press review page - clipquick · 2012. 10. 25. · em pleno século xxi, as empresas continuam a...
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Empleno século XXI, as empresas continuam a des-
perdiçar o talento das mulheres de uma forma dra-
mática. Apesar de representarem 60% dos licen-ciados na Europa e constituírem 44% da força de
trabalho, apenas 13,5% têm lugar nos conselhos de
administração das grandes empresas europeias e
somente 2,5% se sentam na cadeira do poder. O teto de vidro con-
tinua inquebrável mesmo depois de vários estudos terem reconhe-cido que a diversidade de género na liderança é uma vantagem
competitiva para as empresas, e que as características femininas
que até há poucos anos eram consideradas fraquezas são hoje fun-damentais.
O que justifica então que um século depois de as primeiras mu-lheres terem começado a trabalhar nas empresas, a sua represen-
tação seja ainda tão pouco expressiva? Não é com certeza por falta
de preparação, uma vez que uma sondagem feita junto das princi-pais escolas de negócios europeias identificou oito mil mulheres
com competência para assumir postos de liderança nas empresas.E também não é por falta de empenho."As mulheres são mais trabalhadoras, mais perseverantes e mais
criativas que os homens", defende Francisca Vermelho, diretorana OxyCapital. "O que acontece é que não dão a mesma impor-tância à carreira do que a maior parte dos homens."
O estudo Unlocking the Fui! Potcntial o/Women ai Work, realizado
pela consultora IvlcKinscy junto de 60 empresas da Fortune 500,e que entrevistou 200 mulheres, constatou esta realidade. A per-gunta "Aspira chegar ao topo da empresa?", apenas 41% das in-
quiridas respondeu que sim. E este é o ponto para a maioria. A fa-
mília, sobretudo a partir do momento em que há filhos, ocupa um
espaço enorme na vida das mulheres, e a maioria passa a "investir
menos na carreira, porque não tem como investir mais", dizFrancisca Vermelho que, antes da OxyCapital, foi diretora-geralda Triumph International durante seis anos, tendo sido a segundamulher a assumir esta função no grupo a nível mundial.
Associedades de advogados também foram, até há
uns anos, dominadas por homens, mas hoje é fre-
quente encontrar mulheres entre as sócias, se bem
que cm minoria. Carmo Sousa Machado é uma
das sete sócias, num conselho de 27 membros, da
Abreu Advogados. Foi convidada quando já tinhaduas crianças, mas nunca pensou recusar e sentiu a responsabilidadede mostrar às colegas que era possível conciliar a vida familiar com
uma profissão altamente exigente, como c a sua. "O grande desafio
é gerir e dar prioridade às diferentes variáveis: a carreira, a família,a vida social e o seu desenvolvimento pessoal", defende Belén
Vicente, diretora executiva do The Lisbon MBA. O receio de não
conseguir cumprir bem todas estas missões é que assusta muitasmulheres e as leva a afastarem-se da corrida para o topo. Guilhermina
Vaz Monteiro, manaying partner da Horton International Portugal,
assume que o remorso de ter de escolher entre uma vida profissional
apaixonante e uma vida familiar preenchida nos leva a "autoboicotar
a nossa ascensão profissional e a perdermos a garra e a vontade de
nos apropriarmos do nosso próprio sucesso".
Mas o autoboicote não se fica por aqui. "Em alturas de crise, quandoo investimento em formação é mais reduzido, as mulheres são as
primeiras a fazer cedências na família", diz Belén Vicente, assu-mindo que permitem que seja o homem a investir na formação, en-
quanto elas se sacrificam.
Numa
conferência dedicada ao papel das mulheres
na Economia, promovida este ano pelo The WallStreet Journal, na qual participaram 200 líderes
dos meios académico, político e corporativo,Laszlo Bock, vice-presidenle da Google, levantou
ou Ira questão. Enquanto os homens não perdemuma oportunidade de se proporem para uma promoção muitas
vezes, ainda antes de estarem preparados -, as mulheres adiam a
decisão com receio de avançar cedo de mais. "Mas quando umamulher acha que está preparada, na realidade já está preparada há
um ano", garante Laszlo Bock.
O estudo da McKinsey detetou uma clara diferença dos níveis de
confiança entre os dois sexos. "Se existem cinco competências re-
queridas para uma promoção, a mulher dirá que não está prontaporque tem apenas quatro, enquanto o homem que domine só uma
avança com confiança", disse ao Financial Times Joanna Barsh,
responsável pelo estudo. As mulheres insistem em preparar-se ex-cessivamente para tudo, "mas isso não as faz avançar nem criarnovas oportunidades", aponta Deirdre Woods, ex-reitora da
Universidade de Wharton, num artigo publicado no site da escola.
E preciso que sejam claras quando às suas ambições e mostrem
que estão preparadas para o desafio seguinte. E é aqui que muitasmulheres falham.
Enquanto os homens estão sempre a pensar na promoção seguintee gastam tempo a promover-se junto do chefe, existe um alarmantenúmero de mulheres que acredita que o importante é concentrar--se a fazer um bom trabalho. Mas isso não chega, porque o bom
trabalho só é visível se for promovido, alerta a diretora da McKinsey.
Teoricamente já não se questiona o talento das mulheres. E as virtudesda liderança feminina até são enaltecidas. Mas, na prática, a sua presença
à frente das empresas continua a ser exceção e não a regra.Por que razão será a mudança tão lenta? pormariamartins
Fazer networking na própria empresa é um
investimento no futuro e não uma perda de
tempo. Guilhcrmina Vaz Monteiro é a única
mulher, em 250 partners da Horton
International, com licença para operar num
país, e assume que "num grupo onde nas reu-niões globais os homens vão todos jogar golfe,
é prejudicial não desenvolver e estreitar esses
laços que só os que pertencem ao old boys'club conseguem". Mas não é fácil fazê-10, e
admite que o facto de não participar em ati-vidades tipicamente masculinas, como as
grandes pescarias ou ficar no bar do hotel
após o jantar a beber uns copos, faz com quelhe escapem alguns negócios para Portugal,
que vê resultarem entre outros países.Nos EUA, a crise nos setores automóvel e da
metalurgia atirou muitos homens para o de-
semprego e trouxe uma responsabilidadeacrescida às mulheres como sustento da família, mas também lhes
concedeu mais liberdade para investirem na carreira. Com os maridos
em casa para lomar conta dos filhos, cias podem agora dedicar-se
de corpo e alma à vida profissional, como só poucas o fizeram antes.
Em The End ofMen and the Rise ofWomen, um livro recente e po-lémico, Hanna Rosin advoga o fim da era da testosterona, mas re-conhece que esta perda de virilidade na sociedade está a ser feita
pelo acréscimo de trabalho das mulheres e não pelo reconhecimento
de que valem tanto como os homens. Nas classes mais baixas, muitas
mulheres assumem-se como o sustento dos lares, à custa de acu-mularem dois ou três empregos. E em Silicon Valley, por exemplo,mulheres que ocupam cargos de direção em importantes empresasde tecnologia parecem finalmente conseguir conciliar a carreira e
a família, mas a um preço elevado - saem cedo para ir buscar os fi-lhos, mas voltam ao trabalho depois de os deitar, e sem hora paradesligar o computador. Não por acaso, no início de outubro, o The
New York Times escrevia que a esperança de vida das mulheres tra-balhadoras nos Estados Unidos desceu... cinco anos.
4spolémicas quotas não são o caminho que a
maioria das mulheres deseja para alcançar a pa-ridade de sexos na liderança das empresas, nem
é isso que defende Viviane Reding, vice-presi-dente da Comissão Europeia - o ideal seria uma
adesão voluntária dos países e das grandes em-
presas, para começar. Mas perante a fraca resposta destes, Reding
tem enfrentado tudo e todos na sua batalha para instituir um sis-
tema de quotas que discrimine as mulheres de forma positiva.No início de 2011 anunciou que o objetivo é, em 2020, 40% dos
membros dos conselhos de administração das grandes empresas
europeias serem mulheres. Porém, em setembro deste ano, um grupode nove países, liderado pela Grã-Bretanha, anunciou que não vai
aprovar a proposta - porque não concordam com facto de tal obje-tivo ser imposto pela União Europeia e não pelos Governos de cada
país. A Suécia e a Alemanha também comunicaram que não vão
subscrever o sistema de quotas. E os empre-sários europeus já fizeram saber que não acei-
tam interferências na sua liberdade de escolha
nem acreditam que esta seja a melhor via para
atingir a paridade entre homens e mulheres.
Perante estas reações, Viviane Reding suavi-
zou o discurso, clarificando que as quotas te-rão um caráter temporário e que devem ser
os países a estabelecer sanções para as em-
presas que não cumprirem a medida, e não
as instituições europeias.Esta é uma proposta polémica. Mesmo entre
as mulheres, existem algumas reservas em re-
lação às quotas. Isabel Canha, diretora da re-vista Exame, reconhece que a maioria das em-
presárias e gestoras com quem tem falado ao
longo de 20 anos de carreira rejeita a ideia de
qualquer discriminação positiva - "queremser tratadas como iguais, reconhecidas pelo
seu trabalho, e não querem beneficiar de qualquer prerrogativa es-
pecial pelo simples facto de serem mulheres".
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os Estados Unidos, as mulheres têm conseguido fa-
zer um caminho mais rápido, mesmo sem quotas, e
a sua presença na liderança das empresas representa
quase 13%. Este ano fez-se história quando a lista
da Fortune 500 bateu o recorde de presenças femi-
i ninas, com 18 mulheres -em 2003, apenas sete em-
presas desta lista eram lideradas por mulheres! Mas com uma média
de 2,5% de mulheres na liderança de empresas, a Europa ainda está
aquém destes números. Por isso, Viviane Reding não desiste. Acredita
que dificilmente se conseguirá um equilíbrio sem ser por esta via.
Também Isabel Canha admite que no passado considerou que as
quotas menorizavam as mulheres, mas hoje acredita que "a sua
instituição temporária poderá acelerar um processo que se tem re-velado demasiado lento".