(375892887) telefonica brasilera.docx

42
C C C APACIDADE S TECNOLÓGICA S E ESTRATÉGI A EMPRESARIA L : EVIDÊNCIAS EM NÍVEL DE EMPRESA D A INDÚSTRIA DE TELEFONIA FIXA NO B RASIL 1 TECHNOLOGICAL CAPABILITY AND CORPORATE STRATEGY: FIRM-LEVEL EVIDENCE FROM THE PUBLIC SWITCHED TELEPHONY INDUSTRY IN BRAZIL MARIA F A TIMA BELLINGHINI Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (EBAPE/FGV). Praia de Botafogo, 190, sala 510 – Botafogo, Rio de Janeiro RJ – CEP 22250-900 E-mail: [email protected] P A U L O N. FIGUEIREDO Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (EBAPE/FGV). Praia de Botafogo, 190, sala 510 – Botafogo, Rio de Janeiro RJ – CEP 22250-900 E-mail: pnf@fgv.br 1. A versão original deste artigo foi apresentada no XXVIII Encontro Anual da ANPAD – área Estratégia em

Upload: oscar-sanchez-fernandez

Post on 16-Sep-2015

218 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

CC APACIDADES TECNOLGICAS E ESTRATGIA EMPRESARIAL:

EVIDNCIAS EM NVEL DE EMPRESA D A INDSTRIA DE TELEFONIA FIXA NO BRASIL1

TECHNOLOGICAL CAPABILITY AND CORPORATE STRATEGY: FIRM-LEVEL EVIDENCE FROM THE PUBLIC SWITCHED TELEPHONY INDUSTRY IN BRAZIL

MARIA F A TIMA BELLINGHINI Escola Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas da Fundao Getulio Vargas (EBAPE/FGV).Praia de Botafogo, 190, sala 510 Botafogo, Rio de Janeiro RJ CEP 22250-900E-mail: [email protected]

P AULO N. FIGUEIREDO Escola Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas da Fundao Getulio Vargas (EBAPE/FGV).Praia de Botafogo, 190, sala 510 Botafogo, Rio de Janeiro RJ CEP 22250-900E-mail: [email protected]

1. A verso original deste artigo foi apresentada no XXVIII Encontro Anual da ANPAD rea Estratgia em Organizaes realizado em Curitiba, PR, de 25 a 29 de setembro 2004. Os autores gostariam de agradecer aos gerentes, engenheiros e diretores da Telemar Norte Leste, bem como aos especialistas da indstria que contriburam para a materializao deste estudo. Os autores tam- bm agradecem profundamente a dois avaliadores annimos pelas crticas e comentrios valiosos.

RESUMO Estudos sobre estratgia empresarial, em especial os desenvolvidos a partir dos anos 1990, tm dado especial nfase aos aspectos de capacidades tecnolgicas e inovao como fontes de vantagens competitivas. Essa abordagem, no entanto, ain- da escassa na literatura, em especial nos pases localizados em economias em desenvolvimento. luz de modelos desenvolvidos na literatura internacional, este trabalho apresenta evidncias empricas de estratgia empresarial, com base no de- senvolvimento de capacidades tecnolgicas para garantir vantagem competitiva. E est baseado numa pesquisa realizada em uma empresa prestadora de servios de telefonia fixa no Brasil: a Telemar Norte Leste, no perodo ps-privatizao, entre1998 e 2002. Esforos deliberados da empresa, para uma consistente acumulao tecnolgica interna, tiveram um papel crucial no incremento da sua performance competitiva. Portanto, a abordagem para estratgia empresarial baseada em capaci- dades tecnolgicas contribui para explicar, em grande parte, o aprimoramento da performance da empresa.

P ALA VRAS-CHA VE Capacidade tecnolgica; Estratgia empresarial; Performance corporativa; Telefonia fixa; Pases em desenvolvimento.

40 ABSTRACT Studies on corporate strategy, more specifically those developed from thw1990s, emphasize the importance of technological capability and innovation as- pects as competitive advantage sources. Empirical studies on this issue are still scarce in the literature, especially in late-industrializing countries. Drawing on available frameworks in the international literature the aim of this paper is to present empirical evidence of corporate strategies based on the development of

technological capability. To elaborate the current work, a fieldwork was carried out in Telemar Norte Leste, a big telecommunications operator in Brazil. The study covers 1998-2005 just after the privatization of telecommunications services in Brazil. Telemar put a lot of effort on the accumulation of technological capability. The evidence suggests that this had positives implications for its competitive per- formance. The study suggest that a corporate strategy supported by a technologi- cal capability building a approach certainly contributes to improving corporate per- formance corporate performance indicators.

KEYWORDS Technological capability; Corporate strategy; Corporate performance; Public switched telephony network; Late-industrializing countries.

1 INTRODUO E ANTECEDENTES NA LITERA TURA

A literatura gerencial apresenta diferentes perspectivas para interpretarmos e examinarmos a maneira como empresas desenham e implementam as suas estratgias empresariais no intuito de aprimorar sua performance competitiva. A estratgia empresarial seria concebida como um design racional, em um cui- dadoso projeto criado pelos sistemas de planejamento da empresa, anterior s aes e aos eventos (ANSOFF, 1965, 1985; STEINER, 1969; SIMONS, 1995). Tal abordagem influenciou aes empresariais, particularmente por meio da criao de unidades dedicadas ao planejamento, que eram responsveis pela for- mulao da estratgia das empresas, dentro de um ciclo definido de atividades, de maneira normalmente dissociada do restante da organizao. Essa aborda- gem foi criticada em funo de seu carter esttico e limitado, crtica essa que emergiu de autores alinhados perspectiva de estratgia empresarial como um processo emergente nas organizaes: as estratgias emergem como respostase adaptaes a condicionantes internos e externos, crises, erros e aprendizado 41da empresa (RUMELT, 1974, 1984; MINTZBERG, 1996; GOOLD, 1996; e v- rios outros).

REVISTA DE ADMINISTRAO MACKENZIE Volume 7, n. 2, p. 39-60 A estratgia empresarial tambm tem sido estudada pela perspectiva de posicionamento competitivo. Essa linha de pensamento emergiu nos estudos sobre competitividade industrial, implementados no mbito do Boston Consul- ting Group (BCG) e outras empresas de consultoria, como McKinsey e Arthur

D. Little. Essa abordagem dominou o ensino e a prtica da gesto empresarial, em meados dos anos 1970 a meados dos anos 1980. Estratgia empresarial estaria associada a escolhas predeterminadas pela empresa, ao exame da com- petio a partir da perspectiva interempresarial, ao alto grau de abstrao e an- lise e forte nfase em conceitos microeconmicos baseados na curva de expe- rincia.Porter (1995), a partir dos seus pioneiros estudos sobre vantagens compe- titivas de setores industriais e de naes, argumentava que a estratgia da em- presa deveria enfatizar o seu posicionamento perante certas foras especfi- cas. Um dos mritos dessa abordagem o desenvolvimento de um sistemtico exame das foras competitivas que influenciam a empresa. Mostra tambm que as atividades tecnolgicas de uma empresa devem ser avaliadas em um contexto de rivalidade competitiva: firmas devem buscar, via inovao, uma capacidade que seja difcil de imitar. Reconhece que a inovao pode modifi- car as condies competitivas por meio de produtos substitutos e mudanas nas barreiras de entrada. Porm, essa abordagem ignora o papel dos recursos intra-empresariais capacidades inovadoras internas como varivel-chave para explicar a performance competitiva de empresas. Ou seja: tais questes no so formalmente examinadas nos estudos implementados luz dessa abordagem.As limitaes contidas nessas abordagens contriburam para a emergncia de abordagens para estratgia baseadas em capacidades (ou competncias), principal- mente tecnolgicas, internas da firma. Com razes intelectuais na perspectiva da estratgia baseada em recursos ou base de conhecimento da empresa (PENRO- SE, 1959), a perspectiva baseada em capacidades dinmicas foi intensamente dis- seminada na literatura internacional de estratgia empresarial a partir do incio dos anos 1990 (PRAHALAD; HAMEL, 1990; TEECE; PISANO, 1994; PAVITT,1990, 1998; LEONARD-BARTON, 1995, 1998; PAVITT; STEINMULLER, 2001). Tal abordagem considera as capacidades internas da empresa ou sua base de conhecimento ou ativo cognitivo a principal fonte de vantagem competitiva. Es-42 sas capacidades esto refletidas nos processos e na organizao da produo de bens e servios, nos produtos, nos procedimentos e rotinas organizacionais da empresa, bem como em suas prticas gerenciais (BELL; PAVITT, 1993; FIGUEI- REDO, 2001). Refletem-se ainda em seus valores, normas e crenas (LEONARD- BARTON, 1995, 1998). Por serem intrnsecas a uma empresa, tais capacidades dificilmente so compradas ou transferidas automaticamente de uma empresa para outra ou simplesmente copiadas. Adicionalmente, tais capacidades condicio-

nam as escolhas estratgicas da empresa em termos de atividades tecnolgicas(DOSI, 1988; PAVITT, 1991).H, no entanto, que se fazer uma distino entre dois tipos fundamentais de capacidades tecnolgicas. Capacidades para usar certa tecnologia e para rea- lizar atividades tecnolgicas inovadoras capacidades para inovar tecnologica- mente. Mais especificamente, Bell e Pavitt (1993, 1995) classificam as capaci- dades em capacidades de rotina aquelas consideradas necessrias para uma empresa estar habilitada a executar atividades e operar em sua indstria com padres bsicos de eficincia e capacidades inovadoras classificadas como as capacidades para aprimorar e criar processos, servios e produtos. Estas distinguem as empresas e contribuem para aprimorar e fortalecer a sua performance competitiva. E podem ser acumuladas de maneiras distintas, for- mas e velocidades diferentes tanto entre empresas do mesmo setor industrial como tambm dentro da empresa (FIGUEIREDO, 2001; TACLA; FIGUEIRE- DO, 2003).Essa perspectiva influenciou a emergncia de estudos sobre as implicaes das capacidades tecnolgicas para o aprimoramento da performance tcnica e econmica de empresas de pases em desenvolvimento ou de industrializao tardia j nos anos 1960 (HOLLANDER, 1965). A partir do incio dos anos1990, novos estudos emergiram para examinar essas duas questes em empre- sas de maneira compreensiva, ou seja, com forte nfase na dimenso organiza- cional da capacidade tecnolgica (TREMBLAY, 1994) e para explicar diferenas entre empresas do mesmo setor industrial (FIGUEIREDO, 2001). No Brasil, es- tudos recentes tm examinado essa relao na indstria de mveis (BEN, 2001) e na indstria de telefonia mvel (CAVALCANTI, 2001). Porm, so necess- rios mais estudos sobre essas questes de forma a avaliar a real importncia das capacidades tecnolgicas para a estratgia empresarial e para o fortalecimento da performance competitiva.Este artigo examina o papel das capacidades no aprimoramento da perfor- mance competitiva em nvel de empresa, na indstria de telefonia fixa, com ba-se em um estudo de caso individual. Especificamente, o estudo examina a em- 43presa Telemar Norte Leste, criada em 1998. O artigo est estruturado como segue. A seo 2 apresenta a mtrica para exame de capacidades tecnolgicas na indstria de telecomunicaes fixas. O desenho e o mtodo do estudo subjacen- te a este artigo so apresentados na seo 3. As sees 4 e 5 apresentam as evi- dncias empricas do estudo, ou seja, as capacidades tecnolgicas e a evoluo de indicadores de performance corporativa, respectivamente. Finalmente, a se-

o 6 discute as concluses do estudo. Vale ressaltar, no entanto, que o foco deste artigo centra-se to-somente na estratgia de acmulo de capacidades tec- nolgicas na empresa examinada e suas possveis implicaes para performan- ce corporativa. As fontes para a construo de capacidades tecnolgicas ou seja, os processos subjacentes de aprendizagem no so examinados aqui. Adicionalmente, fatores externos, como estrutura da indstria e condies macroeconmicas, esto alm do escopo deste trabalho.

2 MTRICA P ARA EXAME DAS CAP ACIDADES TECNOLGICAS

As capacidades na empresa estudada so examinadas aqui luz do modelo proposto por Figueiredo (2001), adaptado de Bell; Pavitt (1995) e Lall (1992)2. O modelo adaptado para a indstria de telecomunicao fixa apresentado no Quadro 1, no qual observa-se que a acumulao de capacidades pode variar de nveis bsicos (capacidades rotineiras), at nveis de elevado grau de complexi- dade (capacidades inovadoras de bsicas a avanadas). A primeira coluna mos- tra os nveis de capacidade e as demais mostram as funes tecnolgicas estu- dadas. As capacidades tecnolgicas so medidas e expressas pelas atividades que a empresa capaz de fazer de maneira independente. As atividades que expres- sam os tipos e nveis de capacidade tecnolgica esto contidas nas clulas do Quadro 1. As principais atividades de empresas prestadoras de servios de tele- comunicaes fixas envolvem capacidade de introduzir alteraes nos processos operacionais e comerciais, que possibilitam acompanhar a evoluo tecnolgica dos equipamentos e sistemas desenvolvidos pela indstria. Por isso, essa mtri- ca define a seguinte formao:

1para a funo de desenvolvimento de processos comerciais, produtos e ser- vios nveis 1 e 2 para as atividades de rotina e 3 a 7 para as atividades ino-44 vadoras;2 para a funo desenvolvimento de sistemas de telecomunicaes e proces-sos operacionais nveis de 1 a 3 para as atividades de rotina e de 4 a 7 para inovadoras.

2. Sobre os detalhes de adaptao e validao da mtrica indstria de telefonia fixa ver Bellinghini(2003).

CAPACIDADES TECNOLGICAS E ESTRATGIA EMPRESARIAL MARIA FATIMA BELLINGHINI PAULO N. FIGUEIREDO

QUADRO 1

InovadorasNVEIS PROCESSOS COMERCIAIS, PRODUTOS E SERVIOS PROCESSO DE IMPLANTAO E OPERAO DAS REDESRotina1. Bsico Oferta de servios de transporte e telefonia (voz pblica local e longa dis- Especificao, desenho e implantao dos sistemas e suporte para ope- tncia). Padres e polticas comerciais desenvolvidos dentro de padres rao e manuteno de redes, nos padres de qualidade requeridos pe- estabelecidos por outros prestadores de servios. los rgos reguladores de cada pas, realizado pelos fabricantes, comsuporte de empresas de engenharia, que realizam os projetos.2. Renovado Ofertas de servios de valor agregado e de dados, baseados nas tradi- Especificao de redes determinstica e estatstica de dados com su- cionais redes de transporte, implantados a partir de padres e polticas porte de fabricante. Operao com equipe prpria e suporte dos fabri- comerciais desenvolvidas por outros prestadores de servios e implan- cantes, responsveis pelo treinamento.tados com suporte de fabricantes.3. Extrabsico Oferta de servios internacionais e de acesso internet, dial up e banda Especificao e implantao de redes de transmisso e redes de servios larga, comunicao de dados com protocolo IP e de rede inteligente. multisservio, rede inteligente de voz realizada por equipe prpria. Su- Processos de comercializao seguem padres internacionais, sendo im- porte de fabricantes para treinamento e manuteno de redes. plantados com equipe tcnica prpria, customizados por cliente e seg- Operao e superviso com equipe prpria, com processos implanta- mento de mercado. dos segundo prticas internacionais.Inovadoras4. Pr-intermedirio Oferta de servios de segurana e gerenciamento de servios. Integrao Operao e gesto integradas do sistema de telecomunicaes e das re- de solues com diferentes tecnologias. Acordos de trnsito para chama- des de servios, por meio de equipes prprias que dominam a tecnologia. das de longa distncia e de interconexo entre redes especializadas de da- Oferta de nveis diferenciados de qualidade e desempenho de servi- dos com operadores internacionais. Oferta de bundles de servios de voz. os (implantao, manuteno e disponibilidade).5. Intermedirio O campo do mercado empresarial caracteriza a oferta de solues que Gesto de redes e solues proprietrias de clientes. Definio de avanam no campo da aplicao do cliente, tendo que, para isso, desen- processos de diferenciao de nveis de qualidade de servios espec- volver especializaes nos campos de hospedagem de aplicativos e out- ficos para cada cliente. Operao de acesso em banda larga.sourcing de redes. Integrao de solues com diferentes tecnologias decomunicao fixa e mvel. Suporte na implantao de sistemas ERP, CRM, mercado residencial, pela oferta plena de servios avanados.45CAPACIDADES TECNOLGICAS EM EMPRESAS DE SERVIOS DE TELECOMUNICAES FIXAS MODELO DESCRITIVO

continua

46 REVISTA DE ADMINISTRAO MACKENZIE Volume 7, n. 2, p. 39-60

QUADRO 1 (CONTINUAO )

InovadorasNVEIS PROCESSOS COMERCIAIS, PRODUTOS E SERVIOS PROCESSO DE IMPLANTAO E OPERAO DAS REDESROTINAInovadoras6. Intermedirio Define a capacidade de desenvolver produtos customizados ao longo da Implantao de sistemas de clientes, gerenciando padres de SLA Superiorcadeia de valor, incluindo e-business, integrao total de tecnologias no (Service Level Agreement) especficos. Relatrio de desempenho decampo das aplicaes pessoais e empresariais. rede de clientes, garantindo nveis contratados.7. Avanado Desenvolvimento de solues inditas, por equipe prpria e em parceria Desenho e especificao de sistemas com tecnologias emergentes. estratgica com integradores e fornecedores de equipamentos e sis- Implantao de novos sistemas em parceria estratgica com inte- temas de telecomunicaes, no campo da aplicao do cliente, utilizan- gradores e fornecedores.do para isso tecnologias de telecomunicaes de nova gerao.CAPACIDADES TECNOLGICAS EM EMPRESAS DE SERVIOS DE TELECOMUNICAES FIXAS MODELO DESCRITIVO

Fonte: Adaptada de Figueiredo (2001) e Cavalcanti (2001). Derivada do estudo.

3 DESENHO E MTODOS DE ESTUDO

O estudo de caso subjacente a este artigo baseia-se em evidncias empricas de primeira mo, qualitativas e quantitativas, coletadas base de diferentes tcni- cas (YIN, 2002; FIGUEIREDO, 2004): entrevistas; observao direta (por exem- plo, visitas a call center e centros de gerncia de redes); consulta a documentos internos, a registros em arquivos e a publicaes corporativas, alm de encontros fortuitos. As fontes de evidncias qualitativas envolveram executivos e tcnicos das reas de planejamento empresarial, engenharia de sistemas de telecomunicaes e gerncia de redes, desenvolvimento de produtos, servios ao cliente, diretores de negcios e consultores da rea de recursos humanos, especialistas da indstria (externos empresa), relatrios de consultorias, arquivos internos, intranet. Para realizao das entrevistas foi elaborado um roteiro de perguntas. As perguntas foram formuladas de maneira a captar a natureza de sua estratgia empresarial, as diferentes atividades tecnolgicas desenvolvidas pela empresa, bem como suas implicaes para performance. Para mensurar a melhoria dos indicadores de per- formance tcnico-econmica, foram selecionados os indicadores mais relevantes para esta indstria conforme mostrados na seo 5.A anlise dos dados coletados baseou-se na elaborao de quadros descriti- vos e analticos (MILES; HUBERMAN, 1984). Esses dados foram agrupados se- gundo o modelo do Quadro 1. Assim, para cada uma das funes tecnolgicas foram coletadas evidncias para substanciar o alcance, ou no, de cada nvel de capacidade tecnolgica. Os indicadores de performance tcnico-econmica, por se tratarem, em sua maioria, de dados quantitativos, foram organizados em qua- dros e grficos. Isso possibilitou sua interpretao de maneira clara e a identifi- cao de sua possvel associao com as capacidades tecnolgicas.

4 TIPOS E NVEIS DE CAP ACIDADES TECNOLGICAS NA EMPRESA ESTUDADA

A Telemar Norte Leste surgiu em julho de 1998, com a ciso do sistema Te-lebrs, decorrente do seu processo de privatizao. Foram ento formadas trs 47empresas regionais de telefonia fixa: Telesp (Telefnica), Tele Norte Leste (Tele-

REVISTA DE ADMINISTRAO MACKENZIE Volume 7, n. 2, p. 39-60 mar), a Tele Centro Sul (Brasil Telecom) e uma empresa de longa distncia ope- rando em todo o territrio nacional Embratel. O estudo de uma empresa desse setor, portanto, importante no apenas pela relevncia dessa indstria para a economia brasileira, mas tambm para apresentar evidncias sobre as estrat- gias empresariais e capacidade tecnolgica em um contexto privatizado. O anti- go sistema Telebrs, criado na dcada de 1970, conviveu entre 1980-1990 com

uma carncia de recursos, reduo de investimentos e desacelerao no desen- volvimento tecnolgico. Tais fatores acentuaram a necessidade de implantar-se um novo modelo organizacional da indstria, baseado na introduo gradativa da competio e da privatizao. Isso, por sua vez, objetivava a captao de recur- sos privados e externos, para aumentar a oferta de servios por meio da introdu- o de novas tecnologias capazes de apoiar o crescimento do mercado brasilei- ro (WOHLERS; COSSETTI, 1997).A Telemar, formada pela unificao de 16 operadoras de telefonia fixa, tor-nou-se a maior empresa deste setor no Brasil com capital 100% nacional.3 A sua unificao baseou-se em um novo desenho organizacional. Para isso, foi neces- sria uma ampla reviso de processos, sistemas e posicionamento comercial. Ainda por fora dos contratos de concesso, foram definidos nveis obrigatrios de qualidade de servio, significando o desafio de alcanar novos patamares de performance operacional.Durante o ano de 1999, foi implementado na empresa um amplo e sistemti- co processo de treinamento interno e uma reviso de sua estrutura organizacional, visando uma otimizao do trabalho, eliminao de redundncias, especializao de equipes, reviso e uniformizao dos processos e ampliao do conhecimento asso- ciado para todas as suas operadoras. Esse conjunto de aes integrava o Plano de Transformao da empresa. Para implementar essas aes, foi criada, no Rio de Ja- neiro, uma holding para coordenar todo o processo de fuso e o projeto Plano de Transformao. Este plano definiu as etapas a serem percorridas para a total fuso administrativa e societria. Foram identificados 56 processos considerados vitais para a consolidao dessa estratgia. Esses processos visavam a unificao de redes e equiparao entre servios, garantia dos nveis de qualidade contratuais, redefini- o dos processos e poltica comercial. A implementao desses processos de mu- dana implicou uma ruptura com os processos operacionais existentes at ento. A partir da fuso, a empresa empreendeu o primeiro passo para a equiparao das capacidades tecnolgicas disponveis nas empresas mais avanadas.Tais aes permitiram uma atualizao do portfolio de produtos especficos para cada tipo de mercado e o estabelecimento de acordos tcnico-econmicos entre as unidades fundidas. Isso possibilitou maior abrangncia ao sistema de telecomunicaes da empresa e a construo do arcabouo operacional que per- mitiu a ampliao geogrfica e tecnolgica das suas redes e demais atividades.48 luz do modelo do Quadro 1, esse conjunto de atividades implementado na em- presa refletiu o alcance de capacidades em nvel 2 em 1999 e nvel 3 em 2000

3. Foram agrupadas as empresas estaduais de telefonia local fixa dos Estados de Amap, Roraima, Amazonas, Par, Cear, Piau, Maranho, Rio Grande do Norte, Paraba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Minas Gerais, Esprito Santo, Rio de Janeiro, que formaram a holding Tele Norte- Leste S.A, posteriormente denominada Telemar Norte Leste S.A, quando do seu processo de fu- so, realizado em agosto de 2001.

para as duas funes tecnolgicas examinadas aqui: 1. processos comerciais, produtos e servios; e 2. processo de implantao e operaes de redes. O Qua- dro 2 contm evidncias que ilustram e substanciam esses nveis de capaci- dades tecnolgicas alcanados pela empresa de 1998 a 2000. Esse perodo en- volveu uma ampla reestruturao da empresa, cujos focos foram o processo de solidificao das capacidades tecnolgicas internas e a garantia das operaes bsicas com adequado grau de confiabilidade, qualidade e eficincia econmica. Adicionalmente, entrevistas revelaram que tal reestruturao tambm envolvia a construo de uma base tcnico-organizacional para a empresa engajar-se em atividades tecnolgicas mais sofisticadas nos anos seguintes.

QUADRO 2

FUNO CAPACIDADES TECNOLGICASNVEL 3 EXTRABSICODesenvolvimento Elaborao de acordos de interconexo dentro de novas regras de negociao, que pos- de produtos sibilitaram que aspectos comerciais e operacionais fossem estabelecidos de forma a me- e processos lhorar a produtividade tcnico-econmica.comerciaisNovos procedimentos comerciais voltados para atuar de forma diferenciada nos distintos mercados, com aes especficas de marketing, vendas e ps-vendas, dando unicidade ao comercial da empresa.Padronizao de produtos segundo a mesma poltica comercial, ampliando a abrangn- cia geogrfica da oferta.Desenvolvimento de novos produtos e processos comerciais decorrentes para sua implan- tao, baseados nas redes especializadas de dados, no mesmo padro de tecnologia e qualidade j oferecidas pelos concorrentes.Especializao das estruturas de vendas, visando maior captura de market share.Maior conhecimento internalizado decorrente da captura no mercado de especialistas, maior treinamento das equipes e uniformizao e padronizao dos procedimentos tcni- co-operacionais.Desenvolvimento Acordos tcnicos de interconexo desenvolvidos de forma a otimizar o encaminhamento de processos de trfego e utilizao da rede de terceiros, por meio de um melhor planejamento e ope- de implantao rao de trfego.e operao Planejamento, contratao e implantao do backbone nacional e das redes especializa- de redes de das de servios de dados multisservios e inteligente de voz.telecomunicaesPadronizao das plataformas e tecnologias utilizadas, promovendo a melhoria de qua- lidade de servio.Uniformizao e descrio dos novos procedimentos operacionais.Formao de equipes especializadas, pelo remanejamento interno e contratao de es- pecialistas.Terceirizao de atividades voltadas para a logstica de entrega e manuteno dos servios.CAPACIDADES ACUMULADAS EM NVEL 3 PARA AS DUAS FUNES TECNOLGICAS

49

Fonte: Derivado do estudo.

Durante o perodo de 2001-2002 a empresa engajou-se em um novo pro- cesso de reestruturao. Isso tambm envolveu a fuso societria em agosto de2001 e o cumprimento antecipado das metas de universalizao estabelecidas pela Agncia Nacional de Telecomunicaes (ANATEL) no contrato de conces- so. Tais metas representavam uma obrigao condicionante para a empresa atuar em novas reas geogrficas e em novos negcios que viabilizariam a estra- tgia de crescimento da empresa no setor.As evidncias empricas relativas ao perodo 2001-2002 sugerem que, duran- te esse espao de tempo, a empresa moveu-se para a construo de capacidades tecnolgicas do nvel 3 (extrabsico) para o nvel 4 (pr-intermedirio) nas duas funes tecnolgicas. Por exemplo, durante esse perodo, a empresa passou a ofer- tar novas solues que incorporaram novas tecnologias aos seus servios, as quais j eram disponveis em empresas semelhantes que atuam no mercado internacio- nal. Decorrente da introduo da rede multisservios (especializada para a presta- o de servios de telecomunicaes de dados e imagem), passou a ofertar produ- tos baseados em novos protocolos de comunicao, aderentes s aplicaes mais sofisticadas do mercado empresarial. Nas comunicaes pessoais, passou a ofer- tar cestas de servios que possibilitam o acesso a novas facilidades de comunica- o a custos mais vantajosos para o mercado, e tambm a se especializar e domi- nar a tecnologia incorporada aos sistemas de telecomunicaes implantados, alm de coordenar a ampliao geogrfica da rede para todo o territrio nacional e enca- minhamento de trfego internacional.A implantao de servios de acesso em banda larga possibilitou a intro- duo pioneira da tecnologia Assymetrical Digital Subscriber Linec (ADSL) no mercado brasileiro4. Adicionalmente, a estruturao do Centro de Gerncia de Servios permitiu que a empresa oferecesse servios mais diversificados para atender s necessidades de grandes clientes. Tais servios envolviam monito- rao precisa e garantia da qualidade de suas telecomunicaes terceirizadas para a Telemar.O Quadro 3 contm evidncias que ilustram e substanciam esses nveis50 de capacidades tecnolgicas alcanados pela empresa durante o perodo 2001-2002.

4. A tecnologia ADSL permite maior qualidade para as comunicaes pessoais de acesso inter- net. uma tecnologia que utiliza linha telefnica digital (par metlico que chega at a casa de cada usurio, para uso do telefone comum) para trfego de dados em velocidades de at oito megabits por segundo. utilizado pelos provedores de acesso internet em banda larga.

QUADRO 3

FUNO CAPACIDADES TECNOLGICASNVEL 4 PR-INTERMEDIRIODesenvolvimento Elaborao de acordos de interconexo com todas as operadoras para fins de encami- de produtos nhamento de trfego nacional e acordos de encaminhamento de trfego internacional e e processos estabelecimento de ponto de presena no exterior.comerciaisOferta de pacotes de servios dada a capacidade de desenvolvimento de novos produtos, com ofertas de rede de dados com aspectos adicionais de segurana e gerenciamento.Integrao de tecnologias envolvendo a rede fixa e a rede de telefonia celular (solues de acesso sem fio, desenvolvendo produtos inovadores no mercado brasileiro, numa si- nergia entre a rede fixa e mvel celular).Desenvolvimento Acordos tcnicos de interconexo para operao nacional e trfego internacional.de processos Planejamento, contratao e implantao da rede de acesso que possibilitou a antecipa- e implantao e o das metas de universalizao.operao Padronizao das plataformas e tecnologias utilizadas, promovendo a melhoria de qua- de redes de lidade de servio, com gerenciamento nico e integrado de redes.telecomunicaesFormao de equipes especializadas, por meio do remanejamento interno e contratao de especialistas e treinamento tcnico junto a fabricantes.CAPACIDADES ACUMULADAS EM NVEL 4 NAS DUAS FUNES EXAMINADAS

Fonte: Derivado do estudo.

QUADRO 4

FUNO CAPACIDADES TECNOLGICASNVEL 5 INTERMEDIRIODesenvolvimento Oferta de solues empresariais baseadas na gesto de redes de clientes por meio de so- de produtos lues de outsourcing.e processos Oferta de acesso ADSL, incorporando tecnologias de ponta, em banda larga, ao acesso comerciais residencial.Desenvolvimento de solues empresariais especficas em conjunto com parcerias, visan- do a oferta conjugada de aplicativos implantados por integradores, que fazem parte do processo produtivo dos distintos setores econmicos, vinculados s solues de integra- o de redes, propiciada pelos servios de telecomunicaes.Desenvolvimento Incorporao de procedimentos para gerncia de rede de clientes, com domnio das tec- de processos nologias dos terminais de acesso e da rede dos clientes.de implantao Incorporaes de softwares especializados de monitoramento, alarme e rotas de con- e operao tingncia.de redes de Suporte operacional aos clientes e logstica para instalao e reparo para acessos em telecomunicaes banda larga.Integrao com parceiros para suporte em aplicativos do usurio.CAPACIDADES ACUMULADAS EM NVEL 5 PARA AS FUNES EXAMINADAS

51

Fonte: Derivado do estudo.

Durante o incio de 2003 a Telemar engajou-se no mercado de outsourcing total da infra-estrutura de telecomunicaes de seus grandes clientes. Trata-se de uma atividade sofisticada que envolve a transferncia dos ativos de telecomu- nicaes do cliente para o prestador de servios e uma srie de solues para atender a necessidades especficas de clientes. Adicionalmente, a empresa im- plementou outras atividades tecnolgicas, conforme descritas no Quadro 4. De acordo com o modelo do Quadro 1, as evidncias sugerem que ao final de 2003 a Telemar havia acumulado nvel 5 de capacidade tecnolgica nas funes de desenvolvimento de produtos, processos comerciais, implantao e operao de redes de telecomunicaes.

5 EVOLUO DE INDICADORES DE PERFORMANCE TCNICO-ECONMICA NA EMPRESA ESTUDADA

O exame dos indicadores tcnico-ecnomicos da Telemar, selecionados entre os tpicos dessa indstria, foram classificados em trs tipos:

1.qualidade tcnica dos servios: medida pela qualidade do servio de telefonia pblica; tempo de atendimento s solicitaes de instalao, reparo e mu- dana de endereo; tempo de atendimento por meio de call center e pessoal- mente; qualidade na emisso de contas;2. evoluo do negcio quanto ao uso de tecnologias para formao do portf-lio de produtos: medida pela diversidade das tecnologias utilizadas;3.desempenho econmico: medido por nvel de investimentos; crescimento da receita lquida, EBITDA (Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization) e a produtividade da planta.

O exame das evidncias empricas permitiu a identificao de alguns refle- xos das capacidades tecnolgicas ao longo do perodo 1998-2003. Isso, por sua vez, reflete a natureza da estratgia empresarial implementada durante este perodo. A seguir so discutidas algumas dessas evidncias.52

5.1 QU ALID ADE TCNICA DOS SER VIOS

No perodo de 1998-2000, quando a empresa acumulou capacidades de n- vel 3 (extrabsico), marcado pela expanso das redes, dobrando a capacidade de trfego, em termos de quantidade de novos cabos de fibras pticas, instalao das centrais e demais elementos de rede, observou-se uma evoluo positiva nos prin-

cipais indicadores de qualidade tcnica. Durante o perodo 2001-2002, quando alcanou capacidade de nvel 4, a empresa realizou maior monitoramento das redes, com a implantao do centro de gerncia integrado, uma maior capacita- o da equipe tcnica e a reviso dos processos internos, tanto operacionais quanto comerciais. Com a implantao da rede de banda larga, responsvel pelo redimensionamento tcnico das centrais locais, refletido no nvel 5 de capacida- des tecnolgicas, esses indicadores tiveram outro perodo de melhoria significa- tiva. O Quadro 5 apresenta a evoluo medida nos principais indicadores de per- formance tcnica.

QUADRO 5EVOLUO DOS INDICADORES DE QUALIDADE TCNICA DOS SERVIOSINDICADORES META MDIA ANUAL

Taxa de obteno do sinal de discar com tempo mximo de espera de 3 segundos98%ND99,299,699,7Taxa de chamadas locais originadas completadas60% at 200165% em 200257,260,862,065,8Taxa de chamadas de longa distncia nacionais originadas completadas60% at 200165% em 200254,259,060,265,4Numero de solicitaes de reparo por100 (cem) acessos em servio3 at 20012,5 20024,54,53,75,3Nmero de contas com reclamao de erro, em 1.000 (mil) contas emitidas3 at 20012,5 20028,93,02,21,7Taxa de atendimento de solicitaes de reparos de usurios residenciais em at 24 horas95% at 200196% 200283,987,096,589,0Taxa de atendimento de solicitaes de reparos de usurios no residen- ciais em at oito horas95% at 200196% 2002ND89,295,991,7Taxa de atendimento s solicitaes de mudana de endereo de usurios residenciais em at trs dias teis95%ND74,996,199,2Taxa de atendimento s solicitaes de mudana de endereo de usurios no residenciais em at 24 horas95%ND69,594,498,0Taxa de atendimento por telefone ao usurio do Servio Telefnico Fixo em at 10 segundos92% at 200193% 2002ND94,595,997,61999 (%) 2000 (%) 2001 (%) 2002 (%)

53

Fonte: Derivado do estudo.

No Quadro 6 destacam-se os seguintes indicadores: taxa de chamadas lo- cais completadas com sucesso, que passou de 57,2% em 1999 (abaixo do par- metro mnimo de qualidade para esse tipo de servio) para 65,8% em 2002. Isso reflete a racionalizao realizada pela equipe de planejamento de rede envolven- do redimensionamento de trfego e substituio das centrais. A taxa de chama- das de longa distncia completadas com sucesso subiu 11,2 pontos percentuais no mesmo perodo. No perodo em que a empresa acumulou capacidades ino- vadoras em nvel 4, este indicador evoluiu de 60,2% para 65,4% em funo de maior capacidade na gesto de redes de longa distncia, quando foram imple- mentadas as ampliaes da rede nacional de telecomunicaes.A taxa de obteno do sinal de discar em at 3 segundos teve uma melhoria no desempenho da rede como um todo. Esse indicador reflete a qualidade alcan- ada pela rede local, proveniente do maior domnio tecnolgico existente nas equipes de rede e operaes medida que implementavam atividades tecnol- gicas mais sofisticadas.A taxa de atendimento por telefone ao usurio de telefonia fixa, em at 10 segundos, melhorou de maneira consistente: passou de 94,5% (2000) para 97,6% (2002). Aumentou, em mdia, dois pontos percentuais por ano e alcanou um padro de qualidade de atendimento em nvel internacional. Esta atividade, em- bora tambm tenha sido terceirizada, passou a ser executada por uma subsidi- ria da Telemar, que absorveu parte da equipe tcnica da empresa, bem como seu conhecimento. A descrio dos padres realizados pela rea de varejo, respon- svel por esse processo, garantiu os nveis de atendimento acima da meta, refle- tindo o nvel de capacidade tecnolgica alcanado pela empresa.Por fim, como mencionado por engenheiros e gerentes, a melhoria da qua- lidade na emisso de contas reflete os esforos de otimizao realizados nas cen- trais telefnicas. Estas so responsveis por gerar os registros destinados ao fa- turamento das chamadas. Ou seja, as evidncias sugerem que a melhoria deste indicador no teria sido alcanada sem o acmulo de capacidades tecnolgicasinovadoras em nveis 3 e 4.

545.2 EV OLUO DO NEGCIO

Como mostrado no Quadro 6, em 1998, a empresa tinha domnio de sete tipos de tecnologias para prestar seus servios. Em 2000, a partir do desenvol- vimento de capacidades em nvel 3, seus servios passaram a ser prestados base da implementao de 12 tipos diferentes de tecnologia.

QUADRO 6ALGUNS EXEMPLOS DE TECNOLOGIAS INTRODUZIDAS PARA PRESTAO DE NOVOS SERVIOS

TECNOLOGIAS DISPONVEISTECNOLOGIAS ADICIONADASTECNOLOGIAS ADICIONADASEM 1998EM 2000EM 20021. Acesso telefnico digital1. Rede de dados frame relay1. Acesso banda larga2. Circuitos digitais nacionais2. Rede inteligente de voz2. Acesso celular3. Rede de longa distncia3. Rede IP53. Circuitos digitais Internacionaisnacional4. Rede Vsat (Very Small4. Gerncia de redes4. Rede de pacotesAperture Terminal)65. Housing (compartilhamento6. Redes virtuais privativas5. Redes virtuais privativasde infra-estrutura)de vozde dados6. MPLS (Multiprotocol Label7. Servios de valor adicionadoSwitching)77. Outsourcing8. Rede de longa distncia inter-nacional9. Rede frameFonte: Derivado do estudo.5. Rede telefnica local

No fim de 2002, comeou a realizar atividades relativas ao nvel 5 (interme- dirio) de capacidade tecnolgica, passando a utilizar cerca de 20 diferentes tec- nologias de servios de telecomunicaes. Isso contribuiu para a atualizao em seu portfolio de produtos de forma a equiparar-se ao padro de servios dispon- veis em nvel internacional. Adicionalmente, a introduo dessas novas tecnolo- gias, que, por sua vez, reflete sua capacidade absorvedora (expressa pelo seu n- vel de capacidade tecnolgica), possibilitou que a empresa passasse a prestar servios nos mercados de varejo, empresarial e de atacado (formado por outros prestadores de servios).Outro indicador de evoluo do negcio medido pela quantidade de aces- sos instalados, englobando os acessos do tipo telefnico, de dados e de banda larga: medida que a equipe de rede e operao avanou com a implementao de atividades inovadoras, estas foram capazes de planejar, contratar e implantar expanses de redes que possibilitaram aumentar os acessos telefnicos de 8,155

5. Rede especializada de dados responsvel pelo roteamento de pacotes entre dois sistemas que utilizam a famlia de protocolos TCP/IP, desenvolvida e usada na internet. considerado o mais importante dos protocolos em que a internet baseada.6. Sistema cuja abertura das antenas considerada pequena para freqncias de operao, utili- zado em redes de transmisso de dados via satlite.7. um padro de redes IP em que utilizado um rtulo (label) para o encaminhamento dos pacotes.

milhes (1998) para 10,5 milhes (2000), quando alcanou capacidades tecno- lgicas em nvel 3. Este nvel de capacidade possibilitou ainda que a empresa elaborasse um planejamento do crescimento da rede, contratando os investi- mentos necessrios para acumular at 2002 a instalao de aproximadamente oito milhes de novos terminais. Este projeto, que envolveu equipes de planeja- mento da evoluo da rede e de logstica de compra e instalaes, representou a maior operao j realizada no Brasil neste setor. Em paralelo, houve a instala- o de mais de 13 mil acessos banda larga, o que envolveu controle de atividades tcnicas e comerciais. A implementao dessas atividades, pela prpria empre- sa, no teria sido possvel sem que a empresa estivesse apta a realizar atividades tecnolgicas em nveis 4 e 5 conforme expresso no modelo do Quadro 1.

5.3 DESEMPENHO ECONMICO D A EMPRESA EM ESTUDO

Indicadores econmicos como EBITDA e produtividade da planta instalada cresceram, em mdia, 26% a.a., durante o perodo 1999-2002. O resultado de evoluo do EBITDA se deu a taxas de crescimento maiores do que o de vendas. Durante o perodo no qual a empresa evoluiu do nvel 2 para o nvel 3 de capa- cidade tecnolgica, este indicador cresceu em mdia 28% a.a. Contriburam pa- ra esse resultado as constantes reorganizaes das reas de negcios e de rede que, ao otimizarem e padronizarem seus processos, eliminaram redundncias e nveis gerenciais e introduziram um estilo de gesto baseado em controle dos resultados e reduo de custos operacionais.O indicador de produtividade, medido pela receita por terminal instalado, re- fletiu a maior eficincia operacional da empresa na instalao de terminais gera- dores de trfego e comerciais. Isto, por sua vez, decorreu das aes da rea de varejo que desenvolveram pacotes de servios e incentivo ao aumento do valor da conta mdia, o que refletiu o acmulo de capacidade tecnolgica em nvel 3 (1998 2000). O volume de investimentos realizados no perodo 1998-2002 alcanou cerca de R$ 20 bilhes maior volume de investimentos realizados at ento no Brasil neste setor. A magnitude e a complexidade no planejamento desses inves- timentos, com forte interao com a indstria e empresas de engenharia para a sua execuo, refletem sua capacidade para implementar, de maneira indepen-56 dente, atividades tecnolgicas relativamente complexas.

6 DISCUSSES, CONCLUSES E RECOMENDAES

Este trabalho contribui para o entendimento do papel das capacidades tec- nolgicas na estratgia empresarial. Mais especificamente, o trabalho buscou

examinar a implementao de uma estratgia voltada para o aprimoramento de performance competitiva pela perspectiva da abordagem das capacidades tecno- lgicas. As evidncias da empresa aqui examinada sugerem que a abordagem para estratgia empresarial baseada em capacidades tecnolgicas contribui para explicar, em grande parte, o aprimoramento da performance da empresa. Ou se- ja, o aprimoramento dos vrios indicadores de performance e sua capacidade de gerar recursos prprios para grandes investimentos certamente no dependeu apenas de posicionar-se adequadamente a certas foras do ambiente da inds- tria (abordagem de posicionamento).Os esforos intra-empresariais para a construo de recursos internos e es- pecficos firma (capacidade tecnolgica) certamente foram decisivos para ga- rantir a melhoria dos vrios indicadores operacionais e, por conseguinte, a sua competitividade.Sem dvida outros fatores externos empresa devem ter influenciado a me- lhoria dos indicadores de performance tcnico-econmica na Telemar, como: a estrutura da indstria tanto em nvel de Brasil como em nvel internacional e as condies de demanda e de investimentos no mercado interno. Porm, as evi- dncias tambm sugerem que se os nveis de capacidade tecnolgica da empre- sa no tivessem sido aprofundados, muito provavelmente a empresa no teria obtido a melhoria nos indicadores de performance tcnico-econmica mencio- nados aqui.Adicionalmente, alinhando-se a estudos anteriores (FIGUEIREDO, 2001; TACLA; FIGUEIREDO, 2003), este estudo sugere que a acumulao de capaci- dades tecnolgicas em uma funo tecnolgica influenciada pela forma como outras funes so acumuladas ao longo do tempo. A Telemar Norte Leste no teria acumulado capacidades no nvel intermedirio em produtos se no tivesse acumulado capacidades em operaes de sistemas de telecomunicaes.Os resultados alinham-se s concluses de trabalhos anteriores a respeito da importncia estratgica da acumulao de capacidades tecnolgicas para em- presas que operaram em pases em desenvolvimento (PENROSE, 1959; TEECE; PISANO, 1994; DUTRNIT, 2000; FIGUEIREDO, 2001, 2003). As evidncias deste estudo apontam o importante papel da acumulao de capacidades naestratgia de aprimoramento da performance operacional das empresas. Ou se-57ja: esforos deliberados para uma consistente acumulao tecnolgica interna tm um papel crucial no incremento da performance competitiva da empresa. Esta tarefa, contudo, complexa, dispendiosa e exige comprometimento e esforos contnuos da alta direo da empresa. Isso porque capacidades tecnolgicas po- dem ser debilitadas quando tais esforos diminuem ou so negligenciados.A mtrica empregada neste trabalho pode auxiliar na gesto empresarial pela identificao de oportunidades de melhoria de performance tcnico-econ-

mica, e pela acumulao de capacidade tecnolgica e processos de aprendizagem. Esta ferramenta analtica pode auxiliar tambm na orientao de estudos de pol- ticas governamentais para desenvolvimento tecnolgico, identificando oportuni- dades de melhoria na capacitao tecnolgica de setores industriais estratgicos.Este estudo mostra a viabilidade da aplicao de modelos de exame de capa- cidades tecnolgicas (Quadro 1) para empresas e unidades organizacionais espe- cficas da indstria de telecomunicaes fixas. Alm disso, contribui para abrir caminho para futuras comparaes entre unidades operacionais especficas tan- to em nvel da mesma empresa como em nvel interempresarial. Isso possibili- taria um entendimento ainda mais detalhado sobre as implicaes prticas dos processos de aprendizagem para o aprimoramento da performance de empre- sas de setores estratgicos da indstria no Brasil.

REFERNCIAS

ANSOFF, H. I. Administrao estratgica. So Paulo: Atlas, 1985.. Corporate strategy: an analytic approach to business policy for growth and expan- sion. New York: McGraw-Hill, 1965.BELL, M.; PAVITT, K. Technological accumulation and industrial growth: contrasts bet- ween developed and developing countries, industrial and corporate change, v. 2, n. 2, p.157-211, 1993.. The development of technological capabilities. In: HAQUE, I. U. (Ed.). Trade, technology and international competitiveness. Washington, DC: World Bank, 1995. BELLINGHINI, M. F. Acumulao de capacidades tecnolgicas e suas implicaes para o aprimoramento da performance tcnico-econmica em operadoras de telefonia fixa: a experincia da Telemar Norte Leste S.A. 2003. Dissertao (Mestrado em Gesto Em- presarial) Escola Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas EBAPE, Fun- dao Getulio Vargas, Rio de Janeiro, 2003.BEN, F. Acumulao de capacidades tecnolgicas e suas implicaes para a performance cor- porativa: um estudo comparativo entre duas empresas da indstria moveleira em Bento Gonalves RS. 2001. Dissertao (Mestrado em Gesto Empresarial) Escola Brasilei- ra de Administrao Pblica e de Empresas EBAPE, Fundao Getulio Vargas, Rio de58 Janeiro. 2001.CAVALCANTI, R. A. Acumulao de capacidades tecnolgicas e performance operacional emoperadoras de telefonia celular. 2001. Dissertao (Mestrado em Gesto Empresarial) Escola Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas EBAPE, Fundao Getulio Vargas, Rio de Janeiro, 2001.DOSI, G., The nature of the innovative process. In: DOSI ,G.; FREEMAN, C.; NELSON, R.; SILVERBERG, G.; SOETE, L. (Eds.). Technical change and economic theory. London: Printer Publishers, 1988.

DUTRNIT, G. Problemas de la administracin del conocimiento en firma Latino Ame- ricana. In: XXI SIMPSIO DE GESTO DA INOVAO TECNOLGICA. 2000, So Paulo.FIGUEIREDO, P. N. Aprendizagem tecnolgica e performance competitiva. Rio de Janeiro: FGV, 2003.. Pesquisa emprica sobre aprendizagem tecnolgica e inovao industrial: al- guns aspectos prticos de desenho e implementao. In: VIEIRA, Marcelo Milano Fal- co; ZOUAIN, Deborah Moraes (Org.). Pesquisa qualitativa em administrao. Rio de Janeiro: FGV, 2004.. Technological learning and competitive performance. Cheltenham, UK: EdwardElgar Publishing, Inc. MA, USA, 2001.GOOLD, M. Learning, planning, and strategy: extra time. California Management Review, Berkeley, v. 38, n. 4, p. 100-102, Summer 1996.HOLLANDER, S. The sources of increased efficiency: a study of Du Pont rayon plants, Cambridge, MA: MIT Press, 1965.LALL, S. Technological capabilities and industrialization. World Developement, v. 20, n.2, p. 155-186, 1992.LEORNARD-BARTON, L. Nascentes do saber: criando e sustentando as fontes de inova- o. Rio de Janeiro: FGV, 1998.. Wellsprings of knowledge: building and sustaining the sources of innovation. Boston, MA: Harvard Business School Press, 1995.MILES, M. B.; HUBERMAN, M. A. Qualitative data analysis. a source of new methods, London: Sage, 1984.MINTZBERG, H. et al. The Honda effect revisited. California Management Review, Berkeley, v. 38. n. 4, p. 79-117, 1996.PAVITT, K. Key characteristics of the large innovating firm. British Journal of Manage- ment, Oxford, v. 2, p. 41-50, 1991.. Technologies, products and organization in the innovating firm: what AdamSmith tell us and Joseph Schumpeter doesnt. Industrial and Corporate Change, v. 7, n.3, p. 433-443, 1998.. What we know about the strategic management of technology. California Mana- gement Review, Berkeley, v. 32, n. 2, p. 17-26, Spring 1990.; STEINMUELLER, W. E. Technology in corporate strategy: change, continuity and the information revolution. In: PETTIGREW, A.; THOMAS H.; WHITTINGTON, R. (Eds.). Handbook of strategy and management. London: Sage Publications, p. 344-372,2001.PENROSE, E. T. The theory of the growth of firm. Oxford: Basil Blackwell, 1959. 59PORTER, M. P. Vantagem competitiva. Rio de Janeiro: Campus, 1985.PRAHALAD, C.; HAMEL, G. The core competence of the corporation. Harvard BusinessReview, Amsterdan, v. 90, p. 79-9, 1990.RUMELT, R. P. Strategy, structure and economic performance. Cambridge: MA: HarvardBusiness School Press, 1974.. Towards a strategic theory of the firm. In: LAMB, R. B. (Ed.). Competitive strate- gic management. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall, 1984.

SIMONS, R. Levers of control: how managers use innovative control systems to drive stra- tegic renewal. Boston: Harvard Business School Press, 1995.STEINER, G. A. Top management planning. New York: Macmillan, 1969.TACLA, C. L.; FIGUEIREDO, P. N. Processos de aprendizagem e acumulao de capa- cidades tecnolgicas: evidncias de uma empresa de bens de capital no Brasil. Revista de Administrao Contempornea, Curitiba, v. 7 , n. 3, p. 101-126, 2003.TEECE, D.; PISANO, G. The dynamic capabilities of firms: an introduction. Industrial and Corporate Change, v. 3, n. 3, p. 537-557. Oxford: University Press, 1994. TREMBLAY, P. Comparative analysis of technological capability and productivity growth in the pulp and paper industry in industrialized and industrializing countries. D. Phil Thesis, SPRU, University of Sussex, 1994.WOHLERS, M.; COSSETTI, P. Infra-estrutura: perspectivas de reorganizao. Teleco- municaes. Braslia: IPEA, 1997YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e mtodo. 2 ed. So Paulo: Bookman, 2002.

TRAMITAO Recebido em 14/1/2005Aprovado em 3/5/2006

60