bico de papagaio · rio de janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos...

67
BICO DE PAPAGAIO Fabio Daflon

Upload: others

Post on 04-Nov-2020

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

BICO DE

PAPAGAIO

Fabio Daflon

Page 2: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Perché la vita è dolore e l’amore godimento è un anestetico. Life is pain and the enjoyment of love is an anesthetic.

— Cesare Pavese In Il mestiere di vivere (1947), 78. Translated as The Burning Brand: Diaries

1935-1950 (1961), 90.

Page 3: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Agradecimentos

Entre os organicistas e os não organicistas da área psi fico com os segundos, que acreditam mais nas causas intrapsíquicas como objeto de investigação e tratamento via psicoterapia do que no cômodo e nem sempre eficaz tratamento com psicotrópicos apenas, que tem suas indicações, mas não são absolutos como nada é na medicina, que, na psiquiatria demanda dos psicoterapeutas, sejam eles médicos ou psicólogos que não deixem de considerar a possibilidade da existência desde tumores cerebrais até às síndromes mentais orgânicas, cujas etiologias e tratamentos não cabe discutir aqui, sendo aberta entretanto uma exceção para um alerta que é o de que apenas cerca de 50% das doenças mentais senis são verdadeiramente Alzheimer, os demais casos reais são demências de outras naturezas; cabendo ressaltar que tal ou qual remédio para retardar ou não o avanço da doença dependeria da existência de estudos duplos-cegos em que metades dos pacientes tomariam medicamento e a outra metade não, a fim de verificar qual das duas metades teria melhor qualidade de vida, como tal tipo de estudo é questionável eticamente, não foi realizado. Feito assim este protesto contra a alzheimerização da vida, o agradecimento inspirador vai para o Dr Julio de Mello Filho da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão, que recentemente me acolheu como paciente em 2015 para períodos de internação no Serviço de Psiquiatria para desintoxicação medicamentosa, acontecida em outro hospital de saúde mental, salvando-me a vida, sendo eu mesmo um exemplo de que em certos casos o médico não organicista, mas com conhecimento de psicotrópicos e dos seus efeitos colaterais tem condições de até mesmo combater com antídotos e tratar iatrogenias causadas por profissionais extremamente organicistas, que creem em remédios além de tudo.

Last but not least, agradeço ao Dr. Ruy Perini, medico psiquiatra em Vitória, autor do livro tese de mestrado no Centro de Ciências e Letras da Universidade Federal do Espírito Santo Não há remédio certo, sobre os pensamentos pioneiros em saúde mental no Brasil de Machado de Assis, com ênfase em seu conto O alienista, que caracteriza Machado, como um pensador da anti-psiquiatria bem antes que essa escola da psicologia e da psiquiatria surgisse nos anos sessenta do século XX.

Vitória, ----/----/---- Fabio Daflon

Page 4: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Apresentação Bico-de-papagaio é uma planta (arbusto de até 4 m ( Euphorbia

pulcherrima ) da fam. das euforbiáceas, de tronco e ramos claros, lenhosos, folhas decíduas e flores amarelas, globosas, em umbelas, cercadas por brácteas lanceoladas, vermelho-sangue, em verticilos de até 40 cm de diâmetro; asa-de-papagaio, cardeal, flor-de-papagaio, folha-de-papagaio, folha-de-sangue, gigante, manhã-de-páscoa, papagaio, parece-mas-não-é, poinséttia, rabo-de-arara [Nativo da América Central, é muito cultivado como ornamental e esp. associado ao Natal; fornece tintura amarela e vermelha, tem inúmeras propriedades medicinais e variedades com brácteas amareladas, brancas ou róseas), mas aqui é como se chama popularmente afecção de coluna que cause dor, mas também é um bico falante que reclama da dor, daí a analogia do curupaco com a dor lombar e o caráter rabugendo de alguns papagaios. Já tendo sido publicado o livro sobre os gigantes da alma Humor, sob o título Sovacos: poesia sob os braços, já tendo sido entregue ao editor Saulo Ribeiro, da Editora Cousa, o livro sobre o gigante Ira, sob o título O sal do destempero, este Bico de Papagaio contem poemas sobre a dor relacionada aos sofrimentos psicossomáticos. Embora a dor psicogênica não mude ninguém, porque mais importante do que se conhecer é se compreender, isto é, saber a razão de alguma coisa, sendo a consciência o remédio para os males da alma, a dor sinaliza e é um gigante capaz de fazer o homem se dobrar a ela; cabendo aqui ressaltar o heroísmo das pessoas que resistam à tortura, ignóbil, que por razão semelhante fazem que não tratemos nos poemas do sadomasoquismo, mas a dor faz parte inclusive do prazer dela se obter alívio, essa é a dor que sinaliza a quebra da homeostase, não dor de fraturas infligidas conscientemente ao outro ou à si mesmo como forma de prazer ou de maldade.

Fábio Daflon é especializado em medicina psicossomática pelo Instituto de Medicina Psicossomática do Rio de Janeiro, quando escolheu sua especialidade médica, antes de optar pela pediatria, cambaleou em dúvidas entre ela e a área psi. Mas decidiu não fazer psiquiatria porque julgavasse e julgasse incapaz de tratar de pessoas com distúrbios mentais graves; e como psicossomaticista atuou de forma pontual e e prevenção de distúrbios psicológicos (principalmente tangentes à criança com personalidade passivo-dependente), este ano comemora quarenta anos de formado com a sua da Faculdade de Ciências Médicas do Estado do Rio de Janeiro de 1978 – Turma FCM 1978.

Apesar da alguma qualificação como psicossomaticista, Fabio Daflon não cumpriu a exigência de apresentar e defender monografia ao final do curso, sendo então especializado, mas não especialista, como é em pediatria. Natural que escreva poemas como ser humano que sofreu dores e que as mitigou em outros quando pode. Esperamos assim que a leitura não seja dolorosa ao leitor, embora compreender a dor para se conhecer melhor é ao que o poeta se proponha.

Alguns personagens do Boteco Sovaco das Estrelas onde é a sede da Academia dos Biriteiros de Boteco, e onde foi fundada a filosofia hidropônica-etílica dos que mantem a fé de que cachaça é água porque ambas nos fazem flutuar, e porque se sabe que no amor só é bebida a embriaguez, falamos de Meril Stripper a nossa espião ao estilo Mata Hari, hari, hari, Krishna Hari,

Page 5: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

caçadora de homens de verdade e terapeuta sexual e Dumbo – o elefante drone que descobre axilas no mundo para o Troféu Moela Crua, já falado no livro Sovacos: poesia sob os braços que, cordialmente, remete o leitor a esse livro dos oito gigantes da alma, como já dito, relacionado com o Humor, como a Dor também deve ser. Boa leitura.

Vitória, 22 de janeiro de 2018. Stanislaw Balner

Page 6: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

A dor de não partir

O esmagamento em que a dor humilha àquele fóbico a quem aprisiona, a lhe mostrar que é dele a própria filha, a lhe mostrar que manda, que é a sua dona, é a dor mais ingnóbil que causa sofrimento, por ser o medo em não sair de casa, é a dor autoinflingida, é a dor que mente, é a dor que ao pensamento amputa a suas asa; não define o sujeito nem como um sádico nem como um masoquista; é a dor narcisista do que em recolhimento torna-se o artista, dor do pudor extremo que sente o pudico, dor de quem se odeia, e, intervencionista, aplica em si o golpe que lhe turva a vista.

Page 7: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Bullying Que há de tão estranho no fraco ser fraco, a não ser a fatuidade de quem se acha forte precisar desse espelho, bem antes da morte, onde o definitivo é rosto em osso e caco; onde há fraqueza além dessa musculatura na sábia humildade que é a fortaleza, do fraco e do forte nessa ossatura casa do nosso espírito onde a beleza transcende a estética e tem mesmo feiura na falta de caráter ou no sofrimento que o gesto imperfeito traz a quem pratica; mas tudo que nos faz ter essa caradura é fazer o outro ser nossa lente de aumento, na mais porca, errada e insana matemática.

Page 8: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

A cova do lado de cá do rio Atravessar a dor ao invés de ser atravessado pela dor; medroso de fazer travessia acontecer com medo de um final horroroso; sendo essa travessia um grande repto, porque toda prudência é covardia, e toda valentia é entrar no intersepto da dor dilacerante que a escolhia sem ter sido escolhida ou desejada, dor da perda de amores, de valores, cognição de si mesmo incrédula, em sua mesquinhes até à medula; de em sua covardia ser o nada, até se desfazer da dor e seus rancores.

Page 9: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

A verdade absoluta da mentira C’ o rosto é confuso em sua busca, com a cara sente raiva desse equívoco, então, amiga, agora e aqui evoco que não saia correndo em forma brusca, o ódio é sempre falta de clareza e a clareza falsa é violenta, difícil ver semblante em tibieza e não fazer a plástica que intenta criar uma verdade inexistente, a de que ser assim seja sempre o efeito da falsa identidade estabelecida, sei que dessas coisinhas andas esquecida e que és definitiva no que não invente o verdadeiro ser ainda nessa vida.

Page 10: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Luz no fundo do poço Se após fracasso amoroso volta a adolescência o homem descasado, sem sol da juventude que possa dar volta ao corpo mesma força, vigor bem cuidado por que só como jovem homem é amado? Soro da juventude custa muito caro, que outros sóis terá sem sol ultrapassado, quanta tristeza custa o espelho que encaro? Ir à barbearia, escurecer cabelo, comprar roupa de grife, viajar por mundos de uma juventude que não é a sua? Enquanto ser seria ter sido mais belo, mais bondoso consigo, sem ter ido à fundos poços onde se vê a luz do mundo da Lua.

Page 11: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Lição de autoridade

Trovão de só rugir sem alumiar o grito respeito o teu mugido bem mais que o estrondo, autoridade boa só quando tem rito de não ultrapassar o medo em que me rondo; perscruto o teu mugir como o da vaca em pasto, no chamado ao bezerro novo novamente, em que nada é gritante, nada é feito em rasto, e a cabeça abre numa nova mente, sem imposição do medo além de ser o pai, sem transformar frondosa árvore em bonsai, crescido em vaso estreito como pé de gueixa, que agora se permite e quer que a voz levai aos cantos do planeta onde horror distanciai, entre os pés de mesa e uma mola frouxa.

Page 12: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Maldita tatuagem Uma marca de giz, logo um apagador, diz que vem apagar, como uma onda do mar que apaga da areia o nome de um amor, e assim o verso escrito incapaz de domar leão dos mares, focas, cavalos marinhos, que faz lembrança ir ao mar em seu refluxo pra alguma profundeza, onde não hajam ninhos, anseios desmedidos de prazer e luxo; marca de giz no ar, feita por avião onde a apagar demanda alguns momentos, lenitivos maiores, os esquecimentos que sempre estão à mão, mas às vezes não estão, quando foi muito forte razão dos tormentos em marcas tatuadas de cinzas pigmentos.

Page 13: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

O pai maravilhoso Quem trazia desconforto e proteção era o pai, a voz que confortava era a que zangava, o pai era floresta o filho era o bonsai, forçado a ouvi-lo nunca foi, mão brava só se fosse amputada, a mão era amiga, de tantas coisas boas nada foi embora, não, o pai não cantava, toada ou cantiga eram assoviadas; minha alma chora, no dia em que senti tal pai nunca existira, o pai não era soldado, médico ou químico, não era metalúrgico, músico ou tira; nunca houve proteção, que nada, é mentira, o pai que sempre quis é um pai onírico, não consegui segui-lo e a vida expira.

Page 14: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

O erro hierático e errante da dor Ah!... Dor órfa, viúva e arrima, bico de papagaio em mutismo, dor que afasta, nunca aproxima, causadora em si de cataclismo; dor que ao fazer-se só, é onipotente; dor de pedra no rim, de parto transverso, que sem dizer palavra é doente; dor que não se distrai pelo universo reduzida a pó; vinda de cinza de uma fogueira densa entre a cabeça o corpo e os membros, o sol e a terra, dor que ao ser dor apenas é ranzinza; inutil mensageira que à peça diga o roteiro, mas não diz e erra.

Page 15: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

O espiral da dor na perda das identidades De repente o lobo não é lobo é coiote, e a loba a faz de bobo, e o lobo a cerceia, e o que cada um faz ao outro é só boicote, e ainda assim cada um ao outro mais anseia, e quem ao outro frustra vê toda verdade, e o que tem frustração não mais se ilude o que pra um é malsão pro outro é virtude, e o amor se arrebata na infelicidade; sim, apenas o amor não é o bastante, não se amarra ao cais navio com barbante, quando é total a falta de afinidades, tudo que importa ao outro são só veleidades, como distintas viagens seriam paralelas na dor que é tão intensa de se ver estrelas?

Page 16: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

O eterno retorno à casa marrom A circularidade e a fuga do cão que só sabe morder o próprio rabo incruento, faz do eterno retorno o pior unguento, que é o movimento da autolimitação: completo automatismo em vida incompleta, de quem nunca partiu o próprio ser c’ o amor, sentindo em dó maior sempre a mesma dor, até que enfim só a dor o locupleta. É a dor em que só passa a dor pra doer adiante, dor que obstrui visão por ser dor lancinante, que reúne toda dor já sentida no instante instante; dor que é causada por dura guante, que faz a força toda ser força minguante, a não ser que se rompa círculo e quadrante.

Page 17: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Metamorfose O que estraga a beleza é a ruindade que sempre nasce junto c’ a desgraça de a gente procurar essa cara metade que é rara no mundo, mas na mesma praça, no mesmo banco e jardim senta ao lado, de repente, pertinho da gangorra, senta, em que mais gordo o corpo faz o outro elevado; ah; como dói a beleza em que se intenta ver apenas candura, havendo a maldade, de até doer nos olhos na vontade grande de querer adentrar esse perfeito espelho, o qual se for quebrado traz a tempestade dos sete anos de azares que a tristeza expande ao mudar vaga-lume em escaravelho.

Page 18: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Afasta-te de quem não sabe o bem que o faz A fórmula do mal que proteção nos traz, o tal mal necessário, às vezes renegado, é sincronia plena entre o ódio e o amor que faz o pensamento quando não é mal aplicado, e o mal que se aceita quer o bem-estar de quem saiba ser mau, ao praticar o mal, contra quem só deseje lhe admoestar com injúria e falácia, só jogando sal em ferida aberta ou que não quer fechar: o calcanhar de Aquiles que todo mundo tem, desconstruindo a vida ao se apegar no ontem no que traga ao hoje a voz de se inflamar defeituosa chaga que podia beijar para o mal ser bem no bem que ele tem.

Page 19: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

O rosto da preguiça é o da depressão O braço longo da preguiça pesa mil toneladas. E não há a força capaz de ser a alavanca nessa empreitada de vencer à força essa preguiça depressiva intensa; essa preguiça assassina infiltra dentro dos músculos inércia infensa que fortalece imensidão da biltra; tão impeditiva é a preguiça dona de corpo e mente que a ambos mata lenta, bem cruelmente, a esmagar o ânimo; até que nada sobre ou reste ao arrimo carregador de toda culpa; fona, então, o último suspiro violenta.

Page 20: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

A senda da retidão Não, não basta o aconchego do teu mormaço, nem chuva de verão que não atravesse inverno; se os outros são o céu, são também o inferno, mas que a ninguém se teste o ter nervos de aço. O que há em teu entorno não é só a pretensa aura; o espelho é maior do que o que em te penteias: tua casa, tua vida, da aranha são teias de onde julgas poder a paz e causar paúra; e o que há de falso é toda fortaleza em que nada desmonta nem é assim tão sólido, nem presdigitador nem charlatão, poeta, não invento realidades, mas sinto a beleza em tudo que deseja não passar qual bólido, sem dar a mão à curva em tal da linha reta.

Page 21: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Abertura da primeira das três janelas Dentro de um campo minado por manias da rotina, a ser só está acostumado e mais nada descortina; mas ao não fechar cortina das três janelas da mente, a preguiça que o amofina o faz ficar descontente, ao olhar que não o contente por não ser compreendido não consegue mostrar dente de seu sorriso perdido entre o sol que caído nunca nasce nos seus olhos de castanho esvaído sob o teto dos sobrolhos; há a ausência dos molhos que o obriga a ter fome de hiena a comer escolhos em fome que o consome e o faz ter amor sem nome ou só com nome de guerra, em corpo onde o amor some e o sexo se enterra que se algum prazer berra desde essa brutalidade de ferradura que ferra com mal que não tem idade mata a felicidade em floresta sem picadas em janela de fealdade bem muito mal explicadas, sem ânimo de as escadas da casa da inconsciência abrir para que visadas sejam suas inconsequências, sempre postas em sequência em falsa organização, onde não há fé nem ciência e nada fica à mão,

Page 22: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

até que ouça a canção dessa janela aberta quando o amor desperta sem que haja mão esperta que o acolha com doçura tocante amor que o desperta e traz sol à noite escura que à língua lhe traz secura por medo elevado ao pânico de o amor vir ser a cura do imenso terror nanico, que é não saber ser rico em afeição sem tormento, janela que justifico ver se fechar no momento desse amor sem estamento viciado em falsidades que se fecha no momento em viver suas maldades, ao sair pelas cidades com portas da alma fechadas, em ações encadeadas por coração sem flechadas, infenso às enamoradas horas que abram janelas, indo pelas vis estradas, onde não há coisas belas. Ou onde as coisas belas são negadas por cegueira, pálpebras que, sem janelas, se fecham por vida inteira.

Page 23: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

A maldição do dragão inacabado

- Se sou o teu dragão não me deixe aleijado senão mordo teu flanco e bato com o rabo raiz da tua coxa onde a cauda acabo de sentir tatuada do outro lado, agora estou sem pés um sob cada glúteo e projetado até ao meio das tuas coxas, sem pés não sou ninguém, serei dragão inútil, mas se a agulha dói não deixa manchas roxas, exijo ser marcado em teu corpo até ao fim. - Desculpe dragão místico não me maltrate, mas sob as pregas glúteas tuas patas doem ao serem tatuadas e me falta coragem... - Então farei teus sonhos serem pesadelos, Queimando-te à noite todos os cabelos.

Page 24: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Resumo do suicídio de José Assis Valente, compositor brasileiro. Ao beber guaraná com formicida não viu felicidade ser brinquedo, valente foi à sós ser o suicida para mostrar ao mundo o seu medo de ter história triste em arremedo da que mereceria e nunca teve, dor jamais descontruída em segredo por quem o asseguraria, mas não teve, porque mudar passado quem consegue? E assim mundo acabou sem canção, sem quem o libertasse da dor jegue, que empaca no sujeito e o persegue porque fica amarrada em coração até que a própria dor suicida cegue.

Page 25: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

A insensibilidade da dor Dor que não dá descanso, dor que traz fadiga, dor que em remanso busca apenas briga; diga ao que veio, diga, se tão forte e densa por amor mendiga, sem dizer se apensa é a algo que pensa e pulsa à procura de uma recompensa, dor que é ofensa, dor que não quer cura; prenhe de indiferença.

Page 26: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

A mulher castradora ou o hobby do Monstro do Lago Néscio Dumbo – o elefante-drone – viu o monstro em viagem clandestina em seu Citroen; e na floresta depilada dos países baixos ir lá plantar as mais estranhas raízes de invisíveis plantas carnívoras feiosas, antes de tudo disfarçadas em mis rosas de desgrenhadas folhas subidas ao caule ao léu, ao léu, ao léu, onde há o caos lhe imposto pela triste sina, de ser monstro, ser mulher castradora de tálamos em riste quando usa o disfarce de mais bela musa e deita na areia assim como demonstro cientificamente ao assediá-la em chiste até que da minha carne toda se obtusa.

Page 27: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

A pensadora Ser ou não ser ou não ser ou ser; eis a questão. Essa é a pergunta feita aos que aqui estão. Desde o Oiapoque até ao Paquistão, Todas podem responder essa cruel questão. Quanto dinheiro custa ser alguém sem roupa, ah! É, simplicidade é tudo, please, me poupa, há quem dinheiro ganhe mais nua sem roupa; mas é preciso ser uma bela cachoupa; se beleza não põe mesa é porque ela pode; às vezes grana vem de um velho e feio bode, não gosto de bigode, mas com grana pode; quesito tem resposta meio esquisita, sem ter não dá pra ser nem pra dar periquita; quem tem canta a vida é bonita, é bonita.

Page 28: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

As asas da descontrução A dor serpeginosa do desejo busca mitigação e lenitivo se a cobra histérica faz despejo de todo seu veneno em ser vivo na autoinoculação ou sedução onde caiba a luxúria que é o veneno das mais mesquinhas almas sempre à mão de quem lhes dê a mão. E é pequeno o tempo necessário aos efeitos da dor na autoinoculação, quando dor é o prazer da inconsciência plena do que então fazer com a dor!...Ou fazer o que com o amor no ato da sedução; se é sem coração, se não há a paixão do ser em construção.

Page 29: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

As suas mãos, onde estão as suas mãos? Volição O nascer da vontade de ser o propósito ao sempre fracassar aniquila a alma, e o que aniquila a alma se faz esquisito e afasta toda gente, e é mar que não acalma, nasce com bem mais dor ainda se a paixão é a da falsa alegria, é a vida distraída do unidos venceremos, quando é solidão a roupa dessa farsa muito bem vestida, onde o outro é jogado em qualquer valão, onde a compaixão não se olha no espelho e o que o outro precisa é sempre resvalão; que há de ser pra sempre, de agora, o ato em vão, pois a mão amputada é braço sem mão; e o chão de cada dia já é um medo velho.

Page 30: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

As vezes o escuro da noite é o açoite Na certa ser irreal em tudo por ter nada realizado é pior do que o irrealizado desejo da libido, asa quebrada desde a adolescência até o passado adulto, e desde antão até agora e nada da inquietude cessar, desse desejo secar porque desejo seco arruína a estrada por onde os sonhos andam a se emborcar, nem sempre ébrios, nem sempre sóbrios, de fato; embora o amor vivido e com vida plena faça que essa vida não seja pequena, sem que o desejo seja só o artefato de alguém que após fracasso acenda a lanterna porque não teve a noite que o devia, serena,

Page 31: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Auto retrato de Cora Colatina, poeta capixaba de carícias secas Gosto do azul que é quase preto ou petróleo, amo perfumes, no momento uso só o Dynastie, espero que comigo ninguém se enfastie, uso também Marina de Bourbon e o Lilly, mas prefiro os da Nina Ricci, CH ou CC que são mais que perfeitos. Flores delicadas como as margaridas, orquídeas, sem esquecer dos girassóis, deviam ser deixadas na natureza, que é onde gosto de estar a sós quando a dança do ventre me pega de surpresa; e canto além de haver pudores de ser só uma cantora de banheiro a gritar, não sou desafinada, aguento bem refrega, fui feita pra paixões, jamais cultivo dores.

Page 32: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Beber só para brindar Calar o desespero é aguentar a dor da mais insuportável frustração , não permitir que vire em tresloucada ação também é ter cuidados de amor c’ a dor que é a mola emperrada, então; beber também mitiga a dor de grandes perdas, mas leva homem a cair no chão e agulhas gigantescas mais altas que os Andes na hora da ressaca o afligirão ao ponto de espetar o céu dessa paixão ou como se injetasse álcool no inferno; na enésima frustração já não sou beberrão, já era até pra estar dentro de um caixão, mas vou é trabalhar, já vesti o meu terno.

Page 33: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

O babaca ideal Jeca Tatuado tem todos estados civis Imagináveis e impossíveis: foi amigado em relação mais que aberta, mas os vis ciúmes deram triste final magoado para os dois, ele e Gerusa, que em exagero pôs tudo a termo, e deixou-o a ermo e à sós; casou com Sônia no papel sem erro!. Após um ano desfizeram os seus nós. Após um tempo foi com Amélia o enlace, Viveram bem, mas enviuvou logo, não se fez de rogado; pra que rogo? Com uma periguete reiniciou o jogo, logo virou o corno; disse: - Assim me drogo! Fui solteiro, casado, viúvo e corno!

Page 34: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Boa sorte, a esperança é a última que morre Era uma vez a vez que não chegava nunca e muito expectativa havia por chegada logo! E a espera já era uma espelunca; pior, entre o sol da tarde e a madrugada, a esperança toda já era a desculpa, chegava a atrapalhar muito o raciocínio, mas a fé não o deixava sentir a culpa embora não pagasse mais o condomínio; fé foi diminuindo, estava abatido, com coração partido foi abandonado, era como se fosse ter que ir à nado ao outro lado da rua que era um oceano, então viu que chegava o final do ano, pegou último dinheiro, jogou na loteria.

Page 35: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Boteco Sovaco das Estrelas – o único onde do amor só e bebida a embriaguez. Não vou mais para a Austrália para ver canguru, cuja fêmea é boa mãe, na bolsa carrega o filho, porque há muita mãe que só pensa em bigorrilho se for um rapaz bonito, arrogante e sem guru; que nunca encaroce mingau, bigorrilho é o cara, e ensina a tirar o cavaco do pau; não mãe, seu filho não quer o gatilho nem cara de mau, que a noite ir ao Sovaco das Estrelas, boteco onde se come moelas, onde há filosofia e as mulheres mais belas, com axilas cheirosas, isso sim, mar de rosas; há canalhas inteligentes e conversas em trivelas, viajo não, vou ao Sovaco das Estrelas; elas me esperem. Lá sou garçom das boas prosas.

Page 36: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Canto geral do brasileiro, hoje! Dentro da noite onde o sol esconde o rosto e se pudesse nem voltava a brilhar, o medo e a vergonha são imenso desgosto, grande insegurança nos faz o ar faltar, noite indigna da noite, que rejeita o títere que nos rouba o sonho c’ os políticos que roubando o Brasil, como se uma úbere pudesse dá-los o leite de torna-los ricos, cada vez mais e mais riquíssimos, canalhas, jogando os hospitais do SUS ao plano último das suas preocupações espúrias onde as malhas da grande roubalheira é urdida sem último a roubar apague a luz e cessem as bandalhas, não, não farão isso, se estiverem no cimo; com o poder na mão; com a justiça ao máximo engessamento das atribuições, porquanto juízes sejam indicados por quem no cimo, com raras exceções, sejam donos do quanto justiça possa ir, para o nosso espanto de ver como a Lei protege quem a fez, de ver que é impossível a esperança em canto, que em ira se revele contra a desfaçatez de ser o Brasil tão grande com homens tão pequenos, canalhas e larápios de todas as espécies, roubando sempre muito de quem ganha menos; mas um dia isso acaba, seus grandes facínoras, recuem com suas manhas de unhas de gatunos, bem perto está o tempo do fim das suas horas de ladrões e rufiões da justiça em que, oras, o povo não acredita, com razões de sobra, e a quer muito mais dura c’ os senhores e senhoras que tem olhos de vidro e venenos de cobra, canalhas mais que estúpidos, são assassinos de sonhos e de planos de homens, mulheres e até de crianças, vós não terás quem os sinos dobrem, de todo malfeito punição esperes: hoje não é mais tempo em que as canções mobilizem o povo em grandes multidões, mas a hora há de chegar em que serão feridos vocês asseclas, cúmplices, bem nos corações, embora tais feridas não lhes cause aflições pois nem um coração há dentro de os seus peitos, ou só o coração em dextroposição, de uma direita cruel que cresce no espaço da esquerda corrupta e cheia de ladrão, mas há quem ainda tenha nos seus nervos aço, tem que haver quem consiga ser nacionalista,

Page 37: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

que o neoliberalismo destrói quase tudo, destrói planejamento e nos cega a vista, ao ponto de buscarem o pior escudo no pior candidato contra outro ruim, embora o país não seja totalmente feito de gente má, embora o chinfrim vá apoiar quem autoritariamente nos fez descer goela abaixo em degola, sabre que mataria a sua própria gente; assim, com a voz em ira, brademos cidadãos, brademos contra os cães que rezam e roubando tiram do nosso filho o futuro das mãos, enquanto em suas casas reunião de bando realizam diariamente sem qualquer vergonha, reajamos que ainda é tempo, sigamos de mãos dadas, que em união venceremos peçonha, sigamos cidadãos, esforços não são vãos, sigamos até que o último caia na batalha, não dá mais pra usar as luvas de pelica, sigamos adiante, a hora não falha, agora já sabemos, façamos a hora, de contra a canalha levantar canções, vindas das cordoalhas dos nossos corações.

Page 38: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Cena cotidiana irada da inteligência emocional Recém-passadas a ferro prontifiquei as roupas a tempo e a hora da festa, mas o canalha me deu bolo, deixou-me embonecada no portão, só fiquei sossegada quando soube que o cara tinha sido atropelado e morto.

E, assim, morreu contigo toda a minha angústia e dor.

Page 39: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Chuva do amanhecer Como o sol, grande operário, que se deita ao fim de cada dia com missão cumprida, é o trabalhador que se ama e respeita que sabe dar sentido à sua própria vida, que enquanto esse sentido é subtraído pelos porcos políticos que os seus direitos tentam diminuir tirando-lhes efeitos, ainda se faz de tolo aos olhos do bandido, é o trabalhador que se ama e respeita, mas é abandonado quando a noite chega, como o sol, grande operário, que se deita sabendo que a vida não vai ter melhora, mas que não vai embora, toda manhã volta, embora tristemente quando às vezes chora.

Page 40: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Contrição De um fundo de abismo a inferioridade faz o que é alcançável parecer não ser possível, não à mão, ser a única verdade, onde sem o diálogo não vai mais nascer nenhuma ascensão ao andar térreo, onde a solidão é o monstro mais terrível , sórdido até à sarjeta! Que infecta e ferre o coração com limalhas do mais baixo nível, quando o discurso sai da boca ao avesso, jogando contra o peito onde não há mais ritmo alteração completa do algoritmo; até que aberto o tórax, antes tão opresso, nada se vê lá dentro, nem coração ou istmo, de uma dor imensa, ainda em foro íntimo.

Page 41: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Curso de outroajuda quando te faltas a ti mesmo sem assinar presença.

Enquanto os carrilhões soam em torre profanas cuida-te a ti mesmo pra dar tempo de ser conhecido entre o sol das distâncias que afanas qual catador de passos que está a descer da escadaria soberba cheia de traquitanas da solidão comércio de escambos sem chama de uma alma mínima em instantâneas chicanas que faz que durmas mal e role em sua cama até que o pão de ló encontre-te ao centro do indevassável mel do que ainda seja o amor muar sob a cabeça iluminada Lua de neon em sua luz fria que agora apago e entro. Sim, saber que o outro ajuda desfaz o palor e faz nascer o Sol dessa sarjeta crua.

Page 42: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

A exiguidade Da cupidez à estupidez do homem caminho foi sempre o mais exíguo; sina de ser o inconveniente: - Xingo-o porco, vil, viu xinguei o homem, somem das minhas veias o sangue; faca afiada sofri mutismo após tê-lo expulso, à faca nessa alvorada irada, agora médico mede-me o pulso, o seu olhar é sério, causa riso, e o riso desata as cordas vocais, propôs olharmos um pro outro sérios. O riso tem poder, não há mistérios, agora falo ao doutor medo e os ais; irei, doutor, ao delegado, sim, preciso.

Page 43: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Contra teu nome e o meu nada farei Há sempre um nome de mulher na voz ou foz do rio da vida onde navegue homem sério, que trate os remos como aos braços e à esse rio que é afluente do amor bem maior e atroz quando traído ou faltante, cedo ou tarde, traído por força da paixão que violenta a liberdade de partir quem já não arde a chama doce que se apaga em tédio e intenta não mais amar ou ir amar além o rio, e até além o mar oceano todo do amor, além da vida onde navegue homem ébrio pra naufragar no peito a dor sem que o amor seja juiz mal e frio e ao rio ir sombrio jogar a dor junto c’ a sua carga sem ter brio.

Page 44: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Das linhas digitais aos momentos belos Dessas linhas digitais das tuas duas mãos ninguém ainda quis ler, só leem a tua palma que às vezes é a claque que os acalma, enquanto as singulares digitais são os nãos que o dedo indicador tantas vezes acena, mesmo a se pôr nos lábios a pedir silêncios, mesmo a pedir silêncio das gatas em cios por não haver telhado onde se faça a cena. Ninguém quer labirinto dessas linhas cheias, mas em tua solidão sabes bem o que anseias das polpas digitais às linhas dos cabelos, quem nessas entrelinhas entre de mãos cheias limpando de os teus olhos todas as areias do tempo que te impede os momentos belos.

Page 45: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

De repente, Ana palíndromo de Ana

Massa de excitação, sentimental em nada, cacoetes de macho, amor aprendido em ruas e esquinas com guris de papagaiada, entre as mais sápidas nuas e cruas, milhões de vezes repetidas, hiperbólicas bolinações, sem vida amorosa ou gesto traduzido em palavra, experiências ricas, que ao menos o livrasse de sofrer de resto. Um raro amigo ou outro, vivos e mais espertos, a ter como exemplo de sucesso amoroso no precoce adolescer sem ter do amor ciência. Amor falacioso em versos desertos, até que Ana surgiu prenhe de afeto e gozo para parir o amor em mim, saudoso em dor.

Page 46: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

De repente, a vida ... Então o lado de fora da loucura são as minhas mãos?!... Que hábeis agora ao piano produzem a canção de fim de ano, prenunciando a idade da razão; ao sentirem a força do mar delirante na dança sem sentido, sem navegação, onde não há convés, camarote avante, onde o sono sossegue o coração; saber vida estar fora do delírio afora, sem o teto quadrado encher de água fria o mormaço do sol que ainda há e havia guardando hora da fórra pra quando o pôr fora as mãos tocassem bela e clara sinfonia de uma chuva morna e tépida de verão.

Page 47: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Diálogo adulto entre os irmãos sobre a fraqueza da vontade diante do dever de viver plenamente com algum apelo tardio à religiosidade. Couberam-me as quedas de joelhos quebrados; homem sem nenhuma fé, mantido acordado por café, com dores na cabeça e nos artelhos. Mas por que fé nenhuma se vermelhos estão agora esses joelhos, se não há castigo de ajoelhar em milho? Somos, hoje, mais velhos, embora haja saudade do tempo antigo. Irmã, minha falta fé não tinha a ver com Cristo, E sim c’ o desamparo, sem ter culpa o pai, muito menos o Cristo, e ainda sou pagão. Mas e os teus estudos de teologia, irmão? Foram poucas leituras, quero ler, mas resisto; e a fé que em mim falta sempre é inação.

Page 48: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Divagações de um prisioneiro do ódio Agora não é da cama a ausência de mormaço de algum calor humano, dançantes o tango bem, e o bolero fluiu no passo a passo ao abraço da dança afetuosa onde o orangotango ao término do samba ainda fica mudo e bebe o indevido, bebe em ritmadas escalas de improviso onde o que bebe é tudo exceto as urgências ultimadas ao contingenciamento entre as pernas bambas do esforço em que se culpa inutilmente da falta de mormaço e do acalanto em falta até que o pesadelo chegue e diga a ambas pernas autoflagelos da história que mente que do hospício enfim o doido se deu alta. E que se o acalanto ainda é o que falta Monstro do Lago Néscio não é mais feminino, que a mulher te quer, que o amor peralta canta o amor à mulher como se fosse hino, sem o empertigar do músculo e do osso noutra função que não oferecer o braço e como é bom sentir mão úmida em pescoço e ao permitir-se a dança fazer móvel laço entre o que é o amor e o infinito espaço que se não há no corpo agora estreitado ao outro corpo em sinuoso abraço ao que é sinuoso agora é escalado c’ a superação do que foi maltratado e veio gerar a culpa e o ressentimento, e fez após a dança o corpo estirado agora em barragem de fresco cimento capaz de se secar fazer aprisionado o corpo felizardo que foi bem dançado, que passa na calçada neste exato momento ao lado dançarino da mulher que dança e canta ao pé da música a letra mágica de um céu que nos pertença como esperança do sangramento justo dessa veia trágica sangria obsoleta mas que ainda cura a dor que foi infligida e se fez pedagoga de um caminho em falso, de uma procura da mulher cabisbaixa que ao ascender roga que a leve assim sem traços ainda definidos ao espaço infinito do que for palavra, embora já sorria e tenha lábios abridos ao que a língua agita na mais bela lavra de um passo de dança que não seja em falso seja a letra música igual da palavra,

Page 49: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

que externe o que há de terno na jurisprudência, da tua absolvição dissolução completa da culpa agora bem saudada em retreta. onde o soldado é preso por ter cantado errado., na interdição do ódio filho de ira e medo; bem-vindo enfim de quem teria autorizado a si ser próprio medo guardado em segredo de admoestar alguém além do necessário, mas que ao repreender daria a liberdade do amor ser o que é fluxo de calmo rio onde foi compreendida a mais bela verdade.

Page 50: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Dor de recordar

A dor de recordar pra muita gente entende ser uma dor saudosa apenas de não terem acontecido as coisas do amor que ainda ferem; amores que não tiveram nenhum happy end, porque o amor carece de feijão e sonho, e sonho sem feijão sempre foi a condição em que o amor depura-se, vem do coração, sem que haja frustração, sem que fique tristonho. Minha dor de recordar é de outra natureza é a dor de ter enfeado essa tua beleza, quando sem condição, sem sonho e sem feijão, faltou-me então coragem e delicadeza, eu era um garoto, tu eras a princesa, em baile de carnaval de triste folião.

Page 51: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Luzes desgrenhadas Dos faróis há as entranhas, da mulher as superfícies, do mar seduções e manhas. do barco dias difíceis; de dia o farol dorme, de noite vê caravelas, tudo sempre no conforme para as noites serem belas; o mar descasca o farol e lhe sobe por paredes, Lorca anagrama Carol na poesia com suas sedes; o reboco das paredes estragado pelo mar dentro da sede das sedes não o impede de funcionar; farol não tem luz lunar, gira a luz de lado à lado, tenta assim mancomunar segurança e mar salgado; cavalo marinho é gado em manada de cavalos, tem semblante iluminado por prisma que forma halos de luz, lucífera, luz, que jamais trantorna os olhos, luz que nave não seduz e evita que vire escolhos

olhos grandes sem escolha.

Page 52: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Hawahv, Eva, vida à brasileira.

Ancestral autoconsolo do reino boçal que passa do estado mole ao que é sólido, quando só em sua própria mão encontra o sal recluso em caverna ou porão, qual bólido, bolina sua cabeça antes do corpo todo, como se infectado por feroz piolho, devora o pomar, em tudo passa o rodo, até que sobre Adão deus ponha o seu olho, desde já a mulher foi sempre digital, enquanto, até hoje, o homem é manual, no simbólico ato da autossatisfação, que traduz amor próprio em dedo ou em mão; com mulheres em regra em íntimo bacanal, até que enfim criaram o nosso carnaval.

Page 53: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Em capela do medo

Quando o mar encapelado da noite insone apenas desgastar marinheiro no bote, ou apenas escaler de navio naufragado, talvez homem do mar onírico vá ter a paz do lençol branco desfraldado em vela bafejada por sopro de fugaz calmaria, onde se repõem forças dos braços e pernas, sobre o instável convés. Nunca um maremoto de água invasora em câmara escura, por ter rompido dique de alguma doca face ao temor do peito, rachadura em quilha, forquilha de miragens em dor transoceânica. Escotilha fechada em pálpebra cerrada de o olho não vazado pela dor da fuga.

Page 54: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Meril Stripper I Em suas saboneteiras Meril Stripper tem essências perfumosas de soro de gata, para que todos saibam que o que a entretem é afundar navio que seja de pirata, pirata Jack Esparro será a primeira vítima, depois outros virão de avião com pó de pirlimpimpim, não, cocaína da ótima, por isso é que ela nova personagem compôs; carrega pós de mico e cianureto, um velho maranhense vai ser o primeiro sacana ao se coçar antes de se ver morto; fará gente sair da zona de conforto, ladrão, psicopata, nunca sobranceiro, pois só Meril é capaz de balançar coreto.

Page 55: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Radio TPM 2.0 – 1 – As novas identidades e missões de Meril Stripper a caçadora dos homens sem coração. Tragada por cigarros e olhares vis, Meril Stripper passa a ser Maria Juana Cintra, luta contra os políticos vis-à-vis se preciso com ajuda até do Zé Pelintra; Pepe – o urso de prepúcio – a protegerá, contra os criminosos no poder adentro, Meril fará do umbigo o grande instrumento, para cumprir missões honrar nome de guerra, a experiência adquirida como puta, irá fazê-la ser mortal pros filhos dela, o que se quis dizer: uns bons filhos da puta! Embora o que mais tenha seja putaria, Meril de todas as putas foi a mais bela. palavra de cliente que nunca mentiria.

Page 56: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Meril Stripper II Desde ontem não sou mais mulher da vida, o mestre confiou-me outra missão, descobrir ponto fraco, onde é a ferida, o calcanhar de Aquiles dos sem coração, político safado que rouba a nação agora vai ganhar uma grande ferroada, pior que em alto mar mordida de cação, e essa história agora não é só zoada; sou a nova Mata Hari, Hari, Hari, Krishna, que ao apaixonar na mão terei político, que apesar de ter passado ruim sem ficha limpa, ganha do senhor juiz absolvição; canalha e assassino é o político que rouba do povão a esperança e o pão.

Page 57: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Entre sapos inúteis e ruminações infantis Era uma vez um outono, entre sapos engolidos e a princesa sem trono algo doente d’ ouvidos, mas que tinha dentes ávidos e farpas vindas da língua capazes de aos atingidos causar infecção ou íngua na virilha que não míngua como faz a triste Lua, que por um caraminguá de afeição se põe nua às vezes no meio da rua ou em um lugar qualquer onde se autodestrua sem saber o que é que quer; ao ponto do sapo querer não ter nada a ver com isso, dentro de papo viver queria, mas sem compromisso; o problema que houve nisso é que os sapos engolidos eram recheio de chouriço de um amor de tempos idos, quando a cera nos ouvidos era de abelha rainha, caros meninos, eu vi dos meus olhos a cara de fuinha que a princesinha tinha quando queria que nada lhe tirasse alguma vinha que se queria da amada; e a sapa regurgitada em ruminação magoada era sapa não sapo, coitada, que é dona dessa balada; balada de balaiada onde possuir caçamba, olhem bem rapaziada, só causava perna bamba em vara verde, caramba, de bambu ou de marmelo, entre as pernas de um bamba que ao fim se viu amarelo, igual a livro no prelo feito com papel barato, onde nada era belo em moça de fino trato, que queria todo prato só pro apetite dela, jamais perfume barato, nunca uma chorumela com que se sentisse bela, ninharia que alegrasse Wendy ou Cinderela, quando o amor bastasse e o progresso esperasse até chegada d’ outono, quando alegraria a face enfim sentada no trono.

Page 58: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Florestas depiladas são iguais mar sem cabelos, verdade, o que sai do espelho é o ... monstro do Lago Néscio sem nunca ter mor- rido é mais imortal que o pesadelo humano de não ter consciência do temor terrífico que causa ao vir puxar cabelo, primeiro são os pés, depois são os cabelos dessas florestas depiladas dos países baixos, e o não encontrar nada faz rogos e apelos não valerem também nesses debaixos acimas dos joelhos dobrados em pânico; onde o urinol é chamado o penico; e o monstro refastela o que enfeia as belas na ausência de cabelos nesse mar profundo onde inunda o mudo pânico em terror e êxtases; desde o haver florestas sem fundo.

Page 59: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Nelson Foi louca a conversa com Nelson Rodrigues, causou-me espanto raro quando ele me disse que deveria dizer à Yara: “ Perdoa-me por me traíres!”. É triste pensar que a ame ainda, mas se é pra dar perdão vou dar a mim mesmo, ciumento, como fogo em ira, perdi minha mulher para um cão caipira, sinto muita vergonha até perder o ar; jamais irei à Yara, que não me sai da cabeça com quem me fiz de tolo e arrogante à beça, para pedir perdão, isso é muito humilhante, por tanto idealizá-la fui péssimo amante, maldisse minha vida não adianta ter pressa, quanto mais nego a dor, mais a dor recomeça.

Page 60: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Sonho Fujões do silêncio os olhares são lápis que colorem tudo, sem riscar corpo de folha, ou quadro dentro de moldura. Só os olhos são capazes das mais indizíveis amoras, como as violetas rubras dalguns orvalhados olhos. Os olhos só são Desbotados por borbotões de desgostos, drama dos olhos mais belos, ou por tragédia de perda de quem a morte nos leva. Hoje a tristeza me estranha, o momento é de relevo sob luz que tudo exalta. Mas tua falta me perturba por não saber o teu nome. Por não colheres nos braços a alegria de um poeta que só a tem em sonho.

Page 61: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Depois daquele dia Após o mais difícil inverno, quando o porto foi tragado pela bruma e um mar vazio transmutado em abismo e alçou o navio a uma órbita sem prismas de luz; capaz de tornar saudosa a mais cruel tempestade, a carne embarreirava o amor ideal conspurcando da carne; sensações vazavam fora de qualquer controle pelos incontáveis poros da pele sem zarcão do casco de ferro do navio, assim menos denso, em levitação errática e hierática, até se esbarroar contra o nada; para, ao assentar em uma base de reparos, onde três mulheres e quatro homens com roupas de operários, ouviram as histórias e estórias, episódios e fatos acontecidos em todas as derrotas da navegação de longo curso, da navegação de cabotagem de navegação pluvial da navegação pelo ar, onde a levitação era um pedido de partida para o além; Ouviu: mas há tantos além menos intangíveis, tantas razões para navegar, tantas perguntas para não serem respondidas, tantos elementos para que a esperança não atrapalhe o raciocínio; que o ar voltou às velas e soprou para apagar o fogo dos lutos e secar o choro das vistas carpideiras, até haver respiração de música mais uma vez seguida de outra e outra, e o respirar clareou os olhos do timoneiro, e os olhos alimentaram

Page 62: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

o cheiro do mundo vindo ao nariz; e as narinas dilatadas abriram um sorriso ao bem-vir de novas fomes.

Page 63: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Gnomo sob eclipse A areia movediça em que a pessoa afunda o tempo da sua vida imobilizada pelo peso nas pernas antes da estrada, faz se sentir inepta e c’ a alma imunda, tempo coagulado em areia é morte, e o que molha areia do tempo são as lágrimas escondidas na inércia da falta de sorte que é a desculpa melhor sobre as mil e uma lástimas de quem se encontra em movediça areia, e que ao mexer-se afunda e então fica em inércia, paralisado em medo de ao agir morrer, e ao não agir ser morto se nada mais anseia, seja em qualquer lugar do mundo aqui ou em Pérsia, qualquer lugar do tempo a desaparecer.

Page 64: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Julieta não tem culpa de nada disso Tristezas nunca pagam dívidas, meu caro, desatenção as gera além do necessário; a barra que encaro escrevo no diário, por que não quer saber da barra que encaro? Seu carro é o do ano, o meu é o retrasado; a escola da menina está atrasada, Nem sei como pensar que um dia fui casada com um cara tão ruim e mal ajuizado, não culpe a ninguém por estar atrás das grades, precisava dizer poucas e boas verdades, Julieta nossa filha é ótima aluna, e vejo em face book passeios de escuna que andas realizando com tuas namoradas, enquanto as minhas contas só andam atrasadas.

Page 65: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Lembrança que dói

Lembrança dolorosa a do comportamento que ao sol expõe a chaga sem que nunca seque, que aumenta as suas margens com tom de lamento até que a cuíca chore e o reco-reco breque seu nunca intencional coçar a ferida; euforia da miséria com roupa mendiga, sem que ao olhar provoque nada que a bem-diga, agora cicatriza como fosse a brida que a mais nada estreita nem mais nada alarga, como a máquina falha em diminuição da carga sem ter conformação porém resignada, sem que a resignação faça doer à ilharga quem estiver ao lado, quem a mão não larga na amizade ou amor, onde dor pulsa: nada.

Page 66: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Sobre a sobrevivência Luz branca da verdadeira perda da visão, sem ser cega a ave com suas asas perde contorno no leite de luz e sua alvura se confunde com o fundo sem fundo do céu; teme mais por prudência que por medo não aterrissar, isto é, vive a temor de saber que o pensamento voa tão alto às vezes a ponto de resultar apenas em imensa incompreensão. O pombo-correio tem missão mais clara: ave maratonista-mensageira entre dois pontos definidos. Como é boa a missão de levar novidades desinteressantes a nós mesmos, pássaros servis de causas que não nossas; sejam mensagens sufragistas ou de alheamento pleno, totalidade só há na expectação, rotas claras nada definem, assim, remissão nenhuma se faz carência enquanto há voo.

Page 67: BICO DE PAPAGAIO · Rio de Janeiro, falecido este ano de 2018, que tanto incentivo deu aos estudos da Medicina psicossomática do Rio de Janeiro e ao Dr. Paulo Roberto Chaves Pavão,

Neura A buzina obrigou a olhar o semáforo a tempo de pisar no acelerador, Juliana reassumiu postura de decoro, o motor não queria ser trem parador, agora era a ladeira e dobrar à direita entrar pela saída em garagem discreta, o que já acabara sem a obra feita precisava acabar sem dor que alfineta, às vezes há quem nunca pode ser o par que leve ao desespero quem o desespera, e a esperança vira apenas besta-fera, o amor não é detergente para sanear o que nos cambaleia no esforço de amar mas faz amedrontada a pior quimera.