universidade federal do cearÁ centro de tecnologia departamento de engenharia hidrÁulica e...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA HIDRÁULICA E AMBIENTAL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA CIVIL (POSDEHA)
ANDERSON BARBOSA ARAÚJO
PANORAMA, ESTIMATIVA E AVALIAÇÃO DO POTENCIAL DE PRODUÇÃO E
UTILIZAÇÃO DO BIOGÁS DE REATORES UASB EM ETES OPERADAS PELA
COMPANHIA DE ÁGUA E ESGOTO DO CEARÁ
FORTALEZA
2019
ANDERSON BARBOSA ARAÚJO
PANORAMA, ESTIMATIVA E AVALIAÇÃO DO POTENCIAL DE PRODUÇÃO E
UTILIZAÇÃO DO BIOGÁS DE REATORES UASB EM ETES OPERADAS PELA
COMPANHIA DE ÁGUA E ESGOTO DO CEARÁ
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-
Graduação em Engenharia Hidráulica e
Ambiental, da Universidade Federal do Ceará,
ênfase em Saneamento Ambiental, como
requisito parcial para obtenção do título de
Mestre em Engenharia Civil (Recursos
Hídricos).
Orientador: Prof. Dr. André Bezerra dos
Santos.
FORTALEZA
2019
ANDERSON BARBOSA ARAÚJO
PANORAMA, ESTIMATIVA E AVALIAÇÃO DO POTENCIAL DE PRODUÇÃO E
UTILIZAÇÃO DO BIOGÁS DE REATORES UASB EM ETES OPERADAS PELA
COMPANHIA DE ÁGUA E ESGOTO DO CEARÁ
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-
Graduação em Engenharia Hidráulica e
Ambiental, da Universidade Federal do Ceará,
ênfase em Saneamento Ambiental, como
requisito parcial para obtenção do título de
Mestre em Engenharia Civil (Recursos
Hídricos). Área de concentração: Saneamento
Ambiental.
Aprovado em: 22/11/2019.
BANCA EXAMINADORA
________________________________
Prof. Dr. André Bezerra dos Santos (Orientador)
Universidade Federal do Ceará (UFC)
________________________________
Prof. Dr. Francisco Suetônio Bastos Mota (Examinador interno)
Universidade Federal do Ceará (UFC)
________________________________
Prof. Dr. Marcos Erick Rodrigues da Silva (Examinador externo)
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE)
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, Francisco Josineto e Ana Beatriz, por não terem deixado de
perguntar para mim o que estava faltando para eu defender minha dissertação, ainda que meu
silêncio fosse minha resposta; por não terem me deixado desistir, por estarem sempre
presentes quando eu precisava e por mostrar o significado mais puro do amor.
À minha irmã, Josiana Beatriz, pelas constantes distrações como tentativas de me
fazer desopilar e por mostrar, diariamente, que ser apaixonado pelo que faz é o diferencial
para a qualidade do resultado final.
À Conceição de Maria (in memorian), pelos repetidos exemplos de perseverança e
hombridade e pelas vezes em que botou em prática o clichê de que “quem acredita sempre
alcança”. Que o tempo me permita conservar você e suas lições de vida sempre límpidos na
minha memória e no meu coração.
Ao meu orientador, Prof. Dr. André Bezerra dos Santos, que, mesmo atribulado,
não só aceitou me acompanhar no início do ciclo de mestrado, enquanto eu ainda trabalhava
na CAGECE, mas também permaneceu ao meu lado, com muita paciência, quando a
dissertação era minha última prioridade de vida. Obrigado por ter acreditado e confiado em
mim, por nunca ter duvidado do meu potencial, ainda que eu mesmo questionasse ser
merecedor disso.
Ao Pedro Mouta, graduando em Engenharia Ambiental, também aluno do
professor André, pelas ajudas montando e verificando planilhas, apontando meus erros e me
ajudando a decidir que diretrizes adotar na representação dos resultados.
À banca avaliadora, Prof. Dr. Suetônio Bastos Mota e Prof. Dr. Marcos Erick
Rodrigues da Silva, por disponibilizar tempo para ler a dissertação, questionar e assistir à
defesa, contribuindo para o melhoramento do ambiente acadêmico de discussão e produção
científica, tão minado e renegado, ultimamente, por governantes e ignorantes da sociedade
civil.
Aos meus amigos, Vicente, Karinne, Pedro, Ananda, Lia, Karine, Ana Cléa,
Mariana, Mayla, Tito, Júnior, Dudu, Wescley, Roberto, Breno, Ricarte, Laurentino, Carla,
Virgínia, Anderson, Íkaro, Renata, Carol, Leonardo e tantos outros que me deram dicas, que
me fizeram rir e criar forças para voltar para casa renovado, preparado para mais uma sessão
de leitura, digitação, análise e manipulação de dados na frente do computador.
À Universidade Federal do Ceará (UFC), ao Departamento de Engenharia
Hidráulica e Ambiental (DEHA), a todos os professores e demais colaboradores do Programa
de Pós-Graduação em Engenharia Civil (Recursos Hídricos), com ênfase em Saneamento
Ambiental, pela oportunidade de promover um ambiente de ensino de altíssima qualidade,
incentivando a produção científica e instigando todos os alunos, sem descriminação, a
fazermos a diferença no mundo, começando pela nossa comunidade, ao nosso redor.
À Companhia de Água e Esgoto do Ceará (CAGECE), por ter me acolhido em
primeiro momento como estagiário e, posteriormente, como engenheiro; por ter me ajudado a
vivenciar os conhecimentos, em sua maioria, teóricos da Universidade de uma maneira prática
e por disponibilizar os dados para levantamentos e estimativas contidos nessa dissertação.
À Secretaria Municipal do Desenvolvimento Habitacional de Fortaleza
(Habitafor), meu atual ambiente de trabalho, pelas vezes em que precisei me ausentar
fisicamente ou ainda por compreender as ocasiões em que estava presente de corpo, mas com
a mente em outro lugar. Em especial, gostaria de agradecer à Salomit, Mariana, Bia, Tânia,
Cadinho, Adna, Carliane, Gorete, Eliene, Claudinha e Geane por conseguirem aliviar o peso
de acordar cedo todos os dias e enfrentar as adversidades do cotidiano laboral.
Ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Estações Sustentáveis de
Tratamento de Esgoto – INCT ETEs Sustentáveis, pelo pioneirismo na busca por fontes
renováveis de energia.
Por fim, agradeço a todos os que aqui não foram citados, mas que, pessoalmente
ou por pensamento, direto ou indiretamente, constante ou esporadicamente, torceram por
mim, me apoiaram e me ajudaram a fechar mais um ciclo na minha vida, o qual me permitiu
alcançar o título de Mestre em Engenharia Civil.
"Como é maravilhoso que ninguém precise esperar um
minuto sequer antes de começar a melhorar o mundo."
Anne Frank, 1947
RESUMO
Esse trabalho teve como objetivo diagnosticar e avaliar o potencial de aproveitamento
energético do biogás de reatores UASB em ETEs operadas pela CAGECE. Para inventariar
essas estações de esgoto, quantificá-las por tecnologia adotada, classificá-las quanto ao porte
por população e vazão e estimar a eficiência das ETEs com reatores UASB, foram levantadas
planilhas junto à CAGECE e consultada a base de dados da ANA. Adicionalmente,
utilizaram-se literaturas atualizadas para levantamento de taxas de consumo de energia
elétrica e de energia térmica, além de índices de produção de DQO e de biogás. Os resultados
obtidos, após tratamento estatístico adequado e exclusão de outliers, foram representados,
com a ajuda do Excel, em formatos de gráficos, tabelas e quadros. Dessa forma, embora se
tenha notado superioridade numérica da tecnologia decanto-digestor em estações de micro e
pequeno porte, percebeu-se grande viabilidade quanto à utilização da energia térmica do
biogás proveniente das ETEs com reatores UASB para cocção de alimentos em fogões
apropriados. Apreendeu-se também que, durante a análise das eficiências das estações com
reatores UASB, a maioria das ETEs ficou enquadrada nas categorias de pior situação (PS) e
situação típica (ST), bem como foi fácil perceber que aquelas em que a rota tecnológica
contemplava um pós-tratamento apresentaram maior poder de remoção de DQO do que as
sem pós-tratamento. Em relação ao cenário proposto para substituição do previsto no Plano
Municipal de Saneamento Básico de 2014, notou-se grande geração de créditos de carbono e
uma produção energia elétrica suficiente tanto para suprir as demandas internas das ETEs
propostas, como para retornar à rede de abastecimento energético, promovendo lucros para a
CAGECE. Finalmente, o estudo econômico dessa proposição retornou valores de CAPEX e
OPEX que permitiram amortizar os custos desse investimento em curto prazo, diferentemente
do calculado para a previsão do PMSB.
Palavras-chave: Biogás. ETE Sustentável. Reator UASB. Energia. Viabilidade Econômica.
ABSTRACT
This study aimed to assess and evaluate the energy reuse potential of biogas from UASB
reactors in sewage treatment plants (STP) operated by CAGECE. A STP inventory
concerning the units in Ceara was done in order to quantify its plants by their adopted
technologies, to classify them with regard to their population size and wastewater flow rate,
and to estimate the efficiency of STPs with UASB reactors. CAGECE provided institutional
Excel spreadsheets to be consulted along with the online National Water Agency database. A
big range of updated scientific literature was also consulted in order to gather information
about electric and thermic energy consumption rates, as well as COD and biogas production
indexes. The obtained results, after a thorough statistical analysis and purge of outliers, using
Excel, were then represented in graphics, tables and charts. Hence, although there has been
noticed a numerical superiority of micro and small STPs using septic tank, it was also
possible to realize a great feasibility in regards of reusing biogas from STP with UASB
reactors to produce thermic energy and feed appropriate stoves in order to cook food. During
the STP UASB reactor efficiency analyses, the majority of the STP was placed in the worst
scenario (WS) and typical scenario (TS) categories, and it was easy to notice that those STPs
of which technological route contemplated some kind of effluent post-treatment process also
presented a higher capacity of removing COD than the ones without a post-treatment unit.
Concerning the projected scenario by the 2014 BSMP and the proposed alternative, there was
a large carbon credits generation and a tremendous production of electricity which was
enough not only to supply the STPs internal demands, but also to produce energy credits with
the state energy utility, providing profits to the state water and wastewater utility. Finally, the
economic study performed for the alternative proposal returned CAPEX and OPEX values
that permitted a short-time pay-back of these investments, which did not happen to the 2014
BSMP projected scenario.
Keywords: Biogas. Sustainable STP. Energy. UASB reactor. Economic feasibility.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – (a) Número de ETEs por categoria de município; (b) Número total de ETEs por
tecnologia. ........................................................................................................... 22
Figura 2 – Incremento (em azul) na quantidade de plantas de biogás na Europa. ............... 25
Figura 3 – Processo de digestão anaeróbia e redução de sulfato. ......................................... 30
Figura 4 – Rotas de conversão de DQO e fluxo do metano em reatores UASB. ................. 38
Figura 5 – Simulação do balanço de massa de DQO, no pior cenário. ................................ 39
Figura 6 – Tratamento do biogás conforme seu uso final. .................................................... 42
Figura 7 – Aplicabilidade de diversas tecnologias quanto à vazão de ar e à concentração do
poluente. .............................................................................................................. 43
Figura 8 – Fluxograma da ETE Arrudas. ............................................................................. 49
Figura 9 – Fluxograma conceitual, esquemático e completo de uma ETE sustentável de
pequeno porte. Os losangos representam oportunidades de tomadas de decisão,
com diferentes rotas tecnológicas a serem escolhidas. ....................................... 51
Figura 10 – Esquema de queimador de fogão a biogás. ......................................................... 52
Figura 11 – Fogão a biogás individual doméstico. ................................................................. 53
Figura 12 – Fogão a biogás comunitário. ............................................................................... 53
Figura 13 – Fluxograma das alternativas de aproveitamento do biogás em ETEs operando
com reatores UASB. ............................................................................................ 54
Figura 14 – Mapa das unidades de negócio da CAGECE no interior. ................................... 56
Figura 15 – Foto aérea da Estação de Pré-Condicionamento (EPC) de Fortaleza. ................ 58
Figura 16 – Percentual das tecnologias adotadas em ETEs operadas pela CAGECE. ........... 69
Figura 17 – Representação da quantidade de tecnologias adotadas por unidade administrativa
da CAGECE, em 2018. ....................................................................................... 71
Figura 18 – Quantitativo de ETEs operadas pela CAGECE por unidade administrativa. ..... 73
Figura 19 – Representação do percentual de ETEs operadas pela CAGECE, em 2018. ....... 74
Figura 20 – Quantitativo de ETEs por tecnologia adotada, em cada faixa populacional. ...... 76
Figura 21 – Quantitativo de ETEs por tecnologia adotada, em cada faixa de vazão. ............ 78
Figura 22 – Eficiências de remoção de DQO das ETEs de reatores UASB sem pós-
tratamento. ........................................................................................................... 80
Figura 23 – Eficiências da remoção de DQO das ETEs de reatores UASB com pós-
tratamento. ........................................................................................................... 82
Figura 24 – Eficiências de remoção de DQO das ETEs de reatores UASB de Fortaleza, no
ano de 2018. ........................................................................................................ 87
Figura 25 – Eficiências de remoção de DQO das ETEs de reatores UASB da Região
Metropolitana de Fortaleza, no ano de 2018. ...................................................... 88
Figura 26 – Eficiências de remoção de DQO das ETEs de reatores UASB do interior do
Ceará, no ano de 2018. ........................................................................................ 91
Figura 27 – Situação atual das ETEs do Ceará, com tecnologia reatores UASB, quanto à
produção de energia. ........................................................................................... 96
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Contaminantes comumente presentes no biogás e suas adversidades. .................. 35
Quadro 2 – Estimativa de produção de metano e potencial elétrico do biogás. ....................... 36
Quadro 3 – Classificação de tecnologias para tratamento do biogás quanto a sua natureza. ... 44
Quadro 4 – Correspondência das unidades de negócio por bacia administrativa. ................... 55
Quadro 5 – Classificação das ETEs quanto à tecnologia e à tipologia de tratamento. ............. 57
Quadro 6 – Grupos por intervalo populacional. ....................................................................... 59
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Oferta interna de energia no Brasil e no Mundo (%)........................................... 19
Tabela 2 – Perspectivas de crescimento das diversas fontes energéticas no Brasil. ............. 20
Tabela 3 – Comparação do poder calorífico de alguns combustíveis. .................................. 33
Tabela 4 – Composição do biogás originário de diferentes fontes. ....................................... 34
Tabela 5 – Características das ETEs, produção de biogás e potencial de recuperação
energética obtidos da validação do modelo matemático desenvolvido. .............. 39
Tabela 6 – Parâmetros adotados no cômputo do potencial energético a partir do biogás de
reatores UASB. .................................................................................................... 63
Tabela 7 – Relações unitárias de produção de metano, de biogás e de energia em reatores
UASB tratando esgoto doméstico. ...................................................................... 64
Tabela 8 – Dados das ETEs de Fortaleza de acordo com o PMSB, para o ano de 2033....... 65
Tabela 9 – Quantitativo das tipologias adotadas no estado do Ceará. ................................... 68
Tabela 10 – Quantitativo de ETEs por unidade administrativa e por tecnologia. ................... 72
Tabela 11 – Classificação das ETEs do Ceará por porte, quanto à população atendida. ........ 75
Tabela 12 – Classificação das ETEs do Ceará por porte, quanto à vazão afluente. ................ 77
Tabela 13 – Avaliação da produção de biogás e geração de energia térmica das ETEs de
Fortaleza (UN-MTE). .......................................................................................... 85
Tabela 14 – Avaliação da produção de biogás e geração de energia térmica das ETEs da RMF
(UN-BME). ......................................................................................................... 89
Tabela 15 – Avaliação da produção de biogás e geração de energia térmica das ETEs do
interior do Ceará. ................................................................................................. 92
Tabela 16 – Relações unitárias obtidas e classificação das ETEs quanto ao modelo de Lobato
(2011). ................................................................................................................. 93
Tabela 17 – Previsão de consumo elétrico das ETEs aeróbias em Fortaleza, para 2033. ....... 97
Tabela 18 – Avaliação da previsão de produção de biogás e geração de energia elétrica em
Fortaleza, no ano de 2033. .................................................................................. 99
Tabela 19 – Análise financeira da alternativa prevista para Fortaleza, pelo PMSB (2014), em
2033. .................................................................................................................. 104
Tabela 20 – Análise financeira da alternativa proposta para Fortaleza, em 2033. ................ 104
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 16 1
OBJETIVOS ............................................................................................................... 18 2
2.1 Objetivo Geral ............................................................................................................. 18
2.2 Objetivos Específicos .................................................................................................. 18
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .................................................................................. 19 3
3.1 As motivações e perspectivas do biogás no cenário energético do Brasil e do
mundo .......................................................................................................................... 19
3.2 A digestão anaeróbia em reatores UASB e a origem do biogás .............................. 28
3.3 Composição, potencial energético e estimativa de perda do biogás oriundo de
reatores UASB ............................................................................................................. 32
3.4 Alternativas de tratamento e análises das aplicações do biogás de ETEs para fins
energéticos ................................................................................................................... 41
MATERIAL E MÉTODOS ....................................................................................... 55 4
4.1 Informações gerais da pesquisa ................................................................................. 55
4.2 Levantamento, quantificação e organização dos dados .......................................... 56
4.3 Estimativas do potencial energético do Ceará ......................................................... 61
4.4 Análise financeira dos cenários avaliados ................................................................ 67
RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................................ 68 5
5.1 Das quantidades, tipologias e tecnologias adotadas no Ceará ................................ 68
5.2 Dos portes das estações de tratamento de esgoto ..................................................... 74
5.3 Da capacidade de tratamento das ETEs com tecnologia reatores UASB .............. 80
5.4 Do potencial atual de produção de biogás no Ceará ............................................... 83
5.5 Do prognóstico energético para as ETEs de Fortaleza ............................................ 96
5.6 Da avaliação econômica das ETEs propostas ........................................................ 102
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ............................................................... 106 6
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 108
16
INTRODUÇÃO 1
Atualmente, já é consenso que água, alimento e energia são três dos recursos que
mais preocupam o mundo quanto à disponibilidade de fontes úteis para benefício da
população. Por causa disso, efluentes domésticos começaram a ser considerados, mais
preferencialmente, como uma fonte desses recursos do que meramente como um rejeito
líquido (McCARTY et al., 2011). Aliado a isso, o aumento dos preços do barril de petróleo, a
possibilidade de desabastecimento energético e o maior crescimento da preocupação
ambiental da população vêm forçando uma mudança na forma de pensar dos grandes
exploradores de fontes energéticas não-renováveis, para que seja dada maior ênfase à
prospecção de tecnologias renováveis, como a solar, a eólica, a marítima e a biomassa
(DEUBLEIN; STEINHAUSER, 2011).
Essa mudança de paradigma, no que se refere à nova imagem do efluente de
estações de tratamento de esgoto (ETEs), já é uma realidade cada vez mais praticada no
século XXI, pelo menos em países cujos governantes demonstram maior interesse com a
qualidade ambiental e maior conhecimento a respeito da interveniência desse fator aos índices
de qualidade de vida da população regional e global (METCALF e EDDY, 2016). De fato,
sabe-se que, hoje em dia, podem-se recuperar, por meio da utilização de esgotos, nutrientes e
fertilizantes de culturas agrícolas, como nitrogênio (N) e fósforo (P); recursos hídricos, posto
que os efluentes domésticos são compostos de aproximadamente 99,9% de H2O (VON
SPERLING, 1995); e energia, como pela utilização do metano (CH4) contido no biogás,
componente responsável pelo seu poder de queima.
Entretanto, para Makropolus et al. (2018) apud Bressani-Ribeiro et al. (2019), a
recuperação desses recursos geralmente acontece, quando muito, somente em situações
específicas, com motivações extras, por exemplo: condições de seca na região, legislações
e/ou incentivos especiais e posicionamentos favoráveis ao meio ambiente em escala local.
Contudo, no Brasil, principalmente na região Nordeste, a qual convive constantemente com
longas crises hídricas, pouco se investe em práticas voltadas para a recuperação de recursos
oriundos do tratamento de efluentes domésticos.
No âmbito do estado do Ceará, apenas 39% das cidades contemplam sistemas
coletivos de esgotamento sanitário (SES) (CAGECE, 2019). De acordo com Bressani-Ribeiro
et al. (2019), em se tratando das cidades brasileiras, a crítica infraestrutura do saneamento
ambiental é um cenário comum, além de ser amplamente afetado pela falta de interesse de
17
mobilização de recursos financeiros para a área, impedindo a concepção de SES baseados nos
princípios de sustentabilidades supracitados, ou seja, de sistemas capazes de promover uma
abordagem integrada para o gerenciamento das fases líquidas, sólidas e gasosas do tratamento
de efluentes domésticos, a fim de se promover a preservação de recursos naturais.
Nesse contexto, a digestão anaeróbia das frações orgânicas de resíduos sólidos
municipais (OFMSW, do inglês Organic Fraction Municipal Solid Waste) tem sido alvo de
estudos nas últimas décadas, a fim de se conceber uma tecnologia que consiga aliar a
estabilização desses resíduos e a recuperação de recursos energéticos em nível mundial
(BALAT e BALAT, 2009). Adicionalmente, para o tratamento anaeróbio de efluentes
domésticos naquelas regiões menos economicamente desenvolvidas e de clima mais tropical,
i.e., no Brasil, Metcalf e Eddy (2016) indicam, fortemente, que a utilização de reatores UASB
é uma alternativa atraente devido aos baixos pré-requisitos de área, baixos custos de
instalação, manutenção e operação, condições climáticas favoráveis para otimização da
geração de biogás e reduzida produção de biomassa (lodo), o que, por conseguinte,
impulsiona a escolha dessa tecnologia de tratamento de efluentes domésticos nessas
localidades.
Estudos em diversas escalas (bancada, piloto e real) e em diferentes localidades
nacionais (regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste) e internacionais (EUA, Colômbia, Alemanha,
entre outros) verificaram que o biogás proveniente de ETEs pode ser aproveitado de inúmeras
maneiras, apresentando versatilidades que permitem a adoção da prática mais apropriada, a
depender da análise das peculiaridades de cada local, tais como recurso financeiro disponível,
temperatura ambiente, porte da ETE, tecnologia de tratamento instalada, concentração de
constituintes no efluente e a finalidade a que o biogás gerado servirá.
Contudo, desconhece-se de um estudo mais detalhado sobre o diagnóstico e
avaliação do potencial de aproveitamento energético do biogás de reatores UASB em ETEs
operadas pela CAGECE, assim como dos benefícios da inclusão de reatores UASB como
opção de rota tecnológica para os sistemas centralizados de tratamento para Fortaleza que a
CAGECE planeja para o futuro.
18
OBJETIVOS 2
2.1 Objetivo Geral
Diagnosticar e avaliar o potencial de aproveitamento energético do biogás de
reatores UASB em ETEs operadas pela CAGECE.
2.2 Objetivos Específicos
Estimar e comparar a perda energética do Ceará pelo não aproveitamento do biogás de
reatores UASB;
Classificar as ETEs operadas pela CAGECE quanto ao porte, à capacidade de
tratamento de efluentes e à situação de produção de metano, biogás e energia;
Expor o panorama da CAGECE quanto à utilização de reatores UASB e demais
tecnologias de tratamento de esgotos;
Contribuir para a concepção de ETEs sustentáveis na CAGECE, por meio do
aperfeiçoamento da geração de energia pelo aproveitamento do biogás, sugerindo a
substituição de tecnologias de tratamento de esgoto obsoletas ou que não favoreçam a
produção desse gás;
Promover uma análise econômica da previsão para as estações de tratamento de esgoto
de Fortaleza, contempladas no Plano Municipal de Saneamento Básico, bem como
sugerir uma alternativa mais atraente;
Calcular a geração de créditos de carbono dessas alternativas.
19
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 3
3.1 As motivações e perspectivas do biogás no cenário energético do Brasil e do
mundo
De acordo com o Ministério de Minas e Energia (MME) (BRASIL, 2018), em seu
estudo intitulado de “Resenha Energética Brasileira”, que avaliou e comparou as matrizes
energéticas do Brasil, dos países componentes da Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) e de outras unidades federativas, percebeu-se que, nos
últimos 45 anos, houve uma significativa mudança no que se refere à oferta energética interna
desses países, como pode ser percebido na Tabela 1. Entretanto, de uma forma geral, foi
notória a redução de 14,4% do consumo de derivados de petróleo para produção de energia,
acompanhado por um discreto aumento de 5,9% e 1,1% de oferta de energia por fontes
renováveis, na OCDE e no mundo, respectivamente.
Vale ressaltar que figuram, na OCDE, 36 países, dentre os quais, os maiores
investidores em energias renováveis, como a Alemanha, além de França, Coreia do Sul,
Estados Unidos, Canadá, Portugal, Israel, Japão e Reino Unido.
Tabela 1 – Oferta interna de energia no Brasil e no Mundo (%).
Fonte Brasil OCDE Outros Mundo
1973 2018 1973 2018 1973 2018 1973 2018
Derivados do
petróleo
45,6 34,4 52,6 35,4 29,9 25,8 46,1 31,7
Gás Natural 0,4 12,5 18,9 27,6 12,9 20,9 16,0 22,7
Carvão Mineral 3,2 5,8 22,6 16,6 31,1 34,4 24,6 26,1
Hidráulica 6,1 12,6 2,1 2,2 1,2 2,6 1,8 2,6
Outras Renováveis 44,8 32,6 2,5 8,4 24,7 13,7 10,6 11,7
Fonte: O autor (2019), adaptado de BRASIL (2018).
Contudo, ao avaliar exclusivamente o Brasil, pode-se perceber que o país foi de
encontro à tendência mundial, visto que se constatou um decréscimo de 12,2% na oferta de
energia por fontes renováveis, bem como um acréscimo no consumo de energia de fonte
hidráulica e de gás natural. Esse fato reflete o esforço (ou a falta dele) quanto à substituição
da matriz de produção de energia brasileira para uma mais limpa e sustentável, significando
uma perda de potencial energético.
20
Ainda de acordo com o MME (BRASIL, 2007), em seu estudo quanto à matriz
energética de 2030 do Brasil, a taxa de crescimento dos recursos energéticos para a categoria
“outras fontes primárias renováveis” (biodiesel, biogás e energia eólica), após análise das
perspectivas nos anos de 2005 a 2030, apresentou valor total igual a 8,67% ao ano, cerca de
3,5 vezes superior à taxa para petróleo e derivados (Tabela 2). Isso corrobora o fato de que,
cada vez mais, o cenário para o aumento de investimento em energia renovável está se
tornando favorável e atraente não só para grandes consumidores, como indústrias e grandes
centros comerciais, mas também para pequenos consumidores, como pontos de comércios
simples e residências.
Tabela 2 – Perspectivas de crescimento das diversas fontes energéticas no Brasil.
2005-2010
(%) aa
2010-2020
(%) aa
2020-2030
(%) aa
2005-2030
(%) aa
Energia não-renovável 5,6 3,1 3,3 3,65
Petróleo e derivados 2,8 2,1 2,7 2,47
Gás natural 12,7 4,3 4,3 5,92
Carvão mineral 7,8 4,2 2,4 4,20
Urânio e derivados 12,7 8,0 5,4 7,87
Energia renovável 4,3 4,3 3,6 3,99
Hidroeletricidade 3,1 3,7 3,2 3,42
Lenha e carvão vegetal -0,2 0,0 0,9 0,30
Etanol 5,5 5,9 4,0 5,04
Outras fontes primárias
renováveis
18,4 7,5 5,2 8,67
Fonte: O autor (2019), adaptado de BRASIL (2007).
Devido ao constante aumento da preocupação com a causa ambiental e ao
desenfreado consumo de recursos naturais, vem-se pesquisando tecnologias renováveis e
economicamente viáveis, que possam substituir as convencionais, dando preferência àquelas
que apresentam alto potencial energético e baixo custo de implantação/manutenção. A
utilização de recursos renováveis tem, também, o importante papel de reduzir emissões
gasosas de CO2 mundialmente, e a energia proveniente de biomassa e de resíduos tornou-se
uma forte candidata devido ao fato de garantir continuidade de geração ao longo do ano e em
diversas regiões do mundo, diferentemente de outras energias renováveis, e.g.: solar e eólica,
que são mais dependentes da época do ano e da posição geográfica do local de produção
(LISOWYJ e WRIGHT, 2018). Os autores complementam que a prática de produção de
energia por meio de resíduos, WtE (do inglês, Waste do Energy), é ideal no sentido de evitar a
competição por área agriculturável (para produção de alimentos) e demais usos do solo.
21
Uma alternativa que faz parte do grupo de “outras fontes primárias renováveis”,
da Tabela 2, e que se encaixa no perfil supracitado é a utilização do biogás para produção de
energia, em especial do biogás proveniente do tratamento de esgotos, por meio de reatores
UASB (do inglês Upflow Anaerobic Sludge Blanket), visto que o Brasil é considerado
detentor do maior parque de reatores anaeróbios aplicados para tratamento de efluentes do
mundo (CHERNICHARO et al., 2018a), o que pode ser explicado pelo fato de que, como
apontado em inúmeros estudos, haver uma economia efetiva, principalmente na associação de
reatores UASB com pós-tratamento aeróbio, dos custos de implantação (CAPEX), em torno
de 20 a 50%, e de operação (OPEX), superior a 50%, quando comparados à tecnologia de
lodos ativados (SILVA, 1993; ALEM SOBRINHO e JORDÃO, 2001; von SPERLING e
CHERNICHARO, 2005; CHERNICHARO, 2006, apud CHERNICHARO et al., 2018a).
Para Lisowyj e Wright (2018), a produção de energia por meio do biogás
proveniente da digestão anaeróbia está se tornando cada vez mais viável devido ao fato de que
legislações prevendo essa tecnologia continuam em ascensão quanto a sua importância para a
população mundial. Dessa forma, os autores imaginam que, após maiores aprofundamentos
para aperfeiçoar a eficiência do processo, aumentando a recuperação de metano e diminuindo
os custos, a utilização de biogás para fins energéticos será capaz de substituir o emprego de
combustíveis fósseis e promover uma rota de redução da emissão de metano de reatores
anaeróbios na atmosfera.
Essas constatações tornam o uso de reatores UASB, seja como tratamento único,
seja seguido de algum pós-tratamento, uma tendência no que concerne o tratamento de
esgotos no Brasil, como foi fortalecido por Chernicharo et al. (2018a), que constataram, após
a totalidade de 1.667 ETEs inventariadas nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, o emprego
de 40%, aproximadamente, de reatores UASB nessas estações, expressando a elevada
aceitação desta tecnologia como, pelo menos, primeiro estágio no tratamento de esgotos,
independentemente do porte da ETE, como pode ser verificado na Figura 1.
22
Figura 1 – (a) Número de ETEs por categoria de município; (b) Número
total de ETEs por tecnologia.
Fonte: CHERNICHARO et al. (2018a).
CHERNICHARO et al. (2018a) perceberam que, em que pese apenas as ETEs
com população equivalente acima de 100.000 habitantes (totalizando 10,7 milhões de
contribuintes de esgoto), o potencial energético diário com o uso de reatores UASB atinge
cerca de 110.000 Nm³ de CH4, i.e., o equivalente a 108,1 GWh.ano-1
de produção de energia
elétrica. Esse valor energético seria o suficiente para abastecer aproximadamente 48.830
residências, podendo atingir números até maiores, caso haja aperfeiçoamento de reatores
obsoletos tecnologicamente, melhoria no sequestro de metano dissolvido no efluente, maior
estanqueidade para evitar vazamentos de biogás para a atmosfera e minimização de ligações
clandestinas de água pluvial na rede coletora de esgoto.
Adicionalmente, o aproveitamento do biogás proveniente de reatores UASB
também apresenta os seguintes benefícios, direto e indiretamente (ROSA et al., 2016;
LOBATO, 2011; IPCC, 2013, apud CABRAL et al., 2016; MOREIRA et al., 2018;
POSSETTI et al., 2018; CHERNICHARO et al., 2010; SHEN et al., 2015):
a. Descentralização da geração de energia, reduzindo a sobrecarga das
concessionárias de energia em subestações mais distantes dos grandes centros
metropolitanos e minimizando a dependência energética da região, além de
transformar ETEs (potenciais geradoras de impactos ambientais e onerosas à
administração pública) em centros de geração de lucro e renda;
23
b. Perspectiva de lucro adicional pela produção e comercialização de
energia elétrica, medida já prevista nas normas das agências reguladoras de
energia, bem como a utilização de um subproduto do tratamento de esgotos,
ou seja, agregando valor econômico a um rejeito, além da possibilidade de
geração de empregos verdes (atividades na agricultura, indústria, pesquisa e
administração que contribuem para a preservação ou recuperação da qualidade
ambiental);
c. Redução do consumo e dos gastos com a energia elétrica proveniente
dessas concessionárias, possibilitando a utilização da eletricidade proveniente
de um gerador de energia a biogás para o acionamento de equipamentos na
própria ETE, como sopradores, dosadores de produtos químicos,
computadores, lâmpadas e bombas hidráulicas, fomentando a ideia de ETEs
sustentáveis e produzindo créditos de carbono por meio do uso de energia
renovável;
d. Oportunidade de cogeração de calor, para cocção ou em forma de vapor,
que poderá ser utilizado na secagem térmica de lodo e escuma, favorecendo
maior controle sanitário e reduzindo os custos no transporte e na disposição
final do lodo, o qual poderá ser aproveitado na agricultura (incentivando a
agricultura familiar, o uso de efluentes no lugar de fertilizantes sintéticos, a
minimização do volume e peso de resíduos sólidos direcionados a aterros
sanitários e a economia de água na irrigação de culturas, reduzindo, de uma
forma geral a contaminação e a depleção de recursos naturais como os
recursos hídricos superficiais e subterrâneos);
e. Minimização do efeito estufa tanto pela redução da emissão de metano
(CH4), uma vez que este apresenta potencial de aquecimento
aproximadamente 25 vezes maior quando comparado ao gás carbônico (CO2),
como pelo aumentado sequestro de carbono das medidas do item “d”, e.g., ao
reduzir a quantidade de lodo transportado, também há menos emissões de CO2
nesse serviço;
f. Mitigação das emissões de maus odores no entorno da ETE, além de
reduzir os índices de reclamação da vizinhança, uma vez havendo a retenção
ou eliminação dos diferentes causadores de odor que podem compor o biogás
(principalmente o gás sulfídrico, H2S, e outros compostos orgânicos voláteis),
em detrimento da liberação desse gás in natura na atmosfera.
24
Portanto, pode-se afirmar que a alternativa de geração energética por meio da
utilização do biogás resultante da digestão anaeróbia de reatores UASB promove benefícios
holísticos, uma vez que se podem perceber melhorias nos ramos da economia, do social, do
meio ambiente, do clima, da seguridade energética e da saúde pública.
Embora, no Brasil, ainda seja incipiente (MOREIRA et al., 2018), diversos países
já estão investindo em tecnologias renováveis para incentivar a geração de energia sustentável
há anos, não somente por meio do aproveitamento de biogás oriundo de reatores UASB,
como, inclusive, foi constatado pela Tabela 1. De fato, os países europeus, desde o
firmamento do Protocolo de Quioto, em 1997, vêm substituindo, gradativamente, o uso de
fontes fósseis para fins geração de energia por medidas sustentáveis de igual ou maior
eficiência energética, integração entre os sistemas energéticos dos países desse continente, uso
de veículos elétricos, investimento em transportes de massa e uso de tecnologias da
informação e comunicação para integração dos sistemas elétricos, entre outras medidas
(SÜHLSEN e HISSCHEMÖLLER, 2014, apud MARIANI, 2018).
Em adição a todas as potencialidades ora apresentadas, ainda de acordo com
Mariani (2018), o biogás se tornou mais atrativo nos países europeus, pois a substituição do
gás natural importado da Rússia pelo biogás garantiria menor dependência desse país e,
consequentemente, maior segurança energética. Isso foi intensificado, nesse continente, por
meio de diversas políticas públicas, bem como incentivos econômicos e regulatórios.
Ademais, houve também o início a cultivos de substratos energéticos, como o milho e outros
grãos, além de resíduos, visando à produção de biogás com maior poder calorífico.
Nesse sentido, dos países da Europa que investiram no uso de biogás para fins
energéticos – Suíça, Suécia, Itália e os países do Reino Unido – Alemanha e Áustria figuram
nas posições de maior destaque. Em contrapartida, fora da Europa, pode-se citar, na região do
sudeste asiático e do pacífico leste, Bangladesh, Nepal, Paquistão e Vietnã, além de China e
Índia, que são os maiores produtores de energia por meio de biogás proveniente de
biodigestores em escala doméstica e rural, diferentemente dos países da Europa, que possuem,
em sua maioria, reatores de escala produtiva (GWADR, 2015; MARIANI, 2018).
A Figura 2 mostra o crescimento, em números absolutos e pontos percentuais, da
quantidade de plantas de biogás na Europa, a partir do ano de 2009, em que houve a definição
de metas para redução de gases de efeito estufa na União Europeia. Desse ano até 2016,
percebeu-se o surgimento de mais de 17 mil plantas de biogás, ou seja, quase três vezes
25
superior à totalidade em 2009. Por fim, Mariani (2018) afirma que, embora o número absoluto
tenha crescido, a redução de subsídios tarifários governamentais para geração de energia
elétrica fez a taxa (percentual) de crescimento declinar.
Como uma das maiores referências na área, a Alemanha tem focado no aumento
da utilização de energia renovável de 9,1% para 20% até 2020, desenvolvendo um programa
climático que alinhou a redução de GEE e a geração de energia, no qual foi previsto que a
geração de 25 a 30% de eletricidade e 14% de calor deveria ser de fontes renováveis
(PÖSCHL et al., 2010). Para isso, percebeu-se que uma das estratégias para atendimento
desses parâmetros seria também a utilização do biogás proveniente da digestão anaeróbia. De
fato, Rosa (2013) constatou que, em 2006, a Alemanha já apresentava 778 ETEs com
recuperação do biogás para fins energéticos – destacando a geração de eletricidade (75%),
produção de calor (15%), queima em flares (6%) e usos públicos fora do terreno das ETEs
(3%) –, o que, em termos populacionais, correspondia ao atendimento a 72 milhões de
habitantes. Em dados mais atualizados, percebeu-se que, para ETEs do país em questão, a
produção de eletricidade e de calor a partir do biogás correspondeu a ordens de 11,5 a 22,0
kWh.hab-1
.ano-1
(BRASIL, 2015a).
Figura 2 – Incremento (em azul) na quantidade de plantas de biogás na Europa.
Fonte: EBA (2018), apud MARIANI (2018).
Na América do Norte, para análise do cenário dos Estados Unidos, uma das
maiores potências mundiais, os autores Shen et al. (2015) aferiram que, em média, a vazão de
esgoto tratado no país atinge a marca de 32.345 milhões de galões por dia (aproximadamente
26
1,22*108 milhões de metros cúbicos por dia), consumindo 30,2 bilhões de kWh.ano
-1 de
energia, o equivalente a 3-4% da demanda do país inteiro, agravado pela emissão de 21
milhões de toneladas de gases de efeito estufa. Da vazão total apresentada, os autores
constataram que uma fração de 48% é digerida de forma anaeróbia, representando o potencial
para geração de biogás. Por outro lado, em 2015, o governo dos EUA promulgou a “Ordem
Executiva 13693: Planejando a Sustentabilidade na Nação até 2025”, a qual decretou que a
eletricidade consumida pelo governo federal originária de fontes renováveis deve aumentar de
8,3% para 30% na próxima década (LISOWYJ e WRIGHT, 2018). Dessa porcentagem
aferida em 2015, os autores constataram que apenas 11,5% eram derivadas de biomassa,
representando um interessante campo para investimentos na digestão anaeróbia e utilização do
biogás.
Vale ressaltar que a pesquisa em análise mostrou que os maiores custos em ETEs
(acima de 30% do total gasto com atividades de operação e manutenção) são com eletricidade.
Entretanto, embora a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (USEPA) tenha
reportado que 1484 ETEs produzem biogás anaerobiamente pela digestão de lodo (USEPA,
2011, apud SHEN et al., 2015), menos de 10% delas reaproveitam o biogás para produção de
calor e/ou eletricidade a fim de reduzir os custos energéticos e a pegada de carbono, devido às
emissões de GEE, das estações (SHEN et al., 2015).
Durante a última década, houve também um maior interesse por biodigestores
anaeróbios domésticos na América do Sul, visto que o biogás gerado por tais sistemas pode
ser usado para cozinhar, substituindo a lenha (GWADR, 2015). Essa alternativa permitiu que
houvesse menor desmatamento de florestas para produção de lenha, diminuição dos gastos
domésticos com combustíveis e fertilizantes agrícolas, e a redução do trabalho das donas de
casa e das suas crianças que, previamente, eram responsáveis pela coleta da lenha.
Nacionalmente, o Projeto Brasil-Alemanha de Fomento ao Aproveitamento
Energético de Biogás no Brasil (PROBIOGÁS), com validade de 2013 a 2017, consistiu em
uma iniciativa entre o governo brasileiro, pela Secretaria de Saneamento Ambiental, do
Ministério das Cidades, e o governo alemão, pela Deutsche Gesellschaft für Internationale
Zusammenarbeit GmbH (GIZ), a fim de colaborar para a disseminação do uso energético e
eficiente do biogás, reduzindo, consequentemente, as emissões de GEE, uma vez que foi
notado que a maior parte das ETEs brasileiras, com recuperação de biogás, desperdiçam o
27
potencial energético, econômico, social e ambiental do metano, por simplesmente queimá-lo,
quando muito, antes do lançamento na atmosfera (BRASIL, 2015a).
O Resumo Técnico do 4º Workshop Internacional sobre aproveitamento
energético de biogás de ETEs (BRASIL, 2016a), promovido também pelo PROBIOGÁS,
relatou que mediante uma amostragem em torno de 74 milhões de habitantes, a contribuição
de aproximadamente 23 milhões de pessoas é atendida por 637 ETEs com a presença de
reatores UASB, o que explicita a grande capacidade dessa tecnologia no país. Foi destacado
que se sanados os maiores problemas que levam ao baixo sequestro desse gás nos reatores
UASB, o aproveitamento de biogás produzido em ETEs que atendem mais de 100.000
habitantes seria suficiente para suprir mais de 10% da demanda de energia elétrica do setor,
justificando a necessidade de aprofundamento em estudos de viabilidade nesse ramo.
Nesse mesmo relatório (BRASIL, 2016a), foi pontuado que um dos maiores
obstáculos para o aproveitamento energético do biogás que precisa ser transposto é de ordem
cultural, i.e., profissionais da área (projetistas, operadores e gestores do setor de saneamento)
necessitam alterar suas percepções a respeito das ETEs atuais, pois, mesmo não faltando
conhecimento técnico, falta consenso quanto à importância da gestão integrada e sustentável
para valorizar o tratamento de esgoto no país, impedindo o desenvolvimento do saneamento
ambiental brasileiro. Portanto, a renovação dessa postura é essencial para utilizar o biogás
como propulsor do setor de esgotamento sanitário do Brasil.
Lobato et al. (2009) concordam que, em se tratando do cenário brasileiro, espera-
se, no futuro, um maior aproveitamento do biogás, principalmente devido à crescente onda de
implementação de reatores anaeróbios no tratamento de efluentes industriais, bem como de
aterros sanitários com sistema de biogás, para fins de secagem térmica de lodo, geração de
vapor em agroindústrias, fornecimento de eletricidade para uso local e distribuição de biogás
para pequenas populações vizinhas usarem no cozimento de alimentos.
De fato, a tecnologia de reatores UASB ainda sofre desafios que impossibilitam
seu máximo desempenho operacional, abrangendo todas as fases, da mais inicial até o seu
comissionamento: problemas técnicos de concepção, processos construtivos inadequados e
obstáculos operacionais, incluindo questões essenciais e externas ao terreno físico da ETE,
como falhas administrativas e financeiras (CHERNICHARO et al., 2018a) e mão de obra não
qualificada, principalmente de operadores das estações. Logo, a utilização do biogás
proveniente desses digestores geraria incentivos para o investimento nessa tecnologia de
28
tratamento de esgotos, de modo que não houvesse prejuízos para o futuro do setor de
esgotamento sanitário brasileiro e evitando impactar, sem precedentes, a aceitação da
tecnologia anaeróbia no Brasil.
Há que se dizer também que é necessária uma maior integração entre órgãos
públicos e privados, incluindo universidades e indústrias, a fim de promover uma melhor
estruturação logística e legal, bem como desenvolvimento tecnológico, para melhoramento de
redes de distribuição e comercialização do biogás, visto que: (a) a regulação existente é
específica para o biometano proveniente de resíduos orgânicos, não existindo uma legislação
para o biogás de gás de aterro e esgoto sanitário, sendo permitido seu uso apenas para fins
empíricos (ANP, 2015); e (b) as soluções tecnológicas atuais, sob o ponto de vista econômico,
ainda impedem a produção e o uso do biogás, mesmo que em menor escala, interferindo na
sua entrada na matriz energética brasileira, bem como diminuindo sua competitividade em
relação aos combustíveis de origem fóssil (BRASIL, 2017).
3.2 A digestão anaeróbia em reatores UASB e a origem do biogás
O processo de remoção da matéria orgânica em reatores UASB segue as etapas
indicadas na Figura 3 e descrição específica a seguir:
a. Hidrólise: consiste no primeiro processo da digestão anaeróbia, em que os
compostos orgânicos complexos (polímeros) são quebrados por meio de
exoenzimas liberadas pelas bactérias fermentativas (nesse caso, diversos
organismos anaeróbios facultativos e obrigatórios entram em ação), originando
compostos orgânicos simples (monômeros), solúveis em água, como
mono/dissacarídeos, ácidos graxos de cadeia carbônica longa e glicerina,
(poli)peptídeos e aminoácidos (METCALF e EDDY, 2016; CHERNICHARO,
2016; VAN HAANDEL e LETTINGA, 1994; DEUBLEIN; STEINHAUSER,
2011). Ainda de acordo com Van Haandel e Lettinga (1994), este processo é
considerado o limitante para o processo da digestão anaeróbia, devido,
principalmente, à baixa taxa de quebra de lipídios em determinadas temperaturas.
b. Acidogênese: a segunda etapa do processo, também chamada de fermentação ou
oxidação anaeróbia (METCALF e EDDY, 2016), é caracterizada pela absorção do
material hidrolisado e solúvel no meio, bem como pela produção de ácidos graxos
29
voláteis (AGV) por bactérias fermentativas acidogênicas, que, em sua maioria, são
anaeróbias restritas (VAN HAANDEL e LETTINGA, 1994). Ao final deste
processo, os produtos originados serão mais simples do que os da fase anterior,
originando um conjunto de substâncias essenciais para as bactérias acetogênicas e
as arquéias metanogênicas das fases posteriores (CHERNICHARO, 2016).
c. Acetogênese: nesta fase, entram em ação as bactérias sintróficas acetogênicas,
como define Chernicharo (2016), que são as responsáveis pela continuidade da
fermentação de compostos intermediários da acidogênese para geração dos
substratos precursores do metano, ideais para as arquéias metanogênicas:
hidrogênio, dióxido de carbono e acetato (CH3COO-) em equilíbrio químico com
ácido acético (CH3COOH). Adicionalmente, existem microrganismos denominados
homoacetogênicos (DEUBLEIN e STEINHAUSER, 2011), consumidores de
hidrogênio, convertendo, paralelamente, hidrogênio e gás carbônico em acetato. Os
autores também destacam que as bactérias acetogênicas são produtoras obrigatórias
de H2, embora estas não consigam sobreviver em meio ácido (com elevadas
concentrações de hidrogênio dissolvido). Portanto, para que o equilíbrio da
microbiota possa ser mantido, essas bactérias devem viver em simbiose com
organismos consumidores de hidrogênio e acetato, i.e., as arquéias produtoras de
metano (metanogênicas), que por sua vez, só conseguem sobreviver em ambientes
com elevadas concentrações de H2 no meio, estabelecendo um relacionamento
sintrópico mutualmente benéfico, ou seja, um mutualismo entre esses domínios.
d. Metanogênese: a etapa final é a que efetivamente sintetiza metano e consiste na
atividade de arquéias metanogênicas acetoclásticas, as quais usam o acetato como
fonte de carbono e de energia para produção de gás carbônico e metano –
–, e de arquéias metanogênicas hidrogenotróficas,
responsáveis por capturar hidrogênio (fonte de energia, ou seja, doador de elétrons)
e dióxido de carbono (fonte de carbono e aceptor ou receptor final de elétrons) para
também produção de metano – – (CHERNICHARO,
2016; VAN HAANDEL e LETTINGA, 1994). Chernicharo (2016) ainda frisa que
esses microrganismos são estritamente anaeróbios e sobrevivem satisfatoriamente
em ambientes onde não há (ou há em baixas concentrações) aceptores finais de
elétrons, como O2, NO3-, Fe
3+ e SO4
2-, conforme mencionado anteriormente, pois
tais arquéias apresentam certa especificidade e utilizam somente uma quantidade
reduzida de substratos (por exemplo: ácido acético, hidrogênio e dióxido de
30
carbono, ácido fórmico, entre outros), i.e., a presença dos outros aceptores
deslocaria a reação para rotas preferenciais, interferindo negativamente na
formação de metano, fato que não seria desejável sob o ponto de vista de
aproveitamento energético do biogás.
Figura 3 – Processo de digestão anaeróbia e redução de sulfato.
Fonte: O autor (2019), adaptado de CHERNICHARO (2016); DEUBLEIN e STEINHAUSER (2011).
31
Como relatado previamente, um problema bastante comum e que merece ser
destacado é a possível simbiose de bactérias acetogênicas com bactérias sulfato-redutoras
(também estritamente anaeróbias) em vez de com arquéias metanogênicas, diminuindo a
produção de metano, aumentando a geração de sulfeto de hidrogênio (H2S) (DEUBLEIN e
STEINHAUSER, 2011) e, consequentemente, prejudicando a qualidade do biogás gerado.
A redução dissimilativa (ou desassimilatória) do sulfato, ou, como é mais
conhecida, sulfetogênese consiste na redução, em ambientes anaeróbios, do íon sulfato (SO4-)
em sulfeto de hidrogênio, por bactérias denominadas de sulfato-redutoras (SRB, do inglês
Sulfate Reducing Bacteria), provocando, normalmente, a oxidação da matéria orgânica
presente no meio (TSUTIYA e SOBRINHO, 2000). As SRBs, então, utilizam o sulfato como
aceptor final de elétron no processo de respiração anaeróbia e fonte de enxofre para geração
de energia para seu metabolismo (LOPES, 2010).
Devido à capacidade de as SRBs utilizarem o acetato e o hidrogênio, desviando a
reação para uma rota alternativa e produzindo menos metano – produto desejável na digestão
anaeróbia –, unido ao fato de que a formação do gás sulfídrico acontece anteriormente à
metanogênese, devem ser evitadas, ao máximo, altas quantidades de sulfato no esgoto e no
reator para que a sulfetogênese não se torne bastante pronunciada e culmine na inibição da
geração de CH4 (NUVOLARI, 2011; DEUBLEIN e STEINHAUSER, 2011). Caso contrário,
as SRBs estabelecerão uma relação de competição pelos mesmos substratos com os
microrganismos fermentativos, acetogênicos e metanogênicos, reduzindo a formação de CH4
como consequência da perturbação nos processos descritos na Figura 3, que esquematiza a
clássica e amplamente difundida representação da digestão anaeróbia (CHERNICHARO,
2016).
Especificamente a respeito deste processo em efluentes sanitários, em uma
abordagem estequiométrica, Deublein e Steinhauser (2011) descreveram o processo de
digestão anaeróbia por meio de uma equação química geral, incorporando, como se pode
perceber, uma parcela referente aos constituintes orgânicos presentes em maior abundância
nos esgotos: carboidratos, lipídios e proteínas, como citado por Van Haandel e Lettinga
(1994). Essa parcela está representada pelo primeiro termo da Equação 1, o qual também
determina a quantidade de produtos do restante da reação química, como pode ser visto nas
Equações 4, 5 e 6, para cada um dos constituintes supracitados.
𝒄 𝒉 𝒐𝑵𝒏𝑺𝒔 𝒚 𝒙 𝒏𝑵 𝒔 𝑺 (𝒄 − 𝒙) (1)
32
Em que,
𝒙 =𝟏
𝟖( 𝒄 𝒉 − 𝟎 − 𝒏 − 𝒔) (2)
𝒚 =𝟏
( 𝒄 − 𝒉 − 𝟎 − 𝒏 𝒔) (3)
Para a oxidação de carboidratos:
𝟔 𝟏 𝟔 (4)
De lipídios:
𝟏 𝟔 𝟗
𝟏𝟓
(5)
E de proteínas:
𝟏 𝟓 𝟕𝑵 𝑺 𝟔 𝟏
𝟏
𝑵 𝑺 (6)
Mesmo sendo expressas como um só processo (Equação 1), percebem-se, na
digestão anaeróbia, quatro fases (as três primeiras compõem a fermentação ácida, e a última
também pode ser chamada de fermentação metanogênica), das quais fazem parte os
respectivos microrganismos facilitadores e responsáveis das reações descritas na sequência
(VAN HAANDEL e LETTINGA, 1994).
Antes, embora a formação de H2S seja um processo concomitante à digestão
anaeróbia e não uma fase desta, é importante ainda ressaltar o fato de que, como as
concentrações de proteína encontradas em efluentes domésticos costumam ser elevadas, e a
digestão anaeróbia delas, representada pela Equação 6, gera H2S – componente do biogás
capaz de danificar peças metálicas e também responsável pelo forte odor característico de ovo
podre, em ETEs anaeróbias (CHERNICHARO et al., 2010) –, costuma-se destacar este
fenômeno para maior controle da quantidade deste gás indesejado e, a esta reação, dá-se o
nome de sulfetogênese, cuja intensidade e predominância dependerão da concentração de
sulfato no meio (CHERNICHARO, 2016).
3.3 Composição, potencial energético e estimativa de perda do biogás oriundo de
reatores UASB
Embora comumente se faça associação ao metano, seu componente mais
importante, o biogás, na verdade, é uma mistura de gases de composição variada, de acordo
com o tipo e a concentração de matéria orgânica submetida à digestão anaeróbia, bem como
33
dependente das condições físico-químicas do biodigestor – comentadas no item 3.2 – e das
comunidades de organismos presentes nele (NOYOLA et al., 2006). Por exemplo, em se
tratando do biogás gerado por reatores UASB, especificamente, Van Haandel e Lettinga
(1994) e Chernicharo (2016) afirmam que se podem encontrar teores elevados de CH4 (70-
80%), complementados por CO2 em menor concentração, uma vez que a solubilidade do
dióxido de carbono em água é bem maior (devido à formação de íons bicarbonato) do que a
do metano, o qual rapidamente se desprende da fase líquida e é liberado sob a forma de bolhas
de gás.
Por outro lado, para Balat e Balat (2009), o teor de metano em reatores anaeróbios
tratando efluente doméstico atingiria valores máximos em torno de 55 a 65% em volume,
enquanto que o teor de CH4 no gás natural atinge 90 a 95%, o que fez os autores concluírem
que o biogás pode ser considerado um gás natural de qualidade inferior. Logo, faz-se
necessária a determinação do percentual de metano como importante parâmetro de análise,
pois é esse componente que configura, ao biogás, seu poder calorífico, isto é, o valor
energético do biogás é diretamente proporcional ao teor de CH4 (METCALF e EDDY, 2016),
como pode ser analisado na Tabela 3, a qual, além de comparar o Poder Calorífico Inferior
(PCI) do biogás a outros combustíveis, também analisa a influência do teor de metano e gás
carbônico no peso específico deles.
Tabela 3 – Comparação do poder calorífico de alguns combustíveis.
Combustível Peso Específico (kg/Nm³) PCI (kcal/kg)
Biogás (40% CH4, 60% CO2) 1,4643 2.338,52
Biogás (60% CH4, 40% CO2) 1,2143 4.229,98
Biogás (75% CH4, 25% CO2) 1,0268 6.253,01
Biogás (95% CH4, 5% CO2) 0,7768 10.469,60
GLP 552(líq.) 2,29(gás) 11.026
Propano Não disponível 22.000
Gás Natural Não disponível 8.554
Lenha 390 2.530
Fonte: O AUTOR (2019), adaptado de ALVES (2000); AVELLAR (2001), apud COSTA (2006).
Entretanto, é consenso que há outros gases na composição do biogás que, mesmo
em menores porcentagens, não deixam de ser menos importantes devido aos efeitos adversos
que eles provocam à qualidade do biogás destinado à produção de energia renovável, e.g.,
monóxido de carbono (CO), amônia (NH3), nitrogênio gasoso (N2), hidrogênio gasoso (H2),
34
gás sulfídrico ou sulfeto de hidrogênio (H2S), vapor de água, argônio (Ar), mercaptanas de
baixo peso molecular (R-SH), siloxanos (H(OSiH2)n) e demais compostos orgânicos voláteis
(COVs) (LISOWYJ e WRIGHT, 2018; BALAT e BALAT, 2009; METCALF e EDDY, 2016;
CABRAL, 2016; LOBATO, 2011). Embora o H2S seja o gás odorante mais característico de
ETEs anaeróbias e o mais associado ao biogás, fato que o leva a ser, muitas vezes, o único
parâmetro utilizado por especialistas quanto ao tratamento de odores, outros potenciais
compostos odorantes achados frequentemente em estações de esgoto são: sulfeto óxido de
enxofre (COS), dissulfeto de carbono (CS2), tiofenos (C4H4S), dimetiltrissulfeto ((CH3)2S3),
aminas orgânicas e inorgânicas, ácidos orgânicos, aldeídos e cetonas (ALLEN e PLANK,
1993, apud NOYOLA et al., 2006). A Tabela 4 compara a composição de biogás de
diferentes fontes, incluindo os gases mais comumente encontrados.
Tabela 4 – Composição do biogás originário de diferentes fontes.
Componente Unidade
Composição volumétrica típica por fonte de biogás
Reatores
UASB
Aterro
sanitário Agropecuário
Biodigestor
de lodo
CH4 % 60 a 85 45 a 50 50 a 80 60 a 70
CO2 % 5 a 15 30 a 45 30 a 50 20 a 40
CO % 0 a 0,3 0 a 0,2 - -
N2 % 10 a 25 0 a 15 - < 2
H2 % 0 a 3 Traços a > 1 0 a 2 -
H2S ppmv 1000 a 2000 10 a 200 100 a 700 Até 1000
O2 % Traços 0,8 - -
NH3 % Traços Traços Traços Traços
Fonte: O AUTOR (2019), adaptado de BEN et al. (2013); DEUBLEIN e STEINHAUSER (2011); CABRAL
(2016).
Adicionalmente, o Quadro 1 fornece compostos indesejados e comuns em biogás
de reatores UASB, bem como os potenciais efeitos negativos dessas substâncias. Logo, faz-se
necessária a identificação prévia dessas substâncias, para que a melhor tecnologia de
purificação do biogás seja implementada, potencializando a remoção dos compostos
sulfurosos e vapor de água e diminuindo a diluição do biogás em outros gases inertes, como o
N2. Dessa forma, será possível obter um biocombustível mais aperfeiçoado e com uma
potente condição de combustão.
35
Quadro 1 – Contaminantes comumente presentes no biogás e suas adversidades.
Impurezas Efeitos negativos para o aproveitamento energético do biogás
Dióxido de
carbono
Formação de ácido carbônico, causando degradação de peças mecânicas do
gerador elétrico.
Água Favorece a corrosão nos sistemas de digestão anaeróbia.
Sulfeto de
hidrogênio
Produção de ácido sulfúrico (H2SO4), o qual, além de tóxico, também é
corrosivo.
Oxigênio
Presente no biogás quando há inadequada estanqueidade no sistema de
digestão anaeróbia, podendo resultar em uma mistura gasosa CH4/O2
inflamável.
Compostos
orgânicos
voláteis
Presentes sob a forma de hidrocarbonetos halogenados, alifáticos e aromáticos,
além de compostos oriundos da redução de enxofre, promovem a precipitação
de compostos insolúveis, causando depósitos no biodigestor e obstrução nas
peças do sistema anaeróbio. Fonte: O AUTOR (2019), adaptado de LISOWYJ e WRIGHT (2009).
Como já previamente discutido, a proporção de cada gás é um produto
multifatorial. Portanto, para Metcalf e Eddy (2016), as Equações 1 a 6 demonstram certa
importância, já que têm o intuito de correlacionar as concentrações de carga orgânica do
esgoto degradado anaerobiamente em razão do volume produzido de cada composto dessa
mistura gasosa, para melhor estimativa da qualidade e do potencial energético do biogás,
estabelecendo uma relação molar estequiométrica que visa a descrever a conversão do
carbono da matéria orgânica em CH4 e CO2, do nitrogênio em NH3 e do enxofre em H2S,
como verificado primeiramente por Buswell e Mueller (1952), apud Metcalf e Eddy (2016) –
que contabilizaram, originalmente, apenas o carbono, hidrogênio e oxigênio presentes com o
volume de metano e dióxido de carbono produzidos anaerobiamente – e, posteriormente,
Parkin e Owen (1986) e Tchonobanoglous et al. (2003), apud Metcalf e Eddy (2016),
complementaram essa reação ao incluírem o nitrogênio e o enxofre presentes na matéria
orgânica para contabilização dos volumes de amônia e gás sulfídrico produzido.
De acordo com Chernicharo (2016), existem duas formas de se quantificar a
geração de metano em um reator UASB: a partir da composição química do despejo ou a
partir da DQO degradada ou removida. Esta, por sua vez, corresponde a uma parcela da DQO
total (ou aplicada) que entra no sistema, sendo a outra parcela correspondente à DQO não
degradada (ou não removida) e que, portanto, permanece no reator ou é perdida no efluente.
Logo, partindo do princípio de que um mol de metano reage com dois mols de oxigênio para
que ocorra sua completa oxidação a gás carbônico e água ( ), é
necessária haver a degradação de 64g de DQO para que sejam formados 16g de CH4, ou
ainda, em se tratando de gases, é possível prever que, nas Condições Normais de Temperatura
36
e Pressão (CNTP), há a formação de 350 mL de metano para cada grama de DQO degradada.
O Quadro 2 resume as equações essenciais para o cômputo teórico da geração de metano no
tratamento anaeróbio de esgoto.
Quadro 2 – Estimativa de produção de metano e potencial elétrico do biogás.
Processo Equação Observações
Degradação de
DQO 𝑫𝑸 𝒓𝒆𝒎𝒐𝒗 = 𝑸 × (𝑺𝟎 − 𝑺)
DQOremov = carga de DQO removida
no reator (kgDQO.dia-1
)
Q = vazão afluente (m³.dia-1
)
S0 = concentração de DQO afluente
ao sistema (kgDQO.m-³)
S = concentração de DQO efluente ao
sistema (kgDQO.m-³)
Produção de
metano 𝑸 =
𝑫𝑸 𝑲(𝑻)
QCH4 = vazão de metano produzido
(m³.dia-1
)
DQOCH4 = carga de DQO removida
no reator e convertida em metano
(kgDQO.dia-1
)
K(T) = fator de correção para a
temperatura operacional do reator
Determinação do
fator de correção 𝑲(𝑻) =
𝑷 ×𝑲
𝑹 × ( 𝟕 , 𝟏𝟓 𝑻)
P = pressão atmosférica (1 atm)
K = concentração de oxigênio
dissolvido (COD) para remoção de
um mol de CH4 (64 gDQO.mol-1
)
R = constante dos gases (0,08206
atm.L.mol-1
.K-1
)
T = temperatura operacional do reator
(ºC)
Total de DQO
removida 𝑫𝑸 𝒓𝒆𝒎𝒐𝒗 = 𝑫𝑸 𝑫𝑸 𝒍𝒐𝒅𝒐
Entende-se que a DQO removida
corresponde ao somatório da DQO
transformada em metano e DQO
convertida em biomassa
37
DQO convertida
em biomassa 𝑫𝑸 𝒍𝒐𝒅𝒐 = 𝒀𝒐𝒃𝒔 ×𝑫𝑸 𝒂𝒑𝒍
Yobs = coeficiente observado de
produção de sólidos no sistema,
variando, no Brasil, entre 0,11 a 0,23
kgDQOlodo.kgDQOapl-1
DQOapl = carga de DQO total
aplicada ao sistema (kgDQO.dia-1
)
Vazão estimada
de biogás 𝑸𝒃𝒊𝒐𝒈á𝒔 =
𝑸 %
Qbiogás = vazão estimada de produção
de biogás (m³.dia-1
)
%CH4 = teor de metano presente no
biogás produzido no reator
Fonte: CHERNICHARO (2016).
Embora, na teoria, existam equações que descrevam a composição final do biogás
baseadas no teor da matéria orgânica presente no efluente a ser tratado anaerobiamente; na
prática, a realidade é diferente. Para que seja possível estimar a produção de CH4 e, portanto,
o potencial de recuperação energética, faz-se necessário conhecer as diversas rotas pelas quais
pode ocorrer a conversão da matéria orgânica (DQO) em metano, como apresentado na
Figura 4. Dessas rotas de oxidação da DQO, Souza et al. (2011) e Lobato et al. (2012)
enfatizaram as três mais importantes, sugerindo onde haveria as principais perdas de metano
e, consequentemente, os maiores desperdícios do potencial energético do biogás. São elas:
a. A utilização da DQO na redução de sulfato (menor perda das três rotas,
devido às geralmente baixas concentrações de SO42-
);
b. A conversão da DQO em CH4 que permanece dissolvido no meio líquido
e, portanto, perdido no efluente final (de 36 a 41% das perdas, dependendo do
tempo de detenção hidráulica no reator);
c. A perda de CH4 na superfície livre da zona de sedimentação do reator
UASB como gás residual (cerca de 4% das perdas).
Há também uma fração orgânica da DQO que dificilmente conseguirá ser
processada pelos microrganismos responsáveis pela digestão anaeróbia e, consequentemente,
não será transformada em biogás, não configurando potencial energético ao substrato. A essa
parcela, dá-se o nome de DQO recalcitrante, pois ela é composta por substâncias de baixa
biodegradabilidade, como lignina, celulose, hemi-celulose, entre outras substâncias que
persistem resistentes no interior dos reatores anaeróbios (BRASIL, 2016b).
38
Figura 4 – Rotas de conversão de DQO e fluxo do metano em reatores UASB.
Fonte: O AUTOR (2019), adaptado de LOBATO et al. (2012).
Mantendo o menor número de dados possível, a fim de facilitar a aplicação do
modelo matemático desenvolvido para o balanço de massa a considerar todas as rotas de
oxidação da DQO e fluxos de metano, Lobato et al. (2012) traçaram três cenários (pior,
intermediário e melhor cenário) e os aplicou em uma ETE em escala piloto, uma ETE em
escala de bancada e em duas estações em escala real, cujos resultados podem ser observados
na Tabela 5, com ênfase para ambas as linhas referentes à média de produção de biogás e ao
valor médio do potencial de recuperação energética. Essa mesma metodologia foi empregada
no trabalho de Lobato (2011), em que a pior situação consistia em valores de potencial
energético menores, ou seja, em que havia maior diluição do efluente, maiores concentrações
de sulfato, menor eficiência de remoção de DQO e maiores índices de perda de CH4; por
outro lado, a melhor situação incluía ETEs com potencial energético mais elevado,
consequência de sistemas operando com esgoto mais concentrado, menores concentrações de
sulfato, maior eficiência de remoção de DQO e menores índices de perda de metano. Por fim,
a situação típica referia-se àqueles cenários com tais valores de parâmetros intermediários.
Além disso, a Figura 5 ilustra o balanço de massa quanto à conversão da DQO no
processo de digestão anaeróbia, no pior cenário estipulado (menor potencial energético,
efluente mais diluído, alta concentração de sulfato dissolvido, baixa eficiência de remoção de
DQO pelo reator UASB e altas taxas de perdas de metano).
39
Figura 5 – Simulação do balanço de massa de DQO, no pior cenário.
Fonte: O AUTOR (2019), adaptado de LOBATO et al. (2012).
Tabela 5 – Características das ETEs, produção de biogás e potencial de recuperação
energética obtidos da validação do modelo matemático desenvolvido.
Escala bancada Escala piloto ETE Onça ETE Laboreaux
População (hab) 8 140 330.000 30.000
Vazão média
afluente (L.s-1
) 0,02 0,32 660 70
Número de
unidades 1 1 24 8
Dimensões (m) D = 0,3 D = 2,0 38,4 x 6,4 21,7 x 6,2
Produção de biogás
(m³.d-1
) 0,12 2,1 3.900 390
Potencial de
recuperação
energética (MJ.d-1
)
2,7 55,8 105.000 11.000
Fonte: LOBATO et al. (2012).
Outro estudo considerou todos os gastos energéticos da ETE Laboreaux, na cidade
de Itabira (MG) – incluindo setores como iluminação, demanda administrativa e laboratorial,
operação do filtro prensa da estação, bombas das estações elevatórias, entre outros
equipamentos –, e concluiu que a média de consumo de energia elétrica na ETE, durante o
período da pesquisa (de outubro de 2010 a outubro de 2011), foi de 1.586 kWh.d-1
, isto é,
5.709 MJ.d-1
(ROSA et al., 2016).
Dessa forma, cruzando os resultados de Rosa et al. (2016) e Lobato et al. (2012),
para a ETE Laboreaux, o potencial de recuperação energética da estação excederia toda a sua
demanda em, aproximadamente, 48%, demonstrando, assim, a importância do gerenciamento
das perdas de metano, bem como a necessidade de investimento em tecnologias que
DQO convertida
em biomassa
(lodo)
13% DQO usada na
redução de
sulfato
7% Outras perdas
3%
DQO
transformada em
metano
dissolvido no
efluente
17%
DQO convertida
em metano
presente no
biogás
20%
DQO não
convertida em
metano e
perdida no
efluente
40%
40
promovam sua recuperação energética para fins lucrativos e de minimização das emissões de
gases de efeito estufa mais agressivos. Nos casos de micro e minigeração distribuída, ou seja,
quando a produção não ultrapassa 5 MW de potência instalada para cogeração qualificada e
demais fontes renováveis de energia (ou 3 MW para fontes hídricas), esse excedente poderia
ser redirecionado para abatimento na conta de energia de outros empreendimentos da
concessionária, como estações de tratamento de água, prédios administrativos ou demais
ETEs que não possuem tecnologia para coleta de biogás, por meio da reinjeção dessa energia
extra na rede elétrica da concessionária local de energia, conforme prevê os incisos III e VI,
Art. 7º da Resolução Normativa nº 482, de 17 de abril de 2012, segundo redação alterada pelo
Art. 6º da Resolução Normativa nº 687, de 24 de novembro de 2015, da Agência Nacional de
Energia Elétrica (ANEEL).
III – para o caso de unidade consumidora com microgeração ou
minigeração distribuída a que se refere o inciso II do art. 6º, o faturamento deve
considerar a energia consumida, deduzidos o percentual de energia excedente
alocado a essa unidade consumidora e eventual crédito de energia acumulado em
ciclos de faturamentos anteriores, por posto tarifário, quando for o caso, sobre os
quais deverão incidir todas as componentes de tarifa em R$/MWh;
[...]
VI – o excedente de energia que não tenha sido compensado na própria
unidade consumidora pode ser utilizado para compensar o consumo de outras
unidades consumidoras, observando o enquadramento como empreendimento
com múltiplas unidades consumidoras, geração compartilhada ou autoconsumo
remoto.
Os geradores de energia com potência instalada superior a 5 MW podem
participar da comercialização dessa produção energética por meio de duas esferas de
mercado: o Ambiente de Contratação Regulada (ACR) e o Ambiente de Contratação Livre
(ACL), em que geradores, comercializadores, distribuidores e consumidores livres ou
especiais de energia são capazes de – por meio de acordos livremente estabelecidos entre as
partes ou por meio de leilões de compra e venda regulados pela ANEEL, sob a forma de
Contrato de Comercialização de Energia Elétrica no Ambiente Regulado (CCEAR) – negociar
energia com qualquer outra entidade, independentemente das restrições físicas de geração e
transmissão, desde que sejam membros do Sistema Interligado Nacional (SIN) (CCEE, 2019).
Metcalf e Eddy (2016) compararam o balanço de energia entre os processos
aeróbio (lodos ativados) e anaeróbio (reator anaeróbio), considerando um afluente à
temperatura de 20ºC, com vazão de 100 m³.d-1
e DQO igual a 10.000 g.m-3
. Os autores, então,
concluíram que os gastos energéticos no sistema de lodos ativados foi de 1,9*106 kJ.d
-1 e,
como não houve produção de metano, a produção líquida de energia resultou em -1,9*106
41
kJ.d-1
. Em contrapartida, no sistema utilizando reator anaeróbio com aproveitamento da
energia do biogás, embora tenha havido consumo de 5,3*106 kJ.d
-1 para elevação da
temperatura do esgoto de 20 até 30ºC, a produção de metano convertida em valores
energéticos foi igual a 12,5*106 kJ.d
-1, o que resultou, portanto, em uma produção líquida de
+7,2*106 kJ.d
-1, aproximadamente 3,8 vezes a energia necessária para o tratamento com lodos
ativados, demonstrando uma das vantagens das tecnologias anaeróbias frente às aeróbias.
3.4 Alternativas de tratamento e análises das aplicações do biogás de ETEs para fins
energéticos
Conforme destacado nas sessões anteriores, há a potencialidade de tornar estações
de tratamento de efluente em produtoras de energia, o que pode ser otimizado, segundo
Metcalf e Eddy (2016), pelo coprocessamento de recursos energéticos externos, como óleos,
gorduras, graxas e sobras de alimentos, restando, então, o desafio de prospectar tecnologias
capazes de extrair essa energia contida nos subprodutos da digestão anaeróbia eficientemente.
Antes de se pensar em apresentar uma destinação final ao biogás imediatamente
após sua geração, – seja para produção de energia, seja para uma simples queima em flares –
deve-se ponderar, primeiramente, a que fim o biogás gerado servirá; posteriormente, como ora
discutido, deve-se investigar a respeito de sua composição, i.e., acerca da possível presença de
compostos indesejados, como as potenciais substâncias contaminantes, gases inertes e gases
odorantes, e.g., H2S, gás carbônico, vapor de água e compostos orgânicos voláteis (COVs),
com o intuito de evitar danos aos equipamentos empregados e prejuízos à saúde dos seus
operadores e dos moradores da vizinhança. A Figura 6, retirada do relatório do Projeto
PROBIOGÁS (BRASIL, 2015b), intitulado de Tecnologias de Digestão Anaeróbia com
Relevância para o Brasil: Substratos, Digestores e Uso de Biogás, exemplifica a que níveis
de tratamento deve-se submeter o biogás produzido, em consonância ao seu aproveitamento.
42
Figura 6 – Tratamento do biogás conforme seu uso final.
Fonte: BRASIL (2015b).
As tecnologias para tratamento do biogás podem ser classificadas quanto à sua
natureza: biológica, física ou química, a depender de alguns parâmetros de análise, como
classe, vazão e concentração dos poluentes, solubilidade e biodegradabilidade dos compostos
a serem removidos, temperatura, pressão, teor de oxigênio do gás, potenciais impactos
ambientais relacionados à transferência de poluentes e gastos previstos para investimento e
manutenção dos equipamentos (NOYOLA et al., 2006). Para os autores, o tratamento do
biogás acontece, geralmente, por vias físico-químicas, as quais são capazes de trabalhar a
concentrações mais elevadas de poluentes, como verificada na Figura 7; enquanto os
processos biológicos são preferidos para controle de gases odorantes, em concentrações
relativamente baixas e susceptíveis ao tratamento aeróbico, como uma tecnologia de
mitigação de impactos adversos nos equipamentos e nas áreas ao redor da ETE.
43
Figura 7 – Aplicabilidade de diversas tecnologias quanto à vazão de ar e à
concentração do poluente.
Fonte: O AUTOR (2019), adaptado de CHERNICHARO et al. (2010).
Em se tratando de reatores anaeróbios tratando esgoto doméstico, Chernicharo et
al. (2010) concluíram que, posteriormente a uma análise qualitativa, constituem-se, como
predileção para destinação do biogás gerado, devido ao maior conjunto de vantagens inerentes
à tecnologia, a combustão direta, os métodos bioquímicos, de uma forma geral, e,
particularmente, os biofiltros. O Quadro 3 apresenta exemplos de tecnologias de tratamento
do biogás, classificados por natureza.
44
Quadro 3 – Classificação de tecnologias para tratamento do biogás quanto
a sua natureza.
TE
CN
OL
OG
IAS
US
UA
IS P
AR
A C
ON
TR
OL
E D
E
OD
OR
, H
2S
, C
O2 E
CO
Vs F
ÍSIC
AS
- Condensação;
- Membranas;
- Máscara;
- Diluição;
- Absorção (lavadores de gás);
- Adsorção (carbono ativado, alumínio ou sílica em gel).
QU
ÍMIC
AS
- Combustão (flares, oxidação térmica e oxidação catalítica);
- Precipitação química (FeCl2);
- Tecnologia de plasma;
- Oxidação (OCl-, O3, H2O2, KMnO4, FeO, entre outros).
BIO
LÓ
GIC
AS
- Biofiltração;
- Biofiltro percolador;
- Bioscrubbers;
- Biorreatores de membrana;
- Biorreatores fotoquímicos;
- Reator biológico rotacional de contato.
Fonte: O AUTOR (2019), adaptado de NOYOLA et al. (2006).
Devido ao seu alto poder de queima, o biogás pode ser aproveitado para geração
de calor por meio de sua combustão e consequente produção de vapor quente, o qual pode ser
aplicado para movimentação de turbinas, como no Ciclo Orgânico de Rankine (do inglês,
ORC), no ciclo de Cheng, em turbinas a vapor e em sistemas de pistão (DEUBLEIN e
STEINHAUSER, 2011). Em complemento, além de ser usado no funcionamento de motores,
geradores e moto-picadeiras, o biogás pode também ser aproveitado no processo de
resfriamento de leite, aquecimento de água, na iluminação e em eletrodomésticos, como
geladeira e fogão (COSTA, 2006).
Para maior facilidade, Lobato et al. (2009) dividiram as diversas aplicabilidades
do biogás nas seguintes classes:
a. Uso direto: método de menor complexidade e que apresenta melhor relação
custo x benefício. Consiste na utilização do biogás para substituir ou
complementar outros combustíveis, como o gás natural, carvão e óleo diesel,
em processos industriais em geral, envolvendo, entre outros, aquecedores de
água na piscicultura, secadores de lixiviados, fornos para fabricação de
cerâmica ou vidro e estufas.
45
b. Geração de eletricidade: como já explicitado, por meio de motores de
combustão interna, turbinas e micro-turbinas, além de uma maior gama de
tecnologias para conversão do biogás em eletricidade, a fim de ser consumida
in loco ou vendida à concessionária de energia elétrica da região.
c. Cogeração: produção concomitante de eletricidade e calor (vapor ou água
quente), o que aumenta a eficiência de tais sistemas, conferindo, a essa classe,
a característica de ser uma das mais economicamente interessantes.
d. Combustíveis alternativos: consiste na opção que requer maior tratamento
do biogás quanto à remoção de substâncias corrosivas, como o sulfeto de
hidrogênio, pois prevê sua utilização como combustível veicular, bem como
sua injeção nas redes de gás natural de uma região. Contudo, na Alemanha,
por exemplo, em 2010, já existiam cerca de 40 usinas injetando biogás no
sistema de distribuição de gás e uma espera de, até 2020, estar substituindo
cerca seis bilhões de metros cúbicos de gás natural por ano, reduzindo
consideravelmente os impactos ambientais causados pela extração e queima
indiscriminadas desse combustível.
O relatório do PROBIOGÁS (BRASIL, 2015b) apontou que as principais
alternativas tecnológicas para utilização do biogás, que são consideradas tecnicamente
consolidadas e que apresentam dados empíricos para comprovar sua eficiência, em escala
mundial, são:
a. Motores estacionários a gás, com geração de energia elétrica e térmica
(CHP): do inglês Combined Heat and Power, esses tipos de motores
funcionam por meio da combustão do biogás, produzindo eletricidade e calor
– por isso o nome –, possibilitando a exploração de até 90% da energia
presente nesse biocombustível. Como pré-requisito, determina-se que o biogás
utilizado contenha, no mínimo, 45% de metano, bem como apresente
melhorias na qualidade mediante a minimização de compostos sulfurosos e de
vapor de água (BRASIL, 2015b);
b. Caldeiras de biogás para geração de energia térmica: nessa tecnologia, a
utilização do biogás para produção de calor acontece por meio da queima em
sistemas de aquecimento, com o intermédio de queimadores atmosféricos
(para potência elétrica baixa), de queimadores com ventilador (para
recebimento de ar com alta pressão), ou de queimadores tipo lança (para
46
lareiras de combustão curtas) (BRASIL, 2015b). Mesmo com a limitação de
produzir apenas calor e embora seja exigido um gás com umidade relativa de
até 60% e com concentração de compostos sulfurosos menor que 0,1%, essa
tecnologia passa a ser mais vantajosa do que os motores CHPs devido aos
menores custos;
c. Injeção na rede de gás natural: essa alternativa apresenta maior diversidade
que as duas anteriores, uma vez que permite o aproveitamento de energia sob
as formas elétrica, térmica e veicular. Para isso, deve-se haver uma instalação
específica, com estação de medição quantitativa e qualitativa para controle de
pressão. Além disso, é necessário eliminar todos os componentes gasosos a
fim de se obter um gás com pureza entre 90 e 98% de CH4 (BRASIL, 2015b).
O relatório ainda complementa que o biometano (biogás extremamente
purificado), proveniente da digestão do lodo da ETE da cidade de Bottrop
(Alemanha), está sendo engarrafado e fornecido para utilização como
combustível veicular, resultado de um projeto de pesquisa e desenvolvimento
(P&D) no local.
Bressani-Ribeiro et al. (2017) avaliaram o potencial de recuperação energética em
um cenário composto de um sistema de reator UASB seguido por filtro percolador, tratando
efluente doméstico, em países tropicais e, para isso, lançaram mão das Equações 7 a 10.
𝒑𝒓𝒐𝒅 = 𝒑𝒐𝒑 × 𝑫𝑸 𝒑𝒄 × 𝑺 × 𝒆𝒔𝒑 (7)
𝒅𝒊𝒔𝒑 = 𝒑𝒓𝒐𝒅 × 𝑷 (8)
𝑷𝑻 = 𝒅𝒊𝒔𝒑 × 𝑻 (9)
𝑷 = 𝒅𝒊𝒔𝒑 × (10)
Em que CH4 prod = produção de metano (Nm³.d-1
); pop = população (milhões de
habitantes); DQOpc = DQO per capita (0,10 kgDQO.hab-1
.d-1
); EfUASB = eficiência média de
remoção de DQO em um reator UASB (65%); CH4 unit = produção unitária de metano (158,3
LCH4.kgDQO-1
removida); Edisp = energia disponível (MWh.d-1
); PCCH4 = poder calorífico do
metano (9,97 kWh.m-3
CH4); EPT = energia potencial térmica (MWh.d-1
); EfT = coeficiente de
conversão térmica (40%); EPE = energia potencial elétrica (MWh.d-1
); EfE = coeficiente de
conversão elétrica (30%).
47
Após analisarem a aplicação desse cenário para três grupos populacionais (até
10.000 habitantes, entre 10.000 e 100.000 habitantes, e acima de 100.000 habitantes),
Bressani-Ribeiro et al. (2017) concluíram que sistemas anaeróbios de tratamento de esgoto
prestam um papel importantíssimo quanto ao saneamento ambiental em países tropicais e em
desenvolvimento, como no Brasil, uma vez que se pôde observar um enorme potencial para
produção de energia por meio do biogás gerado nessa modalidade de tratamento, o qual pode
ser destinado a diversos fins, dependendo do tamanho populacional atendido pela estação de
tratamento com tecnologia reatores UASB (11.646 GWh.ano-1
de energia térmica e 6.562
GWh.ano-1
de energia elétrica).
Por exemplo, os autores calcularam que, para estações com porte de atendimento
populacional de até 10.000 habitantes, somando uma capacidade de tratamento instalada igual
a 12.695.895 habitantes, as ETEs responsáveis por essa contribuição de esgoto seriam capazes
de produzir 190.755 MWh.ano-1
de energia térmica, ou seja, 686.718 GJ.ano-1
de energia
térmica que, devido ao contingente populacional, poderia ser direcionada para aquecimento de
água, produção de vapor, cocção de alimentos ou desinfecção do lodo descartado dos reatores
UASB. Adicionalmente, para as ETEs com porte de atendimento entre 10.000 e 100.000
habitantes, o que incluiu uma capacidade de atendimento instalada de 180.105.925 habitantes,
calculou-se uma produção de 2.706.075 MWh.ano-1
ou 9.741.870 GJ.ano-1
de energia térmica
que poderia ser destinada para mesmo fim do grupo anterior.
Por outro lado, para as ETEs com capacidade de tratamento acima de 100.000
habitantes, o que englobou uma capacidade de atendimento instalada de 582.327.513 pessoas,
Bressani-Ribeiro et al. (2017) previram que seriam gerados 6.559.278 MWh.ano-1
de energia
elétrica ou 8.745.704 MWh.ano-1
(31.484.534,4 GJ.ano-1
) de energia térmica. Dessa forma,
potência produzida de energia elétrica, com base no consumo médio residencial brasileiro de
eletricidade, seria capaz de suprir a demanda de 3,2 milhões de unidades habitacionais.
Dois estudos complementares (ROSA, 2013; ROSA et al., 2016) foram realizados
na ETE Laboreaux, em Itabira – MG, a qual apresenta unidades de tratamento biológico
anaeróbio e aeróbio (reator UASB, filtro biológico percolador e decantador secundário). À
época das pesquisas, a estação recebeu uma vazão média de 80 L.s-1
, em sua primeira etapa de
construção, prevista para o atendimento de 70.000 habitantes, podendo chegar até a 123.000
habitantes em 2029. Além disso, todo o biogás gerado era queimado em flares, não havendo
aproveitamento energético desse gás.
48
Diante dessas condições, os autores relataram que se observou uma produção de
390,1 Nm³.d-1
de biogás, com composição média de 78,2% de CH4, 6,7% de CO2 e 15,1% de
outros gases, i.e., valores pertinentes quanto às faixas destacada na Tabela 4, para reatores
UASB (60 a 85% de metano). Logo, com essas características, foi possível estimar um
potencial de produção de energia de, aproximadamente, 10.962 MJ.d-1
(ROSA et al., 2016).
Para o primeiro cenário traçado pelos autores (cenário 1), em que o uso prioritário
do biogás seria como fonte de calor para secagem térmica do lodo e, secundariamente, a
geração de eletricidade com o excedente, percebeu-se que 61,5% do biogás gerado eram
necessários para evaporação da água do lodo, enquanto que 38,5% representavam o
excedente, que seria direcionado para geração de energia elétrica. Adotando-se um
rendimento usual de 30% do conjunto motogerador, a eletricidade produzida (1.265 MJ.d-1
),
proveniente do biogás utilizado, demonstrou-se suficiente para suprir 22,2% da demanda da
ETE Laboreaux. Em contrapartida, em um segundo cenário (cenário 2), foi considerado que o
uso prioritário do biogás seria para a geração de eletricidade, resultando na produção de 3.289
MJ.d-1
, o que correspondeu ao suprimento de 57,6% da estação (ROSA et al., 2016).
Lobato et al. (2013) conduziram um experimento, em escala de bancada, na ETE
Arrudas, localizada no Centro de Pesquisa e Treinamento em Saneamento UFMG/COPASA
(CePTS), na cidade de Belo Horizonte – MG, com capacidade de vazão de 4.5 m³.s-1
. Esse
estudo focou na autossuficiência de estações de tratamento, ou seja, no fomento de ETEs
sustentáveis, bem como no manejo seguro do lodo excedente produzido nesses locais, por
meio do uso do biogás, cuja composição apresentou teores iguais a 70% de CH4, 7% de CO2 e
1.750 ppmv de H2S, produzido por três reatores UASB, cujo volume útil correspondia a 14 m³
cada (Figura 8).
Com relação aos testes de secagem e desinfecção do lodo com o biogás, foi
possível perceber redução de 50% do volume total e aumento de 4 a 8% do teor de sólidos,
com total inativação de ovos de helminto, usados como indicadores de higienização do lodo,
após 1,5 horas de aquecimento e à temperatura de 60ºC. No que concerne à média de
potencial elétrico disponível, os resultados mostraram que a ETE é autossustentável, devido
ao balanço energético positivo de +1,75 kW, i.e., 76% da potência total disponível (2,30 kW)
foram destacados como excedente. Ademais, quanto à unidade de cogeração de energia
elétrica e térmica, observou-se que houve produção de 1,35 kWh de eletricidade por Nm³ de
biogás consumido, enquanto que a demanda dessa unidade foi de 0,32 kWh.Nm-3
desse
biocombustível (extra de +1,03 kWh.Nm-3
) (LOBATO et al., 2013). Esses excedentes
49
destacados podem ser redirecionados a outros propósitos locais, como já discutido
previamente.
Figura 8 – Fluxograma da ETE Arrudas.
Fonte: COPASA (2012), apud ROSA (2013).
Mais um exemplo de uma ETE no Brasil com recuperação energética do biogás é
a ETE Ouro Verde, localizada em Foz do Iguaçu – PR. Essa estação, composta por um reator
do tipo UASB, atua a uma vazão igual a 40 L.s-1
, correspondente a uma população de 35 mil
habitantes, podendo chegar até 70 L.s-1
, e produz biogás a uma vazão aproximada da ordem
de 50 m³.d-1
(teor de CH4 igual a 67%). Esse gás é aproveitado para geração de eletricidade na
própria estação de tratamento, bem como para venda à rede de distribuição da concessionária
de energia elétrica, atingindo, no ano de 2009, o valor de R$ 140,00 por MWh (SANEPAR,
2013 apud ROSA, 2013). A companhia de saneamento do Paraná (SANEPAR) ainda
informou que, no que concerne ao balanço energético da estação Ouro Verde, há um consumo
médio igual a 1.200 kWh.ano-1
e geração estimada de 3.600 kWh.ano-1
, significando um
excedente de 2.400 kWh.ano-1
(ROSA, 2013).
Rosa (2013) destacou que a SANEPAR configura como a maior consumidora de
energia elétrica do estado, sendo este consumo o segundo maior custo operacional da
companhia de saneamento. Portanto, a aplicação do biogás para geração de energia e
consequente economia na empresa é um foco da SANEPAR e deveria ser multiplicada pelas
diversas companhias de saneamento brasileiras. Como exemplos dos diversos investimentos
50
já realizados pela concessionária, tem-se que: foi a primeira companhia brasileira a fornecer
biogás de ETEs para locomoção de veículos e aquecimento de residências; empenha-se
constantemente na prospecção de novas fontes e formas de aproveitamento do biogás para
beneficiamento das estações de tratamento (e.g.: secagem do lodo pelo calor gerado com a
produção do biogás) e estimula a venda da energia transformada a partir do biogás à rede de
distribuição elétrica, para maior economia no processo de tratamento de efluentes de uma
forma geral.
Por fim, com o objetivo de identificar fluxogramas holísticos ideais para a
concepção de ETEs sustentáveis que atendessem diferentes contingentes populacionais
(pequeno porte: população equivalente maior que 2.000 habitantes e menor que 10.000
habitantes; médio porte: população equivalente maior que 10.000 e menor que 100.000
habitantes; grande porte: população equivalente maior que 100.000 habitantes), os autores
Bressani-Ribeiro et al. (2019), motivados pelo corriqueiro descomissionamento de ETEs cuja
tecnologia tenha sido adotada inadequadamente, culminando, consequentemente, na
constatação de baixas eficiências de performance e grandes dificuldades operacionais,
analisaram duas bacias (Rio das Velhas e Jequitaí-Pacuí) em Minas Gerais, para sugerir o
gerenciamento conjunto mais apropriado das partes sólidas, líquidas e gasosas do tratamento
de efluentes, considerando o contexto socioeconômico e ambiental peculiar de cada área.
Em se tratando de ETEs de pequeno e médio porte, por exemplo, quanto às
alternativas tecnológicas sugeridas para recuperação do biogás, Bressani-Ribeiro et al. (2019)
destacaram duas rotas de utilização da energia térmica do biogás de certa simplicidade
construtiva e operacional: i) para cocção de alimentos ou como combustível para aquecimento
de água nas vizinhanças da ETE; e ii) para o sistema de secagem de lodo ou como energia
térmica para processos desinfectantes dentro da área da estação. Com isso, os autores
afirmaram que a pequena substituição de 4% do gás liquefeito de petróleo (GLP) por biogás
resultaria na redução de emissões de carbono de, aproximadamente, 16,8 kgCO2eq.hab-1
.ano-1
,
ou seja, em um balanço positivo de pegada de carbono. A Figura 9 representa um diagrama
completo de uma ETE sustentável de pequeno porte, constituída de reator UASB e filtro
percolador.
51
Figura 9 – Fluxograma conceitual, esquemático e completo de uma ETE sustentável de
pequeno porte. Os losangos representam oportunidades de tomadas de decisão, com diferentes
rotas tecnológicas a serem escolhidas.
Fonte: O AUTOR (2019), adaptado de BRESSANI-RIBEIRO et al. (2019).
A alternativa de aproveitamento do biogás produzido em estações de tratamento
de esgoto, para cocção em comunidades circunvizinhas às ETEs, como substituição do GLP,
lenha ou carvão, de acordo com Souza et al. (2019), pode ser bastante significativa, uma vez
que abre precedente para desenvolvimento de um ramo econômico na localidade por meio da
capacitação dos habitantes da comunidade beneficiada com essa alternativa.
Como exemplo mais popular dos diversos modelos de fogão a biogás utilizados
no mundo, pode-se citar o de duas chamas (KURCHANIA et al., 2010), cujo princípio de
operação (Figura 10) é o mesmo para os demais tipos de queimadores e consiste nas
seguintes etapas: o biogás é injetado pela tubulação até atingir o fogão, onde sofre uma
adequada constrição de fluxo, aumentando a velocidade e promovendo a sucção do ar externo
para dentro do tubo (ar primário, necessário para combustão); para que a combustão ocorra a
contento, o ar deve ser completamente misturado ao biogás até atingir a saída para queima,
52
onde ocorre a complementação de oxigênio pelo ar circundante da chama (ar secundário),
para combustão final dessa mistura gasosa e formação de uma chama azul-escuro, indicando
que a combustão foi adequada (SESSE et al., 1991, apud SOUZA et al., 2019).
Figura 10 – Esquema de queimador de fogão
a biogás.
Fonte: FULFORD (1996), apud SOUZA et al. (2019).
Vale ressaltar que a concentração do biogás e o dimensionamento de cada orifício
de entrada e saída de gás são de extrema importância para a correta combustão do biogás, uma
vez que, caso a queima não aconteça de maneira devida, há a geração de compostos tóxicos,
como o monóxido de carbono e fuligem. A Figura 11 e a Figura 12 ilustram fogões a biogás
individual e comunitário, respectivamente, os quais conseguem operar a uma média de 375 L
de biogás por uma hora, demonstrando eficiência variável entre 40 e 60% (KURCHANIA et
al., 2011). Estima-se que, para cozinhar as três principais refeições diárias de uma família,
seriam necessárias três horas por dia de funcionamento do fogão a biogás, admitindo-se
chama em fogo médio (HOMEBIOGÁS, 2019), o que culminaria na utilização de 1.125
Lbiogás.dia-1
por residência, para cocção.
53
Figura 11 – Fogão a biogás individual doméstico.
Fonte: HOMEBIOGÁS (2018), apud SOUZA et al. (2019); KURCHANIA et al. (2011).
Figura 12 – Fogão a biogás comunitário.
Fonte: KURCHANIA et al. (2010).
O fogão comunitário da Figura 12, por exemplo, com alimentação dupla para
manutenção da pressão do biogás, nas suas duas extremidades, foi empregado por Kurchania
et al. (2010), na Índia, em um abrigo para pessoas em condições carentes de habitação, com o
intuito de assar pães típicos da respectiva região. Por meio desse teste, após a queima de 116
L de biogás por hora, percebeu-se que o fogão apresentou eficiência média de 43,96% para
queima de um biogás cujo poder calorífico era igual a 19,76 MJ.m-3
.
Por outro lado, no que se refere a ETEs de médio porte, adicionalmente às
alternativas explicitadas para as ETEs de tamanho inferior, os autores ainda sugeriram que o
biogás poderia ser utilizado como combustível para um secador térmico de lodo e, para
aumentar a produção desse gás, foi aventada também a possibilidade da geração de biogás
proveniente da escuma dos reatores UASB. Por outro lado, no que refere às estações de
54
grande porte, verificou-se que há diversas alternativas viáveis que percorrem desde soluções
de aproveitamento térmico até a utilização para geração de energia elétrica, incluindo o
beneficiamento do biogás à sua forma mais aprimorada e pura, o biometano.
A Figura 13 (BRESSANI-RIBEIRO et al., 2019) ilustra dois cenários em que é
possível analisar as alternativas para aproveitamento do biogás com base no tamanho da
estação de tratamento (pequeno e médio porte: 2.000 ≤ PE < 100.000 habitantes; grande
porte: PE ≥ 100.000 habitantes). Com essa representação, os autores sustentaram a ideia já
exposta em outros estudos de que a aplicação do biogás para geração de energia elétrica se
torna interessante, ou seja, economicamente viável, para ETEs cuja população atendida
ultrapasse o valor de 100.000 habitantes, predominando, portanto, para ETEs de pequeno e
médio porte, o aproveitamento energético térmico do biogás para cocção, aquecimento de
água e secagem de lodo.
Figura 13 – Fluxograma das alternativas de aproveitamento do biogás em ETEs operando
com reatores UASB.
Fonte: O AUTOR (2019), adaptado de BRESSANI-RIBEIRO (2019).
55
MATERIAL E MÉTODOS 4
4.1 Informações gerais da pesquisa
Os dados utilizados foram coletados, em sua maioria, na Companhia de Água e
Esgoto do Ceará (CAGECE), concessionária responsável pela gestão e operação de sistemas
de tratamento e abastecimento de água, em 151 dos 184 municípios estaduais, e de coleta e
tratamento de esgoto, em 74 do total de cidades do Ceará. Além disso, a CAGECE ainda pode
explorar, comercializar e gerir, para si e para terceiros, energia que seja oriunda ou não do
aproveitamento de subprodutos dos processos de saneamento (CAGECE, 2019), como o
biogás, bem como participar em quaisquer atividades econômicas que se relacionem, direta ou
indiretamente, com o setor de saneamento e seus diversos processos, seja no Ceará, seja em
qualquer outra unidade federativa em território nacional ou internacional.
Para exemplificar a magnitude e importância da concessionária para o estado,
pode-se citar que a CAGECE conta com, em se tratando apenas de esgotamento sanitário, o
atendimento de, aproximadamente, 2,4 milhões de pessoas, por meio de uma rede coletora
com 4.720,8 quilômetros de extensão, o correspondente a quase 41% de cobertura no Ceará;
enquanto que, somente na capital Fortaleza, esse índice sobe para 62% (CAGECE, 2019).
Logo, para melhor administração dessa área, a CAGECE dividiu o território cearense em 10
unidades de negócio (UNs) para a capital, região metropolitana de Fortaleza e demais
interiores, conforme mostram a Figura 14 e o Quadro 4.
Quadro 4 – Correspondência das unidades de negócio por bacia
administrativa.
Sigla Unidade de Negócio
UN-BSA Bacia do Salgado
UN-BBJ Bacia do Baixo Jaguaribe
UN-BAJ Bacia do Alto Jaguaribe
UN-BBA Bacia do Banabuiú
UN-BPA Bacia do Parnaíba
UN-BAC Bacia do Acaraú e Coreaú
UN-BSI Bacia da Serra da Ibiapaba
UN-BCL Bacia do Curu e Litoral
UN-BME Bacia Metropolitana
UN-MTE¹ Metropolitana de Macrocoleta e Tratamento de Esgoto ¹ Na capital, ocorre a divisão ainda em UNs Metropolitanas Oeste, Leste, Norte e Sul
(UN-MTO, UN-MTL, UN-MTN, UN-MTS), mas, para o escopo do trabalho e com
relação ao tratamento de esgotos, as UNs explicitadas melhor representam as bacias
administrativas da companhia.
Fonte: O AUTOR (2019).
56
Figura 14 – Mapa das unidades de negócio da CAGECE no interior.
Fonte: O AUTOR (2019), adaptado de CAGECE (2019).
4.2 Levantamento, quantificação e organização dos dados
Primeiramente, foi levantado, junto à Gerência de Operações e Desenvolvimento
Operacional (GDOPE), o quantitativo mais atualizado de ETEs por bacia administrativa e por
tipologia de tratamento de esgotos, considerando, também, o pós-tratamento adotado em cada
ETE, como indicado Quadro 5, em que LES = Lagoas de Estabilização; LFC = Lagoa
57
Facultativa; LMT = Lagoa de Maturação; LAN = Lagoa Anaeróbia; LEP = Lagoa de
Polimento; LRF = Lagoa de Resfriamento; DD = Decanto Digestor; CL = Cloração; FAN =
Filtro Anaeróbio; FSA = Filtro Submerso Aerado; UASB = Reatores UASB; RA = Reator
Aeróbio; DSE = Decantador Secundário; EPC = Estação de Pré-Condicionamento; LAAP =
Lodos Ativados de Aeração Prolongada.
Quadro 5 – Classificação das ETEs quanto à
tecnologia e à tipologia de tratamento.
Tecnologia adotada Tipologia da ETE
LES
LFC
LFC + LMT
LAN + LFC + LMT
LFC + DSE + CL
LAN + LFC
LAN + LMT
UASB
UASB + FSA + CL
UASB + LEP
UASB + CL
UASB + RA + CL
UASB + FAN + CL
UASB + FSA + LEP
UASB + LFC + LMT
DD DD + FAN + CL
DD + FAN
OUTROS
LAAP
LRF
EPC Fonte: O AUTOR (2019).
Legenda: LES = Lagoas de Estabilização; LFC = Lagoa Facultativa; LMT = Lagoa de Maturação; LAN = Lagoa
Anaeróbia; LEP = Lagoa de Polimento; LRF = Lagoa de Resfriamento; DD = Decanto Digestor; CL = Cloração;
FAN = Filtro Anaeróbio; FSA = Filtro Submerso Aerado; UASB = Reatores UASB; RA = Reator Aeróbio; DSE
= Decantador Secundário; EPC = Estação de Pré-Condicionamento; LAAP = Lodos Ativados de Aeração
Prolongada.
Foi analisado um total de 280 estações de tratamento de esgoto, das quais 158
ETEs localizadas na capital, 121 no interior e uma estação de pré-condicionamento de esgoto
(EPC), situada em um ponto na orla Fortaleza, cuja função é tratar previamente o efluente
para disposição no mar, por meio de um emissário submarino, a 3.300 metros da costa e a 16
metros de profundidade (CAGECE, 2019), representada pela Figura 15.
58
Figura 15 – Foto aérea da Estação de Pré-Condicionamento (EPC) de Fortaleza.
Fonte: CAGECE (2019).
A Gerência de Projeto (GPROJ) da companhia, juntamente à unidade de negócio
responsável pelo tratamento de esgoto da capital (UN-MTE), disponibilizou informações a
respeito das vazões e populações de projeto. Entretanto, devido à data de instalação de muitas
ETEs e à inobservância da necessidade de armazenamento desse tipo de informação à época
da concepção dessas estações, só foi possível fazer o levantamento desses dados de apenas
151 estações, dentre as quais, em 71 ETEs, havia dados de vazão e população de projeto, em
outras 71 só continham dados de vazão e em 9 estações havia apenas dados de população.
Logo, foram realizadas estimativas para os casos destacados pela ausência de
informações, considerando os dados do último diagnóstico Atlas Esgotos: despoluição de
bacias hidrográficas, da Agência Nacional de Águas (ANA, 2017), o qual continha
informações para o ano de 2013 e uma previsão de cenário dos mesmos dados para o ano de
2035, a respeito de vazões, cargas afluentes e efluentes às ETEs (kgDQO.dia-1
), índices de
atendimento e investimentos com coleta e tratamento, tipologia atual e prevista, atenção à
remoção de fósforo e de nitrogênio, entre outros parâmetros. Entretanto, para algumas cidades
com apenas uma ETE no município, a tabela só continha o total de habitantes atendido para o
ano de 2035. Logo, para saber o total de contribuintes com a vazão de esgoto no ano de 2013,
foi realizada a multiplicação do percentual atendido pela população estimada na cidade.
Com ajuda do Excel, foi possível classificar as estações analisadas por porte,
quanto à população de projeto, de acordo com o Quadro 6.
59
Quadro 6 – Grupos por intervalo populacional.
Porte Intervalos População (Hab)
Micro Pop ≤ 2.000
Pequeno 2.001 ≤ Pop ≤ 10.000
Médio 10.001 ≤ Pop ≤ 100.000
Grande Pop ≥ 100.001 Fonte: O AUTOR (2019).
Analogamente, baseado nos critérios apresentados pela companhia de saneamento
do Paraná (Sanepar) em seu módulo referente às diretrizes para elaboração de projetos de
sistema de esgotamento sanitário (SANEPAR, 2017), classificou-se também as ETEs por
porte quanto a suas respectivas vazões de projeto, como segue: porte pequeno (até 60 L.s-1
),
médio porte (entre 60 e 200 L.s-1
) e grande porte (acima de 200 L.s-1
).
Foram analisados e disponibilizados pela Gerência de Controle de Qualidade
(GECOQ) dados da Demanda Química de Oxigênio (DQO) de todas as ETEs durante o ano
de 2018, tanto para o esgoto bruto, quanto para o esgoto tratado, resultando em uma média de,
aproximadamente, 400 dados mensalmente. Esse parâmetro é também um dos quatro
utilizados para mensuração da qualidade do efluente, em adição ao potencial hidrogeniônico
(pH), à concentração de sólidos totais (ST) e à concentração de Escherichia coli, compondo o
Índice de Qualidade de Esgoto Tratado (IQET), também disponibilizado pela gerência
supracitada.
Quanto às estações de tecnologia LES, foi analisada a DQO filtrada no efluente
final, enquanto que, para as demais tecnologias, foi utilizada a DQO total. Essa peculiaridade
se justifica pelo fato de evitar que as algas (sólidos suspensos comumente encontrados em
efluentes de lagoas) mascarem o resultado da DQO final da amostra de esgoto analisada. Com
relação aos pontos de coleta fornecidos pela GECOQ, alguns exemplos para esgoto bruto são:
caixa de entrada da ETE, caixa de equidivisão, calha Parshall, caixa de areia, poço de sucção
e PV de entrada; e para o efluente tratado são: caixa de saída da ETE, vertedouro das lagoas,
saída do tanque de contato e PV de saída.
Adicionalmente, percebeu-se que não houve anotação desses parâmetros para
muitas ETEs com tratamento por lagoas de estabilização, em alguns meses, devido à falta de
lâmina de efluente no vertedouro das lagoas, dada a baixa vazão de contribuição e elevada
evaporação no estado do Ceará. Além disso, também foi possível notar a ausência de
informação para algumas ETEs de, principalmente, tecnologia DD por causa de divergências
na programação de coleta de amostras da gerência ou por dificuldade de acesso ao local.
60
Logo, para aumentar a confiabilidade dos resultados finais, no que concerne à
manipulação dos dados de DQO, foram consideradas apenas ETEs de tecnologia reatores
UASB para todo o estado do Ceará, separando aquelas contidas na capital e, portanto,
pertencentes à UN-MTE; aquelas contidas na RMF e, portanto, pertencentes à UN-BME; e as
demais, do restante do estado, ficaram agrupadas como ETEs do interior, independentemente
de a que unidade administrativa pertencesse.
Também por meio do Excel, foi possível organizar esses dados disponibilizados
de DQO para cômputo dos seguintes parâmetros estatísticos: número de dados, média
aritmética, valor mínimo e máximo, coeficiente de variância, desvio padrão, mediana e
percentis (10%, 25%, 50%, 75% e 90%). Com isso e aplicando as Equações 11 e 12,
determinaram-se os fortuitos valores anômalos, ou outliers, isto é, aqueles valores que se
demonstraram estatisticamente discrepantes aos demais do evento (considerando cada mês de
2018 separadamente) por estarem localizados, nos gráficos de box plots, acima do limite
superior máximo ou abaixo do limite inferior mínimo, sendo, portanto, excluídos a fim de
evitar inconsistências nas variáveis estatísticas supracitadas.
𝒊𝒎𝒊𝒏 = 𝑸𝟏 − 𝟏, 𝟓 (𝑸 − 𝑸𝟏) (11)
𝒊𝒎𝒔 𝒑 = 𝑸 𝟏, 𝟓 (𝑸 −𝑸𝟏) (12)
Em que Liminf = limite inferior; Limsup = limite superior; Q1 = primeiro quartil e
Q3 = terceiro quartil. Dessa forma, por exemplo, quaisquer valores que fossem superiores ao
terceiro quartil acrescido de 1,5 vezes o respectivo intervalo interquartil foram excluídos.
Analogamente, quaisquer valores que fossem inferiores ao primeiro quartil subtraído de 1,5
vezes o respectivo intervalo interquartil foram igualmente expurgados da análise estatística.
Vale ressaltar que, ainda em se tratando de limites inferiores, como não existe DQO negativa,
isto é, como esse parâmetro varia unilateralmente, assim como, consequentemente, a
eficiência das ETEs, os valores abaixo de zero foram desconsiderados.
Após o tratamento estatístico dos dados de carga orgânica, calculou-se a eficiência
de cada ETE, efetuando a clássica Equação 13, em que E% = eficiência do sistema; S0 = DQO
afluente à estação e S = DQO efluente à ETE. Adicionalmente, para os casos em que a E% do
sistema foi negativa, ou seja, nos eventos em que o esgoto teve sua concentração de carga
orgânica aumentada após a passagem pelo tratamento biológico, adotou-se o valor zero para
fins de cálculo da média de remoção de carga orgânica anual.
61
% =(𝑺𝟎 𝑺)
𝑺𝟎 𝒙 𝟏𝟎𝟎% (13)
Cabe mencionar que a GECOQ conta com laboratórios de análises físico-químicas
e biológicas de água e esgoto, todos com selos ISO 9001 e 17025, referentes,
respectivamente, à gestão de qualidade e à acreditação laboratorial, o que permitiu garantir a
qualidade dos dados de concentração de DQO, obtidos pelo método titulométrico de
refluxação fechada, de acordo com o livro Standard Methods for Examination of Water and
Sewage (APHA et al., 2012), responsável pela padronização de análises laboratoriais de água
e esgoto.
Com base em todos esses dados trabalhados estatisticamente, foram elaborados
quadros e tabelas, bem como traçados diversos tipos de gráficos, como gráfico de colunas, de
barras, de pizza e box plots, a fim de representar os resultados obtidos qualiquantitativamente.
Dessa forma, foi possível comparar a distribuição das ETEs pelo estado com base na sua
tipologia, determinar o porte dessas estações quanto à população e à vazão, comparar a
eficiência das ETEs de tecnologia reatores UASB com e sem pós-tratamento, calcular o
volume de biogás produzido por esses biodigestores anaeróbios e, por fim, estimar o potencial
energético do Ceará.
4.3 Estimativas do potencial energético do Ceará
Visando à caracterização do potencial de geração de energia no estado, foram
selecionadas apenas as estações de tecnologia reatores UASB – assumindo que todas seriam
passíveis da recuperação do biogás para fins energéticos –, com dados de carga orgânica
disponíveis e com eficiência de remoção de DQO relativamente elevada, isto é, algumas
ETEs, mesmo apresentando dados de DQO, tiveram de ser excluídas em virtude de exibirem
eficiência negativa ou próximas de zero (em torno de 10%), já que nessas não seria possível
produzir biogás para geração de energia.
Além disso, para as estações cujos dados de vazão não foram disponibilizados,
adotou-se a vazão da ETE que mais se assemelhasse, em termos de porte, à ETE cujo dado
estava faltoso, por meio de ligação telefônica para colaboradores da CAGECE. Dessa forma,
43 estações foram organizadas da seguinte forma: 23 estações (ETE 01 a ETE 23) no grupo
da capital (UN-MTE), 12 estações (ETE 24 a ETE 35) no grupo da região metropolitana de
62
Fortaleza (UN-BME) e 8 estações (ETE 36 a ETE 43) no grupo das estações do interior e,
mais detalhadamente, as estações ainda foram agrupadas de acordo com o porte por
população, como no Quadro 6, e organizadas de forma decrescente.
Secundariamente, com o intuito de aproveitar os dados já existentes quanto às
concentrações de DQO afluente e efluente a essas 43 estações de tecnologia reatores UASB,
realizou-se uma separação dessas ETEs entre estações sem pós-tratamento e com pós-
tratamento, para que fosse avaliada a eficiência de remoção de carga orgânica, a depender da
rota tecnológica presente em cada grupo. Dessa forma, considerou-se, como ETEs sem pós-
tratamento, aquelas de tipologia UASB + CL, i.e., as que apresentavam apenas a etapa da
cloração (desinfecção) após o biodigestor anaeróbio e antes da disposição final do efluente; e,
para o outro grupo, o de ETEs com pós-tratamento, foram incluídas aquelas cujas tipologias
previam uma ou mais etapas de tratamento do esgoto antes da disposição final, ou seja, todas
as demais ETEs de tecnologia reatores UASB que não foram enquadradas no primeiro
conjunto, e.g., UASB + FSA + CL, UASB + FAN + CL, UASB + LEP, entre outras. Esses
resultados foram representados em gráficos do tipo box plot.
Devido ao tamanho populacional das ETEs selecionadas e aos estudos de
viabilidade econômica apresentados por Valente (2015) e Rosenfeldt et al. (2015), apud
Chernicharo et al. (2017), e Bressani-Ribeiro et al. (2019), os quais relataram que somente
seria economicamente interessante praticar o aproveitamento do biogás para geração de
eletricidade em ETEs com contribuição limite acima de 100.000 habitantes e que, para
estações com menor população contribuinte, seria mais viável a recuperação térmica do
biogás para cocção, aquecimento de água e secagem de lodo, foi excluída, consequentemente,
a opção de redirecionar o biogás produzido nessas 43 estações para geração de energia
elétrica.
Portanto, embora ainda seja uma prática incipiente no Brasil, foram adotados os
valores apresentados na Tabela 6, os dados de projeto levantados ou estimados, as equações
descritas no Quadro 2 e a Equação 9, a fim de se quantificar a perda energética devido à não
adoção desse tipo de prática que visa à geração da energia térmica do biogás e à recuperação
econômica, em virtude da redução de gastos nas residências e nas ETEs, com a compra de
GLP, lenha e carvão, com a possibilidade de aquecimento de água e com a secagem de lodo,
por meio do tratamento anaeróbio de esgotos.
63
Tabela 6 – Parâmetros adotados no cômputo do potencial energético a partir do biogás de
reatores UASB.
Parâmetro Unidade Valor Referência
Poder Calorífico Inferior (PCI)
de metano kWh.m
-3CH4 9,97
Moran et al. (2012), apud
Bressani-Ribeiro et al.
(2017)
Consumo médio de eletricidade
residencial no Ceará (ano 2017) kWh.mês
-1 126,1 EPE (2018)
Consumo médio de biogás por
residência, para cocção Lbiogás.dia
-1 1.125
Kurchania et al. (2011);
Homebiogas (2019)
Eficiência elétrica típica de um
conjunto moto-gerador % 36 Cabral et al. (2016)
Eficiência de conversão térmica % 40
U.S. EPA (2003), apud
Bressani-Ribeiro et al.
(2017)
Teor de metano no biogás
(cenário típico) % 75
Von Sperling e
Chernicharo (2005), apud
Lobato et al. (2012)
Eficiência de remoção de DQO
(cenário típico) % 65
Von Sperling e
Chernicharo (2005), apud
Lobato et al. (2012)
Contribuição per-capita de
DQO kgDQO.hab
-1.dia
-1 0,10
Von Sperling e
Chernicharo (2005), apud
Lobato et al. (2012)
Fator de conversão de DQO
aplicada em biomassa (Yobs) kgDQOlodo.kgDQOapl
-1 0,17 -
Temperatura interna dos
reatores UASB em Fortaleza ºC 29 Araújo (2016)
Concentração de oxigênio
dissolvido para remoção de um
mol de CH4 (K)
gDQO.mol-1
64 Chernicharo (2016)
Constante dos gases (R) atm.L.mol-1
.K-1
0,080206 -
Pressão atmosférica atm 1 - Fonte: O AUTOR (2019).
Para cálculo do total de residências que poderia ser abastecido com a produção de
biogás, foi realizado o somatório total dos volumes produzidos de biogás individualmente das
estações e, em seguida, dividiu-se esse valor pelo consumo médio diário residencial de biogás
para cocção (vide Tabela 6), o qual foi estimado considerando-se a autonomia do fogão a
biogás apresentado por Kurchania et al. (2011): 375 Lbiogás.h-1
e a estimativa de sua utilização
por três horas por dia, para cozinhar as três principais refeições diárias de uma família, em
fogo médio (HOMEBIOGÁS, 2019).
Foram calculadas as relações unitárias para fins comparativos aos trabalhos de
Cabral (2016) e Lobato (2011), com o intuito de classificar as estações com tecnologia UASB
64
e operadas pela CAGECE, no Ceará, quanto à situação da produção de metano, biogás e
energia por quantidade de DQO removida. O cálculo dessas taxas é essencial para objetivos
de comparação, uma vez que o valor absoluto depende de inúmeras variáveis, como porte e
eficiência da estação.
Lobato (2011), em seu modelo, traçou diversas relações unitárias e seus
respectivos valores; entretanto, nesse trabalho, foram contempladas apenas três relações,
conforme representado na Tabela 7. A classificação de cada ETE foi realizada,
prioritariamente, quanto ao índice calculado para o potencial energético unitário,
considerando-se os outros valores para determinação da classe da ETE apenas quando fosse
inconclusiva a classificação quanto à quantidade de energia produzida por quilo de DQO
removida. Para as estações com níveis abaixo dos valores mínimos estipulados por Lobato
(2011), foi utilizada a classificação Abaixo da Pior Situação (APS), como adotado por Cabral
(2016).
Tabela 7 – Relações unitárias de produção de metano, de biogás e de energia em reatores
UASB tratando esgoto doméstico. Relação
Unitária Unidade
Pior situação (PS) Situação típica (ST) Melhor situação (MS)
Máx. Mín. Méd. Máx. Mín. Méd. Máx. Mín. Méd.
Volume
unitário de
CH4
NLCH4.kgDQOremov-1
154,1 66,0 113,4 185,8 124,2 158,3 219,1 173,9 196,0
Volume
unitário de
biogás
NLbiogás.kgDQOremov-1
220,1 94,3 162,0 247,8 165,6 211,1 273,9 217,4 245,0
Potencial
de energia
unitário
MJ.kgDQOremov-1
5,5 2,4 4,1 6,7 4,5 5,7 7,9 6,2 7,0
Fonte: O AUTOR (2019), adaptado de LOBATO (2011).
Complementarmente e visando à melhor gestão antecipada da concessionária, foi
analisado o potencial de geração de energia na cidade de Fortaleza para o ano de 2033, 14
anos à frente do presente estudo, utilizando o Plano Municipal de Saneamento Básico
(PMSB), elaborado pela empresa Acquatool Consultoria S/S Ltda., juntamente à CAGECE e
à Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente (SEUMA). Nesse plano, previu-se a criação de
três grandes ETEs para compreender todo o território de Fortaleza, demonstradas na Tabela
8.
65
Tabela 8 – Dados das ETEs de Fortaleza de acordo com o PMSB, para o ano de 2033.
ETE Tecnologia População
(hab)
Vazão média
(L.s-1
)
Cocó LAAP + RFA 455.159 908,3
Miriú UASB + FSA 310.721 955,0
Siqueira LAAP + RFA 363.040 527,3 Fonte: PMSB (2014).
Legenda: LAAP = Lodos Ativados, modalidade Aeração Prolongada; RFA= Reator de Fluxo Alternativo; UASB
= Reator Anaeróbio de Fluxo Ascendente; FSA = Filtro Submerso Aerado.
Para fins de dimensionamento de consumo de energia elétrica pelas ETEs Cocó e
Siqueira, cujas tecnologias, diferentemente da adotada pela ETE Miriú, não produz biogás e,
portanto, não é passível de utilização para geração energética, foram utilizados os parâmetros
de consumo elétrico para estações com tecnologia de lodos ativados, modalidade aeração
prolongada, previstos por Von Sperling (2016): 20 a 35 kWh.hab-1
.ano-1
; e por Gude (2015),
apud Paulo et al. (2019): 0,6 kWh.m-3
de efluente tratado. Com isso, foi possível realizar uma
breve análise econômica no tocante ao balanço elétrico entre as três ETEs propostas pelo
PMSB de 2014.
Notou-se que, em virtude dos maiores contingentes populacionais, os quais
atingiram os limites mínimos de número de habitantes para viabilidade econômica do
aproveitamento energético do biogás para geração de eletricidade, segundo os autores
supracitados, foi conveniente estimar o total de energia elétrica que seria produzido em 2033,
na cidade de Fortaleza, supondo que as três ETEs utilizassem a tecnologia de reatores UASB
para tratar o efluente urbano. Para isso, também foram aplicadas as equações do Quadro 2, os
demais dados considerados na Tabela 6 e, adicionalmente, a Equação 10.
Analogamente ao que foi realizado para estimar o total de residências beneficiadas
com o aproveitamento do biogás para cocção, dividiu-se o somatório total de energia elétrica
teórica de cada ETE futura pelo valor médio de consumo elétrico residencial do Ceará (vide
Tabela 6), assumindo, mais uma vez, que tanto a ETE Cocó como a ETE Siqueira fossem de
tecnologia igual à ETE Miriú, a fim de se obter a quantidade de residências que poderão ser
abastecidas caso essa alternativa seja adotada em 2033.
Com base na produção teórica de energia elétrica e no quantitativo de residências
atendidas por essa geração de eletricidade a partir do biogás de reatores UASB, foi possível
calcular a taxa de atendimento (%) de uma ou mais ETEs com capacidade instalada acima de
100.000 habitantes, por meio da Equação 14, não só para as ETEs Cocó, Miriú e Siqueira,
mas também para as ETEs de estudos de casos apresentados na Revisão Bibliográfica. Para
66
isso, assumiu-se que cada unidade familiar era composta por 4 pessoas e que a capacidade
instalada em termos populacionais corresponderia ao somatório das populações atendidas por
cada ETE individualmente.
𝒕𝒂𝒙𝒂 𝒅𝒆 𝒂𝒕𝒆𝒏𝒅𝒊𝒎𝒆𝒏𝒕𝒐 = 𝒕𝒐𝒕𝒂𝒍 𝒅𝒆 𝒑𝒆𝒔𝒔𝒐𝒂𝒔 𝒃𝒆𝒏𝒆 𝒊𝒄𝒊𝒂𝒅𝒂𝒔
𝒄𝒂𝒑𝒂𝒄𝒊𝒅𝒂𝒅𝒆 𝒊𝒏𝒔𝒕𝒂𝒍𝒂𝒅𝒂𝒙 𝟏𝟎𝟎% (14)
Em virtude de melhor representar o ganho da CAGECE diante da sugestão de
substituir as tecnologias aeróbias (LAAP) das ETEs Cocó e Siqueira pela tecnologia
anaeróbia (UASB + FSA), foram realizadas estimativas em termos financeiros, considerando
custos de investimento (CAPEX, do inglês capital expenditure ou capital expenses), os quais
incluíram gastos com a construção civil e com a aquisição dos equipamentos necessários para
o devido tratamento de esgoto; e os custos de operação e manutenção (OPEX, do inglês
operational expenditure ou operational expenses), correspondentes aos gastos com demanda
de energia elétrica, disposição final do lodo gerado durante o tratamento, manutenção do
sistema de aproveitamento energético do biogás, reparação das unidades instaladas, consumo
de óleo lubrificante e análises laboratoriais do biogás.
Finalmente, por meio da utilização da calculadora online de créditos de carbono
(RENSMART, 2018), foi possível representar os ganhos dessa substituição de rota
tecnológica em termos de dióxido de carbono equivalente, baseado no fator de conversão
inglês para o ano de 2018 (0,28307 kgCO2 economizados para cada kWh produzido de fontes
livres de carbono), o qual considerou alguns gases de efeito estufa, como metano e óxido
nitroso (N2O), quanto aos seus equivalentes em quilos de gás carbônico (kgCO2eq). Com isso,
determinou-se a redução de emissões de gases de efeito estufa por meio da avaliação de
ambos os cenários (PMSB e proposto) e seu possível potencial de comercialização com
empresas que necessitassem equalizar as emissões desses gases na atmosfera.
Essas estimativas foram comparadas a esses outros estudos de caso e poderão ser
utilizadas pela concessionária de saneamento da cidade para traçar a melhor abordagem
quanto a possíveis mudanças no PMSB, bem como replicar e balizar as novas tomadas de
decisão quanto às demais ETEs da RMF e do interior, por meio da substituição de tecnologias
obsoletas por métodos mais eficazes de tratamento de esgoto, com previsão de produção de
biogás, a fim de potencializar a geração de energia limpa e renovável.
67
4.4 Análise financeira dos cenários avaliados
Para análise financeira, foram considerados: os padrões alemães de
aproveitamento energético do biogás (dada a falta de parâmetros brasileiros); o valor de
CAPEX per capita igual a R$ 70,23.hab-1
e de OPEX anual per capita igual a R$ 19,88.hab-
1.ano
-1, para ETEs de tecnologia LAAP (ETEs Cocó e Siqueira); e o valor de CAPEX per
capita igual a R$ 89,16 .hab-1
e de OPEX anual per capita igual R$ 12,84.hab-1
.ano-1
, para
ETEs de tecnologia reatores UASB, com pós-tratamento de lodos ativados, modalidade
convencional, e sistema de aproveitamento de biogás (UASB + LAC + GAS), adotando essa
tecnologia para a ETE Miriú. As bases de cálculo para determinação desses valores fogem ao
escopo desse trabalho, mas podem ser facilmente encontradas no estudo do Probiogás,
intitulado de “Viabilidade Técnico-Econômica de Produção de Energia Elétrica em ETEs a
partir do Biogás”, o qual realizou essa análise econômica para estações de 10.000 habitantes
(BRASIL, 2016c).
Assim, foi possível calcular o custo de instalação, operação e manutenção de cada
estação, tanto no cenário do PMSB, como no cenário proposto neste trabalho, o qual consiste
na substituição da tecnologia aeróbia das ETEs Cocó e Siqueira, pela tecnologia anaeróbia
adotada na ETE Miriú, com previsão de aproveitamento energético do biogás para geração de
eletricidade.
Com o intuito de mensurar os custos reais, em valores monetários, utilizou-se a
média ponderada da tarifa de bandeira verde, para o grupo B3 (água, esgoto e saneamento),
estabelecida de acordo com a norma vigente da ANEEL nº 2.350/2019, a qual previu: R$
1,35836 por kWh ponta (três horas consecutivas no dia); R$ 0,85089 por kWh intermediário
(duas horas, sendo uma antes e uma depois do horário de ponta); e R$ 0,5396 por kWh fora-
ponta (demais horas do dia, 19 horas). Logo, a média ponderada dessas tarifas resultou em R$
0,66792, sendo esse valor o utilizado para quantificar, em reais, os custos das propostas
previamente explicitadas.
Por fim, foram calculados os custos evitados para cada ETE e em cada cenário,
por meio do produto entre o potencial elétrico para aproveitamento do biogás e a tarifa média,
indicando quantos reais seriam economizados se essa geração fosse vendida à concessionária
de abastecimento energético. Esse valor foi abatido do respectivo OPEX encontrado para
quantificação do balanço financeiro geral.
68
RESULTADOS E DISCUSSÃO 5
5.1 Das quantidades, tipologias e tecnologias adotadas no Ceará
Dadas as tipologias apresentadas no Quadro 5, após levantamento de suas
respectivas quantidades adotadas nas ETEs do Ceará, foi possível notar que a metodologia de
tratamento de esgotos mais utilizadas no estado foi aquela constituída de decanto-digestor,
filtro anaeróbio e cloração, apresentando, aproximadamente, incidência 2,5 vezes maior do
que a segunda mais utilizada (lagoa facultativa seguida de lagoa de maturação) e cerca de 5,5
vezes maior que a terceira tipologia mais comum (reatores UASB e cloração). Esses e os
demais quantitativos foram apresentados na Tabela 9.
Tabela 9 – Quantitativo das tipologias adotadas
no estado do Ceará.
Tipologia Quantidade
DD + FAN + CL 132
LFC + LMT 56
UASB + CL 25
UASB + FSA + CL 15
DD + FAN 14
LAN + LFC + LMT 11
LFC 9
UASB + RA + CL 6
UASB + LEP 3
EPC 1
LAAP 1
LAN + LFC 1
LAN + LMT 1
LFC + DSE + CL 1
LRF 1
UASB + FAN + CL 1
UASB + FSA + LEP 1
UASB + LFC + LMT 1
Total 280 Fonte: O AUTOR (2019).
Legenda: LES = Lagoas de Estabilização; LFC = Lagoa Facultativa; LMT = Lagoa de Maturação; LAN = Lagoa
Anaeróbia; LEP = Lagoa de Polimento; LRF = Lagoa de Resfriamento; DD = Decanto Digestor; CL = Cloração;
FAN = Filtro Anaeróbio; FSA = Filtro Submerso Aerado; UASB = Reatores UASB; RA = Reator Aeróbio; DSE
= Decantador Secundário; EPC = Estação de Pré-Condicionamento; LAAP = Lodos Ativados de Aeração
Prolongada.
A grande adoção de ETEs de tipologia decanto-digestor (ou fossa séptica) pode
ser justificada tanto pela antiga estratégia, por parte da CAGECE, de descentralizar o
tratamento de esgotos, como devido a pouca disponibilidade de área para instalação de
estações de maior porte; além do fato de estações menores e menos onerosas serem
preferenciais em regiões mais distantes de centros urbanos, como na zona rural e nas
69
periferias dos centros urbanos, em cujo acesso se torna bastante dificultoso para o transporte
de materiais e de subprodutos do tratamento, manutenção e segurança dos funcionários e dos
equipamentos para operação de ETEs mais complexas.
A Figura 16, por sua vez, retratou essa proporção discrepante, em termos de
número absoluto de ETEs por tecnologia adotada, o que não necessariamente representa a
realidade em razão da vazão de esgoto tratado por estação, uma vez que ETEs com tecnologia
DD costumam ser de porte menor e, consequentemente, ter menor afluência de esgoto para
condicionamento e posterior disposição no meio ambiente. Vale ressaltar que, como
apresentado no Quadro 5, foram enquadradas como “outros” as tipologias EPC, LAAP e
LRF.
Figura 16 – Percentual das tecnologias adotadas em ETEs operadas pela
CAGECE.
Fonte: O AUTOR (2019).
Legenda: LES = Lagoas de Estabilização; DD = Decanto-Digestor; UASB = Reatores UASB.
Em comparação ao panorama traçado por Chernicharo et al. (2018a), percebeu-se
que, para as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, o panorama (Figura 1b) aparentou ser mais
promissor, visto que a tecnologia tanque séptico foi bem menos utilizada (apenas 7,26% das
1.667 ETEs inventariadas), com foco na preferência de sua adoção para ETEs de micro porte
(86% dos sistemas com tanque séptico são empregados em ETEs com Pop ≤ 2.000 hab).
Entretanto, essa é uma realidade que tende a ser repetida no Ceará, principalmente na capital,
Fortaleza, uma vez que abordagens de tratamento centralizado de efluentes estão se
mostrando mais promissoras. Dessa forma, estações de tratamento de tecnologia DD, de uma
forma geral, estão sendo desativadas ou transformadas em estações elevatórias de esgoto
28,2%
18,6%
52,1%
1,1%
Percentual de tecnologias adotadas no
Ceará
LES
UASB
DD
OUTROS
70
(EEE) para aduzir as pequenas contribuições isoladas a ETEs mais robustas e de eficiência de
remoção de carga orgânica mais satisfatória.
Medeiros et al. (2014) traçaram um panorama de 192 sedes pertencentes à região
do semiárido brasileiro e concluíram que, avaliando as localidades com sistema de coleta e
tratamento de esgoto, o Ceará apresentou maior índice de cobertura desses serviços, seguido
pela região do semiárido mineiro e potiguar. Entretanto, confrontando o cenário geral
levantado pelos autores e o panorama estabelecido neste trabalho, foi possível perceber,
diferentemente do representado na Figura 16, que houve maior predominância do sistema de
lagoas de estabilização (61,31% das ETEs em operação nessa região), ficando, em segundo
lugar, as estações com tecnologia reatores UASB (17,52%) e, surpreendentemente, na última
posição, os sistemas dotados de fossa séptica, modalidade condominial (2,55%). Esses
percentuais representaram maior desenvolvimento, pelo menos na teoria, dos sistemas de
tratamento do semiárido do Brasil, comparado ao cenário estabelecido nesta pesquisa, visto
que opções mais eficientes foram adotadas.
Quando foram comparados os números de tecnologias das estações de tratamento
por unidade administrativa da CAGECE (Figura 17 e Tabela 10), notou-se que havia mais
regiões com predominância da tecnologia LES: seis unidades ao todo, sendo todas elas no
interior do Ceará. Essa prevalência pode ser explicada pela maior facilidade de se encontrar
área disponível para construção de lagoas de estabilização, bem como pela facilidade de
operação dessa tecnologia, a qual não requer procedimentos operacionais horários nem
necessita de equipamentos sofisticados para tratamento do efluente, ou seja, menor demanda
de operação e de limpeza da área, permitindo a instalação dessas estações em localidades mais
distantes da zona urbana, quando há disponibilidade territorial.
No que se refere ao total de ETEs com reatores UASB, percebeu-se que, ao longo
do território cearense, apenas 18,6% (52 ETEs) do total de ETEs apresentaram tal tecnologia
implantada, ou seja, com suposto potencial para recuperação de biogás de maneira imediata,
i.e., estações cuja tecnologia adotada prevê a geração, separação e captação para utilização do
biogás em diversos fins, conforme apresentado no item 3.4. De acordo com a Tabela 10, esta
tecnologia é a mais predominante na UN-BME, embora a UN-MTE apresente maior valor
absoluto da adoção desses reatores anaeróbios. Dessa forma, aproximadamente 79% das ETEs
com UASB estão localizadas em Fortaleza e em sua região metropolitana, visto que essa
tecnologia permite que essas ETEs sejam mais compactas, atendam uma maior população e
71
apresentem maior eficiência que, por exemplo, a outra tecnologia anaeróbia utilizada pela
companhia, os decanto-digestores.
Em paralelo ao panorama do estado de São Paulo, o Ceará apresentou vantagem
em termos percentuais (18,6% vs. 8,72%), embora SP tenha apresentado maior número
absoluto de ETEs com tecnologia UASB (76 unidades) (CHERNICHARO et al., 2018a).
Contudo, ao comparar a adoção dessa tecnologia aos índices dos estados do Paraná e de
Minas Gerais (CHERNICHARO et al., 2018), percebeu-se a incrível discrepância entre o
cenário dessas localidades e o Ceará.
No estado de MG, houve contabilização de 170 ETEs, quase quatro vezes o total
do Ceará, com tecnologia reatores UASB (78% do total de estações construídas), enquanto
que o estado do PR ostentou a alta marca de 89% das unidades de tratamento de esgoto (258
ETEs com tecnologia reatores UASB, cinco vezes o total cearense). Para esse estado, esse
índice pode ser explicado, principalmente, pela presença dos projetistas da Sanepar
(concessionária de saneamento básico do Paraná) na Holanda, durante a década de 80,
interagindo com o inventor do reator UASB, Gatze Lettinga; para aquele, entre outros fatores,
destacou-se o fato de o estado de MG apresentar relevo bastante acidentado, o que requer
sistemas mais compactos de tratamento, além da grande influência das pesquisas no âmbito
do Prosab (Programa de Pesquisas em Saneamento Básico), sendo algumas das coordenações
na temática de esgoto realizadas pela Universidade Federal de Minas Gerais.
Figura 17 – Representação da quantidade de tecnologias adotadas por unidade
administrativa da CAGECE, em 2018.
79
52
146
3
0
20
40
60
80
100
120
140
160
BSA BBJ BAJ BBA BPA BAC BSI BCL BME MTE TOTAL
To
tal
de
ET
Es
Bacia administrativa
Quantidade de ETEs por tecnologia
LES
UASB
DD
OUTROS
72
Fonte: O AUTOR (2019).
Legenda: BSA: Bacia do Salgado; BBJ: Bacia do Baixo Jaguaribe; BAJ: Bacia do Alto Jaguaribe; BBA: Bacia
do Banabuiú; BPA: Bacia do Parnaíba; BAC: Bacia do Acaraú e Coreaú; BSI: Bacia da Serra da Ibiapaba;
BCL: Bacia do Curu e Litoral; BME: Bacia Metropolitana; MTE: Metropolitana de Macrocoleta e Tratamento de
Esgoto.
Tabela 10 – Quantitativo de ETEs por unidade administrativa e por tecnologia.
Fonte: O AUTOR (2019).
Legenda: BSA: Bacia do Salgado; BBJ: Bacia do Baixo Jaguaribe; BAJ: Bacia do Alto Jaguaribe; BBA: Bacia
do Banabuiú; BPA: Bacia do Parnaíba; BAC: Bacia do Acaraú e Coreaú; BSI: Bacia da Serra da Ibiapaba;
BCL: Bacia do Curu e Litoral; BME: Bacia Metropolitana; MTE: Metropolitana de Macrocoleta e Tratamento de
Esgoto.
A unidade da CAGECE que mais se aproximou da realidade de implantação de
reatores UASB apresentada pelos estados das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste
(CHERNICHARO et al., 2018a) foi a UN-BME, com 48,39% das ETEs identificadas com
essa tecnologia, enquanto que o estado de Santa Catarina apresentou 52% das estações com
mesma característica; o Distrito Federal, 69%. De fato, esse índice das ETEs da RMF
superou, em termos percentuais, o índice geral de adoção da tecnologia UASB para as regiões
Sul, Sudeste e Centro-Oeste (39,5%).
Em um paralelo internacional, considerando 2.734 estações de tratamento
distribuídas em países da América Latina e do Caribe e classificando-as por tecnologia de
tratamento, Noyola et al. (2012) também apresentaram melhor cenário frente ao panorama
evidenciado no Ceará, uma vez que, mais uma vez, tecnologias mais avançadas foram
majoritariamente adotadas, a exemplo: 38% da totalidade dessas ETEs eram de tecnologia
lagoas de estabilização, 26% de lodos ativados e suas variantes e 17% de reatores UASB.
Quanto ao valor percentual de reatores UASB, percebeu-se proximidade entre a presença
dessa tecnologia no Ceará (18,6%) e nos países latinos e caribenhos (17%), embora,
comparando o número absoluto, enquanto que houve um total de apenas 52 ETEs no Ceará,
Unidade Tecnologias
LES UASB DD OUTROS
BSA 8 3 7 0
BBJ 8 0 0 0
BAJ 5 1 1 0
BBA 2 3 2 0
BPA 5 0 13 0
BAC 7 1 0 0
BSI 9 2 0 0
BCL 11 0 0 1
BME 7 15 9 0
MTE 17 27 114 2
TOTAL 79 52 146 3
Total Geral 280
73
para esses países, os autores contabilizaram 493 unidades. Contudo, vale ressaltar que Noyola
et al. (2012) não consideraram a tecnologia tanques sépticos, pois trataram essa tecnologia
como tratamento preliminar.
Interessante salientar também que, dos países analisados pelos autores
supracitados (Brasil, Chile, Colômbia, Guatemala, República Dominicana e México), o Brasil
foi o país em que mais se contabilizou, em pontos percentuais, a tecnologia de reatores UASB
(aproximadamente 30%); enquanto que, no Chile, esse percentual foi nulo (0%).
Desconsiderando a tecnologia adotada, percebeu-se que, como esperado, devido
ao respectivo contingente populacional das cidades em cada UN, a quantidade de ETEs foi
maior na unidade referente à capital (UN-MTE), cerca de cinco vezes maior do que o total da
segunda maior frequência, correspondente às estações da região metropolitana (UN-BME), a
qual, como também suposto, foi superior às demais unidades do interior. Todos os resultados
foram representados na Figura 18.
Figura 18 – Quantitativo de ETEs operadas pela CAGECE por unidade
administrativa.
Fonte: O AUTOR (2019).
Legenda: BSA: Bacia do Salgado; BBJ: Bacia do Baixo Jaguaribe; BAJ: Bacia do Alto Jaguaribe; BBA: Bacia
do Banabuiú; BPA: Bacia do Parnaíba; BAC: Bacia do Acaraú e Coreaú; BSI: Bacia da Serra da Ibiapaba;
BCL: Bacia do Curu e Litoral; BME: Bacia Metropolitana; MTE: Metropolitana de Macrocoleta e Tratamento de
Esgoto.
Logo, de uma forma geral, o panorama das ETEs por região, no estado, mostrou,
conforme a Figura 19, que o número de ETEs operadas pela CAGECE apenas na capital
corresponde a 57,1% do total de estações do estado. Se somado ao quantitativo da região
metropolitana de Fortaleza (RMF), esse percentual aumenta para 68,9% da totalidade de
18
8
7
7
18
8
11
12
31
160
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180
BSA
BBJ
BAJ
BBA
BPA
BAC
BSI
BCL
BME
MTE
Total de ETEs
Ba
cia
ad
min
istr
ati
va
Quantidade de ETEs por UN
74
ETEs, enquanto que o número de ETEs do interior, excetuando as instaladas na RMF,
representam apenas 31,8% das 280 ETEs inventariadas, ou seja, 89 estações.
Figura 19 – Representação do percentual de ETEs operadas pela CAGECE, em
2018.
Fonte: O AUTOR (2019).
5.2 Dos portes das estações de tratamento de esgoto
Em razão das ausências constantes de informações a respeito da população de
projeto das ETEs e da possibilidade de estimá-las, pelo atlas da ANA (ANA, 2017), somente
foi possível o levantamento do porte de 194 ETEs (aproximadamente 69% do total de
estações ativas, disponibilizadas pela GDOPE). Dessas, como representado pela Tabela 11,
13% apresentaram porte médio, enquanto que apenas 1% foi considerada de grande porte
(duas estações com população atendida acima de 100.000 habitantes). Ao somar as
porcentagens das ETEs de micro e pequeno portes, ou seja, de estações que atendem até
10.000 habitantes, percebeu-se que 85% do total enquadravam-se nesse intervalo,
corroborando, mais uma vez, a prioridade da concessionária de saneamento do estado na
adoção de um sistema de esgotamento descentralizado, i.e., um maior número de ETEs de
menor porte para populações pouco numerosas.
Foi possível perceber a mudança de abordagem para uma mais centralizada
quanto aos sistemas de esgotamento sanitário das regiões inventariadas por Chernicharo et al.
(2018a), que apresentou 57% das ETEs instaladas para atendimento de contingentes
populacionais de até 10.000 habitantes (ETEs de micro e pequeno porte), 36% de ETEs de
CAPITAL
57,1%
RMF
11,1%
INTERIOR
31,8%
Percentual de ETEs no Ceará
75
médio porte e 7% de ETEs de grande porte. Essa abordagem se tornou mais atrativa sob o
ponto de vista operacional, em comparação ao cenário cearense, visto que resultou em menos
unidades para monitoramento de qualidade de efluente, menor geração de passivos ambientais
e menor disponibilização de mão-de-obra para operar os equipamentos de tratamento de
esgoto.
Quanto às 86 estações de tratamento das quais não foi possível determinar a
população atendida, 66 (77% das incompletas) consistiam em ETEs com tecnologia DD e
situavam-se na capital, Fortaleza, portanto, pertencentes à Unidade Metropolitana de
Macrocoleta e Tratamento de Esgoto (UN-MTE). Assim, devido à obsolescência da referida
tecnologia e à previsão de inativação ou substituição desses modelos, esse quantitativo
ausente na contabilidade de dados não representou grande prejuízo ao panorama do
tratamento de esgoto estadual.
Tabela 11 – Classificação das ETEs do Ceará por porte, quanto à população atendida.
Portes Intervalos Populacionais (Hab) Quantidades
Micro Pop ≤ 2000 78
Pequeno 2001 ≤ Pop ≤ 10.000 88
Médio 10.001 ≤ Pop ≤ 100.000 26
Grande Pop ≥ 100.001 2
Total 194 Fonte: O AUTOR (2019).
Tendo em vista que a população de projeto é um parâmetro essencial para a
adequada determinação da metodologia de tratamento de uma ETE, o quantitativo dos portes
das estações foi relacionado com a tecnologia adotada pela CAGECE e representado na
Figura 20, para melhor estimativa das escolhas da companhia, no que se refere ao fator
número de habitantes e preferência de tratamento.
Notou-se a expressiva presença de sistemas tratando esgotos por decanto-
digestores para o atendimento de populações de até 2.000 habitantes, ou seja, em ETEs de
micro porte, representando, aproximadamente, 60% dos sistemas implantados para essa faixa
populacional. Esse cenário mudou quando foram analisados os quantitativos de ETEs nos
demais portes determinados, e.g., o número de estações utilizando DD reduziu de 47 para 27
unidades em ETEs de pequeno porte (31% das estações desse intervalo de população) e
atingiu o valor nulo em ETEs de médio e grande porte.
Em contrapartida, ETEs utilizando lagoas de estabilização demonstraram ser mais
preferíveis em se tratando de contingentes populacionais maiores, dado que, em valores
percentuais, essa tecnologia cresceu de 15% nas ETEs de micro porte para 49% nas ETEs de
76
pequeno porte e novamente para 58% em ETEs de médio porte. De fato, esse resultado era o
previsto, dado que a tecnologia de decanto-digestor já não apresenta elevada eficiência para
remoção de carga orgânica em sistemas de baixa demanda populacional, logo, tornar-se-ia
ainda menos favorável sua aplicação para ETEs de portes maiores.
O mesmo aconteceu para o cenário geral traçado por Chernicharo et al. (2018a),
em que o número de fossa séptica reduziu conforme aumentou a capacidade de tratamento da
ETE, em termos do total de habitantes atendidos, vide Figura 1a. Cabe salientar também que,
em se tratando de reatores UASB dessa região, o percentual de adoção de ETEs com reatores
UASB aumentou à medida que cresceu a capacidade de atendimento (26% para micro porte,
36% para pequeno porte e 51% para médio porte). Quanto às estações de grande porte (Pop >
100.000 hab), percebeu-se a preferência por essa tecnologia em valores absolutos (46
unidades), seis unidades acima da segunda mais utilizada (lodos ativados, 40 unidades), o que
representou 40% do total para essa categoria.
Figura 20 – Quantitativo de ETEs por tecnologia adotada, em cada faixa populacional.
Fonte: O AUTOR (2019).
No que se refere à tecnologia de reatores UASB no estado do Ceará, houve uma
diminuição do percentual de sua aplicação de 24%, nas ETEs de micro porte, para 20% nas
ETEs de pequeno porte, apenas em virtude de o número de estações com reatores UASB ter
diminuído em uma unidade, enquanto aumentou número absoluto de ETEs na categoria de
pequeno porte; porém, esse percentual tornou a crescer para 38% no tocante às ETEs de
médio porte, semelhante ao ocorrido no estudo de Chernicharo et al. (2018a). Esse fator
12
43
15
1
47
27
0 0
19 18
10
1 0 0 1 0 0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
Pop ≤ 2.000 2.001 ≤ Pop ≤
10.000
10.001 ≤ Pop ≤
100.000
Pop ≥ 100.001
Nú
mer
o d
e E
TE
s
Intervalo populacional
Preferência de tecnologia por intervalo
populacional no Ceará
LES
DD
UASB
LA
77
também pode ser atribuído à sua versatilidade, à sua maior eficiência de remoção de DQO e à
sua capacidade de amortecimento para tratamento de variadas concentrações de carga
orgânica durante o dia, à qual estão sujeitas todas as estações de maiores contingentes
populacionais. Adicionalmente, por ser uma tecnologia que, em sua concepção, já favorece a
produção de metano passível de utilização para fins energéticos, a maior quantidade de ETEs
com essa tecnologia para a faixa populacional de até 100.000 habitantes, de acordo com os
estudos apresentados no item 3.4 e, em especial, conforme citaram os autores Bressani-
Ribeiro et al. (2019), abre perspectiva para o aproveitamento térmico do biogás na cocção, no
aquecimento de água dos chuveiros da vizinhança e na secagem de lodo da ETE.
Com o intuito de complementar o panorama traçado a respeito da condição do
tratamento de efluentes no estado do Ceará, analisou-se, ainda, mais um aspecto que permitiu
mensurar a capacidade de tratamento dessas ETEs: as vazões de afluência de esgoto, i.e., a
quantidade, em L.s-1
, de esgoto que flui para dentro das ETEs a fim de passar pelas unidades
de tratamento. Dessa forma, cada estação foi classificada por porte, de acordo com os
intervalos apresentados previamente no item 4.2 e discriminados na Tabela 12, para um total
de 204 ETEs.
Com esses resultados, foi possível perceber que, surpreendentemente, houve
maior disponibilização de dados quanto à vazão de esgoto do que à população atendida pelas
ETEs – tanto no atlas da ANA (ANA, 2017), quanto nas planilhas de memorial consultadas na
CAGECE –, ainda que a medição de vazão não seja uma rotina operacional instituída na
concessionária de tratamento de esgoto do estado, já que as ETEs não dispõem de medidores
precisos de vazão de esgoto, como medidores ópticos.
Tabela 12 – Classificação das ETEs do Ceará por porte, quanto à vazão afluente.
Portes Intervalos de Vazão (L.S-1
) Quantidades
Pequeno Q ≤ 60 193
Médio 60 < Q < 200 11
Grande Q ≥ 200 0
Total 204 Fonte: O AUTOR (2019).
Outro ponto que mereceu destaque foi o fato de 193 do total de 204 ETEs com
dados de vazão disponíveis, ou seja, 94,6% das estações levantadas apresentaram
classificação de porte pequeno quanto à vazão afluente de esgoto, o que, mais uma vez,
explicita, em termos quantitativos, a abordagem da CAGECE de descentralizar o tratamento
de esgotos no Ceará.
78
A Figura 21, analogamente à Figura 20, aprofundou a classificação das estações,
exibindo o quantitativo de ETEs por porte, correlacionando-as a suas respectivas tecnologias
de tratamento. Assim como foi percebido na Figura 20, notou-se uma maior predileção para a
utilização de decanto-digestores quando a carga hidráulica era reduzida, com a adoção de DD
para 43% das ETEs com capacidade de tratamento de até 60 L.s-1
. Adicionalmente, para
estações com vazão afluente correspondente ao porte médio, percebeu-se dominação da
tecnologia lagoas de estabilização, enquanto que a tecnologia anterior apresentou valor igual
zero, posto que seria inviável econômico e operacionalmente a execução de fossas sépticas
para condicionar a contento, em termos ambientais, tamanha vazão.
Noyola et al. (2012) também avaliaram a vazão afluente de 2.734 ETEs, a fim de
classificá-las por porte e por tecnologia de tratamento, nos países latinos e caribenhos, e
perceberam, assim como no Ceará, a maior representatividade de estações de pequeno porte
(67,4%), considerando aquelas de fluxo de esgoto menor ou igual a 25 L.s-1
; enquanto que as
ETEs consideradas de médio porte (25 < Q ≤ 250 L.s-1
) representaram 26,6%. O somatório
dessas parcelas (94%) foi bastante similar ao notado para o panorama cearense de ETEs
pequenas (Q ≤ 60 L.s-1
), o qual apresentou 94,6% das estações do estado nessa categoria.
Figura 21 – Quantitativo de ETEs por tecnologia adotada, em cada faixa de vazão.
Fonte: O AUTOR (2019).
61
10
83
0
48
1 1 0 0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Q ≤ 60 60 < Q < 200
Nú
mer
o d
e E
TE
s
Intervalo de vazão
Preferência de tecnologia por intervalo de
vazão no Ceará
LES
DD
UASB
LA
79
Embora as três tecnologias mais utilizadas no estado do Ceará exibissem
consideráveis diferenças, tais como requisitos de áreas, microrganismos envolvidos e índices
de produção de lodo, foram notórias duas importantes semelhanças entre elas: DD, LES e
reatores UASB necessitam de baixas demandas energéticas para funcionar e apresentam
relativa simplicidade operacional, o que implica em reduzidos custos de operação,
diferentemente da tecnologia de lodos ativados, principalmente na modalidade aeração
prolongada. Assim, percebeu-se um perfil de preferência dessas tecnologias de tratamento por
parte da CAGECE, em virtude da descentralização dos sistemas e da localização dessas
unidades.
A elevada presença de ETEs de portes menores, atendendo populações reduzidas e
com carga hidráulica baixa, reflete o lento crescimento do esgotamento sanitário no estado, o
que é resultado dos constantes e comprimidos aportes de recursos financeiros e demais
incentivos para o saneamento básico, ou seja, ao longo dos anos, raramente houve repasse de
grandes quantias de dinheiro para construção e instalação de estações de tratamento mais
robustas no Ceará, ou lançamento de políticas públicas representativas, que incentivasse a
expansão do setor no estado. Portanto, para destinar o pouco dinheiro recebido, optou-se pela
construção de ETEs descentralizadas, as quais, atualmente, apresentam uma série de
desvantagens, principalmente no tocante ao controle de qualidade dessa operação pulverizada
e ao consequente impacto ambiental desencadeado por essas estações.
Segundo Chernicharo et al. (2015), o adequado saneamento de uma região ocorre
em função de fatores socioeconômicos e ambientais, em que aqueles determinam a variedade
de opções a serem adotadas pelos governantes e projetistas, dependendo das especificidades
locais. Assim, geralmente se assumem fatores econômicos para determinar o ritmo com que as
obras de instalação de um sistema de esgotamento sanitário acontecem e a qualidade desses
serviços, ou seja, regiões mais pobres tendem a receber rede coletora e estações de tratamento
de esgoto por último ou de baixa adequabilidade, o que justifica a abordagem da CAGECE,
constatada pelos dados supracitados.
Felizmente, em outra perspectiva, a descentralização dos SES pode ser desejável,
principalmente sob a ótica do uso de efluentes domésticos e da recuperação de recursos
hídricos e de nutrientes, uma vez que previne a mistura destes efluentes com efluentes
industriais, permitindo, mais facilmente, o fomento do uso agrícola do esgoto doméstico
previamente e devidamente condicionado (CHERNICHARO et al., 2015). Dessa forma, os
autores constataram que a otimização da descentralização do tratamento de esgotos, a fim de
80
potencializar suas vantagens, perpassa pelas condições locais onde se prevê a instalação de
novas ETEs, bem como pela associação dessas estações a uma forma de recuperação de
recursos, como o uso ou a recuperação de água e nutrientes, em detrimento da simples
instalação de uma ETE com o intuito de resolver um problema puramente sanitário, isto é,
permitindo agregar valor econômico ao sistema de esgotamento, ideia pela qual esta pesquisa
se baseou.
5.3 Da capacidade de tratamento das ETEs com tecnologia reatores UASB
O levantamento das concentrações de DQO bruta e tratada durante o ano de 2018
permitiu a avaliação da capacidade de remoção de carga orgânica dos sistemas operando com
rotas tecnológicas diferentes, proporcionando, principalmente, em se tratando de
biodigestores anaeróbios, a comparação entre ETEs de tecnologia reatores UASB com e sem
pós-tratamento. Assim, das 43 ETEs que se encaixaram nesse perfil, 21 estações foram
consideradas sem pós-tratamento; e 22, com pós-tratamento. Os valores de 2018 e da média
anual compuseram os gráficos de box plot de ambos os grupos, os quais foram ilustrados pela
Figura 22 e pela Figura 23.
Figura 22 – Eficiências de remoção de DQO das ETEs de reatores UASB sem pós-
tratamento.
Fonte: O AUTOR (2019).
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Média
Efi
ciên
cia
Eficiência de UASBs sem pós-tratamento
25% 50% 90% 10% Mín Máx 75%
81
Com relação às 21 ETEs sem pós-tratamento, percebeu-se que a média mensal de
remoção de DQO de todas variou de 17% até 79%, ao longo do ano de 2018, enquanto que,
ao analisar os valores de cada ETE, individualmente, foi possível notar uma maior variação
(de 0% a 96,6%). De fato, em nove dos doze meses houve eficiência nula em pelo menos uma
das 21 ETEs examinadas, e apenas em quatro meses houve pelo menos uma ETE com
resultados de eficiência acima de 90%, corroborando a constatação de que essa rota
tecnológica não demonstrou porcentagens promissoras para replicação dessa tipologia em
demais localidades.
Em contrapartida, de uma forma geral, o valor médio aproximado referente à
eficiência de remoção de DQO de ETEs sem pós-tratamento foi de 50,2%. Este valor, de
acordo com Chernicharo (2016), foi considerado baixo, posto que a eficiência média esperada
de reatores UASB é de 65%, assumindo um cenário não tão favorável. Vale ressaltar que, para
essas ETEs, as médias de DQO bruta afluente e de DQO tratada efluente foram iguais a,
respectivamente, 1.046 mg.L-1
e 432 mg.L-1
. Se calculada a eficiência média com esses
valores, o percentual seria diferente do apresentado anteriormente, uma vez que, para cálculo
da eficiência média, como descrito na metodologia deste trabalho, consideraram-se nulas (%E
= 0%) os resultados negativos.
Outra característica explícita no gráfico da Figura 22 foi a grande amplitude
interquartil ao longo dos meses e na média geral, o que indicou que as ETEs sem pós-
tratamento não apresentaram grande capacidade de amortecimento de carga orgânica, ou seja,
a estação não conseguiu manter uma eficiência satisfatória para picos de cargas de DQO
flutuantes. Em se tratando de efluentes urbanos, dispor de uma boa capacidade de
amortecimento é fator preponderante, uma vez que é clássico o perfil de distribuição de
afluência de vazão às ETEs ao longo do dia com maior demanda em intervalos de horas
específicas, em detrimento de um perfil horário de carga hídrica e orgânica constantes. Essa
característica também é interessante quando a estação se localiza em áreas turísticas, em que a
população contribuinte flutua ao longo do ano, requisitando maior esforço das ETEs em
períodos de alta estação.
82
Figura 23 – Eficiências da remoção de DQO das ETEs de reatores UASB com pós-
tratamento.
Fonte: O AUTOR (2019).
Por sua vez, as estações de tratamento de esgoto com reatores UASB seguidas de
algum pós-tratamento apresentaram, para o ano de 2018, uma média de remoção de DQO de,
aproximadamente, 70,4%, indicando um aumento de 20 pontos percentuais, comparando às
ETEs do grupo anterior, como pode ser analisado no gráfico da Figura 23. De certa forma,
embora numericamente melhor do que o resultado evidenciado para as estações sem pós-
tratamento, esse percentual de remoção de DQO também não pôde ser considerado de
excelência, visto que, em configurações de UASB + pós-tratamento, espera-se, segundo a
literatura clássica, uma eficiência média de 80%, podendo chegar até valores bem próximos
de 100%, dependendo da tipologia da ETE. Por exemplo, Chernicharo e Almeida (2011)
apontaram uma eficiência de 80% para um sistema composto por reatores UASB e filtro
biológico percolador; Von Sperling (2005), apud Chernicharo (2016), ilustrou algumas
associações de reatores UASB com outras tecnologias e constatou que as combinações de
UASB + flotação por ar dissolvido, UASB + biofiltro aerado submerso (FSA) e UASB +
lodos ativados exibiram maior eficiência de remoção de DQO (83 a 93%).
Ademais, em termos de eficiências mensais, foi notória também a diminuição da
frequência de valores nulos (quatro meses ao todo, cinco meses a menos do que esse número
para as ETEs da Figura 22) e o aumento de eventos em que pelo menos uma estação
apresentou eficiência maior que ou igual a 90% (em todos os doze meses, nove a mais do que
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Média
Efi
ciên
cia
Eficiência de UASBs com pós-tratamento
25% 50% 90% 10% Mín Máx 75%
83
esse valor para o outro conjunto). No que se refere às médias das concentrações de DQO para
essas estações, de maneira similar às ETEs sem pós-tratamento, a DQO bruta foi igual a 978
mg.L-1
, e a DQO tratada resultou em 282 mg.L-1
.
Percebeu-se, facilmente, também a regressão do intervalo interquartil e, portanto,
a demonstração da maior capacidade de amortecimento dessas ETEs com pós-tratamento, as
quais conseguiram suportar picos de cargas mais elevadas de DQO afluente e manter uma
eficiência aceitável, devido à robustez da rota tecnológica adotada, que contou, na maioria dos
casos, com um pós-tratamento aeróbio, seguido de uma etapa de decantação secundária (e.g.:
FSA e decantador lamelar), promovendo uma maior oxidação da matéria orgânica
anteriormente à cloração, a qual visa apenas à, especialmente, remoção de patógenos. Em
virtude disso, pôde-se concluir que houve menor impacto ambiental nas regiões para que
essas estações destinassem seus efluentes condicionados.
Por fim, outro ponto surpreendente, mesmo após o tratamento estatístico e
exclusão de outliers das amostras de DQO bruta e tratada de todas as ETEs, foi o evento de
eficiência máxima (98,8%) apontada pelos valores das planilhas de qualidade de efluente
analisadas, referente à tipologia de UASB + RA + CL. Entretanto, foi uma ETE de tipologia
UASB + LEP que exprimiu maior eficiência média em 2018: 93,0%; e outra de tipologia
UASB + FSA + CL que apresentou a menor eficiência média no mesmo período: 42,3%.
5.4 Do potencial atual de produção de biogás no Ceará
O resumo dos dados calculados de produção de biogás foi representado na Tabela
13, na Tabela 14 e na Tabela 15, para as ETEs pertencentes à capital (UN-MTE), à região
metropolitana de Fortaleza (UN-BME) e ao interior do Ceará (demais UNs). Como o
contingente populacional não ultrapassou o valor de 100.000 habitantes por ETE, não foram
realizados cálculos de aproveitamento de biogás para geração de energia elétrica. Porém,
como previram Bressani-Ribeito et al. (2019), ETEs com populações abaixo desse limite
abrem precedentes para aproveitamento do biogás para fins térmicos.
Dessa forma, considerando os parâmetros estabelecidos na Tabela 6, com ênfase
nos dados de PCI do CH4 (9,97 kWh.m-3
CH4 ou 35,9 MJ.m-3
CH4), de consumo médio de biogás
para cocção (1.125 L.dia-1
), %E térmica do fogão a biogás (40%), teor de metano típico no
biogás (75%) e no fator de conversão de DQO aplicada em lodo (0,17 kgDQOlodo.kgDQOapl-
1), foi possível estimar a produção de biogás e a geração de energia térmica proveniente desse
84
volume formado, bem como prever a quantidade de residências e de pessoas que seriam
beneficiadas com esse aproveitamento, para cada grupo analisado.
A respectiva vazão média de produção de biogás (a 75% de CH4) e de metano, no
tocante às ETEs de Fortaleza, foi igual a 198,4 m³.dia-1
e 148,8 m³.dia-1
. Além disso, também
foi notória a geração média de 148,6 kgDQO.dia-1
sob a forma de biomassa (lodo), devendo,
portanto, haver estudos que abordem o gerenciamento dessa parcela, como utilização do
biogás gerado para desinfecção e secagem desse volume e melhores alternativas para
destinação final, visando a evitar passivos ambientais e custos desnecessários à Companhia.
Devido ao tamanho populacional (10.001 ≤ Pop ≤ 100.000), das 23 estações
pertencentes ao grupo da UN-MTE, a Tabela 13 permitiu destacar que apenas cinco ETEs
(ETE 19 a ETE 23, 17% do total de ETEs de Fortaleza) configuraram no grupo de estações
economicamente aptas para a utilização do biogás como combustível de secadores térmicos
de lodo, possibilitando ainda a potencialização da produção desse gás por meio da geração de
biogás proveniente da escuma dos reatores UASB. Para a maioria das estações (ETE 01 a
ETE 19, 83%), essa alternativa não se mostrou economicamente viável e, portanto, foi
desconsiderada.
Ademais, para a totalidade das ETEs operadas pela CAGECE e em Fortaleza, foi
possível notar que houve produção máxima de energia térmica igual a 15.880,6 MJ.dia-1
e
mínima de 138,8 MJ.dia-1
, bem como média de geração igual a 2.136,1 MJ.dia-1
. Logo, de
uma forma geral, considerando que as 23 estações reaproveitassem o biogás produzido para
fins de cocção, percebeu-se que um total de 4.056 residências circunvizinhas às respectivas
estações poderiam ser abastecidas com esse biogás para ser alimentado como combustível em
fogões especiais.
Vale ressaltar que a variação notada no número de casas abastecidas por ETE
dependeu, principalmente, da vazão fornecida pela companhia de saneamento e, em
consequência, do volume de biogás gerado, de modo que as estações maiores vazões foram as
que apresentaram mais unidades habitacionais beneficiadas foram as ETEs 20 e 23, com,
respectivamente, 1.311 e 530 residências contempladas.
85
Tabela 13 – Avaliação da produção de biogás e geração de energia térmica das ETEs de Fortaleza (UN-MTE).
ETE
População Vazão DQO
Bruta
DQO
Tratada Eficiência
de remoção
de DQO
DQO
Removida
DQO
Aplicada DQO Lodo DQO CH4 Q CH4 Q Biogás
Potencial
térmico
Nº de
residências
abastecidas
por ETE hab L.s
-1 mg.L
-1 mg.L
-1 kgDQO.dia
-1 kgDQO.dia
-1 kgDQO.dia
-1 kgDQO.dia
-1 m³.dia
-1 m³.dia
-1 MJ.dia
-1
ETE 01 100 1,0 732 119 83,8% 52,99 63,26 10,75 42,24 15,99 21,33 229,63 19
ETE 02 450 5,0 546 181 66,9% 157,94 235,96 40,11 117,82 44,61 59,49 640,52 53
ETE 03 612 4,9 899 429 52,3% 199,81 382,36 65,00 134,81 51,05 68,06 732,89 61
ETE 04 714 1,2 1125 198 82,4% 95,28 115,63 19,66 75,62 28,63 38,18 411,08 34
ETE 05 800 5,0 1503 348 76,8% 498,81 649,17 110,36 388,45 147,09 196,12 2111,77 174
ETE 06 832 4,7 996 300 69,9% 280,18 400,86 68,15 212,04 80,29 107,05 1152,71 95
ETE 07 1040 1,6 973 581 40,3% 52,77 131,10 22,29 30,48 11,54 15,39 165,69 14
ETE 08 1620 1,3 988 210 78,8% 88,79 112,70 19,16 69,64 26,37 35,16 378,57 31
ETE 09 2745 5,2 664 394 40,7% 121,49 298,45 50,74 70,76 26,79 35,72 384,67 32
ETE 10 2817 2,7 759 517 31,9% 57,22 179,65 30,54 26,68 10,10 13,47 145,03 12
ETE 11 3775 22,6 653 529 19,0% 241,90 1272,75 216,37 25,53 9,67 12,89 138,79 11
ETE 12 6145 9,0 1061 228 78,5% 644,47 821,25 139,61 504,86 191,17 254,89 2744,58 227
ETE 13 7841 2,0 854 415 51,5% 75,16 146,09 24,83 50,32 19,06 25,41 273,57 23
ETE 14 8200 3,1 886 267 69,8% 164,52 235,67 40,06 124,45 47,12 62,83 676,56 56
ETE 15 8200 3,6 799 383 52,1% 129,23 247,91 42,14 87,08 32,98 43,97 473,42 39
ETE 16 8382 2,8 1092 412 62,2% 165,04 265,17 45,08 119,96 45,42 60,56 652,13 54
ETE 17 9243 13,9 887 476 46,3% 491,65 1061,89 180,52 311,13 117,81 157,08 1691,40 140
ETE 18 9370 10,8 1075 574 46,6% 469,02 1006,68 171,14 297,88 112,80 150,40 1619,41 134
ETE 19 11968 14,7 1308 220 83,2% 1382,42 1662,09 282,56 1099,87 416,48 555,30 5979,27 494
ETE 20 17004 59,3 789 84 89,3% 3608,09 4040,65 686,91 2921,18 1106,14 1474,85 15880,57 1311
ETE 21 27423 58,1 812 568 30,1% 1229,76 4080,52 693,69 536,07 202,99 270,65 2914,29 241
ETE 22 30300 8,8 1151 149 87,1% 757,76 870,39 147,97 609,79 230,90 307,87 3315,03 274
ETE 23 59509 31,5 669 122 81,8% 1490,32 1821,50 309,66 1180,67 447,07 596,10 6418,52 530
Fonte: O AUTOR (2019).
Legenda:
Pop ≤ 10.000
10.001 ≤ Pop ≤ 100.000
86
Por outro lado, para haver uma satisfatória produção de biogás e aumentar seu
fornecimento para um maior número de casas, salientou-se também a importância da melhoria
da operação e do monitoramento das estações, para consequente elevação da eficiência de
remoção de DQO, uma vez que a vazão de uma ETE pode ser uma variável independente de
ações corretivas tomadas pela concessionária de esgotamento sanitário; porém, em se tratando
de processos de controle e acompanhamento do desempenho das ETEs, esses parâmetros
podem sofrer interferências das companhias, adotando-se práticas operacionais que visem a
aperfeiçoar seu tratamento de esgotos e sua qualidade do biogás, tais como o aumento do
tempo de residência celular, a regulação das rotinas de descarga de fundo, de areia e de
escuma dos reatores UASBs, a adequação dos equipamentos do pré-tratamento a montante
dos reatores UASB, para evitar afluência de partículas indesejadas, como gordura, estopa e
demais materiais grosseiros, a aplicação da microaeração na fase líquida do esgoto, entre
outras soluções.
A exemplo dessa influência, vide a produção e o número de residências
abastecidas das estações ETE 01 (%E = 83,8%), ETE 04 (82,4%) e ETE 08 (78,8%), cujos
respectivos valores foram superiores aos das estações ETE 10 (%E = 31,9%) e ETE 07
(40,3%), ainda que tratassem uma vazão similar de efluente. Entretanto, foi a ETE 11 (%E =
19,0%) que melhor representou o grau de preponderância da eficiência de remoção de DQO
para produção de energia térmica a partir do biogás, posto que, mesmo com uma vazão de
cerca de 20 vezes superior à das ETEs 01, 04 e 08, não conseguiu gerar biogás suficiente para
suprir um número maior de unidades habitacionais do que essas três estações supracitadas.
A eficiência geral da UN-MTE, englobando todas as estações de tratamento de
esgoto de tecnologia UASB, operadas pela CAGECE, em Fortaleza, foi representada, mês a
mês, no gráfico da Figura 24, bem como a média acumulada geral do ano de 2018.
87
Figura 24 – Eficiências de remoção de DQO das ETEs de reatores UASB de Fortaleza, no
ano de 2018.
Fonte: O AUTOR (2019).
O segundo maior grupo em quantidade de ETEs com tecnologia de reatores
UASB, ou seja, aquele com as estações operadas pela CAGECE, na região metropolitana de
Fortaleza (UN-BME), conteve 12 estações de tratamento de esgoto, das quais 10 ETEs (ETE
24 a ETE 33, 83% do total de ETEs da RMF) apresentaram população de até 10.000
habitantes, enquanto 2 ETEs (ETE 34 e ETE 35, 17%) incluíram contingentes populacionais
acima de 10.000 e abaixo de 100.001 habitantes, proporcionalmente igual ao grupo de ETEs
de Fortaleza, conforme representado na Tabela 14.
Dessas estações, foi possível somar um total de 1.053 residências abastecidas com
a produção do biogás proveniente de reatores UASB tratando efluente doméstico,
aproximadamente quatro vezes menor do que a quantidade beneficiada pelas ETEs da UN-
MTE. Outro valor que também ficou mais reduzido que o respectivo para as estações da
capital foi a média de produção de energia térmica da UN-BME (1.063,15 MJ.dia-1
),
justificada pela menor média de vazão de esgoto tratado (5,67 L.s-1
) e pela média de eficiência
de remoção de DQO para produção de biogás relativamente reduzida (63,33%), apresentada
na Tabela 14.
Percebeu-se, por fim, que houve uma concentração de produção de biogás nas
estações com maior capacidade de tratamento quanto à vazão, i.e., nas ETEs 34 e 35, as quais
condensaram um total de 551 famílias circunvizinhas (52,32% do total de unidades
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0%
80,0%
90,0%
100,0%
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cia
Eficiência das ETEs de Fortaleza (UN-MTE)
25% 50% 90% 10% Mín Máx 75%
88
habitacionais abastecidas na RMF) que poderiam ser beneficiadas com biogás para cocção.
Outras duas estações mereceram destaque em virtude de suas elevadas eficiências de
tratamento, o que as permitiu produzir uma elevada quantidade de energia térmica e abastecer
relativamente muitas casas, ainda com uma baixa vazão de afluência de esgoto, foram elas:
ETE 27 (Q = 0,80 L.s-1
e %E = 84,77%) e ETE 31 (Q = 2,42 L.s-1
e %E = 90,08%), as quais
apresentaram potencial térmica igual a 366,50 MJ.dia-1
(30 casas abastecidas) e 877,91
MJ.dia-1
(72 casas abastecidas), respectivamente.
A eficiência geral da UN-BME, englobando todas as estações de tratamento de
esgoto de tecnologia UASB, operadas pela CAGECE, na RMF, foi representada mensal e
anualmente no gráfico da Figura 25.
Figura 25 – Eficiências de remoção de DQO das ETEs de reatores UASB da Região
Metropolitana de Fortaleza, no ano de 2018.
Fonte: O AUTOR (2019).
O grupo das estações operadas pela CAGECE no interior é também o que tem
menos exemplares com tecnologia reatores UASB, no qual estão contidas apenas oito ETEs,
sendo sete delas (ETE 36 a ETE 42, 87,5% do total de ETEs do interior) classificadas na
categoria populacional de até 10.000 habitantes, ao passo que apenas uma estação (ETE 43,
12,5%) configurou na classificação de ETEs com contingente populacional acima de 10.000 e
abaixo de 100.000 pessoas, como foi representado na Tabela 14.
00%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
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Efi
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cia
Eficiência das ETEs da RMF (UN-BME)
25% 50% 90% 10% Mín Máx 75%
89
Tabela 14 – Avaliação da produção de biogás e geração de energia térmica das ETEs da RMF (UN-BME).
ETE
População Vazão DQO
Bruta
DQO
Tratada Eficiência de
remoção de
DQO
DQO
Removida
DQO
Aplicada DQO Lodo DQO CH4 Q CH4
Q
Biogás
Potencial
térmico
Nº de
residências
abastecidas
por ETE hab L.s
-1 mg.L
-1 mg.L
-1 kgDQO.dia
-1 kgDQO.dia
-1 kgDQO.dia
-1 kgDQO.dia
-1 m³.dia
-1 m³.dia
-1 MJ.dia
-1
ETE 24 441 0,6 1222 723 40,9% 25,89 63,35 10,77 15,12 5,72 7,63 82,18 7
ETE 25 694 1,1 1344 313 76,7% 97,98 127,74 21,72 76,27 28,88 38,51 414,62 34
ETE 26 697 1,2 1780 726 59,2% 109,29 184,57 31,38 77,92 29,50 39,34 423,58 35
ETE 27 864 0,8 1439 219 84,8% 84,33 99,47 16,91 67,42 25,53 34,04 366,50 30
ETE 28 1527 5,0 1855 606 67,3% 539,73 801,56 136,27 403,47 152,78 203,70 2193,39 181
ETE 29 1539 1,7 1177 465 60,5% 104,52 172,87 29,39 75,13 28,45 37,93 408,43 34
ETE 30 1587 1,4 1049 605 42,4% 53,75 126,88 21,57 32,18 12,19 16,25 174,96 14
ETE 31 2088 2,4 1057 105 90,1% 199,05 220,97 37,56 161,49 61,15 81,53 877,91 72
ETE 32 2746 3,1 1316 595 54,7% 194,80 355,83 60,49 134,30 50,86 67,81 730,13 60
ETE 33 3576 2,4 1286 701 45,5% 120,31 264,48 44,96 75,35 28,53 38,04 409,62 34
ETE 34 12916 20,7 583 194 66,7% 693,53 1040,34 176,86 516,68 195,64 260,86 2808,83 232
ETE 35 22569 27,7 548 158 71,2% 934,51 1312,16 223,07 711,44 269,40 359,19 3867,66 319
Fonte: O AUTOR (2019).
Legenda:
Pop ≤ 10.000
10.001 ≤ Pop ≤ 100.000
90
A avaliação da geração acumulada de energia térmica dessas oito estações de
tratamento de esgoto, representada pela Tabela 15, resultou no valor de 12.562 MJ.dia-1
, com
média igual a 1.570,4 MJ.dia-1
, o que culminou na previsão de abastecimento de 1037
residências, ou seja, apenas 16 unidades a menos do que o grupo anterior. Mesmo com o
acumulado produzido sendo um pouco inferior ao valor da RMF, a média do grupo das ETEs
do interior se mostrou superior à da UN-BME, principalmente devido ao fato de a eficiência
média por estação, para produção de biogás das ETEs da região metropolitana, ter sido
inferior (%E = 63,33%) à eficiência das ETEs do interior (71,69%).
Ainda no mesmo contexto, a ETE 38 (%E = 22,56%) retratou, como já verificado
nos outros dois conjuntos de estações, a necessidade fundamental de uma elevada eficiência
para geração de metano e biogás, posto que, mesmo com uma vazão similar à ETE 37 (%E =
76,38%) e à ETE 39 (81,40%), conseguiu abastecer apenas uma residência, enquanto que as
outras duas beneficiaram, respectivamente, 11 e 27 famílias.
Na Figura 26, diferentemente da Figura 24 e da Figura 25, foi possível perceber
o deslocamento do marcador referente à mediana (50% dos dados) mais próximo à linha que
representa a eficiência dos sistemas de 70%, bem como o menor intervalo interquartil da
maioria dos meses, demonstrando que as ETEs do interior do Ceará não só apresentaram
valores mais satisfatórios, mas também sofreram menos flutuação quanto à eficiência de
remoção de DQO, em comparação aos grupos das ETEs de Fortaleza e das ETEs da RMF.
91
Figura 26 – Eficiências de remoção de DQO das ETEs de reatores UASB do interior do
Ceará, no ano de 2018.
Fonte: O AUTOR (2019).
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0%
80,0%
90,0%
100,0%
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Média
Efi
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cia
Eficiência das ETEs do interior
25% 50% 90% 10% Mín Máx 75%
92
Tabela 15 – Avaliação da produção de biogás e geração de energia térmica das ETEs do interior do Ceará.
ETE
População Vazão DQO
Bruta
DQO
Tratada Eficiência de
remoção de
DQO
DQO
Removida
DQO
Aplicada DQO Lodo DQO CH4 Q CH4
Q
Biogás
Potencial
térmico
Nº de
residências
abastecidas
por ETE hab L.s
-1 mg.L
-1 mg.L
-1 kgDQO.dia
-1 kgDQO.dia
-1 kgDQO.dia
-1 kgDQO.dia
-1 m³.dia
-1 m³.dia
-1 MJ.dia
-1
ETE 36 385 0,3 1175 239 79,7% 24,26 30,45 5,18 19,09 7,23 9,64 103,76 9
ETE 37 576 0,6 800 189 76,4% 32,21 42,17 7,17 25,04 9,48 12,64 136,12 11
ETE 38 585 1,0 383 297 22,6% 7,09 31,43 5,34 1,75 0,66 0,88 9,50 1
ETE 39 667 1,1 982 183 81,4% 75,96 93,31 15,86 60,10 22,76 30,34 326,71 27
ETE 40 2006 24,3 626 252 59,8% 785,05 1312,93 223,20 561,85 212,75 283,67 3054,41 252
ETE 41 2330 2,6 1412 337 76,2% 241,49 317,12 53,91 187,58 71,03 94,71 1019,75 84
ETE 42 4732 9,7 904 135 85,0% 644,38 758,04 128,87 515,52 195,21 260,27 2802,53 231
ETE 43 11345 11,0 1309 98 92,6% 1151,52 1244,19 211,51 940,01 355,94 474,59 5110,21 422
Fonte: O AUTOR (2019).
Legenda:
Pop ≤ 10.000
10.001 ≤ Pop ≤ 100.000
93
Pelos valores reportados por Bressani-Ribeiro et al. (2017), os quais calcularam a
produção de energia para ETEs de diferentes portes, foi possível calcular a produção
específica de energia por habitante contribuinte às estações, a qual permaneceu a mesma (0,15
MJ.hab-1
) tanto para ETEs de até 10.000 habitantes, como para ETEs com capacidade de
atendimento entre 10.000 e 100.00 habitantes. Fazendo o mesmo para as estações destacadas
de azul (micro e pequeno porte) e para aquelas destacadas de verde (médio porte), da Tabela
13, Tabela 14 e Tabela 15, notou-se que a produção específica de energia por habitante,
respectivamente, era igual a 0,28 e 0,24 MJ.hab-1
, aproximadamente o dobro da reportada por
Bressani-Ribeiro et al. (2017), mas demonstrando certa afinidade com o valor previsto pelos
autores. Entre outros fatores, compreendeu-se que a diferença das razões aconteceu pela
metodologia adotada por Bressani-Ribeiro et al. (2017), que estimaram esse potencial para
um grupo de cidades de 114 países diferentes, os quais, por mais que fossem todos de clima
tropical, apresentavam peculiaridades que deveriam ter sido levadas em consideração.
Adicionalmente, com base nesses dados, foi possível calcular as relações unitárias
de todas as 43 ETEs, a fim de classificá-las e compará-las quanto à produção de metano,
biogás e energia, dando preferência para classificação pelo potencial energético unitário e
para as demais relações em caso de o valor unitário da produção de energia estivesse
localizado entre os intervalos elencados por Lobato (2011). Tais valores foram representados
na Tabela 16.
Tabela 16 – Relações unitárias obtidas e classificação das ETEs quanto ao modelo
de Lobato (2011).
ETE
RELAÇÕES UNITÁRIAS
Classificação Volume unitário de
CH4 produzido
Volume unitário de
biogás produzido
Potencial
energético unitário
NLCH4.kgDQOremov-1
NLbiogás.kgDQOremov-1
MJ.kgDQOremov-1
ETE 01 301,82 402,43 4,33 ST
ETE 02 282,49 376,65 4,06 PS
ETE 03 255,48 340,64 3,67 PS
ETE 04 300,53 400,71 4,31 ST
ETE 05 294,88 393,18 4,23 PS
ETE 06 286,56 382,08 4,11 PS
ETE 07 218,72 291,62 3,14 PS
ETE 08 296,96 395,95 4,26 PS
ETE 09 220,53 294,04 3,17 PS
ETE 10 176,55 235,40 2,53 PS
ETE 11 39,96 53,29 0,57 APS
ETE 12 296,63 395,51 4,26 PS
ETE 13 253,54 338,05 3,64 PS
ETE 14 286,45 381,93 4,11 PS
ETE 15 255,17 340,23 3,66 PS
94
ETE 16 275,23 366,97 3,95 PS
ETE 17 239,63 319,50 3,44 PS
ETE 18 240,49 320,66 3,45 PS
ETE 19 301,27 401,69 4,33 ST
ETE 20 306,57 408,76 4,40 ST
ETE 21 165,06 220,09 2,37 APS
ETE 22 304,72 406,29 4,37 ST
ETE 23 299,98 399,98 4,31 ST
ETE 24 221,14 294,85 3,17 PS
ETE 25 294,74 392,98 4,23 PS
ETE 26 269,95 359,93 3,88 PS
ETE 27 302,73 403,64 4,35 ST
ETE 28 283,06 377,41 4,06 PS
ETE 29 272,19 362,92 3,91 PS
ETE 30 226,71 302,28 3,25 PS
ETE 31 307,20 409,60 4,41 ST
ETE 32 261,07 348,10 3,75 PS
ETE 33 237,15 316,20 3,40 PS
ETE 34 282,10 376,13 4,05 PS
ETE 35 288,27 384,37 4,14 PS
ETE 36 297,87 397,16 4,28 PS
ETE 37 294,38 392,50 4,23 PS
ETE 38 93,31 124,41 1,34 APS
ETE 39 299,58 399,44 4,30 ST
ETE 40 271,00 361,34 3,89 PS
ETE 41 294,13 392,17 4,22 PS
ETE 42 302,93 403,91 4,35 ST
ETE 43 309,11 412,14 4,44 ST
Fonte: O AUTOR (2019).
Legenda: APS: Abaixo da Pior Situação; PS: Pior situação; ST: Situação típica (ST); MS: Melhor situação.
No que se refere à produção de metano, as ETEs analisadas apresentaram relação
unitária média igual a 0,26 Nm³ CH4.kgDQOremov-1
, valor inferior ao previsto por Metcalf e
Eddy (2016), os quais estimaram que, para a digestão anaeróbia de lodo aeróbio, seria
produzido 0,4 Nm³CH4.kgDQOremov-1
. Entretanto, em comparação aos resultados calculados
por Lobato (2011), 0,11 a 0,20 Nm³CH4.kgDQOremov-1
, pôde-se afirmar que, em média, as
ETEs com tecnologia reatores UASB do Ceará apresentaram relativa consonância ao modelo
traçado por seu estudo e, consequentemente, ao apontado por Noyola et al. (1998), apud
Lobato (2011), os quais reportaram valores variando entre 0,08 a 0,18 Nm³CH4.kgDQOremov-1
,
uma vez que, para as 43 ETEs, foram encontrados valores unitários de produção de metano
variando, em uma amplitude maior, entre 0,04 e 0,31 Nm³CH4.kgDQOremov-1
. Esses valores
apresentaram menos afinidade aos índices desses autores do que os apontados por Cabral
(2016), que, por sua vez, identificou uma variação de produção de metano por DQO removida
entre 0,08 e 0,14 Nm³CH4.kgDQOremov-1
.
95
Quanto à produção de energia por DQO removida, percebeu-se que as relações
unitárias calculadas para as ETEs do Ceará apresentaram valores bastante inferiores aos
reportados por Lobato (2011) (entre 4,1 e 7,0 MJ.DQOremov-1
), uma vez que o valor médio
encontrado foi igual a 3,8 MJ.DQOremov-1
, variando entre 0,6 e 4,4 MJ.DQOremov-1
. Medidas
visando ao aumento dessa relação, como reparos dos reatores e aperfeiçoamento dos
operadores das ETEs, fazem-se necessárias para que mais pessoas possam ser beneficiadas
pela utilização dessa energia para cocção de alimentos.
Ademais, dos fatores intervenientes para explicar essa diferença de resultados,
cabe salientar que interferem nessas razões: as características do esgoto afluente; a eficiência
do sistema de tratamento; a quantidade de vazamentos para a atmosfera nas câmaras e na
linha de gás do reator, característica intrinsecamente ligada às condições físicas dos reatores
quanto ao grau de deterioração e tempo de funcionamento; a excessiva entrada de água de
chuva no período das análises, diluindo a carga orgânica do esgoto afluente (causando baixa
produção de biogás) ou sobrecarregando hidraulicamente o reator (culminando na perda de
biomassa e diminuindo a eficiência de remoção de DQO); a presença ou não de um pós-
tratamento, bem como sua tipologia; a temperatura ambiente; a confiabilidade dos dados; a
afluência de altas cargas orgânicas e rápido acúmulo de ácidos-graxos voláteis (AGV), o que
inibe a metanogênese; e a qualificação do operador da ETE quanto à melhoria dos processos
de tratamento.
Por fim, foi possível notar que 3 ETEs foram classificadas na pior categoria (APS)
e 11 ETEs foram consideradas em situação típica (ST), enquanto que a maioria (26 ETEs)
permaneceu no cenário de pior situação (PS), quanto à relação de potencial energético
unitário. A Figura 27 ilustra essa classificação, explicitando a necessidade de melhoramento
da situação das ETEs do estado, considerando as relações estipuladas por Lobato (2011), com
o intuito de evitar o desperdício de energia térmica e beneficiar mais famílias, bem como de
impedir o agravamento do efeito estufa por meio das emissões de metano para a atmosfera.
Com isso, também seria possível melhorar o tratamento de efluentes estadual, tornando
possível o atingimento dos níveis estabelecidos pelas legislações locais, a fim de mitigar os
impactos ambientais causados pela disposição de esgotos no meio ambiente.
96
Figura 27 – Situação atual das ETEs do Ceará, com tecnologia reatores UASB, quanto à
produção de energia.
Fonte: O AUTOR (2019).
Legenda: APS: Abaixo da Pior Situação; PS: Pior situação; ST: Situação típica (ST); MS: Melhor situação.
5.5 Do prognóstico energético para as ETEs de Fortaleza
O Plano Municipal de Saneamento Básico, elaborado pela Acquatool, juntamente
à CAGECE e à SEUMA, apresentou a necessidade da instalação de três grandes ETEs,
divididas em grandes Bacias, da seguinte forma: Bacia da Vertente Marítima (região Norte do
município, composta por 6 sub-bacias), Bacia do Siqueira (região Oeste de Fortaleza,
composta por 15 sub-bacias), Bacia do Cocó (área de drenagem natural em direção ao rio
homônimo, composta por 24 sub-bacias) e Bacia do Coaçu/Miriú (região Sudeste do
município, com o rio Coaçu como divisor desta bacia, composta por 8 sub-bacias). Essa
reorganização configurou uma abordagem extremamente mais centralizada no âmbito do
tratamento de esgoto, completamente diferente do que vem sendo adotado pela CAGECE até
o momento.
Como não foram previstas grandes alterações para a Bacia da Vertente Marítima,
uma vez que esta já abrange, atualmente, toda a respectiva área de atuação, não se projetou
uma nova estação de tratamento para essa bacia, considerando, apenas, pequenas intervenções
para contemplar a manutenção e a ampliação do crescimento vegetativo dos habitantes dessa
região. Entretanto, para as demais bacias, houve previsão da construção de três grandes ETEs,
uma para cada região determinada, cujos dados de projeto já foram apresentados na Tabela 8.
6,98%
67,44%
25,58%
Classificação das ETEs do Ceará quanto ao
modelo de Lobato (2011)
APS
PS
ST
97
Ao contrário da ETE Miriú, foi estabelecido que as ETEs Cocó e Siqueira
apresentariam tecnologia principal de tratamento por lodos ativados de aeração prolongada
(LAAP), de rota aeróbia, como o nome sugere, a qual já é classicamente conhecida por
demandar potência relativamente alta de energia elétrica, devido ao uso de sopradores e
bombas hidráulicas, culminando em custos exorbitantes da companhia de saneamento básico
com eletricidade. Enquanto que, como já incessantemente discutido nesse trabalho, a
tecnologia anaeróbia, e.g., a escolhida para a ETE Miriú, demonstrou ser capaz de produzir
energia elétrica e consumir níveis bem inferiores de eletricidade.
Dessa forma, foram utilizados os parâmetros para consumo elétrico em ETEs de
tecnologia LAAP, desconsiderando o pós-tratamento, apresentados por Von Sperling (2016):
20 a 35 kWh.hab-1
.ano-1
; e por Gude (2015), apud Paulo et al. (2019): 0,6 kWh.m-3
de
efluente tratado, para construção da Tabela 17, a qual permitiu calcular o dispêndio
energético para a operação das ETEs aeróbias. Por exemplo, admitindo o valor máximo de
consumo apresentado por Von Sperling (2016), o somatório do resultado apresentado pelas
ETEs Cocó e Siqueira equivaleu-se à demanda de cerca de 18.666 casas, ou podendo atingir
aproximadamente 17.712 unidades habitacionais, se adotada a taxa de Gude (2015), apud
Paulo et al. (2019), dado que o consumo médio de eletricidade residencial no Ceará, no ano
de 2017, foi igual a 126,1 kWh.mês-1
, conforme descrito na Tabela 6.
Tabela 17 – Previsão de consumo elétrico das ETEs aeróbias em Fortaleza, para 2033.
ETE Cocó ETE Siqueira Referência
(MWh.dia-1
) (MWh.dia-1
)
24,94 19,89 Von Sperling (2016).
43,65 34,81
47,11 27,34 Gude (2015), apud Paulo et al. (2019). Fonte: O AUTOR (2019).
A Tabela 8 também permitiu conferir que cada uma das três ETEs ultrapassou o
limite mínimo de 100.000 contribuintes para tornar economicamente viável a alternativa de
geração de energia elétrica por meio do aproveitamento do biogás proveniente de reatores
UASB tratando esgoto doméstico, admitindo que ambas as ETEs (Cocó e Siqueira) também
apresentassem a mesma tipologia da ETE Miriú, o que evitaria os gastos com eletricidade
expostos na Tabela 17, ou seja, além de não consumir a mesma demanda de energia elétrica,
as ETEs Cocó e Siqueira passariam a produzir eletricidade por meio do biogás.
Logo, foram utilizados, mais uma vez, os parâmetros expressos na Tabela 6,
destacando os seguintes valores: geração de DQO per capita (0,10 kgDQO.hab-1
.dia-1
),
eficiência de remoção de DQO de reatores UASB (65%), eficiência de um gerador de energia
98
elétrica a biogás (36%), consumo médio de eletricidade residencial no Ceará (126,1 kWh.mês-
1), bem como os demais parâmetros destacados para o cálculo da geração atual de energia
térmica para as ETEs do item 5.4. Assim, os resultados foram incluídos na Tabela 18.
Com esses valores, notou-se que a produção de biogás foi diretamente
proporcional ao total de habitantes da estação, uma vez que se manteve invariável a eficiência
de remoção de DQO (estimada em um cenário típico) e se adotou uma taxa de aplicação de
DQO com base no número de contribuintes, e não com base na vazão afluente à ETE. Por
isso, a estação que indicou maior produção foi a ETE Cocó (40,3% da geração total de
biogás), seguida pela ETE Siqueira (32,2%) e ETE Miriú (27,5%), totalizando 27.358,52
m³.dia-1
de biogás, o que correspondeu a, aproximadamente, quatro vezes o valor do
somatório de todas as 43 ETEs analisadas no item 5.4 (para o ano de 2018, Qbiogás = 6.914,34
m³.dia-1
), contribuindo com a ideia de que a viabilidade econômica para adotar a alternativa
de utilizar biogás proveniente de reatores UASB visando à geração de energia elétrica se torna
atrativa apenas para estações de grande porte (Pop > 100.000 hab).
99
Tabela 18 – Avaliação da previsão de produção de biogás e geração de energia elétrica em Fortaleza, no ano de 2033.
ETE
População Vazão DQO per
capita Eficiência
de remoção
de DQO
DQO
Aplicada
DQO
Removida DQO Lodo DQO CH4 Q CH4
Q
Biogás
Potencial
elétrico
Nº de
residências
abastecidas
por ETE hab L.s
-1 kgDQO.dia-
1.hab
-1 kgDQO.dia-1
kgDQO.dia-1
kgDQO.dia-1
kgDQO.dia-1
m³.dia-1
m³.dia-1
MWh.dia-1
Cocó 455159 908,8 0,10 65% 45515,90 29585,34 7737,70 21847,63 8272,83 11030,43 29,69 7064
Miriú 310721 955,0 0,10 65% 31072,10 20196,87 5282,26 14914,61 5647,57 7530,09 20,27 4822
Siqueira 363040 527,3 0,10 65% 36304,00 23597,60 6171,68 17425,92 6598,50 8798,00 23,68 5634
Fonte: O AUTOR (2019).
100
Assim, assumir tratamento anaeróbio (reatores UASB) para as três estações de
tratamento previstas no PMSB permitiu indicar um potencial elétrico igual a 73,7 MWh.dia-1
,
energia capaz de alimentar 17.521 residências por mês; enquanto que apenas o tratamento
primário das ETEs Cocó e Siqueira (LAAP), desconsiderando seus pós-tratamentos também
aerados, como já mencionado, consumiria o equivalente mensal de 17.712 a 18.666 famílias.
Caso a CAGECE opte por não integrar o Sistema Interligado Nacional (SIN) e
participar dos ambientes de contratação regulada ou de contratação livre, a fim de possibilitar
a venda desse excedente energético, há a possibilidade de reutilizar essa energia para
alimentar secadores de lodo, sopradores de um pós-tratamento aerado, bombas de sucção e de
dosagem de cloro, bem como para os demais consumos elétricos dentro do próprio terreno da
ETE ou fora dele, conforme inúmeras sugestões abordadas na Revisão Bibliográfica, seja para
demanda dos prédios administrativos da companhia, seja para aquelas estações em que não há
produção de biogás, devido à tecnologia do tratamento de efluentes, em todo o estado do
Ceará, isto é, sem, necessariamente, precisar restringir-se apenas à cidade em que a energia
elétrica foi gerada.
Considerando a capacidade total de atendimento das ETEs Cocó, Miriú e Siqueira
em termos populacionais (1.128.920 habitantes) e admitindo uma composição familiar de
quatro pessoas por unidade habitacional, foi possível estimar que, supondo a injeção dessa
energia na rede da concessionária de abastecimento elétrico, com o intuito de facilitar a
mensuração da distribuição de eletricidade, um total de 70.084 pessoas seria beneficiado com
a energia elétrica fornecida por essas estações previstas, o que correspondeu a uma taxa de
atendimento de 1,55% em Fortaleza, aplicando a Equação 14.
Esse valor se aproximou do apresentado por Chernicharo et al. (2017), para as
ETEs das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, as quais indicaram uma capacidade instalada
para atender 10,7 milhões de habitantes nos reatores anaeróbios de porte grande (Pop >
100.000 hab), correspondendo a uma geração de energia elétrica da ordem de 108,1 GWh.ano-
1, ou seja, o suficiente para suprir a demanda mensal de 48.830 residências (195.320 pessoas
beneficiadas nesses estados), resultando em um índice de atendimento igual a 1,83%. A taxa
de atendimento calculada para o estudo de Bressani-Ribeiro et al. (2017), por sua vez, embora
um pouco maior que a de Chernicharo et al. (2017), também se aproximou da analisada para a
cidade de Fortaleza, uma vez que se percebeu a produção de 6.559.278 MWh.ano-1
em ETEs
de grande porte, com capacidade instalada de atendimento de 582.327.513 habitantes,
101
suficiente para atender 3,2 milhões de habitações (ou 12,8 milhões de pessoas), o que
culminou em um índice de atendimento igual a 2,20%.
A diferença entre essas taxas, entre outros fatores, pode ser explicada pela adoção
de diferentes índices de consumo médio de energia elétrica, uma vez que, para análise das
ETEs de Fortaleza, foi utilizado o índice do Ceará de 2017 (EPE, 2017); enquanto que, para
os demais casos, foi utilizada a taxa apresentada para o consumo médio nacional. Outro fator
interveniente desses resultados é também a eficiência média de remoção de DQO, a qual
variou caso a caso. Entretanto, a proximidade dos índices de atendimento permitiu reforçar a
ideia de que seria mais interessante promover a substituição da tipologia prevista para as
ETEs Cocó e Siqueira pela mesma adotada para a ETE Miriú, a fim de fornecer energia
elétrica para a comunidade residente de Fortaleza.
Comparando o cenário específico da ETE Cocó com um exemplo internacional: a
ETE Taunusstein, na Alemanha (ROSA, 2013), que, com porte similar (50.000 habitantes),
ostentou a marca de produção de energia elétrica igual a 1.500 kWh.dia-1
, a partir de 1.000
m³.dia-1
de biogás gerado (64% de CH4). Assim, a estimativa representada pela ETE Cocó
apresentou superioridade à ETE Taunusstein, em escala real, uma vez que se previu uma
produção de mais de 11.000 m³.dia-1
de biogás e 29.690 kWh.dia-1
de energia elétrica.
Esse e os demais respectivos potenciais energéticos da Tabela 18 também
exibiram superioridade numérica quanto à geração de energia elétrica prevista para a ETE
Laboreaux, em Itabira – MG, na qual se observou, de acordo com Rosa et al. (2016), para
uma população de 70.000 habitantes, uma produção de 390,1 Nm³.dia-1
de biogás (78,2% de
metano), equivalente a uma geração elétrica de 10.962 MJ.dia-1
.
Por fim, sob a ótica dos créditos de carbono gerados pela produção de energia
elétrica, por meio de fontes renováveis, a calculadora online (RENSMART, 2018), de posse
do potencial elétrico de cada ETE proposta, permitiu observar a criação de 3.067,88
tonCO2eq.ano-1
para a ETE Cocó; 2.094,33 tonCO2eq.ano-1
para a ETE Miriú; e 2.446,98
tonCO2eq.ano-1
para a ETE Siqueira. Dessa forma, como a ETE Miriú produziria a mesma
quantidade no cenário proposto no PMSB (2014), a diferença dos cenários proporcionaria a
geração de um total de 5.514,86 tonCO2eq.ano-1
de créditos de carbono, ou seja, de compostos
potencializadores do efeito estufa que se evitou emitir na atmosfera, os quais podem ser
negociados (vendidos) para compensação de empresas que necessitem equilibrar os níveis de
emissão de gases de efeito estufa na atmosfera.
102
5.6 Da avaliação econômica das ETEs propostas
Levando em consideração serviços com obra civil, gastos de equipamentos e
quantidades baseadas em experiências empíricas, o estudo realizado pela Probiogás (BRASIL,
2016c) estipulou um custo de implantação, ou seja, um CAPEX per capita igual a R$
70,23.hab-1
para estações com tecnologia lodos ativados, modalidade aeração prolongada; e
igual a R$ 89,16.hab-1
para ETEs com tratamento principal por meio de reatores UASB,
seguidos de um pós-tratamento de lodos ativados, modalidade convencional, e com
aproveitamento de biogás para fins energéticos. Esse valor resultou em um preço superior
àquele devido aos gastos com equipamentos mais sofisticados para recuperação energética,
não previstos para a tecnologia LAAP, bem como por requerer mais construções de unidades
de tratamento.
Complementarmente, pelo mesmo relatório do Probiogás, foi possível determinar
os custos com operação e manutenção, i.e., OPEX per capita por ano para cada tecnologia,
sendo eles: R$ 19,88.hab-1
.ano-1
para ETEs de tecnologia LAAP e R$ 12,84.hab-1
.ano-1
para
ETEs de tecnologia UASB + LAC + GAS. Ao contrário do que fora percebido para o
CAPEX, os custos anuais de OPEX demonstraram ser menores para a segunda tecnologia,
uma vez que a tecnologia LAAP requer altos gastos com os tanques de aeração
(aproximadamente o dobro da demanda energética da segunda opção), bem como elevadas
despesas com disposição do lodo gerado no tratamento (1,6 vezes maior que na tecnologia
UASB + LAC + GAS). Vale salientar que apenas foram consideradas, para cômputo dos
custos operacionais energéticos anuais, as demandas com o processo de aeração de ambas as
tecnologias, sendo os demais consumos pertinentes às estações invariáveis entre as rotas
tecnológicas.
A alternativa do Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB, 2014)
apresentou CAPEX total de R$ 85.166.000,13, isto é, seria necessário esse valor para
implantação (ano 0) das três ETEs previstas no plano, sendo as ETEs Cocó e Siqueira
aeróbias e a ETE Miriú anaeróbia e, portanto, a única passível de geração de eletricidade para
abatimento do consumo geral de energia. Como valor total dos custos com OPEX, calculou-se
uma quantia anual igual a R$ 20.247.271,77, dos quais seriam descontados apenas R$
4.941.680,60 por ano (aproximadamente 25% do OPEX total), representado com sinal
negativo para indicar o custo evitado com a venda desse potencial à concessionária estadual
de abastecimento energético. Dessa forma, como pode ser consultado na Tabela 19, percebeu-
103
se que, em um ano operação, seria necessário um total de R$ 100.471.591,30 para instalação,
operação e manutenção das ETEs propostas pelo PMSB.
Em contrapartida, a Tabela 20 apresentou os dados financeiros referentes à
proposta de adoção da tecnologia de reatores UASB para as ETEs Cocó e Siqueira. Dessa
forma, notou-se que o sub-total referente ao CAPEX geral apresentou aumento de R$
15.488.507,07 com relação à proposição do PMSB. Entretanto, os custos com operação e
manutenção exibiram uma redução de R$ 5.751.938,97 por ano, devido ao menor valor
estimado de OPEX anual per capita da tecnologia anaeróbia. Adicionalmente, para
demonstrar a superioridade financeira dessa opção, é importante salientar o custo evitado com
a previsão de três grandes ETEs que permitam o aproveitamento do biogás para fins
energéticos, posto que, por ano, seriam economizados R$ 17.954.248,55 em custos de
operação e manutenção; ou seja, dado que o sub-total referente ao OPEX foi de R$
14.495.332,80.ano-1
, pode-se dizer que as três ETEs propostas seriam não só
autossustentáveis, mas também capazes de gerar saldo energético equivalente a R$
3.458.915,75 por ano, assumindo, para fins de dimensionamento, que esse excedente elétrico
seja injetado de volta à rede de abastecimento da concessionária de energia do estado,
podendo resultar em um retorno financeiro ainda maior, caso a CAGECE opte por celebrar
contratos livres entre geradores e consumidores de energia elétrica ou por participar dos
leilões de venda de energia regulados pela ANEEL.
Devido a essa quantia remanescente, a proposta sugerida foi considerada
economicamente viável, pois permitiu considerar, de maneira bastante preliminar, a
amortização do CAPEX excedente (ano 0), com relação à previsão do PMSB, em,
aproximadamente 4,5 anos. Isso significou que, logo após esse período, as duas propostas se
equalizariam em se tratando da diferença entre os respectivos investimentos de implantação,
R$ 15.488.507,07 maior na adoção da tecnologia anaeróbia para as três ETEs, conforme
supracitado. Também para essa proposta, diferentemente da prevista pelo PMSB, a qual não
contemplou excedente energético e, portanto, não gerou lucro, foi aberto precedente para
estimar o tempo em que o investimento seria amortizado por completo, o que resultou em um
período de, aproximadamente, 29 anos, admitindo gastos fixos e anuais com operação (OPEX
calculado), desconsiderando impostos, descontos, valorização monetária e demais variáveis.
104
Tabela 19 – Análise financeira da alternativa prevista para Fortaleza, pelo PMSB (2014), em 2033.
ALTERNATIVA PMSB (2014)
ETE Tecnologia Pop CAPEX OPEX
Potencial
elétrico
Tarifa de
energia Custo evitado Total (ano 1)
hab R$.hab-1
R$ (ano 0) R$.hab-1
.ano-1
R$.ano-1
kWh.ano-1
R$.kWh-1
R$.ano-1
R$
Cocó LAAP 455159 R$ 70,23 R$ 31.965.816,57 R$ 19,87 R$ 9.044.009,33 0
R$ 0,66792
R$ - R$ 41.009.825,90
Miriú UASB + LAC 310721 R$ 89,16 R$ 27.703.884,36 R$ 12,84 R$ 3.989.657,64 7398639,204 -R$ 4.941.680,60 R$ 26.751.861,40
Siqueira LAAP 363040 R$ 70,23 R$ 25.496.299,20 R$ 19,87 R$ 7.213.604,80 0 R$ - R$ 32.709.904,00
Sub-total CAPEX R$ 85.166.000,13 Sub-total
OPEX R$ 20.247.271,77 Total R$ 100.471.591,30
Sub-total economizado (R$/ano) -R$ 4.941.680,600
Fonte: O AUTOR (2019).
Tabela 20 – Análise financeira da alternativa proposta para Fortaleza, em 2033.
ALTERNATIVA PROPOSTA
ETE Tecnologia Pop CAPEX OPEX
Potencial
elétrico
Tarifa de
energia Custo evitado Total (ano 1)
hab R$.hab-1
R$ (ano 0) R$.hab-1
.ano-1
R$.ano-1
kWh.ano-1
R$.kWh-1
R$.ano-1
R$
Cocó
UASB + LAC
455159
R$ 89,16
R$ 40.581.976,44
R$ 12,84
R$ 5.844.241,56 10837881
R$ 0,66792
-R$ 7.238.810,38 R$ 39.187.407,62
Miriú 310721 R$ 27.703.884,36 R$ 3.989.657,64 7398639,204 -R$ 4.941.680,60 R$ 26.751.861,40
Siqueira 363040 R$ 32.368.646,40 R$ 4.661.433,60 8644417,263 -R$ 5.773.757,56 R$ 31.256.322,43
Sub-total CAPEX R$ 100.654.507,20 Sub-total
OPEX R$ 14.495.332,80 Total R$ 97.195.591,45
Sub-total economizado (R$.ano
-1) -R$ 17.954.248,55
Fonte: O AUTOR (2019).
105
Ademais, conforme os índices reportados por Chernicharo et al. (2018), de que
haveria redução de 20-50% dos custos com implantação (CAPEX) e de acima de 50% de
custos com operação e manutenção (OPEX), não foram verificados esses valores na
comparação dos cenários, uma vez que a proposta apresentou CAPEX maior (18,19% a mais)
que a alternativa prevista pelo PMSB; enquanto que, em termos de OPEX, a economia
percentual foi igual a 28,41%. Chernicharo et al. (2015) também apresentaram economias
bastante elevadas quanto à adoção de sistemas de reatores UASB com pós-tratamento de filtro
percolador à base de pedras como meio suporte, o qual consistiu em um CAPEX 40% menor
e um OPEX 90% mais barato do que a tecnologia de lodos ativados, principalmente pela não
utilização de energia proveniente de combustíveis fósseis para o tratamento do efluente.
Contudo, a proposta sugerida nesse trabalho demonstrou um racionamento de R$
3.275.999,25 para o primeiro ano de operação, incluindo os custos de implantação (ano 0) em
ambos os cenários, o que simbolizou uma economia geral de 3,26%.
Finalmente, cabe destacar que a alternativa de adotar estações de tratamento com
tecnologia de lagoas de estabilização, para grandes vazões e em grandes centros urbanos,
como as ETEs Cocó, Miriú e Siqueira, seria antieconômica, dadas as dimensões necessárias e
a impossibilidade de encontrar áreas próximas à capital do Ceará com disponibilidade de
terreno e a um preço acessível para instalação de uma tecnologia de tratamento com uma
enorme demanda de área.
106
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES 6
De uma forma geral, concluiu-se que a utilização para cocção da energia térmica
do biogás proveniente de estações de tratamento de esgoto do Ceará, com tecnologia reatores
UASB, tratando efluentes domésticos, demonstrou satisfatoriedade, devido à totalidade de
residências que poderia ser abastecida com esse gás, para cocção de alimentos.
Foi possível averiguar a concentração de ETEs consideradas de micro e pequeno
porte, bem como a abrangente implantação da tecnologia decanto-digestor para o tratamento
de contribuições baixas em termos populacionais e hidráulicos, corroborando a ideia de que a
abordagem de tratamento de efluentes por parte da CAGECE era de descentralizar os sistemas
de coleta e tratamento de esgotos e aumentar a abrangência desse serviço aos cidadãos do
Ceará, possibilitando a implantação do saneamento básico em regiões mais isoladas.
Entretanto, sugeriu-se que as ETEs de tecnologia DD fossem trocadas, em sua totalidade, por
reatores UASB, com o intuito de melhorar os índices de qualidade do efluente tratado e,
consequentemente, incentivar a geração de biogás, potencializando o ganho para o estado.
Por outro lado, para estações mais robustas, foi fácil perceber a preferência da
companhia para adoção de sistemas de lagoas de estabilização e de reatores UASB.
Adicionalmente, foi possível comparar, em se tratando dos reatores UASB de Fortaleza, que
aquelas ETEs com tal tecnologia, mas sem um pós-tratamento, apresentaram baixa eficiência
de remoção de DQO; enquanto que as demais ETEs da capital, com reatores UASB seguidos
de um pós-tratamento, apresentaram eficiência dentro do esperado em um cenário típico.
Ademais, as relações unitárias calculadas para as 43 ETEs de reatores UASB analisadas
permitiram concluir que pelo menos 29 delas (aquelas nas categorias de APS e PS) precisam
de melhorias para otimizar o aproveitamento energético do biogás.
Quanto à proposição, no Plano Municipal de Saneamento Básico, a respeito das
três grandes estações de tratamento de esgoto, em Fortaleza, concluiu-se que a substituição
das tecnologias aeróbias, viabilizaria uma grande geração de créditos de carbono, os quais
podem ser vendidos, e uma produção acumulada de energia elétrica, cujo excedente pode ser
injetado de volta na rede da concessionária de abastecimento energético estadual,
promovendo lucro para a CAGECE. Adicionalmente, a análise de custos CAPEX e OPEX,
realizada no trabalho, demonstrou viabilidade econômica para a proposta, permitindo, de
maneira preliminar, ao contrário da previsão do PSBM, a amortização desses investimentos.
107
Ao longo do trabalho, também foram destacadas rotas tecnológicas atuais para o
aproveitamento do biogás gerado em estações de tratamento de esgoto, com a apresentação de
estudos contemplando teste de diversas escalas e em diferentes localidades nacionais e
internacionais, os quais permitiram verificar a versatilidade do aproveitamento do biogás
proveniente de ETEs anaeróbias, devendo, contudo, previamente, haver avaliação de alguns
parâmetros, a fim de evitar o dissabor de uma experiência frustrada com essa tecnologia e
impedir que a ideia de fomentar a implantação de ETEs sustentáveis.
Em síntese, foi possível concluir que os objetivos ora traçados para a execução
dessa pesquisa foram alcançados em sua totalidade, sugerindo-se considerar aprofundamento
de trabalhos posteriores, acerca dos possíveis seguimentos: gerenciamento da biomassa (lodo)
gerado nos reatores UASB e uso do efluente das estações, englobando todas as fases do
tratamento de esgotos (sólida, líquida e gasosa); contabilizar, nos modelos de simulação de
geração de biogás, as perdas reais de metano e biogás, por fatores biológicos, físicos e
químicos; melhores técnicas para o tratamento e o beneficiamento do biogás, a fim de evitar
danos aos geradores de energia, bem como para destinar esse subproduto a usos mais nobres,
como combustíveis veiculares; testar a aplicabilidade de um fogão a biogás alimentado por
uma ETE de Fortaleza, com tecnologia reatores UASB, em escala real; e cálculo do índice de
economia de uma família vizinha a essa ETE, devido à substituição do gás de cozinha comum
pelo biogás de um reator UASB.
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