o analista

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Feliz aniversário de cinquenta e três anos, doutor. Bem-vindo ao primeiro dia de sua morte. Assim começa a carta que Frederick Starks, um psicanalista de Nova York, recebe no dia de seu aniversário. A vida tranquila que Starks conhecia até então acaba ali. Ele é lançado em um verdadeiro jogo mortal, por um psicopata que se autodenomina Rumplestiltskin. Em uma eletrizante corrida contra o tempo, Stark deve descobrir a identidade e as motivações do assassino: quem é este homem, cuja vida foi supostamente destruída por Stark no passado? Se falhar, ele testemunhará a destruição de seus familiares e conhecidos, um após o outro... A não ser que tire a própria vida. À mercê de um homem que parece estar sempre um passo à frente, o analista deve usar todos os seus recursos para deter o psicopata e seu desejo de vingança, antes que isso o leve ao suicídio ou à insanidade. Um romance impressionante, na tradição dos suspenses psicológicos, baseado na delicada relação entre analista e pacien

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Índices para catálogo sistemático:1. Ficção de suspense : Literatura

norte-americana 813

Dados internacionais de catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

The AnalystA Ballantine Book

Published by the Ballantine Publishing GroupCopyright © 2002 by John Katzenbach

Copyright © 2013 by Novo SéculoBy arrangement with John Hawkins & Associates, Inc., New York

Coordenação Editorial Silvia Segóvia

Diagramação e capa Guilherme Xavier

Preparação de texto Eduardo Rado

Revisão Tania Heglacy

Impresso no BrasIl

prInted In BrazIl

dIreItos cedIdos para esta edIção à

novo século edItora

CEA – Centro Empresarial Araguaia II Alameda Araguaia, 2190 – 11o andarBloco A – Conjunto 1111 – CEP 06455-000 – Alphaville Industrial, Barueri – SP

Tel. (11) 2321-5080 – Fax (11) 23215099www.novoseculo.com.br

[email protected]

Katzenbach, JohnO analista / John Katzenbach ; [traduzido porActual Translations]. -- 2. ed rev. -- Barueri,

SP : Novo Século Editora, 2013.

Título original: The analyst.

1. Ficção de suspense 2. Ficção norte-americanaI. Título.

13-03048 CDD-813

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The AnalystA Ballantine Book

Published by the Ballantine Publishing GroupCopyright © 2002 by John Katzenbach

Copyright © 2013 by Novo SéculoBy arrangement with John Hawkins & Associates, Inc., New York

Para meus companheiros de pesca: Ann, Peter, Phil e Leslie

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SUMÁRIO

PARTE 1UMA CARTA INOPORTUNA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

PARTE 2O HOMEM QUE NUNCA EXISTIU . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 253

PARTE 3ATÉ OS MAUS POETAS AMAM A MORTE . . . . . . . . . . . . . 345

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PARTE 1

UMA CARTA INOPORTUNA

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No ano em que tinha quase certeza de que morreria, passou grande parte do aniversário de 53 anos como havia passado a maioria dos outros dias: ouvindo pessoas reclamarem das mães . Mães negligentes, mães cruéis e mães sexualmente provocativas . Mães já mortas, que continuavam vivas na mente dos seus filhos . Mães vivas, que os filhos queriam matar . O Sr . Bishop, em particular, mais a Srta . Levy e o autêntico azarado Roger Zimmerman, que dividia seu apartamento na Upper West Side e também, ao que parecia, a totalidade de sua vida consciente e de seus sonhos reais com uma mulher hipocondríaca, manipuladora e rabugenta, que não parecia dedicar-se a nada além de frustrar cada mínimo esforço de independência do filho único – to-dos eles haviam tirado o dia inteiro para descarregar a amargura sobre a mulher que os trouxera ao mundo .

Ele ouvia em silêncio os maiores surtos de ira assassina, interferindo ape-nas de vez em quando com o comentário mais inocente possível, nunca in-terrompendo a fúria vomitada do divã, e a todo tempo desejava que ao me-nos um dos seus pacientes pudesse respirar fundo, renunciar à raiva e encarar a situação como realmente era: ódio de si mesmo . Ele sabia por aprendizado e experiência que, finalmente, após anos de conversas amargas naquele uni-verso do consultório, estranhamente afastado de tudo, todos eles, até mesmo o pobre, desesperado e desajeitado Roger Zimmerman, chegariam por si mesmos a essa conclusão .

Além disso, a ocasião de seu aniversário, que o fazia lembrar-se mais diretamente de sua própria mortalidade, levou-o a pensar se teria tempo suficiente para ver algum deles passar por aquele momento de aceitação que é o grande triunfo do analista . O próprio pai morrera pouco depois de chegar aos 53, o coração enfraquecido pelo fumo compulsivo e pelo estresse, um fato que, ele sabia, escondia-se malévola e sutilmente em seu subconsciente . Assim, enquanto o desagradável Roger Zimmerman

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lamentava-se e choramingava pelos minutos finais da última sessão do dia, ele estava um pouco distraído, sem prestar a atenção que devia, quando ouviu três toques fracos na campainha que havia instalado na sala de espera .

A campainha era o sinal combinado para anunciar a chegada de um outro paciente . Todo novo cliente era informado, antes da primeira sessão, que ao chegar deveria tocar duas vezes a campainha em uma rápida sequência, se-guida por um terceiro toque mais longo . Isso era para diferenciar a chegada dos pacientes da chegada de qualquer vendedor, leitor do relógio da água, vizinho ou entregador que chegasse à sua porta .

Sem mudar de posição, deu uma olhada na agenda próxima ao relógio que ficava na pequena mesa por trás da cabeça dos pacientes, onde não poderiam vê-los . Ainda não eram seis horas . O relógio marcava doze mi-nutos para as seis e Roger Zimmerman pareceu firmar-se no divã .

– Eu pensei que era o último todos os dias . Ele não respondeu .– Ninguém jamais chegou depois de mim, pelo menos não que eu me

lembre . Nem uma vez . Você mudou os horários sem me avisar?Novamente ele não respondeu .– Eu não gosto da ideia de alguém chegando depois de mim – disse

Zimmerman decidido . – Eu quero ser o último .– Por que acha que se sente assim? – finalmente perguntou .– De uma certa forma, ser o último é o mesmo que ser o primeiro –

Zimmerman respondeu, com um tom de voz que implicava que qualquer idiota teria pensado a mesma coisa .

Ele concordou com a cabeça . Zimmerman havia feito uma obser-vação intrigante e precisa . Mas, como o pobre coitado sempre fazia, tinha dito aquilo no último momento da sessão . Não no começo, quando poderiam ter desenvolvido uma discussão produtiva pelos cinquenta minutos restantes .

– Tente trazer essa ideia na sessão de amanhã – disse ele . – Podemos começar por aí . Acho que terminamos por hoje .

Zimmerman hesitou antes de se levantar .– Amanhã? Corrija-me se eu estiver errado, mas amanhã é o último dia

antes de você sumir nas suas malditas férias de agosto, como faz todo mal-dito ano . De que me adiantaria?

Mais uma vez ele permaneceu em silêncio, deixando a pergunta no ar como que voando por sobre a cabeça do paciente . Zimmerman esbravejou:

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– Quem quer que esteja aí fora é mais interessante do que eu, não é? – disse amargamente . Então Zimmerman girou os pés para fora do divã e olhou para o doutor . – Eu não gosto quando as coisas mudam – disse rispi-damente . – Eu não gosto nada disso . – Ele lançou um olhar rápido e pene-trante para o doutor enquanto se levantava, sacudindo os ombros e retor-cendo o rosto de forma repugnante . – Deveria ser sempre a mesma coisa . Eu venho, deito, começo a falar . O último paciente todos os dias . É assim que tem de ser . Ninguém gosta de mudanças . – Ele suspirou, mas dessa vez com um pouco mais de raiva, sem resignação . – Tudo bem . Amanhã, en-tão . A última sessão antes que você vá para Paris, Cape Cod, Marte ou para onde quer que seja, deixando-me completamente sozinho . – Zimmerman virou-se abrup tamente e, decidido, atravessou o pequeno consultório sain-do pela porta sem olhar para trás uma vez sequer .

Por um momento, permaneceu na poltrona escutando o som distante dos passos do homem furioso, ressoando no corredor externo . Então le-vantou-se, sentindo o impacto da idade que lhe havia endurecido as juntas e os músculos durante a longa e sedentária tarde por trás do divã, e seguiu para a entrada, uma segunda porta que dava para sua modesta sala de es-pera . De certo modo, aquela sala de aparência estranha e improvável, onde havia instalado seu consultório há várias décadas, era algo singular, e havia sido a única razão pela qual tinha alugado o apartamento no ano seguinte após terminar sua residência e a razão pela qual estava ali havia mais de um quarto de século .

O consultório tinha três portas: uma que dava para o vestíbulo, que ele havia transformado em uma pequena sala de espera; uma segunda, que levava diretamente ao corredor do apartamento; e uma terceira, que dava acesso a uma modesta cozinha, à sala de estar, a um quarto e ao restante do apartamento . Seu consultório era um tipo de ilha particular, com saídas para esses outros mundos . Ele o via como uma passagem subterrânea, uma ponte entre diferentes realidades . Ele gostava disso por acreditar que a se-paração do consultório com o mundo externo ajudava a tornar seu traba-lho mais fácil .

Ele não tinha ideia de qual dos seus pacientes havia chegado sem hora marcada . Não conseguia lembrar-se de nenhuma ocasião em que um pa-ciente tivesse agido assim, em todos os anos de profissão .

Também não conseguia imaginar qual de seus pacientes poderia estar em tamanha crise a ponto de mudar tão inesperadamente a relação entre analista e analisando . Ele acreditava na rotina, rotina e paciência, onde o

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simples peso das palavras ditas na pureza artificial, porém absoluta, do consultório do analista um dia se transformariam em entendimento e au-tocompreensão . Sobre isso Zimmerman tinha razão . Mudanças não eram uma coisa natural . Então, ele cruzou rapidamente a sala com certa expecta-tiva, levemente perturbado com a ideia de que alguma coisa urgente viesse invadir uma vida que ele receava já se ter tornado completamente sem gra-ça e tremendamente previsível .

Ele abriu a porta da sala de espera e olhou .A sala estava vazia .Por um momento, ficou confuso e achou que talvez se tivesse enganado

com a campainha . Mas Zimmerman também havia escutado . E também havia reconhecido o toque combinado avisando que alguém conhecido es-tava na sala de espera .

– Olá? – disse ele, apesar de claramente não haver ninguém ali para ouvi-lo .

Ele podia sentir a testa franzir com a surpresa e ajeitou os óculos com aro de metal no nariz . – Estranho – disse alto . Então notou o envelope deixado sobre a única cadeira que havia para os pacientes esperarem a consulta . Ele respirou lentamente, balançou a cabeça e achou aquilo um pouco melodramático demais, mesmo para os componentes de sua atual lista de pacientes .

Foi em frente e pegou o envelope . Seu nome estava escrito do lado de fora .– Que estranho – disse ele em voz alta . Ele hesitou um pouco antes de

abrir a carta, segurando-a acima da testa como Johnny Carson costumava fazer em seu quadro “Carnac, o magnífico”, tentando, naquele momento, adivinhar qual dos seus pacientes teria deixado aquela carta ali . Mas aquele ato não parecia característico de nenhum dos doze que ele recebia regular-mente . Todos eles gostavam de expor direta e frequentemente suas queixas sobre o que percebiam como inadequado e falho, o que, embora algumas vezes irritante, era parte integrante do processo .

Ele abriu o envelope e desdobrou duas folhas de papel preenchidas com letras datilografadas . Leu apenas a primeira linha:

Feliz aniversário de 53 anos, doutor. Bem-vindo ao primeiro dia de sua morte.

Respirou fundo de um só fôlego . O ar de mofo do apartamento pareceu deixá-lo tonto . Apoiou-se rapidamente na parede para se recompor .

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Dr . Frederick Starks, um homem que lidava profissionalmente com a in-trospecção, vivia sozinho, atormentado pelas memórias de outras pessoas .

Caminhou até sua pequena e antiga mesa de madeira . Um presente recebido da esposa quinze anos antes . Fazia três anos que ela morrera, e quando ele se sentava àquela mesa era como se ainda ouvisse a voz dela . Abriu as duas folhas da carta à sua frente sobre o mata-borrão . Pensou que já fazia uma década desde a última vez em que sentira medo de ver-dade . E o que o deixara com medo fora o diagnóstico do oncologista de sua esposa . Agora, este gosto ácido e seco na boca era tão indesejado quanto a aceleração de seu coração, que sentia galopar dentro do peito .

Levou alguns segundos para acalmar as batidas . Esperou paciente-mente até sentir o ritmo diminuir lentamente . Estava profundamente consciente da sua solidão naquele momento, e odiava a vulnerabilidade que ela criava nele .

Ricky Starks – ele raramente permitia que alguém soubesse o quanto preferia o som infantil e fraternal dessa abreviação informal ao mais ex-tenso Frederick – era um homem que necessitava de rotina e ordem . Dedicava-se a uma regularidade que certamente beirava a obsessão; acre-ditava que impor tamanha ordem na sua própria vida diária era a única forma segura de manter sentido na confusão e caos que seus pacientes traziam todos os dias para ele . Fisicamente, era esguio, com pouco mais de 1,80m de altura, um corpo ascético, magro, que ele mantinha graças a uma enérgica caminhada diária, na hora do almoço, e a uma firme recusa a ceder aos doces e sorvetes que ele secretamente adorava .

Usava óculos, o que era comum para um homem da sua idade, ape-sar de orgulhar-se de precisar do grau mínimo . Também se orgulhava de, apesar de escasso, o cabelo ainda cobrir o topo da cabeça como o trigo nos campos . Não fumava mais e só raramente bebia um cálice de vinho, uma vez ou outra, para ajudar no sono . Era um homem que se acostumara com a solidão, aventurando-se a comer sozinho em um res-taurante, assistir a um show da Broadway ou ir ao cinema sem compa-nhia . Considerava seu corpo e sua mente em excelentes condições . Na maioria das vezes, sentia-se mais jovem do que era . Mas estava profun-damente consciente de que a idade à qual chegava era a mesma com que o pai morrera, e apesar da comparação ilógica, não achava que iria viver mais de 53 anos, como se isso fosse injusto ou, de alguma forma, ina-propriado . Apesar disso, pensou contraditoriamente, enquanto olhava mais uma vez para as primeiras palavras da carta, ainda não estou pron-

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to para morrer . Continuou lendo, lentamente, parando a cada frase, deixando que o terror e o pânico se enraizassem dentro dele .

Eu existo em algum lugar do seu passado.Você arruinou a minha vida. Você pode não saber como, ou por quê, ou

ainda quando, mas arruinou. Você trouxe desgraça e tristeza a cada minuto da minha existência. Você arruinou a minha vida. E agora eu pretendo ar-ruinar completamente a sua.

Ricky Starks respirou fundo mais uma vez . Ele vivia em um mundo comumente habitado por falsas ameaças e promessas mentirosas, mas imediatamente percebeu que as palavras à sua frente eram muito dife-rentes daquele discurso cheio de rodeios que ele estava acostumado a ouvir todos os dias .

Primeiro, pensei simplesmente em matá-lo para ficarmos quites. Mas percebi que seria fácil demais. Você é um alvo pateticamente fácil, dou-tor. Você não fecha as portas durante o dia. Percorre o mesmo caminho todos os dias, de segunda à sexta. Nos finais de semana, você continua incrivelmente previsível, com sua saída para comprar o Times, um pão de alho, um café, com duas colheres de açúcar, sem leite, a dois quartei-rões de sua casa.

Seria fácil demais. Persegui-lo e matá-lo não seria um grande desafio. E, dada a facilidade com que se pode assassiná-lo, acho que isso não me daria a satisfação necessária.

Decidi que prefiro que você se mate.

Rick Starks mexeu-se desconfortavelmente na cadeira . Ele podia sentir o calor subindo daquelas palavras diante dele, como se viesse de um fogão a lenha, aquecendo-lhe a testa e o rosto . Seus lábios estavam secos, e ele passou a língua inutilmente sobre eles .

Mate-se, doutor.Salte de uma ponte. Estoure seus miolos com uma arma.Atire-se embaixo de um ônibus. Pule na frente de um trem do metrô. Abra

o gás do fogão e acenda a luz. Encontre uma viga adequada e se enforque. Você pode escolher o método.

Mas é a sua melhor opção.

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Seu suicídio será mais apropriado, dadas as atuais circunstâncias do nos-so relacionamento. E, certamente, o meio mais satisfatório de pagar a dívida que tem comigo.

Então, este é o jogo que vamos jogar: você tem exatamente quinze dias, co-meçando amanhã às seis horas da manhã, para descobrir quem eu sou. Se conseguir descobrir, compre um box de anúncio no fim da primeira página do New York Times e coloque ali o meu nome. Isso é tudo: é só colocar meu nome.

Se você não descobrir quem eu sou, então... bem, essa é a parte mais diver-tida. Você vai perceber que a segunda folha desta carta contém os nomes de cinquenta e dois parentes seus. Estão por ordem de idade, desde um recém--nascido, de quase seis meses de idade, o filho de sua sobrinha-neta, até o seu primo, o investidor de Wall Street e notável capitalista, que é um ser tão sem graça quanto você. Se não conseguir colocar o anúncio como expliquei, então você só terá uma escolha: matar-se imediatamente ou destruirei uma dessas pessoas inocentes.

Destruir.Que palavra intrigante! Pode significar a ruína financeira. Pode significar

uma queda social. Pode significar violência psicológica.Pode ainda significar assassinato. Pense nisso. Pode ser alguém jovem ou

velho. Homem ou mulher. Rico ou pobre.A única coisa que posso garantir é que será um acontecimento do qual eles

– ou seus entes queridos – jamais se recuperarão, não importa quantos anos passem fazendo análise. E seja lá o que for, você vai viver até os últimos se-gundos dos últimos minutos de sua vida nesta Terra com a certeza de que foi você quem lhes causou isso.

A não ser, é claro, que você tome a decisão mais honrada e se mate antes, salvando de seu destino qualquer outro alvo que eu tenha escolhido.

Eis a sua escolha: meu nome ou sua nota de falecimento. No mesmo jor-nal, é claro.

Como prova da extensão do meu alcance e do meu plano, entrei em con-tato hoje com um dos nomes da lista por meio de uma pequena e modesta mensagem. Sugiro que você passe o restante desta noite procurando saber quem foi contatado e como. Assim, você pode começar a verdadeira tarefa que tem à sua frente, sem demora, amanhã de manhã.

É claro que não espero que você adivinhe minha identidade.

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Portanto, para mostrar que tenho espírito esportivo, decidi que de vez em quando, no decorrer dos próximos quinze dias, darei a você uma ou outra pista. Só para deixar as coisas mais interessantes, apesar de que um tipo in-tuitivo e esperto como você, deve deduzir que esta carta inteira está cheia de pistas. No entanto, aqui vai uma prévia, e é de graça.

No passado, tudo era alegre e cheio de vida, Mamãe, papai e uma pequena criança.Mas aquele tempo bom acabouQuando papai para o mar viajou.

Poesia não é o meu forte. O ódio, sim.Você pode fazer três perguntas. Do tipo que se responde com Sim ou Não,

por favor.Use o mesmo método, a coluna de anúncios da 1a página do New York

Times.Eu responderei do meu jeito dentro de vinte e quatro horas.Boa sorte. Você pode também aproveitar o tempo para organizar seu fu-

neral. Uma cremação seria provavelmente melhor que um enterro elaborado. Eu sei o quanto você detesta igrejas. Não acho que seja uma boa ideia chamar a polícia. Eles certamente rirão de você, o que, eu acho, sua arrogância não suportará. E isso pode enfurecer-me ainda mais e, por enquanto, você ainda não tem ideia de como eu sou instável. Posso responder a esse ato de forma imprevisível, de várias maneiras terríveis. Mas de uma coisa esteja absoluta-mente certo:

Meu ódio não conhece limites.

A carta estava assinada em letras maiúsculas: RUMPLESTILTSKIN*

Rick Starcks recostou-se com força na cadeira, como se a fúria que ema-nava daquelas palavras à sua frente tivesse atingido seu rosto como um soco . Pôs-se de pé, caminhou para a janela e abriu-a, deixando que os sons

* N.T. No folclore alemão, Rumplestiltskin é um anão que salva a vida de uma garota que havia se casado com um rei. Em troca, ele lhe pede o primeiro filho que ela tiver. Quando a criança nasce, a mãe, desesperada, suplica que ele a libere da promessa. Ele consente, com a condição de que ela adivinhe o nome dele em três dias. Ela consegue no último momento, e o poder de Rumplestiltskin é quebrado.

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da cidade invadissem a quietude da pequena sala, carregados por uma bri-sa tardia e inesperada de julho que prometia uma tempestade a caminho da cidade . Respirou fundo, buscando no ar algum tipo de alívio para o calor que tomara conta dele . Ouviu uma estridente sirene de polícia a alguns quarteirões de distância e a cacofonia das buzinas, que eram a música de fundo em Manhattan . Respirou fundo duas ou três vezes e depois fechou a janela, deixando para fora todos os sons da vida urbana normal .

Voltou à carta .Estou em apuros, pensou . Mas ainda não sabia o quanto . Percebeu que estava sendo profundamente ameaçado, mas os limites

daquela ameaça ainda não estavam claros . Uma parte significativa dele insistia para que ignorasse aquele documento sobre a mesa: que simples-mente se recusasse a entrar em algo que não se parecia muito com um jogo . Ele bufou com força, deixando que as ideias florescessem em sua mente . Todo seu aprendizado e experiência sugeriam que não fazer nada era o mais razoável . Afinal de contas, muitas vezes o analista percebe que manter o silêncio e não responder nada diante do comportamento mais provocativo e ultrajante de um paciente é o meio mais fácil de se chegar à verdade psicológica dos atos . Ele se levantou e deu duas voltas ao redor da mesa, como um cão que fareja algo estranho .

Na segunda volta, parou e olhou mais uma vez para as palavras escritas naquelas páginas .

Ele sacudiu a cabeça . Não vai funcionar, percebeu . Por um momento chegou a admirar a sofisticação do autor da carta . Ricky compreendeu que teria recebido um “vou matar você” com desinteresse e quase aborre-cimento . Afinal de contas, ele já havia vivido bastante, e relativamente bem, pensou . Portanto, ameaçar matar um homem de meia-idade não significaria muita coisa . Mas não era isso que ele estava enfrentando . A ameaça era mais indireta . Alguém mais estava fadado a sofrer, caso ele não fizesse nada a respeito . Alguém inocente e, certamente, alguém jo-vem, porque os jovens são mais vulneráveis .

Ricky engoliu em seco . Eu me sentiria culpado e passaria o resto dos meus dias em verdadeira agonia .

Sobre isso, o autor da carta estava absolutamente correto .Ou então deveria me matar . De repente sentiu um amargo na boca . Sui-

cídio seria a antítese de tudo aquilo que defendeu durante toda a vida . Ele suspeitava que a pessoa que se assinava Rumplestiltskin sabia disso .

Sentiu-se subitamente posto em julgamento .

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Novamente começou a caminhar pelo escritório, avaliando a carta . Uma voz forte dentro dele dizia para esquecer tudo, ignorar a mensagem, carac-terizá-la como um exagero e uma fantasia sem fundamento, mas ele não conseguia fazer isso . Ricky recriminou-se: Só porque algo deixa você des-confortável, não significa que você deva ignorar isso.

Mas ele realmente não tinha uma boa ideia de como reagir àquilo . Parou de andar e voltou para sua cadeira . Loucura, pensou ele . Mas lou-cura com um toque diferenciado de sofisticação, já que vai me fazer en-trar no jogo .

– Eu devia ligar para a polícia – disse em voz alta . Então parou . E dizer o quê? Ligar para a polícia e contar para algum sargento burocrático sem imaginação que tinha recebido uma carta com ameaças? E ouvir um E daí? Na melhor das hipóteses, seria informado de que nenhuma lei havia sido violada . A não ser que sugerir o suicídio a alguém fosse algum tipo de violação . Extorsão? Que tipo de homicídio seria aquele? – pensava . Ocorreu-lhe chamar um advogado, então compreendeu que o problema colocado pela carta de Rumplestiltskin não era de ordem legal . Tinha sido abordado em um campo que conhecia bem . O jogo sugerido era sobre intuição e psicologia; dizia respeito a emoções e medos . Ele sacudiu a cabeça e disse a si mesmo: posso jogar nesse campo .

– Que você já sabe? – perguntou à sua sombra na sala vazia . Alguém conhece minha rotina . Sabe como permito que os pacientes entrem no meu consultório . Sabe quando paro para almoçar . Sabe o que eu faço nos finais de semana . Também é esperto o suficiente para fazer uma lista com os nomes dos meus parentes . Isso exigia um certo talento .

Sabe o dia do meu aniversário .Ele respirou profundamente, de novo . Eu fui estudado .Eu não percebi isso, mas alguém esteve de alguma forma me obser-

vando . Testando-me . Alguém dedicou tempo e esforço consideráveis para criar esse jogo sem me dar muito tempo para reagir .

Sua língua e seus lábios continuavam secos . Repentinamente ficou mor-to de sede, mas sem vontade de abandonar a reclusão do consultório para ir até a cozinha pegar um copo d’água .

– O que eu teria feito para que alguém me odiasse tanto? – pergun-tou ele .

A pergunta foi como um soco no estômago . Ricky sabia que apreciava a arrogância de muitos benfeitores que acreditavam ter feito algum benefício para seu mundinho particular por meio da compreensão e aceitação da

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existência de alguém . A ideia de ter criado uma horrível infecção de ódio em alguém, em algum lugar, era algo extremamente perturbador .

– Quem é você? – perguntou à carta . Imediatamente começou a exami-nar as pastas de pacientes, remexendo em coisas de décadas atrás, mas pa-rou o que estava fazendo . Sabia que mais cedo ou mais tarde teria de fazer aquilo, mas de forma sistemática, disciplinada, persistente, coisa que ainda não estava preparado para fazer .

Ricky não se considerava a pessoa mais qualificada para ser seu pró-prio policial . Mas sacudiu a cabeça, percebendo que, de certo modo, não era verdade . Ele tinha sido uma espécie de detetive por vários anos . A diferença, claro, era apenas a natureza dos crimes que investigava e as técnicas empregadas . Apoiado nesse raciocínio, Ricky Starks recostou-se na cadeira, alcançou a gaveta de cima do lado direito e tirou dela uma antiga agenda telefônica de capa de couro tão velha que estava amarrada com um elástico . Para começar, disse a si mesmo, poderia encontrar o parente contatado por essa pessoa . Deve ser algum paciente antigo, pen-sou, alguém que interrompeu de repente a análise e caiu em depressão . Alguém que desenvolveu uma fixação quase psicótica durante anos . Ima-ginou que com um pouquinho de sorte e talvez com uma ou duas dicas do parente contatado ele poderia identificar esse ex-paciente frustrado . Tentou dizer a si mesmo, confortadoramente, que o escritor da carta – Rumplestiltskin – estava, na verdade, pedindo ajuda . Então, rapidamente descartou esse pensamento tolo . Com a agenda na mão, Ricky pensou sobre o personagem do conto de fadas cujo nome o autor da carta esco-lhera . Cruel, pensou consigo mesmo . Um gnomo mágico com um cora-ção de pedra e que acaba derrotado por pura má sorte . Essa observação não fez com que ele se sentisse nem um pouco melhor .

A carta parecia brilhar em cima da mesa diante dele .Balançou a cabeça lentamente . Isso diz muita coisa, insistiu . Misture as

palavras na carta com aquilo que o escritor já fez e estará provavelmente a meio caminho de descobrir quem ele é .

Então, pôs a carta de lado e abriu a agenda, procurando o número da primeira das 52 pessoas da lista . Fez uma careta e começou a apertar as te-clas do telefone . Na última década, tivera pouco contato com seus parentes e suspeitava que nenhum deles estaria muito interessado em falar com ele . Especialmente dada a natureza daquela ligação .

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