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ESTUDOS ECONÓMICOS APLICADOS 2003/ 2004 NOVA ECONOMIA : O Desafio de Gerir Conhecimentos Orientador: Prof Carlos Pimenta Área de Estudos: Mundialização/ Globalização Ana Catarina Abrantes Rui Pedro Castro i

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ESTUDOS ECONÓMICOS APLICADOS 2003/ 2004

NOVA ECONOMIA: O Desafio de Gerir Conhecimentos

Orientador: Prof Carlos Pimenta Área de Estudos: Mundialização/ Globalização

Ana Catarina Abrantes Rui Pedro Castro

i

“There is the world of ideas and the world of practice.”

Mathew Arnold

ii

ABSTRACT EM PORTUGUÊS Ao longo deste trabalho procurámos estudar um tema agora muito em voga - Nova

Economia -, tentando perceber de que forma a importância da Gestão do Conhecimento

é sua causa e/ou consequência. A este propósito procurámos ainda explorar as relações

entre conhecimento e competitividade, formalizando as nossas principais ideias numa

proposta de modelo.

Um outro aspecto que mereceu bastante da nossa atenção foi o de relacionar a Nova

Economia com a alteração da visão organizacional, sobretudo ao nível das empresas

multinacionais. Neste ponto, tentaremos dissecar o que distingue uma perspectiva

transnacional de uma metanacional.

Por último, fomos ainda levantando algumas problemáticas que poderão ser alvo de

interessantes estudos futuros, nomeadamente ao nível das implicações sobre Política

Económica decorrentes de lógicas de localização de investimentos mais diferenciadas.

iii

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

1 INTRODUÇÃO............................................................................................................. 1 2 EMPRESAS MULTINACIONAIS EM PERSPECTIVA............................................. 2

2.1 O Conceito de Empresa Multinacional (EMN) ...................................................... 2 2.2 Breve Incursão Histórica no Processo Evolutivo das EMN ................................... 2 2.3 As Motivações para o Processo de Internacionalização ......................................... 4

2.3.1 Da evolução das motivações à evolução da mentalidade ................................ 5 3 A GESTÃO DO CONHECIMENTO NO SÉCULO XXI............................................. 8

3.1 Introdução ............................................................................................................... 8 3.1.1 Os Fundamentos da ` Knowledge-Based Strategy` ......................................... 8

3.2 Importância da Gestão do Conhecimento (GC)...................................................... 9 3.2.1 Definição de Gestão do Conhecimento (GC) ................................................ 10

3.3 Economia do Conhecimento................................................................................. 11 3.3.1 Caracterização Sucinta da Economia do Conhecimento ............................... 12 3.3.2 Distinção entre conhecimento e activos tangíveis ......................................... 14

3.4 Tentativa de Conceptualização do Conhecimento num Contexto Organizacional.................................................................................................................................... 15

3.4.1 Relações entre Conhecimento e Informação ................................................. 16 3.4.2 Componentes do Conhecimento .................................................................... 17 3.4.3 A importância do Conhecimento Tácito........................................................ 18 3.4.4 Conhecimento Auto-Transcendente: uma Forma de Conhecimento Tácito.. 19

3.5 Criação de Conhecimento num Contexto Organizacional.................................... 20 3.5.1 A Visão Estática............................................................................................. 20 3.5.2 A Visão Dinâmica.......................................................................................... 21

4 A IMPORTÂNCIA DO LOCAL NA ERA DO CONHECIMENTO ......................... 23 4.1 Introdução ............................................................................................................. 23 4.2 A importância da distinção entre Práticas e Actividades...................................... 24 4.3 A Dependência do Contexto ................................................................................. 25

4.3.1 A importância das determinantes territoriais ................................................. 26 4.4 A Geografia de Localização das Empresas Multinacionais.................................. 27 4.5 Implicações ........................................................................................................... 28

4.5.1 Localização e Globalização: duas faces da mesma moeda ? ......................... 28 4.5.2 Políticas Regionais......................................................................................... 29

5 ORGANIZAR PARA GERIR CONHECIMENTOS .................................................. 30 5.1 Nota Prévia ........................................................................................................... 30 5.2 Introdução ............................................................................................................. 30 5.3 A Estrutura Organizativa da Moderna EMN ........................................................ 31

5.3.1 Papel e relações entre subsidiárias................................................................ 31 5.3.2 Os Fluxos de Informação............................................................................... 39 5.3.3 Heterarquia: um novo conceito organizacional ............................................. 40 5.3.4 A função de Investigação & Desenvolvimento ............................................. 43

5.4 A estratégia da moderna EMN.............................................................................. 44 5.5 A importância de um sistema de incentivos motivador........................................ 45 5.6 Os papeis e responsabilidades da gestão............................................................... 47

6 CONCLUSÃO............................................................................................................. 507 ANEXOS: PROPOSTA DE MODELO ...................................................................... 518 BIBLIOGRAFIA ......................................................................................................... 61

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

1 INTRODUÇÃO A ideia para este trabalho surgiu com um daqueles acontecimentos ainda tão inauditos

em Portugal: a mediatização de um livro: “From Global to Metanational” (Doz et al,

2001). Nele entusiasmou-nos a procura de uma perspectiva de Gestão de Conhecimento

que tem em vista a maximização dos lucros, nomeadamente defendendo-se que a

empresa de sucesso do futuro internacionaliza-se não para projectar aquilo que aprendeu

no berço mas para integrar no seu espólio factores e atributos dispersos geograficamente

e contextualmente diferenciados.

Foi com este pano de fundo que procurámos perceber o que de novo tinha esta

concepção de empresa, quais as razões subjacentes à sua emergência e, de algum modo,

problematizar algumas questões que fomos identificando como mais discutíveis.

Neste propósito, depois de no segundo capítulo enquadrarmos sumariamente o trabalho,

no terceiro capítulo procurámos perceber qual a importância da Gestão do

Conhecimento numa organização, identificando as razões que transformam o

conhecimento num activo tão diferente dos activos críticos tradicionais e tentando ainda

discernir o porquê de um tipo de conhecimento específico (tácito) ser identificado por

variados autores como um factor de cada vez maior importância para a diferenciação

das empresas.

Tendo em conta a crescente atenção a conhecimentos de tipo tácito/contextualizado, no

quarto capítulo tentámos problematizar a interacção entre o meio local e a capacidade

competitiva da empresa, questionando ainda de que forma a abordagem das políticas

públicas poderá aproveitar-se do contexto desenhado no capítulo anterior.

No quinto capítulo procurámos perceber quais as questões organizacionais subjacentes

ao modelo metanacional, confrontando a perspectiva dos seus autores com a de outros.

Nomeadamente, tentando perceber aspectos distintivos (especialmente face ao conceito

de empresa transnacional) e em que tipo de abordagens se poderia ter inspirado.

Por fim, tentámos modelizar a hipótese central do trabalho: as empresas mais bem

sucedidas são as que detêm uma compreensão mais sustentada do que é a gestão do

conhecimento.

1

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

2 EMPRESAS MULTINACIONAIS EM PERSPECTIVA Todo o estudo desenvolvido ao longo deste trabalho teve como conceito inspirador o da

empresa multinacional.

Parece-nos por isso pertinente que se faça, antes de mais, uma tentativa de breve

sumarização do seu percurso evolutivo e do porquê de continuar a ser um tema de

eleição de tantos estudiosos.

2.1 O Conceito de Empresa Multinacional1 (EMN)

“A EMN define-se pelo seu envolvimento em alguma modalidade de

negócio internacional”

Madura (2000, pp3)

“A multinational (…) enterprise is an entreprise that engages in

foreign direct investment (FDI) and owns or controls value-adding

activities in more than one country”

Dunning (1995, pp3)

A 2ª definição (aquela que tem maior aceitação no mundo académico e empresarial)

apresenta a EMN como tendo essencialmente duas características distintivas: por um

lado é uma empresa que coordena múltiplas actividades (aditivas de valor) em vários

espaços políticos – o que significa que tem um substancial FDI em vários países e não

apenas uma actividade exportadora ou participações financeiras; por outro lado

internaliza fronteiras ao criar uma espécie de teia que, através de transacções de

produtos intermédios, conecta os diferentes espaços – o que significa que deixa de

depender do comércio internacional.

O que significa que este tipo de empresas além de deterem FDI ainda gerem

activamente as operações numa lógica estratégica e organizacional (Bartlett et al, 2003).

2.2 Breve Incursão Histórica no Processo Evolutivo das EMN De um modo muito genérico podemos dizer que as EMN são o reflexo de alterações na

estrutura e organização do mundo ao longo da história: desde a descoberta de novos 1 Estas empresas são apelidadas de várias formas : multinacionais, internacionais, globais, transnacionais e metanacionais. Nos capítulos seguintes utilizaremos a abreviatura EMN, embora no ponto 1.3.1 se pretenda dar um significado a cada uma destas terminologias.

2

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

territórios, aos aumentos populacionais e de conhecimentos produtivos, técnicos e

organizacionais.

Aliás, como refere Dunning (1995, pp 133) a evolução das EMN é um micro-cosmo

das mudanças que foram ocorrendo desde as primeiras civilizações, passando pelas eras

mercantilista e industrial, até à revolução computacional dos anos 80.

A maioria dos estudiosos da história das EMN hoje aceita a proposição de que as EMN

modernas são um fenómeno pós revolução industrial (Wilkins, 2001; Dunning, 1995;

Bartlett et al, 2003), já que aparentemente os parentes próximos pré séc. XIX eram

comerciantes (muitos deles shippers) ou banqueiros – quer em parcerias empresariais ou

familiares quer em investimentos individuais.

Aliás, tal não é de estranhar tendo em conta que a evolução nos transportes e nas

comunicações era um pré-requisito a um efectivo controlo das operações além fronteiras

(Wilkins, 2001; Dunning, 1995). Logo, associando estas evoluções às reduções das

barreiras internacionais e à emergência de um capitalismo industrial, torna-se

perceptível o porquê de muitas empresas domesticamente líderes se terem lançado além

fronteiras.

Contudo, não há o mínimo de consenso sobre quando surgiu a primeira multinacional,

embora seja amplamente reconhecido que vários aspectos da moderna EMN têm já uma

longa história.

De facto, se parece inegável que as origens do negócio internacional remontam à época

de sumérios, egípcios e gregos, passando pelos mercantilistas venezianos ou os

banqueiros florentinos medievais e pelas grandes companhias britânicas e holandesas

dos séc. XVII e XVIII, os historiadores não se entendem quanto ao contexto histórico

em que surgiu o embrião das modernas EMN. Só a título exemplificativo: Wilkins

(1970) sugere que surgiram em 2500 a.c com a civilização suméria, outros que data dos

banqueiros italianos dos séc. XIII e XIV (Dunning, 1995) e há ainda um debate sobre se

a East India Company (Inglesa) ou a Dutch East India Company (séc. XVII) poderão

ser consideradas EMN (Wilkins, 2001; Dunning, 1995).

3

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

2.3 As Motivações para o Processo de Internacionalização No quadro tradicional das empresas multinacionais podemos distinguir genericamente

dois motivos para o fenómeno de internacionalização. (Bartlett et al, 2003, Dunning,

1995, Doz et al, 2001)

Um primeiro prende-se com a procura de recursos, para aceder a factores de produção a

custo mais baixo (o que assumiu especial relevância com a redução das barreiras

aduaneiras nos anos 60) ou para assegurar o fornecimento das matérias primas chave.

O segundo motivo relaciona-se com a procura de mercados, especialmente com o

objectivo de se assegurarem economias de escala e de gama (o que garantia uma

vantagem adicional sobre as rivais domésticas).

Ou seja, a internacionalização ocorreria, por exemplo, ou porque a maturidade do

produto determina a relevância dos custos de produção (Vernon, 1966), ou pelo

incentivo da expansão para mercados cultural e geograficamente próximos ou ainda

pelas economias de custo de transacção com a internalização de certas operações.

Assim, genericamente e assumindo esta visão tradicional que atribui o sucesso a um

conjunto de factores competitivos – conotados com os vértices do diamante de Porter-,

no limite, a prosperidade seria função da geografia: a empresa descobre os seus factores

de sucesso no mercado nativo em que se torna líder e segue depois um processo de

internacionalização sequencial e lento que projecta a sua cultura e reforça a importância

da origem.

No entanto, o poder explicativo destas teorias degradou-se quando, especialmente a

partir dos anos 80, o ambiente em que se desenvolvem os negócios internacionais se

complexifica e se sofistica, determinando um quadro de motivações mais rico e

completo: se inicialmente a internacionalização era entendida como uma oportunidade

para melhor gerir o negócio no mercado interno, gradualmente começou a ser integrada

numa visão estratégica mais global e globalizante. (Buckley P., Casson M., 2001,

Bartlett et al, 2003, Doz et al, 2001) Isto porque com a intensificação da competição não

bastam produtos excelentes ou baratos. O sucesso da empresa passa a depender do

conhecimento profundo dos desejos e ansiedades dos seus consumidores e,

simultaneamente, da capacidade de oferecer-lhes soluções com cada vez maior valor na

cadeia de produção.

4

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Por um lado, num contexto de encurtamento do ciclo de vida do produto e de economias

de escala e de investimentos em I&D em crescendo, gerir a nível global deixou de ser

uma opção mas passou a ser um pré-requisito de sobrevivência. Até porque num

contexto em que as Tecnologias da Informação (TI) reduzem o custo da distância os

concorrentes localizam-se nos mesmos sítios com o mesmo tipo de actividades.

Por outro lado, na maioria das indústrias, deixa de existir um mercado líder: os

consumidores mais inovadores, sofisticados e exigentes encontram-se no mundo e em

contextos tão diferenciados como inusitados.

Desafio que se complexifica se for tido em conta que o conhecimento com valor

económico se encontra geograficamente fragmentado em bolsas de saberes

especializados e imbuído de uma cultura e contexto específicos que, apesar de

dificultarem a cópia, o tornam difícil de transferir. Fenómeno que induziu que

capacidades de aprendizagem e descoberta se (re)valorizassem.(Note-se que pela sua

própria natureza uma EMN tem uma grande vantagem informacional que poderá gerir

de modo a concretizá-la em produtos e processos mais avançados ou em recursos mais

eficientes.)

Uma terceira fonte de razões pode-se relacionar com a posição competitiva, já que este

tipo de empresas pode seguir estratégias de compensação de mercados (i.e. compensar

investimentos arriscados nuns mercados com a lucratividade de outros).2

Tal enquadramento reflectiu-se assim na necessidade de encontrar uma oportunidade de

inovação desconhecida dos rivais e de difícil imitação.

2.3.1 Da evolução das motivações à evolução da mentalidade

Desta breve descrição das principais motivações para a internacionalização das

empresas parece intuitivo concluir-se que tais razões acompanharam uma evolução

gradual do padrão de gestão estratégica.

Este processo evolutivo pode ser dissecado em 5 fases (obviamente que custos por

algumas generalidade e arbitrariedade) principais. (Santos, 1997, Bartlett et al, 2003,

Dunning, 1999; Sölvell, Birkinshaw, 1999, Doz et al, 2001).

Numa 1ª fase podemos pensar na EMN como tendo uma mentalidade internacional . Ou

seja a empresa entende as suas operações no exterior como um suporte à empresa mãe

2 Para aprofundamento aconselhamos a leitura Bartlett et al (2003) no capítulo 3.

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Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

pelo facto destas, de diferentes formas, contribuírem para o incremento da rendibilidade

no mercado interno. O que significa que o processo de especialização e integração

internacional era ainda bastante primário.

Numa 2ª fase começa-se a desenvolver uma estratégia multinacional propriamente dita

com o reconhecimento por parte dos gestores de que as oportunidades no exterior

podem ser alavancadas. Logo, inicia-se um processo que balanceia uma fraca

integração global e uma elevada sensibilidade à procura e concorrência locais: as

empresas tornam-se mais flexíveis adaptando os seus produtos, estratégias e práticas de

gestão às especificidades dos mercados.

No entanto, este tipo de estratégia de elevada adaptação originou problemas de

ineficiência produtiva. O que determinou que algumas empresas (muitas de origem

japonesa) optassem por uma estratégia de aproximação às operações internacionais

diferente: afirmando-se como empresas globais. I.e. veêm o mundo como uma unidade

de análise de tal modo que concebem produtos que possam ser produzidos à escala

mundial em poucos mas altamente eficientes centros. O que significa que esta empresa

opta pela eficiência económica em detrimento da adaptabilidade da ´multinacional`.

No entanto, estas empresas globais que até aos anos 80 pareciam invencíveis tiveram

que se mover3 para uma posição intermédia ou transnacional: tornando-se mais

sensíveis às necessidades locais sem perdas de eficiência global – visão popularizada

pela expressão “pensar globalmente, agir localmente”. Assim, estas empresas são mais

sofisticadas porquanto se estruturam numa rede integrada de subsidiárias nacionais com

diferentes funções.

No entanto, na nova fase que agora se adivinha – a quinta – a ideia chave assumiria

novos contornos: a de que, no contexto actual, as vantagens competitivas não resultam

do poder do país de origem mas da capacidade de transcender fronteiras e aprender no

mundo os conhecimentos que integrados permitirão uma inovação permanente e

adaptada ao mercado.

Esta visão exige, desde logo, que se redireccione a questão da internacionalização do

problema de penetração no mercado mundial para a problemática da Economia do

Conhecimento, onde os saberes estão cada vez mais diferenciados e mais dispersos.

Numa frase diríamos que os gestores seriam convidados a substituírem a sua capacidade 3 Este foi um movimento em muito determinado por restrições governamentais (que exigiam adaptações) e pelo recrudescimento das preferências nacionais.

6

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

de aproveitamento das especificidades da sua “home-base” pela capacidade de estímulo

das vantagens da própria organização em arbitrar e conjugar saberes. Estaríamos deste

modo perante empresas metanacionais: aquelas que são capazes de vencer a

competição do conhecimento ao nível tríplice da percepção, integração e

optimização.(Doz et al, 2001)

Há, no entanto, que deixar desde já clara a ideia de que não há uma fronteira muito bem

definida entre o que são hoje empresas transnacionais e metanacionais. Até porque,

como veremos mais à frente, há autores ( entre outros, Hedlund, Bartlett, Ghoshal,

Hakanson) que atribuem às empresas de tipo transnacional capacidade de resposta aos

desafios da Economia do Conhecimento.

Assim, se os primeiros 3 ´tipos´ de internacionalização das empresas foi sendo baseado

numa projecção internacional de vantagens adquiridas em casa., aquilo que alguns

autores adivinham é a necessidade se ser substituído por um outro onde a atracção e

integração de conhecimentos seriam os actores principais4: “Learning from your

backyard is no substitute for learning from the world” (Doz et al, 2001, pp 240)

4 As razões para a necessidade deste movimento são amplamente discutidas no capítulo seguinte.

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Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

3 A GESTÃO DO CONHECIMENTO NO SÉCULO XXI

“For countries in the vanguard of the world economy, the balance between

knowledge and resources has shifted so far towards the former that knowledge

has become perhaps the most important factor determining the standard of

living – more than land, than tools, than labour. Today most technologically

advanced economies are truly knowledge-based”

World Development Report, 1999

3.1 Introdução Já desde o tempo de Sócrates e Platão que o conhecimento tem sido objecto dos maiores

debates filosófico-epistemológicos. E apesar de ser um conceito com 2400 anos de

história é hoje hasteado como a mais moderna descoberta da ciência económica.

Há, aliás, hoje em dia quem diga que talvez uma das “descobertas” mais notáveis do

nosso tempo é a de que o conhecimento é não só a chave do desenvolvimento

económico mas também do sucesso empresarial.

De facto, apesar de Marshall (1890) no final do séc. XIX já se referir à importância da

circulação de informação e de know-how como portadoras de vantagens empresariais ,

só já nos anos 80 do século XX ganham peso novas teorias de crescimento. A mais

conhecida e, seguindo autores como Schumpeter e Solow, é a de Romer que propõe que

o conhecimento seja entendido como um 3º factor de crescimento e aquele que se

responsabilizaria por crescimentos sustentados ao longo do tempo. (Romer, 1986)

No que respeita ao conhecimento como activo fundamental das vantagens competitivas

da empresa, o reconhecimento é ainda mais recente. Foi só a partir da segunda metade

da década de 90 que se registou um rápido crescimento no interesse pela gestão do

conhecimento (GC) intra e inter firmas5.

3.1.1 Os Fundamentos da ` Knowledge-Based Strategy`

Como já dissemos foi na última década que emergiu uma nova perspectiva sobre qual a

função da empresa e as fontes de criação de valor e vantagem competitiva. Em

particular, autores como Goshal, Moran, Teece ou Grant foram pioneiros na sugestão de

5 Perceber o conhecimento como activo que precisa de ser protegido não nenhuma novidade (já a Constituição Americana DE 1790 reconhecia a importância das patentes), mas percebe-lo como principal activo estratégico é-o ainda

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Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

que a principal função da empresa e a sua única fonte de vantagem competitiva

sustentável é a sua capacidade para integrar o conhecimento de diferentes indivíduos no

processo de produção de b&s.

O que significa que, de alguma forma, esta perspectiva emergiu da visão da “resource-

based theory ” (de autores como Barney, Amit, Schoemaker), segundo a qual o factor

determinante de uma vantagem competitiva sustentável é a habilidade da empresa

transferir e utilizar recursos intangíveis (competências, capacidades organizacionais ou

dinâmicas).

No entanto, pelo facto de ser uma teoria ainda bastante recente mantêm-se muitas

questões importantes. No nosso entender há a salientar duas: (i) saber qual a relação

entre processos de integração do conhecimento e performance; (ii) determinar quais os

factores que influenciam o sucesso do desenvolvimento e da aplicação de tais processos

de integração6.

3.2 Importância da Gestão do Conhecimento (GC)

“Capital consists in a great part of knowledge and organization …

Knowlwdge is our most powerful engine of production”

Marshall, 18907

Uma primeira questão a responder é a que respeita ao porquê do conhecimento só se

assumir como tema fulcral na agenda de economistas e gestores cerca de 1990, cem

anos depois desta citação de Marshall.

Consultando alguns dos vários autores que se têm debruçado sobre o assunto (Nelson,

1991; Winter, 1987; Davenport, Prusak, 1998; Webber, 1993; Drucker, 1988;

Santagelo, 2001; Dunning, 2002; Storper, 2002; Audretsch, 2002; Solvell, Birkinshaw,

2002; Doz et al, 2001; Nonaka, Takeuchi, 1995) podemos apontar algumas razões:

• Globalização e Competição: as empresas procuram uma vantagem sustentável

que as distinga no seu mercado. Já não podem esperar que aquilo que fez sucesso

ontem se mantenha viável amanhã. Qualidade, serviço, inovação, flexibilidade,

6 A propósito da 2ª questão recomenda-se a leitura de Emery J.D. (2002). Designing Firm Integrating Processes from the Knowledge-based View. CASOS 2002 Conference. (working-paper) 7 Marshal, A. (1972) Principles of Economics, 8ª ed, 1ª publicação 1890, London, MacMillan

9

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

compreensão do consumidor e rapidez são os factores críticos de sucesso. O que

significa que as empresas se diferenciam pelo conhecimento que detêm.

• Convergência dos conceitos produto e serviço8: a distinção entre o que é um

produto e um serviço está a desaparecer. Isto significa que um premium price só é

obtido através de smart products, i.e. através do conhecimento.9

• Tecnologia já não é uma vantagem sustentável: é cada vez mais difícil

prevenir a imitação de produtos e processos produtivos numa era caracterizada pela

mobilidade, pelo reverse engineering e pelo aumento da disponibilidade tecnológica.

Logo só uma empresa que saiba gerir eficientemente o seu conhecimento é capaz de

dar o salto qualitativo e criativo que lhe permite a manutenção da liderança de

mercado.

Genericamente, podemos talvez afirmar que houve uma tomada de consciência de

que estávamos perante a emergência de uma sociedade “pós-industrial” onde, como

Bell ou Drucker previram, o conhecimento seria o ´axial principle`. Isto significou a

necessidade de se estudarem as suas implicações não só na política económica mas

também na gestão.

3.2.1 Definição de Gestão do Conhecimento (GC)

Chegados a este ponto importa perceber qual o significado de gerir conhecimento.

Na longa tradição da gestão ocidental, uma empresa era vista como uma “black box”

onde os processos de gestão eram delimitados por parâmetros racionais e conscientes.

(Nonaka et al, 2001).O que significa que a organização era visionada como uma

máquina processadora da informação que adquiria no seu ambiente interno e externo de

modo a, tendo por base um determinado objectivo, resolver um problema específico.

No entanto, estudos mais recentes (Nonaka e Takeuchi, 1995; Doz et al, 2001)

entendem a organização como sendo mais do que uma processadora de informação, mas

tendo como principal função a criação, preservação e projecção de conhecimentos no

mercado (através de b&s) de forma mais eficiente que os concorrentes10.

8 Neste contexto entendemos os conceitos de produto e serviço do ponto de vista do Marketing (cf Kotler et al, 2001, pp 7) 9 A este propósito conferir o que estudiosos do marketing como Kotler defendem. 10 O primeiro economista moderno a preocupar-se com a análise do conhecimento foi Fritz Machlup, a este propósito aconselha-se a consulta dos seus 3 volumes (1980-84) Knowledge: Its Creation, Distribution and Economic Significance. Princeton, N.J.: Priceton University Press

10

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Podemos deste modo distinguir 3 fases na discussão sobre GC (Scharmer, 2001). Uma

1ª fase muito incipiente em que se foca a importância do conhecimento explícito, o que

significaria que gerir conhecimento era sobretudo gerir informação. Uma 2ª fase em que

começa a existir uma preocupação com o processo de criação do conhecimento

(Nonaka, Takeuchi, 1995), focando-se a interacção entre conhecimentos explícitos e

tácitos. Numa 3ª fase, há uma maior preocupação em perceber quais as condições que

permitem o desenvolvimento de conhecimentos tácitos e como a partir daí

dinamicamente se processa a criação de corporate knowledge (Nonaka et al, 2001)

Deste modo, ao longo deste trabalho vamos entender a gestão do conhecimento como

todo um processo consciente e sistémico de recolha, organização, criação, uso e difusão

de conhecimentos considerados vitais para a organização. O que significará desde logo

um esforço de transformação de conhecimentos individuais em conhecimento

organizacional (corporate knowledge) que, sendo partilhado, pode mais facilmente ser

fecundado e mais eficientemente utilizado.

3.3 Economia do Conhecimento

“A knowledge- driven economy is one in which the generation and

exploitation ok knowledge play the predominant part in the creation of

wealth”

United Kingdom Department of Trade and Industry, 1998

Em 1990, Alvin Toffler11 dizia que vivíamos numa sociedade do conhecimento, onde o

conhecimento se assumia como a principal fonte de poder.

De facto, nos últimos 3 séculos assistiu-se a uma mudança da principal fonte de riqueza

nas economias de mercado. Passou-se da relevância dos recursos naturais e mais tarde

dos activos tangíveis ( como infra-estruturas, maquinaria e equipamento), para se dar

hoje primazia aos activos intangíveis ( conhecimento e informação de todo o tipo).

(Quintas, 2002)

Por um lado, as estatísticas são claras na demonstração de que as economias

desenvolvidas têm como principal vantagem competitiva a actividade inovativa baseada

em conhecimento. Aliás, se entendermos que knowledge workers são aqueles que lidam

11 Toffler, A. (1990) Powershift: Knowledge Wealth and Violence at the Edge of the 21sr Century. New York: Bantam Books

11

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

com ´símbolos´ (e de um modo grosseiro os associarmos ao trabalho terciário que é

realizado nos vários sectores) verificamos que estes representam mais de 60% do

trabalho em países economicamente mais evoluídos.

Por outro lado, começam a aumentar o número de casos em que o próprio mercado

bolsista valoriza mais a componente imaterial das empresas do que a componente física

(notem-se os casos da Microsoft ou da Intel).

3.3.1 Caracterização Sucinta da Economia do Conhecimento

Podemos deste modo definir na economia do conhecimento como características

distintivas (Quintas, 2002; Davenport, Prusak, 1998; Webber, 1993; Drucker, 1988;

Santagelo, 2001; Dunning, 2002; Storper, 2002; Audretsch, 2002; Solvell, Birkinshaw,

2002; Doz et al, 2001) :

O capital humano como principal componente de valor do sistema

(Re)descobriu-se a importância central das pessoas ao perceber-se a inimitabilidade das

suas competências, depois de um conjunto de estratégias (muitas vezes catastróficas) de

downsizing nos anos 80. Ou seja, passou-se a compreender a pessoa como possuindo

um conjunto de conhecimentos formais e informais que a habilitam não só a criar

novos conhecimentos como também a ser um agente de retenção da memória colectiva

e organizacional.

Obviamente que os mais cépticos poderão contra-argumentar com os esforços

legislativos mais recentes de flexibilização do mercado de trabalho. No entanto, há que

ter em linha de conta dois aspectos: em primeiro lugar, não é pelo facto de se facilitar o

despedimento que se desvalorizam as pessoas. Note-se que o objectivo primeiro é o de

criar condições a uma gestão mais eficiente do pessoal e evitar situações de acomodação

a lugares; em segundo lugar, a importância das competências é função positiva das

responsabilidades assumidas, o que significa que não faz sentido incluir na afirmação

acima todos os cargos e profissões. Ficando por natureza excluídos todos os que são

acessórios às funções principais da empresa.

Consciencialização dos limites das NTI: quanto maior a componente tácita

maior o valor do conhecimento

Como escreveu Webber num artigo da Harvard Business Review, ´no fim a localização

da nova economia não está na tecnologia … Está na mente humana ` (Webber, 1993 :

27).

12

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Apesar da tecnologia reduzir as restrições de tempo e de distância, também significou

um aumento na velocidade de transferência de conhecimentos codificados. O que se

traduz no facto de grande parte do conhecimento com maior valor económico ser aquele

que é criado em comunidades de prática que partilham experiências e visões de si e do

mundo dificilmente transferíveis para fora da comunidade.

Grande dispersão do conhecimento

Várias são as razões que podemos apontar para a existência de bolsas de saber

especializado em todo o mundo.

Por um lado razões de mercado relacionadas com a globalização de mercados e

consequentes interacção com consumidores e aposta em marketing periférico; e razões

tecnológicas relacionadas com a crescente complexidade tecnológica e convergência

industrial, o outsourcing e transferência de tecnologias, e a existência de

acontecimentos aleatórios.

Por outro lado, o facto destes conhecimentos tecnológicos e de mercado estarem muitas

vezes “presos” ao contexto por conterem conhecimentos tácitos.

O reconhecimento de que o sucesso depende de um fluxo contínuo de

aprendizagem e inovação

Hoje em dia, a rentabilidade de transferir commodities (produtos, capital, sistemas,

informação) diminuiu. Tendo em conta que a maioria das empresas já sabe como operar

globalmente, a eficiência tríplice produção-distribuição-vendas já não é uma vantagem

diferenciadora. O que significa que em muitos mercados a chave para uma vantagem

competitiva sustentável é a capacidade inovadora. E a inovação, por definição, sendo

algo de novo está dependente da criação e aplicação de conhecimentos.

Por outro lado, o ritmo exponencial de mudança (nos mercados, nas indústrias, nas

tecnologias) exige uma contínua regeneração e desenvolvimento dos conhecimentos de

modo a ser possível uma reinvenção permanente da organização. I.e. mudanças

contínuas na envolvente externa exigem a capacidade de internamente as organizações

serem capazes não só de absorver mas também de criar novas práticas, rotinas e

conhecimentos. O que significa que a empresa moderna e competitiva terá de se

preocupar cada vez mais com a criação contínua de conhecimento.12

12 Também aqui poder-se-ia argumentar que nem todas as empresas têm hoje como objectivo a criação de conhecimento. No entanto, parece-nos que esta será uma necessidade futuramente ainda mais premente e

13

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

3.3.2 Distinção entre conhecimento e activos tangíveis

Apesar de mais à frente nos debruçarmos mais detalhadamente sobre o conceito

“conhecimento”, parece-nos importante deixar desde já bem clara a distinção entre

activos físicos e activos imateriais ou, mais concretamente, conhecimento (Nonaka et al,

2001; Nonaka, Teece, 2001).

Em primeiro lugar, devemos ter em conta que ao conhecimento poder-se-ão atribuir

características de bem público, no sentido de que o consumo por parte de um indivíduo

não afecta a quantidade disponível para outro.

No entanto, fica aqui em aberto a dúvida sobre se esta característica também se poderá

generalizar a conhecimentos industriais. Isto porque se é verdade para conhecimentos

científicos (ou conhecimentos básicos), no que respeita a conhecimentos aplicados o

seu valor económico reduz-se quando utilizado por várias entidades diferentes. O que

poderá significar uma redução da “quantidade” (aqui entendida de um ponto de vista de

rentabilidade) disponível para um agente marginal.

Em segundo lugar, embora seja um activo não deteriorável com o uso (aliás até pode

ver a sua qualidade aumentada com o learning by using) está frequentemente exposto a

uma rápida depreciação pelo ritmo avançado de criação de novo conhecimento. Em

casos de inovações radicais pode até ficar instantaneamente obsoleto.

Os custos de transferência também são funções diferentes da distância. Isto porque no

caso de bens tangíveis dependem de uma distância física, i.e dos custos de transporte e

associados; enquanto no caso do conhecimento são quase nulos se houver possibilidade

de codificação e extremamente significativos se se tratarem de conhecimentos tácitos e

contextualizados (o que significa que quanto maior a distância cultural maiores os

custos).

Por último, a questão dos direitos de propriedade. Já que estes são sem dúvida mais

difíceis de estabelecer e mais limitados no caso de activos intangíveis. (Lembramos a

este propósito a discussão à volta dos direitos de autor ou das patentes).

Deste conjunto de asserções fica mais uma vez claro que os activos do conhecimento

exigem uma reflexão diferente da tradicional por parte da economia e da gestão.

transversal a todos os sectores (por exemplo já hoje actividades mais “ tradicionais” como a aquacultura ou a agricultura estão hoje fortemente imbuídas de modernos conhecimentos técnico-científicos).

14

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

3.4 Tentativa de Conceptualização do Conhecimento num Contexto

Organizacional

“ Knowledge is a fluid mix of framed experiences, values, contextual

information, and expert insight that provides a framework for evaluating and

incorporating new experiences and information. It originates and is applied in

the mind of knowers. In organisations, it often becomes embedded not only in

documents or repositories but also in organizational routines, processes,

pratices, and norms.”

Davenport, Prusak, 1998: 5

Para que uma organização possa assumir o conhecimento como a sua principal

vantagem competitiva terá, antes de mais, de perceber qual o significado do mesmo

dentro de uma organização, quais as formas que assume e a natureza dos processos que

envolve.

De acordo com o filósofo Ferrater Mora, o conhecimento resulta de um `contacto com a

realidade` que é objecto de objectivação e generalização. O que significaria que, em

última análise, seria uma sistematização dos dados da experiência numa tradição13.

Deste modo seríamos induzidos a dizer que a experiência é o ponto de partida de todo o

saber. No entanto a representação da realidade (nas suas vertentes de transfiguração,

sistematização e organização da experiência) pode ser feita a diferentes níveis,

derivando em diferentes tipos de saberes.

Logo à partida, a epistemologia distingue dois tipos de saber:

Explícito: os que são passíveis de serem transmitidos seja de forma metódica (os

que se situam no plano disciplinar e da circulação de informação) ou de modo

espontâneo (ligados aos processos de socialização e aculturação), pela facilidade de

codificação e partilha assincrónica

Tácito: os que resultam sobretudo de uma experiência pessoal e

intransmissível14, i.e. ligados ao plano da singularidade existencial do indivíduo. Logo,

conhecimento experimental, intuitivo e que exige o face-a-face de modo a que a

comunicação se efective

13 Cf Ferrater Mora, J. (1975).Dicionário de Filosofia vol. II p.601 14 Referimo-nos aqui à experiência da vida de acordo com o entendimento de Heidegger, i.e. aquela que se situa no plano do acontecimento inesperado e em que subitamente o agente se encontra em participação activa

15

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

De modo semelhante, o conhecimento dentro de uma organização pode ser entendido

como existindo nestas duas formas básicas (Davenport, Prusak, 1998)

Depois destas primeiras generalidades estaremos talvez em condição de procurar

perceber (ainda que de modo grosseiro) as características que, num contexto

empresarial, dão valor económico ao conhecimento.

3.4.1 Relações entre Conhecimento e Informação

Em primeiro lugar, surge a necessidade de distinguir informação de conhecimento.

Na perspectiva que encara a empresa numa tripla função de criação, operacionalização e

disseminação de conhecimento, as fronteiras entre informação e conhecimento tornam-

se pouco claras.

Informação , palavra de origem latina (informãre) que originalmente significava “dar

forma a”, pode ser genericamente definida como um conjunto de dados percepcionados

pelos sentidos com determinado objectivo. Aliás o próprio valor da informação pode ser

mensurado, por exemplo, em função dos resultados que produz (Teorias Pragmáticas da

Informação) ou pela função inversa da probabilidade de ocorrência (Teoria de

Shannon).

No entanto, neste contexto importa apenas ressaltar dois aspectos:

- em primeiro lugar que o valor da informação é qualquer coisa de bastante complexa e

relativa e que não resulta simplesmente do seu conteúdo bruto. (Dauphiné, 2003 ,

Delahye, 1999);

- em segundo lugar, que a informação pode ser considerada a matéria prima do

conhecimento na medida em que fornece a base para a compreensão: altera o modo

como o receptor entende determinada coisa ou facto ao provocar alterações ao nível do

seu comportamento ou juízo de valor.

No entanto, a criação de conhecimento depende claramente da relação entre o agente

que procura conhecer e a informação que tem disponível e, ao mesmo tempo, da relação

que tal agente estabelece com o conhecimento de outros agentes do grupo.

O que significa que desta experiência relacional resultam genericamente dois planos ou

modalidades de conhecimento: o plano da singularidade existencial que é subjectivo na

sua natureza porque intimamente ligado a interpretações e considerações colectivas e

individuais; e o plano dos conhecimentos organizados disciplinarmente e que resultam

de investigações com carácter de rigor e cientificidade.

16

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Conhecimento é, portanto, um conceito com maior amplitude, profundidade, riqueza e

por isso também dotado de maior ambiguidade: a informação pode ser utilizada para se

inicializar ou formalizar um determinado saber, mas os contornos do conhecimento vão

bem para além do escopo da informação.

3.4.2 Componentes do Conhecimento

Podemos, no entanto, distinguir no conhecimento algumas componentes essenciais

(Davenport, Prusak, 1998, Nonaka, Takeuchi, 1995):

Contextualizado15: o conhecimento é especifico a um determinado contexto na

medida em que se refere a um tempo-espaço específico16, de outro modo seria apenas

informação17. O que significa que o conhecimento é o resultado dinâmico de interacções

sociais, refinando os seus axiomas à medida que interage com os contextos.

Humanístico : na medida em que a informação só se torna conhecimento depois

de ser interpretada pelo indivíduo. O que significa que o conhecimento tem em si juízos

de valor porque julga situações e informações em função do que já sabe.

Complexo: o conhecimento não é uma estrutura rígida mas molda-se à

complexidade tendo consciência do que não sabe18.

Acelerador da acção: em muitas situações a internalização da experiência

conduz a uma actuação inconsciente e automática.19

Relacional: na medida em que os credos e sistemas valorativos condicionam a

organização mental do conhecimento, determinando o modo de percepção e absorção de

uma determinada realidade. O que significa que o poder de seleccionar, organizar e

julgar do conhecimento advém-lhe em larga medida do conjunto de crenças e princípios

do individuo.20

Experimental: o conhecimento desenvolve-se não só através da absorção de uma

aprendizagem formal mas também através de vivências anteriores.

15 Note-se que esta é uma visão oposta à visão Cartesiana que enfatizava a absoluta libertação de contexto do conhecimento 16 Cf von Hayek, F. A. (1945). `The use of knowledge in society`, The American Economic Review, 35 17 “Não há factos mas apenas interpretações” de acordo com F. Nietzsche 18 Esta foi uma das características já invocadas por Sócrates na Grécia de 400 a.c. 19 Note-se que o conhecimento pode ser avaliado pela acções e decisões que originou, o que significa que, tendo em conta que decisão e conhecimento residem normalmente no mesmo indivíduo é por vezes difícil traçar uma fronteira entre conhecimento e acção. 20 A este propósito lembramos a citação de Alfred North Whitehead: “There is no whole truths; all truths are half truths” in Price, L. (1954). Dialogues of Alfred North Whitehead. Boston, MA: Little, Brown and Company

17

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

3.4.3 A importância do Conhecimento Tácito

“Tácit Knowledge is the knowledge that enters into the production of

behaviours and/or the constitution of mental states but is not ordinarily

accessible to consciousness”

Dictionary of Philosophy of Mind

Temos vindo até aqui a optar por uma distinção dos conhecimentos em tácitos e

explícitos, quando outras taxinomias poderiam ser adoptadas. Parece-nos que do que

anteriormente foi dito ter-se-á tornado relativamente intuitivo o porquê desta opção.

Contudo, tentaremos neste ponto sistematizar algumas ideias que relevam a importância

desta distinção.

Tradicionalmente, a epistemologia ocidental não fazia esta distinção porque entendia o

conhecimento como sendo explícito. No entanto, perceber a sua verdadeira natureza e o

processo através do qual é criado significa reconhecer a complementaridade entre

conhecimentos tácitos e explícitos. (Nonaka et al, 2001)

Esta noção de que é necessária uma integração dos diferentes tipos de conhecimentos de

modo a ser possível a criação de conhecimentos é uma herança de Michael Polanyi.

De facto, a noção de conhecimento tácito surge com este autor quando, inquirindo a

natureza do conhecimento científico, rejeita a visão determinística defendida desde os

tempos de Laplace e propõe uma alternativa epistemológica – Personal Knowledge –

em que se compreendia a importância da fusão entre conhecimento objectivo e aquilo

que chama “the knower´s act of knowing” ou conhecimento tácito. Mais concretamente

e de forma bastante simplicista, advogava que a validação (repare-se que não se trata de

verificação) dos factos da experiência era objecto do conhecimento tácito (Polanyi,

1958, 1966) Tal dever-se-ía ao facto de o conhecimento explícito perder rapidamente o

seu significado sem o auxílio do tácito.

Ou seja, rotinas, procedimentos, ideais, interpretações, pressentimentos são

conhecimento tácito. Logo, dificilmente formalizado porque dependente de emoções,

valores, ideais, comprometimentos que o tornam altamente individualizado. (Winter,

1987)

E é percebendo a especificidade do conhecimento tácito que podemos perceber a sua

importância para a organização e o porquê de hoje se assumir como o principal

“strategic asset”.

18

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Um contributo importante nesta matéria é o de Doz et al no livro From Global to

Metanational onde os autores, hierarquizando conceptualmente os conhecimentos

segundo um critério de complexidade, defendem a ideia de que são os conhecimentos

tácitos de tipo `existencial´ (as percepções do mundo) e de tipo `endémico` (relativos a

comportamentos culturais) que permitem à empresa a criação de vantagens estratégicas

consistentes no mercado: sendo necessário estar presente onde está este tipo de

conhecimento, maior a dificuldade de imitação ou replicação dos b&s a que der origem.

Por outro lado, este tipo de conhecimentos tácitos – conhecimentos de que os grupos

podem dispor mas dos quais não têm consciência – é predominante nas organizações,

porque nele assenta o trabalho dentro de uma organização que é por definição

cooperativo e complementar.

De facto, num estudo feito recentemente pelo Delphi Group, demonstra-se que o

conhecimento tácito representa cerca de 75% do conhecimento colectivo e de que em

média as organizações acreditam que cerca de 42% desse conhecimento se encontra nos

trabalhadores.21

3.4.4 Conhecimento Auto-Transcendente22: uma Forma de Conhecimento Tácito

Neste ponto procuramos apenas dar a entender que a própria noção do significado de

conhecimento tácito é ainda palco de problematização entre os autores. A este propósito

evocamos o trabalho de Otto Scharmer (2001) – baseado na pós-moderna epistemologia

de Martin Heidegger, Nishida e Nietzche - que propõe uma distinção entre dois tipos de

conhecimento tácito: self-transcending knowledge (ou conhecimento tácito não

corporizado) e o conhecimento tácito ( acrescente-se corporizado em rotinas e práticas)

proposto por Nonaka.

De acordo com o autor, self transcending knowledge poderia ser entendido como uma

capacidade para pressentir o que ainda não existe23.

Dito de outro modo, trata-se do conhecimento sobre as origens do pensamento

resultantes de experiências sensitivas. O que significa que ao contrário do conhecimento

tácito não há um saber que “produz” realidade mas um saber de presenciar a realidade. 21 Frappaolo, C., Wilson, L.T. After the Gold Rush: Harvesting Corporate Knowledge Resources. Intelligent KM website 22 Fazemos notar que se trata de uma interpretação livre da expressão “Self- transcending Knowledge” utilizada pelo autor Claus Otto Scharmer 23 A este propósito lembramos a célebre frase de Michelangelo que quando falava da sua obra prima dizia que “David já estava na pedra e ele se limitara a retirar o que não era David”

19

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

O que significa que a acção daí resultante será a primeira, i.e. aquela que rompe ou

transcende as barreiras do conhecimento até aí definidas. Admitindo-se, então, que esta

será a força energética da espiral que conduz à criação do conhecimento, poder-se-á

então dizer que é este o tipo de conhecimento que maior diferenciação pode fazer dentro

das empresas. Isto porque, como defendem Doz et al, o meta-desafio das empresas é o

de serem capazes de sentir o que está por emergir, o que significa serem capazes de

penetrar nas fontes de conhecimentos ainda não corporizados.

Esta seria basicamente uma distinção de conhecimentos puramente tácitos (impossíveis

de transmitir) de conhecimentos implícitos (i.e. conhecimento que sendo tácito pode ser

codificado se sujeito a algum processo de transformação). No entanto, por razões de

simplificação, daqui para a frente não faremos qualquer distinção entre conhecimentos

tácitos e implícitos.

3.5 Criação de Conhecimento num Contexto Organizacional

“Knowledge creation is a continuous, self-trasnscending process by means of

which ones transcends the boundary of the old self into a new self by acquiring

a new context, a new view of the world and new knowledge”

Nonaka, Toyama, Konno (2001)

3.5.1 A Visão Estática

Se assumirmos como hipótese que o conhecimento é “alguma coisa” que pode ser

directamente gerida várias serão as formas de geração de stocks de conhecimento

(Davenport, Prusak, 1998)

Sucintamente podemos destacar:

Centros de I&D: esta é uma das formas mais problemáticas, pela dificuldade de

definir uma estratégia de I&D24, de determinar orçamentos (pelo risco e incerteza25

associados), qual a estrutura organizacional e a forma de disseminar e aplicar os

conhecimentos gerados na organização

Fusões e Aquisições: ao introduzir problemas de integração cria-se uma sinergia

- “creative chaos” de Nonaka e Takeuchi (1995)- que, alargando a base de ideias e 24 Por exemplo ainda hoje a gestão estratégica e a economia industrial divergem nas soluções que apresentam 25 A este propósito Freeman fez um exaustivo trabalho de descrição das várias componentes de incerteza associadas à inovação

20

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

valores, melhoraria as condições de criatividade. No entanto para que tal funcionasse

seria necessária a existência de uma linguagem comum e de uma forte gestão de

confrontos.

Redes: criando uma malha inter-independente e inter-relacionada de

conhecimentos e competências dispersos em zonas de saber especializado, onde cada

participante contribuiria com um valor incremental. Esta é basicamente a proposta da

metanacional (Doz et al, 2001) inserindo em si um conjunto de problemas – desde logo

de codificação e transferência – que serão mais à frente discutidos26.

3.5.2 A Visão Dinâmica

“Knowledge creation is a dynamic human process that transcends

boundaries”

(Nonaka et al, 2001: 22)

Saber quais os factores que poderão estar na origem da criação de conhecimento dentro

de uma organização é manifestamente pouco para uma empresa que ambicione uma

eficiente GC. É, portanto, necessário perceber quais os movimentos que concorrem para

o desenvolvimento do processo.

Neste ponto destaca-se um livro de 1995 de Nonaka e Takeuchi (The Knowledge-

creating Company) e todos os refinamentos posteriores à teoria (Nonaka, Konno,1998,

Nonaka, Konno, Toyama, 1998, 2001).Defendendo a ideia de que o conhecimento é um

processo vivo que resulta da interacção entre indivíduos e entre estes e os contextos,

estes autores propõe que a criação de conhecimento assenta na conversão do tácito em

explícito através do processo SECI (socialização-externalização-combinação-

internalização). Deste modo, criar-se-ía uma espiral de interacção entre estas quatro

modalidades de conversão. O que significa que os autores admitem que a criação de

conhecimento organizacional é um processo que nunca termina mas que continuamente

se melhora.

26 Proposta que vem na sequência dos teóricos das “social networks” como Liebskind ou Goshal entre outros. A este propósito talvez fosse também interessante consultar Camagni (1991) sobre redes e `local milieu`

21

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Partindo da teoria dos três bashos27 do filósofo japonês Kitaro Nishida28, propõem ainda

que o contexto comum no qual o conhecimento seria partilhado, criado e utilizado

seriam os ba (um por cada modalidade de conversão). Logo o ba, podendo ou não ser

também um espaço físico, é sobretudo um espaço mental de interacção e integração dos

contextos individuais. No que respeita ao ba , poderíamos talvez ser tentados a

compará-los com as “comunidades de prática”. Há, no entanto, desde logo uma

distinção fundamental: enquanto o ba é um local de criação de conhecimento, estas

comunidades são locais essencialmente de transmissão de conhecimentos tácitos.

As teses de Nonaka e Takeuchi têm sido alvo de extensão e validação empírica por

Soo, Midgley, Devinney (2002ª, 2002b).

Estes autores propõem essencialmente que o processo de criação de conhecimento é

iterativo de tal modo que ao melhorar a capacidade de a empresa resolver problemas

melhora a sua própria capacidade de criação de novo conhecimento. Procuram ainda

demonstrar que factores como a capacidade de absorção, o tipo de cultura

organizacional, os contextos industrial e conjuntural também afectam a performance

inovativa da empresa.

Fica ainda por estudar um aspecto que, quanto a nós, é crucial: diferenciar a intensidade

e tipo de efeitos no processo de criação de conhecimento dos aspectos específicos à

empresa (redes informais, comprometimento, confiança, …) e dos relativos ao contexto

do problema .

NOTA FINAL AO CAPÍTULO

Poderia ser colocada a questão de qual a pertinência de GC em mercados menos

propensos a actividades inovativas.

Obviamente, uma primeira resposta passaria pela dissertação acerca do crescimento da

importância da inovação de processos, mesmo em actividades tão tradicionais como a

agricultura ou a pesca.

No entanto, uma outra razão de extrema importância, prende-se com o facto de a gestão

do conhecimento não gerar apenas criação de novos saberes mas de ter também efeitos

de spillover. Relacionados com o suporte da memória organizacional, aumento da

27 Basho é uma expressão japonesa que significa espaço partilhado 28 Para aprofundamento sugerimos Nishida, K. (1921) An inquiry into the Good. Abe, M., Ives, C. (trad) (1990). New Haven/London: Yale University

22

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

variedade de competências e com o fomento de uma cultura de empresa capaz de se

reflectir a si própria e de se regenerar abrindo-se ao conhecimento exterior.

4 A IMPORTÂNCIA DO LOCAL NA ERA DO CONHECIMENTO 4.1 Introdução Apesar dos constrangimentos de tempo e espaço terem sido significativamente

reduzidos e em alguns casos eliminados, o desenvolvimento tecnológico continua

localmente contextualizado. (Santangelo, G.D., 1999) O que dualmente poderá

significar a existência duma restrição à capacidade das empresas combinarem processos

de aprendizagem localmente distantes e simultaneamente a existência duma vantagem

competitiva pela superior inimitabilidade do ambiente local.(Doz et al, 2001).

As razões para tal fenómeno parecem-nos a nós fundamentalmente presas a duas

constatações:

- em primeiro lugar o ambiente técnico-sócio-económico continua a reforçar uma path-

dependency dos processos de aprendizagem (apesar de uma maior dispersão geográfica

de processos de rotina), na medida em que os conhecimentos de pendor tácito não se

tornaram mais facilmente codificáveis com o desenvolvimento e adopção das NTI. O

que significa que continua a ser actual o paradigma evolucionista que procura

demonstrar que há parcerias intimas entre trajectórias produtivas e contextos politico-

institucionais (Nelson, 1993);

- em segundo lugar, os conhecimentos muito contextualizados têm custos de

codificação tão elevados que nem sempre é rentável para a empresa dispersá-los no

espaço29.

Deste modo, embora possa parecer paradoxal à primeira vista, na era das

telecomunicações a localização do conhecimento continua a ser um aspecto de extrema

importância30.O que poderá de algum modo sustentar a hipótese (Audretsch, D.B, 1999)

de que as diferenças culturais entre regiões explicam diferentes performances

inovativas.

29 Por exemplo, não é pela simples leitura de um estudo de mercado na China que um analista é capaz de perceber as escolhas de consumo de um chinês. 30 Note-se que o tema da inovação como um fenómeno aglomerado e localizado ganhou fôlego com os trabalhos de Krugman e Porter. Embora antes deles possamos pelo menos identificar os contributos de Weber e de Marshall.

23

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

4.2 A importância da distinção entre Práticas e Actividades Assumindo-se como verdadeira a ideia de que o valor do conhecimento e de práticas

únicas como base de vantagem competitiva se tem vindo a tornar mais pronunciado31,

então as economias de escala e de gama perdem progressivamente a sua importância

competitiva. (Sölvel O, Birkinshaw J, 1999)

Por outro lado, se capitais, bens físicos e informação são crescentemente capazes de

viajar eficientemente pelo mundo, a habilidade para os gerir a uma escala global passa

também a ser uma vantagem distintiva em retracção. (Doz et al, 2001)

O que poderá significar que são as capacidades e as práticas que se reforçam como real

força competitiva das empresas.(Dunning, J.H. , 1999)

Esta hipótese remete-nos para a necessidade de distinguir entre práticas e actividades.

Genericamente poderíamos dizer que actividades são o conjunto de operações realizadas

pela empresa e que as práticas consistem no modo como tais actividades são levadas a

cabo. O que significaria que cada actividade tem uma ou mais práticas associadas (pese

embora a possibilidade de algumas práticas se poderem associar a várias actividades),

sendo que estas representam uma forma de acrescento de valor a tal actividade32.

Assim, admitindo-se como válida esta distinção, poderíamos ainda deduzir que as

práticas estariam enraizadas em contextos sócio-institucionais. Ou seja, resultariam de

um conjunto de factores ambíguos (integrados e valorizados num “uso” que é sobretudo

uma aprendizagem diária) que dificultariam a perceptibilidade e imitabilidade dos

processos pelos quais surgiram.

Deste modo, enquanto as actividades são susceptíveis de exportação e outsourcing,

dificilmente se “comercializam” práticas.

Obviamente que neste aspecto, poder-se-ia talvez argumentar que embora as práticas

não tenham existência física (porque inerentes ao próprio processamento da actividade)

talvez pudessem ser susceptíveis de tradução nas ideias e influências de um certo

31 Esta questão foi mais longamente problematizada no capítulo anterior. 32 A título exemplificativo, actividades seriam por exemplo o desenvolvimento de produtos e marcas ou a distribuição, enquanto as práticas seriam por exemplo aspectos relacionados com o controlo de qualidade, formas de gestão, métodos de abordagem do consumidor.

24

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

número de pessoas (ainda que reduzido). No entanto, se transferir operações já é muitas

vezes dispendioso (pelos custos de transporte e quebras de produção), o custo torna-se

bastante mais elevado quando se trata de transferir os indivíduos detentores das práticas.

Desde logo pela dificuldade, em muitas situações, de identificar quais os indivíduos em

questão (especialmente se se tratarem de práticas colectivas). Por outro lado, pelo

elevado risco de se perder qualquer coisa no “transporte”: é bastante intuitivo perceber-

se que existem determinado tipo de actuações que apenas fazem sentido num

determinado contexto porque só aí são eficientes.

4.3 A Dependência do Contexto Até há algumas décadas era mais ou menos consensualmente aceite que os factores que

influenciariam a localização das empresas se relacionavam, para além das variáveis

como custos e disponibilidade de factores produtivos ( Teoria das Vantagens

Comparativas de D. Ricardo), com a capacidade de aproveitamento de economias de

escala e com os custos de transacção (Krugman, P., 1991 a, 1991 b, 1995)).

Poderíamos talvez até dizer, numa interpretação muito livre, que a visão de A. Smith se

tinha prolongado no tempo: a localização da actividade económica estaria condicionada

pelo tamanho e geografia dos mercados.

No entanto, faz cada vez mais sentido ter em linha de conta a “personalidade” do

mercado (i.e. até que ponto está estandardizado ou, similarmente, avaliar quais as

especificidades que o diferenciam).33 O que significaria que se alargaria o espectro dos

custos de transacção aos resultantes de transferências de saberes, tecnologias e b&s

entre mercados cultural e socialmente diferentes. Ou seja, os custos de transacção

(outrora entendidos sobretudo na sua componente estática) passariam a ser dinâmicos

porque relacionados com aprendizagens e coordenação de saberes e competências.

E é com este pano de fundo que se pode perceber a importância do contexto para

determinadas actividades. Isto porque se é mais ou menos directo que a localização de

actividades como vendas, logística ou marketing é essencialmente função do espaço

geográfico da procura, no que respeita às actividades inovativa e produtiva há uma

33 A este propósito vale a pena levantar a problemática sobre o significado de globalização, fazendo denotar que neste trabalho globalização não é de todo sinónimo de uniformização (até porque as formas que assumiu foram diferenciadas consoante os espaços planetários e as actividades económicas), mas um “processo que reforçou e alargou as dependências e relações internacionais” ( Hoskisson R., Hit M., Ireland R.D.,2004 pp 8 )

25

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

maior mobilidade. De tal modo que se espera que gravitem em torno dos locais em que

expectavelmente terão alguma vantagem competitiva.

Vamos por isso tentar sistematizar algumas ideias sobre a importância das

determinantes espaciais nos processos inovativo e produtivo.

4.3.1 A importância das determinantes territoriais

Hoje, há já uma vasta bibliografia sobre Economia Territorial que tem edificado um

importante património em torno da interpretação da interacção que as vertentes

cognitiva, inovativa e produtiva operam no dinamismo territorial (Santos, 2002), desde

os contributos do paradigma marshalliano (centrado na emblemática figura do distrito

industrial) aos defensores de conceitos como meio inovador, redes, região inteligente

ou sistema regional de inovação.

Em suma, foi sendo notório um processo de progressiva valorização dos contributos

politico-institucionais, das relações e solidariedades societais, das representações

colectivas. Ou, mais resumidamente, do território enquanto espaço de simbiose entre

sociedade e estrutura empresarial.

Não sendo objectivo deste trabalho a exploração destes contributos teóricos, é

pertinente invocá-los enquanto o reconhecimento de que o local não pode ser entendido

como acolhedor passivo de empresas, mas percebido como actor dinâmico e decisivo na

criação de activos competitivos.

Ou seja, torna-se actualmente reconhecida a importância da matriz local ou do local

millieu (Camagni, R., 1991), enquanto espaço físico em que se desenvolvem

espontaneamente relações tácitas e informais propiciadoras de transferências de

conhecimentos e da emergência de uma cultura e processos de aprendizagem colectiva

próprios. Dito de outro modo, o dinamismo empresarial (e mais concretamente o

processo inovativo) passa a ser visto como o resultado de um percurso de aprendizagem

contínua e interactiva que acumula, interioriza e utiliza conhecimentos (tácitos e

codificados). (Doz et al, 2001; Santangelo G.D., 2003; Audretsch D.B, 1999; Storper

M, 1999 ; Hoskisson et al, 2004 ; Bartlett et al, 2004 ; Kluge J. et al, 2002 ; Nonaka et

al, 2002 ; Nelson e Winter, 1993)

Esta relevância acrescida da dimensão espacial resulta da sobreposição de dois aspectos

fundamentais:

26

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

- por um lado, do facto das instituições informais (i.e. as regras, rotinas e normas

que prevalecem na cultura sócio-produtiva local) reduzirem os níveis de

incerteza e consequentemente os custos de decisão;

- por outro lado, porque o conhecimento tácito que vai sendo desenvolvido e

acumulado num contexto específico ao longo do tempo torna cada sistema local

num sistema único e irrepetível.

Logo as dinâmicas da empresa estariam, pelo menos parcialmente, ancoradas a

conhecimentos específicos a um determinado território (na medida em que pelo seu

carácter tácito e contextual exigiriam proximidade geográfica). E logo, quanto mais uma

determinada actividade dependesse de recursos enraizados e dificilmente disponíveis ou

reproduzidos na mesma configuração noutros locais, mais territorializada essa

actividade estaria (i.e menor seria a margem para ser geograficamente substituída)34.

4.4 A Geografia de Localização das Empresas Multinacionais As teorias de localização tradicionais parecem ter perdido capacidade explicativa para

sectores35 onde o conhecimento tenha um papel importante36. Este fenómeno desde logo

resultaria do facto da competição nestes sectores se basear mais na criação de variedade

do que em duplicações (Santangelo G.D, 2003) e por outro lado da crescente

importância de uma especialização que aumente activos (Dunning J.H. 1999).

Desenvolvendo um pouco mais esta segunda hipótese, vale a pena distinguir entre 3

tipos de especialização internacional:

- especialização horizontal (tipo Hechscher-Ohlin): cada um dos produtos da

empresa é produzido em diferentes locais como forma de potenciar as vantagens

das economias de escala;

- especialização vertical: quando os diferentes estágios da cadeia de produção

passam por diferentes locais, tirando-se partido das diferenças de custos de

produção;

34 A este propósito conferir Storper (1999) que defende que hoje em dia faz mais sentido falar em “territorialização” que em “localização”. 35 De acordo com a tipologia de Pavitt , seriam sobretudo os sectores: ´baseados na ciência´ e ´fornecedores especializados´. (Pavitt, K, 1990) 36 O que significa que é plausível aceitar as Teorias de Localização Tradicionais como robustas para actividades intensivas em recursos tangíveis.

27

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

- especialização que aumenta activos: imposta pelos imperativos da economia

do conhecimento, o objectivo é promover a eficiência dinâmica através de um

reforço das vantagens competitivas via valorização de activos internos e do

acesso a activos externos. O que significa que tendo em conta que o capital

intelectual se torna cada vez mais sofisticado, idiossincrático, tácito, complexo e

contextual, esta especialização ganha em importância.

Deste modo, as EMN localizam-se de modo não só a complementarem as suas

capacidades como para acederem a sistemas locais novos, dinâmicos e inimitáveis. O

que significa que por um lado reforçam capacidades competitivas explorando bolsas

locais de conhecimento especializado (Doz et al, 2001; Dunning J.H., 1999; Santangelo

G.D., 2003; Sölvel et al, 1999) e por outro as vantagens específicas de cada sistema

local são “fertilizadas” e melhoradas ao longo do tempo por conhecimentos diferentes.37

4.5 Implicações 4.5.1 Localização e Globalização: duas faces da mesma moeda ?

Esta é uma questão que não cabe no âmbito deste trabalho tentar responder. Contudo,

tendo em conta que o que aqui se pretende é o levantamento de algumas das

problemáticas mais interessantes, não nos pudemos esquivar a lançar algumas ideias

para futura discussão

Assim, parece-nos que, tendo em conta o que se disse anteriormente, é talvez possível

dizer que o que se passa dentro das EMN é um espelho ao nível micro-cósmico das

mudanças que se operam a nível global. Ou seja, sendo estas empresas veículos e

designers do próprio processo de globalização, parecem também assumir-se no papel de

reforçadoras da localização.

Em primeiro lugar porque se tratam de empresas cada vez mais integradas, no sentido

em que têm vindo a adoptar uma visão holística e sistémica das suas operações: cada

filial é parte de uma rede de actividades inter-relacionadas configuradas para valorizar a

empresa como um todo. (Dunning, J.H , 1999).

37 Como referia Camagni (1991), o ´meio local´ pode funcionar como obstaculizante se a cultura for fechada ao exterior. O que significa que há toda a vantagem numa renovação periódica da cultura local, estabelecendo contactos com outras culturas.

28

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Depois porque se por um lado aumentam a proporção de actividades que são conduzidas

fora de casa e em muitos países, pelo outro as suas filiais assumem-se como cada vez

mais imbuídas dos contextos locais. (Doz et al, 2001; Doz et al, 1998).

Por último, porque se as EMN necessitam de “espaços” que acomodem concorrentes,

consumidores, fornecedores e actividades de suporte, tais “espaços” também terão que

ser suficientemente pequenos de modo a que seja possível a maximização dos

benefícios das interdependências transferíveis.

4.5.2 Políticas Regionais

Ao longo destas páginas temos desenvolvido a ideia de que a importância da

internacionalização de inputs e outputs físicos perde relevância para a

internacionalização indirecta das ideias e dos saberes. E tanto mais quanto se assuma

que um aspecto com cada vez maior relevância para o sucesso das empresas é o da

apropriação e aplicação de ideias globais.

Assim, tendo em conta este panorama, torna-se clara a necessidade de um novo estádio

de concepção de políticas públicas, na qual as autoridades locais/regionais precisariam

de disponibilizar mais do que mão de obra qualificada ou infra-estruturas produtivas, de

transporte e comunicação. O que se traduziria na necessidade de se orientarem também

para a valorização e (re)descoberta do território enquanto fonte de conhecimentos

implícitos e de memórias de cultura empresarial relevantes para a diferenciação

competitiva38.

Deste modo, as políticas regionais modernas deveriam acentuar as especificidades

locais (ou dito de outro modo, aprofundar a imperfeição da concorrência entre as

regiões) de modo a que a competitividade empresarial esteja umbilicalmente

dependente da competitividade territorial. O que se traduziria num menor risco no

curto/médio prazo de deslocalização de actividades mais intensivas em conhecimentos (

e logo de maior valor acrescentado) e num reforço da atractividade local.

Deste modo um território competitivo não é um somatório de empresas competitivas,

mas uma combinação de determinantes de competitividade ( nomeadamente recursos,

conhecimentos e organização institucional) que garantem um estatuto de

inimitabilidade: é a conectividade dos actores locais desenhada num grafo de relações

38 Para uma melhor fundamentação desta ideia cf o capítulo anterior.

29

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

institucionais a fonte duma acumulação de experiências, conhecimentos e saber-fazer

diferenciadores que garantem a competitividade das empresas e logo uma maior

competitividade territorial. (Figueiredo A.M, 2002)

5 ORGANIZAR PARA GERIR CONHECIMENTOS 5.1 Nota Prévia Neste capítulo pretende-se, desde logo, perceber (e em alguns casos problematizar)

quais os mecanismos de que uma empresa pode dispor para gerir conhecimentos.

Em segundo lugar ( como já antecipado no capítulo 1) tentaremos perceber o que

distingue uma empresa de tipo transnacional de uma de tipo metanacional e que

contributos inovadores acrescentou o 2º conceito àquele primeiro.

5.2 Introdução Hoje em dia, uma EMN não se pode limitar a explorar economias de escala globais ou a

retirar dividendos das imperfeições dos mercados de trabalho, de capitais e de produtos

através de processos de arbitragem. Uma vez alcançada uma dimensão e uma

localização global, permitindo o acesso a recursos dispersos por todo o mundo, parece-

nos que a nova empresa do futuro deverá: ter a sensibilidade para identificar novas

ondas tecnológicas e novos mercados, independentemente da sua localização; saber

actuar perante oportunidades e ameaças surgidas; conseguir explorar novas ideias e

produtos de forma eficiente e à escala mundial (Bartlett e Ghoshal, 1995).

Assim, apesar de muitas vezes as unidades periféricas se encontrarem separadas por

grandes distâncias geográficas e até culturais, a nova EMN deverá conseguir coordenar

de forma flexível e eficiente os processos de identificação, captação e implementação

das oportunidades disponíveis nesses locais. (Doz et al, 2001)

A deslocalização das actividades de I&D e da tomada de decisões estratégicas

constituem uma mudança ocorrida já há vários anos, em que as empresas globais

combinaram os pontos fortes internos com as oportunidades disponíveis no meio

envolvente. Posteriormente, verificou-se que a tendência de autonomização e

independência das filiais não era compatível com uma realidade caracterizada pelo

30

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

aumento do fluxo de capitais, produtos, pessoas, informação e conhecimento dentro das

próprias empresas.

Ora, neste contexto de crescimento internacional e expansão da variedade de funções, as

sedes estavam a encontrar enormes dificuldades para manter o controle centralizado das

estruturas em que assentavam as actividades do grupo.

Uma resposta inicial residiu na divisão da actividade das empresas em funções, pelo que

cada divisão era responsável pelas operações nacionais e internacionais de uma linha de

produtos em particular. No entanto, tal solução não foi bem sucedida, já que as

entidades que detinham o poder de decisão não conheciam a realidade de cada mercado

local, tomando decisões que contrariavam as próprias tendências do mercado (Hakanson

1995).

Bartlett e Hedlund, citados por Hakanson (1995), defendem que a solução passa pela

criação duma empresa transnacional assente numa estrutura heterárquica. O mesmo

Hakanson sugere a ascensão de uma nova estrutura designada de “novo paradigma

organizacional” caracterizado pela reelaboração dos papéis e responsabilidade dos

gestores de topo, das subsidiárias e das divisões produtoras de conhecimento e

inovação. No fundo, torna-se-ia necessária uma reformulação de toda a estratégia da

empresa, não esquecendo os sistemas de incentivos, os mecanismos de coordenação e

controlo e a importância atribuída à função de I&D.

5.3 A Estrutura Organizativa da Moderna EMN 5.3.1 Papel e relações entre subsidiárias

O processo de inovação e de transferência de conhecimento não é imediato e acarreta

custos consideráveis, nomeadamente porque a inexistência de meios de coordenação e

transferência e a inadequação de produtos localmente concebidos a mercados diferentes

pode inviabilizar este processo. O que torna necessária uma cuidada preocupação na

gestão das subsidiárias e, mais particularmente, do conhecimento aí localizado.

Historicamente, a prática mais comum de gestão de subsidiárias tem sido o desempenho

de papéis e a assunção de responsabilidades segundo uma sequência rígida: isto é,

utilizando os mesmos mecanismos de planeamento e controlo e dispondo de parâmetros

de avaliação idênticos em todas as subsidiárias. Ou seja, utilizam permanentemente o

31

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

mesmo padrão simétrico de comportamento, sendo que nenhuma das subsidiárias é

discriminada positiva ou negativamente em relação às restantes.

Esta estratégia tem como consequência uma divisão de papéis, cabendo um papel

global à sede e papéis meramente locais às subsidiárias. Neste contexto, a relação entre

a sede e as unidades periféricas torna-se unidimensional, sendo que as subsidiárias

podem assumir uma dependência total da sede ou serem totalmente autónomas e

isoladas da mesma (desenvolvendo apenas uma de duas estratégias possíveis: a

projecção da estratégia da sede ou a adaptação à realidade local). Assim sendo, a falta

de flexibilidade da estrutura existente limita a acção inovadora das suas subsidiárias,

impedindo o desenvolvimento simultâneo de processos de inovação centrais, locais e

globais (Bartlett e Ghoshal 1995).

Por estas razões vários autores, apoiados ou não em exemplos reais inovadores, se têm

debruçado no estudo de soluções alternativa.

Bartlett e Ghoshal (1995) advogam uma solução que passa pela criação de um sistema

que atribui diferentes papéis e responsabilidades aos vários centros da organização, de

acordo com as suas características mais vincadas ou os atributos que tornam

indispensável a sua contribuição para cada processo específico de inovação.

Aliás a grande diferença introduzida pela organização transnacional face à global reside

na rejeição do pressuposto, até então assumido inquestionavelmente, de que a estrutura

organizacional e os processos de gestão têm de ser homogéneos e idênticos para todas

as unidades periféricas pertencentes à empresa. Assim, a transnacional assume uma

característica inovadora ao conseguir diferenciar as posições e responsabilidades das

diversas subsidiárias nacionais no contexto da empresa, de acordo com as suas

capacidades actuais e futuras.

Um sistema interno de diferenciação de tarefas e áreas de pesquisa entre as unidades

periféricas permite que cada uma das mesmas desenvolva capacidades e acumule

experiência nas áreas onde apresentem maior potencial e melhores condições, bem

como onde haja maiores exigências por parte dos seus clientes chave. As várias

subsidiárias acabam por participar nos processos de inovação conjunta no seio da

empresa de acordo com a contribuição potencial que possam vir a dar aos mesmos.

Deste modo, a visão transnacional defende que as subsidiárias que estão localizadas nos

ambientes mais estimulantes e que possuem as maiores capacidades tecnológicas e de

32

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

gestão funcionam como líderes estratégicos de inovação.( Bartlett e Ghoshal 1995,

Hakanson 1995).Em primeiro lugar ao criarem inovações para os seus mercados locais,

as subsidiárias geram também inovações alavancáveis à escala global, aproveitando as

tecnologias, tendências e práticas de gestão encontradas nesse ambiente. Em segundo

lugar, porque uma outra oportunidade é a transferência directa de competências das

unidades periféricas para a sede (“reverse technology transfer”), assim que os gestores

de topo se apercebam de sinais de novas oportunidades e necessidades dos mercados,

gerando-se depois uma inovação direccionada do centro para a periferia. (Centralização

que como veremos é oposta à visão metanacional). Por último, porque as diversas

unidades periféricas podem também servir como plataforma de aprendizagem para os

gestores da sede testarem as suas ideias e aperfeiçoarem os seus projectos sem correrem

tantos riscos num mercado de maior importância para a empresa. Mesmo que não

possuam as capacidades internas para explorar essas oportunidades e liderar o processo

de inovação, as subsidiárias podem funcionar como sensores para procurar e identificar

oportunidades, originando processos de inovação global comandados pela sede.

Assim sendo, as unidades que disponham de um maior número de departamentos (I&D,

marketing, comercial) altamente competentes seriam aquelas que maiores possibilidades

teriam de liderar projectos inovadores, já que a comunicação intra-unidades é mais fácil

e eficiente que inter-unidades (as perdas e fugas de informação e conhecimento são

menos prováveis; e por outro lado, os contactos pessoais frequentes e a partilha de

valores e ambientes comuns aumentam a probabilidade da ocorrência de trocas de

conhecimento). No entanto, é necessário que tal não prejudique um papel activo de

todas as subsidiárias nos projectos de inovação que vão sendo desenvolvidos pela

empresa.

Note-se que esta é uma visão próxima à perspectiva metanacional, embora este

argumento encerre em si uma incompatibilidade que reside na defesa da liderança de

alguns projectos de inovação relevantes para a empresa por parte das subsidiárias mais

pequenas, mesmo que estas não disponham das capacidades para o fazer. O objectivo

desta estratégia seria o de forçar as mesmas a procurar recursos noutras unidades,

resolvendo o seu problema e reforçando as suas capacidades. Porém, este procedimento

envolve um risco adicional para a empresa já que o conhecimento não é facilmente

transmissível, como revela Szulanski (1996).

33

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Um outro aspecto a ter em conta prende-se ao facto de que quando uma unidade

periférica dispõe de recursos em excesso para o potencial do mercado que serve, na

empresa multinacional tradicional há o hábito de se exigir maior autonomia face à sede

e de se realizar uma diferenciação mais profunda dos seus produtos direccionados ao

mercado local (Bartlett e Ghoshal 1995). Ora, uma característica inovadora é o facto de

nas empresas transnacionais e metanacionais, esses recursos serem usados para a

elaboração conjunta de projectos de inovação global, através de processos de inovação

“globally-linked” em vez de se limitarem a desenvolver projectos de cariz local.

Bartlett e Ghoshal (1995) apresentam quatro tipo de subsidiárias, de acordo com o

potencial de oportunidades dos mercados em que se situam e de acordo com os recursos

disponíveis para aproveitar essas oportunidades.

Assim temos:

- a subsidiária líder∗: cujas capacidades são aproveitadas em processos de inovação

global, mas somente nas áreas funcionais em que lhe é reconhecida uma capacidade

extraordinária;

- a subsidiária implementadora∗: com um papel bem mais limitado à execução de

tarefas de âmbito local, como a criação e implementação de inovações destinadas ao

mercado em que actua;

- a subsidiária identificadora∗: não dispondo das capacidades necessárias à exploração

das oportunidades à disposição no seu meio envolvente, é dotada de recursos que lhe

permitam assumir um papel de liderança numa área de negócio relevante para a qual

tenha muito potencial. Ela deverá desenvolver as suas capacidades de identificação no

curto prazo, deixando para mais tarde as capacidades de implementação e aplicação das

oportunidades encontradas; enquanto não atinge esse estado, a subsidiária identificadora

recolhe, interpreta e distribui informação, conhecimento e tecnologia inovadoras

surgidas no seu ambiente.

∗ tradução livre a partir do artigo dos autores referidos.

34

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

- a subsidiária contribuinte∗ encontra-se na situação já apresentada de dispor de

recursos superiores aos necessários para o desempenho das suas tarefas locais (o

ambiente em que actua revela um potencial diminuto).

Note-se, contudo, que a interdependência entre os diversos tipos de subsidiária exige

uma coordenação entre as mesmas para que os processos de percepção, transferência e

implementação funcionem sequencialmente e de forma eficiente. Essa coordenação

deverá basear-se em mecanismos que garantam que as pesquisas feitas pelas unidades

identificadoras seja transmitidas às líderes. A líder deverá também estar integrada com

as subsidiárias contribuintes de forma a aproveitar a sua capacidade disponível para

apoiar processos globais de inovação.

De qualquer forma e visto que as inovações geradas irão ter repercussões em todos os

mercados em que a empresa se encontra presente, tanto na visão transnacional como

metanacional uma rede de ligações entre todas as unidades periféricas é necessária para

proceder à implementação local das inovações e à avaliação permanente do sucesso das

mesmas. O que se traduz na necessidade de um pólo de atracção e aglutinação.

Bartlett e Ghoshal (1995) advogam um papel de liderança por parte da sede em

determinadas áreas de negócio, assumindo-se como um nó aglutinador dos esforços de

identificação, resposta e desenvolvimento de inovações pelas unidades periféricas;

sendo que o papel de direcção estratégica e coordenação global das actividades deverá

ser desempenhado pela sede, em estreita colaboração com as subsidiárias líderes. Doz et

al (2001) propõem uma descentralização com a criação de magnetos que não só

focalizem como gerem a energia necessária à inovação; e que tanto poderão ser uma

determinada actividade, como uma plataforma tecnológica ou como uma necessidade

de cliente a satisfazer.

Contudo, as duas perspectivas não têm que colidir pelo que uma solução intermédia

(onde a sede se assume no desenho do magneto e a partir daí descentraliza) será em

muitos casos a melhor opção.

Há, no entanto, outras visões.

No estudo de Behrman e Fischer (1980)39, referido por Melcof, é apresentado um

espectro do tipos de relação entre a sede e as subsidiárias, variando entre a

35

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

“centralização absoluta”* (num extremo em que a autonomia das subsidiárias é muito

reduzida) e a “liberdade total” ( no outro extremo em que as subsidiárias têm toda a

liberdade para porem em prática as suas políticas sem prestarem contas à sede).

No meio destes dois tipos de sistemas encontram-se a “centralização participativa” e a

“liberdade supervisionada”.

De referir que este equilíbrio de poder tem associados diferentes graus de comunicação

entre sede e subsidiárias.

No estudo de Akasawa (1996)40, também citado por Melcof, estabelece-se uma relação

entre o nível de autonomia concedido pela sede às suas subsidiárias localizadas no

estrangeiro e a existência de ligações formais e informais entre as mesmas entidades. O

autor conclui que quanto mais profundas e inseridas no contexto local do país de

instalação se tornam as ligações das subsidiárias, maior tende a ser a autonomia

adquirida pelas mesmas. Assim, a sede tenderia a estabelecer mecanismos mais

formalizados de controlo às unidades externas. Quando estas aumentavam o grau e

frequência de comunicações com a sede, ser-lhes-ia concedida mais autonomia em

virtude da estabilidade e confiança obtida e da sensação de controle que a sede ganhava.

Para realizar este controle, Nobel e Birkinshaw (1998)41, apontados por Melcof,

apresentam diferentes mecanismos:

- nas unidades do tipo “international creators”, o principal mecanismo de controle é a

socialização, que envolve intercâmbio de trabalhadores e frequentes visitas às unidades

externas.

No entanto, a necessidade de um sistema de controle diferenciado e personalizado,

adaptado à realidade de cada unidade, não é suficiente no objectivo de obter uma visão

geral das actividades da organização. Se não for acompanhado por mecanismos de

integração interna na empresa, corre-se o risco de ocorrer uma segmentação em vez de

uma diferenciação, com cada uma das unidades a actuar unilateralmente e sem partilhar

os mesmos objectivos da sede. Também a constante comunicação entre as entidades

39 Behrman, J.N. e Fischer, W.A. (1980). Overseas R&D activities of transnational companies. Cambridge, MA: Oelgeschlager, Gunn e Hain * traduções livres a partir do artigo do autor. 40 Akasawa, A. (1996). “External-internal linkages and overseas autonomy-control tension: The management dilemma of Japanese R&D in Europe”. IEEE Transactions on Engeneering Management, 43(1), 24-32 41 Nobel, R., Birkinshaw, J. (1998). “Innovation in multinational corporations: Control and communication patterns in international R&D operations. Strategic Management Journal, 19, 479-496

36

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

assume preponderância, sendo que os mecanismos de controle mais formais

(estabelecimento de regras e procedimentos de actuação pelas subsidiárias, segundo

critérios da sede) têm uma importância relativamente inferior.

Contudo, este constitui o tipo de unidade que mais se aproxima do paradigma das

metanacionais e das transnacionais;

- os “local adaptors” (dentro do próprio país sede) e os “international adaptors”

(deslocação para mercados de semelhança cultural e geográfica) utilizam os

mecanismos formais como meios de controle e comunicação mais frequentes – sendo

que estes vêm ao encontro do paradigma das multinacionais.

De forma diferente e dando particular importância ao estabelecimento de linhas de

comunicação dentro da empresa, Melcof (2004) definiu um método que estabelece

padrões de comunicação e se baseia no conceito de célula estrutural (“stuctural cell”). A

célula estrutural consiste num conjunto de unidades organizadas, dentro da mesma

firma, que têm ligações comunicativas com a unidade líder e entre si –“centre unit,

periphery units”. As “structural cells ” podem ser classificadas consoante o padrão de

comunicações estabelecido dentro da firma. Este padrão depende da intensidade das

ligações centro-periferia e interperiferia.

Enquanto as multinacionais apresentam um sistema de “star cell”42 - em que o centro

assume um papel de liderança absoluta, pelo que o peso das comunicações centro-

periferia é muito forte contrastando com as interperiferia -, já nas “network cell” as

unidades da periferia estão tão fortemente ligadas entre si como relativamente ao

centro43 Na “network cell”, o poder das subsidiárias expressa-se sob a forma de

influência e de capacidade para persuadir outras unidades, até mesmo a sede, a levar a

cabo as suas propostas. Verifica-se o exercício desse poder nas reuniões e discussões

entre as unidades, sendo que o centro é a unidade moderadora e com um poder acima de

qualquer outra unidade (mas não absoluto).

42 Fazemos notar que foi aproveitando a descrição da actividade da empresa multinacional revelada por Bartlett e Ghoshal (1990) - em que a empresa concentra toda a sua actividade tecnológica na sede, expande-se para mercados externos semelhantes ao seu e estabelece aí as suas subsidiárias (“implementors”)- , que Melcof teve a ideia de a associar à “star cell”, já que as unidades periféricas, copiando as estratégias e políticas da casa-mãe, comunicam mais frequentemente com a sede do que com outras subsidiárias. 43 Note-se que existem ainda as “cluster cell” e as “satellite cell” que não se enquadram em nenhum dos modelos de organização da empresa estudados

37

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

O problema deriva da interdependência entre unidades, o que restringe a autonomia das

mesmas já todas as decisões devem ser tomadas em conjunto. Com uma maior

independência, as subsidiárias ganhariam a sua autonomia mas também perderiam o

poder de influência entre elas, o que poderia levar ao desvio dos objectivos estratégicos

da companhia.

Uma outra visão interessante referida por Melcof é a das redes de comunicação externas

apresentadas por Benson (1975)44.

O autor expõe a teoria de que uma unidade poderia ganhar poder dentro da organização

a partir do estabelecimento de relações mais profundas com redes exteriores à

companhia, relativamente às quais a firma ganhasse uma certa dependência.

Adaptando às multinacionais, Ghoshal e Bartlett (1990)45 afirmaram que o

estabelecimento de fortes ligações de comunicação das subsidiárias a organizações

locais inseridas nos países de expansão daria um maior poder a essa unidade periférica

no seio da firma, levando a um certo “desvanescimento das fronteiras da própria

empresa”.

No contexto das empresas metanacionais, tal não será suficiente já que é indispensável a

mobilização do conhecimento identificado nessas entidades locais. (Doz et al 2001).

Por outro lado, assim que uma filial se estabelece num país e se liga ao ambiente local,

se esse ambiente contiver recursos e informação que sejam importantes para outras

partes da organização, então essas partes teriam acesso a esses recursos através da filial

aí situada. Por isso, Ghoshal e Bartlett (1990) propõem ainda que à medida que a rede

de ligações a entidades externas à empresa se densifica, a rede de comunicações interna

da empresa tem de efectuar o devido acompanhamento de forma a gerir e a integrar todo

o conhecimento absorvido (contudo, não se faz a devida distinção entre conhecimento e

informação).

Esta visão já está de acordo com a perspectiva das empresas metanacionais, uma vez

que esta transferência não é automática, precisa de um indutor e de um condutor.

44 Benson, J.K. (1975). “The interorganizational network as a policy economy”. Administrative Science Quarterly, 20, 229-249 45 Ghoshal, S. E Bartlett, C.A. (1990). “The multinational corporation as na interorganizational network”. Academy of Management Review, 15(4), 603-625

38

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Um vasto conjunto de autores, revelados por Melcof (2004), entre os quais se

encontram McDonought e Kahn (1997)46, advogam a necessidade de promover uma

comunicação mais frequente e eficiente entre subsidiárias.

O seu argumento vem ao encontro da visão metanacional, já que os mesmos defendem

que as tecnologias e o conhecimento a elas associado encontra-se disperso

geograficamente e que a comunicação directa entre subsidiárias é o modo mais eficiente

de conceber e disseminar novos produtos, métodos e processos. A inclusão do centro

enquanto intermediário apenas atrasa essa transferência e pode dar lugar a erros de

tradução e comunicação. (colide um pouco com a necessidade de coordenar

conhecimento - papel que o centro poderia desempenhar).

5.3.2 Os Fluxos de Informação

Vimos até aqui que nas modernas EMN, o fluxo de informação assume grande

importância.

Ao contrário dos sistemas hierárquicos, em que esse fluxo se faz de uma forma bilateral

entre a sede e as diferentes subsidiárias, numa organização com uma rede integrada, os

padrões de comunicação são bastante mais complexos, envolvendo fluxos de

informação laterais entre as subsidiárias.

A sede tem aqui o papel de manter um funcionamento eficiente dos canais de

comunicação, sejam eles formais ou informais, envolvendo mesmo o estabelecimento

de contactos pessoais regulares que conduzam à partilha de conhecimentos.

Estes canais encontram-se assentes numa infraestrutura empresarial (Hakanson 1995)

bastante mais vasta em que se baseiam outros sistemas que se encontram ao serviço da

empresa.

Desde logo os sistemas formais de comunicação que passam pela elaboração de

procedimentos padronizados de tratamento de documentação, de contabilidade e

auditoria, da criação de relatórios, os quais deverão ser continuamente actualizados e até

melhorados, com o objectivo de facilitar a transferência de tecnologia e de

conhecimento. A criação de redes informáticas online acessíveis por todos os elementos

da empresa, úteis para a recolha de informação interna relevante, constituem um

impulso para essa padronização de procedimentos.

46 McDonough, E.F. e Kahn, K.B. (1997). ‘Using “hard” and “soft” technologies for global new product development’. IEEE Engeneering Management Review (Fall), 66-75

39

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Por outro lado, os canais informais de comunicação não perderam a sua importância,

mesmo com a expansão das TIC’s. A transferência de conhecimento estratégico assenta

muito no contacto pessoal, nomeadamente através de demonstrações, negociações e

trabalho de equipa. Muitas vezes, surgem novas ideias e oportunidades do contacto

ocasional entre indivíduos especializados em áreas diferentes. Este tipo de

comunicações, dada a sua natureza, não pode ser estruturado em sistemas formais. Os

seus resultados surgem de forma imprevista, pelo que a obrigação da gestão é a de

permitir a construção de redes informais que conectem peritos de todo o globo,

facilitando os seus processos de inovação. Outras formas de incentivar este processo são

a rotação internacional de quadros e a realização de conferências entre diferentes

divisões funcionais e diferentes subsidiárias da empresa (Hakanson 1995).

5.3.3 Heterarquia: um novo conceito organizacional47

A difusão internacional de competências e capacidades tecnológicas e de gestão deu

origem a uma concorrência mais apertada mas também permitiu um maior potencial de

criação e aproveitamento de novas ideias no seio das EMN’s.

Nesse contexto, a estrutura formal organizacional definida sob a forma de divisões de

produtos (típica das multinacionais) revela certas dificuldades no novo ambiente

competitivo que se tende a formar nos dias de hoje48.

Hedlund e Rolander (1995) advogam uma mudança na estrutura das multinacionais, no

sentido de uma nova forma à qual chamam de heterarquia.

Esse novo formato organizativo envolve a dispersão geográfica de actividades

estratégicas chave e do papel de coordenação internacional de actividades para as

subsidiárias, implicando um corte com a noção de hierarquia formal de posições e de

responsabilidades na tomada de decisões dentro da empresa e permitindo a ascensão de

mecanismos de controlo menos formais e mais normativos. Desta forma, seria dada

maior importância à aprendizagem e pesquisa de oportunidades e a acções que

interajam com o ambiente externo à empresa de forma a retirar maiores vantagens para

a ela.

47 Conceito originariamente desenvolvido por Hedlund 48 Esta questão foi mais longamente abordada no capítulo da Gestão do Conhecimento

40

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Nesse sentido, os autores sugerem os trabalhos de Hagström (1989)49 e Ledin (1989)50,

que abrem novas perspectivas para as formas das redes de comunicação e informação

dentro das empresas EMN’s.

A estrutura heterárquica proposta por Hedlund para as EMN’s contém algumas

características que podem facilitar programas de aprendizagem e experimentação, bem

como uma relação interactiva com o ambiente que a envolve.

Entre elas, encontram-se:

- existência de diversos centros de diferentes tipos: a sede não tem uma localização

única, mas sim diferentes sedes para as diferentes funções. Para mais, não existe

nenhum centro com maior dimensão (de produto, função ou geográfica) que seja

hierarquicamente superior aos restantes.

A empresa possuidora de uma estrutura heterárquica preocupa-se com a coerência

prática e não com papéis e estatutos formais. Essa estrutura é flexível ao longo do

tempo, podendo a importância de cada centro variar de acordo com a área funcional que

se encontrar mais em foco. A flexibilidade desta estrutura vai além da permitida pela

organização em matriz, permitindo uma resposta rápida e personalizada face aos

problemas e oportunidades surgidos (a visão metanacional também partilha esta

perspectiva):

- integração na empresa por meios normativos e não coercivos ou formais (no entanto,

o estabelecimento de uma cultura, de um estilo e de uma ética da empresa são

indispensáveis para não se cair numa situação anárquica);

- gestão partilhada: não existe uma liderança que toma todas as decisões mas todos

têm a autonomia e a responsabilidade para tomar decisões, sempre tendo em conta a

partilha e o fluxo de informação e conhecimento;

- utilização de parcerias: fundamental de forma a utilizar potenciais sinergias na

exploração do ambiente global, nomeadamente através do estabelecimento de joint-

ventures, da externalização das actividades mais repetitivas (por exemplo, as

actividades operacionais), internalizando as actividades que conferem vantagens

competitivas (tecnológicas, I&D, marketing).

49 Hagström, Peter (1989), “New information systems and the changing structure of MNC’s” 50 Ledin, Hakan (1989), “Building a dynamic intelligent network: lessons from the telecommunications revolution for the MNC of the future”

41

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Aliás, esta ideia é também defendida pela perspectiva metanacional, que sugere o

estabelecimento de uma comunicação e uma receptividade permanentes para com estas

entidades, abrindo portas à captação da experiência acumulada pelas mesmas e ao seu

aumento de flexibilidade e capacidade de adaptação às mudanças das necessidades da

empresa;

- focalização imediata e efectiva no problema competitivo da empresa: concentra-se na

área de negócio mais atraente ;

- constituição de uma “organização holográfica”51: a informação sobre a empresa

encontra-se em todos os seus centros, havendo um sistema comum de princípios e

condutas de realização de pesquisas e partilha de tecnologia e conhecimento.

Deste modo, uma estrutura mais heterárquica permite pesquisar em áreas invulgares que

não passem somente pelos produtos disponíveis e pelos concorrentes existentes no

presente.

Por outro lado, hoje mais importante do que a hierarquia formal e a aplicação sequencial

das disposições da liderança, importa que os quadros estejam organizados num sistema

de aprendizagem, com respostas positivas e negativas consoante a análise e resolução

dos problemas surgidos (Hedlund e Rolander 1995).

Deste modo, na visão heterárquica sugere-se que a liderança das novas EMN’s deve ser

meta-institucional, pois a sua função é a de criar formas de gestão que possibilitem um

funcionamento mais flexível e autónomo da organização e dos seus elementos.

White e Poynter (1995) apresentam uma visão semelhante à de Hedlund, a qual

apelidam de “organização horizontal”52 .

Contudo, acrescentam um ponto que não foi muito focado por Hedlund: a resolução dos

problemas é feita lateralmente e não verticalmente, reduzindo a importância da posição

hierárquica na condução das discussões. Isto porque tendo em conta que as capacidades

cognitivas humanas são limitadas e que o conhecimento se encontra globalmente

disperso, é impensável a tomada de decisões adequadas por apenas um centro. Assim,

nos processos de decisão laterais, a existência de uma rede horizontal permite que se

estabeleça a reunião e o acordo dos membros da empresa que chefiam os centros

51 Tradução livre de Hedlund e Rolander (1995) 52 Tradução livre de White e Poynter (1995)

42

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

funcionais que podem ser afectados pelo assunto em causa, em vez de tratar um assunto

enviando-o sequencialmente para o topo da cadeia hierárquica.

Uma questão focada por Hedlund e que também não deve ser negligenciada é a relação

da empresa com os seus concorrentes. Ter um profundo conhecimento dos mesmos é

importante mas também pode ser perigoso pois corre-se o risco de seguir a concorrência

sem nunca arrebatar a liderança. As oportunidades escondidas dentro da empresa têm

mais importância do que aparentam. Torna-se assim indispensável analisar o ambiente

externo à empresa, como universidades onde se geram as tecnologias que estarão por

detrás dos produtos líderes de amanhã. Há que tomar então uma atitude mais activa

relativamente ao ambiente envolvente, em vez de se concentrar meramente na indústria

onde se actua.

Será realista considerar que a necessidade de uma estrutura heterárquica varia consoante

o mercado e indústria onde a empresa se move. De facto, haverá situações em que

apesar da procura de uma maior autonomia pelas subsidiárias, não deixa de haver

espaço para estruturas rígidas e permanentes de forma a manter a integração do grupo.

Quanto a saber quais as situações em que há uma melhor adaptação a uma situação ou a

outra, só o gestor perante o caso concreto saberá responder.

Contudo, seria de todo o interesse para a gestão a realização de estudos empíricos

transversais aos vários sectores económicos internacionais que dessem indicações sobre

a adequação das alternativas.

5.3.4 A função de Investigação & Desenvolvimento

Tendo em conta tudo o que se argumentou anteriormente, o papel da função de I&D

localizada na sede não será mais a de controlo sistemático da actividade das divisões

externas, como acontecia nas organizações mais hierarquizadas, mas sim a de manter

um equilíbrio e um funcionamento eficazes da rede de unidades que desenvolvem esta

função, orientando-as na direcção estratégica desejada. Em vez de ocupar o lugar de

líder hierárquico da actividade de I&D do grupo, a sede constitui mais uma unidade da

equipa, que proporciona apoio directo às restantes unidades e facilita as trocas de

informação que permitem uma exploração máxima do conhecimento disponível na

empresa (Hakanson 1995).

43

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

O risco que esta estratégia encerra é o da burocratização do processo de inovação

devido à falta de experiência do pessoal na actividade de controlo, já que o mesmo está

mais talhado para a investigação (Hakanson 1995).

Para desenvolver esta estratégia, a gestão necessita de uma rede horizontal equilibrada,

uma orientação estratégica bem definida e uma infra-estrutura empresarial adequada

(Hakanson 1995).

A rede horizontal que liga as divisões de I&D dispersas geograficamente envolve a

distribuição de tarefas entre as mesmas, de forma a definir a estrutura de poder dentro

da organização e a evitar conflitos internos, duplicação de esforços e o desvio da

estratégia empresarial estabelecida.53

A estrutura da rede e o seu funcionamento eficiente obriga a uma renovação de

capacidades e adaptação a mudanças do meio envolvente. A rede não é uma estrutura

rígida, pelo contrário, está sujeita a redefinições que devem ser progressivas de forma a

evitar rupturas no sistema.

5.4 A estratégia da moderna EMN Como se disse no primeiro capítulo, historicamente, os processos de inovação das

EMN’s reflectiam uma de duas possíveis mentalidades: ou a diversidade internacional

dos mercados era vista como um mal cujas consequências deviam ser eliminadas e onde

qualquer alteração ao produto originalmente concebido de forma a melhor se adaptar ao

mercado local era mínima - empresas globais; ou a resposta específica às necessidades

do mercado local constituía um comportamento indispensável à entrada no mesmo, sem

o qual o produto em questão não teria qualquer sucesso - empresas multinacionais

propriamente ditas (Bartlett e Ghoshal 1995).

Contudo, faz hoje mais sentido que processos de criação de produtos e tecnologias

passem pela alavancagem à escala global de inovações geradas localmente, sendo as

inovações ou concebidas numa subsidiária, para um mercado específico ou criadas em

53 Note-se que esta especialização funcional coincide com a perspectiva metanacional que é defensora da organização do grupo em departamentos localizados nos pontos geográficos com maior potencial de absorção de conhecimentos e desenvolvimento de capacidades, em vez de uma rede de subsidiárias apetrechadas com todos os meios (No fundo, defende-se a ideia da aplicação eficiente dos recursos escassos da empresa nas áreas que têm maior potencial de criação de valor para ela).

44

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

conjunto por diferentes unidades (“globally-linked”), utilizando recursos, capacidades e

experiência da sede e de várias unidades periféricas.

Porém, para que todos estes processos sejam bem sucedidos, é necessária a existência

daquilo a que Bartlett e Ghoshal (1995) chamam “mentalidade transnacional” e Doz et

al (2001) de “mentalidade metanacional”. Esta mentalidade funciona como um dínamo

capaz de impulsionar a geração interna de inovações utilizando todos os estímulos

externos a que está sujeita, como necessidades dos consumidores, novas tendências de

mercado e ondas tecnológicas. Além disso, o acesso a um conjunto diversificado de

capacidades raras – inerentes a pessoas – potencia a possibilidade de resposta adequada

às necessidades encontradas.

Aliás, de acordo com o defendido pela perspectiva metanacional, Hakanson argumenta

que, estando as tecnologias e o conhecimento concentrados em bolsas de inovação e

conhecimento, faz todo o sentido que muitas empresas tenham aberto filiais que

funcionam como “postos de escuta”. Já que, permitindo-lhes uma preparação para lidar

com clientes mais exigentes, favorecem o desenvolvimento de capacidades em

mercados mais competitivos que possam ser difundidas por todas as divisões da

empresa.

5.5 A importância de um sistema de incentivos motivador Um dos pontos fulcrais na moderna EMN será a criação de um sistema de incentivos e

prémios pela performance das unidades periféricas, de acordo com a sua contribuição

para a estratégia global da empresa.

Uma solução passaria por haver uma remuneração extraordinária das inovações

geradoras de valor, paga aos indivíduos que tenham estado por detrás das mesmas, ou

um bónus a pagar às unidades operacionais capazes de reproduzir as inovações à escala

global.

Outra solução seria a de indexar parte da remuneração da gestão aos resultados totais do

grupo e não apenas da sua subsidiária. A preocupação única pelo desempenho da

unidade sob seu comando pode levar a uma subutilização dos recursos da mesma, já que

negligencia a colaboração e a expansão de outras unidades que poderiam utilizar

também os seus recursos (Hakanson 1995).

45

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Assim, durante o exercício da sua actividade, as subsidiárias deverão compreender que

o seu desempenho faz parte de uma rede empresarial coordenada, contribuindo para a

criação da estratégia do grupo e cooperando com as unidades responsáveis pela

actividade operacional.

Esta orientação poderá obrigar a mudanças na forma de operação das subsidiárias,

reduzindo a sua autonomia e preocupação imediata com o mercado local em prol da

integração na estratégia global do grupo (Hakanson 1995).

Uma outra questão que se pode revelar problemática numa organização horizontal é a

avaliação da performance dos seus elementos.

Isto porque sendo o conhecimento indissociável do indivíduo e sendo este

temperamental, pode acontecer que o conhecimento não flua nem seja colocado à

disposição da empresa. Logo, os instrumentos para motivar a força de trabalho não

podem ser triviais nem esporádicos, mas têm de ser incentivos a longo prazo

directamente ligados à estrutura de avaliação da performance dos indivíduos e equipas.

Este conceito é apresentado por Davenport e Prusak (1998), ao qual eles apelidaram de

“nontrivial motivational aids”.

A utilização de medidas como as receitas ou os lucros gerados é desaconselhável porque

incentiva o esforço individual de cada subsidiária em detrimento da procura da obtenção

de vantagens globais. Por outro lado, a análise do desempenho de cada unidade deverá

ter em conta o rendimento obtido das suas acções, os custos em que ela ou os seus

parceiros incorreram e os custos do apoio obtido de outras subsidiárias. Logo, torna-se

necessária a criação de um mecanismo de preços de transferência que conduza a uma

justa atribuição de méritos e regalias entre as diferentes subsidiárias (White e Poynter

1995).

Assim sendo, não seria aconselhável realizar uma avaliação baseada apenas em

números!

Há, contudo, que notar que na visão metanacional há uma recusa em utilizar preços de

transferência de conhecimento, apresentando como alternativa um sistema de “favores”,

em que cada elemento partilha o seu conhecimento na expectativa de mais tarde o de

outros ser também com ele partilhado.

46

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Esta opção poderá encerrar uma pequena contradição, desde logo porque também se

propõe um sistema de bonificações assente nas contribuições para projectos de inovação

– o que de algum modo poderá ser incompatível com um espírito de entreajuda.

5.6 Os papeis e responsabilidades da gestão As capacidades fundamentais exigidas aos gestores de topo das empresas de amanhã

passam pela eficiência na execução das estratégias da empresa através de uma

flexibilidade orientada para unir os esforços das diferentes subsidiárias, de forma a

competir coordenadamente e a retirar vantagens das interdependências existentes mas

não exploradas entre as diversas áreas de negócio.

Assim, os principais objectivos da gestão são: criar um depósito de conhecimento,

melhorar o acesso ao conhecimento disponível dentro da firma (mas disperso) e

proporcionar uma cultura e ambiente propícios ao conhecimento dentro da firma

(Davenport e Prusak 1998).

Sendo objectivos inovadores no seio da empresa, cabe à gestão de topo o

desenvolvimento dos primeiros esforços para que sejam atingidos.

Quanto aos depósitos de conhecimento, devemos distinguir três tipos de conhecimento:

o de origem externa (por exemplo, análise das práticas da concorrência), o

conhecimento interno estruturado e documentado e o conhecimento interno de índole

informal ou tácito. Uma solução possível de administração destes depósitos, aventada

pelos autores Davenport e Prusak (1998), seria a criação dos “knowledge managers”,

cuja função seria a de recolher e disseminar o conhecimento pelos directores das

divisões aos quais mais ele poderia interessar, tornando esse conhecimento

«armazenado» mais acessível e útil.

Um melhor acesso e transferência de conhecimento passaria por focar quem possui e

quem precisa do conhecimento e construir mapas de fontes e origens de conhecimento

baseadas em redes internas. Ou seja, uma inventariação das tecnologias, capacidades e

características dos mercados dentro da empresa poderá facilitar a emergência de

oportunidades baseadas no conhecimento54.(Doz et al, 2001)

54 Exemplos de situações possíveis são uma procura conjunta de uma solução para um padrão de problemas apresentado por inúmeros clientes, ou o desenvolvimento em equipa de projectos de inovação que até então eram desenvolvidos em paralelo por manifesto desconhecimento das partes.

47

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Quanto ao conhecimento tácito, mais difícil de transmitir, criar-se-ia um sistema de

discussão em comunidade sobre uma plataforma electrónica, onde se partilhariam

pistas, truques, opiniões, experiências e observações, quer entre elementos pertencentes

à organização, quer entre estes e os clientes e fornecedores da empresa. Dado o imenso

valor da informação da empresa, a plataforma interna deveria ser completamente

estanque de modo a salvaguardar os interesses da companhia.

Porém, nenhum destes sistemas dará resultados satisfatórios se a gestão de topo não

desenvolver um ambiente propício à criação, prospecção e captação de conhecimento;

se não criar uma sensibilidade e receptividade cultural, mudando atitudes e

comportamentos face ao conhecimento; se não criar magnetos que sirvam de orientação

para a boa gestão e exploração do conhecimento, utilizando-o no desenvolvimento de

um produto desejado por um cliente.

Criar um sistema de compensação motivador dessa atitude, mudar a percepção dos

trabalhadores relativamente ao seu trabalho, fazendo-os sentir como criadores e

distribuidores de conhecimento, poderá constituir uma mais-valia na exploração das

potencialidades do conhecimento disponível (Davenport e Prusak 1998).

Logo, o sucesso também depende da geração de um ambiente interno familiar, em que

os indivíduos compreendam que têm mais a ganhar se trabalharem em equipa do que

sozinhos, da promoção do respeito interculturas (relativamente a possíveis conflitos

entre culturas de diferentes localizações), da partilha de conhecimento sem secretismos

nem vontade de retirar méritos pessoais exclusivos, da utilização de uma linguagem

comum e compreensível para todos de forma a minimizar as perdas de conhecimento

aquando da sua transferência.(Doz et al, 2001)

A gestão de topo terá também de ser capaz de criar um conjunto de magnetos capazes

de subsistir para além dos motivos para os quais foram criados, estando para tal dotados

da flexibilidade e capacidade de adaptação a novas exigências, prolongando assim o seu

período de vida útil.

Aliás, uma das formas de avaliar o sucesso da gestão do conhecimento num projecto

concreto é a probabilidade desse conhecimento vir a ser usado noutros projectos e não

se tratar de uma iniciativa individual ou isolada, e a presença de alguma evidência de

rentabilidade económica, quer através da actividade de gestão de conhecimento

enquanto um centro de actividade secundário (Contabilidade de Custos – custeio por

48

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

actividades), quer através do aumento dos resultados da organização como um todo. O

desenvolvimento de métodos de medida da velocidade, custo, impacto e satisfação do

consumidor derivados da nova gestão do conhecimento, consultando, por exemplo, os

clientes quanto à satisfação do novo serviço/produto, constituem também mecanismos

de avaliação da eficiência na gestão do conhecimento – avaliação de desempenho e

informação para controlo de gestão.

A gestão de conhecimento costuma apresentar dois níveis de sucesso: melhoria limitada

de um processo ou função específica dentro da empresa (como novos produtos,

melhoria do serviço ao cliente, formação, criação e gestão de patentes), ou então a

transformação da organização como um todo. (Davenport, Prusak, 1998)

Esta segunda hipótese é aquela que apresenta maior potencial para a empresa porque

gera as bases para que toda a empresa e os seus membros desenvolvam as suas

actividades de acordo com os novos parâmetros da moderna EMN.

O grande problema da gestão de conhecimento é que precisa de uma grande dose de

visionário - normalmente, se não há prognósticos de lucros imediatos, não se avança

com esse projecto inovador (Davenport e Prusak 1998).

Outro problema decorre do facto dos accionistas desejarem lucros e de não haver uma

ligação definitiva entre a eficiente gestão do conhecimento e a performance económica

e financeira. Esta questão só poderá ser testada, em nossa opinião, com um modelo

econométrico completo capaz de incorporar todas estas variáveis.

49

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

6 CONCLUSÃO O conceito de metanacional surgiu como resposta a um contexto de intensificação da

competição em sectores onde a capacidade de resposta aos desafios da economia do

conhecimento marcam o posicionamento da empresa na escala do sucesso.

No entanto, o conceito em si assenta fundamentalmente na visão mais recente da

empresa transnacional, embora realize alguns ajustamentos significativos e inovadores

ao nível da utilização de magnetos – clientes, projectos ou áreas específicas de

actividade – como veículo de mobilização de saberes e competências para dentro da

empresa, enfatizando a importância de conhecimentos contextualizados e tácitos. De

resto, a interligação das unidades subsidiárias fora já proposta fundamentalmente por

Bartlett e o estabelecimento de relações dentro da empresa assume-se como próximo da

forma heterárquica apresentada por Hedlund.

No entanto, e como é óbvio, não se pode preconizar uma fórmula única de sucesso. O

que significa que a proposta da metanacional é uma linha de horizonte que terá de ser

adaptada às especificidades da empresa e do sector. Por exemplo, a gestão terá de

resolver questões como onde e como procurar determinados consumidores, novas

competências e tecnologias; de que modo aceder aos conhecimentos; quais os custos e

benefícios das vantagens daí decorrentes; que configuração de sistemas, estruturas e

incentivos será a mais adequada para os seus objectivos; … O que significa que não se

pode delimitar um padrão único de metanacionais. De facto, um desafio para trabalhos

futuros seria o de perceber as diferentes cambiantes possíveis e ajustá-las às

características dos sectores: uma empresa pode nascer com um desígnio

50

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

conscientemente metanacional como evoluir nesse sentido. Ou porque nasceu no “sítio

errado” e a internacionalização impôs essa postura, ou porque na sua evolução

multinacional sofreu um processo de reconfiguração organizacional.

A este propósito a tentativa de testar e aperfeiçoar o modelo por nós proposto poderia

ser um auxílio preciso nessa tarefa. Outra hipótese de trabalho passaria pela criação de

uma taxionomia das EMN’s e respectiva avaliação da adequação de cada solução a cada

um dos sectores de actividade.

7 ANEXOS: PROPOSTA DE MODELO 7.1 Nota Prévia No final deste trabalho pareceu-nos que a melhor conclusão que lhe poderíamos dar era

a de tentarmos modelar as várias hipóteses que aqui foram sendo discutidas.

Como mais à frente se verá, não tivemos pretensões de elaborar um modelo testável mas

apenas de equacionar as hipóteses e de propor formas de as testar.

7.2 Hipóteses H1: As empresas com melhor performance relativamente à média do seu sector são as

que registam maior dinamismo inovativo relativo

De facto a inovação quer ao nível dos processos quer ao nível de novos produtos55

(produtos que podem ser radicalmente novos ou apenas diferenciados) pode induzir

aumentos de produtividade e um alargamento da base da procura (quer conquistando

quota de mercado com preços mais competitivos quer entrando em novos mercados). O

que se traduziria em melhorias na performance comercial e financeira da empresa.

H2: As empresas mais bem preparadas para gerir conhecimentos são as que têm

maior dinamismo inovador.

55 Deve-se entender aqui produto como podendo ser um bem ou um serviço (remetemos para a nota de rodapé nº 8 )

51

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

A maioria das empresas hoje em dia têm um departamento de recursos humanos, no

entanto tal não é sinónimo da existência de uma gestão do seu nível de conhecimentos.

O que significa que a GC decorre, desde logo, de uma consciencialização por parte da

empresa de que o conhecimento pode ser o activo fundamental das suas vantagens

competitivas56, desde logo por acreditarem que o sucesso depende de um fluxo contínuo

de aprendizagem e inovação ( sendo esta a nossa hipótese H1 ).

Note-se, contudo, que não esperamos que esta hipótese seja verificada para todos os

sectores, sendo que nos parece sobretudo plausível para o conjunto de sectores onde a

eficiência tríplice produção-distribuição-vendas ao nível global já não é uma vantagem

diferenciadora.

Assim, entenderemos Gestão do Conhecimento (GC) como todo um processo

consciente e sistémico de recolha, organização, criação, uso e difusão de conhecimentos

(formais e informais) considerados vitais para a organização. O que significará desde

logo um esforço de transformação de conhecimentos individuais em conhecimento

organizacional (corporate knowledge) que, sendo partilhado, pode mais facilmente ser

fecundado e mais eficientemente utilizado57.

Há no entanto que referir que, tendo em atenção toda a argumentação que fomos

formulando no trabalho, esperamos que a gestão de conhecimentos de tipo tácito

assumam especial relevância. Esta hipótese resulta de um pressuposto epistemológico

segundo o qual são os conhecimentos tácitos (porque dependentes de factores tão

pessoais e contextuais como emoções, sistemas valorativos e culturais e ideais) que

conferem significado aos conhecimentos explícitos (codificados ou formais) (Polanyi,

1958, 1966). Deste modo, propomos que os conhecimentos tácitos influem na

capacidade inovadora da empresa por duas vias:

- por um lado porque sendo conhecimentos rígidos ao contexto (com stickiness ) os b&s

daí resultantes terão maior probabilidade de estarem mais próximos das necessidades do

mercado e serem tecnologicamente mais dificilmente imitáveis, garantindo-se uma

vantagem competitiva verdadeiramente diferenciadora e quiçá mais duradoura (isto

apesar de a sua apreensão por parte da empresa ser financeiramente mais exigente); 56 Para maior desenvolvimento desta ideia remetemos para a leitura do capítulo “A Gestão do Conhecimento no Século XXI” deste trabalho. 57 Definição que foi retirada da página 11 deste trabalho.

52

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

- por outro lado, o processo criativo dentro de uma empresa, sendo quase por definição

cooperativo e complementar, exige uma linguagem comum, sendo que a cultura

organizacional, o comprometimento dos vários elementos de uma empresa com uma

determinada missão assenta muito especialmente em conhecimentos de tipo tácito (por

exemplo: rotinas e procedimentos, ideais e interpretações e até pressentimentos são

conhecimento tácito).

7.3 Formalização do Modelo Note-se que, e como anteriormente referimos, estas hipóteses deverão ser testadas ao

nível sectorial, já que é expectável que em alguns sectores económicos ainda sejam

relativamente mais relevantes as economias de gama e de escala (tal poderá ser feito

utilizando variáveis dummy ou por testes sectoriais).

7.3.1 Hipótese H1

Performance da empresa = f (dinamismo inovador)

Para avaliar a performance da empresa poderia ser utilizado um índice compósito que

conjugaria o desempenho bolsista com o crescimento relativo das vendas e o peso das

vendas de produtos novos no total.

O desempenho bolsista, embora não seja uma medida perfeita da evolução do valor da

empresa, reflecte-o parcialmente em mercados eficientes sob a forma semi-forte no

sentido de Fama.58

Os outros dois indicadores, embora possivelmente correlacionados com o anterior,

procurariam avaliar de forma mais directa a performance comercial da empresa, já que

não podemos ter a certeza de que indicadores financeiros captem correctamente esta

vertente. O crescimento relativo da vendas pretende mensurar a capacidade da empresa

em satisfazer o mercado. (Note-se que se optou por esta medida e não pela quota de

58 Em mercados financeiros que reflectem instantânea e imediatamente toda a informação pública disponível, prova-se que o preço de um activo financeiro é, em cada instante, um estimador não enviesado do seu valor intrínseco. A este propósito conferir FAMA E., Foundations of Finance, Basic Books, 1986

53

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

mercado não só por esta última ser mais dificilmente calculada mas sobretudo pela

dificuldade em acompanhar a penetração da empresa em diferentes mercados 59)

Por outro lado, o peso das vendas de produtos novos no total funcionaria como uma

proxy da capacidade da empresa sustentar no futuro a sua actividade.

Yi = ½ * Y1 i + 1/3* Y2 i + 1/6 * Y3 i

Definição da variável explicada: Y = performance da empresa

Y1 = abnormal return = (∆ cotação bolsista da empresa – ∆

índice sectorial bolsista)

Y2 = (Vendas de Produtos Recentes60/ Vendas Totais)

Y3 = ( crescimento vendas empresa i / crescimento vendas do

sector)

i = 1,2,3,4,5, …, N

N = número de empresas na amostra do sector em estudo

O dinamismo inovador poderia ser avaliado por medidas como:

- um índice tradutor da aplicação industrial de inovações pela empresa, avaliado pela

intensidade com que esta cria produtos diferenciados61 ou radicalmente novos num

determinado período5. Na construção do índice dever-se-ia atribuir um maior peso aos

produtos novos, já que o esforço de investimento nestes últimos é à partida superior;

- número de patentes registadas nos EUA pela empresa num determinado período;

- intensidade de I&D relativamente à média do sector;

59 Note-se que para este estudo é de extrema relevância uma definição correcta do mercado relevante de forma a ser possível estabelecer comparações. Por exemplo, em vez de se utilizar o mercado dos refrigerantes seria mais interessante utilizar-se o mercado das bebidas. 60 Obviamente que o conceito teria de ser definido de acordo com as características de cada sector. 61 Note-se que seria necessário definir cuidadosamente os parâmetros em que assenta a noção de produto diferenciado.

54

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

No entanto, estamos conscientes que todas estas medidas apresentam falhas. A 1ª

porque não tem em conta as inovações de processo; a 2ª porque ignora o facto de

existirem bastantes casos em que as inovações não são patenteadas; a 3ª porque sendo

uma medida de input desconsidera as questões relacionadas com a eficiência da

actividade.

Parece-nos, contudo, que apesar das suas limitações a 1ª medida seria a mais adequada,

isto porque, tendo em conta a argumentação que foi sendo desenvolvida ao longo deste

trabalho, nos parece que as inovações de produto são mais relevantes para o sucesso da

empresa. Uma hipótese de construção deste índice seria :

Índice D Xi= 1/3 * X1i+ 2/3* X2i

Xi = 0 0 X1i = nº produtos diferenciados da empresa i Xi = xj xj/ x (max sector) X2i = nº produtos radicalmente novos da empresa i Xi = x (max sector) 1

Assim, a primeira hipótese seria formulada do seguinte modo:

Yi = f ( D)

7.3.2 Hipótese H2

A variável explicada nesta segunda hipótese seria a variável explicativa escolhida na

hipótese anterior (D).

Avaliar até que ponto uma empresa faz a gestão dos seus conhecimentos é , talvez, a

tarefa mais complicada na construção deste modelo. No entanto, procurámos listar os

factores que nos parecem mais relevantes.

Assim, pretenderíamos testar não só a validade da hipótese (através dos testes de R2 ao

modelo62), mas também decifrar quais da lista aventada são os factores mais relevantes

para o dinamismo inovador (através de testes de significância individual).

62 Note-se que uma baixa significância global não invalidaria desde logo a hipótese já que poderia apenas querer dizer que os factores apontados não seriam os mais relevantes.

55

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

Tendo em conta toda a argumentação desenvolvida ao longo deste trabalho,

consideramos que uma empresa que faz a Gestão dos seus Conhecimentos (GC)

preocupa-se com os seguintes factores (ressalvando sempre a possibilidade de estarem a

ser omitidos outros):

1. organização estruturada numa rede tal que a comunicação entre subsidiárias

fosse relativamente fácil;

2. processos de decisão lateral63;

3. preocupação em diversificar as áreas científicas dos quadros e manter a sua

estabilidade na empresa (sem prejuízo da diversificação de funções );

4. sistema de incentivos à transferência de conhecimentos;

5. capacidade em percepcionar e mobilizar conhecimento externo.

Os anteriores factores poderiam ser quantificados pelas seguintes medidas :

1. Organização estruturada numa rede tal que a comunicação entre subsidiárias fosse

relativamente fácil

Uma 1ª medida (Z1) seria o grau de rotatividade de quadros dentro do grupo.

Uma segunda medida (Z2) avaliaria a interacção (através dos contactos, sejam eles

reuniões, (vídeo)conferências, etc) entre indivíduos de diferentes áreas, sejam

funcionais, sejam geográficas face à média das empresas na amostra do sector.

Z1 = [(nº total de trabalhadores que foram transferidos do seu departamento) / (nº total

de trabalhadores)]

Z2 =[(nº contactos inter-departamentais + nº contactos entre subsidiárias)da empresa i

/ ∑i (nº contactos inter-departamentais + nº contactos entre subsidiárias) do sector]

i = 1, …, N empresas do sector.

2. Processos de decisão lateral

Este factor seria avaliado pela medida (Z3) que tem em conta a frequência de

comunicações ( telefonemas, emails, faxes, (vídeo)conferências, reuniões, ou outros

63 O conceito encontra-se desenvolvido no capítulo “ Organizar para Gerir Conhecimento”

56

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

considerados relevantes para a empresa em estudo) entre responsáveis do mesmo nível

hierárquico comparativamente à comunicação vertical

Quanto menor este indicador maior a rapidez potencial das tomadas de decisão, porque

o processo não tem que passar por tantos intervenientes.

Z3 = ( nº comunicações entre responsáveis do mesmo nível hierárquico / nº de

comunicações totais dentro do grupo) no período de 1 ano.

3. Preocupação em diversificar as áreas científicas dos quadros e manter a sua

estabilidade na empresa (sem prejuízo da diversificação de funções)

Muitas inovações resultam do cruzamento de informação e conhecimentos de áreas de

investigação. Assim, uma forma de avaliar a preocupação que a empresa tem com este

factor seria através de um índice de diversificação (Z4), sendo que quanto menor o

índice maior a diversificação. Por exemplo, se uma empresa tiver apenas 1 projecto com

6 investigadores (que tanto podem ser investigadores a trabalhar nos centros de I&D da

própria empresa como naqueles com quem a empresa estabeleceu alianças) com

formação na mesma área científica terá um Z4 = √ (1)/ 1 =1; contrariamente uma

empresa que tiver também um só projecto com 6 investigadores mas todos de áreas

diferentes terá = √ (6)/6 ~ 0,41.

Note-se que não estamos a ter em conta aqui a efectividade da transferência de

conhecimentos entre os diferentes investigadores.

Z4 = ∑p [(√ nº áreas científicas64 do projecto p)/ nº áreas científicas diferente do

projecto p ] / nº total de projectos da empresa i

p = 1, …, P projectos da empresa i

64 A composição e número das áreas científicas teria de ser alvo de um estudo prévio de forma a terem em conta as realidades dos sectores em estudo. Ou seja, provavelmente cada sector terá um conjunto próprio de áreas científicas. Por exemplo, engenharia seria desagregada em eng. química, civil, mecânica, electrónica, … consoante as especificidades sectoriais.

57

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

O factor estabilidade poderia ser captado através de um índice (Z5) que avalia a situação

dos trabalhadores de cada empresa relativamente à situação média do sector.

Z5 = (nº médio anos de um trabalhador na empresa i / nº médio anos de um

trabalhador da empresa i no sector) / (nº médio anos de um indivíduo do sector numa

empresa / nº médio anos de um individuo no sector)

4. Sistema de incentivos à transferência de conhecimentos

Uma possível medida seria a proporção dos prémios referidos no capítulo “Organizar

para gerir Conhecimento” no total de remunerações pagas pela empresa. No entanto,

esta medida é criticável porque não tem em conta a distribuição dos prémios, já que, por

exemplo, a gestão de topo poderia receber a quase totalidade desses incentivos.

Atendendo a isso, sugerimos uma outra medida (Z6) que consistiria na percentagem de

trabalhadores que recebem uma parte da sua remuneração na forma de prémios.

Z6 = (nº trabalhadores que recebem prémios / nº total de trabalhadores) na empresa i.

5. Capacidade em percepcionar e mobilizar conhecimento externo

Há várias possibilidades aqui a considerar. Uma delas seria a taxa de consulta das bases

de dados (redes formais que reúnem conhecimento codificado e documentado)

(Z7).Uma outra hipótese seria a taxa de actualização das bases de dados, recorrendo não

só aos estudos feitos pela empresa mas também pelos knowledge brokers 65(Z8). Dado

que estas duas taxas são complementares já que a 1ª reflecte o grau de circulação da

informação e a 2ª a qualidade da mesma, sugerimos a sua agregação num único índice

(Z9).

Uma outra medida possível prender-se-ia à importância que a empresa dá ao

estabelecimento de alianças estratégicas com centros de investigação, universidades,

fornecedores, distribuidores, concorrentes e clientes, quer ao nível de I&D quer ao nível

operacional (por exemplo: marketing, design) (Z10). No entanto, embora esta medida

65 Como por exemplo a Dun & Bradstreet.

58

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

reflicta a importância que a empresa dá à captação de conhecimento externo, é uma

medida de input e logo não reflecte a eficiência deste investimento, além de não ter em

conta a preocupação com a diversificação de ambientes em que a empresa opera.

Por isso, uma medida complementar poderia ser o grau de internacionalização da

empresa, embora não se estivesse aqui a ter em conta a possibilidade de a empresa fazer

outsourcing de algumas actividades relacionadas com a sua principal função ( como por

exemplo: marketing, design, I&D).

Assim, a melhor alternativa parece-nos ser a reformulação da medida (Z10), substituindo

volumes de investimento pelo nº de alianças estratégicas (entendidas genericamente

como joint-ventures, outsourcing relacionado com a principal função da empresa e

protocolos ) (Z11)

Z9 = ½ * Z7 + ½* Z8 Z7 = nº acessos à base de dados / nº de trabalhadores com

acesso autorizado

Z8 = nº actualizações/ nº acessos

Z10 = (total de investimentos em alianças estratégicas/ total de investimentos da

empresa) nos últimos 5 anos

Z11 = nº de investimentos em alianças estratégicas pela empresa i / nº investimentos em

alianças estratégicas médio do sector

Logo, a 2ª hipótese poderia ser formalizada da seguinte forma:

D = f (Z1, Z2, Z3, Z4, Z5, Z6, Z9, Z11)

7.4 Recolha de informação O principal factor que nos impede de testar empiricamente o nosso modelo é a

dificuldade em obter os dados que propomos utilizar. No entanto, deixamos aqui

algumas pistas quanto a este processo:

59

Estudos Económicos Aplicados 2003/ 2004

- realização de estudos de caso de organizações onde existem indicações relativamente

aos processos estudados, nomeadamente com entrevistas a CEO’s, CKO’s e quadros

superiores das subsidiárias;

- recolha de dados cross-section relativos ao desempenho das empresas, às

características sectoriais e regionais;

- realização de inquéritos junto do pessoal das empresas.

7.5 Amostra Na escolha da amostra ter-se-iam de ter em conta vários aspectos.

Desde logo, o facto de ser necessário fazer uma listagem dos principais sectores a nível

internacional e para cada um escolher aleatoriamente um conjunto de empresas.

Por outro lado, o facto de uma das exigências incontornáveis para a escolha de uma

empresa ser a sua cotação em bolsa, sendo que julgamos que as bolsas a utilizar deverão

ser relevantes a nível mundial (por exemplo: S&P 500, Euronext, Footsie ou Nikkei).

Note-se que, embora se esteja a restringir ainda mais este critério já que ficam à partida

excluídas PME´s, julgamos que deste modo de forma mais expedita se garante a

cobertura dos mercados mais desenvolvidos (onde estas hipóteses adquirem

plausibilidade).

7.6 Resultados Esperados Como anteriormente referimos não esperamos que as regressões apresentem

significância global significativa para todos os sectores, esperando que sejam para os

sectores com maiores ligações a tecnologias de ponta (biotecnologia, medicina,

aviação, química, electrónica, entertainment, …) que as hipóteses apresentarão maior

corroboração empírica. Paralelamente, temos também consciência que os testes de

significância individual serão também eles provavelmente diferentes consoante o sector

em estudo.

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