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V. 13 1984 DISTRITO FEDERAL REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO

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V. 13 1984

DISTRITO FEDERAL

REVISTADO

TRIBUNAL DE CONTASDO

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SUMÁRIO

I. - DOUTRINA ____________________________________________________________ 4

OS PRINCÍPIOS DA LICITAÇÃO ___________________________________________ 5ANTONIO MARCELLO DA SILVA Promotor Público no Estado de São Paulo __________________5

IMPEDIMENTO DE MEMBROS DOS TRIBUNAIS DE CONTAS: o inciso II, artigo 36 daLOMAN (Lei Orgânica da Magistratura Nacional)_______________________________ 14

Luiz Navarro de Britto ______________________________________________________________ 14

CONTROLE DE LEGALIDADE DOS CONTRATOS PELO TRIBUNAL DE CONTAS _ 21José Borba Pedreira Lapa ____________________________________________________________ 21

PROBIDADE ADMINISTRATIVA (Aspectos Constitucionais e de Legislações Especiais) 31JOSÉ DE OLIVEIRA MESSINA Procurador-Chefe do Tribunal de Contas do Município de São Paulo _ 31

A DESBUROCRATIZAÇÃO E MODERNIZAÇÃO ADMINISTRATIVAS E OSTRIBUNAIS DE CONTAS _________________________________________________ 39

PEDRO DELEORCE_______________________________________________________________ 39

"A DESBUROCRATIZAÇÃO E OS TRIBUNAIS DE CONTAS"___________________ 49HEITOR CHAGAS DE OLIVEIRA____________________________________________________ 49

DAS FUNÇÕES JURISDICIONAIS DOS TRIBUNAIS DE CONTAS________________ 58AÉCIO MENNUCCI _______________________________________________________________ 58

ASPECTOS PRAGMÁTICOS DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA _________________ 64JOSÉ AUGUSTO DELGADO Juiz Federal (RN) _________________________________________ 64

A FISCALIZAÇÃO FINANCEIRA E ORÇAMENTARIA DA ADMINISTRAÇÃOMUNICIPAL____________________________________________________________ 75

FLAVIO SÁTIRO FERNANDES Cons. TC - Paraíba ______________________________________ 75

ACUMULAÇÃO DE CARGOS EM SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA _________ 85ORLANDO MORAES Cons. TC-Pernambuco ___________________________________________ 85

O CONTEÚDO DA FISCALIZAÇAO FINANCEIRA E ORÇAMENTÁRIA DOSMUNICÍPIOS ___________________________________________________________ 92

DAVID ALVES DE MELLO Cons. TC. Amazonas________________________________________ 92

GRITO DE APOSENTADO _______________________________________________ 102VIVALDI MOREIRA _____________________________________________________________ 102

II. - VOTOS E PARECERES _______________________________________________ 107

PENSAO MILITAR _____________________________________________________ 108FERNANDO TUPINAMBA VALENTE_______________________________________________ 108

COBRANÇA EXECUTIVA DE DÉBITOS FIXADOS PELO TRIBUNAL ___________ 110ELVIA LOADELLO CASTELLO BRANCO ___________________________________________ 110

PENSOES MILITARES DO DISTRITO FEDERAL ____________________________ 119ELVIA LORDELLO CASTELLO BRANCO ___________________________________________ 119

PENSÃO ESPECIAL ____________________________________________________ 128ELVIA LORDELLO CASTELLO BRANCO____________________________________________ 128

REVISÃO DE PROVENTOS ______________________________________________ 131Elvia Lordello Castello Branco_______________________________________________________ 131

PENSÃO ESPECIAL FUNDADA EM ACIDENTE EM SERVIÇO _________________ 134LINCOLN TEIXEIRA MENDES PINTO DA LUZ _______________________________________ 134

CONTROLE EXTERNO SOBRE BANCOS OFICIAIS__________________________ 139LINCOLN TEIXEIRA MENDES PINTO DA LUZ _______________________________________ 139

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CONCESSÃO DE PENSÕES COM BASE NO ART. 5.° DA LEI Nº 4.069/62 _________ 146LINCOLN TEIXEIRA MENDES PINTO DA LUZ _______________________________________ 146

REAPRECIAÇÃO DE REFORMAS E PROVENTOS JÁ CONSIDERADOS LEGAIS PELOTRIBUNAL____________________________________________________________ 150

LINCOLN TEIXEIRA MENDES PINTO DA CRUZ______________________________________ 150

PENSÃO ESPECIAL A MULHER JUDICIALMENTE SEPARADA DEEX-FUNCIONÁRIO _____________________________________________________ 152

LINCOLN TEIXEIRA MENDES PINTO DA CRUZ______________________________________ 152

TEMPO DE SERVIÇO Lei Complementar e Lei Ordinária ______________________ 154ROBERTO ROSAS_______________________________________________________________ 154

III - NOTICIÁRIO DO TCDF ______________________________________________ 157

TCDF II SEMINÁRIO SOBRE TRIBUNAIS DE CONTAS (Junho de 1983)__________ 158

III SEMINARIO SOBRE TRIBUNAL DE CONTAS (Maio de 1984 ) _______________ 159

POSSE DO CONSELHEIRO JOEL FERREIRA _______________________________ 161

HOMENAGEM AO CONSELHEIRO SUBSTITUTO JESUS DA PAIXAO REIS _____ 167

HOMENAGEM AO CONSELHEIRO PARSIFAL BARROSO ____________________ 168

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I. - DOUTRINA

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OS PRINCÍPIOS DA LICITAÇÃO

ANTONIO MARCELLO DA SILVAPromotor Público no Estado de São Paulo

SUMARIO

I. PRINCÍPIO DA LICITAÇÃO: Livre escolha e principioda licitação - Conceito de licitação. II. PRINCÍPIOS DALICITAÇÃO: Procedimento formal - Publicidade - Igualdadeentre os licitantes - Sigilo na apresentação das propostas -Vinculação ao edital - Julgamento objetivo - Adjudicaçãocompulsória ao vencedor.

I - PRINCÍPIO DA LICITAÇÃO

Para a plena consecução dos seus objetivos, que se resumem na promoção dobem-estar da coletividade, a Administração deve servir e construir, mas, não sendoauto-suficiente, precisa, como qualquer particular, socorrer-se de outras pessoas,geralmente do setor privado, para obter serviços, obras e bens, e, não raro,necessita também alienar coisas. A diferença é que o particular contrata pelosistema da livre escolha, ao passo que a Administração deve fazê-lo emconformidade com o princípio da licitação, a que se refere o artigo 126 do Decreto-lein° 200, de 25-12-1967.

LIVRE ESCOLHA E PRINCÍPIO DA LICITAÇÃO - Pelo sistema da livreescolha, o interessado na prestação de um serviço, na realização de uma obra, naaquisição ou alienação de um bem, elege com inteira liberdade o ofertante e aoferta. É que faz o particular, principalmente a pessoa física, cujas contrataçõespautam-se apenas por seus interesses pessoais e por suas disponibilidadesfinanceiras, sujeitos, ambos, a alteração no curso das negociações, de modo que oajuste final nem sempre corresponde à pretensão primeva do interessado. Inexistemnormas orientadoras de sua escolha, sendo comuns as avenças privadas resultantesda simpatia, do bom conceito e até mesmo da capacidade de convencimento doofertante, o qual, aproveitando-se dessas circunstâncias, consegue, muitas vezes,levar a outra parte a contratar coisa bem diversa da que pretendia.

O princípio da licitação, diversamente, exige que o contrato resulte decompetição entre ofertantes, os quais, disputando o negócio através de suas ofertas,

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propiciam ao futuro contratante a oportunidade de escolher a mais vantajosa. Paratanto, é essencial que o objeto da licitação (que se confunde com o objeto do futurocontrato) seja suficientemente definido e que se estabeleçam regras precisas,disciplinando a participação dos interessados e, principalmente, o julgamento daspropostas. São requisitos fundamentais, cujo desatendimento descaracteriza einvalida a licitação, tanto no setor público, quanto no privado, no qual surge com onome de seleção, coleta de preços, concurso de ofertas, etc.

A exigibilidade da observância do princípio da licitação nas contrataçõesadministrativas não decorre, como sugerem alguns doutrinadores, do princípio daisonomia, consagrado no § 1° do art. 153 da Constituição da República. Primeiro,porque as licitações não se abrem no interesse dos particulares, mas no dacoletividade; segundo, porque o contrato não configura um prêmio ao contratado,mas o único meio de que dispõe a Administração para atender a determinadanecessidade do serviço público, quando não pode fazê-lo diretamente.

A licitação, portanto, não é instaurada para propiciar iguais oportunidades aosinteressados em contratar com o Poder Público (muito embora essa igualdade devaser assegurada em todas as suas fases), mas, isto sim, para facultar àadministração o exame das condições pessoais dos proponentes, a fim de aferir suaidoneidade para executar o objeto do contrato, e a eleição da melhor proposta. Istopor que, diversamente do que ocorre com o particular, que é livre para contratar comquem deseje aquilo que lhe apeteça, a Administração, sujeita aos princípios damoralidade e da finalidade administrativas, obriga-se a celebrar seus ajustes apenascom quem seja idôneo, sob o quádruplo aspecto jurídico, fiscal, técnico e financeiro,e ofereça a proposta mais vantajosa, isto é, a que melhor atenda aos interesses enecessidades do serviço público.

O princípio da licitação é, portanto, uma decorrência daqueles princípiosmaiores, mas o procedimento licitatório só é impositivo nos termos e nos limites dalegislação pertinente. Daí resulta que as contratações dos órgãos não abrangidospelo Decreto-lei n° 200/67 (cf. art. 125), como os do Legislativo e do judiciário daUnião (salvo exigência de normas específicas destes Poderes), estão desobrigadasde prévia licitação. Conseqüentemente, os responsáveis pelos contratos de taisórgãos só responderão pela inexistência de um procedimento cautelar-seletivoprévio apenas nos casos de comprovado dano ao serviço ou ao erário público,resultante de sua omissão. Mas, nas contratações legalmente sujeitas à licitação, oservidor poderá ser responsabilizado pelo simples descumprimento da lei, semprejuízo da invalidação do contrato, mesmo que vantajoso para a Administração.

Conceito de licitação - No seu conceito mais amplo, pode-se dizer que licitaçãoé competição, tal como as disputas desportivas, artísticas ou culturais. em que doisou mais concorrentes, submetidos às regras de participação e ao julgamento deárbitro ou comissão, empenham-se em obter a vitória e os prêmios ou honrariasprometidas. -'este estudo, interessa-nos o seu conceito técnico-administrativo, umavez que o Decreto-lei nº 200/67 erigiu-a em procedimento-condição dascontratações administrativas. É o que nos propomos expressar a seguir.

Já dissemos que licitação é o procedimento administrativo pelo qual aAdministração procura obter a proposta mais vantajosa para a execução de suasobras e serviços, compra de materiais e gêneros, e alienação de seus bens.1 No

1 Cf. nosso Contratações Administrativas, São Paulo, 1971, pág. 53.

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mesmo sentido. HELY LOPES MEIRELLES a considera "procedimentoadministrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta maisvantajosa para o contrato de seu interesse",2 com plena aceitação da maioria dosmodernos monografistas nacionais, colho ADILSON ABREU DALLARI3 e LÚCIAVALLE FIGUEIREDO.4 Todos nós. todavia, omitimos um importante aspecto rioconceito de licitação, qual seja o da verificação da idoneidade dos proponentes.

Com efeito, em qualquer licitação é imprescindível uma fase na qual aAdministração identifica os licitantes e comprova a sua idoneidade para contratar,quando menos sob o ângulo da capacidade jurídica. Essa fase é geralmente formale anterior à seguinte, cm que se toma conhecimento das propostas, mas pode serinformal, como ocorre no convite, e posterior, como acontece com o leilão e com oconcurso. O essencial é que exista e, em qualquer hipótese, anteceda acontratação, pois os negócios administrativos devem ser realizados com pessoacerta, quanto à identidade, e determinada, quanto aos requisitos mínimos exigidospara o ajuste, vale dizer, com pessoa idônea.

Feitas essas ponderações, podemos, agora, formular o conceito de licitaçãonestes termos:

Licitação é o procedimento administrativo, cautelar e seletivo, pelo qual aAdministração verifica a idoneidade dos proponentes e escolhe a propostatrais vantajosa para a contratação pretendida.

A licitação é procedimento por desenvolver-se através de uma sériepreordenada de atos, encadeados lógica e necessariamente para a produção dedeterminado resultado; é procedimento administrativo porque regulada por normasestabelecidas unilateralmente pela Administração interessada, em conformidadecom as disposições legais pertinentes; é procedimento administrativo cautelarporque entre suas finalidades se insere a verificação da idoneidade dos proponentespara a execução do objeto do contrato; é procedimento administrativo seletivoporque outra de suas finalidades é a confrontação das ofertas, para a escolha damais vantajosa.

II - PRINCÍPIOS DA LICITAÇÃO

Em razão do seu caráter competitivo e de suas finalidades, a licitação deveatendimento a determinados princípios que resguardam os participantes de injustadiscriminação, tanto na verificação da idoneidade, quanto no julgamento das ofertas,e protegem a Administração contra os proponentes inidôneos e contra a preferênciapor proposta que não se apresente como a mais vantajosa, nos termos do pedido edo oferecido.

A inobservância desses princípios, nela sempre consubstanciados em normas,pode acarretar a nulidade total ou parcial do procedimento licitatório e a do contratosubseqüente, tais sejam os prejuízos causados aos participantes ou à coletividade.Em certos casos, todavia, a lesividade ao patrimônio público é presumida, comoocorre com a concorrência e a tomada de preços realizadas com desatendimento ou

2 HELY LOPES MEIRELLES, Licitação e Contrato Administrativas, São Paulo, 1977, pág. 5.3 ADILSON ABREU DALLARI, Aspectos Jurídicos da Licitação, São Paulo, 1973, pág. 139, de quemdiscordamos, por conceituar a licitação como procedimento discricionário, quando, na verdade, é vinculado, nomínimo ao instrumento convocatório.4 LÚCIA VALLE FIGUEIREDO, Direitos dos Licitantes e Prerrogativas da Administração, São Paulo, 1977, pág.19.

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diminuição do seu caráter competitivo (Lei nº 4.717, de 29-6-1965, que regula aAção Popular, art. 4°, III, b e c).

Assim, o conhecimento dos princípios básicos da licitação é essencial aointérprete, para a compreensão das normas aplicáveis e para a aferição da validadedos atos e procedimentos licitatórios, bem como dos contratos deles resultantes.Apesar de reconhecerem a relevância desses princípios para a regularidade formal esubstancial de qualquer procedimento seletivo, os doutrinadores ainda nãochegaram a um acordo quanto à sua denominação e, principalmente, quanto à suaenumeração, mas a maioria os condensa em dois ou três, de caráter amplo eabrangente,5 De nossa parte, arrolamos sete,6 tantos quantos enumerou HELYLOPES MEIRELLES, com a seguinte denominação: procedimento formal,publicidade de seus atos, igualdade entre os licitantes, sigilo na apresentação daspropostas, circulação ao edital, julgamento objetivo, adjudicação compulsória aovencedor.7

A nomenclatura proposta pelo consagrado Mestre, embora não coincidainteiramente com a nossa, envolve a mesma matéria e é mais técnica. razão pelaqual preferimos adotá-la neste estudo, em que examinaremos, a seguir os seteprincípios básicos da licitação.

PROCEDIMENTO FORMAL - Qualquer licitação se desenvolve mediante umasérie ordenada de atos, encadeados logicamente para a obtenção do resultado final:a adjudicação do seu objeto ao autor da proposta mais vantajosa.

A licitação é, portanto, procedimento, e, como tal, não pode afastar-se da formapreestabelecida, seja em lei, decreto, regulamento, portaria, caderno de encargos ouno próprio instrumento convocatório. As normas procedimentais constituem garantiapara os licitantes e para a própria Administração, por assegurarem a normalidade doprocedimento, através da fixação da forma de determinados atos, do momento paraa sua prática e de suas condições de validade,

O que o princípio do procedimento formal impõe é, pois, a estrita observânciadas regras procedimentais, mas "não significa que a Administração deva ser"formalista" a ponto de fazer exigências inúteis ou desnecessárias à licitação, comotambém não quer dizer que se deva anular o procedimento ou o julgamento, ouinabilitar ou desclassificar diante de simples omissões ou irregularidades formais nadocumentação ou na proposta, desde que tais omissões ou irregularidades sejamirrelevantes e não causeis prejuízos à Administração ou aos concorrentes", comoadverte HELY LOPES VIEIRELLES, concluindo que: "A regra é a dominante nosprocessos judiciais: não se decreta nulidade onde não houve dano para qualquerdas partes - pas de nullité sans grief. 8

5 CAIO TÁCITO, Direito Administrativo, São Paulo, 1975, págs. 181 e 182; CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DEMELLO, O Edital nas Licitações, in "Boletim do Interior", ed. CEPAM, 57/5; ADILSON ABREU DALLARI, obra cit.,pág. 33; BARTOLOMÉ A. FIORINI Y MATTA, Licitación Pública, Buenos Aires, 1972, págs. 40 e segs.; HÉCTORA. MAIRAL, Licitación Pública, Buenos Aires, 1975, págs. 18 e segs.: SAYAGUÉS LASO, La Licitación Pública,Montevidéuu, 1940, págs. 52 e 53; JOSÉ ROBERTO DROMI, Instituciones de Derecho Administrativo, BuenosAires, 1973, págs. 388 e 389.6 CP. nosso Contratações Administrativas , cit., pág. 53; ampliamos a matéria no estudo Modalidades de Licitação- Obrigatoriedade e Dispensa, in "Estudos Sobre a Lei Paulista 10.395/70", Ed. Cedro, São Paulo. 1971, págs.61 a 63.7 HELY LOPES MEIRELLES, obra cit., págs. 10 e segs.8 HELY LOPES MEIRELLES, obra cit., pág. 11.

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Esclareça-se, finalmente, que o princípio do procedimento formal, além daobediência aos atos e sua seqüência, aos termos e aos prazo procedimentais,obriga, ainda, à observância da modalidade de licitação prevista para determinadacontratação, a qual só pode ser substituída por outra nos casos expressamenteadmitidos em lei. É o que ocorre com o Decreto-lei n° 200/67, que autoriza autilização da concorrência ao invés da tomada de preços, sempre que a autoridaderesponsável o entender conveniente (art. 127, § 7°) .

PUBLICIDADE - A publicidade de seus atos é fundamental para a validade dalicitação que, voltamos a insistir, não passa, em última análise, de uma competiçãopública entre particulares, para o atendimento de determinada necessidade daAdministração. Por isso mesmo, não pode haver licitação sigilosa, como reconheceo Decreto-lei nº 200/67, ao considerá-la dispensável (melhor diria dispensada)quando a sua realização puder comprometer a segurança nacional, a juízo doPresidente da República(art. 126, § 2°, b).

A publicidade, nas licitações, apresenta dois aspectos distintos, consoante serefira à divulgação dos instrumentos convocatórios ou ao conhecimento que osparticipantes (e os administrados em geral) devam ter dos atos subseqüentes,através de presença em sessões, publicações oficiais e fornecimento de certidões.

No que concerne à divulgação dos instrumentos convocatórios, para que hajapleno atendimento ao princípio da publicidade, o prazo entre a publicação do avisode abertura (ou da entrega da carta-convite, no convite) e a data designada para orecebimento das propostas deve ser proporcional à complexidade do objeto dalicitação e à amplitude da área de competição.

Lembramos, a esse propósito, que a concorrência caracteriza-se pela grandecomplexidade de seu objeto em regra menor na tomada de preços e pequena noconvite. Por outro lado. a área de competição, na c6ncorréncia, aberta a qualquerinteressado que satisfaça aos requisitos mínimos de participação, é ampla; natomada de preços, dirigida exclusivamente aos já cadastrados pela Administração, élimitada; no convite, acessível apenas aos diretamente convidados. é restrita. Daípor que o Decreto-lei nº 200/67 fixou os prazos de convocação em, pelo menos,trinta dias para a concorrência, quinze dias para a tomada de preços e três (lias úteispara o convite (arts. 129 e 127, § 4º), passíveis, os dois primeiros, de redução àmetade por lei estadual (Lei nº 5.456, de 20-6-1968, art. 3º).

Esses prazos são os mínimos que a Lei considera satisfatórios para oatendimento do princípio da publicidade. Todavia, confundindo-se coro os prazospara a elaboração das propostas, devem ser ampliados sempre que a complexidadedo objeto de determinada licitação o exigir. A inobservância de proporcionalidadeentre o prazo de convocação e o 'necessário para o preparo da oferta, de modo aimpedir a participação de interessados ou a favorecer quem tenha tido conhecimentoantecipado da abertura da licitação, afronta o princípio em exame, tipificandocomprometimento do caráter competitivo do certame ou limitação das possibilidadesnormais de competição. Trata-se de irregularidade que pode ensejar a invalidaçãodo procedimento, a partir da divulgação do instrumento convocatório, e até mesmo anulidade do contrato subseqüente, nos precisos termos da Lei n° 4.717/65 (art. 4°,III, b e c). Atento a essa realidade, o Decreto federal nº 3.140, de 9-11-1973,determina que, nas concorrências e tomadas de preços para a contratação de obrase serviços de engenharia, os prazos de convocação, respeitados os mínimos legais,

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sejam fixados "em função do valor e da complexidade da obra ou serviço a executar"(art. 12, I e II ).

Quanto ao segundo aspecto pelo qual se deve encarar a publicidade naslicitações, ou seja, o da divulgação dos atos seguintes ao da convocação dosinteressados, advertimos que as decisões referentes à habilitação dos licitantes ouao julgamento das propostas, sejam de pessoa física ou de comissão, não precisamser tomadas em público. Tanto a apreciação dos documentos comprobatórios daidoneidade, quanto a das propostas pode ser feita, como normalmente, o é, a portasfechadas. O essencial, para o princípio da publicidade, é que a abertura dosrespectivos invólucros ocorra em ato público, facultando-se o exame de seuconteúdo aos participantes, e que as deliberações sobre habilitação, classificação eadjudicação sejam devidamente publicadas, ensejando aos interessados, ou aqualquer cidadão, se for o caso, o recurso às vias administrativas e judiciaiscompetentes.

IGUALDADE ENTRE OS LICITANTES - O princípio da igualdade entre oslicitantes impõe que o procedimento licitatório, desde a convocação até o ato final.não se despoje do seu caráter competitivo, para transformar-se em instrumento deprivilégio ou desfavor a participante. Daí a sua importância para a seriedade dalicitação, reconhecida pela grande maioria dos doutrinadores9, havendo quem, commuita razão, considere a isonomia entre os participantes a matriz dos demaisprincípios. 10

A finalidade última da licitação é a escolha da melhor proposta, de modo que oprocedimento visa a oferta e não à pessoa do ofertante. Todavia, por força doprincípio da moralidade administrativa, só pode ser admitido no certame, comocandidato ao futuro contrato, quem demonstre possuir os requisitos mínimos decapacitação jurídica, técnica e financeira, bem corno de regularidade fiscal, exigidospara a execução do seu objeto, vale dizer, o proponente idôneo. Destarte, sãoperfeitamente legítimas as exigências relativas à capacidade para contratar com aAdministração (capacidade jurídica), à capacidade para executar o objeto dalicitação (capacidade técnica) e à capacidade para arcar com os ônus financeirosdecorrentes do contrato (capacidade financeira, ou "idoneidade financeira", segundoa Lei nº 6.946, de 17-9-1981, art. 4º). Quaisquer outras silo descabidas e ilegais,mormente quando consubstanciam real favorecimento a licitante, em detrimento dosdemais, transformando a licitação em mera formalidade para justificar a adjudicaçãodo seu objeto a proponente previamente escolhido.11

É desnecessário buscar no § 1º do art. 153 da Constituição da República(princípio da isonomia) o fundamento do princípio em exame, pois o tratamentoisonômico dos proponentes, impedindo sejam desigualados os iguais e igualado osdesiguais, é da natureza mesma da licitação, que seria inócua se, através ou adespeito dela, o administrador público pudesse fazer vingar seus sentimentos

9 HELY LOPES MEIRELLES, obra cit., pág. 13; cf. também os autores citados na nota 5, retro. HÉCTOR A.MAIRAL, que adota posição idêntica à nossa, adverte que "sólo es posible una real competencia de precioscuando se coloca a los oferentes en uno pie de lgualdad, evitando discriminaciones o tolerancias que favorezcana unos en detrimiento de otros" (obra cit., pág. 19).10 CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, obra cit., pág. 6, onde, depois de arrolar quatro princípios,encabeçados pelo da isonomia, conclui que: "Sem embargo, julgamos que todos descendem do primeiro, poissão requisitos necessários à sua existência ou à fiscalização de sua real ocorrência".11 Na esteira dessa doutrina, o Tribunal de Justiça de São Paulo já decidiu que: "É ilegal a discriminação entreconcorrentes, em licitação pública, tal como a exigência de fornecimento de materiais, de forma a excluir grandenúmero de concorrentes" (TJSP Rev. Dir. Adm. 110/249).

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pessoais de predileção ou repúdio por determinado competidor, com ou semprejuízo para a Administração.

Reitere-se, porém, que, no interesse do serviço público, a Administração pode(e deve, sempre que necessário) estabelecer requisitos mínimos de capacitaçãojurídica, técnica e financeira, e exigir prova de situação regular perante o Fisco, a fimde evitar a participação de interessado que, se vencedor não teria condições decelebrar ou de executar plenamente o contrato. O essencial para a sua validade éque essas exigências guardem estrita correlação com o objeto da licitação, como,acertadamente, prescreve o Decreto n° 73.140/73, a propósito da habilitação emconcorrência para a execução de obras e serviços de engenharia (art. 21, § § 4° e5°) .

SIGILO NA APRESENTAÇÃO DAS PROPOSTAS - O sigilo na apresentaçãodas propostas é também importantíssimo para a salvaguarda do caráter competitivodas licitações, tendo a assegurá-lo, no caso da concorrência, norma penal que punecom detenção e multa o funcionário que devassá-lo ou propiciar a outrem aoportunidade de fazê-lo (Código Penal, art. 326).

O sigilo na apresentação das propostas deriva naturalmente do princípio daigualdade entre os licitantes, uma vez que o conhecimento prematuro das ofertas deoutros competidores ensejaria ao proponente injusta vantagem sobre estes.

Com efeito, se a Administração, através do procedimento licitatório, pretendeobter a melhor proposta, o licitante, por seu turno, procura ganhar o contrato,superando seus concorrentes pelo oferecimento de maiores vantagens, dentro desuas possibilidades e do permitido no instrumento convocatório. Interessa-lhe,portanto, manter sua proposta em segredo, a fim de que outro interessado, tomandoconhecimento dela, não venha a melhorar sua própria oferta.

A responsabilidade pelo sigilo das propostas, desde que lhe foram entregues, éda Administração que, por isso mesmo, deve exigir a sua apresentação eminvólucros indevassáveis. A quebra do sigilo, antes do momento oportuno, ou seja,da sessão pública de abertura das propostas, pode ensejar a nulidade doprocedimento.

VINCULAÇÃO AO EDITAL - Através do edital, convite ou que outro nome sedê ao instrumento convocatório, a Administração expõe, de modo definitivo, a suapretensão, e estabelece, por assim dizer, as regras do jogo para aquele determinadocertame, consubstanciadas nas disposições pertinentes às condições departicipação, à forma e ao momento para a prática dos atos procedimentais, aocritério para a valoração das propostas, às cláusulas do futuro contrato.

Ora, ninguém, em sã consciência, participaria de uma competição na incertezada permanência de suas regras, pelo menos durante o seu curso regular. Assim, aose apresentarem à licitação, os interessados confiam em que Administração ecompetidores agirão em consonância com as prescrições do edital e das leis,decretos, regulamentos, portarias, cadernos de encargos, que, em razão de suasupremacia hierárquica, integram o instrumento convocatório, tenham ou não sidoreproduzidos em seu texto. Por isso mesmo é que as alterações das normas legaispertinentes ressalvam sempre as licitações em andamento, embora nãoprecisassem fazê-lo, porquanto, excetuados os aspectos meramente formais, nãopoderiam, validamente, influir nas regras do jogo em andamento.

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Os termos do instrumento convocatório são, pois, vinculantes para aAdministração e para os competidores; são lei entre estes e aquela, no consensodoutrinário e jurisprudencial.12 Do disposto no instrumento convocatório não poderãofugir os licitantes, pena de alijamento do certame, nem a Administração pena deinvalidação do procedimento. É regra que não admite exceções, nem pode serpostergada, ainda que em benefício do serviço público.13 Assim, se a Administração,pelo exame de alguma proposta, concluir pela inviabilidade do pedido emdeterminada licitação ou pela possibilidade de maiores vantagens, não previstas noedital ou convite, deverá revogá-la, para que outra se instaure, com as necessáriasalterações. Com isso, propiciará a apresentação de novas ofertas e a participaçãode outros interessados, que talvez não tenham atendido à primeira convocaçãojustamente pelas imperfeições do respectivo instrumento.

O princípio da vinculação ao edital foi expressamente endossado pelo Decreton° 73.140/73, ao determinar que "qualquer alteração do edital, durante a fluência dorespectivo prazo, implicará sua prorrogação por número de dias igual ao dosdecorridos entre a primeira publicação do aviso de licitação e a do aviso daalteração, usando-se, para a divulgação desse fato, os mesmos meios que servirampara noticiar a licitação"( artigo 6°, VI). Essa providência é impositiva, em qualquermodalidade de licitação, sempre que ocorra modificação substancial do respectivoinstrumento convocatório, obrigando também à devolução das propostas jáentregues, para a sua adequação às novas prescrições, se for o caso. Sementeassim ter-se-á atendido aos princípios .da vinculação e da publicidade, bem como aoprincípio maior da igualdade entre os participantes.

JULGAMENTO OBJETIVO - A despeito de todas as cautelas preliminares,tendentes a resguardar o seu caráter competitivo, a licitação se descaracterizaria seas propostas pudessem ser julgadas discricionariamente. É que, com isso, perderiaa sua razão de ser, condensada no momento culminante do confronto das ofertas,para a eleição da mais vantajosa.

É fundamental, portanto, que o julgamento seja objetivo, isto é, que se realizeem conformidade com o critério preestabelecido no instrumento convocatório,levando-se em consideração exclusivamente os fatores nele mencionados. É porisso, exatamente, que o Decreto-lei n° 200/67 exige que o edital fixe o "critério dejulgamento das propostas" (art. 13, IV) e especifique os fatores a seremconsiderados na valorização delas, tais como a qualidade, o rendimento, os preços,as condições de pagamento, os prazos, tendo em vista, sempre, o interesse doserviço público (art. 133) .

De acordo com o princípio em exame, é imperativo que até mesmo o critério eos fatores de julgamento sejam objetivos, no sentido de pertinentes e adequados aoobjeto da licitação. Além disso, devem ser expressamente consignados noinstrumento convocatório, de modo que, substituindo-se o julgador, o resultado finalnão se altere, em que pese a margem de subjetivismo inerente a qualquerjulgamento humano.

12 Cf. HELY LOPES MEIRELLES e CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, obras cits., págs. 16 e 8,respectivamente. Para o Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, a "concorrência pública é um procedimentovinculado cuja violação acarreta a sua nulidade" (TASP Rev. Dir. Admi. 87/208).13 Segundo HÉCTOR A. MAIRAL, "tos oferentes no pueden apartarse del pliego de condiciones ni sun aduciendoofrecer articules de mayor calidad, pues los demás oferentes pudieram haber ofrecido idênticos articulos, dehaberselos previsto en los pliegos" (obra cit., págs. 19 e 20).

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Conseqüentemente, afrontam o princípio do julgamento objetivo, sujeitando-seà anulação, os instrumentos convocatórios que consignam critérios e fatores vagos,impertinentes ou inadequados ao objeto da licitação, ou, o que é pior, deixam o seuestabelecimento ao alvedrio do julgador, após o conhecimento das propostas.

ADJUDICAÇÃO COMPULSÕRIA AO VENCEDOR - Corolário do princípio dojulgamento objetivo, o da adjudicação compulsória veda que o objeto da licitaçãoseja adjudicado a outrem que não o seu legítimo vencedor.

Advirta-se que só se pode considerar legítimo vencedor o autor da propostaque, examinada e confrontada objetivamente com as demais, à vista dos fatores devaloração e em estrita conformidade com o critério de julgamento previamenteestabelecido, contiver as maiores vantagens para a Administração. Assim, somentea ele poderá ser adjudicado o objeto da licitação, isto é, ser reconhecido o direito aocontrato, se e quando a Administração resolver celebrá-lo, sob pena dedesatendimento à finalidade primeira do certame, que, como vimos, é a escolha daproposta mais vantajosa.

Julgamento ou adjudicação desvinculada do edital é, pois, ilegítima, cabendo aquem deveria ter sido declarado vencedor recorrer às vias judiciais, inclusivemediante mandado de segurança,14 se a Administração, espontaneamente ou porprovocação sua, não corrigir o erro. Isto por que, a par do interesse público naobtenção da proposta mais vantajosa, a adjudicação cria, para o adjudicatário, odireito subjetivo ao contrato, passível de reconhecimento pelo Poder judiciário.

14 Parece-nos oportuno transcrever aqui esta excelente decisão do Tribunal Federal de Recursos, sobre aviabilidade do mandado de segurança para o resguardo de direitos preteridos em concorrência: "Todo aqueleque entra numa concorrência tem o direito de a ver processada regularmente, de acordo com a lei queestabelece seus pressupostos essenciais. Se ela se processou fora dos termos da Lei (ou do Edital), oconcorrente desatendido ou prejudicado tem direito de a ver anulada e ainda por mandado de segurança, pois háum direito seu, lesado com a realização de atos nulos" (TFR Rev. Dir. Adm. 42/251; no mesmo sentido: TASPRev. Tribs. 363/371).E, a propósito do princípio estudado acima, anote-se esta, do Tribunal de Justiça de são Paulo: "Não é licito àAdministração adjudicar o objeto da concorrência pública a quem não foi vencedor na licitação" (Rev. Tribs.227/163).

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IMPEDIMENTO DE MEMBROS DOS TRIBUNAIS DECONTAS: O INCISO II, ARTIGO 36 DA LOMAN (LEI

ORGÂNICA DA MAGISTRATURA NACIONAL)

Luiz Navarro de Britto

A escolha do tema desta conferência foi-me sugerida por uma recente consultasubmetida ao Tribunal de Contas da Bahia e sobre a qual me prenunciei comoChefe da Procuradoria do Estado junto àquela Corte.

O estudo da matéria pode ser desdobrado em duas partes fundamentais: I - aextensão aos membros dos Tribunais de Contas do impedimento previsto no incisoII, art. 36 da Lei Complementar nº 35/79; II - a competência para julgar essesimpedimentos.

I - O IMPEDIMENTO

Referindo-se ao Tribunal de Contas da União, diz o § 3º, art. 72 da Lei Maior daRepública:

"§ 3° Os seus Ministros serão nomeados pelo Presidente da República, depoisde aprovada a escolha pelo Senado Federal, dentre brasileiros, maiores de trinta ecinco anos, de idoneidade moral e notórios conhecimentos jurídicos, econômicos efinanceiros ou de administração pública, e terão as mesmas garantias, prerrogativas,vencimentos e impedimentos dos Ministros do Tribunal Federal de Recursos" (osgrifos não são do texto).

Reportando-se à organização dos Estados, o inciso IX, art. 13 da mesmaConstituição Federal determina:

"IX - a aplicação, no que couber, do disposto nos itens I o III do art. 114aos membros dos Tribunais de Contas, não podendo o seu número sersuperior a sete."

O artigo e incisos indicados são os seguintes:

"Art. 114. É vedado ao juiz, sob pena de perda do cargo judiciário:

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I - exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função, salvoum cargo de magistério superior, público ou particular, e nos casos previstosnesta Constituição;

II - receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, porcentagens oucustas nos processos sujeitos a seu despacho e julgamento; e

III - exercer atividade político-partidária."

Acompanhando o mandamento federal, as Constituições dos Estados tambémconsagram a equiparação dos Conselheiros dos Tribunais de Contas aosdesembargadores. A Lei Maior do Estado da Bahia, por exemplo, assim dispõe noseu art. 45:

"Art. 45. O Tribunal de Contas, com sede na Capital e jurisdição sobretodos os órgãos da administração centralizada e descentralizada do Estado,compõe-se de sete conselheiros, nomeados pelo Governador, com préviaaprovação da Assembléia Legislativa, dentre brasileiros maiores de 35 anos,de idoneidade moral e notórios conhecimentos jurídicos, econômicos,financeiros ou de administração pública, e terão os mesmos direitos, garantiasprerrogativas, vencimentos e impedimentos dos desembargadores do Tribunalde Justiça" (o grifo não é do texto).

No Distrito Federal, embora a Lei n° 5.538/68 não mencione expressa eglobalmente a aludida equiparação, os seus arts. 5° e 6° ocupam-se das garantias eimpedimentos dos Conselheiros, transcrevendo com pequenas variações osdispositivos da Lei Orgânica do Tribunal de Contas a União que disciplinam oassunto.

Não há dúvida, portanto, quanto ao agasalho jurídico da extensão dosimpedimentos dos magistrados aos Ministros e Conselheiros dos Tribunais deContas. já a súmula 42 -do Supremo Tribunal Federal há muito declaraenfaticamente: "É legítima a equiparação de juízes do Tribunal de Contas, emdireitos e garantias, aos membros do Poder Judiciário".

Mas, além dos impedimentos explicitamente referidos, no texto da CartaMagna, a "Lei Complementar, denominada Lei Orgânica da Magistratura Nacional"(Parágrafo único, art. 112 da Constituição) também estabelece no inciso II do seuart. 36:

"Art. 36. É vedado ao magistrado:

II - exercer cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação oufundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe,e sem remuneração."

Ora, tratando-se de Lei Complementar e reconhecida a equiparação aosmagistrados, dos membros dos Tribunais de Contas, esses impedimentos alcançampor conseqüência os seus Ministros e Conselheiros.

Certo, as Leis Orgânicas das Cortes de Contas disciplinam a matéria, de modoaliás quase uniforme, tomando como modelo o art. 69 do Decreto-lei nº 199/69,concernente ao Tribunal de Contas da União:

"Art. 69 É vedado ao Ministro do Tribunal de Contas, sob pena de perdade cargo:

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I - exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública,salvo em cargo de magistério e nos casos previstos na Constituição Federal.

II - exercer atividades político-partidária.

III - exercer comissão remunerada, inclusive em órgãos de controlefinanceiro da Administração Direta ou Indireta.

IV -exercer qualquer profissão liberal, emprego particular, sercomerciante, sócio, gerente ou diretor de sociedades comerciais, salvoacionista de sociedades anônimas ou em comandita por ações.

V - celebrar contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia,empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionáriade serviço público, salvo quando o contrato obedecer a normas uniformes."

Essas disposições também constantes das legislações estaduais e do artigo 69da Lei 5.538/68, desta Corte do Distrito Federal, não ilidem contudo a aplicação dasnormas consagradas na LOMAN, até porque as primeiras são muito anteriores àEmenda Constitucional n° 7/77 e, por conseguinte, à Lei Orgânica da MagistraturaNacional. Os preceitos desta última atingem os membros de todos os Tribunais deContas, pois "ministros e conselheiros - escreve DÉCIO CRETTON - têmimpedimentos iguais aos dos juízes, como sustentáculos indispensáveis da suaimparcialidade e independência" (Estatuto da Magistratura Brasileira, Rio, EdiçãoSaraiva, 1980, p. 189).

Pode-se reclamar, na Lei Complementar n° 35/79, o exagero e inconveniênciasobretudo do item II do seu artigo 36. Sugerindo a sua supressão, quando o projetotramitava no Congresso, o deputado JOSÉ BONIFÁCIO NETO observou com todoacerto:

"O item coloca à margem da vida social toda a magistratura pois lheveda participar, ativamente de todas as instituições sociais, mesmo asbeneficentes. Traz, portanto injustificável restrição do Direito. A realidadenacional mostra no dispositivo em epígrafe, que as direções das SantasCasas de Misericórdia, dos Clubes de Serviços, das Fundações dedicadas àinfância desvalida, à recuperação de menores, etc., são tradicionalmenteentregues aos magistrados como garantia da seriedade de sua atuação e porforça de sua experiência com os problemas humanos; a Santa Casa daMisericórdia do Rio de janeiro, a Fundação Mello Mattos, a Fundação RomãoDuarte, entre muitas que subsistem no país graças à dedicação dosmagistrados e sua: esposas, são belos exemplos que justificam, por si, asupressão proposta."

Na mesma oportunidade, o deputado NELSON MARCHEZAN justificou outraemenda supressiva, de sua autoria, lembrando:

"A restrição do inciso não é prevista na Constituição, nem da Emenda n°7. Fere o artigo 153 §§ 1° e 2° da Constituição, que assegura a igualdade detodos perante a lei, bem como a liberdade de associação. A mencionadarestrição afronta os artigos VII, XX e XXVII da Declaração dos DireitosHumanos. Representa verdadeira cassação da cidadania, isolando o juiz dequalquer participação na vida social. Todo o cidadão não só tem o direito, maso dever de participar da vida social: contribuindo no seu desenvolvimentocultural, social, religioso, artístico, colaborando na promoção da pessoa

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humana, pelas mais diversas formas, independentemente de uma açãopolítica e do exercício de uma atividade profissional.

A prevalecer o inciso, será vedada uma participação mais atuante emqualquer cargo de direção de diversas associações, desde as culturais, até asfilantrópicas" (in Paulo C.A. Lima -Lei Orgânica da Magistratura Nacional, Riode janeiro, Edições Trabalhistas S.A. - 1979, pp. 111 e 112).

Todos esses argumentos procedem e é bem provável que o CongressoNacional ainda venha a corrigir a norma equivocada. Porém a lei existe e comrespaldo na Constituição da República. O inciso I do seu artigo 114, antes daEmenda n° 7/77, proibia apenas o exercício de "qualquer outra função pública". Aredação vigente refere-se a "qualquer outra função" o que permitiu a amplituderezada na Lei Orgânica da Magistratura Nacional, impedindo o exercício de cargo de"direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, de qualquernatureza ou finalidade, salvo de associação de classe e sem remuneração".

Segundo alguns autores os impedimentos operam automaticamente, sem oimpulso e a execução de qualquer procedimento. O consagrado PONTES DEMIRANDA, por exemplo, afirma que se o "juiz aceita outra função pública, perde,ipso iure, o cargo. A regra jurídica constitucional, doutrina o Mestre, é bastante emsi, é self-executing". (Comentários à Constituição de 1967 - Com a Emenda n° 1, de1979, S. Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2ª edição, 1970, p. 579. )

O Supremo Tribunal Federal tem, no entanto, concluído de modo contrário. NoRecurso Extraordinário n° 69.851-RN, o Ministro BILAC PINTO lembrou a propósito"uma experiência pessoal. Ao ser nomeado para a Embaixada em Paris, entendi quea mera aceitação dessa missão diplomática permanente, importava na perdaautomática do mandato. Não desejava renunciar, precisamente porque consideravaque havia perdido o mandato. Assim não entendeu a Câmara de Deputados. Ourenunciava ao mandato ou seria instaurado o processo de sua perda. Fui, assim,forçado a renunciar a um mandato que já considerava perdido. Há certa analogiacom o presente problema, no sentido de que normas constitucionais desse tipo nãosão auto-executáveis" (in Revista Trimestral de jurisprudência, Brasília, STF 1971,vol. 57, pp. 267 e 288).

Relatando caso também semelhante na Ação Rescisória n° 269-GB, o MinistroADALICIO NOGUEIRA relembrou que desde a sessão do Supremo TribunalFederal, de 12 de novembro de 1937, "em que se leu a carta a este dirigida peloeminente Ministro Hermenegildo de Barros, que decidira afastar-se de seu cargo,desde que atingira a idade limite para a compulsória e entendera ser estaautomática, o Pretório Excelso, por unanimidade dos seus preclaros componentes,pensava de modo contrário. Interpretara o dispositivo constitucional em foco nosentido de ser necessário o ato declaratório de aposentadoria, o decreto que aformalizasse". (in Revista Trimestral de jurisprudência, Brasília, Supremo TribunalFederal, 1967, vol. 43, pp. 571 e 572. )

No caso presente, parece indiscutível a necessidade de sentença judicial paraque se configure a perda do cargo de Ministro ou de Conselheiro. Para tanto, porsua iniciativa ou provocado pelo Corte de Contas, o Procurador-Geral competentedeverá tomar as providências cabíveis. Resta entretanto a pergunta: a quemrepresentar?

II - A COMPETÊNCIA PARA JULGAR

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Os Tribunais de Contas não podem decidir sobre os impedimentos dos seusMembros que importem em perda do cargo.

Dir-se-á que se trata de "matéria de sua administração interna" decorrente daregra maior inserida no inciso 111, do art. 115 da Constituição da República,aplicável ao Tribunal de Contas da União por força do parágrafo 1°, art. 72 damesma Carta e extensiva ao âmbito dos Estados.

Mas, em verdade, nem as Leis Orgânicas das Cortes de Contas nem os seusrespectivos Regimentos Internos cogitam do assunto. E não poderiam fazê-lo,porque ele envolve o princípio constitucional da vitaliciedade cuja abrangência, peloseu próprio significado e natureza, extrapola largamente a esfera de atribuições"interna corporis" desses Colegiados. Com efeito, a vitaliciedade é uma dasgarantias asseguradas aos membros do Poder judiciário e dos Tribunais de Contasque, nos termos do inciso I, art. 113 da Carta Magna Federal não podem "perder ocargo senão por sentença judiciária". O Acórdão do Supremo Tribunal Federal,julgando o Recurso Extraordinário n° 69.851, negou aos Tribunais de Contascompetência até mesmo para sobrestar o exercício do cargo de Conselheiro porconstituir esse ato antecipação de sentença judiciária que o Tribunal (de Contas)não poderia de modo algum praticar". Cuidando-se de perda de cargo, sublinha oSenhor Ministro Relator, ela "só poderá verificar-se mediante sentença do juiz" (inRevista Trimestral de Jurisprudência, Brasília, Supremo Tribunal Federal, 1971, vol.57, p. 269). Visando resguardar a independência dos seus titulares, a solenidadeconstitucional do preceito lhe preserva controle e decisórios exclusivos. Não podemassim os Tribunais de Contas apreciá-lo ou arbitrar sobre o seu exercício.

Certo, a Lei Orgânica da Magistratura inovou, no particular, ao prever a perdado cargo de magistrado vitalício "em procedimento administrativo". Eis o texto doinciso II, art. 26 da Lei Complementar n° 35/79:

"II - em procedimento administrativo para a perda do cargo, nas hipótesesseguintes:

a) exercício, ainda que em disponibilidade, de qualquer outra função, salvo emcargo de magistério superior, público ou particular;

b) recebimento, a qualquer título e sob qualquer pretexto, de percentagens oucustas nos processos sujeitos a seu despacho e julgamento;

c) exercício de atividade político-partidária."

A inconstitucionalidade desses dispositivos é manifesta. Observe-se aliás quena redação do caput do art. 26, aprovada pelo Congresso Nacional, lia-se aexpressão "por sentença judiciária definitiva" e o Senhor Presidente da República avetou argüindo que "inutilizaria a alternativa do procedimento administrativo" (Ver LeiOrgânica da Magistratura Nacional, Brasília, Senado Federal, 1980, 2P1 edição, p.22). O veto foi aceito. Guardou-se assim a coerência interna do novo texto econtrariou-se a regra impositiva da Constituição que subordina exclusivamente aperda do cargo de magistrado a "sentença judiciária".

A Lei Orgânica continua porém em vigor e o seu art. 27 com os seus 8 longosparágrafos descrevem detalhadamente toda a tramitação do processoadministrativo. O caput do artigo e seus três últimos parágrafos dizem o seguinte:

"Art. 27. O procedimento para a decretação da perda do cargo terá iníciopor determinação do Tribunal, ou do seu órgão especial, a que pertença ou

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esteja subordinado o magistrado, de ofício ou mediante representaçãofundamentada do Poder Executivo ou Legislativo, do Ministério Público ou doConselho Federal ou Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil.

§ 6° O julgamento será realizado em sessão secreta do Tribunal ou doseu órgão especial, depois de relatório oral, e a decisão no sentido dapenalização do magistrado só será tomada pelo voto de dois terços dosmembros do colegiado, em escrutínio secreto.

§ 7° Da decisão publicar-se-á somente a conclusão.

§ 8° Se a decisão concluir pela perda do cargo, será comunicada,imediatamente, ao Poder Executivo, para a formalização, do ato."

Essa "decisão", em sua exegese discutível, pode ser assimilada a uma"sentença judiciária". O ato final, após instrução contraditória, partirá do Poderjudiciário. Essa assimilação entretanto não pode ser aproveitada no que diz respeitoaos Tribunais de Contas. A competência judicante destes últimos é muito limitada,adstrita à "fiscalização da execução orçamentária" (Ver J. B. Pedreira Lapa -Decisões dos Tribunais de Contas e a Coisa Julgada, Salvador, 1981, mímeo p. 2) eno exercício da função de órgão de controle externo, auxiliar do Poder Legislativo.Por isso mesmo, nem o seu Plenário, nem qualquer "órgão especial" de outro Poderteria competência para proferir `julgamento ou "decisão" similar. Escrevendo antesda publicação da Lei Orgânica, LINCOLN T. M. P. DA LUZ ressaltava: "estoupersuadido de que a perda do cargo vitalício de Ministro ou Conselheiro de Tribunalde Contas só poderá ocorrer - seja o veto aceito ou rejeitado - como conseqüênciade sentença judiciária, não tendo cabimento cogitar-se da perda de um dessescargos mediante simples procedimento administrativo, o que equivaleria à negaçãoda garantia da vitaliciedade" ("A Lei Orgânica da Magistratura e o Tribunal de Contasdo Distrito Federal" in Revista do Tribunal de Contas do Distrito Federal, Brasília,1979, vol. n° 9, p. 248) .

Pode-se indagar se, considerando o interesse manifesto do órgão, não seriapertinente que o plenário do colegiado respondesse a consultas formuladas pelosseus próprios Membros sobre a questão.

Não discuto esse interesse. Mas a competência dos Tribunais de Contas pararesponder consultas limita-se às matérias sobre as quais eles podem decidir. Todasua resposta envolvendo os impedimentos implicará sempre em uma apreciaçãoinócua, com repercussões que podem ferir a autoridade da Egrégia Corte e atécausar danos de extrema gravidade. Lembre-se o fato ocorrido no Tribunal deContas do Rio Grande do Norte. Depois do Plenário conceder licença expressa paraque um dos seus Conselheiros assumisse a Presidência do Banco do Estado, opróprio Tribunal sustou mais tarde, também, ilegalmente a reassunção do mesmoConselheiro ao seu cargo vitalício, "como medida acautelatória de futuras nulidadesjurídico-processuais nos julgamentos afetos a este Tribunal" (Ver RecursoExtraordinário n° 69.851-RN - in Revista Trimestral de jurisprudência op. e vol. cits,p. 261).

Concluo, portanto, que mesmo revestida do caráter de consulta, a questão nãopode ser formalmente apreciada pelos Tribunais de Contas. No silêncio dalegislação, a lógica e o bom senso aconselham que se recorra às normas da letra b,inciso I, art. 119 e letra b, inciso I, art. 122 da Constituição Federal, dispositivos

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esses que ordenam as competências do Supremo Tribunal Federal e do TribunalFederal de Recursos para processarem e julgarem originariamente, "nos crimescomuns e de responsabilidade", respectivamente, os Ministros do Tribunal deContas da União e os Conselheiros dos Estados e do Distrito Federal.

O reconhecimento ao Supremo Tribunal Federal e ao Tribunal Federal deRecursos da competência de "processar e julgar" a perda de cargo dos Membrosdas Cortes de Contas importará em uma exegese analógica e extensiva, por issomesmo imperfeita. Mas, rejeitado esse recurso hermenêutico, chegar-se-á aoentendimento absurdo de que Suas Excelências, além das mesmas "garantias,prerrogativas, vencimentos e impedimentos" dos magistrados, detêm aindaimunidade à perda de seus cargos, prevista no art. 114 da Lei Maior da República,pela inexistência de órgão próprio para decidir sobre os seus impedimentosfuncionais. Inaceitável este privilégio, que contraria e tolhe a norma constitucional,parece de todo concernente à competência dos Tribunais Superiores citados.Observe-se, aliás, que entre as vedações constantes do art. 114, o item III refere-sea "exercer atividade político-partidária". Ora, esse mesmo impedimento, repetindoexpressões idênticas, constitui crime de responsabilidade para os Ministros doSupremo Tribunal Federal, conforme dispõe o item 3, art. 39 da Lei n° 1.079/50 que"define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo e julgamento".Não se estaria então incorrendo em absurdo recorrer-se aos arts. 119 e 122 daConstituição para fazer cumprir a regra do seu art. 114.

CONCLUSÃO

Em suma, de todo o exposto, parece indiscutível que os Membros dosTribunais de Contas acham-se submetidos à norma proibitiva do inciso II, art. 36 daLei Orgânica da Magistratura Nacional que veda ao magistrado o exercício decargos "de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, dequalquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe, e semremuneração".

Por outro lado, no silêncio dos textos pertinentes, entendo que cabe aoSupremo Tribunal Federal e ao Tribunal Federal de Recursos julgarem,respectivamente, os Ministros do Tribunal de Contas da União e os Conselheiros dasCortes de Contas do Estado e do Distrito Federal, em todos os casos deimpedimento de que decorram a perda dos seus cargos vitalícios.

No que diz respeito à regra constante do inciso lI, art. 36 da Lei Orgânica daMagistratura Nacional, pode-se discutir a sua constitucionalidade. Mas, a intolerânciada sua abrangência desafia o bom senso e aconselha, portanto, a imediata revisãodo legislador.

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CONTROLE DE LEGALIDADE DOS CONTRATOSPELO TRIBUNAL DE CONTAS

José Borba Pedreira Lapa

SUMARIO

1. Contratos administrativos e contratos daadministração: desvalia do questionamento.

2. Controle administrativo, de legalidade ou legitimidadee jurisdicional: Conceito. Distinção e competência.

3. Os contrates relacionados com a despesa pública e asubtração de competência constitucional para o julgamento desua legalidade pelos Tribunais de Contas.

4. Criação do controle externo e o poder de inspeção.Competência constitucional restrita ao exame da legalidadedas despesas, decorrentes ou não de contratos, pelas Cortesde Contas.

5. Liquidação da despesa. Exame dos diversoscomponentes e fases da despesa. Julgamento da regularidadedas contas e a função balizadora dos contratos relacionadoscom a despesa pública. Efeitos.

* * *

Ao iniciar esta explanação, permitam-me agradecer o privilégio de mais umavez, a convite deste egrégio Tribunal de Contas, por indicação do eminenteProfessor ROBERTO ROSAS, retornar ao convívio de seu consagrado CENTRO DEESTUDOS. Não entretanto, sem as sofridas e angustiantes apreensões daincidência do convidado, agravadas, no momento, por aqueloutras conseqüentes doprocesso de restauração das franquias democráticas em que o povo brasileiro seempenha, mais que antes, para a conquista de melhor destino no futuro.

Esta exposição parte da premissa que tem por desvalioso o questionamentoobjetivando contratos administrativos e contratos da administração pública, comoentes distintos. Uma vez considerada a inexistência, em nosso País, da dualidade dejurisdição, perde todo e qualquer interesse, prático sobremodo, porfiar derredor à

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existência ou não de verdadeiros contratos administrativos. Questão que fora alçadaa nível de particular relevo, quando, outrora, em determinados países, a justiçaComum era a competente para dirimir questões relacionadas com os contratosprivados da Administração. Enquanto ao Contencioso Administrativo cabia a tarefade solucionar dúvidas e quizilhas resultantes dos chamados contratosadministrativos. A exemplo, na França, onde o Tribunal de Conflitos existira paradirimir os antagonismos.

Estamos, portanto, a cuidar dos contratos da Administração Pública, tambémuma operação jurídica determinada e bem definida, presentes os elementosessenciais - acordo de vontades, bilateralidade de vontades, finalidade de criação desituação jurídica apenas individual.

Contratos esses da Administração Pública, onde se abrigam os contratosregidos principalmente pelos princípios e normas do direito privado e aquelesregidos principalmente pelo direito público.

Na celebração desses contratos, inexiste a possibilidade jurídica de aAdministração despojar-se a qualquer título ou pretexto do jus imperii. Sempre, demodo invariável, a Administração Pública há de levar em conta de indeclinávelconsideração os elementos, tirados do Direito Administrativo, que entendem com avalidade e eficácia do ato contratual - competência, objeto e finalidade. Sempre háde colimar o interesse público em termos indissociáveis1 .

Exatamente porque os contratos administrativos, espécie do gênero contratosda administração, no dizer de alguns, concluem-se para o funcionamento do serviçopúblico, e são incondicionalmente submetidos a regime de direito público,informados por princípios inerentes a esse regime2.

Em ajustamento, a inexistência de possibilidade da Administração valer-seapenas de normas de direito privado. Embora haja de socorrer-se desse direito paraaferir a capacidade da parte para contratar, procedendo na conformidade dasnormas de direito privado3.

Em contraposição à força obrigatória dos contratos regidos pelo direito privado,identificamos como traços diferenciadores daqueles, nos contratos de DireitoAdministrativo, o poder de alteração unilateral ou JUS VARIANDI; o poder de sançãoauto-executória, o poder de rescisão e o dever de restabelecimento da equaçãofinanceira 4.

O JUS VARIANDI reside na faculdade de poder a Administração, e só ela,modificar o contrato para adaptá-lo às exigências e interesses públicos e, emcontraprestação, cumprir o dever de restabelecimento da equação financeira; asanção auto-executória é outro privilégio da Administração Pública, porque imanenteá própria função administrativa. Detém o poder que, por igual, somente a ela assiste,de rescindir o contrato, nele compreendido o poder menor de sanar asirregularidades ou dar-lhe, enfim, conformidade com a lei e o interesse público, pormotivos de conveniência ou oportunidades, de que também é árbitro exclusivo. Aponto de liberar, com a sanatória ou auto-controle ex officio, a ingerência do Poder

1 Celso Antonio Bandeira de Mello - O Conceito do Regime Jurídico e Seu Valor Metodológico - RDP. Vol. II.2 Gaston Jéze, Cours de Droit Publique, 1933.3 Agustin Gordillo - Derecho Administrativo de Ia Economia; Vidal Perdommo - Contrato de Obra Pública. - Boi.Cepam - SP.4 G. Enterria y Ramón Fernandez - Tratado de Direito Administrativo.

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judiciário5. Seja para aproveitá-lo ou torná-lo apto a prosseguir por funcionários seusou por terceiros.

Estamos convencidos de haver esse contributivo, em oposição à forçaobrigatória dos contratos regidos pelo direito privado, influenciado o advertidolegislador constitucional, além das razões adiante cogitadas, a retirar a competênciados Tribunais de Contas para julgar da legalidade dos contratos, sob qualquerenfoque.

Por certo, pode o Tribunal de Contas examiná-los quando se afigure oportuno.Tanto no desempenho da função de auditoria financeira e orçamentária, como noexercício da competência de julgamento da regularidade de contas dosAdministradores. Todavia, nesses casos, examina os contratos como atos jurídicosperfeitos e acabados, abonados pela presunção de legalidade e legitimidade. Asignificar a impossibilidade de declará-los inválidos ou tirar-lhes a executoriedade.

Feita esta abordagem abrangente dos contratos de modo geral, passamos,doravante, ao exame de incidência nos contratos relacionados com a despesapública.

Esse controle de legalidade pelo Tribunal de Contas se afigura de todo em todoinconfundível com o controle jurisdicional que antecede à execução forçada, quandoa Administração utiliza as vias judiciais para compelir o administrado aocumprimento de suas obrigações para com o Estado. Caso em que pode o indivíduosuscitá-lo também contra a Administração Pública. Distinto do controleadministrativo, que tem por fim corrigir os defeitos de funcionamento interno doorganismo administrativo e se exerce do alto para baixo, através de recursos, comoelemento de amparo a interesses do administrado6.

Por sus vez, o controle de legalidade ou legitimidade verifica-se não somentesob o aspecto do atendimento de normas legisladas, como também dos preceitos daadministração pertinentes ao ato controlado. Para consecução dos fins dessecontrole, consideram-se normas legais desde as disposições constitucionaisaplicáveis, até as instruções normativas do órgão emissor do ato, ou os editaiscompatíveis com as leis e regulamentos superiores. E tanto pode ser exercido pelaAdministração, quanto pelo Legislativo ou pelo judiciário, com a única diferença deque o Executivo exercita-o ex of fido ou mediante provocação recursal. Ao passoque o Legislativo só o exercita nos casos expressos na Constituição e o judiciárioatravés de ação adequada7.

Reduzida a problemática a seus termos mais singelos, na ordem destaexplanação, cumpre justificar que os Tribunais de Contas na atual sistemática daConstituição, sabem todos, não mais detêm competência para julgar da legalidadedos atos contratuais, no exercício do controle externo da fiscalização financeira eorçamentária a ele atribuída pela Constituição Federal.

Esse controle, cumpre não olvidar, há de ser entendido é certo, aquelerealizado por órgão estranho à Administração, responsável pelo ato controlado, aexemplo a apreciação das contas do Executivo e do judiciário pelo Legislativo, a

5 Súmula 473 - STF - TFR, em RF 225/96, Borsi em Primo Tratato, de Orlando, vol. 2, segunda parte, p. 34.Alessi, S stema, 1953, p. 162 STF - RDP 9/183, RDA 37/315,98/160, RT 231/66, TJSP - RDA 100/49.6 Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro.7 Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 1979.

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auditoria do Tribunal de Contas sobre a efetivação de determinadas despesas doExecutivo e a anulação de ato do Executivo por decisão do judiciário8 .

Em referência o controle exercido pelo Tribunal de Contas da União, comoórgão auxiliar do Congresso Nacional (Constituição Federal, art. 70, § 1°), comsujeição dos Estados ao modelo federal, nos permitimos colecionar o doutomagistério do Procurador José Guilherme Villela, do Distrito Federal, em trabalhoapresentado ao VIII Congresso dos Tribunais de Contas realizado em João Pessoa -Paraíba. Invocando o sempre acatado ensinamento do colega Luiz Zaidman,consagrado especialista na matéria, tira a limpo que, em submissão aos princípiosbásicos do paradigma, ficam os Estados obrigados a seguir o modelo federal,segundo jurisprudência reiterada e tranqüila do Supremo Tribunal Federal (RE n°78.568, julgado pelo Plenário em 27-2-75, Rel.: Min. Thompson Flores).

Com efeito, nas disposições constitucionais que tratam da fiscalizaçãofinanceira e orçamentária não se atribui competência ao Tribunal de Contas para ojulgamento da legalidade dos contratos ou para o controle de legalidade dessesatos. Muito ao revés, lá está, em letra de forma, de modo claro e incontendível, ocontrole externo deferido atualmente ao Tribunal de Contas, restrito, no particular, aoexame da legalidade das despesas. Inclusive das despesas decorrentes decontratos relacionadas com a correspondente formação, formalização e conseqüenteaptidão do ato contratual para produzir efeitos válidos.

É certo que o ato administrativo contratual pode estar perfeito e não tereficácia, por pender termo ou condição suspensiva, que não será o placet doTribunal de Contas. Sabendo-se que a eficácia ou ineficácia não é vício do ato, esim momento do ato, mesmo o não idôneo para produzir efeitos jurídicos9, refogecompetência ao Tribunal de Contas para emitir julgamento sobre se lhe falta ou não,conforme o caso, aptidão jurídica geradora dos efeitos visados. O poder que oDireito não conceda ao ato contratual, de produzir o efeito que produziria se fosseválido, não tem, na liquidação da despesa, o condão de restabelecer a competênciaretirada dos Tribunais de Contas.

Mais claramente, o contrato não chega a ser, sequer, ato preparatório daexecução da despesa pública. É ato final do processamento administrativo, em quese insere, no seu contexto, o problema financeiro do procedimento administrativo.Quer se trate do contrato, da licitação, do fornecimento, da execução de obras,prestação de serviços ou de outro ajuste previsto no art. 134 do Decreto-lei n° 200.Por exemplo, de referência à licitação, completado o procedimento licitatório, terminao procedimento administrativo a ela pertinente. E dali por diante é que desponta arelação contratual de outro tipo e por ela se compromete o adjudicatório a executar oobjeto da licitação. Em contrapartida, a Administração se obriga ao pagamento dopreço na forma ajustada. É nesse momento e não em outro que surge, na realidade,o aspecto da realização da despesa e nasce, ipso facto, a correspondente relaçãode direito financeiro.

Entende-se que por esse modo e a fluir daquele momento - o estabelecimentoda relação de direito financeiro - passa a processar-se a despesa pública nos limitesda autorização orçamentária ou dos créditos adicionais.

8 ) Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 1979.9 Humberto Fragola, Gli Atti Amministrativ, 1952, p. 70. Lafayette Pondé, O Ato Administrativo, Sua Perfeição eEficácia, RDA 2.916.

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O processamento da despesa é um conjunto de atos de natureza financeira,precedido, em regra, de um procedimento administrativo, tendente à contrataçãorespectiva, conduzindo ao pagamento correspondente, fim último, na oportunidadeprópria. Quando se cuida da utilização do regime de execução indireta, nosdefrontamos com o procedimento da licitação (convite, tomada de preços econcorrência).

Como todo ato de gestão financeira, o de despesa, em especial, exige acomprovação da operação de registro contábil ou em conta adequada, com anecessária classificação. Antecedem atos preparatórios, em grande número e aomesmo tempo outros atos condicionantes da realização da despesa pública, emcada unidade orçamentária, como previsto nos arts. 47 a 50 da Lei n° 4.320/64 e 17do DL. n° 200/67. Esses atos preparatórios interferentes no início da execução dadespesa pública e no disciplinamento jurídico da execução dessa mesma despesaalicerçam duas conclusões fundamentais na justificativa do empeço constitucional àcompetência do Tribunal -de Contas para julgar da responsabilidade dosadministradores com base nos contratos10. - A simples observância das condiçõesconstitucionais da despesa pública não basta, contudo, para que sua realização sejalegal. Antes de sua efetivação, intercorrem vários atos, que preparam e condicionamsua validade e regularidade, entre os quais não se inscrevem, necessariamente, oscontratos.

- O processamento da despesa, até a sua realização ou execução, começacom procedimentos administrativos prévios, passando pelas fases de empenho dadespesa, sua liquidação até o pagamento.

Estas as etapas por lei exigidas, sem cuja observância não se poderá reputarlegal a execução da despesa, a saber:

a) Prévio empenho (art. 60 da Lei n° 4.320/64), materializado pela emissão danota de empenho, embora dele não se origine obrigação malgrado o disposto no art.58 da Lei n° 4.320/64;

b) Liquidação da despesa (Lei n° 4.320/64).

c) Ordem de pagamento (art. 64 da lei citada).

d) Pagamento da despesa.

A propósito desta última etapa da liquidação da despesa, a efetuar-se portesouraria ou pagadoria regularmente constituía, por ordem bancária ou chequenominativo, cumpre saber se é simples operação material ou é também operaçãojurídica. Não se trata de mera operação material, pelo menos no Direito Financeirobrasileiro. Não consiste na simples transferência de soma de dinheiro do funcionáriopagador ao funcionário credor. O órgão pagador não é executor cego da ordem depagamento. Mas um controlador da regularidade jurídica da liberação, quecompromete sua responsabilidade, pois somente deverá efetuar o pagamento apósverificar a regularidade da liquidação da despesa11.

No exame dos diversos componentes e fases da despesa, o contrato surgecomo instrumento balizador da vontade das partes contratantes. E em nenhummomento o julgamento da regularidade das contas dos Administradores implica nojulgamento da legalidade e legitimidade dos contratos. 10 José Afonso da Silva, Orçamento Programa no Brasil, RT 1973.11 José Afonso da Silva, op. cit.

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Quando nos reportamos ao contrato que escapa ao julgamento de legalidadepelo Tribunal de Contas, estamos a nos referir também ao ajuste, tido como perfeitoe acabado, em que a Administração Pública, agindo nessa qualidade, celebrara como particular ou outra entidade administrativa, para consecução de objetivo deinteresse público, nas condições estabelecidas pela própria administração direta eindireta. Firmado, pois, com peculiaridades administrativas e sujeito aos preceitos dodireito público. E se presentes os pressupostos necessários a toda atuaçãoadministrativa. Realizado que seja sob às normas do direito privado, contendo,todavia, aqueles pressupostos de interesses e finalidade públicos.

O posicionamento das Cortes de Contas há de ser de eqüidistante indiferençaao exame da legalidade em derredor a validade ou invalidada, anulabilidade ourevogabilidade, eficácia ou ineficácia, alteração, resolução ou rescisão do atocontratual. Justo porque esse tipo de controle do contrato administrativo constitui umdos poderes inerentes à Administração e por isso mesmo implícito em toda acontratação pública. Dispensando até cláusula expressa. O Tribunal de Contasporque dele não participa, é res inter allios na esfera de competência do seujulgamento constitucional, de injustificável invasão sem comprometimento doprincípio federativo da repartição dos poderes, embora harmônicos mas, entre si,independentes.

Tal controle é privativo da administração contratante e por isso a ela compete acorrespondente prerrogativa de adequar os seus contratos às exigências domomento, supervisionando, acompanhando e fiscalizando o seu cumprimento ouintervindo na execução, como seja, da utilização das obras públicas, da prestaçãode serviços à coletividade, enfim, do objeto do contrato. Ressalvado, bem de ver, odisposto no art. 153, 49 da Constituição Federal, comandando no sentido de que alei não poderá excluir da apreciação do Poder judiciário qualquer lesão de direitoindividual12.

Nem haveria de ser por outro modo, por isso que o sistema brasileiro é o domonopólio de jurisdição pelo Poder judiciário, consagrado na disposição transcrita, apartir de quando foi abolido, com a República, o contencioso administrativo.

Vale reeditado, a propósito o lúcido e douto magistério de Luiz Zaidman,reportando-se a farta bibliografia especializada. Em razão dos seus objetivos e porocorrer ex officio, mesmo o julgamento da regularidade de contas a que procedemas Cortes de Contas, embora sob formas e procedimentos idênticos aos dosTribunais do Poder Judiciário, não participa da natureza de função jurisdicional, nosentido estrito que a teoria do processo dá à expressão13.

Daí por que, a mencionada função do julgamento que se explicitara emdispositivo regulamentar (Decreto nº 1.166, de 17-11-1892) e que somente foiinscrita na Carta Política de 16-7-1934, prossegue Luiz Zaidman, motivaracontrovérsias a ponto de ser reputada forma de jurisdição contenciosa e por essemodo averbada de exorbitância14.

Logo, o julgamento de contas constitui, na realidade, juízo para efeito decontrole, seguido, quando se conclui existir débito, de providências para que serecomponha o patrimônio público, nos tempos e para aqueles fins de efetuar-se 12 Hely Lopes Meirelles, op. cit.13 Luiz Zaidman, op. cit.14 Luiz Zaidman - As Funções das Cortes de Contas Brasileiras à luz do Controle jurídico - in Revista do Tribunalde contas do Distrito Federal 4.1968, págs. 45 a 70.

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cobrança judicial pela via executiva (Decreto-lei nº 199, de 25-2-67, arts. 49/50, decerto modo restaurado com a Lei nº 6.822, de 22-9-80) .

E mais:

A partir da Constituição de 196715, esse tipo de julgamento foi, por isso,explicitamente, enfeixado entre as atividades de controle externo. E ficouespecificado como julgamento não dos responsáveis, nem mesmo das contas, comodiziam as Constituições e leis anteriores ( e ainda repete em gênero a atual no art.70, § 1°), mas, tão-somente, da regularidade das contas (art. 70, § 4° da CF). Julgar,no caso, é avaliar, conferir, ajuizar a regularidade das contas.

O ponto de maior proximidade entre os órgãos com essa função de controle eos juridicionais situa-se em que, no tocante ao ressarcimento, os primeiros podemdeterminá-lo, promovê-lo e, às vezes, conseguí-lo na via administrativa, enquanto,os segundos são hábeis a torná-los efetivos sem o concurso da vontade do obrigadoe com a força da coisa julgada (13 - verbis, op. cit. pág. 58) .

Ao depararem as Cortes de Contas, por conseguinte, com irregularidades ouabusos, representarão ao Poder Executivo e ao Poder Legislativo, quer se trate decréditos, contas, contratos, aposentadorias, reformas ou pensões ou quaisqueroutros atos com repercussão financeira, assim visando a que se ponha cobro àsituação anômala (art. 72, §§ 4° e 5° da CF).

Insta observar, como fizera o mesmo Luiz Zaidman:

"Como a atividade de controle encerra, fundamentalmente, a desalvaguarda da eficácia, de princípios e de normas jurídicas, oencaminhamento de representação ao Poder Executivo e ao Poder Legislativonão se faz por livre escolha. Condiciona-se à opção criteriosa para apurar odestinatário mais apto a restaurar a ordem ou a promover a recomposiçãopatrimonial. Por conseqüência, a instância última será, em regra, o PoderLegislativo."

A atual Constituição não consignando, como o fizera a anterior (art. 77, IIl), acompetência que aí sempre se impõe exclusiva e expressa,16 por não excetuado ojulgamento da legalidade de contratos, aboliu essa atribuição das Cortes de Contas,que não mais poderão exercitá-la, sem o risco de resvalar pela exorbitância noabuso de poder, entendido o ato como "exercido sem fundamentos legais ou acimados limites fixados pela lei".17

Sem embargo do preceito constitucional, resultaria possibilidade do julgamentoda legalidade dos contratos pelos Tribunais de Contas, se ao acaso se revestissemda condição de Tribunal Contencioso Administrativo, como ocorre em alguns países,a exemplo da Alemanha, onde a implantação da jurisdição administrativa obedeceraao desejo de proteger os direitos subjetivos (privados e públicos) dos cidadãos(propriedade, liberdade pessoal, direito de sufrágio, etc.) contra os erros e abusos

15 Comentários à Constituição Federal Brasileira - Ed. Saraiva, São Paulo, 1933, Vol. IV, pág. 430; MárioMazagão - Curso de Direito Administrativo, Ed. Rev. dos Tribunais, São Paulo, 4.- ed. 1968, pág. 36 - Cfr. LuizZaidman, op. cit. RTC do DF.16 Carlos Maximiliano - Hermenêutica e Aplicação do Direito - Ed. Freitas Bastos, 1947, v. 323, pág. 321/22.17 Brandão Cavalcanti, Teoria dos Atos Administrativos, 1973, p. 129; Caio Tácito, O Abuso de PoderAdministrativo no Brasil, 1959, p. 9; Seabra Fagundes, op. cit. 2.a Ed. Konfino - 98 n. 2 b, 309, 328 - RobertoRosas do Abuso de Poder, 1968 e Cretella Junior, Trat. 1966. p. III.

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das autoridades administrativas. Inscrevendo-se a competência daqueles Tribunaisaté o ponto em que começa o poder discricionário das autoridades administrativas.18

Sabemos, entretanto, que nem mesmo aos contenciosos administrativosfederais e estaduais, previstos no art. 203, acrescentado à Constituição Federal,pela Emenda n° 7, de 13-4-77, se permitiu, antes expressamente foi vedado, o poderjurisdicional.

Percebe-se, à luz meridiana, que a supressão da competência dos Tribunais deContas para julgar da legalidade dos contratos é uma conseqüência dos estudos eanálises realizados pela Comissão Especial encarregada dos trabalhos de reformaadministrativa que "sustentou a necessidade de emendar-se a Constituição Federal,no que respeita ao Tribunal de Contas é de se expedirem duas leis, uma dispondosobre a nova lei orgânica do Tribunal de Contas e outra sobre a reorganização daAdministração Federal".

E mais:

"Ser indispensável uma redefinição das atribuições do Tribunal, com oobjetivo de colocá-lo na posição de órgão de controle externo do PoderExecutivo e não, como atualmente ocorrer, de órgão que interfere a todo omomento em atos de responsabilidade do Presidente da República, dosMinistros de Estado e autoridades delegadas, enfraquecendo, assim, aatuação das autoridades administrativas, sem que disso resulte proveitoalgum para o serviço público federal, antes contribuindo para diluirresponsabilidades, estimular a burocracia e onerar os custos operacionais"(Nazaré Dias, A Reforma Administrativa, 2ª ed., Rio, FGV, 1969).

Como já assinalado, a Constituição de 1967 alterou fundamentalmente aorientação até então reinante, com referência à fiscalização financeira eorçamentária. Adotando nova conceituação de controle e modificando suas técnicasde execução, acabou com o sistema de "registro prévio" e a posteriori ou, maissimplesmente, pôs fim a um arremedo de controle, desprezando o formalismo:

"Cada medida tem sua razão de ser, cada órgão tem sua participação definida,cada responsabilidade - seja pela aplicação dos recursos, seja pela fiscalização doseu emprego - ficou explicitada; a autoridade administrativa superior não maispoderá refugiar-se na omissão; o Tribunal de Contas acha-se armado para umaação atuante.

O que se quer é que haja controle de fato, real; que o formal ceda lugar aosubstancial."19

A volta ao passado, implicando no restabelecimento, por via oblíqua e aoarrepio do texto constitucional - JUS COGENS - consubstanciado no art. 153 § 2°,senão do SISTEMA DE REGISTRO PRÉVIO, porém o de REGISTRO APOSTERIORI, levou o eminente Conselheiro JOSÉ FONTES ROMERO a observar,com o peso de inconteste autoridade especializada:20

"Daí ter o eminente Ministro VICTOR DO AMARAL FREIRE, em diversasoportunidades, ressaltado que, para maior eficiência do novo sistema de

18 Fritz Fleiner - Instituciones de Derecho Administrativo - Ed. Labor.19 Fritz Fleiner - Instituciones de Derecho Administrativo - Ed. Labor.20 Rev. Tribunal de Contas do Distrito Federal - A Fiscalização do Tribunal de Contas - Rev. do TCDF - pág. 199.

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fiscalização, era necessário adquirir a mentalidade adequada, desvencilhando-se dosaudosismo."

Para que isso não fosse reeditado, a Constituição Federal inovou, ao cometerao Tribunal de Contas o desempenho de auditoria financeira e orçamentária. Foi,portanto, na forma de ser da execução do controle que se operou profundamodificação na sistemática anterior com a substituição do sistema de registro,qualquer que seja a rotulação que se lhe empreste. De anotação inclusive, ou sobqualquer outro color, por não identificada em nenhum corpo de lei (por isso mesmovedada a sua prática pela mesma Constituição (arts. 153 §§ 2° e 36 e 200).

Quando a Lei n° 4.320, de 17-3-64, no § 2° do art. 63, dá o contrato, ajuste ouacordo respectivo (inciso I) como base da liquidação da despesa por fornecimentosfeitos ou serviços prestados, não conduz o executor a discutir a validade ouinvalidade do contrato, ajuste ou acordo respectivo, nem ao exame de oportunidadee conveniência em relação às cláusulas neles inseridas, o mesmo ocorrendo emrelação ao Tribunal de Contas.

O executor, porque autorizado pela presunção de legalidade ou legitimidade,dá conseqüência ao ato administrativo contratual, justo porque os atosadministrativos, qualquer que seja sua categoria ou espécie, nascem com aPRESUNÇÃO DE LEGALIDADE, independentemente de norma legal que aestabeleça. Essa presunção decorre do princípio da legalidade da Administraçãoque, nos Estados de Direito, informa toda a atuação governamental. Além disso, apresunção de legitimidade dos atos administrativos responde a exigências deceleridade e segurança da atividade do Poder Público, que não poderiam ficar nadependência da solução de impugnação dos administrados, quanto à legitimidadede seus atos, para, só após, dar-lhe execução.

A presunção de legitimidade autoriza a imediata execução, ou operatividadedos atos administrativos, mesmo que argüidos de vícios ou defeitos que os levem àinvalidade. Enquanto, porém, não sobrevier o pronunciamento de ilegalidade, osatos administrativos são tidos por válidos e operantes, quer para a Administração,quer para os particulares sujeitos ou beneficiários dos seus efeitos. Admite-se,todavia, a sustação dos efeitos dos atos administrativos através de recursos internosou de mandado de segurança, ou de ação popular, em que se conceda a suspensãoliminar, até o pronunciamento final de validade ou invalidade do ato impugnado21. Epara isso são eles obrigatoriamente publicados (Dec. n° 84.555 de 12-3-1980. )

Em reforço, os comentaristas da Lei n° 4.320/64 de normas de DireitoFinanceiro22 bem como o renomado José Afonso da Silva, Professor Titular daUniversidade de São Paulo, autor de Orçamento Programa e outros consagradoslivros, em conferência pronunciadas no Centro de Estudos do TCDF, em 24-4-77,sobre Regime jurídico da Despesa Pública, parecem não discrepar desseentendimento.

Como corolário, o Tribunal de Contas, no exame da regularidade dasdespesas, sobremodo obstaculizado pelo texto constitucional, também está inibidode afrontá-lo e, por igual, à presunção de legalidade ou de legitimidade dos atosadministrativos, para proferir julgamento da legalidade dos contratos que seentendem aptos, à vista do instrumento em que se ostentam, até que sejam

21 L. Meirelles, op. cit. verbis, p. 112.22 J. Teixeira Machado Jr. e Heraldo da Costa Reis - Com. a Lei n.º 4.320 - 14.- ed.

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invalidados pelo Poder judiciário ou anulados pela própria Administração, por víciosque os tornem ilegais, ou revogados por motivo de conveniência ou oportunidade,respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a apreciaçãojudicial, porque deles não se originam direitos (Súmula n° 453 dos STF) hipóteses,de todo em todo inconfundíveis com a produção de efeitos indiretos dos mesmosatos.

Nem se argúa com o ato administrativo contratual nulo, por encerrar vícioessencial, não produzindo por isso o efeito de direito correspondente. É certo que oato administrativo nulo considera-se como não editado e, como tal, não produznenhum efeito direto. Efeitos indiretos, como a responsabilidade, a prova de certosfatos que neles se contêm não são tolhidos pela nulidade. 23

Abstraída a problemática da falta de competência do Tribunal de Contas para oexame da legalidade dos contratos e conseqüente julgamento, reserva-se-lhe,tão-somente em relação às despesas irregulares decorrentes desses atos, aobrigação de solicitar à Assembléia Legislativa que determine a sustação do ato ouadote outras medidas que julgar necessárias ao resguardo dos objetivos legais. Nãose lhe permitindo, porém julgamento ou apreciação abrangente de qualquer aspectode legalidade do ato contratual estranho às etapas exigidas e propriamente ditas daliquidação da despesa, máxime para responsabilizar os executivos por vícios ouirregularidades intrínsecas ou formais do ato contratual.

Deverão servir os contratos, apenas, submissos à sua verdadeira destinarãolegal e técnica, no âmbito das Cortes de Contas, como elementos informativos dostrabalhos de auditoria realizados pelo Tribunal de Contas, através de inspeções.Sem embargo de que as despesas deles decorrentes sejam submetidas ao seucrivo, como oferecidas à execução para exame de regularidade, tornando-seimpositivas em caso contrário e por deliberação Plenária, as providênciasconstitucionais que se inscrevem em apropriados e específicos dispositivos. Brasília,Distrito Federal, 9 de maio de 1984.

Brasília, 9 de maio de 1984.

23 B. Cavalcanti, Cfr. Cretella Júnior, Tratado, 1966, v. II pág. 297/8. STP RDP-9/183, RDA 37/315, 98/166 RT231/661 TJSP - RDA 100/49.

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PROBIDADE ADMINISTRATIVA (ASPECTOSCONSTITUCIONAIS E DE LEGISLAÇÕES

ESPECIAIS)

JOSÉ DE OLIVEIRA MESSINAProcurador-Chefe do Tribunal de Contas do Município de São

Paulo

"O talento sem probidade é um castigo" (Bolívar)

No vastíssimo campo da competência privativa da União sob o aspecto político,jurídico, econômico, financeiro e administrativo, nossa Lei Maior apregoaenfaticamente que lhe cabe, também, legislar sobre NORMAS GERAIS deorçamento, DESPESA e gestão patrimonial e financeira de natureza pública (art. 8°,inciso XVIII, letra "c" da CF).

Destas atribuições resulta, sem maiores indagações, a importância das regrasbásicas editadas pela União para serem observadas no âmbito da administraçãofederal, estadual e municipal, nos setores especificamente enunciados.

Tanto isto é certo que a União poderá intervir nos Estados se foremcontrariadas as diretrizes fixadas em lei federal relacionadas com a execução dosplanos econômicos ou financeiros (art. 10, inciso V, letra "c", da CF).

Por outro lado, a Constituição Federal consignou que os Estados e osMunicípios serão organizados e regidos por leis locais ficando, no entanto, sujeitos atodos os princípios por ela estabelecidos e definidos. Dentre eles, os pertinentes à"prestação de contas da administração" (art. 10, inciso VII, letra "f" c/c o art. 13,inciso I, da CF); à elaboração do orçamento; à fiscalização orçamentária e financeirae o atinente à aplicação dos recursos recebidos da União e atribuídos aosMunicípios (art. 13, inciso IV, da CF).

No respeitante à prestação de contas da administração na esfera federal,verifica-se que é atribuição do Presidente da República prestar anualmente aoCongresso Nacional, dentro de sessenta dias após a abertura da sessão legislativa,as contas relativas ao ano anterior (art. 81, inciso XX, da CF). No Estado de SãoPaulo, a atribuição está colocada no art. 34, inciso XIII, da Constituição Estadual,

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devendo a prestação ser feita à Assembléia até o dia 30 de abril de cada ano.Finalmente, no campo dos Municípios Paulistas, a atribuição é no sentido doencaminhamento da prestação de contas do Executivo e da Mesa da Câmara aoTribunal competente até o dia 31 de março de cada ano.

Evidentemente, as contas a serem prestadas pelo Presidente da Repúblicaestão vinculadas à Lei Orçamentária Anual que fixou a despesa e previu a receita(art. 60 da CF). São contas, portanto, das despesas e das receitas públicas quedevem ser prestadas ao Poder Legislativo que, em tese, aprovou-as em face daatribuição dispositiva que lhe cabe sobre as matérias de competência da União, (art.43, inciso I, da CF) entre elas, as do orçamento anual e plurianual.

E porque foi ele, Poder Legislativo, que recebeu a proposta de orçamentoenviada pelo Presidente da República (inciso XIX do art. 81 da CF) para votaçãoconjunta das duas Casas até 4 (quatro) meses antes do início do exercício financeiroseguinte (art. 66 da CF) e o devolveu para sanção, a ele caberá, por força decompetência exclusiva, julgar as contas do Presidente da República (art. 44, incisoVIII, da CF).

Se este, contudo, deixar de apresentá-las na forma estatuída pelo inciso XX doart. 81 da Carta Magna, elas serão tomadas pela Câmara dos Deputados, tambémpor competência privativa, nos termos do inciso II do art. 40 da mesma Magna Lei.

Do que se expôs, resulta a inegável importância da Lei Orçamentária, que devemerecer o máximo cuidado por parte dos atos administrativos presidenciais. Omesmo se diga com relação aos atos dos Governadores e dos Prefeitos Municipais.Se, portanto, contra ela atentarem, serão considerados crimes de responsabilidade,porque ferem a Constituição na sua ossatura básica. Curioso notar que a probidadeadministrativa precede a Lei Orçamentária na escala da enumeração exemplificativarevelada pelo art. 82 da CF, visto que a probidade da administração está esculpidano inciso V, e a Lei Orçamentária no inciso VI. Há uma como que recomendação dolegislador constitucional ao Presidente: seja probo em tudo, também no cuidar daexecução da Lei Orçamentária!

Dentro deste espírito de moralidade administrativa, conta-nos JL SalcedoBastardo no seu livro "Visão - Revisão de Bolívar", Livraria Abril Editora, RJ, 1976,pág. 73 - a seguinte passagem do Libertador: "Hoje - dizia ele ao intendente deMagdalena, seu amigo Mariano Montilla - tive o pesar de saber que, na lista doorçamento do Estado-Maior, se incluiu um cozinheiro meu cujo soldo é de cinqüentapesos. Espero que V. se digne revê-lo e avisar-me da quantia a que monte parafazer o reembolso a que corresponda". Percebe-se até que pormenores atingia aanálise do orçamento, feita por Bolívar!

A recomendação da probidade é geral para todos os administradores. Idênticarecomendação há para os Governadores dos Estados e para os Prefeitos Municipaisjá que para estas duas esferas da Administração Pública os crimes deresponsabilidade ocorrerão na forma e nos casos definidos na legislação federal. NoEstado de São Paulo a matéria é regida pelo art. 35 da Constituição Estadual e nosMunicípios de São Paulo, está prevista no art. 40 da Lei Orgânica dos Municípios.

Demais, neste passo, cumpre lembrar a Lei Federal nº 4.320, de 17 de marçode 1964, que imprimiu normas gerais de direito financeiro para a elaboração e ocontrole dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e doDistrito Federal - com sustentação no art. 8°, inciso XVII, letra "c" da CF -

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precisamente quando do Título VIII, ao tratar "Do Controle da ExecuçãoOrçamentária", deu as linhas gerais sobre como se deverá processar o "ControleExterno" a ser exercido pelo Poder Legislativo com o precioso auxílio do Tribunal deContas.

Dentro dessa linha, o art. 81 da Lei n° 4.320/64 reza o seguinte: "O controle daexecução orçamentária pelo Poder Legislativo terá por objeto verificar a probidadeda administração, a guarda e legal emprego dos dinheiros públicos e o cumprimentoda Lei de Orçamento".

Mas, o que é a probidade, o que é ser probo? PROBIDADE: do latim probitas,de probus (probo-honesto-honrado). Entende-se a honestidade de proceder ou amaneira criteriosa de cumprir todos os deveres que são atribuídos ou cometidos àpessoa. Procedimento justo. PROBO: do latim probos (reto, legal, justo) íntegro,cauteloso em suas obrigações, criterioso no modo de proceder (vide Vocabuláriojurídico, de PLÁCIDO E SILVA, Ed. Forense, 1978, volume 3).

No Título seguinte, a mesma Lei nº 4.320/64, tratando "Da Contabilidade" nocapítulo "Das Disposições Gerais", a ela confere atribuições de suma importância,quer no campo contábil, propriamente dito, quer no campo das evidênciasdecorrentes dos fatos ligados à administração orçamentária, financeira, patrimonial eindustrial, pois deverá destacar perante a Fazenda Pública a situação de todosquantos, de qualquer modo, arrecadem receitas, efetuem despesas, administrem ouguardem bens a ela - Fazenda - pertencentes ou confiados.

Infere-se, portanto, que não são somente os fatos contábeis que devem serinvestigados e estimados pela Contabilidade Pública. Também os fatos aderentes eemergentes do complexo administrativo devem ser valorados dentro da mesmaótica. Sim, porquanto se assim não se entendesse a atuação do órgão Contábil,caberia indagar: como poderia ele -setor contábil - acompanhar a execuçãoorçamentária; conhecer a composição patrimonial, determinar os custos dos serviçosindustriais, levantar os balanços gerais e proceder à conclusiva análise einterpretação dos resultados econômicos e financeiros? Se a ele não fosse permitidoconhecer os fatos administrativos, vale dizer as ocorrências, o casuísmo, comopoderia realizar ou superintender a tomada de contas dos agentes responsáveis,informando corretamente o Tribunal de Contas competente para o julgamento noâmbito administrativo?

Exerce, portanto, o setor da Contabilidade Pública relevante papel no quadromaior da verificação da PROBIDADE ADMINISTRATIVA.

Não é somente a fidelidade funcional dos responsáveis por bens e valorespúblicos que deve ser objeto do controle da execução orçamentária; é, por igual, alegalidade de todos os atos administrativos executórios do orçamento e, mais ainda,a verificação a propósito do cumprimento do programa de trabalho previsto tambémno orçamento.

Destarte, se internamente o setor contábil da Administração Pública devepenetrar em todos esses escaninhos com a obrigação de pôr em evidencia os fatoscontábeis e administrativos tudo para que o Poder Executivo crie condiçõesindispensáveis, assecuratórias da eficácia do controle externo (inciso IX do art. 71 daCF - externamente o Poder Legislativo, como controlador da mesma execuçãoorçamentária, terá, entre seus objetivos, o principal: de verificar a PROBIDADE DA

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ADMINISTRAÇÃO, tudo após receber o parecer prévio do Tribunal de Contas (art.75 usque 89 da Lei n° 4.320/64).

Disto se pode tirar uma ilação ampliativa do raio de ação dos Tribunais deContas, pois se são eles que, em primeira mão - externa corporis - tomam ciência detodo o procedimento orçamentário do exercício findo, recebendo todas as peçascomponentes do balanço financeiro, se são eles que realizam todas as inspeçõesnecessárias, se são eles que examinam os levantamentos contábeis, os certificadosde auditoria e, ainda, tomam ciência de todos os pronunciamentos das autoridadesadministrativas, tudo isto no legítimo exercício de atribuições constitucionais,podendo representar tanto ao Poder Executivo quanto ao Poder Legislativo sobreirregularidades e abusos por eles verificados (§ 49 do art. 72 da CF) e. se são elesque, afinal, apresentam para o derradeiro julgamento - 2á instância Administrativa -do Legislativo o Parecer Prévio, está claro que estão obrigados a registrar, nessetrabalho final, tudo o que encontram de normal e também de anormal. Dentro dasanormalidades, por evidente, se se deparam com fatos e atos contábeis ouadministrativos que revelaram abuso de autoridade ou do direito, decorrentes daextrapolação de poderes ou do exercício irregular de comandos objetivamentelegais, ocasionando danos morais ou diretamente contra o interesse público(sociedade), se verificaram o mau uso dos bens, descomedimento ou excesso nautilização dos valores públicos, tudo, enfim, que retrata abusos no manejo da coisapública, deverão manifestar-se ofertando ao Poder a que estão vinculados - PoderLegislativo - o prévio parecer onde analisarão todos os fatos e atos administrativosque porventura afetaram os componentes do patrimônio público. Isto não significaque os Tribunais de Contas entrem no mérito da gestão governamental - o, que lhesé vedado fazer. O que eles fazem é exatamente proceder a um juízo de valor sobreas aplicações e os resultados.

Destacamos a importância dos estudos avaliativos a propósito docomportamento de todos os órgãos da Administração, bem como do resultado finalde todos os ajustes pactuados, precisamente porque, sem dispor destes elementos,o Presidente da República não terá condições de atender à atribuição específica de,por ocasião da abertura da sessão legislativa, remeter ao Congresso Nacional amensagem dizendo sobre a situação do País, solicitando as providências que julgarnecessárias (art. 81, inciso XXI, da CF). De registrar que esta atribuição éindelegável, como que a confirmar o alto grau de sua importância, vinculando oPresidente ao aprimoramento do controle interno, à probidade na administração e àlei orçamentária, conforme vimos (art. 81, parágrafo único, da CF).

Conclui-se, então, que é o Congresso Nacional que exerce pleno jure controlefinanceiro externo, com o auxílio do tribunal administrativo -sem dúvida o da maiorhierarquia no ramo do Direito Administrativo - denominado Tribunal de Contas daUnião, com jurisdição em todo País, sendo seus integrantes denominados Ministros,com as mesmas garantias, prerrogativas, vencimentos e impedimentos dos Ministrosdo Tribunal Federal de Recursos (§ 3° do art. 72 da CF).

O Tribunal de Contas, tanto o da União quanto os dos Estados e os dosMunicípios (São Paulo e Rio de janeiro) configuram a primeira instânciaadministrativa, visto que seus pareceres poderão ser revistos pelos respectivosPoderes Legislativos e Câmaras Municipais, no grau de segunda instânciajurisdicional administrativa.

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Nota-se que, na área federal, o Ministro, no exercício da supervisão ministerial,tem como um dos principais objetivos transmitir ao Tribunal cie Contas, sem prejuízoda fiscalização deste, informes relativos à administração financeira e patrimonial dosórgãos do Ministério (inciso XI do art. 25 do Decreto-lei n° 200. de 25 de fevereiro de1967).

Por outro lado, o controle interno exercido pelo próprio Poder Executivo pormeio do órgão contábil deverá apurar os custos dos serviços, de forma queevidencie os resultados da gestão (art. 79 do Decreto-lei n° 200/67).

Cumpre lembrar aqui uma peça de real valor para os que desejarem seaprofundar na matéria. Trata-se de "Parecer Prévio sobre as contas do Governo daRepública (1967)", Ed. 1°i69, do Departamento de Imprensa Nacional, elaboradopelo Ministro Victor Amaral Freire, partícipe dos trabalhos da Comissão de ReformaAdministrativa que elaborou o anteprojeto que afinal se transformou no Decreto-lein° 200, de 25 de fevereiro de 1967.

Em certa altura do seu alentado parecer (pág. 29), Sua Excelência,transcrevendo trecho da justificativa do anteprojeto na parte relacionada com osnovos métodos gerenciais na aplicação dos rescursos provenientes do povo e sobreos sistemas de administração direcionados para a produtividade e o custo dosserviços, destacou os nobres objetivos da Comissão ao se preocupar com ainstituição de sistemas que direcionassem para a simplificação dos mecanismos deacompanhamento da execução, dos resultados e do controle de gastos daAdministração.

Evidentemente, esses custos deverão ser tomados no sentido genérico, isto é.são todos os custos que a Administração suportou na obtenção de todos os serviçosque prestou à coletividade, vale dizer: custos com os serviços propriamente ditos,com as obras e com as compras, enfim com todo o complexo orçamentário de quedispôs num determinado exercício. A somatória de tudo, cotejada com os resultados,fornecerá o grau de aproveitamento da Administração.

É este grau de aproveitamento, ou de eventual desaproveitamento, que osTribunais de Contas deverão também consignar em seus Pareceres Prévios a fim deque o Poder Legislativo possa, num juízo final, dizer da legalidade ou da ilegalidade,da regularidade ou da irregularidade, da probidade ou da improbidade dos fatos eatos administrativos que compuseram a administração sub judice.

Consigne-se que, nas tomadas de contas dos ordenadores das despesas, oórgão de auditoria do Poder Executivo deverá expedir o certificado de regularidade.Se contudo, verificar a existência de irregularidade, deverá determinar providênciasque resguardem o interesse público e a probidade na. aplicação dos dinheirospúblicos, dando ciência, oportunamente, ao Tribunal de Contas (§ 2° do art. 82 doDecreto-lei n° 200/67). Ora, se os Tribunais de Contas tomam ciência de eventuaisimpropriedades no destino do dinheiro público, é evidente que deverão tomarconhecimento dos fatos e sobre eles manifestar seu entendimento, apurando asresponsabilidades.

Se há ordem superior impositiva ao Poder Executivo de manter um sistema decontrole interno que deva, além de outras finalidades, assegurar eficácia ao controleexterno, vejamos agora seu fundamento legal, o que representa este segundomomento controlador e quem o exerce?

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Naturalmente, e em primeiro lugar, o Executivo deverá permanecer dentro dosprecisos limites da fixação da despesa e da previsão da receita, excepcionadas,apenas, as autorizações para abertura de créditos suplementares, as operações decrédito por antecipação da receita e disposições sobre a aplicação de saldosporventura existentes (art. 60, incisos I e lI, da CF).

Consciente dessa posição, que lhe é ditada pela Lei Maior, deverá o PoderExecutivo, em segundo lugar, manter sistema de controle interno para propiciar ascondições necessárias ao controle externo, que é exercido pelo Poder Legislativo(Congresso Nacional), ao mesmo tempo que eleve acompanhar a regular realizaçãoda receita e da despesa, a execução dos programas de trabalho e do próprioorçamento, além de proceder -e este é um ponto de realce - à avaliação dosresultados alcançados em todo o campo administrativo, além de especificamenteverificar a execução dos contratos (arts. 70 e 81, incisos I, II e III, da CF) .

O controle externo da fiscalização financeira e orçamentária da União seráexercido pelo Congresso Nacional (art. 70 da CF) com o auxílio do Tribunal deContas da União compreendendo: a) a apreciação das contas pelo Presidente daRepública; b) o desempenho (comportamento) das funções de auditoria financeira eorçamentária; e) o julgamento das contas dos administradores e demaisresponsáveis por bens e valores públicos (§ 1° do art. 70 da CF).

Das inspeções realizadas nas demonstrações contábeis enviadas pelos trêsPoderes da União, que compõem as contas que a Constituição qualifica como sendodo Presidente da República, o Tribunal forma um juízo e emite um parecer-prévio,que será enviado ao Congresso Nacional em sessenta dias (§ 1º e 2° do art. 70 daCF).

É evidente que tais contas são da Administração Pública, porém como quem asenvia ao Congresso Nacional é a maior autoridade administrativa - na União, oPresidente da República, nos Estados, os Governadores e, rios Municípios, osPrefeitos - esta empresta o seu nome titulando o complexo técnico-contábil anualque remete para superior julgamento do Congresso Nacional, das AssembléiasLegislativas e das Câmaras Municipais.

Isto, porém, não quer dizer que o Titular Executivo das esferaspolítico-administrativas do Estado seja o único responsável pelas irregularidades,ilegitimidades e ilegalidades que forem eventualmente apontadas.

Tanto isto é certo que o § 4º do art. 70 da CF se refere expressamente aojulgamento da regularidade das contas dos administradores e demais responsáveis,o que, por si, revela que a autoridade máxima administrativa é responsável diretasomente pelos atos que, imediata e diretamente praticar, bem como pelas ordens oudeterminações irregularidades ou ilegais que expedir nos campos da receita e dadespesa pública, não podendo ser apenado pelas faltas de seus subordinados, anão ser que seja conivente.

Os subordinados responderão pessoalmente em face da subjetividade daresponsabilidade, se exorbitarem das ordens recebidas. (Art. 80, § 2°, do Decreto-lein° 200/67.)

Ora, de indagar: verificação de resultados e controle do dispêndio dos dinheirospúblicos é, ou não, à vista da mensagem transmitida pelo legislador que a recebeu,naturalmente, no seio da comunidade, o indiscutível desiderato do Povo?

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Na Administração Pública, o resultado positivo de qualquer empreendimento éuma obrigação: não se aceitam escusas ou justificativas que não tenhamsustentação admitida preliminarmente pelo Tribunal de Contas, depois pelo PoderLegislativo e, por derradeiro, pelo Poder judiciário.

Este, o tripé judicante do comportamento do Poder Executivo a quem competesomente, com probidade, gerir os recursos públicos.

E, voltando ao Libertador, com ele comungando rezamos:

"Os povos, com sagaz intuição, perdoam em seus governantes todos osdefeitos; estão prontos a olvidar os erros, mas recordam e cobramperpetuamente a apropriação dos dinheiros públicos." (of. cit. pág. 73. )

CONCLUSÕES

1. O projeto de lei orçamentário elaborado pelo Executivo deve colherinformações na comunidade à qual se destina para refletir com fidelidade suasnecessidades e constituir peça programática dinâmica.

2. A execução orçamentária há de se processar com precisão e rigor absolutoe, mais, com critérios de moralidade e legalidade a fim de que o justo resultadoateste os altos propósitos da Administração.

3. Tanto o Poder Executivo quarto o Poder Legislativo, este com o auxílio doTribunal de Contas, dispõem de todos os mecanismos necessários à apuração dequaisquer irregularidades ou ilegalidades no campo das finanças públicas, de sorteque a PROBIDADE ADMINISTRATIVA é aferida "interna corporis" pela própriaAdministração por força do controle interno que lhe é atribuído pela Lei Maior e,externa corporis, pelo Legislativo e pelo Tribunal de Contas, por força do controleexterno que lhes é outorgado pelo mesmo Estatuto Maior.

4. O Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União (Lei nº 1.711, de28-10-1952) declara que, pelo exercício irregular de suas atribuições, o funcionárioresponde civil, penal e administrativamente (art. 196 ), decorrendo aresponsabilidade civil do procedimento (atos ou omissões) doloso ou culposo, queimporte prejuízo da Fazenda Nacional, ou de terceiros (art. 197), verificado nodesempenho do cargo ou função (art. 199), cumulando-se as penas civis, penais edisciplinares conquanto independentes entre si. Idêntica independência verifica-sepor igual na instância civil, penal e administrativa (art. 200).

5. Nosso Código Penal - ao considerar, para os efeitos penais, funcionáriopúblico quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce o cargo,emprego ou função pública tanto na Administração Direta quanto na AdministraçãoIndireta (Paraestatais) - fornece o elenco de ações que configuram os crimes contraa Administração Pública em geral, entre eles destacando: o Peculato, o extravio,sonegação ou inutilização de livro ou documento, o emprego irregular de verbas ourendas públicas, a concussão, a prevaricação e a violência arbitrária (art. 312 usque327, do Código Penal Brasileiro). Outro fundamento não tem este título do EstatutoPenal, senão o de defender os interesses da Administração Pública, fixando aquantidade das penas aplicáveis a todos quantos firam os princípios que regem amoralidade administrativa.

6. A PROBIDADE ADMINISTRATIVA, portanto, não é abstração, mas realidadeNATURAL E JURIDICA, condicionadora do comportamento ético a ser observadopor todos os Homens Públicos.

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A coletividade, por fim, deve participar de todas as realizações públicas doPaís, mediante informações precisas dos meios disponíveis e das metas objetivadaspela Administração, para poder discernir e avaliar o grau de aproveitamento ou dedesaproveitamento dos atos governamentais, a fim de REPRESENTAR ePETICIONAR, perante a própria autoridade, pelos abusos que verificar e, também,ANULAR os atos administrativos danosos por meio de AÇÃO POPULAR na esferado PODER JUDICIÁRIO, tudo com embasamento no § 4°, 11, 30 e 31 do art. 153 daConstituição da República Federativa do Brasil.

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A DESBUROCRATIZAÇÃO E MODERNIZAÇÃOADMINISTRATIVAS E OS TRIBUNAIS DE CONTAS

PEDRO DELEORCE

Inspetor-Geral de Controle Externo do Tribunal de Contas do Distrito Federal.

1 - BUROCRACIA E DESBUROCRATIZAÇÃO

1.1 - Burocracia; sentidos próprio e pejorativo da palavra.

1.2 - Desburocratização; combate à burocracia desnecessária ou excessiva.

1.3 - Conscientização do problema; trabalho indispensável.

O termo desburocratização não nos parece o mais adequado para o significadoque a ele se tem dado.

Todos sabemos que a palavra burocracia significa procedimentos próprios dosserviços de registros, controles, tramitação de papéis etc., bem como as respectivasnormas inerentes a qualquer organização, tanto do setor público, quanto do setorprivado.

O excesso desses procedimentos, bem como a criação desnecessária deexigências outras, para atender a meras formalidades, sem reais objetivos, é queensejou o sentido pejorativo hoje dado ao termo burocracia.

Sabemos todos, também, que há uma tendência muito própria do funcionáriode escritório, com ênfase para o setor público, de criar papéis, normas e exigênciasde caráter burocrático, com vistas a estabelecer registros e controles, especialmenteobjetivando garantir a veracidade de situações e procedimentos de outros órgãos oupessoas, sem levar em conta o custo econômico e social decorrentes de taisexigências.

Pior, ainda, é que, por vezes, cessam os controles ou desaparecem osobjetivos e continuam os papéis a serem exigidos.

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Para combater essa burocracia desnaturada e distorcida é que se idealizaramos procedimentos de desburocratização, de tal sorte importantes que justificaram acriação de um Ministério somente com essa finalidade.

É de tal ordem esse estado de coisas que merece aplausos a iniciativa doGoverno de lutar contra a burocracia desnecessária, sendo dignas do nosso maiorrespeito a coragem e a tenacidade com que vem atuando nessa área SuaExcelência o Senhor Ministro Hélio Beltrão.

Confiamos, plenamente, no resultado do trabalho abnegado de SuaExcelência, reconhecendo, todavia, que a luta terá que ser permanente, sem tréguasporque, a cada papel ou exigência desnecessária que o seu Ministério consegueabolir, possivelmente alguns outros são criados, nos diversos escalões daAdministração Pública.

Espera-se que o trabalho de conscientização nacional que Sua Excelência vemdesenvolvendo produza os resultados positivos que todos desejamos.

2 - A REFORMA ADMINISTRATIVA

2.1 - Constituição Federal de 1967; Decretos-leis nºs 199/67, 200/67 e 900/69.

2.2 - O fim do "registro prévio".

2.3 - Remessa sistemática de papéis - proibição.

2.4 - Controles puramente formais, de custos superiores aos riscos - abolição.

2.5 - Valorização do sistema de Controle Interno.

2.6 - O Controle Externo com base nos procedimentos de auditoria.

Parece não restar dúvida de que a Reforma Administrativa Federal, delineadano Decreto-lei n9 200/67, com as modificações do Decreto-lei nº 900/69, expedidosem decorrência da nova ordem constitucional de 1967, pode ser considerada comomarco inicial do trabalho de desburocratização e modernização administrativas.

Relativamente aos Tribunais de Contas, no entanto, a matriz dessamodernização e simplificação de procedimentos administrativos encontra-se noDecreto-lei n.º 199/67, que consubstancia a Lei Orgânica do TCU.

A extinção do arcaico sistema de "registro prévio", mediante o qual aAdministração somente podia ultimar suas operações financeiras e orçamentáriasapós o beneplácito do Tribunal de Contas, representa, no nosso modesto entender,por si só, um grande passo no caminho da simplificação e desburocratização deprocedimentos, já que, a par de emperrar a máquina administrativa, nãoproporcionava a contrapartida desejável de eficiência do controle que, afinal,objetivava.

Com a Reforma de 1967 os Tribunais de Contas perderam a competência paraesse tipo de controle prévio dos gastos públicos, que, na verdade, em grande parte,não tinham condições materiais de executar com plenitude, porque demasiadoabrangente, o qual, com freqüência, se acabava esgotando no exame de aspectospuramente formais.

Parece lícito acrescentar, ainda, que grande parte das despesas públicas erarealizada sob a chancela legal do chamado "registro automático", e, assim,praticamente posta à margem da ação fiscalizadora dos Tribunais de Contas.

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Em compensação, receberam esses Tribunais, com a Reforma, competênciapara exercer o controle externo de maneira muito mais efetiva, pelo sistema deauditoria, universalmente consagrado como eficiente e de menor custo operacional,além dos aspectos positivos de não interferir no andamento da máquinaadministrativa e de obrigar o administrador dos recursos públicos a adotar decisõessob sua inteira responsabilidade, sem a tutela prévia do Tribunal.

Entendemos, assim, que a substituição do "registro prévio" pelo novo sistemade controle por auditoria constituiu importante providência de desburocratização emodernização administrativas, que, a par de eliminar considerável número depassos na tramitação de papéis e processos, proporcionou maior eficiência aocontrole e reduziu custos operacionais, com ranho de tempo.

Outro benefício da Reforma, de caráter desburocratizante, consiste na vedaçãocontida no Decreto-lei n° 200/67, quanto -à "requisição sistemática de papéis".

Dispõem hoje os Tribunais de Contas de competência constitucional P legalpara valer-se das inspeções in loco, e examinar o que julgarem necessário, nãosendo dada à Administração a recusa ou sonegação de qualquer documento ouelemento de informação pedido por seus inspetores.

Essa competência constitui prerrogativa muito mais ampla do que a anterior,pois que os Tribunais recebiam grande massa de papéis, com informações nemsempre fiéis aos acontecimentos a fiscalizar.

Hoje, em vez do exame de números e dados frios indicados em balanços eoutros documentos, que nem sempre representam, com real clareza, as operaçõesocorridas ou as decisões tomadas, os agentes do controle externo têm aprerrogativa de ir às repartições verificar in loco a realidade dos atos praticados efatos ocorridos, retratando em relatórios o resultado do seu trabalho, em termos maisobjetivos e confiáveis.

A recomendação contida na legislação reformista (art. 14 do Decreto-lei n°200/67), para que sejam abolidos controles puramente formais, de custos superioresaos riscos que poderão advir de sua ausência, constitui, também, princípio que visaa desburocratizar a máquina administrativa.

Salvo em casos excepcionais, não se compreende sejam mantidos controlescujo custo operacional ultrapasse os valores controlados.

Com base nesse princípio, a Administração Pública tem determinado a baixana responsabilidade de devedores de pequenos valores, cuja cobrança custariamais do que a importância do débito a ser recebido.

Digno de registro, porque resulta também em desburocratização, é a relevânciaque a Reforma Administrativa deu ao Sistema de Controle Interno, elevando-o anível constitucional.

A valorização desse sistema, com o objetivo de torná-lo cada vez anaisconfiável, é da mais alta valia para a eficiência do Controle Externo, que, podendodele valer-se, com razoável segurança, poderá restringir a penetração dos seusexames e verificações e diminuir as requisições de papéis e documentos.

Para que o sistema do Controle Interno, que deve ter em sua cúpula orespectivo órgão de auditoria interna, possa, realmente, desincumbir-se da missãoque a Constituição lhe reservou é de suma importância que o Controle Externo, em

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lugar de tentar suprir-lhe as deficiências, como freqüentemente ocorre, exija que aAdministração organize o referido sistema de forma efetiva e adequada para que secumpram os mandamentos constitucionais.

Tendo como base' de atuação um sistema de auditoria, consentâneo com osetor público e devidamente planejado e programado, adquire o Controle Externocondições de realizar-se com maior agilidade e eficiência e, ainda. a menor custooperacional do que a fiscalização exercida pelos Tribunais de Contas à vista depapéis e documentos enviados pela Administração.

Assinale-se fato importante que é o da maior oportunidade com que seprocessa essa fiscalização.

Pelo sistema de controle, somente à vista de documentos enviados aosTribunais, uma vez já rechaçado o sistema de "registro prévio" por todas as suasinconveniências e quase nenhuma vantagem, a fiscalização dar-se-á sempre aposteriori, além do risco de o controle vir a esgotar-se nos aspectos formais damatéria sob exame. Na verdade, por esse sistema. os Tribunais estarão atuandosobre o passado, tendo que aceitar, com freqüência, a figura do "fato consumado".

Enquanto isso, pelo sistema de fiscalização in loco, o Controle Externo temcondições de examinar os atos e fatos em época contemporânea à sua efetivação,podendo, por isso, exigir que, em tempo oportuno, a Administração corrija as falhasou adote procedimentos de resguardo do patrimônio público.

Além desse mérito, as inspeções in loco permitem que o Controle Externo sejarealizado com maior efetividade porque, segundo critério exclusivo do próprioTribunal, podem os exames atingir a extensão ou o aprofundamento que ascircunstâncias exigirem.

Assim, o controle pelo sistema de auditoria é, ou pode ser, conforme decida oTribunal, mais abrangente e aprofundado, menos oneroso, mais ágil econtemporâneo aos fatos e, conseqüentemente, mais eficiente, dependendo tudoisso, todavia, da ação do Controle Externo.

Dignas, ainda, de especial referência, quanto a procedimentos dedesburocratização relacionados com os Tribunais de Contas, são as novas normasde fiscalização de recursos federais transferidos, pela União a Estados, DistritoFederal e Municípios, estabelecidas pelo Decreto-lei ns 1.805/80, com as alteraçõesintroduzidas pelo Decreto-lei n° 1.833/80.

Em razão da nova sistemática de controle prevista naqueles diplomas legais,deixaram de ser remetidas, por aquelas unidades da Federação, ao Tribunal deContas da União, anualmente, mais de 4.000 prestações de contas.

Acrescentando-se o custo operacional de um considerável número dediligências decorrentes do exame de tais contas, verifica-se que a providência gerousubstancial economia de recursos, em termos de papel e trabalho, tanto para o TCU,quanto para Estados, Distrito Federal e Municípios.

Vale ressaltar que o novo sistema não ocasionou, praticamente, acréscimo detrabalho aos Tribunais que receberam a competência de fiscalizar a aplicação dosmencionados recursos, tendo em vista que as Contas das citadas entidades já sãopor eles examinadas e nelas os referidos recursos sempre estiveram incluídos.

3 - MODERNIZAÇÃO DO CONTROLE EXTERNO

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3.1 - Treinamento e reciclagem de pessoal

3.2 -Implantação de modernas técnicas de auditoria

3.3 - Adaptação das técnicas e procedimentos do setor privado ao setor público

3.4 - Criação de modelo adequado ao setor público

3 . 5 - Inspeções programadas

3.6 - Inspeções especiais

3.7 - Consolidação do sistema

Todos que exercitam, de alguma forma e em qualquer grau, o Controle Externosabem que a Reforma Administrativa deixou, em princípio, os Tribunais de Contasmeio perplexos, por força da mudança radical que trouxe em seu bojo, notadamentequanto à fiscalização financeira e orçamentaria.

O sistema de "registro prévio" burocrático por excelência, montado sob a formade mecanismos administrativos quase automáticos de registros e trocas de papéis,no qual a tônica era o exame da legalidade e da conferência aritmética de valores,não exigia do funcionalismo dos Tribunais outra atitude que não a de examinar einformar os papéis que lhe caíam na mesa de trabalho.

De repente, esses papéis não viriam mais aos Tribunais de forma automática.

O Controle Externo, como assim passou a ser chamado, havia ganhocompetência muito mais ampla. Mas, para exercita-la, era preciso deixar oaconchego do trabalho interno e ir à Administração fiscalizar. E mais, essafiscalização não seria mais tão formal e puramente aritmética. Era imprescindívelformar juízo sobre o mérito dos atos administrativos e, a cada exame, arcar com aresponsabilidade de tudo fazer constar de relatório específico, para conhecimento eprovidências de alçada superior.

A Reforma encontrou, assim, nos Tribunais de Contas, um funcionalismo bome bem qualificado para o que vinha fazendo. Despreparado, todavia, em grandeparte, para realizar a fiscalização pelo *novo sistema.

Em face da impossibilidade de substituição, o treinamento e a reciclagem deconhecimentos foi a solução que, em todos esses anos, tem sido adotada paraadequar e preparar o material humano necessário ao pleno exercício do ControleExterno, sem falar, naturalmente, das novas admissões mediante concursospúblicos, com exigências ajustadas no sistema de auditoria.

Parece não ser demasiado afirmar que esse treinamento e reciclagem deconhecimentos há de ser permanente, em diversos níveis sob variados aspectos,para que os Tribunais possam manter em elevado nível técnico o pessoal queexerce o Controle Externo, especialmente aquele que o executa em trabalhos decampo.

O aperfeiçoamento tecnológico hoje avança velozmente.

O volume de recursos financeiros mobilizados pelo Governo é cada dia maior.

O desenvolvimento do País demanda investimentos em projetos cada vez maisamplos, complexos e sofisticados.

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Em conseqüência, os mecanismos de controle precisam acompanhar paripassu esse desenvolvimento, sob pena de caírem no obsoletismo, e de afiscalização não se efetivar.

Os três elementos fundamentais: planejamento, execução e controle precisamestar afinados, em termos de eficiência, para que a Administração e gestão dosrecursos públicos sejam realizados de forma eficaz.

Para que os Tribunais de Contas possam alcançar .seus objetivos, dentrodesse contexto, é indispensável que o Controle Externo se atualize, adotandomodernas técnicas de auditoria, para realizar seu trabalho de maneira efetiva.

A Reforma Administrativa, no nosso entender, ao transplantar para o setorpúblico o sistema de controle por auditoria, até então somente utilizado no setorprivado, cometeu certa violência, embora necessária. É que, segundo já vimos, ofuncionalismo dos Tribunais não se mostrava preparado para esse trabalho técnico,quer do ponto de vista intelectual, quer do psicológico.

Além disso, determinados procedimentos de auditoria, universalmenteconsagrados no setor privado, tiveram de ser adaptados para aplicação no setorpúblico, acima de tudo na área da Administração Direta ou Centralizada.

Até mesmo em relação a alguns organismos administrativos da AdministraçãoIndireta, como as autarquias -e fundações, teve o sistema de adequar-se àscaracterísticas típicas desses órgãos, em razão, principalmente, da legislação deregência.

Tais considerações nos levam a crer que o Controle Externo terá que criarmodelo próprio de auditoria, alicerçado no conhecimento e experiência do setorprivado, mas adequado ao setor público, segundo as características peculiares dosdiversos tipos de órgãos a serem fiscalizados, bem como, em função da capacidadeatual do funcionalismo existente nos Tribunais, que deverá ser treinado e recicladopara a evolução e aperfeiçoamento desse modelo.

Num primeiro momento, o trabalho realizado pelo Controle Externo, com apoionas chamadas inspeções in, loco, tanto programadas, quanto especiais ouextraordinárias, já vem oferecendo razoáveis resultados, notadamente, secontrastarmos o atual sistema com o anterior.

A fiscalização decorrente das inspeções e a simples expectativa de controleresultante desse tipo de trabalho tem levado os diversos setores da Administração aaprimorar substancialmente a dualidade do planejamento e da execução financeira eorçamentária a seu cargo, como também a aperfeiçoar os mecanismos de controleinterno, com o intuito de torná-lo confiável e adequado, em benefício da própriasegurança dos administradores.

A consolidação desse sistema favorecerá, em futuro próximo, se dêem passosmais largos, com vistas ao emprego de técnicas mais modernas c de sistemas maissofisticados de controle como, por exemplo, a utilização de processamento de dadosa serviço dos Tribunais, para o exercício da fiscalização que lhes compete.

É evidente que cada Tribunal de Contas desenvolverá e fará evoluir seu própriomodelo de controle de forma talvez diferente dos demais, em função dos recursosmateriais e humanos disponíveis e de outras circunstâncias peculiares a cada caso.

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O importante, todavia, é que haja certa uniformidade de procedimentos, emtorno dos princípios que regem a Reforma Administrativa.

4 - TRIBUNAL DE COTAS DO DISTRITO FEDERAL - FILOSOFIA E MODELODE CONTROLE EXTERNO

4.1 - Fiscalização com apoio, principalmente, nas inspeções in loco. Legislaçãopioneira - 1962.

4.2 - Prestígio ao trabalho do órgão de Auditoria Interna.

4.3 - Supressão da remessa de documentos e papéis ao TCDF, em função dograu de confiabilidade na eficiência do Controle Interno, a juízo do Tribunal.

4.4 - Tomadas de contas de ordenadores de despesa e de agentesresponsáveis por bens e valores. Simplificação.

4.5 - Prestações de contas de suprimentos de fundos (adiantamentos) e deauxílios e subvenções. Fiscalização por meio de inspeções.

4.6 - Prestações de contas de entidades da administração indireta e fundações.Acompanhamento dos atos de gestão. Inspeções.

4.7 - Fiscalização de projetos de obras. Acompanhamento a nívelfísico-financeiro.

4.8 - Plano Geral de Inspeções - programação anual.

A título unicamente de informação, sem pretender, com isso, indicar modelo aser seguido por outros Tribunais, não poderíamos deixar de expor nestaoportunidade, embora de maneira sucinta, a forma adotada pelo Tribunal de Contasdo Distrito Federal, para exercer a fiscalização que lhe compete, em harmonia comos critérios e princípios ditados pela Reforma Administrativa.

Assinala-se, de início, que o Tribunal de Contas do Distrito Federal, muito antesda Reforma de 1967, isto é, desde 1962, já dispunha de legislação que lhe permitiautilizar as inspeções in loco, como instrumento de fiscalização, não somente para ocontrole dos atos praticados no âmbito da hoje denominada Administração Direta,como, também, para verificar a correção dos procedimentos de gestão dosresponsáveis pelas entidades descentralizadas, atualmente classificados comoAdministração Indireta e Fundações.

Ressalte-se que, em relação às empresas públicas e sociedades de economiamista, os demais Tribunais de Contas do País, somente a partir da vigência da Lei n°66.223/75, passaram a ter competência para fiscalizar, efetivamente, tais entidades.

Dessa forma, teve o TCDF condições mais favoráveis, em termos de legislaçãode regência, para desencadear os novos procedimentos de fiscalização, por meio deinspeções in loco, bem antes da Reforma Administrativa de 1967.

Atualmente, a fiscalização, a cargo do TCDF, dos atos praticados pelo Governodo Distrito Federal, tanto na área da Administração Direta, quanto no âmbito dasentidades da Administração Indireta e Fundações, é exercida, basicamente,mediante inspeções in loco.

Tem contribuído, sobremaneira, para o êxito dessa fiscalização a eficiência doControle Interno.

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Diga-se, de passagem, que essa eficiência resultou, em grande parte, dedecisões e procedimentos do Tribunal, tendentes a prestigiar e apoiar o trabalhodaquele Controle, exigindo, em contrapartida, atuação mais eficaz dos seus agentes.

À medida que o Controle Interno vem sendo aprimorado, como resultado,também, da conscientização dos responsáveis pelo Executivo, que passaram a vernele instrumento de maior segurança administrativa, o Tribunal, a seu juízo, temdispensado a remessa de documentos e papéis arquivados nos respectivos órgãosde origem.

Assim, por exemplo, as prestações de contas dos agentes responsáveis porsuprimentos de fundos, anteriormente denominados adiantamentos, e das entidadesprivadas que recebem auxílios e subvenções não mais são enviadas ao Tribunal,para exame e julgamento, salvo quando o ordenador da despesa ou o órgão decontrole interno respectivo verificar a existência (lê falha insanável.

A comprovação dessas aplicações de recursos públicos, quando realizada deforma regular, permanece arquivada no órgão de origem dos recursos, para examepelos inspetores do Controle Externo, por ocasião da verificação da tomada decontas anual do ordenador da despesa ou, ainda, em qualquer das inspeçõesrealizadas no correr do exercício.

As tomadas de contas dos ordenadores de despesa, por seu turno, não sefazem acompanhar de documentos comprovantes de despesa. São elasorganizadas por agente do próprio Executivo, contendo, tão-somente, relatório doseu organizador, mapas demonstrativos da execução orçamentária e outrasinformações úteis à sua compreensão, bem como relatório o parecer do órgão deauditoria interna. São esses documentos que servem de base ao trabalho defiscalização a cargo do Controle Externo.

Na organização das prestações de contas das entidades da AdministraçãoIndireta e Fundações, o Tribunal, recentemente, dispensou a remessa de inventáriosfísicos de bens móveis e imóveis, desde que a respectiva entidade mantenha setorcompetente de controle interno desses bens, cuja eficiência o Controle Externo, aseu juízo, possa confirmar.

Nessa área da Administração, o Tribunal, também, se faz presente, durantetodo o correr do exercício, através da fiscalização por inspeções.

O exame das prestações de contas anuais é muito facilitado porque o Tribunal,ao recebê-las, está a par de todas as ocorrências que tenham merecido destaque,durante o exercício financeiro a que se referem, conhecendo, também, asirregularidades ou falhas verificadas no curso das inspeções, bem como, asprovidências tomadas pelos responsáveis para saná-las.

Controle que vem sendo implantado, há dois anos, no TCDF é o de fiscalizaçãode projetos de obras, com acompanhamento de nível físico-financeiro.

Esse controle está sendo realizado, com bastante êxito; basicamente por meiode inspeções in loco.

A ação do Controle Externo, nessa área começa, efetivamente, a partir daseleção dos projetos indicados no Orçamento-Programa da Administração Direta enos Planos de Aplicação das entidades da Administração Indireta e Fundações.

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Os pontos altos dessa fiscalização estão situados nos atos e procedimentoslicitatórios, nos contratos de adjudicação da obra e no cronograma físico-financeiro.

O acompanhamento de todas as fases do projeto é feito por meio deinspeções, inclusive o cumprimento das etapas do cronograma físico-financeiro.

Por derradeiro, cabe assinalar que as inspeções realizadas pelos inspetores doTCDF, com exceção das especiais, se subordinam a um Plano Geral de Inspeções,anualmente aprovado pelo Plenário do Tribunal.

Compreende tal Plano uma programação flexível de trabalho, cujocumprimento é retratado em relatórios trimestrais elaborados pelos diversos setoresresponsáveis pela sua execução. Os resultados apresentados nesses relatóriosservem de base ao reajuste da subprogramação para o trimestre subseqüente.

5 - INTERCÂMBIO DE IDÉIAS, DE INFORMAÇCSES E DECONHECIMENTOS TÉCNICOS.

5.1 - Simpósio e Seminários

5.2 - Interação a nível técnico

5.3 - Efeito multiplicador

Muito embora cada Tribunal deva ter seu próprio modelo de fiscalização,adequado às peculiaridades locais e aos meios de que disponha, em termos derecursos materiais e humanos, não há como negar o inestimável valor do constanteintercâmbio de idéias, informações e conhecimentos que se poderá estabelecerentre os técnicos de todos os Tribunais de Contas do País, visando a uma razoáveluniformização de procedimentos, porquanto os objetivos desses órgãos são,basicamente, os mesmos, e o sistema de controle deve obedecer à matrizconstitucional, conformada no Decreto-lei n° 199/67, não como um molde rígido,mas como um balizamento de princípios.

Nessa ordem de idéias, parece justo ressaltar a valiosa contribuição

que se tem obtido dos simpósios e seminários patrocinados pelo Instituto RuiBarbosa nestes últimos anos, com o inestimável apoio dos Tribunais que oscoordenaram.

A nosso ver, tais conclaves deveriam acontecer com mais freqüência, parauma difusão mais acelerada dos conhecimentos técnicos, tão necessários àmodernização do trabalho a cargo do Controle Externo.

Desejável seria, queremos crer, que todos os Tribunais de Contas reservassemem seus orçamentos dotações específicas para custear o constanteaperfeiçoamento de seu pessoal, seja mediante a realização de cursos detreinamento e reciclagem de conhecimentos de nível técnico, seja por meio dafreqüente promoção de simpósios e seminários, com idêntica destinação.

A aplicação de recursos nesses objetivos, todos sabemos, constituiinvestimento seguro, com retorno certo, especialmente pelo efeito multiplicador queproporciona, em virtude da interação que ocorre entre o pessoal técnico diretamentebeneficiado e os demais colegas de cada órgão.

Afinal, os Tribunais de Contas, apesar dos relevantes serviços que prestam àcausa do controle das finanças públicas, representam, via de regra, uma dasmenores unidades orçamentárias, em matéria de custo operacional.

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No Distrito Federal, pelo menos, essa é a posição do nosso Tribunal, nocontexto do Orçamento. De outro lado, seu custo operacional corresponde a menosde meio por cento do valor anualmente fiscalizado, no conjunto da AdministraçãoDireta, Administração Indireta e Fundações.

Ao finalizar esta breve e despretensiosa exposição, entendemos licito afirmarque modernização e desburocratização administrativas não somente podem comodevem andar de mãos dadas, a caminho do bom planejamento, para uma execuçãomais aprimorada, sob controle eficaz e a custos operacionais mais reduzidos.

Muito obrigado pela atenção de todos os senhores e senhoras.

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"A DESBUROCRATIZAÇÃO E OS TRIBUNAIS DECONTAS"

HEITOR CHAGAS DE OLIVEIRA

Secretário de Modernização e Reforma Administrativa da SEPLAN-PR.

Esta oportunidade de voltar à Bahia é para mim motivo de rara satisfação,acresce a esta a honra de dirigir-me a um auditório muito especial, onde seencontram juízes das cortes de contas e especialistas e técnicos que atuam noâmbito dos órgãos de controle das atividades públicas.

Agradeço o convite que me foi formulado pelo ilustre Dr. Joaquim BatistaNeves, digno Presidente do Tribunal de Contas do Estado da Baleia, responsávelpor esta oportunidade de contato que espero seja proveitosa para uma reflexão aque convido todos os presentes.

Tenho certeza de que, a atenção deste auditório e a sua adesão a estemomento de reflexão permitir que as idéias que venho expor sejam enriquecidas edinamizadas pelo despertar de questionamentos e inquietações que pretendosemear neste momento.

Senhores: não pode restar a menor dúvida quanto ao caráter essencialmentedemocrático das funções de controle dos recursos públicos.

A ação do estado nas modernas democracias, entre os seus mecanismos deauto-regulação encontra nos tribunais de contas e nas instituições do mesmo gêneroum instrumento de equilíbrio e controle, cuja ação adequada precisa serassegurada.

Posso garantir-lhes que estes são os pressupostos do que venho propor, semestes pressupostos não me permitiria a ousadia que me estou permitindo, natentativa de questionar ou despertar inquietações.

Reitero, portanto, o meu fundamental respeito e minha convicção de estarfalando para autoridades que dominam técnicas, conhecimento e poder decisório nocampo do controle da administração pública. Magistrados e especialistas.

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As idéias que vou expor giram em torno de um fenômeno muitíssimoimportante que se está desenvolvendo no nosso pais e que já tem encontradorepercussão internacional.

Ressalto, de saída, a repercussão internacional porque nenhuma ação dedivulgação foi promovida fora das nossas fronteiras e, entretanto, de tal forma temmobilizado a opinião pública nacional que transbordou e começa a interessar outrospaíses.

Trata-se, Senhores, do Programa Nacional de Desburocratização, trata-se dasidéias, palavras e ações simplificadoras do Ministro Hélio Beltrão e de sua equipe.

Originado da sensibilidade do Presidente Figueiredo, que percebeu suaurgência, o Programa Nacional de Desburocratização é hoje um fenômeno inédito ealtamente salutar que está encontrando eco e apoio em todos os segmentos dasociedade.

Inspirado nos mesmos princípios básicos da Reforma Administrativa do finaldos anos 60, o Programa Nacional de Desburocratização traz, entretanto, umaênfase nova: a ênfase humanista.

A tônica do programa está caracterizada legalmente pela primeira dasprioridades formuladas no decreto presidencial que o instituiu: Melhorar oatendimento aos usuários dos serviços públicos.

Quero destacar, deixar bem assinalado que este é o objetivo primordial doprograma, e, a partir deste marco, decorrem as demais preocupações e as outrasmedidas.

Apelo para a sensibilidade de cada um dos senhores para perguntar-lhes:quantos brasileiros pobres, humildes e honestos se encontram neste momento emfilas intermináveis aguardando a vez para serem mal-atendidos?

Quantas dessas pessoas estão nas filas das repartições pela 3ª, 4ª ou maisvezes?

Quantos estão sendo prejudicados pelo simples fato de terem o atendimentodos seus direitos postergado?

Todos ou quase todos, entretanto, temos certeza, estão neste momento emfilas, perdendo o seu precioso tempo e deixando de lado alguma atividade produtiva.

Sim, como as repartições só funcionam nos horários em que todos trabalham,é preciso abandonar o trabalho para ir pleitear nos balcões e guichês.

Todos ou quase todos que se encontram nas longas filas dos órgãos públicosestão também julgando, a sua maneira sofrida e revoltada, a ação do governo.

Nós todos, Senhores, que trabalhamos nos órgãos governamentais, estamossendo julgados, estamos sendo tachados de burocratas.

É que o homem comum não distingue os poderes pois não são versados emmatéria constitucional nem muito menos conhecem as diferenças entre oscomponentes da trilogia de Montesquieu.

Nós todos, Senhores, não escapamos ao julgamento dos concidadãosamargurados das filas por que também eles não distinguem os níveis de governo.

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Esta nossa solidariedade diante do julgamento do público é um outropressuposto que acrescento a esta reflexão.

A burocracia, tal como descrita no modelo ideado por Max Weber, seria dasmelhores formas de atuação do estado, a fim de atingir os seus objetivos maislegítimos, ocorre, entretanto, que, por força das disfunções acumuladas e nãodevidamente repelidas, a palavra burocracia foi adquirindo uma conotação pejorativaque, afinal, se difundiu mais amplamente do que o significado weberiano, assim, aação de depurar o organismo burocrático dos adereços espúrios que lhe foramacrescentados, precisou denominar-se desburocratização, por uma questão cultural,isto é, por ser o contrário, o antônimo, o antídoto da burocracia, no pejorativo.

É esta concepção distorcida porém consagrada pelo uso e pelos dicionáriosque paira sobre todo o aparelho burocrático, como uma acusação nacional.

Curioso e mais relevante ainda é o fato de que, se somos solidários por sermosservidores públicos e estarmos englobados por tal julgamento, passamos a sersolidários também com o mesmo público, nos momentos em que nos temos queexpor as filas, as demoras dos outros órgãos onde somos apenas usuários.

No momento em que os males da burocratização nos assaltam e nos lesampessoalmente, sabemos senti-los e queixar-nos, é então que aderimos as críticas ecomentários desairosos.

Servidores e usuários do serviço público, cidadãos que somos, como é queestá a nossa sensibilidade nos momentos em que outros cidadãos e outrosservidores, usuárias dos órgãos públicos em que trabalhamos, dependem dasnossas decisões?

Eis que uma nova questão se nos apresenta: mesmo que, em nossasrepartições e especialmente nos órgãos de controle não haja contato direto com opúblico, há, indiretamente, atitudes de decisões que vão influir na capacidade deatendimento dos setores da administração que contatam diretamente o grandepúblico.

Este quadro é a .realidade. É, aliás, a realidade em grandes contornos. O panode fundo do grande drama da burocracia nacional. Drama constituído pelos milhõesde cenas diárias onde os cidadãos e as empresas enfrentam as dificuldadesdecorrentes das disfunções dos órgãos públicos. Cenas dos conflitos existentesentre as .padronizações decidas e impostos no âmbito dos órgãos centrais eaplicadas rigidamente, da mesma forma, a realidade absolutamente diferenciadas.

O Ministro Hélio Beltrão tem sido incansável em apontar com precisão ascausas da burocratização no Brasil.

Disse o Ministro Extraordinário em sua conferência na ESG, em junho desteano:

"A burocratização constitui uma tendência secular de nossa administraçãopública, que encontra suas causas mais profundas na sedimentação de hábitos epreconceitos herdados de nosso passado colonial e incorporados a cultura doserviço público.

Referimo-nos especialmente a centralização, ao formalismo, e a desconfiançaque, invariavelmente, presentes ou subjacentes em nossas leis e regulamentos, se

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transformaram em responsáveis principais pelo emperramento e pela burocratizaçãoda administração pública brasileira.

De fato, a centralização excessiva das decisões e a inapetência para delegarorganismo administrativo. A concentração do poder decisório é a causa principal dalamentável morosidade das soluções, do desmesurado crescimento da máquinaburocrática e do progressivo esvaziamento da autoridade periférica. Como fatoragravante, o centralismo administrativo provoca a exacerbação de uma óticaexcessivamente central, que tende a aplicar soluções uniformes e padronizadas aum país imenso e heterogêneo, marcado por diversidades e peculiaridades, areclamar soluções diferentes para problemas diferentes.

O exagerado apego ao formalismo responde pelo absurdo de, naadministração pública, conferir-se mais importância ao documento do que ao fato,como se a vida fosse feita de papéis e não de pessoas e de fatos.

Finalmente, a marca da desconfiança, que se traduz na mórbida obsessão dafraude, está presente na maioria das leis, regulamentos e normas que regulam aadministração pública e o sem relacionamento com servires e usuários.

...............................................................................................

Quando Tomé de Souza desembarcou na Bahia em 1549, nomeadoGovernador-Geral pelo regime absolutista e centralizador vigente em Portugal, játrouxe consigo um "regimento" pronto e acabado, elaborado em Lisboa, querepresentou na verdade a primeira Constituição do Brasil. Ainda não havia povo nemsociedade, mas já existia, pré-fabricado e imposto, de alto e de longe, o arcabouçoadministrativo que deveria moldar a ambos. Esse modelo passou a prevalecer. Aestrutura burocrática sempre precedeu e condicionou a organização social.

De fato, foi principalmente na administração pública que se refugiaram eenraizaram o autoritarismo, o centralismo, o formalismo, a desconfiança e a tutelaque marcaram o arcabouço burocrático-colonial português."

A centralização gera decisões demoradas e inadequadas porque são tomadassem o conhecimento direto dos fatos e muitas vezes desencadeiam padronizaçõesingênuas porque inaplicáveis a realidades diversas. Padronizações que consagrame impõem formalidades que acabam atribuindo aos documentos e à papelada umaimportância muito maior do que aos fatos e às pessoas.

A interferência excessiva do Estado na atividade privada, bem como ainterferência excessiva da União na área de atuação dos Estados e dos Municípiossão, ainda hoje, manifestações de centralização do mesmo tipo de ação de tutelaexistente nas relações entre a metrópole e a colônia, relações que se caracterizamainda hoje por tratar os cidadãos brasileiros como se fossem súditos.

Este ranço colonial permanece e precisa ser erradicado.

Em todos os casos de embaraço burocratizante vamos encontrar normasbaseadas na desconfiança, no centralismo e no formalismo excessivo.

Outros fatores, certamente, poderão ser encontrados nas organizaçõespúblicas gerando as disfunções que se refletem nas demoras e atrasos.

Nestes dois anos de existência do programa, cerca de duas centenas de atosforam baixados com o objetivo de simplificação da administração pública, da

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desconcentração das decisões, da eliminação dos excessos de formalismos,exigências desnecessárias e controles prévios ineficazes.

Este trabalho de erradicação tem-se concentrado inicialmente na alteração dosdispositivos legais e normativos em geral, onde se encontram as determinaçõesburocratizadas que devem ser cumpridas pelos servidores públicos.

Este .processo de depuração dos instrumentos normativos (leis, decretos,portarias etc.), mesmo passados dois anos, ainda está longe de considerar-seconcluído.

Ainda é necessário identificar nas normas os focos de burocratização esubstituí-los por dispositivos simplificadores.

Por mais que se tenha feito em termos de medidas a nível federal, muito maisprecisa ser feito. Muito mais então se considerarmos que, como diz o MinistroBeltrão, "em sua aversão a burocracia, o homem comum, não sendo versado emmatéria constitucional, costuma desconhecer as fronteiras da federação e da divisãode poderes, para ele a burocracia é uma só, seja ela federal, estadual ou municipal".

O Programa Nacional de Desburocratização, tem entre os seus objetivosprioritários os pequenos.

O pequeno cidadão, humilde e honesto que tem todo o direito de ser bemtratado e atendido pelos órgãos públicos; a pequena empresa sufocada pela cargaburocrática; o pequeno servidor, especialmente o que vive o cotidiano dos balcões eo pequeno município, o menor na federação.

Tem sido bastante divulgadas as medidas do Programa Nacional deDesburocratização.

Diversas delas dirigidas diretamente ao interesse dos cidadãos, outras aos daspequenas empresas, outras aos dos servidores.

Além desta fundamental dimensão do programa, nitidamente de cunho jurídicoe político, voltada para a eliminação das causas maiores da burocratização, outrosaspectos práticos e relevantes do processo de desburocratização devem serressaltados.

Pretendo, agora, analisar o .programa, a partir de dois conjuntos de raciocíniosfundamentais.

O primeiro raciocínio partiria de algo que denomino "premissa organização .Quero dizer com isto que o objeto de análise e alvo da ação seria a organização emsi, como é hoje, como está funcionando agora, com a configuração legal,institucional e estrutural que atualmente tem. Por organização entende-se, nestecaso, tanto um órgão público observado isoladamente, como a organização estatal,isto é, a própria administração pública.

O outro raciocínio teria como ponto de partida algo que chamo de "premissafunção". Com isto identifico como objeto da análise e da ação do programa a funçãodo órgão público, aquela que gerou a necessidade de sua criação.

A urgência que originou a decisão política de desburocratizar a administraçãopública não permitiria uma ação baseada no que estou denominando de "premissaorganização". Quando mais não fosse, bastaria a constatação de que, há longotempo vêm sendo tomadas diversas medidas isoladas voltadas para aspectosinternos da administração pública, permanecendo incólumes, entretanto, os efeitos

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que continuam a prejudicar o cidadão e a sociedade: filas, demoras, indecisões. Éque as causas maiores da geração de entraves não se encontram no âmbito internode cada órgão.

A função social da administração pública, por exemplo, está devidamenteconsiderada quando o ministro extraordinário usa como aforismo a expressão"serviço público é serviço ao público", ou ainda quando o Ministro Beltrão afirma, aose referir ao programa, que se trata, "antes de tudo, de uma mudança filosóficadecorrente da vontade (decisão) política de mudar".

A "premissa função" e, principalmente, a ênfase na função social estão,portanto, no próprio embasamento filosófico do programa, a administração públicaprecisa reencontrar a sua razão de ser: servir aos diversos segmentos da sociedadenacional, isto é, a cada cidadão, às empresas, aos grupos sociais.

A partir de pesquisas de qualidade de atendimento realizadas nos órgãospúblicos de seis capitais brasileiras (Rio de janeiro, Porto Alegre, João Pessoa, SãoPaulo, Brasília e Recife), a equipe do programa levantou uma série deconsiderações que deverão ser levadas em conta para aperfeiçoar as relações comos usuários.

Além das pesquisas mencionadas, que contaram com a participação deestudantes universitários do Projeto Rondon, os milhares de cartas que têm chegadoconstantemente ao Gabinete do Ministro Beltrão, trazem queixas e sugestõesrelativas a atendimento do público.

Com base nestes dados, que foram obtidos no contato direto com cidadãos,empresas e servidores públicos, desenvolveu-se um conceito de qualidade deatendimento que envolve os seguintes itens principais de adequação:

- Instalações físicas;

- descentralização das unidades de atendimento;

- horários de atendimento;

- simplificação de rotinas e formulários;

- redução de exigências e controles a priori;

- nobilitação do trabalho de atendimento;

- utilização de meios de telecomunicação;

- divulgação de informações sobre endereços, serviços e documentosnecessários.

Com base nesta conceituação de qualidade de atendimento, inferida dascarências constatadas, algumas experiências piloto de melhoria do atendimentoestão sendo desenvolvidas em vários órgãos públicos.

Da vivência com estes projetos pilotos, foi possível formular uma estratégia deação que denomino de mudança organizacional a partir das demandas externas.

Uma estratégia nova de reforma ou modernização administrativa foi aalternativa encontrada para desenvolver uma ação de mudança dos órgãos públicosque responda a urgência de atender melhor os milhões de brasileiros que continuamdesrespeitados pelas filas e demoras.

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Esta estratégia nova e coerente com os princípios do programa está sendotentada pela SEMOR - Secretaria de Modernização e Reforma Administrativa daSEPLAN.

Através de projetos piloto de melhoria da qualidade de atendimento, estamosbuscando uma nova metodologia de ação renovada.

A primeira etapa consiste basicamente no diagnóstico da efetividade do órgão.Isto é, na caracterização do impacto que a ação do órgão exerce sobre a suaclientela.

Este diagnóstico se obtém através de pesquisa junto aos usuários e aosservidores que têm contato direto com o público.

Importa saber o quanto o órgão está distanciado ou não das suas funções,especialmente da sua função social.

Um diagnóstico da efetividade também se completa e se atualiza através dainstitucionalização de mecanismos sensoriais da organização.

Os dirigentes dos órgãos, uma vez convencidos do significado do seu papel,precisarão instrumentar-se com informações atualizadas sobre como os serviçosestão sendo percebidos por quem os utiliza.

Equipes dedicadas a identificar problemas no atendimento, deverão informar adireção do órgão sobre queixas, sugestões e aspirações da clientela, transmitidasaos servidores do balcão, encaminhadas através de cartas ou outros meios decomunicação.

A partir daí, isto é, em função das demandas externas, é que deverá iniciar-see basear-se o processo de mudança organizacional.

A segunda etapa consistirá de um processo de mudança planejada na faixa decontato entre a organização e o usuário.

Uma vez identificadas as prioridades devem ser alteradas e adequadas ascondições de atendimento.

Não se trata apenas de mudar os aspectos físicos dos locais de atendimento,mas de reduzir as filas sem disfarçar as demoras.

O objetivo é resolver o problema no balcão.

O que se pretende, em primeiro lugar, é que só vá até o guichê a pessoa querealmente precisa ir ali.

Para isto é necessária alguma forma de recepção e triagem orientando para talou qual guichê, para tal ou qual andar. Melhor ainda, se um bom mecanismo decomunicação social informar ao cidadão o endereço certo do atendimento, antesmesmo que ele se dirija à repartição errada.

Em decorrência da mudança da filosofia, isto é, o atendimento passando a serpreocupação de toda a organização, outras mudanças vão acontecer, pornecessárias, durante a segunda etapa.

Servidores serão treinados e remanejados, os horários de funcionamento doórgão poderão ser alterados, rotinas novas e simplificadas deverão ser implantadase, antes que se retome o hábito de "racionalizar o erro", as normas deverão serrevistas para se retirar delas os estrangulamentos burocratizantes.

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Após esta fase de redirecionamento da organização no sentido de reencontraros interesses da sua clientela, e exatamente por causa disto, outras disfunçõespoderão ser detectadas.

A terceira grande etapa será a das outras mudanças realmente necessárias,aquelas que decorrerão de uma necessidade de se completar o processo,chegando-se mesmo a redesenhar as estruturas e a redefinirem-se as normasmaiores da organização.

A par destas etapas, permeando-as desde o princípio, toda uma revisão dosaspectos comportamentais em geral e gerenciais, especificamente, deverá serdesenvolvida.

Todos os titulares de posições gerenciais, chefes e dirigentes em todos osníveis têm que ser incentivados a mudar o seu comportamento.

O momento histórico que vive a administração pública brasileira caracteriza-sepor uma convocação, um apelo nacional a tantos quantos detêm parcelas de poderde decisão e julgamento, para questionarem, reverem, redimensionarem o papel decada órgão, com vistas ao exercício das suas funções e ao atendimento dossegmentos da sociedade que constituem as suas clientelas.

Estes homens de direção, entretanto, senhores, de tanto serem instados aatender as exigências dos órgãos centrais normativos e de controle, encontram-secerceados.

Em boa parte as limitações de que se queixam têm conotações subjetivas. Masconvido-os a refletirem, por exemplo, sobre as conseqüências medo-quase-pavorque pairam na administração pública.

Órgãos centrais normativos e de controle, cujo relevante e essencial significadoé indiscutível, precisam, entretanto, tornar-se sensíveis à constatação destasrealidades.

Os dirigentes públicos encontram-se compelidos pelas normas em vigor aatender a um excesso de formalidades padronizadas que sem sombra de dúvidadesviam a sua atenção.

Os dirigentes estão nos seus cargos para dirigir os destinos de cada órgão;para coordenar os recursos disponíveis e obter os destinos de cada órgão; paracoordenar os recursos disponíveis e obter os resultados sob a forma de serviçosprestados à comunidade.

A realidade, entretanto, é outra. Em cada nível de Governo, os órgãos centraistêm contribuído com uma carga de exigências e controle formais que prejudicam aação dos dirigentes, desviando-lhes a atenção e inibindo a ação decisória e criativa.

Neste momento, em que autoridades das mais altas deste País na área decontrole dos recursos públicos me estão dando a honra de ouvir, quero conclamá-lasao pleno engajamento na cruzada do Programa Nacional de Desburocratização, cujoêxito também depende sensivelmente do interesse e cooperação dos Tribunais deContas.

É um Programa Nacional, o que não quer dizer que seja central oucentralizado. Por seu alcance e por sua magnitude, cumpre que dele participem osque já se empenham em transformar o controle externo das finanças públicas eminstrumento de administração democrática e de serviço à coletividade. Cumpre

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participar, principalmente, do aprimoramento constante das normas em vigor, deforma a escoimá-las dos ranços coloniais e, em decorrência, eliminar os controlescujo custo econômico-social seja excessivamente oneroso. Há que rever oscontroles formais ainda remanescentes, apesar de tanto esforço já empreendido,para aliviar os administradores de atividades em essência supérfluas, as quaispossam acarretar comportamentos quase ritualizados e na verdade, inócuos.

Trago-lhes a mensagem, a conclamação, o apelo nacional, no sentido enfim dasua contribuição para a mudança urgente nos rumos da administração pública.

Os dirigentes públicos precisam, cada vez melhor vislumbrar os usuários paraalém da montanha de papéis. Precisam ter uma nova atitude que os leve a tomarconsciência das realidades de suas clientelas. Precisam assegurar aos cidadãos eàs empresas a justa e adequada contrapartida dos tributos que sustentam o Estado.E, para tudo isso, para uma ampla renovação nas atitudes e comportamentos dosdirigentes públicos, faz-se necessária mudança orientada nas normas e exigênciasde controle, seja interno, seja externo.

As Cortes de Contas cabe, portanto, papel fundamental neste processo queestá mobilizando a Nação. E, certamente, como já espelha este conclave, irão trazerao esforço nacional da desburocratização o relevante concurso da cultura, dadedicação e do patriotismo de seus integrantes.

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DAS FUNÇÕES JURISDICIONAIS DOS TRIBUNAISDE CONTAS

AÉCIO MENNUCCI

Os Tribunais de Contas brasileiros, "corpos de magistratura intermediáriosentre a administração e a legislatura"1 exercem, no sistema jurídico pátrio, trêsfunções exponenciais. São elas: a auditoria financeira e orçamentária sobre os atosde gestão das unidades administrativas dos três Poderes estatais; a emissão deparecer prévio sobre as contas prestadas anualmente pelos chefes dos PoderesExecutivos da União e dos Estados e pelos prefeitos municipais e que sãoencaminhados às respectivas Casas Legislativas e, finalmente, o julgamento dascontas dos administradores e responsáveis por bens e dinheiros públicos.

Na primeira das espécies acima apontadas, aos Tribunais compete, além deacompanhar a arrecadação da receita, examinar a execução da despesa,perquirindo da legalidade dos empenhos, contratos e licitações. Tais exames, aindanessa fase de auditoria, estendem-se à verificação da regularidade dos atos deaposentadoria, pensões e reformas dos servidores públicos.

Na segunda das atribuições supra-anotadas, os Tribunais examinam e emitempareceres técnicos prévios sobre as contas anuais prestadas pelos chefes dosPoderes Executivos e prefeitos municipais e que são dirigidas às respectivas Casasde Leis.

Aqui, há que distinguir, entre as contas apresentadas aos Tribunais pelosprefeitos (e que englobam as contas das Mesas das Câmaras Municipais) e aschamadas contas que são encaminhadas anualmente pelos governadores dosEstados e pelo Presidente da República, contas essas que compreendem tambémàquelas referentes aos Poderes Legislativo e Judiciário e também as dos própriosTribunais de Contas.

As primeiras - aquelas referentes às Prefeituras - são verdadeiramente o quepodemos chamar de contas. O Tribunal - refiro-me agora à Corte de Contas 1 Ruy Barbosa - Anais do Congresso Nacional - 1890.

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Estadual paulista - examina-as em profundidade. São perscrutados nos examesrealizados in loco (e atente-se para o fato de que existem no Estado de São Paulo570 municípios, além do Capital ) não só os balanços propriamente ditos, mastambém tudo que se refere a atos administrativos praticados pelos alcaidesinterioranos e pelas suas respectivas Câmaras Municipais. O Tribunal examina tudo:empenhos, licitações, contratos, subsídios e remunerações, quer do próprio prefeito,quer dos edis, assim como também os salários e vantagens dos servidoresmunicipais. Examinam mais: o almoxarifado, os bens patrimoniais existentes, aTesouraria, a execução orçamentária, perquirindo até o pagamento das obrigaçõesprevidenciárias devidas pelo Município e da correção da cobrança de sua dívidaativa.

Já no que se refere às contas do governador (e também do mais alto dignatárioda Nação, o presidente), contas essas sobre as quais o Tribunal emite parecerprévio - a ser submetido aos respectivos Parlamentos -a estória muda de figura...

Fixemo-nos agora, novamente, em São Paulo, para melhor compreensão doleitor e já que o que ocorre em nossa província acontece, igualmente, nos demaisEstados da Federação.

As contas enviadas pelo governador do Estado à Assembléia Legislativa,anualmente e nos termos constitucionais (artigo 34, item XIII, da Lei Maior paulista),e que passam pelo crivo do Tribunal de Contas, onde recebem parecer (artigo 90,item I da mesma Carta), rolo são contas.

Essas chamadas contas nada mais são que extenso relatório, que éacompanhado do Balanço Geral do Estado e demais demonstrações financeirascorrelatas e pelos quais se procura demonstrar o que foi gasto (despesa) e o que foiarrecadado (receita) no exercício encerrado, dando-se ênfase especial aodesempenho orçamentário do Estado e às realizações do governo dentro do mesmoperíodo.

Mas tudo isso, feito em um só processo e em termos bastante gerais.

Tais contes seriam (e são), em última análise, o espelho contábil de tudoquanto ocorreu, de natureza e ordem financeiro-orçamentárias, no ano que sefindou. Importantes, sim, .desde que consideradas sob os contornos que envolvem acontabilidade pública estadual, mas perfeitamente dispensáveis quanto aosaspectos referentes á fiscalização exercida pelo Tribunal de Contas.

A continuidade de seu envio às Cortes de Contas, que se repete e aconteceaté hoje, decorre de imperativo legal, cuja subsistência só se pode atribuir à falta deobjetividade dos feitores das últimas Constituições brasileiras, pelo menos no quetange ao capítulo da fiscalização. Obra-prima de verdadeiro bizantismo, talvez fosseválida em 1890 -quando Ruy propôs a primeira norma legal republicana sobrefiscalização dos dinheiros públicos2, ou quando foi a regra literalmente introduzida naConstituição de 1891 -, mas que não se justifica mais quando já são decorridoscerca de noventa anos daqueles eventos.

O rótulo que se lhe dá de contas e a obrigatoriedade do seu envio ao Tribunaljá deveriam estar abolidos há muitos decênios.

Aliás, um detalhe significativo, ainda dentro do capítulo: - quer na União, querem todos os Estados-membros da Federação, e desde que existem os Tribunais de 2 Decreto Federal nº 966-A, de 7 de novembro de 1890.

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Contas, em todos os tempos da história brasileira, tais contas, salvo três honrosasexceções, jamais foram impugnadas pelos Tribunais, por ocasião da lavratura doparecer prévio. As exceções a que me reporto - e que são pelo menos as queconheço - ocorreram: uma nas Alagoas - (relator delas o eminente conselheiro ArturJucá, que lá ainda preleciona e que detectou falhas graves no Balanço) e as outras,salvo erro, no Rio Grande do Norte e no Paraná.

Assim, para o entendimento do verdadeiro significado das funções exercidaspelos Tribunais de Contas, é de fundamental importância distinguir entre tais contas(meros relatórios financeiros anuais) e as efetivas contas que são prestadascotidianamente por todos aqueles que, no Estado Moderno, guardam, arrecadam oudespendem dinheiros públicos.

Sobre estas últimas é que se exerce a real função jurisdicional das Cortes deContas brasileiras, e dela trataremos logo abaixo.

Todas essas funções que foram acima indicadas e que são exercidas pelosTribunais de Contas não têm efeito de jurisdição plena, ou seja, são despidas deeficácia definitiva.

Todas elas podem ser alteradas, ou simplesmente anuladas, por outros atos denatureza administrativa, exercitados ou pelo Poder Executivo - (ad referendum doPoder Legislativo) - ou pelo próprio Legislativo, ou, ainda, pelas câmaras políticasinterioranas - as Câmaras dos Vereadores.

Desenganadamente, essa é a verdade constitucional brasileira. Os contratosde enorme valor financeiro, as aquisições vultosíssimas, as aposentadorias ereformas dos servidores públicos, as contas do Presidente da República, dosgovernadores, dos prefeitos e das Mesas das Câmaras Municipais, ainda queimpugnadas pelos Tribunais de Contas e mesmo que, umas e outras, viciadas deirregularidades e eivadas das maiores ilegalidades, podem ser consideradas emordem por, decisão do Poder Político.

É o que decorre da inteligência dos artigos 16, § 2°, 44, item VIII e 72, §§ 5° a8°, da Constituição Federal, regras essas aplicáveis aos Estados-membros, umaspela própria força originária maior, outras em razão do comando insculpido no artigo201 da mesma Carta.

E seja-nos lícito esclarecer que, no caso específico dos contratos consideradosilegais .pelos Tribunais e que, por força de lei constitucional, são obrigatoriamentesubmetidos ao Poder Legislativo, para o julgamento final, não há sequernecessidade dos Parlamentos se manifestarem expressamente sobre a matéria. Osimples silêncio do Legislativo implicará, após o decurso do prazo de 30 dias,anulação total da decisão do Tribunal...

Passemos, nesta altura, a examinar a última das funções que, no inicio desteartigo, consideramos exponenciais. A da jurisdição dos Tribunais sobre as contasprestadas pelos agentes do poder público, os jurisdicionados de quaisquer dos trêsPoderes.

As decisões dos Tribunais, no julgamento de tomada de contas, têm força decoisa julgada em relação às pessoas e matérias sujeitas á sua jurisdição. Taljurisdição é inconteste. Decorre ela de regra maior, inscrita no Estatuto Fundamentaldo País, a qual é rebustecida por normas menores inseridas nas Constituições

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Estaduais, nas leis ordinárias de organização dos Tribunais de Contas e, ainda, pelaprópria jurisprudência dos Tribunais judiciários, inclusive do Pretório Excelso.

Dizem as leis maior e menor, no que tange à matéria e em relação ao Estadode São Paulo:

"O controle externo do Congresso Nacional será exercido com o auxílio doTribunal de Contas da União e compreenderá a apreciação das contas doPresidente da República, o desempenho das funções de auditoria financeira eorçamentária, bem como o julgamento das contas dos administradores e demaisresponsáveis por bens e valores públicos" 3

e "Ainda no exercício das funções jurisdicionais, compete ao Tribunal julgar erever originariamente, ou em grau de recurso, as contas de todos os servidores equaisquer responsáveis que, singular ou coletivamente, tiverem recebido,administrado, arrecadado e despendido dinheiros públicos, depósitos de terceiros,ou valores e bens de qualquer espécie, inclusive material pertencente ao Estado, oupelos quais este seja responsável, ou estejam sob sua guarda, bem como daquelesque deverem responder pela sua perda, extravio, subtração ou dano, seja qual for oórgão ou entidade a que pertençam, ainda que essa responsabilidade resulte decontrato, comissão ou adiantamento." 4(grifos nossos.)

Na mesma linha, a posição do Supremo Tribunal Federal, verbis: "Salvonulidade decorrente de irregularidade formal grave ou de manifesta ilegalidade, é doTribunal de Contas a competência exclusiva para julgamento de contas dosresponsáveis por haveres públicos" - RF-226/81).

E tais regras se aplicam aos servidores das autarquias - (por imperativo do art.70, § 5°, da Constituição Federal) e, no que couber, aos dirigentes das empresaspúblicas, sociedades de economia mista e fundações mantidas pelo Estado - (porforça do estatuído na Lei Federal n9 6.223/75).

Possuindo, portanto, os Tribunais de Contas, ampla jurisdição conclusivaquando perquirem da legitimidade das contas que são prestadas por todos quantoguardam, arrecadam e despendem dinheiro (e bens) públicos, devem essasinstituições examinar, nos feitos submetidos a seu julgamento, somente o aspectoformal das contas? Ou, ao contrário, devem elas inquirir da legitimidade substancial,e não só da formal, examinando nas contas os aspectos essenciais da normajurídica ínsita no ato administrativo praticado? É sua obrigação verificar tão-somenteda exação dos contornos de continente, envoltórios do ato, ou ao reverso, examinarda lisura dele, inspecionando completivamente de sua natureza?

Evidentemente que a segunda das opções acima formuladas é a verdadeira.Quer se a examine sob a sua aparência legal, seu ângulos, o ético, sua face moral,ela sempre se imporá, visto que a fiscalização Tribunais de Contas exercida sobre aatividade administrativa do Estado há que investigar, além do liame existente entre aregra e o fato, o próprio conteúdo do ato.

Se assim não fosse, para que a outorga constitucional de jurisdição plena noscasos de tomada de contas? Se não, qual a razão de referidas instituições seremdenominadas TRIBUNAIS e exercerem, em sua plenitude, as prerrogativas

3 Artigo 70, § 1.°, da Constituição Brasileira.4 Artigo 09, item I, da Lei Estadual n.º 10.319, de 10 de dezembro de 1988.

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concedidas pela mesma Constituição, em seu artigo 115, somente aos órgãos doPoder judiciário?

Tais galardões jamais seriam ofertados pelo legislador constituinte aos órgãosfiscalizadores se suas funções principais, no campo da tomada de contas,houvessem de ficar restritas ao exame singelo dos elementos e itens orçamentários,do haver ou não haver créditos disponíveis, da verificação rasteira das notas deempenho e de despesa, de meros recibos e atestados de prestação de serviços ourecebimento de materiais.

Bandeira de Mello recentemente tratando da mesma matéria prelecionava,dando especial destaque às teorias dos motivos determinantes e de desvio depoder: "Aos Tribunais de Contas cabe, sem quaisquer sombras de dúvidas, verificar,nas contas prestadas pelos agentes do poder público, se nelas ocorreram ospressupostos fáticos supostos pela regra jurídica e se a decisão que a determinoucumpriu todos os requisitos legais necessários à sua validade. Aos Tribunais deContas compete, nesse plano, examinar o ato em sua intimidade, não se limitando aanalisar tão-somente os umbrais dele." 5

Essa a real legítima exegese dos §§ 1° e 4° do artigo 70 da Carta Maior. Aimperiosidade - na defesa da moralidade na aplicação dos dinheiros públicos - dainvestigação, ampla e total, da legalidade do comportamento e da lisura dodesempenho da atividade estatal.

Nenhuma magistratura, no exercício da função de julgar, estaciona nos portaisdo ato judicando. Ao contrário. Examina-o a fundo, penetrando em seu âmago,questionando da própria intenção do agente, verificando do comportamento desteface às normas que regem a sua conduta.

Assim também devem os Tribunais de Contas exercitar a sua jurisdição: -questionando amplamente da licitude do comportamento do Estado, face aospreceitos da legalidade e às regras maiores da moralidade administrativa.

Recordando, outra vez, Bandeira de Mello: "Não se cuida na tomada de contas,do exame do mérito da despesa, este privativo do Poder que o executa, mas sim, docontrole do cumprimento integral da regra que o norteia."

Controle que o Estado de Direito exige, que a sociedade espera e que o textoconstitucional permite e determina.

Este o entendimento único e verdadeiro sobre a matéria.

E, para encerrar estas considerações, nada melhor que transcrever, nesteepílogo, aquilo que o prof. Carlos Costa, atual vice-presidente do Tribunal de Contasdo Estado do Rio de janeiro, após asseverar que "a função jurisdicional não éexclusiva do Poder judiciário, nem entre nós, e tampouco em outros países. ( . . . ) Ajurisdição sobre as contas é, inegavelmente, atribuída ao Tribunal de Contas pelaConstituição Federal. Tal jurisdição é plena, absoluta, compreendendo não só ascontas e seus agentes, mas, também, todos os aspectos civis e administrativosconexos, dentro das contingências legais e constitucionais", proclama, comsabedoria: "É esse o nosso entendimento sobre a jurisdição do Tribunal de Contas eque se assim fosse exercitada, sem percalços, lhe aproximaria bem mais do

5 Celso Antonio Bandeira de Mello - Conferência proferida no simpósio "O Tribunal de Contas e sua jurisdição" -Rio de janeiro - 1982 - (suas palavras são citadas de memória pelo articulista, pois o conferencista, em suapalestra, não se baseou em texto escrito).

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necessário controle axiológico, reclamado pela consciência do povo. Controle commotivações morais, pelo qual o exame dos atos e fatos administrativos se fizessedentre os espaços e balizamentos legais, mas também e sobretudo, em face dedoutrinas éticas, a cujas refrações deve submeter-se a atividade administrativa."6

6 Carlos Costa - Conferência pronunciada na Universidade "Clama Filho", sob o tema "O Tribunal de contas -órgão e Função Jurisdicional - Rio de Janeiro - 1982.Aecio Mennucci foi procurador-geral do Estado e é conselheiro e vice-presidente do Tribunal de Contas doEstado de São Paulo.

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ASPECTOS PRAGMÁTICOS DA ADMINISTRAÇÃOINDIRETA

JOSÉ AUGUSTO DELGADOJuiz Federal (RN)

Professor Assistente do Departamento de Direito Públicoda UFRN.

1. CONSIDERAÇÔES INICIAIS

A abordagem do tema "Aspectos Pragmáticos da Administração Indireta"enseja, no campo jurídico, o estudo dos princípios e regras, instituídos por lei, queusualmente são aplicados em tal forma do Estado administrador se manifestar naexecução de sua primordial tarefa - promoção do bem comum.

Na verdade, prepondera, atualmente, o pensamento doutrinário de que há umadiferença substancial entre o que seja Estado-global e Estado-administração, por sesituarem em posições jurídicas que refletem duas realidades fáticas diversas,traduzindo, ainda, duas modalidades de imputabilidade de direitos e obrigações. Poresta razão, Marcelo Caetano, em sua obra "Princípios Fundamentais de DireitoAdministrativo", pág. 30, Forense, 1977, 1ª edição, afirmou que "O Estado-global, sequisermos personificá-lo juridicamente, tem por substrato uma comunidade depessoas individualizada pela fixação de certo território e organizada politicamente. Osubstrato do Estado-administração é um conjunto de serviços estruturado emobediência às leis promanadas dos órgãos legislativos e que é representado peloGoverno ou Poder Executivo". A seguir, como a demonstrar a preocupação deseparar os tipos identificados, conclui que "O Estado-global traduz, como pessoajurídica, a imputação de direitos e de obrigações à comunidade nele organizada comos seus órgãos legislativos, executivos e judiciários. O Estado-administraçãorecorta-se no setor governamental ou executivo, sem o abranger totalmente, poisdele se distinguem, com personalidade jurídica própria, numerosas entidades,através das quais se processa o que a doutrina chama administração indireta".

Dentro de tal contexto, assiste-se o Estado desempenhando, sob o amparo deuma modalidade técnica-jurídica, tarefas de satisfação das necessidades coletivas

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através de órgãos especialmente criados para esse fim. Saliente-se que tal modo deagir do Estado constitui, no momento, um fenômeno mundial com tendênciasexpansionistas.

Através de qualquer uma das formas de administrar (a direta ou a indireta), oque busca o Estado é a satisfação do interesse público, para tanto, não medindoesforços para instrumentar-se de forma que lhe permita atingir aquele ideal.Afirma-se, conseqüentemente, a transformação do Estado Liberal Burguês emEstado Social, processo que teve seu começo em fins do século passado e que seacelerou após a Primeira Guerra Mundial, resultando, na atualidade, no EstadoModerno, que cuida não só de garantir a expressão das formas naturais dasociedade, porém, assume uma postura de intervenção decidida na economia, nãosó tentando ordenar o corpo social, como também, procurando atenuar osdesequilíbrios, oferecendo proteção aos menos fortes, com uma adequadadistribuição da riqueza.

Não seria possível ao Estado ter êxito na ampliação de suasresponsabilidades, se continuasse a adotar regras puras de Direito Público. Assim,por exigência da própria globalidade institucional que surgiu em face das novasatividades estatais, começaram, com intensidade crescente, os modelos,instrumentos e formas de Direito Privado a serem aplicados para a realização dosobjetivos perseguidos.

É natural, porém, que o Direito Privado, que rege tais relações jurídicas, não seapresente "puro". Daí, a prudência de agir do manipulador dos preceitos jurídicosprivados nas situações discutidas, pois, naqueles casos e hipóteses em que ointeresse do Estado se apresenta como predominante, não se deve alargarindevidamente o significado e. a extensão da norma privada ou, da mesma maneira,restringi-Ia ao alcance só de interesses particulares.

2. A ADMINISTRAÇÃO INDIRETA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Estabelecida, de modo sintético, a multiplicidade das tarefas do EstadoModerno, é de bom conselho penetrar no cotejo de algumas das implicaçõesjurídicas que envolvem a Administração Indireta, começando pelas normasconstitucionais que dela tratam de modo explícito ou implícito.

2.1. O Art. 45 da Constituição Federal

O primeiro aspecto que entendo dever ser examinado é o que trata doprocesso de fiscalização dos atos praticados pela Administração Indireta. Olegislador constituinte, no particular, cometeu à lei regular o processo defiscalização, cuja competência pertence à Câmara dos Deputados e ao SenadoFederal, conforme disposição do artigo 45 da Constituição Federal: "A lei regulará oprocesso de fiscalização, pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, dosatos do Poder Executivo, inclusive os da Administração Indireta".

Há de entender-se que o dispositivo constitucional não exige lei complementar.Do mesmo medo, que a função fiscalizadora ali prevista é de natureza ampla egeral, além de não cuidar da fiscalização financeira e orçamentária prevista no artigo70 e parágrafos da Constituição Federal. Limita-se à fiscalização dos atos doExecutivo praticados através da Administração Indireta e que envolvam, ou não,aplicação de verbas públicas. É, na feliz expressão de Michel Temer, in Elementosde Direito Constitucional, pág. 45, 1ª edição, RT, "Competência derivada da idéia

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segundo a qual os atos da Administração devem ser acompanhados e fiscalizadospelo povo".

A respeito do artigo 45 da CF, na forma como está redigido, devem ficarassentados os seguintes aspectos:

a) A sua eficácia é limitada. Depende de legislação integrativa para chegar aoponto de plena operatividade.

b) Não autoriza ao Legislativo a questionar os atos discricionários praticadospela Administração Indireta.

c) A fiscalização deverá ser exercida de acordo com o processo instituído pelalei ordinária.

d) Não permite a regra constitucional que o Poder Legislativo substitua aoAdministrador. A função é, unicamente, de fiscalizar o ato administrativo praticadopela Administração Indireta, aplaudindo ou criticando, nunca a de controlar.

e) Através do processo de fiscalização podem ser fornecidos elementos quejustifiquem a convocação de Ministros de Estado e outros agentes do PoderExecutivo, para que prestem esclarecimentos.

f) Possibilita, outrossim, ao parlamentar, o uso da ação popular, do direito depetição e de representação com a finalidade de invalidar os atos administrativos quecausem ou venham a causar prejuízo ao patrimônio público.

g)Não se confunde a fiscalização do artigo 45 com a permitida pelo artigo 70 dotexto constitucional. Esta é fiscalização financeira e orçamentária, exercida com oauxílio do Tribunal de Contas.

A respeito do atual artigo 45 da Constituição Federal, é de se ter como certa aproposta feita pelo Professor Fávila Ribeiro, em seu trabalho "O Legislativo e aProblemática da Responsabilidade na Organização Constitucional Contemporânea" -Conferência pronunciada no Seminário sobre a Organização Político-Constitucionalpara o Brasil Contemporâneo", em 29-1-80, publicada pelo Senado Federal, pág. 51-, após haver enfocado a necessidade do controle parlamentar ser reforçado comprocedimentos mais versáteis, de que a redação do momento merece modificação,com o fim de incluir uma atividade mais concreta em favor do Congresso Nacional,pelo que devia ser:

"Art. 45. No exercício do poder de fiscalização pode a Câmara dosDeputados ou o Senado Federal submeter ao Tribunal de Contas ou aoMinistério Público, respectivamente, recomendação a que se instaureinspeção em órgãos da Administração Pública, para apurar irregularidades, oupara adoção de providências tendentes à apuração de responsabilidadepenal, por crime cometido em detrimento do patrimônio ou de entidadeadministrativa ou por abuso de poder contra a liberdade individual.

Parágrafo único. A lei regulará o processo de fiscalização a ser realizadodiretamente pelo Senado Federal ou pela Câmara dos Deputados em órgãosda Administração Direta ou Indireta."

2.2. O Art. 69 da Constituição Federal

O artigo 62 da Constituição Federal cuida de determinar que "O orçamentoanual compreenderá obrigatoriamente as despesas e receitas relativas a todos osPoderes, órgãos e fundos, tanto da Administração Direta quanto da Indireta,

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excluídas apenas as entidades que não recebam subvenções ou transferências àconta do orçamento".

Tem-se aí, a nível constitucional, a obrigação do orçamento anual compreendertambém as despesas e receitas da Administração Indireta, com exclusão apenasdaquelas entidades que, em face de sua autonomia financeira, não recebemsubvenções ou transferências à conta do orçamento.

O § 1° do art. 62 explicita que as despesas e receitas dos órgãos daAdministração Indireta serão incluídas em dotações globais e que tal não lhesprejudicará a autonomia na gestão legal dos seus recursos.

2.3. O Art. 7°, § 5°, da Carta Magna

Na Seção que trata da Fiscalização Financeira e Orçamentária, o § 5° do art.70 disciplina que "As normas de fiscalização financeira e orçamentária estabelecidasnesta seção aplicar-se-ão às autarquias". Estas, como entidades integrantes daAdministração Indireta, ficam, conseqüentemente, submetidas ao sistema defiscalização financeira e orçamentária estabelecido pelo Congresso Nacionalmediante controle externo e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo,instituídos por lei.

Desnecessário, a meu pensar, o conteúdo do § 5° do art. 70 da CF, uma vezque o princípio estabelecido no caput e § 1° daquele artigo, denota abranger tanto aAdministração Direta como a Administração Indireta, de vez que expressa de modoevidente a incidência da fiscalização e controle sobre as contas dos administradorese demais responsáveis por bens e valores públicos. A não ser que se queirainterpretar que o § 59 do art. 70 da CF estabelece, apenas, que os processos defiscalização e controle aplicáveis às contas da Administração Direta e às autarquiasnão podem ser o mesmo para as empresas públicas e as sociedades de economiamista, em face de suas vinculações com o Direito Privado. Assim não penso, com amáxima vênia, dos que formam corrente contrária. Entendo que o processo defiscalização financeira e orçamentária previsto pela Constituição é uno e aplicávelaos órgãos da Administração Direta e Indireta. A minha posição é no sentido de queos meios de interpretação do texto constitucional são predominantementefinalísticos. Visam extrair do texto o que, realmente, se compatibilize com a eficáciasocial da lei constitucional, aproximando-o, também, do caráter essencialmentepolítico que o cerca. A tarefa do aplicador da norma é exteriorizar o pensamento queo legislador exprimiu ao elaborá-la, garantindo-lhe, assim, a sua objetividade e a"certeza do direito na compreensão do seu sentido", levando sempre "emconsideração o substrato espiritual dela, o sistema político que a Constituiçãotraduz" (Marcelo Caetano, Direito Constitucional, vol. II, pág. 11, Forense).

Não prevalece, a meu ver, o fundamento de que há omissão do legisladorconstituinte, por haver entendido que o controle das contas das empresas públicas edas sociedades de economia mista, por serem pessoas de direito privado, não podeser feito pelas formas fixadas para a Administração Direta e para as autarquias.

É evidente que o Estado mantém tais entidades sob tutela, respeita a suaautonomia de gestão, sem que, porém, elas deixem de ser instrumentos da açãoestatal. O Estado não renuncia ao seu poder de mando sobre elas, criando,portanto, uma situação em que o Estado fica abrangido pelo Direito de três maneirasdistinta s, como bem salientou o Prof. Almiro do Couto e Silva, da Faculdade de

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Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em seu trabalho "Controledas Empresas Estatais", in RDP, n° 55/56, dez. 1980, pág. 116:

" .. pelo Direito Público, especialmente pelo Direito PúblicoAdministrativo, quando regido por regras totalmente extravagantes do Direitocomum; pelo Direito Privado Administrativo quando, para a realização dos finspúblicos imediatos, se sujeita a normas de Direito Privado; pelo Direito Privadosimplesmente, quando figura na relação jurídica como qualquer indivíduo)."

Registre-se que, embora os conceitos de empresa pública e sociedade deeconomia mista não estejam ainda, pacificados, no plano doutrinário, a ConstituiçãoFederal traça linhas fundamentais para a criação e atuação dos órgãos daAdministração Indireta, estando entre elas a finalidade do interesse público relevantepara legitimar as suas presenças no universo administrativo. Assim, a rigor, aAdministração Indireta é Administração Pública, embora realizada de formadescentralizada, pelo que não se justifica qualquer fuga às regras determinantes daSeção VII da Constituição Federal.

2.4 O Art. 99, § 2º, da Carta Maior

A pesquisa a que me propus, leva à meditação, no momento, ao art. 99, § 2°,da CF, onde está consignado que a proibição de acumular remuneradamente cargose funções públicas, estende-se, também, a cargos, funções ou empregos emautarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista.

O preceito que proíbe a acumulação de cargos, funções e empregos públicostem força de eficácia plena. E, historicamente, tem origem no Brasil imperial quando,embora sem figurar no texto constitucional, a proibição existia com base nalegislação ordinária, passando, a partir da Carta de 1891, a ser de nívelconstitucional.

Apresentando, de modo resumido os princípios que regulam a acumulação decargos, tem-se o círculo formado do modo seguinte:

a) A Constituição só proíbe acumulação remunerada.

b) A acumulação de autoridade não é proibida, conseqüentemente, o que poderesultar em uma situação pior do que a acumulação de cargos, empregos oufunções. Neste caso, entendo que a acumulação de cargos inacumuláveis, desdeque não se acumulem remunerações, só pode existir se houver interesse manifestodo serviço público, o que passa a atuar como exceção e não como regra.

c) Há possibilidade de exercício de um outro cargo ou função por funcionáriolicenciado (sem remuneração) para tratar de assuntos particulares.

d) As três primeiras exceções previstas no texto constitucional (apermissibilidade de se acumular um cargo de juiz com um cargo de professor; a dedois cargos de professor e a de um cargo de professor com outro técnico ecientífico) cuidam da atividade de magistério, sem impor qualquer restrição notocante a grau, salvo a correlação de matérias. O mesmo se diga no referente àsatividades técnicas ou científicas.

e) A quarta exceção da norma maior é a permissibilidade da acumulação dedois cargos de médico. Sobre o tema, estou de acordo com Luiz Ubiratan Oggero,advogado mineiro, que em artigo publicado na RDA 115/325, na Seção "Notas eComentários", afirmou que "não deve ser incluída na possibilidade de acumulação

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as funções de direção de hospitais, pronto-socorros, etc.. ., função de naturezaprecipuamente administrativa, embora demandem soma de conhecimentos, naárea". É de ser lembrada, contudo, a abalizada opinião de Adilson Abreu Dallariquando, ao tratar do assunto, advertiu que "nem todos os cargos de direçãoimpedem a acumulação com outro cargo ou função de médico. É preciso distinguirentre diretoria administrativa e diretoria técnica; a primeira deverá caber a tiniadministrador e a segunda a uni profissional especializado na área de atividade a«que pertença tal diretoria técnica. Ninguém melhor que um médico para exercer asfunções de diretor técnico de um hospital ou pronto-socorro»(pág. 44, in RegimeConstitucional dos Servidores Públicos, RT, 1976) .

f) O legislador ordinário pode, através de lei nacional de caráter complementar,estabelecer outras exceções à proibição de acumular, seguindo os princípios jáestabelecidos no art. 99, § 1°, da CF. Ampara tal comportamento o interesse doserviço público e a permissibilidade constitucional (art. 99, § 3º).

g) O aposentado, tendo em vista o que determina o art. 99 § 4°, dn CF, poderáreceber, simultaneamente, por três títulos diferentes dos cofres públicos. Este é opensamento de Celso Antônio Bandeira de Melo; "Isto significa que o aposentadopoderá receber, simultaneamente, por três títulos diferentes dos cofres públicos -dado que o texto constitucional o permitiu: duas vezes, pelas duas aposentadoriasque poderia legalmente ter, por se tratar de acumulações permitidas por um dosincisos do art. 99 (ou uma vez por rim dos cargos acumuláveis, que tenha na ativa) euma vez por um contrato de natureza técnica ou especializada, por exemplo" (pág.53, Apontamentos sobre os Agentes Públicos, RT, 1981).

2.5. O Art. 19, § 1º, da Constituição Federal

A imunidade tributária de que são favorecidos a União, os Estados e osMunicípios se estende às autarquias de cada uma dessas pessoas políticas. Assimexpõe o § 1° do art. 19, da Constituição Federal. A conseqüência gerada é a de queo patrimônio, a renda e os serviços vinculados às finalidades essenciais dasautarquias ou decorrentes dessas finalidades estão imunes de imposto de qualquerespécie. Desnecessário registrar que os demais órgãos da Administração Indiretanão estão protegidos pelo princípio da imunidade. A posição do legisladorconstituinte de 1967 em incluir expressamente as autarquias dentre os entespúblicos imunes ao pagamento de imposto, foi em decorrência da pressãodoutrinária. Antes havia silêncio nas constituições anteriores, o que não se justificavaem face de tais órgãos possuírem as mesmas condições das pessoas de direitopúblico que as originaram.

2.6. O Art. 205, da Constituição Federal

O assunto que exigiu interpretações doutrinárias e jurisprudenciaisdiversificadas e que, somente após muita meditação, encontra-se estabilizado, é odecorrente do conteúdo expresso no art. 205 da Constituição Federal, de profundaressonância nas relações jurídicas da Administração Indireta com as demaisentidades de direito público. O dispositivo analisado dispõe. como é sabido, que "Asquestões entre a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e respectivasautarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista, ou entre umas eoutras, serão decididas pela autoridade administrativa, na forma da lei, ressalvadoao acionista procedimento anulatório dessa decisão".

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A primeira posição assumida foi a de que era da competência da autoridadeadministrativa solucionar questão suscitada entre autarquia e empresa pública, porexemplo.

A respeito, recorde-se a conclusão exposta pelo atual Ministro Luiz RafaelMayer, no parecer emitido quando Consultor-Geral da República, de n° 1.171, de29-12-77, publicado na RDP, pág. 118 e seguintes, n°s 41/422, janeiro/junho, 1977,quando assentou:

"De todo o exposto, resulta que o Presidente da República é competente,em sede de jurisdição própria e na condição de autoridade administrativa porexcelência, para decidir, desde logo, as questões entre a União e respectivasautarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista, ou entreumas e outras. Em se tratando de verdadeiro e pleno contencioso,interadministrativo, a decisão da autoridade tem efeito de coisa julgada, comoespecífica manifestação jurisdicional, terminativa, obrigatória e imutável,insuscetível de apreciação pelo Poder judiciário, salvo a declaração judicial desua nulidade, em juízo de cassação mediante ação intentada por acionistaminoritário de sociedade de economia mista, quando esta for partesucumbente."

A evolução interpretativa, porém, exigiu que a norma fosse investigada commaior profundidade, daí surgindo uma corrente jurisprudencial dentro do EgrégioTribunal Federal de Recursos e no Colendo Supremo Tribunal Federal,manifestadora da opinião de que "O mencionado artigo 205 não diz respeito àsquestões entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios - entidades de âmbitodiverso dentro da Federação. Mas sim entre cada uma delas e as autarquias,empresas públicas e sociedades de economia mista que lhes estio vinculadas, ouentão, entre essas autarquias, empresas e sociedades, se situadas no mesmo planode governo (Federais, Estaduais, do Distrito Federal ou Municipal). Por que estão namesma esfera de administração é que a emenda houve por bem, estabelecer que"suas questões devem ser decididas pela autoridade administrativa designada porlei, para que não haja litígios judiciais entre entidades subordinadas ao mesmoPoder Executivo nos diversos planos que integrara o Estado Federal. Ademais,mesmo no seu campo de incidência o referido dispositivo constitucional só setornará aplicável aos casos concretos, depois de a legislação competenteestabelecer a autoridade administrativa, dentro de cada órbita de governo (Federal,Estadual, do Distrito Federal ou Municipal) a que caberá dirigir tais questões". Aementa citada foi lançada pelo Ministro Miguel Ferrante, integrante da 6á Turma, aodecidir a Apelação Cível n° 56.833-SP, conforme publicação no DJU de 23-10-80.

Hoje, após outras variações interpretativas surgidas sobre o tema, há aconsolidação jurisprudencial no âmbito do Tribunal Federal de Recursos, através daSúmula nº 102, assim ditando:

"A regra inscrita no artigo 205 da Constituição, com a redação daEmenda Constitucional n° 7, de 1977, não é de aplicabilidade imediata,porque depende de lei regulamentadora."

3. TÉCNICA DE FISCALIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA

Apresenta-se como evidente o fato que existe, na atualidade, umapreocupação com as atividades da Administração Indireta. O Prof. Roberto Rosas,em trabalho publicado na RDP 43/44, pág. 105, sob o título "Controle da

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Administração Indireta', fez ver que tal preocupação está "na razão óbvia do grandedesenvolvimento das empresas públicas e das sociedades de economia mista,gerindo enormes recursos públicos, não podendo ficar a salvo da fiscalização".

A presença constante do Poder Legislativo na fiscalização financeira eorçamentária da Administração indireta é cumprimento da determinaçãoconstitucional (art. 45 ), em face de haver reconhecido a necessidade de controledos gastos de dinheiro público, dos valores e bens manipulados pelos órgãos que ocompõem.

Registre-se que o Poder Legislativo, com o auxílio do Tribunal de Contas,necessita de adotar técnicas cada vez mais aperfeiçoadas, a fim de que a sua açãofiscalizadora se torne eficaz. Para tanto, ouso enumerar as providências seguintes:

a) poderá requisitar ao Tribunal de Contas as informações que entender sobreas contas dos órgãos e entidades da Administração Indireta, além das cópias dosrelatórios de inspeções realizados e respectivas decisões proferidas (in RobertoRosas, trabalho e ob. cit., pág. 106);

b) acolher ou rejeitar representação do Tribunal de Contas sobreirregularidades encontradas nas contas da Administração Indireta;

c) requisitar os balanços das entidades e fazer seu julgamento sobre odesempenho financeiro e orçamentário das mesmas;

d) examinar se os atos praticados obedeceram ao princípio da legalidade;

e) analisar se as empresas públicas e as sociedades de economia mistadesenvolvem-se de acordo com os objetivos sociais, operando segundo os métodosdo setor privado e expressando natureza empresarial (in Roberto Rosas, trabalho eobra citados, pág. 107);

f) verificar se as diretrizes constitucionais impostas para a criação dos órgãosda Administração Indireta estão sendo observadas, especialmente as relativas aocaráter supletivo da intervenção do Estado na economia, atuando de modoincentivador e complementar da iniciativa privada (aspectos que a doutrinaconstitucional moderna está denominando de princípio da subsidiariedade), bemcomo, em igualdade econômica com a empresa privada, em face do que dispõe oart. 170, §§ 2º e 3° da Constituição Federal, quando vier a suplementar a iniciativaparticular;

g) não permitir que as empresas públicas e sociedades de economia mistacometam invasão das áreas das atividades privadas, nem entrem em acintosacompetição com o capital particular, através da oferta de produtos já existentes nomercado, ou obtendo privilégios que não são concedidos ao empresariado particular;

h) argüir a inconstitucionalidade da atividade competitiva do Estado em setoresda economia privada, quando não forem observados os requisitos constitucionais jáenunciados;

i) evitar a criação e funcionamento de sociedades de economia mista e dasempresas públicas federais, estaduais e municipais cujos objetivos deoperacionalidade confutem com a garantia constitucional da não competitividade(ver Hely Lopes Meirelles, em trabalho publicado na RT, pág. 12, n° 558, abril de1982, sob o título "O Estado e suas Empresas").

4. PRINCÍPIOS GERAIS APLICADOS A ADMINISTRAÇAO INDIRETA

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O tema comporta outras indagações que se extraem do teto constitucional e dalegislação ordinária. Entretanto, a limitação imposta ao presente trabalho nãopermite enfocá-las do modo que se deseja. Mesmo assim, entendo registrar quenunca é demais buscar adeptos para compartilhar da preocupação dos estudiososdo Direito Público no Brasil, de fundarem as soluções jurídicas 'no campo dosprincípios. Assim penso, por crer o "Direito é essencialmente uma obra de arte", peloque o "necessário afinamento que deverá existir entre a disciplina jurídica e arealidade social, a harmonia que se impõe, a fim de que o Direito se revele umaverdade de quilate válido entre o "dado" dos chamados "fatos normativos" e oprocesso técnico de elaboração do positivismo jurídico, expressa, essencialmente,uma revelação estética, uma identificação entre o justo e o belo(Mário Moacyr Porto,in "Estética do Direito, RT, vol. 541, novembro/1980, pág. 5) .

Julgo, portanto, não haver suporte para o desenvolvimento das idéias dopositivismo francês de que a lei tem poderes soberanos. Ela, por si só, não conduzao justo. Por isso, não se pode divergir de Celso Antonio Bandeira de Mello, quandoafirma, em várias passagens de sua fértil produção intelectual, que, em um regimerepublicano democrático os interesses públicos não estão entregues à livredisposição da vontade do administrador. Este, ao atuar, permanece sempre sujeito àlegalidade; ao controle administrativo; à obrigatoriedade do desempenho da funçãopública; à inalienabilidade dos direitos concernentes aos interesses públicos e aoprincípio da isonomia.

Dentro de tal círculo, devem ser propagadas as atividades da AdministraçãoIndireta. Vinculando-se a tais princípios, desenvolvem os Tribunais de Contas açãode maior importância no concernente à atividade, controle e fiscalização daspessoas jurídicas que compõem a Administração Descentralizada. Embora fiquemna dependência de atos decisórios do Poder Legislativo algumas de suasmanifestações, não se pode deixar de reconhecer que as decisões tomadasrepercutem fortemente para que a moralidade seja alcançada.

5. CARACTERÍSTICA DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA

A atuação do Estado por meio da Administração Indireta representatransferência do exercício da atividade administrativa, o que implica em serdeslocado para uma outra pessoa a mudança de atribuições. Estas incluem em seucontexto o "transpasse dos direitos, poderes, obrigações e deveres relativos a umadada atividade ou, apenas do exercício deles para uma outra pessoa, alguémexterno e ela", na lição de Celso Antonio Bandeira de Mello, in "Prestação deServiços Públicos e Administração Indireta", 2ª ed., RT, São Paulo, 1979, pág. 7.

Ocorre que, quando o Estado confia a uma outra pessoa jurídica certasatribuições que lhe são próprias, não o faz de modo assistemático. Há de continuarfiel aos princípios que norteiam o seu modo de atuar e, ainda, aos que se aplicamespecificamente ao fenômeno da descentralização. Sem a pretensão de esgotar oassunto, creio estar o Estado, quando faz nascer pessoas jurídicas para atuarem naAdministração Indireta, vinculado, entre outros, aos postulados jurídicos seguintes:

a) O que caracteriza a Administração Indireta é a distribuição do Estado aoutras pessoas jurídicas de atividades meramente administrativas.

b) A finalidade do Estado em descentralizar as suas atividades continua a serperseguida, pela Administração Direta, que é de obter satisfação de seus finsadministrativos, mesmo que seja por outra pessoa.

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No particular, lembro a posição do mestre Celso Antonio Bandeira de Mello, játantas vezes citado, o que demonstra o meu apreço pelos seus ensinamentos, queentende não pertencerem á Administração Indireta as sociedades de economiamista e as empresas públicas quando não prestam serviços públicos ou nãorealizam funções públicas, casos em que atuam como formas de exploração privadado domínio econômico, pelo Estado (Prestação de Serviços Públicos eAdministração Indireta, 2ª ed., RT, pág. 9, nota de rodapé). O que me faz receber,com ressalva, a lição do ilustre mestre é o fato de que mesmo o Estado intervindo nodomínio econômico, está ele a exercer, na realidade, atividades atípicas com oobjetivo de amparo social, de fomentar e complementar a da iniciativa privada e decontrolar a ordem econômica, situações que fazem parte das obrigações hojeexigidas do Estado - providência, titularidade dada por Sabino Fraga, "em que opoder público deixa de ser simplesmente um espectador da vida social ouencarregado apenas de regular, de impedir conflitos evidentes; o Estado passou aassumir um papel especialmente diligente na vida social, extremamente participantee essa diligência, essa participação do Estado se manifesta através de todas assuas figuras, de todos os modelos, de todos os aparelhos, de todo o instrumentaladministrativo do Estado", conforme assinalou o próprio Celso Antonio Bandeira deMello, no trabalho "As Empresas do Estado", in Arquivos do Ministério da justiça, vol.153, pág. 7, janeiro/março, 1980.

c) Qualquer que seja a forma de intervenção estatal na propriedade e na ordemeconômica há de conter-se nos limites impostos pela Constituição, sem afastar-se,outrossim, das regras positivas de direito que a regem, sob pena de invalidade daatuação do Poder Público.

d) Não há de se reconhecer possuir o Estado faculdade discricionária no fazernascer órgãos para exercerem atividades administrativas de modo indireto. O seuatuar, no particular, é vinculado aos preceitos da Constituição e da Lei.

e) Os Estados e Municípios só podem criar empresas públicas e sociedades deeconomia mista que tenham por missão a gerência de serviços públicospropriamente ditos. Não lhes é permitido a criação para interferência no domínioeconômico, pois, conforme os arts. 170, §§ 1° e 2º e 163 da Carta Constitucional, talpapel é reservado à União.

f) Os órgãos da Administração Indireta são criados e extintos por lei. É princípiogeral de direito de que um ato só pode ser desfeito por outro de igual categoria ousuperior. A permissibilidade contida no art. 178 do Decreto-lei n° 200, de que oExecutivo pode "liquidar ou incorporar a outras entidades" as empresas públicas esociedades de economia mista que acusem prejuízo, não tem valor jurídico, por ir deencontro ao princípio da legalidade que não autoriza tal tipo de delegação, conformeprevisão do artigo 6°, parágrafo único, da Carta Constitucional.

g) As entidades da Administração Indireta estão sujeitas à supervisãoministerial que tem por escopo assegurar a realização dos objetivos a elasdestinados, além de promover a harmonia de sua atuação com a política e aprogramação do governo.

h) Estão todas as entidades da Administração Indireta sujeitas ao controlefinanceiro do Tribunal de Contas, incluindo-se as empresas públicas e as sociedadesde economia mista, por força da Lei n° 6.223, de 14-7-75, artigo 7º, modificada pelaLei n° 6.525, de 11-4-78.

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6. NECESSIDADE DE INTERPRETAR A NORMA POSITIVA JURÍDICA

Buscar o conteúdo da lei é exprimir a eficácia do Direito. É explicar o sentido danorma, revelando o seu significado, buscando a verdade científica que ela contém ealcançando a essência do Direito com a sua aplicação na prática.

Com razão está quem afirmou que "a positivação da norma é um círculo que semanifesta na positividade, se fundamenta na correspondência aos valores dacoletividade e se complementa ou é sancionado pelo consenso ou verificação deeficácia", concluindo que "o Direito é linguagem cuja parte mais perceptível é apragmática" (Alejandro Bugallo Alvarez, in "Pressupostos Epistemológicos para oEstudo Científico do Direito", pág. 23, Resenha Universitária, São Paulo, 1976).

Por tais razões e pela necessidade de se dar vida e calor humano aoordenamento jurídico contemporâneo, invoco, como mensagem final, o pensamentode Mário Moacyr Porto, obra citada, pág. 15:

"O diuturno contato com as letras e querelas entre os homens, vim acapacitar-me de que o Direito é algo mais que a norma e que, muitas vezes,há uma inconciliável contradição entre a servil aplicação da lei e a realdistribuição da justiça, entre o que é certo, em face da lógica formal, e o que éverdadeiro, à luz dos reclamos da eqüidade, mas a cisão entre o certo e otexto não cava um absurdo entre o magistrado e a justiça, e quanto maiscresce, no mundo contemporâneo, a impiedade e iniquidade entre os homens,mais avulta na consciência do intérprete, a magnitude e a excelência doDireito, que, em sua formulação positiva, não é um catecismo dos justos masuma disciplina de pecadores. É, assim, o Direito algo mais para se sentir doque para se dizer, pois a verdade jurídica, como toda a verdade, é mais umacerteza da alma do que uma conquista do conhecimento. A casa do Direito,como a casa de Deus, tem muitas moradas. Mas não há lugar, em nenhumadelas, para os medíocres de vontade e fracos de coração."

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A FISCALIZAÇÃO FINANCEIRA EORÇAMENTARIA DA ADMINISTRAÇÃO

MUNICIPAL

FLAVIO SÁTIRO FERNANDESCons. TC - Paraíba

O sistema constitucional brasileiro consagra o princípio da obrigatoriedade de.prestação de contas, imposta a todo agente responsável pela guarda de bens,dinheiros e valores públicos. O princípio é abrangente das três esferaspolítico-administrativas que coexistem no nosso ordenamento institucional. Valedizer, vigora tanto em relação à União, quanto em relação aos Estados e aosMunicípios. Tais prestações de contas são apresentadas a órgãos encarregados dafiscalização financeira e orçamentária, dentro de um sistema que se convencionouchamar de controle externo, porquanto exercitado por órgãos estranhos àqueles queexecutam a despesa.

Assim é que, no plano federal, o controle externo é exercitado pelo CongressoNacional, com auxílio do Tribunal de Contas da União. No plano estadual, talcontrole está entregue à Assembléia Legislativa, que o conduz auxiliado peloTribunal de Contas do Estado. Finalmente, no âmbito Municipal, o controle externo élevado a efeito pela Câmara Municipal, com o auxílio do Tribunal de Contas do Estaem vista de a Constituição vedar a criação de Tribunais de Contas Municipais, salvoem municípios que satisfaçam às suas exigências, de ordem tributária edemográfica, o que, presentemente, só é atendido pelos municípios de São Paulo edo Rio de janeiro, que são, assim, os únicos municípios brasileiros que possuemTribunal de Contas próprio.

Recebem, portanto, os Tribunais de Contas Estaduais, da Constituição Federal,a incumbência de proceder à fiscalização financeira e orçamentária dos municípios,a qual se concretiza mediante realização de auditorias, inspeções e diligências,culminando com a emissão de parecer prévio sobre as contas anuais do Prefeito eda Câmara.

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O Tribunal de Contas do Estado da Paraíba, em seus onze anos defuncionamento, tem procurado desincumbir-se de maneira correta da obrigação que,constitucionalmente, lhe é atribuída, em relação ao controle externo, desenvolvendouma ação que, antes de ser punitiva ou repressiva, é orientadora, buscando comessa metodologia prevenir para evitar punir. É claro que, por força de certascircunstâncias, o Tribunal se vê, vez por outra, obrigado a afastar-se dessa linha que- sempre se traçou e, em conseqüência, fazer uso daqueles instrumentos maisseveros que a Constituição e a legislação ordinária põem a seu alcance, para coibirsituações que destoam dos padrões normais da boa administração da coisa pública.

Neste Seminário, que a Secretaria do Planejamento da Paraíba, em tão boahora, realiza, desejo tecer algumas considerações em torno de questões que maiscomumente têm acarretado a emissão de parecer contrário à aprovação de contasmunicipais.

A irregularidade que mais tem ocasionado a rejeição de contas, levando oTribunal a emitir parecer contrário à sua aprovação é a abertura e utilização decréditos adicionais sem a competente autorização legislativa. Como se sabe adespesa pública, para ser validamente executada necessita de autorizaçãolegislativa, quer através da lei orçamentária. quer através de leis especiais. Éprincipio contido na Constituição Federal que, no artigo 61, § 1°, letras "c" e "d",estabelece serem vedadas "a abertura de crédito especial ou suplementar semprévia autorização legislativa" e a "realização, por qualquer dos Poderes, dedespesas que excedam os créditos orçamentários ou adicionais".

O Tribunal tem agido com rigor, no tocante a essa irregularidade, visto que asua ocorrência revela um menosprezo à ação das câmaras, além de representaruma flagrante violação a norma constitucional. Basta referir, por exemplo, que jáhouve caso em que, tendo a Câmara negado autorização para abertura de créditoadicional, solicitada no decorrer do exercício, pelo prefeito, mesmo assim esteprocedeu àquele ato, mediante. decreto, numa verdadeira contestação ao poder quetem, constitucionalmente, competência para autorizar a realização de despesas.

É indispensável, outrossim, que se mantenha permanente controle sobre autilização das dotações, a fim de se evitar a realização de gastos além dasautorizações. A lei oferece um instrumento eficaz para o controle da própriaadministração sobre a utilização dos créditos orçamentários a fim de evitar que sejaexcedido o limite de cada dotação, quer a nível de programa, projeto ou atividade.Esse instrumento é o empenho prévio. Se a Prefeitura atender à exigência do prévioempenhamento das despesas, ela terá sempre o controle dos gastos nas diversasdotações. Infelizmente o que testificamos é que a quase totalidade de nossasprefeituras não atendem a essa exigência legal, procedendo, ao contrário, aempenhamentos "a posteriori". O resultado é o estouro de dotações.

Os prefeitos precisam se conscientizar de que o empenho não é de formanenhuma um entrave à sua ação, não é um empecilho à boa marcha administrativa.Ao contrário, é instrumento eficaz de controle orçamentário, que a lei põe à suadisposição como capaz de assegurar o controle dos gastos públicos, situando-osnos limites das autorizações. Acompanhando a evolução dos gastos por meio doprévio empenho das despesas, têm o prefeito e os setores contábeis da Prefeituracondições de detectar a insuficiência dos recursos destinados a quaisquerprogramas, projetos ou atividades, providenciariam, então, a tempo, asuplementação das dotações escassas. Se os créditos suplementares houverem

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sido abertos já nos limites permitidos na lei orçamentária, o prefeito providenciará aremessa de mensagem à Câmara, solicitando novo limite.

Vale lembrar, a título de advertência que, tanto a falta de empenho prévio comoa abertura e utilização de gastos sem autorização legislativa, vale dizer a realizaçãode despesas não autorizada, configura o crime de responsabilidade previsto noartigo 1°, V, do Decreto-lei n° 201, de 27-2-67, que considera como tal "ordenar ouefetuar despesas não autorizadas por lei, ou realizá-las em desacordo com asnormas financeiras pertinentes".

Cabe salientar, ainda, que. para abertura de créditos adicionais faz-seimprescindível a existência de recursos disponíveis para tal fim. Evidentemente,pois, se o prefeito possui autorização da Câmara mas não dispõe desses recursos,não pode abrir os créditos de que necessita. Devem coexistir os dois requisitos:autorização legislativa e disponibilidade de recursos. A ausência de qualquer delesimpede a abertura de créditos. Segundo o disposto na Lei n° 4.320, sãoconsiderados recursos disponíveis os seguintes:

a) o Superávit Financeiro, apurado em balanço patrimonial do exercícioanterior. Superávit Financeiro é a positiva entre o ativo financeiro e o passivofinanceiro, conjugando-se, ainda, os saldos dos créditos adicionais transferidos e asoperações de crédito a eles vinculadas;

b) os provenientes do excesso de arrecadação, que é a diferença, acumuladamês a mês, entre a arrecadação prevista e a realizada, considerando-se ainda atendência do exercício;

c) os resultados de anulação parcial ou total das dotações orçamentárias ou decréditos adicionais autorizadas em lei;

d) o produto de operações de crédito autorizadas, em forma que juridicamentepossibilite ao Poder Executivo realizá-las.

Sem esses recursos é impossível a abertura de créditos adicionais.

* * *

Outra exigência da maior importância feita à administração pública é a que serefere à realização de licitação, antes de efetuar-se a compra de bens e acontratação de serviços ou obras.

A Licitação é procedimento exigido pelo princípio da moralidade administrativae fere-o a contratação que é feita sem sua observância, acarretando aresponsabilização do administrador faltoso, nos termos do Decreto-lei n° 201.Segundo este diploma legal, constitui crime de responsabilidade adquirir bens, ourealizar serviços e obras "sem concorrência ou coleta de preços", nos casos em quea lei exige. Todo administrador, pois, deve ter o cuidado de efetuar licitação sempreque for contratar a aquisição de bens e realização de serviços e obras, em valoresque se incluem naqueles casos em que a lei exige o procedimento licitatório.

A falta de Licitação, além de provocar a responsabilização do prefeito, acarretaa desaprovação das contas, vez que o Tribunal de Contas sempre opina por issoquando comprova a omissão. Somente nos casos expressamente permitidos em leié que a Licitação pode ser dispensada. Mesmo assim a administração está presa auma obrigação: a de justificar, em .processo aberto para esse fim, a dispensa deLicitação. Toda dispensa de Licitação, pois, tem de ser devidamente justificada,

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expondo a administração as razões por que a determinou. O administrador quedispensa a Licitação sem justificá-lo incide nas sanções legais previstas para ashipóteses de falta de licitação obrigatória. Sempre que entender dispensável alicitação, deve o prefeito, ou autoridade competente da administração municipal,formalizar um processo para nele justificar a dispensa.

É oportuno relembrar, aqui, os casos de dispensa de licitação, pois somentenestas hipóteses, legalmente definidas, pode deixar de ser acatado o princípio que ainstaura, em nome da vantagem e da moralidade administrativa. É dispensável alicitação:

a) nos casos de guerra, grave perturbação da ordem ou calamidade pública;

b) quando sua realização comprometer a segurança nacional, a juízo doPresidente da República;

c) quando não acudirem interessados à licitação anterior, mantidas, neste caso,as condições preestabelecidas;

d) na aquisição de materiais, equipamentos ou gêneros que só podem serfornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivos, bem comona contratação de serviços com profissionais ou firmas de notória especialização;

e) na aquisição de obras de arte e objetos históricos;

f) quando a operação envolver concessionário de serviço público ou,exclusivamente, pessoas de direito público interno ou entidades sujeitas ao seucontrole majoritário;

g) na aquisição ou arrendamento de imóveis destinados ao serviço público;

h) nos casos de emergência, caracterizada a urgência de atendimento desituação que possa, ocasionar prejuízos ou comprometer a segurança de pessoas,obras, bens ou equipamentos;

i) nas compras ou execução de obras e serviços, de pequeno vulto.

Por fim, é de lembrar-se que todos os processos de Licitação e de Dispensa deLicitação devem ser remetidos ao Tribunal de Contas, nos termos da Resolução TC01/75, instruídos com os documentos ali discriminados.

* * *

Comporta fazer, aqui, referência a uma irregularidade costumeiramenteencontrada 'nas contas municipais. Refiro-me à ocorrência, não rara, de excesso degastos na execução de obras públicas. O Tribunal de Contas possui um Serviço deEngenharia ao qual compete fiscalizar as obras públicas, verificando se a suaexecução se fez de acordo com as especificações técnicas estabelecidascontratualmente e se os gastos se situaram de acordo com os preços vigorantes àépoca na região. E aqui é oportuno ressaltar a importância de licitação, porquanto oTribunal tem entendido que, se os gastos com a construção de uma obra foramobjeto de procedimento licitatório, não há falar em excesso se aqueles nãoultrapassaram a quantia licitada, salvo se se verificarem duas hipóteses.

1ª a constatação de vícios na licitação, capazes de invalidá-la, por ofensa àlegislação específica;

2ª a execução da obra com fuga às especificações técnicas constantes doprojeto ou do contrato.

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Assim, se realizada uma obra sem licitação ou com licitação viciada, ou, ainda,diferentemente do que reza o projeto ou o contraio e se o Serviço de Engenharia emseu laudo técnico acusa um excesso de gastos na execução dessa obra, o Tribunalconcluirá, sem dúvida, como tem concluído, pela responsabilidade do Prefeito pelaquantia excessivamente utilizada.

É bom ressaltar que, com relação aos processos de licitação, o Tribunal temverificado, concluindo por sua imprestabilidade, que alguns deles são forjados,ficticiamente conduzidos, sem que reflitam a realidade, preparados, apenas, paraatender formalmente à exigência legal. É claro que tal situação equivale a ausênciade licitação, com todas as suas conseqüências.

* * *

Alguns Prefeitos têm indagado ao Tribunal sobre a providência que podemtomar, na hipótese de a Câmara não devolver-lhe, no prazo legal, para sanção, oprojeto de Lei Orçamentária, enviado pelo Executivo ao Legislativo. Como se sabe, aLei Orgânica determina ao Prefeito remeter até 30 de setembro de cada ano oreferido projeto à Câmara Municipal, que, por sua vez, deve apreciá-lo, e devolvê-lo,para, sanção, até o final o segundo período ordinário de sessões.

Se, porém, a Câmara não atender ao disposto na legislação vigente, deverá oPrefeito, com base na Lei Orgânica e na Constituição Federal, promulgar como lei omencionado projeto.

A dificuldade maior está na hipótese em que a Câmara rejeite o projeto de leiorçamentária oriundo do Executivo. Caberia aí, também, a promulgação, como lei,do :projeto rejeitado?

A resposta, quem dá é o Supremo Tribunal Federal que ao julgarrepresentação de inconstitucionalidade contra dispositivo da Constituição do Estadode São Paulo, deliberou por sua procedência, considerando inconstitucional a normaque determinava, em caso de rejeição do projeto, a promulgação do orçamento emvigor, corrigido monetariamente, concluído que em caso de rejeição do projeto pelaCâmara, o prefeito deve também promulgá-lo como lei.

E já que estamos tratando de projeto de lei e de lei orçamentária, que, segundodefinição legal, deve conter a previsão da receita e a fixação da despesa, cabe, aqui,reportar-me com satisfação ao movimento encetado por quantos participam desteencontro, no sentido de uma reforma tributária que venha minorar a situação aflitivados municípios, manifestando de público, a minha solidariedade a essa campanha eos meus aplausos aos prefeitos paraibanos, que não podem e não devem cruzar osbraços ou calar diante de um quadro de tão grande penúria como é o que retrata asituação financeira de nossas comunas, notadamente dos municípios menores.

Ninguém melhor do que nós do Tribunal de Contas, pode testemunhar essasituação. Analisando os balanços gerais dos municípios paraibanos constatamoscomo o Sistema Tributário ora em vigor é discriminatório em prejuízo dos municípios.Basta referir que, na quase totalidade das nossas comunas, as chamadastransferências, que são recursos repassados da União ou do Estado constituemcerca de 90% da receita dos municípios. A receita própria, por conseguinte, alcançaapenas o percentual de 10%. Com isso temos que a autonomia financeira dosmunicípios, referida na Constituição Federal, quando diz que a autonomia municipalserá assegurada, entre outras garantias pela capacidade dada ao Governo local de"aplicar as suas rendas", essa autonomia, repito, ,diante desse quadro, é

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verdadeiramente uma farsa porque, segundo o entendimento dos doutrinadores,inclusive Hely Lopes Meirelles, as rendas a que se refere, a Constituição sãoconstituídas das receitas próprias que, como vimos, alcançam somente 10% dareceita total. Os outros 90%, constituídos de receitas transferidas, têm aplicaçãoefetiva ou potencialmente vinculada a decisões de órgãos estranhos ao governolocal. É bom lembrar, por exemplo, que até pouco tempo os municípios estavamobrigados a aplicar determinados percentuais dos recursos do FPM em despesas decapital e em saúde. Essa obrigação desapareceu mas pode amanhã, ou depois,voltar, como outras poderão ser instituídas, vez que o município só é,verdadeiramente, autônomo, para aplicar suas rendas e estas só representam, comoeu disse, cerca de 10% da receita total, o que não significa autonomia financeiranenhuma. O fato representa uma sujeição não só financeira, mas também política,vez que os prefeitos ficam obrigados a mendigar e, muitas vezes, submetidos aodomínio político de outra esfera federal ou estadual o que não convém nestestempos de abertura democrática.

Mas, por outro lado, o quadro penurioso, a que me referi, não justifica odesprezo a que alguns prefeitos relegam a arrecadação tributária em seusmunicípios. É atribuição relevante do administrador municipal zelar e velar pelareceita pública, seja própria, seja transferida. Essa obrigação não deve serdescurada em momento algum, e não há motivo que justifique tal comportamento.Infelizmente, o Tribunal tem constatado a ausência completa de receita própria emalguns balanços, de maneira injustificável. Por menor que seja a sede municipal, elahá de ter, no mínimo, duzentas casas, conforme exigência legal, casas quetributadas a quinhentos cruzeiros (Cr$ 500,00) cada uma trariam para os cofrespúblicos uma receita de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU ), da ordem decem mil cruzeiros. Isso afora as Taxas, Receita Industrial, Receita Patrimonial, etc.

No entanto, o que o Tribunal tem evidenciado, em alguns casos, é a totalausência de receita tributária e de algumas outras receitas próprias. E o pior é queno orçamento cujo projeto foi elaborado pelo prefeito e aprovado pela Câmara existea previsão, por exemplo, o IPTU e essa previsão não se cumpre por mera desídiadesses administradores.

Então a receita municipal própria que já é ínfima por força do sistema tributárioem vigor torna-se, ainda, menor pela relapsia de algumas administrações.

* * *

Quero, nesta oportunidade, chamar a atenção dos Srs. Prefeitos para umaobrigação que tem sido, por vezes, descurada por alguns municípios. É a obrigaçãoque têm as prefeituras de remeter, mensalmente, ao Tribunal de Contas balancetes,contendo a movimentação financeira do período. A Lei Orgânica dos Municípios emvigor, determina que tal documento referente a cada mês seja .publicado até o dia20 do mês subseqüente. já a Resolução TC-38/72 estabelece que a remessa doreferido documento ao Tribunal se faça até o último dia do mês subseqüente.

Infelizmente, porém, alguns Municípios se omitem ao cumprimento dessaobrigação, entravando, conseqüentemente a boa marcha da atividade fiscalizadora.

Para coibir tal situação, o Tribunal deliberou, através da Resolução n° 7/83,publicada no Diário Oficial de hoje, 26 de maio de 1983, solicitar ao Banco do BrasilS/A, o bloqueio das cotas do FPM e de outras fontes, dentre da competência que lhefoi outorgada pelo Decreto-lei n° 1.805, de 1° de outubro de 1980.

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A Resolução n° 7/83 dispõe sobre a fiscalização da aplicação dos recursostributários transferidos pela União, ao Estado e aos Municípios e em relação a estescompreende:

a) Imposto único sobre lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos;

b) Imposto único sobre Energia Elétrica;

c) Imposto único sobre minerais;

d) Fundo Rodoviário Nacional;

e) Fundo de participação dos municípios.

Segundo o disposto, ainda, na mesma Resolução os recursos referentes aoFundo de Participação dos municípios e o Fundo Rodoviário Nacional deverão serdemonstrados nas respectivas prestações de contas anuais, distintamente, atravésdos seguintes quadros:

a) Comparativo da Receita Prevista com a Receita Realizada;

b) Comparativo da Despesa Fixada com a Despesa Realizada, por Funções.

Outro aspecto a destacar na mencionada Resolução é que os recursosreferidos em seu artigo 1° devem ser mantidos em estabelecimento de crédito,observado a seguinte prioridade:

I - Agência de estabelecimento de crédito federal ou estadual;

II - Outros estabelecimentos de créditos, excluídos os de natureza cooperativa;

III - Estabelecimento de crédito mais próximo, caso coexista agência bancáriana localidade.

Finalmente, a :ressaltar na mesma Resolução o disposto no artigo 7°,estatuindo o que o Tribunal poderá solicitar ao Banco do Brasil o bloqueio ourecursos dos Fundos Rodoviário e de Participação dos municípios, nos seguintescasos:

I - Falta de apresentação, no prazo estipulado, do Balanço Geral e balancetesmensais necessários a sua composição;

II - Inexistência do controle interno das referidas funções;

III - Irregularidades decorrentes de improbidade que exijam imediatasprovidências do Tribunal, a fim de serem evitados maiores prejuízos ou dilapidaçãode recursos.

* * *

Desejo, ainda, fazer referência a uma matéria que tem suscitado consultas aoTribunal e que é, de fato, relevante, notadamente em face dos interesses que emtorno dela gravitam. Reporto-me ao problema da pensão vitalícia instituída poralguns municípios, em favor de seus ex-prefeitos. Antes de esclarecer oposicionamento do Tribunal de Contas sobre o assunto, cabe um retrospecto do seudesenvolvimento até o presente instante.

Como se sabe, a Assembléia Legislativa da Paraíba promulgou Leicomplementar instituindo para os municípios a obrigação de pagar a seusex-prefeitos uma pensão vitalícia. A época, a medida causou grande sensação nosmeios administrativos e jurídicos do Estado, clamando-se, à unanimidade, pela

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inconstitucionalidade da imposição. Estava patente que Estado não podia criarobrigações pecuniárias para os municípios, porquanto ao fazê-lo, nos termos da LeiComplementar, então aprovada, feria. o princípio da autonomia municipal.

A questão foi esbarrar no Supremo Tribunal Federal, por força de umaRepresentação de Inconstitucionalidade, oferecida pelo Excelentíssimo SenhorProcurador-Geral da República, a requerimento do saudoso Advogado campinenseOtávio Amorim. A disposição complementar era tão gritantemente inconstitucionalque a Excelsa Corte, antes mesmo de julgamento da Representação e a pedido dopróprio Procurador-Geral da República determinou a suspensão de sua eficácia, atéque a matéria fosse definitivamente elucidada.

Acreditava-se, inclusive, à época, que fosse a pensão aceitável desde que deiniciativa do próprio município, ou seja, consubstanciada em lei municipal. OSupremo, porém, manifestou-se em sentido contrário, vale dizer, entendeu que essapensão, mesmo atribuída por lei municipal, carece de amparo constitucional.

Vale transcrever o pronunciamento do Ministro Décio Miranda, Relator do feito.Diz Sua Excelência:

"Acolho os fundamentos do parecer, para julgar inconstitucional a LeiComplementar n° 17, de 25 de julho de 1979, do Estado da Paraíba.

Feita abstração da natureza do estipêndio criado pela Lei Complementarreferida, e encarado apenas o encargo financeiro criado para os Municípios,em dois aspectos desatendeu-se à Constituição.

Configura-se, em primeiro lugar, a inconstitucionalidade formal, por víciode iniciativa, assim olvidado o art. 57, II, c/c o art. 13, III, da Constituiçãofederal.

Incorre o impugnado texto, por igual. nesse aspecto em que está sendoexaminado, em inconstitucionalidade material, por desatenção à autonomiados Municípios, preservada, quanto à aplicação de suas rendas, no art. 15, II,a, da Constituição.

Assim, acolhendo a manifestação do douto parecer, sob o particularaspecto a que se adstringiu, vou mais longe e acrescento que, ainda quandoresguardada a iniciativa do Prefeito e emanada da Câmara Municipal dedeterminado Município lei que dispusesse em igual sentido ao que pretendeuprover a impugnada Lei Complementar estadual n° 17, ter-se-ia de reconhecera inconstitucionalidade da medida.

No âmbito federal e no estadual, o subsídio vitalício ao Chefe do PoderExecutivo, após o exercício, tem justificação na necessidade de resguardar osex-ocupantes dos cargos, que os exerceram deixando sua profissão habitual emuitas vezes a própria região de seu domicílio, das dificuldades ouconstrangimentos que possam eventualmente sofrer no retomar suas antigasou procurar novas ocupações profissionais.

No Município, tais circunstâncias não ocorrem. O prefeito, domiciliado nopróprio âmbito restrito em que passou a exercer o cargo político, não sedeslocou do centro habitual de suas atividades profissionais.

Seria inconcebível que o Município copiasse nesse ponto a normafederal, seria uma anomalia, que, ante os princípios gerais adotados na

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Constituição federal, não prescindiram de autorização em normasconstitucionais da União.

Com efeito, se depende de lei complementar federal o estabelecimentode "limites e critérios" para a própria remuneração de vereadores (art. 15, § 2°,consoante a redação da Emenda Constitucional n° 4, de 1975, ou seja, para aremuneração do efetivo exercício na sua normal duração, que dizer daremuneração anômala, extravagante, a partir da cessação das funções doPrefeito?

A Constituição não se interpreta somente pelo que nela está expresso,mas também pelo que implicitamente decorre do sistema que adota.

Se no âmbito federal e no âmbito estadual, o subsídio além do exercício,ao Chefe do Poder Executivo, depende de norma constitucional federal ouestadual, respectivamente, e se no âmbito municipal, a remuneração normalde Vereadores depende de lei complementar federal que lhe fixe os limites ecritérios, a mesma razão, que ditou tais regras de prudência, impõe quetambém somente pela Constituição Federal se possa eventualmente autorizarremuneração de prefeitos após a cessação de seu exercício."

E na Ementa do Acórdão que lavrou, para a decisão aqui referida, assim sepronunciou o Excelso Pretório:

"EMENTA: Prefeitos. Subsídio mensal e vitalício ao Prefeito, a parti dacessação da investidura no cargo. Criação por Lei Complementar do Estado daParaíba (n° 17, de 25-7-79). Inconstitucionalidade, por implícita afronta aos lindesem que a Constituição federal define a autonomia municipal, em especial no artigo15, II, § 2°. Se a remuneração de Vereadores, em seu próprio exercício normal,depende de limites e critérios definidos pela União, o estipêndio anômalo, além dotempo de exercício do cargo, até vitalício, do Prefeito, não pode prescindir deautorização em norma constitucional da União."

Logo após tomar conhecimento dessa decisão, o Tribunal de Contasprovidenciou a remessa de cópia da mesma aos prefeitos municipais. Este ano,diante de várias consultas que lhe foram dirigidas por alguns dos novos Prefeitos etomando conhecimento da promulgação de leis semelhantes em diversos municípiosdo Estado, o Tribunal, novamente, encaminhou aos municípios, desta vez aos novosPrefeitos, cópia de sua decisão sobre a matéria, em que faz notar a conclusão a quechegou o Supremo Tribunal Federal, considerando inconstitucional a lei municipalque crie a pensão vitalícia, com base nos fundamentos apontados peloMinistro-Relator do feito.

Diante da evidente inconstitucionalidade, devem os senhores Prefeitos recusaraplicação às leis que criem aquela pensão, vez que existe fundamentação para arecusa, conforme ficou evidenciado do Voto do Ministro Décio Miranda e da Ementado Acórdão proferido na apresentação n° 1.025.

* * *

Lembraria, outrossim, a obrigatoriedade de aplicação do percentual mínimo de20% em ensino primário, com recursos da receita tributária. A omissão nocumprimento dessa exigência acarreta a intervenção do Estado no Município,consoante os termos do art. 113, V, da Carta Magna vigente. Através da Resoluçãon° 37/73, o Tribunal de Contas manifestou o entendimento sobre o cumprimento

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dessa obrigação, dizendo que ela deve ser compreendida como referindo-se àaplicação, no atual ensino de 1° grau, de recursos equivalentes, no mínimo, a 20%da receita tributária do Município, não implicando em que os gastos sejamnecessariamente realizados com dinheiro proveniente daquela fonte de receita,desde que respeitados outros percentuais fixados em lei ou convênio, a exemplo daobrigatoriedade de aplicação mínima de 20% do FPM no mesmo setor. Valesalientar que a falta de atendimento dessa obrigação gera para o município aobrigação de aplicar no exercício seguinte, o valor não aplicado no exercícioanterior.

Finalizando, desejaria lembrar aos senhores Prefeitos que o Tribunal de Contasabriga em seu Regimento Interno dispositivo que permite aos Prefeitos dirigir-seàquela Corte a fim de consultá-la por escrito a respeito de qualquer matéria de difícilinterpretação. Apenas lembraria que as indagações, as consultas, as perguntasdevem versar sobre questões em tese não sendo aceitas sobre questões do fato ousobre situações já consumadas. O Tribunal de Contas foi também um dos primeirosa possibilitar aos Prefeitos o oferecimento de esclarecimentos sempre queirregularidades são constatadas em suas prestações de contas. Com isso tem oTribunal possibilitado aos interessados aclarar dúvidas e sanar irregularidades, antesde os processos serem remetidos às Câmaras Municipais. Tudo isso se inclui naspreocupações do Tribunal em desenvolver uma ação pedagógica, antes deutilizar-se de instrumentos mais severos que lhe são postos à disposição pelaConstituição e pela legislação ordinária.

Desejo manifestar aos senhores Prefeitos a plena confiança do Tribunal naação correta, operosa e, sobretudo, criteriosa, dos novos administradoresmunicipais. O comparecimento maciço a este Seminário bem demonstra o interessee a vontade de acertar, manifestados por Suas Excelências, que haverão deencontrar, sempre, no Tribunal de Contas um órgão de cooperação na difícil tarefaque os aguarda durante esse longo mandato de seis anos.

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ACUMULAÇÃO DE CARGOS EM SOCIEDADES DEECONOMIA MISTA

ORLANDO MORAESCons. TC-Pernambuco

Questiona-se, no presente processo, sobre o pedido de reconsideração parcialsolicitado pelos Drs. André Carlos Alves de Paula e Luiz de Sá Monteiro, presidentee vice-presidente, respectivamente, do Banco do Estado de Pernambuco S/A -BANDEPE e de sua controlada Bandepe Crédito Imobiliário S/A - da decisãoproferida no Processo TC n° 882/82, na parte em que este Tribunal fixou o prazo de30 dias para que os requerentes optassem por um dos cargos citados, dado queconsiderou acumulação proibida por lei.

Os suplicantes aduzem, em defesa do seu ponto de vista, as seguintesalegações

a) que a entidade controlada Bandepe Crédito Imobiliário S/A não é sociedadede economia mista, porque criada por força, não de lei, porém da vontade daSociedade Controladora (Banco do Estado de Pernambuco SA) e de outras pessoasfísicas, manifestada em escritura pública de constituição da Sociedade AnônimaBandepe Crédito Imobiliário S/A;

b) não sendo a sociedade controlada acima referida, de Economia Mista, nãoestá abrangida pela proibição de seus servidores acumularem remuneração;

c) ainda mesmo que a Sociedade controlada fosse de Economia Mista, nemassim existiria acumulação ilegal dos dois dirigentes acima mencionados, porquantonão percebem qualquer remuneração pelos cargos dessa mesma entidadecontrolada.

Como sabemos, o Estado Moderno chamou a si inúmeras atribuições que nãoeram ao menos consideradas pelo Estado Liberal Burguês, fruto da concepção dosenciclopedistas franceses do século XVIII e da Economia Clássica Individualista dosingleses.

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O liberalismo econômico de Adam Smith, Davi Ricardo, John Stuart Mill e JeanBaptiste Say entendiam ser o Mundo uma grande oficina de trabalho, sem barreirasalfandegárias, devendo a produção de bens realizar-se onde mais favoráveis fossemas condições de rentabilidade.

Com essa orientação, surgiu o Estado Agnóstico, Passivo, Gendarme, deBraços Cruzados, deixando o fato econômico cingir-se a meia dúzia de regrasprovidenciais, inevitáveis, imutáveis.

Mas o Estado Liberal Burguês logo começou a ser contestado, a partir doséculo passado, quando Marx, Engels, Charles Fourier, Sismonde de Sismondi,Louis Blanc, Sorel e tantos outros viram na colocação dos problemas que afetavama humanidade, grandes e graves injustiças sociais.

O desigual deve ser tratado de modo desigual, afirmavam os socialistas doséculo XIX.

O Estado passou a tutelar o economicamente fraco, chegando Gallart Folch aafirmar que a inferioridade econômica do obreiro deve ser compensada com a suasuperioridade jurídica, querendo com isso dizer que o Estado Moderno deveria serum Estado Intervencionista, para que pudesse restabelecer o equilíbrio da ordemsocial.

Nesse quadro, o Estado Moderno teria de encarar a nova realidade social, comfirmeza, autoridade e inabalável decisão de encontrar grandes soluções para osgrandes problemas.

Reclamava-se a presença do Estado onde quer que houvesse um problemasocial, com uma solução pronta, justa e eficaz.

Todavia, as velhas estruturas do Estado Liberal não podiam movimentar-se nodesempenho dessas soluções.

Daí por que se começou a pensar na formação de entes paraestatais, compersonalidade jurídica própria, patrimônio próprio, administração própria, quepoderiam, em nome do Estado, agir como se Estado fosse.

Foi o nascimento da autarquia, pessoa de Direito Público, que passou a agirem nome do Estado, em determinado setor, estruturado na própria lei.

Mas o Estado precisava de suprir as deficiências no setor produtivo ecomercial, criando outros entes, não mais do âmbito do Direito Público, porém doPrivado, mesmo porque iria agir numa área reservada para as empresas privadas.

Então, a autarquia não atendia a esses novos reclamos Estatais, sendonecessário encontrar meios outros para o desenvolvimento da atividade produtiva ecomercial, controlada pelo Estado, surgindo, então, a empresa pública, com capitalexclusivamente oriundo do Poder Público e a Sociedade de Economia Mista, sob aforma de Sociedade Anônima, com capital público e privado, ficando o Estado,sempre, com a maioria acionária.

Nessa ordem de considerações, os tratadistas passaram a estudar o realconceito da Sociedade de Economia Mista, como órgão integrante da administraçãoindireta do Estado, dado que, via de regra, realiza e desenvolve atividade com aparticipação majoritária do dinheiro do povo.

Surgiu, de logo, a seguinte indagação de aspecto formal: como o Estado deveproceder para a constituição da Sociedade de Economia Mista? Qual o modo de o

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Estado expressar sua vontade para participar de um empreendimento mercantil,como acionista majoritário?

Via de regra, não pode o governante, através de simples ato de gestão,empregar o patrimônio do Estado em um empreendimento, realizando verdadeiroinvestimento de dinheiro público numa entidade de natureza privada, sem que paratanto esteja especificamente autorizado, mediante lei.

A lei, no caso, é peça básica, não apenas para a instituição da Sociedade deEconomia Mista, como de resto para o investimento de qualquer parcela de dinheiropúblico na exploração da atividade econômica.

Por isso é que, no Direito Brasileiro, encontramos a Sociedade de EconomiaMista, com a seguinte definição:

"Sociedade de Economia Mista é a entidade de personalidade jurídica dedireito privado, criada por lei para a exploração de atividade econômica, sob a formade sociedade anônima, cujas ações com direito a voto pertençam em sua maioria àUnião ou a entidade da Administração Indireta." (Art. 5°, III, Dec-lei n° 200, de25-2-1967, com a nova redação dada pelo Dec-lei nº 900, de 29-9-1969. )

A expressão acima criada por lei significa o meio usado para que a vontade dopovo fique expressa, no que se refere à aplicação do seu patrimônio, ou seja, dopatrimônio público.

A autorização legal, entretanto, pode aparecer de modo direto ou indireto, ouseja, o legislador pode autorizar diretamente a constituição de determinadaSociedade de Economia Mista, ou, ainda, autorizar de modo indireto, isto é,dispondo, na constituição de uma Sociedade de Economia Mista, que esta poderáconstituir outra Sociedade, situada no âmbito da exploração econômica do sistema.

Nem por isso diríamos que a autorização legal não existe. Existe, sim, porque avontade do povo ficou expressa em disposição legal, embora de modo indireto.

Por isso é que o legislador pátrio dispôs no § 1° do art. 237 da Lei Federal n°6.404, de 15-12-1976, o seguinte:

"§ 1° A companhia de economia mista somente poderá participar deoutras sociedades, quando autorizada por lei ou no exercício de opção legalpara aplicar imposto de renda em investimentos para o desenvolvimentoregional ou setorial."

Analisando com maior atenção a norma legal antes referida, encontramo-nosdiante da seguinte encruzilhada:

a) o Banco do Estado de Pernambuco S/A (BANDEPE ), como Sociedade deEconomia Mista, somente podendo participar de outra entidade, no caso o BandepeCrédito Imobiliário S/A, mediante autorização legal e, se esta não existe, então aconstituição desta última entidade, sociedade controlada pela primeira, através desimples escritura pública, teria contrariado a regra acima referida da Lei Federal n°6.404/76, pondo em dúvida a existência legal da segunda entidade;

b) ou, ao contrário da hipótese antes referida, a autorização legal existe demodo direto ou mesmo implícito, o que significa a licitude do ato constitutivo dasociedade controlada, devendo esta enquadrar-se na definição de Sociedade deEconomia Mista, adotada pelo Direito Pátrio.

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Inclino-me pela segunda hipótese antes formulada, não apenas porqueentendo que a autorização legal para o funcionamento da Sociedade BandepeCrédito Imobiliário S/A está implícita nos dispositivos legais que autorizaram ofuncionamento do Banco do Estado de Pernambuco S/A - BANDEPE, como tambémporque a caracterização essencial desse tipo societário reside naquilo que o insignemestre Hely Lopes Meirelles chama de "participação ativa do Poder Público na vidae realizações da empresa", in verbis:

"Não se infira, .porém, que toda participação estatal converte oempreendimento particular em sociedade de economia mista. Absolutamente, não.Pode o Estado subscrever parte do capital de uma empresa, sem lhe atribuir ocaráter paraestatal. O que define a sociedade de economia mista é a participaçãoativa do Poder Público na vida e realizações da empresa". (Hely Lopes Meirelles, in"Direito Administrativo Brasileiro", pág. 305, 2á edição, Editora Revista dosTribunais, São Paulo.)

Não é outro o pensamento do eminente tratadista Themístocles Cavalcanti,quando afirma:

"A sociedade de economia mista é aquela em que se verifica, sob umaestrutura do direito privado, a participação financeira de uma pessoa pública edos particulares, regendo-se por normas especiais e organizada a suaadministração de forma a conciliar os interesses econômicos dos sócios como interesse público na constituição do capital da empresa e na suaadministração.

Em relação à constituição .do capital, existem duas modalidadespredominantes na organização dessas entidades - as de participaçãomajoritária do Estado e as minoritárias. Nas primeiras, o Estado possui amaioria do capital e goza de uma preponderância financeira e administrativabem acentuada. Nas minoritárias, a participação financeira do Estado ésecundária em relação à do particular; constitui, antes, um mero auxíliofinanceiro às atividades puramente privadas. No caso da participaçãomajoritária, a predominância do Estado, sob o ponto de vista administrativo, éacentuada e se faz sentir em seus múltiplos aspectos." (ThemístoclesCavalcanti, in "Curso de Direito Administrativo", páginas 202/203, 91 edição,Livraria Freitas Bastos, Rio de janeiro. )

Mas, como afirmei antes, entendo que, no caso concreto que estamosanalisando, o Banco do Estado de Pernambuco S/A - BANDEPE, ao promover ainstituição de sua controlada, Bandepe Crédito Imobiliário S/A, não desrespeitou anorma contida no § 1º do art. 237 da Lei Federal n° 6.404, de 15-12-1976, que exigeautorização legal para a Sociedade de Economia Mista participar de outrasSociedades, exatamente .porque essa autorização está implícita nos dispositivoslegais que deram suporte à criação da primeira entidade.

Vejamos os artigos 1° e 2° da Lei Estadual n° 3.589, de 19-7-60:

"Art. 1º Fica o Poder Executivo autorizado a reestruturar a Caixa deCrédito Imobiliário de Pernambuco, criada pelo Decreto n° 161, de 20 deagosto de 1938, sob a forma de autarquia, sociedade de economia mista porações ou órgão subordinado administrativamente à Secretaria da Fazenda,podendo adotar denominação mais compatível com suas finalidades.

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Art. 2° Na reestruturação de que trata esta Lei, deverão ser criadas asCarteiras de Investimentos Industriais, de Financiamentos Imobiliários e deServiços Públicos, mantida a de Crédito Rural e transformada a de CréditoUrbano em Crédito Geral."

Em seguida, citemos os artigos 1° e 2° do Decreto Estadual n° 679, de 8-1-62:

"Art. 1° Fica criada uma comissão, composta dos bacharéis João JoséRibeiro, Estácio Carlos Cardoso e Francisco Evandro de Paiva Onofre, todosPromotores Públicos efetivos, atualmente servindo como assessores jurídicosdo Governo do Estado, para sob a presidência do primeiro, proceder àincorporação e organização do Banco do Estado de Pernambuco.

Parágrafo único. O Banco do Estado de Pernambuco sucederá à Caixade Crédito Imobiliário de Pernambuco e será constituído sob a forma desociedade de economia mista por ações.

Art. 2° Os Estatutos da sociedade, entre outras providências, criarão asCarteiras de Investimentos Industriais, de Financiamentos Imobiliários eServiços Públicos e transformarão a Carteira de Crédito Urbano em Carteirade Crédito Geral, mantida a Carteira de Crédito Rural."

Como se vê, os dispositivos acima citados autorizaram o Governador doEstado a promover a reestruturação da antiga Caixa de Crédito Imobiliário dePernambuco, criando em seu lugar um órgão da administração indireta.

E isso foi feito, com a instituição do Banco do Estado de Pernambuco S/A -BANDEPE, sob a forma de Sociedade de Economia Mista.

Todavia, o legislador estadual também determinou que a novel entidademanteria, dentre outras, a Carteira de Financiamento Imobiliário.

Com a implantação, no País, do Sistema Financeiro de Habitação, mediante aLei Federal n° 4.380, de 21-8-64, os chamados Bancos de Depósito ficaramproibidos de atuar no financiamento da casa própria, passando essas atribuiçõespara as Sociedades de Crédito Imobiliário, além, naturalmente, das CaixasEconômicas e das Cooperativas Habitacionais.

Isso quer dizer que, a partir da instituição do Sistema Financeiro de Habitação(Lei n° 4.380/64), o Banco do Estado de Pernambuco S/A - BANDEPE, não maispodia atuar no setor do financiamento imobiliário, nos moldes da nova sistemáticaadotada no Brasil e, como constava da norma legal estadual a obrigatoriedade daexistência dessa Carteira, é evidente que o aludido Banco teria de ajustar-se àsnormas da nova legislação federal.

Assim, quando o Banco do Estado de Pernambuco S/A - BANDEPE, cuidou decriar a Sociedade de Crédito Imobiliário, denominada Bandep Crédito Imobiliário S/A,através da competente escritura, nada mais fez do que dar cumprimento àdeterminação contida na lei estadual, no caso, ajustando-se às exigências do novoSistema Financeiro de Habitação instituído pela Lei Federal.

Havia, portanto, mais do que simples autorização legal, para a instituição doBandepe Crédito Imobiliário S/A. Sim, porque havia determinação legal.

Verifica-se, ,pois, que falece consistência ao argumento dos suplicantes,segundo o qual a entidade controlada Bandepe Crédito Imobiliário S/A não é

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sociedade de economia mista, porque sua criação não resultou de imperativo legal,mas de simples ato de vontade da Sociedade Controladora.

Já vimos, aliás, que o Banco do Estado de Pernambuco S/A BANDEPE, comoSociedade de Economia Mista, não podia, como não pode participar de outrasociedade, a não ser mediante autorização legal ou no exercício de opção legal paraaplicar imposto de renda em investimentos para o desenvolvimento regional ousetorial (§ 1° do art. 237 da Lei Federal n° 6.404, de 15-12-76 - Lei das Sociedadespor Ações).

É, não há negar, o Bandepe Crédito Imobiliário S.A. uma Sociedade deEconomia Mista, porque:

a) seu capital é misto, isto é, dele participa um órgão da administração indireta,no caso o Banco do Estado de Pernambuco S.A. - BANDEPE;

b) a maioria acionária pertence ao aludido Banco do Estado de PernambucoS.A. - BANDEPE;

c) tem a estrutura de Direito Privado, sob a forma de Sociedade Anônima;

d) exerce atividade de natureza econômica;

e) sua criação resultou de imperativo legal.

Se Sociedades de Economia Mista são o Banco do Estado de PernambucoS.A. - BANDEPE, e o Bandepe Crédito Imobiliário S.A., seus diretores não podemacumular cargos ou funções nessas duas entidades, mesmo que renunciem àremuneração pelo exercício do caro ou função de uma delas, porque, em taiscondições, como tem entendo este Tribunal, em reiteradas decisões, o desrespeito ànorma constitucional (art. 99, § 2°, Constituição do Brasil) é patente.

Peço vênia, aqui, aos meus colegas deste Tribunal, para citar o seguinte trechodo meu voto na decisão agora contestada:

"O argumento de que o legislador proibiu, apenas, as acumulações,quando fossem elas remuneradas, com ser insustentável, ensejaria apossibilidade de tais acumulações ficarem ao bel-prazer dos seus ocupantes,bastando, para descaracterizá-la, que os interessados renunciassem àsremunerações daqueles cargos, digamos, passando a perceber estipêndiopelo quinto cargo. Nessa hipótese, perguntaria aos defensores dessa tese: aacumulação seria legítima?"

E prossegui no meu voto:

"Por oportuno, passo a citar judicioso pronunciamento do eminente ConselheiroJarbas Maranhão, no Processo TC n° 1.394/81, antes citado:

Na verdade, o que o legislador constituinte quis, foi proibir a acumulação decargos públicos, proibição atualmente estendida a cargos, funções ou empregos nasentidades da administração indireta.

O fato de usar quase sempre o vocábulo REMUNERADO parece-nos umafalha técnica, pois, todo cargo público é remunerado.

É mesmo de seu conceito legal: CRIADO POR LEI, EM NCMERO CERTO,COM DENOMINAÇÃO PRÓPRIA E PAGO PELOS COFRES PÚBLICOS.

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Por isso, pensamos que a redação .de melhor técnica é a da Constituição de1946: É VEDADA A ACUMULAÇÃO DE QUAISQUER CARGOS.

Claro que está a referir-se a cargos que, por serem cargos não remunerados,conforme sua própria definição legal e doutrinária. E não a qualquer outra tarefa ouatividade meramente honorífica, e, assim, brindado, nas leis, apenas como serviçorelevante.

O que a Constituição veda - insista-se - é a acumulação de cargos, pois, aludira CARGOS REMUNERADOS ou à ACUMULAÇÃO REMUNERADAassemelha-se-nos a um absurdo ou tautologia, de vez que, como vimos, a palavracargo pressupõe remuneração. A remuneração é de sua natureza.

O fato de alguém que acumule, deixar de perceber por um dos cargos nãodescaracteriza a acumulação.

A renúncia à retribuição não invalida a essência do cargo, que é, sempre, umconjunto de atribuições e responsabilidades devidamente remunerado."

Eis aí as magistrais palavras do Conselheiro Jarbas Maranhão.

E aí vai a conclusão do meu voto no processo referido:

"A própria Lei das Sociedades Anônimas, pela qual são regidas asSociedades de Economia Mista (Lei n° 6.404, de 15-12-76) dispõe em seusarts. 145 e 152, que os cargos de diretores e administradores dessasentidades são remunerados. O fato de o beneficiário renunciar à remuneraçãonão retira desses cargos o qualificativo remuneratório.

Vamos mais além, para afirmar que os diretores de uma SociedadeAnônima e, portanto, também de Economia Mista, não podem renunciar àrespectiva remuneração. Esta tem de ser declarada na assembléia geralcompetente, em quantitativos certos, como manda a lei. Isso feito, poderão,depois de receberem sua remuneração, dela dispor à vontade, doando aquem quer que seja, inclusive à própria empresa a que prestam serviço.Entretanto, o trabalho terá de ser remunerado: é um princípio universal,adotado, no caso, pela legislação brasileira das sociedades anônimas, comovimos."

De todo o exposto, voto no sentido de indeferir o pedido de reconsideração dosDrs. André Carlos Alves de Paula e Luiz de Sá Monteiro, para manter, na íntegra, adecisão deste Tribunal, proferida no Processo TC nº 882/62.

* * *

(OBS.) - Voto proferido pelo Conselheiro Orlando Morais, do Tribunal deContas do Estado de Pernambuco, no Processo TC nº 3.566/82, em sessãorealizada a 24-03-1983.

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O CONTEÚDO DA FISCALIZAÇAO FINANCEIRA EORÇAMENTÁRIA DOS MUNICÍPIOS

DAVID ALVES DE MELLOCons. TC. Amazonas

1. RAZÕES DESTE ESTUDO

No X Congresso dos Tribunais de Contas do Brasil, reunido em Maceió - 1979,sua Resolução n° 02 foi de reativar-se a deliberação do VIII Congresso, no sentidode Emenda à Constituição Federal ,para a extinção dos Conselhos de Contas dosMunicípios.

O assunto voltou a ser agitado no XI Congresso, em Florianópolis -1981, emque a Moção nº 05 era por que se propugnasse pela não criação dos Conselhos deContas nos Estados, uma vez que os Tribunais de Contas estão aparelhados a bemexercerem a fiscalização financeira dos Estados e Municípios.

Quem compareceu ao Congresso de Florianópolis presenciou a quase "irasanta" com que o Ministro Mário Pacini, fazendo coro com os demais, profligou acriação dos Conselhos de Contas. "Este assunto" -dizia ele - "é um dos mais graves;um dos mais importantes que estão sendo discutidos neste Encontro". E também -"os homens lúcidos, patriotas, tranqüilos dos Tribunais de Contas, conscientes eciosos das suas responsabilidades, estão a dizer a todo segmento da sociedadebrasileira, de que se está cometendo um absurdo neste Pais".

Em fins de maio do ano passado, o Tribunal de Contas do Rio de janeiropatrocinou simpósio sobre o tema "o Tribunal de Contas e sua jurisdição", sendoconferencistas renomados professores de direito, juristas outros e Ministros doTribunal de Contas da União. No conclave, vários foram os pronunciamentos contraa criação dos conselhos de contas municipais, dentre eles alteando-se os dosMinistros Victor do Amaral Freire e Miguel Seabra Fagundes, tendo este consideradoaqueles órgãos como "uma excrescência", carreando o efeito do enfraquecimentodos Tribunais de Contas, pela perda de parte de sua competência. Presidindo umadas sessões do simpósio e ao fazer a apresentação do conferencista - ProfessorCoutrim Netto, pronunciei algumas palavras sobre o assunto, considerando a

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proliferação dos conselhos de contas municipais um dispendioso bis in idem, sóensejado por uma falha na redação do texto constitucional.

"Homens lúcidos, patriotas", nós dos Tribunais de Contas temos o dever decontinuar no combate contra os conselhos de contas, não somente para evitar queoutros surjam, mas para conseguir a sua própria anatematização constitucional.Assim como um novo "Delenda Carthago."

É um tanto de lamentar-se que, com a criação dos últimos conselhos decontas, irão tenha havido uma reação a exemplo dos Tribunais de Contas do Rio dejaneiro, Ceará e Minas Gerais, que provocaram perante o Supremo Tribunal Federala declaração da insconstitucionalidade dos conselhos criados em seus Estados.

A inércia talvez se explique devido ao sucessivo fracasso da iniciativa doscitados Tribunais de Contas, pois o Supremo Tribunal Federal, diante dasrepresentações por aqueles provocadas, deu sucessivamente pelaconstitucionalidade da criação desses conselhos.

Com a devida vênia, ouso dizer que, com um estudo mais aprofundado,poderemos chegar à conclusão de que, pelos seus aspectos formais e pela doutrinavencedora, os julgados da Excelsa Corte não têm a firmeza que a iteração possaapresentar. É afirmação que faço com isenção e objetividade, nada obstante oapreço e admiração que voto aos eminentes Ministros que tomaram parte nosjulgamentos. Veremos, a seu tempo, minha análise a respeito.

Em realidade, quero chegar à conclusão de que, makré tout, os chamadosconselhos de contas municipais, quase espúrios em sua própria denominação, alémdo seu mítico suporte constitucional, na realidade são órgãos supérfluos edispendiosos, em conseqüência, inúteis e danosos ao Tesouro dos Estados. Lutarpela sua extirpação é um dever patriótico.

2. SÍNTESE HISTÓRICA CONSTITUCIONAL DA FISCALIZAÇÃOFINANCEIRA E ORÇAMENTÁRIA DA UNIÃO, DOS ESTADOS E DOSMUNICÍPIOS

Se bem que resumidamente e sem descer a comentários particulares, valeráum retrospecto histórico da estruturação constitucional republicana a respeito dafiscalização das finanças públicas.

A Constituição de 1891 limitou-se a dizer, em um único artigo, que - "éinstituído um Tribunal de Contas para liquidar as contas da receita e da despesa everificar a sua legalidade, antes de serem prestadas ao Congresso". Nenhumaalteração foi introduzida com a reforma constitucional de 1926.

A Constituição de 1934, deslocando o Tribunal de Contas para o capítulo "Osórgãos de Cooperação nas Atividades Governamentais", dispensou-lhe maior e maiscircunstanciado número de disposições. Declarando-o mantido, especificou queacompanharia a execução orçamentária, julgaria as contas dos responsáveis pordinheiros ou bens públicos, daria ou recusaria registro aos contratos e a quaisqueroutros atos de que resultasse obrigação de pagamento pelo Tesouro Nacional, alémde emitir parecer prévio sobre as contas anuais do Presidente da República.

Fiel ao regime que instituiu. a Carta outorgada de 1937 foi avara com oTribunal de Contas, dedicando-lhe um só artigo, 114, e reduzindo-lhe as atribuições.

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A Constituição de 1946 restaurou o sistema da de 1934, ampliando um poucoas atribuições do Tribunal de Contas.

Mais minuciosa foi a Constituição de 1967. Entre outras inovações, substituiu oregistro prévio pelo exame da legalidade das despesas, quase sempre só aposteriori. Poucas alterações lhe trouxe a Emenda de 1969.

Quanto à fiscalização financeira e orçamentária dos Estados, foi a Constituiçãode 1967 a primeira a fazer expressa referência aos seus Tribunais de Contas. A de1946, no Título I - Da Organização Federal, e no Capítulo I _ Das DisposiçõesPreliminares, limitou-se a declarar, no art. 22, que - "a administração financeira,especialmente a execução do orçamento, será fiscalizada na União pelo CongressoNacional, com o auxílio do Tribunal de Contas, e nos Estados e Municípios pelaforma que for estabelecida nas Constituições estaduais," remetendo seu parágrafoúnico à obrigatoriedade da observância de certas normas na elaboraçãoorçamentária.

Constitucionalmente, foi só com a Emenda n° 1/69, que a fiscalizaçãofinanceira e orçamentária dos Municípios recebeu menção expressa, em seu art. 16e três parágrafos, todos inovadores em nossa história constitucional republicana.Seu artigo 191 referiu-se ao Tribunal de Contas do Município de São Paulo, mas deforma a merecer crítica quanto à "espada de Dámocles" que ficou suspensa sobresua cabeça, uma vez que deixou ao arbítrio da Câmara Municipal mantê-lo, ou não.

Também não recebeu aplausos a redação das disposições sobre a fiscalizaçãofinanceira e orçamentária dos Municípios, particularmente a ambigüidade do texto do§ 1º do art. 16, defeito que ensejou o surgimento dos conselhos de contasmunicipais.

3. O PRONUNCIAMENTO JUDICIAL NA QUESTÃO DACONSTITUCIONALIDADE DA CRIAÇÃO DOS CONSELHOS DE CONTASMUNICIPAIS

Formalmente e quanto a doutrina vitoriosa é ainda discutível que a reiteraçãodos julgamentos do Supremo Tribunal Federal seja inapelavelmente convincentequanto a ter sido alcançada a verdade esperada.

Examinando-se, um a um, o desenrolar dos três julgamentos, com oposicionamento dos Ministros que neles tomaram parte, verificamos que o desfechodo último causa verdadeira perplexidade.

Na Representação n° 846, do Rio de janeiro, foi Presidente o Ministro AliomarBaleeiro, sendo relator o Ministro Antônio Neder. Foi nessa ocasião que a matéria foimais longamente debatida. Depois de circunstanciado relatório, o Ministro AntônioNeder produziu um longo voto em que, adotando o parecer ministerial, da autoria doentão Procurador-Geral da República, Professor Xavier de Albuquerque, deu pelaprocedência da declaração de inconstitucionalidade da criação do Conselho deContas dos Municípios do Estado do Rio de janeiro. Elaborou a interpretação dotexto constitucional de acordo com o processo recomendando modernamente, isto é,fazendo-se a interpretação gramatical como preparatória da interpretação lógica,para depois fazer - "esta como preparativa da interpretação sistemática, a que maisautorizadamente revela o direito legislador.

O principal opositor da doutrina do Ministro Antônio Neder foi o Ministro BilacPinto, para quem a exegese que inadmite outro órgão que não o Tribunal de Contas

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do Estado para a fiscalização financeira e orçamentária dos Municípios, - "tornagratuito, inócuo e sem objeto o disposto nos §§ 1° e 2°, do art. 16", pelo que é válida,portanto, para repúdio desta exegese do texto constitucional de 1969, a regrasegundo a qual não há palavras supérfluas, sem conteúdo ou destinação nos textoslegais.

Tomando parte na discussão, acompanharam o Ministro Antônio Neder, osMinistros Oswaldo Trigueiro e Thompson Flores, colocando-se ao lado do MinistroBilac Pinto seus colegas Rodrigues Alckmin, Eloy da Rocha e Aliomar Baleeiro,havendo empate na apuração final: cinco (05) Ministros votaram pelaconstitucionalidade dos conselhos de contas municipais - Aliomar Baleeiro, LuizGallotti, Eloy da Rocha, Bilac Pinto e Rodrigues Alckmin: cinco (05) outros - AntônioNeder, Oswaldo Trigueiredo, Djaci Falcão, Barros Monteiro e Thompson Flores -pela inconstitucionalidade. Não houve quorum para declaração desta.

No segundo julgamento - Representação n° 917, do Ceará, votaram pelaconstitucionalidade, em número de 6 (seis) os Ministros Aliomar Baleeiro, Eloy daRocha, Bilac Pinto. Rodrigues Alckmin, Leitão de Abreu e Cordeiro Guerra, e contra,em número de quatro (4) os Ministros Xavier de Albuquerque (que manteve aopinião que externara anteriormente como Procurador-Geral da República, narepresentação do Rio de janeiro) Antônio Neder, Thompson Flores e Djaci Falcão.

Como Relator, o Ministro Aliomar Baleeiro, depois de ler o parecer doProcurador Moreira Alves, que foi contrário à procedência da Representação,limitou-se a dizer que - "coerentemente com meu voto no julgamento daRepresentação nº 846, julgo improcedente a Representação nº 917, nos termos doparecer da Procuradoria Geral da República". O Ministro Antônio Nedermanifestou-se pela procedência, lendo seu voto proferido na Representação n° 846Rio de janeiro. Quanto aos Ministros Xavier de Albuquerque, Thompson Flores eDjaci Falcão, declararam continuar com o voto anteriormente dado.

Como se vê, praticamente não houve discussão, também não tendo sidosuscitados argumentos novos.

A terceira vez em que foi levantada a questão perante o Supremo foi naRepresentação nº 952-MG, formulada pelo Procurador-Geral da República HenriqueFonseca de Almeida, atendendo a solicitação do Tribunal de Contas de MinasGerais.

Era impugnada emenda na Constituição daquele Estado, segundo a qual ficaracriado o Conselho de Contas dos Municípios, estendendo-se aos seus membros "asmesmas garantias, prerrogativas, vencimentos e impedimentos dos membros doTribunal de Contas".

Presidiu o julgamento, em sessão plenária de 21-11-79, o Ministro AntônioNeder, sendo Relator o Ministro Djaci Falcão.

No tocante à inconstitucionalidade da criação do Conselho de ContasMunicipais, ao lado do Tribunal de Contas do Estado, a solicitação do Tribunal deContas de Minas Gerais voltou a insistir na interpretação do § 1º do art. 16 daConstituição Federal, invocando os raciocínios dos Ministros que, na Representaçãon° 846-RJ, tinham votado no sentido daquela inconstitucionalidade.

O Procurador-Geral da República, ainda que tendo oferecido a Representação,contra a mesma se manifestou, inclusive sustentando a possibilidade da extensão

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aos membros dos Conselhos de Contas Municipais das mesmas garantias,prerrogativas e vencimentos atribuídos aos membros do Tribunal de Contas.

O Ministro Djaci Falcão, Relator, modificou completamente sua posiçãoanterior. Depois de referir-se às duas Representações passadas e de que se filiara àcorrente da inconstitucionalidade, declarou que "tenho para mim que, nesta altura,após os dois julgados anteriormente referidos, nos quais ficou admitida a legalidadeda criação do Conselho de Contas dos Municípios, não é de bom alvitre reabrir aquestão, mesmo à vista de novos Ministros que passaram a compor o Tribunal".Adotou o parecer da Procuradoria Geral da República, principalmente baseado novoto Bilac Pinto da Representação nº 846/RJ. Desacompanhou a Procuradoria Gera,porém, na equiparação quantos aos vencimentos.

Resultado: julgada constitucional a criação dos Conselhos de Contas, emborainconstitucional a paridade de vencimentos.

Somente manifestou voto o Ministro Décio Miranda acompanhando o Relator.Não consta ter havido divergência na conclusão do julgamento, de que participaramos Ministros Antônio Neder, Djaci Falcão, Thompson Flores, Xavier de Albuquerque,Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Muñoz, Décio Miranda eRafael Mayer.

Foi mesmo surpreendente esse último julgamento, do Supremo, cujo desate daquestão constitucional parece ter sido influenciado preponderantemente pelas duasdecisões anteriores, nada obstante a presença de juizes novos na composição daCorte, se bem que, e em verdade, nenhuma matéria nova tivesse sido agitada.

4. EXAME DA MATÉRIA SOB ASPECTOS NOVOS

Entre outros, dois princípios são inscritos expressamente na EmendaConstitucional de 1969: o da autonomia municipal e o da fiscalização financeira dosmunicípios. Dir-se-á que já coexistiam desde a Constituição de 1946, consideradaaquela referência geral do seu artigo 22, dando liberdade a que os Estados, em suasConstituições, regulassem a forma de fiscalização da sua própria administraçãofinanceira e dos municípios, enquanto a autonomia municipal já vem agasalhadaconstitucionalmente desde 1891. Note-se, porém, que foi a Emenda n° 01/69 quetrouxe a inovação de estabelecer em seu art. 16 e parágrafos a forma dessafiscalização, da fiscalização municipal.

O que impende, atualmente, é definir o conteúdo, abrangência da fiscalizaçãoda administração financeira e orçamentária, dos municípios pelo Estado, de modo acompatibilizá-la com o princípio da autonomia municipal.

É pacífico que, quanto aos Estados, seus Tribunais de Contas modelam-sepelo da União, de modo que é comum, em suas respectivas áreas de jurisdição, aforma e o conteúdo da fiscalização financeira e orçamentária. E é assim oestruturamento geral do seu sistema, conforme as disposições dos artigos 70 e 72da Emenda de 1969:

I - A fiscalização é exercida pelo Legislativo, mediante controle externo, com oauxílio do Tribunal de Contas;

II - O controle externo compreende duas funções específicas: a) julgamento decontas; b) exame da legalidade de despesas;

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III - O julgamento de contas é de duas espécies e de competências privativas:a) das contas gerais do governo, que cabe ao Legislativo, com parecer prévio doTribunal de Contas; b) das contas dos administradores e responsáveis por bens evalores públicos, que cabe ao Tribunal de Contas;

IV - O exame da legalidade das despesas compete ao Tribunal de Contas, masem caráter de primeira instância porque: a) em matéria de contratos o Legislativo,até com o cômodo comportamento do silêncio, poderá tornar insubsistenteimpugnação levantada pelo Tribunal; b) o Chefe do Executivo poderá ordenar aexecução do ato sustado pelo Tribunal, ad referendum do Legislativo, a quemsempre caberá a última palavra.

As auditorias e inspeções locais são propriamente instrumentos processuaispara o exercício das funções competenciais acima especificadas.

É forte a tendência doutrinária e jurisprudencial de que, com a Emenda de1969, tornou-se obrigatória a instituição dos Tribunais de Contas nos Estados pois aestes aquela repetidamente se referiu, inclusive para tratar da titulação dos seusmembros (art. 193 - § 29 ), impondo restrições aos mesmos (art. 13 - IX), comoassegurando-lhes foro privilegiado nos crimes comuns e de responsabilidade (art.122 - b).

Fazendo-se abstração do órgão ou instituição a que caiba, pelo controleexterno, a fiscalização financeira e orçamentária dos Municípios, será certo que estanão terá a mesma extensão, a mesma abrangência que cabe ao Tribunal de Contasrelativamente ao Estado a que é pertinente. Com o Distrito Federal e os Territórios, oEstado-membro constitui a República.

A esta altura não se alça o Município, que, embora presente "em quase umséculo de experiência constitucional republicana" - conforme observa o ProfessorRaul Machado Horta, acha-se excluído de "entre os entes que compõem a UniãoFederal, a Federação ou a República".

A interpretação do art. 16 e seus parágrafos 1° e 2°, assim, deverá ter emconta a harmonização dos dois princípios constitucionais.

Estancada a nociva e indiscriminada proliferação dos Tribunais de Contas nosEstados, pois a estes aquela repetidamente se referiu, inclunal de 1969 a fórmula deser operada a fiscalização dos Municípios por parte dos Estados, mas sem queestes ultrapassem o limite da autonomia daqueles, ou, pelo menos, não a ferissemprofundamente.

Deve-se entender, então, que a fiscalização financeira e orçamentária pelosEstados nos Municípios restringe-se à emissão do parecer prévio sobre as contas aque os Prefeitos estão obrigados a prestar anualmente e que são julgadas, privativae irrecorrivelmente, pelas Câmaras Municipais. Ao órgão para isto competente sãofacultados os instrumentos formais das auditorias e inspeções locais.

Este entendimento tem apoio no § 2° do art. 16 da Emenda Constitucional de1969, cuja interpretação foi esquecida na querela judicial sobre a constitucionalidadeda criação dos conselhos de contas municipais.

Em sua "Técnica Legislativa", esclarece Hélio Fernandes Pinheiro que,consoante as regras da elaboração legislativa, o artigo deve conter um únicoassunto enunciando exclusivamente a norma geral, enquanto as medidas

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complementares e as exceções são reservadas aos parágrafos, que têm por objetoo conjunto de pormenores ou preceitos necessários à perfeita inteligência do artigo.

Ora, o artigo 16 enuncia a norma geral da fiscalização financeira eorçamentária dos Municípios, segundo o modelo da União, por operar-se mediantecontrole interno e externo, este a cargo da Câmara Municipal. Como o parágrafo 39,porém, estabeleceu pressupostos de difícil consecução para a criação de Tribunaisde Contas pelos Municípios, com o que estes, em sua imensa maioria, ficariam semum órgão auxiliar das Câmaras no exercício do controle externo, determinou oparágrafo 1° que o auxílio seria prestado pelo Tribunal de Contas do Estado ouórgão estadual a que fosse atribuída essa incumbência.

Se qualquer órgão estadual a que fosse atribuída a competência de auxiliar aCâmara Municipal tivesse a mesma amplitude das atribuições do Tribunal de Contasno exercício da fiscalização financeira e orçamentária do Estado, ocorreria umafranca invasão ria área da autonomia do Município. Especialmente se lhe fosse dadaa competência de julgar os responsáveis por bens ou valores do Município.Dar-se-ia, em verdade, um inadmissível choque entre princípios erigidos naConstituição da República.

Por isto a disposição contida no § 2° do art. 16, cuja significação teleológica atéo presente - quanto me ocorre saber - ainda não foi suficientemente definida. Porque, qual a rabo do quorum qualificado estabelecido no § 2°, para que possa aCâmara Municipal rejeitar o parecer do órgão estadual sobre as contas geraisapresentadas pelo Prefeito?

O Professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho, em seus "Comentários àConstituição Brasileira - Emenda n° 01/69" - procura explicar que -"dado o carátertécnico e a imparcialidade presumida dos órgãos estaduais que, assessorando atomada de contas, emitirão parecer sobre as mesmas, a Constituição houve por bemexigir maioria qualificada para rejeição desse parecer".

Ora, é da mesma natureza o parecer prévio que o Tribunal de Contas da Uniãoemite sobre as contas que o Presidente da República presta anualmente aoCongresso Nacional, assim como o parecer prévio que os Tribunais de Contas dosEstados dão sobre as contas anuais que os Governadores apresentam àsrespectivas Assembléias Legislativas. Esses pareceres podem ser aceitos ourecusados até por uma maioria absoluta ocasional. E jamais se questionou sobre ocaráter técnico desses pareceres e a imparcialidade presumida dos órgãoseminentes.

A ratio é outra. E somente pode-se entender a disposição do § 2° com afinalidade limitativa da atuação do órgão estadual na fiscalização financeira eorçamentária dos Municípios. Não fosse assim o estabelecimento constitucional daFiscalização dos Municípios ficaria completa com o caput do artigo 16 e seuparágrafo 1° e a matéria do § 3° ficaria mais tecnicamente acomodada como umparágrafo único do artigo 191.

Entende-se, portanto, que a interferência do órgão estadual na fiscalizaçãomunicipal restringe-se à emissão do seu parecer prévio, sem embargo das suasatribuições de auditoria e inspeções locais, como instrumentos processuais para aelaboração do parecer.

O elemento interpretativo do histórico da evolução republicana da fiscalizaçãofinanceira e orçamentária abona esse sentido do § 2°, do art. 16, tendo-se em vista a

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consagração constitucional dos Tribunais de Contas. Previsto para a União já naMagna Lei de 1891, para os Estados vem aparecer nominalmente na de 1967,enquanto que para os Municípios somente surge a possibilidade de sua criação naEmenda de 1969, condicionada aos requisitos do § 3° do seu art. 16.Exclusivamente aos Tribunais de Contas dos Estados e os Tribunais de Contas dosMunicípios, nas áreas de suas respectivas jurisdições, será lícita a plenitude dasatribuições previstas nos arts. 70 e 72 da Emenda n° 01/69 para o Tribunal deContas da União.

Com isto limita-se a um mínimo a intromissão do Estado na administraçãoprópria do Município no que diz respeito ao seu peculiar interesse, sem arranhão noprincípio da autonomia municipal. Isto porque a Câmara pode rejeitar o parecerprévio, verificada a maioria qualificada, esta sim, destinada a impedir ou ao menosdificultar que o mero critério político e os conciliábulos de interesses personalistasprevaleçam sobre os valores da moralidade e da probidade da administração públicamunicipal.

Certo que o órgão estadual poderá representar ao Prefeito e à CâmaraMunicipal sobre irregularidades ou abusos que verificar, quando proceda ainspeções anuais ou no correr cio exercício, mas num propósito apenas decolaboração, de advertência, para que sejam coibidos ou prevenidos os abusos eirregularidades, ou mesmo punidos os seus autores. Também, quando for o caso,poderá representar às autoridades competentes ao constatar a prática de crimes deresponsabilidade, definidos no Decreto-lei n° 201, de 27 de janeiro de 1967, ou decrimes contra a administração pública, capitulados no Código Penal. Poderá edeverá, porque são crimes de ação pública.

Este é o procedimento que vem sendo adotado pela generalidade dosTribunais de Contas do Estado, o que, de outro modo, seria impraticável diante darealidade brasileira, porque materialmente impossível a Estados como os de MinasGerais e São Paulo, por exemplo, exercerem o controle externo sobre os seusnumerosos municípios, se esse controle tivesse o conteúdo pleno descrito no § 1°do art. 70 da Constituição da República. Mais ainda: providenciar de acordo com odisposto no § 5° e suas alíneas do art. 72.

Ademais, se algum órgão estadual, Tribunal de Contas ou o que fosse, viessea exercer controle sobre contratos e atos outros originadores de despesas; sobreconcessões de aposentadorias e pensões; se julgassem contas de administradorese responsáveis por bens e valores públicos - em qualquer desses casos estariadesrespeitando a autonomia do Município, pois nele não têm jurisdição no que dizrespeito ao peculiar interesse da administração municipal. Excetua-se, naturalmente,o controle sobre a legalidade dos convênios que repassem recursos do Estado parao Município, pois o controle, então, pelo Tribunal de Contas, é exercido sobre aautoridade estadual conveniente. Também o julgamento das contascorrespondentes ao emprego desses recursos repassados, pois ao Tribunal deContas cabe julgar as contas dos que recebem dinheiros do Estado para aplicá-losde qualquer forma.

Ainda quanto à realidade brasileira, na grande maioria dos Municípiosespalhados pelo território nacional - de condições econômicas modestas e às vezesprecárias, quase sem renda própria - o Prefeito centraliza a administração municipal,invariavelmente sendo o único ordenador de despesas, o único responsável porbens e valores e tendo sob sua custódia pessoal os dinheiros públicos.

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A mais meritória função que os Tribunais de Contas dos Estados possamexercer na parte que lhes cabe na fiscalização financeira e orçamentária dosMunicípios - é a função pedagógica, de aconselhamento, de orientação dasacanhadas administrações municipais, no sentido de observarem as normasfinanceiras na realização das despesas. Não devemos "ter a intenção de procurarfazer a caça ao ladrão, ao desonesto, mas de controlar e de melhorar" - como disseo Ministro Mário Pacini. Experiência profícua e eloqüente teve o nosso modestoTribunal de Contas do Amazonas neste sentido, antes da desnecessária criação einstalação de um conselho de contas municipais.

5. O APARATO, ONEROSIDADE E SUPERFLUIDADE DOS CONSELHOS DECONTAS MUNICIPAIS

Em conferência que pronunciou a propósito da proliferação dos conselhos decontas municipais, observou a Conselheira Eva Andersen Pinheiro, do Tribunal deContas do Pará, que "a tônica, nos órgãos criados nos termos das respectivas leisorgânicas, é adotar a mesma estrutura organizacional dos Tribunais de Contas, nãosó no que diz respeito à sua composição, vencimentos, vantagens e prerrogativasdos seus membros, mas com relação à forma da fiscalização exercida, inclusivequanto à administração indireta, nela incluídas as entidades mencionadas na LeiFederal n° 6.233", logo acrescentando que, "apesar de rotulado de Conselho, essesórgãos representam, na realidade, outro Tribunal".

Disto dou testemunho eu próprio, quanto ao conselho criado no Estado doAmazonas, no pródigo entardecer da última administração, conselho que bempoderia ter sido chamado de "Tribunal de Contas dos Municípios do Estado doAmazonas", tal o seu paralelismo perfeito com o Tribunal de Contas do Estado doAmazonas, e em um particular superando o próprio Tribunal de Contas da União. Éque a sua lei orgânica, na parte em que trata do exame da legalidade dos atos quedão lugar a despesas, dá ao onipotente órgão o poder de cancelar as despesas,mesmo em caso de contratos, caso a Câmara Municipal não se pronunciar dentro detrinta dias sobre impugnação pelo mesmo levantada. Que poder teria o órgão paratornar efetiva uma sua deliberação nesse sentido? Nenhum, por certo. E sabe-seque é vão o direito que não tem sanção ou força que o assegure. É mais umamistificação do que outra coisa, sendo de concluir-se com o Conselheiro AécioMennuci, do Tribunal de Contas de São Paulo: "seria risível, se trágico não fosse..."

Nenhuma dúvida tenho de que não só essa bizarra atribuição do conselhoamazonense seja letra morta, mas também todas aquelas que, afrontando oprincípio da autonomia municipal, a lei que lhe conferiu, e que jamais foramexercidas anteriormente pelo Tribunal de Contas do Estado, porque acertadamentea sua Lei Orgânica não lhas outorgou.

Aparatosos e dispendiosos são esses órgãos excrescentes no sistemaconstitucional nacional da fiscalização financeira e orçamentária, dos quais indagavao Ministro Mário Pacini com que propósito eram criados.

Tenho para mim, como antes afirmei, que ainda é discutível aconstitucionalidade da criação dos conselhos de contas municipais. Ao voto longo elúcido do Ministro Antônio Neder, em que analisou a referência a "outro órgão" notexto constitucional segundo os processos gramatical, lógico e sistemático dahermenêutica jurídica, bem poderia ser acrescida a interpretação do § 2° do art. 16da Constituição de 1969, também do ponto de vista sistemático constitucional, emque o princípio da autonomia dos municípios não deve ser molestado com a

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efetivação do princípio da fiscalização financeira e orçamentária municipal realizadacom a intromissão de um órgão estadual. Teria então mais solidez a suainterpretação de que o "outro órgão" do texto constitucional seria aquele existente aotempo da edição da norma, 1969, nos Estados de Sergipe e Paraíba, que não erampropriamente Tribunais de Contas, como hoje ainda ocorre com o Estado do Acre.

Foi a advertência do Ministro Bilac Pinto, de que no texto constitucional "não hápalavras supérfluas" que comandou, até o último julgamento do Supremo, a correntevitoriosa da constitucionalidade dos conselhos de contas municipais. Todavia, setivermos em conta a valoração que o § 2° do art. 16 concedeu ao parecer prévio doórgão estadual, seja ele qual seja, é igualmente certo que a interpretação puramenteliteral do texto não pode admitir que a Constituição venha a ensejar a criaçãoindiscriminada e prolífera de órgãos supérfluos e dispendiosos, sobrecarregandoinutilmente o erário público que é alimentado penosamente pelos contribuintes,quando a sua função já vinha sendo exercida de longo tempo e de modointeiramente satisfatório pelos Tribunais de Contas dos Estados.

Porque é falso supor-se seja humilhante para os Tribunais de Contas aqualidade de órgãos auxiliares das Câmaras Municipais. Auxiliar é ajudar, e oauxílio, a ajuda pode até vir de cima, como quando a União presta auxílio a umEstado, na emergência de uma catástrofe. Ao depois, a Constituição, com sentidomais adequado ao que ocorre efetivamente, poderia ter usado os termos"cooperação", ou "colaboração", ou "por intermédio": o controle externo seráexercido pelo Congresso Nacional, com a cooperação, com a colaboração, porintermédio do Tribunal de Contas. Na realidade, a maioria dos atos de controle sãoefetuados pelos Tribunais de Contas, alguns até privativamente.

Igualmente falso que os Tribunais de Contas já estariam bastante carregadosde. atribuições, sendo demasiado peso o acréscimo da fiscalização municipal. Arealidade do que acontecia era outra: os Tribunais de Contas dos Estados, namedida exata da sua competência, vinham plena e eficientemente exercendo suasfunções, desde que as maiores tarefas, as de auditoria e inspeções, são realizadaspelos seus técnicos.

São óbvios os motivos da criação indiscriminada e fértil dos conselhos decontas municipais. O "porquê" dessa criação, indagado repetidamente pelo MinistroMário Pacini, poderia ser respondido com poucas palavras: não por motivo sério ede interesse público.

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GRITO DE APOSENTADO

VIVALDI MOREIRA

Estamos repletos de homens inteligentes, cheios de idéias, capazes dasformulações mais brilhantes e laboriosas construções intelectuais, incapazes, porém,de resolver nossos problemas. Eis o que pode pensar qualquer criatura azeda com avida.

Vou responder como um conterrâneo meu, homem de poucas letras, mas deaguda inteligência, sempre que amigos e parentes lhe levavam encrencas pararesolver:

- "Quando você entrou nessa enrascada ou nesse negócio, veio aqui para meconsultar? Então, porque agora entende que estou na obrigação de resolver seuproblema?"

Dentro da lógica usual, meu conterrâneo tinha toda a razão.

Mutatis mutandi, é o que estamos assistindo na atualidade. As dificuldades queestamos vivendo vieram de trás, de alguns decênios, de dois pelo menos. E, então,por que nós devemos pagar por erros acumulados? Será mais lógico ir parcelando adívida para que outras gerações participassem do resgate.

Podem estas as palavras preliminares de saudação a um colega que nos iráfalar daqui a pouco sobre tema específico de nossas tarefas constituírem o núcleode uma tese que se impõe à nossa consideração.

É o Procurador-Geral do Tribunal de Contas da Bahia figura largamenteconhecida e respeitada nos meios jurídicos e políticos do País. O Dr. Luís Navarrode Brito, por seus títulos e cultura, pelos cargos já desempenhados e pelo queexerce. Poderá ser, com seu brilho de constitucionalista, um excelente advogadodas idéias que terei a coragem de expor daqui a pouco, tão logo saúde em suapessoa, o membro conspícuo do Ministério Público junto do Tribunal de Contas daBahia e o autor de obras jurídicas tão conhecidas e louvadas pela lucidez de seuconteúdo. Professor de Política e de História das Idéias Políticas, nesta minhadespretensiosa saudação espero que Sua Excelência aprofunde o assunto epropugne por esta tese que não é de interesse restrito de uma classe, mas procura

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suspender uma penalidade injusta que nos foi imposta unicamente aoscomponentes de um só dos Poderes da República e do funcionalismo em geral.Vamos promover conjuntamente esta campanha. Acho-me em posição insuspeitapara pleitear, pois já fui penalizado e comigo não há mais remissão, não há maisremédio...

Quanto ao ilustre Dr. Luís Navarro de Brito também, pois ainda está longe docutelo e pode, tranqüilamente pleitear o abrandamento da pena... Por várias razões,é justa a campanha em vista do avanço da ciência, que pela química moderna,prolongou o limite da vida humana, além da economia para os cofres públicos. Oque, de início, posso sugerir para a supressão do inciso constitucional limitativo é oexame periódico do indivíduo que atingiu os 70 anos de existência, estabelecendoesse prazo para a aposentadoria voluntária, além dos outros requisitos dos 30 ou 35anos de serviço.

Isto não é novidade, pois os juízes americanos não sofrem o vexame daincapacidade. Há um belo episódio narrado na biografia do justice Oliver WendellHolmes. Eleito Presidente da República, Franklin Roosevelt foi à casa do grande juizda Suprema Corte e encontrou-o a ler Platão.

- "Para que ler Platão, Mr. Justice?" Oliver Wendell Holmes, com 90 anos feitose atuando ainda naquele pretório, respondeu ao Presidente Roosevelt: - "Paraaperfeiçoar meu espírito". To improve my mind... É claro que Roosevelt não teria idoem visita ao eminente magistrado senão para um discreto exame psicológico... Ficaaberta a porta àqueles que desejam mais cedo o ócio com dignidade: os 30 anos ouos 70. Daí por diante, o exame de sanidade mental.

Lembra-me, também, Gilberto Amado que cortava relações com quem lheperguntava se estava aposentado... Eu, que o freqüentava sempre, certa vez ouvi-oresponder malcriadamente ao telefone uma determinada pessoa pela impertinênciada pergunta. Ao pousar o fone, virou-se para mim, possesso, e repetiu: - "Ora veja,que imbecil. Falar em aposentadoria comigo. Só os mentecaptos se aposentam. Nãofalo mais com ele. Não merece o meu diálogo..."

Confesso-lhes que esta arenga me foi sugerida, ontem, por acaso, ao redigiruma página de meu diário. De imprevisto, vim refletindo e escrevendo acerca dosseptuagenários válidos, em virtude de uma conversa na véspera com Afonso Arinose sua insatisfação diante da idade. Em seguida, telefonei para um colega que seaproxima da faixa dos 70 e disse-lhe:

- "Você vai ver, daqui a pouco, o que é a situação de aposentado involuntário.É como se estivéssemos lendo um livro cujo entrecho principal houvesse terminadoe há ainda umas páginas de "anexos", opiniões sobre o autor, notas, mapas, coisaspelo gênero, absolutamente dispensáveis para avaliação do texto. Aquilo nós lemosse quisermos. Não faz parte do conjunto, do contexto. Então, é a sensação completade que terminamos a representação. C'est fini Ia contre-dance"...

Ele ficou meio sem assunto ao telefone, pois sentiu fundo a verdade de minhareflexão.

Graças a Deus, ainda mantenho vários interesses e possuo ocupação definida,afazeres que me enchem o tempo todo. Só sinto que recebo do Estado uma certaimportância em dinheiro que não mereço, como retribuição por não fazer nada, porhaver sido mandado para casa por força de um inciso legal discriminatório. O quechamam proventos não enchem minha alma, se bem que encham minha mesa... E

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se eu não me tivesse preparado para essas tarefas sobressalentes que, mal ou bem,desempenho com minha autêntica vocação?

Quero lembrar aqui aquele grito que se tornou histórico em França: Place auxjeunes. . . Lugar aos jovens. Somos mandados para casa, regiamente pagos, paradar lugar aos mais moços. E será justo? É uma indagação que me abstenho deformular por me parecer que sou suspeito. Mas merece melhor exame. Certacategoria de homens não desejam confessar-se velhos. E se sentem melancólicosquando o texto legal diz um chega-prá-lá. O mesmo que sucede a milhares dehomens capazes de oferecer subsídios valiosos ao país e são marginalizados, emvirtude do texto constitucional. Empurram-nos, é a verdade - em linguagem crua -com o engodo do otium cum dignitate, mas, na realidade desejamos a dignidade,sem ócio. E todos aceitamos a situação condicionados, talvez, pelos costumes, pelapressão social e, finalmente, pelo texto constitucional. Alguns, infelizmente, aceitama completa imobilidade. Outros, inconformados, usam o jus sperneadis, como se dizem linguagem faceira. Todavia esse jus é tão legítimo como os que mais o sejam,pelo menos como chaminé para exalar o gás carbônico da indignação.

Há em tudo o que aqui digo um pouco de humorismo, é claro. Não deixa,porém, de ter muita verdade. Venho conversando com uma série de macróbioscomo eu, e noto em todos certo grau de inconformismo. Todos resistemostensivamente. Só os que sempre levaram a vida flauteada, como se diz, nãoproduzem qualquer reação de desespero. Pode não ser biológico o limite - e em mimnão o é, tenho a certeza - mas o clima que envolve o aposentado e o leva a aceitar acondição é o legitimo condicionamento social, a pressão, o preconceito de séculos eaté milênios, pois Cícero já redigiu o tratado De Senectute, para se conformar e nosacalentar. E a nos esmagar, finalmente, a letra de lei: a Constituição da República,art. 113, § 1° - "A aposentadoria será compulsória aos setenta anos...", que marca ofim de nossas atividades úteis de cidadãos. Não nos proíbe, no entanto, fora docargo, de exercermos outras, tão úteis como as de que fomos enxotados pelo látegoda Carta Magna.

É uma injustiça e um paradoxo, pois para os cargos de carreira há o entrave, avedação constitucional, que considera nulos os atos praticados pelos funcionáriosapós setenta anos, e, no entanto, para os cargos eletivos não existe acorrespondente proibição. A assimetria nos aborrece. Temos de admitir um sóraciocínio se formos lógicos: um deles, comparativamente, é inferior ao outro, ou ode carreira ou o eletivo... Admitamos, ad argumentadum, que seja o de eleição.Então, um homem já aposentado é eleito deputado, senador ou presidente daRepública, já inválido? E nós tivemos um excepcional Presidente da República,homem de grande força moral e primorosa inteligência, Epitácio Pessoa, aposentadodo Supremo Tribunal Federal. E ainda agora mesmo temos na Chefia da Casa Civilda Presidência um magistrado em idêntica condição, a quem estão delegadasfunções importantes e delicadas, além das costumadas, inerentes à investidura. Sãocriaturas constitucionalmente inválidas ou incapazes juridicamente. Os atos dessesaltos funcionários estão isentos do crivo constitucional? Então, razõesprimeiramente, biológicas, e, em seguida, jurídicas só atuam contra aqueles quededicaram a vida inteira a uma tarefa específica, no decorrer da qual só fizeramacumular experiência? A condenação à inatividade só fulmina os que exerceram,primordialmente, o serviço público de carreira e a magistratura?

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A atividade política exige menos responsabilidade? As atividades legiferante ea executiva estão isentas de erro ou imprecisão? Na essência, a pechaestigmatizante lançada pelo inciso constitucional, que remete para a ociosidade umhomem em plena pujança intelectual, com capacidade de trabalho, com experiênciamultiplicada - e tudo isso, de um dia para outro, marcado, infalivelmente, nocalendário, é atirado ao lixo? O mais esdrúxulo é considerarmos o dia exato dacompulsória. Até ontem, digamos, um magistrado podia exarar uma sentença, darum voto, lavrar um acórdão. De hoje em diante, o dia inaugural de sua décadagloriosa dos "setenta", já a Lei Maior rugiu que ele é incapaz. O pior é o apodo daincapacidade jurídica, pois outro nome não cabe para designar a mácula que éjogada na face do funcionário atingido pela compulsória em plena atividadeprodutiva e com suas circunvoluções cerebrais perfeitamente em ordem. E o institutoda incapacidade é dos mais vexatórios do Direito que se possa atribuir a umapessoa. Estão capitulados nos artigos 5° e 6° do Código Civil, tanto os incapazesabsolutos como os relativamente incapazes, a começar pelos loucos de todo ogênero e os pródigos. E como definem os léxicos a capacidade? É umapossibilidade legal. Então, sou um incapaz perante a lei. Sou comparado àscrianças, aos silvícolas e aos mentecaptos. Urge, então, que se modifiquem osvocábulos não só nos textos legais, mas até nos dicionários.

Gozamos da vitaliciedade, como está no item I do artigo 113, isto é, se fuinomeado magistrado, carregarei o cargo pela vida toda, exceto se o perder porsentença judiciária, conforme o § 2° do art. 113 da Constituição. Logicamente,seguindo a sistemática da Carta, ainda que declarada a cláusula, sou exposto aovexame de ser punido por completar setenta anos, como se houvera praticado atosimorais capitulados para a perda do cargo e da função de julgar.

A Constituição decreta peremptoriamente: é considerado imoral completar ocidadão setenta anos de idade. Então, eu prevariquei ao completar a idade limite, aocompletar a idade provecta que a Constituição arbitrariamente instituiu. Não há, emboa lógica, silogismo mais perfeito. Será nulo o ato jurídico praticado na função,quando a pessoa é incapaz, eis o que dispõe o art. 146 do Código Civil.

Se no dia imediato ao de meu aniversário das setenta primaveras eu houvesseproferido um voto em processos até ali distribuídos a mim, no Tribunal de Contas, talfato seria nulo ou anulável. De qualquer modo, eivado de suspeição. Houve umaautêntica metamorfose em minha personalidade decretada por um inciso legal,embora eu nada sofresse física ou mentalmente.

Tudo o que consegui elaborar até agora acerca da incapacidade legal,arrastando-me ao domínio das nulidades em matéria civil, faz-me recordar apersonagem de Stendhal em seu romance La Chartreuse de Parme.

A ficção pode entrar para nos acalmar a inquietação causada pelo problemajurídico da aposentadoria compulsória.

É o caso da bela Sanseverina que exercendo papel de relevo na sociedademilanesa, dominadora dos salões, em plena vivacidade de espírito, de belezafulgurante, resolve, com pouco mais de trinta anos triunfais, retirar-se para a vidaprivada. Todos deploram a deserção de Sanseverina, mas desconhecem seuspecados, a causa de sua reclusão, a fuga daquela ribalta onde exercia os primoresde seu talento de sedutora. A aposentadoria voluntária da personagem stendhalianapode servir-nos de consolo, a nós que nos esforçamos, não guardando nenhum

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pecado escondido, em permanecer na ribalta como símbolo da dedicação ao serviçopúblico, sem a maquilagem da Sanseverina.

É esta a fortuna que nos espreita, a todos nós que vamos arrastados à forçapara os bastidores.

Quase nem posso agradecer a gentileza de meus companheiros da atividade,trazendo-me novamente à ribalta, para dar a ilusão a um aposentado de que elepresta ainda algum serviço á função que exerceu por trinta e quatro anos...

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II. - VOTOS E PARECERES

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PENSAO MILITAR

FERNANDO TUPINAMBA VALENTE

Cogitam os autos do exame da concessão de pensão militar à viúva doTenente-Coronel CB Álvaro Corrêa Martins, falecido em 21-3-70.

Após uma longa caminhada e em razão do entendimento adotado pelo Tribunalao examinar o Processo n° 125/79, em sua Sessão de 3-12-81, vieram os autos aapreciação dos órgãos desta Corte e, em função do estudo feito pelos órgãosinstrutivos, subiram à consideração da Douta Procuradoria Geral com proposta denova diligência, à vista da delegação de competência de que trata a Portaria n° 43,de 9 de março de 1982, para a regularização da documentação, qual seja,expedição de novo Título de pensão e anexação do decreto de concessão inicial.

Reexaminando o problema das Pensões Militares do Distrito Federal em toda asua extensão e estabelecendo um paralelo com as pensões civis, analisando toda aevolução deste instituto a partir da Lei n° 3.765, de 4 de maio de 1960, do Decreto n°49.096, de 10-10-60, que a regulamenta e modificações, através do exaustivoparecer de fls. 63/88, a Procuradora Élvia Lordello Castello Branco esgotapraticamente todo o assunto, chegando às seguintes conclusões:

a) enquanto não for editada lei própria para as corporações militares do DF, nojulgamento das pensões militares da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros doDistrito Federal, deve esta Corte de Contas adotar a legislação federal, bem como ajurisprudência do Tribunal de Contas da União;

b) considerando que os processos estão chegando ao julgamento desta Casacom grande defasagem de tempo, devem ser desprezadas as diligências nãoessenciais, considerando o caráter de urgência atribuído a tais processos;

c) necessidade de oportuna adequação do Ato Regimental n° 9/80, comprevisão da competência para apuração das pensões militares;

d) dessemelhanças entre as pensões civis especiais e as pensões militares,inclusive, na preterição de beneficiários, diferenciação entre beneficiários facultativose obrigatórios, e na possibilidade de contribuição para pensão correspondente a umou dois postos acima da dos contribuintes;

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e) desnecessidade de ato formalizado em decreto ou portaria para concessãodas pensões.

Considerando as razões expostas, entendo que o Tribunal, ao acolher omencionado parecer, estaria em parte reformulando o entendimento anteriormentefixado (Processo nº 125/79), para considerar desnecessária a expedição de decretoconcessivo, bem como atendendo o preceituado no § 2º, do art. 10, da Lei n°3.765/60.

Acolhidos os princípios consignados no parecer acima, o Tribunal poderiadeterminar a sua aplicação a todos os casos semelhantes.

No caso em exame, também entendo que todos os elementos exigidos pelosarts. 36 e 38, do Decreto nº 49.096/60, constam do processo e inclusive a ausênciado ato de concessão da reforma está suprida pelo apostilamento do mesmo no versodo título de fls. 12.

Assim, voto:

a) pela adoção do parecer da Douta Procuradoria-Geral, neste e em casossemelhantes;

b) seja declarada legal a concessão da pensão inicial de Cr$ 1.852,00 a NadirDuarte Martins, viúva do Tenente-Coronel CB Álvaro Corrêa Martins.

_______________Processo n° 2.386/79 - 7-6-83.

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COBRANÇA EXECUTIVA DE DÉBITOS FIXADOSPELO TRIBUNAL

ELVIA LOADELLO CASTELLO BRANCO

A atuação deste Ministério Público no campo da execução das decisões daCorte, quando se tenha de processar pelos órgãos jurídicos do GDF e de suaAdministração Descentralizada, não se deve restringir ao envio àqueles órgãos doexpediente necessário à promoção da cobrança.

2. Venho, pois, no cumprimento do dever de zelar pelos interesses daAdministração e da Fazenda Pública, expor e em seguida requerer o que adiante secontém.

A MATÊRIA EM CAUSA

3. Embora assentada na doutrina e na jurisprudência da mais alta corte doPaís, a natureza jurisdicional das decisões das Cortes de Contas no julgamento dascontas dos administradores e demais responsáveis por bens e valores públicosparece matéria ainda suscetível de dúvidas por parte não só da Administração comode autoridades judiciárias.

4. Com efeito, em caso recente, o MM. juiz de Direito da 2ª Vara da FazendaPública do Distrito Federal indeferiu pedido de execução de débito apurado emprocesso de tomada de contas especial, assim fundamentando o indeferimento:

"Busca-se execução cujo montante resulta de processo administrativo,que por sua vez ensejou a elaboração de cálculos múltiplos, terminando pordecisão do Tribunal de Contas do Distrito Federal.

Este não é órgão do Poder judiciário e as suas decisões não constituemtítulo judicial capaz de estribar processo de execução.

No caso presente faltam todos os requisitos para o processo deexecução, notadamente a certeza e a liquidez da quantia que se pretendeexecutar.

Por tais razões, indefiro a inicial.

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Intime-se." (Doc. n° 1. )

5. O autor da ação informou a este Ministério Público que - convencido doacerto da decisão - dela não recorrera para o Tribunal de justiça e que ajuizaria, omais breve possível, ação ordinária para cobrar o débito referido no acórdão doTribunal. (Doc. n° 2. )

A OPINIÃO DA DOUTRINA

6. Pontes de Miranda dá notícia de que, já no Congresso jurídico de 1905, foiaprovada a seguinte doutrina:

"A sentença do Tribunal de Contas, condenando o responsável aopagamento do alcance, tem processo com execução própria perante a Justiçafederal e longe de ser simples cobrança de dívida é a execução de sentençajudicial, proferida por tribunal federal, que, na espécie, procede como órgão doPoder judiciário, independente e autônomo." (Pontes de Miranda, Comentáriosà Constituição de 1946, Tomo III, pág. 23. )

6. Examina o grande jurista, com a eficácia e incisividade que lhe foram semprepeculiares, todos os aspectos constitucionais e legais da atribuição conferida aoTribunal de Contas para julgamento das contas dos responsáveis sob sua jurisdição,primeiro por leis ordinárias e, a partir de 1934, pelas Constituições republicanas. Dosjuízes que deduz destaco estes:

"Hoje, e desde 1934, a função de julgar as contas está claríssima, notexto constitucional. Não havemos de interpretar que o Tribunal de Contasjulgue, e outro juiz as rejulgue depois. Tratar-se-ia de absurdo bis in idem. OuTribunal de Contas julga ou não julga. ( ... ) "Tal jurisdição exclui a intromissãode qualquer juiz na apreciação da situação em que se acham, ex hypothesi,os responsáveis para com a Fazenda Pública. (Op. cit. págs. 22 e 23. )

A separação entre o julgamento das contas e a execução das decisõesrespectivas é de direito administrativo. O legislador ordinário tem poder paraatribuir ao Tribunal de Contas a execução de suas próprias decisões, comopara a deixar aos juízes comuns. Se a lei ordinária confere ao Tribunal deContas a execução, tudo se simplifica, pois que o juiz judicante é o juiz daexecução. Se separa o julgamento e a execução, não infringe, conformedissemos anteriormente, o traçado constitucional da jurisdição do Tribunal deContas. Em tudo que se refere ao julgado mesmo, nenhuma competência tem,nem pode ter, o juiz comum, mero juiz de execução. (Grifei.)

As questões decididas pelo Tribunal de Contas, no julgamento dascontas dos responsáveis pelos dinheiros ou bens públicos, não são simplesquestões prévias: são questões prejudiciais, constituem o prius lógico-jurídicode um crime, ou pelo menos, de circunstância material desse. É elementoindispensável à repressão do crime de peculato, por parte do juiz comum, ojulgamento das contas dos responsáveis, e esse julgamento somente podeser feito pelo Tribunal de Contas. Quando o juiz comum despreza o julgado doTribunal de Contas, infringindo-o, ou modificando-o, ou tendo-o pordesnecessário, usurpa funções do Tribunal de Contas, em proveito dosacusados, ou contra eles." (Op. cit. pág. 27. )

7. Deixou, nesses tópicos, bem claro o grande mestre que por força doordenamento constitucional são as Cortes de Contas que julgam, privativamente, os

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responsáveis por bens e dinheiros públicos e que o juiz comum, se a ele competir aexecução do julgado, não lhe pode discutir o mérito nem por qualquer formaalterá-lo.

8. O mesmo pensamento e convicção são expressados pelo não menosinsigne Victor Nunes Leal:

"A corrente doutrinária que, entre nós, sustenta a imutabilidade, inclusivepara o judiciário, das decisões do Tribunal sobre prestações de contas dosresponsáveis por dinheiros e outros bens públicos (supra, § 29 ), baseia-se novocábulo "julgar", usado pelos textos constitucionais de 1934 e 1937.CASTRO NUNES chegou mesmo a se estender na demonstração daequivalência das expressões "julgar as contas" (Constituição de 34) e "julgardas contas" (Constituição de 37 ).

Ora, se a competência para julgar contas torna prejudicial e definitivo opronunciamento daquele órgão sobre o fato material do alcance (ou da suaausência), pode parecer que idêntica conseqüência se deva extrair da competênciado Tribunal de Contas para julgar da legalidade dos contratos, aposentadorias,reformas e pensões." (...) (Leal, Victor Nunes. Problemas de Direito Público, EditoraForense, RJ, 1ª Edição, 1960, pág. 231. )

9. Em trabalho dos mais complexos sobre as funções jurisdicionais eadministrativas dos Tribunais de Contas, assim se manifesta o ilustre CarlosCasimiro Costa:

"Os Tribunais de Contas não são órgãos do Poder judiciário; aliás, emnenhuma parte do mundo, consoante observação feita, tais Tribunais se integramnesse Poder. São órgãos autônomos, cuja autoridade e competência derivamdiretamente da própria Constituição. Não obstante essa circunstância, podemosafirmar que os Tribunais de Contas exercem funções jurisdicionais propriamenteditas, de natureza judicante, e funções meramente administrativas. As primeirasconsistem em "julgar as contas dos responsáveis pelos dinheiros e outros benspúblicos e as dos administradores das entidades autárquicas" (art. 77, n° II, daConstituição federal; art. 70, b, da Constituição estadual de São Paulo); assegundas, em "julgar da legalidade dos contratos aposentadorias, reformas,disponibilidades e pensões" (art. 77, nº III, da Constituição Federal; art. 70, e, daConstituição estadual).

As conseqüências dessa distinção são da maior importância: no primeiro caso,as decisões dos Tribunais de Contas passam em julgado, sendo insuscetíveis dealteração mesmo pelo Poder judiciário; no segundo caso, as decisões dos Tribunaisde Contas não fazem coisa julgada, podendo ser alteradas pela própriaAdministração Pública, em determinadas hipóteses, através de ato retificatório ouanulatório que virá a registro final do próprio Tribunal, ou podendo ser alteradas peloPoder judiciário, através de recurso de qualquer interessado (art. 141, § 4º, daConstituição federal), sendo a sentença de justiça obrigatória, também, para oTribunal de Contas. (in Revista de Direito Administrativo, Ed. FGV, RJ/SP, 1958, Vol.53, pág. 29.)

10. Adiante demonstra, com o apoio de Rafael Bielsa a separação entre asjurisdições civil, penal e administrativa com relação ao alcance e ao alcançado:

"Como observa Bielsa, um mesmo fato pode determinar responsabilidades deordens diversas: administrativa, penal e civil. A tomada de contas da gestão

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financeira do agente é de ordem administrativa, o que se fixa é a responsabilidadedo exator ou pagador no desempenho de sua função pública. Quando se diz queessa responsabilidade é civil como «de uso na linguagem corrente, o que se querdizer é apenas fixar a sua índole civil em contraposição à responsabilidade penal,que as cortes de contas não apuram, porque não exercem jurisdição penal.

Por isso mesmo, conclui o douto expositor argentino que as cortes de contasnão invadem nem a jurisdição civil nem a jurisdição penal a cargo dos juízescomuns, quando fixam a responsabilidade do agente por fatos ou atos de sua gestão(Rafael Bielsa, Derecho Administrativo, 4ª ed., 1938, vol. I, pág. 764).

E limita-se a essa verificação o julgamento da conta. É um Juízo que se instituisobre operações administrativas, limitado aos atos ou fatos apurados, seja paraliberar o responsável, seja para o declarar alcançado em vista das irregularidadesencontradas na sua gestão.

O Tribunal de Contas estatui somente sobre a existência material do delito,fornecendo à justiça, que vai julgar o responsável, essa base de acusação.

Não julga a este, não o condena nem o absolve, função da justiça penal.Fixa-lhe apenas a responsabilidade material, apurado o alcance. Outrosaspectos da imputação pertencem por inteiro à justiça comum, que podeabsolver o responsável alcançado, contanto que não reveja o julgado decontas, não negue a existência material da infração financeira. (Op. cit., pág.34. )

11. Como os juristas anteriormente citados, repudia a revisão do julgado doTribunal como matéria de defesa na cobrança executiva.

"Muito menos, portanto, se compreende que possa ser revisto o julgadode contas como matéria de defesa na cobrança executiva. A amplitude dedefesa agora assegurada pela lei terá, pois, de comportar essa limitação debase constitucional, em se tratando de alcance apurado pelo Tribunal deContas.

As decisões proferidas em tomadas de contas, já se entendia assim no antigoDireito imperial, e hoje por melhores razões, "têm a autoridade e força de sentençados tribunais de justiça e são executórias desde logo contra os mesmosresponsáveis". Por isso mesmo, "a dívida proveniente de alcance não precisa serinscrita previamente" (Decreto-Lei nº 960, art. 2°, § 2°) .

Parece, conseguintemente, pacífica a tendência jurisprudencial para oreconhecimento das funções judicantes do Tribunal de Contas em matéria detomada de contas. Relativamente, entretanto, as funções administrativas dosTribunais de Contas, perdura ainda acentuada divergência. (Op. cit., pág. 38. )

12. Sempre grande, sempre lúcido, afirma Seabra Fagundes ao tratar docontrole jurisdicional da administração pública.

"Duas exceções restritas admite a Constituição ao monopóliojurisdicional do Poder judiciário, no que concerne à matéria contenciosaadministrativa.

A primeira diz respeito aos crimes de responsabilidade do presidente daRepública, dos ministros de Estado, quando conexos com os desse, e dos

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ministros do Supremo Tribunal Federal. O seu julgamento competirá aoCongresso.

A segunda se refere ao julgamento da regularidade das contas dosadministradores e demais responsáveis pela guarda ou aplicação de bens oufundos públicos atribuído ao Tribunal de Contas." (in o Controle dos AtosAdministrativos pelo Poder judiciário, 41 ed., Forense, Rio, 1967, pág. 139. )

13. E mais adiante:

"O Tribunal de Contas não aparece na Constituição como órgãocomponente do Poder judiciário.

Dele se trata no capítulo referente ao Poder Legislativo, do qual constitui,pelo menos por algumas das suas atribuições, órgão auxiliar.

Não obstante isso, o art. 71, § 4°, lhe comete o julgamento daregularidade das contas dos administradores e demais responsáveis por bensou dinheiros públicos, o que implica em investido no parcial exercício dafunção judicante. Não bem pelo emprego da palavra julgamento, mas sim pelosentido definitivo da manifestação da corte, pois se a regularidade das contaspudesse dar lugar a nova apreciação (pelo Poder judiciário), o seupronunciamento resultaria em mero e inútil formalismo. Sob esse aspectorestrito (o criminal fica à justiça da União) a Corte de Contas decideconclusivamente. Os órgãos do Poder judiciário carecem de jurisdição paraexaminá-lo". (Op. cit., págs. 140, 141 e 142. )

14. Castro Nunes, citado pelo autor, teve também o mesmo entendimento.

15. Dei a palavra aos mais doutos, e muitos outros pronunciamentos do mesmoteor poderiam ser aqui transcritos. Limito-me porém a lembrar que o tema foi objetodo excelente trabalho apresentado pelo Conselheiro Substituto Dr. Raimundo deMenezes Vieira na parte introdutória ao Parecer Prévio sobre as contas do Governono exercício de 1981.

A VISÃO DO JUDICIÁRIO

16. O Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente decidido em consonânciacom o pensamento doutrinário exposto. Assim foi no Mandado de Segurança n°7.280, relator o Ministro Henrique D'Avila, julgado em 20-6-60, que traz a seguinteementa:

"Não se conhece de mandado de segurança contra ato do Tribunal deContas que, ao julgar prestação de contas, apura o alcance do responsávelpelo dinheiro público, porque tal ato é, insuscetível de revisão na via judicial,exceto quanto ao seu aspecto formal ou ilegalidade manifesta."

17. A decisão foi unânime e dela participaram os Ministros Sampaio Costa,Gonçalves de Oliveira, Vilas Boas, Cândido Mota Filho e Ari Franco, sob apresidência do Ministro Barros Barreto. (in Revista Forense n° 195, 1961, págs. 165e 166. )

18. Noutro julgado, o Recurso Extraordinário n° 55.821, relator S4inistro NunesLeal, discutiu-se, entre questões processuais, a competência do Tribunal de justiçado Estado do Paraná para anular resolução do Tribunal de Contas que mandaraexpedir provisão de quitação a Procurador do Estado por importâncias por elerecebidas, bem como a provisão expedida pelo Presidente com base na resolução.

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19. Nessa oportunidade, sustentou o Relator:

"A meu ver, essas irregularidades formais são insignificantes, não têm agravidade que, de acordo com os precedentes mencionados, justificaria aintromissão do judiciário nessa tarefa especial para cujo desempenho oconstituinte instituiu um órgão altamente qualificado, como o Tribunal deContas, protegendo seus Juízes com as garantias próprias dos magistrados."

20. Na mesma assentada, o Ministro Barros Monteiro, embora ressalvasse oacatamento devido ao art. 150, § 4°, da Constituição, acabou por anuir em que as"decisões do Tribunal de Contas não podem ser revistas pelo Poder judiciário, a nãoser quanto a seu aspecto formal".

21. Ao votar, também o Ministro Djaci Falcão afirmou que "a decisão doTribunal de Contas guarda, na espécie, força preclusiva, ressalvada, é claro, aofensa positivada a texto de lei".

22. Foi, ainda lembrado, no mesmo julgamento, este parecer doProcurador-Geral da República, Carlos Medeiros Silva, no Mandado de Segurançan° 6.960:

"Como se vê, pretende o impetrante, por via de mandado de segurança,invalidar decisão do Tribunal de Contas, proferida no exercício de suacompetência constitucional privativa, à vista de decisão judicial absolutória,dada em processo criminal. Mas a condenação do Tribunal de Contas não émero ato administrativo, mas decisão, equiparada às que o Poder judiciárioprofere, ante os termos inequívocos do art. 77, n° II, da Constituição. (...)Demonstram as informações, à toda a evidência, que dinheiros públicos, sob aguarda do impetrante, não foram restituídos à tesouraria da repartição, semmotivo legítimo de escusa. A absolvição, no processo criminal, não elide estefato, a despeito de haver inocentado ao impetrante quanto à prática de crime."

23. E assim votou o Ministro Ribeiro da Costa:

"A decisão sobre a tomada de contas de gastos de dinheiros públicos,constituindo ato específico do Tribunal de Contas da União, ex vi do dispostono art. 77, n° II, da Constituição Federal, é insusceptível de impugnação pelomandado de segurança, no concernente ao próprio mérito do alcance apuradocontra o responsável, -de vez que não cabe concluir, de plano, sobre ailegalidade desse ato, salvo se formalmente eivado de nulidade substancial.. .".

24. Julgando o MS. 16.255, dizia o Relator, Ministro Evandro Lins:

"Trata-se apenas de delimitar, entre as várias missões atribuídas aoimportante organismo fiscalizador, o que se compreende na sua funçãoexcepcional de jurisdição privativa. E, neste ponto, os que têm versado o temanão divergem no assinalar limites estreitos ao âmbito próprio da jurisdição decontas, no qual, segundo Castro Nunes, cinge-se a Corte a proferir decisãosobre a regularidade intrínseca da conta, e não sobre a responsabilidade doexator ou pagador ou sobre a imputação dessa responsabilidade. (...) Tudoquanto ultrapassa este limitado objeto de exame da regularidade intrínsecadas contas prestadas pelos responsáveis, refoge à competência jurisdicionalrestrita, e inampliável por lei, do Tribunal de Contas. Só o que toca a esteexame, já para liberar o responsável, já para declara-lo em alcance, constitui

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decisão jurisdicional definitiva, a cavaleiro de qualquer revisão judicial." (inRTJ, vol. 38, 1966, pág. 249.)

O DIREITO POSITIVO VIGENTE

25. A sede principal da matéria, no direito legislado, é a relativamente recenteLei n° 6.822, de 22 de setembro 1980, cujo art. 19 dispõe:

"As decisões do Tribunal de Contas da União condenatórias deresponsáveis em débito para com a Fazenda Pública tornam a dívida líquida ecerta e têm força executiva, cumprindo ao Ministério Público Federal, ou, nosEstados e Municípios, a quem dele as vezes fizer, ou aos procuradores dasentidades da Administração Indireta, promover a sua cobrança executiva,independentemente de quaisquer outras formalidades, na forma do dispostona alínea c, do art. 50, do Decreto-lei n° 199, de 25 de fevereiro de 1967."

26. A leitura desse dispositivo deixa a impressão de que apenas as decisõescondenatórias de responsáveis da Administração Direta e da Administração Indiretadeveriam ser objeto da cobrança executiva. O equívoco se desfaz, porém, com aconsulta ao art. 2° da mesma lei, que reza:

"Incluem-se entre os responsáveis mencionados no artigo anterior os daAdministração Indireta, os das Fundações instituídas ou mantidas pela União,e os abrangidos pelos arts. 31, item X, e 43 do Decreto-lei n° 199, de 25 defevereiro de 1967, e pelo art. 183 do Decreto-lei rd" 200, de 25 de fevereiro de1967, bem como os administradores de quaisquer recursos originários detransferências federais." (Grifei. )

27. Vê-se, portanto, que é o mais lato possível o alcance desse diploma, quese estende mesmo, por força do art. 39, à cobrança de multas impostas peloTribunal de Contas da União nos casos previstos no art. 53 de sua Lei Orgânica.

28. Cumpre frisar, aliás, que o tema, sistematizado nesta lei, já se encontravaregulado no § 2° do art. 39 da Lei nº 4.320/64, em face da nova redação dada a esseartigo pelo Decreto-lei n° 1.735, de 20 de dezembro de 1979, onde se estatui:

"Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza,proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais emultas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da FazendaPública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios,contribuições estabelecidas em lei, multas de qualquer origem ou natureza,exceto as tributárias, foros, laudêmios, aluguéis ou taxas de ocupação, custasprocessuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos,indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveisdefinitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigaçõesem moeda estrangeira, de sub-rogação de hipoteca, fiança, aval ou outragarantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais." (Grifei.)

29. Tratando-se de preceito contido na lei que estabelece as normas gerais dedireito financeiro, a qual, conforme o disposto no art. 89, inciso XVII, alínea c, daConstituição, é obrigatória para a União, os Estados, o Distrito Federal e osMunicípios, está fora de dúvida que abrange, as decisões do Tribunal de Contas nãoapenas da União, mas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que opossuam.

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30. Esse simples e sólido argumento põe por terra qualquer reparo ouhesitação quanto à aplicabilidade da Lei n° 6.822/80 no caso de as decisões quejulguem responsáveis em alcance provirem não do Tribunal de Contas federal, masde Corte de Contas estadual, do Distrito Federal ou de Município.

31. Aliás, o curto caminho do direito positivo conduz ao mesmo ponto a que sechegaria pela interpretação sistemática do ordenamento jurídico pátrio.

32. Se, na verdade, ninguém questiona que a Lei n° 6.822 verse matéria dedireito processual e por isso mesmo, cogente perante todos os órgãos judiciais doEstado, de qualquer nível, há quem conteste que autorize a cobrança executiva dedébitos julgados em decisões definitivas dos Tribunais de Contas dosEstados-membros, do Distrito Federal e dos Municípios, sob o argumento de que, nahipótese, a norma é de direito adjetivo específico - estabelecida que foiexclusivamente para o Tribunal de Contas da União.

33. O fato, porém, é que, segundo entendimento pacífico de doutrina e dejurisprudência, capitaneada essa por sucessivos julgados do Supremo TribunalFederal, o modelo federal de Corte de Contas, por força do princípio expresso no art.13, IV, da Constituição, é obrigatório F ara a fiscalização financeira e orçamentáriaem todos os graus de nossa federação. Havendo, em qualquer das esferas deorganização estatal, um Tribunal de Contas, esse deverá moldar-se pelo padrãofederal.

34. A pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, sobre o tema,consolidou-se em reiteradas decisões, como as tomadas nas Representações n°s753, 755, 758, 764 e 886. Sua essência foi bem sintetizada no Parecer que oProcurador-Geral da República emitiu no RE n° 78.568-AM

"Se o Estado-membro decide, à luz de seus próprios critérios einteresses, instituem um Tribunal de Contas para auxiliar o Legislativo nafiscalização financeira e orçamentária, deverá seguir, nas suas linhasfundamentais, o modelo federal." (RTJ.73, pág. 560. )

35. Decorre daí o inevitável corolário de que as decisões prolatadas pelosTribunais de Contas brasileiros são ontologicamente idênticas, independentementedo nível federativo a que pertença o Tribunal que as proferiu. Ora, sendo decisõesde igual natureza, emanadas de órgãos compulsoriamente instituídos segundomodelo único, diversos não poderiam ser os efeitos delas decorrentes.

36. Conjugando-se as duas premissas - a de que a Lei n° 6.822/80 estatuiuregras de direito processual e a de que a eficácia das decisões dos Tribunais deContas locais não pode diferir da eficácia das decisões de seu protótipo federal -apresenta-se inevitável a conclusão de que a Lei nº 6.822/80 confere o caráter detítulo executivo extrajudicial às decisões dos Tribunais de Contas que julguem emdébito responsáveis -sejam eles da Administração Direta, da Administração Indireta,de Fundações instituídas ou mantidas pela União, pelos Estados ou pelo DistritoFederal ou por Municípios que possuam Tribunal de Contas, ou sejam ainda osmencionados nos arts. 31, X, e 43 do Decreto-lei nº 199/67 ou no art. 183 doDecreto-lei n° 200/67.

CONCLUSÃO

37. A despeito de tão definida, na doutrina, na jurisprudência e, principalmente,no direito positivo pátrio, a questão do valor jurídico das decisões do Tribunal de

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Contas que julgam responsáveis em alcance perante os cofres, seja da FazendaPública, seja das entidades de gestão descentralizada, - o velho e generalizadodesconhecimento de que são alvo, entre nós, as matérias pertinentes a essainstituição continua a dar azo ainda, no âmbito do judiciário e, o que é pior, no daprópria Administração, a entendimentos de todo divorciados da realidade jurídica,como o expresso na sentença de que se dá notícia, nestes autos, de pronto acatado,como estreme de dúvidas, pelo próprio órgão jurídico da entidade interessada.

38. Creio, assim, imperioso e urgente que este Tribunal, formalmente, fixe claraorientação sobre o assunto, a ser transmitida, com os subsídios coligidos nestarepresentação, aos órgãos próprios da Administração Direta do Distrito Federal, bemcomo às autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundaçõesvinculadas ao Governo local e sujeitas à fiscalização desta Corte de Contas.

39. Requeiro, pois, que o Egrégio Plenário aprove a seguinte decisão quedeverá nortear a cobrança executiva de débitos fixados definitivamente por esteTribunal:

"Ao teor do art. 39, § 2°, da Lei n° 4.320, de 17 de março de 1964, bemcomo dos arts. 1° e 29 da Lei n° 6.822, de 22 de setembro de 1980, emcombinação com o princípio do art. 13, IV, da Constituição federal - asdecisões do Tribunal de Contas do Distrito Federal que julguem em alcancetodo e qualquer responsável, desde que juridicamente subordinado àfiscalização financeira e. orçamentária de sua privativa competência, valemcomo título executivo extrajudicial, tornando a dívida líquida e certa, de modoque, independentemente de outras formalidades, se impõe a promoção dacobrança executiva do débito na forma do art. 48, III, da Lei n° 5.538, de 22 denovembro de 1968.

Após fixadas em decisão definitiva deste Tribunal de Contas, tambémsão objeto da cobrança executiva prevista no art. 1° da Lei n° 6.822/80 asmultas impostas com fundamento no art. 51 e parágrafo único da citada Lei n°5.538/68."

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PENSOES MILITARES DO DISTRITO FEDERAL

ELVIA LORDELLO CASTELLO BRANCO

1. Aplicação da Lei n° 3.765, de 4 de maio de 1960 e doDecreto nº 49.096, de 10 de outubro de 1960, que aregulamenta com as modificações posteriores.

2. Dessemelhanças entre as pensões militares e aspensões civis especiais.

3. Os beneficiários de uma ordem preterem sempre osdas ordens seguintes.

4. Existência de beneficiários obrigatórios e facultativos.

5. Contribuição, nos casos especificados em lei, parapensão correspondente a um ou dois postos ou graduaçõesacima da dos contribuintes.

6. Desnecessidade de ato formalizado em decreto ouportaria para concessão da pensão.

7. Observância provisória das normas do TCU.8. Correto o valor da pensão.

9. Legalidade da pensão.

PARECER

I - CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

Acolhendo parecer deste Ministério Público, no Processo nº 125/79, decidiu oTribunal, entre outras questões, que:

a) é de sua competência o julgamento das pensões militares instituídas pelosintegrantes do Corpo de Bombeiros e da Política Militar do Distrito Federal,concedidas a partir de 1968;

b) o regime jurídico dessas pensões foi, até o surgimento das Leis n° 6.022 e6.023, ambas de 3 de janeiro de 1974, o mesmo das pensões do pessoal dasForças Armadas, cujo diploma básico é a Lei n° 3.765, de 4 de maio de 1960,regulamentada pelo Decreto nº 49.096, de 10 de outubro de 1960;

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c) na instrução dos processos de pensão militar deverão ser observadas asalterações dos diplomas acima referidos, bem como, em princípio, a jurisprudênciafirmada pelo Tribunal de Contas da União;

d) mesmo sob o regime das Leis n°s 6.022 e 6.023, de 3-1-74, já citadas, háque buscar subsídios na legislação federal análoga, já que aqueles diplomas contêmescassas disposições sobre o tema: e

e) o direito à pensão nasce na data do óbito e se governa pelas leis então emvigor.

2. Sobre esses pontos preliminares, nada mais há a decidir.

3. O que ora exige exame mais detido é a correta interpretação da Lei n°3.765/60 e do decreto que a regulamenta, visto que as pensões militares diferem emmuito das civis. Apesar de instituídas há quase dois séculos, ainda hoje não sechegou a conclusão segura sobre a natureza jurídica desse instituto de proteção àfamília dos militares ou a pessoas que eles tenham decidido designar comodestinatários dessa proteção. Estão magnificamente expostas todas ascaracterísticas, peculiaridades da matéria, e as doutrinas a ela pertinentes, naexcelente obra do Professor J. E. Abreu de Oliveira, "Pensões Militares" (Forense,1960 ), a qual não pode ser descurada por quem quer que enfrente o assunto.Vê-se, ali, que as pensões militares são, já por expressões legais, jádoutrinariamente, tratadas como herança militar, como indenização, como seguro,como pensão alimentar. Mas, se encarada como herança militar -conceito por certomais corrente, tanto que é comum nos arestos dos Tribunais falar-se em abertura dasucessão e em herdeiros - a ordem e a qualidade destes diferem das do CódigoCivil.

4. Ilustrativo é o cotejo entre o disposto na lei civil e na Lei n° 3.765/60. Mandao Código, no art. 1.603, deferir a sucessão legítima na seguinte ordem:

I - Aos descendentes

II - Aos ascendentes

III - Ao cônjuge sobrevivente

IV - Aos colaterais

V - Aos Estados, ao Distrito Federal ou à União.

5. Já a Lei n° 3.765/60 estabelece no art. 79:

"A pensão militar defere-se na seguinte ordem:

I - à viúva;

II - aos filhos de qualquer condição, exclusive os maiores do sexomasculino, que não sejam interditos ou inválidos;

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III - aos netos, órfãos de pai e mãe, nas condições estipuladas para osfilhos;

IV - à mãe ainda que adotiva, viúva, solteira ou desquitada, e ao pai,ainda que adotivo, inválido ou interdito; (Redação da Lei n° 4.958, de 27-4-66.)

V - às irmãs germanas e consangüíneas, solteiras, viúvas, desquitadas,bem como aos irmãos menores mantidos pelo contribuinte, ou maioresinterditos ou inválidos;

VI - ao beneficiário instituído, desde que viva na dependência do militar enão seja do sexo masculino e maior de 21 anos, salvo se for interdito ouinválido permanentemente."

6. Salta aos olhos, desde logo que pelo Código Civil o cônjuge sobreviventeocupa o terceiro lugar na ordem de sucessão, enquanto que, no estatuto militar, aviúva pretere, em regra sozinha, todo e qualquer outro beneficiário do falecido.

7 . Não é, entretanto, minha intenção criticar, discutir ou tratar doutrinariamentea matéria, e sim, destacar nas leis e regulamentos que a disciplinam os pontos emque se extremam as pensões militares das civis especiais, com o escopo de orientara instrução dos processos nesta Corte, abrangendo o período que vai de 1968 até3-1-74.

II - LEI N° 3.765/60, E SUAS ALTERAÇÕES

1. Dos Contribuintes e das Contribuições

8. Nessa linha de ação, cumpre, de pronto, destacar duas categorias decontribuintes: os obrigatórios (art. 1° e §§) e os facultativos, assim tratados no art. 2°e §§:

"Os oficiais demitidos a pedido e as praças licenciadas ou excluídaspoderão continuar como contribuintes da pensão militar, desde que orequeiram e se obriguem ao pagamento da respectiva contribuição, a partir dadata em que forem demitidos, licenciados ou excluídos.

§ 1° O direito de requerer e de contribuir para a pensão militar, na formadeste artigo, pode ser exercido também por qualquer beneficiário da pensão.

§ 2° A faculdade prevista neste artigo somente pode ser exercida noprazo de um ano, contado da data da publicação do ato da demissão,licenciamento ou exclusão.

§ 3° Os contribuintes de que trata este artigo, quando convocados oumobilizados, passarão à categoria de obrigatórios, durante o tempo em queservirem."

9. Não há, nas pensões civis, dispositivos de idêntico teor. É curioso que no §1° se dá verdadeira substituição do contribuinte: já não o militar, mas aquele que sepode beneficiar da pensão. Ao mesmo tempo, a qualidade de contribuinte obrigatóriopode ser provisoriamente retomada. O valor da contribuição apresenta tambémcaráter diverso. Na previdência civil de estatutários, a contribuição recai sempresobre o salário-base ou a remuneração do servidor; nunca, sobre o saláriocorrespondente a cargo que não seja o seu.

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10. O valor das contribuições tem sofrido várias modificações. De acordo com oart. 3° e seus §§, a contribuição para a pensão militar era igual a um dia devencimento (soldo e gratificação) do contribuinte, arredondada em cruzeiros para aimportância imediatamente superior, qualquer que fosse a fração de centavos; acontribuição, tanto obrigatória quanto facultativa, na inatividade, era igual à do militarda ativa, com o mesmo posto ou graduação; se o militar contribuísse para a pensãode posto ou graduação superior, a contribuição seria iguala um dia dos vencimentosdesse posto ou graduação; os oficiais graduados no posto imediato contribuíam paraa pensão militar como se efetivos fossem, no posto ou graduação; o oficial queatingisse o número um da respectiva escala, contribuía para a pensão militar doposto imediato (art. 3° e §§ 1°, 2°, 3° e 4° da Lei).

11. A Lei n° 4.328, de 30 de abril de 1964, pelo art. 187, alterou o art. 3°, § 2°,da Lei n° 3.765/60, para determinar que as contribuições para a pensão militarseriam iguais a um dia e meio de soldo, com o mesmo arredondamento.

12. A base da contribuição deixou assim de ser o vencimento, consideradocomo soldo mais gratificação, para ser apenas o soldo.

13. Nova modificação foi introduzida ela Lei n° 5.475, de 23 de julho de 1968,passando o art. 3° e § 2° (a Lei n° 3.765/60), a ter a seguinte redação:

"Art. 3° A contribuição para a pensão militar será igual a 3 (três) dias dosoldo do contribuinte, arredondada em centavos para as importânciasimediatamente superiores. (Grifei.)

§ 2° Se o militar contribuir para a pensão do posto ou graduaçãosuperior, a contribuição será igual a 3 ( três ) dias do soldo desse posto ougraduação."

14. Durou pouco, porém, a alteração da Lei n° 5.475/68. Em 4 dedezembro do mesmo ano veio a lume a Lei n° 5.552, que entrou em vigor em1° de janeiro de 1969 ( art. 13 ) e estabeleceu:

"Art. 9° As contribuições para a Pensão Militar, de que tratam o art. 3° eseu § 2° da Lei n° 3.765, de 4 de maio de 1960, alterada pela de n° 5.475, de23 de julho de 1968, serão iguais a 2 (dois) dias de soldo, arredondadas emcentavos para as importâncias imediatamente superiores.

Parágrafo único. A quantia referente à contribuição para a pensão militar,na inatividade, será igual à do militar da ativa, com o mesmo posto ougraduação."

15.O Decreto-lei n° 1.081, de 2 de fevereiro de 1970, tratou exclusivamente docálculo das pensões militares:

"Art. 1° A fixação do valor de todas as pensões militares será feita naforma da Lei n° 3.765, de 4 de maio de 1960, combinada com o art. 9° da Lein° 5.552, de 4 de dezembro de 1968.

Art. 3° Este Decreto-lei produzirá efeitos a contar de 1° de fevereiro de1970, revogadas as disposições em contrário."

16.Cumpre acentuar que as alterações do art. 3° da Lei n° 3.765/60 visaramexclusivamente modificar o quantum da contribuição, e, nunca, suas peculiaridades,tratadas nos parágrafos dos artigos.

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17. Alteração importante foi introduzida pelo Decreto-lei nº 1.449, de 13 defevereiro de 1976, de que não se tratará nesta oportunidade.

2. Dos beneficiários e sua habilitação

18. As pensões militares distinguem, como as civis, várias ordens debeneficiários, mas os de uma ordem preterem os das ordens seguintes, comoadiante se verá. Pelo art. 7° da Lei n° 3.765/60, a pensão militar é deferida:

I - à viúva;

II - aos filhos de qualquer condição, exclusive os maiores do sexo masculino,que não sejam interditos ou inválidos;

III - aos netos, órfãos de pai e mãe, nas condições estipuladas para os filhos;

IV - à mãe, ainda que adotiva, viúva, solteira ou desquitada, e ao pai, ainda queadotivo, inválido ou interdito; (Redação da Lei n° 4.958, de 27-4-66 ).

V - às irmãs germanas e consangüíneas, solteiras, viúvas ou desquitadas, bemcomo aos irmãos menores mantidos pelo contribuinte, ou maiores interditos ouinválidos;

VI - ao beneficiário instituído, desde que viva na dependência do militar e nãoseja do sexo masculino e maior de 21 (vinte e um) anos, salvo se for interdito ouinválido permanentemente.]

19. A Lei n° 5.774, de 23 de dezembro de 1971, pelo art. 77, alterou os itens IVa VI, que passaram a ter a seguinte redação:

"Art. 77. A pensão militar defere-se nas prioridades e condiçõesestabelecidas a seguir e de acordo com as demais disposições da Lei dePensões Militares:

d) à mãe, ainda que adotiva, viúva, desquitada ou solteira, como tambémà casada sem meios de subsistência, que viva na dependência econômica domilitar, desde que comprovadamente s e arada do marido, e ao pai, ainda queadotivo, desde que inválido ou interdito ou maior de 60 (sessenta) anos;

e) às irmãs, germanas ou consangüíneas, solteiras, viúvas oudesquitadas, bem como aos irmãos, germanos ou consangüíneos menores de21 (vinte e um) anos mantidos pelo contribuinte, ou maiores interditos ouinválidos; e

f) ao beneficiário instituído que, se do sexo masculino, só poderá sermenor de 21 (vinte e um) anos ou maior de 60 (sessenta) anos, interdito ouinválido e, se do sexo feminino, solteira."

E inovou, ao estabelecer:

"Art. 78. O militar viúvo, desquitado ou solteiro poderá destinar a pensãomilitar, se não tiver filhos capazes de receber o benefício, à pessoa que vivasob sua dependência econômica no mínimo há 5 (cinco) anos e desde quehaja subsistido impedimento legal -para o casamento.

§ 1º Se o militar tiver filhos, somente poderá destinar à referidabeneficiária metade da pensão militar.

§ 2° O militar que for desquitado somente poderá valer-se do dispostoneste artigo se não estiver compelido judicialmente a alimentar a ex-esposa."

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20. O beneficiário será habilitado à pensão integral, salvo se houver mais deum com a mesma precedência, quando a pensão será igualmente repartida entreeles (art. 9º e § 1° ). Assim, enquanto houver viúva pensionável, a ela caberáintegralmente o benefício, excluídos todos os demais beneficiários.

21. As exceções a essa regra estão previstas nos §§ 2° e 39 do mesmo art. 99,que estipula:

".....................................................................................................................................

§ 2º Quando o contribuinte, além da viúva, deixar filhos do matrimônioanterior ou de outro leito, metade da pensão respectiva pertencerá à viúva,sendo a outra metade distribuída igualmente entre os filhos habilitados naconformidade desta lei.

§ 3° Se houver, também, filhos do contribuinte com a viúva ou fora domatrimônio, reconhecidos estes na forma da Lei n° 883, de 21 de outubro de1949, metade da pensão será dividida entre todos os filhos, adicionando-se àmetade da viúva as cotas-partes dos seus filhos."

22. Daí que os filhos do casal nunca se habilitam durante a vida da mãe,exceto se ela não tiver direito à pensão, nos termos do § 1° do art. 79, ou se perderesse direito em virtude de comprovação, em processo judicial, de má-conduta ouperda do pátrio poder (art. 23, I) .

23. O Tribunal de Contas da União tem decidido em favor da partilha dapensão entre mãe e filhos no caso de companheira (Processos TC nºs 13.855/67 e5.960/73). Ainda, segundo decisões do TCU, divide-se a pensão, na mesma ordemou precedência, quando o militar deixar duas viúvas, comprovado que seja,exaustivamente, na esfera administrativa, a putatividade do casamento. Havendoduas viúvas e filhos, a cada uma caberá 1/4 (um quarto) da pensão e 2/4 (doisquartos) aos filhos do militar.

24. As regras sobre a destinação das pensões militares determinam também aemissão de um ou mais títulos de pensão. Assim, em não havendo mais de umbeneficiário com igual precedência, emitir-se-á um único título. Quando, porexemplo, a viúva tenha precedência, mesmo que haja prova no processo daexistência de filhos menores ou inválidos, seus e do militar, haverá um só título. Se apensão foi dividida entre duas viúvas, um título para cada uma; se entre uma viúva,filhos desta com o militar e filhos só deste, um titulo para a viúva e seus filhos eoutros para os demais filhos habilitados.

3. Da Declaração de Beneficiários

25. A lei fez obrigatória para o contribuinte a declaração dos seus beneficiários,estabelecendo que, até prova em contrário, prevalecerá ela para a qualificação dosmesmos à pensão militar e chega a punir com suspensão de pagamento ouprovento o contribuinte que não a apresentar (art. 11 e § ).

26. Apesar do rigor da exigência há de admitir-se possa, eventualmente,candidatar-se ao benefício parente não expressamente mencionado pelocontribuinte.

4. Das Pensões e seu Valor

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27. A pensão militar corresponde, normalmente, a 20 (vinte) vezes o valor dacontribuição. Quando se fizer prova de que o contribuinte tenha falecido emconseqüência de acidente ocorrido em serviço ou de moléstia nele adquirida, apensão será igual a 25 (vinte e cinco) vezes a contribuição. Passará a 30 (trinta)vezes a contribuição se a morte decorrer deferimento recebido, de acidente ocorridoou moléstia adquirida em operações de guerra, na defesa ou na manutenção daordem interna (art. 15 e §§ da Lei n° 3.765/60).

28. Anoto, desde já, que o artigo 11 do Decreto n° 49.096/60 foi revogado peloDecreto n° 57.579, de 4 de janeiro de 1966.

29. Outros aspectos bem específicos das pensões militares são os referidosnos arts. 17 a 22, e nesses casos o valor da pensão tem balizamento diferenciado.

30. A pensão resultante de promoção post mortem, referida no artigo 21, foiregulamentada pelo Decreto n° 52.737, de 23 de outubro de 1963; e o Decreto-lei nº197, de 24 de fevereiro de 1967, deu nova redação aos arts. 21 e 22 da Lei nº3.765/60. Outra alteração ao art. 22 foi introduzida pelo Decreto n° 79.917, de 8 dejulho de 1977.

31. É importante ter sempre em conta toda e qualquer alteração da Lei n°3.765/60, e do seu regulamento, pois as pensões militares regem-se pelas normasatuantes na data do óbito.

5. Da Perda e da Reversão da Pensão Militar

32. A matéria é tratada nos arts. 23 e 24 e contém disposição esdrúxula eaberrante: a que determina a perda da pensão pela viúva cuja má conduta forapurada em processo judicial. Perdem ainda o direito à pensão a viúva destituída dopátrio poder, o beneficiário do sexo masculino válido e capaz quando atingir amaioridade e o beneficiário condenado por crime delituoso do qual resulte a mortedo contribuinte, além do beneficiário que renuncie expressamente ao seu direito.

33. Importante, nesse tópico é assinalar a existência de duas modalidades dapassagem do benefício de um para outro ou outros titulares. Dando-se passagempara beneficiário da mesma ordem, chama-lhe a lei transferência. Se passa parabeneficiário da ordem seguinte, caracteriza-se a reversão.

6. Das Disposições Transitórias

34. Por seu próprio caráter, essas normas dispensam maiores comentários.Vêm nos arts. 23 a 35 da lei e só esporadicamente interessarão ao controle externo.

III - DECRETO N° 46.096/60 E SUAS ALTERAÇÕES

1. Considerações Gerais

35. O Decreto em referência regulamentou, minudentemente, todas asdisposições da Lei n° 3.765/60, começando por definir, no art. 1°, a pensão militarcomo "o benefício criado pela Lei n° 3.765, de 4 de maio de 1960, em favor dosbeneficiários que ela especifica". Trata dos contribuintes, das contribuições, dosbeneficiários, da declaração dos beneficiários, do pagamento da pensão e dalegalidade da concessão e cuida ainda de outros assuntos pertinentes ao instituto,não contemplados na lei.

36. Desse Decreto merecem especial atenção as disposições dos artigos 6°, 7ºe seus §§, que tratam das pensões resultantes das promoções post mortem,

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ressalvado, desde já, que o art. 89 foi revogado pelo Decreto nº 644, de 2 de marçode 1962. Revogado foi também o art. 11, pelo Decreto n° 57.579/66.

2. Competência para Conceder o Benefício e Emitir o Título de Pensão

37. Matéria tratada exclusivamente pelo decreto é a da competência para aconcessão do benefício e para a emissão do título de pensão. Diz o § 1° do art. 36:

".....................................................................................................................................

§ 1º São competentes para conceder pensão militar, transferência dedireito, reversão, melhoria, atualização de tabela e aumento, as seguintesautoridades:

d) no Ministério da Justiça e Negócios Interiores, os Diretores deIntendência da Polícia Militar A de Contabilidade do Corpo de Bombeiros, paraa s concessões de caráter provisório, e o Diretor-Geral do Departamento deAdministração, no referente às concessões definitivas (Redação do Decreto n°1.501, de 9-11-62) ".

38. O título de pensão, segundo a alínea d do § 1º do art. 51 do decreto,também com a redação do Decreto n° 1.501/62, é assinado, no Ministério da justiçae Negócios Interiores, pelo Diretor-Geral do Departamento de Administração.

39. Ora, da atenta leitura não só do regulamento consubstanciado no Decreton° 49.096/60, como da jurisdição do TCU e ainda das regras que aquela Corteobserva na instrução dos processos de pensão militar, deduzi que não há dois ato:;de concessão de pensão. Nem mesmo um ato formalizado em portaria ou decreto,como ocorre nas pensões civis.

Entendo que, requerida a pensão militar nos termos dos arts. 36 e seguintes doDecreto n° 49.096/60, e verificado, liminarmente, o direito dos beneficiários que sehabilitaram, a autoridade citada na primeira parte da alínea d do § 1° do art. 36,concederá a pensão por simples despacho no requerimento e determinará ainstrução do processo pelo órgão competente da organização a que pertencia ocontribuinte. Em seguida, autoriza-se a inclusão do beneficiário na folha depagamento da Pensão Provisória. O passo posterior é a emissão do título dePensão Militar, segundo modelo instituído pelo Decreto. Esse título é que deve serassinado pelo Diretor-Geral do Departamento de Administração, ou autoridade a elecorrespondente na Polícia Militar e no Corpo de Bombeiros. Só então vai o processoa exame e julgamento do Tribunal de Contas (arts. 51 e 54, b). Até o julgamentopelo Tribunal, os pagamentos efetuados aos beneficiários terão caráter provisório(art. 54, § 5° ). Julgada legal a concessão, "os beneficiários poderão consignar emfolha de pagamento" (art. 55, parágrafo único). Os títulos serão, ainda, registradosem livro próprio, com as indicações previstas no art. 52, entre as quais a data doregistro da concessão pelo Tribunal de Contas.

40. As apostilas, quando as houver, serão lavradas em folhas aditivas (art. 53).Atualmente, tem competência para expedir o título de pensão especial, no Corpo deBombeiros, o Diretor de Pessoal e na Polícia Militar, a autoridade equivalente.

IV - CONCLUSÕES

41. Bem acertada andou esta Corte de Contas ao decidir que, no julgamentodas pensões militares do pessoal da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros do

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Distrito Federal, até que editada lei própria para essas corporações, devem seradotadas não só a legislação federal como a jurisprudência do Tribunal de Contasda União. Entendo que - no exame dos processos dessas concessões, sejamoriginais ou decorram de transferência ou reversão - cumpre observar também,guardadas as peculiaridades locais, as instruções seguidas naquela Corte.

42. Entendo, mas tendo em vista a urgência com que tais processos devem serjulgados, que a Inspetoria deva orientar o seu exame no sentido de apurar se oprocesso contém os elementos de certeza indispensáveis ao ajuizamento dalegalidade da concessão, deixando de lado diligências que não sejamabsolutamente essenciais, sobretudo nos processos que estão vindo já muito tardeao julgamento desta Corte.

43. A adoção das instruções do Tribunal de Contas da União se fazem tão maisnecessárias quanto o Ato Regimental n° 9/80 é omisso a respeito das pensõesmilitares, omissão que será, por certo, em breve sanada.

V - EXAME DO PRESENTE PROCESSO

44. Trata-se da pensão concedida a Nadir Duarte Martins, viúva doTenente-Coronel Álvaro Corrêa Martins, falecido em 21-3-70, em virtude de infamoagudo do miocárdio e acidente vascular cerebral, conforme atestado de óbito à fl. 2.

45. Constam do processo o requerimento da viúva, a certidão de casamento, acertidão do posto em que foi reformado o militar, a declaração de beneficiários,prova a que se refere o art. 38, 1, e, do Decreto n° 49.096/60, combinado com o art.29 da Lei n° 3.765/60 (fl. 11), a certidão de haver o militar pago mais de 24contribuições para a pensão relativa a General-de-Brigada, a Carta Patente doex-militar com as apostilas adequadas, a instrução com os dados relativos aocontribuinte (fl. 15 ), informação da Diretoria de Contabilidade sobre o valor dacontribuição, a não existência de dívida a ser saldada e o valor da pensão, e aautorização para inclusão da viúva na folha de pagamento de Pensão MilitarProvisória (fl. 16).

46. A pedido do Tribunal foi .expedido o título de Pensão Militar, segundo omodelo aprovado pelo Decreto n° 49.096/60 (fl. 51), e fotocópia do Boletim n° 63,que deu publicidade ao deferimento do pedido da viúva para que lhe fosse passadacertidão do que constasse dos assentamentos do militar, a fim de instruir anecessária documentação para percepção da respectiva pensão (fl. 53 ).

47. O processo, a meu ver, contém todos os elementos exigidos pelos arts. 36e 38 do Decreto n° 49.096/60. É verdade que as instruções do TCU exigem que oprocesso de concessão venha acompanhado pelo de reforma. Nem a Lei n°3.765/60 nem seu regulamento fazem tal exigência, razão por que a considerodispensável.

48. Verifico que a pensão inicial no valor de Cr$ 1.852,00 (um mil, oitocentos ecinqüenta e dois cruzeiros), foi fixada de acordo com os arts. 6° e 15 da Lei n°3.765/60.

49. Por todo o exposto, sou de parecer que o Tribunal dê pela legalidade daconcessão em tela.

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PENSÃO ESPECIAL

1. Pensão especial instituída pela Lei n° 6.782, de 19 de maio de 80.

2. Atestação de óbito em virtude de doença especificada em lei.

3. Em face da obscuridade da Lei quanto à data de inicio do benefício equanto à obrigação do empregador no período em que a instituiçãoprevidenciária nada paga à família do de cujus, é válida a interpretaçãoconsubstanciada na Súmula n° 40 do TCU, infracitada.

4. Legalidade da concessão.

5. Diligência para aprimoramento, a posteriori, dos procedimentosadministrativos adotados visando a redução de custo e maior eficácia docontrole interno e externo.

ELVIA LORDELLO CASTELLO BRANCO

PARECER

Cuida o processo da concessão de pensão especial à família de ex-servidor doGDF falecido em 3 de abril de 1982, em virtude de cardiopatia grave, conformeatestação médica à fl. 11v.

2. Concedeu-a o decreto à fl. 13, a partir da data do óbito, nos termos do art. 19da Lei n° 6.782/80. Emitido o título de pensão à fl. 23, veio o processo ao Tribunal,que determinou diligência nos termos de fl. 26.

3. Cumpriu-se a diligência nos termos em que foi solicitada, com a emissão dedois outros títulos, um referente à pensão integralmente paga pelo GDF, fl. 30, eoutro da parcela que lhe cabe pagar em complemento da pensão previdenciária, efoi ainda retificado o decreto concessório para inclusão da vantagem prevista no art.5º do Decreto-lei n° 1.776/80, c/c o art. 19 da Lei nº 1.050/50.

4. Examino a legalidade do pagamento da pensão, no valor integral, pelo GDF,no período de 3 de abril até, presumivelmente, 30 desse mês.

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5. A Lei nº 6.782/80 que equipara ao acidente em serviço a doençaespecificada em lei para efeito de pensão especial, não tem regulamentação própria.

6. O art. 242 da Lei n° 1.711/52 e os decretos que o regulamentaram, primeiroo de nº 36.995/55 e atualmente o de nº 76.954, de 30 de dezembro de 1975, sãoomissos quanto à data de início do benefício. O último diploma, entretanto,estabelece, no art. 29, que:

"O valor da pensão especial será igual a do vencimento do cargo ocupado pelofuncionário no dia do evento, deduzida a pensão previdenciária."

7. já a Lei n° 3.373, de 12 de março de 1958, que dispõe sobre o Plano deAssistência ao Funcionalismo e sua família, a que se referem os arts. 161 e 256, daLei n° 1.711/52 - na parte referente à previdência, diz, no § 1º do art. 3°, que opecúlio especial será calculado de acordo com o art. 5º do Decreto-lei nº 3.347, de12 de junho de 1941, que institui o regime de benefícios de famílias de segurados doIPASE. Ora, o § 4º desse artigo diz que "a pensão será irreversível e o seupagamento será devido a partir do mês seguinte ao da morte do segurado, até,inclusive, aquele em que o beneficiário completar 21 anos ou falecer".

8. Interpretação literal do art. 2º do Decreto n° 76.954, de 30 de dezembro de1975, que define o valor da pensão, combinado com o § 4º do art. 5º do Decreto-leinº 3.347/41, leva à conclusão lógica de que ao órgão empregador só caberá acomplementação do que for pago pela Instituição Previdenciária.

9. Não foi esse, entretanto, o critério que vingou no Tribunal de Contas daUnião que editou, ao tempo do Decreto nº 36.899/52, a Súmula nº 40, desse teor:

"O pagamento da pensão especial à família do servidor falecido emdecorrência de acidente no desempenho de suas funções, devido a partir dadata do óbito, correrá, no primeiro mês, à conta do Tesouro Nacional, e, nosmeses subseqüentes, parte pelo Tesouro Nacional e parte pela Instituição dePrevidência Social."

10. Terá a Corte considerado, para assim decidir, a efetivação do benefícioainda que a Instituição Previdenciária, com base no já citado Decreto-lei n° 3.347/41,nada pagasse á família do extinto.

11. A Súmula continua em vigor, como se pode ver no Anexo III da Ata n°93/82, publicada no DO de 11 de janeiro de 1983, Seção I, pág. 641, que trata deconcessão de pensão com base na Lei n° 6.782/80.

12. Em face da obscuridade, seja do art. 242 do Estatuto, seja dos decretosque o regulamentaram, não só quanto à data de início do benefício, mas tambémquanto ao lapso de tempo em que a Instituição de Previdência nada paga a famíliado de cujus, endosso o entendimento do TCU.

13. Anoto que situação idêntica à examinada só se concretiza nos casos deóbitos ocorridos a partir de abril de 1980, porque a Lei nº 6.782, de 1980, é de 11 demaio daquele ano. Nos casos de óbitos ocorridos até 31 de março de 1980, aoDistrito Federal tem cabido, apenas, a complementação da pensão previdenciária.

14. O caminho que a Inspetoria sugeriu à Administração para este e casosanálogos foi a elaboração de dois títulos de pensão: um para o pagamento daparcela inteiramente a cargo do GDF e outro para a parcela complementar. Amedida é muito antieconômica. Duplicam-se o material gasto e a mão-de-obra. Teria

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sido preferível determinar fosse apostilado o título já emitido, de modo a deixar bemclaro o compromisso da Administração e o direito dos beneficiários e recomendar aelaboração de modelo mais flexível, do qual conste a parcela inicial e a definitiva daspensões concedidas. Além do mais, a existência de 2 (dois) títulos igualmenteválidos poderá dar lugar a fraudes, pois, no título do pagamento integral pelo GDFconsta apenas a data do início da obrigação.

15. Isto posto, e considerando ainda a economia de meios, proponho que oTribunal:

a) de pela legalidade da pensão concedida, nos termos dos títulos às fls. 30 e32;

b) determine se faça, a posteriori, apostila no título à fl. 30, para que fique certoque o pagamento ali consignado vai somente a 30 de abril de 1982;

c) determine seja tornado sem efeito o titulo à fl. 23, devendo a Administraçãooficiar ao Tribunal, em 30 dias, sobre a efetivação dessas duas medidas;

d) determine, para casos futuros a elaboração de um único título que abranja apensão paga integralmente, com especificação da data de início e fim do benefício,e a da pensão complementar.

16. É o meu parecer.____________Processo nº 2.554/ 82 - 19-1-83.

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REVISÃO DE PROVENTOS

1. Revisão de proventos de servidor aposentado com base na L.C. nº 30/77,para conferir-lhe gratificação por operações especiais.

2. A revisão de proventos autorizada pela L.C. no 36/79 há de ser feita deacordo com a Lei nº 6.778/80, à exceção dos efeitos financeiros, que são devidos apartir de 1º de dezembro de 79 ou do primeiro dia do mês subseqüente ao dapublicação do ato de aposentadoria.

3. Ilegalidade de ato de revisão de proventos que mandou incluir entre osdispositivos legais que fundamentaram a aposentadoria decretada em junho de 78artigos do Decreto-lei nº 1.727/79.

4. Inspeção in loco para o fim indicado neste parecer.

Elvia Lordello Castello Branco

PARECER

Escrivão da Polícia aposentado em 8 de junho de 1978, com base na L.C. n.30/77, requereu a inclusão nos seus proventos da Gratificação por OperaçõesEspeciais, criada pelo Decreto-lei nº 1.727, de 10 de dezembro de 1979.

2. O processo foi instruído na Coordenação do Sistema de Pessoal como se ainativação tivesse decorrido de doença especificada em lei (fls. 32 e 33), e oGovernador baixou o decreto visto por cópia. à fl. 38, pelo qual resolve rever osproventos da aposentadoria do interessado "para incluir nos dispositivos legais quefundamentaram a sua aposentadoria os artigos 2º e 3°, do Decreto-lei nº 1.727, de10 de dezembro de 1979".

3. Nesta Corte a Divisão de Controle de Concessões propôs a devolução doprocesso à SEA para que:

"1) anule o decreto de fl. 38, por ser considerado ineficaz; e

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2) em conformidade com o Decreto-lei n° 1.727/79, art. 3º, faça um novo atorevisório e, conseqüentemente, corrija o provento revisto de fl. 34, tomando por baseos vencimentos do interessado em 10-12-79 (Decreto-lei nº 1.727/79)."

4. A revisão de proventos a que tem direito o interessado decorre do art. 2°, daL. C. n° 36, de 31 de outubro de 1979, que dispõe:

"Os funcionários aposentados na forma da L. C. nº 29, de 5 de julho de1976, ou nos termos desta Lei, farão jus à revisão dos respectivos proventoscom base no Plano de Classificação de Cargos de que trata a Lei nº 5.645, de10 de dezembro de 1970, observadas as mesmas normas que disciplinam oassunto em relação aos servidores inativados sem as vantagens do citadoPlano e respeitada, em cada caso, a proporcionalidade de proventos.

Parágrafo único. A revisão de proventos de que trata este artigo,relativamente aos funcionários aposentados na forma da L.C. nº 29, de 5 dejulho de 1976, produzirá efeitos financeiros a partir do início da vigência destaLei, e nos demais casos, a contar do primeiro dia do mês subseqüente ao dapublicação do ato de aposentadoria."

5. O prazo da vigência da Lei é 1° de dezembro de 1979, pois foi publicada a 1°de novembro de 79, e republicada a 5 do mesmo mês e ano.

6. Indiscutível que é a incidência da L.C. nº 36/79 sobre os servidores doDistrito Federal, estão por ela abrangidos os que se aposentaram com base na L.C.n° 30/77 e ao Plano de Classificação de Cargos nela referido, corresponde, noâmbito local, a Lei nº 5.920, de 19 de setembro de 1973.

7. Ao ser editada a referida Lei Complementar que determinou se fizesse arevisão de proventos dos beneficiados pela aposentadoria especial observando-se"as mesmas normas que disciplinam o assunto em relação aos servidores inativadossem as vantagens do citado Plano e respeitada, em cada caso, a proporcionalidadede proventos", já estava em vigor a Lei n° 6.703, de 26 de outubro de 1979, queestendeu aos funcionários aposentados da Administração Direta e das AutarquiasFederais as vantagens financeiras do Plano de Classificação de Cargos, instituídopela Lei nº 5.645/70.

8. Estabeleceu o diploma todos os critérios a serem observados na revisão e,no artigo 4°, determinou:

"A revisão assegurada por esta Lei acarreta a supressão de todas asvantagens, gratificações, parcelas e quaisquer outras retribuições percebidaspelo inativo, ressalvados o salário-família e a gratificação adicional por tempode serviço."

9. O parágrafo único esclarece que a supressão não alcança as vantagens doart. 184 da Lei nº 1.711/52, asseguradas, na aposentadoria, aos funcionáriosamparados pelo art. 177, § 1°, da C . F . de 67, em sua redação originária,respeitado nos demais casos, o disposto no § 2º do art. 102 da Constituição, naredação da Emenda nº 1/69.

10. Trata o artigo 5" do reajuste dos proventos dos funcionários aposentadoscom as vantagens do art. 180 do Estatuto.

11. Pelo artigo 8º, os efeitos financeiros da revisão são devidos a partir de 1ºde janeiro de 1980.

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12. No plano local, dispôs sobre o assunto a Lei nº 6.778, de 12 de maio de1980, cujos princípios são idênticos aos da Lei nº 6.703/79, da qual não foramreproduzidos apenas os arts. 6º e 7º.

13. Não há, portanto, como deixar de aplicar, aos inativos pelas LeisComplementares n°s 30/77 e 36/79, o art. 4°, da Lei nº 6.778/80, e absurdo seriaconferir-lhes gratificação que tem como pressuposto o exercício efetivo de cargo denatureza policial.

14. Pelo exposto, sou de parecer que o Tribunal dê pela ilegalidade do ato à fl.38, e determine inspeção in loco para que se apure o modo pelo qual estão sendorevistos os proventos dos beneficiados pela L.C. nº 36/79 e pela Lei n° 6.778, de 12de maio de 80.

______________Processo nº 2.882/78 - 29-3-82.

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PENSÃO ESPECIAL FUNDADA EM ACIDENTE EMSERVIÇO

1. Acidente em serviço atípico: as circunstânciaspeculiares do caso concreto.

2. Auto-integração da norma jurídica. Recurso dointérprete à legislação homóloga, para a solução de hipótesenão prevista com exatidão no modelo legal.

3. Limitações das funções de controle quando daadoção, pela autoridade administrativa, de exegese razoávelda regra de direito.

4. O iníquo contexto jurídico em que se enquadram asconcessões de pensões especiais após a entrada em vigor daLei nº 6.782/80.

5. Caracterização do acidente em serviço. Legalidade doato concessivo da pensão especial em apreço.

LINCOLN TEIXEIRA MENDES PINTO DA LUZ

PARECER

I - INTRODUÇÃO DO TEMA

Trata-se da pensão especial concedida, com base no art. 242 do Estatuto, àfamília de Joaquim Henrique Cares, morto em acidente em serviço oficialmentereconhecido a fls. 47.

2. Já constava dos autos parecer deste Ministério Público, que, emboraprotestando por diligência preliminar, manifestara antecipadamente, no mérito, suaconcordância com a caracterização do evento como acidente em serviço e,implicitamente, com a legalidade da concessão.

3. Dispensável seria, pois, com rigor, a volta dos autos à Procuradoria, se oEgrégio Plenário, ou um de seus membros, deixasse de acatar as conclusõesdaquele pronunciamento.

4. Ainda assim, não me furtarei à emissão de novo parecer, até porque aexistência de opinião divergente, justifica, se estenda e aprofunde a análise dos

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autos, para que o Tribunal possa decidir com a exata visão das implicações epeculiaridades que o processo envolve.

II - O INUSITADO CASO EM DISCUSSÃO

5. Já frisara, no parecer anterior, o caráter atípico do acidente em serviço aquifocalizado. Tal atipicidade rende ensejo, obviamente, à possibilidade dacontrovérsia.

6. Não visa o Direito, todavia, a resolver apenas as hipóteses pontualmenteenquadradas no figurino legal. Pretende e precisa ir mais longe, dando solução atodos os casos que venham a emergir da realidade, em sua insuspeitável riqueza,por mais que, à primeira vista, pareçam aberrar do modelo esquemático traçado nalei.

7. As agudas objeções opostas no voto preliminar do ilustre Relatorcontraponho as seguintes circunstâncias, que, consideradas cada uma de per si,talvez não bastem para dar por caracterizado o acidente em serviço, mas que, emseu conjunto, me confirmam na persuasão de caie a função pública exercida peloservidor falecido foi, se não causa direta, concausa de importância, causaconcorrente necessária ao evento danoso que o vitimou:

a) Joaquim Henrique Cares, quando faleceu, servia à NOVACAP, da qual eramórgãos tanto a Divisão de Parques e jardins, do Departamento de Viação e Obras - acuja disposição se achava o funcionário -, quanto o Departamento de Águas eEsgotos - a que pertenciam o imóvel em que residia, o acampamento em remoção eo veículo oficial fornecido para a mudança;

b) o acidente. em que perderam a vida o servidor e pelo menos dois de seusfilhos, aconteceu em dia e horário normais de expediente;

c) havia comprovado interesse público na mudança e no transporte do servidore de sua família e, portanto, na breve viagem que o acabou vitimando;

d) na conformidade de depoimento prestado pelo mais qualificado superiordireto do funcionário morto, o Dr. Stenio de Araújo Bastos, então Engenheiro-Chefeda Divisão de Parques e jardins, recebera a vítima "autorização, dispensando-a desuas atividades funcionais, perra proceder à mudança de sua família e pertences";

e) importância nenhuma deve atribuir-se ao fato de serem distintos o órgão aque, no momento, prestava oficialmente serviços o funcionário falecido e o órgãointeressado na realização. da mudança e proprietário do acampamento. Não porquese enquadravam ambos na estrutura administrativa da NOVACAP, mas,exclusivamente, porque, mesmo na hipótese de tratar-se de órgãos absolutamentediversos, prevaleceria, no tocante ao acidente em serviço, o princípio da unidadesubstancial do serviço público.

III - RECURSO SUBSIDIÁRIO À LEGISLAÇÃO MILITAR

8. É sabido que o Direito positivo é um todo indiviso, orgânico e completo em simesmo, de sorte que, na presença de lacuna formal da norma jurídica, corre aointérprete o dever de buscar-lhe a auto-integração por meio da interpretaçãoextensiva ou da analogia, ou até, eventualmente, a hetero-integração, com o recursoa elementos externos ao sistema jurídico positivo, tais como as noções de eqüidadee justiça.

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9. Louvável, pois, haja a instrução lembrado regra expressa da legislaçãomilitar que, tendo por alvo hipótese simétrica à do caso em apreço, admite aexistência do acidente em serviço quando o falecimento de funcionário ocorra:

- no decurso de viagem em objeto de serviço autorizada por autoridadecompetente (alínea d do art. 1° do Dec. nº 57.272/65);

- no decurso de viagem imposta por motivo de movimentação efetuada nointeresse do serviço, ou mesmo a pedido do próprio servidor (alínea e do mesmodecreto);

- no deslocamento entre sua residência e o local em que sua missão deva terinício ou prosseguimento, desde que efetuado em veículo oficial para tal fimdestinado (alínea f ainda do mesmo decreto).

10. Sem dúvida tem a norma como destinatário natural o servidor militar, o queobsta sua direta aplicação ao caso em apreço, mas que -de forma alguma - impededele se utilize o intérprete para o preenchimento da lacuna específica na legislaçãovigente dos funcionários civis, tal como proposto na instrução.

IV - DUAS PRELIMINARES FUNDAMENTAIS

1) As questões a considerar

11. Há, por outro lado, ao menos duas preliminares que precisam, a meu ver,ser devidamente sopesadas pela Corte na eventualidade de pretender acompanharo voto do Relator. Trata-se de pontos cardeais de referência, o primeiro, genérico,atinente às funções de controle; o outro específico, peculiar ao tema das pensõesespeciais.

2) Limites naturais da função de controle

12. Importa, antes de tudo, ter presente que, ao contrário do que possaparecer, não compete ao Tribunal apurar se houve ou não o acidente em serviço.Essa tarefa já foi realizada pelo órgão próprio da Administração.

13. A esta Corte cabe, isso sim, apreciar se o ato do Governo tem ou nãofundamento jurídico, ou, reduzindo o ângulo de observação, se a Administração -frontalmente - contrariou o texto legal ao admitir ter havido o acidente em serviço.

14. E a diferença é em tudo e por tudo essencial!

15. A Administração, legal e primariamente investida da competência paraavaliar a existência e a caracterização do acidente, possui liberdadeconsideravelmente mais ampla para a interpretação das circunstâncias factuais ejurídicas do evento.

16. Para que o Tribunal de Contas aponte como ilegal qualquer ato dos órgãosou entidades sujeitas a seu controle, imprescindível será que a interpretação dada àlei pelo administrador ultrapasse os limites do juridicamente razoável.

17. Em outras palavras, far-se-á necessário que a exegese adotada pelaautoridade fiscalizada seja patentemente contrária à lei. Se ao menos razoável oentendimento que levou o fiscalizado a agir, deverá o Tribunal com ele conformar-se.

18. Um dos conhecidos postulados que regem a atividade do Poder judiciárioobsta a que o juiz substitua os critérios do administrador por seus próprios critérios.

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19. Tal máxima, bem examinada, se embasa na repartição constitucional elegal das funções do Estado e implica o reconhecimento da preferência asseguradaao detentor originário da competência, em detrimento dos órgãos de controle.

20. Aplica-se, pois, induvidosamente aos Tribunais de Contas, que, penso eu,estão autorizados a impugnar apenas os atos administrativos, financeiros eorçamentários abertamente ilegais. Na dúvida, cumpre-lhes acatar os motivos doadministrador.

21. Para que a Corte suste, portanto, o pagamento da pensão especial aquiapreciada, deverá estar de todo convencida de sua manifesta ilegalidade.

3) O contexto jurídico das pensões especiais

22. A outra preliminar para que deve voltar-se a atenção do Plenário é a dopeculiar contexto jurídico em que, atualmente, se situam as pensões especiais.

23. Com o advento da Lei n° 6.782, de 19 de maio de 1980, que equiparou aoacidente em serviço, para os efeitos do art. 242 do Estatuto, as moléstias gravesespecificadas na lei, elasteceu-se drasticamente o campo de incidência dessaspensões, a despeito de manter-se intacto o conceito legal de acidente em serviço.

24. Passaram a advir daí situações de extrema iniqüidade, das quais poderáser exemplo modelar o caso em pauta, na eventualidade de o Tribunal decidir emdesacordo com este parecer.

25. Ao servidor atingido por moléstias graves, que lhe abreviarão,dramaticamente, a esperança de sobrevida, ou, quando menos, lhe acarretarão altograu de incapacidade e dependência física, parece, sem dúvida, justo concederaposentadoria privilegiada com proventos integrais, até porque a própria doençaserá fonte constante de despesas extraordinárias.

26. Nenhuma injustiça haverá pois, com relação ao aposentado por outrosmotivos a quem se defiram proventos proporcionais ao tempo de serviço.

27. Como injustiça não havia na legislação anterior quando mandava pagarpensão especial apenas aos funcionários acidentados em serviço ou vítimas deagressão sofrida e não provocada no desempenho de suas funções. Aqui a relaçãode causalidade entre o interesse da Administração na realização do serviço e oevento danoso causador da morte do funcionário, aliada à questão paralela daresponsabilidade civil do Estado, fornecia a base ética e jurídica da concessão.

28. Ao instituir-se, no entanto, em decisão pouco amadurecida, aquelasenfermidades graves discriminadas na lei como fundamento também para aspensões especiais, entrou-se a distinguir entre situações essencialmente idênticas: ados funcionários falecidos em decorrência duma dessas moléstias e a dos demaisservidores cuja morte resulte de outra causa qualquer.

29. Sobrevindo o fato principal, o fato mais grave do falecimento, é irrelevanteindagar a natureza da doença e, rematada incongruência pesquisar a gravidade damoléstia de que padecia o ex-servidor. Pois que essa gravidade é .por certo objetode presunção, e presunção absoluta.

30. Razão alguma de ordem administrativa, moral, humana, jurídica ou lógicaautoriza desigualar os servidores falecidos em função de sua causa mortis.

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31. Daí por que este Ministério Público e o próprio Plenário tacitamenteadotaram, desde o início, critérios pouco rígidos na apreciação das pensõesespeciais fundadas na Lei n° 6.782/80.

32. Toda essa ambiência jurídico-administrativa, embora sem específicapertinência com o caso em foco, serve-lhe de obrigatório pano de fundo, na medidaem que a aplicação da lei, ao menos de modo subjacente, se norteia pelo ideal dejustiça.

33. Como negar pensão especial à família desse ex-servidor - falecido emdecorrência de acidente havido com veículo da Administração, no qual seencontrava, na hora do expediente, com confessada e prévia autorização de seuchefe imediato, para efetuar o transporte de seus móveis retirados de imóveltambém pertencente à Administração, que por necessitar do local lhe promovera adesocupação? Como negar a pensão se a ela faria jus essa família caso seu chefetivesse morrido por cardiopatia ou por outra doença do gênero?

34. Examinadas a fundo, as bases jurídicas não são idênticas, concedo; mas obenefício é o mesmo, como é o mesmo o instituto.

V - CONCLUSÃO

35. Os suportes elementares das pensões conseqüentes a acidentes emserviço estão presentes neste caso: o interesse público como causa, remotaembora, do acidente e a questão implícita da responsabilidade da Administraçãopelo evento danoso.

36. Com convicção redobrada, disponho-me, pois, a opinar pela legalidade daconcessão, tão logo cumprida satisfatoriamente a diligência saneadoraanteriormente requerida.

___________Processo n° 863/83 - 27-6-83.

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CONTROLE EXTERNO SOBRE BANCOS OFICIAIS

1. Vigência do Código e do Regulamento Geral deContabilidade Pública.

2. Posição hierárquica equivalente de ambos osdiplomas.

3. Limite vertical à aplicação direta e compulsória doR.GCP e da legislação regente dos contratos administrativosda união.

4. Limites, teóricos e práticos, à incidência horizontal doRegulamento de Contabilidade e, notadamente, das regrassobre contratos.

5. Peculiaridades do controle externo sobre os bancosoficiais.

6. Possibilidade de a Administração celebrar contratosnão onerosos.

7. O contrato administrativo na ordem jurídica do Distrito.8. Soluço recomendável para o caso concreto em exame.

LINCOLN TEIXEIRA MENDES PINTO DA LUZ

PARECER

I - COLOCAÇÃO DO TEMA

Quando da apreciação deste processo em Plenário, suscitaram-se dúvidasquanto à aplicação do regime do Regulamento Geral de Contabilidade Pública aoscontratos do Banco Regional de Brasília S/A, sociedade de economia mista doDistrito Federal.

2. O tema, reconheça-se, é deveras fascinante. Sua exata compreensão vaicomportar, quando não exigir, a investigação de várias premissas jurídicas; que vãoda questionável vigência das normas desse famoso e vetusto regulamento decontabilidade à sua aplicação obrigatória à cena administrativa do Distrito Federal,passando pela análise da latitude do campo de atuação dos preceitos que nele secontêm.

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3. Como se verá, também .para a adequada discussão de tais premissas,convém relembrar, ao menos pela rama, certos conceitos e postulados básicosregentes da estruturação e dinâmica da administração indireta dos interesses doEstado.

II - A VIGÊNCIA DO CÓDIGO E DO REGULAMENTO GERAL DECONTABILIDADE PÚBLICA

4. Em estudo, ainda inédito, que tivemos ocasião de realizar para a Secretariade Modernização e Reforma Administrativa do Ministério do Planejamento, foi-nosdado elaborar - ao cabo de ingente pesquisa -esboço, tanto quanto possívelcompleto, de consolidação das normas contratuais administrativas em vigor.Averiguamos, então, que, sem embargo dos sessenta anos decorridos da edição doRGCP, muitos de seus mandamentos alusivos aos contratos administrativoscontinuam integral ou parcialmente atuantes. Observamos a revogação expressa outácita de numerosos dos artigos originais, revogação operada não apenas ao nívelda lei, mas, não raro, por incompatibilidade ostensiva ou subjacente com os textosconstitucionais supervenientes (Constituições de 1926, 1934, 1946, Emenda n°18/65, Constituição de 1967 P Emenda nº 1/69). De outro lado, em mais de cincodezenas de leis deparamos com disposições derrogatórias ou ab-rogatórias doregime originalmente fixado às contratações pelo RGCP.

5. Sem mencionar a legislação mais obviamente pertinente ao tema da relaçãocontratual administrativa, como a peculiar às licitações, à organização do Tribunal deContas da União, ao direito financeiro, à reforma administrativa, também nas maisinesperadas sedes, como a Lei do Serviço Militar, o Código Eleitoral, o Código deÁguas, etc., dá-se com dispositivos modificadores da pauta jurídica estabelecida noRegulamento Geral de Contabilidade Pública.

6. Duas deduções preliminares - se não contraditórias, ao menos adversativas -podem-se, desde logo, tirar do exposto: que o Código e o Regulamento Geral deContabilidade Pública subsistem parcialmente em vigor e que, em contrapartida, étarefa árdua e arrisca precisar quais dentre seus artigos continuam a viger e - maisdifícil ainda - especificar que alterações lhes foram impostas pela copiosa edesordenada legislação ulterior.

7. Eloqüente mostra de tais dificuldades está no Enunciado n° 68 da súmula dejurisprudência predominante do Tribunal de Contas da União, que, prudentemente,assim preceitua:

"No sistema de controle externo, instituído pela Constituição de 1967 edisciplinado em legislação ordinária pertinente, continuam em vigor asdisposições do Código de Contabilidade da União e seu Regulamento, naquiloque, a juízo do Tribunal de Contas da União, não tiver sido revogado."

8. Reservou-se, pois, a Corte de Contas federal a cautelosa prerrogativa deempreender, caso a caso, o exame da regra cuja aplicação se pretenda,contentando-se com a afirmação de que, em principio, vigorará o Código, ou algunsde seus dispositivos. E, a bem da verdade, o problema não se resolve com a singelaverificação de que essa ou aquela disposição permanece em vigor. Necessário sefaz escrutar o ordenamento jurídico à procura dos acréscimos, peculiaridades,exceções e :normas especiais que se vieram adicionando ao RGCP, no curso desua dilatada existência.

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9. A índole assistemática e a falta de rigor técnico que, entre nós, preside ainovação da ordem jurídica torna no mínimo temerário assegurar vigente qualquermandamento legal velho de sessenta anos, ainda mais em matéria tãoseguidamente contemplada pelo legislador como a das contratações administrativas.

III - A PARIDADE JURIDICA ENTRE O CÓDIGO DE CONTABILIDADE E OSEU REGULAMENTO

10. É ilustrativo frisar que o sucinto Código e o extenso Regulamento deContabilidade, gerados, respectivamente, pelo Decreto Legislativo n° 4.536, de28-1-22, e pelo Decreto n° 15.783, de 8-11-22, não guardam entre si diferençasubstancial quanto à sua força jurídica, dado que o Regulamento, a despeito deeditado por decreto, receberia de imediato a expressa e formal ratificação doCongresso Nacional, no art. 162 do Decreto Legislativo nº 4.362, de 6-1-23.

11. Deixou de ser, então, simples ato administrativo de feitio normativo paraqualificar-se como lei em sentido material e formal. Compreende-se assim o porquêda ostensiva e crescente preferência dada ao Regulamento, onde tudo se previa, emdesfavor do Código que, muito genérico, deixava sem solução as dúvidasemergentes da prática administrativa.

IV - O ÂMBITO DE ATUAÇÃO DO RGCP

1) Limite Vertical

12. Em ambos os diplomas, apura-se facilmente que seu alcance vertical secifrava ao plano da União, em consonância, aliás, com a relativa pureza original denosso federalismo, onde só por exceção se autorizava a ingerência da União nosnegócios e interesses dos Estados-membros.

13. Ligeira consulta comparativa às sucessivas Constituições brasileiras revelacom limpidez as crescentes amarras que, ao longo do tempo, foram sendo postas àliberdade legislativa das unidades intra-estatais, progressivamente circunscrita embenefício da capacidade legiferante da União.

14. Sem embargo, ainda recentemente, sob o regime da Carta de 1967, amaior parte da doutrina sustentava, com razão, a inconstitucionalidade de impor àUnião, aos Estados e Municípios o figurino jurídico que escolhera para suas própriaslicitações.

15. Toda a censura endereçada à Lei n° 5.456/68, por obrigar a adoção doregime federal de licitações às esferas estadual e municipal, confirma que só hámuito pouco tempo - após editada a Emenda nº 1/69 -. passaram as normas geraissobre gestão patrimonial e financeira de natureza pública a ficar constitucionalmentereservadas à União. Mesmo agora, perceba-se, apenas as normas "gerais" tocam àUnião, conservada a competência supletiva dos Estados, nos limites da lei federal.

16. Tratando-se como se trata de regras que, sobre datarem de época muitoanterior à nova orientação constitucional, nada têm de gerais, sendo, ao contrário,extremamente pormenorizadas, é meridianamente claro que não modelam oscontratos dos Estados-membros e dos Municípios.

2) Limites Horizontais

a) Perspectiva doutrinária

17. As pessoas jurídicas providas de autonomia superior à das autarquias, deque crescentemente se utiliza o Estado no atendimento às multifárias tarefas a que

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hodiernamente se entrega, nascem libertas dos severos controles hierárquicos quesubmetem o núcleo central de Serviço Público. Esses ramos laterais daAdministração gozam, em princípio, de liberdade análoga à da empresa privada,reguladas precipuamente suas atividades .pela sistemática jurídica aplicável àsrelações comerciais e do trabalho.

18. Em lugar de se sujeitarem à intensiva fiscalização de cunho hierárquico,tais entidades se submetem, em tese, aos mais elásticos e intermitentes controlesda tutela administrativa.

19. É corrente a máxima da doutrina francesa, consoante a qual os controlespeculiares à tutela administrativa só valem nos casos e nos limites dos textosjurídicos que os definam: "pas de tutelle sans texte, pas de tutelle au-delà destextes". Deflui daí a certeza de que, teoricamente, os controles prefigurados noregime dos contratos administrativos só hão de alcançar os entes descentralizadosmediante norma legal expressa que o determine.

b) Perspectiva legal

20. A acentuada simplicidade estrutural da Administração Pública em 1922,contrastante com a sofisticada organização estatal de nossos dias, acarreta algumadificuldade à verificação da extensão do campo de incidência horizontal dessasnormas contratuais.

21. De fato, embora o art. 764 do Regulamento pareça indicar que taismandamentos não obrigavam além das fronteiras dos departamentos daadministração pública, os quais corresponderiam hoje aos chamados "órgãos daAdministração Direta", depreende-se, com segurança, de outros preceitos, como osarts. 768 e 773, que, também, os entes autárquicos eram alcançados pelo regime doRegulamento. Note-se, ainda assim, a menção a "regulamentos especiais" de algunsserviços públicos abre lugar à convicção de que neles vigorava certa mitigação ouadaptação das regras gerais do RCCP, as quais, portanto, no caso das autarquias,nem sempre incidiam automaticamente, substituídas que eram, então, pelas normasespeciais que as derrogavam.

22. Nos termos da legislação mais moderna, contudo, desaparece qualquerhesitação sobre a íntegra aplicação do regime contratual da Administração centralao campo autárquico. Com efeito, por disposição do art. 125 da Lei da ReformaAdministrativa, todo o seu Título XII abarca não somente a Administração Direta,mas, outrossim, as autarquias. E de permeio com as regras licitatórias ali previstasdescobrem-se vários preceitos de todo atinentes às contratações, como os arts. 134,136 e 140.

23. De outro lado, o Decreto n° 73.140, de 9-11-73 - baixado com o duploescudo dos itens III e V do art. 81 da Constituição e, portanto, com caráter nãoapenas regulamentar, mas de lei em sentido material - estende, no art. 1º, também àadministração autárquica federal o seu campo de atividade.

24. Vale o esclarecimento adicional de que o citado inciso V do art. 81 conferecompetência privativa ao Presidente da República para inovar a ordem jurídicaquando se trata de regular a estruturação das atribuições ou do funcionamento dosórgãos da Administração federal.

c) Ilação parcial

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25. A falta de regra que prescreva a aplicação do regime dos contratosadministrativos às empresas públicas e sociedades mistas e à luz do que a contrariosensu se acha implícito no art. 125 do Decreto-lei n° 200/67 e no art. 19 do Decretonº 73.140/73, já analisados, compreende-se que .nem o RCCP nem a legislaçãomodeladora dos contratos administrativos atinge os pactos celebrados por empresaspúblicas e sociedades de economia mista.

26. Como, entretanto, essas entidades, em atenção ao princípio do interessepúblico que as informa, não se podem furtar ao regime do Direito Administrativo, écurial que o Estado conserve o poder de disciplinar-lhes as linhas gerais de atuação,mediante a técnica legislativa da enumeração das proibições, ou seja, das exceçõesou dos condicionamentos à sua liberdade de gerir-se, sob a rubrica dos ,princípiosdo planejamento, da coordenação, da descentralização e desconscentração depoderes, da delegação de competência e do controle, tais como consagrados na Leide Reforma Administrativa, ou, ainda, de outros escopos norteadores da atividadepública.

27. O importante é mencionar, todavia, que, na ausência dessescondicionamentos, prevalecerá nessa matéria a liberdade básica dos entesdescentralizados.

IV - CONCLUSÕES DE ORDEM GERAL

28. Tendo em conta, inicialmente, que, para exigir a aplicação de qualquer dasprescrições do RGCP, se impõe, caso acaso, uma extensa e cerrada pesquisa como propósito de confirmar não somente a vigência básica, mas as derrogações,acréscimos e alterações ocorridos desde sua edição, conclui-se, na preliminar, queas normas contratuais do Regulamento Geral de Contabilidade Pública:

I - Não se aplicam, horizontalmente, além dos limites da Administração Direta edas autarquias:

a) em decorrência da pura e simples exegese do texto desse estatuto, cujo raiode ação não ultrapassa o círculo das autarquias;

b) porque - em face da teoria jurídico-administrativa - os contratos dasempresas públicas e sociedades de economia mista se governam, em essência,pelo direito do trabalho e das obrigações, sem prejuízo dos controles imanentes àtutela administrativa; e

c) porque - também sob a ótica do direito positivo e sobretudo do art. 170 daConstituição - as empresas estatais se dedicadas à exploração econômica,notadamente quando em concorrência com a iniciativa privada, se regem pelasnormas aplicáveis às empresas particulares com relação ao direito do trabalho e dasobrigações.

II - Não atuam na órbita dos bancos oficiais constituídos sob a forma desociedade de economia mista:

a) porque, dentre as empresas com liberdade original de gestão, são associedades mistas as que ostentam o mais acurado índice de autonomia, inclusivepara a celebração de contratos;

b) porque, sobre as sociedades de economia mista que sejam tambémentidades bancárias, a fiscalização financeira e orçamentária do Estado - aíconsiderado o exercício da auditoria pelo Poder Público e pelos Tribunais de Contas

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- deve efetuar-se de maneira a mais moderada possível, no interesse de evitar aduplicação dos controles sobre elas já aplicados pelo Banco Central.

III - Não incidem, verticalmente, abaixo do plano federal:

a) porque - mesmo admitindo-se o regime dos contratos como matériapertinente à gestão patrimonial de natureza pública de que trata o art. 89, XVII, c, doConstituição - a competência da União para dispor sobre o tema só começou com aEmenda nº 1/69, não respaldando obviamente a legislação anterior;

b) porque à União, sobre o tema, cabe editar somente normas "gerais" conceitode que de todo se extremam os minudentíssimos ditames do RGCP;

c) porque, em contrapartida, os preceitos que não quadrem com esse conceitode "normas gerais" ficaram constitucionalmente reservados à competência legislativados Estados-membros, na forma do parágrafo único do mesmo art. 89 daConstituição.

V - OS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS DO DISTRITO FEDERAL

29. No nível da lei, não existem normas próprias acerca dos contratosadministrativos do Distrito Federal. Ao lançar o Decreto nº 4.507, de 26-12-78,dispôs, todavia, o Governador, com suporte no art. 20, II, da Lei n° 3.751/60 e noteor da Lei nº 5.721, de 26-10-71, não apenas sobre as licitações, mas igualmentesobre as contratações da Administração do Distrito.

30. A análise desse documento fundamental ministra, de forma direta ouimplícita, a contraprova do que vimos até aqui sustentando. Em verdade, logo no art.1°, adstringe-se à Administração Direta e às Autarquias a incidência do diploma, aomesmo tempo que, no art. 126, se determina a edição de atos próprios dasfundações, empresas públicas e sociedades mistas para disciplinar o tema. Comotópicos obrigatórios desses atos, indicam-se, tão-somente, as diretivas genéricasconstantes dos arts. 2º, 40, 121 e 122, alusivas, respectivamente, à mútuapreferência assegurada. às empresas de cujo capital participe o Distrito, aabatimentos-padrão a se concederem às firmas estabelecidas no DF e àobservância das penas de suspensão do direito de licitar e de declaração deinidoneidade cominadas a licitantes ou contratantes faltosos.

31. Nos diversos capítulos do Título VI, cogita-se, com alguma minúcia, doscontratos administrativos, versando, dentre inúmeros pontos, sobre a formalizaçãodas contratações (arts. 12 e 100); sobre as cláusulas obrigatórias (art. 101) e asacessórias (art. 102) ; sobre a duração dos contratos e sua prorrogação (art. 103 eparágrafos); sobre as formalidades essenciais à validade dos pactos (art. 104); sobreas alterações contratuais e suas condições (art. 106) ; sobre a execução e o.recebimento dos serviços e fornecimentos contratados (art. 107); sobre asmodalidades, conseqüências e motivos das rescisões (arts. 115 a 118).

32. Daí se infere que, na elaboração desse texto normativo, acataram-se, pontopor ponto, as premissas fundamentais que vimos examinando, a saber: que asistemática do contrato administrativo estabelecida para a Administração Direta sóse projeta, de forma imediata, sobre a área das autarquias; e que tal sistemáticatambém não obriga abaixo do plano federal, podendo, quando muito, servir demodelo não-vinculante adaptável às peculiaridades locais.

33. Depreende-se, de outro lado, que, no caso peculiar do Distrito Federal,além das disposições expressamente referidas no art. 128, o arcabouço do regime

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contratual do Decreto nº 4.507/78 foi, em princípio, estendido aos domínios dasempresas públicas, sociedades mistas e fundações, na medida em que se exige detais entidades que baixem "normas semelhantes" às contempladas nesse mesmodecreto. A despeito da fluidez e imprecisão do conceito de semelhança, é possívelafirmar que ali se estabelece a presunção de que, somente por exceção e paraatender a interesses específicos e peculiaridades inequívocas, poderão essasentidades afastar-se dos moldes e padrões adotados para a Administração Diretalocal.

VI - ARGUMENTOS ESPECÍFICOS

34. Descendo ao exame do caso específico destes autos, não nos parecetambém recomendar-se a diligência proposta, por acreditarmos que:

1) somente na doutrina, ou em pane dela - mas não na lei - aponta-se aonerosidade entre os traços elementares do contrato administrativo;

2) mesmo aceita, tal premissa doutrinária não exclui a possibilidade de aAdministração celebrar contratos não onerosos, os quais, quando muito, perderiamas características de contratos administrativos, ,para qualificar-se no gênero maisamplo dos contratos privados da Administração;

3) o contrato em tela tão-somente sob o prisma formal poderia ser consideradogratuito, na medida em que não prevê remuneração direta à entidade prestadora deserviço. Materialmente, trata-se de contrato oneroso, pois que a remuneração se dáde modo indireto, à base dos ganhos de capita de que a co-contratante abre mãoem beneficio do Banco Regional de Brasília.

______________Processo nº 537/83 - 7-4-83.

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CONCESSÃO DE PENSÕES COM BASE NO ART. 5.°DA LEI Nº 4.069/62

1. Questão prejudicial: eficácia não-vinculante dospareceres da Procuradoria-Geral, por força de seu caráterpuramente opinativo.

2. Requisitos, positivos e negativos, à habilitação dacompanheira.

3. Importância fundamental do impedimento jurídico paranovas núpcias, notadamente após a vigência da lei do divórcio.

4. A designação da beneficiária, estabelecida no art. 5°da Lei n° 4.069/62, deve ser, de preferência, expressa.Dessume-se, no entanto, do casamento religioso ou de outrasevidências indiretas apreciáveis caso a caso.

5. Satisfatório o cumprimento da diligência ordenada.Aprovação do ato.

LINCOLN TEIXEIRA MENDES PINTO DA LUZ

PARECER

I - QUESTÃO PREJUDICIAL

Na sessão do dia 16, último, decidiu o Tribunal autorizar nova audiência daProcuradoria sobre o cumprimento da diligência determinada a fls. 27. A providênciafoi, em certa medida, oportuna, muito embora não seja usual nem ortodoxa adevolução de processo ao conhecimento do Ministério Público quando já se tenhaesse pronunciado conclusivamente na preliminar e no mérito.

2. Fique definido que, por efeito do caráter não vinculante dos pareceres emgeral e, pois, dos pronunciamentos do Ministério Público, será sempre possível àCorte, quando deles discorde, agir conseqüentemente, assumindo postura diversadaquela que recomendem.

3. No caso dos autos, todavia, qualquer decisão do Tribunal no sentido dadesaprovação da concessão em exame, ou mesmo de nova diligência saneadora

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poderia acarretar prejuízo à beneficiária da pensão. Prefiro, portanto, abrir mão daprejudicial e lavrar este parecer complementar.

II - EXPLICAÇÃO NECESSÁRIA

4. Habituado, mal habituado talvez, à irrepreensível confiança com que oEgrégio Plenário tem sempre honrado as opiniões desta Procuradoria, e, maisespecificamente, os critérios do signatário, julguei dispensável justificar, empormenor, a proposta de aprovação do ato concedente da pensão, tanto mais que aprecedente diligência fora por mim próprio requerida. Reparo, agora, a omissão.

5. Importa deixar claro, inicialmente, que, ao avaliar o resultado daqueladiligência, não a dera por integralmente atendida. Querendo assinalar, ainda que depassagem, a feição subjetiva do parecer, tive o cuidado de qualificar comosatisfatório o seu cumprimento: dava-me por satisfeito com os elementos trazidosaos autos, conquanto incompletos à luz do parecer anterior.

III - CIRCUNSTÂNCIA DECISIVA: A DATA DA MORTE DO SERVIDOR

6. A verdade é que a formulara no suposto da inexistência de óbice àlegalização da união de fato entre o servidor falecido e sua companheira, orarequerente da pensão. Escapara-me a circunstância de que o falecimento dofuncionário datava de antes da lei do divórcio e da nova jurisprudência,progressivamente dominante nos tribunais judiciários, os quais, com muito acerto,passaram a atribuir valor decisivo ao impedimento legal para o novo matrimônio, emcasos do gênero.

7. No contexto sócio-jurídico que antecedeu à instituição do divórcio entre nós,a realidade social e a opinião pública haviam ultrapassado a lei, favorecendo assima atuação moderadora dos juízes e tribunais, que, em atenção à generalizadacondescendência com o casamento de fato, entraram a reconhecer direitos cada vezmaiores às companheiras, cuja situação jurídica aos poucos se aproximava da deesposas legítimas.

8. Com o advento do divórcio, no entanto, iniciou-se a revisão de algunsexcessos havidos na proteção às uniões de fato, até porque a questão se esvaziarade aspectos emocionais que antes a matizavam.

9. Dissolúvel o casamento, ganhou o impedimento nupcial nova importância namedida em que não mais poderia perdurar a complacência da justiça com aquelesque - agora sem motivo socialmente justificado - conservavam ou estabeleciamligações matrimoniais ao arrepio da lei.

10. Vê-se, pois, o relevo absoluto que assume, no caso em cogitação, a datada morte do instituidor da pensão.

11. Sabido que, ao falecer o instituidor, subsistia ainda, em toda a força, oimpedimento legal ao casamento do desquitado, mudam o enfoque e os critérios dejulgamento da pensão.

IV - OS REQUISITOS DA LEI E AS PROVAS DOS AUTOS

12. Evidenciou-se o desquite do ex-funcionário e sua vida em comum com apensionanda pelo largo período de dez anos. Em contrapartida, a despeito dadiligência, não veio aos autos a formal designação da beneficiária.

13. Entendi, porém, uma demasia que o não-preenchimento desse únicopressuposto preponderasse sobre as demais circunstâncias dos autos, entre as

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quais releva sobremaneira a de já vir a interessada percebendo - sob o amparo damesma norma jurídica - a pensão previdenciária do INPS.

14. Convém, ademais, refletir que, bem analisados, os requisitos da lei,positivos e negativos, não se reduzem àqueles três citados no parecer anterior.

15. Com efeito, além deles, estabelece a lei ao menos duas outras condições,negativas, a saber:

a) a inexistência de filhos do servidor, capazes de receber o benefício; e

b) a circunstância de o funcionário desquitado não estar judicialmentecompelido a alimentar a ex-esposa.

16. Vale a explicação de que, havendo filhos aptos à percepção do benefício, acompanheira fará jus apenas à metade da pensão, tal como manda o § 4° do artigoem comento.

17. Essas provas, por sua natureza, não são exigíveis a priori, mas apenasoponíveis por eventuais prejudicados.

18. Tira-se daí que a deprecante de fls. 1 satisfaz completamente não apenasduas dentre três, mas quatro dentre cinco condições legais à percepção dobenefício.

19. De mais a mais, postas as coisas sob rigor absoluto de interpretação, épreciso convir, não pede a lei ultima ratio, que a designação da beneficiária se operede maneira expressa. A súmula do Colendo Tribunal de Contas da União querespaldou a diligência vai além do texto seco do art. 5°, § 3°, da Lei nº 4.069/62, aoexigir seja em princípio expressa a designação da beneficiária. E tanto assim é que,de imediato, abre ela própria exceção para a designação tácita resultante docasamento religioso.

20. Sem dúvida, a importância ali reconhecida à cerimônia religiosa só podejustificar-se, sob o prisma do Direito, como obséquio a uma implícita manifestaçãoda vontade do instituidor no sentido de garantir à companheira toda a proteçãosocial e econômica a seu alcance.

21. Isso porque, da perspectiva do Direito Civil ou do Direito Administrativo, omatrimônio simplesmente religioso não possui, entre nós, eficácia própria. É, quandomuito, prova indireta, declaração tácita de vontade, que os Tribunais valorizaram emfunção daquele inconformismo social com a proibição jurídica das novas, núpciasdos desquitados que anteriormente prevalecia.

22. Disso tudo se infere, por conseguinte, que a Súmula n° 24 do TCU está, emalguma medida, desatualizada, pelo menos com relação aos servidores falecidosmais recentemente. Tal entendimento tende, mesmo, a cristalizar-se em novaformulação que tenha em conta precípua a existência, ou não, do impedimentomatrimonial.

23. Seja como for, a falta da explícita designação da beneficiária pareceu-mesuprível pelas demais circunstâncias testificadas no processo, entre as quaissublinho:

d) a companheira percebe, normalmente, a pensão previdenciária, com apoiodo mesmo art. 5° da Lei n° 4.069/62, o que indica haver o INPS consideradocumpridos os requisitos de habilitação ali previstos (cf. fls. 11/llv.);

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b) além disso, é mãe de Ângela Maria Almeida Cordeiro, filha do servidorfalecido (cf. fls. 4);

c) subsistia, na época da morte do funcionário, o impedimento legal para seucasamento com a beneficiária (cf. fls. 3);

d) a requerente viveu cerca de dez anos na companhia do falecido e sob suadependência econômica (cf. fls. 30); e) o instituidor não estava obrigado a prestaralimentos à ex-esposa.

24. Daí ter opinado - como ora opino - pela aprovação do ato em apreço.___________Processo nº 1.354/82 - 29-6-83.

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REAPRECIAÇÃO DE REFORMAS E PROVENTOSJÁ CONSIDERADOS LEGAIS PELO TRIBUNAL

1. O auxilio invalidez é parcela legalmente excluída doconceito de provento.

2. O adicional de inatividade, pela natureza dospressupostos que o regem, deve, em princípio, integrar-se no"quantum" dos proventos e submeter-se ao julgamento doTribunal de Contas.

3. Reexame por amostragem, mediante inspeções inloco, das reformas cujos proventos, já apreciados pelo Tribunal,venham a sofrer reajustes por força dos arts. 93, 37, 105 e 107da Lei n° 5.619/70 (elevação ao piso do soldo da ativa eadicional de inatividade).

4. Devolução do processo à origem.

LINCOLN TEIXEIRA MENDES PINTO DA CRUZ

PARECER

Este processo refere-se à reforma do Soldado PM, Armando Rodrigues daCosta, concessão essa considerada legal por esta Corte, ao apreciá-la na Sessãode 26 de julho de 1979.

2. Posteriormente, em outubro de 1981, foi baixado por S. Exa o Governadornovo ato, visto às fls. 55, com o único fito de, mediante retificação, outorgar aoreformado, além dos proventos proporcionais inicialmente deferidos, auxílio-invalideza que fazia jus nos termos da lei.

3. Conferindo o demonstrativo de fls. 58/59, elaborado pela Diretoria dePessoal da Polícia Militar local, verifico, no entanto, que, de par com o mencionadoauxílio-invalidez, duas outras parcelas estão agora agregadas aos proventos domilitar em apreço, a saber: a concernente à elevação dos proventos até o nível dosoldo da ativa, com apoio no parágrafo único do art. 105 da Lei n.° 5.619/70, e oaditamento do adicional de inatividade, na forma do art. 93,3, combinado com o art.107 da mesma lei, com a modificação decorrente do art. 1° do Decreto-lei nº 1.776/79.

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4. Para a exata apreciação da matéria, ministra o Estatuto da Polícia Militar doDistrito Federal precioso subsídio, na medida que exclui do conceito estrito deproventos, não apenas a parcela atinente ao auxílio-invalidez, mas ainda o chamadoadicional de inatividade (Lei n° 6.02.3/74, art. 53, § 2°, u e b).

5. Essa última vantagem, ao contrário do auxílio-invalidez, tem tão nítidascaracterísticas de retribuição financeira, que - sem embargo da letra da lei - nãohesito em reputá-la englobada no conceito genérico de proventos, devendo, pois, ameu critério, submeter-se, em princípio, ao exame deste Ministério Público e àapreciação do Egrégio Plenário, para fins de registro.

6. Quando, porém, se tratar, como no caso dos autos, de reforma e proventoscuja legalidade já foi objeto de decisão final da Corte, parece-me deva o seureexame efetuar-se, apenas, por amostragem, nas inspeções de rotina da InspetoriaGeral.

7. Tanto mais quando se cogite de vantagens cujos pressupostos de direito ede fato já estejam cabalmente apurados nos autos, simplificando-se, destarte, aoextremo a apreciação jurídica da matéria.

8. Em verdade, o arredondamento do estipêndio até o piso do soldo da ativa évantagem de ordem tão geral, concedida de modo incondicionado, que não requerexame de natureza propriamente jurídica. A sua vez, o adicional de inatividade,conquanto variável na razão dos anos de serviço, pode, sem maior dificuldade, tersua legalidade aferida com base nos elementos fáticos já constantes do processo.Daí, bastar que modificações desse tipo havidas nos proventos passem apenas pelocrivo da auditoria financeira e orçamentária a cargo da Inspetoria-Geral.

9. A solução alternativa - fazer retornar ao Tribunal, caso a caso, todas asreformas já julgadas, sempre que a reavaliação dos proventos implicasse inovaçãode seus fundamentos ou de seus cálculos - representaria trabalho e despesasdesmedidas, incompatíveis, a meu ver, com as diretrizes da racionalização docontrole e da eliminação dos procedimentos de fiscalização extremamente onerosos,estabelecidas no art. 14 da Lei de Reforma Administrativa.

10. Por motivos da mesma ordem, já tem decidido o Colendo Tribunal deContas da União, em casos homólogos, abster-se do controle sistemático dessegênero de aumento de despesa.

11. Tais razões me levam a acatar a sugestão da Inspetoria Geral, no sentidoda devolução do processo à Polícia Militar, sem prejuízo da ulterior apreciação,mediante inspeções, das alterações que, com base em nova fundamentação legal,ocorram nos proventos iniciais dos militares reformados.

______________Processo n° 774/75 - 16-5-83.

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PENSÃO ESPECIAL A MULHER JUDICIALMENTESEPARADA DE EX-FUNCIONÁRIO

1. Sendo irrenunciável o direito a alimentos, o cônjugeque deixa de recebê-los quando da separação judicial poderáulteriormente pleiteá-los, desde que deles venha a necessitarpara sua subsistência.

2. Daí que a pensão especial - em princípio sóoutorgável à mulher desquitada que receba alimentos - tambémpode ser requerida pela ex-esposa não pensionada de servidorfalecido. Nesse caso, porém, a concessão não seráautomática, mas, condicionada à comprovação dos requisitosdo direito a alimentos especificados na lei civil.

3. A prova dos autos não corrobora, antes infirma, anecessidade econômica da requerente, motivo por que falta, ameu ver, amparo legal para que lhe seja concedida pensãovitalícia. A pensão - de caráter temporário - cabe Integralmenteà filha menor.

LINCOLN TEIXEIRA MENDES PINTO DA CRUZ

Trata-se da pensão especial concedida, com apoio no art. 242 do Estatuto emcombinação com o art. 1° da Lei nº 6.782/80, à família do ex-servidor, RobertoDamaso Bittencourt, falecido em razão de moléstia capitulada no art. 178, 1, b, doEstatuto.

2. Além da filha menor deixada pelo de cujus, pleiteou também o benefício aSra. Nancy Santos de Andrade, que, desde 1979, se achava judicialmente separadado servidor falecido.

3. A pretensão da ex-esposa - deduzida no documento de fls. 22, em adendoao requerimento inicial de fl. 1, onde se pedia a pensão apenas para a filha menor -conta de fato com o endosso de pelo menos uma decisão do Egrégio Tribunal deContas da União, que, conforme se lê a fls. 34/36, acolheu o entendimento de que,sendo irrenunciável o direito à pensão alimentícia, pode a desquitada ulteriormente àseparação judicial habilitar-se à pensão especial, contanto que verificados ospressupostos legais.

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4. Ampara-se tal decisão na Súmula 379 do Supremo Tribunal Federal, nadoutrina dominante do Tribunal Federal de Recursos e em orientação firmada para aAdministração Federal no Processo n° CGR/H/ 864 da Consultoria Geral daRepública.

5. Toda essa jurisprudência versa, no entanto, especificamente, sobre apensão de alimentos, cujo pressuposto basilar é o da necessidade econômica dobeneficiário. E essa necessidade, no caso em tela, nem se acha comprovada nosautos, nem tampouco seria de presumir-se. Muito ao contrário, da prova produzidadeflui a presunção de que a interessada possui economia própria, funcionária que éhá anos da IBM do Brasil (doc. de fls. 8), de sorte que não lhe cabe direito aosalimentos.

6. Quando abre mão da pensão alimentícia, incide a ex-esposa em hipóteseexpressamente definida no art. 5°, inciso I, alínea a, da Lei n° 3.373, de 12-3-58, queestabelece o Plano de Assistência ao Funcionário e a sua Família, o qual exclui aesposa desquitada que não receba pensão de alimentos de entre os membrospensionáveis da família do servidor.

7. A diretriz geral que respalda a jurisprudência judicial e administrativaprevalente na esfera federal parece-me deva ser respeitada também nesta Cortepelos foros de justiça e eqüidade que a inspiram. Sem embargo, quando se cuida dodeferimento de pensão a ex-esposa de servidor falecido, estou convicto tem lugar,em princípio, a norma específica do citado art. 5°, I, a, da Lei n° 3.373/58.

8. Somente se tal beneficiário vier percebendo a pensão de alimentos será dereconhecer-lhe, de plano, o direito à pensão especial.

9. O preceito legal e jurisprudencial concernente à irrenunciabilidade dosalimentos é, nesse caso, de aplicação subsidiária, condicionada à prova de que adesquitada ou divorciada sofreu substancial mudança em sua situação econômica aponto de precisar socorrer-se da pensão alimentícia.

10. De resto, consoante o próprio Enunciado 379 da Súmula do Supremo, opedido de pensão ulterior ao desquite não é incondicionado, mas, ao revés,dependente da ocorrência dos pressupostos legais do direito a alimentos, tal comodiscriminados no Código Civil.

11. Mencione-se, afinal, que, segundo o demonstrativo de fls. 30, apenas afilha menor recebe a pensão do INPS, o que é indício adicional de que à peticionárianão assistia direito a requerer em nome próprio os benefícios pleiteados a fls. 22.

12. Tenho, pois, por ilegal o decreto em exame, que, deve, a meu critério, sersubstituído por novo ato que conceda integralmente à filha do servidor falecido apensão temporária que legalmente lhe toca.

______________Processo n° 2.634/82 - 4-3-83.

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TEMPO DE SERVIÇOLEI COMPLEMENTAR E LEI ORDINÁRIA

1. Consulta. Tempo de serviço para aposentadoria dosfuncionários policiais civis da Secretaria de Segurança Públicado DF.

2. Somente a lei complementar federal pode deduzir otempo de serviço para a aposentadoria.

3. As leis ordinárias anteriores continuam válida eeficazes, se não incompatíveis com o sistema atual.Precedentes do Supremo Tribunal.

4. Legislação aplicável aos policiais do DF. Lei n°4.878/65. Lei especial para a matéria. Impossibilidade davigência da Lei n° 3.313/57 em concorrência com a Lei n°4.878.

5. Consulta por ser conhecida porém, respondidanegativamente, enquanto não houver lei complementar para aespécie.

ROBERTO ROSAS

PARECER

1. O Secretário de Segurança Pública do DF consulta esta Corte sobre oalcance dos benefícios da Lei nº 3.313/57 em relação aos funcionários policiais civisda Secretaria de Segurança Pública do DF.

2. O processo traz valiosos subsídios que devem ser relatados, por suaimportância para o deslinde da consulta.

Consultou-se o DASP sobre o benefício da aposentadoria com vencimentosintegrais aos policiais civis do Distrito Federal com 25 anos de serviço, como prevê oart. 1°, item II, da Lei n° 3.313 para os servidores policiais da Polícia Federal. Pormeio do Parecer nº 041/83 da Secretaria de Pessoal Civil/COLEPE opinouconclusivamente:

"A aposentadoria voluntária do policial civil da polícia que atue,legalmente, na área do Distrito Federal e ocupante de cargo a que se refere a

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Lei n° 4.483/64, modificada pela Lei nº 4.813/65 e pelos Decretos-leis n.°69/66 e 315/67, pode ocorrer aos 25 anos de serviço de naturezaeminentemente de policiamento, com apoio no item lI do art. 1º da Lei n°3.313/ 57" (fls. 6/7) .

O ilustre Procurador-Geral do Distrito Federal, Dr. Emmanuel FranciscoMendes Lyrio, em outra oportunidade, concluiu pelo indeferimento da apelação.Assim opinou, porque a Lei n° 4.878, de 1965, em seu artigo 62, parágrafo único,subordina os funcionários da Polícia do Distrito Federal ao regime instituído pela Lein° 1.711. (fls. 72/73). Acresce, entretanto, que o interessado nesse parecer,impetrou o Mandado de Segurança n° 719 perante o Egrégio Tribunal de justiça doDistrito Federal, que, por maioria, concedeu a ordem com o acórdão assimementado:

"Funcionário Policial. Aposentadoria Voluntária, com vencimentosintegrais aos 25 anos de serviço público. Deferimento. Continua em vigor a Leinº 3.313/57, em face da inércia do Executivo em atender ao que determina oart. 103 da Constituição Federal. A nova Lei n° 4.878/65 não revogou a queconfere aos impetrantes o direito que postulam, devendo subsistir a leiespecial, no que tange à aposentadoria em questão, porque esta não foimodificada pela Lei n° 4.878/65" (fl. 9).

Neste Tribunal, a Inspetoria opinou pela aplicação das já mencionadas Leis n°s3.313/57 e 4.878/65 (fl. 117). Diga-se a bem deste relatório que o ilustre Procurador,Dr. Lincoln Teixeira Mendes Pinto da Luz emitiu parecer pela incompatibilidade daaplicação dessas leis com o art. 103 da Constituição (fls. 108 e segs. ).

É O RELATÓRIO

Na vigência das Constituições de 1967 e 1969 o Supremo Tribunal teveoportunidade de negar a validade de leis estaduais que reduziam o tempo deserviço, porque essa possibilidade estava reservada à lei complementar federal(Representação n° 757 - RTJ 53/215; Representação n° 754 - RTJ 50/218;Representação n° 840 - RTJ 60/18; Representação n° 1.037 - RTJ 98/30;Representação n° 983 - RTJ 91/761). Mais recentemente, a Suprema Corte ao julgara Representação n° 1.033 foi mais adiante, ao expressar a necessidade dessa leicomplementar (RTJ 95/501). Claro que esses diplomas legais foram baixados a os aEmenda Constitucional de 1969, que impõe a lei complementar federal para aredução do tempo de serviço para a aposentadoria. Logo, essa questão não tolhe aaplicação das normas legais ordinárias anteriores, mesmo que posteriormente exija-se lei complementar para a matéria.

Na doutrina, José Souto Maior Borges sustentou a eficácia da legislaçãoanterior, se não tiver incompatibilidade com o direito constitucional novo, isto é, a leiordinária anterior persistirá válida e eficaz, ainda que regulando matéria de leicomplementar (Lei Complementar Tributária - pág. 76).

O Supremo Tribunal também adotou essa tese, em várias oportunidades, entreoutras, no Recurso Extraordinário nº 83.835:

"Permanece válida e eficaz a lei ordinária anterior à Constituição, quetenha regulado matéria de lei complementar, desde que não contrastante comseus princípios e normas ou com o seu espírito." (RTJ 77/657 ). Da mesmaforma foi julgado o RE 83.091 - RTJ 81/855.

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Portanto, a legislação ordinária que reduziu o tempo de serviço para aaposentadoria está em vigor, não dependendo de lei complementar, porque esta éexigida pelo art. 103 da Constituição, via Presidente da República, sem qualquerincompatibilidade com o sistema ou normativamente, porquanto à lei complementarnada se exige, além daquilo que a lei ordinária dispôs, apenas a iniciativapresidencial, e o processo legislativo qualificado.

No presente caso, sob estudo, outra questão se põe. Não há direito adquirido àaplicação da Lei n° 3.313 àqueles que não preencheram o direito à aposentadoriaaté o advento da Lei n° 4.878. Não é crível que algum servidor tenha completado 25anos de serviço estritamente policial em 1965, pois daí poder-se-ia admitir o direitoadquirido, dentro da regra tempos regit factum.

Como observaram os votos vencidos no já mencionado Mandado deSegurança nº 719. Desembargadores José Manoel Coelho e Eduardo Ribeiro a Lein° 4.878 regulou a matéria relativa ao policial do Distrito Federal, que somente, porrecepção, poderia beneficiar-se da Lei nº 3.313. Portanto, a Lei nº 4.878, Estatuto doPolicial, rege completamente a matéria.

Para não alongar esse parecer a esta consulta, e dá-Ia mais rápida, a esteTribunal concluo com os votos vencidos (fls. 16-A e 30) já mencionados e a opiniãodo ilustre Procurador-Geral do Distrito Federal (fls. 72/74 e 107, initio). Acresce aindaque o Ministro Rafael Mayer, Relator do Agravo n° 92.614 interposto pelo DistritoFederal contra a decisão do Tribunal de justiça do Distrito Federal, deu provimento aesse agravo para mandar subir o Recurso Extraordinário, quando será examinada atese (DJ 30-5-83 - pág. 7655).

EM CONCLUSÃO

a) opinando pelo conhecimento da consulta;

b) opinando pela resposta negativa.____________Processo n° 1.578/83 - 30-5-83.

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III - NOTICIÁRIO DO TCDF

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TCDFII SEMINÁRIO SOBRE TRIBUNAIS DE CONTAS

(JUNHO DE 1983)

Presidência: Conselheiro Vivaldi Moreira

Conferência: Luiz Navarro de Brito - Procurador-Geral do Tribunal de Contasda Bahia

Tema:

Presidência: Conselheiro Parsifal Barroso

Conferência: Conselheiro David Alves de Melo

Tema: Fiscalização Financeira Municipal

Presidência: Conselheiro Rogério Nunes

Conferência: Professor Carlos Ayres de Brito, Procurador do Tribunal deContas de Sergipe e Procurador-Geral da justiça de Sergipe

Tema: Ministério Público e Tribunal de Contas

Presidência: Conselheiro Geraldo Ferraz

Conferência: Professor Eros Roberto Grau, da Faculdade de Direito da USP

Tema: Administração Indireta

Presidência: Conselheiro Fernando Tupinambá Valente

Painel com a participação da Inspetoria Geral do TCDF

Tema: Administração Indireta

Coordenador: Dr. Pedro Delforge

Presidência: Conselheiro Nelson Siqueira

Conferência: Antônio Marcelo da Silva, MP/SP

Tema: Licitação e Tribunal de Contas

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III SEMINARIO SOBRE TRIBUNAL DE CONTAS(MAIO DE 1984 )

PROGRAMA

Presidência - Conselheiro José Wamberto

Expositor - Onorato Sepe, membro da Corte de Contas da Itália

Tema: As Funções Jurisdicionais do Tribunal de Contas

Presidência - Conselheiro joel Ferreira

Expositor - José Borba Pedreira Lapa, Assessor jurídico do Tribunal de Contasdo Estado da Bahia

Tema: Controle de Legalidade dos Contratos pelo Tribunal de Contas

Presidência - Conselheiro Fernando Tupinambá Valente

Expositor - Carlos Ayres de Brito, Professor da Faculdade de Direito da UFSE;Procurador-Geral da justiça de Sergipe

Tema: As Funções Jurisdicionais do Tribunal de Contas

Presidência - Dra Elvia Lordello Castello Branco, Procuradora-Geral doTribunal de Contas do Distrito Federal

Expositor - Adilson de Abreu Dallari, Professor da PUC/SP Tema: Licitação

Presidência - Conselheiro Geraldo Ferraz Expositor - Antonio Carlos Cintra doAmaral, Professor da PUC/SP Tema: Administração Indireta

Presidência - Conselheiro Rogério Nunes

Encerramento - Conselheiro João Feder, Vice-Presidente do Tribunal deContas do Estado do Paraná

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POSSE DO CONSELHEIRO JOEL FERREIRA

Aos 24 dias do mês de agosto de 1983, às 15:00 horas, na Sala das Sessõesdo Tribunal, presentes os Conselheiros Rogério Nunes e Fernando TupinambáValente, os Conselheiros-Substitutos Raimundo de Menezes Vieira e ModestoMarques de Oliveira e o Procurador Dr. Roberto Ferreira Rosas, o Presidente,Conselheiro José Wamberto Pinheiro de Assunção, declarou aberta a sessão,especialmente convocada para ser dada posse ao Dr. Joel Ferreira da Silva,nomeado membro desta Corte de Contas no dia 17 do corrente mês.

Inicialmente, o Senhor Presidente convidou para tomarem assento à mesa oExmo. Senhor Governador do Distrito Federal, Coronel José Ornellas de SouzaFilho, o Prof. Euclides Pereira de Mendonça, representante do Ministro da Justiça, oMinistro Luciano Brandão Alves de Souza, do Tribunal de Contas da União, oDeputado Ary Kffuri, representante da Câmara dos Deputados, e o Senador PassosPorto, representante da Comissão do Distrito Federal.

Em seguida, o Senhor Presidente solicitou aos Conselheiros Rogério Nunes eFernando Tupinambá Valente que introduzissem no Plenário o novo ConselheiroJoel Ferreira da Silva, que prestou o compromisso de ser exato no cumprimento deseus deveres, assinando o respectivo termo.

Antes de conceder a palavra ao Conselheiro Rogério Nunes para saudar, emnome da Corte, o novo Conselheiro, o Senhor Presidente assim se expressou:

"Senhor Conselheiro Joel Ferreira da Silva,

Além do nosso eminente companheiro e Vice-Presidente Conselheiro RogérioNunes, que falará competentemente por todos nós para saudar Vossa Excelência,direi duas palavras. Duas palavras, apenas, para afirmar que Vossa Excelência seincorpora, neste solene momento, a uma Casa que se tem devotado ao seu dever. Auma Casa que tem procurado estar à altura das responsabilidades inerentes a umaCorte encarregada da fiscalização financeira e orçamentária da Capital daRepública, de uma cidade que se projeta como a mais moderna do mundo e querepresenta, ela mesma, uma antecipação na arquitetura e também na políticaadministrativa.

Nascendo com Brasília em 1960, este Tribunal surgiu também moderno. Em1962, com o Decreto local 196, de 5 de julho, recebeu os poderes de fiscalização da

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administração indireta, enquanto idênticas atribuições somente foram estendidas àsdemais Cortes em 1975, com a Lei n° 6.223. Já era, assim, expressiva a nossaexperiência nesse campo que, como sabemos, atinge o maior volume do orçamentobrasileiro.

Desde então, temos procurado renovar métodos, estudar experiências, levantaridéias. Isto nos leva a uma convivência mais freqüente, estreita e fraterna com osTribunais estaduais e municipais. Há pouco, de 22 a 24 de junho último, realizamosaqui mesmo um seminário que contou com o comparecimento de muitas Cortes deContas para um debate cordial e - posso assegurar - muito proveitoso.

E outra responsabilidade possui o Tribunal de Contas do Distrito Federal: aquitem sede a Secretaria Executiva do Centro de Coordenação dos Tribunais deContas do Brasil. É este um órgão encarregado, como, aliás, está claro em seunome, de estabelecer o relacionamento entre as Cortes no sentido de unir esforços,ordenar aspirações, encaminhar estudos visando ao aperfeiçoamento da estruturalegal que possibilite a defesa de um emprego sempre correto dos recursos públicos.

Ainda nesse capítulo, creio poder afirmar que somos bem sucedidos. Avigilância fiscalizadora deste Tribunal é feita didaticamente, preventivamente e, naspoucas vezes quando se torna necessário, também corretivamente. Nas poucasvezes, esclareço, porque o Governo do Distrito Federal tem sempre acatado asnossas decisões, muitas vezes nos ouvindo antecipadamente sobre questões nãocomuns que sempre surgem, demonstrando, assim, empenho e propósito de cumprirbem a lei e de servir à comunidade de forma racional e eficiente. É este umdepoimento espontâneo que presto por estrito dever de justiça.

Com este breve intróito, dou a palavra ao Conselheiro Rogério Nunes parasaudar o Excelentíssimo Senhor Conselheiro Joel Ferreira da Silva."

Transcreve-se, a seguir, o discurso do Conselheiro Rogério Nunes:

"Conselheiro Joel Ferreira

Numa viagem espiritual ao Amazonas, descortinei o esplendor da luxuriantefloresta, virgem e misteriosa, e sob o seu impenetrável manto verde vislumbrei amaior rede fluvial do Globo, onde os rios são estradas, por eles se escoam asriquezas rumo ao litoral e transita o essencial à vida da imensa região; através delesse faz visita, compra, passeio. Mas nada me impressionou tanto como a visão queeu tive da característica telúrica do homem amazônico, a sua personalidadeembebida da influência do solo, do clima, da água, das lendas e costumes,plasmada no seio da realidade ambiental, que lhe confere força e audácia para nãodeixar que a "terra-mãe o esmague no próprio gesto materno com que o amamenta".

Essa teria sido também a impressão do eminente sociólogo contemporâneoGilberto Freyre, ao distinguir no Amazonas a área de cultura mais impregnada dainfluência nativa, vendo que "o que aí se come tem ainda o gosto de mato; éenrolado em folha de palmeira e bananeira; leva castanha, prepara-se em cuia; épolvilhado de puçanga feita de folhas de "kurimikaá" torradas; e os nomes são aindaos dos índios, coro um quer que seja de estrangeiro à primeira vista. Mas só àprimeira vista".

E Barros Ferreira, quase místico, experimentou a sensação de que "aAmazônia ainda conserva a tepidez do último dia da criação... e as impressõesdigitais do Supremo Criador".

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Nessa minha visão, só não me foi possível divisar mais a fase áurea daborracha, quando a reserva brasileira no mercado mundial chegou a alcançar 98%do produto. Isto ficara para trás. A sombra do tempo apagou a imagem do períodoem que começou o declínio desse comércio, a época do grande esplendor deManaus, em que tudo para ali chegava do Velho Mundo. A cultura vinha da França;da Inglaterra, o dinheiro; Portugal mandava o vinho; e até a mãos-de-obraespecializada chegava de fora para embelezar a cidade, como demonstrado noadmirável acervo do Teatro Amazonas.

Quem quer que preste o seu depoimento sobre a região com relação ao seupassado e a realidade atual, jamais poderá fazê-lo melhor do que o ilustre filhodaquele berço que hoje vem integrar o Corpo de Juízes desta Corte de Contas:Conselheiro Joel Ferreira.

Ninguém como .ele seria capaz de com mais acerto discorrer sobre a sua terranativa e acerca do irmão amazônide, do meio em que este vive e a sua conseqüentevocação para vencer os mais sérios desafios, isto porque S. Exª., vindo de lá,passou a existência convivendo com as dificuldades que a maioria dos brasileiros sósabe que existem através de imagens mostradas pelos meios do comunicação.

Amazonense da hospitaleira Manaus, berço do "Muriaquitã", verde amuleto deraras e misteriosas propriedades, nasceu o nosso novo colega no espaço coradopelo equador térmico, o paraíso da luz vibrante, como a vêm os estudiosos doterritório amazônico, e ali aprendeu, desde cedo, com a gente da terra, comoconseguir vencer o meio ambiente e dele extrair o fator econômico que prende ohomem ao lugar em que vive. Lutou e sofreu, porque sempre viveu numa terra dehomens que sofrem e lutam.

Quando milhares de nordestinos embarcados nos "Ita" da Costeira e nosnavios do "Loide", comboiados pela Marinha de Guerra, chegavam para a batalha daborracha, na época da guerra, ele testemunhou o notável feito desses heróicosirmãos.

Ali cresceu, fez-se rapaz e enfrentou, com grandes dificuldades, os estudos.Formou-se em Direito. Prestou concurso público e foi nomeado Fiscal do Trabalho.Mas não deixou o seu Amazonas. Assistiu às transformações, acompanhou anervosa alegria da prosperidade na fase de progresso, ao lado do conformadosofrimento da pobreza.

É exatamente aí, ao que me parece, que começa a desvendar-se o recônditomotivo que o levou a sentir a necessidade de impor a si próprio o ônus de servir àcomunidade. Daí, foi um passo o seu engajamento à política partidária, para assumira obrigação de lutar pelo bem-estar coletivo, por melhores dias para a sua gente;demonstrar, com a sua atuação na vida pública, que amava o solo em que nasceu eestava pronto a batalhar por ele.

Candidatou-se a Deputado Estadual e elegeu-se. Foi o seu primeiro êxito nasurnas. A escolha do seu nome poderia parecer ocasional, fruto de uma circunstânciafavorável. Mas não, porque durante 28 anos seguidos exerceu mandatos eletivos,conferidos pelo voto de seus conterrâneos, não apenas dos que habitavam -acidades, mas também dos que moravam nas longínquas aldeias às margens dosigarapés formados pelo rio Negro ou dos povoados existentes à beira do barrentoSolimões, em cujos quadrantes desfilam aqueles que possuem característicastelúricas mais acentuadas, sejam seringueiros, balateiros, caucheiros, mateiros,

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toqueiros, comboieiros ou qualquer outro desbravador da inóspita selva subjugado àinfluência do solo, da água, do clima, das lendas e costumes.

Na assistência a esses correligionários, deixava a cidade para penetrar nosertão. Percorreu "varadouros" e trilhou o espaço palmilhado por aquele irmãobrasileiro de que nos fala o sempre atual Euclides da Cunha: "o rude seringueiroduramente explorado, vivendo do pedaço de terra em que pisa por longos anosexigindo ingentes providências que lhe garantam resultados a tão grandes esforços.O quase-servo que vive à mercê do império discricionário dos patrões e onde ajustiça é naturalmente serôdia e nula..."

Mais tarde, quando o Governo Federal procurou dar à região a possibilidade desoerguer-se, ele viu o florescer da Zona Franca e a trajetória industrial da suacidade; a abertura de nova fronteira de progresso chegando ali.

Exerceu relevantes funções no seu Estado, dentre elas a presidência daAssembléia Legislativa, de onde foi convocado para assumir temporariamente, porduas vezes, a Chefia do Poder Executivo. E na Câmara Federal, representando oAmazonas, integrou as Comissões de Finanças, Valorização da Amazônia, RelaçõesExteriores, Comunicação e Segurança Nacional, além de haver desempenhadocargos na Mesa Diretora e exercido as atividades de vice-líder de bancada.

Não foram de pouca monta os serviços prestados à Nação pelo nosso novocolega. Aqui registro, em rápida síntese, somente algumas das atividades queexerceu, mas o suficiente para mostrar que com os conhecimentos acumulados naAdministração Pública, particularmente na Chefia do Executivo estadual, sornados àvasta experiência parlamentar, a sua inteligência. a sua lição de serena energia, asua força de vontade, muito se enriquecerá com a sua presença o Tribunal deContas do Distrito Federal.

Vou terminar. Não devo distanciar do recém-chegado o momento que o seucoração espera ansioso: os parabéns de seus amigos e colegas; o abraço carinhosoda esposa e filhas.

Assim, Conselheiro Joel Ferreira, por mim e pelos meus prezadoscompanheiros, que muito me honraram ao me conferirem delegação para falar nestasolenidade de sua posse, eu o saúdo, na efusão do mais vivo apreço, formulando osmelhores votos para que seja feliz na nova etapa de sua vida pública."

O Procurador Dr. Roberto Ferreira Rosas pediu a palavra para associar-se, emnome do Ministério Público junto a esta Corte, às manifestações cie regozijo pelaposse do novo Conselheiro ciente da valiosa contribuição que Sua Excelênciapoderá dar ao Tribunal com sua vasta e rica experiência de homem público.

O Conselheiro Joel Ferreira da Silva pronunciou a seguinte oração deagradecimento:

"Exm° Sr. Dr. José Wamberto DD. Presidente desta Corte Exm° Sr.Governador José Ornellas Exm°s Srs. Conselheiros Exm°s Srs. Ministros Exm° Sr.Representante da Procuradoria Geral Exm°s Senadores. Exm°s SenhoresDeputados Senhores Auditores Senhores Procuradores Senhoras e Senhores

Mesmo vindo dos largos, liberais e polêmicos caminhos do parlamento, ondedediquei os melhores anos de minha vida ao longo dos 28 anos ininterruptos demandato, sinto-me emocionado diante deste novo e seleto ambiente, ladeado portão ilustradas figuras.

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Debito este espanto à minha origem de menino que só aos 15 anos viu, pelaprimeira vez, uma carta do ABC. E ao mesmo que sempre tive de defrontar-rne coma mais difícil de todas as tarefas: a de julgar.

Preferi sempre defender a acusar, ser julgado a julgar.

Criança, ainda, e até chegar ao parlamento, exerci as mais humildes e rudesprofissões.

Ajudado por Deus e outros amigos, em 1954 o povo colocou-me noparlamento, reelegendo-me seguida e sucessivamente, tornando me o únicoamazonense com cerca de 30 anos de mandato. Ali construí a muralha da defesados fracos, dos pobres, dos que não tinham como defender-se.

Deixei no meu Estado uma obra da qual sempre terei sadio orgulho e sobre aqual os olhares das futuras gerações obrigatoriamente hão de passar.

Aqui, nesta seleta e alta Corte, o verbo mais freqüente é o julgar. Este verbome assusta; mas é com ele que terei de conviver daqui por diante.

Como os que transformam dores em motivos de alegria, também eu, quandoestiver julgando, convencer-me-ei de que estarei defendendo a sociedade, napermanente vigilância do bom emprego dos recursos e bens de seu povo, por partedos detentores do poder.

Assim, afastarei de mim o fantasma do juízo, para ter presente a glória dadefesa.

Se ao parlamento e ao povo servi nos mais verdes anos da existência, a estaCorte de Contas quero emprestar os mais experientes e vividos anos de minha vida.

Lá, no parlamento, construí um valioso e indestrutível patrimônio que o temponão demolirá: as muitas e duradouras amizades que conquistei. Estas não têmpreço.

Se aqui, concomitantemente com a defesa dos altos interesses da sociedade,puder também angariar amizades como fiz no parlamento, estarei plenamentecompensado.

O mesmo destino que, aos 15 anos, me colocou uma carta do ABC nas mãos,fez-me, por 3 décadas, membro do Poder Legislativo e agora, talvez, pelo resto dosanos, por semelhança, membro do Poder judiciário,

Fui fiel ao destino. Cumpri sua determinação. Por não haver conhecido infâncianem juventude, também não tinha tempo a perder. Foi apenas esta a exigência queo destino me fez: não perder tempo. Para buscar o futuro, sem poder retornar aopassado, teria que avançar, partindo as algemas do tempo, em busca do futurodesconhecido. Li toda carta do ABC; li outros livros, empurrei com violência a inérciae os inertes, avistei o horizonte e segui.

É certo que o Brasil passa por dias conturbados e seu futuro parecedesconhecido. Sua principal crise não é a econômico-financeira - mas a decredibilidade nos homens públicos. É urgente que esta desapareça antes dequaisquer outras.

Hoje integro esta Egrégia Corte de Contas. Ambiente novo para mim, masespero, aprendendo da sabedoria de seus ilustres membros e servidores e com a

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cooperação do Ministério Público, bem servir à sociedade, na defesa de seusinteresses.

Aqui virão todos os atos da Administração do Distrito Federal, no respeitante abens e valores de interesse público. Daqui, no âmbito das Cortes de Contas, não hárecursos. Ainda que controvertidas em outros aspectos, o pensamento é unânime,de que, no julgamento dos bens e valores públicos, suas decisões são terminativas.

Termino agradecendo aos muitos amigos que comigo foram e são solidários ecomigo se alegram nesta hora.

Peço perdão por não os citar nominalmente. Quero, porém, com muita alegriaexternar meus agradecimentos, do fundo do coração, aos diletos amigos quemenciono:

Aos meus familiares - presentes ou não Ao Dr. Antunes de Oliveira AoPresidente João Figueiredo Ao Deputado Nelson Marchezan Ao Vice-PresidenteAureliano Chaves Ao Ministro Ibrahim Abi-Ackel Ao Senador José Sarney AoSenador Raimundo Parente Ao Deputado Amaury Mulher Ao Deputado Paulo Malufe Ao Governador José Ornellas.

Senhor Presidente, a Vossa Excelência, ao Excelentíssimo Senhor ConselheiroRogério Nunes e ao Procurador Dr. Roberto Ferreira Rosas, o meu melhor apreço eo mais alto reconhecimento por tudo quanto sobre mim afirmaram.

A todos os presentes, meu fraternal abraço."

O Senhor Presidente, após expressar o agradecimento da Corte a SuaExcelência o Governador do Distrito Federal e aos Exmos. Senhores Ministros,Conselheiros, Senadores, Deputados e Secretários de Estado por seucomparecimento à solenidade, declarou encerrada a Sessão, às 17:30 horas. E,para constar, eu, Alberto Xavier de Almeida, Secretário das Sessões, lavrei apresente Ata, que, depois de lida e achada conforme, vai assinada pelo Presidente,Conselheiros e Procuradora-Geral.

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HOMENAGEM AO CONSELHEIRO SUBSTITUTOJESUS DA PAIXAO REIS

SESSÃO DE 2 DE FEVEREIRO DE 1984

Encerrada a fase de julgamento de processos, o Senhor Presidente propôs quese consignasse em ata o profundo pesar da Corte pelo falecimento, ocorrido duranteo recesso, do Auditor Jesus da Paixão Reis, "grande e brilhante companheiro, deelevado espírito público e correção inigualável".

A Procuradora-Geral Dra. Elvia Lordello Castello Branco e osConselheiros-Substitutos Raimundo de Menezes Vieira e Modesto Marques deOliveira discorreram sobre as excepcionais qualidades do companheirodesaparecido, destacando seu caráter, inteligência, dedicação, bondade,competência jurídica e firme cultura.

O Conselheiro Fernando Tupinambá Valente, que apenas pôde conhecê-lo àdistância, e o Conselheiro Joel Ferreira, que não teve a oportunidade de conhecê-lo,associaram-se à homenagem - da qual dar-se-á ciência à família do Auditor JesusReis.

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HOMENAGEM AO CONSELHEIRO PARSIFALBARROSO

Aos 6 dias do mês de julho de 1983, às 15:00 horas, na Sala das Sessões doTribunal, presentes os Conselheiros Geraldo de Oliveira Ferraz, Rogério Nunes eFernando Tupinambá Valente, o Conselheiro-Substituto Raimundo de MenezesVieira, o Auditor Modesto Marques de Oliveira e o Procurador-Geral em exercício Dr.Lincoln Teixeira Mendes Pinto da Luz, o Presidente, Conselheiro José WambertoPinheiro de Assunção, declarou aberta a sessão, especialmente convocada para ashomenagens da Corte ao Conselheiro José Parsifal Barroso, que se aposentou emvirtude de ter completado ontem 70 anos de idade.

O Senhor Presidente deu conhecimento ao Plenário de telegrama do MinistroWilson Gonçalves, do Tribunal Federal de Recursos, associando-se às homenagensque são prestadas hoje ao Conselheiro José Parsifal Barroso.

A seguir, o Senhor Presidente pronunciou as seguintes palavras:

"Senhores Ministros, Senhores Parlamentares, Senhores Conselheiros,Senhores Auditores, Senhor Procurador-Geral, Senhor Secretário das Sessões,Autoridades, Servidores desta Corte, Excelentíssima Senhora Olga Barroso, minhasSenhoras, meus Senhores.

Este Tribunal inicia neste momento uma sessão especial. Diria muito especial,para prestarmos uma indeclinável homenagem a um dos mais eminentes homenspúblicos brasileiros e que nos deu a subida honra de conviver conosco durante 6anos. Uma convivência agradável, cordial e cheia de ensinamentos para nós. E quetodos nós esperamos que não se interrompa com a sua aposentadoria que hojeacontece.

O Conselheiro José Parsifal Barroso, um cearense ilustre que já percorreutodas as altas escalas da vida política e administrativa do Brasil; o escritorconsagrado de vários ensaios de sociologia e de antropologia; o professor admiradode várias gerações em ginásios e faculdades superiores; e figura humana irradiandobondade, compreensão e companheirismo; o chefe de família exemplaríssimoorientando e assistindo seus descendentes, enfim, um homem de que os seuscontemporâneos só têm motivos para votar-lhe admiração, apreço e estima.

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Para dizer tudo isso em termos mais precisos, o Plenário desta Corte designouaquele que mais recentemente chegou a esta Casa, o eminente ConselheiroFernando Tupinambá Valente, também um nordestino maranhense, embora comcidadanias ainda da Bahia e de Brasília.

Assim, dou a palavra ao Conselheiro Fernando Tupinambá Valente, parasaudar, em nome do Tribunal de Contas do Distrito Federal, o Conselheiro JoséParsifal Barroso."

Assim se expressou o Conselheiro Fernando Tupinambá Valente:

"Seria bem mais fácil, se, interpretando restritivamente a delegaçãohonrosamente outorgada pelo Presidente José Wamberto e demais Conselheirospara traduzir em palavras as nossas justas e merecidas homenagens ao nobreConselheiro José Parsifal Barroso, que, impelido por dispositivo constitucional, deixade participar, fisicamente, da nossa Corte de Contas, a partir de hoje, limitasse meupronunciamento à sua passagem nesta Casa.

Ocorre que não se trata da aposentação de um brilhante componente desteTribunal, mas do encerramento de uma luminosa "carreira funcional", e insisto naexpressão, pois nosso conhecimento do homenageado, embora recente, é bastantepara sentir que o mestre Parsifal, mais uma vez, estará apenas mudando o rumo desua fascinante vida pública. Mas, como dizia, não se trata de uma rotineiramanifestação ao Conselheiro que, depois de bem cumprida sua missão, faz opçãopelo justo e merecido descanso.

"Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixodo céu."

"Há tempo de nascer, e tempo de morrer, tempo de plantar, e tempo dearrancar o que se plantou."

Nasceu o nosso homenageado na ensolarada Fortaleza, do Estado do Ceará,há exatamente 70 anos, onde também realizou os seus estudos, inclusive o grauuniversitário em Ciências jurídicas e Sociais na Faculdade de Direito do Ceará.Mesmo antes de formar-se já se dedicava ao magistério no Instituto São Luís e notradicional Colégio Militar do Ceará; o fascínio pelo magistério foi tamanho quejamais o abandonou, mesmo quando importantes e absorventes atividades dosimportantes cargos ocupados reduziram sua disponibilidade de tempo.

Em 1936 iniciava a atividade política na condição de Deputado Estadual daClasse dos Professores, atividade que seria posteriormente consolidada comsucessivas eleições para a Assembléia Legislativa do Estado do Ceará, SenadoFederal e Câmara dos Deputados.

A partir de 1956, no exercício do mandato de senador, seu caminho cruza pelaprimeira vez com a Capital Federal: escolhido pelo Presidente Juscelino Kubitschek,assume o cargo de Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, realizando umaprofícua administração.

Uma das atividades que mereceram destaque na sua administração - naqueleMinistério - foi sem dúvida a construção de Brasília, pois os diversos Institutos dePrevidência Social vinculados à sua Pasta construíram os blocos residenciais dassuperquadras no seu segundo encontro com a nossa Capital.

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Estava o nosso Parsifal Barroso "cm tempo de espalhar pedras, e em tempo deajuntar pedras", novamente...

Eleito Governador do Estado do Ceará pelo voto popular, no período 1959/63,teve oportunidade de realizar grandes obras em benefício do seu Estado natal,principalmente em Fortaleza, como o planejamento e construção da avenidaLeste/Oeste, além de grandes realizações na área de educação e no campoadministrativo, sobressaindo-se a fundação do Banco do Estado do Ceará, hoje umdos sustentáculos da atividade econômica daquela unidade da Federação.

"Tempo de rasgar, e tempo coser."

Retorna ao Parlamento, em decorrência de eleição para a Câmara dosDeputados, marca um novo encontro, desta vez mais longo e estreito com Brasília.

Em 1977, dando continuidade de certa forma à sua vinculação ao PoderLegislativo, chega a esta Corte, na qualidade de "braço alongado do Senado", e,embora sua presença nesta Casa tenha sido relativamente curta, foi suficiente paramarcar sua presença como julgador e administrador: relator das contas do Governoem 1978 e Presidente do Tribunal no ano de 1979, oportunidade em que novamenteaflorou sua grande capacidade de administrar. Ampliação das instalações físicas doTribunal, reestruturação administrativa dos serviços auxiliares, criação do Centro deEstudos Heráclio Salles, reorganização da Biblioteca são alguns dos eventos quemerecem ser aqui relembrados.

"Tempo de amar e, tempo de aborrecer."

Observando a vida do Conselheiro Parsifal Barroso constato que nela nãohouve um tempo determinado para o amor em sua vida.

Tudo o que até agora realizou foi feito com muito amor, pois jamais imaginoupoder dirigir o curso do amor, pelo contrário, sempre permitiu que o amordeterminasse o curso de sua vida.

Daí o sucesso, daí a conclusão de que não houve tempo certo para amar, poistodos os minutos de sua vida foram dedicados ao amor, e como prova do queafirmamos, aqui estão: D. Olga, companheira e amiga de todos os momentos; osseus filhos Vera Maria, Francisco Regis, Roberto Parsifal, Siglinda Maria e OlgaEmília; os amigos que soube conquistar, muitos aqui presentes ou desta Casa.

Mas também "há tempo de chorar e tempo de rir; tempo de estar calado etempo de falar".

Assim seus amigos, sobretudo os desta Casa, choram e riem, eis que estãotristes e alegres.

Tristes porque irão perder o convívio diário com o mestre e amigo, porémalegres por vê-lo completar mais uma etapa de sua fascinante vida e receber o justoprêmio da aposentadoria.

Alegria por pressentirem que encerrada a sua carreira funcional, abre-se-lhe aoportunidade de dar uma nova direção à sua vida pública, e por saberem que sehouve tempo de estar calado, haverá tempo de falar.

Senhor Professor, Senhor Deputado, Senhor Procurador, Senhor Senador,Senhor Ministro, Senhor Presidente, Senhor Governador, Senhor Conselheiro,cidadão Parsifal Barroso.

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Poucos homens públicos, muito poucos mesmo, tiveram a feliz oportunidade deocupar tão importantes cargos e por tanto tempo. Ao longo do último meio séculoVossa Excelência teve oportunidade de participar da História do Brasil em condiçõesprivilegiadas.

Este privilégio, além de dar sentido maior à vida, a sua, hoje muito vinculada àHistória do Estado do Ceará, da Capital Federal e do Brasil, gerou umaresponsabilidade para Vossa Excelência para com a História; é verdade que estedébito tem sido amortizado, sobretudo em conversas com seus amigos nosintervalos das reuniões deste Tribunal, por exemplo. Porém é tempo de eliminar esteprivilégio de uns poucos.

É hora de falar para a História das histórias das quais Vossa Excelênciaparticipou, ainda que como espectador, dos 70 (setenta) anos, dos quais mais de 50dedicados à vida pública e pelo menos 22 diretamente dedicados à Capital Federal.

Seus filhos, seus alunos seus eleitores, seus admiradores, seus amigossugerem que, com a autoridade que hoje desfruta face à sua experiência nomagistério, na política e na administração pública, dentre as alternâncias para anova fase de sua vida pública, seja incluída, ou melhor, volte a ser incluída a decronista.

É tempo de "terminar e tempo de agradecer".

Obrigado, mestre Parsifal Barroso, pela sua lição de vida, pelo seu exemplo, esobretudo pela sua humanidade.

Que nosso bom Deus, que conhece as nossas necessidades antes mesmo queelas nasçam em nós, continue a iluminar suas decisões e caminhos, fazendo comque suas realizações nos próximos decênios continuem a suplantar as expectativasmais otimistas dos seus amigos e admiradores.

O Senhor Presidente, em seguida., deu a palavra ao representante doMinistério Público, o Procurador-Geral em exercício Dr. Lincoln Teixeira MendesPinto da Luz, que proferiu o discurso a seguir transcrito:

"Excelentíssimo Senhor Presidente Preclaras autoridades que nos honram comsua presença Excelentíssimos Senhores Conselheiros e ProcuradoresExcelentíssima Senhora Dona Olga Barroso Demais autoridades presentesSenhoras e Senhores

Apraz-me externar o sufrágio do Ministério Público às homenagens que recebedesta Casa a figura nacional de Parsifal Barroso, 'no momento em que, após meioséculo de fecundante e incansável atividade, se desliga formalmente do serviçopúblico.

Sua magnífica folha de serviços à Nação lhe assegura lugar de relevo nãosomente na história desta Corte, mas, sem favor, na galeria das personalidades que,em qualquer tempo, tomaram assento nas bancadas dos Tribunais de Contaspátrios.

No desempenho das mais nobilitastes tarefas reservadas ao homem público,como Deputado estadual, Deputado federal ou constituinte, Professor Universitárioou Senador da República, Governador eleito de seu Estado natal ou Ministro deEstado, soube S. Exa granjear o conceito de grande respeitabilidade pessoal efuncional, graças a dedicação, seriedade e sabedoria política nunca desmentidas.

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A despeito das galas conquistadas em tão preclaras funções, chegou o MinistroParsifal Barroso a este Tribunal imbuído de exemplar humildade. Todo o rico fundode discernimento e experiência acumulado ao longo de sua frutuosa vida pública eleo pôs, devotadamente, a serviço do novo cargo. Com entusiasmo de iniciante, mascom a profundidade do veterano, debruçou-se S. Exª., com desvelo, sobre cada qualdos processos trazidos à consideração do Plenário, concedendo igual atenção aosassuntos transcendentes e à mais trivial e comezinha das matérias.

Em Parsifal Barroso aprendemos a admirar, entre os traços incomuns de suapersonalidade, a cultura humanística, histórica e política, revelada quer noseloqüentes e densos improvisos de que é capaz a propósito de praticamentequalquer tema. quer na mais despretensiosa das conversas em que reafirma sempreo diversificado campo de seus conhecimentos e interesses; aprendemos a admirar oirretocável sentimento de amor à terra natal, seja ela o seu querido Estado do Ceará,seja o Brasil como um todo, cujas vitórias e dificuldades nele sempre encontram oobservador atento e o analista com pensamento próprio; aprendemos a admirar,acima de tudo, a inexcedível cordialidade e o espírito democrático, que o levam adispensar tratamento idêntico à mais alta das autoridades e ao mais humilde doscidadão, mercê do raro talento de agraciar seus interlocutores com consideraçãotoda especial, de modo que cada um deles se sinta escolhido, individualizado,singular.

E nessa época de calculismo, massificação e pressa, a virtude me parece porcerto remarcável.

Intuitivo, é perceber o quanto, doravante, sentirá esta Casa a ausência dequem tanto a dignificou.

Aceite Senhor Conselheiro Parsifal Barroso os agradecimentos da ProcuradoriaGeral pelas distinções de que constantemente nos cumulou, juntamente comcalorosos votos de felicidade pessoal e de novos êxitos na trajetória pública que,fora deste Tribunal, há de prosseguir com o brilho de sempre".

Foi concedida a palavra ao homenageado para seu agradecimento.

O Conselheiro José Parsifal Barroso, depois de referir-se ao honrosocomparecimento de cinco Ministros do Tribunal de Contas da União à solenidade ede prestar tributo especial a sua esposa, Dona Olga - "companheira de toda a vida, aquem tudo devo" -, comentou as palavras de despedida proferidas peloscompanheiros e amigos Presidente José Wamberto, Conselheiro FernandoTubinambá Valente e Procurador-Geral em exercício Dr. Lincoln Teixeira MendesPinto da Luz. Generosidade à parte, nelas verifica a afirmação de um nobresentimento cada vez mais escasso em nossa época; o reconhecimento ao homempúblico pelo que tentou realizar em favor do País e do povo.

Prosseguindo, o Conselheiro José Parsifal Barroso fez um balanço dos seisanos passados nesta Casa, onde encontrou um ambiente de elevado e fraternoconvívio. Recordou as vitórias obtidas pela Corte, sem alarde, em sua zelosa,serena e sábia ação fiscalizadora. Relembrou também a árdua tarefa que lhe foiconfiada no Congresso dos Tribunais de Contas realizado em Maceió de ser relatorda matéria referente à obtenção de Emenda Constitucional que consubstanciasse,de maneira firme e completa, a institucionalização das Cortes de Contas do Brasil;aprovado no Congresso de Florianópolis, o anteprojeto da Emenda encontra-seainda hoje no Ministério da justiça. Lamentando deixar inconclusa a tarefa, disse

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que, se permitido lhe fosse pedir alguma coisa, rogaria a seus colegas odesempenho de uma vigilância constante e contínua para levar adiante a duracampanha, até torná-la vitoriosa.

Finalizando suas palavras, o Conselheiro Parsifal Barroso agradeceu a Deus aoportunidade de encerrar sua vida pública neste Tribunal, a que tanto se afeiçoou, edeixou a todos o testemunho de sua cordial e duradoura gratidão.

Antes de declarar encerrada a sessão, o Senhor Presidente afirmou que oapelo do Conselheiro Parsifal Barroso em prol da Emenda Constitucional não será,está sendo atendido, haja vista a tenaz atividade da Secretaria Executiva do Centrode Coordenação dos Tribunais de Contas do Brasil nesse sentido. Observou aindaque o Conselheiro José Parsifal Barroso deveria repetir o gesto nordestino - quandoalguém deixa uma casa amiga, diz simplesmente: "irão me despeço".

Concluindo suas palavras, agradeceu o comparecimento à solenidade dasseguintes autoridades: Ministros Inácio Moacir Catunda Martins e Jesus Costa Lima,do Tribunal Federal de Recursos; Ministros Luiz Octávio Pires e AlbuquerqueGallotti, Ewald Sizenando Pinheiro e Luciano Brandão Alves de Souza, do Tribunalde Contas da União; Dr. José Carlos Mello, Secretário de Viação e Obras do DistritoFederal; Ministros-Substitutos José Antônio Barreto de Macedo e Lincoln Magalhãesda Rocha, do Tribunal de Contas da União; e o Dr. Hermenegildo FernandesGonçalves, juiz de Direito do Tribunal de justiça do Distrito Federal e Territórios,antigo Procurador junto a esta Corte.

Nada mais havendo a tratar, às 17:30 horas o Senhor Presidente declarouencerrada a sessão. E, para constar, eu, Alberto Xavier de Almeida, Secretário dasSessões, lavrei a presente ata; que, depois de lida e achada conforme, vai assinadapelo Presidente, Conselheiro e Procurador-Geral em exercício.