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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR NOS CONTRATOS DE TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE
MERCADORIA
LEANDRO PEREIRA
Itajaí, outubro de 2006
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR NOS CONTRATOS DE TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE
MERCADORIA
LEANDRO PEREIRA
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor Dr. Diego Richard Ronconi
Itajaí, outubro de 2006
MEUS SINCEROS AGRADECIMENTOS:
A Deus, por ter me proporcionado saúde e condições de continuar na busca de um sonho.
Aos meus pais João Brás Pereira e Célia Minela, meus irmãos Alessandro Pereira e João Brás Pereira Júnior, pela compreensão, amizade e
amor dedicados ao longo de minha vida.
A Elisabeth Joos Blanck, por ter me brindado com sua amizade, compreensão e por ter se tornado
minha segunda mãe, assim a considero.
Fabiano Collato, que se tornou meu melhor amigo de todos os tempos, seja nas horas alegres, como
nas horas difíceis que passei e que precisei.
Ana, Fernando e Marla, pela amizade construída nos meus quatros anos de estágio no Fórum da
Comarca de Balneário Piçarras/SC e que perdura acesa até hoje.
A Drª Ana Vera Sganzerla Truccolo, Juíza de Direito da Comarca de Balneário Piçarras/SC, por
todos os ensinamentos e carinho com que me tratou durante estágio.
A Drª Viviane Daminani Valcanaia, Promotora de
Justiça da Comarca de Balneário Piçarras/SC, por
seu profissionalismo e por ter me brindado com
sua amizade.
Ao Dr. Osvaldo Agripino de Castro Júnior, por me ajudado paralelamente na produção desse
Trabalho.
Ao Meu Orientador Dr. Diego Richard Ronconi, pela atenção dispensada durante todo o tempo da
produção desse trabalho.
ESTE TRABALHO DEDICO ESPECIALMENTE:
Ao Sr. João Brás Pereira e Sra. Célia Minela, por todo amor e carinho que vocês vêm me
proporcionando até os dias de hoje.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí (SC), outubro de 2006
Leandro Pereira Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Leandro Pereira , sob o título
Responsabilidade Civil do Transportador nos Contrat os de Transporte
Marítimo Internacionais de Mercadorias , foi submetida em 21/11/2006 à banca
examinadora composta pelos seguintes professores: Dr. Diego Richard Ronconi,
Dr. Osvaldo Agripino de Castro Júnior e Jaqueline Daros Abreu de Oliveira, e
aprovada com a nota 9,4 (nove virgula quatro).
Itajaí (SC), outubro de 2006
Dr. Diego Richard Ronconi Orientador e Presidente da Banca
Msc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Avarias:
“São os danos, as perdas e as despesas extraordinárias que o navio, ou sua
carga, sofrem durante a expedição marítima, sendo melhor definida no art. 761 do
Código Comercial, que assim dispõe: Todas as despesas extraordinárias feitas a
bem do navio ou da carga, conjunta ou separadamente, ou todos os danos
acontecidos àquela ou a esta, desde o embarque até a sua volta e desembarque,
são reputadas avarias”1
B/L Conhecimento de Carga / Embarque:
“É o documento mais importante do comércio marítimo, pois é um título de crédito
que representa mercadoria nele descrita, evidenciando a existência de um
contrato de transporte”2.
CIF:
“No CIF (custo, seguro e frete) as mercadorias têm o preço acrescido do seguro
marítimo e do frete; usando esse termo, o exportador, por pagar o frete, escolhe a
embarcação que transportará as mercadorias”.3
Contrato:
“(...) é o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica,
destinado a esclarecer uma regulamentação de interesses entre as partes com o
1 CASTRO JR, Osvaldo Agripino. Introdução ao direito marítimo In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional, vol. I. Florianópolis: OAB/SC, 2004. p. 107. 2 CASTRO JR, Osvaldo Agripino. Introdução ao direito marítimo In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional, vol. I. p. 112. 3 ANJOS, J. Haroldo dos, GOMES, Carlos Rubens Caminha. Curso de direito marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 1992. p.178.
escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza
patrimonial”4.
Contrato de Afretamento:
“Fretamento ou afretamento é o contrato pelo qual uma pessoa, o fretador, coloca
à disposição de outra pessoa, o afretador, seu navio ou partes dele, mediante o
pagamento de uma soma denominada de frete. É um contrato misto de locação
de coisas e prestação de serviços, variando os dois conforme a modalidade que
se apresente”.5
Contrato de Transporte:
“É aquele em que uma pessoa ou empresa se obriga, mediante retribuição, a
transportar, de um local para outro, pessoas ou coisas animadas ou inanimadas
(CC, art. 730). A empresa de transporte, pessoa física ou jurídica, está apta à
oferta e à prestação de serviços de deslocamento de pessoas e de mercadorias
por via terrestre, aquaviária, revestindo-se, ferroviária e aérea, mediante contratos
celebrados com os respectivos usuários, revestindo-se para tanto de forma
empresarial, quer em nome individual, quem nome coletivo, e assumindo os
riscos decorrentes desse empreendimento”6.
Contrato de transporte Marítimo:
“É um acordo escrito mediante o qual o armador se compromete a transportar
mercadorias por água, numa expedição marítima, recebendo em troca ma quantia
em dinheiro denominada frete. Assim o frete é o preço do transporte”.7
FOB:
4 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. 21 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 24. 5 ANJOS, J. Haroldo dos, GOMES, Carlos Rubens Caminha. Curso de direito marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 1992. p.184. 6 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. v. III, 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 417. 7 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. 2 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p.145.
“No caso FOB (posto a bordo), significa que as mercadorias serão postas a bordo
pelo exportador, e daí por diante as despesas e responsabilidade correrão por
conta do importador”.8
Navio e embarcação:
“Espécie do gênero embarcação, construção flutuante de natureza móvel,
destinada a uma navegação que habitualmente o submete aos riscos do mar,
sendo necessário que tenha robustez para enfrentar as fortunas das viagens
marítimas, personalidade, nacionalidade e nome. A Convenção Internacional para
Unificação de Certas Regras em Matéria de Conhecimentos Marítimos, em seu
art. 1°, define navio como sendo “toda embarcação d estinada ao transporte de
mercadorias por mar”.
A embarcação, por sua vez, de acordo com o item 0108 da NORMAM 03,
expedida pela Diretoria dos Portos e Costas, ao regulamentar a Lei 9.537, de 11
de dezembro de 1997, que dispõe sobre a segurança do tráfego aquaviário –
LESTA, “é qualquer construção inclusive as plataformas flutuantes e as fixas,
quando rebocadas, sujeitas à inscrição na autoridade marítima e suscetível de se
locomover na água, por meios próprios ou não, transportando pessoas ou
cargas”.
No caso de embarcação de esporte ou recreio, o seu registro de propriedade,
conforme item 0209, da NORMAM 03, será deferido à pessoa física residente e
domiciliada no País, às entidades públicas ou privadas sujeitas às leis brasileiras,
e aos estrangeiros, mesmo aqueles não residentes nem domiciliados no País, de
acordo com a Lei n° 7.652/88 alterada pela Lei n° 9 .774/98”9.
Responsabilidade Civil:
“Responsabilidade Civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a
reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela
8 ANJOS, J. Haroldo dos, GOMES, Carlos Rubens Caminha. Curso de direito marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 1992. p.178. 9 CASTRO JR, Osvaldo Agripino. Introdução ao direito marítimo In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional, vol. I. p. 105.
mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por coisa a ela pertencente
ou de simples imposição legal”10.
Transporte aquaviário:
“(art. 1º, §1º, II) – Dispõe sobre a sua ordenação a Lei nº. 9.432, de 08.01.97,
abrangendo o afretamento, o armador, a tripulação, a marinha mercante e os
regimes de navegação.
A lei nº 9.443, de 08.01.97, instituiu a política nacional de recursos hídricos,
inclusive no que toca ao transporte aquaviário, criando sistema de
gerenciamento”.11
Transporte Marítimo:
“Transporte é o conjunto de meios que possibilitam o deslocamento de bens e
pessoa. Para que haja produção é necessário que se localizem no mesmo lugar a
mão-de-obra, a matéria-prima e o equipamento de transformação, carecendo,
ainda carecendo ainda do meio para colocar tal produto no mercado. Como cada
país possui suas vantagens comparativas, ou seja, produtos e serviços que são
característica da própria geografia e cultura do povo, o transporte surge como
elemento essencial para a divisão do trabalho e ampliação de mercado. Nesse
quadro, pode-se sustentar que a relação entre mobilidade e renda é tal que
países nos quais bens e povo movem-se com facilidade têm, relativamente, alta
renda per capita, pois países que dependem de transporte não podem gerar
maior produtividade.
Por sua vez, grande parte do transporte e do comércio internacional é feito entre
nações separadas por oceanos, por rios e lagos, sendo esse gênero de transporte
denominado aquaviário, e por ocorrer nos mares e oceanos, chama-se transporte
marítimo, sendo imbatível no tocante ao preço e à capacidade de movimentar
grandes quantidades de mercadorias”.12
10 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Responsabilidad e Civil . São Paulo: Saraiva: 1999, v.7, 13 ed., p.36. 11 SILVA, De Plácido.Vocabulário jurídico . 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p.830. 12 CASTRO JR, Osvaldo Agripino. Introdução ao direito marítimo In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional, vol. I. p. 104.
SUMÁRIO
RESUMO.........................................................................................XIV
INTRODUÇÃO ................................................................................. 15
CAPÍTULO 1 ......................................... ........................................... 18
BREVES NOÇÕES SOBRE RESPONSABILIDADE CIVIL......... ..... 18 1.1 BREVE HISTÓRICO ACERCA DA RESPONSABILIDADE RIVI L. ...............18 1.2 CONCEITO E ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL . ...................21 1.3 ESPÉCIES E FORMAS DE RESPONSABILIDADE CIVIL .... ........................24 1.3.1 RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL ..........................................................25 1.3.2 RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL ................................................26 1.3.3 RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA ..............................................................28 1.3.4 RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA ...............................................................30 1.4 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL .......... .............................34
CAPÍTULO 2 ......................................... ........................................... 43
CONSIDERAÇÕES SOBRE OS CONTRATOS DE TRANSPORTE E SUAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS....................... ..................... 43 2.1 CONCEITO DE CONTRATO DE TRANSPORTE ............. .............................43 2.2 ESPÉCIES DE CONTRATOS DE TRANSPORTE ............ .............................44 2.2.1 CONTRATO DE TRANSPORTE DE PESSOAS........................................................45 2.2.2 CONTRATO DE TRANSPORTE DE COISAS ..........................................................51 2.3 FORMAS DE TRANSPORTE........................... ..............................................56 2.3.1 CONTRATO DE TRANSPORTE TERRESTRE .........................................................57 2.3.2 CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO ................................................................59 2.3.3 CONTRATO DE TRANSPORTE MARÍTIMO, LACUSTRE E FLUVIAL ...........................60 2.3.3.1 Marítimo ................................... ................................................................60 2.3.3.2 Fluvial................................... ...................................................................61 2.3.3.3 Lacustre ................................... ................................................................61
2.4 REQUISITOS E ELEMENTOS DOS CONTRATOS DE TRANSPO RTE .......61 2.5 AS CONVENÇÕES E TRATADOS INTERNACIONAIS ACERCA DOS CONTRATOS DE TRANSPORTE............................ ............................................62
CAPÍTULO 3 ......................................... ........................................... 65
OS CONTRATOS DE TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE COISAS E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR ...................................... ................................... 65 3.1 TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE COISAS E O BRIGAÇÕES DO TRANSPORTADOR................................... ....................................................65 3.2 AVARIAS NO TRANSPORTE MARÍTIMO................. ....................................69 3.2.1 AVARIA GROSSA ............................................................................................71 3.2.2 AVARIA PARTICULAR ......................................................................................73 3.3. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANS PORTADOR MARÍTIMO DE COISAS POR AVARIAS ..................... ........................................74 3.4 OS TERMOS INICIAL E FINAL DA RESPONSABILIDADE D O TRANSPORTADOR ...................................... .......................................................80 3.5. CLÁUSULAS EXONERADORAS AJUSTADAS ENTRE O TRANSPORTADOR E O CARREGADOR ....................... ....................................81 3.5.1. CONCEITO CLÁUSULAS EXONERADORAS .........................................................81 3.5.2. VANTAGENS DA CLÁUSULAS EXONERADORAS .................................................82 3.5.3. DESVANTAGENS DAS CLÁUSULAS EXONERADORAS ..........................................82 3.6. LEGISLAÇÃO ESPECIAL APLICÁVEL AO CONTRATO DE T RANSPORTE MARÍTIMO............................................................................................................83 3.6.1 CÓDIGO CIVIL .................................................................................................85 3.6.2 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR..............................................................86 3.6.3 TRATADO DE TRANSPORTE MULTIMODAL DO MERCOSUL....................................90 3.6.3.1 Do Documento ou Conhecimento de Transporte Multimodal. ............91 3.6.3.2 Responsabilidade do Operador de Transporte Multimodal ................92 3.6.3.3 Responsabilidade do Expedidor.............. ..............................................94
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................... ............................... 95
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ...................... .................. 100
RESUMO
O estudo sobre o tema A Responsabilidade Civil do Transportador no Contrato de Transporte Marítimo Internacional de Mercadorias tem por finalidade aprofundar o conhecimento sobre a Responsabilização do Transportador Marítimo ante as avarias ocorridas durante o transporte, visando a realização de uma monografia, para a conclusão do curso e obtenção do grau de bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí. No primeiro capítulo será tratado sobre noções gerais a respeito da Responsabilidade Civil, sua evolução histórica, elementos e requisitos para a sua caracterização, bem como suas formas e espécies. Já o segundo capítulo abordará os Contratos de Transporte, elementos, formas, espécies e suas relações internacionais. O terceiro capítulo terá como assunto os Contratos de Transporte Marítimo Internacionais e a Responsabilidade Civil do Transportador com suas peculiaridades, tais como a inserção das cláusulas de não indenizar no Conhecimento de Embarque ou Bill of Lading, bem como a legislação aplicável e a Responsabilidade do Transportador contida no Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. Utilizou-se o método indutivo para a elaboração do presente trabalho. O tema é atual e relevante, visto que a região do Vale do Itajaí é Portuária e encontra-se atualmente em expansão, devido ao desenvolvimento econômico do nosso País, em que o mercado de trabalho vem necessitando de pessoal especializado para atuação nas soluções dos conflitos que estão surgindo junto com o crescimento das exportações e importações, cujo o principal meio de transporte utilizado é o marítimo, eis que financeiramente mais viável, tanto aos exportadores quanto aos importadores.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto a Responsabilidade
Civil do Transportador nos Contratos de Transporte Marítimo Internacional de
Mercadorias.
O seu objetivo é produzir Monografia para obtenção do
Título de Bacharel em Direito – Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando de
Responsabilidade Civil, com seus conceitos, elementos, espécies e formas, sendo
a responsabilidade contratual, extracontratual, subjetiva, objetiva, por fim as
excludentes de responsabilidade civil.
No Capítulo 2, tratando de considerações sobre os contratos
de transporte e suas relações internacionais, identificando os conceitos e
espécies de Contrato de Transporte, sendo o Contrato de Transporte Pessoas,
Coisas e sob as formas Terrestre, Aéreo, Marítimo, Fluvial e Lacustre e ainda os
requisitos e elementos dos contratos de transporte, por fim as Convenções e
tratados internacionais sobre os contratos de transporte marítimo.
No Capítulo 3, tratando dos Contratos de Transporte
Marítimo Internacionais de Coisas e a Responsabilidade Civil do Transportador,
iniciando com o Transporte Marítimo Internacional de Coisas e obrigações do
transportador, identificando as Avarias no Transporte marítimo, destacando-se a
avaria grossa e a avaria particular, seguido das excludentes de responsabilidade
civil, a fixação do termo inicial e final da responsabilidade do transportador, as
cláusulas exoneradoras ajustadas entre o transportador e o carregador, com as
vantagens e desvantagens da inclusão dessas cláusulas.
Após, as abordagens serão a respeito da legislação especial
aplicável aos contratos de transporte marítimo, abordando-se o Código Civil e o
Código de Defesa do Consumidor.
16
Por fim, o trabalho trata a respeito do conhecimento de
transporte multimodal e da responsabilidade transportador e expedidor.
A presente Monografia se encerra com as Considerações
Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da
estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a
Responsabilidade Civil do Transportador nos Contratos de Transporte Marítimo
Internacional de Mercadorias.
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
perguntas:
Em que condições poderá o transportador marítimo se eximir
da responsabilidade de reparação por danos decorrentes de avarias de
mercadorias transportadas?
É válida a cláusula de exclusão de responsabilidade nos
contratos de transporte marítimo por danos causados aos bens objetos do
transporte?
No entanto, diante de tais indagações foram apresentadas
as seguintes hipóteses:
� “O transportador poderá exonerar-se da responsabilidade de reparar o dano na mercadoria avariada se não houver culpa do transportador, ou seja, se o mesmo estiver sob a incidência de falta do afretador, vício próprio da mercadoria, embalagem inadequada.
� A Convenção de Bruxelas de 1924, prevê a possibilidade da inserção de cláusulas de isenção de responsabilidade no contrato de transporte marítimo internacional. No entanto, a referida Convenção não foi recepcionada pela legislação brasileira. Portanto não possuem validade no ordenamento jurídico pátrio.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados
17
o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa foram acionadas as
Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
18
CAPÍTULO 1
BREVES NOÇÕES SOBRE RESPONSABILIDADE
CIVIL.
1.1 BREVE HISTÓRICO ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVI L
A Responsabilidade Civil, de acordo com a teoria clássica,
está fundamentada em três fatores: o dano, a culpa e o nexo causal entre o dano
e a culpa.13
Entretanto, na época em que vigia a Lei de Talião, “olho por
olho e dente por dente”, não se cogitava a possibilidade de um terceiro intervir na
relação entre as pessoas, visto que imperava a vingança privada imediata.14
Assim discorre Carlos Roberto Gonçalves15:
“Nos primórdios da humanidade, entretanto, não se cogitava do fator culpa, o dano provocava a reação imediata, instintiva e brutal do ofendido. Não havida regras, nem limitações. Não imperava, ainda, o direito. Dominava, então, a vingança privada, forma primitiva, selvagem talvez, mas humana, da reação espontânea e natural contra o sofrido; solução comum a todos os povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal”
Com o decorrer do tempo, a lei de Talião começou a perder
força, tendo em vista que a vítima percebeu ser mais vantajoso a troca do
cumprimento da pena de forma brutal por pagamento de prestação pecuniária,
iniciando o período da composição.
Nesse sentido, leciona Pablo Stolze Gagliano16:
13 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 8 ed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. 04. 14 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 04. 15 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 04. 16 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. V.III. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 11.
19
“Há, porém, ainda na própria lei mencionada, perspectivas da evolução do instituo, ao conceber a possibilidade de composição entre a vítima e o ofensor, evitando-se a aplicação da pena de Talião. Assim, em vez de impor que o autor de um dano a um membro do corpo sofra a mesma quebra, por força de uma solução transacional, a vítima receberia, a seu critério e a título de poena, uma importância em dinheiro ou outros bens”
Conforme se colhe da história, segundo Carlos Roberto
Gonçalves17, tempos depois, já com a existência de uma autoridade soberana,
esta tolhe o direito da vítima de fazer justiça com as próprias mãos, torna
obrigatória a composição econômica e impõe tarifações, em que encontra
fundamento na Lei das XII Tábuas, Código de Ur-Nammu e Código de Manu,
porém ainda não se cogitava a culpa.
Somente com os romanos houve a distinção entre pena e
reparação, com a distinção dos delitos públicos e privados, sendo que os delitos
públicos eram pagos para o Estado e os delitos privados às vítimas.
Os fundamentos norteadores da reparação do dano surgem
da Lei Aquília, visto que continha elementos caracterizadores da culpa com
relação à injúria.
Mais adiante, no direito francês foi estabelecido um princípio
geral da responsabilidade civil, tornando desnecessária a enumeração de casos
de composição obrigatória, bem como vários outros princípios que influenciaram
em outros povos.
A constatação da responsabilidade civil fundamentada na
culpa do agente, in abstracto e a distinção da culpa delitual e culpa contratual,
aparece na redação dos arts. 1382 e 1383 do Código de Napoleão. Carlos Alberto
Gonçalves18 assim discorre: “A responsabilidade civil se funda na culpa – foi a
definição que partiu daí para inserir-se na legislação de todo o mundo”
17 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 04-09. 18 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 06.
20
Assim destaca Pablo Stolze Gagliano19:
“(...), observe-se que a inserção da culpa como elemento básico da responsabilidade civil aquiliana – contra o objetivismo excessivo do direito primitivo, abstraindo a concepção de pena para substituí-la, paulatinamente, pela idéia de reparação do dano sofrido – foi incorporada no grande monumento legislativo da idade moderna, a saber, o Código Civil de Napoleão, que influenciou diversas legislações do mundo, inclusive o Código Civil Brasileiro de 1916”
Devido ao desenvolvimento industrial, surgiram outras
teorias, sendo uma das mais importantes a chamada teoria do risco, eis que
supriu as hipóteses que a teoria da culpa não incidia. Carlos Alberto Gonçalves
diz: “A responsabilidade seria encarada sob o aspecto objetivo: o operário, vítima
de acidente do trabalho, tem sempre direito a indenização, haja ou não culpa do
patrão ou do acidentado”20
Porém, a teoria do risco criado não substituiu a teoria da
culpa, vez que as duas teorias são aplicas e foram adotadas, recentemente, pelo
novo Código Civil Brasileiro.
Sobre o assunto, descreve Alvino Lima, apud Pablo Stolze
Gagliano21:
O momento inovador se levanta contra a obra secular; a luta se desencadeia tenazmente e sem tréguas. Ripert proclama Saleilles e Josserand os ‘síndicos da massa falida da culpa’, e, a despeito das afirmações de que a teoria do risco desfaleceu no ardor de seu ataque, seus defensores persistem na tarefa, e as necessidades econômicas e sociais da vida moderna intensa obrigam legislador a abrir brechas na concepção da teoria clássica da responsabilidade.
Ambas, porém continuarão a substituir, como forças paralelas, convergindo para um mesmo fim, sem que jamais, talvez, se
19 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p. 12. 20 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 06. 21GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p. 13.
21
possam exterminar ou se confundir, fundamentando, neste ou naquele caso, a imperiosa necessidade de ressarcir o dano, na proteção dos direitos lesados.
No art. 186 do Código Civil, encontra-se presente a
Responsabilidade Civil fundamentada na culpa, definindo o ato ilícito. (“art. 186.
Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar
direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito”).
Entretanto, art. 927, parágrafo único do mesmo diploma
legal prevê as possibilidade de aplicação da Responsabilidade Civil Objetiva,
pregada pela teoria do risco, conforme se transcreve:
Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza risco para os direitos de outrem
Diante disso, percebe-se claramente, que o atual Código
Civil adota os dois tipos de responsabilidade civil.
1.2 CONCEITO E ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
O entendimento de Responsabilidade como nos ensina o
Mestre Rui Stoco22, pode ser extraído “da própria origem da palavra que vem do
latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe
de responsabilizar alguém por seus atos danosos.”
Savatier apud Silvio Rodrigues23 conceitua que
Responsabilidade Civil é “a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o
prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que
dela dependam”.
22 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil . 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2001. p.89 23 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil – Responsabilidade civil . v.4., 18 ed. rev. São Paulo:
Saraiva, 2002. p.6.
22
Para Cavalieri Filho24 trata-se de “um dever jurídico
sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever
jurídico originário”.
Maria Helena Diniz25 entende que:
“[...] Responsabilidade Civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal”.
Caio Mário Pereira da Silva26, entende que
“Responsabilidade Civil consiste na efetivação da reparabilidade abstrata do dano
em relação a um sujeito passivo da relação jurídica que se forma”.
Com fulcro nos conceitos apresentados, entende-se que
responsabilidade civil é uma obrigação jurídica de reparação ou indenização de
dano ou lesão de direito, seja no âmbito patrimonial ou extrapatrimonial, causado
em virtude da culpa ou do dolo por parte do agente, seja por fato próprio, ou por
coisas ou terceiros em sua dependência ou ainda por imposição legal, de forma
ilícita, a outrem.
Entretanto, da leitura do art. 186 do Código Civil, se extrai os
elementos caracterizadores da Responsabilidade Civil Aquiliana, ou seja,
fundamentada na culpa, que segundo Carlos Roberto Gonçalves27 que afirma que
a partir da leitura do artigo supracitado, logo tem-se a idéia de que quatro são os
elementos essenciais da Responsabilidade Civil. Assim ele os enumera: 1. Ação
ou omissão; 2. Culpa ou Dolo do agente; 3. relação de causalidade e 4. o dano
experimentado pela vítima.
24 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 2.ed. São Paulo: Malheiros,
2002. p. 22. 25 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Responsabilidad e Civil . São Paulo:
Saraiva: 1999, v.7, 13 ed., p.36. 26 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil . Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.11. 27 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.31.
23
Comprovada a existência desses requisitos, surge um
vínculo jurídico por força do qual o prejudicado assume a posição de credor e o
ofensor, a de devedor.
Ação ou omissão do agente. Segundo Silvio Rodrigues28, A
conduta causadora do dano pode ser uma ação (ato positivo) ou uma omissão
(ausência de ato) que advém de uma conduta própria do agente, ou seja, se o
agente fere a vítima, deve indenizá-la. Ressalva ainda:
O ato do agente causador do dano impõe-lhe o dever de reparar não só quando há, de sua parte, infringência a um dever legal, portanto ato praticado contra direito, como também quando seu ato, embora sem infringir a lei, foge da finalidade social a que ela se destina
Também, há a responsabilidade por ato de ação ou omissão
de terceiros que estão sob sua sujeição, na qual os pais, tutores, curadores,
patrões, respondem por atos dos filhos, tutelados, curatelados e empregados.
Esta espécie de responsabilidade só ocorre nas hipóteses previstas em lei.
E, por fim, pode ocorrer a responsabilidade por danos
causados por animais ou coisas sob a guarda do agente. Assim, se partes de
uma construção caem na rua causando dano a outrem o dono da obra deve
indenizar a vítima.
Culpa ou dolo do agente. Da análise do art. 186 do Código
Civil, pode-se facilmente constatar a presença desses requisitos, sendo o dolo na
ação ou omissão voluntária e a culpa quando se refere a “negligência ou
imprudência”.
Carlos Roberto Gonçalves29 ensina que “para obter a
reparação do dano, a vítima geralmente tem de provar dolo ou culpa strictu sensu
do agente”. Pois, como o mesmo menciona, nosso diploma civil adotou a teoria
subjetiva.
28 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil . p. 14 e 15. 29 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.32.
24
A responsabilidade civil subjetiva exige a presença da culpa
ou do dolo para caracterizar o dever de indenizar. Dolo é a vontade consciente,
ou seja, o agente age com a intenção de prejudicar; já a culpa é a negligência,
imprudência ou imperícia, ou seja, não há um propósito de causar o dano, este é
conseqüência da negligência do agente.
Relação de causalidade. Entende Silvio Rodrigues30 que a
relação de causa e efeito existente entre a conduta do agente e o dano sofrido
pela vítima. Assim, o dano só gera responsabilidade quando é possível
estabelecer um nexo causal entre ele e o seu autor, gerando o dever de indenizar,
entretanto, deve-se observar as possíveis causas de excludentes de
responsabilidade civil, pois se o autor não teve culpa, a este não cabe o dever de
indenizar.
Dano experimentado pela vítima. É composto por dois
elementos: um material e outro formal.
Segundo Fischer, apud MONTENEGRO31:
Em linguagem vulgar, entende-se o por dano todo prejuízo que alguém sofra na sua alma, corpo ou bem, quaisquer que sejam o autor e a causa da lesão. Em linguagem jurídica, dano é todo prejuízo que o sujeito de direito sofre através da violação dos seus bens jurídicos.
Para que o dano dê ensejo à responsabilidade civil, é
imprescindível a presença dos dois elementos: o prejuízo e a lesão a um
interesse juridicamente tutelado.
1.3 ESPÉCIES E FORMAS DE RESPONSABILIDADE CIVIL
A Responsabilidade Civil poderá se apresentar de algumas
espécies, entre elas a contratual e extracontratual e duas formas, subjetiva e
objetiva, como se passa a expor.
30 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil . p.17. 31 MONTENEGRO, Antonio Lindbergh C. Ressarcimento de Danos . 6 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1999. p. 07.
25
1.3.1 Responsabilidade Civil Contratual
Deve existir uma distinção entre Responsabilidade Civil
Contratual e Extracontratual; segundo Rogério Marrone de Castro Sampaio32 a
Contratual é a que decorre do descumprimento ou inadimplemento contratual,
causando prejuízo aos outros contratantes, estabelecendo o artigo 399 do Código
Civil: “Não cumprindo a obrigação ou deixando de cumpri-la pelo modo e tempo
devido, responde o devedor por perdas e danos”.
Compreende-se na Responsabilidade Civil Contratual, antes
de existir a obrigação de indenizar, o que existe é um vinculo jurídico entre o
inadimplente e o seu contratante, vínculo este derivado da convenção.
Nesse sentido exemplifica Carlos Roberto Gonçalves33:
uma pessoa pode causar prejuízo a outrem por descumprir uma obrigação contratual. Por exemplo: quem toma um ônibus tacitamente celebra um contrato, chamado contrato de adesão, com empresa de transporte. Esta, implicitamente, assume a obrigação de conduzir o passageiro ao seu destino, são e salvo, se, no trajeto, ocorre um acidente e o passageiro fica ferido, dá-se o inadimplemento contratual, que acarreta a responsabilidade de indenizar as perdas e danos, nos termos do art. 389 do Código Civil. Acontece o mesmo quando o comodatário não devolve a coisa emprestada porque, por sua culpa, ela pereceu. Com o ator, que não comparece para dar o espetáculo contratado. Enfim, com todas as espécies de contratos não adimplidos.
Na Responsabilidade Civil Contratual ou Extracontratual,
vários pressupostos são comuns.
Desta forma, explica Carlos Roberto Gonçalves34 a distinção
entre a Responsabilidade Civil Contratual da Extracontratual, sendo que o Código
Civil distinguiu as duas de maneira genérica, fixando os arts. 186 a 188 e 927 e
32 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil . 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 24. 33 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.25 34 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.26
26
seguintes para a Extracontratual e nos arts. 395 e seguintes e 389 e seguintes a
contratual.
Assevera ainda que:
É certo, porém, que nos dispositivos em que trata genericamente dos atos ilícitos, da obrigação de indenizar e da indenização (art. 186 a 188, 927 e s. e 944 e s.) o Código não regulou a responsabilidade proveniente do inadimplemento da obrigação, da prestação com defeito ou da mora no cumprimento das obrigações provenientes dos contratos (que se encontra no capítulo referente aos efeitos das obrigações).
Entretanto, conclui o mesmo autor que, embora essa
dualidade de tratamento dos aspectos jurídicos da responsabilidade civil, não se
deve traçar muitos duelos, eis que seus efeitos serão uniformes.
Na Responsabilidade Civil Contratual a indenização, em
muitos casos, quando possível é avaliada pela prestação não cumprida,
abrangendo o prejuízo efetivo e também o proveito que o contratante poderia ter
tido.
No que se refere ao ônus da prova, entende Pablo Stolze
Gagliano35, que na Responsabilidade Civil Contratual não será necessário o
contratante que cumpriu com sua parte na avença provar a culpa do inadimplente,
tendo em vista que, de regra, a culpa é presumida, bastando à vítima, somente,
demonstrar o fato do inadimplemento. O contratante é que deverá provar não ter
agido com culpa em sentido lato. Ou seja, o contratante inadimplente é que fica
com o ônus de provar as excludentes da responsabilidade civil.
1.3.2 Responsabilidade Civil Extracontratual
A Responsabilidade Extracontratual é também chamada de
aquiliana. Segundo Silvio Rodrigues36, deriva da existência de um fato lesivo à
esfera jurídica de outrem, o ato pode ser cometido por pessoa capaz ou incapaz,
35 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p. 20. 36 RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. p.08 e 09.
27
não pressupondo qualquer avença anterior entre ofensor e ofendido. Aplica-se, no
caso, os arts. 186 e 927 do Código Civil:
"Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência, ou imprudência, violar direito, e causar prejuízo a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito."
"Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo."
Por conseguinte, responsabilidade aquiliana é resultado da
prática de um ato ilícito por pessoa capaz ou incapaz, visto que não há vínculo
anterior entre as partes, por não estarem ligadas por uma relação obrigacional ou
contratual. A fonte dessa responsabilidade é a inobservância da lei, ou melhor, é
a lesão a um direito.
Para Rogério Marrone de Castro Sampaio37 a
Responsabilidade Civil Extracontratual é assim definida:
“No tocante à responsabilidade extracontratual ou aquiliana, o dever de indenizar os danos causados decorre da prática de um ato ilícito propriamente dito (ilícito extracontratual), que se consubstancia em uma conduta humana positiva ou negativa violadora de um dever de cuidado (culpa em sentido lato). Encontra previsão legal no art. 186 do Código Civil (art. 159 do CC/1916). Em outras palavras, a obrigação de reparar o dano não está relacionada à existência anterior de um contrato e ao descumprimento culposo de uma obrigação por ele gerada. Origina-se, outrossim, de um comportamento (genericamente tratado pelo ordenamento jurídico no referido art. 186 do CC) socialmente reprovável. Cita-se como exemplo a hipótese do indivíduo que, dirigindo imprudentemente seu veículo, atropela um pedestre, causando-lhe lesões corporais.”
No tocante ao ônus da prova na Responsabilidade Civil
Aquiliana, Rogério Marrone de Castro Sampaio38 entende que esta cabe á vítima,
visto que é ela quem deve provar a culpa do agente. Caso não consiga, tal prova
ficará sem ressarcimento.
37 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil . p. 24 38 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil . p. 25
28
Carlos Roberto Gonçalves39 pactua sobre o mesmo
entendimento no que diz respeito do ônus da prova na responsabilidade civil
extracontratual: “(...) o autor da ação é que fica com o ônus de provar o fato se
deu por culpa do agente (...)”.
Importante ressaltar é a questão da capacidade do agente
que pratica um ato ilícito, conforme Carlos Roberto Gonçalves40, o incapaz pode
ser responsabilizado civilmente nessa modalidade de responsabilidade civil, haja
vista a previsão legal do art. 928 do Código Civil, que responsabiliza os incapazes
em geral pelos prejuízos que causarem, todas as vezes que as pessoas por eles
responsáveis não tenham a obrigação de fazê-lo, ou não disponham de meios
suficientes.
Silvio Rodrigues41 segue o mesmo entendimento:
“Em matéria de capacidade também diversas são as posições. Assim, o menor púbere só se vincula contratualmente assistido por seu representante legal e, excepcionalmente sem ele, se maliciosamente declarou-se maior (CC, art. 180); portanto, só pode ser responsabilizado por seu inadimplemento nesses casos; na responsabilidade aquiliana, entretanto, cumpre-lhe reparar o prejuízo sempre, pois se equipara ao maior quanto às obrigações resultantes de atos ilícitos em que for culpado (CC de 1916, art. 156)”.
Como podemos compreender do entendimento supra citado,
quando um menor figura como autor de ato ilícito causador de um dano, este é
equiparado ao maior e tem o dever de reparar os prejuízos.
1.3.3 Responsabilidade Civil Subjetiva
A responsabilidade civil subjetiva, conforme leciona Silvio
Rodrigues42, não se trata de espécie, mas sim, de maneira de encarar o dano,
aduz ainda, que a responsabilidade é subjetiva quando inspirada na idéia de
culpa, sendo a prova do agente causador do dano indispensável.
39 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.28 40 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.28 41 RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. p.10. 42 RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. p.11.
29
Carlos Roberto Gonçalves43 assevera que, desde a teoria
clássica, se tinha a culpa como fundamento da responsabilidade, também
chamada de teoria subjetiva.
A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto
necessário do dano indenizável, sendo assim a responsabilidade do causador do
dano se configura, somente se o agente agiu com dolo ou culpa.
Afirmou, ainda, que o Código Civil adotou a teoria subjetiva,
conforme se verifica no art. 186, elegendo o dolo e a culpa como fundamentos
para a obrigação de reparar o dano.
A Responsabilidade Subjetiva é atualmente erigida como
regra necessária, porém sem prejuízo da adoção da Responsabilidade Objetiva,
tendo em vista a previsão desta última em vários artigos no Código Civil.
No mesmo sentido, Caio Mário da Silva Pereira44 declara:
“A essência da responsabilidade subjetiva vai assentar, fundamentalmente, na pesquisa ou indagação de como o comportamento contribui para o prejuízo sofrido pela vítima. Assim procedendo, não considera apto a gerar o efeito ressarcitório um fato humano qualquer. Somente será gerador daquele efeito uma determinada conduta, que a ordem jurídica reveste de certos requisitos ou de certas características. Assim considerando, a teoria da responsabilidade subjetiva erige em pressuposto da obrigação de indenizar, ou de reparar o dano, o comportamento culposo do agente, ou simplesmente a sua culpa, abrangendo no seu contexto a culpa propriamente dita e o dolo do agente.”
Diante de tais entendimentos, verificou-se que é majoritária
a opinião entre os doutrinadores, sobre a Responsabilidade Civil Subjetiva no
tocante o seu fundamento na culpa em sentido amplo, sendo necessária a
caracterização do dolo ou culpa do agente causador para que o dano possa ser
indenizável e, por fim, que nos tempos atuais o Código Civil adotou a
Responsabilidade Civil Subjetiva como regra, entretanto há dispositivos que fixam
43 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24. 44 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil . p. 29-30.
30
a responsabilização do agente sem a verificação de sua culpa, ou seja a
Responsabilidade Civil Objetiva.
1.3.4 Responsabilidade Civil Objetiva
A Responsabilidade Civil Objetiva, de acordo com Carlos
Roberto Gonçalves45, é possível a responsabilizar um agente causador de um
dano, independentemente de sua culpa, desde que previsto por lei. Quando isso
ocorre, acontece a responsabilidade legal ou objetiva, visto que prescinde da
culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade.
Esta responsabilidade, segundo o mesmo autor46, em alguns
casos é presumida pela lei, sendo que em outros, é de todo prescindível, tendo
em vista que a responsabilidade se funda no risco. Sendo presumida, inverte-se o
ônus da prova, restando ao autor da ação provar somente a ação ou omissão, eis
que a culpa, nesse caso, é presumida. Entretanto, é facultado ao réu a
oportunidade de apresentar provas que excluem a sua culpa, invertendo-se o
ônus da prova.
Fixa ainda que, com relação aos casos em que se prescinde
totalmente da prova da culpa, basta somente que haja relação de causalidade
entre a ação e o dano, independentemente de culpa.
Aduz que a teoria do risco é justificada pela
responsabilidade objetiva. Sendo que a teoria do risco é aplicada a toda pessoa
que exerce alguma atividade que cria um risco de dano para terceiros, devendo
ser obrigada a repará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa, ocorrendo
assim o deslocamento da noção de culpa para a idéia de risco, figurado como
teoria do risco proveito, tornando-se mais tarde como risco criado.
Acrescenta47 que, nos primeiros tempos, a responsabilidade
era objetiva, entretanto sem que por isso se fundasse no risco, assim como o
conhecemos atualmente, visto que anteriormente a Responsabilidade Objetiva
45 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24. 46 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24. 47 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24.
31
era baseada na idéia de vingança. Contudo, ultrapassada a essa idéia, surgiu à
pesquisa da culpa do agente causador do dano. Atualmente, ocorre a volta ao
objetivismo, mas não pela idéia de vingança, mas por entender que culpa não é
mais suficiente para regular todos os casos de responsabilidade.
Afirmou48, ainda, o autor, a respeito da Responsabilidade
Objetiva no contexto histórico, que, a partir da segunda metade do século XIX, foi
que a questão da Responsabilidade Civil Objetiva ganhou estrutura, aparecendo
como um sistema autônomo no campo da responsabilidade civil. Na Itália, na
Bélgica e em outros países apareceram importantes trabalhos. A tese da
responsabilidade objetiva encontrou seu mais propício campo doutrinário de
expansão e de consolidação na França. Entre os autores que mais contribuíram
se destacam Saleilles, Josserand, Ripert, Demoogue, Mazeaud e Mazeaud,
Savatier e outros. Já no Brasil, destacam-se os nomes dos doutrinadores Alvino
Lima, Agostinho Alvim, Aguiar Dias, Orlando Gomes, San Tiago Dantas,
Washington de Barros Monteiro, além de inúmeros juristas de escol, como Clóvis
Beviláqua, Costa Manso, A. Gonçalves de Oliveira, Orozimbo Nonato e outros.
Destaca o referido autor49 que a Responsabilidade Civil
Subjetiva é a regra do código, entretanto a Responsabilidade Civil Objetiva é
adotada em vários dispositivos. Dentre eles, no diploma civil brasileiro, os arts.
936, 937 e 938, que tratam da responsabilidade do dono do animal, do dono do
prédio em ruína e do habitante da casa da qual caírem coisas. E os arts. 929 e
930, que prevêem a responsabilidade por ato lícito (estado de necessidade).
Ainda, os arts. 939 e 940, que disciplinam sobre a responsabilidade do credor que
demanda o devedor antes de vencida a dívida ou por dívidas já pagas; o art. 933,
trata sobre os pais, tutores, curadores e empregadores donos de hotéis e de
escolas respondem, independentemente de culpa, pelos atos danosos de
terceiros; o parágrafo único do art. 927, que dispõe sobre a obrigação de reparar
o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando
a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar; devido sua
natureza, risco pra os direitos de outrem.
48 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24. 49 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24.
32
Ainda, em diversas leis esparsas, a tese da
Responsabilidade Civil Objetiva foi utilizada, como, por exemplo: Lei n. 6.453/77
(que estabelece a responsabilidade do operador de instalação nuclear), Decreto
legislativo n. 2.681, de 1912 (que regula a responsabilidade civil das estradas de
ferro), Lei n. 6.938/81 (que trata dos danos causados ao meio ambiente), Código
de Defesa do Consumidor entre outras, significando, assim, que a
Responsabilidade Civil Objetiva não substituiu a subjetiva, mas se encontra
circunscrita dentro de seus limites.
Nesse sentido entende Sílvio Rodrigues50 a respeito a
Responsabilidade Civil Objetiva:
“Na responsabilidade objetiva a atitude culposa ou dolosa do agente causador do dano é de menor relevância, pois, desde que exista relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o ato do agente, surge o dever de indenizar, quer tenha este último agido ou não culposamente.
A teoria do risco é a da responsabilidade objetiva. Segundo essa teoria, aquele que, através de sua atividade, cria risco de dano para terceiros deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua atividade e seu comportamento sejam isentos de culpa. Examina-se a situação, e, se for verificada, objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por aquele.”
No mesmo sentido Rogério Marrone de Castro Sampaio51
dispõe:
“Distinção esta da maior importância para o estudo da responsabilidade civil, à medida que a adoção da responsabilidade objetiva é fruto da evolução das relações sociais, voltada a possibilitar àquele que, prejudicado em razão de determinado comportamento humano, possa ver seu dano reparado, restabelecendo-se uma situação de equilíbrio.
(...)
50 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil . p. 11. 51 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil . p.26, 27 e 29
33
A responsabilidade civil objetiva, por sua vez, tem como característica determinante o fato de que o elemento culpa não é essencial para o surgimento do dever de indenizar.
(...)
A responsabilidade objetiva, impulsionada pelo Direito Francês, apenas ganhou corpo a partir do século XIX, quando, efetivamente, estruturada na teoria do risco.
Prevalecendo a idéia de que todo dano, na medida do possível, deve ser indenizado, ganhou espaço no mundo jurídico a tese de que a obrigação de reparar o dano nem sempre está vinculada um comportamento culposo do agente. E, como fator justificador do surgimento da obrigação de indenizar, socorre-se, nesse caso da denominada teoria do risco.
(...)
O estudo da responsabilidade civil passa pela evolução da responsabilidade subjetiva ou clássica, adotada como regra na maioria dos ordenamentos jurídicos, até atingir a responsabilidade objetiva, incidente em hipótese especiais.”
Por fim, destaca sobre a adoção da Responsabilidade Civil
no Código Civil atual:
“Com o advento do novo Código Civil, em 2002, não houve rompimento com a estrutura passada. Foi mantida, como regra, a responsabilidade civil subjetiva, aplicando-se a objetiva a situações especiais”
Aduz, Pablo Stolze Gagliano52, sobre a coexistência da
Responsabilidade Civil Subjetiva com a Objetiva:
“(...) a nova concepção que deve reger a matéria no Brasil é de que vige uma regra geral dual de responsabilidade civil, em que temos a responsabilidade subjetiva, regra geral inquestionável do sistema anterior, coexistindo com a responsabilidade objetiva, especialmente em função da atividade de risco desenvolvida pelo autor do dano (conceito jurídico indeterminado a ser verificado no
52 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.17
34
caso concreto, pela atuação judicial), ex vi do disposto no art. 927, parágrafo único”
Diante de tais entendimentos, verifica-se que é majoritária a
opinião entre os doutrinadores sobre a Responsabilidade Civil Objetiva no sentido
de que, para a caracterização dessa responsabilidade, não se faz necessária a
caracterização da culpa do agente causador do dano e que para ser possível a
exigência é que esteja impreterivelmente previsto na legislação.
1.4 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL
Conforme visto anteriormente, existem pressupostos
ensejadores do dever de reparar o dano sofrido pela vítima, entretanto, há outros
que, se presentes no caso concreto, podendo isentar ou atenuar o causador do
dano do dever de reparar.
Conceitua as causas de excludente de responsabilidade civil
Pablo Stolze Gagliano53:
“Como causas de excludentes de responsabilidade devem ser entendidas todas as circunstâncias que, por atacar um dos elementos ou pressupostos gerais da responsabilidade civil, rompendo o nexo causal, terminam por fulminar qualquer pretensão indenizatória.”
Pablo Stolze Gagliano54 classifica as excludente em, 1)
estado de necessidade; 2) legítima defesa; 3) exercício regular de direito e estrito
cumprimento de um dever legal; 4) caso fortuito e força maior; 5) culpa exclusiva
da vítima; 6) fato de terceiro.
Identificar-se-ão, agora, as excludentes supramencionadas.
1) Estado de necessidade.
53 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.112 54 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.111.
35
O estado de necessidade encontra-se previsto no art. 188, II
e parágrafo único do Código Civil, bem como nos arts. 929 e 930 do mesmo
diploma legal.
Art. 188, II e parágrafo único, assim dispõe:
“Não constituem atos ilícitos:
II – a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.
Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo”
Rogério Marrone de Castro Sampaio55 explica que o estado
de necessidade, conforme acima apresentado, não difere do previsto no Código
Penal. Entretanto, segundo o mesmo autor, o estado de necessidade não
aparece, em geral, como excludente de responsabilidade civil, visto que a
obrigação de indenizar à vítima permanece, salvo se esta não tenha sido a
causadora da situação de perigo. Contudo, cria o direito de regresso ao que agiu
na situação dessa excludente em face do real causador do dano.
Nesse diapasão, Pablo Stolze Gagliano56 exemplifica e
comenta:
“É o caso do sujeito que desvia o seu carro de uma criança, para não atropela-la, e atinge o muro da casa, causando danos materiais. Atuou nesse caso, em estado de necessidade.
Note-se, entretanto, que, se o terceiro atingido não for o causador da situação de perigo, poderá exigir indenização do agente que houvera atuado atuado em estado de necessidade, cabendo a este ação regressiva contra o verdadeiro culpado (o pai do bebê que o deixou sozinho por exemplo) (...)”
55 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil . p.95. 56 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.113
36
Conclui-se, portanto, que o estado de necessidade não
exime o agente de responsabilidade, gerando para ele apenas o direito à ação
regressiva contra o causador do perigo, já que, em oposição ao fato de terceiro,
não descaracteriza o nexo de causalidade, vez que o terceiro apenas provocou o
perigo, sendo o dano efetivamente realizado pelo agente causador do dano
propriamente dito.
2) Legítima defesa.
A legítima defesa encontra-se prevista no art. 188, I do
Código Civil, conforme se transcreve:
“art. 188. Não constituem atos ilícitos:
I – os praticados em legítima defesa ou exercício regular de um
direito;”
Pablo Stolze Gagliano57 explana que, para caracterizar
legítima defesa o indivíduo deve encontrar-se frente a uma situação atual ou
iminente de injusta agressão, sendo para si ou para outrem, que não está
obrigado a suportar. Ressalva-se que, em caso de excesso cometido pelo agente,
atingir direito de um terceiro inocente, esta excludente não se aplica, devendo o
agente indenizar, cabendo, nesse último caso, ação regressiva ao verdadeiro
agressor.
Desta forma, entende Rogério Marrone de Castro
Sampaio58:
“Conclui-se, portanto, que como excludente de responsabilidade civil, tem-se, apenas a legítima defesa real (compreendida a legítima defesa de terceira pessoa) e praticada contra a pessoa do agressor, causando-lhe danos. Isto quer dizer que, se por erro ou engano, terceira pessoa também for atingida, persistirá, diante dela, o dever de repara o dano. O mesmo cuidado se deve tomar com a legítima defesa putativa (derivada de erro sobre a
57 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.114 – 116. 58 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil . p.96.
37
circunstâncias de fato). Nesse caso, tal comportamento mantém o caráter ilícito, à medida que tal putatividade não surge como excludente de ilicitude, mas de culpabilidade.”
Desta feita, ocorre a excludente em comento somente
quando presentes os pressupostos da legítima defesa.
Ressalva-se que, recaindo o dano sobre pessoa diversa da
que provocar a agressão ou ameaça, não se pode conceber a presente causa de
exclusão de responsabilidade, neste caso há possibilidade de direito de regresso,
quanto à legítima defesa putativa, na qual a reação é suposta, já que não há
agressão ou ameaça concreta não exclui a responsabilidade de indenizar.
3) Exercício regular de direito e estrito cumprimento de um
dever legal.
Essas excludentes de responsabilidade têm por esteio,
segundo Pablo Stolze Gagliano59, a idéia de dar segurança aos que estão
incumbido de um direito ou no cumprimento de um dever legal, entretanto, não
são tolerados excessos torna o ato ilícito, o que descaracteriza as excludentes,
devendo os agentes reparar o dano causado, visto que, ocorrendo excesso,
ocorre o abuso de direito disciplinado no art. 187 do Código Civil.
Sobre o assunto discorre Rogério Marrone de Castro
Sampaio60:
“Destaca-se apenas porque maior a incidência prática que os danos causados por agentes no desempenho de serviço público, ainda que por delegação, mesmo que no estrito cumprimento do dever legal, são indenizáveis pelo Estado ou pelas pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público.”
Diante de tais entendimentos, observa-se que, para a
configuração de tais excludentes, a conduta do agente deve ser moderada.
59 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.117 – 121. 60 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil . p.97.
38
Assim, havendo excessos no exercício do direito ou no cumprimento do dever
legal, o ato será ilícito, surgindo o dever de indenizar.
4) Caso fortuito e força maior.
Essas excludentes de Responsabilidade Civil encontram-se
previstas no art. 393 do Código Civil, que assim dispõe:
“O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizados.
Parágrafo único. O caso fortuito ou força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”
Essas excludentes são de grande relevância, tendo em vista
a grande incidência na prática. As duas não consistem em acontecimentos alheio
à vontade do agente, sendo que os próprios acontecimentos são responsáveis
pelo dano causado, excluindo a responsabilidade do agente.
Haja vista a semelhança entre caso fortuito e força maior,
essas possuem características diferenciadas.
Maria Helena Diniz61 distingue força maior de caso fortuito,
sendo que a força maior é oriunda de fatos da natureza, que impede o
cumprimento de uma obrigação e por conseqüência ocasiona prejuízos a uma
das partes. Já no caso fortuito, são prejuízos causados por causas desconhecidas
ou por fato de terceiros.
Nesse sentido, Silvio Rodrigues62 apresenta a seguinte
distinção entre o caso fortuito e força maior:
“(...) se nos adstringimos apenas ao campo da responsabilidade aquiliana, poderíamos afirmar que o caso fortuito ou força representa uma causalidade entre o ato do agente e o dano experimentado pela vítima. Assim, por exemplo, se forte temporal faz com que o isolador se desprenda e a vítima, que esbarra no fio
61 DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p. 105. 62 RODRIGUE, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil . p.174 e 175.
39
elétrico, venha a ser eletrocutada, não se pode inculpar ninguém, e, por conseguinte, não têm os seus herdeiros ação de ressarcimento, visto que o fato derivou de caso fortuito.
(...)
A excludente de força maior é a mais importante de quantas haja, justamente por tirar a relação de causa e efeito entre o ato do agente, que diretamente provocou o prejuízo, e o dano experimentado pela vítima.”
Já, Rogério Marrone de Castro Sampaio63 assevera que, se
a responsabilidade for de natureza contratual, fundamentada na culpa,
comprovada o caso fortuito para exonerar o devedor. Entretanto, se a obrigação
for fundamentada na teoria do risco, somente a força maior poderá exonerá-lo da
obrigação.
Portanto, denota-se que a isenção de responsabilidade
pelos danos causados por caso fortuito e força maior tem por esteio o fato de que,
se a obrigação de ressarcimento dá-se em decorrência de acontecimento que
escapa ao poder do agente, haja vista sua gênese em um fator estranho, a
conseqüência lógica é o afastamento da reparação dos danos.
5) Culpa exclusiva da vítima.
No caso de culpa exclusiva da vítima, exclui-se qualquer
responsabilidade do causador do dano. A vítima deverá arcar com todos os
prejuízos, pois o agente que causou o dano é apenas um instrumento do
acidente, não se podendo falar em nexo causal entre sua ação e a lesão.
Pablo Stolze Gagliano64 assim define e exemplifica a culpa
exclusiva da vítima:
“A exclusiva atuação culposa da vítima tem também o condão de quebrar o nexo de causalidade, eximindo o agente da responsabilidade civil.
63 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil . p.93. 64 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.126.
40
Imagine a hipótese do sujeito que, guiando o seu veívulo seguindo as regras de trânsito, depara-se com alguém que, visando suicidar-se, arremessa-se sob as suas rodas. Nesse caso, o evento fatídico, obviamente, não poderá ser atribuído ao motorista (agente), mas sim, e tão somente ao suicida (vítima).”
Entretanto, levanta Rogério Marrone de Castro Sampaio65 a
possibilidade da culpa concorrente, que é quando o agente e a vítima possuem
suas parcelas de culpa no resultado, nesse caso não ocorre a quebra total do
nexo de causalidade, apenas seus enfraquecimento, ocorrendo a compensação
de reparação de acordo com o grau da culpa das partes.
Desta forma, entende Maria Helena Diniz66:
“(...) se a vítima e o ofensor causaram culposa e conjuntamente o mesmo dano, caso em que se terá compensação de reparações. As suas responsabilidades se neutralizam e se compensam se as suas partes estiverem em posição igual, logo, não haverá qualquer indenização por perdas e danos. Entretanto se estiverem em situação desigual, por haver gradatividade na culpa de cada um, ter-se-á uma condenação das perdas e danos proporcional à medida da culpa que lhe for imputável.”
6) Fato de terceiro.
Como o próprio nome já infere, essa excludente ocorrerá
quando o dano causado for ocasionado por um terceiro, quebrando assim o nexo
de causalidade, e, em conseqüência isentando o agente de reparar o dano.
Nesse contexto, Maria Helena Diniz67 define fato de terceiro:
Por culpa de terceiro, isto é, de qualquer pessoa além da vítima ou do agente, de modo que, se alguém for demandado para indenizar um prejuízo que lhe foi imputado pelo autor, poderá pedir a exclusão de sua responsabilidade se a ação que provocou o dano foi devida exclusivamente a terceiro.
65 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil . p.90. 66 DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p.104. 67.DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p.104
41
Mais a diante destaca:
Para que ocorra a força exoneratória do fato de terceiro, será imprescindível: 1) um nexo de causalidade, isto é, que o dano se ligue ao fato de terceiro por uma relação de causa e efeito (RJTJSP, 21:50); logo não poderá haver liame causam entre o aparente responsável e o prejuízo causado à vítima; 2) que o fato de terceiro não haja sido provocado pelo ofensor, pois a responsabilidade do ofensor será mantida se ele concorrer com a do terceiro, salvo se o ofensor provar que houve culpa exclusiva de terceiro (RJTJSP, 40:50; RT, 429:260, 523:101, 437:240; Súmula 187 do STF); 3) que o fato de terceiro seja ilícito; 4) que o acontecimento seja normalmente imprevisível e inevitável, embora não seja necessária a prova de sua absoluta irresistibilidade e imprevisibilidade.
Entretanto, segundo Pablo Stolze Gagliano68, não é pacífico
esse entendimento, tendo em vista a súmula 187 do Supremo Tribunal Federal,
que trata da responsabilidade contratual do transportador, pela qual, no acidente
com o passageiro, não é ilidida por culpa de terceiro, devendo indenizar a vítima,
desencadeando somente o direito de regresso.
Nesse diapasão, discorre Rogério Marrone de Castro Sampaio69:
Já na esfera da responsabilidade civil contratual, o interesse do tema acentua-se nos casos de responsabilidade do transportador. Como já visto, adotada que foi a responsabilidade civil objetiva, tem-se como regra que a culpa de terceiro não exonera o transportador pelos danos causados ao passageiro transportado.
Portanto, conforme se vislumbra dos entendimentos supra
citados, o fato de terceiro se caracteriza como causa de escusa do dever de
reparar o dano sofrido pela vítima quando, para o advento desse, não sobrevier o
menor resquício de culpa por parte de agente ou daquele que sofrer o prejuízo
imposto pelo fato danoso, sendo, assim, imprevisível e inevitável para ambas as
partes. Pode-se por outro lado, ser imputada ao terceiro interveniente a
68 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.128 – 130. 69 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil . p.91.
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responsabilidade pelo evento danoso, ressalvado os casos de responsabilidade
objetiva.
Visto as breves considerações a respeito da
Responsabilidade Civil, no próximo capítulo, abordar-se-á as espécies de
Contratos de Transporte e suas relações internacionais.
CAPÍTULO 2
CONSIDERAÇÕES SOBRE OS CONTRATOS DE TRANSPORTE E SUAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
2.1 CONCEITO DE CONTRATO DE TRANSPORTE
O Contrato de Transporte é de grande importância, visto que
através dele o transportador se obriga a transportar as mercadorias ou pessoas,
de maneira adequada e responsável.
Roberto Senise Lisboa70 conceitua contrato de transporte
como “o contrato por meio do qual uma pessoa física ou jurídica (transportadora)
se obriga a conduzir pessoas ou coisas para determinado destino, mediante o
pagamento respectivo do interessado”.
Maria Helena Diniz71 conceitua o Contrato de Transporte:
[...] é aquele em que uma pessoa ou empresa se obriga, mediante retribuição, a transportar, de um local para outro, pessoas ou coisas animadas ou inanimadas (CC, art. 730). A empresa de transporte, pessoa física ou jurídica, está apta à oferta e à prestação de serviços de deslocamento de pessoas e de mercadorias por via terrestre, aquaviária, ferroviária e aérea, mediante contratos celebrados com os respectivos usuários, revestindo-se para tanto de forma empresarial, quer em nome individual, quer em nome coletivo, e assumindo os riscos decorrentes desse empreendimento.
Quanto à classificação, Orlando Gomes72 considera que “o
contrato de transporte é bilateral, simplesmente consensual e oneroso”. Aduz
ainda o mesmo autor, que dele nascem obrigações para as duas partes, sendo a
70 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: contratos e declarações un ilaterais: teoria geral e espécies. v.III. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005 p. 508. 71 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. v. III, 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 417. 72 GOMES, Orlando. Contratos . 24 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 306.
44
de prestar serviço aquela contraída pelo transportador e a de pagar, a ajustada
pelo contratante.
Silvio Venosa73 entende que o “contrato de transporte é o
negócio pelo qual um sujeito se obriga, mediante remuneração, a entregar coisa
em outro local ou a percorrer um itinerário para uma pessoa”.
No entanto, ressalva ainda o mesmo autor, que se deve
distinguir o contrato de transporte propriamente dito, em que como o objetivo
principal do seu ato negocial é o translado de uma coisa ou pessoa, da relação de
transporte acessória de outro negócio. Entretanto, quando o transporte de
pessoas ou coisas figurar como assessório, por exemplo, em um contrato de
compra e venda, em que o vendedor se obriga a entregar a coisa, este não se
qualifica como transportador, não se submetendo, portanto, a seus riscos
específicos, restando a ele as normas que se aplicam à compra e venda.
Contudo, como se pode perceber dos entendimentos
anteriormente expostos, o Contrato de Transporte é consensual, bilateral, tem por
objetivo principal o transporte de pessoas ou coisas.
2.2 ESPÉCIES DE CONTRATOS DE TRANSPORTE
O Contrato de Transporte, segundo Silvio Venosa74, divide-
se em transporte de pessoas e coisas. Tem conceito unitário e se diferencia de
acordo com a natureza do objeto, já que sua finalidade é o deslocamento de um
local para outro.
Ressalta ainda o mesmo autor que o transportador deverá
propiciar todas as condições para que a pessoa ou a coisa transportada tenha
totais condições de transporte e não chegue danificada.
73 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies . v. III, 4 ed. São Paulo: Atas, 2004. p. 490. 74 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies . p. 495.
45
Já Maria Helena Diniz75 vai além da classificação das
espécies de Contratos de Transporte de Pessoa e Contrato de Transporte de
Coisas. Leva em conta o meio empregado, subdividindo em: a) Transporte
terrestre, que sofre uma nova subdivisão em função de veículo utilizado -
ferroviário e rodoviário, ou em função da extensão coberta, - urbano,
intermunicipal, interestadual e internacional; b) Transporte aquaviário, marítimo ou
fluvial e c) Transporte aéreo.
Portanto, verifica-se de maneira clara que as espécies de
Contratos de Transporte, hoje, são o de pessoas ou de coisas, adotando-se
regras específicas, como será visto a seguir.
2.2.1 Contrato de Transporte de Pessoas
O Contrato de Transporte de Pessoas é regulado pelo
Código Civil nos artigos 734 usque 742.
Maria Helena Diniz76 define: “o contrato de transporte de
pessoas é aquele em que o transportador se obriga a remover uma pessoa e sua
bagagem de um local para outro, mediante remuneração”.
Já Roberto Senise Lisboa77 entende que: “Transporte de
pessoas é aquele que decorre da condução de passageiros, acompanhados ou
não de bagagem, com bilhete expedido pelo transportador ou terceiro por ele
autorizado”.
Já Silvio de Salvo Venosa78 ensina no sentido de que:
A regra geral é no sentido de que o transporte de pessoas é um serviço público, um direito constitucional do indivíduo em se locomover. Nesse sentido, o transportador não poderá recusar passageiro, salvo, é evidente, a hipótese descrita acima, os casos
75 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. p. 418 - 420. 76 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. p.435. 77 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: contratos e declarações un ilaterais: teoria geral e espécies. p. 509. 78 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies . p.501.
46
previstos nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou de saúde do interessado o justifiquem (art. 739).
Diante de tais entendimentos, percebe-se que o majoritário é
que o Contrato de Transporte de Pessoas tem como pressuposto, além do
transporte de seres humanos, também de suas bagagens. Porém ressalta Maria
Helena Diniz79 que não caracteriza Contrato de Transporte de Pessoas o
realizado gratuitamente, por amizade ou cortesia, desde que esse favor não
venha beneficiar, mesmo que indiretamente, o Transportador.
Segue esse entendimento Silvio de Salvo Venosa80:
Somente deve ser considerado transporte gratuito aquele totalmente desinteressado, sem direito algum à retribuição pecuniária. É o transporte benévolo ou amistoso, que se funda na amizade ou cortesia e não decorre de dever ou obrigação. Não é gratuito, pois se apresenta agregado a outro contrato oneroso ou como acessório de uma prestação de serviços.
Maria Helena Diniz81 aduz que o Contrato de Transporte de
Pessoas pode ser subdividido em três modalidades, ou seja, terrestre, marítimo e
aéreo, que serão regidos por normas especiais por força de regulamentos que se
subordinam, porém apresenta semelhanças no que concerne aos requisitos
essenciais da formação dos contratos.
Vale ressaltar, segundo a mesma autora, que na modalidade
do Contrato de Transporte de Pessoas, são contraentes de obrigação ambas as
partes: o transportador se obriga a transportar e o passageiro se propõe a ser
transportado, mediante remuneração. No entanto, outra característica importante
reside na capacidade das partes. No contrato de transporte de pessoas, pode
figurar como transportado o incapaz, ressalvado quando obrigatório o
acompanhamento de uma pessoa maior responsável pelo incapaz, ou quando
necessária autorização judicial.
79 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. p. 435 e 436. 80 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies . p. 501. 81 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. p. 436 e 437.
47
Conforme Caio Mário da Silva Pereira82, inovou o novo
Código Civil de 2002 ao responsabilizar o transportador, mesmo quando atribuído
a fato de terceiro, restando somente admitida a excludente de responsabilidade
civil quando causada por força maior, fixado no art. 735.
Nesse sentido, manifesta-se Carlos Roberto Gonçalves83:
Ocorrendo um acidente de transporte, não pode o transportador, assim, pretender eximir-se da obrigação de indenizar o passageiro, após haver descumprido a obrigação de resultado tacitamente assumida, atribuindo culpa ao terceiro (p. ex., ao motorista do caminhão que colidiu com o ônibus). Deve, primeiramente, indenizar o passageiro para depois discutir a culpa pelo acidente, na ação regressiva movida contra o terceiro.
Maria Helena Diniz84 esclarece que o bilhete de passagem
emitido pela transportadora é um título de legitimação que representa o contrato,
porém, caso ocorra perda, falha ou irregularidade não extingue a obrigação
gerada entre as partes, visto que há, também, a possibilidade de o transportador
não emitir o bilhete.
Desta forma ressalta Caio Mário da Silva Pereira85:
Via de regra, o transportador emite um documento que constitui o instrumento do contrato. Para o transporte de pessoas, chama-se bilhete de passagem, que pode ser pessoal ou impessoal; no primeiro caso é intransferível, e no segundo dá direito a condução de qualquer pessoa. Não é, todavia, obrigatória a sua emissão. Muitas modalidades de condução se realizam, com características contratuais, à simples admissão do passageiro no veículo, mediantes pagamento, adiantado ou não. Quando o transportador emite o bilhete de passagem, é comum fazer inscrever nele normas contratuais a serem obedecidas pelo passageiro. É evidente que as normas que sejam abusivas considerar-se-ão
82 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaraçã o unilateral de vontade, responsabilidade civil. vol. III. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense – 2004 p. 330. 83 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro . Vol. III. São Paulo: Saraiva – 2004. p.460. 84 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. p. 437. 85 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaraçã o unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 331.
48
como não escritas, especialmente quando o contrato de transporte se der no âmbito de relação de consumo. Mesmo sem a emissão pode o transportador estabelecer normas, cujo conhecimento pelo passageiro se dá quando se encontrarem afixadas em locais visíveis (Código Civil, art. 738).
Importante discorrer, mesmo que de maneira sucinta, sobre
as agências de turismo, considerando que essas empresas celebram diariamente
Contratos de Transporte de Pessoas, segundo Maria Helena Diniz86, intermediam
grande parte das vendas de passagens aéreas entre a transportadora e os
passageiros, promovem o deslocamento de pessoas no âmbito nacional e
internacional e auxiliam os passageiros em serviços correlatos à venda de
passagens e de turismo.
Maria Helena Diniz87 assim define as funções das agências
de viagens:
A agência de viagens terá a função de: vender excursões e passagens por conta própria ou de empresas de transporte; organizar, promover e executar viagens ou excursões individuais ou coletivas; prestar, mediante remuneração, serviços turísticos, inclusive de guia, intérprete, prestando informações a viajantes; prestar serviços especializados, mediante remuneração, relacionados com passeios, viagens, acomodações em hotéis.
No entanto, Roberto Senise Lisboa88 ensina que “a
responsabilidade civil das operadoras ou agências de turismo é objetiva”. Desta
forma, responderá por todos os danos patrimoniais e morais, solidariamente,
podendo os danos morais ser imputados somente em face dos causadores do
prejuízo.
No que se refere à quantificação da indenização por danos
materiais, o Código Civil no parágrafo único do art. 734, dispõe sobre o direito do
transportador de exigir a declaração do valor da bagagem, sendo assim, segundo
86 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. p. 439. 87 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. p. 439. 88 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: contratos e declarações un ilaterais: teoria geral e espécies. p. 521.
49
Caio Mário da Silva Pereira89, existindo essa declaração, torna-se mais fácil fixar
a indenização por danos materiais, restando somente ao magistrado a apreciação
do eventual dano moral ocorrido. Entretanto, caso o passageiro venha a
transgredir as normas estabelecidas pelo transportador, o magistrado deverá
julgar de acordo com o grau de culpa de cada um, visto que o passageiro pode
concorrer para a ocorrência do dano causado. Contudo, muito embora o Código
Civil não estabeleça, há a possibilidade de se atribuir a culpa exclusiva ao
passageiro, o que exime o transportador da responsabilidade civil sobre o dano
causado.
Carlos Roberto Gonçalves90 segue o mesmo entendimento e
acrescenta:
De acordo com o Decreto n. 2.681, de 1912, a culpa concorrente da vítima não exonera o transportador da obrigação de compor os danos. Somente a culpa exclusiva da vítima pode exonerá-lo. O Código de Defesa do Consumidor manteve o princípio da responsabilidade objetiva do prestador de serviços, admitindo como excludentes somente a comprovada inexistência do defeito e culpa exclusiva da vítima ou de terceiro (art. 14, § 3º), que rompem o nexo causal (sendo admissível, pelo mesmo motivo, a força maior).
O art. 740 e parágrafos do Código Civil, trata do direito do
passageiro de restituição do valor da passagem no caso de desistência, se
comunicado ao transportador antes de iniciada a viagem, para o transportador
renegociar o bilhete, ou durante a viagem, neste caso restituindo o passageiro
somente o trecho que não foi transportado, se no trecho desistido, o lugar for
ocupado por outro passageiro. Ressalvado o direito do transportador de reter o
valor de 5% do valor a ser restituído a título de multa compensatória no que ser
refere aos casos de restituição anteriormente expostos.
A esse respeito, Silvio de Salvo Venosa91 entende, que o
prazo para desistência deve ser regulamentado por legislação específica e
89 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaraçã o unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 331 e 332. 90 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro . p. 462 91 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies . p. 501 e 502.
50
exemplifica com o prazo de 24 ou 48 horas antes da data do embarque, visto que
se avisado somente no momento do embarque, ocasionaria grandes prejuízos ao
transportador. Ressalta, os casos que o transportador vende mais bilhetes do que
deveria, nesses casos deve o transportador propiciar o passageiro outro
transporte de mesma espécie e qualidade e dependendo do caso, indenizar o
passageiro. Reforça ainda que, nos casos em que for exigida a produção de
prova (§ 1º), será aplicado o Código de Defesa do Consumidor. Por fim, entende
que a multa compensatória poderá ser exigida nos casos em que o transportador
não incorrer em culpa.
No art. 741 do Código Civil, se encontra novamente
caracterizada a responsabilidade objetiva do transportador em levar o passageiro
até o destino final, face aos fatos imprevisível em que impeça o transportador de
concluir a viagem.
Para Caio Mário da Silva Pereira92, o transportador não será
eximido da responsabilidade de concluir a viagem contratada pelo passageiro,
mesmo que tenha que ser por meio diverso do contratado, neste caso com a
anuência do passageiro, visto que não se admite cláusula de excludente de
responsabilidade, conforme o previsto na segunda parte do art. 734 do mesmo
diploma legal.
Por fim, preconiza o art. 742 do Código Civil, o direito do
transportador de reter a bagagem, bem como outros objetos pessoais a fim de
garantir o pagamento do valor passagem, quando não realizado em nenhum
momento pelo passageiro.
Ao se identificar esse artigo, percebe-se a similaridade com
o penhor legal realizado pelos hoteleiros. Contudo, conforme Silvio de Salvo
Venosa93, não se trata de penhor legal, “mas de um direito procedimental de
retenção sobre a bagagem do passageiro, que poderá ser alegado também como
matéria de defesa, enquanto não for pago o valor da passagem”.
92 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaraçã o unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 330. 93 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies . p. 503.
51
Portanto, diante de todo o exposto no que condiz o Contrato
de Transporte de Pessoas, percebe-se que o Código Civil expõe, de maneira
clara, as regras que regem esse tipo de contrato, visto que, se fixa a
responsabilidade objetiva do transportador, em contrapartida permite ao julgador
ponderar as decisões quando houver culpa concorrente ou exclusiva do
passageiro.
2.2.2 Contrato de Transporte de Coisas
O Contrato de Transporte de Coisas vem disciplinado no
Código Civil do art. 743 ao 756 e segundo Silvio de Salvo Venosa94, o Código
Civil traça regras gerais, visto que “não se conflitam com os princípios criados
pelos usos e costumes mercantis”.
Para Caio Mário da Silva Pereira95: “No contrato de
transporte de coisas o transportador obriga-se, essencialmente, a conduzir a
coisa de um local para outro, e entregá-la em seu destino, em tempo certo e
previamente estabelecido”.
Maria Helena Diniz96, conceitua o Contrato de Transporte de
Coisas como:
(...) aquele em que o expedidor ou remetente entrega ao transportador determinado objeto lícito para que, mediante pagamento de frete, seja remetido a outra pessoa (consignatário ou destinatário), em local diverso daquele em que a coisa foi recebida.
Nessa relação contratual, segundo a mesma autora, figuram
como partes na relação contratual o remetente e o transportador, visto que o
destinatário somente terá o direito de receber a mercadoria.
94 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies . p. 504. 95 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaraçã o unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 330. 96 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. p. 420.
52
Já, Carlos Roberto Gonçalves97 entende que, no Contrato de
Transporte de Coisas figura também como parte o destinatário ou consignatário,
pessoa a quem é destinada.
Os arts. 743 e 744 do Código Civil disciplinam a respeito da
descrição dos objetos a serem transportados, que será realizado pelo remetente;
do conhecimento de transporte emitido pelo transportador ao receber a coisa,
bem como da exigência da lista das mercadorias a serem transportadas pelo
transportador.
Caio Mário da Silva Pereira entende que, as coisas a serem
transportadas devem estar devidamente caracterizadas a fim de não confundir
com as demais, efetivando sua individualização com o conhecimento de
transporte emitido pelo transportador, que deverá conter os dados do remetente,
transportador e destinatário.
A respeito do conhecimento de transporte Silvio de Salvo
Venosa98 ensina que o transportador deverá entregar ao remetente, que por sua
vez remeterá ao destinatário e ainda:
Não é documento essencial para todo contrato de transporte. Vários diplomas legais a ele se referem, dependendo de cada modalidade de transporte, estando fragmentada sua legislação. Como vimos, o vigente Código também se refere ao documento em várias oportunidades. De fato, sua existência faz presumir, até prova em contrário, a conclusão do contrato, o recebimento da carga e as condições do transporte. O Código Comercial regulamentou-o quando da disciplina do transporte marítimo. O Decreto nº 17.473/30 disciplinou-o de forma genérica, para todas as modalidades de transporte.
O art. 745 do Código Civil trata do dever de indenizar
quando o remetente fornecer informações inexatas ou falsa descrição a respeito
da coisa a ser transportada, bem como fixa o prazo decadencial para o
transportado requerer judicialmente.
97 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro . p. 463. 98 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies . p. 507.
53
Desta forma, exemplifica Maria Helena Diniz99: “(...)
expedidor, que escondendo tratar-se de inflamável, causou incêndio no veículo. O
condutor deverá para tanto mover ação dentro de cento e vinte dias, a contar
daquele ato, sob pena de decadência (CC, art. 745)”. E ainda cita em sua obra, a
opinião de Nelson Nery Jr. E Rosa Mª A. Nery, que seguem a corrente que o
prazo fixado pelo artigo em comento não é decadencial, mas prescricional, por
tratar-se de ação com pretensão condenatória.
Os arts. 746 e 747 do Código Civil tratam da recusa do
transportador em transportar a carga, quando não estiver adequadamente
embalada e trazer risco a saúde das pessoas ou danificar o veículo, bem como
outros bens ou quando não permitida por lei ou venha desacompanhado da lista
com a descrição dos objetos a serem transportados.
Carlos Roberto Gonçalves100 explica que é necessário que a
coisa a ser transportada deve vir devidamente descriminada não só para que
tome as providências necessárias a fim de promover o transporte, mas que possa
exercer o direito de recusa em transportar a coisa.
O remetente, segundo o art. 748 do Código Civil, tem o
direito de requerer de volta a coisa dada em transporte ou dar novo destino,
entretanto, deverá indenizar as despesas que ocasionarem o novo deslocamento,
bem como perdas e danos se ocorrem.
É dever do transportador conduzir com cautela a coisa para
que não ocorra dano e entregar dentro do prazo previamente acordado, conforme
o art. 749 do Código Civil, pois a responsabilidade do transportador se dá no
momento em que recebe a coisa e termina quando for entregue ao destinatário ou
depositada em juízo, quando este for o caso. No entanto, o valor da indenização
terá como teto o constante no conhecimento de transporte, conforme art. 450 do
Código Civil, estendendo também, a responsabilidade quando a coisa estiver
99 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrig ações contratuais e extracontratuais. p. 433. 100 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro . p. 464.
54
depositada em armazém do transportador por for força contratual, o que seguirá
as regras do contrato de depósito, art. 751 do Código Civil.
Neste sentido entende Caio Mário da Silva Pereira101:
O transportador, enquanto mantém consigo a coisa transportada, assume os riscos a ela inerentes. A sua obrigação essencial consiste em conduzir a coisa ao seu destino intacta no prazo concertado entre as partes (art. 749). Se a coisa estiver em seu poder, é por ela responsável, mesmo que não estiver sendo transportada, mas simplesmente guardada em seu galpão ou armazém, hipótese em que o Código lhe atribui a responsabilidade inerente ao contrato de depósito (art. 751). A responsabilidade do transportador é limitada sob o ponto de vista do dano material ao valor que tiver sido atribuído à coisa no conhecimento, e se inicia no momento em que ele a recebe para o transporte e somente finda quando ocorre a entrega ao destinatário, ou, quando não for encontrado, ao próprio remetente ou a pessoa por ele indicada. Na hipótese em que o transportador não encontrar o destinatário que tiver sido apontado no conhecimento, ou este se recusar a receber a coisa, ou mesmo ter dúvida sobre quem deva efetivamente entregá-la, deve tomar as providências necessárias para depositar o bem em Juízo, a fim de eximir da sua responsabilidade pelos riscos de perecimento ou danos a coisa.
Contudo, segundo Carlos Roberto Gonçalves102, em
incorrendo em culpa do remetente em não informar qual o destino da coisa, este
deverá indenizar o transportador o período em que a coisa estiver sob sua
custódia.
O art. 752 do Código Civil preconiza que, caso o remetente
queira que o transportador avise o destinatário da chegada da coisa ou se a
entrega for no domicílio deste, deverá estar previamente acordado e descrito no
conhecimento de embarque.
101 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaraçã o unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 334 e 335. 102 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro . p. 466.
55
Entretanto, segundo Silvio de Salvo Venosa103, a forma a ser
entregue a mercadoria transportada deverá ser previamente acordada pelas
partes, constando no conhecimento de embarque o local de entrega, bem como
se o transportador tem a obrigação ou não de avisar a chegada da mercadoria.
Ressalta ainda o mesmo autor, as Incoterms (termos
comerciais), muito utilizado no comércio internacional, ante a falta de uma
legislação supranacional a Câmara de Comércio Internacional (CCI), criou
cláusulas que tratam basicamente das questões referentes do local de entrega da
mercadoria e a transferência da responsabilidade, do rateio das despesas, bem
como das providências relativas aos documentos alfandegários e de fronteira. As
Incoterms são representadas por siglas que, entende o autor, a simples inclusão
das mesmas no contrato faz a compra e venda inserir-se no rol de obrigações
internacionais criados pela CCI.
Conforme o art. 753 e parágrafos, o transportador pode ser
responsabilizado ou não, pelo perecimento ou deterioração da mercadoria
transportada, no caso da inexecução do transporte ou se sofrer impedimento de
fazê-lo por longo tempo, ressalvado motivo de força maior.
Carlos Roberto Gonçalves104, atribui aos casos de força
maior “obstrução da rodovia, suspensão do tráfego ferroviário, revolução, guerra
ou algum fenômeno inevitável da natureza (...)”, e, sendo nesses casos o
transportador deverá solicitar informação ao remetente a fim de nortear o
transportador a tomar as devidas providências, sob pena de responder pelos
danos causados a coisa. Caso o impedimento permanecer, sem culpa do
transportador e em havendo silêncio por parte do remetente, o parágrafo primeiro
faculta o transportador depositar a coisa em juízo ou vendê-la. Se o impedimento
da conclusão do transporte da coisa for por culpa do transportador, este poderá
depositar a coisa por sua conta e risco ou vendê-la, depositando o valor recebido.
No entanto, deverá o transportador avisar o remetente do depósito ou da venda.
103 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies . p. 506. 104 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro . p. 466.
56
O transportador, como se observou anteriormente, deve
entregar a coisa no local descrito no conhecimento de transporte, emitido pelo
transportador e entregue ao remetente que entrega ao destinatário devidamente
endossado para que possa receber a coisa. No entanto, segundo o art. 754 do
Código Civil, o destinatário tem o dever de, ao receber a coisa, conferi-la e
apresentar reclamações no prazo de dez dias, salvo quando não perceptível a
primeira vista ou dano parcial na coisa, desde que denunciado pelo mesmo prazo,
a contar da data da entrega.
Caio Mário da Silva Pereira105 entende que:
Em princípio o destinatário que tem o ônus de buscar a coisa transportada após desembarcada no local de destino, no prazo que tiver sido ajustado entre as partes. Qualquer alteração de prazo deve evidentemente ser incontinenti informada ao remetente e ao destinatário.
Por fim, o Código Civil prevê a possibilidade do transporte
ser realizado por mais de um transportador e sendo assim, caberá a
responsabilização em todas as situações acima referidas a todos, ressalvado o
direito de regresso entre eles.
2.3 FORMAS DE TRANSPORTE
Para melhor visualização dos contratos de transportes em
espécies, se faz necessário sucinta explanação a respeito das modalidades de
transporte.
Desta forma, Roberto Senise Lisboa106 classifica as
modalidades de transporte:
O contrato de transporte pode ser classificado, entre outras hipóteses: quanto ao meio de locomoção e quanto ao objeto.
105 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaraçã o unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 335. 106 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: contratos e declarações un ilaterais: teoria geral e espécies. p. 509 e 510
57
Sob o aspecto do meio de locomoção, o contrato de transporte pode ser:
- terrestre, efetuado por veículos que são conduzidos sobre o asfalto, os trilhos ou terra.
O transporte terrestre pode se dar: por meio de rodovia, por meio de ferrovia ou por meio de aerovia.
- marítimo, tanto por embarcações de pequeno porte como por embarcações de médio e grande porte, que são conduzidas por vias lacustres, rios, mares e oceanos.
- aéreo, efetuado por embarcações de pequeno, médio e grande porte, no espaço aéreo sobre a terra e sobre as águas.
Portanto, percebe-se que para que seja formalizado o
contrato de transporte, primeiramente deve-se observar a modalidade a qual será
aplicada, pois somente após essa informação se pode formalizar o contrato
aplicando a legislação pertinente, como será visto a seguir.
2.3.1 Contrato de Transporte Terrestre
Como observado anteriormente, o Contrato de Transporte
Terrestre divide-se em rodoviário e ferroviário ou até mesmo por aerovias. No
entanto, restringir-se-á este estudo somente no conceito do Transporte Rodoviário
e o Ferroviário, eis que a pesquisa não tem por escopo o transporte terrestre.
Segundo Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi107 , o
transporte rodoviário internacional é aquele efetuado por caminhões e carretas
normalmente ligando países limítrofes. Pode também ligar países que não
possuem fronteiras entre si, passando por um terceiro país, desde que este o
permita.
E aduz ainda, que para viagens de curta e média distâncias,
o modal rodoviário é o mais utilizado no comércio internacional de mercadorias.
Dentre as suas principais características, pode–se citar:
a) Simplicidade de funcionamento;
107 MENDONÇA Paulo C, KEEDI Samir. Transportes e seguros no comércio internacional. São Paulo: Editora Aduaneiras 1997. p.93.
58
b) Maior disponibilidade para embarques urgentes;
c) Permite integrar regiões, mesmo as mais afastadas, bem como o interior do
país;
d) Vendas do tipo entrega porta a porta, trazendo maior comodidade para
exportador e importador;
e) Menor manuseio da carga, sendo o veículo lacrado no local de carregamento e
aberto no local da entrega;
f) Rapidez na entrega em curta distância;
e) possibilidade de utilização de embalagens mais simples e de menor custo.
Por fim, na óptica dos mesmos autores, o transporte
rodoviário é peça fundamental, permitindo que a multimodalidade e a
intermodalidade é peça fundamental, permitindo que a multimodalidade e a
intermidalidade passam a ser realizadas. Apenas ele tem a capacidade interligar
os diversos modais, abrangendo todo o percurso da mercadoria. Por via de regra,
apresenta preços de frete mais elevados do que os modais ferroviário, portanto
sendo recomendado para mercadorias de alto valor ou perecíveis. Não é
recomendado para produtos agrícolas e granel, cujo custo é muito baixo para este
modal. Neste sentido, funcionaria apenas para complementar os demais modais,
entretanto não é isto o que ocorre na prática.
Já no que ser refere ao transporte ferroviário internacional,
Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi108 definem que aquele efetuado por vagões,
puxados por locomotivos, sobre trilhos e com trajetos devidamente delineados, ou
seja, não tem flexibilidade quanto a percursos e estão presos a caminhos únicos,
o que pode provocar atrasos na entrega das mercadorias em caso de obstrução
da ferrovia. Liga, normalmente, países limítrofes, podendo ser realizados também
entre países que não façam fronteiras entre si, mas que apresentem condições
108MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.104.
59
para tal, tanto em relação à distância quanto à viabilidade de custos e condições
das ferrovias, cujo trânsito é realizado através de um terceiro ou terceiros países.
Segundo Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi109:
O transporte ferroviário não é tão ágil quanto o rodoviário no acesso às cargas já que as mesmas devem, em geral, ser levadas a ele.
O Brasil tem aproximadamente 30.000 Km de ferrovias (contra 150.000 Km de rodovias), o que é muito pouco para um país com as nossas dimensões territoriais.
Portanto, consta-se que a malha rodoviária brasileira é muito
superior a ferroviária, o que acaba dificultando bastante o seu uso.
2.3.2 Contrato de Transporte Aéreo
Segundo Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi110, o contrato
de transporte Aéreo tem como objeto o transporte realizado por em presas de
navegação aérea, através de aeronaves de vários tipos e tamanhos, nacional e
internacional e pode ser utilizado praticamente para todas as cargas, embora com
limitações em relação ao marítimo, quanto à quantidade e especificação.
Ainda, através da navegação aérea , pode-se atingir
qualquer ponto do planeta, sendo esta opção interessante para cargas de alto
valor ou de alta perecibilidade, ou amostras, que necessitam chegar rapidamente
ao seu destino.
Conforme Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi111, o
transporte aéreo internacional é baseado nas normas da IATA (International Air
Transport Association) e em acordos e convenções internacionais. As reservas
para transporte de cargas podem ser feitas para um espaço na aeronave, para o
espaço total ou ainda afretamento de aviões cargueiros. As reservas são
109MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p. 104 110 MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.30. 111 MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.110 e 111.
60
realizadas pelos expedidores diretamente com a companhia aérea ou através de
um agente de carga IATA.
Este modal se diferencia dos demais graças às seguintes
características.
a) Maior rapidez no transporte;
b) Apropriado para o transporte de mercadorias de pouco peso/volume e alto
valor;
c) Usado particularmente com muita eficácia para transporte de amostras;
d) Ideal para o transporte de mercadorias com prioridade de entrega e (urgência);
e) AWB (Airway Bill) obtido com maior rapidez.
2.3.3 Contrato de transporte Marítimo, Lacustre e F luvial
2.3.3.1 Marítimo
O transporte marítimo é aquele realizado por navios em
oceanos e mares e pode ser utilizado para qualquer tipo de carga, podendo
aportar e descarregar em qualquer porto do mundo, sendo o único meio de
transporte que transporta milhares de toneladas ou de metros cúbicos de
qualquer produto de uma só vez112.
De acordo com Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi113 O
transporte Marítimo possui a seguinte divisão: a) Navegação de longo curso: que
faz a ligação entre países próximos ou distantes a chamada navegação
internacional; b) Navegação de cabotagem: que é aquela realizada entre os
portos do mesmo país, a chamada navegação nacional.
112 MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.28. 113 MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.29
61
2.3.3.2 Fluvial
É a navegação praticada nos rios, dá-se dentro do país e/ou
continente, nomeada como navegação de interligação de interior114.
Como acontece no transporte marítimo, também pode haver
transportes de qualquer carga e com navios de todos os tipos de tamanhos,
desde que a via navegável os comporte115.
2.3.3.3 Lacustre
Navegação lacustre é aquela realizada em lagos e tem como
características a Ligação de cidades e países circunvizinhos. No entanto, tendo
em vista que não existem muitos lagos navegáveis, é um tipo de navegação
bastante restrita116.
2.4 REQUISITOS E ELEMENTOS DOS CONTRATOS DE TRANSPO RTE
O Contrato de Transporte tem como requisitos e elementos,
segundo Jônatas Milhomens e Geraldo Magela Alves117, a bilateralidade, visto
que gera obrigações para o transportador, como também para o passageiro ou
expedidor, a onerosidade eis que ambas as partes contraem ônus em virtude da
celebração do contrato, comutativo, pois as prestações adquiridas com a
formalização do contrato são certas e determinadas e consensual, tendo em vista
que a formalização do contrato depende somente da vontade das partes.
Entretanto, Carlos Roberto Gonçalves118 argumenta que o
além das características anteriormente expostas, o contrato de transporte é
conhecido como contrato de adesão, visto que é de costume uma das partes não
discutir o contrato, bem como há um regulamento previamente estabelecido.
Exemplifica o autor com o transporte de ônibus, uma vez que o passageiro
114 MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.29 115 MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.29 116 MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.29 117 MILHOMENS, Jônatas, ALVES, Geraldo Magela. Manual prático dos contratos. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense – 2005. p. 428. 118 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro . p. 452 e 453.
62
adquire a passagem e conseqüentemente adere a todas as cláusulas expostas no
bilhete.
Já Silvio de Salvo Venosa119, não classifica como contrato
de adesão, no entanto acrescenta que se trata de contrato de duração, ante a
necessidade de um lapso temporal para ser cumprido o respectivo contrato.
Portanto, constata-se que não é muito pacífica a
caracterização do Contrato de Transporte, entretanto, todos os autores
concordam em ser o contrato de transporte bilateral, oneroso, comutativo e
consensual.
2.5 AS CONVENÇÕES E TRATADOS INTERNACIONAIS ACERCA DOS
CONTRATOS DE TRANSPORTE
De acordo com o art. 732 do Código Civil poderá ser
aplicável toda e qualquer legislação especial aos Contratos de Transporte, desde
que não contrarie o disposto no mesmo.
Levando-se em conta que os Contratos de Transporte
podem ser entabulados para transporte de coisas ou pessoas, de ordem nacional
e internacional, sendo que, nesse último, incidem normas de cunho
supranacional, ou seja, são regulamentados por tratados e convenções
internacionais.
Os tratado e Convenções, segundo Rui Stoco120, “são
acordos entre os Estados”, que segundo o mesmo autor, são celebradas
convenções internacionais, quando seu objeto for de menor importância e a
durabilidade for por prazo menor do que estabelecido por um tratado.
De acordo com o art. 84, VIII da Constituição Federal, o
Presidente da República é a pessoa competente para celebrar entre os Estados
119 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies . p. 494. 120 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil . 6.ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 422.
63
os tratados e convenções internacionais, que estarão sujeitos a referendo do
Congresso Nacional.
Rui Stoco121 ensina que, com o advento da condição de
submeter o acordo internacional celebrado pelo Presidente, a aprovação do seu
texto pelo Congresso Nacional, que emitirá, caso seja aprovado, Decreto
Legislativo, que por sua vez será novamente remetido ao Presidente para
promulgação por meio de Decreto Presidencial, o Brasil adotou a corrente dualista
extremada.
Explica ainda122, que a corrente dualista teve como
precursor Triepel em 1899, contida na obra de Volkerrecht und Landesrecht, que
doutrinava a existência de duas ordens jurídicas, sendo uma interna e outra
externa e para que esta última seja inserida na primeira, exige-se um processo de
recepção, onde tornará a norma externa em interna. Dessa forma, afasta-se uma
possibilidade de conflito entre uma lei infraconstitucional e um tratado ou
convenção, visto que as duas estarão no mesmo patamar. Em havendo conflitos,
estes serão solucionados adotando as regras pertinentes a solução de conflitos
de normas de mesmo grau.
Portanto, constata-se que para um tratado ou convenção
internacional ser a legislação nacional ser aplicado é necessário respeitar todo um
procedimento.
No entanto, dentre os tratados e as convenções
internacionais hoje aplicadas no contrato de transporte marítimo internacional, se
destaca a Convenção Internacional para Unificação de Certas regras em Matéria
de conhecimento, realizada em Bruxelas no dia 25 de agosto de 1924. Contudo, o
Brasil somente ratificou a citada convenção, porém não houve a promulgação da
mesma para que tivesse validade no ordenamento jurídico prático123.
121 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil . p. 422. 122 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil . p. 422. 123 CASTRO JR. Osvaldo Agripino de. Aplicação do código de defesa do consumidor ao contrato de transporte marítimo. Universidade do Vale do Itajaí. Produção Científica CEJURPS – 2006. p. 138.
64
Contudo, é questionável a sua aplicação, tendo em vista que
contrataria disposição legais, bem como princípios que regem o direito brasileiro.
Por conseguinte, a referida convenção é comumente
aplicada aos Contratos de Transporte Marítimo Internacionais, em que se
necessita de verificação da ocorrência ou não a responsabilidade do
Transportador, como será demonstrado no capítulo seguinte.
CAPÍTULO 3
OS CONTRATOS DE TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE COISAS E A RESPONSABILIDADE
CIVIL DO TRANSPORTADOR
3.1 TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE COISAS E O BRIGAÇÕES
DO TRANSPORTADOR
De acordo com Carla Adriana Comitre Gibertoni124 o
Transporte Marítimo Internacional de Coisas se dá pelo contrato de fretamento,
ou de transporte marítimo, em que figuram como partes o fretador (armador) e o
afretador (o proprietário da mercadoria), sendo que o primeiro, mediante acordo
escrito, se compromete a transportar mercadorias por vias aquáticas, recebendo
uma quantia em dinheiro que é chamada de frete.
Para Leandro Raphael125 “é um acordo escrito mediante o
qual o armador se compromete a transportar mercadorias por água, numa
expedição marítima, recebendo em troca uma quantia em dinheiro denominada
frete.”
Ressalta ainda, Flávia de Vasoncellos Lanari126, que pode vir
a integrar o contrato de transporte o destinatário da mercadoria, desde que este,
no momento da contratação assumir a responsabilidade de pagamento do
transporte.
Para compor o valor do transporte ou frete, como é
denominado, segundo Carla Adriana Comitre Gibertoni127, existem fatores
referenciais para a fixação do frete, que englobam despesas arcadas pelo
124 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 174. 125 RAPHAEL, Leandro. Direito marítimo. São Paulo: Aduaneiras, 2003. p. 51. 126 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 87 e 88. 127 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 175.
66
armador para a carga e descarga das mercadorias, além de outros fatores, tais
como peso, sendo em toneladas métricas, unidade de volume, em metro cúbico,
ou ao valor intrínseco da mercadoria.
No entanto, segundo a mesma autora, o valor do frete será
fixado como melhor convier ao armador.
O Código Comercial Brasileiro traz, em seu art. 566, o
conceito de contrato de fretamento na legislação brasileira:
O contrato de fretamento de qualquer embarcação, quer seja na sua totalidade ou em parte, para uma ou mais viagens, quer seja à carga, colheita ou prancha, ou que tem lugar quando o capitão recebe carga de quantos se apresentam, deve provar-se por escrito. No primeiro caso o instrumento, que se chama “carta-partida” ou “carta de afretamento”, deve ser assinado pelo fretador e afretador; e por quaisquer outras pessoas que intervenham no contrato, do qual se dará a cada uma das partes um exemplar; no segundo, o instrumento chama-se conhecimento, e basta ser assinado pelo capitão e o carregador. Entende-se por fretador o que dá, e por afretador o que toma a embarcação a frete.
Leandro Raphael128 comenta que as regras dispostas no
Código Comercial coadunam com as regras obedecidas pelo Transporte Marítimo
Internacional de Mercadorias, bem como na forma do contrato, visto que as
formas admitidas são através do Charter Party, ou seja, em português “carta-
partida” ou “carta de afretamento” e Bill of Lading, traduzido como conhecimento
de embarque.
Carla Adriana Comitre Gibertoni129 assim define os contratos
citados pela legislação pátria:
Se o contrato se refere ao fretamento ou afretamento de todo um navio, o documento se denomina carta partida (“charter party”) contrato ou apólice de fretamento (contract of affreightment); se o fretamento é parcial, para pequenos lotes de mercadorias, o instrumento fica restrito ao conhecimento de embarque (“Bill of lading”) ou um booking note (reserva de praça).
128 RAPHAEL, Leandro. Direito marítimo. p. 53. 129 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 178.
67
No entanto, as referidas espécies de contrato de transporte
marítimo, segundo Carla Adriana Comitre Gibertoni130, são praticados de cinco
formas, sendo elas:
1. No contrato a casco nu, a posse do navio permanece com
o afretador e a administração com o proprietário, entretanto, pode o fretador ficar
com a posse e administração do navio, onde receberá a denominação de
bareboat charter party, sendo que a responsabilidade da emissão da carta partida
ou do boletim de conhecimento de embarque será pelo mesmo;
2. Por tempo ou prazo (timer charter party), nessa forma o
afretador toma o navio em aluguel, devidamente equipado pelo proprietário e se
responsabiliza pela emissão do conhecimento, porém a posse do navio
permanece com o proprietário, ou seja, o proprietário controla todo o navio, mas o
coloca a disposição do afretador por um prazo determinado;
3. Por viagem (rate, trip, Voyage charter), é o contrato onde
toma o navio inteiro, chamado de viagem redonda (“single Voyage”) ou por
viagens consecutivas (“consecutives voyages”), entre dois ou mais portos
enumerados, sendo calculado por tonelada o preço do frete. O fretador se
responsabiliza pela emissão do conhecimento de embarque, visto que detém a
posse do navio. No entanto, nessa modalidade o proprietário cede o navio
devidamente equipado e se fica responsável por todas as despesas da viagem;
4. Fretamento parcial, essa forma de contrato é equiparado
ao contrato de fretamento por viagem. No entanto, nessa modalidade se difere,
visto que o espaço do navio será dividido em várias pequenas partes, para
acomodação de várias embarcações. O conhecimento de embarque será emitido
pelo fretador. Esse tipo de contrato é o mais comum devido ao grande porte dos
navios existentes;
130 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p.
68
5. Fretamento total, é somente utilizado quando o navio será
utilizado por um afretador. No entanto, em não constando cláusula que inibidora,
pode o afretador subfretar a terceiros para transportar mercadorias destes. Esse
tipo de contrato é mais comum para transporte de carvão e petróleo, pois ocupa
todo o espaço destinado a carga. No art. 570 do Código Comercial encontra-se
prevista essa modalidade de contrato.
Identificadas algumas espécies de contrato de transporte
marítimo de carga, percebe-se de maneira geral que se trata basicamente de um
contrato de aluguel, entabulado pelo afretador e o fretador, onde ora um figura
como responsável pela expedição do conhecimento de embarque ou carta
partida, ora é o outro, dependendo o tipo do contrato.
No entanto, a presente monografia tem por escopo apurar a
responsabilidade do Transportador Marítimo nos Contratos de Transporte
Marítimo Internacional de Carga, ou seja, o fretador marítimo que como tal, possui
obrigações legais para cumprir na relação contratual, que ora se passa a
identificar.
Theophilo de Azevedo Santos131 assevera, que a obrigação
do transportador marítimo é dividida em antes de iniciada a viagem, durante e
finda a mesma:
a) Antes da viagem o transportador deverá por a disposição
do afretador para receber a carga no dia e hora marcada, caso não tenha hora
certa para iniciar viagem o capitão do navio será responsável para decidir o
momento em que o navio estiver preparado para receber a carga. Possui a
obrigação antes de iniciada a viagem, também de receber e arrumar a carga;
expedir conhecimento de embarque de acordo com a Lei e iniciar o transporte.
b) Durante a viagem a obrigação do transportador é de
transportar as mercadorias, conservando-as devidamente; ter o navio total
condições de continuar a viagem, providenciando os consertos quando
131 SANTOS, Theophilo de Azevedo. Direito da navegação (marítima e aérea): doutrina, jurisprudência, legislação. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1968. p. 223 – 226.
69
necessários. Contudo, se não existir condições de operar o conserto durante a
viagem, o transportador deverá providenciar outro navio para continuar o
transporte; seguir a rota estabelecida, dela não desviando.
c) Finda a viagem o transportador deverá aportar o navio no
local determinado pelas normas da administração e entregar ao destinatário ou
consignatário a mercadoria na mesma condição que a recebeu.
Geraldo Bezerra de Moura132 relaciona as seguintes
obrigações do transportador:
1) Receber, transportar e entregar as mercadorias no tempo e lugar convencionados;
2) Expedir o conhecimento de frete (cf. Código Comercial, art. 100; Decreto n° 19.473, de 10 de dezembro de 1930 q ue regula os conhecimentos de transporte de mercadorias por terra, água ou ar e dá outras providências);
3) Seguir o itinerário ajustado para o transporte da mercadoria (cf. art. 110 do Código Comercial);
4) Aceitar a variação da consignação (cf. art. 113 do Código Comercial e Decreto n° 19.473/1930, art. 4° e 7°).
Por fim, do art. 590 em diante do Código Comercial
Brasileiro, traz os direitos e obrigações o Transportador nos contratos de
Transporte Marítimo Internacional de Carga, sendo que as quais já foram
abordadas pelos encíclicos doutrinadores anteriormente expostos.
Não obstante observadas as obrigações do transportador,
este poderá ser responsável por avarias que vierem a afetar a carga, caso em
que deverá ressarcir de acordo com a forma ajustada.
3.2 AVARIAS NO TRANSPORTE MARÍTIMO
De acordo com Carla Adriana Comitre Gibertoni133, a avaria
em sentido jurídico possui significado amplo, visto que abarca não só os danos
132 MOURA, Geraldo Bezerra de. Direito da navegação em comércio exterior. São Paulo: Aduaneiras, 1991. p. 201/202.
70
que podem ocorrer aos navios ou com as cargas nos acidentes marítimos, mas
engloba todas as despesas extraordinárias necessária para suportar o dano, bem
como todas as despesas ocorridas durante a viagem, desde o embarque até seu
desembarque.
Geraldo Bezerra Moura134esclarece que:
(...) para que sejam consideradas avarias neste sentido técnico é necessário que esses danos acontecidos àqueles ou a esta sejam extraordinários, e, por conseguinte entrem na categoria de fatos imprevistos. Se fossem apenas fatos normais próprios da rotina de navegação, tudo resvalaria em previsões e cálculos dos interessados. E, neste ponto, desapareceu a figura da liquidação, repartição e contribuição, elemento indispensável da avaria grossa.
O Código Comercial Brasileiro no seu art. 761 conceitua
avaria:
Todas as despesas extraordinárias feitas a bem do navio ou da carga, conjunta ou separadamente, ou todos os danos acontecidos àquelas ou a esta, desde o embarque ate a sua volta e desembarque, são reputadas avarias.
Segundo Leandro Raphael135, avaria tem a seguinte
classificação:
De dano (avaries-dommages), quando compreendem prejuízos materiais.
Avarias-despesas (avaries-domages), quando se trata de despesas realizadas em carater extraordinário, isto é, que não foram cogitadas, causadas por força maior.
As avarias, não havendo convenção particular ajustadas entre as partes, exarada na carta partida ou no conhecimento, qualificam-se e regulam-se pelas disposições legais pertinentes; no caso brasileiro, pelas disposições do Código Comercial (art. 762).
133 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 206. 134 MOURA, Geraldo Bezerra de. Direito da navegação em comércio exterior. p. 233. 135 RAPHAEL, Leandro. Direito marítimo. p. 67
71
No entanto, não obstante a classificação das avarias em
avaria dano e avaria despesas, que estabelecem a distinção entre as despesas
com a reparação dos danos ocorridos no navio ou a carga, ou ainda em ambos e
as despesas decorrentes de gastos inesperados, ou necessários para que o navio
conclua a expedição marítima com sucesso, importante ressaltar que a
classificação mais importante se divide em avaria grossa e avaria particular.
3.2.1 Avaria Grossa
As Avarias Grossas encontram-se disciplinadas no art. 764
do Código Comercial, onde relaciona 21 itens classificados como Avarias Grossas
e, ao final, expõe:
E, em geral, os danos causados deliberadamente em caso de perigo ou desastre imprevisto e sofrido como conseqüência imediata destes eventos, bem como as despesas feitas em iguais circunstancias, depois de deliberações motivadas (art. 509), em bem e salvamento comum do navio e mercadorias, desde a sua carga e partida até o seu retorno e descarga.
Conforme, Carla Adriana Comitre Gibertoni136, a Avaria
Grossa ou Comum trata-se de decisões humanas, em que visam proteger
interesses maiores, a fim de salvaguardar o bem comum, com o intuito de evitar
maiores danos em detrimento da comunidade de interesses, sendo que, em caso
de indenização ou reparo, todos os interessados na expedição marítima deverão
contribuir, visto que o seu efeito principal é criar reciprocidade de direitos e
obrigações.
Exemplifica a mesma autora, que o alijamento137 é o tipo de
avaria mais comum e que se classifica como avaria grossa ou comum, visto que
visa proteger os demais interesses a bordo do navio.
De acordo com Carla Adriana Comitre Gibertoni138, as
avarias grossas são regidas pelas regras de York-Antuérpia, que são regras
136 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 212 e 213. 137 Alijameto é o lançamento ao mar de objetos carregados no navio para aliviá-lo. Alijamento é o transbordo das mercadorias para outras embarcações. 138 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 213.
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indicam o que é, ou não, avaria grossa. Definem os fundamentos da avaria, a sua
natureza e estabelecem certas circunstâncias como a culpa e despesas em
substituição. Essas regras são 7 atualmente, em ordem alfabética, sendo da letra
A até a G.
Segundo Carla Adriana Comitre Gibertoni139, as Regras de
York-Antuérpia fornecem, na Regra A, a seguinte definição de avaria comum:
Um ato se caracteriza como de avaria grossa quando, e somente quando, implicar em um sacrifício ou despesa extraordinária, internacional e razoavelmente feito para a segurança comum e no sentido de preservar de um perigo os bens envolvidos na mesma expedição marítima.
Leandro Raphael140 ressalta que as seguintes características
essenciais da avaria grossa:
- deliberação prévia ou ato voluntário a respeito do sacrifício;
- exclusão de culpa do capitão ou do carregador, ou seja, o sinistro, ou perigo de sinistro, não se apresentou por culpa de ninguém;
- comunhão de benefícios, ou seja, o objetivo é benefício do navio e da carga ao mesmo tempo, e os danos ou despesas tenham sido efetuados em benefício comum, isto é, do navio e da carga.
No entanto, alguns autores entendem que para ser
considerada avaria grossa, o resultado deve ser útil, ou seja, a mesma deve
resultar do salvamento do restante da carga e do navio. Contudo, a lei brasileira,
bem como as Regras de York-Antuérpia não fazem essas exigências, sendo as
perdas, danos ou despesas admitidas como tal.
J. Haroldo dos Anjos e Carlos Rubens Gomes141
exemplificam:
Um navio carrega carga no convés e sob mau tempo; o Capitão, verificando que a estabilidade do navio está comprometida, e que
139 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 214. 140 RAPHAEL, Leandro. Direito marítimo. p. 68. 141 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 1992. p. 79.
73
pode haver naufrágio, manda largar a peação para que a carga caia no mar, assim, “aliviando” o navio – má ação deliberada do comando, em beneficio do navio e da carga, e cujos prejuízos devem ser rateados por todos, sendo, portanto, uma avaria grossa.
Diante do que foi visto, pode-se entender que as avarias
grossas englobam: a) o fato extraordinário, que ocasione as despesas, ou danos
ao navio, ou a carga; b) a ação emanada da vontade humana, feito em benefício
do navio ou da carga ao mesmo tempo, devendo beneficiar-se a ambos
conjuntamente; e c) tem como termo inicial da expedição marítima o porto de
partida e final o porto de desembarque.
Por fim, Carla Adriana Comitre Gibertoni142, ressalta que a
avaria grossa, tem como efeito principal criar um direito e uma obrigação
simultânea, ou seja, diante dos fatos ocorridos, todos os interessados na
expedição marítima serão indenizados, em contrapartida todos estarão obrigados
a contribuírem para a indenização.
3.2.2 Avaria Particular
A avaria particular pode ser chamada de avaria simples,
que, segundo Carla Adriana Comitre Gibertoni143, são oriundas de caso fortuito ou
força maior, nessa espécie a vontade do homem não intervém, porém responde
nos casos de imprudência, imperícia ou negligência, de dolo do comandante,
equipagem ou empregados do armador, podendo ser até terceiros.
Avaria simples ou particular para Leandro Raphael144:
É a que a vontade humana não intervém para resguardar interesses relativos ao navio ou à carga; as avarias particulares são enumeradas no art. 766 do Código Comercial Brasileiro, dispondo, que são em geral, as despesas feitas e o dano sofrido só pelo navio, ou só pela carga, durante o tempo dos riscos. A avaria particular pode ocorrer durante a viagem ou mesmo
142 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 213. 143 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 211. 144 RAPHAEL, Leandro. Direito marítimo. p. 68 e 69.
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enquanto o navio estiver parado, durante o embarque e desembarque, podendo derivar:
- de fortuna do mar: não só caso fortuito ou força maior, incêndio ou albaroamento, mas todo e qualquer evento ocorrido no mar;
- de vício próprio: quanto ao navio (má qualidade dos materiais de construção, má manutenção, etc.) e quando à carga (facilidade de decomposição de certas mercadorias, mau acondicionamento, etc.)
- faltas do capitão: falta de vigilância, pois é depositário da carga.
Portanto, de acordo com a doutrina acima citada, as avarias
particulares são danos ocorridos ao navio, ou a carga individualmente, em que
não há a vontade de salvaguardar o bem comum, sendo decorrentes dos
acidentes da navegação.
O art. 766 do Código Comercial enumera os tipos de avarias
particulares, onde relaciona vários tipos de acidentes da navegação e ao final
ressalta que, ”as despesas feitas e o dano sofrido pelo navio, ou só pela carga,
durante o tempo dos riscos”.
Carla Adriana Comitre Gibertoni145 menciona: “(...) a questão
da avaria da mercadoria provocada por borrasca (art. 766, 1, CCom) ou
tempestade, que isentam de responsabilidade do armador fretador e
transportador, onerando tão somente o segurador”.
Salienta Flávia de Vasoncellos Lanari146, que no caso de
avaria simples ou particular não estão sujeitas a responsabilidade do
transportador, salvo de previamente acordado no contrato de seguro ajustado.
3.3. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANS PORTADOR
MARÍTIMO DE COISAS POR AVARIAS
ANJOS e GOMES147 entendem que para que haja uma
imputação de responsabilidade civil, há a necessidade da existência da relação
145 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 211. 146 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 111.
75
de causalidade, entre o agente causador do dano, a vítima e o fato, em que
dependendo da circunstância ter-se-á a presença das excludentes de
responsabilidade civil.
A doutrina é unânime em considerar como excludente de
responsabilidade do transportador marítimo: a) ausência de nexo causal; b) culpa
exclusiva da vítima; c) fato exclusivo de terceiro; d) Caso fortuito ou força maior;
e, e) vício próprio.
LANARI148 entende que:
(...) ao transportador, exonerar-se de sua responsabilidade provando que a inexecução das obrigações assumidas decorreu de fatos a ele não imputáveis, tais como, na hipótese de ter havido falta do afretador, o vício próprio da mercadoria, embalagem inadequada, ou se tiver ocorrido caso fortuito ou força maior.
Adiante, serão tratadas cada uma dessas excludentes:
a) Ausência de nexo causal.
GIBERTONI149 assevera que, “inexistindo a relação de
causa e efeito entre a ação ou omissão do agente e o fato ocorrido, não existe a
responsabilidade”.
No mesmo sentido ANJOS e GOMES150 ensinam que,
“Exclui a responsabilidade por inexistência da relação de causa e efeito entre a
ação ou omissão e o fato ocorrido”.
b) Culpa exclusiva da vítima.
De acordo com ANJOS e GOMES151, ocorre culpa exclusiva
da vítima quando ao agente pressupõe o dolo ou culpa pela ação ou omissão,
liberando o autor do dano de qualquer responsabilidade.
147 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 229. 148 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 112. 149 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 356. 150 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 230. 151 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 230.
76
Acrescenta GIBERTONI152 que, “No caso de culpa
concorrente, a indenização reduz-se proporcionalmente, ou pela metade”.
c) Fato exclusivo de terceiro.
GIBERTONI153 conceitua que, o fato exclusivo de terceiro
somente ocorre quando um fato extraordinário envolve uma terceira pessoa, não
integrante da relação jurídica entre as partes contendoras.
No entanto, ressalta ANJOS E GOMES154 que:
Os prepostos ou empregados, filhos, curatelados, apesar de serem terceiros na relação jurídica, não são considerados, nessa condição, para efeito de imputação da responsabilidade aos seus patrões ou comitentes, pais, curadores e tutores, pois nesse caso, incide a responsabilidade indireta desses em relação ao dano causado por aqueles, face ao vínculo jurídico obrigacional.
Exemplifica GIBERTONI155, como excludente de
responsabilidade ocasionada por fato de terceiro as greves e os lockouts. Porém,
tais fatos não poderão ocorrer por culpa do transportados, pois se for constatado
sua culpa o transportador responderá pelos danos causados na carga devido ao
atraso na entrega.
d) Caso fortuito ou força maior.
GIBERTONI156 entende que caso fortuito os acontecimentos
possíveis, mas imprevisível, ou de total desconhecimento do homem. Já a força
maior enquadra-se nos acontecimentos previsíveis, porém nada se pode fazer
para evitar seu acontecimento mesmo que queira.
ANJOS e GOMES157 entendem que:
152 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 358. 153 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 358. 154 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 230. 155 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 358. 156 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 359. 157 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 230 e 231.
77
Juridicamente são expressões sinônimas; mas enquanto o caso fortuito dir-se-á do acontecimento possível, porém imprevisível ou estranho à ação humana por força maior deve-se entender o acontecimento previsível, mas inevitável pela simples manifestação da vontade ou da ação humana; por força maior deve-se entender o acontecimento previsível, mas inevitável pela simples manifestação da vontade ou da ação humana.
No entanto, ressalta LANARI158, que somente deverá ser
caracterizada o caso fortuito e a força maior quando o fato impeditivo for de
caráter absoluto, ou seja, toda simples dificuldade, facilmente superável, ou que
onere mais o transporte, desde que não resulte em prejuízos extraordinários, não
caracteriza caso fortuito e força maior, visto que em todo negócio há a hipótese e
ocorrência de áleas e ricos próprios do empreendimento.
No mesmo sentido, GIBERTONI159 entende que: “(...) o
evento imprevisível, mas evitável, ou o imprevisível e inevitável, mas superável
quanto aos incidentes sobre a execução contratual, não constitui caso fortuito ou
força maior”.
Portanto, diante do exposto, se constata que para que o
transportador possa se beneficiar dessa excludente, deverá demonstrar que o
dano ocorreu única e exclusivamente por causa dos eventos imprevisíveis, ou
previsíveis, porém inevitáveis, eis que se restar caracterizado alguma falta, logo
incorrerá em culpa e responderá pelo dano. Porém, será necessário a analise de
caso in concreto.
e) Vício próprio.
ANJOS e GOMES160 definem que o vício próprio decorre da
natureza da própria carga que está sendo transportada, podendo ser imprevisível
ou previsível, sem que o dano sofrido tenha sido ocasionado por culpa do
transportador.
158 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 116. 159 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 360. 160 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 232.
78
Da mesma forma GIBERTONI161 define vício próprio como
“todo e qualquer evento danoso, seja previsível ou imprevisível, resultante da
própria natureza da carga transportada, sem que ocorra direta ou indiretamente,
por culpa do transportador”.
ANJOS e GOMES162 exemplificam e diferenciam vício
próprio de vício oculto na coisa, sendo que o primeiro ocorre quando uma carga
de natureza perecível venha a perecer antes da entrega e no segundo é
classificado como vício redibitório, que pode tornar a mercadoria imprópria ao uso
a que se destinava, ou lhe reduz o valor, face ao contrato comutativo.
Ressaltam ainda os mesmos autores, que há a possibilidade
de ocorrência de perdas ou avarias nas cargas, devido a própria fragilidade das
mesmas, ou da forma como foram embaladas para o transporte, como por
exemplo embalagens em caixa de papelão ou outro material frágil, ao invés de
caixa de madeira, para o armazenamento de latas ou tambores de óleo, etc.
Portanto, segundo GIBERTONI163, “o vício próprio da carga,
em si, é o defeito latente, que se manifesta durante a viagem, e que não era ou
não podia ser conhecido antes do início da viagem”.
Completa ANJOS e GOMES164 que:
Com efeito, desde que previamente ressalvado pelo armador ou seus prepostos, não cabe qualquer indenização, em casos de vício próprio, correndo por conta dos donos das mercadorias, durante o transporte, salvo na existência de cláusula expressa. Do contrário, o armador toma sobre si os riscos e os encargos das mercadorias suscetíveis de vício próprio, durante o transporte, se não ressalvar no conhecimento ou em outro documento hábil – a carta partida ou o protesto -, a menos que essa possibilidade seja, de forma tal, que em face da natureza da carga seria impossível a identificação ou previsão do risco, por ocasião do embarque.
161 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 361. 162 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 232. 163 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 361. 164 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 232.
79
Contudo, de acordo com ANJOS e GOMES165, há
entendimentos jurisprudenciais que não aceitam a ressalva como excludente de
responsabilidade, somente será aceito se houver indícios que o transportador
empregou todos os cuidados com a carga, com o objetivo de evitar a incidência
do vício próprio. Porém, discordam de tal entendimento, pois o transportador
estaria assumindo o risco da negligência ou imprudência do interessado,
descaracterizando o a finalidade do contrato, sobrepondo-se fatores meramente
econômicos, alheios ao interesse recíproco e à segurança da carga
transacionada.
Porém, destaca GIBERTONI166 que:
Nas hipóteses de vício próprio, caso fortuito ou força maior, cabe ao armador o ônus da prova. Ou seja, a prova de que os danos provierem desses fatos cabe ao transportador. Se este não se cercar de todas as cautelas devidas, ressalvando, por exemplo, a possibilidade de vício próprio, fica impraticável a produção da prova após a ocorrência do fato ou evento danoso por vício próprio. A ressalva no conhecimento, carta partida ou competente protesto marítimo faz presunção juris tantum de que a carga que vier a sofrer danos ou avarias teve previsão antecipada dos efeitos do vício, implicando, dessa forma, em limitação da responsabilidade do armador ou transportador, eis que a parte interessada – o dono da carga –, instada sobre a possibilidade do evento, não tomou nenhuma providência, razão pela qual não se pode permitir que se beneficie da sua própria negligência ou má-fé.
Portanto, diante de tais entendimentos, constata-se que vício
próprio é o defeito oriundo da própria carga, que venha resultar na perda ou
avariar a mesma durante a viagem, sem que fosse possível o seu conhecimento
antes do inicio da viagem, entretanto, para que seja possível a dessa excludente
de responsabilidade o armador deverá fazer constar ressalva na carta-partida,
conhecimento de embarque ou protesto, ou mediante cláusula expressa no
contrato.
165 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 232. 166 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 364.
80
3.4 OS TERMOS INICIAL E FINAL DA RESPONSABILIDADE D O
TRANSPORTADOR
De acordo com LANARI167, a responsabilidade do
transportador está diretamente relacionada com a obrigação de receber a carga a
bordo e organizá-las, incluindo a supervisão da estivação da carga.
Segundo LANARI168 a responsabilidade do armador
(transportador) no momento em que a carga deixa o piso do cais ou do caminhão
que a transportou, podendo ser içada por guindaste de bordo ou do porto. Porém
o transportador terá direito de regresso contra a entidade estivadora ou ao porto.
LANARI169 classifica que:
Podem surgir duas possibilidades no momento da estivação: a) o carregamento é feito com equipamento pertencente ao armador e, neste caso, obviamente, a responsabilidade, será deste último; b) o carregamento é feito com equipamento pertencente ao porto e, neste caso dever-se-ão distinguir duas hipóteses: 1. se a avaria aconteceu desde a posição ao lado do navio até o convés, o armador pode responsabilizar o porto e requerer indenização; 2. se a avaria aconteceu passada a altura do convés, dentro do porão, a responsabilidade será do armador, mesmo no caso de culpa do próprio guindasteiro.
Entende a mesma autora que no momento da descarga das
mercadorias o transportador tem a obrigação de agir com uma razoável diligência
no cuidado das mercadorias, porém terá o mesmo direito de regresso quando for
no momento do carregamento. Porém, após o descarregamento das mercadorias,
o transportador manterá depositadas as mercadorias por um tempo, para que a
fiscalização alfandegária proceda às devidas averiguações. No entanto, o
transportador irá entregar a mercadoria mediante recibo, com as devidas
ressalvas referentes às condições das mercadorias, a um armazém, que pode ser
de sua propriedade ou do porto e a responsabilidade transfere-se para esses.
167 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 124. 168 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 124. 169 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 124.
81
Ressalta LANARI170, que:
Em muitos conhecimentos, tem-se incluído a cláusula After Tackle, ou seja, após guincho ou talha, seguindo a qual a responsabilidade do armador cessa após o descarregamento das mercadorias. No entanto, esta cláusula não é unanimemente interpretada em todos os países, dado o direcionamento da jurisprudência norte-americana, segundo a qual, mesmo existindo essa cláusula, a responsabilidade só cessa após a entrega das mercadorias ao consignatário.
Por fim, entende LANARI171 que os acordos realizados entre
as partes a respeito da armazenagem, são perfeitamente válidos.
3.5. CLÁUSULAS EXONERADORAS AJUSTADAS ENTRE O
TRANSPORTADOR E O CARREGADOR
A doutrina denomina as cláusulas exoneradoras de
responsabilidade ajustadas entre o transportador e o carregador, como cláusula
de não responsabilidade ou cláusula de não indenizar.
3.5.1. Conceito Cláusulas exoneradoras
GIBERTONI172 entende que:
A cláusula de não indenizar ou a cláusula de irresponsabilidade é a
convenção das partes em isentar o devedor reparar o dano. Trata-se de
uma cláusula contratual acessória, destinada a afastar as normais
conseqüências da inexecução contratual.
ANJOS e GOMES173 afirmam que, a cláusula de não
indenizar – “É inserida nos contratos de transportes e afretamentos, com
finalidade específica de excluir a responsabilidade do transportador ou afretador”.
170 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 126. 171 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 126. 172 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 365 e 366. 173 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 237.
82
LANARI174 explica que o transportador, através da inserção
das cláusulas de exoneração, estará isento de indenizar a outra parte,
independentemente do adimplemento ou não de suas obrigações contratuais.
3.5.2. Vantagens da Cláusulas Exoneradoras
De acordo com LANARI175 a inserção das cláusulas
exoneradoras de responsabilidade gera um abatimento considerável no frete,
visto que o risco do transporte diminui consideravelmente.
Conforme GIBERTONI176, as cláusulas de não indenizar tem
como fundamento o princípio da autonomia da vontade e na liberdade de
contratar.
No entanto, segundo LANARI177 as cláusulas exoneradoras
deverão constar no conhecimento ou na carta partida de maneira expressa legível
e devidamente assinada assinado por seus carregadores, para que surta seus
efeitos legais.
3.5.3. Desvantagens das Cláusulas exoneradoras
GIBERTONI178 afirma que, a convenção de Bruxelas, de
1924, que dispõe sobre a responsabilidade do transportador, no que se referir às
mercadorias e ao estado de navegabilidade do navio, prevê a possibilidade da
inclusão das cláusulas de não indenizar, ressalvando que a manifestação não
seja contraria a ordem pública.
Porém, segundo a mesma autora, a referida Convenção
Internacional para Unificação de Certas Regras Concernentes aos
Conhecimentos Marítimos, de 25/08/1924, não foi ratificada pelo Brasil e não
poderá ser aplicada.
174 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 127. 175 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 127. 176 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 366. 177 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 127. 178 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 370.
83
A Súmula 161 do STF dispõe que: “Em contrato de
transporte, é inoperante a cláusula de não indenizar”.
Ressalta Eduardo de Avelar Lamy179 que:
Aos olhos da ordem jurídica brasileira, portanto, as bases legais
em que se fundam os contratos internacionais de transporte
marítimo, comprovados pelos conhecimentos de transporte, as
chamadas Bill of Ladings, não apenas desrespeitam a Lei de
Introdução ao Código Civil, mas também revelam-se verdadeiros
contratos de adesão, nos termos do Código de Proteção e Defesa
do Consumidor (CDC, art. 54), na medida em que impossibilitam
as discussão de cláusulas contratuais pelos contraentes,
retirando-lhes a autonomia da vontade.
Portanto, diante de tais entendimentos constata-se que, a
legislação brasileira não aceita o conteúdo contido nas cláusulas de não indenizar
inserida na carta-partida ou no conhecimento de embarque.
3.6. LEGISLAÇÃO ESPECIAL APLICÁVEL AO CONTRATO DE T RANSPORTE
MARÍTIMO
De acordo com o anteriormente exposto, se percebe que o
Brasil não ratificou o tratado internacional que dispõe sobre as regras de
responsabilidade do transportador marítimo, portanto, não há aplicabilidade em
território nacional.
Porém, segundo GIBERTONI180 a Legislação pátria ainda
não codificou detalhadamente a maneira como se deve proceder nesses casos,
nem vedando ou permitindo a inclusão das cláusulas de não indenizar nos
contratos de transporte marítimo internacionais.
179 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legi slação aplicável e competência . In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. Vol. II. Florianópolis: OAB/SC, 2005, p. 411. 180 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 371.
84
Contudo, de acordo com o art. 9º da Lei de Introdução ao
Código Civil, aplicar-se-á a lei brasileira para as obrigações aqui constituídas.
Portanto, aos contratos de transporte marítimo internacional celebrado pelos
importadores ou exportadores brasileiros junto aos armadores estrangeiros, os
conflitos oriundos destes, poderão ser dirimidos pela legislação brasileira181.
Completa Orlando Morais Filho182 que:
Ainda, percebe-se que o conforme o art. 88 do CPC183, o foro competente para dirimir questões acerca da responsabilidade civil no transporte marítimo quando o comerciante for nacional ou possuir domicílio no Brasil, e da mesma forma quando no Brasil for o cumprimento da obrigação ou de responsabilidade de evento acontecido no mesmo pode ser o foro brasileiro.
Da mesma forma esclarece Osvaldo Agripino de Castro
Junior184:
Assim, pode-se inferir que um Conhecimento de Embarque emitido no Brasil estará sempre sujeito à legislação brasileira, já que a nossa doutrina não admite a autonomia da vontade das partes para escolher a lei aplicável a um contrato, de modo que, qualquer cláusula de Conhecimento de Embarque emitido no país que remeta a uma lei estrangeira ou a uma Convenção Internacional não ratificada pelo Brasil não terá validade. Todavia, modernamente a tendência mundial é da adoção de convenções internacionais que expressamente deixam às partes escolher o direito aplicável às obrigações contratuais internacionais.
181 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legi slação aplicável e competência . In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. Vol. II. Florianópolis: OAB/SC, 2005, p. 418. 182 MORAIS FILHO, Orlando. Limites e responsabilidade da aplicação do Código d e Defesa do Consumidor no contrato de transporte marítimo. Monografia do Curso de Direito CESUSC, 2006. p. 45. 183 Art.88. É competente a autoridade judiciária brasileira quando: I – o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil; II – no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação; III – a ação se originar de fato ocorrido ou de fato praticado no Brasil. Parágrafo Único. Para fim do disposto no nº I, reputa-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que aqui tiver agência, filial ou sucursal. 184 CASTRO JUNIOR, Osvaldo Agripino de. A Aplicação do código de defesa do consumidor ao contrato de transporte marítimo . Mimeo, 2005. p. 10.
85
Diante do exposto, conforme LAMY185, os contratos de
transporte marítimo internacionais, tais como o Bill of Ladings, firmados no Brasil
são considerados como contratos de adesão, visto que não há discussão das
cláusulas previamente e o Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC)
veda expressamente tal prática no seu art. 54 e o Código Civil dispõe, nos seus
art. 423 e 424, a nulidade das cláusulas que estipulem renúncia antecipada de
direitos.
3.6.1 Código Civil
Como anteriormente assinalado, o Código Civil poderá ser
aplicado aos contratos de transporte marítimo, principalmente quando estamos
diante de Bill of Ladings (B/L) que vem redigido, de maneira que não possibilita ao
importador ou exportador brasileiro de discutir qualquer das cláusulas, ocorrendo
o desequilíbrio contratual.
Nesse sentido LAMY186 entende que:
(...) será aplicável o sistema do CC e as cláusulas de tais compromissos também poderão ser consideradas nulas em razão do desequilíbrio contratual havido, pois a maioria delas refere-se à própria natureza do negócio (CC, art. 424), o que também poderá ocorrer em razão das possibilidades trazidas pelo abuso de direito praticado pelos armadores (CC, art. 187).
Carlos Roberto Gonçalves apud LAMY187acrescenta que:
Tendo em vista que o contrato de adesão é integralmente elaborado pelo policitante, economicamente mais poderoso, e que o aderente limita-se a aderir às cláusulas preestabelecidas, sem poder de discuti-las, é dever do primeiro redigi-las com clareza, precisão e simplicidade.
185 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legi slação aplicável e competência . In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. Vol. II. Florianópolis: OAB/SC, 2005, p. 411. 186 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legi slação aplicável e competência . In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. Vol. II. Florianópolis: OAB/SC, 2005, p. 421. 187 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legi slação aplicável e competência . In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. p. 421.
86
A Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem se
manifestado em considerar como não escrito no contrato quando houver cláusula
limitadora da responsabilidade ou cláusula de não indenizar, ou seja, segue o
entendimento que tais cláusulas ferem os preceitos da legislação pátria e não
contém qualquer validade no ordenamento jurídico brasileiro.
Dessa forma já decidiu a Terceira Turma do STJ188:
REsp 29121 / SP ; RECURSO ESPECIAL 1992/0028623-2
CIVIL E COMERCIAL - SEGURO - TRANSPORTE MARITIMO - INDENIZAÇÃO - CLAUSULA LIMITATIVA DA RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR – SUMULA 161, DO STF.
I- REPUTA-SE NÃO ESCRITA QUALQUER CLAUSULA LIMITATIVA DA OBRIGAÇÃO DE NÃO INDENIZAR, EM CONTRATO DE TRANSPORTE MARITIMO, O VALOR CAPAZ DE TORNAR IRRISORIA A INDENIZAÇÃO RELATIVA AOS DANOS CAUSADOS.
II- PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
III- RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
Portanto, diante de tais entendimentos, resta devidamente
caracterizada a aplicabilidade do Código Civil nos contratos de transporte
marítimo.
3.6.2 Código de Defesa do Consumidor
Segundo LAMY189, para que o Código de Defesa do
Consumidor (Lei 8.078/90) incida sobre os contratos de transporte marítimo, será
necessário a caracterização do desequilíbrio contratual havido entre as partes,
sendo classificado uma consumidora e a outra fornecedora.
188 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso 3 a Turma 16.12.92 . Relator: Ministro Waldemar Zveite. Diário de Justiça. 22 de março de 1993, página 4540. 189 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legi slação aplicável e competência . In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. p. 419.
87
O art. 2º do CDC define consumidor, sendo toda pessoa
física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
A respeito do conceito de consumidor, Claudia Lima
Marques190 entende que:
O legislador brasileiro parece ter, em princípio, preferido uma definição mais objetiva e consumidor. O art. 2º do Código afirma expressamente que consumidor é “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. Na definição legal, a única característica restritiva seria a aquisição ou utilização do bem como destinatário final. Certamente esse destinatário final é retirar o bem de mercado (ato objetivo), mas se o sujeito adquire o bem para utiliza-lo em sua profissão, adquire como profissional (elemento subjetivo), com fim de lucro, também deve ser considerado “destinatário final”? A definição do art. 2º do CDC não responde à pergunta, é necessário interpretar a expressão “destinatário final”.
Portanto, percebe-se que há uma problemática a respeito do
conceito de destinatário final, onde poderá ser aquele que simplesmente retira do
mercado, ou aquele que retira do mercado, mas que sua finalidade não poderá
fazer parte da cadeia de produção.
O dilema acima exposto fez fundir duas correntes, sendo
uma finalista e a outra maximalista.
MARQUES191 assevera que:
Destinatário final é aquele destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo, segundo esta interpretação teleológica não basta ser destinatário fático do produto, retira-lo da cadeira de produção, leva-lo para o escritório ou residência, é necessário ser destinatário final econômico do bem, não adquiri-lo para uso profissional, pois o bem seria novamente um instrumento de produção cujo preço será incluído
190 MARQUES, Cláudia Lima, Contratos no código de defesa do consumidor. o novo regime das relações contratuais. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 253. 191 MARQUES, Cláudia Lima, Contratos no código de defesa do consumidor. o novo regime das relações contratuais. p. 253 e 254.
88
no preço final do profissional que o adquiriu. Neste caso, não haveria a exigida “destinação final” do produto ou o serviço.
Esta interpretação restringe a figura do consumidor àquele que adquire (utiliza) um produto para uso próprio de sua família, consumidor seria o não profissional, pois o fim do CDC é tutelar de maneira especial um grupo da sociedade que é mais vulnerável. Consideram que restringindo o campo de aplicação do CDC àqueles que necessitam de proteção para estes, pois a jurisprudência será construída em casos, onde o consumidor era realmente a parte mas fraca da relação de consumo e não sobre casos em que profissionais – consumidores reclamam mais benesses do que o Direito Comercial já lhes concede.
Note-se que, de uma posição inicial mais forte, influenciada pela doutrina francesa e belga, como veremos, os finalista evoluíram para uma posição mais branda, se bem que sempre teleológica, aceitando a possibilidade do Judiciário, reconhecendo a Vulnerabilidade de uma pequena empresa ou profissional, que adquiriu, por exemplo, um produto fora de seu campo de especialidade, interpretar o art. 2º de acordo com o fim da norma, isto é, proteção ao mais fraco na relação de consumo, e conceder a aplicação da normas especiais do CDC analogicamente também a estes profissionais.
Diante do acima exposto, para a teoria finalista, entende-se
que para que seja considerado uma relação de consumo, o destinatário final não
poderá adquirir um produto ou serviço quando a pessoa for incluir o produto ou
serviço na sua cadeia produtiva, porém a referida teoria tem aceito que figure
como consumidor o proprietário da pequena empresa, podendo ser ela
exportadora ou importadora.
LAMY192 é adepto da teoria finalista e entende que os
importadores e exportadores não são consumidores, visto que suas atividades
estão, por natureza, inseridas na atividade econômica, muito embora reconheça o
desequilíbrio contratual em favor dos armadores prestadores de serviço de
transporte internacional, em virtude do regime jurídico do B/L.
192 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legi slação aplicável e competência . In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. p. 419.
89
A corrente maximalista prega que não há necessidade de
que o produto ou serviço tenha como destinatário final a pessoa que utilizar sem
que obtenha lucro ou integre a sua cadeia produtiva, visto que esse pensamento
entende que consumidor é aquela pessoa física ou jurídica que adquire um
produto ou serviço, e pelo simples fato de retirar do mercado assume essa
condição.
Dessa forma, MARQUES193 entende que:
Já os maximalistas vêem nas normas do CDC o novo regulamento do mercado de consumo brasileiro, e não normas orientadas para proteger somente o consumidor não-profissional. O CDC seria um Código geral sobre o consumo, um Código para a sociedade de consumo, o qual institui normas e princípios para todos os agentes do mercado, os quais podem assumir os papéis ora de fornecedores, ora de consumidores. A definição do art. 2º deve ser interpretada o mais extensivamente possível, um número cada vez maior de relações de mercado. Consideram que a definição do art. 2º é puramente objetiva, não importando se a pessoa física ou jurídica tem ou não o fim de lucro quando adquire um produto adquire um produto ou utiliza um serviço.
LAMY194 esclarece que a corrente doutrinária e
jurisprudencial maximalista, classifica como consumidor o exportador que fica
com o ônus do transporte, como ocorre nas vendas CIF (cost. Insurance end
Freight) ou quando pelo importador brasileiro, especialmente pela FOB (Free on
Board), sendo que na primeira situação o exportador fica responsável pelo
pagamento do frete e na segunda o importador.
CASTRO JUNIOR195, entende que aos contratos de
transporte de mercadorias (goods) aplica-se inicialmente o Código Civil, a fim de
se apurar a responsabilidade civil, constante no art. 732. Por outro lado, poderá
193 MARQUES, Cláudia Lima, Contratos no código de defesa do consumidor. o novo regime das relações contratuais. p. 254 e 255. 194 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legi slação aplicável e competência . In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. p. 420. 195 CASTRO JUNIOR, Osvaldo Agripino de. Aspectos destacados do contrato de transporte marítimo em face do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil . Mimeo, 2005. p. 40.
90
ser aplicado de maneira subsidiária o CDC, desde que devidamente demonstrada
a vulnerabilidade na relação contratual.
Completa CASTRO JUNIOR196 que em virtude do princípio
da especialidade, tratando-se de responsabilidade civil, aplicar-se-á as
convenções e tratados constantes no contrato, ressalvado se os países das
partes contratantes ratificaram os mesmos, bem como de maneira subsidiária o
Código Civil, Código Comercial, e Código de Defesa do Consumidor, desde que
não contrarie nenhuma das legislações anteriormente citada.
O Superior Tribunal de Justiça197 assim tem decido:
Resp 302212 / RJ ; RECURSO ESPECIAL 2001/0010266-2. Julgamento. 07/06/2005
RECURSO ESPECIAL AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. TRANSPORTE MARÍTIMO. PRESCRIÇÃO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO. I - A seguradora sub-roga-se em todos os direitos do segurado, em relação à restituição do valor integral pago a título de indenização pelo prejuízo sofrido pelo consumidor. II - Em caso de ação de indenização decorrente de dano causado em mercadoria durante transporte marítimo, aplica-se a prescrição prevista no artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor. Recurso especial não conhecido.
Portanto, diante de tais entendimentos, constata-se que é
possível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos Contratos de
Transporte Marítimo Internacionais.
3.6.3 Tratado de transporte multimodal do Mercosul.
O Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul é um
acordo firmado entre o Governo da República Argentina, da República do
Paraguai, da República Oriental do Uruguai e da República Federativa do Brasil,
que tem por escopo um aproveitamento mais eficaz da infratrutura de transporte
dos Estados Partes, contribuindo para a redução dos custos operacionais de
196 CASTRO JUNIOR, Osvaldo Agripino de. A aplicação do código de defesa do consumidor ao contrato de transporte marítimo . Mimeo, 2005. p. 16. 197 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso 3 a Turma 07.06.05 . Relator: Ministro Castro Filho. Diário de Justiça. 27 de junho de 2005, página 362.
91
transporte na região, levando-se em conta os princípios essenciais do Tratado de
Assunção.
Destaca-se de maior relevância para a presente monografia
os capítulos III, IV e V, eis que tratam do Conhecimento de Transporte Multimodal
e da responsabilidade do Operador de Transporte Multimodal e responsabilidade
do Expedidor.
3.6.3.1 Do Documento ou Conhecimento de Transporte Multimodal.
O Documento ou Conhecimento de Transporte Multimodal é
emitido pelo Operador de Transporte Multimodal, no momento em que toma a
mercadoria em custódia, onde poder valer como título negociável ou não, ficando
a critério do Expedidor198.
Terá vigência em todos os países integrantes do acordo199.
Para que o sejam aplicáveis as disposições do acordo, no
instrumento deverá constar no documento a frase “Acordo de Transporte
Multimodal – MERCOSUL” e prevalecerá sobre as outras cláusulas constantes no
contrato que lhes forem contrárias, salvo quando aumenta a responsabilidade e a
obrigação do Operador de Transporte Multimodal. Entretanto, o Operador não
inscrito ou que não cumpra o disposto no Acordo não poderá gozar seus
benefícios200.
O Operador poderá fazer constar ressalvas no
Conhecimento de Transporte quando as condições da carga descrita no
documento forem iguais as que estiverem sendo transportadas201.
198 Artigo 3° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. 199 Artigo 3° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. 200 Artigo 4° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. 201 Artigo 5° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul.
92
3.6.3.2 Responsabilidade do Operador de Transporte Multimodal
A responsabilidade o Operador de Transporte Multimodal
tem início no momento em que toma a carga em seu poder e termina quando for
entregue ao destinatário ou consignatário202.
O Operador será responsável pelas ações e omissões de
seus empregados ou agentes no exercício de suas funções e empregará todos os
cuidados necessários para o transporte da carga, sob pena de ser
responsabilizado pelos danos sofridos na mercadoria, bem como pelos prejuízos
resultantes do atraso na entrega, se o expedidor tiver feito uma declaração de
interesse pela entrega em um prazo determinado e se a mesma tiver sido aceita
pelo Operador de Transporte Multimodal203.
O Operador de Transporte Multimodal não será
responsabilizado se provara que perda for por causa de: a) ato ou fato imputável
ao expedidor, ou ao destinatário, ou ao consignatário da carga, ou a seus
agentes, representantes ou procuradores; b) vício próprio ou oculto da carga; c)
força maior ou caso fortuito, devidamente comprovados; d) greves, motins ou
"lock-out"; e) Dificuldades impeditivas do transporte e outros atos fora do controle
do Operador de Transporte Multimodal devidamente comprovados, não existindo
outra forma de cumprir o contrato204.
O Operador de Transporte Multimodal e todas as pessoas
físicas ou jurídicas que intervenham por disposição do mesmo para a
movimentação das cargas serão responsáveis pelo aumento das perdas, danos
ou avarias e atrasos na entrega das mercadorias a que derem causa, ainda que
não admitam a referida responsabilidade205.
No caso de atraso na entrega da mercadoria, quando não foi
previamente acordado tempo de entrega, será calculado um tempo razoável em
202 Artigo 6° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. 203 Artigo 7° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. 204 Artigo 10 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 205 Artigo 9° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul.
93
que se normalmente levaria para realizar o transporte, tomando em consideração
as circunstâncias do caso206.
Se passados 90 dias corridos depois da data da entrega
estabelecida, o consignatário ou qualquer outra pessoa com direito de reclamar
as mercadorias, poderá considerá-las perdidas207.
O valor da indenização será fixado de acordo com o valor
das mercadorias, constante em uma bolsa de mercadorias, ou na sua falta, com
observância do preço que tenham no mercado ou, se não se dispuser dessa
quotação nem de seu preço, segundo o valor usual de mercadorias de igual
natureza e qualidade208.
Salvo se a natureza e o valor das mercadorias tenham sido
declarados no conhecimento pelo expedidor antes que o Operador de Transporte
Multimodal tenha as tomado em sua posse, o mesmo não será responsabilizado
por nenhuma perda ou dano sofrido na carga, por valor além do limite de
responsabilidade que cada Estado Parte, fixada no presente tratado209.
Se houver perda ou dano em um trecho determinado, onde
estiver sobre a égide de outra Convenção Internacional ou determinada Lei
imperativa, que fixar outro limite de responsabilidade do que o especificado nesse
acordo aplicar-se-á o limite da Convenção Internacional ou a Lei imperativa210.
Se o Operador de Transporte Multimodal for responsável a
indenizar as perdas e danos ocorridos na carga, o valor da indenização não
poderá ser superior o valor do frete ou os limites de responsabilidade das
mercadorias, salvo se restar devidamente comprovado que o Operador tenha
origem em uma ação ou omissão a ele imputada, com dolo, ou culpa grave211.
206 Artigo 11 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 207 Artigo 11 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 208 Artigo 12 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 209 Artigo 13 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 210 Artigo 15 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 211 Artigo 16 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul.
94
Responde solidariamente com o Operador de Transporte
Multimodal, o seguimento que restou claramente identificado e comprovado a sua
culpa na execução do contrato, sem prejuízo do direito de regresso212.
3.6.3.3 Responsabilidade do Expedidor
O expedidor deverá garantir a exatidão das mercadorias no
momento em que o Operador de Transporte Multimodal toma-as sob sua
custódia, de todos os dados relativos à natureza geral das mercadorias, suas
marcas, números, peso, volume e quantidade e, se procedente, o seu caráter
perigoso, proporcionado por ele próprio ou por meio de outra pessoa que atue em
seu nome, para inclusão no Documento ou conhecimento de Transporte
Multimodal213.
O expedidor será responsável pelos prejuízos causados
pelas inexatidões ou insuficiências dos dados antes mencionados, ainda que
tenha transferido o documento ou conhecimento de transporte multimodal214,
Porém, o Operador de Transporte Multimodal, mesmo tendo
direito ao ressarcimento do Expedidor, tal direito não limitará a responsabilidade,
em virtude do contrato de transporte multimodal, com relação a qualquer pessoa
distinta215.
212 Artigo 19 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 213 Artigo 20 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 214 Artigo 20 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 215 Artigo 20 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul.
95
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como objetivo destacar a
Responsabilidade Civil do Transportador no Contrato de Transporte Marítimo
Internacional de Mercadoria, face as avarias ocorridas durante a viagem.
Para seu desenvolvimento lógico, o trabalho foi dividido em
três capítulos.
O primeiro tratou das Noções Gerais sobre
Responsabilidade Civil, iniciando-se pelos aspectos históricos da
Responsabilidade Civil. Após, abordou-se a respeito do conceito e elementos,
sendo que Responsabilidade Civil é o dever de indenizar que uma pessoa possui
em virtude da violação de direito de outrem, seja no âmbito patrimonial ou
extrapatrimonial, tendo como elementos a ação ou omissão, culpa ou dolo do
agente e a relação de causalidade.
Em seguida, destacou-se as espécies e formas da
Responsabilidade Civil, sendo as espécies contratual e extracontratual e as
formas subjetiva e objetiva. Em síntese, a Responsabilidade Civil Contratual está
diretamente ligada à violação de um contrato previamente firmado, podendo
incorrer o agente causador em culpa ou não, sendo nesse último caso a
Responsabilidade Civil Objetiva. Entretanto, a Responsabilidade Civil
Extracontratual está relacionada a prática de ato ilícito e é imprescindível a
caracterização da culpa do agente causador do dano, ou seja, ocorrendo somente
na forma subjetiva.
Por fim, demonstrou-se a possibilidade do agente causador
do dano não reparar o dano, ou, ao menos amenizar a quantia a ser indenizada,
desde que o agente se encontre em qualquer dessas situações: estado de
necessidade; legítima defesa; exercício regular de direito e estrito cumprimento de
um dever legal; caso fortuito e força maior; culpa exclusiva da vítima; fato de
terceiro.
96
O segundo capítulo foi destinado a apresentar
considerações sobre os Contratos de Transporte e suas Relações Internacionais.
Estudou-se o conceito, espécies e formas com seus
requisitos e elementos, concluindo-se que o contrato de transporte é um tipo de
contrato que gera obrigações para as duas partes, sendo a prestação do serviço
pelo transportador e a outra o dever de remunerar da forma ajustada, podendo
ser Contrato de Transporte de pessoas ou coisas, sob a forma terrestre, aérea,
marítima, fluvial ou lacustre.
No transporte de coisas constatou-se uma divergência
doutrinária no sentido de caracterizar como parte no contrato, ou seja, há
entendimentos que classificam como parte o remetente e o transportador, em
contrapartida, alguns autores entendem que o destinatário ou consignatário figura
também como parte.
O remetente tem o dever de fornecer o endereço exato do
local da entrega da mercadoria ao transportador, sob pena de responder por
perdas e danos.
O Transportador tem o dever de entregar a coisa no local
descrito no conhecimento de transporte, emitido pelo mesmo e entregue ao
remetente endossado para que possa receber a coisa. Porém, o destinatário deve
conferi-la e apresentar reclamações no prazo de 10 dias, salvo quando não
perceptível a primeira vista ou dano parcial na coisa, desde que denunciado pelo
mesmo prazo, a contar da data da entrega.
Finalizou-se o segundo capítulo com as Convenções e
Tratados Internacionais acerca dos Contratos de Transporte Marítimo,
constatando-se que devido ao sistema de recepção dos Tratados Internacionais,
previsto na Constituição Federal, nem todos os Tratados Internacionais, que hoje
são aplicados foram devidamente recepcionado, gerando nulidades contratuais.
No último capítulo tratou-se dos Contratos de Transporte
Marítimo Internacional de Coisas e a Responsabilidade Civil do Transportador.
97
Constatou-se que, o Transporte Marítimo Internacional é um
acordo escrito pelo qual o armador se compromete a transportar mercadorias por
água, numa expedição marítima, recebendo em troca uma quantia em dinheiro
denominada frete, encontrando-se previsto no art. 566 do Código Comercial
Brasileiro.
Pôde-se identificar que os contratos de Transporte Marítimo
podem ser de duas formas: carta-partida ou conhecimento de embarque. Carta-
partida (Charter Party) ocorre quando o Navio é tomado a frete por inteiro e o
conhecimento de embarque (Bill of lading) quando a tomada é parcial.
Identificou-se também, que as principais avarias são as
avaria grossa e avaria particular.
Avaria Grossa verifica-se quando o transportador, com o
objetivo de salvaguardar o bem comum, para evitar maiores danos até mesmo a
sua própria integridade física, decide sacrificar a carga, ou transferi-la para outro
navio, sendo que nesses casos a responsabilidade do transportador é
compartilhada entre todos os interessados.
Avaria Particular é a oriunda de caso fortuito ou força maior.
Não há intervenção de vontade humana, porém o transportador responde no caso
de imprudência, imperícia ou negligência, de dolo do comandante, equipagem ou
empregados do armador, podendo ser até terceiros.
Destacou-se que é possível ao transportador marítimo
eximir-se da reparação do dano, quando for constatado alguma causa de
excludente de responsabilidade, tais como ausência de nexo causal, culpa
exclusiva da vítima, fato exclusivo de terceiro, caso fortuito ou força maior e vício
próprio.
Verificou-se que o termo inicial da responsabilidade do
transportador dá-se no momento em que a carga deixa o piso do cais ou do
veículo que a transportou, podendo ser içada por guindaste de bordo ou do porto.
Porém o transportador terá direito de regresso contra a entidade estivadora ou ao
porto.
98
O termo final ocorre quando o transportador entrega a
mercadoria a um armazém, em que o proprietário do armazém emitirá um recibo
de recebimento, com as devidas ressalvas se houver, ao transportador. O
armazém poderá ser de propriedade do Armador ou do Porto e a
responsabilidade transfere-se para esses.
Importante foi conceituar e identificar as vantagens e
desvantagens das Cláusulas Exoneradoras de Responsabilidade ajustadas entre
o transportador e o Carregador, visto que é pratica comum no mercado de
trabalho hoje, eis que os bill of lading (conhecimento de embarque) são
estruturados sob as regras da Convenção Internacional para Unificação de Certas
Regras Concernentes aos Conhecimentos Marítimos de 25/08/1924, realizada em
Bruxelas. São também denominada de cláusulas de não indenizar ou de
irresponsabilidade, em que isenta o devedor de reparar o dano, possui caráter
assessório, visto que se destina a afastar as normais conseqüências da
inexecução contratual.
A inclusão das referidas cláusulas gera um considerável
abatimento no frete, tendo em vista que o risco do transportador diminui na
mesma proporção.
No entanto, tendo em vista que o Brasil não ratificou a
referida convenção de Bruxelas e as regras por ela imposta não são aplicáveis
neste país, conforme já sumulado pelo Supremo Tribunal Federal – Súmula 161.
Portanto, como as regras da Convenção de Bruxelas não
são aplicáveis ao sistema jurídico brasileiro, aplicar-se-á subsidiariamente o
Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor no que forem compatíveis.
A aplicabilidade de tais legislações é possível por força do
art. 9° da Lei de Introdução do Código Civil, que p revê a aplicabilidade da lei
brasileira para as obrigações aqui constituídas. Portanto, os contratos de
transporte marítimo internacional celebrado pelos importadores ou exportadores
brasileiros junto aos armadores estrangeiros, poderão ter seus conflitos dirimidos
pela legislação brasileira.
99
Quanto a regência pelo Código Civil ou Código de Defesa do
Consumidor há divergência na classificação ou não o importador ou exportador
brasileiro como consumidor.
No entanto, para as duas legislações é evidente o
desequilíbrio contratual, visto que os Bill of ladings (conhecimentos de embarque)
são contratos prontos, em que não são discutidas as cláusulas, caracterizando
contrato de adesão com cláusulas leoninas.
Destacou-se, ao final do terceiro capítulo, algumas
considerações a respeito do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul, onde
observou-se alguns aspectos a respeito do Documento ou Conhecimento de
Transporte Multimodal, Responsabilidade do Operador de Transporte Multimodal,
bem como da Responsabilidade do Expedidor.
Por fim, retoma-se as duas hipóteses levantadas com a
pesquisa:
A primeira hipóse restou comprovada, visto que, conforme
demonstrado, o transportador somente poderá se eximir da responsabilidade
reparatória, caso tenha tomado todas as medidas de segurança para a carga,
tenha provado a ausência de nexo causal entre o fato danoso e a conduta do
Transportador Marítimo, tenha ocorrido por culpa exclusiva do remetente, por fato
exclusivo de terceiro, ou, ainda, por vício próprio da mercadoria.
A segunda hipótese restou também confirmada, embora na
prática, as cláusulas de não indenizar estejam inseridas nos Bill of lading, não
possuem valor jurídico nesse país, visto que o Brasil não ratificou a convenção de
Bruxelas de 1924, bem como tais normas ferem princípios de ordem pública, ante
a renúncia prévia de direitos, ocasionando o desequilíbrio contratual entre as
partes.
Dessa maneira, vale registrar que foram confirmadas as
duas hipóteses levantadas no início da pesquisa.
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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso 3a Turma 07.06.05 . Relator:
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