação com o objeto dessa investigação, considerando que a
liberdade se circunscreve no ato de criar e de propor o quê e como aprender,
herdando a experiência adquirida, criando e recriando, integrando-se às condições
de seu contexto, respondendo os seus desafios, objetivando-se a si próprio,
discernindo, transcendendo, lançando-se no domínio da história e da cultura. Faz-se
importante evidenciar que qualquer forma de aprendizagem sem liberdade não
subsiste, pois tolhendo a autonomia do individuo, ele não cria, não aprende e, desse
modo, sucumbe.
A seleção destes conceitos foi importante para embasar as discussões sobre
os saberes e práticas dos cuidadores de idosos com Alzheimer. Acredita-se que a
metodologia, conscientizadora e libertadora, proposta por Paulo Freire, uniu de
forma muito feliz a cognição e afetividade, reflexão e ação, opressão e liberdade.
3.2 Tipo de Pesquisa
Para atender aos objetivos propostos nesta pesquisa, optou-se por uma
abordagem qualitativa, com estudo descritivo, em decorrência da complexidade do
fenômeno, isto é, a subjetividade que envolve os saberes e práticas dos cuidadores
de idosos com Alzheimer.
Nessa perspectiva, Minayo, Deslandes e Gomes (2007) afirmam que a
pesquisa qualitativa possibilita o investigador identificar neste universo subjetivo os
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significados dos saberes e práticas a partir das crenças, conhecimentos, valores,
mitos, preconceitos, próprios da cultura e história dos sujeitos investigados.
Partindo, pois, dessa definição e considerando todo o universo de práticas e
saberes que caracterizam os sujeitos deste estudo e o objeto de investigação, que
se mostra repleto de significados, acredita-se que esta abordagem foi suficiente para
revelar os dados que responderam às questões norteadoras da pesquisa.
Para Richardson (2007), esta abordagem possibilita a descrição da
complexidade de determinado fenômeno, analisa a interação de certas variáveis,
compreende e classifica processos dinâmicos vividos por classes sociais, contribui
no processo de mudança de determinados grupos e proporciona, em maior nível de
profundidade, o entendimento das particularidades do comportamento dos
indivíduos.
A pesquisa qualitativa explora o valor e o significado individual das
informações coletadas sobre o fenômeno investigado, sendo relevantes os
depoimentos de cada um dos participantes para responder os questionamentos do
investigador sobre a problemática em estudo. Nesse enfoque, a abordagem
qualitativa serviu para aprofundar-se no universo de saberes e práticas desses
cuidadores, os quais retrataram seus valores, sentimentos, necessidades,
experiências, configurando-se em uma riqueza de informações para a análise do
estudo.
Este estudo também foi desenvolvido tomando como princípio a investigação
descritiva definida, conforme Dyniewicz (2007), como a pesquisa que tem como
propósito observar, descrever, explorar e interpretar a realidade, através da
identificação de sua ocorrência, natureza e características, o que proporciona um
aprofundamento dos fenômenos nas suas dimensões, variações e significados,
levando em consideração a subjetividade descrita pelo sujeito.
E com isso, deve-se expressar a importância e a singularidade de cada
sujeito no processo de investigação, pois se trata de um fenômeno amplo, no qual
deverá ser valorizado a totalidade de suas vivências, experiências, priorizando o
contexto político, histórico e social em que o mesmo encontra-se inserido.
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3.3 Os Sujeitos da Pesquisa
Em virtude dos novos arranjos estruturais que se configuram no interior das
famílias na atualidade, houve a necessidade de caracterizar quem são os
cuidadores familiares que, neste estudo, foram considerados as pessoas com
vínculo consangüíneo ou não que auxiliam os idosos no desempenho das atividades
de vida diária no domicílio, bem como no suporte social, emocional, econômico e
cognitivo necessário para o cuidado.
A opção por pesquisar esses sujeitos decorre do fato de que, na maioria dos
casos, são esses familiares que prestam os cuidados diretos ao demenciados ao
longo da evolução da doença e nem sempre tem seus anseios, suas angústias e
necessidades devidamente atendidas e orientadas.
É válido destacar que foram empregados dois critérios de inclusão na seleção
dos sujeitos. O primeiro deles é que deveriam residir em Teresina e exercer o papel
de cuidador familiar principal de um idoso com DA no contexto domiciliar há pelo
menos 30 dias, tendo em vista que a partir deste período já se observa uma série de
repercussões que a evolução deste agravo provoca na família. O segundo critério
adotado foi que este cuidador familiar deveria ser integrante da Associação
Brasileira de Alzheimer (ABRAz) regional Piauí, com sede no Hospital São Marcos,
localizada no município de Teresina – PI.
Considerando esses critérios, participaram da pesquisa 14 integrantes da
ABRAz – PI, os quais passaram integrar o estudo após o convite da pesquisadora,
colocando-se à disposição, sem restrições. Ao aceitarem participar da pesquisa,
foram informados sobre o estudo mediante a leitura do Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (ANEXO A), que foi lido, discutido e assinado por todos,
mediante as devidas explicações sobre os objetivos, a metodologia e as
contribuições dos sujeitos para o desenvolvimento do trabalho.
E para melhor descrição e apresentação, foi elaborado um quadro ilustrativo
com as características sócio-demográficas dos sujeitos, as quais são bastante
heterogêneas, conforme demonstra-se a seguir:
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RESULTADO PERFIL DO SUJEITO
DADOS OBTIDOS
FREQUÊNCIA
SEXO Feminino Masculino
13 01
FAIXA ETÁRIA
30 – 39 40 – 49 50 – 59 60 – 69
02 05 06 01
ESTADO CIVIL
Casada Viúva
Solteira
10 01 03
ESCOLARIDADE
Fundamental incompleto Médio completo
Superior completo Superior incompleto
04 02 06 02
RENDA MENSAL
1 a 3 salários mínimo 4 a 7 salários mínimos 8 a 10 salários mínimos
Mais de 10 salários mínimos
06 03 02 03
PROFISSÃO
Do lar Doméstica Enfermeira
Funcionária pública Odontológa Autônoma
04 02 02 03 01 02
GRAU DE PARENTESCO
Sobrinha Filha Filho
Cônjuge Nora
Outros
01 06 01 02 02 02
TEMPO DE CUIDADO
Menos de 1 ano 1 a 4 anos 5 a 8 anos
02 07 05
Quadro 01: Caracterização Geral dos Sujeitos Fonte: Pesquisa Direta.
Assim, após a definição de quem seriam os sujeitos da pesquisa, buscou-se
uma aproximação com pessoas e locais que facilitassem o acesso aos cuidadores
familiares de idosos com DA. Elegeu-se então a ABRAz regional Piauí. A escolha
inicial desta associação foi pelo fato de ser mais acessível à obtenção da confiança
e o aceite por parte destes associados em contribuir com a pesquisa.
Vale destacar que a ABRAz – PI é uma sub-regional que está interligada à
ABRAz nacional, entidade jurídica, sem fins lucrativos, que atua na área de
educação e saúde, formada por familiares de portadores de Alzheimer e
profissionais da área de saúde e outras áreas afins e voluntários.
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A ABRAZ – PI foi criada em 21 de setembro de 2002, com a missão de ser o
núcleo central de todos aqueles envolvidos com a DA, permitindo o intercâmbio e
apoiando ações voltadas ao bem-estar do portador, da família, do cuidador e dos
profissionais. Possui atualmente 55 integrantes, dentre os quais 38 familiares e 17
profissionais das diversas áreas de saúde.
Assim, foi por intermédio dessa associação que foi possível participar das
reuniões e contatar com os cuidadores familiares, passando a conhecer mais de
perto suas experiências e vivências frente a essa relação de cuidados e a partir daí
selecionar os participantes do estudo.
3.4 O Cenário da pesquisa
Como já foi dito, os sujeitos foram identificados na ABRAz-PI, porém o
ambiente que se mostrou mais adequado para realização das entrevistas foi o
próprio domicílio dos cuidadores, garantindo a eles a permanência junto ao idoso.
Além disso, as suas residências se mostraram um ambiente favorável à interação
pesquisador e sujeitos, possibilitando a estes se sentirem mais à vontade ao revelar
suas experiências, crenças, valores, bem como seus saberes e práticas construídos
através da relação de cuidado que mantém com o idoso portador da doença.É
importante destacar que os domicílios visitados localizam-se nas diversas regiões do
município de Teresina.
3.5 A Produção dos dados
Ao definir o objeto de estudo permeado pelas características fruto da
experiência social e cultural dos sujeitos, focalizou-se como técnica para a
realização desta pesquisa a entrevista semi-estruturada que, segundo Minayo
(2007), constitui um diálogo entre dois ou mais interlocutores, no qual o pesquisador
vai estimulando os sujeitos a expor suas opiniões, pensamentos e expectativas a
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cerca de uma temática com intuito de construir informações pertinentes para o
objeto de pesquisa.
As informações foram originadas através de um roteiro de entrevista que,
segundo a autora, conteve elementos essenciais e suficientes dispostos em tópicos
que contemplou os objetivos propostos na pesquisa.
Essa técnica se mostrou adequada e contribuiu para nortear a investigação,
uma vez que possibilitou estabelecer vínculos com o entrevistado e, desse modo,
aprofundar-se no universo que envolve as relações de cuidado entre o binômio
cuidador e idoso com DA.
Após a autorização do Presidente da ABRAz - PI e a aprovação do Comitê de
Ética e Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Piauí (UFPI), deu-se início à
coleta de dados que ocorreu durante os meses de abril e maio de 2009.
Inicialmente, para a ambientação da pesquisadora e adequação do roteiro
de entrevista semi-estruturada (APÊNDICE A), aplicou-se um teste piloto com o
intuito de realizar correções neste instrumento. Em seguida, as entrevistas foram
conduzidas pela pesquisadora e gravadas em Mp3. Desta forma, esse levantamento
ocorreu até alcançar a saturação dos discursos, isto é, o ponto de saturação no qual
se percebe que as informações se tornaram repetitivas.
3.6 A Análise dos dados
Após a realização das entrevistas e suas transcrições na íntegra, buscou-se
desvendar os significados manifestos e latentes que permeiam o objeto de estudo
proposto. Desse modo elegeu-se a análise de conteúdo de Bardin (2006), que são
um conjunto de técnicas de análise parciais mas complementares, a qual consiste
na explicitação e sistematização dos conteúdos das mensagens e da expressão dos
mesmo.
Nessa perspectiva, foi essencial categorizar as narrativas dos sujeitos para
sistematizar as unidades de significação. Assim, priorizou-se a análise categorial
que consiste no desmembramento do texto em unidades e categorias conforme
reagrupamentos analógicos (BARDIN, 2006).
48
Para a autora, a análise de conteúdo basicamente desdobra-se em três
fases, a saber: a pré-análise; exploração do material; tratamento dos resultados, a
inferência e a interpretação. E acrescenta-se que em cada uma dessas fases deve
se dar prioridade a uma etapa das análises, a qual deve manter uma imbricada
relação com as demais.
Na pré-análise, inicialmente, o pesquisador organiza o material para, em
seguida, realizar a leitura flutuante, na qual se estabelece o primeiro contato com o
corpus, que é o conjunto de documentos a serem submetidos aos procedimentos
analíticos. Nesta fase, o pesquisador passa a ter uma visão globalizada dos dados
(BARDIN, 2006).
A segunda etapa consiste na exploração do material que compreende a
codificação, que corresponde à transformação dos dados brutos por recorte,
agregação e enumeração em unidades de sentido, permitindo uma descrição exata
das características pertinentes do conteúdo (BARDIN, 2006).
Neste estudo, o material codificado originou unidades temáticas como
saberes, práticas, necessidades e sentimentos que envolvem a prática de cuidados
dos sujeitos cuidadores dos idosos com Alzheimer. Após o recorte, procedeu-se à
contagem das unidades de significação, conforme as regras estabelecidas pelo
codificador que, posteriormente, classificou-as e as agregou em quatro categorias:
os saberes sobre a Doença de Alzheimer na voz dos cuidadores familiares; a
essencialidade e a individualidade do cuidado familiar do idoso com Doença de
Alzheimer; as necessidades e os sentimentos que envolvem a prática do cuidador
familiar de idoso com Alzheimer e a influência das questões de gênero na
determinação do cuidado familiar.
Por fim, a terceira fase refere-se ao tratamento, inferência e a interpretação
das categorias de análise obtidas a partir dos depoimentos dos cuidadores familiares
de idosos com Alzheimer acerca das suas práticas e saberes, tendo como base o
referencial teórico dialógico de Paulo Freire.
3.7 Aspectos éticos e legais
O Termo de Consentimento foi elaborado de acordo com as Normas do
Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Piauí (CEP/UFPI), as
49
quais são baseadas na Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº. 196, de 10 de
outubro de 1996, que trata dos procedimentos éticos das pesquisas envolvendo
seres humanos. Essa resolução incorpora, sob a ótica do indivíduo e das
coletividades, os referenciais básicos da bioética, autonomia, não maleficência,
beneficência e justiça, visando assegurar os direitos e deveres que dizem respeito à
comunidade científica, aos sujeitos da pesquisa e ao Estado. Os participantes foram
ainda informados que esse Projeto de Pesquisa foi analisado e aprovado pelo
Comitê de Ética da UFPI, através do parecer nº 0017.0.045.000-09 (ANEXO B)
(BRASIL, 1996).
Destaca-se que nesse termo, como forma de assegurar o sigilo e o rigor aos
aspectos éticos da pesquisa, foi estabelecido e garantido aos sujeitos do estudo, o
anonimato de suas identidades, sendo resguardados, para tanto, os seus nomes
originais, os quais passaram a ser identificados e referidos através da terminologia
depoente acrescido da ordem numérica crescente de acordo com a seqüência das
entrevistas.
50
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS ___________________________________________________________________
51
A partir de suas vivências com os portadores da doença, os cuidadores
familiares revelaram uma variedade de necessidades e sentimentos gerados pela
relação com o idoso portador de Alzheimer, que permeiam seus saberes e práticas e
através da qual foi possível observar a marcante presença da mulher nessas ações
de cuidados.
Através do diálogo com os cuidadores familiares, mergulhou-se no universo
de saberes e práticas dos mesmos e pôde-se extrair dos seus discursos as unidades
de significação que possibilitaram a construção das categorias temáticas a serem
analisadas, as quais expressam as diversas formas de conhecimentos e os
diferentes modos de cuidados construídos pelos sujeitos deste estudo.
Os discursos sobre as práticas e os saberes dos sujeitos convergiram para a
formação de quatro categorias temáticas denominadas: os saberes sobre a Doença
de Alzheimer na voz dos cuidadores familiares; a essencialidade e a individualidade
do cuidado familiar do idoso com Doença de Alzheimer; as necessidades e os
sentimentos que envolvem a prática do cuidador familiar de idoso com Alzheimer e a
influência das questões de gênero na determinação do cuidado familiar.
A análise e discussão dos dados foram embasadas na teoria dialógica de
Paulo Freire, como já explicitado, com enfoque nas concepções e conceitos de
diálogo, cultura, história, conscientização e liberdade, identificando uma articulação
entre os dados emergentes dos sujeitos referentes aos saberes e práticas dos
cuidadores de idosos e os elementos teóricos que sustentam esta investigação.
4.1 Os Saberes Sobre a Doença de Alzheimer na Voz dos Cuidadores
Familiares
Com o objetivo de discutir os saberes dos cuidadores familiares sobre a
Doença de Alzheimer, realizou-se entrevista com os mesmos e constatou-se, a partir
de seus depoimentos, uma diversidade de sentimentos que se manifestaram ora por
ansiedade em verbalizar suas vivências e experiências cotidianas junto ao portador,
ora pela emoção, que pôde ser percebida não só pelas suas vozes trêmulas, mas
também, pelos olhares cheios de lágrimas, ao falar das dificuldades vividas e de
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suas relações com esse doente, carregadas de sentimentos ambivalentes: paciência
e intolerância, afeto e desafeto, medo e coragem, emoção e razão.
O diálogo com esses sujeitos permitiu identificar que os saberes sobre a
Doença de Alzheimer são resultantes da construção sociocultural, fruto das
vivências e experiências que envolvem essa relação de cuidados. Atrelado a isso
observou-se ainda que os saberes expressos por esses participantes mostraram-se
empíricos, cotidianos e históricos, conforme expressam os relatos que seguem:
[...] No inicio nós notamos assim, porque ele trabalhava, ele tinha uma locadora de sinuca e muitas sinucas. Ele colocava num lugar e esquecia de ir lá fazer a cobrança e tudo. Ele ficava falando, aí a gente notou ele trocando as coisas. A gente pedia para vestir a roupa assim, e ai ele vinha com outra [...] (Dep. 04). [...] a convivência você passa a conhecer, aprender, a detectar o diagnóstico (Dep. 13).
[...] o aprendizado sobre a doença a gente adquire somente com o dia a dia. É só com a necessidade (...) (Dep.04).
Nos discursos, os depoentes verbalizam que os saberes sobre a doença são
frutos da convivência, das necessidades sentidas, vivenciadas nessa relação de
cuidados cotidianos. Esses saberes empíricos provenientes das suas histórias de
vida são valiosos, ricos, espontâneos e essenciais no processo de construção do
conhecimento.
A esse respeito, Freire (1980) ressalta que a aquisição do conhecimento
pelo homem acontece através de sua interação com o meio, a partir de suas
necessidades subjetivas, capacitando-o de ser dotado de um conhecimento prévio
resultante das experiências vividas no cotidiano.
Sobre esse tipo de saber, Acioli e Luz (2003) referem que advém de um
conhecimento prático, que nasce das experiências da vida, do sofrimento e do
prazer. É um saber empírico, incompleto, transmitido de forma assistemática e lenta,
que tem como eixo o senso comum, a sabedoria prática que se caracteriza por uma
pluralidade, incorporado às permanências e aos conflitos presentes na realidade
social.
Contudo, embora o saber empírico, resultante do senso comum, não tenha
comprovação científica, não se desfaz o seu valor, uma vez que se expressa na
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validação da sabedoria popular a qual é passível de se transformar em outras
formas de conhecimento, inclusive, na própria ciência.
Nessa perspectiva, é fundamental que os enfermeiros na sua prática de
assistir o idoso com Alzheimer e seu cuidador familiar reconheçam e valorizem a
existência de um saber originado da experiência cotidiana dessas pessoas, visto que
a existência desse saber implica em estabelecer uma interação harmoniosa com
estes sujeitos e compartilhar conhecimentos.
É importante destacar que os cuidadores familiares construíram seus saberes
sobre a DA, a partir das manifestações clínicas percebidas no dia-a-dia dos
portadores, originados concomitantemente ao desenvolvimento das fases da
doença, que foram se somando a uma diversidade de informações adquiridas ao
longo da trajetória deste agravo, como mostram os discursos a seguir:
O Alzheimer é uma doença lenta, que acomete as pessoas de idade avançada [...]. Meu esposo ficou muito estranho em casa, no inicio não conhecia a casa, ficava despido, se armava e agredia a gente, por pouco ele não me matou, por duas vezes. Agora ele está acamado, não segura em cadeira, tem que ficar deitado (Dep. 01).
O Alzheimer na minha mãe se manifesta com fixação de idéias, ela só lembra daquilo. Ela faz a mesma pergunta, faz uma, duas, dez vezes (...) é uma pessoa que não conversa e quando conversa é aquela conversa repetitiva e se a gente não tiver paciência a pessoa se isola, e aí vai criando um mundo só dela (Dep. 03). É uma doença que ela vai esquecendo também de fazer as funções vitais como engolir, mastigar, ela vai esquecendo tudo isto, tenho que falar pra ela mastigar (Dep. 06). O paciente que tem Alzheimer se perde dentro de casa, não sabe onde está o banheiro. O engraçado é que tudo da juventude dela, ela lembra, tá tudo gravadinho, até ela diz de vez em quando: - “minha filha eu acho que eu estou é morta, não lembro mais de nada, não sei fazer mais nada, de jeito nenhum” (risos) (Dep. 14). O Alzheimer é uma doença crônico-degenerativa, que atinge o cérebro e ocorre uma degeneração e é um tipo de demência, é uma doença progressiva, que afeta inicialmente a memória, na fase inicial vai para uma fase moderada e em seguida para uma fase acentuada (Dep. 08).
Esses depoimentos demonstraram que ao elaborar um conceito sobre o
Alzheimer, esses cuidadores familiares atribuem significados relacionados com a
54
sintomatologia que o portador vivencia em determinada fase da doença. Sobre a
evolução da doença, Barreto (2005) destaca três fases progressivas: a inicial; a
avançada e a terminal, descritas a seguir:
A inicial é caracterizada pelos déficits de memória, com maior dificuldade em
recordar fatos recentes, apesar de ser capaz de relatar detalhadamente eventos
passados. As situações de desorientação não são raras nessa fase, podendo o
doente perder-se na rua, em locais pouco familiares ou em ambientes habituais
como sua própria residência. Essas características do início da doença foram
expressas na fala do depoente nº 08, e, de fato, confirmam o quadro de sinais e
sintomas descrito pelo referido autor.
Em relação à fase avançada, caracteriza-se pela presença dos distúrbios
cognitivos que vão se acentuando e acabam por conduzir à perda da autonomia. O
doente evidencia dificuldades em organizar atos motores intencionais (apraxia), em
interpretar informações sensoriais (agnosia), sendo incapaz de reconhecer rostos,
objetos, lugares, de identificar sons e cheiros, situando-se em um mundo cada vez
mais estranho e confuso.
Além disso, a linguagem fica restrita, perdendo gradualmente a capacidade
de comunicar-se verbalmente (afasia). As alucinações e as distorções perceptivas
não são raras nessa etapa, em que muitas vezes o doente não reconhece a sua
própria imagem, considera a casa onde reside estranha e chega a acusar os
familiares de o terem seqüestrado. A experiência de cuidado do doente nesse
estágio gerou saberes que foram expressos pelos depoentes 03 e 14.
Na fase terminal, a agitação dá lugar à inércia. O doente entra em mutismo,
perde a postura ereta e fica confinado ao leito. Problemas de saúde tais como:
constipação, infecções respiratórias ou urinárias e úlceras por pressão surgem ou
agravam-se. Pode-se afirmar que, nesse estágio, a vida do portador torna-se
praticamente vegetativa, conforme ressalta (BARRETO, 2005).
O aprendizado com o convívio e o cuidado de um doente em fase terminal,
exige dos cuidadores, dentre outras, a capacidade de observação e de tomada de
decisão, o que deve ser capaz de superar até a falta de comunicação e expressão
de sintomas por parte do doente. Essas sintomatologias referentes à fase terminal
da doença foram mencionadas pelos depoentes 01 e 06.
Contudo, é pertinente acrescentar que em relação às características das três
fases descritas por Barreto (2005), Coelho (2004) acrescenta que não são bem
55
delimitadas, considerando que os sintomas se interpenetram e o tempo de cada fase
é variável de um indivíduo ao outro. Nesse sentido, as diferenças individuais e
evolutivas da doença fazem com que os cuidadores aprendam e cuidem de modos e
formas distintas a depender das especificidades de cada doente.
Trazendo a discussão para os relatos desta pesquisa, deve-se ressaltar que
os cuidadores atribuíram um significado para a doença relacionando com suas
respectivas fases de evolução, em que se pôde identificar uma diversidade de
saberes que emergiram das falas, embora com um número limitado de cuidadores,
pois cada um dos participantes teve uma realidade diferenciada repleta de sinais e
sintomas, comportamentos, sentimentos e perdas que demandaram atitudes
também diferenciadas.
Esses cuidadores revelaram saberes empíricos, porém ricos de informações
sobre os sinais e sintomas, evolução da doença nas diferentes fases, destacando as
perdas nessa trajetória evolutiva.
Além disso, cabe enfatizar que os relatos apresentaram-se repletos de
saberes com formas alternativas de tratamento, baseados, sobretudo, no amor,
carinho, dedicação e atenção. Esse aprendizado sobre os modos de tratar/cuidar,
traduziram-se em práticas que foram construídas ao longo da doença, a partir das
especificidades da convivência individualizada e das necessidades cotidianas
subjetivas de cada portador, como descrevem os depoimentos seguintes:
[...] Mas pra ser descoberto o tratamento que prolongue só o amor, o carinho e a dedicação que a gente tem com o paciente, porque remédio pode dar uma ajuda, mas eu acho que deixa ele mais lento, por causa dos remédios que dão pra acalmar, dormir. Porque eles ficam mais é dormindo, mas ajuda. Mas é o carinho mesmo e o amor que ajuda a tratar, porque meu esposo está com 8 anos, e ele ainda não perdeu assim. É você dar amor, carinho e atenção, se lhe chamou, você diz o que é, se é pra repetir três, quatro vezes repita (Dep. 04).
Olha este cuidado tem que ter muita dedicação, renúncia, carinho, amor, são estas coisas pra nortear este cuidado, se não você não consegue, porque é muito pesado, eu acho que só o amor (Dep. 06). Eu acho que toda família que tem um portador de Alzheimer, principalmente velho, aliás, nem é mal de Alzheimer, é velho em si, tem que ter um cuidado especial. E o maior cuidado é o carinho e a pessoa se sentir amada (...). Não tem Excelon (referindo ao medicamento), não tem remédio para o mal de Alzheimer, se não
56
existir o amor. Tanto é que ela tem 94 anos e já está com 7 anos que ela tem a doença e não aumentou quase nada (Dep. 11).
Nesses depoimentos, verifica-se um modo de cuidar afetuoso, pautado em
sentimentos como o amor, o carinho e a atenção, os quais se constituíram os
principais motivadores para manutenção dos cuidados que visam retardar o
agravamento do quadro clínico do doente.
No sentido de tornar mais efetiva e eficiente a atuação dos profissionais de
saúde, especialmente, o Enfermeiro, mostra-se imperativa a necessidade de
incorporação do componente afetivo às ações terapêuticas, desde as prescrições
dos medicamentos, atividades de terapias ocupacionais até as práticas de
relaxamento para os próprios cuidadores, para que estes tenham um melhor
condicionamento físico e emocional e possam estar instrumentalizados para assistir
o portador de DA.
Alem da dimensão afetiva, foi possível identificar nos conteúdos das falas
dos cuidadores a riqueza de informações que povoam o contexto sócio-cultural e
histórico, conforme descrevem os conteúdos das falas a seguir:
O médico me encheu de material, me deu um livro que fala da fase moderada e grave, me deu um DVD, me deu um CD-ROM também (Dep.09). Eu tenho conversado muito com outras pessoas, me informado, inclusive sou sócia da ABRAZ-PI. E ela faz tratamento com um neurologista muito bom, e sempre que eu vou às consultas, procuro tirar minhas dúvidas, saber da evolução da doença (Dep.03). Eu tinha muitas dúvidas, mas minha menina fez a assinatura desta revista e ai vai tirando as dúvidas. E a gente tem que lê e cada dia vai descobrindo as coisas, pois cada dia tem uma surpresa, ai com a convivência a gente vai aprendendo, a gente lê e vê que é uma coisa que não tem jeito, porque escapa mesmo da memória, que não volta (Dep. 04). Porque a vida do cuidador é essa, você aprende em livros, você aprende com outras pessoas, você aprende cuidando. É transformando sua vida, não só a vida da gente transforma, mas a casa da gente é transformada, a alimentação da gente se transforma, tudo se transforma (Dep. 08).
De acordo com Figueiredo (2005), as informações sócio-culturais são
provenientes das mais variadas fontes que aos poucos são incorporadas às
57
experiências, sensações e contextos para então compor sínteses heterogêneas que
orientam as ações e práticas da população.
Os participantes do estudo verbalizaram a multidimensionalidade dos
saberes dos cuidadores familiares, que teve como gênese a própria prática,
produzindo e motivando-os na busca de informações em diversas fontes, desde o
serviço de saúde, a ABRAz, a mídia televisiva, revistas e a rede mundial de
computadores, a Internet.
E a partir dessa articulação entre teoria e prática, o cuidador familiar, como
ser social, adota uma postura crítica de forma que vai tornando-se cada vez mais
capaz de construir o seu próprio conhecimento. Assim, a aprendizagem é a
construção desse saber e a constatação da necessidade de transformação, que se
incorpora a aspectos variados de sua vida, de sua casa, de seu modo de conviver,
que se traduz na incoporação e reconstrução de novas práticas. Este movimento
corresponde à passagem da consciência ingênua à consciência crítica (FREIRE,
1994).
Na maioria dos relatos dos cuidadores, mostrou-se evidente o desejo de
aprender a cerca da evolução da patologia, que se reflete pelas buscas em
diferentes fontes, fazendo-os, inclusive, com que passassem a se associar a ABRAz
– PI, por ser um espaço de convivência de grupos de auto-ajuda para os cuidadores.
No entanto, mesmo após estes esforços e estratégias de compreensão da doença, o
conhecimento evidenciado nos depoimentos ainda se mostrou superficial e carente
de informações a cerca da evolução e manejo da DA, o que, de certa forma,
prejudica a instrumentalização do familiar para um cuidado mais eficiente e seguro e
a conseqüente minimização de desgastes físicos e/ou emocionais. Como pode-se
identificar nestes depoimentos:
Tenho muitas dúvidas, tem um mundão que eu preciso desvendar sobre os cuidados. Eu procuro me informar um pouco, mas não vislumbro ainda nada de prático que possa me auxiliar no momento, nada, nada (Dep.07). Eu já li um livro, mas ainda não tenho bem conhecimento da doença, e tenho todas as dúvidas, eu queria ter orientação, de saber como é que cuida (Dep. 02). Apesar de eu ser profissional de saúde e sócia da ABRAz, eu sabia que era uma demência, mas só a convivência prá saber dos
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transtornos que essa doença causa, tanto para o portador como para o cuidador (Dep. 08). Eu não sei de nada, só sei que é uma doença que trás muito esquecimento, a pessoa esquece tudo. Às vezes ela já almoçou e ai ela não lembra (Dep. 11).
Embora se constate um intenso envelhecimento populacional e um
crescente aumento do número de portadores de DA, a realidade da desinformação
ainda está presente, em relação ao universo que circunscreve as necessidades de
conhecimento sobre como lidar com a doença, mostrando-se imperativa a exigência
de aparelhamento dos serviços de saúde e dos profissionais, inclusive na atenção
básica, com a instrumentalização de ações educativas, acolhedoras e socializantes,
que devem ir desde palestras informativas, atendimentos individuais até as visitas
domiciliares, permitindo, a partir destas relações dialógicas e terapêuticas, trocas de
experiências e adoção de novas posturas capazes de provocar a conscientização e
conseqüente transformação da realidade.
Nesse sentido, Freire (1994) destaca que "o ser humano deve ser
compreendido como ser inacabado. E é nessa compreensão que se funde o
processo de conhecer o próximo e a si mesmo". Dessa forma, o conhecimento
estruturado no saber da experiência movimenta-se mediado pela comparação,
repetição, constatação, dúvida e curiosidade.
Com base nos conteúdos dos relatos expressos pelos sujeitos e vinculado
às formas de saberes, pôde-se descrever que, no entrelaçamento com o pensar e
fazer científicos, os familiares cuidadores de doentes com Alzheimer foram
desconstruindo e reconstruindo novos saberes e outras práticas de cuidar a partir
das dificuldades, conflitos e até da própria desinformação, o que possibilita novas
perspectivas e direcionamentos para se lidar com a doença, sobretudo com os
sujeitos que afetam e são afetados nesse processo do cuidar.
4.2 A Essencialidade e a Individualidade do Cuidado Familiar do Idoso com
Doença de Alzheimer
Ao analisar os relatos dos sujeitos, constatou-se que a prática de cuidar
mostrou-se essencial à vida do idoso com DA, as quais foram descritas como
59
originárias da própria necessidade para agir e assistir, sendo construídas através do
compartilhamento entre saberes provenientes do senso comum e do meio científico,
o que resulta em estratégias de cuidados capazes de promover mudanças nas
condições de vida do idoso e do cuidador.
Os discursos verbalizaram uma prática de cuidar cotidiana, contínua,
trabalhosa e desgastante, mas sobretudo, revestida de disponibilidade, boa vontade
e respeito para com o idoso portador de Alzheimer, mostrando-se essencial a sua
sobrevivência. Outro componente presente no cuidado familiar refere-se à
individualidade, que são os modos de fazer próprios de cada individuo fruto das suas
vivências sócio-culturais.
Portanto, a essencialidade e a individualidade mostraram-se como
características marcantes nas ações de cuidados dos participantes desta
investigação, o que encontra apoio na teoria Transcultural de Leininger (1991), que
considera o cuidado indispensável à vida do indivíduo e à própria manutenção de
toda a sociedade, permitindo a sua continuidade, sendo o cuidado visto como um
fenômeno universal, comum a todas as sociedades, no entanto com formas de
expressão que diferem de uma cultura para outra.
Nenhum outro ser vivo necessita mais de cuidado ao nascer do que o
homem, baseado neste princípio existencial se apóia Boff (1999), quando afirma que
o cuidado é essencial à vida humana. Essa essencialidade pode ser evidenciada na
prática dos cuidadores de idosos com DA, considerando as demandas que surgem
nas diferentes fases da doença, as quais vão produzindo limitações, com a
progressiva perda da autonomia e da independência, a ponto de afetar a realização
de atividades de vida diária, tais como: alimentação, hidratação, higienização e
eliminações.
O grau de dependência que se apresenta de forma diversificada entre os
portadores de Alzheimer demanda de seus cuidadores práticas variadas de
cuidados, que vão desde a aproximação e a busca de compreensão de suas
angústias e incertezas com apoio afetivo até o atendimento das necessidades
básicas, essenciais à manutenção da vida.
O atendimento destas dependências ampliam o volume de cuidados tanto
em quantidade como em qualidade, pois as fragilidades vão se acentuando, bem
como, as comorbidades adicionais vão agravando as funções físicas, cognitivas,
60
emocionais e sociais, tornando, cada vez mais, o cuidado essencial à vida, como
mostram os conteúdos desta falas:
A experiência não é muito boa não, mas não é ruim, é como cuidar de uma criança normalmente. Você tem que cuidar, dar banho, trocar fraldas, dar comida, porque ele já não faz nada mesmo. A prática de cuidar é trabalhosa, na hora de dar banho, é trabalhosa, porque ele não caminha normalmente. Quando eu acordo dou asseio, aí vou fazer o café dele, aí volto com ele pra cama, boto ele pra tomar sol, boto ele na cama novamente, ai quando é umas nove horas dou o lanche dele, vou cuidar das coisas de casa, quando é onze horas trago ele para almoçar, às vezes ele não quer almoçar cedo, às vezes dou o banho dele, dou o almoço, é como cuidar de uma criança (Dep. 02). Primeiro tem que dar tudo na mão. Ela tem que tomar medicação, é eu quem dou, o alimento na hora ela não se lembra, às vezes ela se alimenta e esquece que se alimentou e como no caso da minha mãe, esta engordando explosivamente, porque às vezes eu dou alimentação no horário, daí a pouco ela diz que não comeu, e aí eu como não estou em casa, ela esquece e repete novamente, e vai engordando. Também a outra questão do asseio, banho não quer tomar, é preciso a gente lembrar. Eu digo “olha mãe tem que tomar banho”. Às vezes ela fica irritada, muito irritada, e aí ela diz assim: “ah, eu fui mãe, agora sou filha?” (risos) (Dep. 14). Tem que ter cuidado com remédio, com a alimentação, providenciar uma pessoa para ajudar nas atividades domésticas, porque como eu trabalho, fica difícil ter um só cuidador. Então eu sou a cuidadora principal, tô olhando a medicação, alimentação. Eu tenho que voltar na hora pra ver se ela almoçou, eu tenho que estar à noite em casa, ver como foi à noite dela, como foi que ela dormiu, quantas vezes acordou de noite (Dep.08). Eu administro a casa, a tomada do remédio, o horário de banho, alimentação, o cardápio, a consulta com o médico, com o fisioterapeuta e essas coisas tudo é comigo e meu marido. Ela toma banho sozinha, faz as necessidades sozinha, só que normalmente ela não faz a higiene, tem que ter muito cuidado, porque ela tá na fronteira. No caso do banho, ela não tá fazendo a higiene corporal direito e não aceita que ninguém faça. Na cabecinha dela, ela acha que tá normal. Tem os cuidados com a medicação, com a higiene que é terrível e é difícil compartilhar, e mais difícil é encontrar alguém que queira partilhar (Dep.06).
Foi possível observar que essencialidade da ação de cuidar e atender o
idoso com DA que vivencia fragilidades, dependências e perda da autonomia, não
se restringe somente aos atendimentos das necessidades humanas básicas. A
essencialidade também está presente, embora de forma latente, nestes discursos,
61
uma vez que o cuidado familiar dispensado aos idosos valoriza a autonomia,
autoestima como também a própria cognição.
Outra característica da prática do cuidado familiar que emergiu no estudo
refere-se à individualidade do modo de cuidar utilizado de forma específica para
cada portador da doença. Embora em diferentes oportunidades este cuidador
familiar receba orientações e prescrições genéricas acerca da assistência ao idoso,
a ação de cuidar realiza-se com vistas a atender as necessidades e demandas
individuais do idoso e da própria família.
Para tanto, ocorrem adaptações, inclusões de outras informações que se
somam ao que foi orientado pelo serviço de saúde, além das especificidades de
postura do cuidador familiar que tornam o cuidado específico para aquele indivíduo
ao qual se destina.
Essa individualidade do cuidado familiar apresenta uma diversidade de
posturas que vão desde uma atitude protetora, mantendo o idoso dependente de
sua ação e supervisão, até outras que estimulam a participação e o auto cuidado,
com vistas a reduzir o grau de dependência do idoso com DA. Esses diferentes
modos de cuidado familiar podem ser identificados nos depoimentos descritos:
Como eu te falei a gente quer proteger o doente, mas depois que eu fui para a reunião da ABRAz eu vi que eu estava fazendo errado, que até ela estava se sentindo mal de ser tão protegida. Ela disse: “eu vou perguntar ao médico, ele vai me dizer porque eu estou incapaz” (Dep. 08). O médico disse que pra pessoa que cuida de quem tem Alzheimer não tem que dar tudo de bandeja pro doente, quando ela pergunta uma coisa, você faz outra pergunta, pra vê se ela bota a mente pra funcionar, tem sempre que está estimulando (Dep. 14).
Nessas falas, verifica-se diversos modos de cuidado familiar determinados
pela maneira de ser e das visões de mundo próprias da cultura de cada cuidador,
Contudo, não se pode ignorar que o estágio evolutivo da doença e o respectivo grau
de dependência têm influência na escolha das estratégias de cuidado que melhor se
adaptem a cada indivíduo.
A atuação do cuidador familiar é fortemente influenciada pelo grau de
dependência em que se encontra o portador, pois as incapacidades podem atingir
62
desde as tarefas instrumentais como fazer compras, pagar contas, manter
compromissos sociais, usar meios de transporte, cozinhar, comunicar-se, cuidar da
própria saúde e manter a sua integridade e segurança até as atividades básicas, tais
como, arrumar-se, vestir-se, comer, fazer higiene pessoal e locomover-se (BRASIL,
2008).
Partindo desse enfoque, pode-se destacar que os cuidadores têm
conhecimento de que a seleção da estratégia de cuidado familiar mostra-se como
uma ação individualizada, devendo se adaptar a cada portador, ao estágio evolutivo
da doença e ao grau de dependência, como se constata nas falas a seguir:
Quando ela está irritada, eu procuro dançar com ela, faço uma brincadeira com ela para sorrir, não se irritar, porque foi uma coisa que o médico disse: “não deixe ela ficar irritada, a gente procura não contrariar, porque ela esquece” (Dep. 11). Então agora eu criei uma maneira dela tomar banho sem gritar, é só
dizer que vai passear de carro que ela fica bem quietinha (Dep. 12).
Ao expressarem suas práticas de cuidados, os depoentes também
demonstram preocupação em evitar que o idoso fique irritado, ansioso e agitado,
passando a utilizar-se de medidas preventivas para não contrariá-lo, evitando o
confronto, considerando que este só aumenta a agitação e pode até gerar respostas
agressivas e frustrações para ambos.
Na tentativa de evitar uma situação de confronto entre portador e cuidador,
uma alternativa seria desviar o foco, distraindo o doente com outra coisa, de forma
calma e gentil. Isso pode fazer com que ele esqueça o episódio que motivou tal
situação e assim evitar problemas emocionais, como raiva, revolta, frustração,
angústia.
São inúmeros e significativos os desafios impostos aos cuidadores familiares
na convivência com o portador DA, uma vez que o agravamento da doença faz com
que o indivíduo tenha perdas cognitivas, sensoriais, associativas e afetivas que
reduzem a capacidade de discernimento de situações diárias que podem gerar
riscos. Portando, torna-se imperativo a adoção de estratégias de cuidados capazes
de minimizá-los, dentre estas, destacam-se: remover objetos pontiagudos (tesouras,
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facas, talheres, etc), fechar a casa e esconder a chave, no intuito de prevenir
evasões.
Tinha que ser tudo trancado, ele abria a casa à noite. Tive que colocar cadeado, esconder chaves, tirei tudo que fosse arma de casa, talher, louça, cadeira, foi tirado tudo de dentro de casa (Dep. 01).
A adoção de novas estratégias de cuidados é resultante da reflexão dos
cuidadores sobre as necessidades vividas, o que Freire (1980) denomina de práxis,
a unidade indissolúvel entre ação e a reflexão sobre o mundo. De acordo com este
teórico, quanto mais o sujeito refletir sobre a sua realidade, sobre sua situação
concreta, mais emerge plenamente consciente, comprometido; portanto, torna-se
capaz de intervir na realidade para transformá-la.
Nessa perspectiva, o cuidado familiar prestado pelos cuidadores do estudo
mostrou-se transformador, essencial, individual e imprescindível ao atendimento das
necessidades do idoso portador de DA, sendo um cuidado composto de elementos
que ultrapassam o conhecimento e a técnica, alcançando a afetividade e a
sensibilidade do cuidador familiar demonstradas através do compromisso,
compreensão, afeto ao idoso.
Esse modo de cuidar pode ser respaldado na concepção proposta por Boff
(1999), que aponta o cuidado como uma intervenção interpessoal e que se
manifesta nas relações compartilhadas, expressando-se numa interação com o outro
que engloba atitudes e responsabilidades, pois o cuidado humano inclui duas
significações básicas, intimamente ligadas entre si, à atitude de desvelo, de
solicitude e de atenção para com o outro e a atitude de preocupação e de
inquietação.
Nesta perspectiva, esta investigação buscou embasar-se em práticas
educativas que valorizam o diálogo, a troca de experiência, a compreensão do outro
como sujeito, detentor de um determinado saber. Essa forma de construção
compartilhada do conhecimento nasce da relação entre o senso comum e a ciência,
sendo entendida como uma metodologia desenvolvida na prática da Educação e
Saúde que considera a experiência cotidiana dos atores envolvidos e tem por
finalidade a conquista, pelos indivíduos e grupos populares, de maior poder e
64
intervenção nas relações sociais que influenciam a qualidade de suas vidas
(ACIOLLI, 2008).
Desse modo, quando a enfermeira troca conhecimentos e experiências com
a família, ambos crescem e novas estratégias no cuidar se apresentam e tendem a
minimizar os conflitos dos encontros e desencontros desses saberes e práticas. A
esse respeito, Freire (1994, p. 29) afirma que "o diálogo não pode excluir o conflito,
sob pena de ser um diálogo ingênuo. Eles atuam dialeticamente, e o que dá força ao
diálogo entre os oprimidos é sua força de barganha frente ao opressor".
Nesse sentido, o profissional de saúde, sobretudo, o enfermeiro deve
continuamente procurar despertar possibilidades de dimensionar através de saberes
e práticas dos cuidadores, o cuidado e o auto-cuidado, despertando a
conscientização, a qual por sua vez é capaz de se revestir de transformações da
própria realidade social e cultural desse indivíduo.
4.3 As Necessidades e os Sentimentos que envolvem a Prática do Cuidador
Familiar de Idoso com Alzheimer
Ao procurar descrever os saberes e práticas dos cuidadores familiares
acerca da DA, foram identificados necessidades e sentimentos manifestos por estes
sujeitos de diversos matizes os quais dizem respeito ao universo social e cultural e
enfocam questões de âmbito afetivo.
Visando organizar didaticamente a análise e discussão destes achados
enquadrados nessa categoria temática, serão apresentadas, inicialmente, as
necessidades vivenciadas pelos cuidadores familiares nesta relação de cuidado.
Com propósito de possibilitar uma melhor compreensão a respeito das
necessidades vividas pelos sujeitos, buscou-se conceituá-las na perspectiva teórica
de Horta (1979), que considera o ser humano como agente de mudanças, um ser de
transformação, que causa desequilíbrio em seu próprio dinamismo. Por sua vez,
esse desequilíbrio gera necessidades, caracterizadas por estados de tensão
conscientes ou inconscientes, que os levam a satisfazê-las para manutenção do
equilíbrio.
65
É importante lembrar que as necessidades neste estudo, são entendidas,
não apenas como exigências, mas principalmente como aquilo que é essencial a
sobrevivência do individuo, e quando não são atendidas ou atendidas
inadequadamente podem trazer desconforto que por sua vez se for prolongado,
pode provocar doença, seja de ordem física ou mental.
Sobre as necessidades vivenciadas pelos cuidadores familiares, pôde-se
constatar que elas apresentam características que se aproximam das descritas por
Wanda Horta, quais sejam: a universalidade, pois são comuns aos seres humanos,
sendo que neste estudo foi evidenciada nas falas de todos os participantes; e a
individualidade, sendo específica de cada indivíduo, inclusive até na maneira de
satisfazê-la, o que também foi demonstrado no discurso dos depoentes desta
investigação. Cabe enfatizar que cada sujeito expressou as demandas e dificuldades
próprias do cotidiano familiar e apontou as estratégias utilizadas para superá-las.
Em relação às necessidades da família, sabe-se que diversos fatores
influenciam no modo de satisfazê-las, dentre os quais, destacam-se: o ciclo de vida
familiar, a cultura, a raça, além dos fatores sociais e econômicos. E assim, para que
a assistência à família seja integral e resolutiva, torna-se imperativo que os
profissionais de saúde, em especial, o enfermeiro, considerem as necessidades
básicas de cada individuo dentro do seu contexto familiar, histórico, social e cultural
(WAIDMAN, ELSEN, 2004).
Partindo, pois, desses pressupostos, revela-se a importância de se ter
buscado iluminar os achados desta investigação nas concepções teóricas e
filosóficas de Freire (1980) a cerca da historicidade do ser humano, o qual apresenta
no seu ciclo vital possibilidades e limitações próprias de sua cultura, que o capacita
ao aprendizado e à transformação para superação das demandas e dificuldades
cotidianas, o que foi observado nas informações dos sujeitos participantes deste
estudo, que revelaram diferentes necessidades resultantes de sua vivência com o
portador de Alzheimer, conforme descrevem os relatos seguintes:
A rotina de cuidar muda a vida da gente, porque tem limites, hora de sair, de chegar, mas a gente aceita, porque é o jeito. É o jeito mesmo. Fica difícil, é muito difícil a gente aceitar mais a gente aceita. Foi difícil pra mim no início, eu trabalhava, ajudava no orçamento da casa, tinha um salão de atelier, eu tive que fechar para acompanhar ele. E fiquei muito nervosa neste dia, ele ia me matando, fui no médico dele e pedi para mudar os medicamentos, fiquei nervosa,
66
fiquei doente, aí ele mudou o medicamento, mas como são duas famílias, aí a outra família não aceitou, porque ele ficou praticamente dopado, a família não aceitou e ai voltamos ao médico [....]. Foi difícil no início, aí foi que a família começou aceitar e começaram a me ajudar. Hoje tá bom da gente cuidar, porque todo mundo ajuda. Mas mesmo com ajuda ainda é muito difícil, porque eu cuido da casa e tenho duas netas, é difícil encontrar pessoas para conviver com a gente, eu preciso de gente para conviver, para dormir. Também difícil é a condição financeira que não ajuda, eu não tenho condição financeira para pagar duas pessoas. Hoje eu já tô com raio X, doente, doença na coluna, artrose, e osteoporose, por que me curvo toda hora para pegar ele, tem que fazer asseio, tem que trocar fraldas (Dep. 01).
Nesse depoimento, emergiram-se diversos tipos de necessidades
vivenciadas tanto pela cuidadora como pela família no cuidado ao doente, que vão
desde as necessidades de lazer, de atividades sociais; de ordem financeira; de
compartilhamento de responsabilidades e de cuidar da sua própria saúde.
Nesse depoimento, a participante do estudo expressa com muita ênfase a
necessidade financeira vivenciada desde o início da doença do seu cônjuge, que se
acentuou com evolução das dependências e impossibilitou a contratação de serviços
de terceiros. Atrelado a isso, pôde-se identificar outros conflitos como a renúncia a
vida profissional e dificuldades, referentes à perda da integridade física da cuidadora
decorrente da sobrecarga de atividades no cuidado ao doente, tendo como
resultante a instalação de patologias osteoarticulares.
Como já foi dito, cada pessoa tem necessidades específicas, assim como
também utiliza estratégias próprias para atendê-las. A depoente (Dep. 01), diante da
desestruturação financeira e familiar, buscou o diálogo e a integração da família com
vistas ao compartilhamento de responsabilidades, minimizando assim a sobrecarga
física e emocional no cuidado ao doente. Além do mais, a cuidadora, desde o início
do quadro clínico, até os momentos de intensificação dos sintomas, principalmente,
aqueles referentes à agressividade e à fuga do lar, manteve o equilíbrio emocional e
utilizou o mecanismo de aceitação da realidade para superar as dificuldades
impostas no cotidiano do cuidado familiar do cônjuge portador de DA.
Com base na problemática deste estudo, pode-se ressaltar que os achados
convergem aos de outros estudos que apontam com maior evidência algumas
necessidades dos familiares, principalmente, do cuidador, que se caracterizam como
de ordem física, psíquica, econômica, social e emocional. É importante acrescentar
67
que é pertinente a esse cuidador receber apoio e ajuda da família e dos profissionais
de saúde no sentido de cuidar de sua própria saúde, de ter atividades sociais e de
lazer e de satisfazer suas próprias necessidades como ser humano (ALVAREZ,
2001).
Atrelado às necessidades vivenciadas no cotidiano do cuidado domiciliar,
também constatou-se a marcante desestruturação do núcleo familiar, decorrente do
impacto social e psíquico provocado a partir da confirmação do diagnóstico da
doença em um ente querido. Esse fato desencadeia, entre os familiares, sofrimento
e dor, principalmente por ser a doença de Alzheimer despersonalizante e
incapacitante, emergindo a partir daí conflitos e estresses, que acometem os
diversos membros da família, em especial, o cuidador familiar principal, como se
evidenciam nos depoimentos a seguir:
A principal dificuldade é a aceitação do diagnóstico [...] minha vida era completamente diferente, eu não tinha muito compromisso, pois meus filhos já são todos adultos, sabem se virar, e eu era uma pessoa livre, saía para trabalhar, dava 24 horas de plantão e hoje eu não posso mais fazer isso, porque eu tenho ela em minha casa para cuidar. As dificuldades também é o restante da família que não ajuda como deveria, talvez se a gente recebesse esta ajuda, não fosse tão estressante ser cuidador, pois somente a rotina do cuidador é que muda, porque a das outras pessoas continua, vão trabalhar, dormem todos as noites tranqüilas na sua casa, e você é só quem se estressa (Dep. 08). A maior dificuldade que a gente tem no momento é aceitação da família, que assim ela tem vários filhos e só uma filha mulher, e essa filha mulher ela não aceita. Então eu não compreendo como uma pessoa esclarecida pode não aceitar, aliás, pra ela é mais cômodo não aceitar e os outros irmãos são homens e suas mulheres é quem ficam no batente, graças a Deus é que tem, que somos três, apesar de ser eu a cuidadora principal, mas elas ajudam, cada uma faz o que pode. Mas eu acho que o problema principal dos cuidadores é a questão da ajuda, é muito complicada porque ninguém quer se comprometer, ninguém quer ficar naquela rotina (Dep. 06).
Através dos conteúdos dessas falas, percebe-se que foi difícil a aceitação do
diagnóstico, gerando necessidades de reestruturação do núcleo familiar,
visualizadas por importantes mudanças na dinâmica e nas relações familiares que
resultaram na redefinição ou trocas de papéis.
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A necessidade de informações adequadas sobre a doença e de uma melhor
instrumentalização da rede de suporte de saúde para atender o portador e a família,
emergiu no depoimento abaixo. Esta demanda encontrou articulação nos estudos de
Caldas (2000), que retratou a importância do suporte emocional e de uma rede de
cuidados que ligue a família aos serviços de apoio e aos meios que garantam
qualidade de vida aos cuidadores e portadores.
Acho que todo mundo deveria ter formação, para poder saber trabalhar, lidar com o portador dessa doença. Às vezes, sinto dificuldades em compreender as explicações dele (profissional de saúde), em relação à medicação, ele fala umas palavras que não entendo o significado (Dep. 13).
Neste discurso, o depoente expressa com clareza as dificuldades de
compreensão acerca das orientações dos profissionais de saúde, relatando não
entender se quer o significado das palavras, o que deve ser atribuído à falta de
sensibilidade e de uma abordagem capaz de alcançar as especificidades sócio-
culturais do cliente, situação frequentemente identificada no cotidiano dos serviços
de saúde, quando se constata que os profissionais utilizam termos técnicos e atuam
de forma prescritiva e verticalizada.
Essa dificuldade vivida e expressada pelo cuidador familiar, tanto evidencia
a necessidade de informação e de comunicação terapêutica eficiente como também
é capaz de desencadear sentimentos e conflitos estabelecidos através das
inseguranças, dúvidas e incertezas acerca do quadro clínico e das condutas a serem
adotadas para o idoso com DA.
A esse respeito, Luzardo e Waldman (2004) relatam que, muitas vezes, uma
consulta médica centrada no modelo tecnológico e curativista contempla apenas
aspectos intervencionistas da doença, tais como: procedimentos e terapias
medicamentosas, deixando de valorizar outras orientações que visam à
compreensão acerca do evento, uma vez que se considera que estas são tão
importantes quanto a terapia medicamentosa.
Com relação à atitude de transmissão de conhecimento de forma unilateral
presente na conduta desses profissionais de saúde, cabe ressaltar o que defende
Paulo Freire (1987) ao destacar que neste caso o saber é entendido como “uma
doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber” (FREIRE, 1987, p.67).
69
Vasconcelos (2001) reporta-se a este tipo de orientação como “toca boiada”,
referindo-se à imposição de normas e comportamentos considerados adequados
pelos técnicos, que conduzem a um caminho previamente determinado. Estabelece-
se uma relação vertical e autoritária entre o profissional e a população, baseada na
crença de que quem detém o saber é o educador e que é ele quem deve transmitir
suas informações e ensinamentos.
A esse respeito, observa-se que atualmente no Brasil, há uma exigência
social para que se modifiquem as posturas dos profissionais de saúde. O Sistema de
Saúde vigente vislumbra práticas de educação em saúde embasadas no princípio de
que o individuo tem um saber prévio, adquirido através de sua história de vida, de
sua prática social e cultural e de que este é o ponto de partida para a aquisição de
novos conhecimentos. A relação que se estabelece entre profissional de saúde e
população deve ser necessariamente dialógica, baseada no reconhecimento da
existência de diferentes saberes e na possibilidade de aprendizagem mútua
(BORNSTEIN, 2006).
O autor destaca também outro elemento fundamental nessas práticas
educativas, caracterizado pelo entendimento da educação como um processo de
busca e de invenção ou reinvenção, que parte da ação e da reflexão do homem
sobre o mundo para transformá-lo. A problematização das experiências ou situações
vividas se constitui em desafio para a transformação e, portanto, também em fonte
para a organização do conhecimento.
Nesse enfoque, analisando o atual quadro precário e insuficiente dos
serviços do sistema de saúde brasileiro, constata-se que os idosos portadores da
DA sobrevivem com poucos recursos pessoais e sociais, bem como suas famílias.
Além das necessidades materiais, tais como: recursos financeiros, questões de
moradia, transporte e acesso a serviços de saúde, evidenciam-se carências
expressas pelos cuidadores que vão desde as informações sobre sinais e sintomas,
evolução e tratamento da doença até uma rede de serviços de saúde
instrumentalizada para o atendimento do portador e de sua família.
É importante acrescentar sobre as necessidades sentidas pela família em
relação ao cuidado de um idoso portador de Alzheimer, que se faz essencial para o
profissional de saúde, em particular o Enfermeiro, conhecer as necessidades da
família, suas crenças, valores e costumes para facilitar a construção de um plano de
assistência digno e individualizado a cada família (WAIDMAN; ELSEN, 2004).
70
Diante de todas essas necessidades apontadas e descritas pelos
cuidadores, emergiram sentimentos que envolvem a prática desses sujeitos. De
acordo com os conteúdos das falas dos depoentes, pôde-se identificar emoções e
reações afetivas diversificadas, que se refletem através da culpa, medo, ansiedade,
pesar diante de uma doença totalmente incapacitante, o mergulho na insegurança
do caos do desconhecido e a estranheza frente à troca inevitável de papéis sociais.
Além disso, caracterizam-se como freqüentes, o sentimento de impotência frente à
evolução da doença, a tristeza diante da falta de infra-estrutura e de condições
financeiras, a raiva contida pela lenta chegada da morte.
Para superar esta diversidade de sentimentos, evidenciaram-se mecanismos
de defesa tais como: a aceitação da vontade de Deus, bem como, o amor e a
solidariedade ao seu ente querido que se apresenta fragilizado, conforme
expressam estes relatos:
É uma experiência muito cansativa, é como se fosse um conflito ora você tem sentimento de pena, ora sinto muita tristeza, e para mim que entendo um pouco da doença, não é fácil você vê a evolução que cada dia a coisa vai se agravando, não é fácil vê que ela vai chegar a fase de ficar comendo pelo a mão dos outros, eu tenho muito medo, inclusive eu peço muito a Deus que minha mãe não passe por esta provação, apesar da gente não ter o direito de tá pedindo, mas é muito difícil, muito judiação, ai eu acho que é muito dolorido, mas é viver cada dia. Ela agora está comigo e eu fico irritada quando ela vai para a casa dos filhos que não tem a paciência, que não sabe e não quer entender a doença, ai não preservam ela de discussão, de bebedeira, ai ela volta muito pior, ai eu fico irritada, irritadíssima. E ai eu tenho este conflito é um misto de sentimento, pena e culpa, às vezes eu me culpo , acho que não to cuidando direito [...] (Dep.03).
O conteúdo expresso nessa fala do participante que vivencia a experiência
de cuidar de um familiar que, na evolução da doença, chega a não reconhecer o seu
ente querido, denota-se o desenvolvimento de sentimentos ambíguos e
contraditórios, que passam a exigir apoio em crenças e valores e na própria fé para,
assim, manter o equilíbrio e a energia capaz de propiciar a realização do cuidado.
Partindo desse enfoque, Silveira, Caldas e Carneiro (2006), enfatizam que a
prática do cuidar de um familiar com demência mobiliza muitos sentimentos diversos
e opostos num espaço de tempo muito curto: amor e raiva, paciência e intolerância,
carinho, tristeza, irritação, desânimo, pena, revolta, insegurança, negativismo,
71
solidão, dúvida. Além disso, esse cuidado insurge de muitos medos como o de ficar
doente também, de a pessoa estar sofrendo, de a pessoa morrer.
Vilela e Caramelli (2006) acrescentam que os cuidadores sofrem uma
sobrecarga física e psíquica que pode levar a uma má qualidade de vida e por isso
também precisam ser alvo de preocupações e cuidados, já que, em caso de
sobrecarga, poderão se mostrar muito cansados, apresentar irritação e baixa
tolerância, o que certamente irá influenciar no cuidado prestado, bem como poderá
levá-los a um estado de exaustão.
De acordo com Neri e Carvalho (2002), no cuidar misturam-se questões
práticas, financeiras, motivações e afetos, fazendo emergir conflitos e
ambivalências. Em outras palavras, isso significa dizer que o cuidado não é uma
situação linear vivenciada sempre da mesma forma. No início do exercício do papel,
as exigências parecem mais fortes, mas ao longo do tempo, em virtude de
processos adaptativos e da variedade de enfretamentos que ocorrem na vida do
familiar que cuida, o senso de sobrecarga pode se estabilizar ou diminuir.
Partindo dessa mudança de paradigmas e da sobreposição de sentimentos
que se instauram com o desenvolvimento dessa prática, não se deve pensar no
cuidado como uma atividade que necessariamente traz efeitos negativos. Apesar de
ser tarefa onerosa em muitos aspectos, nem todos os cuidadores familiares ficam
insatisfeitos, doentes ou estressados, bem como existe a possibilidade de
transformar cognitivamente a situação de modo a lidar com o ônus.
Dessa forma, também foram evidenciados sentimentos positivos,
gratificantes e prazerosos produzidos nas experiências e nas mudanças
significativas ocorridas na vida de alguns dos cuidadores familiares participantes
desta investigação, como se observa nestas falas:
É uma coisa gratificante porque é minha mãe, eu e meu irmão dorme com ela. Então é prazeroso porque é minha mãe, e não dá trabalho, se a gente souber levar, não dá trabalho (Dep. 11). É uma experiência que apesar de trabalhosa, eu considero boa, porque é dos meus pais, de maneira alguma eu abro mão de cuidar deles, é bom a gente conviver juntos, é muito bom. Por outro lado é ruim, porque a gente não gostaria que isto tivesse acontecendo, como no caso de meu pai, ele é normal, toma decisões, ela não, tudo eu tenho que decidir por ela, por isso tem horas que eu fico aperreada. Mas apesar de cansativa é uma experiência que considero boa, pois são os meus pais (Dep. 14).
72
Através desses relatos, pôde-se observar que por se tratar de entes
queridos, familiares como pai e mãe, isso faz com que os cuidadores se sintam
tristes, mas ao mesmo tempo não se reveste apenas de tristeza, por se constituírem
em pessoas queridas e importantes para suas vidas.
Portanto, ao se descrever as práticas e saberes dos cuidadores de idoso
com Alzheimer, pôde-se refletir sobre necessidades e sentimentos dos cuidadores
familiares deste estudo, que se revelaram em vertentes variadas de dificuldades e
possibilidades, mudanças e transformações, desestruturações e adaptações,
negações e aceitações, que apontaram para as individualidades e as
especificidades de sentimentos e atitudes dos sujeitos capazes de auto estimularem
ao aprendizado e ao crescimento do ponto de vista existencial, emocional e social.
Ocorrendo aqui o que Freire (1980) denomina de verdadeira conscientização,
geradora do aprendizado consciente e transformador, pois é caminhando que se
aprende a caminhar. E, nessa contínua aprendizagem, estes depoentes
demonstraram a superação através do sofrimento, da dor e das preocupações com
as suas realidades.
4.4 A influência das Questões de Gênero na Determinação do Cuidado Familiar
A partir da análise das características sócio-demográficas e dos discursos
dos cuidadores familiares do estudo, constatou-se que a predominância feminina
reflete intimamente as questões de gênero. Em outras palavras, a preponderância
da mulher exercendo o papel de cuidadora principal de familiares acometidos pelo
Alzheimer, recebe forte influência das questões de gênero, que não devem ser
entendidas apenas pelas diferenças anatômicas e biológicas próprias de homens e
mulheres, mas em um sentido mais amplo, que considera gênero a determinação
social e cultural dos sexos (MOTTA, 2001).
Dessa forma, o gênero feminino mostrou-se evidente não só na velhice,
como também no cuidado familiar, sendo representada neste estudo pela forte
presença de filhas e esposas que, em sua maioria, encontravam-se na meia-idade.
73
Cabe enfatizar que a doença de Alzheimer impõe à família a reorganização
e negociações que incluem identificar aqueles que têm disponibilidade de tempo e o
desejo pessoal para assumir a tarefa de cuidar do portador. Este processo decorre
de uma dinâmica específica construída dentro da família e obedece a certas regras
culturais e sociais que estão relacionadas principalmente ao gênero, parentesco e
proximidade física.
Neste estudo, percebeu-se que o grau de parentesco e gênero teve
influência determinante na escolha da filha como cuidadora. Nessa perspectiva,
Freire (2001) relata que estudos sobre o processo de socialização e o
desenvolvimento de papéis ligados ao gênero mostram que desde a infância a
criança aprende as qualidades, as atitudes e os comportamentos vinculados ao seu
sexo biológico e desenvolve valores, costumes baseados naquilo que é prescrito
como adequado para seu gênero. Com isso, fica explicito, por exemplo, as
intencionalidades de que as mulheres se dediquem mais às tarefas domésticas e à
família, especialmente, nos cuidados com filhos, doentes e incapacitados. Sobre
essa questão, a depoente destaca:
A maior queixa é em relação a minha família, meus irmãos não ajudam, é uma situação muito difícil. Eles acham que como eu sou mulher, tenho o dever de cuidar (...) (Dep. 07).
Esse discurso expressa que quando o idoso necessita de ajuda, os filhos
adultos, em especial, as filhas, costumam assumir o papel de cuidadora, por terem
vínculo afetivo e uma responsabilidade de cuidar culturalmente e socialmente
definida, arraigada historicamente e que a mulher assume como função própria.
Para Santos (2003), essa divisão de responsabilidades e atividades está
intimamente relacionada à maneira como foram construídas as relações familiares e
quando o significado de dever ou obrigação era interpretado como uma forma de
retribuição pelos cuidados já recebidos pelos pais. Também ocorria o envolvimento
dos filhos, quando visavam seguir os exemplos de vida dados pelo portador, ou em
função das práticas socioculturais compartilhadas por esse grupo.
Pode-se observar, no discurso abaixo, um misto de obrigação, de retribuição
da dedicação, do amor, dos cuidados prestados, do “sacrifício que a mãe fez”. O
cuidado é interpretado como um retorno, uma reciprocidade, como uma recompensa
pelo que se recebeu, conforme expressa o relato:
74
A minha mãe foi uma pessoa que casou muito nova, casou-se com 12 anos, ficou viúva com 14 anos e casou-se novamente com meu pai com 15 anos, ficou viúva aos 36 anos com 7 filhos para criar. Ela só tem o primário e formou os 7 filhos. Então se hoje eu sou dentista, a outra professora e a outra filósofa, a gente tem que agradecer a ela, pois quando meu pai morreu eu tinha apenas 5 meses, ele só fez me pegar. Então o que nós temos e o que nós somos, temos que agradecer a ela, foi nosso pai e nossa mãe. Eu acho que é por isso que o carinho é maior (Dep. 11).
Este cuidado como retribuição foi investigado por Sommerhalder (2001) que
destacou como uma possibilidade de retribuir valores e a oportunidade de dar
exemplo de solidariedade, relacionando-os ao senso de crescimento pessoal e de
auto-realização, e interpretando-os como benefícios psicológicos, evidenciados no
papel de cuidar das mulheres.
Sobre o predomínio das mulheres como cuidadoras de familiares com
Alzheimer, identificado nesta investigação, encontrou-se similaridades em outros
estudos congêneres, nacionais e internacionais, como os realizados por Caldas
(2000), Sommerhalder (2001), Santos (2003) e Pereira (2008) que relacionaram este
papel feminino aos determinantes sócio-culturais, os quais estabelecem para
mulheres as atividades domésticas e de cuidados da saúde.
No entanto, emergiram informações específicas e particulares do grupo de
sujeitos investigados que não foram evidenciadas em outras produções a cerca da
temática em foco. Pois a maioria das cuidadoras eram casadas, com curso superior,
exercendo atividades profissionais liberais, percebendo renda mensal familiar que
variava entre quatro a dez salários mínimos.
Portanto, apresentavam uma condição sócio-econômica e cultural
diferenciada e positiva, porém paradoxalmente, determinava situações e conflitos
negativos, pois ao estarem exercendo atividade fora do lar, vivenciavam a
sobrecarga da responsabilização com o familiar com DA na esfera doméstica.
Essa dupla jornada de trabalho e de responsabilidades desencadeavam
alterações físicas e emocionais, inclusive com o estabelecimento de doenças,
especialmente, as de cunho emocional. Este fato foi mencionado na fala da
depoente, conforme ressaltado a seguir:
75
Às vezes me sinto culpada, por trabalhar tanto fora de casa, ou melhor, por outro lado penso, como é que eu poderia proporcionar tudo isto pra ela se eu tenho que ajudar a sustentá-la, o plano de saúde dela é em torno de 600 reais, tem uma alimentação toda especial (...) é um conflito, é um conflito muito grande (...) (Dep.03).
Com base nesse enfoque, deve-se expressar que essa condição sócio-
econômica favorável também possibilitou algumas das depoentes minimizar a
sobrecarga de trabalho a elas impostas, dividindo tais práticas com um cuidador
secundário, geralmente uma empregada doméstica que, simultaneamente, acumula
o exercício das tarefas domésticas e o cuidado do idoso com DA.
Essa mulheres que exercem a função de domésticas são pessoas cativas,
que desenvolvem em suas convivências com as famílias laços afetivos, tornando-se
reconhecidas como membros familiares. Santos (2003) enfatiza que as empregadas
doméstica, como os vizinhos e amigos, fazem parte da rede de suporte informal que
muitas famílias utilizam na prestação de cuidados ao idoso portador de Alzheimer.
Portanto, a influência das questões de gênero no cuidado ao idoso com
Alzheimer se mostrou evidente nesse estudo tendo em vista a expressividade do
número de mulheres como cuidadoras familiares. Nesse sentido, observou-se que
as filhas foram as mais selecionadas dentro da estrutura familiar para assumir esse
papel. E essa eleição da mulher para o cuidado familiar não se deu de forma
aleatória, é decorrente do aprendizado social e cultural que estabeleceu ao longo da
história a missão de cuidar para as mulheres.
Nesse sentido, as questões de gênero repercutem não só na eleição das
mulheres como cuidadoras, influenciam, de fato, no modo de cuidar, que foi
expressado de forma clara pelas depoentes deste estudo, quando filhas e/ou
esposas se doam e mergulham no contínuo zelo do seu ente querido, numa ação
repleta de sensibilidade, gratidão, solidariedade, dedicação chegando a se sacrificar
e comprometer suas relações profissionais e sociais, bem como a própria saúde.
Essa forma de cuidado e de dedicação foram, são e serão aprendidas,
ensinadas e impostas às mulheres, em sociedades como a brasileira, em particular a
piauiense, onde ainda hoje a maior parte da população feminina continua no
trabalho doméstico ou do lar, sem, logicamente, desconsiderar os avanços sociais,
culturais e políticos alcançados pelas mulheres nos últimos anos. Mesmo aquelas
76
que atingiram uma formação superior e atuam profissionalmente, continuam
moldadas a serem cuidadoras no âmbito da família.
Essa forma de cuidar que vem desde o momento do nascimento, quando a
mãe cuida do filho, para lhe garantir a vida promove o aprendizado dessa missão
nas experiências das mulheres em todas as etapas da vida. E, com isso, também se
apóia a Enfermagem, que, embora se perceba uma inserção masculina, ainda se
pode dizer que é uma profissão eminentemente feminina, concebida como a arte e a
ciência do cuidado.
É válido acrescentar que nessa conjuntura familiar, em que se sobrepõe o
sexo feminino exercendo a prática do cuidado, os participantes do estudo
mostraram-se diante de um quadro repleto de situações de dependência e
necessidade de cuidado, que influencia as mulheres, filhas e/ou esposas, a
assumirem essa missão para a qual foram educadas durante toda vida.
Contudo, é importante lembrar que as mulheres cuidadoras mostraram-se
dinâmicas, batalhadoras e resilientes, embora paradoxalmente, em momentos de
conflitos, expressaram-se com características de pessoas estressadas, tristes,
chorosas em virtude dos diversos desafios impostos pela condição de ser cuidadora,
o que não as impediu de ir à luta, de continuar buscando informações, lutando por
mudanças e pela conquista de direitos, e, principalmente, demonstrando capacidade
de incorporar saberes e práticas de saúde relevantes acerca da doença,
transformando as dificuldades e demandas em possibilidades e estratégias de
cuidado, próprias dos seres humanos, que são inconclusos e estão em permanente
aprendizado, como diz Freire (1980) em sua teoria da Libertação.
77
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ___________________________________________________________________
78
Esta pesquisa caracterizada como uma Dissertação de Mestrado em
Enfermagem, que enfocou os saberes e práticas de cuidadores familiares de idosos
com a Doença de Alzheimer possibilitou a construção de um marco contextual a
partir de conceitos e concepções acerca do fenômeno do envelhecimento
populacional e suas vertentes demográficas, políticas e epidemiológicas, com
destaque para a DA, patologia de alta prevalência e elevado impacto fisiológico,
psicológico, social e familiar.
Buscando em estudos científicos bases referenciais sobre a trajetória
evolutiva da patologia, nas diferentes fases de desenvolvimento, bem como
identificar os saberes e práticas dos cuidadores familiares em cada uma das etapas
de agravamento do quadro clínico desta morbidade, possibilitou evidenciar a
importância deste cuidador, em sua maioria mulheres, que assumem de forma
solitária e anônima a responsabilidade pelo cuidado do idoso.
Nesse sentido, este mergulho no universo das pesquisas se deu para
responder a questionamentos instigadores originados no cotidiano assistencial e de
ensino sobre a ação de familiares que cuidam de idosos com tantas fragilidades e
dependências. E a partir destas reflexões, identificou-se a necessidade de
aproximações e articulações de conteúdos filosóficos e epistemológicos sobre o
conhecimento contidos na Teoria de Paulo Freire para iluminar a discussão dos
saberes e das práticas experimentadas por estes familiares no ato de cuidar.
Tanto o referencial teórico como os conceitos e concepções sobre a
temática do estudo, encontraram articulação com os achados da investigação,
evidenciando que os saberes e práticas destes familiares cuidadores representam
um fenômeno humano, no qual se afirmam postulações tais como, a da inconclusão
do homem, a da existência de conhecimento proveniente do senso comum e da
capacidade de aprendizado a partir da conscientização.
Dessa forma, esta investigação se configura como um rico resultado de
informações sobre os saberes e práticas de cuidadores familiares construído a partir
do próprio diálogo estabelecido entre os sujeitos e a pesquisadora nas entrevistas
domiciliares. Outros enfoques também contribuíram favoravelmente para se chegar
a esses resultados, como: a obediência aos critérios científicos e metodológicos, a
utilização da análise de conteúdo de Bardin e a identificação de um referencial
teórico adequado ao objeto de estudo.
79
Além de se ter perseguido os requisitos que são exigidos nas pesquisas
cientificas, desenvolveu-se um raport positivo entre os participantes do estudo e a
pesquisadora, que propiciou uma ambientação empática e sensível, favorecendo a
expressão de vivências, valores, sentimentos e crenças que envolvem esta relação
de cuidado. E assim, deve-se expressar que os resultados alcançados mostraram
saberes e práticas repletos de subjetividades decorrentes da historicidade e da
cultura da população.
Nessa perspectiva, o estudo demonstrou que os saberes manifestos pelos
cuidadores familiares sobre a Doença de Alzheimer foram expressos através da
sintomatologia e do seu tratamento, sendo resultantes da construção sociocultural,
frutos das vivências e experiências que envolvem as práticas de cuidados.
E embora, os saberes manifestos pelos sujeitos tenham se mostrado
empíricos, cotidianos e históricos, marcados ora por crenças e mitos, ora pela
precariedade das informações, são de fundamental importância para se
estabelecerem novas visões na área da saúde, sobretudo, da enfermagem, que
devem ser priorizadas no cotidiano da assistência ao portador e ao cuidador da
doença.
Em relação às práticas de cuidado identificou-se serem essenciais no
atendimento das necessidades básicas dos portadores e, conseqüentemente, para a
manutenção da vida dos mesmos. Constatou-se também que essas ações de cuidar
são individualizadas, cotidiana, contínua, trabalhosa e desgastante, e são
determinadas pelo estágio evolutivo da patologia e do conseqüente grau de
dependência do portador. Essas ações de cuidados mostraram-se revestidas de
disponibilidade, boa vontade e respeito com o idoso, embora em alguns momentos
se intercalem sentimentos de adversidades.
É importante lembrar que também se identificou nesta investigação, as
diferentes dificuldades e demandas expressadas e/ou sentidas pelos cuidadores
familiares, destacando-se as necessidades materiais e financeiras, rede de apoio
social e profissional, a divisão de tarefas com os demais membros da família e o
reconhecimento de sua ação de cuidar.
Atrelado a essas necessidades, cabe ressaltar a importância das
informações nesse contexto, cuja desinformação sobre o processo evolutivo da
doença foi bastante evidenciada entre os cuidadores, embora participassem da
80
ABRAz-PI, que tem como missão assisti-los em suas necessidades, principalmente,
no tocante a informações e orientações sobre a patologia.
Outra constatação do estudo refere-se às repercussões negativas da ação
de cuidar na própria saúde física e emocional destes cuidadores, pois foram
evidenciadas: a sobrecarga física, alterações emocionais e as limitações da vida
social, que comprometem o bem-estar destes indivíduos e do próprio doente. É
importante se relacionar que embora ocorrido estas reais conseqüências do árduo
labor destes familiares, paradoxalmente, evidenciou-se que esta prática produz
efeitos satisfatórios, que se traduz para alguns dos participantes como uma ação
enriquecedora, gratificante e capaz de produzir mudanças positivas na vida pessoal.
Também, mostrou-se evidente que a influência das questões de gênero na
determinação do cuidado familiar não repercute apenas na eleição das mulheres
como cuidadoras, mas também no modo de cuidar que foi, é e será aprendido,
ensinado à mulher, em diversas culturas, com destaque a brasileira. Certamente,
com estas características e mais o aprendizado do cuidado da saúde próprio da
condição feminina, estas mulheres realizaram uma prática responsável, respeitosa e
fraterna.
Sabe-se que o novo paradigma da saúde aponta formas de cuidar que
deverão transcender a dimensão biológica, portanto, conhecer os saberes, práticas,
necessidades e sentimentos dos cuidadores familiares possibilitou vislumbrar outros
modos de atuação dos profissionais da saúde, com destaque para o enfermeiro, no
que tange à necessidade de suporte técnico mais adequado e com maior
possibilidade de efetivação de uma intervenção terapêutica.
Assim, o estudo evidenciou ser essencial à sensibilização dos enfermeiros
acerca das repercussões que envolvem o processo de cuidar de um idoso com
Alzheimer, considerando-se que estes profissionais deverão ter um papel ativo no
planejamento de programas de apoio e acompanhamento dos cuidadores familiares
e idosos, devendo constituir-se como o elo entre a família e os demais membros da
equipe multidisciplinar, assumindo, assim, uma postura de disponibilidade e escuta
atenta que lhes permita compreender as necessidades, os sentimentos, e as
dificuldades do binômio cuidador/idoso.
Cabe também ao enfermeiro neste processo, ouvir, oferecer informação,
treinar tarefas e habilidades. Por sua vez, o cuidador familiar conduz a equipe de
saúde ao encontro de uma situação compatível com as suas necessidades pessoais
81
e do familiar que cuida. Surge, então, um dos maiores desafios para os profissionais
de saúde: proporcionar práticas educativas e atendimento significativo para o doente
e seu cuidador, pois cada experiência é individualizada, tornando-se extremamente
importante o contexto, nomeadamente no que diz respeito a percepções culturais, o
papel dos outros elementos da família, amigos e comunidade em que estão
inseridos e aspectos econômicos entre outros.
Portanto, a falta de informação e o desconhecimento que são freqüentemente
referidos pelo cuidador e afetam de forma significativa o desempenho e a
continuidade do cuidado. Apontando para a necessidade de investimentos na área
de educação em saúde com vistas à capacitação destes cuidadores para um melhor
desempenho deste papel, tornando-os elementos mais ativos no processo de cuidar
e na tomada de decisões. Nessa nova e ainda utópica proposta assistencial
configura-se o paradigma inovador da prestação de cuidados que se assenta na
parceria entre o cuidador e o enfermeiro.
Na perspectiva de operacionalizar estratégias inovadoras de atenção ao idoso
e ao cuidador familiar os resultados deste estudo apontam as seguintes sugestões:
1. Capacitação dos Profissionais de Saúde da ESF, com destaque para o
Enfermeiro, na tecnologia de cuidado domiciliar ao Idoso com DA e seus Cuidadores
Familiares.
2. Implantação nos municípios com mais de 100.000 habitantes de Equipes
Especializadas de Internação Domiciliar, que prestarão uma assistência integral e
sistematizada para os idosos com DA e complicações que estejam necessitando de
um maior suporte de cuidados técnicos. Esta internação certamente favorecerá a
atuação do cuidador familiar que não só receberá as informações sobre o quadro
clínico do paciente, como o apoio nas suas tarefas de cuidar.
3. Elaboração, produção e distribuição do Manual de Orientação Técnica para
o Cuidado Familiar ao Idoso com Alzheimer para os Profissionais de Saúde da ESF,
com DVD de auto-orientação em anexo.
4. Elaboração, produção e distribuição de material educativo de orientação
aos cuidadores familiares de idosos com DA (Cartilha “O Passo a Passo do Cuidado
de Idosos com Alzheimer”).
5. Implantação de Grupos de Auto-Ajuda nos diversos territórios de saúde
pelas Equipes da ESF, com vistas a capacitar cuidadores familiares de idosos com
DA, através de Oficinas e Práticas de Educação em Saúde.
82
6. Implantação de Serviços de Aconselhamento e Apoio através de linha
telefônica gratuita – 0800 nas 24 horas. Bem como pela Internet em Blogs e/ou sites
de orientação e comunicação on line, possibilitando aos cuidadores e/ou
interessados informações necessárias para o cuidado do idoso com Alzheimer e o
esclarecimento de dúvidas.
Além das sugestões anunciadas, mostra-se com uma evidente e factível
contribuição deste estudo a idealização da publicação de um livro sobre os saberes
e práticas dos cuidadores familiares de idosos com Alzheimer. Acredita-se que esta
produção científica poderá instrumentalizar não somente o cotidiano de familiares
cuidadores, como também, trará grandes benefícios à prática dialógica do
enfermeiro educador. Afinal, cuidar de um idoso com Alzheimer representa um
desafio não só para a família, mas também para os enfermeiros e profissionais de
saúde de modo geral.
Longe de esgotar os cuidados domiciliares realizados junto ao doente de
Alzheimer, esse livro trará os depoimentos dos cuidadores familiares, nos quais
retratam a sutileza e a sensibilidade do que é fundamental no cuidado, revelando
situações e sugestões de estratégias que podem facilitar o cuidado junto ao doente
e melhorar sua qualidade de vida e a de seus cuidadores.
Além do mais, espera-se que o livro enquanto produto de uma dissertação
de mestrado possa ser utilizado no ensino de graduação e pós-graduação, bem
como, sirva de bases para futuras pesquisas que focalizem a problemática dos
idosos com Alzheimer e as experiências e vivências de seus cuidadores familiares.
Logo, buscar, analisar, descrever, compreender práticas e atitudes, sinais e
sintomas, perdas e ganhos, sentimentos e pensamentos de pessoas que cuidam e
dos que recebem cuidados resultou em uma riqueza de informações para
construção desta Dissertação de Mestrado sobre fenômenos emergentes e
contemporâneos vivenciados na sociedade brasileira, tais como: o envelhecimento,
a doença de Alzheimer e seus cuidadores familiares.
83
REFERÊNCIAS ___________________________________________________________________
84
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APÊNDICES
___________________________________________________________________
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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE/DEPARTAMENTO DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO - MESTRADO EM ENFERMAGEM
APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTA
ENTREVISTA Nº DATA......./....../......
DADOS DE CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS
a. Idade e. Escolaridade
b. Sexo f. Renda Mensal
c. Ocupação g. Vínculo Afetivo
d. Estado Civil
1. O que você sabe sobre a doença de Alzheimer?
2. Fale sobre sua prática de cuidar do idoso portador de Alzheimer no domicílio.
3. Quais são suas dúvidas sobre essa doença e seus cuidados?
4. Você gostaria de falar alguma coisa sobre essa experiência de cuidar, que não foi
abordado nessa entrevista.
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ANEXOS __________________________________________________________________
94
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE/DEPARTAMENTO DE ENFERMAGEM PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO - MESTRADO EM ENFERMAGEM
ANEXO A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Você está sendo convidado (a) para participar, como voluntário, em uma pesquisa. Você precisa decidir se quer participar ou não. Por favor, não se apresse em tomar a decisão. Leia cuidadosamente o que se segue e pergunte ao responsável pelo estudo qualquer dúvida que você tiver. Este estudo está sendo conduzido por Eronice Ribeiro de Morais; Maria do Livramento Fortes Figueiredo. Após ser esclarecido(a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine ao final deste documento, que está em duas vias. Uma delas é sua e a outra é do pesquisador responsável. Em caso de recusa você não será penalizado(a) de forma alguma. ESCLARECIMENTO SOBRE A PESQUISA: Título do Projeto: Saberes e práticas de cuidadores familiares de idosos com Alzheimer Pesquisador Responsável: Maria do Livramento Fortes Figueiredo. Instituição/Departamento: Universidade Federal do Piauí/ Departamento de
Enfermagem Telefone para contato (inclusive a cobrar): (86) 3215-5940 / 9981-5878 Email:
[email protected] ou [email protected] Pesquisadores participantes: Eronice Ribeiro de Morais Telefones para contato: (86) 9982 5234.
A presente pesquisa se configura como um estudo de abordagem qualitativa, do tipo descritivo, a ser realizada nos domicílios dos cuidadores familiares de idosos com Alzheimer integrantes da ABRAZ – PI, na cidade de Teresina Piauí. Os sujeitos serão cuidadores principais de idosos portadores de Alzheimer que apresentam algum grau de dependência e que aceitarem participar da pesquisa. A coleta dos dados realizar-se-á nos meses de abril e maio de 2009 após a aprovação por este comitê de ética e autorização da instituição. Objetiva-se nesta pesquisa: Descrever os saberes e práticas dos cuidadores familiares no cuidar do idoso com Alzheimer; Discutir a luz do referencial dialógico de Paulo Freire os saberes e as práticas dos cuidadores familiares de idoso com Alzheimer. Você responderá um roteiro de entrevista, no qual terão perguntas relacionadas com os saberes e as prática de cuidar do idoso com Alzheimer no domicilio e será gravada em MP3.
Ressalta-se que a presente pesquisa não trará riscos, prejuízos, desconforto, lesões, formas de indenização, nem ressarcimento de despesas.
Garantia de acesso: em qualquer etapa do estudo, você terá acesso aos profissionais responsáveis pela pesquisa para esclarecimento de eventuais dúvidas.
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O principal investigador é a Drª. Maria do Livramento Fortes Figueiredo que pode ser encontrada no endereço Universidade Federal do Piauí, Departamento de Enfermagem, Rua Marcos Parente, 1204. Bairro Fátima, Teresina-PI, telefone (86) 8822-3622. Se você tiver alguma consideração ou dúvida sobre a ética da pesquisa, entre em contato com o Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Piauí, no mesmo endereço Campus Universitário Ministro Petrônio Portella - Bairro Ininga. Centro de Convivência L09 e 10 - CEP: 64.049-550 - Teresina – PI. Tel.: (86) 3215-5734 - email: [email protected] web: www.ufpi.br/cep ♦ Garantia de sigilo: Se você concordar em participar do estudo, seu nome e identidade serão mantidos em sigilo. A menos que requerido por lei ou por sua solicitação, somente o pesquisador, a equipe do estudo, representantes do patrocinador (quando presente) Comitê de Ética independente e inspetores de agências regulamentadoras do governo (quando necessário) terão acesso a suas informações para verificar as informações do estudo). ♦Em qualquer momento da pesquisa o participante terá o direito de retirar o consentimento.
Consentimento da participação da pessoa como sujeito
Eu, _________________________________________, RG/ CPF/ n.º de prontuário/ n.º de matrícula_____________________________________, abaixo assinado, concordo em participar do estudo SABERES E PRÁTICAS DE CUIDADORES FAMILIARES DE IDOSOS COM ALZHEIMER, como sujeito. Fui suficientemente informado a respeito das informações que li ou que foram lidas para mim, descrevendo o estudo. SABERES E PRÁTICAS DE CUIDADORES FAMILIARES DE IDOSOS COM ALZHEIMER. Eu discuti com a Drª Maria do Livramento Fortes Figueiredo sobre a minha decisão em participar nesse estudo. Ficaram claros para mim quais são os propósitos do estudo, os procedimentos a serem realizados, seus desconfortos e riscos, as garantias de confidencialidade e de esclarecimentos permanentes. Ficou claro também que minha participação é isenta de despesas e que tenho garantia do acesso a tratamento hospitalar quando necessário. Concordo voluntariamente em participar deste estudo e poderei retirar o meu consentimento a qualquer momento, antes ou durante o mesmo, sem penalidades ou prejuízo ou perda de qualquer benefício que eu possa ter adquirido, ou no meu acompanhamento/ assistência/tratamento neste Serviço.
Teresina, ____ de _____________ de 200__.
___________________________________________________
Assinatura
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Presenciamos a solicitação de consentimento, esclarecimentos sobre a pesquisa e aceite do sujeito em participar Testemunhas (não ligadas à equipe de pesquisadores): Nome:____________________________________________ RG:______________________________________________ Assinatura: ________________________________________ Nome:____________________________________________ RG:______________________________________________ Assinatura: ________________________________________ Declaro que obtive de forma apropriada e voluntária o Consentimento Livre e Esclarecido deste sujeito de pesquisa ou representante legal para a participação neste estudo1.
Teresina, ____ de _____________ de 200__.
_____________________________________________ Assinatura do pesquisador responsável
1 Observações complementares
Se você tiver alguma consideração ou dúvida sobre a ética da pesquisa, entre em contato: Comitê de Ética em
Pesquisa – UFPI - Campus Universitário Ministro Petrônio Portella - Bairro Ininga. Centro de Convivência L09
e 10 - CEP: 64.049-550 - Teresina – PI tel.: (86) 3215-5734 - email: [email protected] web: www.ufpi.br/cep
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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE/DEPARTAMENTO DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO - MESTRADO EM ENFERMAGEM
APÊNDICE B – CARTA DE APROVAÇÃO DO COMITÊ DE ÉTICA
Livros Grátis( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download: Baixar livros de AdministraçãoBaixar livros de AgronomiaBaixar livros de ArquiteturaBaixar livros de ArtesBaixar livros de AstronomiaBaixar livros de Biologia GeralBaixar livros de Ciência da ComputaçãoBaixar livros de Ciência da InformaçãoBaixar livros de Ciência PolíticaBaixar livros de Ciências da SaúdeBaixar livros de ComunicaçãoBaixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNEBaixar livros de Defesa civilBaixar livros de DireitoBaixar livros de Direitos humanosBaixar livros de EconomiaBaixar livros de Economia DomésticaBaixar livros de EducaçãoBaixar livros de Educação - TrânsitoBaixar livros de Educação FísicaBaixar livros de Engenharia AeroespacialBaixar livros de FarmáciaBaixar livros de FilosofiaBaixar livros de FísicaBaixar livros de GeociênciasBaixar livros de GeografiaBaixar livros de HistóriaBaixar livros de Línguas
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