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ENTRE ENSINO DE FILOSOFIA, LUDICIDADE E A LEI 10639: UMA PROPOSTA AFROPERSPECTIVISTA PARA AULAS DE FILOSOFIA A PARTIR DO CARD GAME COMBATE FILOSÓFICO. Marcelo dos Santos Ribeiro Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós- graduação em Filosofia e Ensino do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca, CEFET/RJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de mestre em Filosofia e Ensino. Orientador: Prof. Dr. Renato Noguera DUQUE DE CAXIAS Dezembro 2019

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ENTRE ENSINO DE FILOSOFIA, LUDICIDADE E A LEI 10639: UMA PROPOSTA

AFROPERSPECTIVISTA PARA AULAS DE FILOSOFIA A PARTIR DO CARD

GAME COMBATE FILOSÓFICO.

Marcelo dos Santos Ribeiro

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-

graduação em Filosofia e Ensino do Centro Federal de

Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca, CEFET/RJ,

como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de

mestre em Filosofia e Ensino.

Orientador: Prof. Dr. Renato Noguera

DUQUE DE CAXIAS

Dezembro 2019

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ENTRE ENSINO DE FILOSOFIA, LUDICIDADE E A LEI 10639: UMA PROPOSTA

AFROPERSPECTIVISTA PARA AULAS DE FILOSOFIA A PARTIR DO CARD

GAME COMBATE FILOSÓFICO.

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Filosofia e Ensino do Centro

Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca, CEFET/RJ, como parte dos requisitos

necessários à obtenção do título de mestre em Filosofia e Ensino.

Marcelo dos Santos Ribeiro

Banca Examinadora:

_________________________________________________________________

Presidente, Prof. Dr. Renato Noguera Junior – UFRRJ/ CEFET/RJ

(orientador)

_________________________________________________________________

Prof. Dr. Marcelo Senna Guimarães – UNIRIO/ PPFEN-CEFET/RJ

_________________________________________________________________

Prof.ª. Dra. Viviane Andrade - CEFET/RJ

_________________________________________________________________

Prof. Dr. Marcelo José Derzi Moraes– UERJ

Suplentes:

_________________________________________________________________

Prof. Dr. Fabio Sampaio– CEFET/RJ

___________________________________________________________________

Prof. Dr. Rafael Haddock-Lobo – UFRJ

DUQUE DE CAXIAS

Dezembro 2019

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Dedico ao meu ex-aluno Gabriel, cuja

provocação em 2013 levou-me a sair em busca

de formas lúdicas de ensinar Filosofia.

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AGRADECIMENTOS

Quero ao agradecer a minha companheira Patrícia pela paciência de horas comigo testando o

jogi comigo e se esforçando para controlar o seu gigantesco espírito competitivo. Meu amor,

toda vez que você ganhou eu deixei. Ao meu sobrinho Paulo Isaque e o meu primo Eudes

Júnior pela empolgação e tempo gastos com partidas de testes. Ao meu filho Marcos Apollo

pela coragem de me enfrentar para decidir quem lavava a louça da janta. Toda vez que você

me ganhou eu deixei também meu filho. Aos alunos que participaram dos testes e

acreditaram na proposta, os de hoje e de ontem. Principalmente o Vitor, meu eterno consultor

de Magic! A minha amiga Renata Brasil e o seu irmão Ricardo Brasil pelas belíssimas

ilustrações que me entregaram. Ao Colégio Estadual Doctor Alfredo Backer por te cedido o

tempo e o espaço para as reuniões de testes.

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RESUMO

A presente Pesquisa de Mestrado pretendeu desenvolver um card game didático do tipo

estratégia para a promoção de um ensino de Filosofia alinhado com as exigências da lei

10.639/03. O referencial teórico para construção do jogo foi o conceito de Filosofia

Afropespetivista e a noção de história ampliada da Filosofia do filósofo Renato Noguera

(2014). O referencial de ensino de filosofia se estruturou a partir da abordagem de Noguera

(idem) no livro “Ensino de Filosofia e a lei 10.639”. Os conceitos de jogo educativo e produto

didático foram compreendidos pela pesquisa dentro da perspectiva da aprendizagem

significativa, especificamente da noção de organizador prévio. O teste do jogo seguiu os

princípios da metodologia de coleta de dados conhecida como grupo focal, que foi combinada

com o uso do aplicativo de mensagens instantâneas WhatsApp, pesquisa-ação e pesquisa-ação

participante. Os testes tiveram como objetivo verificar a percepção dos alunos sobre o jogo no

que refere a sua mecânica, grau de satisfação como atividade lúdica e possibilidade de uso

como organizador prévio para a promoção de uma educação filosófica para as relações étnico-

raciais.

Palavras-chave: Organizador prévio; Disputa teórica; Agon; Afroperspectividade; Jogo.

Produto didático; Denegrir.

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ABSTRACT

The present Master's Research aimed to develop a didactic strategy card game for the

promotion of a philosophy teaching aligned with the requirements of law 10.639 / 03. The

theoretical framework for the construction of the game was the concept of Afropespetivist

Philosophy and the notion of extended history of the philosopher Renato Noguera (2014). The

reference of philosophy teaching was structured from Noguera's approach (idem) in the book

“Teaching Philosophy and the Law 10.639”. The concepts of educational game and didactic

product were understood by research from the perspective of meaningful learning, specifically

the notion of previous organizer. The game test followed the principles of the data collection

methodology known as the focus group, which was combined with the use of the WhatsApp

instant messaging application, action research, and participant action research. The tests

aimed to verify the students' perception of the game regarding its mechanics, degree of

satisfaction as a playful activity and possibility of use as a previous organizer for the

promotion of a philosophical education for ethnic-racial relations.

Keywords: Prior Organizer; Theoretical dispute; Agon; Afroperspectivity; Game. Didactic

product; Denigrate.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Cards da primeira versão do Combate Filosófico---------------------------------- 67

Figura 2 - Partes de um card----------------------------------------------------------------------- 70

Figura 3 - Tipos de terreno básico---------------------------------------------------------------- 71

Figura 4 – De que forma os cards afetam e são afetados no jogo---------------------------- 72

Figura 5 - Zonas do jogo e cards na pilha-------------------------------------------------------- 73

Figura 6 - Procedimento de virar um card------------------------------------------------------- 74

Figura 7 - Procedimentos de combate------------------------------------------------------------ 75

Figura 8 – Verso dos cards e card de filósofo permanente------------------------------------ 78

Figura 9 - Card de filósofo de ação instantânea------------------------------------------------- 79

Figura 10 - Card de filósofa----------------------------------------------------------------------- 79

Figura 11 - Partes de um período tradicional---------------------------------------------------- 80

Figura 12 - Períodos tradicionais----------------------------------------------------------------- 81

Figura 13 - Período especial----------------------------------------------------------------------- 81

Figura 14 - Card do tipo problema---------------------------------------------------------------- 82

Figura 15 - Card de entidade---------------------------------------------------------------------- 83

Figura 16 – Fichas---------------------------------------------------------------------------------- 84

Figura 17 - Cards clássicos do Combate Filosófico com o novo layout--------------------- 85

Figura 18 - Zonas do Combate Filosófico------------------------------------------------------- 86

Figura 19 - Duelo, ataque e contra-ataque------------------------------------------------------- 88

Figura 20 - Opções de layout de card oferecido pelo Magic set Editor--------------------- 90

Figura 21: Print do grupo de watt zap para discutir questões do jogo------------------------ 94

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 8

1 ENSINO DE FILOSOFIA E A LEI 10.639: CONTEXTUALIZANDO A QUESTÃO 11

1.1 O ENSINO DE FILOSOFIA E A LEI 10.639/03: CONTEXTUALIZANDO .................. 11

1.2 O MOVIMENTO NEGRO UNIFICADO E A LUTA POR UMA EDUCAÇÃO

ANTIRRACISTA NO BRASIL ............................................................................................... 11

1.3 A LEI 10.639/03 E O CENÁRIO POLÍTICO CONTEMPORÂNEO BRASILEIRO ...... 14

1.4 A LEI 10.639: DESDOBRAMENTOS E EMBATES ....................................................... 19

1.5 DIFICULDADES PARA IMPLEMENTAÇÃO DA LEI 10.639 POR DISCIPLINAS: O

CASO DA FILOSOFIA ........................................................................................................... 21

1.5.1 Breve histórico da Filosofia como disciplina escolar no Brasil ...................................... 21

1.5.2 O ensino de Filosofia e a lei 10.639/03: em busca de um referencial ............................. 27

1.5.3 O ensino de Filosofia e a lei 10.639: condições atuais .................................................... 28

1.5.3.1 O ensino de Filosofia como questão filosófica ............................................................. 29

1.5.3.2 Dificuldades materiais e gerais para o ensino de Filosofia .......................................... 30

1.5.3.2.1 O problema do desânimo ........................................................................................... 31

1.5.3.2.2 A falta de condições pedagógicas para um ensino de Filosofia em conformidade

com a lei 10639 ........................................................................................................................ 32

2 POSSIBILIDADES E CAMINHOS PARA UM ENSINO DE FILOSOFIA EM

CONFORMIDADE COM A LEI 10.639 .............................................................................. 35

2.1 A FILOSOFIA AFROPERSPECTIVISTA ........................................................................ 36

2.2 A HISTÓRIA DA FILOSOFIA DENTRO DOS PARÂMETROS DA LEI 10639/03 ..... 38

2.2.1 Centralidade grega na antiguidade e racismo epistêmico ................................................ 39

2.3 A DESNATURALIZAÇÃO DO CARÁTER EMINENTEMENTE EUROPEU QUE

IMPREGNA A FILOSOFIA E SUAS CONSEQUÊNCIAS PARA A EDUCAÇÃO ............ 41

2.3.1 O racismo epistêmico como fator potencial para o desinteresse em aulas de Filosofia:

uma discussão importante ......................................................................................................... 43

2.4 A REVISÃO DA HISTORIOGRAFIA FILOSÓFICA EUROPEIA E A AMPLIAÇÃO

DA HISTÓRIA DA FILOSOFIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA ............................................... 45

2.4.1 Os contornos da historiografia filosófica europeia e a crítica da periodização

quadripartite .............................................................................................................................. 46

2.4.1.1 A crítica da periodização quadripartite na história da Filosofia ................................... 48

2.5 O JOGO EM QUESTÃO ................................................................................................... 50

2.5.1 O jogo e a Filosofia ......................................................................................................... 52

2.5.1.1. O Agon na história da Filosofia ocidental ................................................................... 53

2.5.1.1.1 O Agon no período socrático ..................................................................................... 54

2.5.1.1.2 O Agon no período clássico ...................................................................................... 54

2.5.1.1.3 O Agon no período medieva ...................................................................................... 55

2.5.2 O jogo e a educação ......................................................................................................... 56

2.5.2.1. O jogo educativo .......................................................................................................... 58

2.5.2.2. O jogo didático e a aprendizagem significativa........................................................... 60

2.5.2.2.1. Condição para que haja aprendizagem significativa ................................................ 62

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2.5.2.2.2. Organizador prévio ................................................................................................... 63

3 DENEGRINDO A DISPUTA DIALÉTICA: UM A RELATO DE EXPERIÊNCIA DA

APLICAÇÃO DO CARD GAME COMBATE FILOSÓFICO APÓS SUA EXPANSÃO

PARA ATENDER OS DISPOSITIVOS DA LEI 10.639 .................................................... 66

3.1. O PRODUTO DIDÁTICO: FORMATO DOS CARDS, APRESENTAÇÃO DOS

REFERENCIAIS E DA MECÂNICA ..................................................................................... 66

3.1.1 O Magic The: Gathering ................................................................................................. 68

3.1.1.1 Os cards de magic ......................................................................................................... 69

3.1.1.2 As Zonas do jogo .......................................................................................................... 72

3.1.1.3 Conceitos básicos e procedimentos de combate. .......................................................... 74

3.1.2 Do Magic The: catering ao Combate Filosófico ............................................................. 76

3.1.2.1 Os cards do Combate Filosófico após sua expansão .................................................... 76

3.1.2.1.1 Card do tipo filósofo e filósofa .................................................................................. 77

3.1.2.1.2 Cards de Período: períodos tradicionais e períodos especiais ................................... 80

3.1.2.1.3. Cards do tipo problema ............................................................................................ 82

3.1.2.1.4 A Entidade e a Ficha .................................................................................................. 83

3.1.2.1.4. Como se joga Combate Filosófico? .......................................................................... 85

3.1.2.2 A metodologia utilizada para a expansão do Combate Filosófico. .............................. 88

3.2 METODOLOGIA PARA TESTAR O PRODUTO DIDÁTICO ....................................... 90

3.2.1 Aplicação da metodologia de grupo focal para testar o produto didático ....................... 92

3.2.2. Detalhamento das etapas da aplicação da metodologia .................................................. 93

3.2.2.2 Reuniões para testar o produto didático ....................................................................... 95

3.3 ANÁLISES DA PERCEPÇÃO DOS ALUNOS SOBRE O PRODUTO DIDÁTICO ...... 97

3.3.1. Considerações sobre as falas dos sujeitos de pesquisa ................................................... 99

CONCLUSÕES PARCIAIS ................................................................................................ 103

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 105

APENDICE A -

MANUAL...................................................................................................108_Toc27998820

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INTRODUÇÃO

Desde 2013, quando alunos da terceira série do ensino médio da rede Estadual me

procuraram para conversar sobre suas dificuldades com os conteúdos das aulas de Filosofia já

se passaram aproximadamente 6 anos. As queixas diziam respeito a distância entre eles e os

conteúdos. Entre uma queixa e outra, para minha surpresa, eles revelaram que sua intenção

ao me procurar não era se queixar ou fazer alguma exigência, mas sugerir uma forma para

tornar os conteúdos mais próximos da realidade deles, o que de fato fizeram. Sugeriram então

que eu utilizasse referências que eles conheciam para explicar a matéria. Foi quando

sugeriram que eu utilizasse elementos de um famoso jogo da SNK, o The King Of Fighters1

para explicar os conteúdos. Infelizmente eu não consegui naquele ano tomar qualquer

providencia sobre a sugestão que eles fizeram, todavia, também não consegui ignorar a

provocação. Foi quando descobri em pesquisas um jogo de luta desenvolvido pela revista

abril chamado Filosofighters. O jogo “dá vida” a nove filósofos, que se enfrentam em lutas

que lembra muito os famosos árcades que fizeram sucesso na década de 1990 no Brasil a

exemplo de jogos como Street Fighter e Mortal Combat2.

Infelizmente a oferta do Filosofighters em plataforma on line impossibilitou seu uso

em sala de aula, mas, alguns anos depois ele serviria de inspiração para a criação do

“Combate Filosófico”, card game desenvolvido no programa de residência docente do colégio

Pedro II em 2017 para aproximar alunos de baixa renda da Filosofia. A experiência foi

enriquecedora sendo o combate filosófico o resultado de uma iniciativa sugerida por alunos e

que encontrou no professor alguém disposto a fazer a Filosofia habitar entre as pessoas

comuns. Assim o combate filosófico era visto como o ápice da convergência dos interesses

1 Conforme Benjamin Wai-ming (2006) a KOF, sigla para King Of Fighters é um jogo de luta lançado pela

desenvolvedora de jogos SNK em 1994, que desde então lança uma nova versão do jogo a cada ano. Segundo

Wai-ming Ng o jogo, que reune dentre os personagens mais formosos de outros jogos da SNK equipes de três

jogadores, alcançou seu ápice no Brasil e no Mundo na década de 90 ( Benjamin Wai-ming. Street Fighter e The

King of Fighters em Hong Kong: um estudo sobre consumo cultural e localização de jogos japoneses em um

contexto asiático. Game Studies , v. 6, n. 1, 2006).

2 Segundo Erika Urakawa Madureira (2015) os jogos de luta são um subgênero abrigado dentro dos jogos de

ação, sendo um um jogo em que duas personagens, jogador contra jogador ou jogador contra máquina, se

enfrentam em um espaço delimitado como um ringue de boxe ou octógono de MMA, vencendo o round aquele

que demonstrar melhor habilidade e obter um melhor aproveitamento dos golpes que a sua personagem dispõe

(MADUREIRA, Erika U. Estereótipos Brasileiros nos Jogos de Luta. In: Seminário de jogos eletrônicos,

educação e comunicação, 11, 2015, Salvador. Anais... Salvador: UNEB, 2015. p. 27-37. Disponível em <

http://www.revistas.uneb.br/index.php/sjec/article/view/1240/837 >. Acesso em 12 dezembro de 2019).

.

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entre aluno e professor, até que por ocasião do meu ingresso no Programa de pós-graduação

em Filosofia e ensino do CEFET em 2017 eu entrei e uma nova fase e comecei a repensar os

objetivos do jogo, bem como iniciei uma busca por novos referenciais para sua reformulação.

Nesta fase eu já não via o jogo como um fim, mas como um meio, eu só não sabia ainda de

que. Foi quando a dificuldade em encontrar um novo referencial teórico para o Combate

filosófico fez com que eu me lembrasse de uma vocação que ele já tinha e que não foi

explorada, pois um pouco antes de eu terminar o protótipo do jogo para apresentar na defesa

de minha proposta de produto didático no programa de residência docente do Colégio Pedro II

eu me lembre que, sob influência do livro “Ensino de Filosofia e a lei 10639” eu abri uma

porta no jogo para a proposta apresentada pelo professor Renato Noguera no livro, que dizia

respeito a ampliar a história da Filosofia para inserir a contribuição dos povos silenciados pelo

racismo epistêmico, conceito que acabara de conhecer ao ler o livro “Ensino de Filosofia e a

lei 10.639”.

Daí em diante, foi só questão de convidar o professor Renato Noguera para me

orientar e escancarar a porta que eu já havia aberto no jogo, foi quando decidi transformá-lo

em um material didático para ajudar professores de Filosofia a levar para o contexto de suas

aulas parte dos conteúdos prescritos pela lei 10.639 para a promoção de uma educação

filosófica comprometida com a educação para as relações étnico-raciais. Essa proposta foi

apresentada à banca por ocasião da minha qualificação e pareceu razoável, de forma que a

partir das orientações recebidas ali foram formulados os objetivos e traçada a nova estratégia

para a transformação do jogo.

Após a qualificação o objetivo geral da pesquisa passou a ser desenvolver um card

game para o ensino de filosofia com foco nos conteúdos prescritos pela lei 10.639.

Conforme o novo projeto, desenhado a partir do objetivo geral, decidimos que as etapas a

serem percorridas para alcançá-lo seriam: em primeiro lugar, avaliar estratégias para

aplicação das exigências da lei 10.639/03 ao ensino de Filosofia a partir de estudos relativos

ao contexto de sua promulgação e das questões que envolvem o cumprimento de seus

dispositivos em aulas de Filosofia; analisar possibilidades teóricas e práticas para a

implementação da lei 10.639/03 em aulas de Filosofia no contexto educacional brasileiro,

desenvolver um protótipo do card game Combate Filosófico expandido conforme o objetivo

geral da pesquisa; inserir o protótipo no contexto das aulas de Filosofia como um organizador

prévio; elaborar novos cards para o jogo e um novo manual de regras; testar e avaliar o

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10

protótipo do jogo após sua expansão a partir da análise das percepções dos alunos que

participaram do teste.

Tendo em vista os objetivos propostos acima os assuntos abordados pela dissertação

foram distribuídos da seguinte forma: no capítulo um “Ensino de Filosofia e a lei 10.639:

contextualizando a questão” foi contada a história da lei 10.639 desde as campanhas do

Movimento Negro Unificado (MNU) até as estratégias e embates que envolveram a aplicação

de seus dispositivos em aulas de Filosofia. Para tanto foi traçado o percurso da Filosofia como

disciplina escolar no Brasil desde o período colonial até seu retorno obrigatório para o ensino

médio. Por fim, o capítulo se encerra apresentando a problemática que envolve o ensino de

Filosofia no Brasil.

No capítulo dois “Possibilidades e Caminhos para um Ensino de Filosofia em

conformidade com a lei 10.639” buscou-se apresentar uma possibilidade teórica e uma prática

para viabilizar o ensino de Filosofia em conformidade com a lei 10.639, sendo: a noção de

história ampliada da filosofia e o conceito de organizador prévio. No referido capítulo també

foram abordados pontos relevantes para a discussão sobre a filosofia africana e afro-brasileira

e os conteúdos prescritos pela lei 10.639, como: o racismo epistêmico, o conceito de

colonialidade e a crítica da periodização na história da filosofia. Também abordou-se o

conceito de jogo, questões teóricas ligadas a noção de organizador prévio e jogos educativos.

No capítulo três “Denegrindo a disputa dialética: um a relato de experiência da

aplicação do card game Combate Filosófico após sua expansão para atender os dispositivos da

lei 10.639” foi contada a história do card game Combate Filosófico, apresentada sua nova

versão e detalhada a metodologia utilizada para os testes com os alunos. No capítulo três

podem ser conhecidos também alguns cards do jogo, da sua mecânica e do processo para sua

construção e expansão. Também se encontra no capítulo três uma avaliação feita do jogo

pelos sujeitos de pesquisa analisada pelo pesquisador.

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1 ENSINO DE FILOSOFIA E A LEI 10.639: CONTEXTUALIZANDO A

QUESTÃO

1.1 O ENSINO DE FILOSOFIA E A LEI 10.639/03: CONTEXTUALIZANDO

A proposta desta dissertação, de transformar um card game que foi produzido com

outro objetivo, em um material didático voltado para apoiar professores de Filosofia no

cumprimento da lei 10.639/03, surge da tentativa de unir teoria e prática num esforço lúdico

de representar e levar para a sala de aula uma proposta teórica construída para viabilizar o

cumprimento das determinações da lei 10.639 para uma educação para as relações étnico

raciais em aulas de Filosofia.

A proposta teórica é a noção de “história estendida da Filosofia” teorizada pelo

professor Renato Noguera em seu livro “Ensino de Filosofia e a lei 10.639”. No próximo

capítulo conheceremos melhor a proposta, momento em que a dissertação irá detalhar os

referenciais escolhidos para a transformação do card game - Combate Filosófico - e um

material didático voltado para apoiar professores de Filosofia no cumprimento da lei

10.639/03. Todavia, precisamos antes, conhecer melhor o contexto em que a lei 10639/03 foi

pensada, os embates que envolveram sua promulgação e as implicações das transformações

que a lei trouxe para o ensino de Filosofia. Além é claro, de parte da problemática que

envolve seu cumprimento em aulas de Filosofia.

1.2 O MOVIMENTO NEGRO UNIFICADO E A LUTA POR UMA EDUCAÇÃO

ANTIRRACISTA NO BRASIL

A promulgação da lei 10.639, em 2003, representou um marco na história dos

movimentos de resistência negra no país, sendo verdade inclusive, que para compreender o

contexto em que a lei foi pensada e proposta até sua promulgação, é preciso que se

compreenda a própria história da militância negra no Brasil republicano sob a liderança do

Movimento Negro Unificado (MNU) e a história das lutas do MNU por uma educação que

fizesse frente ao racismo e à discriminação da população negra na sociedade brasileira. Desta

forma, esta dissertação se propõe, sem qualquer pretensão de exaurir o tema, a traçar um

breve histórico do MNU e de sua militância em prol de uma educação antirracista no Brasil

republicano.

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O estudo da história do movimento negro no período republicano torna evidente que,

as pautas ligadas à educação sempre estiveram presentes nas reivindicações que os militantes

levavam aos governantes, sendo da mesma forma, preocupação constante e prioritária das

instituições negras de maior importância e destaque desde tempos remotos da história do

Brasil.

Conforme Amílcar Pereira Araújo (2013, p. 28),

[...]ainda no início do período conhecido como “pós-abolição”, antes mesmo da

criação da Frente Negra Brasileira (FNB) – que foi a maior organização do

movimento social negro na primeira metade do Século XX – em 1931 na cidade de

São Paulo, a questão da educação de pessoas negras já despontava como um tema de

grande importância para as organizações de negros em nosso país. Entre essas

organizações, o Centro Cívico Palmares, criado em 1926, merece destaque, pois,

segundo George Andrews, essa organização teria sido um marco importante para a

mobilização política dos negros em São Paulo, justamente durante o período que

antecede a Revolução de 1930.

Para Araújo (idem, p. 28), portanto,

[...] a Lei 10.639/03 é fruto dessas histórias [da resistência negra] ainda pouco

pesquisadas e, portanto, pouco conhecidas e pouco estudadas em nossas escolas. Se

essa lei não pode ser pensada como uma construção realizada a partir de uma

simples relação de causa / consequência, como formador de professores de História,

atuando em cursos de formação inicial e continuada, acredito que para melhor

entendermos e contextualizarmos o processo de construção dessa lei, seja

fundamental conhecer a história do movimento negro organizado no Brasil

republicano.

Petrônio Domingues (2007, p. 02) define movimento negro como “[...] a luta dos

negros na perspectiva de resolver seus problemas na sociedade, especificamente os que são

provenientes do preconceito e da discriminação racial”. O autor divide o período da

militância do movimento negro em três fases: a primeira fase vai da Primeira República ao

Estado Novo ( de 1889 a 1937); a segunda fase da República à ditadura militar (1945 a 1964);

e a terceira fase do início do processo de redemocratização à República Nova (1978-2000).

Para um entendimento razoável da história do movimento negro é crucial que se

conheça o marco divisório que ele experimentou sob a liderança do Movimento Negro

Unificado (MNU), entidade que representou a unificação de todas as entidades de

representação negra no Brasil sob uma nova perspectiva de militância.

Conforme Domingues (2007), no dia 18 de junho de 1978 na cidade de São Paulo em

reunião que contou com a representação de diversas entidades negras, dentre elas: o Centro de

Cultura e Arte Negra (CECAN); o Grupo Afro-Latino América; a Câmara do Comércio Afro-

Brasileiro, além dos jornais “Abertura” e “Capoeira”, bem como os Grupos de Atletas e

Artistas Negros, foi criado o “Movimento Unificado Contra a Discriminação Racial”

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(MUCDR). Domingues (2007) esclarece ainda que na mesma semana, no dia 23 de julho, foi

adicionada a palavra “negro” ao nome do Movimento, que passou se chamar “Movimento

Negro Unificado Contra a Discriminação Racial” (MNUCDR).

Em 1982 o MNU apresentou seu projeto de ação, que tinha como reivindicações

mínimas, a

[...] desmistificação da democracia racial brasileira ; organização política da

população negra; transformação do Movimento Negro em movimento de massas;

formação de um amplo leque de alianças na luta contra o racismo e a exploração do

trabalhador; organização para enfrentar a violência policial; organização nos

sindicatos e partidos políticos; luta pela introdução da História da África e do

Negro no Brasil nos currículos escolares3, bem como a busca pelo apoio

internacional contra o racismo no país (Idem, p, 15).

Para Domingues (2007), o Movimento Negro Unificado (MNU) se insere na terceira

fase do Movimento Negro organizado na República. Essa fase representou uma rearticulação

do Movimento depois do refluxo percebido no período da ditadura militar de 1964:

[...] o golpe militar de 1964 representou uma derrota, ainda que temporária, para a

luta política dos negros. Ele desarticulou uma coalizão de forças que palmilhava no

enfrentamento do “preconceito de cor” no país. Como consequência, o Movimento

Negro organizado entrou em refluxo. Seus militantes eram estigmatizados e

acusados pelos militares de criar um problema que supostamente não existia, o

racismo no Brasil (Idem, 12).

O contexto nacional da reorganização do MNU foi a ascensão de movimentos

populares, sindicais e estudantis, recebendo especial influência ideológica da organização

marxista “Convergência Socialista”. Domingues (idem, p. 13) explica que,

[...]havia na Convergência Socialista, um grupo de militantes negros que

entendia que a luta antirracista tinha que ser combinada com a luta

revolucionária anticapitalista. Na concepção desses militantes, o capitalismo

era o sistema que alimentava e se beneficiava do racismo; assim, só com a

derrubada desse sistema e a consequente construção de uma sociedade

igualitária era possível superar o racismo. A política que conjugava raça e

classe atraiu aqueles ativistas que cumpriram um papel decisivo na fundação

do Movimento Negro Unificado [...].

Para Domingues (2007), a formação do MNU representou um marco na história da

militância negra no Brasil, o que se deveu, dentre outros fatores, ao fato de o MNU ter

conseguido apresentar um projeto capaz de unificar as lutas de todos os grupos e organizações

antirracistas em nível nacional. O projeto do MNU, que objetivava fortalecer o poder político

do movimento negro, tinha como parte significativa do seu plano de ação, segundo o autor,

3 grifo nosso

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direcionar todos os esforços para inserir na pauta das reivindicações sociais a luta contra o

racismo.

Ainda conforme Domingues (2007), com tal estratégia o MNU pretendia articular a

luta dos negros com a de todos os oprimidos da sociedade, reivindicando mudanças na ordem

social vigente. Neste sentido, o MNU atuou em duas frentes principais: adotou medidas que

visavam levar o negro a reconhecer sua condição racial e pressionou o governo para que, a

partir de reformas estruturais em setores estratégicos da sociedade brasileira, fossem tomadas

medidas urgentes de combate ao racismo. No que se refere a primeira parte da estratégia,

Domingues (idem, p.23) explica que

[...] o movimento negro organizado “africanizou-se”. A partir daquele instante, as

lides contra o racismo tinham como uma das premissas a promoção de uma

identidade étnica específica do negro. O discurso tanto da negritude quanto do

resgate das raízes ancestrais norteou o comportamento da militância. Houve a

incorporação do padrão de beleza, da indumentária e da culinária africana.

Sobre a segunda parte da ofensiva do MNU, que dizia respeito a pressionar o governo

a fazer reformas em setores estratégicos da sociedade brasileira para combater o racismo,

Domingues (idem, p.23) esclarece que,

[...] naquele período, o movimento negro passou a intervir amiúde no terreno

educacional, com proposições fundadas na revisão dos conteúdos preconceituosos

dos livros didáticos; na capacitação de professores para desenvolver uma pedagogia

interétnica; na reavaliação do papel do negro na história do Brasil e, por fim, erigiu-

se a bandeira da inclusão do ensino da história da África nos currículos escolares4.

Reivindicava-se, igualmente, a emergência de uma literatura “negra” em detrimento

à literatura de base eurocêntrica.

A reivindicação do MNU por mudanças no currículo, são um nítido sinal da nova

orientação do movimento negro sob a sigla do Movimento, em que abandona-se a fase

“assimilacionista” que reivindica a inclusão do negro na sociedade sem a busca pela

transformação da ordem social. Não se pode perder de vista todavia, que, as reivindicações

por mudanças estruturais na educação, que resultaram na promulgação da lei 10.639/03, tem

como contexto a longa história de luta pela inserção do negro na educação, iniciada logo após

a abolição da escravatura.

1.3 A LEI 10.639/03 E O CENÁRIO POLÍTICO CONTEMPORÂNEO BRASILEIRO

No tópico anterior vimos que na década de 1970, com a reorientação dos movimentos

sociais negros sob a liderança do Movimento Negro Unificado (MNU), foi construído o

contexto mais remoto para a promulgação da lei 10639/03. Já o seu contexto imediato foi

4 grifo nosso.

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construído em meio ao processo de redemocratização do país, tendo início mais ou menos em

1982, momento em que tanto o cenário político brasileiro, como o educacional, já contavam

com uma pequena, mas contundente representação negra.

Conforme Nilma Lino Gomes (2011), essa representação negra se refere a intelectuais

ligados ao movimento negro, formados em programas de pós graduação na década de 70.

Esses intelectuais, que também eram militantes do movimento negro, passam a produzir

conhecimentos sobre as relações étnico raciais por meio de pesquisas educacionais voltados

para a temática, “negro e educação”. Para Gomes (2011) a redemocratização do país iniciada

na década de 1980 contribuiu para a construção das condições que possibilitaram a imersão

desse novo perfil de intelectuais no cenário político brasileiro. Esses novos intelectuais

tematizam, agora via academia e não mais via militância apenas, as relações raciais, sobretudo

no campo educacional. A reboque dessas mudanças e transformações surge no cenário

político brasileiro, figuras como a do renomado militante da causa racial Abdias do

Nascimento, que em 1983 assumiu na Câmara Federal, um mandato de deputado pelo estado

do Rio de janeiro.

A ascensão de políticos como Abdias do Nascimento, em 1980, tem relação direta

com a campanha iniciada em 1970 pelo MNU, reivindicando a presença dos negros nas

esferas do poder, dessa forma, na década de 80, além de contar com um grupo de intelectuais,

que a partir das universidades tematizam as questões raciais produzindo pesquisas que lançam

luzes sobre a problemática da relação entre a população negra e a educação no país, as lides

contra o racismo contam ainda com representação política capaz de transformar o

conhecimento produzido por essas pesquisas em políticas públicas efetivas para combater o

racismo, propondo transformações estruturais na ordem social, como o projeto do deputado

Abdias do Nascimento.

Neste sentido, é fundamental para a compreensão do contexto imediato da

promulgação da lei 10.639/03 o conhecimento de algumas proposituras do então deputado

federal do estado do Rio de Janeiro pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) Abdias do

Nascimento.

Conforme lecionam Solange Rocha e Antônio Novaes da Silva (2013), entre os

projetos propostos pelo deputado federal Abdias do Nascimento destaca-se o Projeto de Lei

1.332/1983, que continha em seu texto “medidas de ação compensatórias” para a população

negra nas áreas educacionais e do trabalho. O deputado propôs também um projeto

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voltado especificamente para a educação que propunha alterações no currículo, sendo

conforme Rocha e Silva

[...]‘incorporar ao conteúdo do curso de história brasileira, o ensino das

contribuições positivas dos africanos e de seus descendentes à civilização

brasileira’, e também a importância de ‘incorporar o conteúdo dos cursos sobre

História Geral o ensino das contribuições positivas das civilizações africanas’

(ROCHA e SILVA, 2013, p. 62).

Alexsandro Gomes da Conceição (2019) nos informa que, embora o projeto tenha

tramitado por cinco anos e dez meses em várias comissões da Câmara dos Deputados, sendo

inclusive aprovado de forma unânime em todas, jamais foi a plenário para a votação final, o

que resultaria em sua aprovação ou rejeição, sendo arquivado em abril de 1989. Na década

seguinte, uma série de mudança na conjuntura política brasileira deixaria para trás o cenário

de recusa das propostas de Nascimento abrindo novos caminhos para a militância contra o

racista na arena política brasileira. Marcia Moreira Pereira e Maurício Silva (2012, p.5)

explicam que

[...]os diversos acontecimentos concernentes à causa negra vinham se intensificando

desde o final da década de 80 e início da década de 90, quando foram publicadas

pesquisas demonstrando o quanto a população negra estaria em defasagem em

relação ao contingente populacional branco, em vários indicadores: saúde, educação,

mercado de trabalho, entre outros. As pesquisas serviram também para comprovar o

quanto a discriminação estava presente em nossa sociedade. Ainda na década de 80,

foi promulgada a Constituição Federal, documento no qual não apenas se reconhece

a pluralidade cultural como parte integrante de nosso país, mas também se busca

combater a discriminação racial e promover a valorização das identidades étnicas.

Conforme apontam Pereira e Silva (2012), na década de 1990 o debate em torno da

questão racial, que já tomava proporções significativas na esfera política, chega a esfera social

chamando a atenção da mídia e ocupando espaço nas instituições escolares. Essa mudança de

cenário, de acordo com os autores, possibilitou conquistas importantes para a população

negra. No que se refere a políticas governamentais de maior amplitude, por exemplo, em 1996

o Governo federal lançou o Programa Nacional de Direitos Humanos, documento que

estabeleceu diversas metas para a promoção dos Direitos Humanos e também metas

específicas para a luta contra a discriminação racial. No campo educacional, foi instaurado no

Rio de Janeiro o Movimento Pré-Vestibular para Negros e Carentes (PVNC), que visava

promover a entrada de estudantes negros nas universidades públicas. Essas conquistas

aconteceram a sombra da “Marcha Zumbi dos Palmares: 300 anos contra o racismo, pela

cidadania e vida”, organizada pelo Movimento Negro Brasileiro, que reuniu em Brasília

aproximadamente 30 mil ativistas. Na ocasião, foi entregue ao governo federal o documento

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“Por uma política nacional de combate ao racismo e à desigualdade racial” que exigia ações

efetivas do Estado na luta contra o racismo (ROCHA; SILVA, 2013, p. 61).

Foi nesse contexto, de visibilidade para a questão racial na mídia, fortalecimento da

discussão sobre racismo nas instituições de ensino e adoção de medidas governamentais para

a promoção da igualdade racial, que o deputado Paulo Paim se aproveitou das conquistas no

texto constitucional para propor o projeto de lei, que conforme Pereira e Silva, foi o

“embrião” da lei 10639. Não obstante as condições serem razoavelmente favoráveis, a

proposta ainda não contava com força política suficiente e foi rejeitada.

A cena política brasileira precisava ainda de mais intervenções até que o passo

definitivo em direção a promulgação de uma lei com a importância da lei 10.639 fosse dado,

e no que dependeu da militância negra, as intervenções não faltaram. Em 1999 foi lançado o

livro “Superando o racismo na escola”. Organizado pelo professor da USP e militante do

Movimento Negro, Kabengele Munanga, o livro continha 11 artigos que versavam sobre

educação e relações raciais e foi considerado, segundo Solange Rocha e José Antônio

Novaes da Silva (idem), “ [...] um dos resultados (na área da educação) dos debates entre

sociedade civil e governo federal ocorridos na década de 1990 [...]”.

Ainda no ano de 1999 é aprovado o Projeto de Lei nº 259, formulado pelos então

deputados Ben-Hur Ferreira e Esther Grossi. Conforme Rocha e Silva (2013) o projeto, que

em seu primeiro artigo justificava a intenção de reconhecer a luta dos negros no Brasil na

formação da sociedade nacional, resgatando sua contribuição, estabeleceu a obrigatoriedade

da temática História e Cultura Afro-Brasileira no currículo oficial da rede de ensino. A

aprovação do projeto dos referidos deputados no fim da década de 90 foi de suma importância

para avanço da militância do movimento negro por mudanças estruturais na educação

brasileira, tendo em vista que, outros acontecimentos importantes da década de 1990 no que

tange a educação, anteriores ao projeto de Lei nº 259, que foram, segundo Rocha e Silva: a

aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBN) em 1996, e a criação,

no ano seguinte, dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), não representaram avanços

significativos no que se refere a inclusão de conteúdos afrocentrados o currículo escolar.

Conforme Araújo e Souza (2016)

“[...] a LDB 9394/1996 teve uma lacuna deixando fora, por ignorância ou por

motivação própria a relevância do ensino da ensino da história da cultura afro para

desenvolvimento psicointelectual e cognitivo humanística dos estudantes da

educação básica (ARAUJO e SOUZA, 2016, p. 11)

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Já Rocha e Silva (2013) explicam que o problema dos PCNs, se referindo

especificamente ao “tema transversal da Pluralidade Cultural” foi que

“[...] não há unanimidade em relação aos propósitos explicitados, sendo eles

severamente criticados por alguns teóricos e educadores, que censuram a forma

como a diferença racial é abordada no documento. Assim, [...] trata-se de uma

proposição que insiste demasiadamente na diferença, podendo-se, entre outras

coisas, questionar se a escola seria, de fato, um espaço de culturas diversas que se

manifestariam plena e livremente (PEREIRA e SILVA, 2012, p. 12).

O passo definitivo para a construção de um currículo antirracista na educação

brasileira foi dado em 2003, quando o então presidente da República Luiz Inácio Lula da

Silva, em cumprimento a uma promessa de campanha, em que assumiu o compromisso de

apoiar a luta da população negras, promulga o projeto de lei que foi aprovado em 1999. A lei

recebeu dois vetos ao propor alterações na LDB: o primeiro, segundo Pereira e Silva (2012)

foi na proposta que determinava, desde o projeto de lei, que as disciplinas História do Brasil e

Educação Artística, deveriam dedicar pelo menos dez por cento de seu conteúdo programático

anual ou semestral à temática africana e afro-brasileira no ensino médio; o segundo, atingiu à

proposta referente aos cursos de capacitação para professores, que pela proposta da lei,

passariam a contar com a parceria de entidades do movimento afro-brasileiro, das

universidades e outras instituições de pesquisa que tinha ligação com o tema. Segue abaixo a

justificativa do governo para os vetos na íntegra:

[...]o referido parágrafo [dedicação de pelo menos dez por cento de seu conteúdo

programático anual ou semestral à temática africana e afro-brasileira no ensino

médio] tratada não atende ao interesse público consubstanciado na exigência de se

observar, na fixação dos currículos mínimos de base nacional, os valores sociais e

culturais das diversas regiões e localidades de nosso país. [Sobre a capacitação de

professores]: verifica-se que a lei nº 9.394, de 1996, não disciplina e nem tampouco

faz menção, em nenhum de seus artigos, a cursos de capacitação para professores. O

art. 79-A, portanto, estaria a romper a unidade de conteúdo da citada lei e,

consequentemente, estaria contrariando norma de interesse público da Lei

Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1988, segundo a qual a lei não conterá

matéria estranha a seu objeto. (BRASIL, 2003b, p. 01)

Apesar dos vetos, a lei foi bem recebida pelo movimento negro, que viu se tornar

realidade uma de suas bandeiras mais importantes desde 1980, que vinha acompanhada da

reivindicação da presença de negros no poder como estratégia para transformar a ordem

social. Uma realidade que ganhou corpo e começou a se efetivar com a promulgação da lei

10639, um produto dos esforços da militância, quer seja atuando como grupo de pressão junto

ao governo ou apresentando dados de pesquisas, via academia, para demonstrar os impactos

negativos do racismo na educação brasileira. Um processo que se consolidou graças ao

protagonismo do deputado federal Ben-Hur Ferreira, homem negro, que elaborou o projeto

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de lei que foi provado e deu seguimento a atuação de outros parlamentares que se valeram de

seus mandatos para fazer avançar a luta contra o racismo na educação, a exemplo de Abdias

do Nascimento.

1.4 A LEI 10.639: DESDOBRAMENTOS E EMBATES

A lei federal 10.639 de 9 de janeiro de 2003, acrescentou à LDB os artigos 26, 2 A e

79 B estabelecendo a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira no

currículo oficial da rede de ensino. Porém, apesar da grande conquista que a lei representou,

de sua promulgação até a implementação, foi um longo caminho, entre: regulamentações

pelos órgão de educação do governo e a efetivação de políticas públicas para implementação

da lei.

Sobre a regulamentação pelos órgãos de educação do governo, Maria da Guia Viana

(2009) nos informa que no dia 10 de março de 2004 foi aprovado pelo Conselho Nacional de

educação (CNE) e o Conselho Pleno (CP) o Parecer 03/04 que instituiu as Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais para o Ensino de História

e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Viana (2009, p. 62) explica que:

[...] o Parecer ressalta, entre outras orientações, o compromisso com a educação de

relações étnico-raciais, a valorização da história e da cultura afro– brasileira e

africana, traz indicações de conteúdos a serem incluídos no currículo nas diversas

áreas de conhecimento, assim como indica ações a serem desenvolvidas pelo poder

público nas três esferas.

No que tange às políticas públicas para a implementação da lei, conforme Viana

(2009), nos anos subsequentes à sua promulgação, o Ministério da Educação, por meio da

SECAD, tratou de desenvolver programas educacionais de acesso e permanência da

população negra à educação escolar em todos os níveis e modalidades, além de ações que

possibilitassem, de forma ampla, a reflexão da sociedade sobre as relações étnico-raciais no

Brasil. De acordo com Viana (2009), portanto, tendo como base dados coletados por um

grupo de trabalho interministerial, as ações da SECAD/MEC foram desenvolvidas adotando-

se as seguintes estratégias:

Projetos Inovadores de Curso (PICS), que integram o Programa Diversidade na

Universidade, dando apoio financeiro a cursos preparatórios para vestibulares

populares e comunitários voltados para a população negra e indígena [...] [;]

Comissão Técnica Nacional de Diversidade para Assuntos Relacionados à Educação

dos Afro-Brasileiros (CADARA), que foi criada em 2003 com atribuição de

assessorar o MEC/SECAD. [...] Fóruns Estaduais – Entre o ano de 2004 a 2005

foram realizados 21 fóruns estaduais de educação e diversidade étnico–racial, com o

objetivo de combater a desigualdade no cotidiano escolar, articulando diversos

segmentos governamentais e não governamentais e organizações de movimento

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negro para divulgar a Lei nº 10.639/03. [...] Programa Brasil Quilombola (SEPPIR)

– Participação do MEC/SECAD no comitê gestor do programa. Este Programa

abrange as ações governamentais para a comunidade remanescente de quilombos,

por meio de articulações interinstitucionais, com ênfase na participação da sociedade

civil. A participação do SECAD no Programa deu-se por meio do Programa Cultura

Afro-Brasileira (PPA 2004/2007) que apoiou técnica e financeiramente as

prefeituras das áreas remanescentes na ampliação da rede física escolar, na formação

continuada de professores e na aquisição de material didático específico para essas

áreas. [...] Formação de Professores – A formação continuada de professores foi

desenvolvida por meio do programa UNIAFRO que financiou cursos presenciais,

coordenado pelos Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros (NEABs) e pelo curso a

distância Educação-Africanidades – Brasil, ministrado pela UNB, e pelas oficinas de

Cartografia sobre geografia afro-brasileira e africana. [...] Produção e distribuição de

material de referência para professores – Publicações de 29 títulos da coleção

educação para todos (SECAD/UNESCO), seis destes fazem referência à

implementação da Lei nº 10.639/03. [...] Cor da Cultura – Materiais produzidos em

parceria com a Fundação Roberto Marinho, kit contendo jogos, cds, dvds, livros,

havendo momento de formação sobre a metodologia de utilizações desses materiais.

O MEC/SECAD promoveu também o Concurso Nacional de Material Didático-

pedagógico para o reconhecimento e a valorização da história e cultura e da

identidade afro-brasileira e africana (2006), porém, como os participantes que se

inscreveram não preencheram os requisitos exigidos, não houve vencedores. [...]

Publicação do texto das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das

Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e

Africana, com cerca de 1.000.000 exemplares distribuídos. [...] Diálogos Regionais

sobre a implementação das Diretrizes Curriculares da Educação Étnico-Raciais.

Trata-se de consulta pública sobre o Plano Nacional de implementação da Lei nº

10.639/2003. - “Os seis diálogos regionais permitiram melhor observação dos

obstáculos a serem superados para uma educação que efetivamente leve em

consideração a diversidade étnico-racial” [...] (VIANA, 2009, p. 64).

Para Viana (2009), não obstante as ações desenvolvidas pelo governo federal com o

intuito de implementar a Lei 10.639/2003, ainda nos anos subsequentes a sua promulgação, a

descontinuidade de ações e a falta de financiamento, representaram grandes entraves no

processo. Em novembro de 2007, a representação da UNESCO e o SECAD/MEC realizaram

no distrito federal uma oficina de trabalho que tinha como objetivo discutir a implementação

da Lei no País. Conforme parte do texto do documento oficial transcrito por Viana (2009, p.

65) a oficina revelou que:

[...] apesar da riqueza de muitas das experiências desenvolvidas nos últimos anos, a

maioria delas restringem-se à ação isolada de profissionais comprometidos (as) com

o princípio da igualdade racial que desenvolvem a experiência a despeito da falta de

apoio dos sistemas educacionais. A consequência são projetos descontínuos com

pouca articulação com as políticas curriculares de formação de professores e de

produção de materiais e livros didáticos sofrendo da falta de condições institucionais

e de financiamento.

Viana (2009) esclarece que as dificuldades, anteriormente detalhadas, também foram

reproduzidas nas esferas de poder Estaduais, dessa forma, embora em cada Estado da

federação tenham sido adotadas estratégias e políticas públicas diversas para a implementação

da lei, em todos se percebe o impacto da ineficiência das políticas da União. No estado do

Maranhão, por exemplo, além do impacto da ineficiências das políticas do governo federal, o

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processo de implementação da lei 10639 foi prejudicado devido a inércia do governo local.

De forma que, conforme Viana (2009, p.65), uma vez que não houve

[...] manifestação do governo do Estado do Maranhão para implementação da Lei nº

10.639/03 em maio de 2004, o Movimento Negro, por meio da Associação das

Comunidades Negras Rurais Quilombolas (ACONERUQ), em reunião no palácio do

governo, entregou aos representantes governamentais do Estado uma pauta de

reivindicações para a população negra maranhense, considerando as desigualdades

raciais no Brasil e no Maranhão, que se constitui o terceiro Estado brasileiro de

maior população negra.

1.5 DIFICULDADES PARA IMPLEMENTAÇÃO DA LEI 10.639 POR DISCIPLINAS: O

CASO DA FILOSOFIA

A negligência do governo do Maranhão em relação a políticas para implementação da

lei 10639, um ano após sua promulgação, demonstrou mais uma vez a importância do

protagonismo exercido pelo movimento negro, atuante também na fase descentralizada da luta

pela implementação da lei 10639, que se deu nos estados.

Os embates envolvendo os governos estaduais, o movimento negro e a comunidade

docente sociedade marcaram os primeiros dez anos da promulgação da lei, sendo os próximos

anos marcados pela discussão em prol das estratégias docentes para que a lei fosse cumprida

nas salas de aula da educação básica. Neste momento, os professores que decidiram se

comprometer com o cumprimento da lei sentiram diretamente os efeitos da ineficiência das

políticas públicas da década anterior.

Neste sentido, a Filosofia constitui um caso particular de dificuldade ao cumprimento

das exigências da lei 10639, pois, além das dificuldades compartilhadas por todas as

disciplinas, ela conta com uma trajetória única na história da educação brasileira, trajetória

que lhe impôs como disciplina escolar desafios muito particulares no que se refere aos

conteúdos prescritos pela lei 10639, conforme veremos nos tópicos seguintes.

1.5.1 Breve histórico da Filosofia como disciplina escolar no Brasil

Conforme Norberto Mazai e Maria Alice Coelho Ribas (2001), a Filosofia como

disciplina escolar chegou ao Brasil com os jesuítas no século XVI. No período, a educação

como um todo era posta a serviço da empreitada colonial portuguesa e ganha forma de

catequese dos povos da colônia, que passam a integrar o grande projeto de expansão da fé

católica. De acordo com Mazai e Ribas (2001, p. 02), “[...] os jesuítas exerciam, de certa

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forma, uma espécie de teocracismo, que suscitava assim um monopólio do pensamento e

afastava Portugal das contribuições do movimento científico da época, com Descartes, Bacon,

Galileu e outros.”.

Dessa forma a educação no período colonial era dirigida a setores da elite, com a

oferta de disciplinas formalistas de cunho retórico, as chamadas “Ciências Sociais e

Humanas”. Para Maria Tereza Pentedo Cartolano (1985), a tradição filosófica no período

colonial foi reduzida uma série de comentários filosóficos de pouca importância teórica, tendo

como fundamento o pensamento escolástico. Segundo Cruz Costa (1960), a Filosofia no

período colonial, sob a responsabilidade dos jesuítas, era livresca, consistindo em um

amálgama de concepções teóricas que vinham prontas da Europa para serem reproduzidas na

colônia.

Ponderam Mazai e Ribas (2009) que a forma que o ensino assumiu com os jesuítas

deixou traços marcantes na educação colonial, tendo efeitos nefastos no ensino de Filosofia,

que se estabeleceu como assimilação, registro e comentário de teorias e escolas de

pensamento européias. De forma que:

[...] a Ratio Studiorum foi a máxima expressão do esforço de sistematização do

conhecimento, constitui-se na organização e no plano de estudos dos jesuítas.

Subordinava o ensino superior à teologia e ao dogmatismo (Filosofia da salvação),

que se alicerçava, por sua vez, na procura de uma ortodoxia definida pelos próprios

jesuítas e que levava a expurgar os textos dos autores que se afastassem das ideias de

Sto.Tomás de Aquino e Aristóteles (MAZIO e RIBAS, 2009, p.3).

O sistema de ensino jesuíta vigorou até as reformas empreendidas pelo Marquês de

Pombal, que resultaram na expulsão dos jesuítas em 1759. As reformas pombalinas ocorreram

como resultado de uma série de transformações políticas, econômicas e sociais que tiveram

início em Portugal e repercutiram no Brasil. De acordo com Armindo Quillici Neto (2007,

p.02) as reformas do Marquês de Pombal marcou o início de uma nova era para a colônia

portuguesa, em que

[...] as novas determinações, ditadas pelo então Marquês de Pombal traziam

grandes mudanças no perfil econômico, cultural e, consequentemente, no

educacional. Nessas circunstâncias, o interesse nas mudanças econômicas levou o

Governador Geral de Portugal a agir de forma drástica, fazendo com que

seguidores dos jesuítas, principalmente os indígenas, fossem forçados ao trabalho

escravo, ou ainda submetidos a torturas que, muitas vezes, levavam à morte.

Quillici Neto (idem) segue esclarecendo que:

[...] outro elemento fundamental que influenciou na expulsão dos jesuítas do reino

português foi o surgimento do Iluminismo, que tinha bases no Movimento

Renascentista e na Reforma Protestante. A exaltação da razão contrapondo-se à

religião revelada, marca do século das luzes, em oposição à era das trevas,

possibilita o surgimento das novas doutrinas democráticas e impulso do

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desenvolvimento científico, e a Educação ganha um novo rumo, tanto em Portugal

como no Brasil.

No que se refere ao ensino da Filosofia, Quillici Neto (2007, p. 08) nos informa ainda

que no período pombalino a Filosofia “[...] deixou de ocupar o espaço doutrinário do

catolicismo Jesuítico, o vínculo com a visão medieval do Ratio e passou a receber uma

influência Iluminista”, passando a “[...] privilegiar os gregos e a concepção moderna fundada

nas ciências naturais [...]” (idem). Não obstante a importância das transformações trazidas

pelas reformas pombalinas para a educação, especialmente para o ensino de Filosofia, com a

importante mudança de paradigma, da ratio medieval para o Iluminismo, Mazai e Ribas

(2009, p.08) esclarecem que, “[...] as reformas do Marquês de Pombal não deixam de marcar

[...] um retrocesso na educação [...]”. Sobre este ponto Cartolano (1985) explica que, apesar

de todos as transformações trazidas com as reformas do Marquês de Pombal, a educação na

Colônia não deixou de se pautar pelos objetivos religiosos como era na época dos jesuítas,

cujos métodos pedagógicos ainda continuaram a ser aplicados depois da expulsão da ordem

dos soldados de Cristo, um método que pendia para a falta de criação individual e original.

Também persistiram no ensino de Filosofia práticas livrescas e escolásticas.

A partir do século XIX, todavia, impulsionada por transformações impostas pela

mudança da sede da coroa portuguesa, de Portugal para o Brasil, a educação, e

consequentemente o ensino de Filosofia, entram em uma nova fase. Mazai e Ribas (2009, p.

05) explicam que

[...]com a vinda de Dom João VI para o Brasil, com toda a sua corte em 1808,

abriram-se às portas para o comércio mundial, o que contribuiu também, para a

introdução de novas idéias na vida da colônia. Nesse período, chegaram a realizar-se

conferências filosóficas. Nasceram novos colégios para a preparação da nova classe

que iria administrar e governar a colônia. Os negócios aumentavam e exigiam uma

expansão da educação. Nesse clima de transformação, a Filosofia no Brasil e o seu

ensino estavam voltados para a formação profissional e não mais para um ensino

propedêutico visando à formação sacerdotal e a propagação da fé cristã.

De acordo com Mazai e Ribas (2009) em 1838 o ensino de Filosofia se torna

obrigatório, sendo incluído nos currículos dos liceus e dos ginásios do curso secundário desde

o início do 19. Conforme os autores supracitados, o ensino de Filosofia no século XIX, foi

marcada pelo setor econômico, uma tendência que se justifica diante das grandes

transformações que ocorreram no período, a exemplo da ascensão das companhias anônimas,

comerciais e industriais, fundação do Banco do Brasil, linha do telégrafo elétrico e a abertura

da Estrada Central do Brasil. Essas transformações vieram acompanhadas de novas ideias, de

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forma que a educação em terras coloniais, e consequentemente o ensino de Filosofia, agora

sofrem influência do positivismo e do evolucionismo, destaque para o Positivismo:

[...] entre as correntes filosóficas em ascensão, nas últimas décadas do século XIX,

por volta de 1870, o Positivismo foi a que mais repercussão teve no seio do

pensamento brasileiro e na educação que aqui se ministrava. A razão fundamental

desse fato radica-se na preexistente tradição cientificista que se iniciou com as

reformas pombalinas, à luz das quais se estruturou todo o sistema de ensino

superior, em bases que privilegiavam a ciência aplicada e a instrução estritamente

profissional (MAZAI e RIBAS, 2009, p. 06).

O Positivismo de Auguste Comte foi muito bem recebido no Brasil, que ainda

contava com um ensino de Filosofia engessado por um método escolástico de raiz medieval,

embora a tempos esse método vinha sendo minado pelo paradigma iluminista, que

enfraqueceu sobremaneira a pedagogia jesuíta. No século 20, sob a República, uma nova

orientação passa a dirigir o ensino de Filosofia, trata-se da busca por um pensamento racional

originalmente brasileiro. Conforme Mazai e Ribas (2009, 13)

com a queda do império e com a instauração da República em 1889, a preocupação

com a busca de uma sociedade racional tornou-se meta prioritária da elite intelectual

brasileira. Surgiram novos centros urbano- industriais e um forte processo de

desarmonia entre campo e cidade. No ano de 1908, fundava-se a Faculdade Livre de

Filosofia e Letras que possuía uma orientação puramente neotomista. Nesse período

também apareceram novos livros de ensino da Filosofia e quase todos possuíam uma

orientação católica.

Nesta fase de busca por um pensamento racional brasileiro as correntes de pensamento

europeu começam a encontrar dificuldade para entrar no Brasil, que já não mantém sua porta

escancarada para o pensamento estrangeiro. Mazai e Ribas (2009) explicam que nessa fase a

principal concorrente a polemizar com o Positivismo de Comte foi a Sociologia, dentre outros

motivos, por se adequar melhor ao perfil do pensamento brasileiro, voltado para problemas

práticos. Conforme assevera Costa (1967, p. 353)

[...] a inteligência brasileira se dá [...] com o trato de problemas concretos. Isto é

assim, porque as questões mais gerais estão contidas em problemas concretos e

vivos, porque tal tarefa se nos impõem com insistência, antes de nos lançarmos a

elucubrações mais largas e profundas [...].

Mazai e Ribas (2009) pontuam que, a busca por um pensamento racional brasileiro e a

diminuição da entrada de correntes europeias de pensamento não foram suficientes para

aproximar o ensino de Filosofia da sociedade brasileira e em 1915 a reforma instituída pelo

decreto n° 11.530 fez da Filosofia uma disciplina facultativa. Porém a situação da Filosofia

ainda não estava definida, mais duas reformas ainda ocorreriam na década de 30. A primeira

“[...] determinava que a educação visava não somente à matrícula nos cursos superiores, mas

também, à formação do homem para todos os setores da vida [...]” (MAZAI; RIBAS, 2001, p.

9), a segunda, de 1942 instituída pelo decreto n° 4.244 dividiu o ensino em dois ciclos: o

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ginásio, cursado em quatro anos e o colegial em três anos. O colegial foi divido em científico

e clássico. O científico tinha como objetivo principal o ensino das ciências e o clássico tinha

uma reserva de quatro horas semanais para o ensino de Filosofia, essas quatro horas deviam

dar conta da chamada formação intelectual. Segundo Cartolano (1985, p.59), “a Filosofia era

disciplina comum aos cursos clássico e científica e deveria ser ensinada de acordo com um

mesmo programa para ambos os cursos, apenas com maior amplitude no curso clássico”.

Mas o grande revés a Filosofia sofreria na década de 60, Já no primeiro ano com a

promulgação da primeira edição da Lei de Diretrizes e Bases da educação Nacional, houve a

sugestão de que a Filosofia se torna-se uma disciplina complementar, o que significou na

prática o fim da obrigatoriedade de seu ensino em nível federal. Em 64 com o Golpe militar as

ciências humanas sofrem restrições em seu ensino, e o ensino de Filosofia passa de

complementar a facultativo, o que significou segundo Mazai e Ribas (2009), o seu banimento

oficial do currículo.

Conforme Mazai e Ribas (idem, p. 13),

[...]a expansão econômica, impulsionada pela chegada do capital estrangeiro, bem

como a proteção do governo militar e os investimentos dados à educação

contribuíram para a extinção da Filosofia do currículo das escolas. A educação

acabou exercendo um papel ideológico, pois foram impostos valores culturais

estrangeiros, como modelos a serem seguidos pela educação no Brasil. O modelo

educacional a ser seguido era totalmente técnico e burocrático.

Para Cartolano (1985) a Filosofia ficou de fora das reformas que se pretendiam

implementar na educação na década de 60 por não atender, segundo o governo militar, aos

interesses tecnoburocráticas e político-ideológicas do regime. Dessa forma, segundo o autor, o

extinção da Filosofia como disciplina, foi muito bem planeada e executada por meio de leis,

decretos e pareceres. Todo esse aparato jurídico tinha como objetivo principal, além banir o

ensino de Filosofia da estrutura educativa estatal, centralizar as decisões na área da educação.

Em 1971 se consolida o processo de expulsão do ensino de Filosofia da estrutura

educacional brasileira, quando a disciplina deixa de integrar oficialmente o currículo, e só

retorna em 1986. Ainda de acordo Mazai e Ribas (2009), a reforma educacional

implementada com a lei n° 5692, que baniu a Filosofia dos currículos, conseguiu conduzir o

ensino público de nível médio a uma profunda crise de identidade cujos efeitos são sentidos

até os dias atuais. Para os autores supracitados o ensino médio público tem uma baixa

capacidade de profissionalizar estudantes, além de deixar a desejar na integração do aluno

com uma educação humana e social.

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Para Cartolano (1985), portanto, com a reforma implementada pela lei 5692, que baniu

a Filosofia dos currículos e introduziu o ensino de uma série de disciplinas5 que objetivavam

doutrinar os estudantes,

[...]ficou muito claro [...] que o pensar crítico e transformador característico da

atividade filosófica constituía uma ameaça ao poder e à ordem vigentes, à medida

que se propunha a formar consciências que refletissem sobre os problemas reais da

sociedade. Nesse sentido, procurou-se aniquilar essa atividade reflexiva,

substituindo-a por outra de caráter mais catequista e ideológico, a nível político. A

educação moral e cívica, sendo também “moral”, estava atendendo ao que se queria

que fosse o ensino da Filosofia, num período de grandes agitações estudantis e

operárias: apenas vinculadora de uma ideologia que perpetua a ordem estabelecida e

defende o status quo (CARTOLANO, 1985, p.74).

Fazendo um balanço do ensino de Filosofia até 1985, Mazai e Ribas (2009) pontuam

que no Brasil, via de regra, a alienação e o dogmatismo sempre foram a principal roupagem

do ensino de Filosofia, que jamais teve como seu objetivo a formação humana ou a produção

de pensamento crítico, pelo contrário, sempre reproduziu ideias vindas de fora sem o mínimo

questionamento, se prestando, portanto, ao papel de canal de transmissão de ideologias

estrangeiras. Um ensino de Filosofia que antes de tudo visava conferir status para quem fosse

capaz de dominar um tipo de ideias que se quer podia ser aplicada a vida prática e a realidade

das pessoas comuns. Para os autores supracitados somente com a abertura democrática em

1982, a Filosofia pode respirar novos ares:

[...] surgem depois de um longo período de espera e discussão, no âmbito da

educação brasileira, a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação, a LDB 9394/96,

e, na seqüência, em 1999, os Parâmetros Curriculares Nacionais, para o ensino

brasileiro [...] (MAZAI e RIBAS, 2009, p. 13).

A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação e os PCNS introduziram

transformações importantes na educação brasileira, mas no que se refere à Filosofia, houve

um claro sinal de que, embora o cenário fosse novo e até mais favorável, a luta por sua

inclusão como disciplina obrigatória continuaria, a prova disso é que os PCNs rechaçaram o

papel da Filosofia como disciplina e a recomendaram, para a decepção de muitos, como

complemento dos Temas Transversais. A Filosofia é, portanto, recomendada nos PCNs como

conteúdo e não como uma disciplina.

Finalmente perto do fim da primeira metade do século XXI a Filosofia passou a

integrar o currículo da educação básica de forma obrigatória. Uma novidade introduzida pela

lei 11684/08. Renato Noguera esclarece que a partir da lei 11684/08, foi desfeita a confusão

legal estabelecidas por dispositivos anteriores, onde a Filosofia ora era colocada o como

5 Eram elas “[...] Moral e cívica e Organização Social e Política do Brasil, OSPB” (MAZAI e RIBAS, 2009, p.

11).

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“curso livre”, ora como “matéria optativa”. Essas denominações, dentre outras que a Filosofia

recebeu até a promulgação da lei 11684/08, estiveram presentes nos seguintes dispositivos

legais: lei 4.024/61, 5.692/71 e 7.044/82. A lei 11685/08 deu fim a confusão estabelecendo

de forma definitiva a presença da Filosofia na educação básica de nível médio como

disciplina. Noguera (2012, p.19) pontua ainda que

O mesmo se aplica à disciplina de Sociologia. Esta também se tornou obrigatória

com a mesma mudança da legislação educacional. Com a publicação da Lei

11.684/08, em 3 de junho de 2008, o Art. 36 da Lei 9.394/96 passou a vigorar com

um novo inciso, preconizando a obrigatoriedade de Filosofia e Sociologia durante

todo o Ensino Médio.

1.5.2 O ensino de Filosofia e a lei 10.639/03: em busca de um referencial

Conhecidas as idas e vindas do percurso trilhado pela Filosofia como disciplina na

legislação educacional brasileira, bem como as metamorfoses que a disciplina sofreu em seus

referenciais desde o modelo adotado pelos jesuítas, fica mais fácil dimensionar o tamanho do

desafio que é adequar o seu ensino às exigências da lei 10.639/03. Neste caso, inclusive,

conforme Renato Noguera (2014), um dos primeiros a teorizar a adequação do ensino de

Filosofia as exigência da lei 10639/03, trata-se de dois desafios específicos: ensinar Filosofia

e “[...] ensinar e promover relações étnico-raciais equânimes através do estudo de História e

Cultura Afro-Brasileira e Africana.” (Idem, p.19).

Ora, sobre o ensino de Filosofia, conforme vimos no tópico anterior, entre os embates

resultantes da luta da disciplina pela sua permanência nos currículos e a busca por um modelo

de ensino que melhor se adequasse a realidade brasileira, foi sendo construído

paulatinamente, a cada nova influência externa, crítica interna, adequação a prática e

legislação reguladora, um modelo de ensino de Filosofia com potencial para aplicação na

educação básica. Já a educação para as relações etnicorraciais em aulas de Filosofia, sequer

contou com uma discussão mais profunda até 2012. Soma-se a isto a realidade de que a

temática africana e afrodescendente nunca esteve presente no debate sobre as matrizes em

torno do arcabouço teórico por detrás daquilo que deveria figurar como conteúdo das aulas de

Filosofia, que sempre considerou estritamente temáticas e modelos ligados a tradição

filosófica europeia.

A tradição filosófica europeia, embora arraigada na matriz curricular do ensino de

Filosofia foi preterida como ferramenta prioritária para pensar os grandes dilemas nacionais,

tarefa que ficou a cargo da sociologia. Conforme Cruz Costa (1967, p. 353),

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[...] a inteligência brasileira se dá melhor, [...] com o trato de problemas concretos.

Isto é assim, porque as questões mais gerais estão contidas em problemas concretos

e vivos, porque tal tarefa se nos impõem com insistência, antes de nos lançarmos a

elucubrações mais largas e profundas [...].

Dessa forma, adequar o ensino de Filosofia às exigências da lei 10.639/03 é fazê-la

pensar alguns dos grandes problemas do Brasil, e portanto, trilhar um caminho nunca antes

trilhado pela disciplina em terras tupiniquins. Isso impõe a professores de Filosofia o desafio

de interpretar os dispositivos da lei 10.639/03 e transformá-los em conteúdos para serem

ensinados na educação básica. Deste modo, o ensino da Filosofia segundo Noguera (2014)

envolve as seguinte problematizações:

[...] o que é próprio da Filosofia que pode contribuir para horizontes antirracistas

na sociedade brasileira? O que a Filosofia tem a dizer sobre o racismo antinegro?

Existem pontos de contato entre a Filosofia e a história da África? As culturas

africanas e afrodiaspóricas, em especial a afro-brasileira, são relevantes para o

entendimento da Filosofia? Ou ainda, existe Filosofia africana e/ou Filosofia afro-

brasileira? (NOGUERA, 2014, p. 19).

Ora, essas problematizações por si só, independente de obterem uma resposta positiva

ou não, já representam um programa com potencial para levar para aulas de Filosofia parte

dos conteúdos prescritos pela lei 10639, todavia, a proposta de Noguera (2014) para levar

para a sala de aula os conteúdos prescritos pela lei e cumprir seu objetivo, que é combater o

racismo, envolve “uma contribuição e um esforço em favor da visibilidade da Filosofia

africana, da Filosofia afrodiaspórica e da Filosofia afro-brasileira para uma educação

antirracista.” (Idem, p. 20). Ou seja, estamos diante de duas propostas de transposição dos

conteúdos prescritos pela lei 10.639 para aulas de Filosofia, que são complementares: uma

mais especulativa e geral, focada em questionamentos que fazem a Filosofia se auto

questionar ao investigar a existência de referenciais até então ignorados pela história da

Filosofia, e outra mais específica, com potencial para igualar as relações étnico raciais e

combater de forma efetiva o racismo no ensino de filosófico, ao trazer a tona a realidade da

Filosofia africana, afrodiaspórica e afrobrasileira, para aulas de Filosofia na educação básica.

1.5.3 O ensino de Filosofia e a lei 10.639: condições atuais

É realmente um grande alento o fato de podermos contar com um livro dedicado

inteiramente ao ensino de Filosofia e da lei 10.639, como o do professor Renato Noguera

(2014), obra pioneira, que representa uma nova fase para o ensino de Filosofia na educação

básica. No entanto, a discussão sobre a aplicabilidade da lei ao ensino de Filosofia está no

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início, bem como a tese que o professor Noguera desenvolve em seu livro sobre a existência

de uma Filosofia afrobrasileira. Dessa forma, antes de abordarmos as possibilidades para um

ensino de Filosofia em conformidade com as determinações da lei 10639, de forma mais

detida, como nos termos do livro supracitado (que ocorrerá no próximo capítulo), precisamos

abordar, ainda que de forma introdutória, as dificuldades mais gerais ligadas ao ensino de

Filosofia no Brasil atualmente, que giram em torno: da discussão teóricas sobre o ensino de

Filosofia, das condições adversas, tanto gerais como específicas, e, finalmente, as questões

ligadas ao currículo, a formação docente e aos materiais didáticos.

1.5.3.1 O ensino de Filosofia como questão filosófica

Conforme Alejandro Cerletti (2009), da mesma forma que não é possível encontrar

uma resposta única para a pergunta “que é Filosofia?”, sendo tal problemática tema próprio e

fundamental da Filosofia, também se constituirá uma problemática oferecer uma resposta para

a pergunta: “o que é ensinar Filosofia?”. Para Cerletti (2009), as diversas respostas possíveis à

pergunta “o que é Filosofia?” poderiam dar lugar a concepções diferentes de Filosofia e de

filosofar, tendo tais concepções formas diversas de interferir no sentido do ensinar Filosofia.

Dizendo de outra forma, cada concepção de Filosofia exige uma delimitação específica de seu

ensino. De acordo com Cerletti (2009, p. 11) “encontrar uma resposta unívoca para ‘que é

Filosofia’ não somente não é possível, mas cada uma das eventuais respostas poderia dar

lugar a concepções da Filosofia e do filosofar, o que influíra, por sua vez, sobre o sentido do

ensinar ou transmitir Filosofia”.

Conforme Cerletti, (2009) ainda, esse problema se daria porque cada filósofo ou

filósofa responde à pergunta “o que é Filosofia?” desde seu próprio horizonte teórico, o que

complica o diálogo com outras respostas feitas à mesma pergunta. Como consequência dessas

formas de se conceituar Filosofia, desconectadas umas das outras, surgem também formas de

se ensinar Filosofia desconectadas, ou pelo menos se incorre nesse risco. O que pode

representar um desafio ao ensino de Filosofia, uma vez que esta desconexão poderia

transmitir a falsa ideia de que as diversas formas de se conceituar e ensinar Filosofia não

dependem de um lastro que as ligue, quando, na verdade, conforme nossa compreensão, disso

pode depender a própria existência da Filosofia como disciplina escolar.

Não obstante, para Cerletti (2009), não se pode evitar que quem pretenda ensinar

Filosofia seja necessariamente conduzido a ensaiar uma resposta sobre “o que é Filosofia” e,

consequentemente, sobre “o que é seu ensino”. Dessa forma, o escopo da conceituação da

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Filosofia e de seu ensino alarga-se cada vez mais. Como se, a cada tentativa, a possibilidade

de conceituação ficasse mais longe de uma forma universalmente instrumental e, portanto,

didática e possível de ser trabalhada em contextos diversos. Cerletti (2009, p.12) observa

ainda que “se a isso somarmos que nos interessa pensar o ensino de Filosofia em um contexto

educativo formal, isto é, naquele em que os conteúdos estão prescritos ou regulados pelo

Estado, o panorama se complexifica ainda mais”.

A discussão sobre a natureza do ensino de Filosofia nos termos de Cerletti (idem) é de

suma importância para a questão que esta dissertação coloca sobre o ensino de Filosofia e a

lei 10.639, pois, o engessamento da discussão sobre “o que é ensinar Filosofia” representa um

verdadeiro entrave a aplicação das exigências da lei, que não poderá contar com professores

preparados para pensar o ensino de Filosofia para além de seu referencial teórico principal.

1.5.3.2 Dificuldades materiais e gerais para o ensino de Filosofia

Além do aspecto teórico, devemos ter em conta também as condições materiais

precárias em que as aulas de Filosofia acontecem. Não se tratando de problemas específicos

de uma aula de Filosofia, mas das condições gerais da educação pública brasileira. Conforme

Ricardo Navia (2004), essas condições, que ele chama de “empobrecimento material do

sistema educativo estatal”, estariam no primeiro nível das dificuldades para uma aula de

Filosofia, sendo:

[...] as péssimas condições materiais em que se desenvolve o ensino médio público:

locais inadequados, falta de materiais e de livros, turmas superlotadas, docentes

pessimamente remunerados e "multi-empregados" que carecem de tempo para

atualização e adequado acompanhamento de seus alunos (NAVIA, 2004, p. 02).

Outros fatores apontados por Navia (idem) como adversos para o ensino de Filosofia,

que não serão comentados aqui por questão de espaço, são: a produção de uma “[...]

burocratização da estrutura educativa [...]”, que ele explica não se tratar de excesso de

funcionários, mas,“[...] que os funcionários políticos e administrativos costumam ter maior

poder de decisão do que os docentes e supervisores docentes de carreira.”, a “ [...] politização

dos cargos de direção educativa [...] ” e as “[...] condições socioculturais dos educandos [...] ”

dentre outros (NAVIA, 2004, p. 03).

Sobre as condições socioculturais dos educandos, Navia (2004) menciona famílias que

não podem custear os materiais indispensáveis para os estudos filosóficos, ausência de

bibliotecas e jornais que introduzem noções de cultura geral e habilidades linguísticas

mínimas. O autor está pensando as condições e adversidades para o ensino de Filosofia na

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América Latina de forma geral, sempre tomando como exemplo o caso do Uruguai, país que

leciona a disciplina e reside. E, embora as condições adversas que ele aponta para o ensino de

Filosofia em sua maioria coincidam com a maioria dos países da América Latina, precisamos

perguntar: o que seriam condições socioculturais adversas para o ensino de Filosofia no

Brasil? Será que tem a ver com o fato de as famílias não poderem custear os materiais

indispensáveis para os estudos filosóficos ou não dispor de bibliotecas nem jornais que

introduzem noções de cultura geral e habilidades linguísticas mínimas apenas? Ora,

certamente a pergunta não pode ser respondida sem uma ampla discussão sobre os grandes

problemas da sociedade brasileira, dentre eles o racismo estrutural, mas, não sendo o objetivo

desta dissertação, iremos direto para um problema enfrentado na educação do Brasil, que

surge a reboque dos grandes dilemas sociais que o país vive: o desinteresse dos estudantes

1.5.3.2.1 O problema do desânimo

Uma reflexão sobre as dificuldades para o ensino de Filosofia na educação básica

precisa analisar de forma detida o desinteresse dos estudantes, pois, se trata de um problema

que atinge todas as disciplinas do ensino médio, sem exceção. É o que demonstra os dados de

uma pesquisa do Centro Brasileiro de Análises de Planejamento (CEBRAP) encomendada

pelo Ministério da Educação (MEC). Conforme o relatório:

[...] a pesquisa qualitativa pretendeu investigar que tipo de relação que os jovens

estabeleceram com a escola de Ensino Médio que frequentam (ou que frequentaram)

e qual o sentido que a escola e os conteúdos que compõem o quadro curricular têm

na [...] vida deles. [Conforme o relatório] por essa metodologia, [buscou-se] [...] um

instrumento que permitissem aos jovens falarem sobre a vida, suas paixões, bem

como sobre os sentidos da escola e do lugar que ela ocupa em suas prioridades e em

sua rotina. Essa etapa do trabalho foi elaborada a partir da coleta de dados por

intermédio de diferentes métodos: participação de jovens em grupos focais;

entrevistas em profundidade; e observação virtual, acompanhando veículos de

sociabilidade e diálogos entre jovens na internet, como redes sociais e fóruns de

discussão sobre escola e adolescência (TORRES et. al., 2013, p. 67).

A pesquisa, que ouviu cerca de 1000 jovens de baixa renda com idades entre 15 e 19

anos nas cidades de São Paulo e Recife revelou que a maioria dos jovens ouvidos não

reconhece a utilidade do conteúdo das disciplinas nas aulas. Conforme o relatório (2013), não

obstante o fato de matérias mais canônicas como Português e matemáticas serem

relativamente bem aceitas, o mesmo não pode ser dito de disciplinas do campo das ciências

exatas como Química e Física, e também as disciplinas ligadas à área das Humanidades e

Ciências Sociais, a exemplo de Geografia, Filosofia e Sociologia, e Literatura. O relatório

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(2013) aponta que, enquanto, 78,8% e 77,6% consideram Língua portuguesa e Matemática,

respectivamente, as áreas do conhecimento mais úteis, 36% dos entrevistados consideram

Geografia, História e Biologia descartáveis. E, apenas 19 % consideram Literatura importante.

A Filosofia foi considerada importante por 24,9 %. Segundo o relatório, a construção dessas

categorias no questionário quantitativo foi produzida a partir da narrativa dos participantes da

pesquisa qualitativa. Onde o sentido de uma disciplina era associado ao uso instrumental dos

seus conteúdos no cotidiano dos estudantes.

Com base nas informações do relatório, existe uma tríade de disciplinas que são mais

resistentes ao desinteresse: matemática, língua portuguesa e história. O estudo analisou o

desânimo dos alunos de baixa renda dentro do contexto geral da percepção que eles têm da

escola pública, depreciada por eles, dentre outros motivos: pela precariedade de seu espaço

físico, pela falta de recursos para as aulas, ausências de tecnologias e pelo aparato de

vigilância que a escola dispõe. Além da visão negativa que o estudante tem da escola pública,

há ainda os problemas específicos de cada disciplina, que contribuem para o desânimo. No

que diz respeito a Filosofia, por exemplo, o professor Marcos Alexandre Alves (2013, p. 31)

fala em “[...] preguiça mental [...]”. Termos como este, embora apontem para

responsabilidade dos alunos, ignorando a face sistêmica do problema, são importantes para a

reflexão sobre o desinteresse em aulas de Filosofia por revelarem indícios da existência de

fatores geradores de desinteresse específicos de aulas de Filosofia, pois, Alves (2013) fala em

um tipo de “preguiça mental” específica para pensar questões filosóficas. Desta forma, o

desinteresse em aulas de Filosofia, de forma específica, pode não estar nos alunos, ou nas

condições gerais da educação brasileira, embora eventualmente alunos possam ser

preguiçosos e certamente que as condições gerais da educação no Brasil agravam o

desinteresse. Todavia, esta é uma hipótese que não poderá ser confirmada sem que se façam

pesquisas muito específicas, sendo o objetivo deste tópico apresentar o desinteresse pela

Filosofia como um dos desafios que o seu ensino enfrenta no Brasil.

1.5.3.2.2 A falta de condições pedagógicas para um ensino de Filosofia em conformidade

com a lei 10639

Além das dificuldades teóricas e mais gerais que o ensino de Filosofia enfrenta, os

professores se deparam ainda com grandes dificuldades relacionadas especificamente ao

campo pedagógico. No que diz respeito a isto, o professor Renato Noguera (2014) em livro

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intitulado “O ensino de Filosofia e a lei 10.639/03” apresentou os resultados preliminares de

uma pesquisa realizada pelo Grupo de estudos de Filosofia africana “Gefa”, grupo de trabalho

(GT), que integra uma das linhas de pesquisa do Afrosim, o grupo de pesquisa

Afroperspectivas, Saberes e Interseções da Universidade Federal Rural do Rio De Janeiro

(UFRRJ), que é coordenado por Noguera. A pesquisa, que ouviu pessoas presencialmente e

através de uma ferramenta da internet sobre as dificuldades docentes à implementação da lei

10639, conforme Noguera (2014, p. 15) “[...] aponta de modo panorâmico alguns desafios que

a legislação impõe”. Um dos desafios mais notáveis constatados pela pesquisa se refere a

grande carência na formação de profissionais preparados para um ensino em nível médio

voltado para as diretrizes de uma educação das Relações Étnico Raciais e ensino da história e

culturas afro-brasileira e indígena.

A pesquisa revelou que, embora 84.6 % das pessoas entrevistadas tivessem

conhecimento que as alterações na Lei de diretrizes e Bases da Educação (LBD) tornaram

obrigatórios os conteúdos de história e cultura afro-brasileira, africana e indígena, 76, 9 % dos

professores e professoras de Filosofia não cumprem essa obrigação legal e 100 % não tiveram

esses conteúdos em sua formação docente. A pesquisa chama atenção ainda para o fato de que

92,3 % dos professores entrevistados se formaram após a LDB tornar obrigatória o ensino de

história e cultura afro-brasileira, africana e indígena, e que, mesmo assim, 100 % não

aprenderam nada a respeito dos conteúdos que a lei tornou obrigatórios. Desses 100 %, 76, 9

% admitem sentir necessidade de formação complementar por não saber como atuar para o

cumprimento da lei (NOGUERA, 2014, p. 16).

A pesquisa aponta ainda que outra reclamação desses professores e professoras é a

ausência de material didático e paradidático que promova um ensino de Filosofia que atenda

minimamente os critérios legais estabelecidos pelo ministério da educação para uma educação

para as relações étnico-raciais. Dessa forma, a ausência de material didático e paradidático

voltados para apoiar professores no cumprimento da lei 10.639/03 é um dos grandes desafios

a serem transpostos por professores de Filosofia comprometidos com uma educação para as

relações étnico-raciais, ao lado da reforma curricular universitária nos cursos de graduação de

Filosofia, através da inclusão de conteúdo afrocentrados, e da busca de formação continuada

na área da educação para relações étnico-raciais. No próximo capítulo esta dissertação tratará

de alguns caminhos e possibilidades teóricas e práticas para o enfrentamento do problema que

constitui a falta de material didático e paradidáticos voltados para apoiar professores no

cumprimento da lei 10.639/03, que foram utilizados como referencial para a adequação e

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transformação do card game Combate Filosófico em um material didático voltado para apoiar

professores de Filosofia no cumprimento da lei 10.639/03.

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2 POSSIBILIDADES E CAMINHOS PARA UM ENSINO DE FILOSOFIA

EM CONFORMIDADE COM A LEI 10.639

Não obstante as dificuldades para um ensino de Filosofia em conformidade com a lei

10639, talvez o caminho mais difícil a ser trilhado por quem deseja cumprir as determinações

da lei seja o caminho teórico. Quadro que podemos justificar de duas formas: em primeiro

lugar, conforme o professor Renato Noguera (2014), as Orientações Curriculares Nacionais

para o Ensino Médio publicadas três anos após a promulgação da lei 10639 não abordaram

diretamente as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino de História e Cultura Afro-

Brasileira e Africana em aulas de Filosofia, além de ter dado centralidade a história da

Filosofia sem maiores problematizações sobre ela. O documento pontua tão somente que

[...] cabe insistir na centralidade da história da Filosofia como fonte para o

tratamento adequado de questões filosóficas. Com efeito, não realizamos no Ensino

Médio uma simplificação ou uma mera antecipação do Ensino Superior e sim uma

etapa específica, com regras e exigências próprias, mas essas só podem ser bem

compreendidas ou satisfeitas por profissionais formados em contato com o texto

filosófico e, desse modo, capazes de oferecer tratamento elevado de questões

relevantes para a formação plena dos nossos estudantes (BRASIL, 2006, p.16).

Para Noguera (2014) a menção que o documento faz a história da Filosofia sem

maiores problematizações torna-se um desafio para um ensino de Filosofia conforme a lei

10639, uma vez que “[...] recorrer à história da Filosofia não dá conta dos conteúdos

estipulados pela Lei 10.639/03.” (NOGUERA, 2014, p, 84).

Colocada essa primeira dificuldade no caminho teórico para a construção de uma aula

de Filosofia em conformidade com a lei 10639, chegamos ao impasse que nos leva à segunda,

que é, a busca por um referencial teórico a ser utilizado por professores de Filosofia como Sul

para uma abordagem da história da Filosofia que dê conta dos conteúdos estipulados pela lei

10639.

Noguera (2014) em seu livro “Ensino de Filosofia e a lei 10639” apresenta propostas

para elucubrar ambas as questões. Sobre a história da Filosofia não dar conta dos conteúdos

estipulados pela lei 10639, ele propõe que a história da Filosofia seja reescrita com a

ampliação do número de filósofos e filósofas do mundo inteiro, dando um destaque numérico

especial para nomes africanos. Sobre o referencial teórico, ele apresenta o conceito de

Filosofia Afroperspectivista, que em linhas gerais, oferece os parâmetros para o exercício

teórico de reescrita da história da Filosofia conforme os requisitos da lei 10639 que ele

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propõe. Antes de detalharmos a proposta de Noguera (2014) para a construção de uma história

da Filosofia ampliada, vamos conhecer melhor o seu conceito de Filosofia afroperspectivista.

2.1 A FILOSOFIA AFROPERSPECTIVISTA

Conforme Renato Noguera (2014, p.45), a Filosofia afroperspectivista, ou

simplesmente afroperspectividade “[...] é uma linha ou abordagem filosófica pluralista que

reconhece a existência de várias perspectivas. Sua base é demarcada por repertórios africanos,

afrodiaspóricos, indígenas e ameríndios”. A nova abordagem filosófica proposta pela

Filosofia afroperspectivista tem como referência, segundo o autor supracitado, o

Quilombismo, a Afrocentricidade e o Perspectivismo Ameríndio. Esse amálgama de

conceitos, que fornecem os elementos que compõem a Filosofia afroperspectivista tiveram

suas contribuições para a construção do novo conceito organizados por Noguera (2014, p. 46)

da seguinte forma:

[...] a formulação política do quilombismo de Abdias do Nascimento e alguns

aspectos da formulação intelectual feita por Molefi Asante, articulados com certas

questões suscitadas pela etnologia amazônica de Eduardo Viveiros de Castro, são as

fontes do que denomino Filosofia afroperspectivista.

Visando obter um melhor entendimento dos conceitos em voga, sendo: o

Quilombismo, o Afrocentrismo e Perspectivismo ameríndio, passamos agora a expor de

forma breve mais detalhes sobre cada conceito, a começar pelo Quilombismo.

Noguera (2014, p. 48) nos informa que o quilombismo consiste em uma

[...] releitura do pan-africanismo que, apesar da crítica ao capitalismo, não significa

adesão ao socialismo. O comunitarismo não se assemelha ao comunismo de Marx.

[...] Marx usa bases epistemológicas racistas e opera dentro de uma lógica

supremacista branca. O quilombismo se assenta numa cosmovisão que tem nas

sociedades ancestrais africanas um importante cânone. Ora, esse cânone está longe

das ideologias românticas de salvação ou síntese dialética, mas se encontra dentro de

um entendimento de que a Filosofia política sempre passa por uma cosmovisão

espiritual. [..] Como sistema econômico o quilombismo tem sido a adequação ao

meio brasileiro do comunitarismo [...]

No que se refere ao Afrocentrismo, o professor Molefi Kete Asante (2010, p. 01)

explica que é “[...] um paradigma baseado na ideia de que os povos africanos devem reafirmar

o sentido de agência para atingir a sanidade”. Neste sentido se trata de um método

revolucionário por tentar responder à pergunta, “o que as pessoas africanas fariam se não

existissem pessoas brancas? ”, resgatando a centralidade do sujeito africano dentro do

contexto histórico africano em um exercício de pensar a realidade africana sem ter a Europa

como centro. Noguera (2014) considera importante pontuar que Afrocentricidade não é uma

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versão africana e negra do Eurocentrismo, tendo em vista que enquanto a “[...] a

afrocentricidade condena a valorização etnocêntrica às custas da degradação das perspectivas

de outros grupos [...], o eurocentrismo apresenta a história particular e a realidade dos

europeus como o conjunto de toda a experiência humana [...]” (NOGUERA, 2014, p. 48).

O Afrocentrismo enquanto método de pesquisa possui três características:

1. O método afrocêntrico considera que nenhum fenômeno pode ser apreendido

adequadamente sem ser localizado primeiro. Um fenômeno deve ser estudado e

analisado a partir das relações de tempo e espaço psicológicos. Ele deve sempre ser

localizado. Ou seja, este é o único modo para investigar as complexas interrelações

entre ciência e arte, projeto e execução, criação e manutenção, geração e tradição e

tantas outras áreas atravessadas pela teoria. 2. O método afrocêntrico considera o

fenômeno múltiplo, dinâmico e em movimento e, portanto, ele é imprescindível para

uma pessoa anotar cuidadosamente e registrar de modo preciso a localização do

fenômeno em meio às flutuações. O que significa que o(a) investigador(a) deve

saber onde ele ou ela se encontra no processo. 3. O método afrocêntrico [...] é uma

forma de crítica cultural que examina a ordem e os usos etimológicos das palavras e

termos para reconhecer a localização das fontes de um(a) autor(a). O que nos

permite articular idéias com ações e ações com idéias baseado no que é pejorativo e

ineficaz, e, baseado no que é criativo e transformador em níveis políticos e

econômicos (ASANTE, 2010, p.3)

Para Noguera (2014), portanto, a afrocentricidade além de uma teoria é também um

método que surge para resistir ao racismo ao tentar recolocar os povos negros dentro de seus

contextos históricos e culturais depois de um deslocamento provocado pelo racismo.

Já o Perspectivismo Ameríndio do antropólogo brasileiro Eduardo Viveiros de Castro

(2002, p. 02), invertendo o argumento central do multiculturalismo, postula que dentro da

visão ameríndia existe uma cultura e diversas naturezas:

[...] esse reembaralhamento dos cards conceituais leva-me a sugerir o termo

‘multinaturalismo’ para assinalar um dos traços contrastivos do pensamento

ameríndio em relação às cosmologias ‘multiculturalistas’ modernas. Enquanto estas

se apóiam na implicação mútua entre unicidade da natureza e multiplicidade das

culturas — a primeira garantida pela universalidade objetiva dos corpos e da

substância, a segunda gerada pela particularidade subjetiva dos espíritos e do

significado [...] —, a concepção ameríndia suporia, ao contrário, uma unidade do

espírito e uma diversidade dos corpos. A cultura ou o sujeito seriam aqui a forma do

universal, a natureza ou o objeto a forma do particular.

Partindo do multiculturalismo, portanto, Viveiro de Castro (2002) cria o conceito de

multinaturalismo, base do Perspectivismo ameríndio. Conforme Noguera (2014, p.50):

[...] para o antropólogo [Viveiros de Castro], ao invés de supor, tal como na

cosmovisão ocidental, uma natureza e diversas culturas, dentro da cosmovisão

ameríndia existe uma única cultura compartilhada por todos os seres humanos,

povos e os outros animais, mas muitas naturezas. [Dessa forma, prossegue Noguera]

A chave para a leitura do perspectivismo ameríndio está na definição da

perspectividade como capacidade ou potência para ocupar outro ponto de vista, isto

é, o multinaturalismo remete a práticas corporais. Não se trata de uma diversidade

cultural, tampouco o corpo entendido como “uma fisiologia distinta ou uma

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anatomia característica; é um conjunto de maneiras e modos de ser que constituem

um habitus, um ethos” [...].

Para concluir essa parte, que trata dos conceitos que fornecem os elementos que

compõe a Filosofia afroperspectivista, sendo, o quilombismo de Abdias do Nascimento, o

Afrocentrismo de Molefe Keite Asante e o Perspectivismo Ameríndio de Eduardo Viveiros de

Castro cabem algumas palavras de Renato Noguera (idem), principal nome ligado ao conceito

e seu criador:

[...]a Filosofia afroperspectivista é devedora da afrocentricidade, do perspectivismo

ameríndio e do quilombismo, uma maneira de filosofar que parte de um pressuposto

geopolítico de que grupos humanos se organizam em busca de hegemonia. A disputa

acadêmica — e, de modo mais geral, toda querela intelectual — faz parte de agendas

políticas. Nosso intuito é favorecer uma política intelectual que amplie as

possibilidades.

A Filosofia Afroperspectivista conta com um método próprio de análise e criação

filosófica: a Roda. Conforme Noguera (idem):

[...]a Filosofia afroperspectivista usa a roda como método de exercício filosófico, um

“modelo” inspirado em rodas de samba, candomblé, umbanda, jongo e capoeira, que

serve para colocar as mais variadas perspectivas na roda antes de uma alternativa ser

alcançada.

O processo criativo na roda de Filosofia tem as seguintes características

[...]o seu funcionamento é semelhante ao exercício de versar nas rodas de partido-

alto, em que cada partideiro ou partideira clama um verso que serve de razão para

ser confrontado ou apoiado por outra(o) partideira(o). No caso da roda de Filosofia,

as ideias são apresentadas pelas pessoas que integram a roda, e o embate intelectual6

segue como base para um texto coletivo. Cada pessoa apresenta o seu argumento

dentro da roda e procura responder as contradições de modo resumido, com

conceitos ancorados em argumentos trabalhados numa métrica filosófica

afroperspectivista. O texto coletivo é o resultado da roda, sempre assinado pelos

vários parceiros de caminhada filosófica (Idem).

2.2 A HISTÓRIA DA FILOSOFIA DENTRO DOS PARÂMETROS DA LEI 10639/03

Depreende-se de Renato Nogueira (2014, p. 52) que, uma história da Filosofia de

acordo com a Filosofia afroperspectivista, portanto, com potencial para atender as exigência

da lei 10.639, passa inevitavelmente por uma “[...] revisão responsável e cautelosa da

historiografia filosófica e das fontes que informam que textos filosóficos anteriores aos gregos

não são quimeras ou suposições”.

No que se refere ao primeiro ponto, ou seja, de revisar a historiografia filosófica

europeia, para Noguera (2014), o exercício de investigação crítica, que problematiza as

6 grifo nosso.

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próprias bases da Filosofia ocidental, é importante para a abertura de novas modalidades

filosóficas de pensamento. Conforme Noguera (idem), esse “exercício de investigação

crítica”, que antecede a busca por novas modalidades filosóficas de pensamento, cerne da

questão em torno da lei 10639 que segundo o autor, passa pela revisão de certos eixos

geopolíticos e a desnaturalização do caráter eminentemente europeu que impregna a Filosofia.

Passamos a abordar agora esses dois pontos a reboque da revisão das fontes que trazem a

problemática dos textos filosóficos anteriores ao gregos.

2.2.1 Centralidade grega na antiguidade e racismo epistêmico

A considerar a importância da centralidade grega na antiguidade para a historiografia

filosófica europeia, um importante eixo geopolítico a ser investigado com vias a revisar a

historiografia filosófica é o que diz respeito ao “racismo epistêmico [ser um] dos fios

condutores mais decisivos na centralidade grega da Antiguidade” (Noguera, 2014, p. 53).

Sobre este ponto Noguera (2014, p. 56) afirma que

[...] se, de acordo com a historiografia filosófica hegemônica a respeito da

Antiguidade, os trabalhos africanos, assim como outros que não sejam ocidentais,

são terminantemente desconhecidos ou “esquecidos”, pode ser menos por ignorância

do que por orientação política. É preciso que as pesquisas na área de Filosofia

possam romper com esse preconceito e retomar elementos do espírito filosófico

como a capacidade de problematizar radicalmente e especular sistematicamente

sobre a realidade.

Algumas pesquisas têm rompido com o pré-conceito contra a produção filosófica

africana e oriental abrindo caminho para o surgimento de teses que contribuem para o

enfraquecimento da teoria, quase canônica, de que a Filosofia é um saber originalmente

europeu. Dentre essas teses estão as contribuição do cientista senegalês Cheikh Anta Diop, do

orientalista Português José Nunes Carreira e do pesquisador Guianes Jeorge G. M. James.

Conforme Noguera (2014), os resultados da pesquisa de Diop (1954, 1967, 1977)

foram de suma importância para o debate sobre a contribuição dos Africanos para a

construção do conhecimento filosófico. Após questionar a ausência das produções africanas

nas agendas de pesquisa da Filosofia e da História, o cientista senegalês demonstrou

empiricamente que os egípcios da antiguidade eram uma civilização negra. Em acordo com

George G. M James, Diop também se posicionou em favor da existência de escolas filosóficas

egípcias anteriores e contemporâneas as famosas escolas gregas dos pré-socráticos, que teriam

inaugurado o pensamento filosófico com a discussão cosmológica, um ponto de vista que

ganhou bastante força com a demonstração da negritude dos egípcios.

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Mais longe, porém menos contundente do que Diop, foi George M. G. James (2005)

com sua polêmica teoria do “Legado Roubado”. Conforme Noguera (2014) a polêmica tese

do “Legado Roubado, postula que os primeiros filósofos gregos, os pré-socráticos,

aprenderam procedimentos filosóficos com os egípcios antigos e não lhes deram o devido

crédito, o que contribuiu para que esse pensadores não fossem arrolados pela história como

filósofos, e como consequência, via de regra, não aparecem nos manuais e compêndios de

história da Filosofia. Segundo James (2005) os filósofos Pitágoras de Samos e Tales de

Mileto estão entre os nomes gregos que receberam sua formação filosófica no Egito antigo.

Para Noguera (2014) as pesquisas de Diop confirmaram a tese de James sobre a presença de

Tales no Egito para estudos filosóficos.

Para José Nunes Carreira (1994) a Filosofia começou no Vale do rio Nilo com

Imhotep em 2700 antes de a. C, portanto, mais de dois mil anos antes da primeira tese

cosmológica grega. A posição de Carreira é endossada pelas pesquisas de Théophile Obenga.

De acordo com Noguera (2014), Obenga, que além de filósofo é arqueólogo e historiador,

especialista em hieróglifos pontua que

[...] no Egito antigo existia um termo que circunscrevia Filosofia, sabedoria e

ciência: rekhet. No caso da Filosofia, o termo remete à ideia de mdt nfr, que

podemos traduzir como palavra bem-feita ou palavra bonita, fala bem esculpida e

cuidadosamente talhada (NOGUERA, 2014, p. 56).

As palavra de Obenga estão bem longe de serem consideradas mera especulação, antes

podem ser confirmadas por fontes textuais egípcias anteriores aos textos mais antigos dos

filósofos pré-socráticos. Conforme Noguera (2014), o filósofo egípcio Ptahhotep deixou

registros importantes sobre a prática filosófica no Egito antigo, que era considerada uma

forma de arte capaz de aperfeiçoar a palavra direcionando-a para a verdade. Ptahhtep (2000)

se refere a rheket nos seguintes termos: “pois os limites da arte não podem ser alcançados e a

destreza de nenhum artista é perfeita” (PTAHHOTEP, 2000, p. 247). Para Noguera (2013b, p.

146) “[...] o caráter inconcluso do rekhet indica que a dissecação perfeita nunca é alcançada,

se trata de um artesanato do pensamento que está em contínuo curso”, portanto, uma forma de

ver a realidade muito próxima das primeiras definições gregas de Filosofia.

Tendo sido feitas essas considerações sobre a problemática trazida pela Filosofia

egípcia antiga, chegamos ao ponto fulcral deste tópico, que diz respeito ao racismo epistêmico

ser o fio condutor da centralidade grega na antiguidade. Para começar nossa análise,

consideramos importante explicitar o conceito de Racismo Epistêmico. Para Noguera (2014,

p. 27), “racismo epistêmico remete a um conjunto de dispositivos, práticas e estratégias que

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recusam a validade das justificativas feitas a partir de referenciais filosóficos, históricos,

científicos e culturais que não sejam ocidentais.”

Conforme Noguera (2014) ainda, no caso específico da Filosofia, o racismo

epistêmico postula que apenas o mundo ocidental tem condições de garantir a filosoficidade

de um saber, sendo filosoficidade o elemento capaz de diferenciar o saber filosófico de outros

saberes não filosóficos.

Para Noguera (2014) o argumento da “filosoficidade” tem origem no racismo

epistêmico por não atender a um critério verdadeiramente filosófico e sim a uma falácia

oriunda do eurocentrismo. Essa falácia postula que um saber só pode ser efetivamente

filosófico, ou seja, preencher certos critérios que diferenciam a Filosofia dos outros saberes,

como já foi explicado, a dita “filosoficidade”, caso sua produção ocorra no ocidente (Europa)

e diante de certas condições políticas e culturais específicas, que se ligam invariavelmente a

pressupostos e temas originalmente gregos. Dessa forma, a considerar a ação do racismo

epistêmico sob os saberes não ocidentais a conclusão não poderia ser outra:

[...] se a Filosofia ocidental tem historicamente sido constituída por uma visão

etnocêntrica — no caso, o eurocentrismo ou excentricidade —, essa visão tenderia a

excluir outros estilos, linhas e abordagens filosóficos, negando a legitimidade

epistemológica dessas abordagens filosóficas que não são ocidentais (Noguera,

2014, p. 28).

A considerar esses argumentos fica explicada a rejeição a priori dos textos egípcios

antigos reivindicados como filosóficos pelos autores supracitados. A rejeição “a priori” se

refere ao fato de que os textos egípcios, como regra, não chegam a ser considerados se quer

para sua rejeição, situação construída e sustentada pelo racismo epistêmico, que ao rechaçar

outros centros de produção filosófica, como as escolas egípcias, por exemplo, garante a

centralidade da Filosofia grega na antiguidade.

2.3 A DESNATURALIZAÇÃO DO CARÁTER EMINENTEMENTE EUROPEU QUE

IMPREGNA A FILOSOFIA E SUAS CONSEQUÊNCIAS PARA A EDUCAÇÃO

Conforme o professor Renato Noguera (2014) o continente europeu deixou sua

assinatura na história da Filosofia por meio do conjunto de temas canônicos que se

estabeleceu e se tornou hegemônico. Para sociólogo

Ramón Grosfoguel (2010), apud

NOGUERA (2014), a Filosofia Ocidental privilegia a “egopolítica do conhecimento” em

detrimento da “geopolítica do conhecimento”. Noguera (2014) coloca que em termos práticos

isso significa que este conjunto canônico de temas, embora esteja referenciado em uma região

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geopolítica do mundo ocidental, que é a Europa, se apresenta como portador de um

conhecimento capaz de alcançar a consciência universal. Desta forma, as questões filosóficas

“universais” estariam postas desde o primeiro filósofo grego, conforme a tradição, Tales,

Sócrates ou Platão, até o último grande nome da Filosofia contemporânea, sendo consideradas

particularistas as questões dos povos não ocidentais.

Para Noguera (2014) está em jogo a colonialidade, conceito criado pelo sociólogo

peruno Annibal Quijano para explicar “[...] às condições de estabelecimento do capitalismo

como padrão de funcionamento mundial, operando através da ‘imposição de uma

classificação racial-étnica da população do mundo’” (NOGUERA, 2014, p. 26). Conforme

Wendell Ficher Teixeira Assis Wendell (2014) com o conceito de colonialidade Aníbal

Quijano procurou explicar processos que transcendem o colonialismo histórico, pois tais

processos embora tenham se originado com e a partir dele, não teriam desaparecido devido a

ação dos movimentos de independência e consequentemente descolonização que lhes deram

fim. Para Quijano (2010) portanto, esse quadro criou a necessidade teórica de distinguir

colonialidade e colonialismo. Uma distinção que o sociólogo peruano fez recorrendo ao

conceito de colonialidade para explicar a continuidade das formas coloniais.

Conforme Noguera (2014) a colonialidade opera por meio de dispositivos7 tendo um

específico para o conhecimento, que se refere a validade dos saberes e da produção

intelectual. Depreende-se de Noguera (2014) que para a compreensão deste dispositivo é

necessário atentar para os efeitos do processo colonizador, que teria resultado na

desconstrução de estrutura sociais autóctones fora da Europa, reduzindo os saberes dos povos

colonizados a categoria de crenças ou pseudos saberes. Para Noguera (2014, p. 27) “essa

hegemonia, no caso do continente africano, passou a desqualificar e invisibilizar os saberes

tradicionais, proporcionando uma completa desconsideração do pensamento filosófico desses

povos”. Neste sentido, o racismo antinegro assume uma categoria especifica que se chama

racismo epistêmico.

Como já vimos, Noguera (2014, p. 27) defini racismo epistêmico como “[...] conjunto

de dispositivos, práticas e estratégias que recusam a validade das justificativas feitas a partir

de referenciais filosóficos, históricos, científicos, e culturais que não sejam ocidentais”

(idem). Ainda conforme o autor, a colonialidade impregna e constitui a produção filosófica

hegemônica, fazendo da Filosofia acadêmica uma atividade intelectual atravessada pelo

7 Os demais dispositivos apresentados por Renato Noguera nesta ordem atuariam sobre: o trabalho e os seus

produtos, o meio ambiente e os seus recursos de produção, o sexo e os seus produtos, a subjetividade e os seus

produtos e a autoridade e seus instrumentos de regulação das redes sociais. Conforme Noguera (2014, p. 26-27)

o conhecimento se enquadraria na categoria “sexo e seus produtos”.

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racismo epistêmico ao sustentar, dentre outras formas, que apenas o mundo ocidental pode

garantir a filosoficidade de um saber.

Para Noguera (idem), portanto, é oportuno fazer um exercício filosófico de análise das

relações entre colonialidade, eurocentrismo e Filosofia, sendo tal análise indispensável para se

avançar na busca por geopolíticas que problematizem a perpetuação das relações assimétricas

de poder inerentes ao conhecimento. Neste sentido, ganha significativa importância a

problemática trazida por Wanderson Flor do Nascimento e Denise Botelho, que oferecem um

panorama dos efeitos do racismo epistêmico e da operação da colonialidade na produção

Filosofia mundial afirmando que

[...]embora a Filosofia, na contemporaneidade, seja produzida nos cinco continentes

e com conceitos importantes sendo produzidos em todos eles, o locus privilegiado

de enunciação da Filosofia segue sendo eurocêntrico. A marca mais importante deste

fenômeno se mostra no fato de que nos currículos dos cursos de Filosofia de todo o

mundo aparece um cânone comum que é basicamente europeu8 (com parcas

contribuições norte-americanas). A própria historiografia da Filosofia é

eurocentrada, o que acaba por invisibilizar as produções existentes fora da Europa e

Estados Unidos (FLOR DO NASCIMENTO; BOTELHO, 2010, p. 82).

O quadro descrito por Flor do Nascimento e Botelho (2010) se reflete de forma

nefasta na educação básica de países como o Brasil, onde conforme Katiuscia Ribeiro (2017,

p. 46):

[...] a supremacia racial eurocêntrica traduz, entre outras coisas, a ausência de

conteúdos que valorizem o legado e a história dos povos negros nas ementas

escolares, subtraindo o lugar existencial desses povos. Essa ação é proposital nas

ideologias do racismo, parasitando essa população, sobretudo as crianças negras

no período escolar9.

Neste sentido a discussão sobre o desinteresse de estudantes em aulas de Filosofia

abordado no capítulo um poderia ser encarado como uma consequência do racismo

epistêmico, obviamente sem prejuízo das dificuldades de caráter estrutural mencionadas no

mesmo capítulo. De forma que o racismo epistêmico poderia ser integrado ao quadro geral de

dificuldades para uma aula de Filosofia como uma das grandes questões teóricas envolvidas.

2.3.1 O racismo epistêmico como fator potencial para o desinteresse em aulas de

Filosofia: uma discussão importante

Conforme a professora Marilena Chauí (2005), uma das principais causas do

desinteresse pela Filosofia de forma geral se refere ao fato de ela não ter sua utilidade

reconhecida pelas pessoas comuns, sendo esta, na opinião da autora, uma das principais

8 Grifo nosso.

9 Grifo nosso.

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causas do desinteresse pela Filosofia também na sala de aula. Chauí (2005) explica, de forma

detalhada, de que forma esse argumento, que conforme ela é um pré-conceito em relação à

Filosofia, se concretiza na pergunta que já se tornou famosa entre os estudantes de Filosofia:

“afinal, para que serve a Filosofia?”. Conforme a autora,

[...]em geral, essa pergunta costuma receber uma resposta irônica conhecida dos

[...]estudantes de Filosofia: “a Filosofia é uma ciência com a qual e sem a qual o

mundo permanece tal e qual”. Ou seja, a Filosofia não serve para nada. Por isso,

costuma-se chamar de “filósofo” alguém sempre distraído, com a cabeça no mundo

da lua, pensando e dizendo coisas que ninguém entende e que são completamente

inúteis (CHAUÍ, 2014, p. 20).

Para a autora, essa pergunta não deve passar despercebida, ao contrário, deve ser

tratada como um diagnóstico da posição que a Filosofia desfruta no senso comum, tendo em

vista que, ela não faz nenhum sentido em se tratando de disciplinas como a química, a física

ou a matemática, por exemplo. Chauí (2014, p. 20) explica que, “em nossa cultura e

sociedade, costumamos considerar que alguma coisa só tem o direito de existir se tiver

alguma finalidade prática muito visível e de utilidade imediata” como é o caso das disciplinas

anteriormente citadas. Deste modo, nas palavras da autora, o desinteresse pela Filosofia

poderia ser explicado, dentre outros motivos, devido a características das sociedades que

abrigam o saber como disciplina escolar.

Já para o professor Renato Noguera (2014), em linhas gerais, o senso comum vê a

Filosofia pela lente do que ele chama de “hipótese genérica”, um tipo de clichê que a

considera um saber sofisticado, com reconhecido e elevado status acadêmico, mas geralmente

dissociado da realidade. Em conformidade com Marilena Chauí (2014), Noguera (2014)

explica que existe uma ideia corrente no senso comum de que a Filosofia não serve para nada.

Mas, diferentemente dela, para Noguera, a Filosofia, entendida como um saber acadêmico

oficialmente constituído e certificado pelas universidades e como disciplina escolar detém

certas características que contribuem substancialmente para o fortalecimento destes

estereótipos que a ela são atribuídos.

Os argumentos de Noguera (2014) em seu livro sobre o ensino de Filosofia e a lei

10.639/03 parecem indicar que uma possível explicação para a força destes estereótipos

estaria, dentre outros fatores, no conjunto canônico de temas que ainda compõe o corpus

principal da atividade filosófica no ocidente. Conforme Noguera (2014, p.12) “[...] a

formação do campo da Filosofia tem seus cânones. As questões incontornáveis consagradas

na história da Filosofia, como, por exemplo, a verdade”. Esse conjunto de temas que formam

“o campo da Filosofia”, por se mostrarem desconectados da experiência de vida das pessoas

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comuns, em grande parte das vezes contribui com a ideia corrente no senso comum de que a

Filosofia não serve para nada e explicaria por que “filósofos e filósofas se ocupariam com

questões tão profundas10

que manteriam distância de eventos corriqueiros e

‘desinteressantes’” (NOGUERA, 2014, p. 13).

Mas o que poderia ser considerado, em sentido amplo, um evento corriqueiro e

desinteressante para um filósofo profissional? Noguera (2014) nos oferece uma pista ao

colocar que uma pessoa pode ter uma formação filosófica considerada boa sem examinar nem

de perto questões como: relações étnico-raciais, racismo antinegro, a relevância da história da

África para a história da Filosofia, os processos de subalternização das produções africanas e

afrodiaspóricas de conhecimento diante do processo de colonização. Certamente não é a

intenção de Noguera advogar que filósofos profissionais não reconhecem a relevância dos

temas listados, mas sim que, dificilmente os reconheceriam como legítimos para uma genuína

investigação filosófica. A esse conjunto de temas considerados inapropriados para uma

legítima investigação filosófica se somam uma gama de questões e temas que ao serem

ignorados contribuem substancialmente para que a Filosofia seja vista como uma área do

conhecimento que nada tem a ver com a realidade das pessoas comuns.

Dessa forma, concluímos esta breve análise da relação racismo epistêmico versus

desinteresse, considerando a existência de uma convergência para a tese de que o desinteresse

que se atribui aos estudantes da educação básica pela Filosofia (conforme a exposição feita no

capítulo um), não seria de fato pela Filosofia em sentido amplo, mas sim, por uma certa

perspectiva filosófica, que por ser eurocêntrica, não contempla as referências culturais e

experiência de vida dos estudantes.

2.4 A REVISÃO DA HISTORIOGRAFIA FILOSÓFICA EUROPEIA E A AMPLIAÇÃO

DA HISTÓRIA DA FILOSOFIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA

Os argumentos apresentados até o momento, no que se refere a lei 10.639 e o ensino

de Filosofia convergem para a necessidade de uma educação filosófica que se oponha ao

racismo epistêmico, ou seja, uma educação antirracista. Para a filósofa Katiuscia Ribeiro

(2017) o desafio proposto pela educação antirracista ao ensino de Filosofia é o

estabelecimento de formas de reforço subjetivo através da educação, para dessa forma ampliar

seus ensinos e permitir aos alunos um exercício responsável de si e dos outros, incorporando

10

Grifo nosso.

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uma epistemologia afroperspectivista que seja capaz de trilhar novas possibilidades e

proporcionar uma efetiva descolonização do pensamento.

Neste sentido, a lei 10.639/3 seria a ponte entre as formas de educação hegemônicas

(baseadas no colonialismo) e uma educação comprometida com a descolonização do

pensamento, já que conforme Ribeiro (2017) a aplicação da lei 10.639/03 ao garantir a

reflexão sobre os saberes africanos nos espaços escolares, ampliando e reescrevendo a história

desses povos, poderia levar os alunos negros a refletir filosoficamente sobre seu lugar, (re)

construindo a referência positiva de sua história.

Trata-se, portanto, de contribuir com o combate ao desânimo dos alunos da educação

básica em aulas de Filosofia , bem como de outras áreas das humanidades, em grande parte

alunos negros, promovendo o deslocamento de uma perspectiva de educação filosófica de

base eurocêntrica e, que, portanto, será desinteressante para afrodescendentes e indígenas, por

desmerecer suas referências culturais, para uma educação filosófica Afroperspectivista, ou

seja, que resgate o protagonismo dos povos africanos, indígenas e afrodiaspóricos na

produção do pensamento filosófico. Conforme o professor Renato Noguera (2014, p. 66) “[...]

uma rica história da Filosofia precisa de um deslocamento do território geopolítico ocidental”.

O autor acrescenta que para que esse deslocamento se efetive é preciso que se cumpra os

dispositivos da lei 10639/03 construindo uma história da Filosofia ampliada com um elenco

de filósofas e filósofos do mundo inteiro, incluindo um vasto time africano. Uma tarefa que

segundo ele passa pelo duplo esforço de reescrever a História da Filosofia inserindo e

articulando a produção africana, asiática, ameríndia e escrever a História da Filosofia

Africana.

A proposta desta dissertação de transformar o card game Combate Filosófico em uma

ferramenta para ajudar professores de Filosofia a levar para o contexto de suas aulas os

conteúdos exigidos pela lei 10639 para uma educação filosófica para as relações étnico-raciais

se pauta parcialmente no primeiro esforço sugerido por Noguera, que diz respeito a reescrever

ou ampliar a História da Filosofia inserindo e articulando a produção africana e afrobrasileira

2.4.1 Os contornos da historiografia filosófica europeia e a crítica da periodização

quadripartite

A proposta de Renato Noguera (2014) explicitada no tópico anterior esbarra em

algumas questões teóricas ligadas a história da Filosofia, como por exemplo, o

questionamento dos limites da historiografia europeia. Esses limites, cujos contornos a lei

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10.639/03 precisa “alterar” são evidentes na obra de autores brasileiros que tradicionalmente

se ocupam da história da Filosofia e são referência para o ensino da história da Filosofia nas

redes públicas, a exemplo de Danilo Marcondes (2010) e Marilena Chauí (2014).

O professor Danilo Marcondes, por exemplo, em livro intitulado “Iniciação a história

da Filosofia, dos pré-socráticos à Wittgensten”, divide a história da Filosofia em quatro

partes. A parte I ele chama de origens, a II Filosofia medieval, a III Filosofia moderna e a IV

Filosofia contemporânea. Todos os fatos importantes, e com fatos queremos dizer

formulações teóricas e conceitos, descritos por Marcondes (2010, p. 19) estão ligados a

regiões do ocidente, já que segundo ele:

[...] os diferentes povos do oriente – assírios e babilônicos, chineses e indianos,

egípcios, persas e hebreus -, todos tiveram visões próprias da natureza e maneiras

diversas de explicar os fenômenos e processos naturais. Só, os gregos, entretanto,

fizeram ciência, e é na cultura grega que podemos identificar o princípio desse tipo

de pensamento que podemos denominar, nesta sua fase inicial, de filosófico-

científico.

Da mesma forma que Marcondes (2010), a professora Marilena Chauí em seu manual

didático para o ensino médio intitulado “Iniciação à Filosofia” postula que “por estar na

história e ter uma história, a Filosofia costuma ser apresentada em grandes períodos que

acompanham, de modo mais geral, os períodos em que os historiadores dividem a história da

sociedade ocidental” (CHAUÌ, 2014, p. 51). Pois bem, o que Marcondes e Chauí, dois ilustres

comentadores da história da Filosofia no Brasil deixaram passar, e que será demonstrado no

próximo tópico, foi, que, a muito historiadores têm questionado a chamada “periodização

quadripartite ou quadripartismo”, esquema de repartição histórica adotada por ambos para

balizar a história da Filosofia, que por se tratar de uma divisão histórica da sociedade

ocidental, é insuficiente na tarefa de abarcar a história de toda a humanidade, tendo sido por

isso, objetada por historiadores.

Neste sentido, podemos perguntar: o que deixa uma pensadora do nível da professora

Chauí à vontade para atribuir a história da Filosofia, sem maiores problematizações, uma

forma de divisão histórica a muito objetada? A resposta é simples: mesmo motivo de

Marcondes, o fato de ela negar aos povos do oriente a condição de sujeitos de conhecimento,

quer seja ele filosófico ou científico, ficando assim “livre” para atribuir exclusivamente ao

ocidente (daí a escolha da periodização quadripartite) a invenção e o desenvolvimento do

pensamento científico e filosófico:

[...] os gregos transformaram em ciência [...] aquilo que era elemento de uma

sabedoria prática. Assim, transformaram em matemática o que os egípcios

praticavam como agrimensura para medir contar e calcular os terrenos após as

cheias do rio Nilo; transformaram em astronomia [...] a astrologia praticada por

caldeus e babilônicos como adivinhação e previsão do futuro; transformaram em

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medicina aquilo que, nas culturas precedentes, eram práticas de grupos religiosos

secretos para cura misteriosa de doenças. [Chauí não para por aí e completa sua

argumentação “epistemicida” na página seguinte escrevendo que “ os gregos

inventaram não somente a ciência ou a Filosofia, mas também a política (CHAUÌ,

2014 p. 34 e 35).

A considerar os pontos defendidos por Marcondes e Chauí, dentre os vários desafios

teóricos que a “ampliação” da história da Filosofia apresenta a professores e professoras,

dois se mostram bastante urgentes: o avanço na discussão teórica sobre a existência de um

pensamento filosófico oriental produzido fora dos limites do ocidente e a busca por um

modelo de demarcação histórica mais próximo de uma verdadeira história total da Filosofia.

Mas antes que se chegue a ambos os objetivos, a considerar a especificidade do produto

didático proposto por esta dissertação, nos prenderemos por hora na crítica da periodização

quadripartite na historiografia filosófica.

2.4.1.1 A crítica da periodização quadripartite na história da Filosofia

No que diz respeito a crítica da periodização, para Leila Alvarenga Turini (2004) a

história organizada segundo o quadripartismo, História Antiga, Medieval, Moderna e

Contemporânea, consiste em uma premissa extremamente questionável por não levar em

conta a diversidade, a multiplicidade de tempos e a especificidade de cada realidade social e

cultural. Conforme Turini (2004, p. 98) “a história-conhecimento organizada segundo o

quadripartismo procura dar conta de tudo o que se passou com a humanidade, na pretensão de

uma história universal. ”, todavia, “ao estabelecer a divisão entre História Antiga, Medieval,

Moderna e Contemporânea, em uma perspectiva eurocêntrica, a periodização quadripartite

desconsidera a história dos povos não europeus”, ou pelo menos o seu protagonismo.

A periodização quadripartite é etnocêntrica e apresenta a visão das classes dominantes,

pois segundo Oliveira e Miranda (2014, p. 03):

[...] as rupturas apresentadas refletem como as mesmas percebem e discursam sobre

o vivido histórico. Em um processo de escolhas entre o que deve ser

lembrado/rememorado e o que será esquecido/apagado, geralmente resultou do

empenho dos vencedores. Karl Marx e Friedrich Engels nos lembram que “a

ideologia consiste em transformar as ideias da classe dominante em ideias

dominantes”. Periodizar é estabelecer marcos, sendo assim, este ato é ideológico,

tem seus condicionantes na sociedade que o concebe.

Para Marilena Chauí (2014), apud Oliveira e Miranda (2014), a mesma autora que

aplica a periodização quadripartite a história da Filosofia, é preciso “elucidar o sentido da

periodização oficial, de sorte a evidenciar que esta última não é uma ação teórica e

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desinteressada, mas um Ato de Poder [...]. A periodização produz o lugar da história e, como

ele, o dá origem legítima do poder vigente (Idem, p.9)”.

Neste sentido, não seria um ato despretensioso a adoção desta mesma divisão

(periodização quadripartite) na história da Filosofia, mesmo sob a alegação de que a Filosofia

inexiste fora das “cercanias europeias” ou que “por estar na história e ter uma história, a

Filosofia costuma ser apresentada em grandes períodos [...] que acompanham a história”

(CHAUÌ, 2014, p.51), pois, como coloca a própria Chauí (2014) apud Oliveira e Miranda

(2014), elucidar o sentido da periodização oficial é necessário para evidenciar que ela não é

uma ação teórica desinteressada, mas um ato de poder. Este “ato de poder” operacionalizado

pela periodização quadripartite no caso da Filosofia objetivaria produzir “o lugar da história”

da Filosofia enquanto produto ocidental legitimando o poder que a sociedade ocidental tem

sobre o conhecimento filosófico.

O professor Mario Ariel González Porta (2007) questiona a periodização quadripartite

por sua falta de base filosófica. Segundo Porta (idem), a história da Filosofia carece de uma

divisão que atenda a critérios filosóficos, e neste sentido, ele aponta dois critérios para uma

divisão filosófica. O primeiro diz respeito a presença de fatores intra-sistemáticos de caráter

filosóficos, o segundo, de fatores evolutivos ou dinâmicos. Para Porta (idem) o

desenvolvimento do pensamento especulativo precisa compreender, além da diferença

essencial entre o pensamento de diferentes períodos, também o princípio interno que

determina a passagem de um pensamento a outro sem apelar para eventos históricos

consagrados pela história geral. Principalmente se esses eventos se referem somente uma

região do globo, já que, “[...] uma rica história da Filosofia precisa de um deslocamento do

território geopolítico ocidental” (NOGUERA, 2014, p. 66).

Este é o ponto fulcral da questão da crítica da periodização quadripartite na

historiografia filosófica, pois o deslocamento a que se refere Noguera (idem) redundará não

apenas na inclusão de nomes de filósofos estranhos a historiografia filosófica tradicional,

como na sua proposta de história ampliada da Filosofia, mas, também a uma nova forma de

divisão dessa historiografia. Pois, uma vez que a história da Filosofia é estendida com textos

filosóficos de outras regiões do globo, automaticamente estaremos diante da necessidade de

novos marcos para o balizamento dessa história.

Conforme o filósofo Alexandre Koiré (1982, p. 16) “a história da evolução espiritual

da humanidade apresenta uma complexidade incompatível com divisões categóricas e

radicais, [pois as] correntes de pensamento atravessam séculos inteiros, se superpõem e se

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entrecruzam”. Neste sentido, nossas reflexões têm apontado para duas possibilidade: ou

opera-se uma ampliação das categorias da periodização quadripartite, que dizem respeito a

antiguidade, medievo, modernidade e contemporaneidade, como marcos atravessados pela

experiência europeia ocidental, para dessa forma incluir na divisão tradicional a experiência

dos povos desprivilegiados, e neste sentido não se falaria mais em Filosofia antiga grega ou

africana, mas, em Filosofia antiga com experiência africana, grega, indiana, chinesa; ou,

abandona-se a periodização quadripartite optando-se por uma divisão da história da Filosofia

que seja filosófica, e mais do que isto, que tenha potencial para ir além da experiência

europeia.

2.5 O JOGO EM QUESTÃO

De acordo com Tizuco Morchida Kishimoto (2002) definir jogo é uma tarefa

extremamente difícil. O autor aponta como exemplo para justificar essa dificuldade, dentre

outros, a variedade de fenômenos considerados como jogo. Sobre este ponto, inclusive, o

filósofo Wittgenstein fala em família de jogos, que inclui os diferentes tipos de jogos e suas

analogias. Para Wittgenstein (1975) por assumir significados diversos e vagos, jogo é um

termo impreciso. Confira abaixo a opinião do filósofo

[...] considere, por exemplo, os processos que chamamos de jogos [...]. Refiro-me, a

jogo de tabuleiro, de cards, de bola, torneios esportivos etc. O que é comum a todos

eles? Não diga: "Algo deve ser comum a eles, se não se chamariam jogos", - mas

veja se algo é comum a eles todos - Pois, se você os contemplar, não verá na

verdade algo comum a todos, mas semelhanças, parentescos, e até toda uma série

deles. Como disse: não pense, mas veja! - Considere, por exemplo, os jogos de

tabuleiro, com seus múltiplos parentescos. Agora passe para os jogos de cards: aqui

você encontra muitas correspondências com aqueles da primeira classe, mas muitos

traços desaparecem e outros surgem. Se passamos agora ao jogo de bola, muita coisa

comum se conserva, mas muitas se perdem. São todos 'recreativos'? Compare o

xadrez com o jogo da amarelinha. Ou há em todos um ganhar e um perder, ou uma

concorrência entre os jogadores? Pense nas paciências. Nos jogos de bola há um

ganhar e um perder; mas se uma criança atira a bola na parede e apanha outra vez,

este traço desapareceu. Veja que papéis desempenham a habilidade e a sorte. E

como é diferente a habilidade no xadrez e no tênis. Pense agora nos brinquedos de

roda: o elemento de divertimento está presente, mas quantos dos outros traços

característicos desapareceram! E assim podemos percorrer muitos, muitos outros

grupos de jogos e ver semelhanças surgirem e desaparecerem (WITTGENSTEIN,

1975, p. 42-3).

Essa grande imprecisão de termos resultou em uma robusta discussão sobre a natureza

do jogo, em que diversos autores tentaram apresentar perspectivas teóricas para caracterizar o

jogo. Veremos em seguida a posição de dois importantes nomes deste debate, Johan Huizinga

e Roger Callois.

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Huizinga (2000) vê o jogo como um elemento da cultura, embora não omita em seus

estudos a existência do jogo fora do universo humano:

[...] os animais brincam tal como os homens. Bastará que observemos os

cachorrinhos para constatar que, em suas alegres evoluções, encontram-se presentes

todos os elementos essenciais do jogo humano. Convidam-se uns aos outros para

brincar mediante um certo ritual de atitudes e gestos. Respeitam a regra que os

proíbe morderem, ou pelo menos com violência, a orelha do próximo. (HUIZINGA,

2000, p. 05).

Conforme Kishimoto (2002) além da relação com a cultura, Huizinga (2000) pontua

como elementos constitutivos do jogo: o prazer, a irreverência, a liberdade, atividade não

ligada ao cotidiano, seu caráter fictício, e finalmente, as regras e a limitação no tempo e no

espaço. Mas sobre tudo, Huizinga coloca contra alguma perspectiva utilitarista envolvendo o

jogo que ele tem um fim em si mesmo. Este fim não está relacionado a fatores físicos ou

biológicos. Conforme Huizinga (2000, p. 6) “[...] o jogo, seja qual for sua essência, não é

material. Ultrapassa, mesmo no mundo animal, os limites da realidade física. Para Huizinga

(idem, p. 07) portanto,

[...] a existência do jogo não está ligada a qualquer grau determinado de civilização,

ou a qualquer concepção do universo. Todo ser pensante é capaz de entender à

primeira vista que o jogo possui uma realidade autônoma, mesmo que sua língua não

possua um termo geral capaz de defini-lo. A existência do jogo é inegável. É

possível negar, se quiser, quase todas as abstrações: a justiça, a beleza, a verdade, o

bem, Deus. É possível negar-se a seriedade, mas não o jogo.

Callois (1958), no geral, concorda com as características do jogo postas por Huizinga,

embora ele veja uma contradição entre o caráter fictício do jogo e sua regulação, e discorde do

papel que Huizinga atribui ao jogo na construção da cultura. Callois (1958) também

acrescenta uma nova característica ao jogo, a improdutividade. Sobre a contradição

encontrada em Huizinga Callois (1958, p. 29) afirma que:

[...] os jogos não são regulados ou fictícios. São antes, ou regulamentados ou

fictícios. De tal forma que, se um jogo regulamentado surge em determinadas

circunstâncias como uma atividade séria e fora do alcance dos que ignoram as suas

regras, isto é, se surge como fazendo parte da vida diária, esse jogo pode logo

proporcionar a um leigo confundido e curioso o esboço de um divertido simulacro.

Não obstante a dura crítica, Callois reconheceu a importância do trabalho de Huizinga

para os estudos sobre o jogo e escreveu nas primeiras páginas do seu livro “O Jogo e os

homens: a máscara e a vertigem” que a obra de Huizinga, embora “[...] contestável na maioria

de suas formulações, não deixou de abrir vias extremamente fecundas para a pesquisa e para a

reflexão. ” (Idem, 23). Callois não esconde de ninguém que reconhece a importância da obra

de Huizinga, da mesma forma que deixa muito claro que sua obra sobre o jogo representa de

alguma forma a continuação da obra de Huizinga, sendo mais completa e profunda. Neste

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sentido, uma das maiores contribuições de Callois para as reflexões sobre os jogos se refere a

sua classificação dos jogos.

Para Callois (1958), em acordo com Huizinga, salvo as exceções já pontuadas, no que

se refere as características, o jogo, além de ser caracterizado como uma atividade livre,

delimitada, incerta, improdutiva, regulamentada e fictícia, pode ser classificado em:

categorias fundamentais e da turbulência a regra. Conforme Callois (idem) o jogo conta com

quatro categorias fundamentais: Agon (competição), Alea (sorte), Minicry (simulacro) e Ilinx

(vertigem). Essas quatro categorias foram divididas em dois grandes grupos: a Ludus,

relacionada a diversão e ao improviso e a Paidia, que diz respeito as regras do jogo.

Em nível de conclusão é preciso dizer que tanto os estudos de Huizinga como os de

Callois constituem riquíssimas fontes de informação sobre o conceito de jogo: Huizinga com

sua grande contribuição sobre o papel do jogo como elemento da cultura e Callois com sua

singular sistematização das categorias do jogo, dentre outras contribuições que ambos

forneceram para as reflexões sobre o jogo. Por esse méritos, ambos se tornaram leitura

obrigatória para quem deseja buscar informações sobre a natureza do jogo. Outros nomes

importantes para quem deseja se aprofundar neste debate são: Wittgenstein, Henriot,

Fromberge e Christie.

2.5.1 O jogo e a Filosofia

Conforme Huizinga (2000) os gregos do período clássico faziam uma certa relação

entre o surgimento da Filosofia na Hélade e o jogo, especificamente o enigma. De acordo com

Huizinga (2000), um discípulo de Aristóteles chamado Clearco escreveu um tratado em que

expunha uma teoria que relacionava a resolução de enigmas primitivos ao surgimento da

Filosofia. A respeito dos enigmas, Huizinga (2000, p. 197).

[...]os antigos usavam-no como prova de sua educação [...], observação que

nitidamente se refere ao jogo de enigmas de que acima tratamos. E, com efeito, não

seria exagerado considerar os primeiros produtos da Filosofia grega como derivados

dos enigmas primitivos.

A teoria de Clearco se encaixa como uma luva na teoria geral de Huizinga, que

relaciona o jogo, ou a atividade lúdica, ao surgimento de todo que é fundamental na cultura

humana. Neste sentido, Huizinga vê na primeira fase da Filosofia ocidental, que é o período

cosmológico, bem como no desenvolvimento posterior da Filosofia, às marcas mais

indeléveis da atividade lúdica:

[...] o filósofo, desde as épocas mais remotas até aos últimos sofistas e retores,

sempre assumiu todas as características do campeão. Desafiava seus rivais,

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submetia-os à crítica mais veemente, afirmando suas próprias opiniões como as

únicas verdadeiras, com toda a autoconfiança juvenil própria do homem arcaico.

Quanto ao estilo e quanto à forma, os exemplos mais antigos de Filosofia possuem

um caráter polêmico e agonístico. Falam, invariavelmente, na primeira pessoa do

singular. Falam, invariavelmente, na primeira pessoa do singular. Quando Zenão de

Eléia ataca seus adversários, fá-lo por meio de aporias — isto é, procura

ostensivamente partir das premissas deles para chegar a duas conclusões

contraditórias e que se excluem reciprocamente. Esta forma é a mais próxima do

enigma que é possível. Zenão pergunta: "Se o espaço é alguma coisa, o que pode

existir nele [...]? O enigma não é difícil de resolver". Para Heráclito, o "filósofo

obscuro", a natureza e a vida são um griphos, um enigma, e ele próprio é um

decifrador de enigmas [...]. (Idem).

Callois (1958) sem dúvida se oporia a essa opinião de Huizinga e o acusaria, como já

o fez11, de exagerar o papel do jogo como elemento da cultura. Todavia, Huizinga não foi o

único pensador a ceder à tentação de interpretar o desenrolar dos acontecimentos da história

da Filosofia como uma grande disputa nos termos da categoria de “Agon” de Callois. Antes

de prosseguir com essa análise, precisamos expor aqui algumas considerações de Callois

(1958, p. 33-34) sobre a categoria de Agon:

[...] há todo um grupo de jogos que aparece sob a forma de competição, ou seja,

como um combate 12

em que a igualdade de oportunidades é criada artificialmente

para que os adversários se defrontem em condições ideias, susceptíveis de dar valor

preciso e incontestável ao triunfo do vencedor. Trata-se sempre de uma rivalidade

que se baseia numa única qualidade (rapidez, resistência, vigor, memória,

habilidade, empenho, etc.), exercendo-se os limites definidos e sem nenhum auxiliar

exterior, de tal forma que o vencedor apareça como sendo o melhor, uma

determinada categoria de proezas. É esta a regra das provas desportivas e a razão de

ser das suas múltiplas subdivisões, que oponham dois indivíduos ou duas equipas

[sic] [...].

2.5.1.1. O Agon na história da Filosofia ocidental

Conforme G. Reale e D. Antiseri “a história da Filosofia é a história dos problemas

filosóficos, das teorias filosóficas e das argumentações filosóficas. É a história das disputas

entre filósofos13

e dos erros dos filósofos (REALE; ANTISERI, 2005, p. 20). Tendo como

ponto de partida a colocação de Reale e Antiseri (2005), as postulações de Huizinda e a

categoria de Agon de Callois, a história da Filosofia desde que a centralidade grega

determinou a hegemonia europeia pode ser vista como uma grande arena de disputa em que

pensadores europeus travam um excludente combate em torno da melhor teoria para resolver

os problemas essenciais da humanidade (Europa). Obviamente esta disputa segue regras

11 Callois (1958, p. 13). 12

Grifo nosso 13

Grifo nosso.

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ocidentais e exclui a priori competidores de fora das “cercanias europeias”, como já foi

discutido em tópicos anteriores.

2.5.1.1.1 O Agon no período socrático

A presença do Agon já foi apontada por Huizinga na Filosofia pré-socrática, mas ela

também esteve presente no período antropológico com Sócrates e suas disputas com os

sofistas e demais conterrâneos em Atenas. Sobre este ponto a filósofa Marilena Chauí (2011)

ao traçar um paralelo entre o personagem Neo do filme Matrix e o filósofo Sócrates, afirma

que ambos travavam combates mentais e de pensamento. Conforme Chauí (2011), Neo lutava

contra o controle que a Matrix exercia sobre a inteligência humana, e Sócrates, contra as

opiniões estabelecidas, contra os pré-conceitos, contra as crenças inquestionadas de seus

conterrâneos.

Em seu combate, o filósofo Sócrates contava com um poderoso arsenal oriundo de sua

mente questionadora e do espirito que supostamente o fazia desconfiar das aparências. Seus

ataques vinham normalmente na forma de perguntas dirigidas a seus conterrâneos. Chauí

(2011), informa, que, essas perguntas eram do tipo: o que é isso que você acredita, o que é

isso que você está dizendo, o que é isso que você está fazendo? As perguntas atingiam

frontalmente o conjunto de crenças que formavam o ideário dos atenienses, já que eles não

tinham um fundamento sólido que os permitisse revidar diante dos ataques socráticos.

Ocasionando que em várias vezes o interlocutor do incansável perguntador abandonasse o

diálogo por ser incapaz de lhe oferecer qualquer resistência. Mas, nem sempre foi assim.

Muitos interlocutores de Sócrates foram capazes de revidar, porém o incansável perguntador

sempre estava pronto a contra-argumentar recorrendo a estratégia de investigação inventada

por ele e conhecida na história da Filosofia como Maiêutica.

2.5.1.1.2 O Agon no período clássico

Platão, discípulo de Sócrates, também apostava no diálogo na busca pela verdade,

mas, diferentemente da técnica de seu mestre, que visava combater as ideias do interlocutor

levando-o a reconhecer seu caráter ilusório, e, portanto, iniciar uma nova busca pela verdade

dentro de si, conforme Chauí (2011), a dialética platônica é um procedimento intelectual que

parte de alguma coisa que deve ser separada ou dividida em duas partes contrárias, de forma

que se reconheça sua contradição e se possa determinar qual dos contrários é verdadeiro e

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qual é falso. Isso devia ser feito através do confronto dessas duas partes. Chauí (2011) explica

que a conversa dialética consiste em uma conversa em que cada participante possui opiniões

diferentes sobre alguma coisa e deve discutir ou argumentar com o outro de modo a superar

sua posição e chegar a uma unidade, uma ideia que é a mesma para ambos e para todos que

procuram a verdade. Desta forma, do confronto entre a tese e a antítese surgiria a síntese.

Essa síntese deve ser divida em duas partes contrárias para serem confrontadas novamente até

que se chegue a uma síntese que não possa ser dividida. Essa ideia indivisível será a verdade

sobre o assunto discutido.

Não é difícil encontrar na dialética platônica a influência da maiêutica de Sócrates, a

começar pela relação que ele vê entre a busca da verdade e o diálogo, por exemplo. No

entanto, a diferença de um método para o outro é bastante clara. Na maiêutica, um dos

interlocutores, no caso específico Sócrates, detém supostamente a habilidade para pôr em

xeque as crenças do outro, exercendo dessa forma um protagonismo. Já na dialética platônica,

os interlocutores estão em pé de igualdade com suas teses e antíteses e precisam atacar a

posição do outro, isto é, por em cheque as crenças, os pré-conceitos e as ideias pré-concebidas

que corroboram com suas teses. A ideia é que com o que resistir da tese e antítese se construa

a síntese. Se uma delas não resistir aos ataques no combate dialético e for descartada

totalmente, significa que se tratava de uma ideia falsa. A tese que resistiu deve buscar uma

nova antítese para reiniciar o processo e construir uma síntese. Assim, a investigação da

verdade na dialética platônica pode ser vista como construção, desconstrução e reconstrução

de uma ideia através do confronto teórico e retórico. Um bom exemplo desse tipo de combate

na Filosofia clássica pode ser a disputa entre Platão e seu mais proeminente discípulo,

Aristóteles sobre a natureza da realidade.

2.5.1.1.3 O Agon no período medieva

O método de investigação dialético não se restringiu ao período antigo e clássico da

história da Filosofia. Conforme Rodriguez (2008), os intelectuais medievais debatiam a

respeito da dialética e da metafísica no período da história da Filosofia conhecido como

escolástica. Pedro Abelardo foi um dos grandes nomes do período. Para Rodriguez (2008) a

pesquisa filosófica em Abelardo se focava na discussão e elucidação de problemas. Rodriguez

(2008) explica que Abelardo contribuiu com a Filosofia medieval com um método filosófico e

pedagógico único que consistia em colocar o estudante em situações que apresentavam

problemas com prós e contras.

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O método filosófico e a postura intelectual de Abelardo deram a tônica do que foram

as disputas dialéticas da escolástica. Sobre o problema dos universais, por exemplo,

Rodriguez (2008, p. 11) explica que o problema ocupava os filósofos escolásticos dialéticos e

foi o centro das discussões filosóficas, “Abelardo atacou cruamente a postura de Roselino

[...] e foi intransigente com o realismo de Guilherme Champeaux [...] porque não concordava

com a concepção filosófica destes mestre”.

O autor relata também que Abelardo, não obstante o fato de reconhecer Guilherme

Champeaux como um grande mestre “[...] não se intimidou e começou a questionar seus

ensinamentos, transformando-se em seu rival ”. (RODRÍGUEZ, 2008, p. 5). Vejamos em que

termos o próprio Abelardo coloca o combate com Guilherme Champeaux:

[...] finalmente cheguei a Paris, onde essa disciplina conseguira florescer ao

máximo, junto a Guilherme, a saber, o de Champeaux, meu preceptor, reputado

então como o principal expoente nesse magistério, tanto pela fama como de fato.

Com ele demorei algum tempo; de início fui bem aceito, mas logo depois eu lhe

pareci muito incômodo quando tentei refutar algumas das suas opiniões e acometi

contra ele a argumentar frequentemente, sendo que, por vezes, eu parecia levar a

melhor nas discussões (ABELARDO, 1973, p. 250).

Conforme João Eduardo Pinto Basto Lupi (2013), não obstante o fato de a escolástica

ser a expressão pedagógica do saber adquirido e completo, existia um espaço para o diálogo

entre mestre e discípulo ou, entre concorrentes e adversários. Lupi (2013), observa que

posteriormente o método dialético daria lugar ao modelo do tratado, passando a ficar em

segundo plano. Todavia, mesmo que a disputa dialética já não fosse mais o método por

excelência da Filosofia, e é bem verdade que para muitos nunca foi, a Filosofia no ocidente

possivelmente já havia se constituído como uma área do conhecimento cuja disputa e a

concorrência provavelmente ditavam a ordem e a medida da produção filosófica. Como

exemplo da afirmação anterior, podemos citar a disputa entre os grandes sistemas construídos

no período da Filosofia moderna, que determinou a concorrência entre “rivais” das mais

diversas áreas filosóficas. Como a clássica concorrência entre empiristas e racionalistas, e

depois, a acirrada disputa entre as grandes sínteses, chegando finalmente a crítica da razão

feita no período contemporâneo, que também envolveu diversos combates teóricos.

2.5.2 O jogo e a educação

Conforme Guilles Brougère (1998) em seu livro “Jogo e Educação” o habito de

associar jogo e educação nem sempre foi tão comum como se vê nos dias atuais. Segundo

Brougère (1998) os termos já chegaram a ser vistos, inclusive como, antimônios. Para o autor,

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57

portanto, é importante identificar como passou-se da noção de jogo como atividade “fútil”

para atividade de valor educativo. Obviamente que esta passagem não aconteceu da noite para

o dia, antes tratou-se de um processo em que o jogo foi paulatinamente se ajustando as

necessidades e demandas da educação.

De acordo com Tizuco Morchida Kishimoto (2002) antes das revoluções românticas,

as relações entre jogo e educação eram orientadas por três concepções: recreação, reforço

escolar para facilitação do ensino de conteúdos e diagnóstico da educação infantil. O jogo

como atividade recreativa está presente já na antiguidade clássica como atestam textos do

filósofo Aristóteles:

[...]ora, esforçar-se e trabalhar com vistas na recreação parece coisa tola e

absolutamente infantil. Mas divertir-nos a fim de poder esforçar-nos, como se

expressa Anacársis, parece certo; porque o divertimento é uma espécie de relaxação,

e necessitamos de relaxação porque não podemos trabalhar constantemente. A

relação, por conseguinte, não é um fim, pois nós a cultivamos com vistas na

atividade. (ARISTÓTELES, 1985, p. 228).

A ligação do jogo a atividade de recreação foi hegemônica durante toda a antiguidade

clássica até a idade média, quando devido a sua ligação com os jogos de azar, rechaçados pela

Igreja, ela foi considerada uma atividade “Não seria”. Importante pontuar que, o fato de o

jogo na Idade Média ser considerado atividade “Não seria” não significa que a atividade

recreativa deixou de ser praticada. Kishimoto (2002, p, 24) explica que,

a Idade Média vê a atividade lúdica se desenvolver no centro da vida social mas às

margens da religião oficial, que a abominava. É nas festas, nos teatros, nos

carnavais, nas festividades de organizações de juventude que o jogo preserva a

identidade dos grupos. Associados ao dinheiro, à novidade, ao não-sério, o jogo se

expande pelos séculos seguintes com a proliferação do jogo de azar, de cards e

dados.

Conforme Kishimoto (2002) somente a partir do Renascimento a brincadeira começa a

ser vista como uma atividade livre capaz de desenvolver a inteligência e facilitar os estudos.

Assim o jogo no Renascimento foi uma forma de contrapor processos verbalistas de ensino,

devendo o pedagogo dar forma lúdica aos conteúdos. Ainda segundo a autora, essa

perspectiva aparece em educadores como Rabelais e Montaigne.

No Romantismo é construída uma nova forma de ver a relação da criança com o jogo,

que passa a ser visto “[...] como conduta espontânea e livre instrumento de educação da

pequena infância (Idem, p.24), perspectiva que aparece em Jean-Paul Richter, Hoffinann e

Froebel. Conforme Kishimoto (2002) a construção dessa concepção envolveu diversas teorias

até sua afirmação enquanto “[...] processo metafórico relacionado a comportamentos naturais

e sociais.” (Idem, p.24). Dentre essas teorias se destacam: o conhecimento da criança como

via de acesso a humanidade de Russeau, o jogo como necessidade biológica, instinto e ato

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58

voluntário de Gloss e a construção dos processos psicológicos a partir de injunções do

contexto sócio-cultural de Vygosrsky.

2.5.2.1. O jogo educativo

Desde a antiguidade clássica as atividades lúdicas têm sido relacionadas a educação. O

Filósofo Platão falava em “aprender brincando” (PLATÃO apud KISHIMOTO, 1996, p. 6).

Mas, conforme Tizuko Morshida Kishimoto (2002) Froebel foi o primeiro a ver o jogo como

parte fundamental do processo educativo. De acordo com Kishimoto (1996, p. 09):

[...]a partir de sua Filosofia educacional baseada no uso dos jogos infantis, Froebel

defini a metodologia dos dons e ocupações, dos brinquedos e jogos propondo [...]

propondo materiais como, bolas, cubos, vareta, anéis e etc. que permitem a

realização de atividade denominadas ocupações, sob a orientação da jardineira, e [...]

brinquedos e jogos, atividade simbólicas, livres, acompanhadas de música e

movimentos corporais, destinada a liberar as crianças para a expressão da relações

que estabelece sobre objetos e situações de seu cotidiano. Os brinquedos são

atividades imitativas livres, e os jogos, atividades livres com o emprego dos dons.

Guilles Brougère (1998) esclarece que a noção de jogo educativo surge da

necessidade de aliar a vocação da criança à missão educativa da escola. Conforme Brougère

(1998) duas noções formam a base do conceito de jogo educativo: em primeiro lugar, a de que

o jogo é um fim em si para as crianças, e em segundo, a de que para os educadores ele é um

meio. Dessa forma, o jogo educativo consiste em uma forma de “[...] conciliar a criança e a

educação, sem renegar um dos termos [...]” (BROUGÈRE, 1998, p. 122). Partindo da ideia de

que o jogo é o trabalho da criança, presente nos estudos de Pauline Kergomard (1910), busca-

se com o jogo educativo conciliar o respeito a criança, que tem no jogo uma expressão de sua

natureza, e ao mesmo tempo não descuidar do processo educativo. Não obstante as

expectativas construídas em torno do jogo educativo, de acordo com Brougère (1998, p.127),

[...]o jogo educativo foi uma atividade bastarda, dando ares de jogo a uma atividade

escolar, a um exercício, em uma estratégia próxima do estratagema [...]. Trata-se

menos de seduzir do que de injetar o jogo com seu valor educativo em uma atividade

que continua a ser totalmente dominada pelo adulto. Aí, sem dúvida, jaz o paradoxo

e a incessante oscilação entre atividades que são mais ou menos próximas do jogo

ou do exercício. Ele se tornou, pela necessidade de propor um material pŕé-fabricado

para auxiliar o trabalho dos professores um objeto completamente paradoxal:

vendido como os brinquedos, propõe incluir aí elementos de ordem didática, suporte

de uma aprendizagem em potencial.

O alerta de Brougère (1998) diz respeito ao perigo de que o jogo educativo, ao propor

uma aproximação entre dois elementos cujas naturezas contém pontos excludentes, jogo e

educação, acabe por fracassar duplamente: privando o jogo de seu caráter livre e espontâneo e

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a educação de seu caráter sério e produtivo, prendendo as crianças em um esquema de

educação fraudulento maquiado pela atividade lúdica.

A noção de jogo educativo ou pedagógico, todavia, sobreviveu a estas objeções

conseguindo se afirmar como ferramenta potencial de apoio a atividade pedagógica na

educação infantil e fora dela. Celso Antunes (2008) assinala que o jogo ajuda o estudante a

construir novas descobertas, desenvolve e enriquece sua personalidade, além de simbolizar

um instrumento pedagógico que eleva o professor à condição de condutor, estimulador e

avaliador de sua aprendizagem. Essa concepção de Antunes se coaduna com as conclusões de

Marli Santa Santos (1997) sobre a importância e utilidade da ludicidade para o ser humano de

modo mais geral. Conforme Santos (1997, p. 12):

[...] a ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e não pode ser

vista apenas como diversão. O desenvolvimento do aspecto lúdico facilita a

aprendizagem, o desenvolvimento pessoal, social e cultural, colabora para uma boa

saúde mental, prepara para um estado interior fértil, facilita os processos de

socialização, comunicação, expressão e construção do conhecimento.

Ricardo R. Fragelli e Fábio M. Mendes (2011) corroboram com os autores

supracitados e afirmam que existem poucas dúvidas que jogos de aprendizagem sejam

capazes de promover o aprendizado efetivo. Embora os autores estejam se referindo

especificamente aos jogos voltados para as ciências exatas como a matemática, eles tocam em

um ponto que diz respeito ao uso dos jogos no processo de ensino aprendizagem de modo

geral. Este ponto se relaciona ao debate que busca “[...] determinar quais são as

características dos jogos e quais são as situações de aprendizagem que tornam o seu uso mais

eficiente que as aulas expositivas tradicionais.” (idem, 101). Um debate que pela sua extensão

não será aprofundado aqui, mas que conforme Fragelli e Mendes (idem) passa por pontos

como:

[...] alguns jogos estimulam uma experiência de aprendizagem rica e estruturada,

mas oferecem pouco em termo de diversão aos aprendizes; outros jogos sofrem do

problema oposto, em que são capazes de prender a atenção dos estudantes, mas não

oferecem muitas oportunidades para estruturar os conhecimentos adquiridos”.

Os jogos do primeiro grupo, embora pedagogicamente mais atraentes pela sua

capacidade de oferecer um ensino estruturado, estão destinados a agradar mais a educadores

do que a educandos. Ou seja, contém um vício que se não for sanado compromete seu uso nos

fundamentos, pois os jogos educativos ou pedagógicos se destinam aos alunos e não aos

professores. Já os do segundo grupo, mesmo sem a oferta de uma experiência de

aprendizagem completa, explicam Fragelli e Mendes (idem, p 91), “[...] podem ser muito

efetivos para promover o aprendizado quando associados a outras atividades em sala de aula”.

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Fragelli e Mendes (2011) estão, tratando da utilização de jogos para potencializar a

educação dentro da perspectiva da aprendizagem significativa, e, neste sentido para os autores

[...] o jogo não precisa cumprir sozinho o papel de engajar os estudantes em uma

atividade de aprendizado, sugerir e induzir que os estudantes produzam as

estratégias e o conhecimento capazes de abordar o problema proposto e, além disto,

organizar e formalizar estes conhecimentos na estrutura cognitiva do mesmo. O

objetivo principal dos jogos aqui discutidos é engajar o estudante na tarefa de

aprendizado, fazendo com que o conteúdo discutido torne-se significativo e

motivador. (Idem, p. 102).

A partir da colocação dos autores supracitados, entendemos que a utilização de jogos

didáticos dentro da perspectiva da Aprendizagem Significativa pode ser a chave para a

questão colocada por Brougère (1998) e atualizada por Fragelli e Mendes (2011), que diz

respeito a dificuldade para conservar os elementos fundamentos do processo de aprendizagem

e da atividade lúdica por ocasião do encontro entre ambos no jogo didático. Para entendermos

melhor esse ponto, passamos a abordar no próximo tópico alguns dos princípios basilares da

Aprendizagem Significativa.

2.5.2.2. O jogo didático e a aprendizagem significativa

Conforme Marco Antônio Moreira (2010, p. 01) “aprendizagem significativa é aquela

em que ideias expressas simbolicamente interagem de maneira substantiva e não-arbitrária

com aquilo que o aprendiz já sabe”. Ainda segundo o autor, “interação substantiva” é aquela

que não é literal, que não é ao pé-da-letra, e “não-arbitrária” é aquela em que a interação não é

com qualquer ideia prévia, mas com algum conhecimento especificamente relevante já

existente na estrutura cognitiva do sujeito que aprende.

Essa informação relevante presente no sistema cognitivo do aluno, que deverá

interagir com novas ideias simbólicas, dentro da teoria da aprendizagem significativa se

chama subsunsor ou “ideias ancoras”. De acordo David Ausubel14 (2010), criador da teoria

da aprendizagem significativa, “subnsunsor” é o fator que possibilitará que o indivíduo de

significado a um novo conhecimento. Para Moreira (2010, p. 01),

[...]em termos simples, subsunçor é o nome que se dá a um conhecimento

específico, existente na estrutura de conhecimentos do indivíduo, que permite

dar significado a um novo conhecimento que lhe é apresentado ou por ele

descoberto. Tanto por recepção como por descobrimento, a atribuição de

14 Conforme Moreira, principal teórico da aprendizagem significativa no Brasil, David Ausubel, que

vivei entre 1918-2008 foi um Médico e psicólogo que dedicou sua vida acadêmica ao

desenvolvimento de uma visão cognitiva à Psicologia Educacional (Moreira, 2010).

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significados a novos conhecimentos depende da existência de conhecimentos

prévios especificamente relevantes e da interação com eles.

De acordo com Moreira (2010) a aprendizagem significativa pode ser superordenada

ou subornada. Sendo mais comum à última. Ainda segundo o autor, a aprendizagem

significativa é superordenada quando:

[...] uma nova idéia, um novo conceito, uma nova proposição, mais abrangente,

passa a subordinar conhecimentos prévios [...]”, e ela é subordinada quando “[...] um

novo conhecimento adquire significado na ancoragem interativa com algum

conhecimento prévio especificamente relevante [..] (MOREIRA, 2010. 01).

Para ilustrar seu argumento Moreira (idem) traz dois exemplos, o primeiro na área da

física, se refere à aprendizagem significativa superordenada:

[...] para um aluno que já conhece a Lei da Conservação da Energia aplicada à

energia mecânica, resolver problemas onde há transformação de energia potencial

em cinética e vice-versa apenas corrobora o conhecimento prévio dando-lhe mais

estabilidade cognitiva e talvez maior clareza. Mas se a Primeira Lei da

Termodinâmica lhe for apresentada (não importa se em uma aula, em um livro ou

em um moderno aplicativo) como a Lei da Conservação da Energia aplicada a

fenômenos térmicos ele ou ela dará significado a essa nova lei na medida em que

“acionar” o subsunçor Conservação da Energia, mas este ficará mais rico, mais

elaborado, terá novos significados pois a Conservação da Energia aplicar-se-á não só

ao campo conceitual da Mecânica mas também ao da Termodinâmica (MOREIRA,

2010, p. 02).

O segundo exemplo, na geografia, se refere à aprendizagem significativa subordinada:

[...] poderíamos também tomar como exemplo a construção do subsunçor mapa. As

crianças na escola formam o conceito de mapa geográfico através de sucessivos

encontros com instâncias desse conceito. Aprendem que o mapa pode ser da cidade,

do país, do mundo. Progressivamente, vão aprendendo que um mapa pode ser

político, rodoviário, físico, etc.. O subsunçor mapa vai ficando cada vez mais rico,

com mais significados, mais estável e mais capaz de interagir com novos

conhecimentos. Dependendo dos campos de conhecimentos que o sujeito busque

dominar em suas aprendizagens futuras, terá que dar significado a conceitos tais

como mapas cognitivos, mapas mentais, mapas conceituais, mapas de eventos e,

sabe-se lá, que outros tipos de mapas. Então, ao longo de sucessivas aprendizagens

significativas o subsunçor vai adquirindo muitos significados, tornando-se cada vez

mais capaz de servir de idéia-âncora para novos conhecimentos (Idem).

No que se refere a ambos os exemplos, Moreira alerta para a realidade de que, caso os

relativos conhecimentos prévios (lei de conservação e mapa) não fossem submetidos a

dinâmica de elaboração, diferenciação e cognição não teriam se expandido até os limites

dados nos exemplos. Conforme Moreira (idem, p. 4) “a clareza, a estabilidade cognitiva, a

abrangência, a diferenciação de um subsunçor variam ao longo do tempo, ou melhor, das

aprendizagens significativas do sujeito. Trata-se de um conhecimento dinâmico, não estático,

que pode evoluir e, inclusive, involuir”.

O processo dinâmico que constitui a aprendizagem significativa segundo Moreira

(2010) é caracterizado por dois processos: a diferenciação progressiva e a reconciliação

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integradora. Conforme Moreira (idem, p. 6) “[...] a diferenciação progressiva é o processo de

atribuição de novos significados a um dado subsunçor (um conceito ou uma proposição, por

exemplo) resultante da sucessiva utilização desse subsunçor para dar significado a novos

conhecimentos”.

Como exemplo da diferenciação progressiva Moreira mostra como o conceito de força

pode ganhar novos significados em relação àquelas noções básicas que lhe são atribuídas

desde cedo por crianças:

[...] qualquer criança já formou esse conceito [força] antes de chegar à escola, mas

com significados do tipo puxão, empurrão, esforço físico, “ fazer força”, “não ter

força”, etc.. Na escola, em ciências, aprenderá que existe na natureza uma força que

é devida à massa dos corpos – a força gravitacional – e que essa força é muito

importante para o sistema planetário, que é atrativa, que é regida por uma

determinada lei, etc.. (Idem, p, 6).

Sobre a reconciliação integradora ou integrativa, Moreira (idem) explica que trata-se

de “[...] um processo da dinâmica da estrutura cognitiva, simultâneo ao da diferenciação

progressiva, que consiste em eliminar diferenças aparentes, resolver inconsistências, integrar

significados, fazer superordenações”. A reconciliação integradora visa regular e limitar a

diferenciação progressiva para dessa forma impedir, por exemplo, que haja uma diferenciação

exacerbada e geral de todas as coisas. Portanto, por meio da diferenciação progressiva e da

reconciliação integradora se dá a dinâmica da aprendizagem significativa: a diferenciação

progressiva mais ligada a aprendizagem significativa subordinada e a reconciliação

integradora à aprendizagem significativa superordenada.

2.5.2.2.1. Condição para que haja aprendizagem significativa

Conforme Marco Antônio Moreira (2010) são duas as condições para que haja

aprendizagem significativa: um material de aprendizagem que seja potencialmente

significativo e um aprendiz pré-disposto a aprender.

Sobre a primeira condição, Moreira (idem) destaca a necessidade de livros, aulas e

aplicativos (exemplos que ele fornece de materiais educativos) que apresentem uma estrutura

lógica em sua natureza, pois conforme Moreira (idem, p.8) esta é a condição para que o

material seja “[...] relacionável de maneira não-arbitrária e não-literal a uma estrutura

cognitiva apropriada e relevante”.

A segunda condição para o autor, é a mais difícil, pois diz respeito à vontade do aluno

de relacionar novos conhecimentos (de maneira não-arbitrária e não-literal) a seus

conhecimentos prévios. Moreira chama essa contribuição do aluno de “predisposição para

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aprender” (Idem), e pontua que a “pré-disposição para aprender” não tem a ver exatamente

com

[...] motivação, ou de gostar da matéria. Por alguma razão, o

sujeito que aprende deve se predispor a relacionar (diferenciando e integrando)

interativamente os novos conhecimentos a sua estrutura cognitiva prévia,

modificando-a, enriquecendo-a, elaborando-a e dando significados a esses

conhecimentos. Pode ser simplesmente porque ela ou ele sabe que sem compreensão

não terá bons resultados nas avaliações. Aliás, muito da aprendizagem memorística

sem significado (a chamada aprendizagem mecânica) que usualmente ocorre na

escola resulta das avaliações e procedimentos de ensino que estimulam esse tipo de

aprendizagem (Idem).

Além da situação anterior, em que o aluno não tem vontade de relacionar novos

conhecimentos, de maneira não-arbitrária e não-literal, existe outro impedimento a

aprendizagem significativa: um aluno que deseja dar significados aos novos conhecimentos e

não tem conhecimentos prévios adequados, ou o material didático não ter significado lógico.

Por esse motivo Moreira coloca que o material didático precisa ser, pelo menos

potencialmente lógico. Potencialmente porque “[...] o material só pode ser potencialmente

significativo, não significativo: não existe livro significativo, nem aula significativa, nem

problema significativo, pois o significado está nas pessoas, não nos materiais (Idem).

2.5.2.2.2. Organizador prévio

Segundo Marco Antonio Moreira (2010) o fator determinante para a aprendizagem

significativa, se tratando de uma premissa que está no próprio Ausubel, é aquilo que o aluno

já sabe. Neste sentido, a figura do subsunçor se torna central no esquema proposto por

Ausubel, tendo em vista que, subsunçores são, segundo Moreira (2010), conhecimentos

prévios relevantes para a aprendizagem de outros conhecimentos.

A clareza, a estabilidade e a organização do conhecimento prévio em um dado corpo

de conhecimentos, em certo momento, é o que mais influencia a aquisição

significativa de novos conhecimentos nessa área, em um processo interativo no

qual o novo ganha significados, se integra e se diferencia em relação ao já existente

que, por sua vez, adquire novos significados fica mais estável, mais diferenciado,

mais rico, mais capaz de ancorar novos conhecimentos ( Idem, p. 9).

A considerar a colocação anterior, se constitui um grande problema para a

aprendizagem significativa quando o aprendiz não dispõe de subsunçores “[...] adequados que

lhe permitam atribuir significados aos novos conhecimentos [...]” (Idem, p. 9). Nestes casos

Ausubel propôs como solução o uso de “Organizadores prévios”.

[...] organizador prévio é um recurso instrucional apresentado em um nível mais alto

de abstração, generalidade e inclusividade em relação ao material de aprendizagem.

Não é uma visão geral, um sumário ou um resumo que geralmente estão no mesmo

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nível de abstração do material a ser aprendido. Pode ser um enunciado, uma

pergunta, uma situação-problema, uma demonstração, um filme, uma leitura

introdutória, uma simulação [um jogo]. Pode ser também uma aula que precede um

conjunto de outras aulas. As possibilidades são muitas, mas a condição é que

preceda a apresentação do material de aprendizagem e que seja mais abrangente,

mais geral e inclusivo do que este (Idem).

De acordo com Moreira (idem), existem dois tipos de organizador prévio: expositivo e

comparativo. O organizador prévio expositivo é adequado diante de um material didático que

não é familiar para o aprendiz, pois neste caso, possivelmente o aprendiz não possui

subsunçores, sendo a função do organizador prévio fornecer esses subsunçores. O que em

tese, conforme coloca Moreira, ele é capaz de fazer, sendo sua função atuar como uma ponte

entre o que o aprendiz sabe e o que ele deve saber para que o material didático seja para ele

potencialmente significativo. O organizador prévio comparativo deve ser utilizado quando o

aprendiz já tem certo grau de familiaridade com o material didático, sendo sua função neste

caso, ajudar o aprendiz a integrar novos conhecimentos a sua estrutura cognitiva e discriminar

esses conhecimentos de outros já existentes nela.

Exatamente esta última característica do organizador prévio torna interessante o uso de

jogos na perspectiva da aprendizagem significativa, especificamente como organizador

prévio. Pois, diferentemente da concepção de jogo educativo renascentista, em que o jogo era

visto como um potencial transmissor de conteúdos (KISHIMOTO, 2002), uso que, como já

vimos em tópicos anteriores, pode ocasionar perda de características fundamentais do jogo, o

uso de jogos educativos na perspectiva da aprendizagem significativa, justamente por não ter

como objetivo principal a transmissão de conteúdo (uso como organizador prévio), o que

pode ocorrer eventualmente, pode preservar as característica fundamentais que compõem a

natureza do jogo, conforme a construção teórica de autores clássicos do tema como Wizinga e

Callois, e ao mesmo tempo, ser utilizado como um material educativo eficiente.

Sobre a eficácia dos organizadores prévios, Moreira (2010) esclarece que no caso de

organizadores expositivos pesquisas tem apontado a existência de um baixo aproveitamento,

sendo preferível para o autor como opção em caso de ausência de subsunçores, ao invés da

utilização de organizadores prévios, promover e facilitar sua construção antes de prosseguir

com a apresentação do novo material. Já o uso de organizadores prévios com o intuito de

mostrar a relação entre novos conhecimentos e conhecimentos prévios, na opinião de Moreira

(2010, p. 11), devem sempre ser utilizados no ensino, tendo em vista que:

[...] o aluno muitas vezes não percebe essa racionabilidade e pensa que os novos

materiais de aprendizagem não têm muito a ver com seus conhecimentos prévios.

Organizadores prévios devem ajudar o aprendiz a perceber que novos

conhecimentos estão relacionados a ideias apresentadas anteriormente, a

subsunçores que existem em sua estrutura cognitiva prévia.

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Em suma, os organizadores prévios devem “[...] suprir a deficiência de subsunçores

[organizadores expositivos] ou para mostrar a relacionalidade e a discriminabilidade entre

novos conhecimentos e conhecimentos já existentes, ou seja, subsunçores [organizador

comparativo]” (Idem).

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66

3 DENEGRINDO A DISPUTA DIALÉTICA: UM A RELATO DE

EXPERIÊNCIA DA APLICAÇÃO DO CARD GAME COMBATE

FILOSÓFICO APÓS SUA EXPANSÃO PARA ATENDER OS

DISPOSITIVOS DA LEI 10.639

3.1. O PRODUTO DIDÁTICO: FORMATO DOS CARDS, APRESENTAÇÃO DOS

REFERENCIAIS E DA MECÂNICA

A primeira versão do card game teve seu primeiro protótipo apresentado como como

produto didático ao programa de Residência Docente do Colégio Pedro II em 2017 como

parte de um “Produto Acadêmico Final”, nome do trabalho de conclusão de curso exigido

como um dos requisitos para a obtenção do título de especialista em docência de Filosofia na

educação básica. O protótipo contava com 58 cards, que não chegaram a ter uma versão

finalizada. Para sua criação foi seguida a seguinte metodologia:

[...] o primeiro procedimento foi elaborar um protótipo do jogo (conforme o projeto)

e apresentá-lo aos estudantes. Nesta fase, a estratégia adotada foi selecionar um

pequeno grupo de estudantes (em torno de cinco) ditos mais afeitos a jogos de forma

geral, para verificar a viabilidade do modelo planejado antes de iniciar o processo de

confecção do formato para ser usado em sala de aula. Tendo recebido um parecer

favorável desse grupo em relação a esse protótipo, tiveram início os testes de um

modelo mais bem estruturado. Os primeiros testes [do modelo mais elaborado] se

deram com voluntários da própria família do pesquisador (namorada, sobrinhos e

primos, todos com idades entre 15 e 27 anos. Foram verificados, inicialmente, a

jogabilidade, o nível de dificuldade oferecido e, principalmente, até que ponto o

jogo era capaz de divertir e despertar interesse (RIBEIRO, 2017, p.14).

Conforme Ribeiro (2017) a considerar o objetivo geral do PAF, que era aproximar

estudantes do ensino médio da Filosofia, tendo como inspiração o jogo da revista Abril, o

Filosofighters15

, o projeto previa que a partir da estrutura de um card game de estratégia já

consagrado se recorreria a temas do universo dos estudantes para a construir um novo card

game de estratégia com potencial para diminuir a distância entre os estudantes de baixa renda

e parte dos “conteúdos universais da Filosofia”, sendo este o problema central para o qual a

pesquisa visava contribuir para a solução. Visando alcançar tal objetivo os cards do Combate

Filosófico foram construídos para aproximar os estudantes dos “Conteúdos Universais da

Filosofia”:

15

Jogo de luta on-line em que os jogadores, por meio do teclado do PC, controlam filósofos e usam seus

conceitos para golpear o filósofo controlado pelo oponente. O jogo conta com nove filósofos ao todo a

disposição dos jogadores.

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O Jogo “Combate Filosófico” transforma os competidores em pensadores que põem

sua “reputação em jogo” ao participar de um duelo cujo objetivo é reduzir à

reputação do oponente a zero. O confronto se dá por meio de um duelo indireto, em

que os competidores precisam atrair filósofos para um “Campo de Batalha”. Estes

filósofos representam cartas que dispõe de “Recursos” para atacar o adversário ou

ativar efeitos (determinações) sobre as cartas que ele controla. Os recursos são

construídos na maioria das vezes a partir dos conceitos criados por cada filósofo.

[Por exemplo:] Os conceitos não são meramente expostos, [nos cards] mas

interferem no jogo de acordo com a especificidade que lhe foi atribuída pelo filósofo

que o criou [além de estarem relacionadas com as habilidades demais habilidades, o

que contribui para a ligação de todos os cards do jogo] jogo. Por exemplo, na carta

Sócrates a dialética se transformou em um espelho (Espelho Dialético) para

devolver ataques ao adversário. Da mesma forma que o conceito de Mais-valia de

Marx se transformou em uma espada (espada Mais-valia) que rouba parte da

capacidade de ataque do adversário. Também a Genealogia da Moral da carta

Nietzsche, que enfraquece cartas que representam filósofos teístas, inicialmente

cristãos (RIBEIRO, 2017, p. 22).

Vejamos na figura 1 o modelo construído para os cards do Combate Filosófico em sua

primeira versão. Os modelos aparecem na figura nesta ordem: card de período, filósofo

permanente e problema.

Fonte: Ribeiro (2017).

Os cards da primeira versão tinham um modelo construído no editor de texto do Word,

se tratando de uma caixa de texto dívida por linhas retas (card de filósofo) separando as partes

do texto. A caixa de texto, que media 9,3 milímetros de cumprimento por 6,3 milímetros de

largura era impressa por impressora comum, preto e branco em papel A4 e recortada para

ganhar a aparência de card.

O jogo escolhido para oferecer a estrutura do novo card game foi o “Magic: The

Gathering”. Dois motivos determinaram a escolha: em primeiro lugar, o projeto contava com

a colaboração de um estudante que habitualmente jogava Magic (RIBEIRO, 2017, p. 25), e,

Figura 1 - Cards da primeira versão do Combate Filosófico

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portanto, conhecia bem sua estrutura, em segundo lugar, como será melhor explicado em

seguida, o Magic, como a dissertação irá se referir ao jogo daqui por diante, dispõe de uma

mecânica já consagrada pelos cards games mais bem sucedidos entre os jogadores de card

game. No que se refere aos temas do universo dos alunos utilizados para construção do jogo

foram utilizados como inspiração elementos do “The King Of Fighters”, jogo eletrônico de

luta para plataforma Neo-Geo que ficou famoso na década de 1990 e ainda se mostra muito

popular até os dias de hoje entre a juventude mais pobre. A franquia da SNK fez muito

sucesso ao reunir e organizar em equipes, e em um só jogo, seus personagens mais famosos.

O novo jogo se inspirou ainda em elementos do universo dos animes que fazem grande

sucesso entre os jovens brasileiros como, Naruto16

e Cavaleiros do Zodíaco17

.

3.1.1 O Magic The: Gathering

Conforme Pedro Panhoca da Silva (2016), o Magic The: Gathering se tornou o padrão

mais comum de jogabilidade a ser encontrado nos jogos de cards do tipo estratégia de forma

geral. Segundo Silva (2016, p. 61):

[...] após o sucesso comercial de Magic: The Gathering são lançados anualmente

dezenas de jogos. Este, assim como outros card games, surgiu de uma ideia de

facilitar os já consagrados RPGs e torná-lo mais dinâmico, simples e fácil de ser

transportado. Como foi o pioneiro dos CCGs (sigla comumente utilizada para

Collectible Card Games), carrega a fama de ser o CCG “clássico” e o mais jogado

dentre todos os outros. Para se jogar Magic: the Gathering, assim como muitos

outros jogos, basta apenas cada jogador ter o seu próprio baralho.

Silva (2016) explica que, no Magic: the Gathering, de agora em diante referido por

essa dissertação simplesmente como Magic, cada card do baralho representa uma magia a ser

executada, que, de alguma forma, interfere ou interferirá nos planos dos demais jogadores. De

16

José Messias (2011) explica que no anime Naruto, cujo protagonista homônimo é um ninja adolescente que

sonha se tornar o líder da Vila Oculta da Folha, uma espécie de cidade-estado nos moldes da polis grega de

Esparta. O menino órfão de pai e mãe vive o drama de ter dentro de si o terrível espirito da Raposa de Nove

Caldas, a clássica entidade do folclore japonês que lhe confere poderes extraordinários, mas também atrai o ódio

dos outros moradores da vila que lembram com tristeza a destruição e as mortes causadas pelo demônio antes de

ser lacrado dentro de Naruto. Que “por esse motivo [...] busca se tornar o melhor ninja de sua vila para poder

finalmente conseguir o reconhecimento de seus pares. ” (MESSIAS, 2011, p. 6). 17

Conforme José Messias o anime “Os Cavaleiros do Zodíaco” ou simplesmente (CDZ), Saint Seiya no original,

narra as histórias de cinco guerreiros com habilidades sobre-humanas que defendem a reencarnação da deusa

grega Atena. Os cinco protagonistas são: Seiya protegido pela constelação de Pégaso, Shiryu constelação de

Dragão, Hyoga de Cisne, Shun de Andrômeda e Ikki de Fênix possuem armaduras de bronze que representam

suas respectivas constelações (MESSIAS, José. No superhero allowed: o herói de mangá contemporâneo. Texto

apresentado na primeira jornada de histórias em quadrinhos da Escola de Comunicações e Artes da Universidade

de São Paulo de 23 a 26 de agosto de 2011, São Paulo).

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acordo com Silva (idem), durante a partida, alguns cards são postas na mesa e representam

elementos do jogo. Os cards simbolizam exércitos/hordas (monstros, guerreiros, criaturas

mitológicas), itens mágicos (armas, auras, veículos) e bases de controle (portais, fortalezas,

castelos, esconderijos) sob o comando do jogador, aquele que gerencia os recursos.

Conforme Matt Tabak (2013, p.4), redator do Manual de Regras autorizado de 2013

[...] o Magic: The Gathering é um jogo de estratégia entre dois ou mais jogadores,

cada um com seu próprio deck personalizado de cards de Magic. Durante o curso do

jogo, os jogadores se alternam em turnos para jogar cards como terrenos (que

permitem que você jogue outros cards), criaturas, feitiços e outras mágicas. Cada

jogador começa com 20 pontos de vida. Você vence quando reduz o total de pontos

de vida de seu oponente a 0 atacando-o com criaturas e mágicas!.

No Magic os jogadores integram um universo específico construído para o jogo e

desempenham um papel:

[...] em Magic, você faz parte da elite dos melhores magos do Multiverso — os

planeswalkers. Alguns são amigos, outros inimigos. Todos controlam magias

aterrorizantes e comandam exércitos de criaturas arrancadas dos infinitos planos da

realidade. O seu deck de cards representa todas as armas de seu arsenal. Ele contém

as mágicas que você conhece e as criaturas que pode invocar para lutar por você.

Personalize seu próprio deck de Magic e desafie seus amigos para ver quem tem a

centelha mais brilhante! (Idem).

Com essa explicação fica fácil nos localizarmos no jogo. No Magic como são

chamados os jogadores? Planeswalkers. Contra quem eles duelam? Contra outros

Planeswalkers. De onde vem suas armas? Do seu Arsenal de mágicas. Onde acontece o

duelo? No multiverso, que está dividido em planos. Como é o duelo? Indireto, através do uso

de cards que representam criaturas. Qual o objetivo do duelo? Ver quem tem a centelha mais

brilhante do multiverso. O que é preciso ter para jogar? Um deck de cards. Passamos a

conhecer agora os tipos de card que compõe um deck de Magic.

3.1.1.1 Os cards de magic

O Magic conta com sete tipos de cards: a mágica instantânea, o feitiço, o

encantamento, o artefato, o planeswalker, o terreno e a criatura. Cada uma tem uma função e

interfere no jogo de uma forma específica.

Conforme Tabak (2013), os cards do tipo criaturas são as que efetivamente lutam

pelos jogadores, são do tipo permanente, significando que ficam no campo de batalha até

serem destruídas, o que pode ocorrer, dentre outras formas, quando bloqueiam um ataque

maior que sua capacidade de resistência, pois cada card do tipo criatura traz números que

indicam seu “poder e resistência”. Conforme Tabak (2013, p.6)

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[...]diferentemente de outros tipos de permanentes, as criaturas entram no campo de

batalha com “enjoo de invocação”: uma criatura não pode atacar nem usar uma

habilidade [...] até que esteja no campo de batalha desde o início de seu turno [...].

Confira na figura 2, a visão geral de um card de Magic:

Fonte: Tabak, (2013).

O card do tipo “Feitiço” representa um procedimento mágico. Os feitiços só podem ser

conjurados durante a fase principal de um dos turnos dos jogadores. Turno é o momento em

que cada jogador de Magic tem oportunidade de tomar suas decisões e executar

procedimentos no jogo. As fases do turno serão explicadas posteriormente. Conjurar uma

mágica é o ato de retirar um card da mão e mostrar ao oponente para que ela interfira no jogo,

indo em seguida para a Pilha. A Pilha é a zona do jogo onde as mágicas ganha vida. Após ter

interferido no jogo, isto é, ter suas instruções seguidas, “o Feitiço” é colocado no cemitério do

jogador que o conjurou. Cemitério é o local do jogo para onde vão os cards que já foram

utilizados e não interferem mais no jogo (TABAK, 2013).

Figura 2 - Partes de um card

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Os cards do tipo “Mágica instantânea” são como os do tipo Feitiço em tudo, com a

exceção de que eles podem entrar no campo de batalha a qualquer momento conforme a

vontade de um jogador, mesmo durante o turno do seu oponente e também em resposta a

outra Mágica. (TABAK, 2013).

Os cards do tipo “Encantamento” diferentemente do feitiço e da mágica instantânea,

representa uma manifestação mágica estável. Isso significa, em primeiro lugar, que você só

pode conjurá-lo, junto com um card do tipo Feitiço, e em segundo que, após conjurá-lo, ele

deve permanecer na mesa a menos que seja destruído, pois o encantamento é um card

permanente (TABAK, 2013).

Os cards do tipo terreno são fundamentais para o funcionamento do jogo, porque a

maioria deles tem a habilidade de gerar Mana. A Mana é a moeda do jogo, necessária para

custear a maioria dos procedimentos no jogo. Por exemplo: para que um card do tipo criatura

entre no campo de batalha, é preciso que o jogador pague o seu custo de Mana. Conforme

Tabak (2013) cada terreno básico tem uma habilidade que gera mana de uma determinada cor.

As Planícies geram Mana branca, a Ilha Mana azul, os Pântanos geram mana preto, as

Montanhas geram mana vermelho e as Florestas geram mana verde. Esses são os cinco

terrenos básicos. Confira na figura 3 os tipos de terreno básico e a mana que eles geram:

Fonte: Tabak, (2013).

Figura 3 - Tipos de terreno básico

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Os cards do tipo artefato representam relíquias mágicas. Assim como um

encantamento, um artefato é um card permanente, ou seja, permanece no campo de batalha e

afeta o jogo. Alguns artefatos são equipamentos que podem ser anexados as criaturas que os

jogadores controlam deixando-a mais poderosa.

Finalmente chegamos ao card de “Planeswalker”. Estes cards representam aliados que

o jogador de Magic pode convocar para lutar do seu lado. São cards permanentes. Os

Planeswalker podem ser atacados pelas criaturas de seus oponentes, podendo o jogador nesse

caso, recorrer a suas criaturas para bloquear normalmente. Um jogador pode causar danos aos

Planeswalker de seu adversário, ao invés de causar nele, usando as próprias mágicas e

habilidades. Os danos causados a um Planeswalker fazem com que ele perca uma quantidade

equivalente de marcadores de lealdade. Caso perca todos os seus marcadores de lealdade, o

Planeswalker será colocado no cemitério. Vejamos na figura 4 de que forma os cards de

Magic afetam e são afetados no jogo

Fonte: Tabak, (2013).

3.1.1.2 As Zonas do jogo

Conhecidos os cards do Magic, vamos conhecer agora as zonas do jogo, que são:

Grimório, Mão, Pilha, Campo de Batalha, Cemitério e Exilio.

O Grimório é o monte de compra de cada jogador, chamado de deck antes de começar

a partida, sendo Grimório um conceito especifico do Magic. O Grimório fica voltado para

Figura 4 – De que forma os cards afetam e são afetados no jogo

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baixo e os cards permanecem na ordem em que estavam no início do jogo, não sendo

permitido que os jogadores olhem os cards de seu Grimório. É chamado de monte de compra

porque a cada turno os jogadores podem renovar seus arsenais mágicos com cards de Magic

comprando uma carta (TABAK, 2013).

A Mão é para onde vão os cards que você compra, isto é, retira do Grimório a cada

turno, como acontece em outros card game. Os cards da mão só podem ser vistos pelo jogador

que os possui. No Magic os jogadores iniciam a partida com sete cards na Mão e o tamanho

máximo da sua mão é de sete cards. Se os cards da Mão ultrapassarem a marca de sete, o

jogador deve descartar cards até atingir um total de sete no final de cada um de seus turnos. A

Pilha é o local onde as mágicas e habilidades aguardam para serem resolvidas, o que acontece

quando a os jogadores decidem não conjurar mais mágicas nem ativar habilidades novas.

Quando isso acontece, e a última mágica ou habilidade a ser colocada na pilha é resolvida os

jogadores têm a oportunidade de conjurar mágicas e ativar habilidades novamente. A pilha é

uma zona compartilhada pelos jogadores. Vejamos na figura 5 uma demonstração das zonas

do jogo na representação de uma partida de Magic e uma demonstração de cards na pilha:

Fonte: Tabak (2013)

Figura 5 - Zonas do jogo e cards na pilha

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3.1.1.3 Conceitos básicos e procedimentos de combate.

Até este ponto já contamos com informação suficiente para uma explicação sobre os

procedimentos de combate, mas, antes é necessário que se aborde um procedimento de suma

importância para uma partida de Magic, e, crucial para os procedimentos de combate, que é o

conceito de “virar” uma carta. Por exemplo: como já vimos neste capítulo, no Magic,

praticamente todos os terrenos básicos têm uma habilidade que gera mana. Para extrair essa

mana os cards do tipo terreno devem ser “viradas” horizontalmente, ao fazer isso você terá

uma mana da cor correspondente ao terreno virado a sua disposição para ser utilizada.

Exemplo: se virar um terreno do tipo “Floresta” você terá a sua disposição uma mana da cor

verde, se virar um do tipo “Pântano” terá uma mana da cor preta. Outro uso importante do

“Virar” um card é a indicação que o card permanente está sendo utilizado. Conforme Tabak

,“Virar” um card

[...] é girá-lo horizontalmente. Você faz isso quando usa um terreno para

gerar mana, quando ataca com uma criatura, ou quando ativa uma habilidade [...].

Quando uma permanente é virada, isso geralmente significa que ela já foi usada

no turno. Você não poderá virá-la novamente até que ela tenha sido desvirada

(endireitada). No início de cada um dos seus turnos, você desvira seus cards virados

para poder usá-los novamente (TABAK, 2013, p. 9).

Vejamos na figura 6 ambos os procedimentos representados, vira um card para gerar

mana e para indicar que um card permanente foi usado:

Fonte: Tabak, (2013)

Sobre os procedimentos de combate, deve-se atentar para suas três fases: declaração

de ataque, de bloqueadores e de dano de combate. Veja na figura 7 uma representação das três

fases do procedimento de combate:

Figura 6 - Procedimento de virar um card

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Fonte: Tabak, (2013)

Conforme a primeira parte da figura 7, da esquerda para a direita, o jogador atacante

ataca com suas três maiores criaturas, perceba que elas estão viradas. Na segunda parte da

figura o jogador defensor (parte de baixo) declara os bloqueadores para dois dos atacantes e

deixa o terceiro livre. O jogador defensor deve decidi que cards serão usados para bloquear.

Finamente, na última parte da figura, o atacante que não foi bloqueado causa 3 pontos de dano

ao jogador defensor. Os atacantes bloqueados e os bloqueadores causam danos uns aos outros.

As criaturas com resistência menor morrem, as maiores vivem.

Para concluir essa exposição sobre o Magic, cabe esclarecer que não foi nosso objetivo

exaurir o tema, que neste caso careceria de muitas páginas além das que utilizamos aqui dada

a complexidade e volume de informações necessárias para sua elucidação, sendo nosso

objetivo tão somente informar os tópicos considerados essenciais para uma completa

explicação sobre o funcionamento do produto didático apresentado por essa dissertação.

Interessados em apreender mais sobre o Magic, inclusive, visando se tornar um jogador, deve

recorrer aos manuais de regras autorizados pela editora Devir.

Figura 7 - Procedimentos de combate

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3.1.2 Do Magic The: catering ao Combate Filosófico

Da mesma forma que no Magic, no Combate Filosófico, e agora em diante referido

por esta dissertação simplesmente pela sigla CF, os jogadores também integram um universo

específico construído para o jogo e desempenham nele um papel. Se no mundo imaginário do

Magic o jogador é um “Planwalker”, tipo de mago que faz parte da elite dos melhores magos

do Multiverso. No CF, os jogadores são “Pensadores”, grandes sábios que se enfrentam em

um conflito teórico para decidir quem tem a reputação mais sólida da história da Filosofia.

No Magic a moeda é a “Mana”, energia vital que alimenta as mágicas. No CF a

moeda é a “Reflexão”, atividade que oferece sustentação para os procedimentos teóricos

executados no jogo. O “Planwalker” invoca uma das cinco cores da Mana (Preta, azul,

amarela, verde e branca) de um dos cinco terrenos básicos existentes no jogo (Planície, Ilha,

Pântanos, Montanhas e Florestas) angariando, dessa forma os meios necessários para acessar

os recursos e executar os procedimentos no jogo, que são, dentre outros: invocar criaturas,

conjurar magias e etc.

O “Pensador” extrai Reflexão de uma das cinco área da Filosofia (Ética, Estética,

Epistemologia, Lógica e Metafísica) de um dos cinco períodos tradicionais da história da

Filosofia (Pré-socrático, Clássico, Medieval, Moderno e Contemporâneo), para acessar os

recursos e executar os procedimentos no CF, que podem ser: “Atrair” um filósofo para o

Campo de Batalha, inserir um Problema ou Período e etc.

No Magic, os jogadores iniciam o jogo com 20 pontos de vida (HP) e perdem quando

seus pontos de vida são reduzidos a zero. No CF da mesma forma os jogadores também

iniciam com pontos de reputação (RP) perdendo o jogo aquele que tiver sua reputação

reduzida à zero. A disputa no Combate filosófico é para decidir qual pensador tem a

reputação mais sólida história da Filosofia, sendo a consequência de a derrota ter o seu nome

apagado da história da Filosofia.

3.1.2.1 Os cards do Combate Filosófico após sua expansão

O Combate Filosófico, referido por esta dissertação doravante simplesmente como CF,

funciona com uma mecânica similar à do Magic, resguardadas as diferenças e adaptações. Por

exemplo: O CF conta com quatro tipos de card contra sete do Magic. No Magic temos o

feitiço, a mágica instantânea, o encantamento, o artefato, a criatura, o terreno e o

planeswalker. Já no CF temos: o filósofo e a filósofa, o problema, o período e as entidades.

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Na pratica esses quatro tipos de cards do CF simulam ou tem potencial para simular o

funcionamento de todos os card de Magic, com exceção do planeswalker, card que não tem

similar no CF.

Dizendo de outra forma, no CF não existe uma carta correspondente para cada carta do

Magic em questão numérica, como ocorre com os Períodos tradicionais, por exemplo, que são

similar aos terrenos em número, todavia, os quatro tipos de cards que compõe o CF pode

funcionar de forma similar aos cards do Magic, exceto o planeswalker.

3.1.2.1.1 Card do tipo filósofo e filósofa

Os card do tipo filósofo e filósofa18

são equivalentes às criaturas do Magic, card que

luta pelo jogador. No CF existem dois tipos de card de filósofo e filósofa: os permanentes e os

de ação instantânea. Os Permanentes ao entrar no Campo de Batalha não afetam o jogo

imediatamente, porém permanecem nele à disposição do jogador. As de ação instantânea são

na maioria das vezes (existem exceções) como um feitiço do Magic, o jogador o põe no

campo de batalha e segue as instruções que ele traz, em seguida ele vai para o seu cemitério.

Relembrando que o Cemitério é o monte de descarte do Magic. No CF o filósofo de ação

instantânea, após afetar o jogo vai para a “Caverna” monte de descarte do CF. Não confundir

Caverna no CF, com Cemitério no Magic. A caverna é um local compartilhado pelos

jogadores, pois no CF não existe Cemitério, os cards que já foram utilizados vão para a

Caverna, não importando a que jogador ela pertencia.

O que faz um card do tipo filósofo ser permanente ou de ação instantânea é a

quantidade de habilidades que ela possui. Essa é uma diferença significativa em relação à

criatura do Magic. Existem cards de filósofo que possuem três habilidades, card que possuem

duas e cards que possuem uma. A regra para defini-las como permanentes ou de ação

instantânea é a seguinte: filósofos com três habilidades são sempre permanentes, filósofos

com duas ou uma são sempre de ação instantânea. Os filósofos, quer sejam permanentes ou de

ação instantânea, só podem utilizar uma habilidade por turno, salvo se uma carta determinar o

contrário. Filósofos permanentes vão para a caverna um turno após utilizarem a sua terceira

habilidade.

18

Teoricamente cards de filósofos e de filósofas são equivalentes e entram na mesma categoria de card, mas na

prática eles se diferenciam, pois alguns cards do CF contam com habilidades que afetam de forma especifica

cards de filósofas, dentre outras peculiaridades de habilidades que poderão diferenciar os respectivos cards. Caso

não se trate de uma habilidade com tais características, se aplicam as mesmas regras para cards de filósofos e de

filósofa.

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Em suma, se o filósofo possui três habilidades, vai para a caverna quando tiver

utilizado as três, se possuir duas ou uma habilidade, afeta o jogo de uma única forma ao entrar

no campo de batalha e vai para a caverna quando sessarem os efeitos de sua habilidade. Os

cards de filósofo não têm poder e resistência como as criaturas do Magic, porém como elas ao

entratrem no campo de batalha não podem ser usadas, pois estão sob o efeito “confusão de

atração” similar a ao enjoo de invocação no Magic.

Os filósofos permanentes vêm com as habilidades numeradas, dessa forma cada vez

que uma habilidade é utilizada coloca-se sobre ela um dado com a numeração referente a

habilidade utilizada. Por exemplo: se foi utilizada a habilidade três de um card, coloca-se o

dado com o número três sobre ele, já se sabe que naquele turno ela não pode ser utilizada e

nem aquela habilidade até o card sair do jogo. Quando um card tiver sobre ele três dados

marcando, um, dois e três, no turno seguinte ao uso da última habilidade ele deverá ir para a

caverna.

Os filósofos não são descartados porque foram destruídos por um ataque superior à

sua resistência, como acontece com as criaturas, mas quando suas habilidades se esgotam.

Como já foi explicado, os filósofos não possuem “poder e resistência” como as criaturas. Para

utilizar os filósofos para bloquear ou atacar é preciso que eles possuam habilidades de ataque

ou de bloqueio. Tendo um custo de Reflexão para ambos. Inclusive, existe no CF, cards de

filósofos que não possuem habilidades de ataque ou de defesa, mas somente de efeitos.

Vejamos a seguir a figura 8 trazendo o verso dos cards do CF e visão geral de um card de

filósofo permanente:

Fonte: autoria própria.

Figura 8 – Verso dos cards e card de filósofo permanente

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Vejamos na figura 9 um card de filósofo de ação instantânea

Fonte: autoria própria.

Para encerrar este subtópico, vejamos na figura 9 um card de filósofa de ação

instantânea, cuja habilidade afeta somente filósofos:

Fonte: autoria própria.

Figura 9 - Card de filósofo de ação instantânea

Figura 10 - Card de filósofa

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80

3.1.2.1.2 Cards de Período: períodos tradicionais e períodos especiais

Os períodos “tradicionais” do CF são similares aos terrenos básicos do Magic. A cada

turno os jogadores podem inserir um período no campo de batalha, o oponente não pode

reagir a isso. Dos períodos o jogador deverá extrair “Reflexão” de uma das cinco áreas da

Filosofia para custear os procedimentos do jogo. A extração é obtida através do procedimento

de “virar a carta” horizontalmente como no Magic com os terrenos. O CF conta com cinco

períodos tradicionais: pré-socrático, clássico, medieval, moderno e contemporâneo,

igualmente o Magic com seus cinco terrenos básicos. Eles geram Reflexão de uma das cinco

áreas da Filosofia: ética, estética, epistemologia, metafísica e lógica, como o Magic com a

mana que pode ser de uma das cinco cores.

Agora vejamos algumas diferenças entre “terrenos” e “períodos”. Diferentemente dos

terrenos, que tem habilidade de gerar mana apenas de uma cor, os períodos, com exceção do

pré-socrático, oferecem ao jogador a opção de escolher, dentre Reflexão de áreas diversas, a

que prefere utilizar. Da mesma forma que no Magic com os terrenos, os períodos só geram

reflexão de uma área por turno, mas, com exceção do pré-socrático, eles oferecem ao jogador

em torno de três, no caso dos períodos clássico, medieval e moderno, e cinco opções, no caso

do Período Contemporâneo. Vejamos na figura 11 as partes de um card de Período

Tradicional:

Fonte: autoria própria.

Figura 11 - Partes de um período tradicional

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81

Vejamos na figura 12 os demais períodos tradicionais:

Fonte: autoria própria.

O CF conta ainda com outro tipo de card de período, trata-se do Período Especial. Os

períodos especiais seguem todas as determinações de uso dos Períodos tradicionais, tendo

somente duas exceções: em primeiro lugar, os Períodos tradicionais possuem outras

habilidades além da capacidade de gerar Reflexão, e em segundo lugar, alguns podem gerar

Reflexão de mais de uma área de forma simultânea. Vejamos um modelo de período especial

na figura 13:

Fonte: autoria própria.

Figura 12 - Períodos tradicionais

Figura 13 - Período especial

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Figura 14 - Card do tipo problema

3.1.2.1.3. Cards do tipo problema

O card do tipo Problema na maioria das vezes desempenha no jogo (CF) uma função

semelhante à do card “Mágica instantânea” do Magic, seguindo também suas regras de uso,

resguardadas as exceções. Por exemplo, como a “mágica instantânea”, quando um card do

tipo problema é inserido no campo de batalha suas determinações devem ser seguidas e após

isso o card ser enviado para o local de descarte, no CF a Caverna. Sobre as diferenças entre os

cards, diferente da “Mágica instantânea” do Magic, no CF os competidores podem inserir um

card do tipo problema no campo de batalha livremente, já que eles não têm “custo de

reflexão”. Da mesma forma, diversamente do card “mágica instantânea” do Magic, os

problemas só podem ser inseridos no turno do adversário se for para responder a inserção de

outro problema. O problema tem uma habilidade que o permite gerar Reflexão Especial, nome

da habilidade dos problemas. Vejamos na figura 14 um card do tipo problema:

Fonte: autoria própria.

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83

3.1.2.1.4 A Entidade e a Ficha

A entidade afeta o jogo como um filósofo de ação instantânea, com uma exceção: a

Entidade é banida do jogo assim que o afeta, só retornando se “Invocada” nominalmente por

outro card. A “Invocação” é uma modalidade de inserção de cards no campo de batalha

exclusiva do card de Entidade. A Invocação pode ser nominal, quando um card solicita a

entrada da Entidade no Campo de Batalha (pode ser um card de filósofo ou de período

especial) ou pagando-se o seu Custo de Reflexão. As Entidades são banidas do jogo após o

afetarem, podendo retornar em caso de uma invocação nominal. Confira na figura abaixo um

card de Entidade:

Fonte: autoria própria.

Os cards do tipo Ficha são equivalentes aos do tipo “Entidade” para todos os efeitos,

eles recebem essa nomenclatura diferente para pontuar sua posição no Jogo como cards

especiais devido à natureza dos personagens que eles representam, pois não são filósofos ou

entidades. Confira na figura 16 os dois cards de Ficha que integram o jogo:

Figura 15 - Card de entidade

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Fonte: autoria própria.

Em suma, este tópico apresentou os tipos de cards do Combate Filosófico após sua

expansão para se adequar as exigências da lei 10.639 e ser usado como material didático para

ajudar professores de Filosofia a levar para o contexto de suas aulas temas exigidos pela lei

10639 para uma educação filosófica para as relações étnico-raciais. Com a expansão o card

game ganhou mais dois tipos de cards, Entidade e Ficha, e teve uma nova modalidade de card

de filósofo, sendo o card de “filósofa”. Com o novo formato os cards do Combate Filosófico

ganharam um layout profissional, ilustração ou fotografia e uma divisão por cores: cards de

filósofo permanente ficaram com fundo roxo escuro, de ação instantânea azul, de entidade e

ficha verde, de problema vermelho e de período tradicional vermelho e de período especial

cinza. Lembrando que o jogo foi ampliado com novos cards, todavia, conservou a maioria dos

card da primeira versão, que representavam os clássicos da tradição filosófica ocidental.

Confira alguns destes cards na figura 17:

Figura 16 - Fichas

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Fonte: autoria própria.

3.1.2.1.4. Como se joga Combate Filosófico?

Conhecidos os cards do Combate Filosófico já podemos nos inteirar sobre alguns

procedimentos e informações necessárias para jogarmos uma partida de Combate Filosófico.

Falaremos primeiro sobre os locais do jogo e em seguida sobre os procedimentos de combate

básicos. Relembrando, as zonas do Magic são: Grimório, Mão, Pilha, Campo de Batalha,

Cemitério e Exilio. As zonas do CF são similares ás do Magic, com duas exceções: o local de

descarte de cards (cemitério) e a pilha (local do jogo onde as mágicas ganham vida). A pilha

não tem uma Zona similar no CF, tendo em vista que as características das habilidades de

efeito dos cards do CF, diferente de algumas “mágicas do Magic”, como regra geral, afetam o

jogo de forma imediata (conferir tipo de habilidades do CF no Manual de Regras nos anexos).

O cemitério enquanto local de descarte de cards individual também não tem similar no CF,

que conta com uma zona de descarte de cards que é compartilhada pelos jogadores chamada

de Caverna. No mais, o CF conta com o Deck ou monte de compra, nome dado a coleção de

cards de um jogador. No Magic se chama Grimório, no CF “Arsenal de Conceitos”. As

demais zonas do Magic existem no CF de forma similar ao Magic, sendo: a Mão, para onde

Figura 17 - cards clássicos do Combate Filosófico com o novo layout

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vão os cards que você compra, isto é, retira do Grimório (monte de compra) a cada turno, no

CF “Arsenal de Conceitos”; o Campo de Batalha, local da mesa onde o duelo acontece e

ficam os cards permanentes como períodos e filósofos no CF, terrenos e criaturas no Magic;

os exílios, para onde são enviados os cards que são expulsos do campo de batalha.

Fonte: autoria própria.

Na figura 18 temos um ambiente do CF preparado para uma partida de combate

filosófico. Mas como esse ambiente foi construído? Perceba que de em ambos os lados da

figura temos a ilustração de um deck, esse é o monte de compra dos jogadores, de onde viram

os cards para formar sua Mão. A cada turno, que é o momento do jogo em que um jogador

executa procedimentos, ele pode comprar um card tirando-o do seu arsenal de conceitos

Figura 18 - Zonas do Combate Filosófico

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(deck) e colocá-lo em sua Mão, seu pequeno arsenal “pronto emprego”. Da Mão os cards

precisam ser colocados no Campo de Batalha o mais rápido possível.

No que diz respeito aos procedimentos de combate, existem diferenças significativas

entre o Magic e o CF. Diferentemente do Magic, em que os “cards” do tipo criatura como

regra tem “poder e resistência”, podendo, portanto, atacar e bloquear conforme a decisão de

seu controlador, o card de “filósofo”, como já vimos anteriormente, só atacam ou bloqueia se

possuirem habilidades de ataque ou de defesa. Desta forma, um jogador ao ser atacado,

mesmo tendo cards de filósofo no campo de batalha pode não ter como revidar o ataque ou

bloqueá-lo. Caso um jogador seja atacado e tenha no campo de batalhas cards com

habilidades para contra-atacar e decida faze-lo, estará dando seguimento a um procedimento

do CF chamado “Duelo”. O Duelo se inicia com a declaração de atacante, isto é, quando um

jogador informa ao seu oponente que irá ataca-lo, diz o nome da habilidade que irá utilizar ,

põe o dado sobre a carta com o seu respectivo número e passa o turno.

A dinâmica do duelo é a seguinte: digamos que o Pensador “X” decida atacar seu

oponente, o Pensador “Y”, com a habilidade de nº 2 do card Platão. Nesse caso ele precisa

virar períodos para pagar o “custo de reflexão” da habilidade, em seguida virar o card e por

sobre ele o dado com o número da habilidade que vai usar. Feito isso, é só passar o turno e

estará desferindo um ataque de -7 com a habilidade “Pelotão de choque da República” do card

Platão. O Pensador “Y” precisa decidir, se, e como vai responder ao ataque. Mas, ele não

precisa fazer isso assim que receber o turno, poderá comprar um card, inserir um período ou

problema, atrair um filósofo e etc., proceder com as fazes de um turno normalmente (ver as

fazers de um turno no manual de regras em anexo), isso porque os ataques no CF não causam

danos de forma imediata, mas somente quando o jogador atacado passa o turno. Mas o que

acontece se ao invés de receber o dano o Pensador Y decidisse contra-atacar com uma

habilidade de maior capacidade? Se ele por exemplo, recorresse a habilidade número três do

card Aristóteles, “Chuva de conceitos da metafísica”, que causa – 12 de dano na reputação?

Neste caso o maior ataque suplantaria o menor e seguiria com o devido desconto para o

pensador X, que teria de lidar com um contra-ataque de -10 e o duelo seguiria. Observe na

figura 19 um esquema explicativo de uma partida de CF com uma demonstração de duelo

com ataque e contra-ataque, como acabamos de descrever.

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Fonte: autoria própria.

Como ficou bem nítido na figura 19, o pensador X teve seu ataque suprimido pelo

ataque maior e agora está em perigo, pois, segundo as regras do duelo (mais informações

sobre o duelo no manual de Regras em anexo) o card usado para atacar não pode ser

desvirado até o fim do duelo. No caso, o card Platão não pode ser utilizado até o duelo

terminar e o pensador X está recebendo um contra-ataque de -10. Perceba na figura 19, que

Platão não é o único card de filósofo que o Pensador X possui no campo de batalha, ele pode

contar com mais dois cards com habilidades de ataque, Immanuel Kant e Marilena Chauí. E

como seus períodos poderão ser desvirados para serem utilizados novamente, ele poderá

responder ao ataque de -10 e dar sequência ao duelo, que só terminará quando um dos

jogadores receber danos em sua reputação, desviar o ataque ou anulá-lo com um ataque de

mesma capacidade.

3.1.2.2 A metodologia utilizada para a expansão do Combate Filosófico.

Como vimos no capítulo 2, a Filosofia afroperspectivista foi a principal referência

teórica para a expansão do CF. Temos chamado as mudanças de expansão porque a estrutura

do jogo permaneceu a mesma do início da pesquisa, que esteve totalmente focada na

Figura 19 - Duelo, ataque e contra-ataque

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ampliação da história da Filosofia com a inserção de parte da produção filosófica africana,

afrodiaspóricas e afro-brasileira. Essa ampliação na prática resultou na inserção no jogo de

novos cards de Período especial, problema, filósofo, criação dos cards de filósofa, de entidade

e de ficha. No que se refere aos textos dos novos cards foi utilizada a mesma metodologia da

versão antiga, em que se recorreu aos conceitos e informações pertinentes da biografia de um

filósofo e a relação deles com seus pares ou período da história da Filosofia para a construção

das habilidades, que na maioria das vezes assumiu o formato de uma técnica secreta de

personagens de animes. Exemplo: a habilidade número três do card Platão no jogo se chama

“Prisão suprassensível” tem relação com sua teoria do mundo das ideias ou das formas,

impacta o jogo enviando um card de filósofo do adversário para o mundo das ideias; a

habilidade de número um do card Abdias do Nascimento se chama “Espada do

Quilombismo”, inspirado em seu conceito de quilombismo, impacta o jogo desferindo um

ataque de -10 na “reputação do adversário”, nome dos pontos de vida no Combate Filosófico.

A pesquisa bibliográfica foi à metodologia dotada na busca por referências para

fundamentar as mudanças que o jogo sofreu no que se refere ao objetivo da pesquisa, que foi

de reconfigurar o jogo visando sua utilização como material didático para ajudar professores

de Filosofia a levar para o contexto de suas aulas temas que atendam às exigências da lei

10.639 para uma educação filosófica para as relações étnico-raciais. Neste sentido, os novos

cards, bem como a modificação dos antigos se inspirou em nomes, período históricos,

conceitos e movimentos filosóficos relacionados a Filosofia afroperspectivista conforme a

construção teórica do professor Renato Noguera (2014) no livro “Ensino de Filosofia e a lei

10.639”, e também em obras de sua autoria que direta ou indiretamente tratam do assunto,

sendo elas, além do livro já mencionado: o capítulo, “Sambando para não sambar,

afroperspectivas filosóficas sobre musicidade do samba e a origem da Filosofia” no livro

“Sambo, logo penso” organizado por Wallace Lopes; o artigo “A ética da serenidade: O

caminho da barca e a medida da balança na Filosofia de Amen-em-ope”; o artigo

“Denegrindo a educação: um ensaio filosófico para uma pedagogia da pluriversalidade”; o

artigo “Zumbi como personagem conceitual e a favela como heterotopia: fronteiras entre a

literatura de Agualusa e as Filosofias de Foucault e Deleuze”.

Para a construção do layout dos cards foi utilizado o programa Magic set Editor versão

1.0 em português criado por Twan Van baixado gratuitamente na página https://magic-set-

editor.br.uptodown.com/windows/download. O Magic set Editor oferece suporte para criação

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de cards nos estilos do Magic e Yu-gi-oh19

, podendo ser baixado por computadores que

utilizam sistema operacional Windows XP ou superior. Confira na figura 19 as opções de

layouts que o editor de cartas oferece:

Fonte: Editor -Disponível em: https://magic-set-editor.br.uptodown.com/windows/download.

As ilustrações e fotos dos cards foram extraídos da internet, com exceção das

ilustrações dos períodos tradicionais, do período especial “Manifesto Antropofágico” e da

ilustração do verso das cartas (logo do jogo), que foram criadas pelo ilustrador Ricardo Brasil

em parceria com a ilustradora Renata Brasil. Outros cards com ilustrações não extraídas da

internet são: Immanuel Kant, Pitah-Hotep, Anaxímenes, filósofos de Frankfurt e Guilherme

de Okham. Ilustrações criadas pelo ilustrador Allan Silva. As cartas foram impressas em uma

gráfica em papel cartão.

3.2 METODOLOGIA PARA TESTAR O PRODUTO DIDÁTICO

Para testar o produto didático adotou-se a metodologia de pesquisa qualitativa

conhecida como grupo focal. Foram considerados os princípios da pesquisa qualitativa

enquanto método que se caracteriza por uma abordagem subjetiva do objeto de pesquisa.

Conforme Claudia Augusto Dias (2000) diferente da pesquisa quantitativa, que usa números

para testar construtos científicos e hipóteses, a pesquisa qualitativa se caracteriza justamente

pela ausência de medidas numéricas e analises estatísticas, pautando sua análise em aspectos

19

Card game de estratégia que utiliza uma mecânica similar à do Magic.

Figura 20 - Opções de layout de card oferecido pelo Magic set

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91

que estão muito além dos números e estatísticas, que dize respeito a subjetividade do objeto

que está sendo estudado. Para P. Liebscher Apud Dias, “[...] para aprender métodos

qualitativos é preciso aprender a observar, registrar e analisar interações reais entre

pessoas, e entre pessoas e sistemas” (DIAS, 2000, p. 01).

De acordo com Dias (2000) a pesquisa qualitativa costuma utilizar métodos menos

estruturados em relação à pesquisa quantitativa, mas em contrapartida, por lidar com a

subjetividade, dispõe de uma análise a partir de informações mais amplas e detalhadas do que

o método qualitativo. A partir de Calder, Dias (2000) aponta três diferentes abordagens

presente na pesquisa qualitativa: exploratória, fenomenológica e clínica. Sobre cada uma delas

Dias (2000, p. 2) informa que

[...] a abordagem exploratória ocorre em duas situações distintas: quando o

pesquisador está interessado em testar aspectos operacionais de uma pesquisa

quantitativa, como por exemplo, o teste-piloto de um questionário; ou quando seu

objetivo é estimular o próprio pensamento científico, por meio da concepção mais

aprofundada de um problema e da geração de novas ideias ou hipóteses a serem

testadas em pesquisas futuras. [A abordagem fenomenológica] [...] tem como

propósito “transferir” o pesquisador para o ambiente que lhe é pouco ou nada

familiar, fazendo com que experimente as mesmas sensações, problemas,

necessidades e satisfações da população pesquisada. [A abordagem clínica] [...]

objetiva trazer à tona sensações e sentimentos que não poderiam ser facilmente

percebidos por meio de métodos de pesquisa estruturados. Na verdade, lida com

informações veladas, por vezes inconscientes e inacessíveis nos relacionamentos

interpessoais, constituindo-se em uma boa ferramenta na obtenção de informações

úteis para o julgamento clínico de um profissional especializado.

Segundo Dias (2000) o grupo focal se encontra entre as técnicas mais utilizadas em

abordagens qualificativas e tem se tornado popular entre pesquisadores das áreas mais

diversas. De acordo a definição de Coplan apud Dias (2000, p.3), grupos focais são “[...]

pequenos grupos de pessoas reunidos para avaliar conceitos ou identificar problemas [...]”.

Para Dias, (idem, p. 3):

[...] o objetivo central do grupo focal é identificar percepções, sentimentos, atitudes

e idéias dos participantes a respeito de um determinado assunto, produto20

ou

atividade. Seus objetivos específicos variam de acordo com a abordagem de

pesquisa. Em pesquisas exploratórias, seu propósito é gerar novas idéias [sic]ou

hipóteses e estimular o pensamento do pesquisador, enquanto que, em pesquisas

fenomenológicas ou de orientação, é aprender como os participantes interpretam a

realidade, seus conhecimentos e experiências. No caso de pesquisas clínicas, há uma

modalidade de grupo focal, conhecida como entrevista de grupo focal em

profundidade (in-depth focus group interview), cujo objetivo é identificar

informações mais profundas do que as que se encontram acessíveis nos

relacionamentos interpessoais.

No que diz respeito a utilização da metodologia de grupo focal na educação, para

Sandra Regina Gomes (2011) ainda se trata de um método em construção, mas que, já é aceito

20

Grifo nosso.

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por muitos como um método de pesquisa educacional por tratar-se de uma ação planejada,

com base num quadro de procedimentos previamente conhecidos que pode eventualmente

comportar outras estratégias de pesquisa. Segundo Alberto Albuquerque Gomes (2011, p. 6):

[...]nas investigações em educação, as entrevistas de grupo focal oferecem [...] a

oportunidade de armazenar dados qualitativos relativos às percepções e opiniões de

indivíduos selecionados. Se aplicadas adequadamente, o investigador poderá captar

informações preciosas sobre os pensamentos e sentimentos dos participantes, em

tempo relativamente curto.

3.2.1 Aplicação da metodologia de grupo focal para testar o produto didático

O teste do jogo Combate Filosófico foi realizado no Colégio estadual Doutor Alfredo

Backer, Unidade Escolar onde o pesquisador é lotado. A turma escolhida foi a 2003, turma da

segunda série do ensino médio segundo a avaliação da escola de baixo rendimento e

indisciplinada. O critério de escolha da turma foi a proximidade entre o conteúdo regulado

para turmas da segunda série do ensino médio regular da rede estadual, se tratando da teoria

do conhecimento, e a proposta da pesquisa, que consiste em testar o card game Combate

Filosófico como um organizador prévio comparativo a fim de que os estudantes aprendam de

forma significativa que a história da Filosofia no ocidente, dentre outras formas de ver a

realidade filosófica, consiste em um combate teórico em torno de problemas que dizem

respeito unicamente a parte ocidental do globo e que portanto, apresenta uma história parcial

da Filosofia. Neste sentido, consideramos que as disputas teóricas em torno das teses sobre o

conhecimento, bem como o “silenciamento”21

dessas discussões sobre a produção filosófica

não ocidental, se encaixariam melhor com a natureza do produto didático.

O grupo focal foi escolhido como metodologia, em primeiro lugar, por ser

tradicionalmente utilizado para testar novos produtos (DIAS, 2000, p. 3), o que possibilitou

um alinhamento entre a natureza do grupo focal enquanto metodologia de pesquisa qualitativa

e a proposta da dissertação. Conforme Coplan Apup Dias (2000), o objetivo central do grupo

focal é identificar percepções, sentimentos, atitudes e ideias dos participantes a respeito de um

determinado assunto, produto ou atividade. Em nosso caso trata-se de um produto (o card

game Combate Filosófico), pois, produto didático também é produto. E o que a pesquisa quer

descobrir tem relação com “atitudes e ideias”, sendo: se os estudantes após o contato com o

produto educacional (Combate Filosófico) foram capazes de aprender de forma significativa

21

Grandes nomes da teoria do conhecimento como kant e Hume adotaram posturas racistas e afirmaram a

incapacidade dos povos africanos de produzir qualquer conhecimento considerado sofisticado de acordo com os

critérios ocidentais (Kant, 1993, p. 75-76).

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93

fazendo a relação entre a “ideia” de combate que eles já têm previamente, com a ideia de

Combate teórico e filosófico apresentada pelo jogo. Neste sentido, como já vimos ao

comentar o papel dos organizadores prévios, a referida relação depende da “atitude” do

aprendiz.

O segundo motivo para a escolha do grupo focal se refere ao tempo que ele possibilita

que o pesquisador economize na coleta de dados. Segundo Alberto Albuquerque Gomes

(2011) quando a metodologia é aplicada de forma adequada as informações coletadas no

grupo Focal podem ser reunidas em um curto espaço de tempo. Esse elemento foi

determinante para a escolha da metodologia, tendo em vista que o fator tempo representou

uma considerável dificuldade para a pesquisa.

Finalmente, a opção pelo grupo focal se deveu a possibilidade que a metodologia

oferece de se combinar com outras metodologias. Gomes destaca que “uma das vantagens da

adoção da entrevista de grupo focal como técnica principal para coleta de dados é a

possibilidade de usá-la isoladamente ou combinada com outras técnicas” (GOMES, 2011, p.

9).

3.2.2. Detalhamento das etapas da aplicação da metodologia

Conforme Gomes (2011) a formação de um grupo focal se inicia com a formulação do

problema e a definição de critérios para a formação do grupo. Sobre o segundo ponto

adotamos como critério para ter experiência com card game de estratégia. Mas, devido à

ausência da referida característica pré-determinada optou-se pela escolha aleatória dos

participantes, procedimento defendido por Gomes ( 2011, p. 11) para esses casos, tendo em

vista que,

[...]a definição de uma amostra aleatória extraída de um grupo deve considerar, na

seleção dos membros, características predeterminadas. Se houver um grande

conjunto de indivíduos que possua essas características, é possível fazer a seleção

aleatória dos participantes daquele grupo.

Desta forma, seis alunos foram selecionados aleatoriamente formando um grupo

bastante heterogêneo de quatro rapazes e duas moças com idades entre 15 e 17 anos. A

segunda providencia a ser tomada após a seleção dos participantes foi criar um grupo de

WhatsApp para troca de informações, recados e para que os alunos se expressassem sobre sua

experiência com o jogo.

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94

Fonte: autoria própria.

Como já vimos anteriormente, a metodologia de coleta de dados do tipo grupo focal

oferece aos pesquisadores a possibilidade de combinar técnicas metodologias de pesquisa

diversas, não obstante isso, a técnica de coleta de dados para pesquisa combinando grupo

focal e aplicativos de mídias sociais não são uma prática muito comum em pesquisas

qualitativas, isso fica evidente quando se busca por informações da referida combinação

metodológica em portais de pesquisa acadêmica como o Google Acadêmico e Scielo. No

entanto, existem experiências bem-sucedidas da referida combinação, inclusive com uso de

WhatsApp já publicadas. Como por exemplo, a experiência relatada no XII Simpósio de

Excelência em Gestão em Técnologia referente a metodologia utilizada na avaliação

institucional da Universidade do Grande Rio (UNIGRANRIO):

Este texto trata da experiência de uma universidade privada do Estado do Rio

de Janeiro na avaliação institucional através de abordagem metodológica e

instrumental diferenciada na busca da qualidade da gestão. Tem como objetivo

demonstrar como a combinação de Tecnologias da Informação e de

Comunicação (TIC) com técnicas presenciais de abordagem podem

incrementar o processo de avaliação institucional dando-lhe mais alcance,

transparência e credibilidade (ARANA et al, 2015, p. 3).

Conforme Arana et. al. (2015) os canais que tiveram mais destaque na experiência que

combinou mídias sociais e grupo focal na coleta de dados para proceder a avaliação

institucional da UNIGRANRIO foram o site da faculdade, o blog, o e-mail, o Marketing e o

WahatsApp. O papel do WahatsApp no processo foi

[...]proporcionar a devolutiva imediata frente a alguma demanda mais urgente da

comunidade, bem como [...] para manter a mobilização dos membros da Comissão

(alunos, professores, funcionários e representantes externos) por meio de um grupo

específico criado no aplicativo (ARIANA et. al., 2015, p. 9).

Figura 21: Print do grupo de watt zap para discutir questões do jogo

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Para Arana et. al. (2015) devido à combinação da técnica de grupo focal com o uso de

mídias sociais no processo de avaliação institucional houve um significativo aumento da

participação dos alunos em relação ao ano anterior, processo que ocorreu sem prejuízo da

qualidade metodológica de ambas as técnicas. Segundo Arana et. al. (2015, p. 11):

[...] as dimensões “virtual” e “presencial” da avaliação [...] [se deram através

da utilização de] instrumentos e roteiros de entrevista com enfoque nos cursos

– o currículo, as práticas pedagógicas – e a unidade em que este se realizava –

a estrutura física e a comunicação interna, dos quais os alunos deveriam

apresentar pontos fortes e pontos fracos, contemplando assim várias dimensões

avaliativas propostas [...] sem, contudo, esgotá-las.

Em nossa pesquisa o WahatsApp foi utilizado como método auxiliar de coleta de

dados, além de mural de avisos e canal para a entrega de documentos e informações referentes

as reuniões do grupo. Dessa forma buscou-se com o uso do aplicativo viabilizar certas

exigências metodológicas ligadas a aplicação da técnica do grupo focal, como por exemplo, a

necessidade de gravação das falas, que não se faz necessária em um grupo virtual, além de

suprir deficiências dos encontros físicos em relação as dificuldades que o formato adotado

(teste de produto didático mais conversa sobre as regras do jogo) ofereceu no que se refere a

oportunidade de os sujeitos de pesquisa se expressarem sua experiência com o produto

didático.

No decorrer da pesquisa, principalmente nas reuniões para testar o produto didático,

também foram utilizados técnicas de pesquisa-ação e pesquisa-ação participante nos termos

de Thiollent, autor que a vê a pesquisa-ação como uma

[...] metodologia de observação [...] na qual os pesquisadores estabelecem relações

comunicativas com pessoas ou grupos da situação investigada com o intuito de

serem melhor aceitos. Nesse caso, a participação é sobretudo participação dos

pesquisadores e consiste em aparente identificação com os valores e os

comportamentos que são necessários para a sua aceitação pelo grupo considerado.

(THIOLLENT, 2003, p.14).

3.2.2.2 Reuniões para testar o produto didático

As reuniões para testar o produto ocorreram na unidade escolar e contou com a

presença do pesquisador e dos 6 alunos da turma 2003 selecionados para participar da

pesquisa. O grupo se reuniu em três ocasiões, duas no pátio da Unidade Escola e uma na sala

de aula. Para que houvesse a primeira reunião foi necessário solicitar que um colega da

unidade liberasse os alunos envolvidos com a pesquisa de sua aula, tal encontro se deu dia no

dia 16 de outubro de 2019 a partir das 14 horas e 30 minutos e terminou exatamente às 16

horas e 20 minutos, horário que marcou o fim dos tempos de aula do colega que cedeu os

alunos para o teste.

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96

A segunda reunião, também realizada no pátio da Unidade Escolar se deu no dia 22 de

outubro a partir das 14 horas e 35 minutos, se aproveitando de um horário vago no quadro de

horários da unidade escolar. A reunião se estendeu até às 16 horas e 20 minutos. O último

encontro ocorreu no dia 28 de outubro na aula de Filosofia sob a regência do professor e

pesquisador com início às 13 horas e zero minuto e termino às 14 horas e 15 minutos. Todas

as partidas foram gravadas e ocorreram sob a mediação do pesquisador, com exceção da

última que por ter acontecido durante uma aula de Filosofia, não contou com mediação direta

do pesquisador.

Em cada encontro, com exceção do primeiro que envolveu além do teste uma

exposição sobre as regras do jogo, houve partidas para testar o produto didático. Para as

partidas os alunos foram divididos em duas equipes, cada uma com três integrantes. Cada

equipe iniciou o jogo com um total de 12 cards em sua “Mão”. Esses cards foram distribuídos

entre os integrantes do grupo. Foi a primeira vez que o card game funcionou com o formato

de 12 card no início da partida, estratégia utilizada para agilizar as jogadas e diminuir o tempo

das partidas. Os materiais usados em cada teste foram: um deck de Combate Filosófico, 12

dados comuns, um telefone para marcar o tempo das jogadas por meio de um aplicativo com

relógio para cronometrar partidas de xadrez (quando um lado é ativado o outro desliga).

A primeira reunião, levando em conta a explicação do pesquisador sobre as regras do

jogo e a apresentação das cartas durou uma hora, 26 minutos e 50 segundos. A segunda durou

uma hora, 6 minutos e 35 segundos. A terceira durou 58 minutos e 22 segundos. Fazendo um

balanço das reuniões de teste, pode-se dizer que a primeira reunião consistiu em uma palestra

para apresentar o jogo, mas que houve tempo para uma partida de teste. A segunda reunião

serviu basicamente para relembrar os fundamentos do jogo aprendidos na primeira, e a

terceira foi de fato o grande teste das equipes. Somente na terceira reunião de teste as equipes

jogaram com uma razoável independência em relação as orientações do pesquisador.

Durante as reuniões de teste, o pesquisador atuou como mediador tirando dúvidas

sobre as regras (os sujeitos de pesquisa não leram o manual de regras), sugerindo jogadas para

incentivar uma maior interação com o produto didático (primeira e segunda reunião de teste),

medindo o tempo de duração da pesquisa e mediando conflitos ligados ao funcionamento do

jogo. Neste sentido o pesquisador adotou a dupla função “de observador crítico e participante

ativo” (GORI, 2006, p. 116), comuns em metodologias de pesquisa-ação e pesquisa-ação

participante.

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97

3.3 ANÁLISES DA PERCEPÇÃO DOS ALUNOS SOBRE O PRODUTO DIDÁTICO

Conforme Alberto Albuquerque Gomes (2011), embora não exista um modelo

acabado para a análise de dados, os que são obtidos por meio de grupo focal devem ser

analisados segundo certos critérios. Esses critérios segundo Gomes (2011) incluem: o uso

repetido de palavras, o contexto em que as informações foram coletadas, os pontos de

concordância dos participantes, opiniões que resultaram de pressão de outros debatedores,

respostas que decorrem de experiências pessoais em detrimento de respostas vagas, ideias

importantes, comportamentos, gestos, reações, sentimentos, valores, pré-conceitos,

dificuldades de compreensão das perguntas, entusiasmo, dificuldades e aproveitamento dos

espaços de liberdade.

Os critérios em questão serão utilizados por esta análise à medida que forem

consideradas eficazes ante os propósitos da pesquisa, que é: a avaliação do jogo como produto

didático para ajudar professores de Filosofia a levar para o contexto de suas aulas conteúdos

exigidos pela lei 10.639 e o uso do jogo dentro da perspectiva da aprendizagem significativa

como um organizador prévio comparativo. Neste sentido, visando abordar ambos os objetivos

e aplicar da melhor forma os critérios para análise de dados listados por Gomes (2011)

pretendemos nesta análise expor o relato de experiência de cada jogador fornecida no grupo

do wahtsapp, comparar as opiniões sobre o jogo aplicando alguns princípios para análise de

dados na perspectiva do grupo focal conforme a lista de Gomes (2011) e por fim analisar as

falas em bisca de indícios da aprendizagem significativa e diagnósticos da avaliação do jogo.

Para expor a opinião dos participantes preservando o anonimato optarmos por identifica-los

por números, conforme a ordem que cada um forneceu suas impressões sobre o jogo no

grupo.

Sujeito de pesquisa número 1:

Em relação ao jogo o número de cartas e tipos é bastante elevado sendo muito

variado isso acaba sendo um pouco confuso e fica difícil de tirar 100% do seu leque

ainda mais sendo novato no jogo, fazendo então que cartas como problemas e

invocações serem deixadas de lado. Em minha opinião um leque com um número

de cartas limitado logo no início faz que seu jogador busque o 100% das suas

cartas dando importância é tirando o máximo de aproveitamentos mas isso não seria

limitado os jogadores poderiam de alguma forma "comprar" um máximo de por

exemplo uma carta aleatória por turno. Enfim estou enfatizando que as habilidades

e os filósofos em si tiram seu foco das outras cartas e elas acabam sendo deixadas de

lado.

Sujeito de pesquisa número 2:

minha experiência com o jogo foi boa, porém senti falta da "pancadaria" na minha

opinião ficou um jogo muito dialético, oque não é ruim, afinal de contas desenvolve

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a criatividade, porém eu acho que tinha que ter algo mais cativando no jogo que

fizesse ele ser tanto um jogo casual quanto um jogo competitivo, como um sistemas

de modo de jogo, tipo, "partida rápida" onde cada jogador começa com 10 cartas e

só pode comprar no 3° turno do jogo, e outro modo como, "partida casual" onde tem

as regras padrões presentes atualmente no jogo, e o outro modo "competição

dialética" onde cada jogador pronto pra dialogar incessantemente joga em um modo

ultra focado onde somente o que tiver melhor os seus conceitos levara a vitória, seria

um modo de jogo muito mais demorado é claro, onde cada jogador começa com 50

pontos de integridade tem seu inicio de jogo com 16 cartas e pode colocar no 1°

turno, e somente neste, 5 períodos, porem não pode colocar nenhum problema ou

carta de ação rápida nem período especial, sendo assim um jogo muito massante

porém bem dialético exceto se seu oponente for uma tabula rasa.

Sujeito de pesquisa número 3:

Minha experiência com o jogo foi boa mas assim como um dos outros jogadores,

achei que começa com muitas cartas e dificulta na hora de agir, e além de tudo

demora a terminar o jogo, mesmo sendo c o tempo contado se torna difícil de

executar algumas outras cartas, como “entidade” e alguns problemas também

Achei legal, mas difícil de entender

Pra jogar ele só lendo o manual e entendendo

Sujeito de pesquisa número 4:

O jogo em é bom mas poderia melhorar,ele pode ser mais rapido, o que atrapalha e

so poder colocar um período por turno, então demora muito pra colocar um filósofo

no campo de batalha, se fosse 2 períodos por turno iria ficar melhor, Mais o jogo é

bom na minha opinião eu gostei do jogo

E não é tão difícil de se jogar vc so tem que entende o jogo e como funciona

Sujeito de pesquisa número 5:

Minha experiencia com o jogo foi boa , porem meio conturbada pois o jogo e de

pensamento rapido e estrategico e eu não costumo pensar muito , e alem disso não

consigo ser ativo em jogo com 3 ou mas pessoas , gostei muito das cartas pois tem

algumas imagens que são recentes e facil de entender oque a imagen quer passa por

mas que pra min seja dificil montar uma estrategia gostei muito dos poderes das

cartas .

Sujeito de pesquisa número 6:

Minha experiência com o jogo "combate filosofico" foi boa, não perfeita, pois tem

uns pontos em que eu não achei perfeito. Como as cartas, o fato de poder ter

"infinitas" cartas em jogo acaba deixando o jogo confuso, pois com muitas cartas em

jogo você acaba pensando pensando e não fazendo nada. Porém mesmo com

infinitas cartas Em jogo eu achei excelente o poder de limitação, como cartas que

banem filósofos para a caverna, ou que deixa seu filosofo pensando numa solução

para um problema de outro filosofo, mas com isso tem as cartas que podem resgatar

os filósofos das cavernas e tira eles de problemas. E outro lado com muitas cartas

em jogo você não fica limitado a 4 cartas e 1 ou 2 combos, isso é muito bom!

As cartas são muito bem feitas, cada uma com 3 poderes explicados e que tem

ligação direta com o filósofo, tirando as de ações rápidas que são as mais filha da...

São as mais chatas né kk

Dentre outras...

E é impossível jogar esse jogo sem ter pelo menos 3 neurônios, e isso é perfeito. Pq

você não vence o jogo apenas jogando cartas fortes.

Já em aula, eu achei que acrescentou muito em assuntos que vimos e não vimos esse

ano.

Essa é a minha opinião é essa é minha carta

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Estes foram os relatos de cada participante sobre sua experiência com o jogo deixadas

no grupo do WahtsApp. Antes de compararmos as falas, precisamos fazer alguns

apontamentos. Em primeiro lugar, as falas dos sujeitos de pesquisa após o sujeito de pesquisa

número 2 aconteceram depois que o pesquisador lançou ao grupo algumas perguntas:

Vamos lá pessoal, ainda faltam alguns relatos. Quem já escreveu pode escrever

novamente ou acrescentar algo. Digam como foi a experiência de vocês com o teste

do jogo Combate Filosófico. Foi boa? Ruim? Muito rápida? Jogo chato? Legal?

Difícil? Muito difícil? Teve a ver com as aulas? Não teve? O jogo n faz o seu tipo?

Te cativou? O que ficou de bom?

Em segundo lugar, o mediador fez outras perguntas ao grupo, que até o fim da escrita

desta dissertação só haviam sido respondidas pelos sujeitos de pesquisa 3 e 4. Vejamos a

seguir as perguntas e como foram as respostas:

Pergunta do pesquisador: “a falta de leirura do manual na opinião de vocês fez muita

diferença?”.

Resposta do sujeito de pesquisa número 4: “fez um pouco pq a gente tinha q parar pra

perguntar como a gente usava as cartas”.

Resposta do sujeito de pesquisa número 3: “sim, fez bastante”.

3.3.1. Considerações sobre as falas dos sujeitos de pesquisa

O que chama a atenção nas falas logo de início é o volume. Alguns sujeitos de

pesquisa não pouparam esforços ao relatar sua experiência com o jogo, o que pode ser um

indício de que houve por parte deles um razoável envolvimento com a experiência.

Interessante notar já nas primeiras falas, que estão inclusive entre as mais robustas e

estruturadas, como os sujeitos de pesquisa podem se expressar de formas diversas sobre a

mesma experiência.

A primeira fala, por exemplo, do sujeito de pesquisa número um, é totalmente técnica.

Não se encontra em seu texto expressões comuns neste tipo de fala como: “gostei, não gostei”

ou “foi bom, não foi bom”. O sujeito de pesquisa tão somente omite uma opinião técnica

sobre o jogo sem deixar claro se a experiência o tocou ou não: “[...] o número de cartas e tipos

é bastante elevado sendo muito variado isso acaba sendo um pouco confuso e fica difícil de

tirar 100% do seu leque ainda mais sendo novato no jogo” (Sujeito de pesquisa número 1).

Do lado oposto esteve o sujeito número 2, que demostrou empolgação em sua fala:

“minha experiência com o jogo foi boa, porém senti falta da "pancadaria [...]". Embora ele

ensaie uma crítica ao jogo no que se refere a falta da “pancadaria”, que não ficou bem claro o

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que significa, acaba por focar sua fala no vir a ser do jogo fazendo diversas sugestões e

apontando possibilidades para o seu melhoramento. O que pode ser um indicio de que sua

experiência foi além do momento em que se deram os testes, que parou para refletir sobre a

experiência:

[...] eu acho que tinha que ter algo mais cativando no jogo que fizesse ele ser tanto

um jogo casual quanto um jogo competitivo, como um sistemas de modo de jogo,

tipo, "partida rápida" onde cada jogador começa com 10 cartas e só pode comprar no

3° turno do jogo, e outro modo como, "partida casual" onde tem as regras padrões

presentes atualmente no jogo, e o outro modo "competição dialética" onde cada

jogador pronto pra dialogar incessantemente joga em um modo ultra focado onde

somente o que tiver melhor os seus conceitos levara a vitória [...].

Após as colocações dos sujeitos de pesquisa 1 e 2 somente na fala do sujeito 6 se verá

novamente uma fala robusta e bem estruturada, trazendo certa objetividade sobre sua

experiência com o jogo. Mas uma diferença deve ser feita sobre as falas dos sujeitos 1 e 2 e

do sujeito 6. Os sujeitos 1 e 2 fizeram suas colocações antes das perguntas do mediador serem

postadas no grupo. Talvez por esse motivo e por ter sido escrita após as outras falas a

participação do sujeito número 6 tenha apresentado um alto grau de organização em que opõe

certos problemas que viu no jogo a pontos que considerou forte demostrando clareza e

atenção ao que está escrevendo.

O sujeito de pesquisa número 5 parece fazer uma crítica ao jogo baseada em critérios

pessoais: “minha experiência com o jogo foi boa, porem meio conturbada pois o jogo e de

pensamento rápido e estratégico e eu não costumo pensar muito , e além disso não consigo ser

ativo em jogo com 3 ou mais pessoas”.

O sujeito de pesquisa número 3 parece ter sido influenciado pela crítica do sujeito

número um, pois além de sua fala ter sido bastante curta, o menciona ao fazer sua crítica:

“minha experiência com o jogo foi boa mas assim como um dos outros jogadores, achei que

começa com muitas cartas e dificulta na hora de agir [...]”.

Não obstante ter havido falas curtas e longas, bem estrutura e confusas, elas foram

suficientes para que, após essa análise, fossem tiradas algumas conclusões, ainda que parciais,

sobre a percepção dos sujeitos de pesquisa sobre o produto didático. Em primeiro lugar,

diversos sujeitos de pesquisa apontam em suas falas problemas em relação ao tempo e ao uso

do potencial máximo dos cards do jogo (sujeitos 1, 3 e 4) e ao grande número de cards

disponíveis para iniciar o jogo (Sujeitos 1 e 6). Dessa forma, o número de cards e o tempo de

duração do jogo já aparece como problemas verificados pelo uso pratico do jogo, não sendo

uma questão de percepção casual.

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Em segundo lugar, a maioria dos sujeitos de pesquisa parece ter considerado a

experiência positiva, tendo em vista que apenas o sujeito de pesquisa número 1 não se

expressou com “gostei”. Os sujeitos de pesquisa número 3 e 6 apontaram pontos positivos nos

cards, o primeiro se referiu as imagens e o segundo ás habilidades, os demais silenciaram, o

que pode indicar uma aprovação unanime do formato e funcionamento dos cards no jogo.

Em terceiro lugar, o sujeito de pesquisa número 2 se referiu ao produto didático como

“jogo dialético” anteriormente ao moderador perguntar sobre a relação entre o jogo e os

conteúdos dados em aula. Isso pode ser interpretado como um forte indício de uso bem

sucedido do jogo como um organizador prévio, tendo em vista que ele fala também em um

modo do jogo que seria uma “competição dialética”, provavelmente o conceito de disputa ele

já conhecia antes do contato com o jogo, mas ao que tudo indica essa ideia foi expandida e ele

agora fala em “disputa dialética”. Algo próximo do esperado pelo uso do produto didático

como um organizador prévio comparativo, que é a utilização por parte dos estudantes da

noção que cada um traz de casa de combate ou disputa, presente, por exemplo em esportes,

jogos eletrônicos e no senso comum para o aprendizado de outras formas de combate ou de

disputa, neste caso especifico, a disputa teórica empreendida por filósofos em busca da

melhor resposta a problemas essenciais, que caracteriza a Filosofia ocidental. Conforme

Marco Antônio Moreira um organizador prévio deve ser a ponte entre o que o aprendiz já

sabe e o que deveria saber para que o material seja potencialmente significativo. Neste

sentido, um

[...] organizador [prévio] deve prover uma ancoragem ideacional em termos que são

familiares ao aprendiz. Quando o novo material é relativamente familiar, o

recomendado é o uso de um que ajudará o aprendiz a integrar novos conhecimentos

à estrutura cognitiva e, ao mesmo tempo, a discriminá-los de outros conhecimentos

já existentes nessa estrutura que são essencialmente diferentes, mas que podem ser

confundidos. (MOREIRA, 2010, p. 11).

No que se refere aos conteúdos prescritos pela lei 10639 de forma especifica, vemos

uma estreia relação entre a noção da história da Filosofia vista como um combate ou uma

disputa teórica em prol de definir a melhor tese para elucidar problemas essenciais da

humanidade e a contestação dessa disputa (aqui entram os conteúdos regulados pela lei) por

considerar apenas teses do lado ocidental do globo. Ora, se os alunos trazem de casa a noção

de combate como disputa em que forças se opõem, certamente também entende a nação de

um combate de segunda classe ou disputa depreciado por certas razões. Por exemplo: imagine

um campeonato que se propõe a reunir os melhores times de futebol da América do Sul, sem

times do Brasil participando, seria certamente uma disputa de segunda classe, dada

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importância dos times brasileiros. Da mesma forma que para Noguera (2014) conceber a

história da Filosofia sem a produção africana, asiática e ameríndia resulta em uma história

parcial da Filosofia, e que, para Obenga, apud Noguera (2014, p. 66) “[...] é empobrecedor e

muito prejudicial para o pensamento especulativo reduzir a história da Filosofia em tempos

mais remotos a um conjunto de textos de uma pequena região do mundo”.

A noção que acabamos de apresentar pode parecer um tanto vaga em relação a noção

de “combate” por exemplo, já delimitada e consagrada como conceito, mas conforme Moreira

(2010) os subsunçores devem ser conhecimentos prévios relevantes para que os materiais de

aprendizagem, bem como os novos conhecimentos, sejam potencialmente significativos. Por

esse motivo, “[...] subsunçores podem ser proposições, modelos mentais, construtos pessoais,

concepções, ideias, invariantes operatórios, representações sociais e, é claro, conceitos, já

existentes na estrutura cognitiva de quem aprende (MOREIRA, 2010, p. 10)”.

Conforme Moreira (2010), portanto, o papel do organizador prévio é fazer com que o

aprendiz perceba a relação que existe entre o conhecimento que ele possui e o novo

conhecimento trazido pelo material didático. Portanto, a noção de que um combate esportivo

pode ser desqualificado por excluir um determinado grupo de participantes pode servir como

ancora ou subsunçor para fazer uma crítica a concepção de história da Filosofia restrita a

Europa. Assim, o tópico “história ampliada da Filosofia” mantem relação estreita com o

tópico “História da filosofa como combate teórico ou disputa dialética”, da mesma forma que

o subsunçor “combate” e a “noção de disputa restrita e excludente.

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CONCLUSÕES PARCIAIS

Esta dissertação buscou apresentar o jogo educativo Combate Filosófica enquanto um

organizador prévio em uma tentativa de viabilizar a problemática do uso dos jogos educativos

sem a pretensão de caráter conteúdista tradicionalmente ligada às atividades lúdicas em

contextos educacionais, e ao mesmo tempo, ousou ao sair da zona de conforto do

eurocentrismo transformando a tentativa em estratégia para levar para aulas de Filosofia parte

dos conteúdos prescritos pela lei 10639 para uma educação filosófica para as relações étnico-

raciais. Portanto, nem de perto foi a pretensão deste projeto apresentar um modelo

metodológico perfeito de aplicação de jogos conforme a teoria da aprendizagem significativa,

nem mesmo pretendemos apresentar um modelo. Importante também esclarecer que da

referida teoria esta dissertação se utilizou do conceito de subsunçor, enquanto conhecimento

prévio que pode ser relacionado com um novo material didático para favorecer a

aprendizagem significativa, e o conceito de organizador prévio, enquanto recurso didático

para favorecer a ligação entre o que o aluno já sabe e o conteúdo apresentado pelo novo

material didático.

Dito isso, vamos às conclusões parciais de nossa experiência, tendo como referencial,

o objetivo geral da pesquisa, que foi antes de qualquer coisa, desenvolver um material

didático com foco nos conteúdos prescritos pela lei 10639 para o ensino de filosofia, mas, que

,trouxe implícito um segundo objetivo e motivação, que foi: ajudar professores de Filosofia

na árdua e solitária tarefa de levar para o contexto de suas aulas conteúdos prescritos pela lei

10639 para uma educação filosófica para as relações étnico raciais. Atarefa é árdua porque

ainda falta apoio dos órgãos de Estado para a aplicação da lei e solitária porque a maioria dos

professores de Filosofia ainda não despertou para as obrigações trazidas pela lei à realidade da

educação filosófica no Brasil.

Não obstante isso, a partir de nossa pesquisa os professores de Filosofia podem contar

com um card game de filósofos, talvez o primeiro do Brasil e do mundo, a reunir em um só

jogo e produto educativo, temas ligados à tradição ocidental europeia, africana, afro-brasileira

e afrodiaspóricas, e os alunos, principalmente, a partir da proposta podem entrar em contato

com os conteúdos prescritos pela lei 10639 de forma lúdica. Isso pode dizer, porque o

Combate Filosófico conseguiu reunir sob a lógica da ampliação da história da filosofia e da

disputa teórica nomes como Tales de Mileto e Cheik Anta Diop, Hanna Arendt e Ângela

Davis, o demiurgo e a cobra gigante Boiuna, Hegel e Abdias do Nascimento. Portanto, o

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apesar de todas as dificuldades verificadas durante o processo de testes, dentre elas, a falta de

tempo e de espaço para reuniões do grupo, prazo curto para analisar os dados obtidos e

problemas com o formato que foi adotado para o teste (número muito grande de cards para

iniciar a partida), os sujeitos de pesquisa demostraram empolgação e se empenharam jogando

durante mais de três horas em três reuniões um jogo de estratégia que exigiu muito de suas

mentes.

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APÊNDICE A – Manual

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Combate Filosófico

Manual de Regras

Autor: Marcelo Ribeiro

DUQUE DE CAXIAS

2019

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SUMÁRIO

1 CONCEITOS BÁSICOS 03

2 OS CARDS DO JOGO 03

2.1 FILÓSOFOS 03

2.2 PERÍODOS TRADICIONAIS 05

2.3 PERÍODOS ESPECIAIS 07

2.4 PROBLEMAS 07

2.5 ENTIDADE 08

2.6 FICHA 09

3 ZONAS DO JOGO 10

3.1 O DECK OU ARSENAL DE CONCEITOS 10

3.2 A MÃO 11

3.3 O CAMPO DE BATALHA 11

3.4 A CAVERNA 11

3.5 OS EXÍLIOS 12

4 DINÂMICAS DO JOGO 12

4.1 USO DO DADO 11

4.2 “VIRAR” UM CARD E OS TIPOS DE HABILIDADE 12

4.3 ATAQUE 13

4.4 DEFESA 13

4.5 EFEITO 14

4.6 DUELO 14

4.7 DINÂMICAS DO DUELO E HABILIDADES DE ATAQUE 16

5 TURNO 16

5.1 FASE DE MANUTENÇÃO 17

5.2 FASE DE INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTOS 17

5.3 FASE DE COMBATE 17

6 PALAVRAS CHAVE 17

6.1 PALAVRAS CHAVE PARA A COLOCAÇÃO DE CARDS NO 17

6.1.1 Inserir 17

6.1.2 Atrair 18

6.1.2.1 Outras Regras De Atração 18

6.1.3 Convocar 19

6.1.4 Invocar 19

6.1.5 Ajuda 19

6.2 PALAVRAS-CHAVE PARA EFEITOS DE HABILIDADES 20

6.2.1 Prender 20

6.2.2 Neutralizar 20

6.2.3 Anular 20

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6.2.4 Banir 20

6.2.5 Escavar 21

6.2.6 Sequestro e resgate 21

7 REGRAS ESPECIAIS 21

7.1 REGRA DE OURO 21

7.2 IMUNIDADE DE CARDS “VIRADAS” 21

7.3 SACRIFÍCIO DE FILÓSOFO 22

7.4 INSERÇÃO INCORRETA DE UM CARD NO CAMPO DE 22

7.5 RECUAR DE UMA JOGADA 22

7.6 CARDS QUE VOLTAM DA CAVERNA OU DE ALGUM EXÍLIO 23

7.7 SINAIS NOS CARDS 23

7.7.1 Asteríscos (*****) 23

7.7.2 Traço (-) 23

7.7.3 Barra (/) 23

8 FORMATOS PARA O EMBATE FILOSÓFICO 24

8.1 “MANO A MANO” OU POR EQUIPES 24

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1 CONCEITOS BÁSICOS

O Combate Filosófico é um card game didático de estratégia baseado na história da

filosofia onde os jogadores, sendo no mínimo dois e no máximo quatro, organizam cards em

um “Campo de Batalha” para duelar em uma disputa ao longo de turnos alternados. No

mundo imaginário do Embate Filosófico os jogadores são “Pensadores” que se enfrentam em

um duelo teórico para decidir quem tem a reputação mais sólida da história da filosofia. A

“reputação” representa os pontos de vida de um jogador. Os competidores iniciam o jogo com

uma reputação de 20 pontos. Perde aquele que tiver os pontos de sua reputação reduzidos à

zero. Este jogador conforme a construção imaginária do jogo tem seu nome apaga da história

da filosofia.

A "moeda" do jogo é a “Reflexão”, atividade que oferece sustentação para os

procedimentos executados no jogo. O “Pensador” extrai “Reflexão” de um dos cinco Períodos

tradicionais da história da filosofia, que são: Pré-socrático, Clássico, Medieval, Moderno e

Contemporâneo. A Reflexão pode ser de uma das cinco áreas da filosofia: Ética, Estética,

Epistemologia, Lógica e Metafísica.

2 OS CARDS DO JOGO

O Combate Filosófico conta com quatro tipos de card: Filósofo e Filósofa, Período,

Problema, Entidade e Ficha.

2.1 FILÓSOFOS

Os Filósofos são os cards que lutam pelos jogadores. Elas podem ser de dois tipos:

"Permanente" e de "Ação instantânea". Os cards de Filósofo Permanente contam com três

habilidades e uma vez no "Campo de Batalha" só saem dele se forem exiladas ou se tiverem

todas as suas habilidades utilizadas. Habilidade é a capacidade que um card tem de afetar o

jogo. Cards de "Ação instantânea”, contam com uma ou duas habilidades, e, ao entrar no

Campo de Batalha, afetam o jogo para em seguida serem lançadas na zona de descarte de

cards. Portanto, um card de Filósofo com três habilidades é um card de Filósofo Permanente.

Com duas ou uma habilidade é um card de Ação instantânea. Mesmo que um card de Ação

instantânea tenha duas habilidades, o jogador só poderá utilizar uma delas. Da mesma forma,

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Verso dos cards e card de filósofo permanente

os cards de Filósofo Permanente só podem ter uma de suas habilidades utilizadas em cada

turno.

Para que um card de Filósofo Permanente ou de Ação instantânea entre no Campo de

Baralha, o jogador precisa ter pagado o seu "Custo de Reflexão" que se refere ao número de

Reflexão de cada uma das cinco Áreas da filosofia que um card de Filósofo necessita para

entrar no Campo de Batalha ou utilizar uma habilidade. O Custo de Reflexão de um card de

Filósofo pode trazer outras exigências além da “Reflexão” como, por exemplo, o sacrifício de

um Filósofo, tendo em vista que “Custo de Reflexão” é, de forma geral, a exigência que um

jogador precisa cumprir para realizar um procedimento no Jogo, não significando

necessariamente o ato de extrair Reflexão de Períodos. Os cards de Filósofos Permanentes

não podem ser utilizados no turno que entram no campo de batalha, pois estão sob o efeito

“Confusão de Atração”, podendo ser utilizadas normalmente no próximo turno. Os cards de

Filósofo de Ação instantânea estão livres do efeito anteriormente citado e afetam o jogo

imediatamente ao entrar no Campo de Batalha.

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2.2 PERÍODOS TRADICIONAIS

Os Períodos tradicionais são cards permanentes, uma vez no Campo de Batalha eles

não saem até o fim do jogo. Eles não possuem “Custo de Reflexão” ou qualquer outra

exigência para entrar no “Campo de Batalha”. Os jogadores podem "inserir" um Período no

Campo de Batalha a cada turno, bastando para isso que sejam tirados da Mão e colocados na

mesa. Um card de Período tradicional tem habilidade de gerar “Reflexão”, essa Reflexão pode

ser de uma das cinco áreas da filosofia: Ética, Estética, Lógica, Metafísica e Epistemologia.

Um card de Período tradicional, com exceção do Pré-socrático, pode gerar Reflexão de mais

de uma área, no entanto, os jogadores só poderão extrair Reflexão de uma área por turno. Por

exemplo: do período Medieval, que gera Reflexão da Metafísica e da Lógica, um jogador

poderá extrair “Reflexão” da Ética em um turno e da Lógica em outro, ou novamente da

Lógica, tendo dessa forma duas opções para escolher em cada turno. O mesmo com o Período

Moderno, que oferece três opções de Reflexão, uma de cada área.

Card de filósofo de ação instantânea

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Card de período tradicional

Os demais cards de período tradicional

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2.3 PERÍODOS ESPECIAIS

Os Períodos Especiais, da mesma forma que os tradicionais, têm habilidade de gerar

“Reflexão” e são cards permanentes. Eles se diferenciam dos Períodos tradicionais em dois

aspectos: primeiro, eles contam com outro tipo de habilidade além de gerar Reflexão;

segundo, alguns podem gerar Reflexão de mais de uma área de forma simultânea por turno.

Uma habilidade de Período Especial (com exceção de gerar mana) pode ser usada apenas uma

única vez no jogo.

2.4 PROBLEMAS

Os Problemas são cards de “Ação Instantânea”, portanto, tem apenas uma habilidade,

como os filósofos de Ação Instantâneos, e da mesma forma que eles, afetam o jogo no exato

momento em que entram no Campo de Batalha e saem em seguida. Mas, como os Períodos,

os Problemas não têm Custo de Reflexão, podendo entrar no Campo de Batalha livremente,

desde que sejam capazes de interferir no jogo. Os cards de Problema vão para a zona de

Card de período especial

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descarte de cards após terem sua habilidade utilizada. Os problemas podem ser utilizados no

turno22

do adversário, desde que empregados para responder diretamente a outro problema.

2.5 ENTIDADE

Os cards de “Entidade” bem como os de Ficha afetam o jogo da mesma forma que os

cards de Filósofo de Ação instantânea, havendo duas diferenças entre eles: em primeiro lugar,

um card de Entidades ou Ficha é banido após afetar o jogo com sua habilidade, ao invés de ir

para a zona de descarte; segundo, o seu Custo de Reflexão representa uma quantidade de

danos na reputação do jogador que decidiu fazê-la entrar no Campo de Batalha. Um card de

Entidade ou de Ficha pode retornar ao jogo após seu banimento se a entrada for determinada

por uma habilidade. Habilidades que fazem as “Entidades ou Fichas” entrar no Campo de

Batalha não pode ser utilizadas mais de uma vez.

22

Ver mais detalhes sobre tuno na seção especifica.

Card do tipo problema

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2.6 FICHA

As Fichas são cards especiais, eles não são Filósofos, Entidades, Problemas ou

Períodos. Sua presença no jogo se justifica pela relação que eles mantêm com outros cards. A

Ficha, no entanto, tem status de Entidade, pois da mesma forma que as Entidades, elas são

banidas do jogo após seu uso e só podem retornar se invocadas nominalmente por uma

habilidade. Um card de Entidade após ser invocada nominalmente não pode mais retornar ao

jogo, da mesma forma que as Entidades, salvo a exceção explicada no tópico anterior.

Card de Entidade

Cards de Entidade

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3 ZONAS DO JOGO

O Combate Filosófico conta com as seguintes zonas: Mão, Deck ou “Arsenal de

Conceitos”, Campo de Batalha, Caverna e os Exílios.

3.1 O DECK OU ARSENAL DE CONCEITOS

O Deck ou “Arsenal de Conceitos” é o monte de compra de cardas de cada jogador. A

partir do seu “Arsenal de Conceitos” os jogadores compram cards para formar sua Mão. O

“Arsenal de Conceitos” deve ser embaralhado antes das partidas e após ser “escavado”23

.

Deve permanecer com os cards com a face para baixo. Depois que a partida tem início não é

permitido aos jogadores examiná-lo sem prévia autorização. Essa autorização normalmente

vem de alguma habilidade.

3.2 A MÃO

23

Será explicado em seção própria.

Zonas do jogo

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Na Mão ficam os cards que são comprados, Sequestrados, Resgatados ou recebidos

para cumprir alguma exigência. A partir dela (Mão) os jogadores traçam suas estratégias

decidindo quais (cards) devem e podem descer ao o Campo de Batalha para o “Combate

Filosófico” e quais devem esperar.

3.3 O CAMPO DE BATALHA

É a zona do jogo onde o “Combate Filosófico” acontece. Nele são organizados os

cards após virem da Mão, da Caverna ou de algum exílio. O Campo de Batalha pode ser

dividido em duas ou quatro partes. Cada jogador organiza seus cards na sua parte do Campo

de Batalha. Os períodos, que são cards permanentes nível 01 (um) (ficam no Campo de

Batalha até o fim do jogo), normalmente ficam perto do jogador. Um pouco mais a frente são

organizados os Filósofos, (Permanentes nível 02 (dois), saem do Campo de Batalha sob certas

condições), mais próximos da linha (imaginária) que separa cada lado do Campo de Batalha.

Entre os Períodos e os Filósofos permanentes podem ser postos os Problemas (cards

provisórias nível 01, saem no mesmo tuno), as Entidades e os Filósofos de Ação instantânea,

(cards provisórias nível 02, podem ficar por mais de um turno sob certas condições). O

Campo de Batalha é uma zona de livre acesso, portanto, os períodos devem ficar sempre a

vista do oponente a fim de que ele possa verificar quais estão virados e quais não estão, da

mesma forma os filósofos. Os jogadores devem ter liberdade também para ler os textos com

as habilidades de cada card. Na esquerda do Campo de Batalha pode ficar localizada a

Caverna e na direita os Exílios e os cards Banidos.

3.4 A CAVERNA

A Caverna é a zona de descarte do jogo. É um local compartilhado por todos os

jogadores e de acesso livre. Devem ir para a Caverna: os cards de Filósofos Permanentes que

tiveram suas três habilidades utilizadas; de Ação instantânea que já afetaram o jogo;

Problemas; cards sacrificados por decisão de algum jogador. Neste caso, elas podem vir da

Mão ou do Campo de Batalha. E, finalmente, qualquer card de Filósofo por determinação de

uma habilidade. Os cards de Entidade e Fuicha não vão para a Caverna, por que são banidas

após entrarem no Campo de Batalha e afetarem o jogo.

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3.5 OS EXÍLIOS

Os Exílios são zonas do jogo destinadas aos cards que por determinação de alguma

habilidade são expulsos do Campo de Batalha. Os exílios são diversos e se identificam por

nomes que constam nas habilidades dos cards. Os cards exilados ficam fora do Campo de

Batalha para todos os efeitos, todavia, não ficam fora da partida de modo geral, podendo

inclusive retornar se alguma habilidade assim determinar.

4 DINÂMICAS DO JOGO

4.1 USOS DO DADO

No Combate Filosófico os lados do dado são utilizados para demarcar posições e

dinâmicas do jogo. Nos cards de Filósofo Permanente, por exemplo, o dado é utilizado para

indicar cada habilidade utilizada. Pois, as habilidades são numeradas. Assim, deve-se colocar

o dado com o mesmo lado da numeração da habilidade utilizada. Exemplo: se foi utilizada a

habilidade de número três, coloca-se sobre card um dado com o lado que marca o número

três. Quando um card de Filósofo Permanente tiver sobre ela três dados com os lados de cima

que marcam um, dois e três, ela deve ir para a Caverna. Outros usos do dado são: para indicar

habilidades de Defesa neutralizadas, dado com o número quatro (4) sobre o card; Para indicar

habilidades de Ataque neutralizados, dado com o número cinco (5) sobre o card; cards

impossibilitados de serem usados por qualquer motivo, dado com o número seis (6) sobre

card.

4.2 “VIRAR” UM CARD E OS TIPOS DE HABILIDADE

Ao virar um card permanente, da posição vertical para a posição horizontal, o jogador

inicia uma ação que tem como consequência o uso de uma habilidade. No caso de um

Período, o movimento resultará na extração de Reflexão de uma das cinco áreas. Por

exemplo: se um jogador virar um período Pré-socrático, terá a sua disposição uma Reflexão

da Epistemologia.

Se virar u2m período Clássico, poderá escolher Reflexão de uma das cinco áreas, pois

como já vimos, se tratando de períodos tradicionais, só é permitida a extração de Reflexão de

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uma área por turno. Neste caso, o período permanece virado até o próximo turno do jogador

que o virou, quando poderá ser desvirado para uma nova utilização.

Se um card virado for de Filósofo, isso significa que uma de suas habilidades será

utilizada imediatamente. Da mesma forma que nos cards de Período, os cards de filósofo

Permanente, uma vez virados e marcada uma de suas três habilidades com o dado, só poderão

ser desviradas no próximo turno de quem os virou.

A dinâmica de “Virar” um card está também diretamente ligada ao uso das

habilidades, essas habilidades podem ser de três tipos: Ataque, Defesa e Efeito.

4.3 ATAQUE

As habilidades de ataque visam causar danos na reputação do oponente. Dessa forma,

eles vêm sempre seguidos de um número antecedido pelo sinal de subtração, exemplo: ataque

de -5, ataque de -4, ataque de -7. O Ataque não tem efeito imediato, deve ser resolvido no

turno do adversário. Exemplo: Jogador “X” atacou o jogador “Y” com uma habilidade de

Ataque para lhe causar -5 de danos. Até o jogador “X” passar o turno nada acontece. Mas,

quando ele passar o turno, o jogador “Y” terá de decidir como irá lidar com o Ataque que lhe

foi desferido. Se ele passar o turno sem decidir, receberá o dano em sua reputação. O Ataque

pode ser “agravado” por uma palavra chave, por exemplo: a palavra seguida da palavra ataque

“Fatal” significa que se o adversário receber o dano total do ataque ele perde o jogo. Outros

exemplos de um ataque agravado são: ataque “Indefensável”, significando que é imune a

habilidades de Defesa, como, escudos, barreiras e afins. Ataque “Indesviável”: imune a

habilidades de esquiva . Ataque “Indelével”: imune a espelhos e afins.

Ataque “Supremo”: reune todos os agravadores anteriores, é Fatal, Indefensável,

Indesviável e Indelével.

4.4 DEFESA

As habilidades de defesa representam uma das possibilidades que um jogador atacado

tem para reagir e não sofrer danos em sua reputação ou diminuir o dano. As habilidades de

defesa são instantâneas, ou seja, surtem seus efeitos de forma imediata, ainda no turno de que

as utilizou. São consideradas habilidades de defesa aquelas que ao serem utilizadas permitem

ao jogador: anular um Ataque ou reduzir seus danos, exemplo: escudo, barreira e etc.; desviar

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um ataque de forma total ou parcial, exemplo: esquivas; devolver ataques integralmente,

diminuídos, aumentados ou em mesma quantidade. Exemplo: espelhos e afins.

4.5 EFEITO

As habilidades de “Efeito” seguem as mesmas regras de utilização das habilidades de

Defesa e Ataque, mas, com uma importante diferença em relação às habilidades de ataque, já

que, da mesma forma que as habilidades de defesa, elas são instantâneas. Significando que

seu impacto sobre o jogo é imediatos, afetando-o ainda no turno de quem as utilizou. Dessa

forma, se uma habilidade determinar que um card deve ser exilado, ou que ele ganhe mais 5

de ataque, isso acontece imediatamente.

4.6 DUELO

Chama-se “Duelo” o procedimento de ataque e contra-ataque que testa a capacidade

dos jogadores de se manterem por mais tempo na disputa para decidir quem mantem sua

reputação intacta por mais tempo. Toda vez que um jogador desfere um Ataque tem início um

Duelo. Quando o adversário decide revidar a esse ataque contra-atacando, o Duelo tem

seguimento. Sobre o duelo, quando um dos jogadores decide defender, esquivar, ou receber os

danos de um Ataque, o Duelo termina. Uma vez que um card é virado para participar do duelo

ele só poderá ser desvirado ao fim do duelo. Dessa forma, como estratégia de jogo, ao desferir

um ataque, sempre é bom ter um card preparado para o contra ataque, já que o card que

atacou não poderá ser reutilizado no turno seguinte.

A dinâmica do duelo é a seguinte: digamos que o Pensador “X” decida atacar seu

oponente, o Pensador “Y”, com a habilidade de nº 2 do card Platão. Nesse caso ele precisa

virar períodos para pagar o “custo de reflexão” da habilidade, em seguida virar o card e por

sobre ele o dado com o número da habilidade que vai usar. Feito isso, é só passar o turno e

estará desferindo um ataque de -7 com a habilidade “Pelotão de choque da República” do card

Platão.

O Pensador “Y” precisa decidir se, e como vai responder ao ataque. Mas, ele não

precisa fazer isso assim que receber o turno, poderá comprar um card, inserir um período ou

problema, atrair um filósofo e etc., proceder com as fazes de um turno24

normalmente porque

24

Será explicado na seção fases de um turno.

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os ataques no Combate Filosófico não causam danos de forma imediata, mas somente quando

o jogador atacado passa o turno. Mas o que acontece se ao invés de receber o dano o Pensador

Y decidisse contra-atacar com uma habilidade de maior capacidade? Se ele, por exemplo,

recorresse à habilidade número três do card Aristóteles, “Chuva de conceitos da metafísica”,

que causa – 12 de dano na reputação? Neste caso, o maior ataque suplantaria o menor e

seguiria com o devido desconto para o pensador X, que teria de lidar com um contra-ataque

de -10 e o duelo seguiriam.

Observe na figura que segue um esquema explicativo de uma partida de Combate

Filosófico com uma demonstração de Duelo com ataque e contra-ataque, como acabamos de

descrever.

Como ficou bem nítido na figura, o pensador X teve seu ataque suprimido pelo ataque

maior e agora está em perigo, pois, segundo as regras do duelo o card usado para atacar não

pode ser desvirado até o fim do duelo. No caso, o card Platão não pode ser utilizado até o

duelo terminar e o pensador X está recebendo um contra-ataque de -10. Perceba na figura, que

Platão não é o único card de filósofo que o Pensador X possui no campo de batalha, ele pode

contar com mais dois cards com habilidades de ataque, Immanuel Kant e Marilena Chauí. E

como seus períodos poderão ser desvirados para serem utilizados novamente, ele poderá

Duelo com ataque e contra ataque

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responder ao ataque de -10 e dar sequência ao duelo, que só terminará quando um dos

jogadores receber danos em sua reputação, desviar o ataque ou anulá-lo com um ataque de

mesma capacidade.

4.7 DINÂMICAS DO DUELO E HABILIDADES DE ATAQUE.

Os ataques desferidos por vários cards viradas devem ser somados formando um único

ataque. Um Ataque formado por “Ataques comuns” e “Ataques agravados” é um Ataque

“misto”. Um ataque sempre se choca com um contra-ataque. Se os ataques tiverem a mesma

capacidade de dano, eles se anulam e termina o Duelo. No caso de ataques com capacidades

de dano diferentes, o de maior capacidade será reduzido pelo de menor seguindo-se a

diferença, o que resultará sempre em uma “conta de subtração”. Por exemplo: imaginemos

que, iniciando um Duelo, o jogador “X” desfira um ataque de -6 contra o jogador “Y”, e este

contra-ataque com -4. Os ataques se chocarão, o que causará uma redução do ataque de -6 em

-4 causando um dano de -2 na reputação do Pensador “Y” que dará fim ao duelo. Em outra

situação, imaginemos que um jogador desfira um ataque de -5 e receba um contra-ataque de -

8. O ataque maior, de -8, será diminuído pelo ataque menor de -5, seguindo a diferença, ou

seja, -3. O jogador que desferiu o ataque de -5 teve seu ataque suprimido em -5 e recebe um

contra-ataque de -3 que dá seguimento ao Duelo.

Em caso de um Ataque ser reduzido ou suprimido por contra-ataque “misto” maior ou

menor, os ataques que formam o Combo misto devem ser eliminados na seguinte ordem:

primeiro os Ataques comuns, depois os “Indesviáveis”, “Indefensáveis”, “Indeléveis” e os

“Fatais”. Por exemplo: se um jogador desferir um Ataque de -27, sendo: 5 comuns, 5

Indesviável, 5 Indefensável, 5 Indelével e 7 Fatal, e receber um contra-ataque de -20, o ataque

fatal de -7 segue colocando sua permanência na partida em risco.

5 TURNO

O Turno é o momento que cada jogador tem para realizar procedimentos no jogo.

Durante o turno de um jogador o jogador adversário não poderá realizar procedimentos, a

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menos que tenha um card ou habilidade que o autorize. O turno de um jogador começa

quando o outro sinaliza verbalmente ou pelo relógio de xadrez que o seu terminou. As

atividades de um turno podem ser divididas em três fases: de Manutenção, de “Instaurar

procedimentos” e de Combate.

5.1 FASES DE MANUTENÇÃO

Na fase de manutenção os jogadores devem comprar um card, desvirar as permanentes

viradas no turno anterior e enviar para a zona de descarte cards de Filósofo Permanente que

no turno anterior utilizou sua terceira habilidade.

5.2 FASES DE INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTOS

Na fase de “Instauração de Procedimentos” devem ser utilizadas os cards com

habilidades de efeito, como Problemas, Filósofos de Ação Instantânea e Entidades.

5.3 FASES DE COMBATE

Na fase de Combate os cards de Filósofos Permanentes são viradas para ativar efeitos

sobre cards do adversário e para atacá-lo. Lembrando que as habilidades de Efeito são

instantâneas e as de ataque só surtem seus efeitos no turno do adversário. Ou seja, mesmo que

se tenha virado um card para atacar, até passar o turno, o adversário não corre qualquer risco.

Da mesma forma, o jogador atacado, só sofre danos em sua reputação quando devolve o

turno.

6 PALAVRAS CHAVE

No Combate Filosófico a presença de uma palavra pode determinar o uso de uma

habilidade ou procedimento no jogo. Por exemplo, a palavra “ataque” no texto de uma

habilidade nunca será por acaso, significando, em primeiro lugar, que se trata de uma

habilidade que causa danos na reputação e surte seus efeitos no turno do oponente; em

segundo, que sua utilização dará início a um Duelo e o oponente terá oportunidade de reagir

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ao ataque. Outros exemplos seriam os procedimentos para um card entrar no “Campo de

Batalha” e a forma como as habilidades afetam o jogo.

6.1 PALAVRAS CHAVE PARA A COLOCAÇÃO DE CARD NO CAMPO DE BATALHA

6.1.1 Inserir

A palavra chave “Inserir” se refere a Períodos e Problemas, cards que não tem Custo

de Reflexão para entrar no Campo de Batalha. Lembrando que um card de Problema, embora

não tenha Custo de Reflexão, para ser inserida no Campo de Batalha precisa ser capaz de

interferir no jogo com sua habilidade.

6.1.2 Atrair

A palavra chave “Atrair” se refere à entrada de cards de Filósofo no Campo de

Batalha, tipo de card que para entrar no Campo de batalha precisa que seja atendido o seu

custo de reflexão (CR). Além disso, diferente dos Problemas e Períodos, que ao serem

“Inseridos” no Campo de Batalha sempre vem da Mão dos jogadores, os cards de Filósofo

podem vir da Mão, dos Decks, dos Exílios ou da zona de descarte de cards. O que distingui a

“Atração” das demais formas de fazer um card de Filósofo entrar no Campo de Batalha

principalmente, é que, os cards “atraídos” sempre entram sob o efeito “Confusão de Atração”,

significando que não podem ser utilizadas no turno que entram no Campo de batalha (CB),

mas, somente no seguinte. A Atração pode ser comum ou especial. É comum quando um card

de Filósofo é deslocado da Mão para o Campo de Batalha tendo sido pago o seu Custo de

Reflexão. É especial quando um card de Filósofo é deslocada de umas das zonas do jogo, que

não seja a Mão, para o Campo de Batalha, ou da Mão sem ter pagado o custo de Reflexão. Na

Atração Especial o card é trazido ao Campo de Batalha por determinação de uma habilidade.

No mais, segue as mesmas regras da Atração comum.

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6.1.2.1 outras Regras da Atração

Quando uma habilidade determina a Atração de um card e não diz de que zona do jogo

ela virá, os jogadores estarão autorizados a acessar a “Mão” e o “Deck”, na seguinte ordem:

assim que a habilidade for utilizada ambos podem procurar o card na “Mão”, se ambos não

encontrarem podem “Escavar os Decks” 25

. Assim que alguém anunciar ter achado card deve

entregá-lo para cumprir a exigência da habilidade e os decks devem ser embaralhados por

seus respectivos usuários, esse é o fim do procedimento de escavação. No caso de uma

“Atração”, os cards não podem vir da Caverna26

ou de algum Exilio, salvo exceções

determinadas pela “Regra de Ouro” 27

.

6.1.3 Convocar

A “Convocação” sempre acontece a partir de uma habilidade e resulta na entrada de

um card de filósofo Permanente ou de Ação instantânea no Campo de Batalha. Os cards de

Filósofos Permanentes “convocados” não entram confusos no Campo de Batalha. Ademais, a

“Convocação” segue as mesmas regras da “Atração”.

6.1.4 Invocar

A “Invocação” é uma forma de um card entrar no Campo de Batalha exclusiva dos

cards de Entidade e Ficha. Existem dois tipos de invocação: comum e especial. A Invocação

comum é determinada por uma habilidade. A especial é quando se paga o Custo de Reflexão

do card de Entidade ou Ficha. Como regra, esse “custo de reflexão” será receber danos na

reputação. Em ambos os tipos de Invocação, comum e especial, o card de Entidade ou de

Ficha é banido após sua entrada no Campo de Batalha. Mas, com uma exceção, em caso de

uma “Invocação especial”, cabe ainda uma “Invocação comum”, por meio de uma habilidade,

sendo vedada a reutilização de tal habilidade se for um filósofo, tendo em vista que o card de

Entidade estará banido sem possibilidade de retorno.

25

Será explicado em seção especifica. 26

Local de descarte de cartas.

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6.1.5 Ajuda

A “Ajuda” é uma forma de colocar cards de Filósofo Permanente no Campo de

Batalha para utilização provisória, em apenas um turno. Dessa maneira, quando uma

habilidade disser “Peça Ajuda” significa que um card de Filósofo terá sua entrada no Campo

de Batalha autorizada por um turno, possibilitando que um dos jogadores utilize uma de suas

habilidades sem Custo de Reflexão. Cards que estão no Campo de Batalha do lado do

adversário, presas, com alguma habilidade “neutralizada”, na Caverna ou em algum Exilio,

não podem entrar no Campo de Batalha através da “Ajuda”. No turno seguinte de sua

utilização o card que veio “Ajudar” deve retornar para sua zona de origem (exceto se o efeito

de sua habilidade ainda estiver ativo no jogo), se for o Deck ele dever ser embaralhado pelo

seu respectivo jogador.

6.2 PALAVRAS-CHAVE PARA USO DE HABILIDADES DE EFEITO

As habilidades de efeito também contam com palavras chaves que determinaram o seu

uso no jogo, são elas: prender, neutralizar, anular, banir, escavar, sequestrar e regatar.

6.2.1 Prender

Quando uma habilidade determina que um card de Filósofo seja preso, significa que

este card não pode utilizar habilidades ou ser removido do Campo de Batalha.

6.2.2 Neutralizar

Neutralizar é o ato de impedir que um card de Filósofo utilize alguma ou todas as suas

habilidades de forma provisória. Neste caso, ela pode ser removida do Campo de Batalha para

ser sacrificada (sendo enviada para a Caverna) ou entregue ao adversário para cumprir alguma

exigência (indo para a Mão neste caso).

6.2.3. Anular

Anular é o ato de suspender uma ou mais habilidades de um card de Filósofo

permanentemente, como se ela tivesse sido utilizada. Neste caso, deve ser posto sobre o card

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que teve a habilidade anulada o dado com o número corresponde à habilidade. A marcação

com o dado abre a contagem que quando chegar a três determina o envio do card para a zona

de descarte.

6.2.4. Banir

O banimento obriga um card de Filósofo ou de Entidade a ser retirada do jogo (a

Entidade poderá retornar se uma habilidade determinar sua Invocação, porém, por uma única

vez). Uma vez “banido”, um card não pode mais afeta o jogo de qualquer forma que seja. Um

card não precisa estar no Campo de Batalha para ser banido, ele pode estar em qualquer uma

das zonas do jogo, bastando para ser banida, que seja dito o nome dela.

6.2.5 Escavar

A palavra-chave “Escavar” no texto de uma habilidade significa autorização para

vistoriar o Deck. Pode ser do próprio jogador ou do adversário, simplesmente para olhar, para

mudar a ordem dos cards, ou, sequestrar uma delas, dentre outras possibilidades que serão

determinadas pela habilidade. O Deck sempre deve ser embaralhado após uma escavação.

Cada jogador embaralha seu próprio Deck.

6.2.6 Sequestro e Resgate

“Sequestrar” é o ato de tomar um card do adversário e colocá-lo imediatamente na

Mão. “Resgate” é o ato de tomar de volta um card sequestrada pelo adversário, ou de retirar

um card do Campo de Batalha (o card deve ser do jogador que solicita o resgate). Nestes dois

casos o card vai direto para a Mão.

7 REGRAS ESPECIAIS

7.1 REGRAS DE OURO

Conforme a regra de ouro qualquer regra do jogo pode ser suspensa por determinação

de uma habilidade. As habilidades são ordens que devem ser seguidas à risca. Se uma

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habilidade disser que um jogador perdeu o jogo, por exemplo, esse jogador perde

imediatamente.

7.2 IMUNIDADES DE CARDS “VIRADOS”

Cards virados não podem ser atingidos por efeitos. Ou seja, se um card for virada para

utilizar uma habilidade, ele não pode ser preso, ter uma habilidade anulada, neutralizada ou

ser exilado e etc. Cards de Filósofo de Ação instantânea e Entidade quando entram no Campo

de Batalha é como se estivessem viradas para todos os efeitos.

7.3 SACRIFÍCIOS DE FILÓSOFO

Os cards de filósofo podem ser sacrificados a qualquer momento do jogo conforme o

interesse de seus controladores, desde que não estejam virados ou presos. Essa regra tem

como exceção cards de Filósofo de Ação instantânea com habilidades que prendem. Pois,

mesmo que elas permaneçam no Campo de Batalha, viradas para todos os efeitos, poderão ser

sacrificadas libertando o card que prendem. Sacrificar um card, como já sabemos, implica

enviá-lo para a Caverna.

7. 4 INSERÇÃO INCORRETA DE UM CARD NO CAMPO DE BATALHA

A inserção incorreta de um card no Campo de Batalha se dá quando o mesmo entra

sem seguir o tramite oficial para a forma de inserção de card necessária para sua entrada.

Exemplo: um card de Filósofo sendo posto no Campo de Batalha sem pagar o seu “Custo de

Reflexão”, ou por engano em lugar de outro e etc. O erro estará confirmado quando o card

encostar totalmente o Campo de Batalha. Um card de Filósofo Atraído ou Convocado de

forma incorreta vai para a Caverna imediatamente. Se o erro se der com uma Entidade ela

deve ser banida. Caso ocorra com um Problema ele deve ir para a Caverna. Com um

Período, para a Mão do adversário.

7.5 RECUAR DE UMA JOGADA

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Existem limites para se mudar de ideia em relação ao uso de alguns procedimentos no

Combate Filosófico. Quando um card tocar totalmente o Campo de Batalha (mesa) não

poderá mais sair dele a não ser para a Caverna, caso seja uma entrada ilegal, ou, em um dos

casos citados pela regra anterior. Sobre o uso das habilidades, uma vez que o dado é solto

sobre o card, não se pode mudar de ideia e nem desvirar os Períodos utilizados. É permitido

mudar de habilidade do mesmo Filósofo caso a habilidade escolhida por engano não seja

capaz de afetar o jogo. Neste caso, também podem ser mudados os períodos. Sobre a compra

de cards, as que forem tocadas por um jogador são consideradas compradas para todos os

efeitos.

7.6 CARDS QUE VOLTAM DA CAVERNA OU DE ALGUM EXÍLIO

Filósofos Permanentes convocados ou atraídos da Caverna devem ter uma de suas

habilidades marcadas pelo dado a escolha de quem o convocou ou atraiu. Filósofos de Ação

Instantânea só podem retornar uma vez da Caverna, e a convocação ou Atração não pode

ocorrer no turno em que elas foram descartadas por uso de habilidade. Filósofos convocados

ou Atraídos do exilio não precisam ter habilidades marcadas com o dado.

7.7 SINAIS NOS CARDS

7.7.1 Asteríscos (*****)

Cinco asteriscos em um card de Filósofo de Ação instantânea significa que o card

pode ser utilizado no turno do adversário.

7.7.2 Traço (-)

Traços separando áreas da Filosofia em um card de Período Especial significam “e”,

indicando que o Período em questão permite o uso de Reflexões de mais de uma área de

forma simultânea por turno. O número de áreas listadas em um card de período, separadas por

traço, é indicativo do número de reflexão de cada área, que o período pode gerar em um turno.

Por exemplo: se um Período Especial oferece a opção de gerar Reflexão de Ética,

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Epistemologia e Lógica, áreas que devem estar separadas por traço, significa que o jogador

pode extrair três tipos de reflexão em um turno. Pendendo ser: uma de cada área, três da

mesma, duas da mesma e assim por diante.

7.7.3 Barra (/)

Uma Barra separando áreas da Filosofia em um card de Período Tradicional ou

Especial significa “ou”, indicando que o Período permite o uso dr Reflexões de apenas uma

área por turno.

8 FORMATOS PARA O EMBATE FILOSÓFICO

8.1 “MANO A MANO” OU POR EQUIPES

Nesta modalidade um dos jogadores, ou representante de equipe, deve se encarregar de

extrair a partir de um monte de cards, previamente embaralhadas, dois Decks. Desses decks os

jogadores, ou representantes de equipe, devem comprar doze cards para formar sua Mão.

Ambos devem rolar o dado, aquele que tirar o maior número inicia a partida. O jogador que

iniciar a partida não pode comprar card, no entanto, pode inserir um Período se tiver em sua

Mão. Quando for passado o turno o adversário inicia a fase de manutenção comprando um

card de seu Deck ou Arsenal de Conceitos.