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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ PATRÍCIA DOS SANTOS DOTTI DO PRADO DE AUTODIDATAS A CIENTISTAS: A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DA FACULDADE DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS DO PARANÁ, 1938-1960 CURITIBA 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

PATRÍCIA DOS SANTOS DOTTI DO PRADO

DE AUTODIDATAS A CIENTISTAS: A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO CURSO DE

CIÊNCIAS SOCIAIS DA FACULDADE DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS DO

PARANÁ, 1938-1960

CURITIBA2017

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

PATRÍCIA DOS SANTOS DOTTI DO PRADO

DE AUTODIDATAS A CIENTISTAS: A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO CURSO DE

CIÊNCIAS SOCIAIS DA FACULDADE DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS DO

PARANÁ, 1938-1960

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisitoparcial à obtenção do título de bacharel em Ciências Sociais,Curso de Ciências Sociais do Setor de Ciências Humanas daUniversidade Federal do Paraná. Orientadora: Profª. Drª. Simone Meucci.

CURITIBA2017

RESUMO

Este   trabalho buscou compreender  o  sentido  da   fundação e   funcionamento  do curso  de

ciências sociais na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná (FFCLPR), no período de

1938 a 1960.   A partir do trabalho em arquivo nos arquivos do Setor de Educação e de Ciências

Humanas  da  Universidade  Federal  do  Paraná,   bem como do  Centro  de  Estudos  Bandeirantes,

identificaram­se quatro variáveis para a compreensão do curso de ciências sociais: os currículos, as

cadernetas de frequência e matéria lecionada das cadeiras, os professores e os alunos. Com isso,

dividiu­se esta pesquisa em dois eixos: uma relativa a seus agentes, isto é, os docentes e os alunos

do curso, e outra referente ao conhecimento elaborado e entendido como relativo às ciências sociais

no período ­ expresso nas cadernetas e currículos do curso.

Fundado em uma Faculdade  cujo  cerne  modernizador  estava  em orientar  um progresso

intelectual,   cultural  e  moral   ao  Paraná,   ao  mesmo  tempo  que  capaz  de   integrar   e  conservar  a

tradição   e   história   do   estado,   tanto   o   curso   quanto   a   própria   FFCLPR   expressaram   um

tensionamento   constante   entre   modernidade   e   tradição,   ciência   e   religião.   Sem   um   projeto

intelectual e pedagógico pensado integradamente, os 10 primeiros anos de funcionamento do curso

de   ciências   sociais,   além   de   intermitentes,   diplomaram   apenas   cinco   alunos.   Suas   aulas   eram

conduzidas sobretudo por professores contratados, comumente ex­alunos da FFCLPR próximos dos

catedráticos.  Apesar   de   seu   currículo   ser   centralizado   nas   cadeiras   de   sociologia,   econômia   e

estatística,   em   um   contexto   de   escassez   de   recursos,   humanos   e   econômicos,   a   cadeira   de

antropologia foi a protagonista do curso.   Atrelado a esta percepção de modernização, o curso de

ciências sociais, no período analisado, não produziu uma reflexão racional e metodologicamente

orientada sobre a realidade social paranaense, salvo a exceção da antropologia.

Palavras­chave: Institucionalização das ciências sociais. Paraná. Faculdade de Filosofia. 

LISTA DE SIGLAS

ABA: Associação Brasileira de Antropologia

CDV: Centro Dom Vital

CEB: Centro de Estudos Bandeirantes

CEPA: Centro de Estudos e Pesquisas Arqueológicas

CG: Conselho Geral

CTA: Conselho Técnico Administrativo

DEAN: Departamento de Antropologia

ELSP: Escola Livre de Sociologia e Política

FFCL­USP: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo

FFCLPR: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná

FFCLSB: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São Bento 

FFSB: Faculdade de Filosofia de São Bento 

FNFi: Faculdade Nacional de Filosofia

ICS: Instituto de Ciências Sociais

IEUSP:  Instituto de Educação da Universidade de São Paulo

ISEB: Instituto Superior de Estudos Brasileiros

MAAP: Museu de Arqueologia e Artes Paranaenses

SCH: Setor de Ciências Humanas

SE: Setor de Educação

UBEE: União Brasileira de Educação e Ensino

UdB: Universidade do Brasil

UDF: Universidade do Distrito Federal

UDN: União Democrática Nacional

UFPR: Universidade Federal do Paraná

UFRGS: Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UP: Universidade do Paraná

USP: Universidade de São Paulo

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AGRADECIMENTOS

Em muitos aspectos, este trabalho só tomou corpo e se constituiu pelos esforços, atenção e

generosidade de diversas pessoas que me acompanharam nos mais variados momentos de minha

graduação e durante minha vida. 

Em especial, agradeço meus irmãos Fernanda, Fabiana e Felipe e minha mãe, Miriam, pela

contínua  paciência   com  meus  questionamentos   e   sarcasmo   sobre   tudo   aquilo  que  pudesse   ser

criticado  através  das   ciências  sociais.  Sou  grata  pelo  encorajamento  e   suporte  que   sempre  me

deram.

Ao professor Paulo Guérios, agradeço imensamente a recepção e confiança no grupo de

pesquisa e na iniciação científica, quando ainda não nos conhecíamos. Sua orientação e conselhos

durante   estes   dois   anos   foram   essenciais   na   constituição   do   meu   jovem   ponto   de   vista   de

pesquisadora; creio serem aspectos que permanecerão em minha trajetória como cientista social.

À professora Simone Meucci sou grata por todo entusiasmo e inquietação instigado desde o

início de minha graduação; todo olhar e percepção do mundo de uma maneira curiosa, interessada e

séria   que   ensinou.   Igualmente   importantes   seus   conselhos   e   orientações   neste   trabalho,

especialmente para que chegasse a esta forma final. 

A Simone e Paulo,  em conjunto,  agradeço a  confiança  em mim para  o  exercício  desta

pesquisa e disposição por esta particular forma de orientação, que muitas vezes os conjugou. Além

de toda paciência, atenção e dedicação com minhas dúvidas e ansiedades. Muito obrigada.

À Carla e Luiza, às quais sou permanentemente grata e feliz pela amizade, hoje e sempre.

À Gabriella e Gustavo, agradeço a companhia constante e conversas que começaram com o

Loureiro Fernandes e terminaram em uma grande amizade. 

À  Sabrina e Henrique,  agradeço a gigantesca paciência,   incentivo e otimismo com meu

trabalho e gênio. 

A João Paulo e Maria Magdalena, agradeço a vivência e companheirismo que, iniciados em

Portugal, permanecem até hoje.

À Sheron, Tábata, Kamille, Solano e Bruno sou grata pelas conversas e compreensões; pela

parceria e companhia que só me fortalecem.

E a meu pai, que não viu este trabalho ficar pronto, retribuo todo amor e carinho de sempre.

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SumárioCAPÍTULO 1.......................................................................................................................................8

1.1INTRODUÇÃO...............................................................................................................................8

1.2 FUNDAMENTOS TEÓRICOS....................................................................................................13

1.3 CIÊNCIAS SOCIAIS REGIONAIS.............................................................................................17

1.4 ARQUIVOS.................................................................................................................................25

2CAPÍTULO 2: OS AGENTES DA MODERNIZAÇÃO.................................................................30

2.1 PROJETOS DE MODERNIZAÇÃO...........................................................................................30

2.2 CATOLICISMO E MODERNIDADE.........................................................................................35

2.2.1 O movimento de restauração católico.......................................................................................35

2.2.2 O Centro de Estudos Bandeirantes............................................................................................37

2.3 OS MODELOS DE UMA FUTURA INSTITUIÇÃO.................................................................42

2.3.1 A Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná.............................................................44

2.4 CIÊNCIAS SOCIAIS COMO ENSINO SUPERIOR: DISCENTES E DOCENTES.................47

2.4.1. Ciências sociais: um curso intermitente...................................................................................51

2. 4.2. Os professores.........................................................................................................................53

2.4.3. Os professores contratados: estratégias de desenvolvimento...................................................57

3CAPÍTULO 3: PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO....................................................................65

3.1 OS CURRÍCULOS DO CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DA FFCLPR.................................65

3.1.1.Os programas das disciplinas....................................................................................................67

3.1.2 O curso especial de didática......................................................................................................70

3.2 AS CADERNETAS DE FREQUÊNCIA E MATÉRIA LECIONADA: AS CIÊNCIAS SOCIAISDO PARANÁ.....................................................................................................................................72

3.2.1 A dinâmica das aulas.................................................................................................................80

3.3 CIÊNCIA E RELIGIÃO: O PAPEL DA FILOSOFIA.................................................................83

3.3.1 A SOCIOLOGIA INTEGRAL..................................................................................................85

CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................................89

REFERÊNCIAS.................................................................................................................................91

FONTES.............................................................................................................................................96

APÊNDICE 1……………………………………………………………………………………….97

APÊNDICE 2……………………………………………………………………………………….97

APÊNDICE 3……………………………………………………………………………………….98

APÊNDICE 4……………………………………………………………………………………...100

APÊNDICE 5……………………………………………………………………………………...100

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CAPÍTULO 1

1.1 INTRODUÇÃO

Sou aluna de graduação do curso de ciências sociais da UFPR. Desde 2016 tenho, pois, meu

próprio curso como objeto de estudo. Inicialmente, o investiguei como sugestão de pesquisa de meu

orientador de iniciação científica, o professor Paulo Guérios; do início do ano para cá, passei a

desenvolvê­lo como objeto de exame do meu trabalho de conclusão de curso, sob orientação da

professora Simone Meucci. Meu objetivo, com efeito, foi compreender o sentido da fundação e

funcionamento do curso de ciências sociais da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná

(FFCLPR) de 1938, data de sua fundação, até 1960.

Como discente do curso que tenho como objeto, tomá­lo como centro de minha investigação

foi,   por   variadas   vezes,   conflituoso.   Pois   no   início   não   raro   tendi   a   procurar   minha   própria

graduação nos documentos, bibliografias e informações acerca do curso de ciências sociais de 1938,

bem como me inclinei a julgamentos de valor tendo por base a minha experiência, considerada

como   adequada   por   mim,   quanto   a   uma   gradução   em   ciências   sociais.   Por   outro   lado,   me

interessava perceber as origens das ciências sociais da UFPR como praticadas e pensadas hoje na

graduação a que tive acesso. Portanto, eu particularmente me inclinei, do ponto de vista do meu

interesse,   a   examinar   a   formação   do   curso   que,   quase   oito   décadas   depois,   frequentei.   A

preocupação em não constituir uma interpretação que explicasse a minha própria formação foi, com

efeito, um dos meus maiores desafios.

Foi preciso, pois, que eu constituísse solidamente meu problema de pesquisa e elaborasse

um olhar sociológico sobre meu objeto para que pudesse, então, examinar com maior clareza o

sentido  do curso durante suas  primeiras  décadas  de funcionamento.  Assim,  a  partir  de  leituras

iniciais1 de trabalhos acerca da institucionalização das ciências sociais no Brasil, tive meu primeiro

contato com a construção de problemas de pesquisa sociológicos/antropológicos que se debruçaram

por entender, sobretudo, a sociologia e a antropologia no Brasil – discutirei alguns deles à frente.

Com isso, constituí uma visão acerca da criação dos cursos de ciências sociais brasileiros

articulada a projetos intelectuais, assim como vinculada a processos sociais e políticos mais amplos

que davam ensejo a suas fundações. O pensamento sociológico passava a ser, pois, uma demanda na

1Aqui me refiro aos trabalhos Condicionantes do desenvolvimento das ciências sociais no Brasil (1930­1964) e Poruma sociologia das ciências sociais, ambos de Sérgio Micelli (1989); A gênese de uma intelligentsia no Brasil ­ Osintelectuais e a política no Brasil, 1920 a 1940, de Luciano Martins (1986); Entre o povo e a nação ­ intelectuais epolítica no Brasil, de Daniel Pecaut (1989); As ilusões da liberdade: a escola Nina Rodrigues e a antropologia no Brasil,de Mariza Côrrea (1998).

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interpretação das dinâmicas brasileiras a partir da década de 1930. Ainda que as origens de um

pensamento social brasileiro datem de período anterior, foi nos anos de 1930 que se consolidou sua

constituição acadêmica, com a fundação do curso de ciências sociais da Faculdade de Filosofia,

Ciências e Letras de São Paulo (FFCL­USP) em 1934. 

Nesse sentido,  o caso da própria fundação da Universidade de São Paulo (USP) é

bastante elucidativo. Como salientou Daniel Pecaut (1989), a criação da instituição, apenas dois

anos após a derrota da Revolução Constitucionalista, fez parte de um projeto de composição de uma

nova elite dirigente, capaz de efetivar e conduzir a modernização do país por meio do conhecimento

intelectual   (1989,   p.   30).   Assim,   cabia   aos   cientistas   sociais,   em   uma   leitura   positivista,   a

organização da sociedade através da apreensão empírica de suas categorias de funcionamento. Pois

havia uma legitimidade no discurso dos cientistas sociais que privilegiava e concedia vigência às

suas interpretações e atuações na e sobre a história do país, em que as universidades eram os centros

de produções destas análises. 

Refletindo sobre a fundação da FFCLPR, busquei  mapear os grupos envolvidos em sua

fundação e seus objetivos. Com isso, intentei compreender a quais demandas respondeu a fundação

de uma faculdade de filosofia no Paraná, estado então marginal nas esferas político, cultural e social

do país. Para tanto, o trabalho de Névio de Campos, Intelectuais paranaenses e as concepções de

universidade (1892­1950), de 2006, foi uma fonte fundamental. 

Fundada em 1938, a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná  foi a primeira

instituição de ensino do tipo no estado. Seu projeto,  conforme compreendeu Névio de Campos

(2006), foi produzido através do diálogo entre concepções de ensino científicas e católicas, a fim de

modernizar o estado por meio da reflexão filosófica pura e desinteressada e não apenas técnica,

como praticada majoritariamente até aquele momento no Paraná; buscavam, com efeito,   tanto o

apoio, quanto a construção de alicerces intelectuais para o futuro do estado. Ao longo de minha

pesquisa foi crucial, pois, compreender a natureza desta singular relação entre ciência, catolicismo e

modernidade na FFCLPR.  

Os agentes envolvidos em sua fundação eram sobretudo os intelectuais de confissão católica

do Centro de Estudos Bandeirantes (CEB) e os professores das Faculdades de Medicina, Engenharia

e Direito do Paraná e Escola Agronômica do Paraná. Posteriormente, coube a tais sujeitos, somados

a outros de elevadas personalidades política e intelectual no estado, as cátedras da Faculdade.

Em especial,  o CEB teve forte atuação na fundação e manutenção da instituição; assim,

empreendi uma análise mais aprofundada acerca do Centro de Estudos Bandeirantes. Esse foi um

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centro   cultural   católico   fundado   em   1929   na   cidade   de   Curitiba;   articulado   às   premissas   do

movimento de renovação católico, o CEB era um espaço de discussão para questões filosóficas e

cientifícas orientadas através da doutrina neotomista. Por seu turno, o neotomismo significava a

possibilidade de conjunção entre ciência e religião através de uma perspectiva da metafísica divina

como explicação integral da realidade da vida,  isto é,  das questões terrenas e ultraterrenas,  e a

ciência   como   explicação   parcial   dos   fenômenos   empíricos.   Dada   a   parcialidade   da   ciência,   a

compreensão   integral   da  vida   requeria   o   conhecimento  metafísico.  Com  efeito,   foi   a   filosofia

neotomista, em diversas e distintas percepções por seus agentes2, que possibilitou a construção da

relação entre ciência e religião na FFCLPR – discutiremos em detalhe à frente. 

O curso de ciências sociais da instituição esteve no rol das primeiras graduações ofertadas

pela FFCLPR à altura de sua fundação. Assim, foi também estabelecido através de relações sociais

articuladas entre os agentes das faculdades isoladas do Paraná e do CEB; em especial, membros do

CEB ocuparam quase metade das cátedras do curso. Uma vez apurados tais agentes, por meio do

trabalho em arquivo nos arquivos do CEB e dos Setores de Educação (SE) e Ciências Humanas

(SCH)  da UFPR, iniciei um processo de constituição das dinâmicas e aspectos formais do curso,

tais como currículos,  programas das disciplinas, aulas,  corpo docente,  entre outros.   Outrossim,

identifiquei também grande parte dos professores e alunos do curso no período de meu recorte de

pesquisa; tratava­se, a partir de então, de apreender a trajetória institucional destes agentes.

Neste primeiro momento investiguei, no arquivo do SCH, 79 cadernetas de frequência e

matéria lecionada, espécies de diários de classe em que constavam os registros de aula das cadeiras

do currículo  do  curso  de  ciências  sociais.  Nos  arquivos  do  CEB,  examinei  as  atas  de   reunião

ordinária dos livros II e III, além dos documentos da Coleção José Loureiro. E no arquivo de SE,

examinei   sobretudo   as   atas   dos   concursos   para   livre­docência   e   catedŕatico,   contratação   de

professores substitutos e as atas dos exames do curso de ciências sociais. Posteriormente, de volta

ao arquivo do SE, analisei as atas da Congregação, do Conselho Geral e do Conselho Técnico da

FFCLPR; além de analisar os anuários da FFCLPR e da Universidade do Paraná de 1941 a 1960.

Com base nesta documentação, reconstituí e apreendi parte do conhecimento construído e entendido

como relativo às ciências sociais, de forma de, posteriormente, acessar o sentido que o curso tinha

para os agentes envolvidos em seu funcionamento. Para tanto, lancei mão de alguns pontos das

sociologias de Karl Mannheim e Max Weber, como será discutido à frente.

2Digo diversas e distintas, pois os variados agentes que atuaram na fundação e manutenção da FFCLPR e do curso deciências   sociais   expressaram   diferentes   compreensões   e   aplicações   da   filosofia   neotomista   em   suas   trajetóriasintelectuais, como veremos.

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A análise das fontes sugeria, com efeito, a constituição de estratégias e tensões na Faculdade

acerca de seus recursos econômicos e humanos, demandas legislativas, subvenções financeiras e

projetos de ensino. Durante toda pesquisa, portanto, analisei e revi as posições, projetos e relações

entre os agentes envolvidos no curso e na Faculdade e a constituição prática de suas ações. Visava

compreender em que medida seus projetos se implementaram na FFCLPR. Não entrarei aqui em

detalhes, pois isso é objeto de análise no texto, porém houve um programa, composto e executado

pelo CEB sobretudo, para a FFCLPR. Buscava­se, com efeito, constituir uma Faculdade capaz de

orientar   a   modernização   e   desenvolvimento   intelectual   do   Paraná,   tendo   por   fio   condutor   o

pensamento neotomista. Ou seja, constituir uma sólida reflexão intelectual capaz de ordenar um

progresso moral – conforme os princípios cristãos, ao mesmo tempo que reintegrasse e mantivesse a

união entre história e tradição paranaense. Pois se compreendia que o avanço técnico, possibilitado

sobretudo pelos projetos de centros de ensino politécnicos, conduzia à uma modernização apenas

técnica   e   profissional,   relegando   a   segundo  plano   a   reflexão   intelectual   e   sua   importância  no

desenvolvimento moral e cultural do estado, quiçá do país.

Compreender,  pois,  em que medida os catedráticos do curso compartilhavam do projeto

neotomista   mais   amplo  da   Faculdade,   assim   como  o   efetivaram  a   partir   de   suas   cadeiras   foi

essencial ao longo desta pesquisa. Para além de um exame da execução ou não de tais objetivos,

busquei identificar nas relações sociais do curso a constituição de estratégias, vínculos e propósitos

pensados pelos agentes, mormente os catedráticos, em suas conexões entre si e com a instituição.

Com efeito, embora o projeto da Faculdade se sustentasse pelo neotomismo, por variadas vezes

foram identificadas relações sociais e estratégias entre os catedráticos e seus alunos que não se

pautavam estritamente pela religião católica e, sim, tinham por objetivo o desenvolvimento de um

conhecimento científico.

Nesse   sentido,   importava   compreender   os   conteúdos   desenvolvidos   e   pensados   como

referentes às ciências sociais do período. Isto é, o que se ensinava e como se ensinava. Para tanto, a

análise  das  cadernetas  de  frequência e  matéria   lecionada  foi  essencial.  Como sugeriu o exame

destes documentos, o sentido que o curso assumiu na FFCLPR foi o de elaborar um conhecimento

acerca  do  mundo social   fundamentado na  sociologia  e   economia,  que  desvendasse  e   indicasse

possibilidades de ação e estratégias de desenvolvimento ao Paraná. Entretanto, tratava­se de um

conhecimento que não questionasse as bases assentadas de poder no estado, que não inquirisse

racionalmente a realidade social com métodos e análise – salvo o caso da antropologia. Pois o curso

de ciências sociais, de maneira geral, remetia ao ideal de modernização perseguido pela FFCLPR,

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qual seja, de produção de conhecimento intelectual puro, desinteressado e moral, que assegurasse a

integração   entre   história   e   tradição   paranaenses   face   aos   avanços   técnicos   e   científicos   e   as

mudanças sociais do período.

A origem da FFCLPR a partir  de um objetivo tensionado entre modernidade e  tradição

implicou em conteúdos de cunho confessional no curso de ciências sociais. Pois não raro houve

debates acerca das encíclicas católicas Rerum Novarum, Divini Redemptoris e Quadregesimo Anno

em sala de aula e a pedido do diretor da Faculdade. No curso de ciências sociais em particular, o

debate e ensino da sociologia integral, como elaborada pelo intelectual católico Alceu Amoroso

Lima, estabeleceu o curso em uma particular posição de inovação e tradição.

Para responder a essas questões e outras tantas que foram formuladas através da análise dos

documentos e leitura de bibliografia, empreendi uma série de retornos aos arquivos do CEB, SE e

SCH da UFPR, além de uma entrevista com um ex­aluno e posteriormente docente do curso de

ciências sociais da instituição, Constantino Comninos. Meus referenciais teóricos foram as teorias

de Max Weber e Karl Mannheim, pois busquei compreender a cadeia de ações e a constelação de

agentes que  agiram na direção da fundação e funcionamento do curso, assim como as bases sociais

do conhecimento de ciências sociais  aqui  construído.  O trabalho de arquivo, por seu turno, foi

constituído a partir do método de etnografia em arquivo, conforme desenvolvido pela antropóloga

Olivia Cunha.  Debaterei os fundamentos teóricos e metodologia à frente.

Este trabalho foi dividido em três capítulos, em que o primeiro contém quatro tópicos. Além

da referente introdução, em seguida articulei uma discussão acerca de meus referenciais teóricos,

visando indicar em quais sentidos e para quê acionei suas teorias; no segundo tópico, trouxe um

debate, a partir do método da etnografia em arquivo, acerca de minha experiência nos arquivos do

SE, SCH e do CEB – busquei, pois, descrever e interpretar algumas das singularidades de suas

práticas arquivísticas e apresentar os principais documentos tidos como fontes nesta pesquisa. Por

fim,   o   tópico   três   constou   do   estado   da   arte   desta   pesquisa,   cuja   finalidade   principal   foi

compreender   as   principais   dinâmicas   de   fundação   dos   cursos   de   ciências   sociais,   atentando

sobretudo para estados fora do eixo Rio­São Paulo, de modo a localizar esta investigação como

contribuição aos estudos de formação de uma ossatura acadêmica das ciências sociais no Brasil.

O segundo capítulo, centrado nas relações sociais entre os agentes da FFCLPR, formou­se

de cinco tópicos. No primeiro, discorri sobre os anseios de modernização presentes no Paraná desde

a fundação da Universidade do Paraná até a constituição das primeiras reuniões para instituição da

FFCLPR,   em 1937.  O  próximo   tópico,   na   esteira   do   argumento,   tratei   do  Centro  de  Estudos

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Bandeirantes, isto é, de sua composição interna, projeto e finalidades, buscando compreender por

quê tal centro se imiscuiu na fundação de uma faculdade de filosofia. O terceiro   tópico, por seu

turno, teve como norte a própria Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná em seu modelo

institucional de fundação e principais anseios. Uma vez examinados, busquei no topico seguinte,

finalmente, compreender o curso de ciências sociais, constituindo meu quinto e último item deste

capítulo. Tal compreensão foi composta por uma divisão analítica entre discentes e docentes do

curso,   em   suas   relações   sociais   e   elaboração   de   estratégias   de   ensino,   mormente   através   dos

professores contratados.

Por fim, o terceiro capítulo foi ordenado para a compreensão do conhecimento elaborado no

curso de ciências sociais. Pois já identificados seus agentes, tornou­se possível perceber parte de

suas ações como relativas a determinados interesses e sentidos, em que a produção e ensino de

conhecimentos da área de ciências sociais  foram interpretados como relativos a estes objetivos.

Assim, o terceiro capítulo foi dividido em três itens, em que o primeiro destinou­se ao exame dos

currículos, programas das disciplinas e curso especial de didática do curso de ciências sociais. O

segundo tópico constou de uma análise detalhada dos conteúdos de cada uma das cátedras do curso

de ciências  sociais,  a   fim de compreendermos  tanto os  conhecimentos  arrolados  na graduação,

como objetivos do curso de ciências sociais. Finalmente, o terceiro item tratou da relação entre

ciência e religião na FFCLPR e, sobretudo, no curso de ciências sociais. Examinei, assim, o papel

desempenhado pela filosofia e sua demanda como elemento integrador do ensino na Faculdade.

Assim como apresentado, passo agora ao debate de meus fundamentos teóricos.

1.2 FUNDAMENTOS TEÓRICOS

Pensar  o  sentido  e  a   fundação  do primeiro  curso  de  ciências  sociais  do  Paraná,   exigiu

compreender a consolidação de uma área e de um tipo de formulação de conhecimento racional e

acadêmico que estabeleceu seus próprios objetos e conquistou sua autonomia às disciplinas afins

(OLIVEIRA,   1995,   p.   235).     Tratando­se   aqui   de   um   estudo   que   acompanha   o   processo   de

institucionalização  do   curso  de   ciências   sociais,   buscamos  compreender   as   correlações  entre   a

formação dessa nova área de conhecimento no Paraná  e  a  própria  sociedade paranaense que o

produziu, em seu processo de racionalização e modernização.

Buscamos,   pois,   apreender   as   dinâmicas,   regras,   ordens,   enfim,   a   via   de   mão   dupla

instaurada   entre   o   curso,   a  FFCLPR e  os   agentes   que   tomaram parte   em  seu   funcionamento,

efetivando a consolidação do curso de ciencias sociais. Nesse sentido, nosso trabalho em arquivo, a

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análise dos dados, as leituras e interpretações nos possibilitaram delimitar quatro grandes variáveis

para a compreensão dos nexos entre os agentes e a sociedade. Essas são: os currículos, as cadernetas

de frequência das disciplinas, os docentes e os discentes. 

Relativamente às cadernetas, essas eram os livros de registro diário da disciplina, em que

deveriam ser registrados os nomes dos docentes e discentes, a frequência de ambos à disciplina, o

conteúdo lecionado, as formas de avaliação e as eventuais  interrupções na condução das aulas,

como feriados, greves, palestras, idas à campo etc – entraremos em detalhes mais à frente. Tais

registros  eram realizados pelos professores  responsáveis  pelas  aulas.  Por  meio dos currículos e

cadernetas,   foi  possível  compreender  como os  agentes  pensavam e construíam o conhecimento

relativo às ciências sociais no período. Para tanto, foi essencial a sociologia do conhecimento de

Karl Mannheim. 

Para   o   sociólogo,   o   propósito   dessa   sociologia   era   lançar   luz   às   origens   sociais   do

pensamento. Ao questionar os fundamentos do conhecimento humano, Mannheim considerou não

haver entidades metafísicas quaisquer que originassem o conhecimento. Para ele, o conhecimento

possível   de   ser   concebido   e   conhecido   era   aquele   referente   ao   homem,   que   existe   em   um

determinado contexto histórico­social concreto e o produz. 

Porém,  não   se   tratava  de  um  indivíduo   tomado   isoladamente,   isto  é,   embora  as   ideias

tivessem origem no homem, elas não se explicavam exclusivamente por sua experiência particular

de vida (MANNHEIM, 1972, p. 30). A sociologia do conhecimento compreendia, portanto, que

“quem pensa não são os homens em geral, nem tampouco indivíduos isolados, mas os homens em

certos grupos que tenham desenvolvido um estilo de pensamento particular em uma interminável

série  de respostas a certas  situações  típicas características de sua posição comum” (ibidem, p. 31).

Sendo   a  maneira   pela   qual   os   homens  percebem,   interpretam  e   transformam  o   mundo

decorrente  de sua condição de grupo, historicamente localizada, o pensamento é  compreendido,

conforme Mannheim, como um fenômeno parcial, socialmente enraizado, cujas origens estão no

grupo que o produz. Sociologicamente, a questão passou a ser a identificação do ponto fulcral de

onde emanam as condições de pensamento. Negou­se, portanto, a universalidade do pensamento,

para assumir sua função em determinado contexto.

Por meio desse suporte teórico, analisamos os currículos do curso, bem como as cadernetas.

Com efeito,  percebemos  a  constituição  de  um  tipo  de  ciência   social  construído  em relação  às

condições ques seus agentes vivenciavam concretamente: as origens do entendimento e produção

das   ciências   sociais   da   FFCLPR   foram,   pois,   construídas   por   agentes   que   vivenciavam   e

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compartilhavam visões de mundo decorrentes de suas posições historicamente localizadas, seja o

CEB, seja a elite local, por exemplo. Não se trata, contudo, de explicar um conhecimento através da

conjuntura vivenciada pelos indivíduos que o produziram e, sim compreender as articulações entre a

produção de um conhecimento e os agentes que o confeccionaram.

Coube a nós, portanto, investigar tanto o conhecimento aqui produzido, em termos de seus

agentes, estratégias, conteúdo, referências a autores, enfim, pesquisar se houve um único projeto

para as ciências sociais ou isoladamente para cada uma das disciplinas que compunham o currículo.

Buscou­se, com efeito, compreender o que eram as ciências sociais da FFCLPR à altura, em que

nossas fontes privilegiadas foram as cadernetas de frequência e os currículos do curso.

Por outro lado, a investigação dos docentes e discentes possibilitou­nos examinar as relações

sociais vivenciadas no curso de ciências sociais e da FFCLPR, de maneira mais ampla. Ao entender

as relações sociais e os agentes envolvidos na constituição do curso e da Faculdade, percebemos

estratégias e sentidos dados às suas ações naquele interím; ademais, apreendemos assim o lugar do

curso  dentro  da   instituição mais  ampla  da FFCLPR, seus   recursos,  negociações,   regulamentos,

ordens,   em   suma,   os   estratagemas   arrolados   pelos   agentes,   a   fim   de   que   se   alcançassem

determinados objetivos junto ao curso ou à FFCLPR.

Nesse   sentido,  Max   Weber   nos   ajudou   a   apurar   nosso   problema   de   pesquisa.   Pois   a

sociologia   weberiana   é,   sem   grandes   pormenores,   “uma   ciência   que   pretende   compreender

interpretativamente a ação social e assim explicá­la casualmente em seu curso e em seus efeitos”

(WEBER, 2012, p. 3).  Isto é, em termos gerais, o cientista deve buscar compreender o sentido da

ação levada a cabo pelos agentes, observando seus desdobramentos e regularidades dentro de uma

singularidade histórica.  Desta maneira,  não se constroem explicações acerca da realidade social

estudada e, sim, compreensões através dos nexos regulares estabelecidos entre as relações sociais

em momentos históricos particulares. 

O ponto de partida de Weber era a compreensão das ações sociais dos indivíduos. Por ação

social   o   sociólogo   compreendia   aquelas   ações   cujo   sentido   subjetivamente   visado   tem   por

orientação a conduta do outro ­ age­se por referência à probabilidade de determinada conduta por

parte de outro agente (WEBER, 2012, p. 4). Trata­se, portanto, de uma análise elaborada a partir do

indivíduo, na medida em que busca compreender o sentido que orienta a sua ação. Visto que as

ações sociais são interações entre dois ou mais agentes, constituem relações sociais. Para Weber,

relações sociais são relações em que há reciprocidade quanto ao conteúdo do sentido que orienta a

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ação entre os agentes – ou seja, estes agem interpretando as ações dos demais agentes e orientam

sua própria ação tendo por base esta interpretação.

Para nós, essa metodologia foi essencial, pois permitiu­nos reconstituir a cadeia de ações

envolvidas na direção da fundação e funcionamento do curso, bem como os sentidos visados pelos

agentes na composição de suas relações sociais  e propósitos.  Pensamos, pois,  a  constelação de

interesses que motivaram ou não tomadas de ação como a fundação do curso, escolha do corpo

docente, seleção de professores auxiliares e assistentes, entre outros, de forma a compreendermos o

sentido que esses agentes atribuíam para o curso de ciências sociais da FFCLPR. Isto é, como se

produziram   determinadas   orientações,   sob   particulares   circunstâncias,   que   concorreram   para   o

exercício de suas agências e objetivos visados.

Embora Mannheim e Weber sejam nossos referenciais teóricos privilegiados, é necessário

ainda destacarmos alguns aspectos da teoria de Basil Bernstein. Acionamos sua compreensão acerca

das dinâmicas institucionais e históricas de produção dos currículos escolares na interpretação da

grade currilar  do curso de ciências sociais da FFCLPR. Para Bernstein,  o processo educativo é

constituído   por   meio   das   relações   estabelecidas   entre   as   práticas   pedagógicas,   avaliação   e   o

currículo.  Em particular,   seu   exame  do  processo   educativo  permite   o   exame  das  práticas   que

transformam  a   infinidade   de   conteúdos  possíveis   em  conteúdos   válidos   ao   ensino   e,   por   isso

mesmo, legítimos.  

Em sua análise, Bernstein associou as relações de poder aos procedimentos de seleção dos

conhecimentos  a  serem transmitidos,   isto  é,  o  estabelecimento  dos  conhecimentos   legítimos ao

ensino.   Quanto   à   transmissão   destes   conteúdos,  Bernstein   a   examinou   à   luz  de   dinâmicas   de

controle:   quanto   mais   enquandrado   o   conhecimento,   maior   controle   teria   o   professor   em   sua

transmissão; quanto menos enquadrado, mais o processo educativo  seria voltado aos alunos.

A caracterização do currículo  é  dada,  nesse  sentido,  a  partir  da  noção de  classificação.

Classificação   representa,   para   Bernstein,   a   formulação   de   fronteiras   entre   as   disciplinas   e   os

conteúdos instituídos na grade curricular. Assinala, nesse caso, as aproximações e distanciamentos

entre   os   conteúdos   do   currículo.   Se   o   conhecimento   é   altamente   classificado,   trata­se   de   um

currículo de coleção, cujos conteúdos são especializados e bem definidos. Por outro lado, se os

conteúdos estão fragilmente isolados e suas fronteiras são menos nítidas, trata­se de uma fraca

classificação, isto é, de um currículo de integração.

Por meio das noções de controle, classificação, enquandramento e poder, Bernstein atinge

compreender as articulações entre currículo, pedagogia e avaliação. Através de tais noções seria

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possível, pois, a apreensão das dinâmicas de seleção, integração ou afastamento das disciplinas e

transmissão de seus conhecimento através de maior ou menor controle por parte do professor ou

alunos. Tais elementos viabilizam, com efeito, uma análise das relações estruturais imbrincadas na

produção dos conteúdos presentes nos processos educativos.

A   partir   dessa   breve   explanação   teórica,   queremos   destacar   a   construção   da   nossa

interpretação sobre a fundação e funcionamento do curso de ciências sociais, constituída sobretudo

através da compreensão do conhecimento elaborado e das relações sociais no espaço do curso e da

FFCLPR.  Com efeito,  entendemos  que,  na  prática,   tanto  a  compreensão  da  origens  sociais  do

conhecimento quanto do sentido das ações dos agentes estão imbrincadas, visto que foram esses

agentes, em suas relações sociais, que produziram o conhecimento das ciências sociais da FFCLPR.

Faremos, pois, uma discussão, por meio da análise das cadernetas e currículos, sobre o saber

produzido   e,   mediante   o   exame   sobretudo   das   relações   dos/entre   docentes   e   discentes,   uma

compreensão das relações sociais na instituição, com vistas a entender o sentido da fundação e

funcionamento do curso de ciências sociais da FFCLPR de 1938 a 1960.

1.3 CIÊNCIAS SOCIAIS REGIONAIS

Investigar o sentido da fundação e funcionamento do curso de ciências sociais, exige­nos

uma compreensão tanto sobre os intelectuais do país, quanto acerca das fundações das Faculdades

de Filosofia,  Ciências e Letras por aqui;  além da apreensão do espaço que estas ocupavam no

projeto de mudança e modernização do país ansiado pelos próprios intelectuais, (auto)encarregados

de   diagnosticar   e   remediar   a   situação   político­social   do   Brasil   (BÔAS,   2002,   p.   132).   Nesse

momento, portanto, discutiremos brevemente alguns trabalhos sobre as Faculdades de Filosofia e as

ciências sociais em estados como Paraná e Rio Grande do Sul, buscando mapear os estudos sobre a

institucionalização   da   área   fora   do   eixo   Rio   de   Janeiro­São   Paulo.   Em   seguida,   contudo,

retomaremos   a   biografia   de   referência   sobre   São   Paulo   e  Rio   de   Janeiro,   por   entendermos   a

importância que ambos estados têm para a compreensão da constituição das ciências sociais no país.

A literatura das ciências sociais acerca de sua própria institucionalização no Brasil tem se

debruçado, majoritariamente, sobre os casos históricos dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro e,

em menor medida, Minas Gerais e Pernambuco. Pesquisadores e pesquisadoras de renome na área,

como Sérgio Miceli, Simon Schwartzman, Glaúcia Villas Boa entre outros, tiveram como base de

suas reflexões os casos centrais acima citados. Assim, poucos são os estudos que tomam por objeto

a institucionalização da área em outros estados brasileiros, constituindo uma baixa compreensão das

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dinâmicas e construções regionais das ciências sociais pelo Brasil. 

Estudiosos e estudiosas como Márcio de Oliveira, Nelson Tomazzi, Maria Tarcisa Bega,

entre outros, lançaram luz à essa discussão no livro As Ciências Sociais no Paraná (2006), em que

buscaram   reconstituir   alguns   dos   processos   sócio­históricos   que   permitiram   a   instituição   e

manutenção de Faculdades de Filosofia,  Ciências e Letras no estado,  bem como de alguns dos

cursos paranaenses de ciências sociais3. O esforço desses pesquisadores residiu no fato de, como

salientou Oliveira, compreenderem “a variante regional como o padrão de institucionalização das

ciências sociais no Brasil” (2006, p. 13). 

No Paraná, o processo de institucionalização das ciências sociais foi particularmente atípico,

pois o primeiro curso da área foi fundado em 1938, quando da instituição da Faculdade de Filosofia,

Ciências e Letras do Paraná em Curitiba. Isto é, embora sua fundação tenha se dado junta, ou em

proximidade, às fundações dos primeiros cursos da área – Escola Livre de Sociologia e Política,

1933; Universidade de São Paulo, 1934 e Universidade do Brasil, 1939, ainda assim o Paraná não é

um estado considerado nos estudos sobre o tema. Para Oliveira (2006), tal fenômeno seria devido,

sobretudo, à marginalidade político­cultural do estado no Brasil; endossa essa consideração o fato

de, até hoje, existirem apenas os dois estudos sistemáticos sobre as ciências sociais da FFCLPR.

Um deles é  o trabalho de conclusão de curso de Gabriel Oganauskas (2006), em que se

discutiu a constituição do curso de ciências sociais da Universidade Federal do Paraná (UFPR), de

1938 a 1968. Enfatizando as dinâmicas de fundação da FFCLPR, o pesquisador considerou haver

forte ingerência católica tanto na elaboração do projeto da FFCLPR, quanto em sua manutenção ao

longo   das   décadas.   A   intelectualidade   católica   curitibana   teria   se   aproximado   do   projeto   da

FFCLPR, para Oganauskas, em razão de, já há mais de uma década, constituir o Centro de Estudos

Bandeirantes ­ instituição cultural do laicato católico curitibano para dicussão de questões de fundo

filosofante,  literário,  científico e religioso – e,  também, por sua preocupação em diagnosticar e

sanar os percalços da modernização do Paraná. 

Assim, em sua interpretação, a FFCLPR foi fundada em 1938, fruto de duas diferentes,

porém conexas, iniciativas: dos intelectuais católicos do CEB e dos intelectuais das Faculdades de

Medicina, Direito e Engenharia do Paraná, que buscavam a reunificação da Universidade do Paraná.

No mesmo ano, passava a funcionar o curso de Ciências Sociais: intermitente, com baixo número

de alunos, expressivo contingente de catedráticos membros do CEB e apoio de professores

3Neste caso, o livro traz diferentes artigos que debatem a fundação e funcionamento do curso de ciências sociais da daUniversidade Federal  do Paraná   (1938),  da Universidade Estadual  de Londrina  (1973),  da Universidade do OesteParanense (1998), e da Universidade de Maringá (2000).

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assistentes. 

Além   de   Oganauskas,   Nelson   Tomazi   também   se   debruçou   sobre   o   tema   no   artigo

“Considerações preliminares sobre a   institucionalização da sociologia no Paraná,  1938 – 1963”

(2006). Tratando­se de um trabalho anterior ao de Oganauskas, Tomazi foi sua fonte principal. Para

além do que já foi exposto, portanto, Tomazi reconstituiu duas grades curriculares do curso, em que

destacou   as   disciplinas   de   sociologia,   antropologia   e   economia,   além   da   ativa   atuação   do

antropólogo José Loureiro Fernandes na constituição de um espaço de pesquisa e discussão para a

antropologia   –   sobretudo   através   da   fundação   de   centros   e   institutos   de   pesquisa,   museus,

congressos, entre outros. 

Focando nas três grandes atuais áreas das ciências sociais – antropologia, ciência política e

sociologia, Tomazi considerou institucionalizadores os esforços  de Loureiro Fernandes  na área de

antropologia,   ao  passo  que   a   sociologia,   a   cargo  de  professores   auxiliares   de   frágil   formação

intelectual nas ciências sociais,  demoraria a constituir um campo de atuação e pesquisa, e sobre a

ciência política, houve poucas informações. Era um curso, dessa maneira, de frágil consolidação de

uma agenda de investigações, sustentado por professores auxiliares e que dialogava com conteúdos

filosóficos e, eventualmente, católicos. Tais questões serão esmiuçadas mais à frente.

Em   que  pesem   as   más   condições   do   arquivo  da  FFCLPR  descritas   por   Oganauskas   e

Tomazi, questões como a seleção dos professores auxiliares e dos livre­docentes, relacionamento

entre os discentes e maiores informações sobre o currículo e ementas das disciplinas foram apenas

parcialmente   respondidas.   Ainda   assim,   são   trabalhos   importantes   e,   também,   as   únicas   duas

investigações sistemáticas, até o momento, sobre o curso de ciências sociais da atual UFPR.

Outros estados fora do eixo Rio­São Paulo também apresentam escassa produção acadêmica

quando se trata do processo de institucionalização de suas ciências sociais. Destacando o baixo

número de estudos sobre o tema no Rio Grande do Sul, Lorena Madruga Monteiro (2006) estudou o

processo de consolidação  da sociologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

de 1940 a 19704. Em um contexto brasileiro de renovação católica, a UFRGS, segundo a autora,

esteve intimamente vinculada à elite católica local, tendo essa papel preponderante no desenho e na

seleção dos  docentes  das  Faculdades  de  Ciências  Econômicas  e  Filosofia  da   instituição.  Neste

sentido,  o   trabalho  intelectual  organizado nestas   faculdades  teria  sido  largamente orientado por

referenciais e personalidades católicas, no que se destacou a figura de Laudelino Teixeira de

4O título completo do trabalho é:  A estratégia dos católicos na conquista da sociologia da UFRGS. Dissertação demestrado defendida em 2006 na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, programa de pós­graduação em CiênciaPolítica.

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Medeiros, primeiro catedrático de sociologia da instituição. 

Laudelino   de   Medeiros   pertenceu   ao   laicato   católico   gaúcho   e   era   formado   em

Administração e Finanças pela Faculdade de Ciências Políticas e Econômicas de Porto Alegre. Para

a   autora,   a   análise   da   trajetória   catedrática   de  Medeiros   evidenciou   a   importância  da  geração

católica na constituição da UFRGS, bem como o nascimento da sociologia universitária gaúcha

dentro da Faculdade de Administração e Finanças da instituição. Por esses motivos, tratou­se de

uma sociologia entrelaçada à economia e referenciada ao catolicismo francês, a Le Play e Jacques

Valdour, além dos brasileiros Amaral Fontoura e Alceu Amoroso Lima.

Em “Os primeiros mestres de antropologia das faculdades de filosofia” (1982), Thales de

Azevedo, antropólogo baiano e ex­catedrático de antropologia da Faculdade de Filosofia da Bahia,

refletiu sobre a formação em medicina dos primeiros antropólogos das faculdades de filosofia do

Brasil. Sendo ele mesmo formado em medicina, destacou as redes de contato que projetavam esses

médicos   à   docência   de   antropologia,   bem   como   as   concepções,   em   início   do   século   XX,   da

antropologia como uma espécie de morfologia humana ou mesmo capítulo da zoologia, o que lhe

tornava   afim   à   medicina.   Ao   tratar   de   sua   própria   trajetória   na   Bahia,   salientou   os   entraves

decorrentes da formação em medicina para o exercício da antropologia, como a falta de orientações

bibliográfica e metodológica e de pares para a discussão deste conhecimento. Daí refletir Azevedo

sobre o lugar da Bahia no processo de desenvolvimento da antropologia: 

O caso da Bahia é muito particular; a Bahia, mesmo geograficamente, está muito longe doRecife, muito longe de Belo Horizonte e muito longe do Rio de Janeiro e, então, ainda maisdifícil  era viajar e  encontrar  outras pessoas;   independente disto,  não havia um meio deencontrar as  pessoas que trabalhavam no mesmo terreno. Dentro das Faculdades, é precisoregistrar isto, também não havia intercâmbio entre os professores; não havia inicialmentedepartamentos, mas cursos, como que se chamava o de geografia e história; somente depoisse criou o de ciências sociais. Tive sempre muito boas relações com os colegas, porém,nunca consegui conversar com os mesmos sobre o que ensinavam e o que eu ensinava paraver se chegávamos a qualquer entendimento. Não houve maneira (1982, p. 271).

Tratando dessa questão, a pesquisadora Maria Brandão, ao analisar a trajetória de Azevedo

no artigo “Thales de Azevedo: ciclos temáticos e vigência na comunidade científica” (2005), trouxe

à luz alguns dos esforços do antropólogo em constituir um ambiente acadêmico para a antropologia

na Faculdade de Filosofia da Bahia, como os Seminários de Antropologia, inaugurado em 1953, e o

Instituto de Ciências Sociais (ICS), fundado em 1962. A partir  do ICS, Azevedo pôde associar

ensino e pesquisa, além de promover “cursos pioneiros de pós­graduação em ciências sociais fora

do Rio de Janeiro e São Paulo” (p. 305). Em suas aulas, relatou Brandão, Azevedo trabalhava os

eixos temáticos da antropologia física e da evolução humana, além de discutir temas da

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antropologia social, como o povoamento de Salvador, por exemplo (p. 303). 

Às palestras, aulas e debates coordenados por Azevedo, compareciam diversos antropólogos

de renome, como Edison Carneiro, Pierre Monbeig, M. Herskovits, G. Herbert Blumer entre outros

(BRANDÃO, p. 305). Com isso, queremos destacar que tais atividades denotavam a diligência do

antropólogo em desenvolver o cenário antropológico baiano; contudo, no entendimento de Brandão,

poucos   foram   e   são   os   estudos   destinados   à   compreensão   da   trajetória   do   antropólogo   e   da

antropologia por ele elaborada.

Por  outro   lado,   ao  pensarmos   as   constituições  das   ciências   sociais   em Minas  Gerais   e

Pernambuco, conforme interpretou Sérgio Miceli  em “Por uma sociologia das Ciências Socias”

(1989), se sobrassaem as alianças entre os intelectuais e os membros das elites dirigentes locais.

Tratando­se de,  quando comparado a São Paulo,  contextos  de menor complexidade quanto aos

postos  de   trabalhos   e   à   estratificação   social,   bem  como   à   formação   de   um mercado  de   bens

culturais, os projetos intelectuais mineiros e pernambucanos estiveram intimamente conectados às

elites locais e à figuras de liderança, como foi o caso de Júlio Barbosa em Belo Horizonte, e de

Gilberto Freyre em Recife.

No entendimento de Miceli, Júlio Barbosa, ao aliar­se à elite belo horizontina, constituiu

uma rede de apoio junto ao governo federal mineiro que propiciou, através de recursos públicos,

apoios   material   e   econômico   a   seus   nascentes   projetos   intelectuais.   Os   quadros   intelectuais

mineiros,   especialmente   aqueles   vinculados   à   instituições   culturais,   configuraram­se   como

“extensões   domésticas   do   poder   político   mantenedor”   (1989,   p.   16),   visto   que   tencionavam

compreender   as   razões   do   dito   atraso   mineiro   e   reinserir   o   estado   nas   dinâmicas   político­

econômicas nacionais. Tal seria uma das razões de as ciências sociais em Minas Gerais haverem

constituído­se em diálogo com o direito e a economia, uma vez que essas eram áreas fundamentais

para o exercício e manutenção dos negócios e poderes das elites locais. Daí surgir, como destacou

Miceli, o programa de ciências sociais no interior da Faculdade de Ciências Econômicas de Minas

Gerais; essa proximidade teria, ainda,  impresso ao curso e aos cientistas sociais uma preocupação e

senbilidade às questões de âmbitos jurídico, político e institucional.

A formação do campo intelectual em Recife, por outro lado, deu­se tanto através de redes de

contato e dinâmicas junto às elites locais, quanto pela tutela de protetores políticos. Os postos de

trabalho para os intelectuais pernambucanos circunscreviam­se em duas grandes modalidades: sua

entrada em orgãos públicos, dada a proximidade dos intelectuais com a elite dirigente local, e a

tecetura de trabalhos intelectuais  encomendados por agentes políticos; no interím dessas atividades,

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buscavam por ambientes para atuar como docentes ou pesquisadores (MICELI, 1989, p. 16­17).

Com efeito, a liderança intelectual de Gilberto Freyre no estado viabilizou, em 1949, a construção

de   um   espaço   institucional   autônomo   para   as   ciências   sociais,   independente   dos   centros

universitários e da esfera político­jurídica de Pernambuco: o Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisa

Sociais.

Rumando   para   São   Paulo,   Sérgio   Miceli   analisou,   em   “Os   condicionantes   do

desenvolvimento das ciências sociais no Brasil (1930­1964)” (1989), a constituição dos cursos de

ciências sociais em São Paulo, na Escola Livre de Sociologia e Política (ELSP) e na Universidade

do Estado de São Paulo (USP), e no Rio de Janeiro, no Instituto Superior de Estudos Brasileiros

(ISEB). Para o autor, as fundações no eixo Rio­São Paulo produziram duas grandes tradições de

ciências sociais no Brasil: uma modalidade de estudo e intervenção político­social – Rio de Janeiro,

e outra de cunho mais acadêmico e científico – São Paulo (1989, p. 15). Em sua análise, entre 1930

e 1964 não houve qualquer iniciativa universitária brasileira, relacionada às ciências sociais, que

fosse desvinculada de ações e/ou projetos políticos. Em especial, o projeto da Universidade de São

Paulo5 guardou íntima proximidade com os anseios de formação de uma elite intelectual capaz de

diagnosticar e sanar os problemas da sociedade brasileira de 19306.

Em vista disso, como apontou Simon Schwartzman, a fundação da Universidade de

São Paulo  pôde ser  compreendida antes  como um projeto  político do que como uma proposta

educacional (1979, p. 194). A base desse projeto político­universitário era a Faculdade de Filosofia,

Ciências e Letras (FFCL­USP), centro da universidade, em que seriam realizadas pesquisas sem

finalidades práticas diretas,  visando o conhecimento puro e universal.  Destarte, seria formada a

requerida elite intelectual capaz de liderar e acelerar o desenvolvimento do país.

O modelo universitário da FFCL­USP foi calcado na experiência de ensino superior

francesa ­ fundamentada na filosofia e na laicidade, mas também centralizada no poder do Estado e

na divisão de funções e formações ofertadas (CAMPOS, 2006, p. 07). Para Sérgio Miceli (1989, p.

104), esse dado representou uma ruptura com os projetos universitários brasileiros anteriores, afins

que eram das ciências jurídicas, além de sinalizar para um posicionamento de distância em relação à

5Nesse momento, focaremos nas ciências sociais da Universidade de São Paulo, de cunho mais científico e acadêmico.Contudo, é significativo para a experiência paulista a Escola Livre de Sociologia e Política, cujos objetivos primárioseram fornecer técnicos e conhecimento passíveis de serem utilizados em orgãos, instituições, projetos, enfim, aplicáveisaos problemas diagnosticados em São Paulo.6Como ressaltou Sérgio Miceli, a crise de hegemonia social e cultural vivenciada pelas elites oligárquicas brasileirasfrente   a   modernização   paulista   nas   primeiras   décadas   do   século   XX   contribuiu   largamente   para   construção   deinstituições de ensino superior no Brasil ­ especialmente pelo potencial dessas em cultivar intelectuais capazes de reporos quadros dos grupos em conflito, renovando­os para a liderança do país (1979, p. XVII).

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intervenção   política   concreta.   Sua   dinâmica   interna   era   ancorada   em   preceitos   científicos   e

acadêmicos, isto é, havia “uma preocupação marcante com o treinamento metodológico, as leituras

dos clássicos, o trabalho de campo individual e/ou em equipe e toda uma socialização acadêmico­

disciplinar” (MICELI, 1989, p. 114). O progresso da ciência, através da pesquisa desinteressada, e a

formação de especialistas nortearam, pois, as relações intramuros da Faculdade, bem como seus

objetivos junto a sociedade.

Se o tipo de ciências sociais praticado na USP pautava­se nesses objetivos, como era,

então, a ciência social do Rio de Janeiro? Para Sérgio Miceli (1989), na então capital federal houve

acentuada ingerência da esfera política sob as experiências universitárias no período de 1939 a

1948. Tal situação marcaria, por um lado, a agenda de pesquisa das instituições fluminenses, e, por

outro, engessaria as possibilidades de institucionalização das ciências sociais, pois que entravava

sua autonomia  acadêmica.  Nesse  sentido,  as  modalidades,  aspirações  e  objetivos  das  pesquisas

realizadas no estado privilegiaram temas interligados ao debate político. Isto é, as preocupações que

nortearam   suas   agendas   de   pesquisa   motivaram­se   pelas   possibilidades   de   intervenção   e

organização nas e das esferas econômica, política, enfim, do planejamento social do Rio de Janeiro

–   marcava­se   assim   uma   diferenciação   entre   as   ciências   sociais   fluminenses   e   as   paulistanas

(ALMEIDA, p. 49). Célebre e herdeiro desse tipo de entendimento e prática das ciências sociais foi

o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), fundado em 1955 no Rio de Janeiro.

Contudo, há que se destacar a presença da Igreja Católica na constituição do ensino

superior fluminense. Em “As ciências sociais no Rio de Janeiro” (1995), Lúcia Lippi de Oliveira

discutiu   a   constituição  da  Faculdade  Nacional   de  Filosofia   (FNFi),   da  Universidade  do  Brasil

(UdB), em 1939.   A partir da relação entre o intelectual católico Alceu Amoroso Lima e o então

ministro  da   educação   e   saúde,  Gustavo  Capanema,   a   pesquisadora   analisou   a   proximidade  da

nascente   FNFi   com   o   grupo   católico.   Visto   que   a   UdB   constituiu­se   após   a   dissolução   da

Universidade   do   Distrito   Federal7,   parte   de   seu   quadro   docente   foi   composto   pelos   antigos

professores   da   UDF;   no   caso   da   FNFi,   Alceu   condicionou   sua   entrada   à   instituição   a   não­

7A   Universidade   do   Distrito   Federal   foi   criada   em   1935   e   liderada   por   Anísio   Teixeira,   intelectual   e   educadorbrasileiro, mais conhecido pela ativa participação no Manifesto dos Pioneiros da Educação de 1932. Teixeira, entãoSecretário da Educação, pretendeu organizar uma universidade aberta às questões propostas pelos reformadores daEscola Nova; uma universidade alinhada, portanto, aos debates, preocupações e objetivos da intelectualidade brasileirareformadora   (MARTINS,  1986,  p.30).  No  entanto,   a  UDF manteve   suas   atividades   apenas   até   1939,  quando   foidissolvida pelo Ministro da Educação e Saúde Gustavo Capanema. Para Luciano Martins (1986), o desmanche da UDFfoi articulado tanto por um contexto de ebulição política no Rio de Janeiro, quanto pela recepção negativa da IgrejaCatólica à iniciativa; Alceu Amoroso Lima foi o último administrador da UDF até seu fechamento, quando já debatia afundação   da  FNFi   com   Capanema.   Formalmente,   contudo,   o   fechamento  da   UDF  deu­se   em  razão   de   seu  não­equiparamento ao modelo universitário exigido pelo Ministério da Educação (OLIVEIRA, 1995, p. 246).

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transferência dos antigos docentes da UDF para a FNFi, em uma atitude que, conforme interpretou

Oliveira,   sinalizou  o  projeto  de   instituição  que  se  queria   fundar,  bem como uma negação  aos

propósitos e objetivos da universidade proposta por Anísio  Teixeira8 (OLIVEIRA, 1995, p. 247).

Nesse sentido, considerou Miceli que, no Rio de Janeiro, apenas foram bem sucedidas até 1964 as

experiências de ensino superior geridas pela Igreja Católica (1989, p. 9).

Com efeito, nos textos acima debatidos são claras as peculiaridades regionais de cada

fundação, que se desdobraram, a  partir  das  instituições e consolidações dos cursos, em motivações

e objetivos diferentemente visados e legitimados. Não há, pois, condições de falarmos em um único

processo de institucionalização das Ciências Sociais no Brasil. Nesse sentido, para compreendermos

o curso de Ciências Sociais da FFCLPR temos de buscar pela própria trajetória institucional das

ciências sociais aqui no Paraná,   interpretando­a em suas próprias singularidades e afinidades às

experiência acimas descritas, num contexto de constituição de uma ossatura acadêmica nacional.

Um estudo sobre o curso de Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia, Ciências e

Letras do Paraná, acreditamos, tem informações a acrescentar sobre a produção de conhecimento no

estado e as redes de agentes acionadas para a fundação e funcionamento do curso, objeto de poucos

trabalhos acadêmicos. Ademais, contribui para a compreensão da institucionalização das Ciências

Sociais no Brasil,  pois que investigar as manifestações regionais de formação de uma estrutura

acadêmica é importante para compreender os nexos entre ciência e sociedade, numa perspectiva

abrangente.

Assim, esse trabalho buscou compreender  o sentido da fundação do curso de ciências

sociais da FFCLPR em 1938 e sua consolidação até 1960. Pretendemos, a partir da consulta aos

materiais   empíricos,   reconstituir   as   relações   entre   os   agentes   e   o   conhecimento   elaborado   e

difundido  no   curso  durante  o   recorte   estabelecido.  As   considerações  derivadas  da   análise   dos

materiais e também da literatura sugeriram uma série de novas informações e compreensões sobre a

complexidade   da   institucionalização   das   ciências   sociais   por   aqui.   Antes,   contudo,   de   as

debatermos, gostaria de discutir algumas singularidades dos arquivos da UFPR.

8Isso não quer dizer, contudo, que a FNFi fosse extritamente católica e, sim, que sofreu a ingerência da Igreja Católicaem sua constituição. Como salientou Oliveira (1995), Alceu Amoroso encontrou resistências na Faculdade de Direito daUdB:  o   intelectual   católico   não   foi   aprovado   nos   concursos   para   as   cátedras  de  Economia  Política,   em 1932,   eIntrodução à  Ciência, em 1933, a despeito de sua posição de destaque na FNFi e junto ao Ministério da Educação(OLIVEIRA, 1995, 247­248).

25

1.4 ARQUIVOS

Ainda que não haja um estudo sobre a história da constituição dos arquivos da UFPR, nosso

campo nos arquivos e conversas com a responsável pelo arquivo do SCH lançaram luz à algumas

situações   institucionais   da   UFPR,   que   consideramos   relevantes   para   a   compreensão   da

institucionalização do próprio curso de ciências sociais.

Acerca do trabalho em arquivo, explorei a sugestão de Olívia Cunha sobre a etnografia em

arquivo. Essa seria, pois, uma “modalidade de investigação antropológica que toma determinados

conjuntos documentais, mais especificamente as coleções e os arquivos pessoais […], como campo

de interesse para uma compreensão crítica acerca das formas de produzir histórias” (CUNHA, p.

291). O arquivo é encarado, pois, como uma instituição que organiza e cristaliza o conhecimento

possível   de   ser   conhecido,   sobretudo   através   de   suas   lógicas   classificatórias   e   cronologias;

destacam­se, assim, os mecanismos de exclusão de determinados documentos, na medida em que

esses deixam de compor os arquivos e são excluídos das narrativas.

O foco da atenção passa, pois, às dinâmicas de constituição dos arquivos e classificação dos

documentos,   tomando­as   como   objeto   de   percepção   crítica   acerca   da   elaboração   das   fontes

possíveis (ibidem, p. 294). Há, com efeito, uma crítica à naturalização do trabalho em arquivo e das

fontes supostamente neutras ali alocadas. Com isso, abre­se a possibilidade de apreender “como

certas narrativas profissionais foram produzidas e como sua invenção resulta de um intenso diálogo

envolvendo imaginação e autoridade intelectual” (ibidem, p. 296). Se constroe, dessa forma, uma

relação de objetivação e subjetivação dos dados documentados, isto é, das narrativas “contadas”

pelos  documentos,  por  meio  da   apreensão  das  práticas   arquivísticas.  Nesse   sentido,   destacarei

alguns aspectos da classificação dos arquivos da UFPR.

A UFPR não possui um arquivo unificado, onde todos os documentos sobre a universidade

estejam   catalogados   e   reunidos.     Atualmente,   o   arquivo   da   UFPR   se   constitui   em   diferentes

arquivos   referentes   aos  setores  da   instituição,   sob   responsabilidade  de  diversos  arquivistas.  Os

arquivos são, pois, fisicamente separados, seja por andares, seja por campus. Cada um dos arquivos

encontra­se   catalogado   diferentemente,   isto   é,   possui   seu   próprio   protocolo   e   código   de

armazenamento,  organização e  consulta,   inclusive  no  tocante ao acesso dos  pesquisadores,  que

devem solicitar um acesso específico para cada arquivo. Para além disso, alguns setores estão agora

higienizando e arquivando seus documentos, enquanto outros arquivos ainda não têm sequer seus

materiais organizados.

Segundo consta no relatório do Arquivo do Setor de Ciências Humanas de 2017, esse

26

arquivo foi apenas recentemente organizado, a partir dum projeto de gestão documental aprovado

na UFPR em 2008 (CASTRO, 2017, p. 3). Isto é, mais de sessenta anos de documentação estava

apenas depositada em uma sala, com precárias condições de acesso ou consulta. O resultado era

“um ambiente insalubre, com documentos mofados, sujos e espalhados pelo chão” (ibidem). Os

trabalhos anteriores que se debruçaram sobre o curso tiveram, pois, contato com esse arquivo do

SCH, de modo que suas  consultas  muitas  vezes  foram dificultadas pelas condições  do arquivo

(OGANAUSKAS, 2006, p. 59). Nesse sentido, por realizarmos nossa pesquisa após a organização

dos arquivos do SCH e do SE, tivemos a oportunidade de consultar e acessar novos documentos,

antes não reputados na construção das  hipóteses e  considerações  dos estudos sobre o curso de

ciências sociais da FFCLPR – exploraremos esse tópico mais à frente.

Outro aspecto a se destacar é a lotação dos documentos nos arquivos. Segundo a responsável

pelo arquivo da SCH, os documentos dos arquivos da UFPR são inamovíveis, ou seja, não podem

ser   transferidos   de   um   arquivo   para   o   outro,   independentemente   de   se   referirem   a   cursos,

departamentos ou discentes de outros setores. A documentação mais antiga do curso de ciências

sociais está alocada no arquivo do SE, pois que foi inicialmente lá armazenada; ao mesmo tempo, a

documentação mais recente sobre o curso está  no arquivo do SCH. Os documentos estão, pois,

dispersos por entre os arquivos, a despeito de seus temas ou assuntos. Essa dispersão do material

muitas vezes dificultou tanto a localização quanto a consulta ao documento.

A despeito da reestruturação do SCH, ainda assim a documentação sobre o curso de ciências

sociais é escassa, havendo poucos materiais pra além das cadernetas de frequência das disciplinas,

cuja própria preservação é intermitente. Há pouco mais documentos, como históricos escolares, atas

de reuniões do Conselho Técnico e Administrativo (CTA) da FFCLPR, relatórios anuais etc – esses

presentes   no   arquivo   do   SE,   que   nos   permitiram   a   reconstituição   de   algumas   características

institucionais  do  curso.  Com efeito,  o  que chama a  atenção é  o  baixo  número de  documentos

preservados na instituição desde sua fundação.

Diferentemente, portanto, de outras instituições, como a Universidade de São Paulo ou o

Museu Nacional, que concentram seus documentos em um único arquivo, a UFPR tem um arquivo

fragmentado por setores e que, somente a partir de 2008, começou a se constituir – período em que

os quatro primeiros arquivistas da universidade foram contratados (CASTRO, 2017, p. 3). Com

isso,  gostaria  de  destacar  a   relação  entre  os  arquivos  das  universidades  e  a   formação  de  uma

memória   institucional,   visto   que   os   documentos   arquivados   se   constituem   enquanto   fontes

privilegiadas das histórias das instituições (FLORES, 2013, p. 13).

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Não pretendo aqui realizar uma explanação sobre história e memória e, sim, discutir um

aspecto que se destaca quando pensamos a relação entre os arquivos e as produções de memórias

institucionais.  Uma vez  que os  documentos,  em si,  não se constituem enquanto memória,  mas

enquanto elementos  que permitem e promovem a sua constituição,  arquivos como o da UFPR,

fragmentados,   dispersos   e   recentes,   revelam   o   quê   sobre   a   própria   instituição?   A   leitura   da

bibliografia sobre as ciências sociais no Paraná ou sobre os intelectuais do estado sugere que o lugar

do   Paraná   na   constituição   do   cenário   intelectual   brasileiro   é   periférico,   ou   seja,   de   pouca

visibilidade ou impacto no que se refere à produção intelectual, sobretudo se comparado a estados

como Rio de Janeiro ou São Paulo. Nesse sentido, a baixa preservação documental da UFPR e a

própria fragmentação da documentação parecem sintomáticas desse lugar periférico.

Por fim, gostaria de comentar brevemente os principais documentos encontrados no arquivo

de SCH, que são, como já dito, as cadernetas   de frequência das disciplinas. Essas são diários de

classes, em que estão anotados os nomes completos dos discentes e docentes, o comparecimento de

ambos às aulas, os conteúdos ministrados e, em alguns casos, as formas de avaliação da disciplina.

De 1943 a 1969, existem 268 cadernetas no arquivo do SCH, em que o grosso dessas está entre

1955 e 1969 – há cadernetas de período posterior a 1969, porém não as contabilizamos.

Como o curso esteve fechado de 1939 a 1942 e, novamente, de 1946 a 1949, há somente as

cadernetas de 1943 a 1945 e a partir de 1950; há cadernetas, portanto, de todos os anos em que o

curso funcionou, mas não de todas as disciplinas e turmas, à exceção das cadernetas da primeira

turma – 1938 a 1940, que não foram encontradas. Dessas 268 cadernetas, selecionamos as primeras

79 pelo volume de material, finalizando nossa análise no ano de 1959.  Buscamos prestar atenção na

quantidade e gênero dos  alunos,  na duração das  disciplinas,  no corpo docente,  na atuação dos

professores auxiliares, no conteúdo ensinado e, por fim, às interrupções que aparecem descritas nas

cadernetas ­ como greves, cursos, seminários, falas de professores, leitura de encíclicas católicas,

entre outras coisas. 

Como destacou Gabriel Oganauskas (2006, p. 60 ­ 61), tanto para sua análise, quanto para a

de Nelson Tomazi foram utilizadas apenas 66 cadernetas, em que 44 eram de sociologia e 22 de

antropologia.  Não  foram analisadas,  pois,  as  cadernetas  das  demais  11  cadeiras  do  curso,  que

tivemos a oportunidade de investigar. Dessa forma, examinamos 79 cadernetas referentes a 21 anos

de   funcionamento   do   curso,   enquanto   que   Oganauskas   analisou   66   cadernetas   para   30   anos.

Também seu exame quanto ao conteúdo do curso se iniciou em 1944, enquanto nós tivemos acesso

a dados de 1938, de modo a reconstituirmos o primeiro currículo do curso e sua primeira turma.

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Além   disso,   destacamos   os  materiais   encontrados   no   arquivo  do  SE,   do  CEB   e   Anuários   da

FFCLPR, que nos  permitiram reconstituir,  quase  completamente,  a   relação dos  professores  em

exercício no curso,  quaisquer  que fossem suas modalidades de contratação, e dos alunos.  Com

efeito,   lançamos   mão   de   um   conjunto   de   dados   inédito   sobre   o   curso   de   ciências   sociais   da

FFCLPR.

Para além das cadernetas, investiguei nos arquivos do CEB as atas de reunião ordinária dos

livros   II   e   III   do  Círculo   de   Estudos  Bandeirantes,   assim   como   os   livros   de   atas   de   reunião

extraordinária   e  de  atas  do  Conselho Diretor  do  CEB;  além dos  documentos  da  Coleção  José

Loureiro. No arquivo do SE tive como fontes principais as Atas dos Concursos de Livre­Docência

nº 2, 1958­1961;  Atas dos Concursos para Catedrático nº 1, 1944­1965; Contratos de professores

substitutos,  1943­1950;  Atas  dos  exames  do  curso  de  ciências   sociais   e  políticas,  1938;  Atas:

Reuniões   ordinárias   e   extraordinárias   da   secção   de   sociologia,   1952­1953;   Livro   ponto

departamento de antropologia, 1958; I Livro de Atas da Congregação da Faculdade de Filosofia do

Paraná;  Lavratura  das  Atas  do  Conselho  Geral  da  Faculdade  de  Filosofia  do  Paraná;  Atas  do

Conselho Técnico­Administrativo da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná e Instituto

de   Educação   anexo   (1938)   e   o   Termo   de   matriculas   nº   01   1938­1943.   Não   obstante,   foram

analisados   outros   documentos,   tais   como:   Históricos   escolares   completos   de   todos   os   alunos

matriculados em 1941 no curso de Didática; Matéria lecionada nas várias cadeiras [do curso de

didática] durante o ano letivo; e Cópia das Atas do CTA Referentes ao Curso [de didática], entre

outros. Para além, analisei também os anuários da Faculdade de Filosofia e Universidade do Paraná

de 1941 a 1960.

Com   efeito,   estes   foram   os  documentos  principais   utilizados   para   reconstituir   parte   da

dinâmica do curso, especialmente   em seus aspectos formais: currículos, disciplinas, professores

catedráticos, livre­docentes e auxiliares, discentes, conteúdos, turmas, entre outros. O acervo do

CEB, em especial, proporcionou uma série de informações sobre os professores catedráticos, visto

que   esses   eram   membros   do   Círculo,   e,   principalmente,   viabilizou   incontáveis   dados   sobre   o

professor José Loureiro Fernandes e a antropologia  por ele praticada. Contudo, também no CEB a

documentação diretamente referente ao curso de ciências sociais é pequena, constituindo, o grosso

da documentação, um acervo sobre as atividades geridas pelo professor Loureiro Fernandes em sua

carreira profissional – que, como veremos, era bastante ativa.

Por fim, a entrevista com ex­aluno Constantino Comninos foi também valiosa, à medida que

lançou luz à dúvidas que tínhamos, trouxe novas informações e dados qualitativos sobre o curso e

29

as relações sociais na FFCLPR. A partir desse conjunto de dados, pudemos compreender algumas

das   faces   do   processo   de   institucionalização   do   curso   de   ciências   sociais   da   FFCLPR,   como

veremos a seguir.

30

2 CAPÍTULO 2: OS AGENTES DA MODERNIZAÇÃO

Neste  capítulo  buscaremos,  pois,   reconstituir   a  gama de  agentes   e   relações   sociais  que

tiveram lugar na fundação e funcionamento do curso de ciências sociais da FFCLPR. Nos importa

identificar,   portanto,   as   conexões   entre   os   agentes   cujas   ações   concorreram   para   a   criação   e

manutenção da Faculdade e,  por conseguinte,  do curso,  para apreendermos o sentido que estes

emprestaram   à   estas   ações.   Divido   em   quatro   eixos,   o   primeiro   apresenta   as   discussões   de

modernização   do   Paraná   através   de   instituições   de   ensino   superior;   o   segundo,   dialoga   sobre

catolicismo e modernidade, em especial o Centro de Estudos Bandeirantes, em Curitiba; o terceiro,

trata da fundação e projeto da FFCLPR; e finalmente, o quarto, investiga o curso de ciências sociais

da instituição à nível de seus agentes e relações sociais.

2.1 PROJETOS DE MODERNIZAÇÃO

As primeiras décadas do século XX no Brasil foram particularmente agitadas. Com efeito,

pesquisadores como Luciano Martins (1986) e Daniel Pecaut (1989) compreenderam os anos 1920

como período­chave para a consolidação do papel dos intelectuais por aqui – e isso nos é importante

pois esses mesmos intelectuais estiveram a frente ou participaram das discussões sobre o ensino

superior   no   Brasil.   Conforme   Martins,   o   cenário   do   período   fora   composto,   em   São   Paulo

sobretudo,  por  diversos  conflitos  de   interesses  entre  as  velhas  elites  estabelecidas  e   as   classes

médias   urbanas   ascendentes.   Tais   acontecimentos   marcaram   uma   tomada   de   posição   dos

intelectuais brasileiros, que foram parte ativa nestas discussões, seja na esfera política – através dos

debates acerca do Estado Novo, seja na esfera cultural – por meio, sobretudo, da Semana de Arte

Moderna,   de   1922.   O   essencial   é   compreender   que   nesse   ínterim   constituiu­se   um   grupo

preocupado com as questões nacionais, que se debruçou sobre elas e procurou traçar um plano de

ação para o Brasil, pautada em sua própria história e seu desejado futuro moderno (MARTINS,

1986, p. 19).

A   preocupação   com   a   modernização   do   Brasil   através   da   criação   de   instituições

também foi uma constante no Paraná. Fundada em 1912, a Universidade do Paraná (UP) foi fruto de

uma   iniciativa   privada,   liderada   por   Nilo   Cairo   e   Victor   Ferreira   do   Amaral9,   que   pretendia

modernizar o estado por meio da técnica e profissionalização. Tratava­se, pois, de uma ideia de

9Nilo Cairo da Silva (1874­1928) foi um intelectual paranaense, formado em engenharia militar pela Escola Militar doRio de Janeiro e em medicina pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Victor Ferreira do Amaral (1862­1953),por   seu   turno,   formou­se   também em medicina  pela  mesma  instituição;   foi   considerado  o   “reitor  de   sempre”  daUniversidade do Paraná (CAMPOS, 2006, p. 64).

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modernização pautada nas profissões bacharelescas, tais como engenharia e medicina10. Assim, os

cursos ofertados pela UP eram Agronomia,  Comércio,  Direito,  Engenharia,  Cirurgia,  Medicina,

Obstetrícia, Odontologia e Medicina Veterinária; já os cursos ou a Faculdade de Filosofia, Ciências

e Letras  foram suprimidos do rol  de graduações  (CAMPOS, 2006, p.  96).   Isso não significou,

contudo,   a   exclusão   dos   conhecimentos   científicos   do   projeto,   visto   que   esses   saberes   eram

utilizados conforme a demanda ou solicitação dos demais cursos, e, sim, caracterizou a preocupação

intelectual à altura, qual seja, a formação de técnicos e bacharéis como via de modernização do

estado (ibidem, p. 64).

A Universidade do Paraná existiu até 1915, quando a reforma Maximiliano centralizou

no   Estado   o   direito   à   fundação   de   universidades,   sendo   permitida   a   criação   de   instituições

particulares   na   medida   em   que   essas   fossem   equiparáveis   às   federais.   No   entanto,   não   havia

universidade federal no Brasil no modelo da UP, motivo pelo qual essa teve de ser desmembrada

nas Faculdades de Medicina, Engenharia e Direito do Paraná (WESTPHALEN, 1988, p. 16).

Deste período até as primeiras reuniões de fundação da FFCLPR em 1937, o cenário

nacional passou por inúmeras mudanças, no que se destacaram a Reforma Francisco Campos de

1931,   a   Revolução  Constitucionalista   de   1932,   o   Manifesto   dos   Pioneiros   de   Educação  Nova

também de 1932, entre outros. Conforme Valéria Floriano Machado, o Paraná não ficou alheio a

essas transformações, nem tampouco a UP. A grosso modo, o Paraná, sob a interventoria de Manoel

Ribas11 durante o Estado Novo, passou por um rígido processo de controle econômico e político,

que  visava  “fragilizar   as   forças   locais,  garantindo  assim a  execução  dos  planos  econômicos  e

políticos nacionais” (MACHADO, 2009, p. 122). Foi no limite dessa conjuntura que começaram as

negociações para a fundação de uma Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras no Paraná.

De maneira geral, a Reforma Francisco Campos buscou homogeneizar e centralizar no

Estado brasileiro o controle sobre o ensino superior, em uma estratégia característica da Era Vargas.

A fim de alcançar tais objetivos, diversas mudanças foram instauradas no cenário educacional; entre

10Como ressaltou Cunha Filho (!988), à altura crescia à afinidade entre o modelo de organização político brasileiro – aRepública ­ e uma ideologia do progresso calcado na atuação dos profissionais bachareis. Havia um reconhecimento eautoridade creditados aos bachareis, sobretudo médicos e engenheiros, que os constituía enquanto portadores de umamissão civilizatória legítima à sociedade brasileira. Tal missão era orientada pelo discurso da técnica e da modernizaçãodo urbano,  ou seja,  pela construção de rodovias,  portos,   inclusão de  tecnologias  na vida diária,  saneamento, entreoutros. Entendia­se, pois, que apenas os bachareis poderiam conduzir o Brasil neste processo de modernização; motivopelo qual, nesse período, o ideal de modernização esteve associado aos bachareis e à técnica (1988, p. 99).11Manoel Ribas (1873­1946) foi um político paranaense, interventor do Paraná de 1932 a 1945. De origem familiarabastada, chegou ao cargo de interventor por indicação do então presidente Getúlio Vargas. Ribas o conheceu duranteseu mandato como prefeito da cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. É considerado um dos grandes estusiastasde projetos educacionais e industrializadores do Paraná (COSTA, 1997, p. 49).

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elas, a permissão para a criação de universidades particulares no Brasil, desde que constituídas por,

no mínimo, três faculdades equiparáveis à Universidade do Rio de Janeiro. Essas poderiam ser as

faculdades   de   direito,   medicina,   engenharia   e   a   particularmente   nova   no   Brasil   faculdade   de

educação,   ciências   e   letras   (MENDONÇA,  2000,   p.   138).  Relativamente   à  última,   a  Reforma

Campos lhe atribuiu uma dupla agenda de atividades: priorizou a formação de docentes para os

ensinos  básicos   e   secundários,   ao  mesmo   tempo  que   a   instituiu   como  núcleo  de  promoção   e

formação de investigações puras de cultura superior (ROTHEN, 2008, p. 153). 

Além disso, no tocante às ciências sociais, foi­lhe conferido caráter profissional do

mesmo quilate  que  profissões  renomadas como direito  e  medicina.  Também sua aprendizagem

passou a ser obrigatória no ensino secundário, forcejando a formação de professores para tanto.

Outros cursos foram abertos nessa época, como pedagogia, farmácia e publicidade, por exemplo.

Houve, pois, uma nova divisão do trabalho intelectual com a complexificação das carreiras. Para

Valéria Machado (2009, p. 133), a profissionalização contribuiu para o entendimento da sociologia

como instrumento racional de compreensão do homem e das sociedades modernas.

Em 1937 foram conduzidas por Omar Gonçalves da Mota, então secretário de Estado

do  Interior  e   Justiça  do  Paraná   e  catedrático  da  Faculdade de  Direito  do  Paraná,   as  primeiras

reuniões para fundação de uma faculdade de filosofia em Curitiba. Mota fora convencido da ideia

por Homero de Mello Braga, pois já anteriormente Mello Braga estava a discutir tal empreitada com

Milton   Carneiro,   tensionando   “criar   em   Curitiba   um   colégio   universitário,   de   nível   médio,   a

exemplo da iniciativa tomada por São Paulo” (HOERNER JUNIOR, 1993, p. 32). Acreditamos que

o colégio universitário a que se referiu Valério Hoerner Júnior era uma das iniciativas do Instituto

de Educação da Universidade de São Paulo (IEUSP), fundado em 1934 e dirigido por Fernando

Azevedo.  O IEUSP marcou,  pois,  a  primeira  experiência  a  nível  universitário  de   formação de

professores para os ensinos básico e secundário. Para tanto, abrigava em anexo jardim de infância,

escolas primária,  secundária  (propedêutica) e de professores (profissional),  centro de psicologia

aplicada e centro de puericultura.  Na escola  de professores,   formavam­se docentes  primários  e

secundários, diretores e inspetores escolares (VIDAL, 2016, p. 1422). No caso paranaense, para

criarem uma instituição deste tipo nos parâmetros da Lei Francisco Campos, era necessária uma

faculdade de filosofia.

Os motivos que levaram Omar da Mota a assumir a ideia não são claros. Ainda assim,

nos   dias   subsequentes   a   seu   encontro   com   Mello   e   Braga,   Mota   travou   contato   com   outros

33

professores das faculdades isoladas do Paraná  e personalidades intelectuais de Curitiba, visando

entusiasmar a elite intelectual paranaense pelo projeto (HORNER, 1993, p. 33). Entre as pessoas

contatadas   por   Mota,   estava   Loureiro   Fernandes,   intelectual   e   membro   do  Centro  de   Estudos

Bandeirantes. Após o contato com Fernandes, o projeto de fundação da FFCLPR foi encampado por

parte intelectuais de Curitiba que, preocupados com o desenvolvimento e progresso do estado, o

conduziram   e   congregaram   diversas   personalidades   políticas   em   seu   entorno.   Ainda   que   tais

intelectuais e Loureiro Fernandes fossem conectados pela confissão católica, seus anseios e projetos

à  FFCLPR foram diferentemente orientados pelo catolicismo,  pela ciência e  por outros fatores,

como veremos.

Para   Valério   Hoerner   Júnior,   o   entusiasmo   de   Omar   da   Mota   com   o   projeto   da

Faculdade, assim como as facilidades que promoveu à fundação da mesma – como a instalação de

sua primeira sede na Assembleia Estadual do Paraná, poderiam ser entendidas à luz de disputas

políticas. Entre 1937 e 1939, Mota ocupou inteirinamente o cargo de interventor estadual do Paraná,

quando Manoel Ribas, o interventor do estado, necessitou se ausentar. Particularmente em 1939,

houve a constituição de manobras políticas para que Motta substituísse permanentemente Ribas na

interventoria do estado.  Ao saber  de  tal  estratégia,  Manoel Ribas o  teria  demitido do cargo de

secretário  do estado do Paraná  e  impedido a constituição de uma carreira  política posterior  no

estado; esse motivo levaria Mota a se transferir posteriormente para o Rio de Janeiro (HOERNER,

1993, p. 33).

Endossa essa hipótese o fato de em 1939, logo após fundada a Faculdade, emergirem

uma série de conflitos entre Manoel Ribas, Omar da Mota e a FFCLPR. Em especial, Ribas fora

apenas parcialmente informado acerca dos trâmites de fundação da Faculdade e desconhecia as

facilidades concedidas por Mota à instituição. Após constatar a participação de seu ex­secretário na

fundação da Faculdade, extinguiu todas as facilidades concedidas por ele, recindiu o contrato entre

a FFCLPR e o ginásio paranaense e forcejou a demissão de membros da diretoria da FFCLPR. No

entendimento de Hoerner Junior, as ações de Ribas orientaram­se por motivos puramente pessoais,

visto que o interventor era um grande entusiasta de projetos educacionais. A motivação última de

suas ações seria, pois, a exclusão de Mota do campo político paranaense, após a fracassada manobra

política em substituir­lhe (HOERNER, 1993, p. 34). Por outro lado, acreditamos que as decisões de

Mota em omitir suas atividades de Ribas e coordenar a fundação e funcionamento da Faculdade

mantinham nexo com a estratégia política que intentou realizar. Pois, como veremos, a FFCLPR foi

fundada por membros da elite política e intelectual parananense, e, assim, Mota conseguiria

34

articular um privilegiado grupo de apoiadores e entusiastas de seus projetos e carreira política.

Não concordamos, portanto, com a compreensão estruturada por Névio de Campos

(2006)  acerca  dos  expedientes   iniciais  para   fundação da  FFCLPR.  Para  Campos,  as  mudanças

advindas com a Lei  Francisco Campos  teriam fomentado os debates sobre a   fundação de uma

faculdade   de   filosofia,   ciências   e   letras   no   Paraná,   especialmente   por   parte   dos   docentes   da

desmembrada   UP.   Em   1937,   Omar   da   Mota,   Milton   Carneiro   e   Homero   de   Melo   Braga,

conduziriam   os   primeiros   debates   oficiais   para   a   criação   de   uma   Faculdade   de   Filosofia   em

Curitiba; para Campos, visavam sobretudo a reestruturação da Universidade do Paraná (2006, p.

143). No entanto, se a fundação da FFCLPR fosse pautada pela finalidade de reestruturar a UP, tal

já  poderia   ter   sido feito,  visto que desde 1931,  com a Lei  Francisco Campos,  era  permitida a

constituição de universidades a partir da integração de três faculdades isoladas (ROTHEN, 2008, p.

145).  Desde  o   início  do  século  XX haviam no  Paraná   as  Faculdade  de  Direito,  Engenharia  e

Medicina;  com efeito,  a  restauração da UP poderia  ter  ocorrido pelo menos seis  anos antes da

fundação da FFCLPR12.

Para além, acreditamos que compreender a FFCLPR à luz das disputas políticas e dos

agentes   envolvidos   em   sua   fundação,   sem   subsumí­la   a   um   expediente   pragmático,   como   a

reestruturação  da  UP,   permite   compreender  mais   complexamente   suas   finalidades   e   objetivos;

principalmente quando temos em vista, como veremos, o lugar ocupado pela FFCLPR no projeto de

modernização do Paraná.  Com efeito,  em nosso entendimento houve uma  simbiose  de distintos

agentes para a formação da FFCLPR, motivo que, por si só, fez desse projeto uma iniciativa não

apenas voltada à  reestruturação da UP, mas também pensado através de distintas perspectivas e

objetivos intelectuais e políticos.  

Não obstante, tendo em vista a predominância de intelectuais católicos sobre o projeto,

discutiremos agora alguns aspectos do Círculo de Estudos Bandeirantes, centro cultural em que se

reunia parte substantiva dos intelectuais de confissão católica envolvidos com a fundação da

FFCLPR.

12Para além, como veremos, quando do reestabelecimento da Universidade do Paraná, em 1946, houve um conflitoacerca da orientação da Universidade; em termos gerais, se esta seria pautada pela técnica e profissionalização ou pelafilosofia neotomista.  Tal tensão sugere,  portanto, que a FFCLPR tinha seu projeto próprio,  pensado conforme seusobjetivos, ao invés de ser uma instituição concebida em termos tão somente de possibilitar a reunificação da UP.

35

2.2 CATOLICISMO E MODERNIDADE

Com a  fundação  da  UP,  perseguiu­se  na   instituição o  objetivo  de  modernizar  o  estado

através da profissionalização e da técnica, como visto. Não obstante, duas décadas após floresceram

algumas percepções acerca da necessidade de estudos orientados sem finalidades práticas e voltados

ao desenvolvimento cultural  e  intelectual  do estado. Com efeito,  a década de 1930 marcou em

Curitiba um período de preocupação e diagnósticos dos rumos do Paraná, pois se entendia que a UP

estava a conduzir o estado para uma “civilização da máquina”  (ANUÁRIO…, 1946, p. 46).

Tais   percepções   e   entendimentos   da   realidade   social   paranaense   foram   formulados

sobretudo por  intelectuais de confissão católica,  reunidos  em centros  de estudos e  agremiações

laicas.   Dessas   agremiações,   interessa­nos   o   Círculo   de   Estudos   Bandeirantes,   visto   sua

preponderância nas negociações para fundação, manutenção e projeto da Faculdade de Filosofia,

Ciências e Letras do Paraná. 

A fundação e estabelecimento do CEB, bem como as atividades e planejamentos que tinham

lugar em suas reuniões – discutiremos à frente ­ mantinham íntimo nexo com as políticas da Igreja

Católica, especialmente em seu projeto de restauração do catolicismo, dando­lhes mormente um

sentido. Para Teodoro Hanicz (2006), a fundação do CEB em 1929 foi promovida e pensada em

termos da restauração católica, projeto operado pela Igreja Católica no ocidente desde o fim do

império  napoleônico.  Nesse  período,  a   Igreja  Católica  adotou uma série  de estratégias  visando

retomar   sua   hegemonia   perdida,   pois   com   a   modernidade   estabeleceu­se   uma   conjuntura   de

questionamento   aos   mandamentos,   direitos   e   privilégios   da   Igreja,   encorajada   sobretudo   pelo

desenvolvimento da ciência e dos Estados laicos. 

2.2.1 O movimento de restauração católico

O movimento de restauração propriamente dito iniciou­se com o pontificado de Leão XII

em 1823. Inicialmente, a Igreja condenou a desordem e desequilíbrio da modernidade, uma vez que

os   princípios   cristãos   deixavam   de   ser   orientadores   para   a   vida   temporal.   Vivia­se,   em   sua

percepção,   uma   conjuntura   de   mediocridade   e   anarquia   moral,   pois,   em   síntese,   os   valores   e

preocupações temporais, sobretudo a ciência, granjeavam espaços e princípios antes organizados e

orientados pela moral católica atemporal.

A partir desse diagnóstico, a Igreja buscou reorganizar sua estrutura eclesiástica, de modo a

distinguir­se das anárquicas instituições modernas, bem como colocar­se em posição de destaque no

processo   de   salvação   da   modernidade   –   salvar   era,   com   efeito,   reorganizar   a   vida   moderna

36

conforme   os   preceitos   católicos   (FRESSATO,   2003,   p.   17).   Para   tanto,   foram   abertas   novas

dioceses, centros de catequeses e feitos investimentos na instrução dos padres. Apenas em 1878

haveria uma mudança na orientação do movimento: reaproximava­se, pois, o catolicismo do mundo

moderno a partir duma perspectiva da Igreja como “mãe e guia moral da civilização e a religião

como a base da convivência humana” (HANICZ, 2006, p. 22). Para tanto, buscou a Igreja atuar na

esfera cultural, na estruturação de políticas dos Estados e intervir na realidade social concreta.

Relativamente   à   esfera   cultural,   houve   uma   abertura   da   religião   católica   à   ciência   e

intelectualidade; isso foi possível sobretudo em razão da filosofia tomista revivida pela Igreja por

meio da encíclica Aeterni Patris, de 1879. Grosso modo, o (neo)tomismo compreendia ser possível

o exercício da ciência e  da prática  religiosa,  visto que a ciência era um conhecimento parcial,

calcado apenas no empírico, enquanto que a religião, por sua vez, era um saber total que englobava

e orientava o empírico (FRESSATO,  2003, p. 18­19). Ou seja, em um diálogo com a modernidade,

a   Igreja  abriu­se  à  produção  de  conhecimento   intelectual   e   científico,  desde  que  esses   fossem

conformados aos princípios católicos.

Cabe ressaltar que o processo de Restauração teve como seu principal agente o leigo. Porém,

não  qualquer   leigo,  mas  o   leigo   intelectual,   organizado  em agremiações,   engajado  emprojetos culturais ou aquele que produz cultura e contribui para o crescimento da ciência eda sociedade a partir da visão católica. Portanto, trata­se de uma camada social que elaborauma agenda e um projeto de ação no campo da cultura (HANICZ, 2006, p. 176).

Isso atestou,  pois,  uma estratégia  da  Igreja  em se aproximar  do mundo e de seus

agentes, no sentido de formá­los sob um prisma católico de entendimento da vida temporal. Ao

mesmo   tempo,   sinalizou   a   “permanência   do   catolicismo   como   uma   religião   que   possui   um

arcabouço de valores, uma visão e interpretação do mundo e deseja continuar sendo uma proposta

de orientação para a sociedade moderna” (ibidem), para além, pois, de uma simples luta de resgate

da tradição católica hegemônica ou de condenação da modernidade por si mesma.

No Brasil,  o processo de restauração da Igreja ganhou força a partir da década de

1920. Durante as primeiras décadas do século XX buscou­se, pois, reformar romanizadamente o

credo e rito católico no país, afastando­o da religião católica luso­brasileira até então dominante

(BEOZZO, p. 345). Para tanto, foram trazidas diversas congregações e ordens religiosas da Europa

para o Brasil,  de modo a instituir  sua reforma no país.  Com efeito,  essa premissa europeizada

dirigiu­se mormente às elites brasileiras, por meio da instituição de colégios católicos e de uma

aproximação com a intelectualidade católica brasileira. 

Conforme Tânia Salem (1982), foi a partir da relação entre Dom Leme, arcebispo das

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dioceses   de   Olinda   e   Recife,   e   o   intelectual   católico   Jackson   Figueiredo   que   se   iniciou   uma

mudança  na  conduta  da   Igreja  brasileira.  Buscou­se,  pois,  uma aproximação da   Igreja  com os

leigos, num registro de “cooptação de intelectuais”; para tanto, a hierarquia eclesiástica católica

elaborou uma estratégia de ação junto ao laicato católico, a fim de que esse lutasse e alastrasse a

cultura católica de volta à sociedade brasileira, especialmente a nível político­partidário (SALEM,

1982, p. 6). O núcleo de promoção desse pensamento foi o Centro Dom Vital (CDV), centro de

estudos católico, e a revista A Ordem, valioso instrumento de difusão dos valores católicos no país.

Com   a   entrada   e   liderança   de   Alceu   Amoroso   Lima   no   CDV   em   1928,   foram

experimentadas   mudanças   quanto   às   orientações   da   Igreja   no   país.   Pretendeu­se,   sobretudo,

distanciar  o  Centro  das  disputas  partidárias   e  cultivar  uma sólida  cultura   superior;   com Alceu

Amoroso   “a   função   espiritual   da   Igreja   estaria   estreitamente   ligada   a   uma   missão   cultural”

(SALEM,   1982,   p.   13).   Assim,   no   próprio   Centro   Dom   Vital   foram   instituídas   conferências

filosóficas,   sociológicas,   educacionais   e   religiosas.   Tencionavam,   pois,   construir   um   sólido

conhecimento intelectual e religioso, de modo a formar um grupo de homens especializados na

trasmissão de uma cultura superior de horizonte confessional (ibidem, p. 25). 

Várias dessas situações desdobraram­se também em Curitiba. Criada em 1894, a diocese de

Curitiba   teve   sua   expansão   a  partir   de  1906,  quando   assumiu   sua  direção  o  bispo  Dom João

Francisco Braga ­ ele ficaria de posse da diocese até 1935. Braga esforçou­se por estabelecer uma

rede de ensino católica no Paraná, regida por congregações religiosas europeias e femininas; nesse

período, seriam fundados 20 colégios e educandários. Conforme Hanicz (2006, p. 179), à  essas

instituições   de   ensino   comparecia   a   elite   paranaense;   observou­se     no   Paraná,   portanto,   a

constituição de uma nova mentalidade católica através do alto, isto é, por meio da educação dos

filhos da elite. 

2.2.2 O Centro de Estudos Bandeirantes

Ainda que fundado sob a égide do movimento de restauração, o CEB não foi uma iniciativa

direta da Igreja e, sim, do  padre  Luiz Gonzaga  Miele e dos leigos  José  Mansur Faranir Guérios e

José Loureiro Fernandes. No entanto, a presença do padre Miele garantiu ao Círculo uma liderança

católica atualizada e em sincronia com as intenções reformadoras da Igreja (CAMPOS,   2011, p.

138). A ideia desses  três fundadores era constituir um centro de estudos católico,  ou seja, uma

sociedade cultural, assim como havia nas metrópoles brasileiras e, de modo geral, ocidentais. Por

meio   de  um  esclarecimento  de  horizonte   católico   neotomista,  o   CEB  guardava   o  objetivo   de

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compreender e resolver problemas intelectuais e morais, esmerar o espírito e fortificar o caráter dos

homens curitibanos (FRESSATO, 2003, p. 4). 

Haja visto a existência prévia de agremiações católicas em Curitiba, como a União dos

Moços Católicos de Curitiba, a ideia logo encontrou eco e, após sua fundação, o CEB já contava

com oito novos membros: Antônio de Paula, Benedito Nicolau dos Santos, Bento Munhoz da Rocha

Neto,  Carlos de Araújo Brito Pereira,  José  de Sá  Nunes, Liguarú  Espírito Santo, Pedro Ribeiro

Macedo da Costa e Waldemiro Teixeira de Freitas (HANICZ, 2006, p. 210). Esses eram, no dizer

de Névio de Campos (2011), personalidades da elite curitibana, em especial os vinculados à família

Munhoz da Rocha ou Fernandes. Os bandeirantes articulavam status, condição financeira e titulação

acadêmica, de modo a constituírem uma “camada social privilegiada” em Curitiba   (CAMPOS,

2011, p. 137).

Após tempo considerável de debates e conflitos entre os católicos e anticlericais em

Curitiba13,   o   CEB,   enquanto   centro   cultural   católico,   tinha   em   suas   premissas   o   esforço   de

recrudescer a moral católica entre os intelectuais paranaenses (FRESSATO, 2003, p. 6). Pois se

diagnosticava  um esmorecimento  dos  valores   católicos  na  modernidade  devido  a  dois  grandes

fatores: a devoção do homem moderno ao mundo material, de modo a deslocar os valores longêvos

e duradouros do catolicismo à esfera doméstica, além de tensioná­los à concorrência com outros

preceitos;   e  a   vulgaridade   do   pensamento   moderno,   entendido   como   parcelado   e,   por   isso,

superficial, uma vez que não atingia a totalidade do pensamento humano. Tais elementos estavam

enredados  na   composição  do  argumento  maior  de  anarquia  da  modernidade:   essa  era,   pois,   o

esfacelamento da ordem católica tradicional e a emergência duma amálgama de interpretações do

mundo que pretendiam vigência na modernidade (FRESSATO, 2003, p. 5­6).

Tais preocupações correspondiam aos dilemas enfrentados pela Igreja Católica no período.

A sincronia  entre  esses  questionamentos  e  o  movimento  de   restauração da   Igreja   foram ações

orientadas pelo padre Miele ­ mesmo após sua saída do Círculo em 1931, continuou a orientar os

membros do CEB com aconselhamentos  através  de cartas.  Contudo,  de sua saída em diante,  a

direção do CEB se constituiu integralmente por católicos leigos. Para Loureiro Fernandes, membro

fundador,   o   sentido   da   existência   do   CEB   era   ser   um   centro   cultural,   porém   católico;

diferentemente, portanto, de uma instituição estritamente confessional e sob controle de autoridades

da Igreja (CAMPOS, 2011, p. 144). 

Haja visto a complexidade do CEB e de suas finalidades, seu intuito último foi, enquanto

13Sobre o tema, ver Maria Tarcisa Bega, Letras e política no Paraná: simbolistas e anticlericais na República Velha.

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centro cultural,  a formação de um laicato católico intelectualizado,   isto é,  o cultivo cultural  de

católicos leigos com vistas não só à composição de um saber católico e, sim, à constituição de um

grupo de homens com sólido conhecimento intelectual, orientados pela moral católica e envolvidos

no  diagnóstico   e   resolução  dos  problemas   –   autodiagnosticados   ­   da   modernidade  paranaense

(HANICZ,   2006,   p.   229).   Tais   problemas   eram,   com   efeito,   a   mediocridade   do   pensamento

paranaense, a ausência de reflexão intelectual desinteressada, a perda dos valores e moral católicos

na condução da vida dos indivíduos e na realidade social.

Se esse era o projeto mais amplo do CEB como centro cultural católico, a nível individual

seus membros compartilhavam diferentes pertencimentos à religião católica. Esse foi o caso, por

exemplo,  de Loureiro  Fernandes:  conjugando desde a  juventude o entusiasmo pela ciência e  a

religião   católica,   Loureiro   refletia   o   católico   leigo   de   início   do   século   XX   interessado   pelo

conhecimento   científico   e   preocupado   com   os   desdobramentos   da   modernidade.   Contudo,   foi

perceptível a mudança de orientação do intelectual quanto ao catolicismo ao longo dos anos, fato

expresso  sobretudo na  carta  enviada  por  Loureiro  ao padre  Luigi  Castagnola  em 1955.  Nessa,

atestou  o   intelectual   esperar   “que  não  perturbem a   serenidade  de   suas  convicções   religiosas   e

demanda que não falem mais sobre o assunto, pois este cabia somente ao  íntimo de cada qual”

(DRESCH, 2016, p. 26). Tal pedido deu­se num contexto em que o padre buscou compreender o

que   denominou   como  “crise   religiosa”  do   intelectual,   visto  que   esse   estaria   se   afastando  dos

princípios católicos ao longo da vida. A troca de correspondências se encerrou com a afirmativa do

padre acerca de seu conhecimento, pela primeira vez, de que o intelectual já não era mais católico

(ibidem). No entendimento de Gabriella Dresch (2016), a trajetória acadêmica de Loureiro e seus

projetos   científicos,   bem   como   seu   trânsito   entre   diversas   instituições,   inclusive   as   católicas,

imprimiram   ao   intelectual   uma   localização   ambígua   no   campo   religioso,   cuja   expressão   mais

acabada foi a carta enviada ao padre Castagnola.

Por outro lado, por exemplo, Bento Munhoz da Rocha Neto, membro do CEB desde sua

fundação e reconhecido católico fervoroso, expressou ao longo de sua trajetória tanto seu credo

católico quanto sua compreensão de mundo via neotomismo. Ao largo de sua vida intelectual e

política, entrelaçou noções e princípios cristãos ao seu discurso de progresso, de modo a constituir

um futuro ordenado e moral ao Paraná, especialmente em sua vida política ­ Bento Munhoz foi

governador do Paraná na década de 50 (CORDOVA, 2009, p. 14). 

Destacam­se, pois, as diferenciações internas ao CEB e a composição de um projeto católico

que, ancorado no neotomismo – veremos à frente, permitiu a conjugação de diferentes convicções

40

sobre   catolicismo,   ciência   e   intelectualidade.   Para   além,   tal   percepção   permite­nos   melhor

compreender as agências e objetivos que, individualmente, foram tomados pelos membros do CEB

no espaço da FFCLPR, ao invés de reduzir  suas ações a um único sentido católico. 

O CEB contava com uma   dupla     agenda     de     atividades,     isto     é,     de     formação

intelectual   e disseminação de conhecimento de  horizonte  católico  em Curitiba. Quanto ao cultivo

intelectual de seus próprios membros, destacamos suas reuniões e o curso de filosofia neotomista,

ministrado pelo padre Jesus Ballarin, de maio de 1935 a dezembro de 1936. As reuniões ordinárias

do CEB eram semanais, apenas para os membros e contavam com exposições temáticas realizadas

pelos  próprios  bandeirantes;  poderiam ser  abordados quaisquer   temas desde que ancorados  nos

princípios   católicos   (CAMPOS,   2011,   p.   140).  Tinham  lugar,   pois,   discussões  que   iam  desde

semântica até a cronologia pré­histórica,  permitindo aos membros a construção, aprimoramento e

compartilhamento  de  um vasto   repertório   científico;  para  além disso,  privilegiavam discussões

sobre o Paraná, celebrando a história e cultura paranaense (HANICZ, 2006, p. 236).  

Relativamente a irradiar para a sociedade mais ampla seus conhecimentos e discussões, o

faziam   por   meio   da   Revista   do   CEB,   fundada   em   1934,   assim   como   através   de   sessões

extraordinárias   e   da   fundação   de   instituições   de   ensino,   como   a   FFCLPR.   Percebe­se,   dessa

maneira,   uma   estratégia  tanto  para  difundir   suas   concepções   e   visões  de  mundo,   quanto  para

dialogar com a modernidade e tomar parte nesse processo, conduzindo­o.

A   leitura   das   atas   das   reuniões   ordinárias   permitiu,   pois,   reconstituir   alguns   dos

contatos do CEB com o movimento de reação católica, mormente com o intelectual Alceu Amoroso

Lima, correspondente honorário do Círculo14. O intelectual é significativamente mencionado como

embasamento para discussões de assuntos como educação e da Ação Católica Brasileira, além de

serem lidos textos seus nas reuniões ordinárias – por exemplo, “No limiar da idade nova” ou “A

Igreja e o momento político”15. Sugere­se, pois, a sincronia do CEB com as ambições mais amplas

da Igreja Católica no Brasil, sobretudo no tocante às disputas pelo campo pedagógico, visto que

ambos   compreendiam   a   educação   como   afim   ao   catolicismo,   dado   sua   natureza   integral,   de

formação completa do caráter humano (HANICZ, 2006, p. 280). Outrossim, os membros do CEB

colaboraram   com   investigações   realizadas   por   Alceu   Amoroso   e   tomaram   parte   nas   reuniões

preliminares de fundação, ainda que não tenham feito parte dela, da Confederação das Associações

Católicas, além de auxiliarem na promoção de debates sobre a Ação Católica16.   O CEB esteve,

14Livro 3 de reuniões ordinárias, ata nº 230, 1935, p. 30.15Livro 3 de reuniões ordinárias, atas: n º229, 1935, p. 30; nº 235, 1935, p. 38, respectivamente.16Livro 3 de reuniões ordinárias, atas: nº 244, 1936, p. 50; anexo 2 da ata de nº 250, 1936, p. 257, respectivamente.

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conforme indica a documentação, alinhado às questões e posturas orientadas pela Igreja Católica

brasileira nas primeiras décadas do século XX.

O   curso   de   filosofia   neotomista   foi   um   dos   principais   fundamentos   para   os

empreendimentos   intelectuais   de   seus   membros.  Pois   permitia   o   interesse   pela   ciência   e   o

desenvolvimento   científico,   uma   vez   que   não  compreendia   ciência   e   religião   como   polos

mutuamente  excludentes.  Em verdade,  percebia­se  a  possibilidade  de  a   inovação  científica   ser

orientada   pelas   premissas   e   ideais   universais   do   catolicismo,   à   medida   que   se   entendia   o

conhecimento empírico (científico) como submetido e englobado pelos princípios extraterrenos do

catolicismo.  Enfim, o neotomismo foi uma reapropriação da filosofia de São Tomás de Aquino à

luz dos dilemas intelectuais modernos, ou seja, através do tomismo pretendia­se construir “uma

cristandade com uma nova face que se caracterizasse pela preocupação em construir um canal de

diálogo com a modernidade” (HANICZ, 2006, p.  260). E a modernidade, nesse momento, pautava­

se sobretudo pelas inovações e desenvolvimentos científicos.

Internamente ao CEB, se constituíram, pois, diferentes intelectuais, com propostas e

percepções distintas do entrelaçamento entre ciência e religião. Embora seja difícil mensurar as

concepções individuais de cada um dos membros acerca do neotomismo, seria claro,  décadas à

frente na FFCLPR, seus discernimentos distintos acerca do catolicismo. Particularmente no espaço

da FFCLPR, por exemplo, houve conflitos que puseram em embate os próprios membros do CEB

acerca do projeto educacional da Faculdade (MACHADO, 2009, p. 15). Foi o caso do conflito, em

1955, entre Homero Batista de Barros, então diretor da FFCLPR, e  Paulo Duarte, redator da revista

Anhembi; iniciado através da defesa de Duarte a Bruno Enei, candidato adequadamente qualificado

à   cátedra   de   Língua   e   literatura   italiana   que   a   perdeu   para   o   padre   Luigi   Castagnola,   cuja

qualificação era um título de notório saber conferido pela própria FFCLPR. O embate lançou luz a

uma   direção   fortemente   católica   da   instituição,   à  medida  que   a   querela   tomava   proporções   e

adicionava   novos   acontecimentos   ao   conflito17.   O   interessante   é   perceber,   pois,   as   posições

assumidas pelos intelectuais de confissão católica e membros do CEB dentro da FFCLPR: alguns,

tais como Loureiro Fernandes e Manoel Lacerda Pinto, manifestaram desagrado com a conduta de

Barros; outros, como Rosário Mansur Guérios, o defenderam. Destacamos assim, brevemente, a

existência de diferentes visões de mundo e finalidades entre os intelectuais que pertenciam ao CEB.

17Para   mais   informações,   consultar:   MACHADO,   Valéria   Floriano.   Diatribes   viperinas   e   digressões   quixotecas:debates intelectuais e projetos educacionais na década de 1950. Curitiba, Programa de Pós­Graduação em Sociologia,UFPR.

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Ao longo da década de 1930, ingressaram ao CEB novos membros, entre eles Arthur

Ferreira  Santos,  Homero de  Barros,  Brasil  Pinheiro  Machado,  Osvaldo Piloto,  Manuel  Lacerda

Pinto, Flávio Suplicy de Lacerda, entre outros; os novos membros eram, igualmente, pertencentes a

famílias tradicionais da elite curitibana. As décadas de 30 e 40 marcaram, pois, períodos de intensa

atividade e debates no CEB, de forma a constituir uma agenda de atividades que ganhou corpo e

prestígio ao longo dos anos. Por meio de uma compreensão de mundo neotomista, enquanto centro

cultural, o CEB investiu em cultivar intelectualmente seus membros. Entre seus intuitos, esteve a

preocupação em orientar uma modernização de moral católica ao Paraná. Nesse sentido, alguns de

seus membros se imiscuíram no projeto de fundação da FFCLPR por entenderem, de maneira geral,

uma faculdade de filosofia como espaço propício para formação de homens afeitos às discussões

filosóficas e ao conhecimento puro.

2.3 OS MODELOS DE UMA FUTURA INSTITUIÇÃO

Em 1938,  foi  fundada em Curitiba a Faculdade de Filosofia,  Ciências e  Letras do

Paraná. Como ressaltou Cecília Westphalen, sua constituição decerto foi inspirada pela fundação e

objetivos  da  FFCL­USP.  No entanto,   a  base  de   sua  organização   foi  baseada  na  Faculdade  de

Filosofia de São Bento (FFSB), em São Paulo (HOERNER, 1993, p. 32). A FFSB foi fundada em

1908 por Miguel Kruse, abade da abadia de São Bento, onde foi instalada, por Paulo Rodrigues,

arcebispo   metropolitano   de   São   Paulo,   e   por   Reynaldo   Porchat,   José   Bonifácio   de   Oliveira

Coutinho e Adolpho Augusto Pinto, professores da Faculdade de Direito de São Paulo. A FFSB foi

a primeira instituição a sediar um curso superior de filosofia no Brasil (MUCHAIL, 1992,  p. 01).

Para Salma Muchail (1992, p. 02), a fundação da FFSB teve por objetivo o diagnóstico

de uma situação defeituosa e singular no Brasil; essa situação seria a exclusão dos conhecimentos

filosóficos do ensino superior brasileiro. Pois afora as disciplinas de filosofia do ensino secundário,

apenas o curso de direito contava com alguma discussão filosófica.  Conforme entendia Miguel

Kruse, tal estado de coisas conduzia a uma mediocridade científica, voltada integralmente para fins

utilitários  e  profissionais   (ibidem).  Portanto,  era   imprescindível  a  criação de  uma faculdade de

filosofia e letras no Brasil.

Em   1909,   buscaram   pelo   reconhecimento   oficial   da   instituição   junto   ao   Estado

brasileiro. No entanto, diante da negativa a tal preposição, a Faculdade de Filosofia de São Bento

agregou­se à Universidade Católica de Louvain, na Bélgica; seus diplomas, ainda que não tivessem

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reconhecimento   oficial,   tinham,   pois,   valor   cultural   (ibidem,   p.   04).   Em   1936   obteve   o

reconhecimento   oficial   do   governo   brasileiro,   readequando­se   ao   modelo   institucional   da   lei

Franciso Campos. Assim, passou a chamar­se Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São

Bento (FFCLSB) e organizou­se em quatro seções com os seguintes cursos: Filosofia (filosofia),

Ciências (matemática, física, geografia e história e ciências sociais), Letras (letras clássicas, neo­

latinas, anglo­germânicas) e Pedagogia (pedagogia e didática) (ibidem).  

Conforme Valério  Hoerner  Júnior   (1993),  este  modelo organizacional  da FFCLSB

inspirou a estrutura da FFCLPR. Em 1937, Homero de Mello e Braga e Milton Carneiro foram à

Faculdade  de  São  Bento   estudar   seu  projeto   estrutural.  De   lá,   voltaram com os   “currículos   e

mecanismos   burocráticos   que   serviram   de   base   para   a   organização   da   primeira   faculdade

paranaense” (HOERNER, 1993, p.  32).  Assim, à  altura de sua fundação, em 1938, a FFCLPR

apresentava o modelo organizacional da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São Bento.

Porém, como situou Cecília Westphalen (1988, p. 10), com a criação da Universidade

do Brasil (UdB) em 193918, instituição federal articulada pelo então ministro da educação e saúde

Gustavo  Capanema,   foi  prescrito  um modelo  universitário  pelo  qual   as  demais   instituições  de

ensino superior deveriam se orientar. Em especial, a Faculdade Nacional de Filosofia (FNFi) da

UdB se tornou modelo nacional às faculdades congêneres e à  preparação de professores para o

ensino básico (FAVERO, 1989, p. 12). A padronização das Faculdade de Filosofia foi decretada em

1939 pela lei n. 1.190, que previa a instituição da FNFi como instituição modelo ao Brasil. Houve,

portanto, uma readqueação da FFCLPR ao modelo da FNFi em 1939.

Estruturada a partir de quatro seções, Filosofia, Letras, Ciências, Pedagogia, mais a

Seção   Especial   de   Didática,   os   cursos   da   FNFi   se   organizavam   pelo   modelo   de   formação

universitária 3+1. Isto é, os cursos seriados – de graduação – tinham duração de três anos, cuja

conclusão conferia  o  diploma de  bacharel   ao  discente;   caso  desejasse   licenciar­se,  o  estudante

deveria cursar mais um ano na seção especial de didática (FAVERO, 1989, p. 11).  De duração de

um ano, o curso de didática era organizado a partir de seis disciplinas anuais: didática geral, didática

especial,   psicologia   educacional,   administração   escolar,   fundamentos  biológicos  da   educação   e

fundamentos sociológicos da educação. Uma vez que qualquer aluno de qualquer curso poderia

licenciar­se, os programas destas disciplinas eram pensados de acordo com a grade curricular do

bacharelado de origem. Compreende­se, com efeito, que o grande expediente da FNFi foi a

18Os debates e articulações iniciais para a fundação da Udb datam de 1937, com a propugnação da lei nº 452, de 5 demaio de 1937, que visava reorganizar a Universidade do Rio de Janeiro (WESTPHALEN, 1988, p. 10).

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habilitação de um vasto corpo docente para as escolas secundárias.  

No bojo, portanto, dessas orientações e perspectivas de ensino superior, a Faculdade

de  Filosofia,  Ciências  e  Letras  do  Paraná   foi   fundada  em 1938  por  31   intelectuais   ligados   às

Faculdades de Direito, Medicina ou Engenharia, à Escola de Agronomia do estado e ao Círculo de

Estudos   Bandeirantes.   Instituição   privada,   inicialmente   organizou­se   em   três   departamentos:

Filosofia,  Ciências   e  Letras,  mais   o   Instituto  Superior  de  Educação.  Em seu  primeiro  ano  de

funcionamento adotou,  pois,  o modelo  institucional  da Faculdade de Filosofia  de São Bento e,

posteriormente,  da  Faculdade Nacional  de  Filosofia.  Abaixo  discutiremos  a   implantação destes

modelos, sobretudo da FNFi, e os objetivos próprios da FFCLPR.

2.3.1 A Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná

O anseio último de criação da FFCLPR foi a percepção de um atraso intelectual no

Paraná. Isto é, ainda que houvesse a fragmentada Universidade do Paraná, a falta de uma faculdade

de filosofia contribuía para o baixo nível intelectual do estado. Faltava um saber capaz de aglutinar

e dar um sentido cultural e aprofundado ao conhecimento técnico produzido pela fragmentada UP.

Nas palavras de Brasil Pinheiro Machado, paraninfo da primeira turma de formandos da FFCLPR

em 1940:

Ao   par   da   necessidade   da   formação   de   técnicos,   cresce,   no   Brasil,   a   necessidade   daformação dessas “elites” intelectuais, voltadas aos problemas básicos e desinteressados doespírito,   com   economia   de   energia   e   com   proximidade   da   vida   real,   porque   dessesproblemas básicos do espírito é que descendem a possibilidade da técnica e a sua disciplina,como da inteligência depende a ordenação das coisas (ANUÁRIO…, 1941, p. 42).

Essa percepção do papel das universidades brasileiras como centros de formação não

apenas profissional, mas também intelectual era corrente na época, resultado de esforços para a

fundação  de   faculdades  de   filosofia  desde  os  anos  1920  no  Brasil.  A  rigor,   a   intelectualidade

brasileira  entendia  ser  necessário   romper  com os   limites   técnico­profissionais  dos   institutos  de

ensino superior brasileiros, pois apenas por meio de um conhecimento puro e desinteressado se

atingiria  modernizar  o  país   (FAVERO, 2003,  p.  110).  Com efeito,  os   intelectuais  da  FFCLPR

entendiam­se como essa elite intelectual encarregada de, através do conhecimento filosófico puro,

criar   “um   clima   propício   ao   desabrochar   de   uma   verdadeira   liderança   intelectual   dentro   do

desordenado ambiente cultural nacional” (ANUÁRIO…, 1941, p. 42). 

Concebida a partir duma perspectiva neotomista, a FFCLPR se constituiu como espaço

de “convivência entre a tradição e a inovação” (CAMPOS, 2006, p. 142); neste sentido, expressava

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um objetivo  de  ordenação  da  cultura  brasileira   a  partir  da   filosofia  católica.  Com efeito,   seus

intelectuais compreendiam a nação como uma cultura em constante transformação, cujo papel dos

intelectuais era mantê­la viva, “em contínuo ajustamento de seus elementos às épocas, sem quebrar

a sua unidade e sua tradição” (ibidem). Ou seja, tratava­se de um projeto modernizador atrelado à

tradição. Ainda que parcialmente contraditório, tal ideário exprimia uma percepção de modernidade

marcada pelo diagnóstico de “desintegração e mudança, de luta e contradição, de ambigüidade e

angústia” (CAMPOS, 2006, p. 165).

No caso  do  Paraná,   como salientou  José  Loureiro  Fernandes  em seu discurso aos

bachareis de 1943, o papel das faculdades de filosofia era produzir um sólido conhecimento cultural

desinteressado, ou seja, “não tendo em mira o lado prático, no sentido exclusivo dos proventos

pecuniários […], sua finalidade é  [formar] uma elite de pensadores,  de sonhadores idealistas, a

serviço do bem comum” (1943, p. 4). A partir disso,  deveria nortear a mudança da vida moderna. A

intelectualidade   paranaense   vinculada   ao   projeto   da   FFCLPR   se   compreendia,   pois,   como

“portadora de um projeto modernizador do Paraná” (CAMPOS, 2006, p. 166). 

Assim,  em 1939,  a  FFCLPR assumia  os  seguintes  objetivos  no seio  da  sociedade

paranaense

“ampliar   a   cultura   no   domínio   das   ciências   puras;   promover   e   facilitar   a   prática   deinvestigações originais; desenvolver e especializar conhecimentos necessários ao exercíciodo   magistério;   sistematizar   e   aperfeiçoar   a   educação   técnica   e   científica   para   odesenvolvimento profícuo de diversas atividades nacionais” (WESTPHALEN, 1988, p. 14).

Sua primeira diretoria provisória fora constituída pelos professores Omar Gonçalves

da Mota como diretor, Carlos de Paula Soares como vice­diretor e Homero de Melo e Braga como

secretário,  e funcionava na   sede do Congresso Legislativo Estadual (ibidem, p. 20). Composto

também  o  conselho  técnico­administrativo,  do  qual faziam parte o padre Jesus Ballarin, Loureiro

Fernandes,  Carlos  Soares,  entre  outros,  aprovou­se em seguida  o funcionamento dos  cursos  de

Filosofia, Ciências Químicas, Geografia e História, Ciências Sociais e Políticas e de Educação, cada

qual  com 20 vagas.  Negociou­se,   também, a administração do curso complementar  do Ginásio

Paranaense, de modo a receita do Ginásio passar à Faculdade.

Em razão do rompimento da  coalizão política do professor  Omar da Mota com o

interventor Manoel Ribas em 1939, houve a transferência da sede da FFCLPR para as instalações

do CEB e da UP. Também nesse período, dados os escassos recursos para o funcionamento da

instituição, Loureiro Fernandes, Homero de Braga e o padre Jesus Ballarin negociaram com os

Irmãos Maristas, da União Brasileira de Educação e Ensino (UBEE), a manutenção da FFCLPR.

46

Nota­se, assim, o crescente predomínio do laicato católico sob a FFCLPR. 

Após  o  contrato  com os   Irmãos Maristas  e  da promulgação da   lei  nº  1.190/39,  o

Conselho Técnico e Adminsitrativo da FFCLPR adequou seu rol de cursos ofertados, currículos e

programas das  disciplinas aos  da FNFi,   tornada faculdade padrão19  (ATAS…, 1939, p.  14­15).

Ainda, a diretoria da FFCLPR fora alterada: Brasil Pinheiro Machado foi escolhido diretor, o Padre

Jesus   Ballarin,   vice­diretor,   e   Homero   de   Melo   e   Braga,   secretário.   Quanto   à   estrutura   da

instituição,  extinguiu­se  o   Instituto  Superior  de  Educação  e  acrescentou­se  o  Departamento  de

Pedagogia, além da oferta dos seguintes cursos regulares: Matemática, Física, Química, História

Natural,   Geografia   e   História,   Ciências   Sociais,   Letras   Clássicas,   Letras   Neolatinas,   Letras

Anglogermânicas e Pedagogia. Foram também instituídos dois cursos anexos, o de Administradores

Escolares e o de Formação de Professores Primários. Ao novo Departamento de Pedagogia coube o

curso especial de didática, destinado à formação em licenciatura dos discentes (WESTPHALEN,

1988, p. 23). 

Houve,   ainda,   outra   alteração   significativa   na   FFCLPR.  Após   o   contrato   com   os

Irmãos Maristas e a UBEE em 1939, foi interdita a docência de mulheres na Faculdade, pois estes

não   permitiam   mulheres   no   corpo   docente   de   suas   instituições   (ALVES,   1988,   p.   75).   Essa

regulamentação em específico vigorou a partir de 1941, ocasionando a demissão das professoras

assistentes e auxiliares de ensino no mesmo ano; as que desejaram, contudo, terminar o ano­letivo,

fizeram­no voluntariamente. Estas professoras foram contratadas ao final de 1940, pois eram ex­

alunas formadas nas primeiras turmas da FFCLPR. Eram, com efeito, diplomadas nas áreas em que

estavam lecionando. As mulheres retornariam à docência na FFCLPR somente uma década depois,

quando do rompimento do contrato com a UBEE e em no contexto de federalização da instituição. 

Por fim, o corpo docente da FFCLPR era estruturado segundo o modelo de cátedras.

Conforme consta  no  Regimento   Interno da  FFCLPR de 1940,  artigo  83:  “o  corpo docente  da

Faculdade será  constituído por professores catedráticos,  docentes­livres,  auxiliares de ensino,  e,

eventualmente, professores contratados” (REGIMENTO…, 1940, p. 32). A carreira de professor

dentro da instituição respondia, portanto, à seguinte hierarquia: 1) instrutor, 2) assistente, 3) livre­

docente e 4) catedrático, em que o catedrático representava o ápice da carreira docente. 

Escolhido por concurso ou nomeado por comprovação de seu saber, o catedrático era o

docente responsável pela regência de uma cátedra específica da instituição. Dado que o catedrático

19Fonte: Atas do Conselho Técnico e Administrativo da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná, 1940, p. 14­15; p. 23. Arquivo do Setor de Educação UFPR, Livro 47.

47

era concursado vitalício e inamovível (após 10 anos), este dominava a cadeira e, consequentemente,

a área de estudos por  toda sua carreira.  No caso de criação de novas cadeiras da mesma área,

constituindo  um departamento,   o   catedrático   também  as   regia.  Tanto  os   instrutores   quanto  os

assistentes  eram  indicados  pelos   catedráticos,  devendo,  os  primeiros,   auxiliar  na  condução das

cadeiras regidas pelos catedráticos, assim como em suas pesquisas; aos assistentes, por seu turno,

competia o auxílio ao catedrático diretamente em sala de aula (REGIMENTO…, 1939, p. 39). Aos

assistentes,   após  dois   anos  de   trabalho,   era  obrigatório  prestar  o   concurso  à   livre­docência  na

cátedra  em que atuava.   Já  os   livre­docentes  eram selecionados  a   fim de  ampliar  a  capacidade

didática da instituição; eram escolhidos mediante concurso, em que apresentavam sua tese de livre­

docência (REGIMENTO…, 1939, p. 41­42). Na prática, como veremos, a trajetória entre os cargos

era permeadas por muitas variáveis, bem como consolidada sobretudo através de redes de contato.

O sentido último da fundação da FFCLPR, podemos dizer, foi a constituição de uma

elite intelectual capaz de orientar a modernização do Paraná, no sentido de permitir a renovação

cultural do estado sem desintegrar sua unidade e tradição. Pois se compreendia que as mudanças da

vida moderna apenas seriam ordenadas e integradas se tivessem por base um sólido conhecimento

filosófico. A partir da reflexão intelectual entendia­se ser possível reverter mediocridade cultural

paranaense,  decorrente do massivo conhecimento técnico produzido no estado. Dada a vultuosa

presença de intelectuais de confissão católica na instituição, uma das linhagens filosóficas de maior

fôlego e alcance na Faculdade foi o neotomismo. Pois foi através dessa filosofia – da relação que

esta promovia entre ciência e religião ­ que parte dos intelectuais vinculados ao CEB se envolveram

na fundação de uma faculdadede filosofia. No bojo desas concepções e objetivos, foi pensada a

Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná. 

2.4 CIÊNCIAS SOCIAIS COMO ENSINO SUPERIOR: DISCENTES E DOCENTES

Em cinco de março de 1938 foi publicado o primeiro edital de concurso de habilitação

– vestibular ­ da FFCLPR. Divulgado tanto no jornal Diário da Tarde, quanto enviado na forma de

cirulares   às   casas   dos   concluintes   do   curso   ginasial,   o   edital   declarava   estarem   abertas,   “na

secretaria desta Faculdade, à rua Barão do Rio Branco, edifício da antiga Assembleia Legislativa do

Estado, de 5 a 25 do corrente, as inscrições para o concurso de habilitação à matrícula” (GLASER,

1988, p. 17­18).  Os programas para os concursos de habilitação seriam baseados nos programas das

disciplinas cursadas nos ensinos fundamentais e ginásios oficiais. 

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Para o curso de Ciências Sociais e Políticas20  se  inscreveram oito candidatos; eram sete

homens e uma mulher21.  O concurso se realizou na sede da própria  FFCLPR e as provas para

Ciências Sociais e Políticas tiveram duração de quatro dias, a iniciar em cinco de abril. Ao todo, os

candidatos realizaram uma prova oral e quatro provas escritas. As primeiras avaliações, em cinco de

abril, foram as provas oral e escrita de geografia; em seguida, sete de abril, prova escrita de Lógica;

dia oito, prova escrita de História da Civilização; e dia nove, prova escrita de Sociologia. 

No dia 13 de abril  foi divulgado o resultado da seleção. A primeira  turma aprovada de

Ciências Sociais e Políticas da FFCLPR constituiu­se por Amaury Wilson Lérro, Antônio O. Mello,

Delohé  Scalco,  João Ricardo von B.  Vernay,  Luiz Ciruelos,  Otávio Secundino Oliveira  Junior,

Silvio Bonardi e Walter Meirelles (ATA DOS EXAMES…, 1938, p. 4­5).   As atas das primeiras

provas parciais das cadeiras de economia política e finanças, filosofia e sociologia, ambas de junho

de 1938, indicam que apenas metade dos discentes aprovados no concurso de habilitação seguiram

efetivamente no curso, apesar de terem se matriculado22. Nas avaliações do final do mesmo ano, a

única   aluna   a   participar   dos   exames   foi   Delohé   Scalco,   o   que   sugeriu   a   evasão   dos   demais

estudantes. Com efeito, Scalco foi a única discente a dar continuidade ao curso, como atestaram as

Atas de promoção dos alunos do primeiro ano, do segundo ano e do terceiro ano de Ciências Sociais

e Políticas23 (1938, p. 7­9).

Em   cinco   de   dezembro   de   1940   teve   lugar   a   primeira   colação   de   grau   da   FFCLPR.

Formaram­se 19 bachareis dos cursos de Ciências Sociais e Políticas (1), Filosofia (3), Pedagogia

(9), Ciência Químicas  (3) e Geografia e História (3). A cerimônia foi aberta com uma missa na

capela do Instituto Santa Maria às 20:30, proferida pelo Arcebispo de Curitiba, Dom Ático Eusébio

da Rocha. Às 21:00, teve início a solenidade de colação de grau no salão nobre do referido Instituto,

paraninfada pelo professor Brasil  Pinheiro Machado. Delohé  Scalco foi a primeira bacharel em

ciências   sociais   formada   pela   FFCLPR.   É   uma   mulher,   portanto,   a   primeira   cientista   social

graduada no Paraná. No ano seguinte, ingressou no curso de didática, a fim de licenciar­se. Ao final

do ano, foi­lhe conferido o grau de licenciada em Ciências Sociais24, sendo igualmente a primeira

licenciada em ciências sociais no Paraná25. 

20Em 1938, o curso se chamava Ciências Sociais e Políticas. Em 1940, seu nome foi modificado para apenas Ciências Sociais, em virtude do Decreto Federal nº 5.756, de 1940 (TOMAZZI, 2005, p. 90).21Fonte: Ata dos Exames do Curso de Ciências Sociais e Políticas. Arquivo do Setor de Educação da UFPR, livro 61.22Fonte: Termos de matrículas nº 01 (1938/1943), p. 2­3. Arquivo do Setor de Educação da UFPR, livro 95.23Fonte: Ata dos Exames do Curso de Ciências Sociais e Políticas. Arquivo do Setor de Educação da UFPR, livro 61.24Fonte: Anexo nº XV, Históricos escolares completos de todos os alunos matriculados em 1941 no curso de Didática. Arquivo do Setor de Educação da UFPR, caixa 385.25Após sua formatura em licenciatura, não apuramos outras informações acerca de sua trajetória.

49

A partir da década de 40, a FFCLPR iniciou um processo de rotinização que lhe conferiu

maior estabilidade e legitimidade. Em 1940 o governo federal reconheceu parte dos diplomas de

bacharéis expedidos pela instituição, entre eles o de ciências sociais, e em 1941, validou o curso de

didática (WESTPHALEN,  1988,  p. 25­26).  Posteriormente, em 1º de abril de 1946, a FFCLPR e

as   Faculdades   de   Medicina,   Direito   e   Engenharia   do   Paraná   foram   congregadas,   coroando   o

reestabelecimento   da   Universidade   do   Paraná.   Com   a   restauração   da   UP   foram   acordadas

subvenções  econômicas  do   estado  à   instituição.  Dentre   as   atividades  e  projetos   encorajados   e

possibilitados  pelos  novos   recursos,   estiveram  a   construção  de   uma     sede  permanente  para   a

FFCLPR e a fundação do Instituto de Pesquisa da FFCLPR, levada à  cabo pelo catedrático de

antropologia, Loureiro Fernandes (WESTPHALEN, 1988, p. 34).

Não obstante, a próxima turma de ciências sociais ingressaria na FFCLPR apenas em 1943,

isto é, cinco anos após a entrada de Scalco na instituição. Durante esse período, o curso ou não

recebeu inscrições para o concurso de habilitação ou esteve desativado em virtude disso; ademais, o

curso voltaria a fechar de 1947 a 1949 pelos mesmos motivos. Nos três anos em que esteve ativo na

década de 40 (1943­1946), o curso funcionou em virtude duma mesma turma, ingressa em 1943

com cinco alunos – três homens e duas mulheres. Ao final, em 1945, se formaram bachareis três:

Arnaud Ferreira Veloso, Maria de Rezende Rubin e Osmar Romão da Silva; licenciaram­se em

ciências sociais apenas Veloso e Rubin26  (WESTPHALEN, 1988, p. 95; p. 97).   Ao todo, como

identificou Gabriel Oganauskas (2006, p. 61­62) nos 11 primeiros anos da FFCLPR, o curso de

ciências sociais funcionou, efetivamente, em apenas seis; nesse interim, formaram­se somente os

referidos  cinco cientistas   sociais.  Comparativamente,  no  mesmo período o  curso  de  História  e

Geografia graduou 83 estudantes (ibidem). 

Apenas com a federalização da Universidade do Paraná em 1950 se iniciou um processo de

rotinização   do   curso   de   ciências   sociais,   expresso   sobretudo   na   entrada   regular   de   alunos   e

estabelecimento permanente de professores. Para além, com a federalização rompeu­se o contrato

com os Irmãos Maristas e obteve­se maior subvenção estadual à  instituição, de modo a ampliar

institucionalmente as possibilidades de pesquisa – organizaram­se, pois, laboratórios e centros de

investigação, aperfeiçoamento do corpo docente, contratação de professores interinos, assistentes e

instrutores, entre outros (WESTPHALEN, 1988, p. 37). Especialmente signitificativa é a reinserção

das mulheres no corpo docente da FFCLPR, pois como veremos, essas assumiram parte substantiva

dos cargos de assistentes e auxiliares de ensino do curso de ciências sociais a partir de então.

26Após sua formatura em licenciatura em 1946, não foram encontradas informações acerca de suas trajetórias.

50

Através da análise dos dados disponíveis nos Anuários da FFCLPR e no trabalho FFCLPR

50 anos, de Cecília Westphalen, sabemos que se matricularam, em nove anos (1950­1959), 193

novos discentes ao curso, constituindo uma média de 21,4 alunos por ano. No entanto, por meio do

exame das cadernetas,  é  visível que apenas pouco mais da metade dos matriculados frequentou

efetivamente   o   curso.   Cursaram,  pois,   as   disciplinas  do  primeiro   ano   de   ciências   sociais   104

discentes27 em nove anos, isto é, uma média de 11,5  alunos por ano; destes, 67 eram homens e 34

eram mulheres. Com efeito, antes mesmo do início das aulas, 91 alunos desistiram do curso. Por seu

turno, chegaram às disciplinas do terceiro ano apenas 59 dos 104 estudantes – 33 homens e 26

mulheres, em uma média de 6,5 alunos por ano. Houve, portanto, um aumento no número geral de

discentes, se comparado à década de 1940; mas ainda assim as turmas eram pequenas e a evasão

alta. No mesmo recorte temporal, se matricularam no curso de história e geografia 655 estudantes;

não sabemos, contudo, se chegaram a cursá­lo efetivamente.

Por outro lado, se ao longo da década de 1950 o número de matriculados em ciências sociais

aumentou, o  contingente de graduados continuou baixo, especialmente se comparado ao curso de

história e geografia. Diplomaram­se em ciências sociais, de 1950 a 1959, 25 bachareis, dos quais 18

seguiram para a   licenciatura;  em história  e  geografia,  159 bachareis  e  145  licenciados.  Chama

atenção, pois, o número de evadidos do curso de ciências sociais, visto que chegaram ao terceiro

ano 59 estudantes, dos quais apenas 25 se graduaram28. Dispomos todos esses dados na  tabela 2 em

 apêndice. 

27Para essa contagem não foram considerados os alunos ingressos em 1955, visto que não foram encontradas nenhuma caderneta das disciplinas da 1º série do referido ano.28Dentre os alunos formados na graduação em ciências sociais de 1939 a 1959, identificamos apenas um que, segundosugere toda documentação, seguiu carreira como antropólogo: Carlos de Araújo Moreira Neto. No entanto, não foipossível confirmar com plena certeza essa informação, motivo pelo qual a mantemos como uma possibilidade. Formadoem ciências sociais pela FFCLPR em 1955, doutorou­se em antropologia pela UNESP de Rio Claro em 1971, com atese A política indigenista brasileira durante o século XIX, sob orientação de Eduardo Enéas Galvão. Em 2005 a obraseria reeditada e publicada em formato de livro pela FUNAI sob o título Os índios e a ordem imperial. Em entrevista aIsabel Heringer, da CGAE/FUNAI, Carlos Moreira assim explicou sua trajetória:  “eu fiz o curso de Ciências Sociais eum dos professores tinha sido colega de Darcy Ribeiro no curso da Escola de Sociologia e Política. Era o professorFernando Altem Felder [sic], que estudou os índios no Xingu. Foi através dele que, em 1953, conheci o Darcy. Naépoca, o Darcy era diretor do Museu Índio, onde eu fiz o curso de antropologia […] O curso acabou prematuramentepor causa das mudanças políticas. […]. Então eu saí de lá e fui trabalhar com o Eduardo Galvão, que também tinha sidocolega do Darcy e era diretor de antropologia do Museu Goeldi. Eu passei uns três ou quatro anos em Belém e volteipra trabalhar com o Darcy na Faculdade Nacional de Filosofia” (set/2005). No prefácio a Os índios e a ordem imperial,Mércio Pereira Gomes reconstituiu alguns aspectos da trajetória acadêmica do antropólogo: Moreira Neto lecionoucomo assistente da cadeira de antropologia na Universidade do Brasil, na Universidade de Rio Claro (UNESP) e naUniversidade Federal  Fluminense, substituindo Darcy Ribeiro,  além de ter  sido etnólogo do Museu Paraense e doInstituto Indigenista Interamericano (MOREIRA, 2005).  Em 1970, Moreira Neto criou o Centro de documentaçãoetnológica do Serviço de Proteção ao Índio. Publicou junto a Darcy Ribeiro o livro A fundação do Brasil: testemunhos1500­1700 (MEIHY, 1993, p. 197). Faleceu em 2007.

51

2.4.1. Ciências sociais: um curso intermitente

Nossa análise sugeriu algumas considerações sobre o estancamento do curso na década de

1940. Primeiramente, não apenas a Reforma Capanema, que retirou a disciplina de sociologia do

ensino básico em 1942 (MORAES, 2011, p. 363), contribuiu para a não­procura pelo curso, pois

que em 1939 já não houve nova turma de ciências sociais. Outros processos, portanto, concorreram

para a baixa busca pelo curso. Nesse sentido, consideramos elucidativo o entendimento de Sérgio

Miceli (1989) acerca da constituição das ciências sociais fora do eixo Rio de Janeiro­São Paulo.

Compreendeu ele:

em estados mais apartados dos centros da vida intelectual no país como Pernambuco, Bahiae   Minas   Gerais,   o   suprimento   de   praticantes   das   ciências   sociais   sucedeu   através   dasescolas superiores tradicionais, ou então, por intermédio do trabalho de divulgação exercidopor autodidatas. Nesses estados, foram as instituições já estabelecidas do ensino superiorque buscaram incorporar as novas disciplinas em sua agenda de preocupações e em seuprograma de trabalho (MICELI, 1989, p. 109).

Entendemos, pois, o Paraná como um desses estados apartados dos centros intelectuais do

Brasil. Com efeito, menções e atribuições à sociologia já estavam presentes na Faculdade de Direito

do Paraná   (CAMPOS, 2006, p.  119).  No entanto,   tratava­se de um entendimento da sociologia

como  um  recurso  científico  para   a   compreensão  do   fenômeno   jurídico  e   não   como  um  saber

específico.  Era um conhecimento,  pois,  utilizado conforme a demanda ou solicitação de outras

áreas.  Em síntese,  a  sociologia não era entendida,  nesse âmbito,  como disciplina particular e a

figura do sociólogo, por consequência, não era requerida (MEUCCI, 2000, p. 28). O estatuto das

ciências   sociais   se   modificaria   no   país   a   partir   da   década   de   1930,   pois   com   as   reformas

educacionais os intelectuais foram alçados à posições de agência sobre a história nacional, em que

os cientistas sociais foram particularmente beneficiados (ibidem, p. 34).

Essa situação foi identificada ao examinarmos o recrutamento dos estudantes de ciências

sociais da FFCLPR. Isto é, muitos deles faziam ciências sociais de maneira a complementar outra

graduação que cursavam ou que já  haviam finalizado; no dizer de Constantino Comninos, “eles

foram saindo porque eles não faziam só ciências sociais, eles faziam direito na Federal [...] pela

manhã, e como o curso [de ciências sociais] funcionava à tarde eles achavam que complementavam

o curso de direito e vinham à tarde fazer ciências sociais”. Os discentes entendiam, portanto, as

ciências sociais não como um saber especializado e, sim, como um suporte para outros cursos, no

registro acima discutido. Compreendemos que a entrada no curso de ciências sociais da FFCLPR

tinha por motivação última, nessa primeira década, complementar outras formações, em especial o

bacharelado em direito.

52

Posteriormente  a  1942,  a   retirada  da sociologia dos  currículos  de ensino básico  decerto

ampliou a escassez do mercado de trabalho para os cientistas sociais, visto que a docência no ensino

secundário era a ocupação profissional mais segura à época29  (BOAS, 2003, p. 46). Ainda que se

referindo à  década de 50, Constantino Comninos nos confirmou que a docência era o principal

mercado de trabalho para os cientistas sociais em Curitiba; mesmo que não no ensino secundário,

em cursos técnicos de variadas naturezas era requerido o conhecimento sociológico e o profissional

licenciado em ciências sociais. Em nosso entendimento, o enxugamento do maior campo de atuação

para os cientistas sociais, reduzindo­o a cursos técnicos, concorreu para o baixo contingente de

alunos ao longo dos anos 1940 e posteriormente.

No entanto, o pequeno número de estudantes do curso de ciências sociais da FFCLPR não

era especificidade da instituição paranaense. Segundo Sérgio Miceli (1989, p. 109 ­ 110), o primeiro

curso de ciências sociais de Minas Gerais, organizado em 1941 na Faculdade de Filosofia, Ciências

e Letras de Minas Gerais, contou com apenas quatro alunos em sua primeira turma; a baixa procura

ocasionou,  no ano seguinte,  o  fechamento do curso,  que voltaria  a   funcionar  apenas em 1947.

Mesmo na Faculdade Nacional de Filosofia os números de formados – bachareis e licenciados ­ em

ciências sociais era pequeno. De 1939 a 1944, diplomaram­se 40 alunos, em uma média anual de

oito formandos; comparativamente, o curso de História e Geografia graduou 147 estudantes, ou

seja, uma média de 29,4 alunos anualmente (FAVERO, 1989, p. 22). Portanto, não se trata de um

fenômeno específico da FFCLPR e, sim, do estatuto das ciências sociais no período, em que o caso

paranaense apresentou suas particularidades. 

Por fim, a partir de 1946 houve modificações a nível federal nos requisitos para ingresso em

instituições de ensino superior, entre eles a exigência de maior escolaridade prévia. Segundo Niroá

Glaser (1988, p. 28), isso resultou numa diminuição no número geral de ingressos da instituição;

mesmo que o curso estivesse desativado nesse ano,  é  possível  que nos anos consecutivos  essa

exigência tenha atingido os interessados na graduação em ciências sociais. 

Na prática, todos esses motivos estavam interligados e, consideramos, concorreram para a

intermitência do curso de ciências sociais da FFCLPR na década de 1940.

29Sobre isso,  é   interessante destacar  que,  embora a sociologia tivesse sido retirada do ensino médio em 1941, oslicenciados em ciências sociais ainda assim poderiam, a partir de 1954, seguir carreira docente no ensino secundárioministrando aulas de filosofia no 2º ciclo, de história geral e do Brasil no 1º e 2º ciclo, e de matemática, no 1º ciclo.Para além do pequeno mercado de trabalho que se manteve, esse dado expressa a afinidade entre as ciências sociais doperíodo e as ciências exatas, como a análise dos currículos demonstrará. Fonte: Portaria nº 478 – de 8 de junho de 1954.

53

2. 4.2. Os professores

Entre 1938 e 1939, todos os docentes da FFCLPR foram nomeados, inicialmente, como

regentes de suas cadeiras. Ao final de 1939 com a lei nº 1190/39 e alteração na expedição dos

diplomas  de  nomeação  dos  professores   da  FFCLPR,  houve  uma   reorganização  de   seu  quadro

docente, em que foram modificados os nomes de algumas cadeiras, além de acrescentadas outras:

Foi   também   nesse   período   que   adotou­se   a   terminologia   de   cátedras   para   a   universidade,

convertendo   os   docentes   de   regentes   a   catedráticos   fundadores   de   suas   respectivas   cadeiras

(GLASER, 1988, p. 25; WESTPHALEN, 1988, p. 24­25). 

Embora não tenhamos identificado claramente os motivos das nomeações, é provável que

muitos dos professores tenham chegado à docência na FFCLPR por serem um de seus idealizadores

ou a convite dos fundadores. O acréscimo de novos professores no quadro docente da FFCLPR em

1939 é ilustrativo quanto a isso, pois “haviam por ocasião da fundação da Faculdade sido omitidos

elementos dotados de reconhecida capacidade didática e cultura especializada e que deveriam ser

convidados a integrá­la” (WESTPHALEN, 1988, p. 24). Com efeito, os convites à docência foram

expediente regular da instituição. Isso não significa, contudo, que os catedráticos não atuassem nas

áreas que lecionavam, como veremos à frente.

Por meio da análise da trajetória discente de Delohé Scalco e da pesquisa FFCLPR 50 anos,

de  Cecília  Westphalen,   foi   possível   reconstituir   tanto   a   grade   curricular   quanto   a   relação  dos

professores catedráticos da primeira turma de ciências sociais da FFCLPR. Na tabela do apêndice 1,

organizamos essas informações salientando, nos casos em que houve, o vínculo do catedrático com

o CEB.

Acerca   destes   catedráticos   –   visto   que   trataremos   dos   currículos   no   próximo   capítulo,

sabemos que Jesus Ballarin, catedrático de filosofia, era um padre espanhol formado em filosofia e

teologia pela Universidade de Cérvera (HANICZ, p. 248);  Arthur Ferreira Santos, catedrático de

Economia  Política   e  Finanças  e  História   das  Doutrinas  Econômicas,   era   formado   em ciências

jurídicas e sociais em São Paulo; Milton Carneiro, catedrático de História da Filosofia, formou­se

em medicina no Rio de Janeiro; Omar Gonçalves da Mota, catedrático de Sociologia, era graduado

em   direito   pela   Faculdade   de   Direito   do   Paraná;  José   Bittencourt   de   Paula,   catedrático   de

Complementos   de   Matemática,   era   formado   em   engenharia   pela   Faculdade   de   Engenharia   do

Paraná;  Manoel Lacerda Pinto, catedrático de Política, graduou­se em ciências jurídicas e sociais

em São Paulo; Loureiro Fernandes, catedrático de Antropologia, era formado em medicina no Rio

de  Janeiro; e Arthur Martins Franco,  catedrático de Estatística, era graduado em engenharia em

54

São Paulo (MACHADO, p. 129­131).

Não   tinham,   pois,   formação   nas   áreas   em   que   lecionavam.   No   entanto,   isso   era

relativamente   comum   à   altura,   visto   que   “para   muitas   matérias   não   havia,   no   país,   mestres

altamente especializados e em condições, portanto, de inaugurar cursos novos e de alto nível e com

as   técnicas  de  pesquisa  para   assegurar   uma  contribuição   constante   aos  progressos   científicos”

(SCHWARTZMAN, 1979, p. 208). A Universidade de São Paulo, nesse sentido, lançou mão de

professores franceses, e a Escola Livre de Sociologia e Política, de docentes norte­americanos. A

FFCLPR, por seu turno, teve seu quadros docentes lotados por autodidatas  que se “formaram às

cegas como um barco de velas partidas, vagando ao sabor das correntes que se cruzam na superfície

das águas30” (ANUÁRIOS 1940/1941, p. 42). Apenas após a diplomação dos primeiros alunos é que

a FFCLPR teve em seus postos docentes cientistas, do ponto de vista acadêmico. Assim, em 1943,

considerou Loureiro Fernandes a FFCLPR como “vigoroso núcleo irradiador de cultura, a despertar

inteligências   adestrando­as   para   os   futuros   trabalhos   de   investigação   científica,   sem   o   ônus

tremendo de um exclusivo e laborioso autodidatismo (p. 10)”.

Nos anos em que o curso esteve ativo durante a década de 1940 (1943 a 1946),  foram

encontradas doze cadernetas de frequência, das seguintes disciplinas e seus docentes efetivos: 1943)

Economia   Política   (Arthur   Santos   de   Almeida),   e   História   da   Filosofia   (Frei   Maria   Tarcísio

Capuchinho); 1944) Economia Política (Arthur Santos de Almeida), Estatítisca (José Nicolau dos

Santos), Ética (Padre Artidório Lima), e Sociologia (Bento Munhoz da Rocha); 1945) Economia

Política e  História  das  Doutrinas Econômicas (Arthur  Santos de Almeida),  Estatística Aplicada

(José Nicolau dos Santos), Etnografia e Antropologia (Cirilo Zacchi), Política (nome ilegível), e

Sociologia (Bento Munhoz da Rocha).

Com efeito, nenhuma das disciplinas foi ministrada por seus catedráticos. Nas Atas dos

concursos para catedráticos31,  consta a contratação de todos os docentes acima referidos para o

exercício das disciplinas em seus respectivos anos ­ à exceção de Bento Munhoz da Rocha e José

Nicolau   dos   Santos.   Os   motivos   para   contratação,   em   todos   os   casos,   eram   o   “impedimento

temporário do titular respectivo”. Os contratos tinham duração de um ano, podendo ser renovados, e

aos contratados competia “prelecionar o programa elaborado pelo professor catedrático, se houver,

ou   o   da   Faculdade   Nacional   de   Filosofia,   com   o   máximo   critério   científico”   (ATA   DOS

CONCURSOS…, 1943, p. 14).

Sobre José Nicolau dos Santos sabemos que era também docente­livre, desde 1946, de

30Oração de paraninfado da turma de 1940 pelo Exmo. Sr. Prof. Dr. Brasil Pinheiro Machado. 31Disponível em: Arquivo do Setor de Educação da UFPR. 

55

Direito  Público   Internacional  da  Faculdade de  Direito  do  Paraná   (ANUARIO…, 1946,  p.  90);

posteriormente, de 1964 a 1967, seria reitor da Universidade do Paraná. De acordo com Jonas Dias

de Souza (2014), os interesses intelectuais de José Nicolau orientavam­se para o tema mais amplo

da   Geografia   Jurídica;   essa   seria   um   sub­ramo   da   geografia   destinado   a   apreensão   do

desenvolvimento histórico das instituições jurídicas em virtude de fatores geográficos sinérgicos

(2014, p. 357). Não apuramos, pois, uma conexão clara entre os focos de interesse e atuação do

professor e a disciplina de estatística, que o mesmo lecionou para os alunos de ciências sociais em

1944 e 1945. Contudo, é  possível  supor  que,  dada a  influência de José  Nicolau,  ele   teria  sido

convidado a lecionar.

Por seu turno, sobre Bento Munhoz da Rocha, titular de história da América, sabemos que a

partir  de  194032,   contudo  formalmente  apenas  em 1941,   substituiu   inteirinamente  o  catedrático

Omar Gonçalves da Mota nas disciplinas de sociologia e de fundamentos sociológicos da educação

(ATAS…,   1940,   p.   22;  GLASER,   1988,   p.   25).   Posteriormente,   em   1946,   Bento  Munhoz   se

afastaria de ambos os cargos, a fim de assumir o posto de deputado federal pelo Paraná no Rio de

Janeiro. Sua atuação nessas   disciplinas   foi   marcante,   visto   que   o   intelectual compreendia a

sociologia   através   dum   prisma   católico,   a   Sociologia   Integral   –   o   tema   será   discutido

posteriormente.

Ainda   acerca   da   contratação   de   professores   substitutos   chamamos   atenção   para   o

distanciamento   dos   catedráticos   da   sala   de   aula,   de   modo   a   tornar,   como   discutiremos,   os

professores substitutos os docentes regulares do curso de ciências sociais ao longo dos anos. Com

base   na   análise   dos  Anuários   da   FFCLPR  da  década   de   194033,   sabemos   que   para   além  dos

professores substitutos acima destacados, foram contratados também Gabriel Munhoz da Rocha, em

1948, e Euclides Mesquita, em 1949, para lecionar na cátedra de Sociologia e de Fundamentos

sociológicos da educação. Considerando que o curso funcionou apenas de 1943 a 1946, ambos

professores foram contratados para ministrar as aulas de sociologia dos demais cursos da FFCLPR.

Tratando­se efetivamente do curso de ciências sociais, na década de 1940 não obtivemos quaisquer

informações de que os catedráticos tenham conduzido suas respectivas cadeiras.

Uma vez que os professores catedráticos eram personalidades da elite curitibana,  muitos

deles concorreram à carreira política ou a outros postos de trabalhos, públicos ou privados, de modo

que   suas   trajetórias   acadêmicas   não   foram   conduzidas   com   dedicação   exclusiva.   Isto   é

32Fonte: Atas do Conselho Técnico e Administrativo da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná, 1940, p. 22. Arquivo do Setor de Educação UFPR, Livro 47.33À exceção dos anuários de 1942 a 1945 e de 1947, que não foram encontrados.

56

significativamente claro quando pensamos a trajetória de determinados professores da instituição.

Em particular, gostaríamos de ressaltar alguns aspectos da biografia profissional de Manoel Lacerda

Pinto, catedrático de Política. 

Durante os primeiros 20 anos da FFCLPR, Manoel Lacerda Pinto foi membro ativo do CEB,

Procurador do Estado do Paraná (1937), Secretário do Interior e Justiça (1939), Desembargador do

Paraná (1941), Presidente do Tribunal Regional Eleitoral (1949, 1951, 1959) Presidente do Tribunal

de Justiça do Paraná (1949, 1959), além de professor de Política da FFCLPR (1939) e de Direito

comercial da Faculdade de Direito do Paraná (1949) (DAGOSTIM, 2011, p. 183). Ou seja, sua

agenda era bastante atribulada. O exemplo poderia ser repetir com as trajetórias de Bento Munhoz

da Rocha, Arthur Ferreira dos Santos, Loureiro Fernandes entre outros. No entanto, o resultado de

seus  afastamentos  dos  postos  docentes  produziu  efeitos  diferentes   em cada  caso,  em  razão  da

constituição  de  estratégias   individuais   para  a   ocupação  dos  cargos  deixados   livres,   como  será

discutido a seguir. 

Embora desde a década de 1940 o curso seja conduzido por professores contratados, esses

de   raro  permaneceram  longamente  no  curso  –   à   exeção  de  Arthur  Almeida  Santos  e  Euclides

Mesquita.  Assim, no decurso da década de 1950, o corpo docente de ciências sociais, à nível dos

professores   contratados,   mudaria   substancialmente.   Dispusemos   na   tabela   3   do   apêndice   os

professores, afora os catedráticos, que foram anotados como docentes nas cadernetas34, assim como

aqueles   discriminados   nos   anuários   da   FFCLPR   como   professores,   quaisquer   fossem   suas

modalidades  de  contratação.   Identificamos,  pois,   ao   longo  da  década  uma docente­livre;  cinco

interinos; sete contratados; cinco instrutores; e três assistentes de quadro extraordinário. Esses 21

cargos foram ocupados por 16 diferentes professores, visto que cinco deles ocuparam mais de dois

postos ao longo da década, isto é, foram, por exemplo, inicialmente instrutores e posteriormente,

interinos. Nota­se que tal recurso à professores contratados, independentemente de seu vínculo, foi

substancialmente acionado pelo catedrático de antropologia, Loureiro Fernandes. Pois dos 21 postos

identificados, cinco foram requisitados pela antropologia, que mobilizou cinco diferentes docentes;

quatro pela estatística, para dois professores, dois pela sociologia, igualmente para dois docentes;

dois   para   a   economia,   para   um   professor;   e   oito   pela   filosofia,   para   quatro   professores35.

Buscaremos explicar essa mobilização de contratados a seguir.

34Por não haver cadernetas de todas as cadeiras, não foi possível identificar todos os docentes em exercício efetivo em todas disciplinas; nesses casos, foi mantido o nome do catedrático. 35Sobre os professores de filosofia é necessário ressaltar que o contingente de contratados se explica pela inclusão dadisciplina de Introdução à   filosofia em todos os cursos da FFCLPR a partir  de 1946. Não foi  possível identificar,contudo, quais desses oitos professores lecionaram efetivamente para o curso de ciências sociais, motivo pelo qualdecidimos por manter todos os oito docentes incluídos nessa contagem.

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É   visível,   pois,   o   afastamento   dos   catedráticos   e   entrada   de   novos   professores   que   se

estabeleceram no curso durante os anos 50. Esse recurso aos livre­docentes, interinos, contratados,

assistentes e instrutores era regular na instituição, visto que já na década anterior era comum, mas

ganhou   força   após   a   federalização.   Nesse   momento,   buscou­se   expandir   o   corpo   docente   da

FFCLPR com a contratação de graduados pela própria Faculdade (WESTPHALEN, 1988, p. 37).

Como veremos, alguns desses professores contratados chegaram aos postos por indicação, visto que

não eram ex­discentes, ou, via de regra,  estabeleceram proximidades com os titulares durante sua

graduação na FFCLPR.

2.4.3. Os professores contratados: estratégias de desenvolvimento

Na   FFCLPR,   conforme   nos   informou   Constantino   Comninos,   as   aproximações   entre

docentes   e   discentes   eram   reguladas   em virtude  de   ações  desempenhadas  pelos   alunos,   como

demonstrações   de   interesse   pela   área,   boas   notas   e   disposição   em   aprender   e   ajudar

voluntariamente.  Em seu caso,   se  aproximou  do professor  de  antropologia  Loureiro  Fernandes

através  da   indicação  da  docente  Válderez  de  Souza  Müeller,  à   altura   (1957)  contratada  como

assistente para lecionar na cátedra de antropologia. O episódio que levou à indicação de Comninos

foi a apresentação de um seminário de 15 minutos, elaborado pelo aluno, acerca da história de

Heródoto; em suas palavras, “era uma prova de fogo. [...] quando eu terminei, ela me disse assim,

“eu vou propor o teu nome para o doutor Loureiro para você ser professor do curso de antropologia;

[…] você se saiu muito bem aqui [...]”. Embora Comninos não tenha ocupado nenhum cargo na

cátedra de antropologia,  Loureiro o indicou ao Museu Paranaense,  especificamente à  sessão de

arqueologia, onde trabalhou na classificação de fosseis junto ao professor Joseph Emperaire.

Para  além,  durante   sua  graduação   (1955­1958),  Comninos   foi  monitor  na  disciplina  de

estatística aplicada, do 3º ano, sob supervisão da professora assistente Zélia Pavão; ascendeu a este

posto em razão de sua dedicação com a disciplina e conversas com a docente acerca de suas dúvidas

e temas da aula. No entanto, visto que seu grande interesse era a área de ciência política, após o

término da classificação dos fósseis, foi monitor de Economia Política e História das Doutrinas

Econômicas, com o professor assistente Arthur Santos de Almeida. Posteriormente, partir de 1962,

Comninos seria professor assistente das cátedras de Economia Política e História das Doutrinas

Econômicas  da  FFCLPR.  Ou seja,  o  convite  ou  o  voluntariado quanto  ao  exercício  de  cargos

docentes   eram estabelecidos  por  meio  de   contatos   em sala  de   aula  ou   indicação  de   terceiros,

recrutando   assim   os   melhores   discentes   para   postos   de   destaque.   Ademais,   tendo   em   vista   a

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escassez de recursos da instituição, arregimentar os estudantes de êxito acadêmico significava, por

outro lado, incrementar as áreas nas quais eles se estabelecessem.

Nesse sentido, o professor Loureiro Fernandes constituía, dentro da FFCLPR, um grupo de

interessados em antropologia e etnografia, composto por estudantes de ciências sociais, pedagogia e

história e geografia. Acerca de sua formação, Loureiro graduou­se em medicina no Rio de Janeiro

em 1927; ao longo de sua trajetória, aproximou­se dos temas da antropologia física e arqueologia.

Em 1952, especializaria­se em antropologia no Museu do Homem, em Paris (DRESCH, 2016, p.

01).   No   entanto,   já   anteriormente   Loureiro   Fernandes   colaborava   para   o   desenvolvimento   da

antropologia no Brasil, marcadamente através de congressos, intercâmbios de pesquisadores (entre

Brasil, Portugal, França e Estados Unidos, sobretudo), pesquisas de campo e publicações, enfim,

variadas   atividades   que   cooperaram   para   o   alargamento   e   visibilidade   do   conhecimento

antropológico (HELM; SANTOS, 2006, p. 82­83). Para além, fundou, entre outros, o Instituto de

Pesquisas   da   Faculdade   de   Filosofia,   Ciências   e   Letras   em   1950,   o   Centro   de   Pesquisas

Arqueológicas (CEPA) em 1955, o Departamento de Antropologia (DEAN), em 1958, e o Museu

de  Arqueologia  e  Artes  Populares  de  Paranaguá   em 1963,   além de  ter   sido  diretor  do  Museu

Paranaense (1938­1946), secretário da educação e cultura do Paraná (1947­1949) e presidente da

Associação Brasileira de Antropologia (1957­1959) (DRESCH, 2016, p. 02). 

No dizer de Comninos, o grupo do Loureiro não era um grupo fechado, no sentido de  haver

formalidades de acesso, porém era necessário estar a par dos assuntos estudados pelos discentes e

por Loureiro para participar. Entre os temas abordados pelo antropólogo, lembrou­se Comninos das

cavalhadas  de  Palmas,   congadas  da  Lapa,   fandangos  de  Paranaguá   e  Boi  de  mamão de  Santa

Catarina. Apuramos como pertencentes ao grupo de Loureiro   os seguintes alunos da FFCLPR:

Cirilo Zacchi (história e geografia), Eny Caldeira (pedagogia), Eny de Camargo Maranhão (história

e geografia),   Igor Chmynz (história  e geografia),  Maria Cecília  Vieira  Helm (ciências sociais),

Marília   Duarte   (história   e   geografia),   Maria   José   Menezes   (história   e   geografia),   Saluá   Elias

(história e geografia) e Válderez de Souza Müeller (história e geografia). Compunham também o

grupo Fernando Altenfelder Silva e Máximo Pinheiro Lima. 

Destes, Cirilo Zacchi, Fernando Altenfelder Silva, Eny Camargo, Máximo Pinheiro Lima,

Saluá Elias e Válderez de Souza Müeller foram professores assistentes de antropologia; à exceção

de Zacchi, os demais lecionaram a partir da década de 1950. Segundo Marília Gomes de Carvalho

(2008, p. 4), Lima era médico de formação e lecionava sobretudo acerca dos temas de antropologia

física;  em 1962,   seria  nomeado chefe  do Departamento de Antropologia.  Fernando Altenfelder

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Silva, por seu turno, foi um antropólogo brasileiro de renome, convidado a lecionar na cátedra de

antropologia da FFCLPR por dois anos, a contar de 1953 (OLIVEIRA, 2010, p. 90). Apresentou o

trabalho “Análise comparativa de alguns aspectos da estrutura social de duas Comunidades do Vale

do São Francisco” como tese de livre­docência à cátedra de sociologia da Faculdade em 195836.    

Sobre   os   demais,   obtivemos   apenas   informações   esparsas,   às   quais   cabe   destacar   o

doutoramento   de   Eny   Camargo   Maranhão   em   1964,   primeiro   doutorado   a   ser   defendido   na

FFCLPR, na área de antropologia física37; tudo indica ter sido orientada por Loureiro.  À Maranhão

Loureiro reservou a chefia da seção de Antropologia Física do DEAN38. Por seu turno, Maria José

Menezes, além de graduada em história e geografia, era também secretária do DEAN. Menezes

realizou cursos de especialização e estágios fora do Brasil em arqueologia, como veremos, além de

participar de pesquisas de campo coordenadas pelo antropólogo (HELM; SANTOS, 2006, p. 100).

O fato de Menezes ocupar um posto administrativo na Faculdade impediu sua nomeação à cargos

dentro do Departamento39; assim, em 1974, prestou e foi aprovada no concurso à livre­docência na

cátedra de antropologia da FFCLPR (ibidem, p. 102).

Essa mesma dinâmica não foi  identificada em nenhuma outra área do curso de ciências

sociais.  Conforme atestam os documentos do CEB, Loureiro Fernandes incentivava a formação

destes alunos mais próximos indicando­os para cursos com colegas ou pós­graduações, assim como

a bolsas de estudos fora do país, e, em alguns casos, a cargos de docência e/ou chefia. Em nossa

compreensão,   Loureiro   Fernandes   estava,   desse   modo,   lançando   mão   de   uma   estratégia   de

desenvolvimento e continuidade da antropologia na FFCLPR. As cadernetas de antropologia e os

documentos do CEB confirmam essa estratégia. Apenas pela documentação do CEB, sabemos que

ele incentivou e organizou, por exemplo,  as bolsas de estudos para cursos fora do país de Eny

Caldeira,  Marília  Duarte   e  Maria   José  Menezes40,   todas   suas   alunas.  As   cartas   trocadas   entre

Menezes e Loureiro durante sua viagem são particularmente ilustrativas quanto aos objetivos do

catedrático. Escreveu ele à Menezes em 196641

você  precisa aproveitar ao máximo sua permanência aí  [em Portugal], e ver tudo o queconvém estudar   e  comprar  para  o   ensino  da  Arqueologia  Préhistórica  e  Etnográfia  doBrasil, cátedra que será criada e como já escrevi, você deve logo fazer livre docência. […]Como   não   vou   à   Europa   em   1966,   vou   pessoalmente   ajudá­la   [quanto   aos   seusvencimentos], uma vez que não há mais possibilidade de ajuda oficial pelo Estado e pela

36Fonte: Atas do concurso de docência­livre nº 2. Arquivo do Setor de Educação da UFPR, envelope 49.37Fonte: CEBDOC, 2086, p. 3.38Fonte: ibidem.39Fonte: ibidem.40Fonte: CEBDOC95, CEBDOC136 e CEBDOC144, respectivamente.41Fonte: CEBDOC66.

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Universidade.   Fique   tranquila   […]   o   que   importa   é   você   aproveitar   ao   máximo   essesúltimos meses (1966, p. 1).

Loureiro   se   referia   a   compra   de   algus   materiais   arqueológicos   para   a   Faculdade,   mas

sobretudo   tratava   da   formação   arqueológica   de   Maria   José   Menezes.   Para   Loureiro   era

imprescindível, pois, que ela absorvesse todo conhecimento possível e, a partir disso, coordenasse o

ensino e pesquisa de arqueologia na FFCLPR. No entendimento de Gabriella Dresch (2016, p. 45),

Loureiro   intentava   assim   abandonar   a   docência   estrangeira42  e   estimular   a   produção   de

pesquisadores   brasileiros,   que   coordenariam   os   centros   de   pesquisa   da   FFCLPR   vinculados   à

antropologia  e   arqueologia.  Ainda,  é   latente   a  mobilização  de   recursos  do  antropólogo  para  a

formação de Menezes, incluindo seus próprios rendimentos e redes de contato em diferentes

instituições, como o Estado ou a Universidade.

Dessa forma, entendemos que, no que tange ao corpo discente, as ações levadas a cabo pelo

catedrático na FFCLPR tiveram como sentido último a cooptação dos melhores alunos, visando

com   isso   constituir   relações   sociais   que   perdurassem   e   permitissem   o   desenvolvimento   da

antropologia. Conforme sugere a documentação por nós analisada, houve uma reciprocidade quanto

ao estabelecimento das relações sociais entre Loureiro e seus alunos43. Pois através das relações

sociais constituídas entre Loureiro e seus discentes era possível que os últimos acessassem uma

formação   privilegiada,   e   que,   por   outro   lado,   o   antropólogo   cultivasse   sua   área   de   estudos,

sobretudo através de uma rede de pesquisadores qualificados e elaboração de agendas de pesquisas. 

Certamente há mais fontes acerca das atividades desempenhadas por Loureiro Fernandes ao

longo   de   sua   trajetória   profissional,   motivo   pelo   qual   temos   condições   de   articular   mais

profundamente suas relações sociais dentro da FFCLPR. No entanto, sobre a cátedra de sociologia e

seus   professores,   durante   a   década   de   1940   Euclides   Mesquita   e   Gabriel   Munhoz   da   Rocha

lecionaram nas cadeiras de sociologia; Munhoz da Rocha posteriormente seguiria para postos de

trabalho no curso de filosofia da FFCLPR. Destaca­se, pois, afastamento do titular de sociologia,

42Na década de 1950 Loureiro articulou a recepção do casal de arqueólogos franceses Annette Emperaire e JosephEmperaire no Centro de Estudos Arqueológicos da UP, a fim de que ministrassem alguns cursos (DRESCH, 2016, p.03)43Isso é particularmente notável nas cartas trocadas entre as alunas em viagem e Loureiro, pois os agradecimentos àsoportunidades articuladas pelo antropólogo, bem como seu apoio, eram enfatizados como indispensáveis ao sucesso desuas viagens e formações. Haja visto, por exemplo, a carta remetida da França a Loureiro Fernandes por Marília Duarteem 1966. Nesta, visava informá­lo de suas atividades e pedir­lhe auxílio quanto à burocracia para reentrar em Portugal.Escreveu­lhe Duarte: “muito obrigada por seu esforço em me ajudar financeiramente, bem como pela sua “palavrinha”junto ao Cônsul Português; de fato se o senhor puder influir através dele ou de qualquer pessoa junto ao Conselho daFundação [ilegível] seria o maior auxílio que o senhor poderia me dar, pois as cousas parecem que vão se arranjar. […].Como vê, se o senhor tem a possibilidade de “dar uma mãozinha” para que eu volte a rever esta linda terra que sechama Lisboa, está na hora H. Senão ficarei também complexada, pois este é um grande sonho da minha vida presente”(CEBDOC136, p. 3; grifos no original).  

61

Omar Gonçalves da Mota, desde a década de 40. 

Mota  era  advogado  de   formação  e   também professor  catedrático  de  direito   industrial  e

legislação do  trabalho na  Faculdade de  Direito  do Paraná,  além de docente   livre  de economia

política   na   mesma   instituição44.   Das   16   cadernetas   de   ensino   e   frequência   das   disciplinas   de

sociologia analisadas, em apenas três constava a docência de Mota: 1956, 2º e 3º anos; 1957, 1º ano;

e 1957, 2º e 3º anos45. Ainda assim, nessas cadernetas o catedrático compartilhou a docência com a

professora Maria Olga Mattar e compareceu intermitentemente ao largo do ano letivo.

Embora Omar da Mota não estivesse presente no curso de ciências sociais, teve atuação

preponderante na fundação da FFCLPR, como visto. À altura, Mota era secretário de Estado do

Paraná  no governo de Manoel Ribas e assim entusiasmou a elite intelectual pelo projeto, como

auxiliou a instalar a FFCLPR nas dependências da assembleia estadual do estado (HORNER, 1993,

p. 34). Em razão de rusgas com a elite política paranaense, Mota transferiu­se ao Rio de Janeiro na

década de 1960, onde lecionou na Escola Superior de Guerra (ANUÁRIO…, 1967, p. 265). Não

encontramos quaisquer trabalhos de Mota relacionados à sociologia; assim, entendemos que sua

titulação   como   catedrático   de   sociologia   fez   parte   do   expediente   da   FFCLPR   em   nomear

personalidades da elite política e intelectual do Paraná.

Nelson Tomazzi identificou ter Euclides Mesquita organizado o 1º Congresso de Sociologia

do Paraná. Nós, infelizmente, não encontramos quaisquer informações sobre isso. No entanto, sobre

o professor Mesquita sabemos, a partir de Comninos, que era advogado de formação e que lecionou

em ciências sociais a partir de 1948, em substituição a Omar Gonçalves da Mota. Foi contratado

assistente de sociologia da FFCLPR em 1949 e, em 1951, professor interino na mesma cátedra,

cargo no qual permaneceu até a década de 1960. Não encontramos qualquer trabalho de Mesquita

relacionado à sociologia, seja anteriormente, seja posteriormente a seu posto de interino; tal sugere

que não permaneceu trabalhando na área de ciências sociais46. Não foi possível identificar como

Mesquita chegou a estes postos no curso de ciências sociais, porém é provável ter sido indicado por

Omar da Mota,  visto que esse era  também catedrático na Faculdade de Direito,  onde Mesquita

igualmente lecionava.

44Fonte: Currículo Vitae dos professores do curso de didática. Arquivo do setor de educação, envelope Validação doantigo curso de didática (antes da validação), Caixa 385.45Embora se trate de cinco turmas, são apenas três cadernetas. Pois as turmas de 2º e 3º anos mencionadas tiveram suasaulas reunidas, isto é, as turmas eram integradas e tinham suas aulas juntas em razão do pequeno número de alunos. Issoserá detalhado à frente.46De autoria de Mesquita, encontramos quatro trabalhos: as dissertações “O Estado e as contituições republicanas noBrasil” (1949) e “Da compensação” (1961), ambos apresentados aos concursos de livre­docência às cátedras de TeoriaGeral do Estado (reprovado) e de Direito Civil (aprovado) da Faculdade de Direito do Paraná, respectivamente; e osartigos “A ficção no Direito” e “A compensação”, ambos sem data.

62

Embora Euclides Mesquita fosse o professor interino de sociologia desde 1951, Maria Olga

Mattar esteve presente na cátedra de sociologia no mesmo período como sua auxiliar de ensino.

Chama atenção, pois, o seguinte fato: das 13 cadernetas de sociologia na década de 1950, em três

constam condução das aulas por Euclides Mesquita; em quatro por Mattar e Mesquita em conjunto;

três por Omar da Mota e Maria Olga Mattar juntamente ; e três por Maria Olga Mattar. Com efeito,

Mattar esteve à frente da disciplina de sociologia em 10 das 13 cadernetas encontradas; para além,

predominou na cadeira a partir do final da década de 1950. 

Em entrevista ao boletim Vida Universitária da PUCPR (2007, p. 01), Maria Olga Mattar

afirmou ter  se  formado em filosofia na FFCLPR e defendido seu doutorado em sociologia com a

tese   de   livre­docência   O   Preconceito   na   Vida   Social:   Raízes   da   Exclusão   Social   (1958),   sob

orientação de Bento Munhoz da Rocha. Foi convidada e contratada em 1951 pelos Irmãos Maristas

para   lecionar na FFCLPR como professora assistente de sociologia de Bento Munhoz, visto que

esse era professor interino de sociologia desde 1941. Em 1958, Mattar prestou e foi aprovada no

concurso para livre­docência de sociologia47 na FFCLPR, no qual apresentou a tese acima referida.

Afora sua tese,  Mattar elaborou, a partir dos anos 1950, mais dois materiais sociológicos: duas

apostilas que  utilizava  para  dar  suas  aulas (TOMAZI, 2006, p. 93­94).

Com efeito, na sociologia parece ter predominado uma outra natureza de relações sociais e

objetivos quanto ao ensino e desenvolvimento da área. Pois embora, como veremos, a disciplina de

sociologia fosse central no currículo de ciências sociais, seus professores não eram formados na

área, assim como não identificamos quaisquer especializações ou cursos por eles realizados que

articulassem formações sociológicas. Relativamente ao catedrático Omar da Mota, seu vínculo ao

direito e contínuo afastamento das aulas concorreram, em nosso entendimento, para uma fragilidade

institucional  da  disciplina,  uma vez  que não este  não   lançou  mão  de   recursos  ou   favoreceu a

formação de determinados discentes, como o fez Loureiro Fernandes. 

As cadeiras de antropologia e sociologia constituem os casos sobre os quais mais temos

informações. Contudo, essa dinâmica entre alunos e professores e indicação aos cargos parece ter

sido regular nas demais cadeiras do curso e da Faculdade. Zélia Pavão, por exemplo, era aluna da

graduação em matemática quando assumiu o cargo de assistente em estatística junto ao matemático

Remy Teixeira, contratado em 1952 como professor de estatística geral (WINKELER, 2016, p. 78;

MIGUEL, 2008, p. 17). Zélia Pavão era licenciada em pedagogia e bachareal em matemática pela

FFCLPR; em 1956, doutorou­se em educação e, em 1963, em estatística (WINKELER, 2016, p.

47Fonte: Atas do concurso de docência­livre nº 2. Arquivo do Setor de Educação da UFPR, envelope 49.

63

78). Desde 1952, atuou como instrutura de estatística aplicada e geral junto ao professor Teixeira;

em   1958,   com   a   saída   deste,   assumiria   o   cargo   de   professora   interina   das   referidas   cadeiras

(ANUÁRIOS…, 1958/1959, p. 63).

Ainda   que   sobre   a   condução   da   disciplina   de   política   existam   poucas   informações,

Comninos nos informou haver uma relação de proximidade de Lacerda Pinto, o catedrático, com

alguns alunos. O titular os recebia em casa para conversas e palestras sob determinados temas, os

emprestava livros – especialmente os livros em francês de Hubert Bourdot, enfim, criava também

vínculos com os discentes sem, contudo, projetá­los a cargos docentes. Como atestam as cadernetas

de política, Lacerda Pinto ou não comparecia às aulas ou comparecia intermitentemente ao largo do

ano letivo; ainda assim, não encontramos nenhuma informação de que ele tenha indicado auxiliares

ou   assistentes.   Na   experiência   de   Comninos,   quando   Lacerda   Pinto   não   comparecia,   as   aulas

simplesmente não aconteciam.

Por fim, gostaríamos de falar brevemente sobre as cátedras de economia política e história

das   doutrinas   econômicas,   ambas   a   cargo   do   intelectual   Artur   Ferreira   dos   Santos.   Filho   de

Claudino Rogoberto Ferreira dos Santos, prefeito de Curitiba entre 1916 e 1917, Artur Ferreira dos

Santos era formado em direito pela Faculdade de São Paulo. No Paraná, exerceu diversos cargos

públicos e políticos, entre eles deputado federal do Paraná (1935­1937; 1950), presidente da UDN

(1953), governador do Paraná (1955) e diretor da Carteira de Crédito Geral do Banco do Brasil

(1956­1968) (VERBETE BIOGRÁFICO, 2017, p. 1). Acreditamos, assim, que Almeida Santos foi

convidado à docência na FFCLPR em virtude de sua proeminência política, mas que, no entanto,

não chegou a exercê­lo, visto que não há registro algum de que tenha ministrado aulas e desde 1943

Arthur Almeida Santos foi admitido como assistente de suas cátedras. Em verdade, todas as 15

cadernetas de Economia Política e História das Doutrinas Econômicas, correspondentes a todos os

anos de funcionamento do curso a  partir  de 1943,   foram ministradas   integralmente por  Arthur

Almeida Santos; em virtude disso, o identificamos  como o docente regular mais antigo do curso de

ciências da FFCLPR no período aqui examinado.

Infelizmente,  obtivemos poucas informações acerca de Arthur Almeida Santos.  Sabemos

que foi contrado em 1943 como assistente das referidas cátedras e que, a partir de 1950, passou a

regê­las   como   professor   interino.   Constantino   Comninos,   seu   aluno   de   1954   a   1957,   seria

posteriormente seu auxiliar de ensino em Economia Política e História das Doutrinas Econômicas.

Em seu caso, como haviam apenas três alunos na turma e, mais tarde, apenas Comninos, Almeida

Santos lhe ensinava o conteúdo das cátedras em aulas particulares em sua casa, por meio de

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palestras,  conversas  e   indicações  de  leituras.  A aproximação entre  ambos,   somado a  seu êxito

acadêmico, renderam a Comninos o cargo de auxiliar de Almeida Santos em 1962.

 Em nosso entendimento, esta relação entre formação discente e docência, num registro de

desenvolvimento   das   áreas   de   estudo,   indicou   a   construção   de   estratégias   particulares   dos

professores visando determinados objetivos junto a suas áreas. Entendemos terem se constituído,

por um lado, relações sociais entre os alunos e professores que visavam, em reciprocidade, formar

pesquisadores/docentes de excelência e desenvolver seus campos de estudo. Porém, por outro, nem

todos professores engajarem­se neste objetivo. Como visto, não era raro selecionarem assistentes

com vistas tão somente a sanar o afastamento dos titulares e dar continuidade às aulas e cursos. Pois

uma vez  que  os  catedráticos,  em grande parte  dos  casos,   foram escolhidos  em virtude  de  seu

prestígio   social,   nem   todos   compartilhavam   de   objetivos   intelectuais   quanto   às   cátedras   que

fundaram.   Ademais,   some­se   a   isso   a   escassez   de   recursos   da   instituição   que,   em   nossa

compreensão, impedia igualmente a elaboração de estratégias de ensino.

A   relação   entre   discentes   e   docentes   e   desenvolvimento   de   áreas   de   estudo   esteve

significavamente enunciada na escolha do corpo docente contratado, à medida que os requisitos de

seleção e qualificação dos assistentes, auxiliares, interinos etc, expressaram, em última instância, a

elaboração   de   estratégias   para   o   aprimoramento  dos   domínios  das   cátedras   ou   tão   somente   a

regência   das   aulas.  Com  efeito,   a   liderança  de   Loureiro   Fernandes,   a   particularidade   de   seus

projetos   e   sua   diligência   indicam   que,   em   condições   de   escassez   de   recursos,   financeiros   e

humanos,   houve   espaço   para   apenas   um   projeto   científico   no   curso   de   ciências   sociais   e     a

antropologia foi a protagonista.

Ainda, nossa análise identificou, pois, a prossecução de objetivos inviduais quanto ao curso,

à   medida   que,   conforme   indica   a   documentação   examinada,   não   houve   um   projeto   político­

pedagógico   pensado   integradamente   para   o   curso.   Tal   se   expressou,   fundalmentalmente,   na

constituição   destas   estratégias   individuais   nas   cátedras   e,   como   veremos,   na   elaboração   dos

programas das disciplinas. O curso se organizou, com efeito, a partir de cátedras com finalidades

pensadas isoladamente; sua integração, pois, esteve a cargo do projeto mais amplo da Faculdade,

qual seja, de produção de uma elite intelectual para o Paraná.

65

3 CAPÍTULO 3: PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO

Arrolamos   até   aqui   tais   compreensões   acerca   dos   grupos   envolvidos   na   fundação   da

FFCLPR, seus professores, alunos, projetos e conflitos, pois em nosso entendimento compreender o

curso de ciências sociais exigiu visualizar em conjunto o ambiente em que ele teve lugar, sobretudo

a concepção do espaço em que o curso esteve inserido. Dessa forma, pudemos localizar alguns dos

aspectos que permitiram o desenvolvimento duma ciência social dentro duma faculdade específica,

atentando assim às singularidades desse processo,“relacionando não um pensamento ou uma ideia,

mas todo um sistema de ideias a uma realidade social subjacente” (MANNHEIM, 1967, p. 26). Na

impossibilidade de dialogarmos com todos elementos e fenômenos imbrincados na fundação da

FFCLPR e do curso, selecionamos aqueles cujos rastros deixados pela documentação, memória e

literatura permitiram a reconstituição de alguns aspectos da história do curso de ciências sociais da

atual UFPR, conforme nosso problema de pesquisa. Com a percepção desses elementos sociais dos

quais emanaram parte da constiuição da FFCLPR, gostaríamos agora de discutir o conhecimento

produzido no curso de ciências sociais, entendendo­o   como relativo à  essas mesmas condições

sociais. Para tanto, dividimos este capítulo em três tópicos: 1) os currículos do curso de ciências

sociais; 2) as cadernetas de frequência e matéria lecionada do curso; e 3) ciência e religião. 

3.1 OS CURRÍCULOS DO CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DA FFCLPR

Ao longo de nossa investigação identificamos, pois, dois diferentes currículos no curso de

ciências   sociais.   O   primeiro,   relativo   apenas   à   primeira   turma   da   FFCLPR   (1938­1940),   e   o

segundo, acionado de 1940 em diante48. Quanto à constituição destas grades curriculares, não foi

possível apurar a origem do currículo de 1938, isto é, se foi elaborado pelos próprios catedráticos ou

transplantado   de   outra   instituição,   por   exemplo.   Contudo,   acerca   do   currículo   de   1940,   sua

reorganização e retirada de uma disciplina, entre outras evidências, atestaram a afinidade desta nova

grade curricular com o currículo do curso de ciências sociais da FNFi. 

Na tabela 1 em apêndice, organizamos a grade curricular de 1938. Essa é uma informação

inédita acerca do curso de ciências sociais da FFCLPR. Este currículo foi vigente apenas para a

primeira turma de ciências sociais, ingressa em 1938, visto que no ano seguinte, com a prescrição

do padrão universitário   federal,   iniciou­se o processo de adequação da FFCLPR ao modelo da

FNFi49.  Formado  a  partir  de  13  disciplinas,  o   currículo  de  1938  era   centrado  nas  cadeiras  de

48De agora em diante, chamaremos oprimeiro currículo de “currículo de 1938” o segundo currículo, de “currículo de 1940”.49Fonte: I Livro de Atas da Congregação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná, p. 17. Arquivo doSetor de Educação UFPR, Livro 43.

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sociologia, com três disciplinas, e nas cadeiras de estatística e matemática, que juntas somavam três

disciplinas  voltadas   ao   ensino   de  métodos   quantitativos.  Três   distintas   disciplinas   de   filosofia

também integravam o currículo, em uma proposta, a nosso ver, adequada às pretensões da FFCLPR.

À economia eram reservadas duas disciplinas, economia política e finanças e história das doutrinas

econômicas. Por fim, as disciplinas de política e antropologia eram ministradas na última série do

curso; sobretudo a cadeira de antropologia parece apartada da proposta do currículo, focado em

sociologia,   estatística   e   economia   política,   uma   vez   que   não   há   um   diálogo   aparente   entre   a

antropologia e as demais disciplinas.

Em 1940,  no entanto,  a  grade curricular  do curso apresentaria  algumas  mudanças50.  Na

tabela 4 em apêndice organizamos uma comparação entre ambos currículos. Com efeito, o grosso

das disciplinas continuou o mesmo, contudo, sob uma nova ordem e disposição: quatro disciplinas

na primeira série, cinco na segunda, e quatro na terceira. A cadeira de filosofia geral e psicologia foi

retirada   do   currículo;   em   contrapartida,   incluiu­se   mais   uma   disciplina   de   economia   política.

Também a disciplina de economia política e finanças teve seu nome alterado apenas para economia

política. Neste momento, o eixo do currículo transferiu­se à sociologia e à economia, cada qual com

três disciplinas, seguido das disciplinas de estatística e complementos de matemática e da filosofia. 

O   interessante  dessas   alterações   foi   a   aproximação  do   currículo  de   ciências   sociais   da

FFCLPR ao currículo da FNFi. Conforme Maria Fávero (1989, p. 70), de 1939 a 1946 a grade

curricular das ciências sociais da Faculdade Nacional manteve­se a mesma – a organizamos no

apêndice 5. Com efeito, a mudanças curriculares efetuadas no rol das cadeiras do curso de ciências

sociais da FFCLPR orientaram­se no sentido da total adequação do curso aos padrões da Faculdade

Nacional.

Em análise dos currículos do curso de ciências sociais da FNFi, Glaúcia Villas Boas (2003)

desvendou algumas das  demandas por  trás das  escolhas  de suas cátedras.  Para a pesquisadora,

tratou­se de um currículo alicerçado no ensino da sociologia e da economia, seguido da estatística e

filosofia. A predominância da economia se explicaria por dois viéses: a possibilidade de lecionar no

ensino secundário as disciplinas de sociologia e de economia; e pela criação da Faculdade Nacional

de Economia apenas em 1945. Até esse ano, portanto, destinavam­se ao curso de ciências sociais da

FNFi  aqueles   interessados em especializar­se em economia (2003,  p.  48).  Já  a  preminência  da

50Tomazi identificou haver um novo currículo em 1940 (2005, p. 93). O autor afirmou haver a retirada das disciplinasde Filosofia Geral e Psicologia e História da Filosofia, sendo ambas substituídas pela cadeira de Ética, que teria lugarno 1º e 2º ano. Nossa análise, contudo, revelou que apenas a disciplina de Filosofia Geral e Psicologia foi extinta,continuando a funcionar e ser parte do currículo as disciplinas de História da Filosofia, no 1º ano, e a de Ética, no 2ºano.

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sociologia se explicaria, para além da docência no ensino secundário, pela demanda crescente de

seu conhecimento como meio de interpretação racional das sociedades (ibidem, p. 51). Sobre a

antropologia e a política, a pesquisadora considerou que estas ainda não se configuravam enquanto

áreas  de  importância,  motivo pelo  qual   teriam somente  uma disciplina  cada ao  final  do curso.

Apenas em 1947 a antropologia alargaria sua visibilidade, em termos curriculares, com a oferta de

duas disciplinas eletivas, etnografia do Brasil e metodologia e pesquisas antropológicas (ibidem, p.

50).

Segundo   consta   nas   atas   das   reuniões   da   Congregação   e   do   Conselho   Técnico­

Administrativo da FFCLPR, o transplante deste currículo, bem como dos programas das disciplinas

– discutiremos à frente, realizou­se sem imposições da parte dos professores paranaenses. Isto é,

esses   não   opuseram   ressalvas,   ou   ao   menos   elas   não   foram   registradas,   à   reestruturação   dos

currículos  da  FFCLPR.   Em   nosso   entendimento,   tal   cirscunstância,   relativamente   ao   curso   de

ciências   sociais,   era   sintomática   de   um   projeto   pedagógico   pensado   sem   integração   do   corpo

docente, para além de uma imposição legislativa acerca da condução dos cursos superiores. Pois tal

sugere não ter havido uma proposta para o curso de ciências sociais oriunda de seu próprio corpo

docente. Entendemos, nesse sentido,  que um projeto para o curso se deu apenas posteriormente, à

medida   que   este   se   consolidou   na   FFCLPR   e   possibilitou   a   formulação   de   estratégias

individualmente às cátedras, como visto. 

Ademais, tendo por base a teoria de Basil Bernstein, percebemos a elaboração de ambas

grades curriculares como derivadas de processos classificatórios, cujas fronteiras são esbatidas. Isto

é, os conteúdos eram alocados e pensados a partir de um fŕagil isolamento. Em nossa percepção,

constituem­se enquanto currículos de integração, pois além da repetição das cadeiras, há o fator de

transplante e adequação do currículo de 1940. Como visto, na FNFi o currículo de ciências sociais

foi pensado por meio sobretudo da sociologia, economia e estatística, em que economia e sociologia

predominavam   na   grade   curricular   mormente   pela   percepção   da   economia   como   elemento   de

importância para a compreensão da realidade social, assim como pela inexistência de um curso de

economia. Assim, as ciências sociais apresentavam­se como a área mais próxima para o ensino

desse tipo de conteúdo, sinalizando o esmaecimento das demarcações entre as áreas. Tal ficará mais

claro ao debatermos os conteúdos em si presentes nas cadernetas. 

68

3.1.1. Os programas das disciplinas

Aos   catedráticos   competia   a   constituição   dos   programas   das   disciplinas   de   suas

cátedras. Dentro dos limites impostos pelos dispositivos regulamentares do Conselho Nacional de

Educação, os titulares elaboravam sua agenda de conteúdos e atividades, bem como a execução das

atividades  práticas  que  porventura   fossem articuladas  na  disciplina.  Os programas  das  cadeiras

deveriam ser pensados e submetidos anualmente aos exames do diretor da Faculdade e do Conselho

Técnico  Administrativo   (CTA)  da  mesma,   a   fim destes   avaliarem e  validarem a  condução  da

cadeira.   Especificamente, deviam os catedráticos apresentar anualmente tais programas a 26 de

fevereiro,   isto   é,   antes   do   início   das   aulas,   para   o   estabelecimento   dos   cursos   normais   que

funcionariam no mesmo ano. A revisão do CTA da Faculdade tinha por intuito  tanto avaliar o

respeito às indicações do Conselho Nacional de Educação, quanto a organização dos materiais e

recursos necessários à condução das cadeiras (REGIMENTO, 1938, p. 8­9). Esse percurso estava

previsto, com efeito, no Estatuto da Faculdade51.

Do currículo de 1938, encontramos os programas das disciplinas de economia política

e finanças, sociologia e antropologia e etnologia52. Infelizmente, não obtivemos informações acerca

da elaboração destes programas; é possível, no entanto, que fossem espelhados nos programas de

ensino da Faculdade de Filosofia de São Bento,  uma vez que essa instituição serviu de base à

organização da FFCLPR em seu primeiro ano. No tocante à forma escrita destes programas, essa

era bastante semelhante à anotação dos conteúdos nas cadernetas de frequência e matéria lecionada.

Isto é, o programa previa a divisão da cadeira em três partes, em que cada uma destas parcelas era

organizada   na   forma   de   tópicos   numerados   que   se   subdividiam.   Ademais,   em   nenhum   dos

programas   foram  referidos   autores/as   ou  bibliografia.  As   cadernetas   e   programas  das   cadeiras

apresentavam, pois, uma mesma forma de sistematização e ordenação dos conteúdos.

Com o processo de adaptação da FFCLPR ao modelo da FNFi em 193953 foram, pois,

alteradas   as   grades   curriculares   dos   cursos,   seus   programas   de   disciplinas,   designados   novos

professores, entre outras mudanças à nível administrativo. Com efeito, cabia agora à secretaria da

51Embora   não   tenhamos   encontrado   o   Estatuto   da   Faculdade,   analisamos   o   Regimento   Interno   da   mesma,   queexplanava acerca dos trâmites previstos no Estatuto para a elaboração dos programas das disciplinas. O RegimentoInterno de 1938 foi encontrado nas Atas do Conselho Técnico Administrativo da Faculdade de Filosofia, Ciências eLetras do Paraná, presente no setor de Educação da UFPR, livro 47.52Fonte:   I   livro de atas  da Congregação da Faculdade de Filosofia,  Ciências  e Letras do Paraná,  1938,  p.  03­16.Arquivo do Setor de Educação da UFPR, livro 43.53Fonte: Atas do Conselho Técnico Administrativo da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná, 1939, p. 15­16.  Arquivo do Setor de Educação da UFPR, livro 47.

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FFCLPR  solicitar   à   FNFi  os   programas  das   disciplinas   anualmente   (ATAS…,   1940,   p.   23)54.

Embora não saibamos se os programas das disciplinas de 1938 eram redigidos e pensados pelos

próprios catedráticos, de 1939 em diante tais programas foram transplantados da FNFi, conforme

atestam as atas do CTA e da Congregação da FFCLPR. 

Contudo, isso não significou uma simples cópia dos programas, pois conforme a ata da

17º reunião do Conselho Técnico e Administrativo da FFCLPR de 1941, a adoção dos programas

em vigor na FNFi se daria “sem prejuízo de orientação particular de cada um [dos professores] e de

sua autonomia didática” (1941, p. 216).   Nesse sentido, compreendemos que a padronização ao

modelo da FNFi foi pensanda em termos de uma adaptação e não de uma replicação da instituição

no   Paraná.   Para   além,   tal   endossa   nossa   interpretação   acerca   das   agências   individuais   dos

catedráticos,  visto que ainda que houvesse o modelo e programas das disciplinas da FNFi,  era

possível   articular   elementos   e   orientações   particulares   à   condução   das   cátedras,   mas   não,   de

maneira geral, aos programas e currículos. Ou seja, havia permissão para uma certa configuração

das cátedras conforme os interesses de seus titulares, porém, ao mesmo, tempo, deveria­se orientar

seus conteúdos e forma de acordo com a legislação federal.

Ainda em 1939, foi lavrado o contrato da FFCLPR com os Irmãos Maristas. Após, foi

alterado o regimento interno da FFCLPR, pois que se acrescentou Conselho Geral, formado por três

integrantes da UBEE, incluindo o reitor do instituto Santo Maria, e dois membros da FFCLPR.

Competia ao Conselho Geral funções administrativas, como validação de orçamentos, pagamentos,

inscrições, emprego de professores, entre outros, bem como a vigilância e zelo pelo cumprimento

dos objetivos e orientação da Faculdade (REGIMENTO…, 1940, p. 20­21). Quanto à orientação da

Faculdade, tratava­se da religião católica. Assim, à  altura das negociações entre a FFCLPR e a

UBEE, foi estabelecido que,  ainda que os catedráticos pudessem manter  os programas de suas

disciplinas conforme os dispositivos da lei n. 1.190/39, deveriam demonstrar respeito e deferência

“perante os postulados cristãos de sua orientação espiritual [da UBEE], seguindo, em tudo quanto se

relacionar com as disciplinas dos diferentes cursos, uma conduta de elevado aceitamento à tradição

católica do povo brasileiro55” (ATAS…,1939, p. 20). 

Se por um lado adequação ao modelo da FNFi exigiu mudanças na grade curricular

dos cursos normais e dos programas das disciplinas ministradas atrelando,  assim, a FFCLPR  à

54Fonte: ibidem, p. 23.55Fonte: I Livro de Atas da Congregação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná, 1939. Arquivo do Setor de Educação UFPR, Livro 43.

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proposta nacional de educação, por outro, o contrato com a UBEE consolidou o projeto católico da

Faculdade,   visto   que   instituiu   formalmente   o   respeito   à   tradição   católica.   Nesse   sentido,

acreditamos,  houve  um  tensionamento  da   instituição  entre  dois  parâmetros  e  objetivos,  que   se

expressou sobretudo na condução das disciplinas. Essas, como discutiremos à  frente, ao mesmo

tempo que dialogavam eventualmente com conteúdos católicos, pautavam­se pelos programas de

disciplinas   da   FNFi   e   eram   elaboradas,   como   visto,   conforme   a   constelação   de   interesses   e

possibilidades dos docentes em desenvolver aquela área em particular. A análise dos programas das

disciplinas expressou os objetivos últimos da FFCLPR: modernizar  o Paraná  por meio de uma

cultura superior desinteressada pautada, por seu turno, no respeito aos preceitos da religião católica.

3.1.2 O curso especial de didática

A nível formal, a formação em licenciatura da FFCLPR tinha como base o currículo 3+1 da

FNFi. Isto é, após três anos de bacharelado, optava­se por cursar ou não mais um ano de disciplinas,

no  curso  especial  de  didática,   a   fim de   licenciar­se.  As  cadeiras   eram didática  geral,  didática

especial,   psicologia   educional,   administração   escolar,   fundamentos   biológicos   da   educação   e

fundamentos sociológicos da educação. No mesmo registro da FNFi, o expediente deste formato

curricular era a habilitação de um grande número de professores para o ensino secundário.

Para   Loureiro   Fernandes56  (DISCURSO…,   1944,   p.   10),   os   professores   secundários

deveriam   cultivar   em   seus   jovens   alunos   uma   elevada   consciência   humanística   e   patriótica,

mormente por meio do ensino de uma consistente cultura geral. Assim, entendia que “do corpo de

seus diplomados recrutará a Nação os professores, os humanistas, habilitados por longos cursos de

aperfeiçoamento   didático   e   científico   […]   responsáveis   no   futuro   pela   elevação   do   ensino

secundário” (ibidem). A FFCLPR esteve, portanto, em sincronia com os objetivos federais impostos

pela Reforma Francisco Campos, tendo por finalidades fundamentais a formação de professores e a

promoção duma cultura superior a nível nacional.  

No entanto, tendo em vista o modelo curricular da FFCLPR (3+1), ainda que tal esquema de

formação   preparasse   um   vasto   corpo   docente   em   condições   de   fazer   frente   aos   objetivos

vislumbrados pelos   intelectuais  da   instituição,  ao  final  conduzia  à   superposição de  dois  cursos

(FÁVERO, 1989, p. 12). Pois os conteúdos de teoria e método eram trabalhados separadamente: as

teorias no bacharelado e os métodos de ensino na licenciatura.  Do ponto de vista da formação

docente, o tratamento de teoria e método como elementos estanques e separados fragilizava o

56Discurso ao bacharéis de 1943, pelo paraninfo José Loureiro Fernandes. 1944, Anuário da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná.

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preparo à docência (ibidem). 

Tal foco na formação de professores manifestava a afinidade do projeto da FFCLPR com os

objetivos  da   intelectualidade  católica  no  campo educacional  brasileiro.  Como  já  posto,  o  CEB

esteve articulado a algumas das premissas da ação católica brasileira. Essa afinidade se expressou,

também, na FFCLPR. Em 1942 Alceu Amoroso Lima foi escolhido paraninfo dos formandos da

FFCLPR;   em   seu   discurso,   dissertou   longamente   sobre   o   papel   da   intelectualidade   católica

brasileira no campo da educação. Sinteticamente, Alceu Amoroso expressava, por meio da crítica

ao   pensamento   moderno,   um   projeto   nacionalista   para   a   educação.   Em   sua   concepção,   aos

professores  cabia  a  condução  do destino  do  país,  uma vez  que estes   seriam responsáveis  pela

orientação dos jovens alunos rumo à uma autonomia de pensamento calcada nos princípios cristãos.

No ano seguinte, em seu discurso aos bachareis e licenciados, Loureiro Fernandes se debruçaria

sobre o tema do neotomismo e sua validade na FFCLPR. Tratando especialmente do combate ao

cientismo e da construção de um conhecimento integral, Loureiro reiterou o posicionamento e de

Alceu Amoroso e acrescentou

o Sacerdócio da Verdade, sagrado ministério,  é  que dá  a esta Faculdade alta expressãointelectual ao traduzir um sentimento coletivo, uma corrente de opinião e um roteiro deatividades cujo objetivo é de construir uma verdadeira escola. Escola na elevada “função decriar,   recriar,   e   disciplinar   os   altos   atributos   da   cultura   humana   e   de   perpetuar   seuselementos constitutivos”(1943, p. 10).

A par desses objetivos, a FFCLPR constituiu­se, nesse sentido, como centro irradiador dum

projeto católico para a educação secundária paranaense.  Tal proposta estava articulada,  por seu

turno, ao ideal de modernização da Faculdade, ou seja, de, a partir do neotomismo, preservar a

unidade e integração da cultura paranaense face às transformações da vida moderna. Pois assim se

atingiria  “criar,   recriar  e  disciplinar  os  altos  atributos  da  cultura  humana” nas  novas  gerações.

Outrossim, à medida que a Faculdade se aproximou de elementos confessionais externos, como os

Irmãos Maristas e a UBEE, foi perceptível a apreensão e constituição de objetivos internos que

articularam tanto as exigências legislativas federais, quanto o programa católico nacional para a

educação. 

Assim como os currículos  e programas das disciplinas,  o curso de didática expressou o

elevado objetivo perseguido pela licenciatura da FFCLPR, qual seja, habilitar um vasto contigente

de professores especializados e promover um sólido conhecimento humanista e cristão aos alunos

secundários   paranaenses.   Não   se   trata,   no   entanto,   de   creditar   à   FFCLPR   uma   orientação

integralmente católica e, sim, de examinar seu tensionamento entre os objetivos de produção de

uma cultura superior desinteressada e de respeito/ajuste às demandas católicas.

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3.2 AS CADERNETAS DE FREQUÊNCIA E MATÉRIA LECIONADA: AS CIÊNCIAS

SOCIAIS DO PARANÁ

Se   os   currículos   e   programas   das   disciplinas   se   estruturavam   formalmente   segundo   as

configurações acima debatidas, as aulas do curso de ciências sociais expressavam, por seu turno, os

resultados e  efeitos práticos de tais  perspectivas  de ensino.  Agora,  portanto,  nos deteremos em

analisar os conteúdos e dinâmicas de sala de aula registrados nas cadernetas de ensino de frequência

do curso de ciências sociais da FFCLPR. Para tanto, analisamos seis cadernetas de antropologia e

etnografia,   uma  de   complementos  de  matemática,   15  de   economia  política,   oito  de   estatística

aplicada, 10 de estatística geral, três de ética, oito de história das doutrinas econômicas, três de

história da filosofia, oito de política e 16 de sociologia. 

Tendo   em   vista,   pois,   que   as   cadernetas   mantinham   anotações   pontuais   acerca   dos

conteúdos, ou seja, na maior parte dos casos anotava­se apenas o tema da aula, teremos como base

para a presente discussão este tipo de registro. Ademais, trata­se de um conhecimento dinâmico,

abordado diferentemente em cada uma das cadernetas ao longo dos anos, ainda que referentes à

mesma cadeira; faremos, portanto, uma síntese dos conteúdos das cadernetas por cátedra.

As disciplinas de economia, seja economia política, seja história das doutrinas econômicas,

foram integralmente ministradas por um mesmo docente, Arthur Santos de Almeida. Em virtude

disso, as cadernetas apresentaram, cada qual segundo sua disciplina, o mesmo conteúdo ano a ano.

O que se percebe, a partir disso, é o entendimento da esfera econômica como um dos fundamentos

da   vida   social   e   a   própria   economia,   como   uma   ciência   social.   Nas   cadernetas,   é   latente   a

correspondência entre aspectos econômicos,  como moeda, renda,  mercado e  teorias econômicas

com as questões das ciências  sociais  à  altura,  como formação de Estados,  divisão do  trabalho,

formas de produção, entre outras. Nas cadernetas de economia, constam leituras e/ou debates de

autores como Adam Smith, David Ricardo, Karl Marx e Paul Rigon.

Especificamente a disciplina de economia política, de modo geral, era iniciada com uma

discussão introdutória acerca das ciências sociais, seguida da ciência econômica, onde apresentava­

se  a  economia  política.  Estudava­se,  pois,  “o   fato  econômico  e   sua  conexão com outros   fatos

sociais: o direito, a moral e a linguagem”57; o docente apresentava a constituição histórica de seus

objetos e métodos de estudo. Após, comumente era encetado um debate sobre formação de salário,

juros,  elaboração de capital,  consumo e rendimentos,  constituição de mercados,  impostos,  entre

outros tópicos. Seguido desses debates mais pontuais, eram discutidas questões como produção e

57Caderneta de frequência e matéria lecionada de Economia Política, 1º ano, professor Arthur Santos de Almeida, cursode ciências sociais, 1954. Disponível em Arquivo do Setor de Ciências Humanas da UFPR.

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distribuição   de   riquezas   a   partir,   sobretudo,   das   teorias   marxista,   socialista,   malthusiana   e

ricardiana; essa última teoria dava ensejo à discussão sobre renda e consumo. 

Em alguns anos, como em 1951, por exemplo, foram debatidas teorias e visões da Igreja,

como sua percepção acerca do salário mínimo, conforme presente nas encíclias – não especificadas.

A partir de metade da década de 1950, incluiu­se a discussão sobre pleno emprego e economia de

prosperidade   e   depressão.   De   modo   geral,   a   disciplina   articulava   uma   espécie   de   história   da

economia,  com ênfase na produção e circulação de bens. Não identificamos diferenças entre as

disciplinas de economia política do 1º ano e do 2º ano.

Por seu turno, a cadeira de história das doutrinas econômicas tinha por finalidade, pode­se

dizer,   apresentar   historicamente   as   principais   escolas   de   pensamento   econômico   no   Ocidente.

Retomava­se, pois, o desenvolvimento das teorias econômicas desde o Egito antigo, passando pelas

doutrinas romanas, metalistas, mercantilistas, liberalistas, capitalistas, comunistas, entre outras. Em

especial,   nessa   cadeira   se   discutiam   as   correntes   econômicas   pensadas   pela   Igreja   Católica,

denominadas   “catolicismo   social”;   este   tema   era   visto   no   tópico   sobre   Movimento   Religioso.

Assim, Arthur Almeida Santos apresentava alguns aspectos do pontificado de Leão XVIII, seguido

do debate das encíclicas Rerum Novarum e Quadragesimo Anno. Em alguns casos, tal discussão foi

acompanhada de  debates   sobre  os  movimentos  protestantes,  em outros,   junto   à  questões  como

intervencionismo familiar e confessional. 

A presença de conteúdos católicos em ambas disciplinas é ambígua, pois tais temas estavam,

por um lado, inseridos no contexto de discussão, sugerindo assim a importância de os analisar em

sala de aula; por outro, a intermitência com que alguns conteúdos foram trabalhados em sala, como

a questão do salário mínimo segundo a Igreja,  indicou certa opção por esses  temas.  Quanto ao

sentido de conteúdos católicos em sala de aula, discutiremos em maior profundidade à frente.

As   aulas   de   sociologia,   contudo,   respondiam   a   uma   peculiar   configuração.   Junto   às

disciplinas de economia, era a área com mais cadeiras no currículo; a despeito disso, seu conteúdo

parecia não responder a um saber especializado, e, sim, a um aglutinado de disciplinas que não

permitia a definição própria e que acabava não agregando agentes em torno de um projeto. As

disciplinas   oscilavam   entre   conteúdos   de   direito,   filosofia,   estatística   e   economia,   sobretudo

impedindo a compreensão da variável social propriamente dita: ora era o Estado, ora a economia,

ora a moral, ora o catolicismo.

Na sociologia do 1º ano, era realizada uma apresentação da sociologia como fato social, sem

contudo, uma menção a autores. Em algumas cadernetas, constou o debate do desenvolvimento

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histórico desta ciência a partir de Augusto Comte, para, em seguida, discutir­se fato social. Após,

geralmente abordava­se o tópico de progresso social a partir das correntes finalista e determinista,

ou  grupos   social   e   classes.  A  estruturação  da  disciplina  era  dada,  pois,   a  partir  do  debate  de

conceitos tomados como tópicos das aulas: sociedade, hierarquia, normas sociais, evolução social,

mobilidade social. 

Apenas em algumas das cadernetas foram distinguidos autores; por exemplo, no caso da

cadeira de sociologia do 1º ano de 1952, conduzida por Olga Mattar e Euclides Mesquita, foi citado

Euclides da Cunha como fonte para a discussão do tópico “o homem e o meio”.  Em 1954, na

mesma cadeira conduzida pelos referidos docentes, discutiu­se Gabriel Tarde e Alfred Fouillé, sem

discriminar, contudo, quais aspectos de suas teorias foram abordados. A sociologia do 1º ano devia,

 sugere­se, apresentar introdutoriamente a sociologia aos alunos.

Já as cadeiras de sociologia do 2º e 3ºanos tinham seus conteúdos entreleçados e misturados:

ora determinado conjunto de tópicos era discutido no 2º ano, ora no 3º e vice­versa. Esta percepção

se reforçou à medida que as cadernetas de ambos os anos muitas vezes eram referentes à disciplinas

ministradas em conjunto para os 2º e 3º anos de ciências sociais. Com efeito, das 16 cadernetas de

sociologia,   seis   eram  relativas   a  disciplinas  de   sociologia  ofertadas  para  os   referidos  anos  em

conjunto.

De modo geral, a disciplina de sociologia do 2º ano passou por algumas fases ao longo do

curso. Durante a década de 1940, quando regida por Bento Munhoz, teve enfoque nas populações

marginais do sul do Brasil, em que se discutiu o conceito de aculturação. Posteriormente, a partir do

segundo semestre do ano, a cadeira era conduzida para os temas da economia, com o debate de

modos de produção, interdependência de fatores econômicos e sociais, grupos e classes sociais. A

partir da década de 1950, sob regência alternada dos professores Euclides Mesquita e Olga Mattar, a

disciplina abrangia tantos aspectos de uma sociologia econômica (como Bento Munhoz ministrara),

assim como de uma sociologia da religião, em que se discutiam autores como Émile Durkheim e

James Frazer; comumente se inseria a doutrina social do catolicismo e suas encíclicas, tais como

Rerum   Novarum,   Quadragésimo   Anno   e   Divini   Redemptoris,  nesse   espectro   de   temas.

Posteriormente, se estudava uma sociologia do conhecimento, assim denominada nas cadernetas. 

A sociologia do 3º  ano,  por  seu  turno,  abrangia  uma sociologia  da religião,  em que se

apresentava seu conceito e seguia­se discutindo religião e magia, feitiçaria e magia, formas sociais

da religião, entre outros temas. Em seguida, a partir desses aspectos se desenvolvia uma sociologia

do conhecimento preocupada em desvendar as articulações entre inteligência e ciência e lançar luz

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ao   papel   social   da   ciência   na   modernidade.   Tais   conteúdo   eram,   senão   os   mesmos,   muito

semelhantes em suas anotações aos do 2ª ano. 

Quando ministradas em conjunto, contemplavam uma variedade de temas, como discussões

acerca  de  tipos  de moradias  urbanas  e  higienização das  cidades,  no sentido  de compreender  o

desenvolvimento de doenças como tuberculose, sífilis e febre amarela. Analisavam­se também os

hábitos alimentares dos brasileiros e aspectos de saneamento rural. Outras vezes se discutiam o

conceito de raça e etnia no Brasil,  com ênfase no  índio,  negro e português;  quando havia essa

abordagem, em seguida eram trabalhos os temas de imigração e aculturação. 

Para além, algumas cadernetas registraram como conteúdo do 2º e 3º anos (em conjunto)

apenas os temas de religião e sociologia do conhecimento; em outros casos, apenas os tópicos de

desenvolvimento histórico da sociologia, como era comumente examinado na cadeira de sociologia

do 1º ano. Por fim, havia a explanação igualmente de temas da ordem de uma sociologia jurídica,

como direito natural e direito positivo, materialismo jurídico, desagregação da concepção integral

de direito, entre outros; e da ordem de uma sociologia política, em que se examinavam conteúdos

acerca das formas de Estado e de governo, democracia etc. Ou seja, não havia uma clara definição

acerca dos conteúdos a serem trabalhados nas disciplinas de sociologia do 2º e 3º ano de ciências

sociais.

Baseada nas duas apostilas que usava para lecionar sociologia, Maria Olga Mattar editou em

1998 o livro Organização e Contexto Social. Neste, definiu sociologia como “estudo da sociedade

em  todos  os   seus  aspectos.  A Sociologia  geral  procura  conhecer   a   realidade   sociológica   total,

formas,  mútuas   dependências,   correlações   entre   fatos   sociais   e   não   sociais,   a   fim  de   explicar

cientificamente as regularidades, regras e normas comuns a estes fatos sociais” (MATTAR, 1998, p.

16).   Por   outro   lado,   haveriam   também   sociologias   especiais   e   ciências   sociais   específicas,

preocupadas   em   conhecer   fatos   particulares,   tais   quais   economia,   religião   e   vida   urbana,   por

exemplo (ibidem). Ademais, compreendia a sociologia como uma ciência descritiva e comparativa

das sociedades, cuja função era formular leis e regularidades da vida humana (ibidem, p. 19). Com

efeito, a base da compreensão sociológica de Mattar era durkheimiana.

Para Mattar, a função da sociologia era “determinar a causa dos fenômenos comunitários e

organizar melhor a sociedade” (1998, p. 28). Neste sentido, se valia da estatística em uma tradução

matemática   dos   fatos   sociais,   da   história   como   evolução   temporal   destes   mesmos   fatos,   da

antropologia na percepção do homem como criador e transmissor de cultura e da psicologia social

como estudo  dos  padrões  de  comportamento  humano  em grupo   (ibidem).  A especificidade  da

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sociologia, nesse sentido, era a apreensão da organização social – essa entendida como um fato

social, visto que assim englobaria os aspetos da interação humana. Assim, sociologia estudaria a

“estrutura e funcionamento como dinâmicos e integrados num todo homogêneo, ditado pela herança

e cultura” (ibidem, p. 35).

Ao longo do livro, Mattar articula uma série de autores, desde Florestan Fernandes a Pitirim

Sorokin. Embora Mattar citasse suas referências ao final de cada um dos capítulos do livro, ao

longo do texto abordava suas teorias e considerações por meio de uma síntese pessoal. Isto é claro,

por exemplo, na seguinte passagem: 

Até hoje, no entanto, os sociólogos não chegaram a um acordo sobre o objeto específico daciência. Para uns, o fato social primeiro e a estrutura; para outros, os processos sociais […],para  outros  ainda,  as   relações   sociais   […] ou as   instituições,  ou  ainda os  produtos  daconvivência.   Fazendo   uma   síntese   do   pensamento   dos   autores,   podemos   dizer   comsegurança que a sociologia é  a  ciência da Organização Social  na forma e no conteúdo(MATTAR, 1998, p. 35).

Com efeito, esta percepção da sociologia e de sua função esteve expressa nas cadernetas,

seja  em sua apresentação em sociologia do 1º  ano a  partir  do conceito  de  fato social,  seja  na

preocupação em englobar um largo espectro de elementos e de disciplinas a fim de inferir algum

conhecimento sobre a realidade social. Além da abordagem de tais perspectivas por meio de uma

síntese pessoal de leituras por parte dos professores, sem necessariamente mencionar autores ou

indicar bibliografias durante as aulas. 

Acerca disso, é interessante retomar alguns aspectos levantados por Antônio Cândido no

artigo A sociologia no Brasil, de 1959. Para Cândido, a década de 1930 no Brasil marcou, pois, a

produção de uma sociologia baseada em uma indiferenciação disciplinar, “assim, é bastante largo o

seu âmbito de compreensão, englobando atividades que, noutros países, seriam rotuladas de história

social,  etnologia,  antropologia cultural,  folclore,  política” (CÂNDIDO, 2006, p. 292).   Também

Sérgio  Miceli   (1989,  p.  07)  considerou haver,  até   a  década  de  1950,  uma frágil  diferenciação

disciplinar  nas ciências sociais,  sem condições,  portanto,  de estabelecer  um perfil  às  lideranças

intelectuais da área, aos temas de pesquisa, conteúdos dos currículos, agendas de pesquisa e

metodologias. 

No   caso   da   FFCLPR,   para   além   de   uma   clara   indiferenciação   disciplinar   e   baixa

especialização da sociologia, a rotatividade de professores a cargo da área foi um dos elementos,

consideramos, fundamentais para o caráter amorfo da cátedra, no que se refere à sistematização de

seus conteúdos. Na verdade, acreditamos ter­se tratado de uma via de mão­dupla, em que, à medida

que não se constituía um projeto para a cátedra de sociologia, nem uma agenda de investigações e

ensino, não se aglutinavam agentes em torno da área. Por seu turno, sem agentes para levar a cabo

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tal projeto, este não se elaborava. No tocante a isto, no entanto, acreditamos que foi predominante a

ausência do catedrático, Omar da Mota, como já debatido anteriormente.

Já os conteúdos das cadernetas de estatística, cujas aulas foram dadas majoritariamente pela

professora Zélia  Pavão,   tinham como pontapé  os  conhecimentos  matemáticos   introduzidas  pela

disciplina   de   complementos   de   matemática.   Na   caderneta   de   complementos   de   matemática

encontrada nenhum conteúdo foi registrado; no entanto, Constantino Comninos, em reflexão sobre

as   disciplinas   que   cursou   durante   a   graduação,   afirmou   que   tal   disciplina   tinha   por   objetivo

aprofundar os conhecimentos matemáticos que seriam requeridos, posteriormente, nas disciplinas

de estatística geral e  aplicada.  Uma vez revisados os conhecimentos  matemáticos,  a cadeira de

estatística geral, alocada no 2º ano, introduzia os procedimentos e cálculos estatísticos, tais como

cálculo de média, mediana, desvio­padrão, variância, coeficiente de variação, quartis, entre outros.

Por seu turno, a cadeira de estatística aplicada mesclava o cálculo estatística aprofundado, como

cálculo do coeficiente de assimetria e variação, medidas de dispersão, média relativas etc,  com

estudos práticos  de  indicadores sociais  –  índice de Gini,  por exemplo.  Buscava­se,  com efeito,

instrumentalizar a prática estatística em cálculos sobre demografia, mobilidade urbana, natalidade.

Ou seja, havia marcadamente uma preocupação com os aspectos quantitativos das ciências sociais.

Nas cadernetas de frequência e matéria lecionada de antropologia, constava a regência

de aulas por Loureiro Fernandes, Cirilo Zacchi e Fernando Altenfelder Silva. Como dito, quase

todas as cadernetas se estruturaram de maneira muito semelhante, indicando a forte presença de

Loureiro na condução da antropologia da instituição. Normalmente, se iniciava a disciplina com

uma   recapitulação   histórica   da   formação   da   antropologia,   através   sobretudo   das   correntes

evolucionistas e difusionistas. Em alguns casos, acrescentava­se um debate sobre a formação da

arqueologia e da etnologia. Construía­se a cadeira, pois, através de uma apresentação inicialmente

mais teórica da antropologia e etnografia; no tocante à isso, eram abordadas as seguintes teorias e

autores:   evolucionistas,   arqueológicas,   panetnográficas   (Morgan),   Vierkandt   e   Demiker,

funcionalista,   sociológica   e   difusionista.   Em   seguida,   trabalhavam­se   os   denominados   “fatores

evolutivos sociais”: clima, alimentação, reino animal e vegetal (fatores externos), e caça, pesca,

alimentação, habitação, cultivo entre outros (fatores internos).

Excepcionalmente na cadeira conduzida por Fernando Altenfelder Silva em 1954, houve um

outro ajustamento de conteúdo. A disciplina foi tratada como estudo de antropologia social, calcada

na   discussão de autores como Émile Durkheim, Bronislaw Malinowski, Alfred Radcliff­Brown e

Ferdinand Tönnies – neste caso foi especificada a obra Comunidade e Sociedade, e nos temas de

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instituições,  morfologia  social   e  anatomia   social.  Altenfelder   também trabalhou  a  definição  de

objetos e métodos antropológicos, tais como entrevistas, etnografia e questionários. E, por fim, os

temas de tecnologia como cultura, família, relações de parentesco e ecologia humana, para os quais

convergiu o estudo do grupo indígena Bakairi.

Considerando   ambas   conduções   da   disciplina   de   antropologia   e   etnografia,   houve   a

formação de um saber antropológico atrelado às correntes evolucionista e social.  Para além, os

temas abordados na cadeira refletiam a agenda de pesquisa elaborada por Loureiro Fernandes e seu

grupo. Como examinado no capítulo 1 deste trabalho, o desenvolvimento da antropologia no Brasil

foi marcado pela afinidade da área com a medicina; daí sua orientação para o evolucionismo. 

Conforme Thales  de  Azevedo  (1982),  muitos  médicos  orientavam sua   formação  para  o

estudo de anatomia, fisiologia, antropometria e antropologia física; assim, marcado pelas condições

sociais   do   período,   alargou­se   o   interesse   pelas   raças   humanas   e   pelas   possíveis   diferenças

antropofísicas,   fisiológicas  e  psicológicas  entre  elas   (AZEVEDO, 1982,  p.  262).  No entanto,  a

maioria dos médicos interessados em antropologia física se orientaram, posteriormente,  “para o

estudo da cultura, da organização social, das instituições, dos sistemas de valores e das crenças, da

etnolingüística de populações tribais” (ibidem, p. 263). Nessa direção, Azevedo assim definiu a

atuação de Loureiro: 

Seguindo um roteiro comum a outros médicos, interessa­se e publica, a princípio, sobrequestões de hematologia étnica e de antropometría de índios brasileiros e vem a explorarsambaquis da costa e jazidas arqueológicas do planalto paranaense, dando a tais trabalhosum   desenvolvimento   acentuado.   São   contribuições   suas,   de   relevante   importância,   osestudos etnográficos de  índios caingangue de Palmas e dos xetá  da Serra dos Dourados(1982, p. 267).

Sobre as aulas de política é custoso inferir algo, visto que o conteúdo anotado nas cadernetas

se restringiu ao assinalar do ponto do programa da disciplina que foi lecionado. No entanto, o fato

de haver uma única disciplina de política em todo curso, bem como as aulas serem irregulares, além

de não haver quaisquer incentivo identificado à pesquisa e ensino na área, sugerem que a política

não   foi   alvo,  nesse  momento,  de  um projeto   institucionalizador,   como   foi   a   antropologia,  por

exemplo. Indica, também, que a cátedra não se constituia como uma área de destaque no currículo

do curso.

Por fim, as disciplinas de filosofia eram duas: história da filosofia e ética. As cadernetas de

história da filosofia encontradas foram regidas pelos docentes Padre Tarcísio Maria Capuchinho,

em 1943, e Ubaldo Puppi, em 1959. Em ambos os casos, tratou­se de uma disciplina de retomada

histórica do desenvolvimento do pensamento filosófico ao longo do tempo; não se tratava, contudo,

79

de uma historização da filosofia e, sim, de um debate de suas escolas e linhagens desde a grécia

antiga. Era uma cadeira orientada, com efeito, por uma perspectiva panorâmica e de seleção de

autores principais. Entre tais autores, a doutrina de São Tomás de Aquino foi longamente abordada

– por um mês ­ em comparação às demais teorias, cuja duração era de não mais que duas semanas.

A reflexão da doutrina tomista em ambos casos encorporou a  discussão acerca do cristianismo e a

filosofia;  no tocante à  condução da disciplina de 1943, foi discutida a Suma Teológica de São

Tomás de Aquino e revisados os temas de sua cosmologia, psicologia, metafísica, teodiceia e ética.

Encontramos igualmente duas cadernetas de ética, cujos conteúdos foram ministrados pelos

professores padre Artidório Lima, em 1944, e Ubaldo Puppi, em 1954. A primeira parte da cadeira

era, pois, destinada à discussão sobre moral, envolvendo desde as discussões sobre moral realista e

moral idealista, até questões sobre livre arbítrio. Após essa discussão, comumente embasada nos

escritos do filósofo alemão Emanuel Kant, direcionava­se a cadeira ao tema da ética. A partir   de

então, eram debatidas questões amplas como as ações humanas, atos elícitos, noção de lei, entre

outros tópicos. Por fim, introduzia­se a questão acerca do direito natural x direito positivo, com

ênfase na relação entre Deus e o direito.

De maneira geral, tratou­se de um curso de forte diálogo com as ciências exatas, em que

essas eram instrumentalizadas como suporte às investigações quantitativas da área; de produção de

um conhecimento antropológico que buscava uma excelência em sua construção; de uma sociologia

amorfa, cuja pluralidade de temas e objetos não permitiu a composição duma agenda de pesquisas;

de intenso diálogo com a economia, essa entendida como uma ciência social, para compreensão de

diversos fenômenos sociais; e, por fim, de uma cadeira de política de baixa visibilidade e alcance

dentro do curso. Ressaltamos que, ainda que houvesse um forte apelo ao catolicismo na instituição,

a documentação analisada não sugere a produção de intelectuais católicos pelo curso de ciências

sociais,  pois  os   conteúdos  confessionais,   ainda  que presentes,   eram  intermitentes  e   localizados

dentro de um espectro bastante largo de conteúdos e conhecimentos gerais. 

Neste sentido,  cabe se perguntar a qual percepção de modernidade o curso esteve vinculado.

Constituída   enquanto   espaço   de   harmonia   entre   tradição   e   inovação,   a   FFCLPR   propunha   a

“manutenção   [...]   dos   elementos   universais   do   catolicismo,   bem   como   [a]   aceitação   [...]   do

progresso material advindo, particularmente, do desenvolvimento científico” (CAMPOS, 2006, p.

142). No caso do curso de ciências sociais, sugere­se a produção de um conhecimento atrelado a

esta percepção tensionada entre modernidade e tradição. Pois, conforme sugere a documentação,

não se elaborou uma reflexão de questionamento acerca da realidade social, ou seja, se prescindiu

80

de uma racionalização da sociedade na constituição deste conhecimento. Por outro lado, se não

houve a formulação de questionamentos acerca das bases de poder local, buscou­se, por meio do

projeto   mais   amplo   da   FFCLPR,   manter   a   coesão   e   integração   da   cultura   e   realidade   social

paranaenses   através   de   uma   leitura   de   união   entre   tradição   e   inovação.   Foi   a   esta   visão   de

modernidade que, acreditamos, o curso esteve vinculado.

Não   obstante,   as   singularidades   internas   da   Faculdade,   relativamente   a   seus   recursos,

projetaram  a   cátedra   de   antropologia   ao   protagonismo   no   curso.  Como   visto,   a   diligência  do

catedrático Loureiro Fernandes monopolizou os recursos possíveis postos aos demais professores,

sobretudo no tocante à constituição de grupos de pesquisa e agendas de investigação. Dessa forma,

o curso produziu sobretudo leituras sociais acerca dos sujeitos estudados na cátedra de antropologia.

O sentido assumido pelo curso, nesta direção, foi o de produção de profissionais voltados ao debate

sobre   populações   marginais   no   estado,   que   atuaram,   inclusive   sobre   orientação   de   Loureiro

Fernandes, na demarcação de terras indígenas e proteção de patrimônios arqueológicos58.

Finalmente, a análise das cadernetas e dos agentes indicou, com efeito, a constituição de um

curso sem um projeto intelectual, cujo conhecimento produzido prescindia de uma racionalização

da realidade, visto que não esta não era inquerida com uma preocupação metodológica, à exceção

da  disciplina  de   antropologia.  Ainda  que  a   compreensão  da  vida  moderna,   em  suas   lógicas  e

mudanças,   tenha sido um dos principais  apelos  de fundação da Faculdade,  o curso de ciências

sociais, acreditamos, não se constituiu enquanto produtor de um conhecimento racionalizado acerca

da realidade social.

3.2.1 A dinâmica das aulas

Por razões já discutidas, as turmas do curso de ciências sociais costumavam ser pequenas.

Assim,  era  expediente   comum reunir  estudantes  de  diferentes   séries  do  curso  em uma mesma

disciplina. Por exemplo, em 1952 os alunos do 2º ano e do 3º ano cursaram juntos a disciplina

anotada como estatísica geral e aplicada, ministrada pelos professores João Remy e Zélia Pavão;

estatística geral era referente à 2º série do curso, e estatística aplicada, à 3ª. Em 1954, Euclides

Mesquita lecionou sociologia em conjunto para as turmas da 2ª e 3ª série de ciências sociais. Com

efeito,  essa logística de reunião de turmas  foi identificada em 11 das 66 cadernetas da década de

58Sobre isso, ver os trabalhos: DRESCH, Gabriella Anne. Entre instituições e projetores: Loureiro Fernandes e os usosdos   filmes   etnográficos.  Curitiba:   trabalho  de   conclusão  de   curso  de   ciências   sociais  UFPR,  2016;   e  ANAIS  doseminário comemorativo do centenário de nascimento do profº drº José Loureiro Ascensão Fernandes. In Revista doCentro de Estudos e Pesquisas Arqueológicas, v. 3, p, 1­220, 2005. 

81

50.

Quando perguntado sobre o ensino nessas condições, Comninos afirmou “o conteúdo era

cumprido assim [...] o pessoal que tava no terceiro acompanhava, o pessoal que tava no segundo

adiantava, e ia fazer o terceiro depois, com os que vinham logo. Era uma espécie de rodízio, porque

eram poucos  alunos”;   tal  não acontecia   sem prejuízos,  uma vez  que para   tanto  era  necessário

condensar os conteúdos de dois distintos programas de disciplinas em apenas um.

Essa   dinâmica   de   reunião   de   turmas   ocorria   também   entre   os   cursos   que   ofertavam

disciplinas semelhantes e ministradas pelo mesmo docente59. Isso foi substancialmente regular nas

cadeiras de sociologia do 1º ano de ciências sociais, que eram cursadas normalmente junto aos

alunos de filosofia e pedagogia. Nestes casos, afirmou Comninos, havia um enfoque na disciplina

de acordo com o curso que a ofertava, mas observava­se a origem diferenciada dos estudantes e as

exigências daí derivadas.

Acerca da composição das aulas, Constantino Comninos nos afirmou que a maior parte das

aulas que frequentou eram elaboradas da seguinte forma: “você pegava um monte de livro, fazia um

esquema, vinha pra sala de aula, punha um esquema no quadro, como a Olga fazia, e quem falava

era o professor”. Não havia, pois, a leitura do texto em si e, sim, a discussão da interpretação do

docente sobre o tema. Exemplar sobre isso eram as apostilas de sociologia elaborada pela profª Olga

Mattar. Nessa, como visto, Mattar discutia temas centrais da sociologia com base em seus autores

de referência, ao mesmo tempo, explicava tais temas a partir duma síntese pessoal destes autores. 

Conforme   os   conteúdos   das   cadernetas,   à  exceção   das   disciplinas   de   economia   e

antropologia, nas demais cadeiras discutiam­se determinados tópicos de ensino como a professora

Olga Mattar o fazia, ou seja, por meio de uma síntese intelectual elaborada pelo docente. Isto é, se

conduzia o conteúdo a partir da interpretação que o professor fazia acerca da leitura das fontes e

bibliografia disponível que, salvos os casos mencionados, não era obrigatoriamente indicada aos

alunos. Entendemos, pois, que essa maneira de coordenar o ensino em sala de aula encontrava eco

na própria formulação de conhecimento e ensino prevista nos programas das disciplinas.

Ainda assim, havia uma bibliografia específica de cada cadeira. Comninos lembrava­se de

ter lido, ainda que alguns por vontade própria, os seguintes autores ao longo da graduação: Euclides

da Cunha, Paulo Prado, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Antônio Cândido, Florestan

Fernandes, Celso Furtado, Raymundo Faoro, Joaquim Nabuco, Caio Prado Jr., Antônio Cândido e

Florestan Fernandes. Além desse autores, a discussão dos clássicos, fosse de qualquer área, era feita

59Essa dinâmica foi identificada em seis das 66 cadernetas do período.

82

com bases em leituras em espanhol, pois que poucos livros estavam traduzidos para o português.

Assim,  os  principais  trabalhos  a que  tinha acesso eram os  editados  pelo Fondo de Cultura del

Mexico ou pela Espasa­calpe, de Buenos Aires e Madrid. Para dar conta, portanto, da bibliografia e

discussões  do   curso,  Comninos  afirmou  que,   em  seu   ano,   os   alunos   juntaram­se  e   realizaram

traduções de artigos, capítulos e textos do inglês, francês e alemão para o português. Buscavam

assim, suprir a deficiência de títulos de ciências sociais em português. Após traduzirem, copiavam

os textos em papel carbono e dividiam entre si. Outras estratégias eram mimiografar os textos e

compartilhá­los; emprestá­los dos professores; ou ir à casa dos docentes para realizar as leituras. 

Acerca do acesso à fontes, bibliografia e contato com os temas estudados pelas ciências

sociais, era perceptível a preocupação do catedrático Loureiro Fernandes em oferecer a seus alunos

uma   formação   de   excelência.   Acerca   disso,   ressalto   aqui   os   filmes   etnográficos   elaborados   e

encomendados por Loureiro em parceria com o cinegrafista tcheco Vladimir Kozak60. Em análise

destas   películas,   Gabriella   Dresch   (2016)   considerou   três   distintos   empregos   dos   filmes   por

Loureiro: político, educativo e acadêmico. Relativamente ao uso acadêmico, Loureiro se valia dos

filmes  para  promover  a   seus  alunos  uma   formação  diferenciada,   a  medida  que  o   antropológo

entendia tais películas como “capazes de aproximar os estudantes do que era retratado, suprindo a

distância da universidade no que tangia os espaços de pesquisa” (DRESCH, 2016, p. 36). Assim,

Loureiro acrescentava às suas aulas expositivas e de campo – que eram em número significativo ­

materiais que permitiam e encetavam uma formação privilegiada a seus alunos.

A grosso modo, pois, estes eram alguns dos aspectos que orientavam as dinâmicas e

propostas didáticas do curso de ciências sociais. Somados aos conteúdos estudados nas cadeiras,

constituiam um curso, de modo geral, de frágil produção de conhecimento e ensino, porém que se

consolidou e ganhou maior força ao longo do tempo. Em relação aos discentes, chama atenção sua

disposição em desenvolver  estratégias  de  ensino e aprendizado,  a   fim de  sanar  as  dificuldades

postas a uma formação universitária à altura. Assim, ainda que houvesse uma fragilidade latente no

curso, indicada sobretudo pela reunião das turmas e condução das aulas e conteúdos, era manifesto

o esforço destes agentes no cultivo de sua própria formação.

60Vladimir Kozak (1897­1979) era natural da Moŕavia, atual República Tchecha; engenheiro mecânico de formação,imigrou definitivamente para o Brasil em 1927, onde residiu nas cidades de Salvador, Vitória e Belo Horizonte, antesde estabelecer­se, por fim, em Curitiba, em 1938. Desde que chegou ao país, iniciou uma série de registros acerca desua fauna e flora, atuando como fotógrafo e cineasta (BENETTI, 2015, p. 10­11). Ao se estabelecer em Curitiba, travoucontato com Loureiro Fernandes, que o empregou voluntariamente no Museu Paranaense. Juntos, gravariam uma sériede películas etnográficas, entre as quais Os Xetá na Serra dos Dourados (ibidem, p. 58). 

83

3.3 CIÊNCIA E RELIGIÃO: O PAPEL DA FILOSOFIA

Em 3 de maio de 1938 teve lugar a primeira aula da Faculdade de Filosofia, Ciências e

Letras do Paraná. A aula inaugural foi proferida pelo padre Jesus Ballarin, cujo tema foi Ciência e

Filosofia; Ballarin direcionou­se, sobretudo, a aproximar ciência e filosofia ao longo da história,

atentando aos períodos de identidade, diferenciação e harmonia entre ambas (ALVES, 1988, p. 65).

Em 1941, o padre Ballarin voltaria a falar sobre ciência e o neotomismo, por ocasião da diplomação

das turmas de 1941 da FFCLPR. No contexto desta fala, o padre Ballarin dissertou sobre a profusão

de conhecimentos engendrada com a fundação da Faculdade de Filosofia do Paraná e os perigos daí

advindos; entre esses, estava o cientismo. Baseado em premissas neotomistas, disse ele:

a  ciência  é   apenas   a   “escola  primária  do  espírito”.  A ciência  não  se   identifica  com aVerdade,   não   se   emparelha,   nem   dispensa   e   muito   menos   suprime   a   Religião.   Opensamento humano, a razão humana é uma força viva que busca seu ponto de apoio e oseu fim; o princípio e o fim da inteligência é Deus (ANUÁRIO…, 1941, p. 52).

 Acreditava­se ser possível, pois, o harmônico convívio entre ciência e religião, uma

vez   que   a   última   respondia   pela   totalidade   dos   saberes   e   era   a   única   capaz   de   estabelecer

imperativos morais  verdadeiros  aos  indivíduos.  A ciência era apenas um conhecimento parcial,

decerto importante, mas que não abrigava, pela sua natureza empírica, a explicação metafísica dos

fenômenos. Continuando em sua fala, acrescentou o padre Ballarin, “a ciência conserva o seu posto,

gloriosa e modesta, consciente de seus limites e de sua impotência radical tanto para resolver, como

para   debilitar   as   grandes   questões   que   mais   vivamente   interessam   os   homens”   (ibidem).

Observamos, pois, a importância concedida a ciência e às suas questões. No entanto, trava­se de

designar um lugar pra ela, abaixo do conhecimento divino, naturalmente. No neotomismo, a ciência

ocupava o espaço de um discurso particular sobre fenômenos racionais e empíricos, não tendo,

assim, influência sobre as questões metafísicas. A supressão dos limites científicos se daria através

dos conhecimentos  divinos,  pois  esses   responderiam às  questões  que a circunferência prática e

racional da ciência não permitia. 

Entre as preocupações de alguns dos intelectuais de confissão católica em fundar uma

faculdade remeteu, como visto, aos desdobramentos que o progresso científico havia acarretado,

pois em seu entendimento a modernidade estava contaminada pelo cientismo e por uma falta geral

de caráter e princípios morais, ambos advindos da crença de que a ciência a tudo solucionaria e

ordenaria (CAMPOS, 2006, p. 154). O cientismo era, pois, transformação da ciência de forma de

conhecimento a imperativo moral, isto é, na modernidade as ciências prescreviam formas de agir.

Em sua concepção, tais desígnios não cabiam à ciência e, sim, à metafísica divina, visto que essa

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era total e capaz de preconizar, assim, os imperativos morais verdadeiros aos indivíduos.  Nota­se,

com efeito, que o conflito entre ciência e religião se constituia no registro do diagnóstico da ciência

como cientismo e não como forma de construção e explicação racional de determinados fenômenos.

Com a Faculdade de Filosofia haveria a possibilidade, portanto, de aproximar a ciência moderna

dos pressupostos da filosofia católica neotomista; dessa forma, poderiam tanto conduzí­la, quanto

imbuir­lhe de um novo estatuto na vida moderna (ibidem, p. 152).

Em 1946, a disciplina de Introdução à filosofia seria instituída como obrigatória em

todos os cursos da FFCLPR; com isso, tensionava­se impedir o desenvolvimento de um cientismo

na instituição. Para Loureiro Fernandes, a par duma formação complementada pelo conhecimento

filosófico desenvolveria­se uma nova concepção de ciência, qual seja, “aquela que compreende a

ciência como conhecimento tanto dos fenômenos (ciências positivas) quanto da substância (ciência

metafísica)” (DISCURSO AOS…, 1943, p. 9).  Essa pretensão esteve presente, pois, desde o início

da FFCLPR e sinalizou a perenidade de um projeto educacional neotomista ao longo dos anos. Para

Loureiro Fernandes, o progresso científico moderno caminhava agora para a formação de uma nova

síntese  do  pensamento  humano,  devendo   a  Faculdade  de  Filosofia  desenvolver   conhecimentos

apropriados, de forma a unir ciência e filosofia na sociedade paranaense. Ou seja, cultivar cientistas

cuja formação, qualquer fosse sua área de especialização, fosse construída pela filosofia, de modo a

alcançar os aspectos universais da ciência e não recair em um cientismo.

A disciplina de filosofia foi incluída nos currículos da FFCLPR61  justamente no momento

em que a  Universidade do  Paraná   era   reunificada.  Em seu discurso  de   instalação do conselho

universitário,  Francisco  de  Paula  Soares   assim definiu  os  objetivos  da  UP,   “formar  a   elite  de

homens de que o Paraná precisa para abrir suas estradas, construir suas pontes, tratar de valorizar

suas terras, sanear e educar sua gente e defender seus direitos, mas principalmente […] formar os

homens de Estado de que o Paraná precisa para a sua própria salvação” (ibidem, p. 39). Havia, pois,

um   apelo   à   técnica   como   instrumento   de   modernização,   em   uma   aspiração   característica   das

faculdades isoladas de direito, engenharia e medicina do Paraná.

No   mesmo   ano,   Homero   Batista   de   Barros,   professor   da   FFCLPR,   dissertou   sobre   a

formação   humanística   a   que   as   faculdades   brasileiras   deveriam   se   ater,   a   fim   de   se   realizar

integralmente todos aspectos da vida humana e, com isso, constituir um progresso moral e cristão.

Ao final de sua fala, salientou Barros acerca da reestauração da UP,

61À exceção dos cursos de filosofia, ciências sociais e pedagogia que já contemplavam cadeiras de filosofia em seucurrículo (CAMPOS, 2006, p. 199­200).

85

o grandioso empreendimento só atingirá  seu objetivo se não se limitar apenas à  obra deerudição e cultura, mas se desempenhar realmente a grande missão de orientação espiritual,acumulando as reservas de resistência das novas gerações. E   se   não   seguir   esse   rumo,   a  Universidade  não  virá   senão  a   fabricar   técnicos  para   acondenável “civilização da máquina”, uma das causas mais decisivas da “indignidade domundo moderno” (ANUÁRIO…, 1946, p. 46).

Essa dupla perspectiva acerca dos fundamentos e objetivos da UP encontrava sua razão de

ser no Estatuto das Universidades do Brasil de 1931, cuja concepção de universidade era calcada

numa   percepção   agregacionista   de   faculdades   isoladas,   em   que   sua   unidade   mantinha­se   pela

administração por uma mesma reitoria (ROTHEN, 2008, p. 157). Por outro lado, a distância entre

os projetos da UP e da FFCLPR indicou o estabelecimento de ações estratégicas que visavam, em

última   instância,   estabelecer   diferentes   ideais   educativos   no   espaço   privilegiado   de   uma

universidade (CAMPOS, 182, 2006).

Foi nesse sentido que compreendemos a incorporação da disciplina de Introdução à filosofia

em  todos  os   cursos  da  FFCLPR.  Ainda  que   fosse  um projeto  mais   antigo  dos   fundadores  da

FFCLPR, ele tomou corpo e se efetivou justamente em 1946. Na concepção da direção da FFCLPR,

a inclusão da disciplina de filosofia suprimiria as deficiências que  a especialização dos cursos de

graduação imbuía à construção duma ciência universal. Pois para  eles,  sem o saber filosófico de

base   se   recairia     em   um   “culto   exclusivo   à   ciência   positiva”   (DISCURSO…,   1944,   p.   8­9).

Ademais, reforçavam assim papel da Faculdade como centro orientador da Universidade, à medida

que a localizavam como centro de produção de conhecimento puro e desinteressado, porém capaz

de ser utilizado por outras Faculdades e cursos. 

3.3.1 A SOCIOLOGIA INTEGRAL

Conteúdos católicos ou relativos à Igreja Católica não eram raros no curso de ciências

sociais da FFCLPR. De maneira mais ampla, também não na FFCLPR, uma vez que essa tanto foi

fundada por membros do CEB, quanto dispunha deles em seu corpo docente. No entanto, o que isso

siginificou em termos da produção de um conhecimento relativo às ciências sociais? Havíamos

destacado   anteriormente   que   Bento   Munhoz   teve   uma   atuação   marcante   para   a   sociologia   da

FFCLPR, por compreendê­la por meio de um horizonte católico. A sociologia a que Bento Munhoz

se referia era a Sociologia Integral. 

Em 1942, ele assim a definiu “[a sociologia integral] vai à natureza humana, mas à sua

natureza completa, e considera o societismo uma contingência da vida humana. Traz da filosofia

uma concepção do ser racional, que tira aos fatos sociais a fixidez e a fatalidade inerentes aos fatos

86

físicos   e   biológicos”   (ANUÁRIO...,   1942,   p.   16   apud   CAMPOS,   2006,   p.   161).   Ou   seja,   a

sociologia moderna, ancorada em seus critérios empíricos e científicos representava apenas uma

parcela   do   conhecimento   sociológico   possível,   ao   passo   que   a   sociologia   integral,   de   cunho

neotomista, podia apreender a totalidade do comportamento humano.

A fonte do pensamento de Bento Munhoz era o intelectual católico Alceu Amoroso

Lima  (WOISKI,  1988,  p.  112).  Tratando­se  da  sociologia   integral  de  Amoroso Lima,  esta   foi

desenvolvida em seu manual de sociologia, Iniciação à sociologia, de 1931. Neste, Amoroso Lima

apartou a sociologia de sua compreensão positivista, à medida em que entendia sua origem entre os

filósofos antigos e religiosos. Baseado em pressupostos neotomistas, Amoroso Lima destacou “a

compatibilidade entre os pressupostos cristãos e a reflexão racional acerca da vida social inspirado

em autores como Le Play e Jacques Maritain” (MEUCCI, 2000, p. 69). A partir disso, o intelectual

constituiu uma sociologia integral, visto que essa interagia com a natureza, ao mesmo tempo que se

integrava aos aspectos metafísicos da realidade. A diferença, portanto, da sociologia integral estava

em sua compreensão dos aspectos ultra­terrenos, enquanto que outras variações da sociologia –

como a naturalista, por exemplo – valiam­se tão somente dos processos fenomênicos da realidade

sensível   na   construção   de   suas   investigações.   Dessa   maneira,   produziam   compreensões

generalizadas e reduzidas ao empírico (ibidem, p. 70).

Este entendimento da sociologia teve lugar na condução das aulas de sociologia de

Bento Munhoz.  Conforme o depoimento de  Albano Woiski, ex­aluno de pedagogia (1941­1945) e

posteriormente docente da FFCLPR, Bento Munhoz cultivou em seus alunos um entendimento da

sociologia fundamentado na sociologia integral de Amoroso Lima. Para Woiski (1988), a disciplina

conduzida   por   Bento   Munhoz   era   profundamente   humanista,   pois   explicava   o   homem   como

construtor   da   sociedade,   ao   contrário   das   teorias   materialistas   e   comunistas   que,   a   seu   ver,

subsumiam o homem à vida social. Assim, “o prof. Bento nos colocou dentro da sociologia cristã.

Só havia um livro na linha dessa doutrina, o de Alceu Amoroso Lima – Tristão de Athaíde. Esse

livro foi analisado de ponta a ponta  (1988, p. 112)”. Acreditamos que tal percepção esteve presente

também nas cadernetas de fundamentos sociológicos da educação, regida por Bento Munhoz em

1942,  quando esse discutiu o sentido sociológico da encíclica Rerum novarum62.

Em 1951, a professora assistente de sociologia Olga Mattar também trabalhou de abril

a   maio   o   conteúdo   das   encíclicas   católicas  Rerum   Novarum,   Quadragésimo   ano  e  Divini

62Fonte: Anexo nº IV, Matéria lecionada nas várias cadeiras durante o ano letivo. Arquivo do Setor de Educação da UFPR, caixa 385

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Redemptóris  em sala de aula. Em 1956, a professora voltaria a discutir as mesmas  encíclicas na

cadeira de sociologia, dessa vez junto ao tópico de sociologia econômica. Em entrevista a Gabriel

Oganauskas, Mattar afirmou que “recebia orientações do diretor da Faculdade, Homero de Barros

(membro   do   CEB),   para   trabalhar   estas   encíclicas   em   sala”63  (2006.   p.   69).   Acerca   disso,

compreendemos:

no debate estabelecido no meio católico, vemos a formação de um modo de pensar querecusava o laicismo. Diante dos postulados desse pensamento a postura da Igreja era dupla:indicar os meios para superá­lo e lembrar que as calamidades são frutos da desobediênciaoriunda do desrespeito pela moral católica. Essa maneira de compreender a realidade estavapresente nas encíclicas, nas cartas pastorais do episcopado brasileiro e nos pronunciamentosda intelectualidade católica. Isso confirmava que o projeto da elite intelectual atendia a duastarefas: primeiro, formar um grupo convicto de suas idéias; segundo, chamar a atenção parao   perigo   da   laicização   do   mundo   moderno   e   cooptar   novos   jovens   para   divulgar   ocatolicismo (CAMPOS, 2006, p. 128).

É nessa direção que percebemos, pois, o debate das encíclicas em sala de aula. Pois

tendo em vista o projeto neotomista da FFCLPR e o progressivo domínio de intelectuais católicos

sob a instituição, ministrar aulas de sociologia cujo conteúdo eram documentos da Santa Sé parece

estar de acordo com a proposta mais ampla de construir, por meio da FFCLPR, uma modernidade

de fé  e moral católica.  Na compreensão de Simone Meucci (2000, p. 71), a sociologia integral

articulava, pois, ciência, filosofia e política. Era científica na medida que se fundamentava em uma

análise histórica e parcial;  filosófica,  pois formada por especulações; e política por buscar pela

aplicação   concreta   de   suas   investigações   e   diagnósticos.   Seu   objetivo   último   era,   portanto,

reestabelecer e impor uma determinada ordem social, coordenada pela moral cristã. 

Nesse sentido, a sociologia integral representou a compatibilidade por excelência da

ciência moderna com os princípios cristãos. A preocupação dos intelectuais católicos da FFCLPR

era tanto compreender a modernidade de Curitiba, quanto orientá­la a um rumo moral e ordenado.

Para tanto, a sociologia integral se apresentava como o instrumento ideal de análise, pois permitia

uma modernização   fundamentada nos  postulados  católicos.  Consideramos,  portanto,  haver  uma

peculiar  relação entre ciência e religião na FFCLPR com vistas,  sobretudo, à  modernização do

estado. No curso de ciências sociais, a particularidade desse pensamento se expressou na integração

de conteúdos católicos, como as encíclicas, em sala de aula. Constituiu­se, pois, um conhecimento

63Contudo, há que se acrescentar que aparentemente as orientações de Homero de Barros eram apenas à Mattar,  vistoque  em nenhuma  das  demais   cadernetas   foi  discutido  exclusivamente  o   conteúdo  das   encíclicas  –  à   exceção  defundamentos sociológicos da educação. Sobre isso, acreditamos que a posição de Mattar enquanto professora mulhernuma   instituição   predominantemente   masculina   e   onde   as   mulheres   foram   interditas   durante   uma   década   foideterminante quanto às intervenções externas em suas disciplinas. Em entrevista à PUC em 2007, Mattar relatou tersofrido preconceito em sala de aula por ser uma docente mulher; tal episódio seria o leitmotiv para a produção de suatese de livre­docência em 1956, em que discutiu o preconceito na vida social (ENTREVISTA…, 2007, p. 2)

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de ciência social que abrangia elementos neotomistas sem, contudo, estar submetido a eles.

89

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essa monografia sistematizou as considerações obtida após dois anos de investigação

acerca   da   fundação   e   funcionamento   do   curso   de   ciências   sociais   da   Faculdade   de   Filosofia,

Ciências e Letras no Paraná  de 1938 a 1960. Para tanto, foram empreendidas investigações nos

arquivos do Setor de Ciências Humanas e Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná

(UFPR), bem como ao acervo do Centro de Estudos Bandeirantes (CEB). Foi também realizada

uma   entrevista   com   um   ex­discente   e,   posteriormente,   docente   do   curso   de   ciências   sociais,

Constantino Comninos.

O curso de ciências sociais foi fundado em 1938, quando da criação da FFCLPR. Sua

constituição   foi  de  afinidade  com Faculdade  Nacional  de  Filosofia,   em  relação  ao  currículo  e

programas  de  disciplinas  de  ciências  sociais.  No entanto,   sua  particularidade  se  expressou nos

elementos neotomista articulados na fundação e manutenção do curso e da FFCLPR. Para tanto, foi

fundamental a participação dos intelectuais do CEB, visto sua influência e projeto modernizador

para o Paraná. Este projeto, por seu turno, foi fundamentado em uma percepção de preservação da

unidade e cultura paranaense, no sentido de salvaguardar sua tradição e história, ao mesmo tempo

que dialogar com a vida moderna; conciliava, pois, tradição e inovação.  

A inauguração de uma área especializada sem corpo docente especializado, teve seu 

quadro docente catedrático lotado por homens de áreas afins às lecionadas e ao recurso à docência

de professores contratados ­ que, em muitos casos, foram os docentes efetivos. Os 11 primeiros

anos do curso marcaram, portanto, uma fase de longa intermitência, pequeno número de alunos e

apenas   cinco   formados.   Também   as   relações   que   se   firmaram   entre   docentes   e   discentes

promoveram o desenvolvimento de áreas de estudo e do curso propriamente dito,  uma vez que

muitos   dos   ex­alunos   tornaram­se   docentes   do   curso   como   assistentes,   contratados   ou   livre­

docentes.

Em relação aos conteúdos e conhecimentos arrolados – analisados sobretudo através

das   cadernetas   de   frequência   das   cadeiras   e   curríclos,   constituiu­se   uma   ciência   social   cujo

conhecimento não expressava uma racionalização da realidade social paranaense, visto que não a

interrogava   com   um   método   por   meio   do   qual   construísse,   à   exceção   da   antropologia,   um

conhecimento analítico sobre a  realidade.  Tal  formulação de conhecimento exprimia,  em nosso

entendimento,   a   afinidade   do   curso   com   o   projeto   de   modernidade   da   FFCLPR,   calcado   na

preservação da unidade cultural curitibana.

90

Assim,   o   curso   de   ciências   sociais   se   constituiu   a   fim   das   ciências   exatas,

especialmente  da  estatística,  e  em diálogo com a  filosofia  e  a  economia,  em que a  última era

entendida  como uma ciência  social.  A antropologia,  dado o projeto  elaborado pelo  catedrático

Loureiro Fernandes,  monopolizou os recursos do curso,  fundando uma forte área de estudos;  a

sociologia, por seu turno, se constituiu de um aglutinado de eixos temáticos, sem formação de um

projeto; e, por fim, as poucas informações sobre a política indicam a pequena projeção dessa dentro

do curso. 

91

REFERÊNCIAS

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do curso de ciências sociais de 1943 a 1959.

97

APÊNDICE 1 – Currículo do curso de Ciências Sociais e Políticas da FFCLPR em 1938

Série Currículo do curso de Ciências Sociais e Políticas da FFCLPR em 1938

1º ANOFilosofia Geral e Psicologia – Padre Jesus Ballarin (CEB)

Sociologia – Omar Gonçalves da Mota

Economia Política e Finanças – Arthur Ferreira Santos (CEB)

2º ANO

Complementos de Matemática – José Bittencourt de Paula 

Economia Política ­ Arthur Ferreira Santos (CEB)

História da Filosofia – Milton Carneiro

Estatística ­ Arthur Martins Franco (CEB)

Sociologia ­ Omar Gonçalves da Mota

3º ANO

Sociologia ­ Omar Gonçalves da Mota

História das Doutrinas Econômicas – Arthur Ferreira Santos (CEB)

Política – Manoel Lacerda Pinto (CEB)

Antropologia e Etnografia64 – José Loureiro Fernandes (CEB)

Estatística Aplicada­ Arthur Martins Franco (CEB)

Ética – Docente não identificadoFonte: Anexo nº XV, Históricos escolares completos de todos os alunos matriculados em 1941 no curso de Didática.Arquivo do Setor de Educação da UFPR, Caixa 385.

APÊNDICE 2–  Números anuais do concurso de habilitação da FFCLPR aos cursos de ciências sociais ehistória e geografia,  de 1950 a 1959.  E números anuais de diplomação nos cursos de ciências sociais ehistória e geografia na FFCLPR, de 1950 a 1959.

Ano

Números anuais doconcurso de habilitação da

FFCLPR 

Números anuais de diplomações em ciências sociais ehistória e geografia pela FFCLPR

CiênciasSociais

História eGeografia

Bachareisem Ciências

Sociais

Licenciadosem Ciências

Sociais

Bachareisem Históriae Geografia

Licenciadosem Históriae Geografia

1950 4 61 0 0 18 17

1951 8 80 0 0 18 19

1952 13 76 2 1 19 15

1953 10 69 0 1 31 Indisponível

1954 16 46 6 2 17 24

1955 14 51 1 3 8 24

64Ainda que a cátedra tenha, em 1938, sido fundada como Etnografia e Noções Tupi­Guarani, no ano seguinte, após a promulgação da lei nº 1190/39 e da alteração do corpo docente da FFCLPR, a cátedra foi alterada para Antropologia e Etnografia, nunca tendo, pois, funcionado com o nome de Etnografia e Noções Tupi­Guarani. 

98

1956 26 61 2 2 9 10

1957 22 50 3 2 20 7

1958 32 51 6 2 12 16

1959 48 110 5 5 7 13

TOTAL 193 655 25 18 159 145Fonte: anuários da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná de 1940/1941; Anuários da Universidade doParaná de 1946 a 1949; e anuários da Universidade Federal do Paraná de 1950 a 1959. Disponíveis em biblioteca dosetor de ciências humanas da UFPR.

APÊNDICE 3 ­  Docentes de Ciências Sociais da FFCLPR entre 1950 e 1959

1950: Docentes­Livres: Zélia Pavão, estatística educacional;

Interinos: Arthur Santos De Almeida, economia política e história das doutrinas econômicas;

Contratados: Frei Otmar Zuck, introdução à filosofia; Frei Vittal Paffo, introdução à filosofia;

Instrutores:  Eny de Camargo Maranhão, antropologia;  Olga Mattar, sociologia;  Máximo Pinheiro

Lima, antropologia e etnografia;

1951: Docentes­Livres: Zélia Pavão, estatística educacional;

Interinos: Arthur Santos De Almeida, economia política e história das doutrinas econômicas; Cirilo

Zacchi, história da América;  Euclides Mesquita, sociologia;  Padre Edmundo Dreher,  introdução à

filosofia; 

Assistentes   do   quadro   extraordinário:  Máximo   Pinheiro   Lima,   antropologia;  Saluá   Elias,

etnografia do brasil; Padre Luigi Castagnola, introdução à filosofia e história da filosofia;

Instrutores: Olga Mattar, sociologia;

1952: Docentes­Livres: Zélia Pavão, estatística educacional;

Interinos:   Arthur  Santos  de  Almeida,   economia  política  e  história  das  doutrinas     econômicas;

Euclides Mesquita, sociologia; 

Contratados: Padre Edmundo Dreher, introdução à filosofia; João Remy Freira, estatística geral e

aplicada; 

Instrutores: Olga Mattar, sociologia; Máximo Pinheiro Lima, antropologia; Zélia Pavão, estatística

geral e aplicada; 

1953: Docentes­Livres: Zélia Pavão, estatística educacional;

Interinos:  Arthur Santos de Almeida, economia política e história das doutrinas 

 econômicas; Euclides Mesquita, sociologia; 

Contratados: Padre Edmundo Dreher, introdução à filosofia; João Remy Freira, estatística geral e

aplicada; 

Instrutores: Olga Mattar, sociologia; Máximo Pinheiro Lima, antropologia; 

99

1954: Docentes­Livres: Zélia Pavão, estatística educacional;

Interinos:    Arthur  Santos  de  Almeida,   economia  política   e  história   das  doutrinas     econômicas;

Euclides Mesquita, sociologia; 

Contratados:  Fernando   Altenfelder   Silva,   antropologia   e   etnografia;  Padre   Edmundo   Dreher,

introdução à   filosofia;  João Remy Freira,  estatística  geral  e  aplicada;  Ubaldo Puppi,  história  da

filosofia e ética;

Instrutores:  Olga   Mattar,  sociologia;  Máximo   Pinheiro   Lima,  antropologia;  Valderez   Peixoto

Mueller, etnografia;

1955: Docentes­Livres: Zélia Pavão, estatística educacional;

Interinos:    Arthur   Santos   de   Almeida,   economia   política   e   história   das   doutrinas   econômicas;

Euclides Mesquita, sociologia; 

Contratados:  Fernando   Altenfelder   Silva,   antropologia   e   etnografia;  Padre   Edmundo   Dreher,

introdução à   filosofia;  João Remy Freira,  estatística  geral  e  aplicada;  Ubaldo Puppi,  história  da

filosofia;

Instrutores:  Olga   Mattar,  sociologia;  Máximo   Pinheiro   Lima,   antropologia;  Valderez   Peixoto

Mueller, etnografia;

1956: Docentes­Livres: Zélia Pavão, estatística educacional;

Interinos:   Arthur  Santos  de  Almeida,  economia  política  e  história  das  doutrinas     econômicas;

Euclides Mesquita, sociologia; 

Contratados: Padre Edmundo Dreher, introdução à filosofia; Ubaldo Puppi, história da filosofia;

Instrutores:  Olga   Mattar,  sociologia;  Máximo   Pinheiro   Lima,  antropologia;  Valderez   Peixoto

Mueller, etnografia;

1957: Docentes­Livres: Zélia Pavão, estatística educacional;

Interinos:   Arthur  Santos  de  Almeida,   economia  política  e  história  das  doutrinas     econômicas;

Euclides Mesquita, sociologia; 

Contratados: Padre Edmundo Dreher, introdução à filosofia; Ubaldo Puppi, história da filosofia;

Instrutores:  Olga   Mattar,  sociologia;  Máximo   Pinheiro   Lima,  antropologia;  Valderez   Peixoto

Mueller, etnografia;

1958/59: Docentes­Livres: Zélia Pavão, estatística educacional;

Interinos:   Arthur  Santos  de  Almeida,   economia  política  e  história  das  doutrinas     econômicas;

Euclides Mesquita, sociologia; Zélia Pavão, estatística geral e aplicada;

Contratados: Padre Edmundo Dreher, introdução à filosofia; José Virgílio Castelo Branco Rocha,

ética; Ubaldo Puppi, história da filosofia;

Instrutores:  Olga  Mattar,  sociologia;  Máximo   Pinheiro  Lima,   antropologia;    Eny  de   Camargo

100

Maranhão, antropologia;Fonte: anuários da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná de 1940/1941; Anuários da Universidade doParaná de 1946 a 1949; e anuários da Universidade Federal do Paraná de 1950 a 1959. Disponíveis em biblioteca dosetor de ciências humanas da UFPR.

APÊNDICE 4 ­ Currículos do curso de Ciências Sociais  da FFCLPR em 1938 e 1940

 Currículos do curso de Ciências Sociais da FFCLPR em 1938 e 1940

Série 1938 1940

1º ANO

Filosofia Geral e Psicologia  Complementos de Matemática 

Sociologia  Sociologia 

Economia Política e Finanças  Economia Política

História da Filosofia

2º ANO

Complementos da Matemática Estatística Geral e Metodológica

História da Filosofia Sociologia

Estatística Economia Política

Sociologia  Ética

3º ANO

Sociologia Sociologia

História das Doutrinas Econômicas História das Doutrinas Econômicas

Política  Política

Antropologia e Etnografia Antropologia e Etnografia

Estatística AplicadaEstatística AplicadaÉtica 

Fontes: Anexo nº XV, Históricos escolares completos de todos os alunos matriculados em 1941 no curso de Didática.Arquivo   do   Setor   de   Educação   da   UFPR,   Caixa   385;   TOMAZZI,   Nelson.   Considerações   Preliminares   sobre   ainstitucionalização da Sociologia no Paraná, 1938­1963. IN OLIVEIRA, Márcio (org), As Ciências Sociais no Paraná.Curitiba:  Pretexto,  2006, p.  85­109; e Cadernetas de frequência e materia lecionadas do curso de ciências sociais,disponíveis em Arquivo do Setor de Ciências Humanas da UFPR.

APÊNDICE 5- Disciplinas do curso de ciências sociais da FNFi e da FFCLPR em 1940

Disciplinas do curso de ciências sociais da FNFi e da FFCLPR em 1940

Série FNFi FFCLPR

Complementos de matemática Complementos de Matemática

Sociologia Sociologia

Economia Política Economia Política

História da Filosofia História da Filosofia

Estatística Geral Estatística Geral e Metodológica

Sociologia  Sociologia

Economia Política Economia Política

Ética Ética

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Sociologia Sociologia

História das Doutrinas Econômicas História das Doutrinas Econômicas

Política Política

Antropologia e Etnografia  Antropologia e Etnografia

Estatística Aplicada Estatística AplicadaFontes: Anexo nº XV, Históricos escolares completos de todos os alunos matriculados em 1941 no curso de Didática.Arquivo   do   Setor   de   Educação   da   UFPR,   Caixa   385;   TOMAZZI,   Nelson.   Considerações   Preliminares   sobre   ainstitucionalização da Sociologia no Paraná, 1938­1963. IN OLIVEIRA, Márcio (org), As Ciências Sociais no Paraná.Curitiba:  Pretexto,  2006,  p.   85­109;  Cadernetas  de   frequência   e  materia   lecionadas  do  curso  de   ciências   sociais,disponíveis em Arquivo do Setor de Ciências Humanas da UFPR; e FÁVERO, Maria de Lourdes Albuquerque. AFaculdade Nacional de Filosofia, começando a desenrolar um novelo. Rio de Janeiro: editora UFRJ, 1989, p. 70.