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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MATO GROSSO
SECRETARIA DE ESTADO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE SINOP
CURSO DE LETRAS
HANNA VERÔNICA DA SILVA FERNANDES
O PODER DA PERSUASÃO NOS DISCURSOS POLÍTICOS: A
“REALIDADE” DA MÍDIA
SINOP MT
2011
HANNA VERÔNICA DA SILVA FERNANDES
O PODER DA PERSUASÃO NOS DISCURSOS POLÍTICOS: A
“REALIDADE” DA MÍDIA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Banca
Avaliadora do Departamento do Curso de Letras da Unemat
– Universidade do Estado de Mato Grosso – Campus
Universitário de Sinop, como requisito parcial para
obtenção do titulo de Licenciatura Plena em Letras.
Orientadora: Professora Doutoranda Neusa Inês Philippsen
SINOP MT
2011
HANNA VERÔNICA DA SILVA FERNANDES
O PODER DA PERSUASÃO NOS DISCURSOS POLÍTICOS: A
“REALIDADE” DA MÍDIA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Banca Avaliadora do Departamento do Curso
de Letras- UNEMAT, Campos Universitário de Sinop como requisito parcial para a obtenção
de Licenciatura Plena em Letras.
_____________________________________________
Professora Doutoranda Neusa Inês Philippsen
Departamento de Letras
UNEMAT – Campos Universitário de Sinop
______________________________________________
Professora Helenice
Departamento de Letras
UNEMAT – Campos Universitário de Sinop
________________________________________________
Professora Graci
Departamento de Letras
UNEMAT – Campos Universitário de Sinop
__________________________________________________
Professora Juliana
Chefe de Departamento de Letras
UNEMAT – Campo Universitário de Sinop
SINOP – MT/2011
DEDICATÓRIA
A meus pais que sempre estiveram presentes
em minha caminhada e demonstraran
paciência. E carinho. E sempre me
incentivaram a seguir em frente.
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, pela confiança que depositaram em mim e pelo o apoio e incentivo
incondicional nas horas em que eu mais precisei.
Ao meu namorado,Franck , pelo carinho contínuo e pela força quando achava que não ia
conseguir. Por sua compreensão nas horas que me fiz ausente.
À minha orientadora, Neusa, pela luz constante, pela dedicação e por sua paciência ao
explicar o caminho para uma marinheira de primeira viagem.
Aos meus familiares, que mesmo de longe, acreditaram no meu potencial e na minha
capacidade,passando pensamentos positivos.
E acima de tudo a Deus, porque se não fosse por Ele não teria chegado até aqui.
EPÍGRAFE
O discurso é, de parte a parte, histórico
Fragmento de história e descontinuidade
Na própria história, o que coloca o
Problema de seus próprios limites
De seus cortes, de suas transformações
Dos modos específicos de sua temporalidade, e não de seu
Surgimento abrupto em meio às cumplicidades do tempo.
(FOUCAULT, “Arqueologia do Saber”)
RESUMO
HANNA,Fernandes Silva Verônica.O Poder da Persuasão nos Discursos Políticos: A
“Realidade” da Mídia. 2011. Monografia de Conclusão de Curso – UNEMAT –
Universidade do Estado do Mato Grosso.
A mídia ocupa um papel central nas relações entre os campos sociais e políticos na
atualidade. Pela importância que a mídia e a política possuem para a sociedade, este estudo
apresenta uma análise discursiva imagética, da campanha eleitoral de 2010, entre os partidos
concorrentes PSDB e PT, seus efeitos de sentidos, ideologia e historicidade. Ao fazermos
recortes dos corpus, de suas propagandas eleitorais,analisando os fios discursivos, e percebendo
a teatralização existente,diante da politica midiática, que transforma a campanha eleitoral em
espetáculo. A política se concentra em derrubar o candidato concorrente, mesmo por meio das
mais escusas acusações verbais, como podemos perceber na Campanha Eleitoral de 2010.
Mídia como a formação do imaginário nas Campanhas Políticas, retratando as ideologias de
acordo com cada suporte midiático, num jogo de interesse, que tem com propósito,
supostamente ajudar a sociedade a votar com consciência, usando magnificamente a arte da
persuasão.
Palavra-chave: Discurso Politico, Ideologia, Mídia.
ABSTRACT
HANNA, Fernandes Silva Verônica. Persuasion Power in Political Speeches: Media
"reality". 2011. Monograph Course Conclusion - UNEMAT - Mato Grosso Public
University.
The media occupies a central role in relations between social and political fields
nowadays. Given the media and politics society importance, this study presents a 2010
campaign imagery discursive analysis between PSDB and PT competing parties, its
meaning, ideology and history effects making corpora clippings of their election
advertisements, analyzing discursive threads, and realizing the existing manipulation
policy on the media, which turns the campaign into a spectacle. The policy focuses on
overthrowing the rival candidate, even using the most excuses verbal accusations, as
noted in 2010 election campaign. Media as an imaginary formation in political
campaigns, portraying ideologies according to each media support, in an interest game,
which is purposeful supposedly to help the society to vote consciously, beautifully using
the persuasion power.
Key words: Polítical Speech, Ideology, Media.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................
2 ANÁLISE DE DISCURSO: matizes ideologicas...............................................................
2.1 IDEOLOGIA...................................................................................................................
3 MÍDIA E DISCURSO POLÍTICO......................................................................................
3.1 MÍDIA E COBERTURA POLÍTICA...............................................................................
3.2 MÍDIA POLÍTICA E IMAGEM..........................................................................................
4 A CULTURA DO ESPETÁCULO: CAMINHOS PERCORRIDOS.....................................
4.1 BREVE RELATO HISTÓRICO E IDEOLÓGICO DOS PARTIDOS PSDB E PT: vieses
reflexivos.........................................................................................................................................
4.2 MARCAS DISCURSIVAS E IMÁGETICAS: considerações analíticas.................................
5 CONCLUSÃO.....................................................................................................................
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................................
REFERÊNCIAS WEBGRÁFICAS.........................................................................................
ANEXOS................................................................................................................................
1 INTRODUÇÃO
Neste trabalho analisamos a Campanha Política do ano de 2010, dos partidos PSDB
(Partido da Social Democracia Brasileira) e PT (Partido dos Trabalhadores), que tinham como
candidatos, respectivamente, JOSÉ SERRA (PSDB) e DILMA VANA ROUSSEFF (PT).
Vale destacar que as campanhas políticas estão presentes em nossas vidas há muitos
séculos, mas somente a partir da realização das eleições diretas para Presidente da República,
em 1989, somos nós quem escolhemos nossos representantes do país.
O interesse por essa temática de pesquisa surgiu ao observarmos que, mesmo
participando “democraticamente” da escolha de seus representantes políticos, a sociedade tem
se mostrado insatisfeita e descontente com a política e os políticos eleitos.
Assim, tivemos o intuito de verificar o papel da mídia nesse processo e o quanto o
poder da persuasão está ligado à construção do imaginário que impulsiona os nossos sentidos e
as nossas escolhas, mobilizadas por discursos que já ouvimos e vimos.
Percebemos, então, à medida que lançávamos nosso olhar reflexivo ao corpus que
mobilizávamos, amparados pelo aporte teórico da Análise de Discurso de linha francesa, que
somos reféns de nossas memórias, e da ideologia, no que tange aos discursos políticos, pois
estes se valem de uma repetição constante de discursos e que têm, ao longo dos tempos,
sempre o mesmo objetivo, o de manipulação. É esse objetivo, que se extrema ao limite do
espetáculo, que procuramos exemplificar nesse trabalho de pesquisa, por meio de notícias
veiculadas na mídia na última Campanha Política da República do Brasil.
Nosso olhar analítico ateve-se, também, ao interdiscurso, às falhas, aos jogos, à
dispersão, aos deslizes, enfim, aos recursos que foram utilizados pelos suportes midiáticos em
suas materialidades imagética e discursiva e que levam aos espectadores efeitos de sentido de
“verdade”, ou seja, ao assujeitamento dessas “verdades” (re)produzidas.
Desse modo, foi-nos necessário realizar incursões reflexivas sobre a língua, a ideologia
e a história, bem como sobre o discurso como prática social e política, sua importância no dia
a dia na vida social dos brasileiros, sua produção de sentidos, determinada por seu espaço, sua
historicidade. Assim, amparados por tais resultados analíticos, é possível afirmar que estamos
sempre sujeitos à linguagem, e aos seus equívocos do cotidiano.
O trabalho analítico revelou-nos as diversas “faces” que se mostraram na campanha de
2010, seus efeitos de sentidos, seus discursos e propostas de campanha, que se apresentaram
como retomadas de discursos já ditos, feitos por outros candidatos em campanhas passadas. O
discurso tal qual se revelou nos fios discursivos pode ser visto como “arma” política.
A mídia aparece, nesse contexto, como instrumento das campanhas políticas, os
rádios, televisão, os jornais, todos buscam mostrar a melhor imagem, a melhor notícia, ou seja,
a mídia propaga a produção de sentido na sociedade, bem como a formação do imaginário das
campanhas políticas, pois as retratam de acordo com as ideologias de cada suporte midiático,
num jogo de interesses que tem como propósito, supostamente, “ajudar” a sociedade a votar
com consciência. Usando magnificamente a arte da persuasão.
A pesquisa mobilizou essencialmente a ideologia como noção operatória em um corpus
selecionado de notícias de mídia online que circularam nos três últimos meses da Campanha
Política Eleitoral de 2010.
No capítulo II, apresentamos a Análise de Discurso, uma reflexão sobre a língua, a
ideologia e a história, analisando o discurso político, sua influência, seu verdadeiro papel
na campanha política sua historicidade, a persuasão que é feita em todo o discurso
político. E uma análise, sobre o aporte teoria que fundamenta a pesquisa; a ideologia.
No capítulo III, apresentamos uma análise sobre o discurso político, e o analisamos
a partir, do homem e sua História, seus sentidos e suas ideologias, seus domínios
linguísticos, enfim, o homem e sua História em movimento, falando e se transformando.
Ou seja, ideias, memória, percurso, correr, ação do homem diante da sociedade. Falamos
também sobre mídia e cobertura política, o surgimento da mídia, como propagadora do
discurso político, e a importância da imagem nos discursos políticos.
No IV e último capítulo, apresentaremos, os recordes das campanhas políticas de
2010, e faremos analises, nos fios discursivos, para percebemos as ideologias impregnadas
em cada suporte midiático. O jogo midiático diante da grande massa, a sociedade, que
“inconscientemente” aplaude, para a grande espetacularização política.
2 Análise de Discurso: matizes ideológicas
Neste capítulo, pretende-se fazer uma reflexão sobre a língua, a ideologia e a história,
tal como são apresentadas no aporte teórico que fundamenta essa pesquisa, a Análise de
Discurso de linha francesa, e como as mesmas atuam nos discursos políticos e midiáticos, aos
quais nos ateremos no decorrer desse trabalho. Daremos ênfase, assim, ao discurso como
prática social e política, bem como enfatizaremos os sentidos produzidos pela historicidade,
inseridos em formações ideológicas, sentidos esses que nos levam a perceber que estamos
sempre sujeitos à linguagem e seus equívocos do cotidiano.
Para Maingueneau (1987), a chamada “escola francesa de Análise de Discurso” filia-
se: * a uma certa tradição intelectual europeia ( e sobretudo da França) acostumada a unir
reflexão sobre texto e sobre história. Nos anos 60, sob a égide do estruturalismo, a conjuntura
intelectual francesa propiciou, em torno de uma reflexão sobre a “escritura”, uma articulação
entre a linguística, o marxismo e a psicanálise. A Análise de Discurso nasceu, portanto, tendo
como base a interdisciplinaridade; * e a uma certa prática escolar que é a da “ explicação de
texto”, muito em voga na França, do colégio à universidade, nos idos anteriores a 1960.
Segundo A. Culioli (apud Maingueneau, 1987, p. 6), “a França é um país em que a
literatura exerceu um grande papel e pode-se perguntar se a análise do discurso não é uma
maneira de substituir a explicação de texto enquanto exercício escolar”.
Todavia, em consonância com Orlandi (1996), apresentamos a Análise de Discurso
como uma disciplina de entremeio, que se estrutura no espaço que há entre a linguística e a
ciência das formações sociais. E trabalha com as relações de contradições que se estabelecem
entre essas disciplinas, caracterizando-se, não pelo aproveitamento de seus conceitos, mas por
repensá-los, questionando, na linguística, a noção de transparência da linguagem sobre a qual
teorias são produzidas nestas áreas.
A Análise de Discurso, dessa maneira, para trabalhar a forma material, traz para dentro
de sua prática o trabalho com a paráfrase e a metáfora, bem como com o equívoco, ou seja, o
efeito da falha da língua que se inscreve a partir da negação da historicidade inscrita na
linguagem, e, as ciências das formações sociais.
É importante ressaltar, também, que tais práticas distinguem a palavra gramática da
palavra língua, isto é, ambas podem significar coisas muito diferentes, nesse sentido, contudo,
compreendemos que as gramáticas e a maneira de se estudar a língua são diferentes em
diferentes épocas, e em distintas tendências teóricas.
Outrossim, a língua e a linguagem sempre foram um dos maiores mistérios da
humanidade. Sempre buscamos compreender por que falamos assim, ou de onde veio à ligação
entre signo e significado como termos de regras formais, área de interesse da Linguística ou
ainda como normas de bem dizer, objeto de estudo da Gramática normativa. Em toda a história
da humanidade encontramos pesquisadores intrigados com estas questões, sempre trabalhando
a favor de esclarecer ao homem o porquê de nos comunicarmos.
A própria palavra gramática como a palavra língua pode significar coisas
muito diferentes, por isso a gramática e a maneira de se estudar a língua são
diferentes em diferentes épocas, em distintas tendências e em autores
diversos. Pois é justamente pensando que há muitas maneiras de se significar
que os estudiosos começaram a se interessar pela linguagem de uma maneira
particular que é a que deu origem à Análise de Discurso. (ORLANDI, 2010,
P.15.).
Nesse contexto, a Análise de Discurso, doravante AD, surge como mecanismo de
investigação tanto no meio escolar, quanto no meio social. Pêcheux (1983/1990), precursor
dessa área do saber na década de 60 do século passado, trata, em suas primeiras abordagens de
estudo, sobre o âmbito social dos discursos políticos da época. Nesse momento de constituição
da AD ele analisa o manifesto comunista, e explicita “as posições ideológicas e os lugares
sociais menos conflitantes” (MUSSALIN, 2003, p. 117.). Ainda conforme essa autora, nessa
primeira fase da AD, os analistas de discurso observavam o discurso dentro de seu contexto
discursivo, ou seja, um comunista dentro de um espaço comunista, falando de comunismo para
um grupo de comunistas, porém, se um comunista estivesse falando com um marxista ou
liberal, sua posição de sujeito mudaria, pois ele sairia de uma relação homogênea para um
conflito, então “um debate não seria, portanto, objeto da AD” (MUSSALIM, 2003, p. 118.).
Para a AD, cada processo discursivo é gerado por uma máquina discursiva.
Assim, diferentes processos discursivos (o processo de construção do
manifesto comunista e o processo de construção do manifesto liberal, por
exemplo) referem-se a diferentes máquinas discursivas, cada uma delas
idêntica a si mesma e fechada sobre si mesma. (PÊCHEUX,1983/1990 apud
MUSSALIM, 2003, p. 118.).
A máquina discursiva para a AD é, portanto, as regras pré-fixadas, às quais o sujeito é
submetido, pois, segundo esta visão, “quem de fato fala é uma instituição, ou uma teoria, ou
ideologia” (Ibid, 2003, p. 133.). O sujeito é constituído por seu meio, porém, ele não o
modifica, é assujeitado à máquina discursiva e submetida às regras que esta imprime aos
distintos enunciados.
Já no segundo momento de constituição da AD, há um deslocamento da noção de
discurso, a língua já não é vista apenas como estrutura, ela é acontecimento, ou seja, a partir do
momento em que produzimos um enunciado ela deixa de ser apenas estrutural e passa a ser
social, visto que aquele enunciado pode ter significações distintas dependendo do ambiente em
que é proferido, ou dos valores que uma determinada sociedade tem, ou dependendo, ainda, da
capacidade de interpretação que cada um tem, e, sobretudo, das formações ideológicas que nos
constituem enquanto indivíduos, e, ao mesmo tempo, nos dão a ilusão de sermos agentes livres,
únicos.
Cabe destacar, assim, que a AD não veio apenas para responder questões atreladas à
escola, mas investigar o funcionamento discursivo na sociedade, já que a partir de um
conhecimento discursivo e ideológico o sujeito torna-se mais crítico em tudo que observa. As
palavras deixam de ser um campo acabado, estático, e se tornam, agora mais do que em
qualquer outro momento da história, obscuras, polissêmicas e a serviço de distintas instituições,
pois o discurso pode ter várias significações. E é nesse contexto que a língua, de fato, ganha
atenção especial nas mais diversas áreas do conhecimento.
A AD, desse modo, nos permite trabalhar em busca dos processos de produção de
sentido e de suas determinações histórico-sociais. Isso implica o reconhecimento de que há uma
historicidade inscrita na linguagem que não nos permite pensar na existência de um sentido
literal, já posto, e nem mesmo que o sentido possa ser qualquer um, já que toda interpretação é
regida por condições de produção.
Para tanto, propõe-se um deslocamento das noções de linguagem e sujeito,
que se dá a partir de um trabalho com a ideologia. Assim, passa-se a
entender a linguagem enquanto produção social, considerando-se a
exterioridade como constitutiva. O sujeito, por sua vez, deixa de ser centro e
origem do seu discurso para ser entendido como uma construção polifônica,
lugar de significação historicamente constituído. (LEANDRO FERREIRA,
MARIA CRISTINA, 2001, p.20).
Nesse sentido, Orlandi salienta que “O sujeito acredita-se produtor do seu discurso,
mas apenas é assujeitado” (2010, p. 19.). Então, temos um sujeito que, ao acreditar que é dono
de si, dono de seus pensamentos e discursos, nada mais é do que assujeitado à ideologia
“opressora” de sua história, de sua língua. Dessa forma, o assujeitamento significa o
movimento de interpelação dos indivíduos por uma ideologia, condição necessária para que se
tornem “sujeitos” de seus discursos ao crerem que, livremente, se submetem às condições de
produção impostas pela ordem superior estabelecida, ou seja, têm a ilusão de autonomia.
Os indivíduos vivem interpelados pela ideologia, não havendo, portanto, uma
separação entre a existência da ideologia e a interpelação do sujeito por ela, o que ocorre é um
movimento de dupla constituição:
Se o sujeito só se constitui através do assujeitamento é pelo sujeito que a
ideologia torna-se possível já que, ao entendê-la como prática significante,
concebe-se a ideologia como a relação entre sujeito, língua e história na
produção de sentidos. (ORLANDI, 2010, p. 26).
A partir dessa rede de constituição, portanto, é que os diferentes sentidos são
possíveis, de acordo com a formação discursiva na qual são reproduzidos. Esses sentidos são
todos igualmente evidentes por um efeito ideológico que provoca no gesto de interpretação a
ilusão de que um enunciado quer dizer realmente o que diz.
É nesse contexto que surge o terceiro momento de percurso da AD, em que o sujeito é
constituído por várias formações discursivas, que se entrecruzam e determinam o que pode,
deve ser dito a partir de um determinado lugar social. Não existe mais a noção de sujeito
marcado pela ideia de unidade, ele passa a ser concebido como aquele que desempenha
diferentes papéis de acordo com as várias posições que ocupa no espaço interdiscursivo.
Assim, não existe mais a concepção de homogeneidade enunciativa, pois, ao se
admitir o caráter que o sujeito assume, diante das várias formações discursivas que o compõe,
por si só já se admite o caráter heterogêneo do discurso, e passa-se a incorporar a noção de
interdiscurso, ou seja, a relação que um discurso tem com outros. É a partir dessa terceira fase
de estudos da AD que empreendemos a nossa pesquisa e pretendemos lançar nosso olhar
analítico no corpus selecionado.
O interdiscurso é definido por Ferreira (2001) como:
O conjunto das formações discursivas e se inscreve no nível da constituição
do discurso na medida em que trabalha com a ressignificação do sujeito
sobre o que já foi dito, o repetível, determinando os deslocamentos
promovidos pelo sujeito nas fronteiras de uma formação discursiva. O
interdiscurso, dessa maneira, determina materialmente o efeito de
encadeamento e articulação de tal modo que aparece como o puro já dito.
Para tanto, as possibilidades de dizeres se atualizam no momento da enunciação como
efeito de um esquecimento correspondente a um processo de deslocamento da memória como
virtualidade de significações. “A memória discursiva faz parte de um processo histórico
resultante de uma disputa de interpretações para os acontecimentos presentes, e os já
ocorridos”. (Ferreira, 2001, p 22). Há uma memória inerente à linguagem e os processos
discursivos são responsáveis por fazer emergir o que, em uma memória coletiva, é
característica de um determinado processo histórico e ideológico. “O sujeito toma suas as
palavras de uma voz anônima que se produz no interdiscurso, apropriando-se da memória que
se manifestará de diferentes formas em discursos distintos”. (Orlandi, 2010, p. 47).
O deslocamento da memória se evidencia a partir das formações imaginárias, que
sempre resultam de processos discursivos anteriores (Pêcheux, 1975, p.163). As formações
imaginárias se manifestam no processo discursivo, através da antecipação, das relações de força
e de sentidos. Na antecipação, o emissor projeta uma representação imaginária do receptor e, a
partir dela, estabelece suas estratégias discursivas. O lugar de onde fala o sujeito determina as
relações de força no discurso, enquanto as relações de sentido pressupõem que não há discurso
que não se relacione com outros.
O que ocorre é um jogo de imagens dos sujeitos entre si, com os lugares que ocupam
na formação social e dos discursos já ditos com os possíveis e imaginados. As formações
imaginárias, enquanto mecanismos de funcionamento discursivo, não dizem respeito a sujeitos
físicos ou lugares empíricos, mas às imagens resultantes de suas projeções.
Ao pensarmos o discurso como uma teia a ser tecida podemos dizer que o
intradiscurso é o fio do discurso de um sujeito, é um efeito do interdiscurso
sobre si mesmo, uma vez que incorpora a relação de possibilidades de
substituição entre palavras, expressões, como se esses elementos, assim
encadeados entre si, tivessem um sentido evidente, literal. (LEANDRO
FERREIRA, MARIA CRISTINA.2001, p.23 ).
Nessa relação de possibilidades ocorre o que Orlandi (2010) denomina de polissemia,
ou seja, deslocamento, ruptura, emergência do diferente e da multiplicidade de sentido no
discurso . Tal multiplicidade garante a criatividade na língua pela intervenção do diferente no
processo de produção da linguagem, permitindo o deslocamento das regras “que afetam o
sujeito e os sentidos na sua relação com a história e língua”. (Orlandi, 2010, p. 48). Essa
possibilidade do novo criada pela polissemia é a própria razão de existência da linguagem, já
que a necessidade do dizer é fruto da multiplicidade dos sentidos. São os processos
polissêmicos que garantem que o mesmo objeto simbólico passe por diferentes processos de
ressignificação.
O sujeito em AD, portanto, é resultado da relação com a linguagem e a história e é
constituído a partir da relação com o outro, nunca sendo fonte única do sentido, tampouco
elemento onde se origina o discurso. Ele estabelece uma relação ativa no interior de uma dada
formação discursiva; assim como é determinado ele também afeta e determina a sua prática
discursiva. A incompletude é, dessa forma, uma propriedade do sujeito e a afirmação de sua
identidade resultará da constante necessidade de completude.
A constituição do sujeito, todavia, está atrelada às condições sócio-históricas, em que
a história se caracteriza a partir das relações com o poder e está ligada não à cronologia, mas às
práticas sociais. Para a AD, todo o fato ou acontecimento histórico significa e precisa ser
interpretado, é pelo discurso que a história deixa de ser apenas evolução. A historicidade,
assim, se inscreve no discurso, sendo entendida como a relação constitutiva entre linguagem e
história. Para o discurso, não interessa o rastreamento de dados históricos em um texto, mas a
compreensão de como os sentidos são produzidos. É nesse trabalho de compreensão dos
sentidos nos textos que acontece a inscrição da história na linguagem.
No subitem a seguir, falaremos sobre a noção operatória essencial desse trabalho, a
ideologia, vista a partir de seu interrelacionamento com a historicidade, apreendida em seus
efeitos de sentidos do cotidiano, de acordo com o lugar onde o sujeito se encontra, de sua
interpretação, ou seja, a ideologia como prática social, em que o sujeito é interpelado por
formações discursivas e ideológicas, o que o faz pensar ser “dono” de seu discurso.
2.1 Ideologia1
O conhecimento da dualidade constitutiva da linguagem, isto é, do seu caráter ao
mesmo tempo formal e atravessado por entradas subjetivas e sociais, provoca um deslocamento
nos estudos linguísticos até então balizados pela problemática colocada pela oposição
língua/fala e que impôs uma linguística da língua. E essa instância de deslocamento da
1Este subitem possui trechos retirados do livro BRANDÃO, Helena Hathusue Nagamine. Introdução à
Introdução à Análise de Discurso. 2°edição. 2004. p. 18-19-103.
linguagem é a do discurso. Ela possibilitará operar a ligação necessária entre o nível
propriamente linguístico e o extralinguístico.
Matizado por nuanças significativas, o termo ideologia é ainda hoje uma noção confusa
e controversa. Segundo CHAUÍ (1981), o termo “ideologia”, criado pelo filósofo Destutt de
Tracy, em 1810, na obra Elements de idéologie, nasceu como sinônimo da atividade científica
que procurava analisar a faculdade de pensar, tratando as ideias “como fenômenos naturais que
exprimem a relação do corpo humano, enquanto organismo vivo, com o meio ambiente” (p.23),
e se opunha à metafísica, à teologia e à psicologia pela exatidão e rigor científico que se
adotavam como método. Contrariando esse significado original, o termo passa a ter um sentido
pejorativo pela primeira vez com Napoleão Bonaparte, que qualifica os ideólogos franceses de
“abstratos, nebulosos idealistas e perigosos (para o poder) por causa do seu desconhecimento
dos problemas concretos” (Reboul, 1980, p.17). A ideologia passa a ser vista então como uma
doutrina irrealista e sectária, sem fundamento objetiva, e perigosa para a ordem estabelecida.
Tal conceituação, ressignificada ao longo da História, recebe nova roupagem nos
estudos da Análise de Discurso, como o conjunto de atitudes e de representações, não
individuais nem universais, que se relacionam às posições de classes e conflitos umas com as
outras. A formação ideológica é um elemento suscetível de intervir como uma formação em
confronto com outras forças na conjuntura ideológica característica da formação social.
Pêcheux (1975) afirma, ainda, que as palavras, expressões, proposições, mudam de sentido
segundo as posições sustentadas por aqueles que as empregam, sentidos esses que são
determinados de acordo com as formações ideológicas nas quais se inscrevem estas posições.
Elemento determinante do sentido que está presente no discurso e que, ao mesmo
tempo, se reflete na exterioridade, a ideologia não é algo exterior ao discurso, mas sim
constitutiva da prática discursiva. Entendida como efeito de relação entre sujeito e linguagem, a
ideologia não é consciente, mas está presente em toda manifestação do sujeito, permitindo sua
identificação com a formação discursiva que o domina. Tanto a crença do sujeito de que possui
domínio de seu discurso, quanto à ilusão de que o sentido já existe como tal, são efeitos
ideológicos.
Todo sujeito move-se em um discurso guiado pela relação que construiu com os textos
lidos em sua história de leitor, ou seja, constitui-se dentro de uma memória social de leitura.
Assim, ao ser colocado diante de um discurso, o sujeito leitor está sendo impelido a interpretá-
lo, e esse movimento de leitura estará necessariamente vinculado às condições sócio-histórico-
ideológicas que o envolvem e que determinam tanto o leitor e sua formação.
O discurso, dessa maneira, é o ponto de articulação dos processos ideológicos e dos
fenômenos linguísticos. Parte-se do pressuposto de que o discurso “materializa o contato entre
o ideológico e o linguístico no sentido de que ele representa no interior da língua, os efeitos das
contradições ideológicas” (Courtine, 1982, p.240).
A Análise do Discurso apresenta-se, nesse contexto, como uma disciplina não acabada,
em constante mudança.
A ideologia, por sua vez, nesse modo de a conceber, não é vista como
conjunto de representações, como visão de mundo ou como ocultação da
realidade. Não há, aliás, realidade sem ideologia. Enquanto prática
significante, a ideologia aparece como efeito da relação necessária do sujeito
com a língua e a com a história para que haja sentido. E como não há uma
relação termo-a-termo entre linguagem/mundo/pensamento essa relação
torna-se possível porque a ideologia intervém com seu modo de
funcionamento imaginário. São assim as imagens que permitem que as
palavras “colem” com as coisas. (ORLANDI, 2010, p. 48).
Desse modo, não existe sociedade sem ideologia, somos, a todo o momento, guiados
por nossas ideologias, pois, quando realizamos nossos discursos, usamos a língua para nos
comunicar, nossos discursos são, portanto, carregados de ideologias, que acreditamos ser
únicas, no entanto somos sujeitos à língua e à história para nos constituirmos e, assim,
produzir sentidos. Pois, conforme Althusser (1970, p.12) “a ideologia representa a relação
imaginária de indivíduos com suas reais condições de existência”.
No capítulo seguinte, abordaremos, em linhas gerais, sobre o discurso político e o
papel da mídia nos contextos sócio-discursivos, contextos esses que nos apresentam suportes
midiáticos supostamente mediadores de notícias, mas que se revelam carregados de ideologias
da classe dominante.
3 Mídia e Discurso Político
O discurso político é, provavelmente, tão antigo quanto à vida do ser humano em
sociedade. Na Grécia antiga, o político era o cidadão que, responsável pelos negócios públicos,
decidia tudo em diálogo, na praça onde se realizavam as assembleias dos cidadãos, mediante
palavras persuasivas. Daí o aparecimento do discurso político, baseado na retórica e na oratória,
orientado para convencer o povo.
Ao longo de toda a História, o discurso político faz parte das campanhas políticas,
constituído de argumentações fortemente persuasivas, com o intuito de tornar coletivas ideias e
pensamentos, sobrepondo-se aos interesses da comunidade. Em períodos eleitorais, a sua
maleabilidade permite sempre uma resposta que oscila entre a satisfação individual e os
grandes objetivos sociais da resolução das necessidades elementares dos outros.
A partir de tais reflexões, para fundamentar teórico-metodologicamente nosso trabalho,
recorremos à Análise de Discurso, pressuposto teórico central dessa pesquisa, pois esta,
conforme apresentado no Capítulo I, busca trabalhar a língua como um todo, considerando o
homem e sua História, seus sentidos e suas ideologias, seus domínios linguísticos, enfim, o
homem e sua História em movimento, falando e se transformando. Ou seja, ideias, memória,
percurso, correr, ação do homem diante da sociedade
E vale destacar que a Análise do Discurso não foi projetada para ser apenas um
simples campo de estudo, tendo também grande contribuição para o discurso político, o que a
torna um instrumento de intervenção política; segundo Courtine (2006, p.60), “o discurso
político se tornou rapidamente o principal (...) objeto da AD”, uma vez que pode desvendar a
vontade de verdade dos discursos político.
A Análise do Discurso, dessa forma, contribui significativamente para a
desmistificação de saberes postos, na medida em que coloca em cheque o conceito de verdade,
a verdade que é toda como uma construção discursiva que acontece na história e que está
entremeada por relações de saber e de poder. De acordo com Foucault (2001, p.12), “a verdade
não existe fora do poder ou sem o poder”, pois “o discurso não é simplesmente que traduz as
lutas, ou os sistemas de dominação, mas aquilo por que se luta, pelo que se luta, é o poder do
qual nos queremos apoderar” (Idem, 1999, p. 10). Portanto, tomar a palavra jamais representou
um gesto ingênuo.
Todo discurso é uma prática, uma ação do sujeito sobre o mundo, contextualizada como
um acontecimento, que funda uma interpretação e constrói uma vontade de verdade, que
seleciona e exclui sentidos. O discurso, dessa forma, longe de ser um elemento transparente ou
neutro no qual a política se pacífica, é um modo privilegiado de exercer a arte da “persuasão”
Entende-se, assim, que o discurso político tem por finalidade a persuasão do outro, quer
para que a opinião do candidato se imponha, quer para que os outros o admirem. Para isso,
necessita da argumentação, que envolve o raciocínio, e da eloquência da oratória, que procura
seduzir recorrendo a afetos e sentimentos.
Para que todas essas características do discurso ocorram com êxito, é necessário o uso
da língua, e da linguagem, como forma de manipulação da sociedade, com seus equívocos e
deslizes de sentidos.
A Análise de Discurso concebe a linguagem como mediação necessária entre
o homem e a realidade natural e social. Essa mediação, que é o discurso, torna
possível tanto a permanência e a continuidade quanto o deslocamento e a
transformação do homem e da realidade em que ele vive. O trabalho simbólico
do discurso está na base da produção da existência humana (ORLANDI, 2010,
p. 15).
Nesse sentido, pode-se afirmar que os discursos políticos estão inseridos nos contextos
reais da produção humana e são perpassados por ideologias, formadas no meio social e
influenciadas pela historicidade, o que os torna suscetíveis a mudanças no intuito de melhor
conseguir persuadir os seus eleitores.
Portanto, todo discurso político, é movido pela produção da cultura do espetáculo, o
político usa seu discurso como ferramenta para agradar seus eleitores, ele diz o que o “povo”
quer ouvir, usando os famosos jargões, que, aliás, são hoje a brevidade e a simplicidade das
proposições, acompanhadas de uma obsessão por pequenas frases, de uma argumentação
esquematizada.
Como exemplificação dessa esquematização do discurso político, recordaremos alguns
jargões usados na campanha política de 2010, dos candidatos Dilma Rousseff e José Serra. Um
dos jargões de Serra, em sua campanha, foi: “sim, nós podemos”, curto e direto. Serra indica
nesse enunciado que, junto com o “povo”, vai conseguir mudar o país, torná-lo mais justo,
enfim, em pequenas palavras, seu discurso é simples e “claro”.
Para Gregolin (2003, p.23), “a submissão exagerada dos discursos a esse modelo e, em
conseguência, sua fastidiosa monotonia, contribuíram fortemente para despertar junto ao
público o desejo de que enfim alguém que lhe fale outra forma surja inesperadamente”, e essa
forma de discurso atrai os eleitores, por ser supostamente uma forma transparente, de fácil
compreensão, distinta dos discursos longos e cansativos, e, por serem jargões curtos, são
rapidamente memorizados e multiplicados pela multidão, com o intuito principal: convencer
que o discurso é verdadeiro.
A candidata Dilma se apoiou no jargão: “Dilma 2010, é Lula outra vez”, por ser
candidata do partido do presidente então atual. Dilma se apoia na boa campanha que Lula teve
no seu mandato e “sugere” a seus eleitores que, votando nela, a sociedade continuará tendo o
candidato que luta pelo “povo”, que busca a igualdade social. Do mesmo modo, sua proposição
simplificada é cristalizada na voz da sociedade com facilidade.
Desse modo, os discursos foram gradualmente abreviados, por questões econômicas e
de tempo, para tornar mais fácil sua persuasão, mais direta. E, a partir da implantação de
dispositivos de interlocução, mobilizados fundamentalmente pela mídia, ampliou-se
sobremaneira a difusão e propagação de tais discursos. Assim, dada a importância desses
dispositivos à nossa temática, abordaremos, sucintamente, sobre um pequeno recorte deles no
subitem abaixo: rádio, TV, e jornal, bem como sobre suas influências nas coberturas das
campanhas políticas, sua historicidade e ideologias.
3.1 Mídia e Cobertura Política2
Com relação aos jornais impressos em 1822 os primeiros exemplares foram
divulgados em forma e tamanho de livros, já que a imprensa, naquele contexto, exercia também
o papel de ensinar e educar o público. O século XIX foi marcado pelo jornalismo literário, com
a presença de escritores no meio impresso. No entanto, a imprensa vinha se desenvolvendo
conforme as ordens e questões políticas. Em meio à restrição da liberdade da imprensa, com a
censura da imprensa Régia e o clima agitado, nascem os pasquins, publicados por um grupo de
jovens revoltados com os fatos e a autonomia exercida pelo poder político sobre a mídia. E vale
destacar que foi com a chegada da corte portuguesa, em 1808, que iniciou a história da mídia
impressa brasileira.
Para conquistar a população em geral, e com isso um novo regime, nos pasquins eram
utilizados textos e temas como: ao preconceito de cor, ao patriotismo e à aliciação das forças
armadas. Os periódicos irônicos, que proliferaram a partir de 1831, traziam nomes sugestivos
como Homem de cor e o Crioulinho, que tratavam de assuntos relacionados à abolição dos
escravos. Pode-se perceber, com o surgimento desses periódicos, o início das primeiras
manifestações críticas à política na imprensa brasileira.
2Este subitem possui trechos retirados dos livros abaixo: ABREU, Alzira Alves, Mídia e política no Brasil:
Jornalismo e ficção. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003. / SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa No
Brasil. São Paulo: Martins Pontes, 1983./ ZIMMER, Kerlin Schillreff, Mídia e Política: Análise do Discurso e
das Imagens da Campanha de Reeleição do Presidente Lula no Jornal Nacional. Monografia – Curso de
Graduação em Jornalismo. Unifra, 2007.
E, no final do XIX, já existia um grande número de jornais circulando,
principalmente no Rio de Janeiro, em São Paulo e nas demais capitais. As inovações no
conteúdo e no projeto gráfico foram aprimoradas com a modernidade dos equipamentos e com
a análise de periódicos anteriores.
O marco entre o fim do século XIX e o início do século XX foi o nascimento de
jornais de circulação e porte nacional, como a Folha de São Paulo, Correio do Povo e O
Globo, que permanecem até hoje em circulação. A apuração dos fatos e o consumo de
informações pelo público foram despertando o interesse das empresas e a concorrência em
divulgar primeiro um acontecimento. Vale ressaltar que os assuntos políticos sempre tiveram
espaço nos meios de comunicação, especialmente nos jornais impressos.
A exceção ocorreu apenas no período da ditadura, no século XX, já que houve pressão
e perseguição contra os jornalistas e veículos de comunicação, além de filtragem das notícias
por meio da instalação de órgãos de censura do governo militar, que atuavam dentro das
redações.
Após a abertura política e o fim da ditadura, na década de 1980, o cenário mudou, o
país percebeu que presidentes da República não dispunham mais do poder, e que o novo
poder que surgia era o da mídia.
Outro veículo, que sempre propagou notícias do setor político no Brasil, foi o rádio,
que surgiu no começo do século XX.
O rádio aparece como atração ao público e apresenta pela primeira vez a narração dos
fatos históricos, sociais e políticos, pelo meio radiofônico, em 1922. A transmissão por alto-
falantes teve como cenário de estreia a exposição internacional no Rio de Janeiro que
comemorava os cem anos da independência do Brasil.
No alto do morro do corcovado estavam dois transmissores, de 500 watts cada, que
foram usados para captar o discurso do então presidente Epitácio Pessoa e algumas palavras do
rei da Suécia, Gustavo Adolfo V, que visitava o país nesta data. Esse encontro político marcou
o nascimento da história do rádio no Brasil, em sete de setembro de 1922.
A transmissão da voz, tanto do discurso presidencial quanto da ópera O Guarany, de
Carlos Gomes, soava como algo mágico, imprescindível para o público distante do local. Em
menos de um ano a população brasileira pôde conhecer melhor a sintonia radiofônica, a partir
de 20 de abril de 1923, quando entrou no ar a rádio Sociedade do Rio de Janeiro, fundada por
Edgard Roquete Pinto e Henrique Charles Morize. Esses considerados pais da radiodifusão no
Brasil.
Nos primeiros anos, o rádio era visto como um instrumento de transformação educativa
e de propagação de informações ao público, conferências científicas, músicas eruditas e
cobertura dos fatos eram temas abordados com frequência nas primeiras transmissões da rádio
Sociedade do Rio de Janeiro.
Após a Revolução de 1930, nasceu um Brasil mais urbano e moderno. Essa revolução,
que foi um movimento armado e político para impedir que Júlio prestes assumisse a
Presidência da República, trouxe transformações econômicas e políticas que contribuíram para
que o meio radiofônico deixasse de ser um canal educativo e passasse, além de buscar o lucro,
a transmitir programas ligados ao governo. O presidente Getúlio Vargas, que assumiu o
governo na década de 1930, conseguiu, através de um decreto, o poder concessório dos canais
de rádio e a criação de um programa oficial obrigatório que funcionava como um porta voz do
governo.
Ainda dentro do enfoque político, a primeira vez que o rádio foi utilizado para
incentivar, em grande escala, a presença do povo nos comícios e o fluxo de voluntários às
frentes de combate foi em 1932. Getúlio Vargas soube, como ninguém, usar o veículo para a
construção de sua imagem como guia e pai dos trabalhadores. O rádio serviu como instrumento
de aproximação do governo e dos trabalhadores. E, logo depois da grande difusão da
radiofonia, surge a televisão no Brasil.
O surgimento da televisão no século XX, mais especificamente em 1950, cativou a
atenção dos telespectadores, pela união de som e imagem ao mesmo tempo, que até então não
existia no país. O novo meio de comunicação nasceu com o intuito de representar a sociedade,
de todas as classes sociais e faixas etárias, e de transmitir ao público os acontecimentos que
passavam pelo mundo, através de narração dos fatos e representação da imagem.
Durante o estado novo e após a Segunda Guerra Mundial, o desenvolvimento industrial
começou a exercer grandes influências na economia brasileira. Com a bandeira de uma
política nacionalista, o presidente Vargas investiu na indústria e na produção de bens de
consumo duráveis, foi nesse período de crescimento industrial que nasceu a televisão no país.
A união do som e da imagem pôde ser visualizada no dia dezoito de setembro de 1950,
em São Paulo. A TV Tupi Difusora, com o apoio do empresário Assis Chateaubriand, foi a
primeira estação no Brasil a ter transmissões regulares. Francisco de Assis Chateaubriand
Bandeira de Melo construiu a maior rede de comunicações da história do país, com diários e
emissoras associados.
Nos primeiros anos, a televisão enfrentou dificuldade para se propagar. Apenas
famílias de classes médias e altas tinham condições de comprar um aparelho televisivo, já que o
preço do receptor era muito alto. Além do mais, esse meio de comunicação não conseguia atrair
anunciantes de imediato. Os programas televisivos tinham como referência e formato os
programas radiofônicos.
Durante o movimento de 1964, a mídia televisiva também se inseria, tal como os
demais meios de comunicação, nos processos políticos com os recursos e limitações da
censura, o que fazia com que o regime definisse os alinhamentos e não raro o próprio destino
político, ideológico e editorial dos veículos.
Em 1985, a constituição da nova república possibilitou que a mídia televisiva
abordasse temas políticos com mais frequência e com menos restrições. A rotina e o discurso
dos candidatos também passaram a ser apresentados constantemente pelos telejornais no
período das campanhas eleitorais. Isso só se tornou possível pelo avanço do suporte técnico da
televisão. Os novos equipamentos, videoteipe e câmeras modernas, permitiram a entrada do
repórter ao vivo e também possibilitaram ao público acompanhar o dia-a-dia dos candidatos em
período eleitoral.
E, assim, com o passar dos anos a mídia televisiva se solidificou perante a sociedade e
se transformou num meio de comunicação muito acessível, transmitindo e acompanhando fatos
importantes para o desenvolvimento e informação da sociedade, sendo esses anunciados como
seus principais objetivos.
No entanto, ao lado de tais objetivos, imprescindíveis para a rápida propagação de
notícias, verifica-se outra obscura função da mídia moderna, a de ser instrumento de
propagação da teatralidade midiática, mais especificamente de um grande espetáculo voltado
para as campanhas eleitorais.
Não é possível fazer uma oposição entre o espetáculo e a atividade social
efetiva: esse desdobramento também é desdobrado. (...) A realidade surge no
espetáculo, e o espetáculo é real. Essa alienação recíproca é a essência da
sociedade existente. (DEBORD, 1997, p. 15)
A mídia é então um dos meios mais importantes para a proliferação dessa alienação
das ações humanas, dentre elas as desenvolvidas por políticos e pelas políticas públicas. Com
o avanço tecnológico, tudo é captado em instantes e televisionado para todo o mundo. Isso
também vale para o que ocorre nas campanhas políticas.
Nesse contexto, o discurso político é, conforme Gregolin (2003, p.3), o pilar básico
para a verdadeira “cultura do espetáculo”, entranhada na sociedade (pós) moderna, que
transforma tudo e todos em objeto de consumo midiático.
Ou seja, esse espetáculo midiático é a afirmação da aparência, e a afirmação de toda a
vida humana. Dessa forma, a sociedade se torna objeto principal desse espetáculo, ao sermos
corrompidos por imagens, que julgamos reais, ao vermos um debate político. Pela mídia
somos iludidos, por uma realidade que nos é imposta, pois a mídia se torna um porta voz da
política, para com a sociedade, espetacularizando discursos feitos por determinado candidato.
As mídias e a publicidade não trouxeram o espetáculo e as imagens para a
política. Tudo isso já estava lá. O exercício do poder, ou sua conquista,
sempre compreendeu uma dimensão imaginária. A política é uma questão
tanto de imagens e representações quanto de ética e de relações de força.
(ACHACHE, 1990, p.146)
Nesse sentido, a mídia surge como veículo de propagação de ideologias políticas que
têm o intuito de mostrar à sociedade a “realidade”. Para tanto, se munem de truques
midiáticos e de discursos clichês, que, nas campanhas eleitorais, visam persuadir eleitores e
levá-los ao esquecimento das insatisfações referentes às atividades desenvolvidas por
políticos em suas legislaturas. Vale destacar, assim, que a mídia, em seus mais variados
suportes, tem, em muitas situações e contextos políticos, evidenciado uma tendência à
teatralização, ao espetáculo, utilizando-se dos mais escusos argumentos de marketing político.
Na política, as imagens tornam-se muito sofisticadas e complexas porque
precisam garantir, simultaneamente, estabilidade e permanência ao poder e sua
adaptabilidade, flexibilidade e dinamismo para responder as conjunturas. A
competição pública não se faz entre partidos, ideologias ou candidatos, mas
entre imagens que disputam valores como “credibilidade”, “confiabilidade”,
“respeitabilidade”, “inovação”, “prestígio” (GREGOLIN, 2003, apud CHAUÍ,
1992, p. 386).
Ou seja, para as estratégias de marketing político tudo se transforma num jogo, de
sentidos, de palavras e, principalmente, de imagens, estratégias tais que garantem o espetáculo,
para aplausos e delírio da sociedade que, muitas vezes, acena passivamente e colabora para essa
teatralização.
Dessa forma, ao reduzir-se tudo em imagem e em redes flutuantes que invadem nossa
percepção, somos hipnotizadospelas cenas, áudios e formas de textos impressos, que são
incontáveis vezes repetidas, tornando-nos, assim, numa sociedade alienada, que apenas
reproduz “verdades” e discursos prontos, que se cristalizam em nosso cotidiano.
3.2 Mídia Política e Imagem
A mídia é um fato consumado nas campanhas eleitorais. Hoje a mídia é o instrumento
principal para que se realize uma boa campanha, seja ela publicitária e principalmente política,
pois hoje vivemos em uma sociedade totalmente ambientada pela mídia. É nesse contexto que a
política se inscreve:
Como teatro: de um lado, no palco, a atuação, a representação (no duplo
sentido que ela aí comporta); de outro, na plateia, a passividade espectadora,
ou talvez, a circunstância das ações no limite do aplauso ou da vaia; e de
repente..., ainda, a emergência de um terceiro agente que, do palco, movido
aparentemente pelas injunções de um instransponível “princípio de
realidade”, atribui-se o papel de revelar, ao público, cujo olhar detém-se tão-
só à superfície, e não coincidente entre os efeitos de verossimilhança ali
apresentados e a verdade que lhes subjaz. (GREGOLIN, 2003, p. 58)
A política, a partir desse viés do espetáculo, apresenta-nos políticos, que, juntamente
com a mídia, se utilizam de recursos que fazem seus discursos parecerem “verdadeiros”. Dentre
tais recursos, priorizam problemas que são recorrentes em nossa sociedade e que envolvem
fatos da realidade, como a fome, o desemprego, a moradia, enfim, “já-ditos” que são sempre
retomados em interdiscursos atualizados e que levam os eleitores a crerem que ao votar em
determinado candidato ter-se-á uma sociedade melhor.
“Em suma, há um certo encontro entre a fome midiática de produzir “verdades” e a
vontade espectadora de comer “verdades” (GREGOLIN, 2003, p.62). O que a sociedade
acredita ser “verdade”, no entanto, é superficial, são discursos que historicamente se repetem
em todas as campanhas eleitorais, mas, por acreditar que dessa vez será “diferente” , fica na
plateia aplaudindo todo o teatro midiático.
Os efeito de sentidos, todavia, são muitos e esses, influenciados pela mídia, são
facilmente “aceitos” pelo “povo”.
A produção de sentido nas notícias dos fatos se realiza a partir de sentidos de
um jogo de influências em que atuam impressões dos próprios jornalistas
(eles também sujeitos históricos), dos leitores e da linha política dominante
no jornal. Por outro lado, há eventos políticos produzidos para se imporem
como notícia. Nesse caso, a imprensa torna-se um veículo usado por
determinados grupos/partidos para ganhar visibilidade (ou notoriedade)
política. (MARIANI, 1998, p.60).
Desse modo, jornalistas, repórteres, equipes editoriais inteiras, mesmo apresentando
ideologias, culturas e preferências destoantes das dos suportes midiáticos em que atuam, são, de
certa forma, “obrigados”, a concordarem com a ideologia pré-estabelecida pelos donos do
veículo de comunicação ou a dos grupos/partidos que o mantém economicamente, exigindo em
troca a veiculação de notícias conforme os seus interesses políticos, com o intuito de persuadir
e manipular os efeitos de sentidos levados à sociedade.
Assim, conforme Pinto:
A chamada liberdade de expressão é na verdade um dos grandes mitos
democráticos do nosso tempo e, para a maioria das pessoas, o acesso às
formas mais prestigiosas de gêneros discursivos dá-se apenas como
participantes que ocupam as posições subjetivas subordinadas, com poder de
expressão muito limitado. A quantidade de gêneros de discursos que uma
pessoa domina e utiliza na sua prática de produção e/ou consumo de textos,
quando o conteúdo o exige, constitui uma espécie de capital econômico-
financeiro propriamente dito, e que condiciona o reconhecimento do seu
status em cada evento comunicacional de que participa e (re) define sua
posição dentro das escalas de poder na sociedade. (PINTO, 2002, p. 54.
Grifos do autor)
Então, a “liberdade de expressão”, de acordo com o autor, é imposta pelos detentores do
poder econômico, visto que cada classe social recebe os gêneros discursivos conforme sua
escala de poder, ou seja, quanto menor a renda, menos poder. A mídia, nesse contexto, é
utilizada para, além de propagar e perpetuar tal mito, tornar o discurso político
ideológico“verdadeiro” para cada classe, isto é, a “verdade” é imposta a partir da classe
dominante.
E nas campanhas eleitorais os candidatos fazem seus discursos voltados para que
classe? Um olhar mais apurado nos leva a constatar que há preferência pela classe de menor
capital econômico financeiro. Os recursos midiáticos, imagéticos e discursivos são elaborados
levando em consideração, fundamentalmente, pessoas que mal sabem escrever o próprio nome,
que moram geralmente em lugares sem saneamento básico, luz, água, dentre outras
necessidades imediatas, e prometem, então, em seus jargões, “vida melhor”, “mudança já”,
“igualdade a todos”, enunciados que remetem à memória discursiva e que apenas reforçam a
teatralização que se tornou a política brasileira.
Grandes grupos/corporações econômicas e políticas, que aparecem quase sempre
intrinsecamente ligados, são responsáveis por levarem suportes midiáticos a “venderem” tais
discursos como se estivessem fazendo uma propaganda publicitária: “compre”, “irá mudar a
sua vida”, “é a melhor escolha a fazer”, “não arrisque seu dinheiro, faça a escolha certa”. Dessa
maneira, assim como somos manipulados pela mídia para comprarmos roupas, carros ou outro
acessório qualquer “compramos” determinado partido.
Na realidade, diante de uma produção racionalizada, expansionista,
centralizada, espetacular e barulhenta, posta-se uma produção de tipo
totalmente diverso, qualificada como “consumo, que tem como característica
suas astúcias, seu esfarelamento em conformidade com as ocasiões, suas
‘piratarias’, sua clandestinidade, seu murmúrio incansável, em suma, uma
quase-invisibilidade, pois ela quase não se faz notar por produtos próprios
(onde teria o seu lugar?) mas por uma arte de utilizar daqueles que lhe são
impostos”. (CERTEAU, 2000, p.94)
A política, portanto, se tornou algo para consumo, um instrumento manipulável por
usuários. Escolhemos o que mais nos parece remeter à “verdade”, o teatro que mais convencer
ganhará o meu precioso voto, ou, talvez, aquele que melhor pagar.
A compra e venda de votos se torna cada vez mais frequente nas campanhas políticas,
a sociedade se corrompe ao aceitar propina dos políticos, se tornando participante dessa
espetacularização política.
Dentre as estratégias usadas por políticos nas campanhas políticas, destaca-se ainda o
oferecimento do emprego como objeto de consumo.
O sistema produtor de mercadorias, movido pela finalidade de criar valores
de troca, tem um intrínseco caráter destrutivo: elimina a força humana de
trabalho, destrói a natureza e coisifica e fetichiza o universo do trabalho, da
cultura e dos valores. (SARGENTINI, 2001, p. 125)
Como os índices de desemprego no Brasil permanecem altos, os candidatos políticos
elencam dentre suas prioridades o “emprego”, objeto de desejo de significativa parte da
população no Brasil. O Brasil insere-se nas estatísticas que mostram o desejo de vultuosa parte
dos brasileiros de entrar no mercado de trabalho ou de voltar a ele.
Há de se considerar que o percurso que levou os candidatos a elegerem o
emprego como um objeto de desejo de consumo dos brasileiros passa pelo
olhar midiático que se debruça sobre a questão. Ao construir a história do
tempo presente, a mídia faz repercutir a situação do mercado de trabalho por
meio de slogans e de frases de efeito que alternam o pessimismo e o
otimismo. (GREGOLIN, 2003, p. 127)
Ou seja, a mídia faz o jogo de imagens e discursos usando o “emprego”, jogo que foi
rapidamente apreendido pelos candidatos políticos, que o utilizam a seu favor e refinam ainda
mais o grande espetáculo. Vale ressaltar que, ao falarmos de mídia, não podemos deixar de lado
a imagem, pois é ela que juntamente com o meio midiático faz produzir sentidos.
A imagem é também uma da formas de comunicação com o outro, com a sociedade,
nas imagens encontramos intertextualidades, e enunciadores, tal como nos textos verbais.
Conforme Gregolin “as imagens têm o poder de remeter-se a temas passados, os inseridos a
temas da atualidade na memória presente do interlocutor”. (2003, p. 114). A imagem também
pode ser percebida como discurso, e, ao interpretá-la pelo olhar e não através da palavra,
apreende-se a sua matéria significante em diferentes contextos. Através dessa interpretação, é
possível produzir outras imagens, outros textos, produzidos pelo espectador a partir das
linguagens verbal e não-verbal.
A interpretação de textos não verbais efetiva-se, por esse efeito de sentidos que se institui
entre o olhar, a imagem e a possibilidade do recorte a partir das formações sociais em que se
inscreve tanto para quem produz o texto, neste caso a mídia, quanto para o telespectador, a
sociedade. Nesse sentido, o discurso político é pensado e elaborado pela significação do discurso
linguístico e pela constituição das imagens, transmitidas na televisão.
Do ponto de vista simbólico, a observação da imagem possibilita o
desenvolvimento de uma atividade de produção de significação. Se, de um
lado, essa eficácia simbólica favorece a liberdade de interpretação o
conteúdo legível ou dizível da imagem pode variar conforme as leituras, de
outro, faz com que a imagem comporte um programa de leitura, uma vez que
assinala um certo lugar a quem a observa. (GREGOLIN, 2003, p.118)
Portanto, a linguagem é sempre um instrumento necessário à análise da imagem. “A
análise de discurso defende a idéia de que qualquer imagem, mesmo isolada de qualquer outro
sistema semiótico, deve sempre ser considerada como sendo um discurso” (PINTO, 2002, p.
33). As imagens são um dos tipos possíveis de análise, não há signo sem contexto, visto que a
mera existência de um signo já indica seu contexto.
Entramos nesse mundo de aparências, no mundo da ideologia e do poder,
que é o mundo da linguagem, e no qual estamos condenados a “viver”. Ao
me referir com insistência ao fato de a análise de discurso ser sempre
dependente do contexto, tinha em mente que todo processo produção-
circulação-consumo dos sentidos de um texto passa por estas duas
dimensões, contitutivas do que se chama semiose social. (PINTO, 2002,
p.44)
Conforme Foucault, “através de signos as coisas tornam-se distintas, elas conservam-
se na sua identidade, desfazem-se e se ligam. Como exemplo, pode-se dizer que os símbolos
pertencem aos signos representativos e os índices ou indícios aos signos não representativos”
(1966, p.87).
As imagens, mais fortemente de maneira afetivo-racional, estão diretamente ligadas à
sensibilidade, enquanto a linguagem apresenta mais fortemente efeitos cognitivos,
reproduzindo variados significantes que servem de base para a produção do significado e que se
constituem nos contextos históricos e ideológicos.
No terceiro e último capítulo desse trabalho, a seguir, pretendemos, a partir de nossas
considerações analíticas, mostrar como os processos de alienação imagética e discursiva se
efetuam e que tessituras se imprimem nos êxitos político e midiático. Para tal intento,
selecionamos recortes textuais veiculados pela mídia nas campanhas eleitorais de 2010, dos
partidos PT e PSDB.
4 A cultura do espetáculo:caminhos percorridos
Nesse capítulo lançamos um olhar analítico sobre a historicidade e as ideologias que
constituem e mobilizam os partidos PSDB e PT. Cabe ressaltar que iniciamos nossas reflexões
levando em consideração os seguintes questionamentos: os partidos estão realmente usando as
ideologias partidárias? Ou realizam as campanhas eleitorais valendo-se de estratégias da
espetacularização ?.
4.1 Breve relato histórico e ideológico dos partidos PSDB e P3: vieses
reflexivos.
Ambos os partidos, PSDB e PT, têm uma trajetória muito importante no Brasil, cada
um com seus objetivos e ideologias, algumas parecidas e outras totalmente opostas. A seguir,
explanaremos sobre, um pouco da história e ideologias dos partidos e de seus candidatos à
presidência concorrentes na campanha de 2010.
O Partido dos Trabalhadores (PT) é um partido político brasileiro. Fundado em
1980, é um dos maiores e mais importantes movimentos de esquerda da América do Sul.
Composto essencialmente por dirigentes sindicais, intelectuais de esquerda, representantes
católicos e da teologia da libertação. O PT foi fundado com um viés socialista, democrático.
Com o golpe de 19644, a espinha dorsal do sindicalismo brasileiro, o CGT (Comando Geral
dos Trabalhadores), que reunia lideranças sindicais tuteladas pelo Ministério do Trabalho, foi
dissolvido enquanto os sindicatos oficiais sofriam intervenção governamental.
O PT surgiu, assim, rejeitando tanto as tradicionais lideranças do sindicalismo oficial,
como também procurando colocar em prática uma nova forma de socialismo democrático. Foi
oficialmente reconhecido como partido pelo Tribunal Superior de Justiça Eleitoral no dia 11
de fevereiro em 1982. Seu símbolo é uma estrela vermelha de cinco pontas, com a sigla PT ao
centro. Seu código eleitoral é o 13.
A sua organização estrutural pautou-se em formulações dos intelectuais marxistas,
mas também continha em seu bojo, desde o nascimento, ideologias espontâneas dos
sindicalistas que constituíram o seu núcleo duro organizacional, ideologias estas que
apontavam para uma aceitação da ordem burguesa, e cuja importância tornou-se cada vez
maior na medida em que o partido adquiria bases materiais como máquina burocrática-
eleitoral.
Dilma Rousseff, última candidata à presidência pelo PT, ocupou os cargos de
3 Este subitem contém informações retiradas dos sites abaixo:
PSDB, história. Disponível em: www2.psdb.org.br/índex.php/PSDB/historia. Acesso em 13/06/2011. Às 20:14.
PT, história. Disponível em: www.pt.org.br. Acesso em 13/06/2011. Às 20:30. 4 O Golpe Militar de 1964 designa o conjunto de eventos ocorridos em 31 de março de 1964 no Brasil, e que
culminaram, no dia 1 de abril de 1964, com um golpe de estado que encerrou o governo do presidente João
Belchior Marques Goulart, também conhecido como Jango. Entre os militares brasileiros, o evento é designado
como Revolução de 1964 ou Contrarrevolução de 1964. O golpe estabeleceu um regime alinhado politicamente
aos Estados Unidos da América e acarretou profundas modificações na organização política do país, bem como
na vida econômica e social.
secretária da Fazenda da Prefeitura de Porto Alegre (1986-89), foi presidente da Fundação de
Economia e Estatística do Estado do Rio Grande do Sul (1991-93) e secretária de Estado de
Energia, Minas e Comunicações em dois governos: Alceu Collares (PDT) e Olivio Dutra
(PT).
Filiada ao partido dos trabalhadores (PT), desde 2001, coordenou a equipe de Infra-
Estrutura do Governo de Transição entre o último mandato de Fernando Henrique Cardoso e
o primeiro de Luiz Inácio Lula da Silva, tornando-se membro do grupo responsável pelo
Programa de Energia do governo petista. Seu tema, nas eleições de 2010, era saúde, educação
e cidadania, uma linha de proposta parecida com a do ex- presidente Luiz Inácio Lula da
Silva. Foi a candidata que venceu as eleições em 2010, marcando a história da política
brasileira como a primeira mulher eleita presidente em nosso país.
O Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) também é um partido político
brasileiro. Foi fundado em 25 de junho de 1988 por importantes figuras do cenário político
brasileiro, como o ex-presidente (à época senador) Fernando Henrique Cardoso . Atualmente,
o PSDB pode ser considerado o segundo maior partido político do Brasil. Foi criado
originalmente com o objetivo de representar a social democracia no Brasil. Entre as principais
propostas originais do partido encontram-se o enxugamento da máquina, a instituição do
parlamentarismo nos planos políticos e uma economia de mercado regulada pelo Estado, com
participação mais livre das empresas privadas e de investidores.
A ideologia desse partido é sustentada por alguns pontos principais: defesa
intransigente da democracia, descentralização administrativa, crescimento econômico
sustentável com distribuição de renda, reforma política que fortaleça os partidos, aproxime o
eleitor de seus parlamentares e reduza as possibilidades de corrupção. Seu símbolo é o tucano
nas cores azul e amarelo, e, por esta razão, seus membros são chamados de tucano .
José Serra, último candidato à presidência pelo PSDB, em 1986 elegeu-se deputado
federal pelo MDB (Movimento Democrático Brasileiro) e dois anos depois acabou derrotado na
disputa à Prefeitura paulista, já filiado ao recém-criado PSDB. Em 1990, retornou à Câmara
dos Deputados e, em 1994, elegeu-se senador. No ano seguinte, assumiu o Ministério do
Planejamento. Deixou o cargo em 1996 para disputar pela segunda vez a Prefeitura de São
Paulo. Ficou em 3º lugar. José Serra em 01 de outubro de 2006 foi eleito governador do estado
de São Paulo.
Serra tem uma carreira política extensa, secretário estadual de planejamento, deputado
federal constituinte, senador, ministro do planejamento, ministro da saúde, prefeito de São
Paulo, governador de São Paulo e foi um dos fundadores do partido PSDB em junho de 1988.
Sua proposta temática nas eleições de 2010 era trazer melhorias para a saúde e para a educação.
Foi derrotado, no segundo turno, pela candidata Dilma Rousseff.
Nas exposições ideológicas e interdiscursivas acima, de ambos os partidos, é possível
verificar como as ideologias e os “já-ditos” estão impregnados no discurso e na história dos
candidatos à presidência do Brasil de 2010. Ou seja, há um sistema ordenado de ideias ou
representações de normas e de regras. De acordo com Chauí:
A ideologia propriamente dita, isto é, o sistema ordenado de ideias ou
representações e das normas e regras como algo separado e independente das
condições materiais, visto que seus produtores, os teóricos, os ideológicos,
os intelectuais não estão diretamente vinculados à produção material das
condições de existência. E, sem perceber, exprimem essa desvinculação ou
separação através de suas idéias. (CHAUÍ, 1980, p.65.).
Nesse sentido, as ideias das classes dominantes, em cada época, são sempre as ideias
dominantes, isto é, é essa a classe que representa a força material dominante. Cada candidato
defende a sua ideologia, sua produção material e cognitiva, porém essa (re) produção parte tão
somente dos “pensantes”, aqueles que instauram as ideias, e as distribuem a toda a sociedade,
tornando-se, desse modo, ideias dominantes, o saber para poucos, o saber que manipula por
meio da persuasão, pois se utiliza de argumentos que convencem e fazem surtir o “efeito” de
realidade.
Nas campanhas políticas a ideologia é usada como fator principal, ponto necessário
para mostrar à sociedade que os discursos são “verdadeiros”, passando a ser um instrumento de
dominação da sociedade, porque o dominante faz com que suas ideias passem a ser ideias de
todos, por meio da ilusão e, principalmente, da persuasão.
A produção de ideias, de concepções da consciência liga-se, a princípio,
diretamente e intimamente à atividade material e ao comércio material dos
homens, como uma linguagem da vida real. Consequentemente, a
observação empírica tem de mostrar empiricamente e sem qualquer
especulação ou mistificação a ligação entre a estrutura social e política e a
produção. (MARX E ENGELS, 1965, p. 14.).
Diante da breve exposição de fatos sócio-históricos e ideológicos feita acima, vale
destacar que divergências e/ou semelhanças, que se apresentam na constituição desses dois
partidos, serão retomadas nas exposições analíticas das formulações de notícias selecionadas do
corpus de suportes midiáticos com o propósito de compará-las, ou seja, verificar como a
ideologia é caracteriza nos fios discursivos e se ela se mantém fiel aos moldes originários dos
partidos, e é isso que pretendemos mostrar no subitem seguinte.
4.2 Marcas discursivas e imagéticas: considerações analíticas
O jogo de imagem e discurso político que vem ocorrendo historicamente e
ideologicamente, com o passar dos anos se solidificou e se tornou a indústria do espetáculo, a
sociedade toda se tornou dependente da mídia. O teatro se tornou papel principal nas
campanhas, conforme observaremos em alguns recortes retirados de textos verbais e
imagéticos da Campanha Política de 2010, dos partidos PT e PSDB, que tinham como
concorrentes Dilma Roussef e José Serra.
Nas campanhas eleitorais, dos partidos, Dilma e Serra se utilizaram de discursos e imagens,
usando, fundamentalmente, a mídia para apresentar suas propostas políticas, e realizar seu
“marketing” político.
Dilma tinha como proposta prioritária de campanha dar continuidade aos trabalhos do
então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tais como, ênfase ao desenvolvimento social,
eliminar a pobreza extrema até 2014, ampliação do Bolsa Família5 , assegurar acesso à água
potável. Serra batia na tecla da saúde e da educação como prioridades, ambos repetindo “já
ditos” em campanhas anteriores e se valendo de artimanhas midiáticas para suas atuações
políticas.
Vários acontecimentos marcaram a campanha política dos dois partidos, mas, os que
mais repercutiram efeito na mídia foram os que traziam a espetacularização como pano de
fundo. Dentre eles, destacamos “a bolinha de papel”, que atingiu o candidato do PSDB José
Serra, quando foi participar de uma caminhada, no bairro Campo Grande no Rio de Janeiro,
no dia 20 de outubro de 2010. Durante a caminhada de agenda política, Serra foi atingido por
uma “bolinha”, que foi arremessada, supostamente, por militantes do PT.
5O Bolsa Família é um programa de transferência direta de renda com condicionalidades, que beneficia famílias
em situação de pobreza e de extrema pobreza. O Programa integra o Fome Zero que tem como objetivo
assegurar o direito humano à alimentação adequada, promovendo a segurança alimentar e nutricional e
contribuindo para a conquista da cidadania pela população mais vulnerável à fome.
O Bolsa Família atende mais de 13 milhões de famílias em todo território nacional. A depender da renda familiar
por pessoa (limitada a R$ 140), do número e da idade dos filhos, o valor do benefício recebido pela família pode
variar entre R$ 32 a R$ 306.
A partir deste fato dá-se início a um dos maiores espetáculos já vistos na política
brasileira, promovido pelos mais distintos suportes midiáticos e assistido pela ávida plateia
espectadora, nós. Os efeitos produzidos por este acontecimento foram muitos, surgiram,
então, várias narrativas e sentidos para o mesmo fato.
Destacamos, dentre tais narrativas e suportes midiáticos, a reportagem, que se encontra
nos anexos desse trabalho, intitulada “Hipótese de que bolinha de papel atingiu Serra
precisaria ter cumplicidade na farsa de várias pessoas, inclusive de médico sério e de hospital
renomado”, publicada dia 21/10/2010 às 17: 31 na coluna de Ricardo Setti 6no site da Revista
Veja . É importante ressaltar que é notório e público que a Revista não esconde sua antipatia
pelo partido PT.
A Revista Veja é uma revista semanal brasileira, publicada pela Editora Abril. Foi
criada em 1968, pelos jornalistas Victor Civita e Mino Carta. Atualmente, com uma tiragem
superior a um milhão de exemplares, é a Revista de maior circulação no Brasil. A Revista
trata de temas do cotidiano da sociedade brasileira e do mundo, como política, economia,
cultura e comportamento; tecnologia, ecologia e religião por vezes também são abordadas.
Possui seções fixas de cinema, literatura, música, entre outras variedades, elaboradas e quase
sempre assinadas por jornalistas.
A reportagem em questão apresenta a sua preferência ideológica partidária já nas
marcas discursivas (materialidade linguística) do título. Ao enunciar a possível “farsa” do
episódio como ‘hipotética’, a Revista utiliza como principal recurso discursivo-argumentativo
a dúvida, ou seja, procura estimular o leitor, por meio de marcadores discursivos explícitos ou
implícitos, a coadunar com a ideologia desse suporte jornalístico, ideologia que,
historicamente, mantém-se fiel ao estado de direita e, dessa forma, apresenta,
indubitavelmente, preferência pelo candidato do PSDB José Serra .
A estratégia discursivo-argumentativa da dúvida é empreendida ao longo do texto e se
mostra em outras marcas como com o verbo “ser”, grafado em letras maiúsculas, em “SERÁ
QUE TODO MUNDO MENTIU?” Ou ainda em “Serra, então, será um mentiroso?”. O
próprio colunista, nesse caso representante da ideologia da Revista, responde às duvidas
elencadas para auxiliar o raciocínio do leitor, isto é, nos sentidos que devem ser apreendidos,
ao enunciar que “como sempre se deve conceder às pessoas o benefício da dúvida”.
6Imprensa, a hipótese da bolinha de papelão. Disponível em: veja.abril.com.br/blog/Ricardo-
setti/tag/imprensa/Page/2. Acesso em 14/06/2011. Às 18:15.
A dúvida se faz presente também nos seis questionamentos expostos pelo autor, ou
seja, ele apresenta uma relação considerável de pessoas renomadas e instituições que seriam,
no caso do evento ter sido ‘forjado’, “cúmplices da articulação ‘enganosa’, dentre as quais
políticos e assessores, o Hospital Samaritano e o Dr. Jacob Kligman. Nesse sentido, o
“médico sério” e o “hospital renomado” vêm em defesa da ideologia que se expõe.
No último questionamento, que, como os demais, remete o leitor à ampla defesa do
candidato Serra, tem-se, no enunciado, marcas ainda mais persuasivas “quem garante que ele
não sofreu o impacto de um objeto capaz de causar dano e que não tenha sido filmado pelo
cinegrafista?”Ou seja, quem ‘garante’? Você, leitor, ‘garante’?
Em contrapartida à preferência ideológica manifestada explicitamente pela Revista
Veja, apresentamos outra reportagem (também em anexo), intitulada “A armação de Serra” 7 ,
publicada também no dia 21/10/2010 às 15:47 na Revista ISTOÉ e que, por ser matéria de
capa, não aparece assinada, o que remete o texto à responsabilidade da Revista. Vale ressaltar
que, antes do texto verbal, apresenta-se o ‘polêmico’ vídeo apresentado no dia anterior na
rede televisiva SBT e que, supostamente, revela a farsa do objeto que teria atingido o
candidato Serra.
A revista ISTOÉ, é publicada pela Editora Três, fundada em 1973, por Domingo
Alzugaray, seus temas são voltados para moda, cultura, economia, saúde, educação e
política. Ultimamente, está escrevendo reportagens sobre os escândalos políticos.
Nessa reportagem, ao contrário da estratégia discursivo-argumentativa utilizada
pela Revista Veja, que mobilizou operadores textuais de dúvida, ISTOÉ se vale de
proposições afirmativas e, tal como o conteúdo imagético e discursivo veiculado pelo SBT,
apresenta o acontecimento como teatro midiático, e, dessa forma, manifesta simpatias ao
partido de esquerda, PT.
Dentre as formulações apresentadas, que reforçam a tendência assertiva
dessa produção textual e que dão à reportagem o tom de jornalismo de denúncia, destaca-se:
“(...) chega a ser de má fé imaginar que uma armação do tipo poderia passar despercebida
pelos olhos digitais”. A consonância com a ideologia petista é expressa explicitamente no
enunciado final do texto “O episódio deu grande visibilidade ao PSDB, mas acabou não
7 Armação de Serra. Disponível em: istoe.com.br/reportagens/paginar/a+armação+de+serra. Acesso em
01/12/2011. Às 15:42.
convencendo o eleitor e virando motivo de piadas na internet”, em que a marca discursiva
adversativa “mas” remete exatamente ao sentido contrário de que o ‘episódio’ tenha dado
‘visibilidade ao PSDB’, e, ainda, por meio da ironia subsequente, encaminha os efeitos de
sentido à teatralização do fato.
Enfim, as ideologias distintas que envolvem as produções textuais dos dois suportes
midiáticos analisados são apenas uma pequena amostra do teatro midiático que se tem
desenvolvido nas campanhas no cenário político atual. Como complemento dessa cultura do
espetáculo que move a mídia nacional temos as imagens, recurso imprescindível para tornar
os fatos “verdadeiros”.
O candidato do PSDB, José Serra, no Rio, após ter recebido o telefonema, logo
após ter sido atingido.
As imagens acima foram tiradas do momento exato em que ocorreu o fato, no dia
20/10/2010. São elas que permitem ao jornalismo de denúncia questionar a veracidade do
episódio, visto que o candidato só demonstra sentir ‘dor’ posteriormente ao telefonema, que
foi recebido após o “ objeto” ser arremessado, (como podemos perceber na foto acima), só
depois do telefonema é que Serra coloca a mão na cabeça, parecendo ter se machucado, e
então é levado até um hospital e logo liberado.
Nos dias subsequentes vários suporte midiáticos veiculavam o acontecimento,
suscitando questionamentos sobre o que realmente teria acertado Serra. As hipóteses mais
reproduzidas pelos distintos veículos de comunicação giraram em torno de uma fita isolante e
mesmo da “bolinha de papel”. Enfim, a arena estava armada e o espetáculo midiático nos fez
assistir ao mais desastroso teatro em torno “da bolinha de papel”, num jogo de ofensas entre
os dois maiores partidos brasileiros, PT e PSDB, ao qual assistíamos atônitos, esperando o
próximo episódio.
Outras imagens discursivas que foram mobilizadas como integrantes do espetáculo,
que se promoveu nas campanhas eleitorais de 2010, foram as fotos e aparições televisivas de
Dilma ao lado do então presidente Lula (Luiz Inácio Lula da Silva). As imagens foram
exploradas em razão da grande popularidade e aceitação do governo de Lula à época.
No âmbito discursivo Dilma afirmava que continuaria seguindo os passos de Lula,
com o intuito de levar seus eleitores a acreditarem que, votando em Dilma, estariam
automaticamente votando em Lula, ou seja, seria um governo de continuidade . Ao convencer
seus eleitores a votarem nela, por influência de outro candidato, Dilma usa-se perfeitamente
da teatralidade, um grande jogo midiático.
O discurso, juntamente com a imagem de Dilma e Lula, concretiza o espetáculo
midiático da persuasão, pois somos influenciados por nossas experiências e realizações, o que
nos torna reféns de discursos superficiais, que a mídia insiste em nos mostrar a todo o
momento.
A imagem a seguir, que foi amplamente veiculada nas mídias à época da campanha,
representa o pilar basilar das estratégias traçadas pelo ‘marketing’ político do partido PT. Lula
e Dilma juntos, lado a lado, ambos com um sorriso estampado que demonstra que tudo está
bem; é a representação de um governo que se aproxima do povo, o que também é verificável
nas vestimentas, visto que Lula usa uma roupa informal, uma camisa azul e um casaco bege,
sem o seu “uniforme” tradicional de presidente, terno e gravata, e ao seu lado a também
defensora da luta pela igualdade social, Dilma.
José Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, em foto oficial para o site de Dilma.
Outro fator importante a ser observado é a cor vermelha no traje de Dilma, cor de seu
partido e que foi muito utilizada durante as aparições midiáticas feitas pela candidata.
São resultados analíticos como esses que nos permitem afirmar que a mídia é, ela
mesma, o próprio “poder” na sociedade, pois ela dita regras, comportamentos, tendências , e
no século XXI, com mais força e estratégias , a política e os políticos, por meio de suportes
midiáticos, mobilizam formações ideológicas e efeitos de sentidos que propagam falsas
verdades.
E com isso percebemos, também, que ambos os partidos rompem com suas ideologias
partidárias, pois, a partir do momento em que os partidos PSDB e PT, e seus respectivos
candidatos, deixam de lado as temáticas que mobilizam historicamente e ideologicamente
suas bases constitutivas, eles se assemelham muito mais do que divergem, visto que o que
interessa é o resultado das eleições, o poder.
Para tanto, tudo vale, principalmente o uso da persuasão através da teatralidade
midiática, o que reforça o espetáculo da mídia por meio de interdiscursos.
O jogo midiático é, portanto, produto que dificilmente sairá de linha, estará presente
em tudo. A língua, objeto principal para tal realização, se tornou produto de venda e compra,
e isso ocorre historicamente, porém agora com a força da mídia:
Em vista da heterogeneidade constitutiva do discurso da mídia, pois nele
falam o jornalista, o fotógrafo, o cartunista, o chargista, o cientista político, o
sociólogo, o historiador, entre outro, história, memória e esquecimento são
acionados na produção dos sentidos vinculados aos textos dessa ordem
discursiva. Assim, nessa prática, a história é, muitas vezes, simbolicamente
manipulada pela memória ou pelas memórias coletivas. Por conta do
confronto ideológico que se constitui em torno das celebrações oficiais,
alternaram-se história e memória (tradição, mito) do descobrimento, ora para
sustentar o ideário de nação moderna e independente, ora para denunciar a
falácia dessa imagem. (GREGOLIN, 2003, p. 117).
Ou seja, no atual jogo político discursivo e imagético história, memória e ideologia se
fundem e se imbricam numa teia de “já-ditos” e que, na condição de assujeitados, nos fazem
ser literalmente plateia do grande espetáculo político que vive a sociedade brasileira.
5 CONCLUSÃO
Analisar o discurso político midiático não foi tarefa fácil, pois a mídia, como vimos, é
heterogeneamente constituída e nela se fundem falas distintas e “já-ditos” que se manifestam
em textos e imagens, os quais produzem diversos significados e sentidos. O discurso e o modo
de conceber a linguagem são modificados continuamente, tanto pelo contexto, como pela
história, pela ideologia e pelo interdiscurso. Assim, a mídia, ao ganhar espaço e projeção no
século XX, tornou-se uma grande articuladora e formadora de opinião da sociedade.
Ao compreendermos a necessidade de analisar os efeitos midiáticos na vida social,
iniciamos nosso trabalho de pesquisa, munidos pelo aporte teórico da Análise do Discurso de
linha francesa, com o intuito de verificar as possibilidades da língua enquanto propagadora
de sentidos. Logo, foi-nos possível vislumbrar, além dos enunciados e seus equívocos, a
persuasão política, as influências tecidas através das campanhas políticas, a manipulação, e,
fundamentalmente, a teatralização através da mídia.
Tivemos, então, como resultados analíticos que, nos discursos políticos, tanto a
materialidade linguística quanto a imagética apresentam marcas que evidenciam as ideologias
às quais se filia cada suporte midiático, marcas que ‘estrategicamente’ propõem evidenciar a
“verdadeira” realidade.
A política e os políticos filiados a ela usam a mídia para conseguir persuadir seus
eleitores, diante de discursos inflamados, impregnados de duplos sentidos, realizando a
teatralização política. Dessa forma, a política brasileira, atualmente, se tornou palco do mais
prestigioso espetáculo, o qual faz, inclusive, em nome do poder que deve ser conquistado a
qualquer custo, deixar de lado a ideologia partidária, para se concentrar em ‘derrubar’ o
candidato concorrente, mesmo que por meio das mais escusas acusações verbais, tais como os
fatos que assistimos na Campanha Eleitoral de 2010 entre os partidos PSDB e PT.
Nota-se, então, que a mídia tem uma certa predileção em destacar os escândalos
políticos, que, diferentemente de programas políticos que afastam o espectador pela apatia e
descrédito, estes estimulam o interesse de audiência pelo sensacionalismo que promovem. A
aceitação passiva que essa mídia de massa tem promovido demonstra, ainda, o estado de
alienação e de acriticidade dos brasileiros. Destarte, vale destacar, que vivemos em uma
sociedade capitalista, em que geralmente o dinheiro e a “compra” de votos estão acima de
qualquer princípio, e, infelizmente, o “povo” vende facilmente o voto por pensar
individualmente.
Após analisarmos os recortes da Campanha Política de 2010, do PSDB e PT, podemos
afirmar, então, que os questionamentos que fizemos no início do capítulo III foram sendo
respondidos ao longo das considerações analíticas que fizemos, os recortes nos mostraram que
a campanha eleitoral utilizou-se, como recurso principal, de estratégias de espetacularização.
Contudo, respondidas tais inquietações, outras mais foram surgindo, o que comprova a
complexidade do tema. Dentre elas destacamos: será que não é hora de valorizarmos o nosso
voto e votarmos com mais, muito mais consciência? Não seria importante participarmos de
movimentos que denunciem a corrupção? Inquietações estas que podem ser respondidas em
um outro momento de análise.
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Armação de Serra. Disponível em: istoe.com.br/reportagens/paginar/a+armação+de+serra.
Acesso em 01/12/2011. Às 15:42.
Reportagem da revista Istoé, site:
istoe.com.br/reportagens/paginar/a+armação+de+serra.
A armação de Serra
Vídeo mostra que candidato foi atingido por uma bola de papel e simulou
ferimento
ISTOÉ
Confira o vídeo exibido no SBT:
A tumultuada caminhada do candidato à presidência José Serra no Rio de Janeiro na
quarta-feira 20 acabou rendendo visibilidade negativa para o PSDB. Durante o ato, que
contou com a participação de cabos eleitorais do PT e de Serra, o tucano foi atingido por um
objeto na cabeça. Nota do PSDB apontou que se tratava de “um objeto pesado”.
No entanto, vídeo feito por cinegrafistas do SBT mostra que o objeto, que parece ser
leve, se assemelha a uma bola de papel amassado. No momento do impacto, o candidato não
esboça nenhuma reação de dor. Simplesmente olha para o objeto que caiu no chão à sua
direita e continua a caminhada. O vídeo também aponta que, só minutos depois, após receber
um telefonema, é que o candidato começa a demontrar sinais de que o objeto o havia
machucado. Em plena era da informação, na qual somos constantemente vigiados por
câmeras, chega a ser de má fé imaginar que uma armação do tipo poderia passar
desapercebida pelos olhos digitais. O tiro saiu pela culatra.
Alegando tontura e náuseas, Serra foi levado para o hospital Samaritano, no Botafogo, e
submetido a uma tomografia. O médico que o atendeu, Jacob Kligerman, recomendou 24
horas de repouso. O candidato, então, cancelou o restante de sua agenda no Rio. O episódio
deu grande visibilidade ao PSDB, mas acabou não convencendo o eleitor e virando motivo de
piadas na internet.
Reportage, da revista veja, site
veja.abril.com.br/hipótese-de-que-bolinha-de-papel-atingiu-serra
Hipótese de que bolinha de papel atingiu Serra precisaria ter
cumplicidade na farsa de várias pessoas, inclusive de médico
sério e de hospital renomado.
Circula na Web, e em certos veículos eletrônicos, a versão de que o
presidenciável tucano José Serra não foi atingido na cabeça por objeto capaz de causar
qualquer dano, durante caminhada no bairro de Campo Grande, no Rio, e sim por uma
bolinha de papel.
A versão se baseia em trecho de um vídeo da rede de televisão SBT a respeito
dos incidentes de ontem, ocorridos quando militantes do PT entraram em confronto com
militantes do PSDB.
O SBT mostra que Serra não parece ter sentido nada de especial ao ser atingido
pela bolinha de papel, e que só começou a mostrar sinais de que algo o havia
eventualmente ferido depois de atender a uma ligação em seu celular. Ele, então, estaria
simulando algo mais grave do que ocorreu para se fazer de vítima.Pode ser, claro. Em
política no Brasil parece que vale tudo.
SERÁ QUE TODO MUNDO MENTIU? — Como sempre se deve conceder às
pessoas o benefício da dúvida, porém, este blog propõe que o leitor se faça as seguintes
perguntas:
1. Serra, então, será um mentiroso? Um homem que foi prefeito de São Paulo,
senador da República, ministro e governador do maior estado do país seria um
mentiroso? Para faturar simpatias, usou a mera bolinha de papel que bateu em sua
cabeça para fazer teatro e mentiu à imprensa dizendo que, depois do impacto, sentiu
náuseas e tontura?
2. Todos os políticos e assessores que estavam à sua volta e confirmaram o fato
aos jornalista também mentiram?
3. O respeitado Hospital Samaritano, no bairro de Botafogo, para onde Serra foi
levado após o tumulto em Campo Grande, não apenas submeteu o candidato a uma
tomografia sem qualquer necessidade como também particip0u da farsa?
4. Como se teria combinado com a direção do hospital a montagem da farsa? Por
telefone? Por algum emissário que lá chegou antes do candidato? Os vários médicos do
hospital envolvidos no processo, então, foram também mentirosos? São todos parte de
uma conspiração para prejudicar o bom nome dos militantes petistas?
5. O dr. Jacob Kligman, respeitado médico que atendeu Serra, mostrou aos
jornalistas o local do impacto e mencionou os sintomas apresentados — dr. Kligman,
durante mais de quatro anos presidente do Instituto Nacional do Câncer, membro da
Academia Nacional de Medicina, do Colégio Brasileiro de Cirurgiões e do American
College of Surgeons — então arriscou sua reputação e sua honra pessoal participando
de uma farsa? Sim, ele foi secretário de Saúde do ex-prefeito Cesar Maia (DEM) e
mantém relações de amizade com Serra — daí a razão do presidenciável tê-lo
procurado. Isso fará do médico um canalha?
6. Finalmente, além da bolinha de papel que atingiu Serra, segundo o vídeo do
SBT, quem garante que ele não sofreu o impacto de um objeto capaz de causar dano e
que não tenha sido filmado pelo cinegrafista?
O radicalismo e o ódio presentes na atual campanha presidencial precisam ser
pelo menos temperado pela moderação e pelo bom senso.