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Do estado falimentar: as hipóteses legais presuntivas da situação de insolvência. Comentários ao art. 94 da Lei de Falências e Recuperação de Empresas ( Lei n. 11.101, de 9 de fevereiro de 2005) Autora: Marianna de Queiroz Gomes, aluna do 9º semestre de Direito da UFC, matrícula 0269687. Texto elaborado em 15 de novembro de 2009, Fortaleza/CE. Contato: [email protected] SUMÁRIO Apresentação 1. Introdução. 1.1. Noções de “empresa”, “empresário”, “sociedade empresária” e “estabelecimento comercial”. 1.2. Função social da empresa. 1.3. A que espécie de devedor se aplica a Lei n.º 11.101/2005. 1.4. A falência. 1.4.1. Conceito e natureza jurídica. 1.4.2. Finalidades e princípios do instituto da falência. 2. Comentários ao art. 94 da Lei n.º 11.101/2005. 2.1. Visão geral. 2.1.1. Comparação com a antiga Lei de Falências. 2.1.2. A insolvência. 2.1.2.1. Considerações gerais sobre o estado de insolvência. 2.1.3. Dos sistemas falimentares. 2.2. Inciso I – A impontualidade. 2.2.1. Considerações preliminares sobre a legitimação ativa ao pedido de falência. 2.2.1. Considerações preliminares sobre a legitimação ativa ao pedido de falência. 2.2.3. Sobre liquidez, certeza e exigibilidade. 2.2.4. Sobre títulos executivos: conceito e função. Os títulos executivos na falência. 2.2.5. Protesto do título executivo no requerimento de falência. 2.2.6. Sobre a legitimidade ativa ao pedido de falência com base na impontualidade. 2.3. Inciso II – Da execução frustrada. 2.4. Inciso III – Dos atos de falência. 2.4.1. Inciso III, alínea a – Liquidação precipitada de ativos, pagamento ruinoso ou fraudulento. 2.4.2. Inciso III, alínea b – Atos para retardar pagamentos ou fraudar credores. 2.4.3. Inciso III, alínea c – Da transferência irregular do estabelecimento. 2.4.4. Inciso III, alínea d – Da simulação de transferência do estabelecimento. 2.4.5. Inciso III, alínea e – Dação irregular de garantia.

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Do estado falimentar: as hipóteses legais presuntivas da situação de insolvência. Comentários ao art. 94 da Lei de Falências e Recuperação de Empresas ( Lei n. 11.101, de 9 de fevereiro de 2005)

Autora: Marianna de Queiroz Gomes, aluna do 9º semestre de Direito da UFC, matrícula 0269687. Texto elaborado em 15 de novembro de 2009, Fortaleza/CE.

Contato: [email protected]

SUMÁRIO

Apresentação

1. Introdução.1.1. Noções de “empresa”, “empresário”, “sociedade empresária” e “estabelecimento comercial”.1.2. Função social da empresa. 1.3. A que espécie de devedor se aplica a Lei n.º 11.101/2005. 1.4. A falência. 1.4.1. Conceito e natureza jurídica. 1.4.2. Finalidades e princípios do instituto da falência.

2. Comentários ao art. 94 da Lei n.º 11.101/2005.

2.1. Visão geral. 2.1.1. Comparação com a antiga Lei de Falências. 2.1.2. A insolvência. 2.1.2.1. Considerações gerais sobre o estado de insolvência. 2.1.3. Dos sistemas falimentares.

2.2. Inciso I – A impontualidade. 2.2.1. Considerações preliminares sobre a legitimação ativa ao pedido de falência. 2.2.1. Considerações preliminares sobre a legitimação ativa ao pedido de falência. 2.2.3. Sobre liquidez, certeza e exigibilidade. 2.2.4. Sobre títulos executivos: conceito e função. Os títulos executivos na falência. 2.2.5. Protesto do título executivo no requerimento de falência.2.2.6. Sobre a legitimidade ativa ao pedido de falência com base na impontualidade.

2.3. Inciso II – Da execução frustrada.

2.4. Inciso III – Dos atos de falência.2.4.1. Inciso III, alínea a – Liquidação precipitada de ativos, pagamento ruinoso ou fraudulento. 2.4.2. Inciso III, alínea b – Atos para retardar pagamentos ou fraudar credores.2.4.3. Inciso III, alínea c – Da transferência irregular do estabelecimento.2.4.4. Inciso III, alínea d – Da simulação de transferência do estabelecimento.2.4.5. Inciso III, alínea e – Dação irregular de garantia.2.4.6. Inciso III, alínea f – Abandono de estabelecimento.2.4.7. Inciso III, alínea g – Não cumprimento do plano de recuperação judicial.

2.5..§1º - Considerações adicionais sobre a possibilidade do litisconsórcio ativo no requerimento de falência.

2.6. § 2º - Da necessidade de interesse processual para apresentação de títulos no requerimento de falência.2.7. §3º - Considerações adicionais ao protesto no requerimento de falência.2.8. §4º - Necessidade de certidão em caso de execução frustrada.2.9. §5º - Da descrição fática acompanhada de provas no requerimento de falência baseada em ato falimentar.

DA CONCLUSÃO

BIBLIOGRAFIA

APRESENTAÇÃO

É objetivo do presente trabalho analisar as hipóteses legais que ensejam a decretação da falência, o que fazemos comentando o art. 94 da Lei n.º 11.101/2005. Realizou-se uma pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, e, partindo da fixação dos conceitos de empresário, de estabelecimento comercial e de empresa, lançamo-nos à empreitada de definir falência, considerando sua natureza jurídica e seus princípios.

A seguir, traçamos definição econômica e depois jurídica para o estado de insolvência. Vamos aos comentários do artigo 94 da Lei de Falências, nosso objeto de estudo, procurando delinear quais situações fazem presumir esse estado de insolvência, e, por, conseguinte, possibilitar ao credor o recurso ao Judiciário a fim de que este Poder decrete a falência.

Palavras chave: falência, insolvência, presunção de insolvência, impontualidade, atos de falência.

1. INTRODUÇÃO

1.1. Noções de “empresa”, “empresário”, “sociedade empresária” e “estabelecimento comercial”

O comércio, hoje englobado pelo conceito amplo de “atividade empresarial”, é fato social e econômico, provavelmente surgido com o próprio homem. Do escambo à venda de serviços e bens complexos que temos hoje, da economia de troca à economia de mercado, a circulação de riquezas sempre esteve presente como inerente à atividade humana. (1)

Por trás de atividade empresarial, qualquer que seja ela, temos a reunião de elementos, que podem ser corpóreos e incorpóreos, bens econômicos, escassos e úteis, voltada à percepção de lucro, fazendo aqueles bens escassos mais úteis. Esse seria um conceito econômico de comércio.

Ocupemo-nos, agora, de traçar um conceito jurídico de “comércio”. De início, observamos que nosso Código Civil, conforme antecipado, não mais se utiliza, todavia, dessa expressão “comércio” ou “comerciante”, o que faz comércio. Utiliza, isso sim, a noção de atividade empresária, adotando, desta feita, a Teoria da Empresa e superando a Teoria dos Atos de Comércio. Sob a égide do novo Codex, fala-se em “empresário”, “sociedade empresária”, “atividade empresária”, “empresa”. Vejamos:

“Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa”.

O Código não define empresa, mas sim seu titular. Ricardo Negrão (2), citando Asquini, doutrinador italiano, e sua teoria poliédrica da empresa, destaca quatro perfis jurídicos sob os quais podemos ter a empresa: o perfil subjetivo – aspecto atinente a quem, a qual sujeito, exerce a empresa; perfil funcional, aspecto dinâmico, força em movimento, a atividade empresarial voltada a um fim produtivo; o perfil objetivo, o estabelecimento empresarial, aí tida a empresa como patrimônio aziendal, complexo de bens corpóreos e incorpóreos utilizado pelo empresário para sua atividade; e, por fim, o perfil corporativo ou institucional, “o resultado da organização do pessoal, formada pelo empresário e seus colaboradores”.

Negrão, todavia, distancia-se da doutrina de Asquini, aproximando-se da de Bulgarelli, quando enumera três aspectos, e não quatro, necessários à conceituação de empresa (3). Seriam eles: o aspecto subjetivo, o empresário, o sujeito que exerce a atividade, pessoa física ou jurídica; o aspecto objetivo, o estabelecimento empresarial, conjunto de bens organizados para o exercício da atividade, os quais podem ser corpóreos e incorpóreos; e aspecto funcional, a atividade econômica organizada, caracterizada, nas palavras do professor, por ser “econômica, voltada para o mercado, com vistas à produção ou à circulação de bens ou serviços, de forma organizada e exercida profissionalmente”(4).

Fábio Ulhoa concebe empresa como “a atividade econômica organizada para a produção de ou circulação de bens ou serviços” (5), percebendo equívoco na visão multifacetária da empresa proposta por Asquini. Segundo Ulhoa, os perfis ali delineados correspondem a conceitos jurídicos próprios. Temos que assiste razão a Ulhoa. De fato, empresa, empresário e estabelecimento empresarial são coisas distintas. A empresa é a atividade econômica organizada, a junção de elementos corpóreos e incorpóreos submetidos por alguém (o empresário) com vistas à obtenção do lucro. Sobre o estabelecimento comercial, o Código Civil expressamente prevê em seu art. 1142:

“Art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária”.

Já sobre o empresário, o Código Civil traz conceito expresso, já anteriormente colacionado. No dizer de Ulhoa, “empresário é a pessoa que toma a iniciativa de organizar um atividade econômica de produção ou circulação de bens e serviços”.

Para Requião, na mesma linha, “o empresário é o sujeito que exercita a atividade empresarial” (6). Acrescenta ainda o autor dois elementos como essenciais à caracterização do empresário: a iniciativa e o risco.

Em nosso ordenamento temos o empresário individual, pessoa física exercente de atividade econômica, e a sociedade empresária, pessoa jurídica que explora a atividade empresária. Não mais subsiste a distinção entre empresários civis e comerciais: agora há apenas a figura do empresário. Existe o empresário individual, que responde com seus bens pelas obrigações civis ou comerciais (7), e a sociedade empresária, que tem patrimônio próprio e constitui-se de sócios, cujo patrimônio pode ou não, dependendo do tipo societário, responder pelas obrigações da sociedade.

Em resumo, observamos que o empresário, ou a sociedade empresária, aglutina pessoas, bens móveis e imóveis, o estabelecimento comercial, de forma a produzir bens e serviços profissionalmente. Esses bens e pessoas postos juntos de forma ordenada têm um valor maior que o que tinham antes dessa junção. A eles o empresário agrega valor, torna-os mais úteis. A essa atividade damos o nome de empresa, conceito dinâmico, vez que a só existência de bens, empregados e de aglutinador, o empresário, estaticamente vistos, não forma empresa.

Nessa ordem de idéias, ponderamos que o empresário e a sociedade empresária integram-se à economia, em maior ou menor escala, de acordo com sua importância, assumindo obrigações, celebrando contratos, empregando pessoas, pagando impostos, enfim, fazendo circular riquezas.

Como já citado, o risco é iminente mesmo à conceituação da figura do empresário. Toda empresa, toda atividade, guarda em si maior ou menor risco. Assim, por vezes, as empresas falham em sua função primordial que é produzir o lucro, por fatores (crise) internos e/ou externos. Essa crise pode ser financeira (ausência de dinheiro) ou econômica (impossibilidade de manter um giro empresarial lucrativo). Às vezes também, e o que é bem freqüente, elas deixam de honrar seus compromissos. Em um cenário mais adiantado, a atividade pode não ter mais como se perpetuar. Se estiver lidando com os dois tipos de dificuldades, a financeira e a econômica, o devedor vai à falência, à extinção da atividade como existia. Já se a crise é apenas financeira, e vislumbra-se chance de retomada da situação de equilíbrio da empresa, o devedor vai para a recuperação judicial ou extrajudicial.

1.2. Função social da empresa

O empresário/sociedade empresária cumpre uma função na sociedade em que está inserido, uma função social. Assim, é de interesse do Estado que, se aquela atividade for viável e rentável, perpetue-se, cresça e produza frutos, como também é interesse do Estado sanear o meio empresarial, conservar a atividade produtiva e eliminar a que não o seja, afastar o empresário de sua atividade, se esta for a solução para a continuação da atividade, como uma forma de aduzir segurança ao todo. A quebra, a bancarrota, a falência, é, por conta mesmo dessa nomeada “função social”, fenômeno que interessa a um sem número de pessoas e entidades.

1.3. A que espécie de devedor se aplica a Lei n.º 11.101/2005

É nesse cenário que se enquadra nosso objeto de estudo, a falência, disciplinada pela Lei n.º 11.101/05, de 9 de fevereiro de 2005:

“Art. 1o Esta Lei disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, doravante referidos simplesmente como devedor”.

Assim, de início, podemos ter os institutos da falência e da recuperação judicial como voltados ao empresário e à sociedade empresária, conceitos já retro delineados.

1.4. A falência

1.4.1. Conceito e natureza jurídica

Traçadas essas considerações iniciais, pensemos o conceito de falência. Este, economicamente, prende-se à noção de que o empresário/sociedade empresária se constitua em um estado de insolvência, de crise econômico-financeira, isto levando em consideração primordialmente a situação patrimonial do devedor, passivo superior ao ativo. Juridicamente, destaca-se como essencial à caracterização da falência não apenas o estado de insolvência, mas sim o próprio estado de falência, o que aqui nos pretendemos a analisar.

Ricardo Negrão traz uma definição de falência vinculada a à idéia de falência como processo de execução:

“Falência é um processo de execução coletiva, no qual todo o patrimônio de um empresário declarado falido – pessoa física ou jurídica – é arrecadado, visando o pagamento da universalidade de seus credores, de forma completa ou proporcional. É um processo judicial complexo que compreende a arrecadação de bens, sua administração e conservação, bem como a verificação e o acertamento dos créditos, para posterior liquidação dos bens e rateio entre credores” (8).

O Ministro Francisco Falcão, em voto ao Recurso Especial 287824 / MG, tece considerações sobre a falência que reputamos bastante válidas à colação neste momento:

“Em nosso ordenamento jurídico, a falência representa a insolvência do devedor comerciante que tem seu patrimônio submetido a um processo de execução coletiva. Seus bens são arrecadados e conduzidos à venda judicial forçada, com a distribuição proporcional do ativo entre os credores habilitados” (9).

A Lei 11.101/2005 traz normas de cunho material e processual, isso é certo, suscitando dúvidas acerca da natureza jurídica da falência. A compreensão mais moderna do instituto, entretanto, aponta para o reconhecimento da primazia de sua natureza processual, por tratar-se essencialmente de execução coletiva que recai sobre o devedor empresário.

Ricardo Negrão nos auxilia nesse intuito de traçar a natureza jurídica da falência:

“O procedimento pré-falimentar é processo de conhecimento, de feição contenciosa, no qual, sumariamente, o magistrado irá conhecer os fatos trazidos pelo autor e, ao final, decretará ou não a falência do devedor. O pedido de abertura da quebra é pretensão de tutela constitutiva, e a sentença que decreta a falência modifica não apenas a situação jurídico econômica do falido, pessoa natural ou pessoa jurídica, e seus sócios com responsabilidade ilimitada, mas, com maior ou menor intensidade, as relações e contratos firmados pelo devedor e empregados, fornecedores e toda sorte de credores, portadores de uma diversificada e multiforme cesta de títulos” (10).

Fábio Ulhoa, na mesma linha, conceitua falência como processo executivo, vejamos:

“A falência é, assim, o processo judicial de execução concursal do patrimônio do devedor empresário, que , normalmente, é uma pessoa jurídica revestida da forma de sociedade por quotas de responsabilidade limitada ou anônima. Para os não empresários sem meios de honrar a totalidade de suas obrigações, o direito destina um processo diferente de execução concursal, que é a insolvência civil disciplinada no Código de Processo Civil (arts. 748 e s.)” (11).

Já Requião, em sua obra Curso de Direito Falimentar, pondera haver dissenso na doutrina acerca da natureza jurídica da falência, se instituto de direito substancial ou de direito processual, construindo a falência como um instituto sui generis, misto de direito comercial e direito processual, vez que “no processo de falência, com efeito, se permeiam regras de direito material ao lado de normas de direito formal”(12).

De fato, difícil apreender o fenômeno complexo “falência” por meio de uma teoria pura. De certo, tem elementos de processo executivo, inarredável sua natureza de execução concursal, mas também abarca elementos de jurisdição graciosa e de direito material.

Não é procedimento executivo simplesmente, pois, por exemplo, apesar de seu objetivo final ser a execução forçada, posto pressupor a execução inadimplência e título executivo, ao passo que a falência supõe, por vezes, insolvência, pode não exigir que quem a provoque esteja munido de título executivo, como veremos.

Por outro lado, nos casos de autofalência, e.g., ou quando o devedor não se oponha a esta, não há um caráter francamente coativo, não havendo partes em litígio, e sendo o contraditório incidental no processo

de falência. No procedimento de falência, isso é certo, cuida-se de interesse de ordem pública, lá atuando a autoridade judicial frequentemente mais como administradora de relevantes interesses privados que como judicante.

Ficamos aqui com a predominância da natureza processual do fenômeno complexo “falência”. A Lei de Falências apresenta institutos de direito material e processual, isso é certo. Se focamos, como o faz a maioria da doutrina, em ser a falência, deontologicamente, uma execução forçada contra o patrimônio de um devedor comerciante e insolvente, não chegamos a outra conclusão que não a de ser a falência instituto preponderantemente de direito processual.

1.4.2. Finalidades e princípios do instituto da falência

Como finalidades da falência, antes de avançarmos, cumpre destacar, vide art. 75 da Lei de Falências: o afastamento do devedor de suas atividades; preservação e otimização da utilização produtiva de bens; tratar-se os credores igualmente, a par condictio creditorum; saneamento do meio empresarial; segurança às relações jurídicas.

Detenhamo-nos um pouco nos princípios. O Professor Amador Paes de Almeida (13) reputa como princípio fundamental a recuperação econômica da empresa, em atenção à função da empresa na comunidade em que atua. O doutrinador cita ainda o Senador Ramez Tebet, quanto aos princípios fundamentais da nova legislação falimentar brasileira:

a) Preservação da empresa; b) Separação dos conceitos de empresa e empresário; c) Recuperação das sociedades e empresários recuperáveis; d) Retirada do mercado de sociedades ou empresários não recuperáveis; e) Proteção aos trabalhadores; f) Redução do custo do crédito no Brasil; g) Celeridade e eficiência dos processos judiciais; h) Segurança jurídica; i) Participação ativa dos credores; j) Maximização dos ativos do falido; k) Desburocratização da recuperação de microempresas e empresas de pequeno porte; l) Rigor na punição de crimes relacionados à falência e à recuperação judicial.

2. COMENTÁRIOS AO ART. 94 DA LEI N.º 11.101/2005

2.1. Visão geral

2.1.1. Comparação com a antiga Lei de Falências

“Art. 94. Será decretada a falência do devedor que”:

Sobre o colacionado artigo, escreveu Bezerra Filho (14):

“1. A antiga Lei de Falências estabelecia duas ‘espécies’ de crédito que permitiam o requerimento da falência, ou seja, o pedido com fundamento em título líquido e certo (art. 1º da lei anterior); e o pedido com fundamento em atos de falência (art. 2º), sendo que, para cada espécie, havia um tipo de procedimento diferente, previsto respectivamente nos arts. 11 e 12. Este sistema foi alterado pela lei atual, que criou três espécies, previstas respectivamente nos incisos I, II e III.

2. O inciso I corresponde ao art. 1º da lei anterior, ou seja, requerimento de falência com fundamento em título líquido e certo; o inciso II destaca a segunda espécie, ou seja, a situação na qual o executado não paga, não deposita e não nomeia bens à penhora; e finalmente, o inciso III prevê a terceira espécie, os chamados atos de falência. Ou seja, o legislador optou por dividir os chamados ‘atos de falência’ em duas subespécies, ao invés de mantê-las em uma única, como ocorria na lei anterior”.

2.1.2. A insolvência

2.1.2.1. Considerações gerais sobre o estado de insolvência

Numa avaliação pré-jurídica, podemos considerar o estado de insolvência como a situação em que o patrimônio ativo de um empresário ou de uma sociedade empresária não consegue fazer frente a suas

dívidas, seu patrimônio passivo, por motivos de insuficiência, descrédito ou falta de liquidez (15). Falido é aquele que tem passivo superior ao ativo; aquele que não tem como fazer frente a suas obrigações. Essa é regra que subjaz ao Direito. Do devedor que paga suas dívidas diz-se “solvente”; do que não paga, “insolvente”. Têm-se a falência de fato com a insolência, vez que a de direito só existe com a sua decretação, na forma dos arts. 99 e seguintes da Lei de Falências.

No nosso sistema, inexiste a falência ex officio. Esse estado de fato da insolvência pode ser confessado pelo empresário, quando teríamos autofalência, caso disciplinado pelos arts. 105-107 da Lei de Falências, como pode também ser presumido por “atos que exteriorizem a ruína da empresa” (16). Na hipóteses do art. 94, esse “estado de falência de fato”, requerido por credor, pode ser levado ao conhecimento do Judiciário e transformar-se em “estado de direito”.

2.1.3. Dos sistemas falimentares

Quando não confessado, o que por vezes pode não ocorrer, o estado de falência necessita de parâmetros. Nessa toada, o Direito formula sistemas de perceber essa situação, os quais são, no escólio de Requião (17):

a) estado patrimonial deficitário; b) cessação de pagamentos; c) impontualidade; d) atos enumerados em lei.

Teríamos o primeiro sistema quando da demonstração de que “o devedor, patrimonialmente enfraquecido, não está em condições de solver regularmente suas obrigações” (18).

Já o sistema de cessação de pagamentos usa como parâmetro para auscultar a insolvência a cessação de pagamentos. Segundo Requião, as origens deste remontam ao “Code de commerce” de Napoleão. Difere o devedor inadimplente do devedor insolvente: este tem passivo superior ao ativo, aquele pode ser solvável. Coube à jurisprudência conceituar, em um dado momento de nossa história, o que seria essa “cessação de pagamentos”, questão de fato deixada à apreciação dos tribunais, o que tornou o sistema, naquele momento legislativo repleto de falhas, vez que difícil de conceituar precisamente essa cessação, se a ela basta o inadimplemento de uma ou várias obrigações, a dita “mora”, ou se demandaria a real quebra, a total impossibilidade de continuação financeira, a insolvabilidade. Hoje temos parâmetros objetivos a definir “cessação de pagamentos”, conforme adiante esmiuçado,

Impontualidade, nas palavras de Requião, “consiste no não-pagamento de dívida líquida no vencimento”. Irrelevante, no sistema que adota como parâmetro a impontualidade, se o passivo é superior ou inferior ao ativo, se o devedor é ou não solvente ou se a situação de impontualidade remonta apenas a crise de liquidez. “é elemento implícito o não-pagamento desmotivado, que presume a falta de meios financeiros para fazê-lo”(19).

Sobre o sistema da enumeração legal, tratam-se de critérios caracterizadores da situação de insolvência, atos exteriores que fazem presumir a insolvência.

Requião, em comentário ao Decreto-lei n.º 7.661/45, aduziu ser o sistema de atos de falência “coadjutor dos demais”. A antiga Lei de Falências, para além da confissão do devedor, teria adotado um sistema misto, pois tanto a impontualidade como atos exteriores legalmente determinados determinariam a abertura do processo de falência. Reputamos persistir verdadeira tal assertiva, se considerarmos a similitude dos incisos do art. 94 às situações elencadas na Lei de Falências antiga. De fato, nosso sistema falimentar, ao lado da autofalência, continua a traçar presunções legais da “quebra” (iuris tantum), orbitando em volta da impontualidade e de atos ditos “falimentares”.

Conforme ensina Gladston Mamede,

“basta a verificação de tais situações [presuntivas da falência], complementados os requisitos jurídicos que lhes dão sustentação, para que a falência seja decretada, sendo de todo indiferente – e mesmo juridicamente impossível- a pretensão de demonstrar solvabilidade, isto é, de demonstrar a existência de patrimônio líquido positivo, embora seja tal particularidade elemento relevante para determinadas alternativas de solução do pedido falimentar, a exemplo do depósito elisivo ou do pedido de recuperação judicial” (20).

2.2. Inciso I – A impontualidade

“I – sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos na data do pedido de falência”;

2.2.1. Considerações preliminares sobre a legitimação ativa ao pedido de falência

Antes de avançarmos, pensemos quem pode requerer a falência. O art. 96 da Lei de Falências, arrola as pessoas que têm legitimidade ativa ao pedido. Sobre o tema, ensina Amador Paes de Almeida:

“A legislação falimentar brasileira não consagra a falência ex officio, isto é, a possibilidade da declaração da quebra pelo juiz, independentemente de provocação dos interessados, exigindo, via de conseqüência, a iniciativa dos credores”.

Acrescenta o citado autor;

“Podem requerer a falência do devedor:

a) o credor, por obrigação líquida, constante de título executivo, judicial ou extrajudicial; b) o próprio devedor (autofalência); o sócio acionista da sociedade devedora; c) o cônjuge sobrevivente e herdeiros (falência do espólio)”.

2.2.2. Considerações gerais sobre impontualidade à luz do inciso I do art. 94 da Lei de Falências

O inciso I do art. 94 da Lei de Falências fala daquele devedor que é impontual, inadimplindo obrigações acima de um determinado piso. Percebemos, todavia, que o conceito de impontualidade que dessai da Lei está subordinado a dois requisitos: deve decorrer de obrigação líquida materializada em título executivo e deve ocorrer sem relevante razão de direito. Aí temos evidenciado o caráter de execução concursal da falência. O credor que requer a falência poderia requerer execução singular, a esta seria também legitimado. O fundamento da escolha, da preferência pela falência seria,

“a boa-fé do credor que, percebendo o estado falimentar provável, não se socorre da execução singular, regida por aqueles artigos 583 e seguintes do Código de Processo Civil, mas opta pelo pedido falimentar, inscrito na Lei 11.101/05” (21).

Percebemos a possível vocação do procedimento falimentar para ação de cobrança, o que não deve ocorrer. Cabe perceber, na mens legis, como já antecipado, o intuito de elidir a utilização do pedido de falência como ação de cobrança. O abuso na substituição da execução singular deve ser reprimido, e foi afastado pela exigência do piso mínimo de 40 salários mínimos.

Essa malversação do processo falimentar sujeita o credor imprudente ao pagamento de perdas e danos, se tiver ajudo com dolo e com a intenção manifesta de prejudicar o empresário-devedor. Trata-se de valor de alçada. “Aos credores por valores inferiores somente resta a execução civil, embora o pedido de falência, nestes casos, possa resultar da frustração daquela, como se vê da previsão anotada no art. 94, II, da Lei 11.101/05” (22).

Pela redação legal, observamos que o pedido de falência pode resultar do inadimplemento de uma ou várias obrigações consubstanciadas em títulos executivos protestados, obrigações quanto a um ou vários credores, hipótese em que teremos litisconsórcio ativo. Maiores considerações quando dos comentários ao §1º.

Fala-se em “relevante razão de direito”. A impontualidade deve ser injustificada, para usar expressão de Ulhoa (23). Portanto, se o empresário ou sociedade empresária não paga e comprova a ocorrência dessa relevante razão, conforme rol (exemplificativo) disposto no art. 96 da Lei de Falências, não será considerado devedor para os efeitos deste diploma (24).

2.2.3. Sobre liquidez, certeza e exigibilidade

Segundo o art. 586 do CPC, “A execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível”. Não define, todavia, o conceito de certeza, liquidez nem de exigibilidade.

Comecemos por pensar quê seja obrigação. Para Carlos Roberto Gonçalves, é “o vínculo jurídico que confere ao credor (sujeito ativo) o cumprimento de determinada prestação” (25).

Já pagamento, o ato de pagar, para o civilista, “significa, pois, cumprimento ou adimplemento de obrigação. O Código Civil dá o nome pagamento à realização voluntária da prestação debitória, tanto quanto procede do devedor como quando provém de terceiro, interessado ou não na extinção do vínculo obrigacional [aquele que, em virtude da existência da obrigação, liga credor e devedor]” (26).

Feitas essas considerações iniciais, partamos à definição de certeza, liquidez e exigibilidade. Certa é a obrigação sobre a qual não restam dúvidas. Ela existe. Se pairam dúvidas quanto à existência da relação jurídica que origina a obrigação, ela não é certa; não se terá título executivo, mas apenas documento comprobatório de uma das versões sobre os fatos e sobre o direito, comportando dilação probatória (27). Há que se passar, assim, por uma fase de cognição do título, não apto à execução e, via de conseqüência, inapto ao procedimento de falência.

Quanto à liquidez, na definição de Carlos Roberto Gonçalves: “considera-se líquida a obrigação certa, quanto à sua existência e determinada, quanto ao seu objeto”.

Liquidez e certeza, embora complementares, não se confundem. Liquidez deve ser entendida “como a determinabilidade do quantum debeatur” (28). É ilíquida a obrigação cujo objeto depende de prévia apuração, pois seu valor encontra-se indeterminado é indeterminável. Necessário o caminho da liquidação, o que o torna imprestável à direta execução.

“Há liquidez, autorizadora da execução, quando o título permite, independentemente da prova dos fatos, a exata definição da quantidade de bens devidos, quer porque a traga diretamente indicada, quer porque o número final possa ser aritmeticamente apurado mediante critérios constantes do próprio título ou de fontes oficiais, pública e objetivamente conhecidas” (29).

Nesse ponto, lembremos a lição de Gladston Mamede:

“O Direito já evoluiu para considerar líquido o título cujo valor final não esteja estampado no instrumento ou, mesmo, quando outro valor esteja estampado, desde que o valor final seja apurável por simples cálculos aritméticos, formulados para acolher a incidência de fatores como correção monetária, juros, multa etc. Para tanto, será necessário apresentar, com a petição inicial, uma memória discriminada e atualizada do cálculo aritmético que dá a expressão final do valor da obrigação” (30).

Sobre exigibilidade, temos: “diz-se exigível uma obrigação quando seu cumprimento não está sujeito a termo condição ou qualquer outra limitação” (31). Obrigação exigível é a que venceu. Em regra temos o adimplemento das obrigações, pacta sunt servanda, princípio secular de Direito. Em regra também, temos o adimplemento voluntário, mas nem sempre assim ocorre. Da obrigação que venceu e não foi adimplida, diz-se obrigação inadimplida, total ou parcialmente.

2.2.4. Sobre títulos executivos: conceito e função. Os títulos executivos na falência

Já título executivo pode ser considerado como “cada um dos atos jurídicos que a lei conhece como necessários e suficientes para legitimar a realização da execução, sem qualquer nova ou prévia indagação acerca da existência do crédito” (32).

Se o credor não porta título executivo, título líquido certo e exigível, não poderá habilitar seu crédito na falência, processo de execução concursal. Não teria, assim, interesse em agir, condição da ação. Façamos a necessária ligação entre título executivo e interesse processual. Este existe no binômio interesse-adequação e interesse-necessidade, adequação do provimento pleiteado e do meio para sua obtenção, e necessidade da tutela jurisdicional. A exigibilidade liga-se à idéia de necessidade da tutela jurisdicional executiva, interesse-necessidade, ao passo que o título executivo remonta à adequação do provimento escolhido e do processo de execução, interesse-adequação (33).

A exigibilidade de títulos interpreta-se restritivamente na falência (34). Lembremos que o art. 5º da Lei de Falências veda a cobrança, na falência das obrigações a título gratuito e as despesas que os credores fizerem para tomar parte na recuperação judicial ou na falência, salvo as custas judiciais decorrentes de litígio com o devedor.

Para Carlos Roberto Gonçalves, negócios jurídicos gratuitos, gênero que compreende a espécie obrigações a título gratuito, são

”aqueles em que apenas um das partes aufere vantagens ou benefícios, como sucede na doação pura, no comodato, no reconhecimento de filho etc. Nessa modalidade, outorgam-se vantagens a uma das partes sem exigir contraprestação de outra” (35).

Podemos entender como “obrigações a título gratuito” obrigações não-onerosas, que não contenham uma contraprestação como decorrência direta. São as obrigações constituídas por graça. Mamede se adianta, acrescentando não legitimar o pedido de falência o oferecimento de garantia pessoal (fiança ou aval) ou real (penhor ou hipoteca) a favor de terceiro (36). Visa-se a evitar fraudes.

Nos termos do art. 289 do CPC, a petição inicial será indeferida quando o autor carecer de interesse processual. Conforme o art. 267 do CPC, extingue-se o processo, sem resolução de mérito, quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual. Observamos, então, que o processo de falência deve ser extinto, sem julgamento de mérito, quando o autor não portar título executivo, ou título o qual não possa ser exigido na falência, posto carente de interesse.

Vejamos agora os títulos executivos representativos de obrigações fiscais. A Fazenda Pública é credora. O CTN estabelece:

“Art. 187. A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento”. (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005) (Grifo nosso)

“Art. 188. São extraconcursais os créditos tributários decorrentes de fatos geradores ocorridos no curso do processo de falência”. (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005) (Grifo nosso)

De fato, a certidão de dívida ativa é título judicial (art. 585, VII). Temos, entretanto, pelos dispositivos acima colacionados, que o crédito tributário não pode ser cobrado no processo de falência. Partindo dessa premissa, ponderamos que a Fazenda não pode requerer falência, por lhe faltar interesse processual, interesse-adequação. Resta-lhe recorrer à execução individual, execução fiscal.

Em uma análise metajurídica, podemos entender que não seria interessante ao Estado requerer a falência de empresários. Estes fomentam a economia, fazem circular a riqueza. Se o Estado pudesse requerer falência, teríamos um sem número de empresários quebrados, o que não se coaduna com as finalidades daquele, a quem caberia, isso sim, incentivar a atividade empresária, estimular a economia.

Nesse sentido, já decidiu o STJ, em acórdão proferido à luz do Decreto-lei n.º 7.661/45, mas cujas considerações continuam atuais:

“TRIBUTÁRIO E COMERCIAL. CRÉDITO TRIBUTÁRIO. PROTESTO PRÉVIO. DESNECESSIDADE. PRESUNÇÃO DE CERTEZA E LIQUIDEZ. ART. 204 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. FAZENDA PÚBLICA. AUSÊNCIA DE LEGITIMAÇÃO PARA REQUERER A FALÊNCIA DO COMERCIANTE CONTRIBUINTE. MEIO PRÓPRIO PARA COBRANÇA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. LEI DE EXECUÇÕES FISCAIS. IMPOSSIBILIDADE DE SUBMISSÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO AO REGIME DE CONCURSO UNIVERSAL PRÓPRIO DA FALÊNCIA. ARTS. 186 E 187 DO CTN.(...)IV - Afigura-se impróprio o requerimento de falência do contribuinte comerciante pela Fazenda Pública, na medida em que esta dispõe de instrumento específico para cobrança do crédito tributário.V - Ademais, revela-se ilógico o pedido de quebra, seguido de sua decretação, para logo após informar-se ao Juízo que o crédito tributário não se submete ao concurso falimentar, consoante dicção do art. 187 do CTN.VI - O pedido de falência não pode servir de instrumento de coação moral para satisfação de crédito tributário. A referida coação resta configurada na medida em que o art. 11, § 2º, do Decreto-Lei 7.661/45 permite o depósito elisivo da falência.VII - Recurso especial improvido” (37).

O Ministro-relator, nas razões de seu voto ao citado Recurso Especial, aduz:

“De fato, afigura-se absolutamente ilógica a possibilidade do requerimento de falência, porquanto equivaleria a um verdadeiro paradoxo. É que basta imaginar que a Fazenda Pública requeira a falência e logo após a sua decretação informe ao Juízo que o seu crédito não se sujeita ao concurso universal, nos termos do dispositivo supracitado.

Sobre o ponto, a lição de Rubens Requião:

‘De nossa parte, estranhamos o interesse que possa ter a Fazenda Pública no requerimento da falência do devedor por tributos. Segundo o Código Tributário Nacional os créditos fiscais não estão sujeitos ao

processo concursal, e a declaração da falência não obsta o ajuizamento do executivo fiscal, hoje de processamento comum. À Fazenda Pública falece, ao nosso entender, legítimo interesse econômico e moral para postular a declaração de falência de seu devedor. A ação pretendida pela Fazenda Pública tem, isso sim nítido sentido de coação moral, dadas as repercussões que um pedido de falência tem em relação às empresas solventes.’(in Curso de Direito Falimentar, Editora Saraiva, 3ª Edição, pág. 72)

A este fundamento, acrescente-se um outro, decorrente de imposição da própria Lei de Execuções Fiscais, que em seu artigo 38 determina textualmente, verbis:

‘Art. 38. A discussão judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública só é admissível em execução, na forma desta Lei (...)

A aludida disposição legal exclui a possibilidade de a Fazenda Pública executar o seu crédito de outra forma, e com isso, pelo menos na seara tributária, disciplina o brocardo jurídico, pertencente à Teoria Geral do Direito, que pontifica que a todo direito corresponde uma ação que o assegure. Por outro lado, quanto à legitimação ordinária para ajuizar o pedido de falência, verifica-se que a regra geral impõe para este fim que o credor seja quirografário, ou seja, desprovido de qualquer preferência ou privilégio, o que revela a impossibilidade de submeter o crédito tributário à renúncia dessas qualidades, porquanto goza de privilégio ex vi legis, sendo certo igualmente que o agente tributário não possui poderes para dele dispor, porquanto o crédito tributário é irrenunciável”.

A embasar o requerimento de falência, teríamos os títulos executivos judiciais e extrajudiciais. Na definição dos primeiros, temos o Art. 475-N do CPC, dos segundos, o art. 585, também do CPC.

Comum o requerimento da falência com base em títulos de crédito. Preleciona Ulhoa, abeberando-se em Vivante: “título de crédito é o documento necessário para o exercício do direito, literal e autônomo, nele mencionado” (38).

Dispõe o art. 887 do CC: “O título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei”. Lembremos que são princípios do direito cambiário, a qual se submetem os títulos de crédito (39): a cartularidade ( o credor deve se encontrar na posse do título para exercer o direito nele mencionado); literalidade (o título obriga conforme o que nele está escrito); autonomia (os vícios que comprometem as obrigações que originaram o título não se estendem a este).

Conforme aduz Mamede,

“obviamente, não apenas se deverá apresentar o título de crédito, mas também o documento apresentado deverá atender aos requisitos legais obrigatórios, sob pena de desqualificar-se e, assim, perder sua executoriedade, o que impediria, por igual, fosse usado na instrução do pedido de falência” (40).

2.2.5. Protesto do título executivo no requerimento de falência

A Lei requer o protesto do título, seja judicial, seja extrajudicial (41). O protesto é fundamental quando o pedido de decretação de falência se faz com base na impontualidade, o que se infere também da análise do art. 94, §3º, da lei em comento, como adiante estudaremos. Segundo Requião, “o protesto constitui a prova oficial e pública de que o título líquido não foi pago em seu vencimento” (42).

Mamede cita precedente do Superior Tribunal de Justiça (Resp 245.648) que merece nota. O Ministro Barros Monteiro esclarecera na ocasião do julgado que o protesto para fim falimentar, dito protesto especial, diria respeito a títulos não sujeitos ao protesto comum obrigatório.

Como sabemos, notificação de protesto pode ser enviada por correio, mediante aviso de recebimento. Quanto à necessidade de identificação da pessoa, representante da empresa, a receber o protesto, observamos firme jurisprudência do STJ “no sentido de exigir tão-somente a identificação daquele que recebe a notificação do protesto, sendo desnecessária a prova de sua representação legal ou qualidade de preposto da empresa devedora”, como enuncia o Ministro-Relator Sidnei Beneti em seu voto ao Agravo Regimental ao Agravo de Instrumento 636261 / MG (43), citando o julgado AgRg no Ag 667.482/MG (44).

O Superior Tribunal de Justiça sobre notificação de protesto publicou recentemente a súmula 281, de 22 de setembro de 2008:

“A notificação do protesto, para requerimento de falência da empresa devedora, exige a identificação da pessoa que a recebeu”.

Temos também a possibilidade de cancelamento ou sustação do protesto. O cancelamento do protesto, conforme art. 26 da Lei n.º 9.492/97, decorre do pagamento do título, quando este é apresentado ao Tabelião, ou de decisão judicial. Já a sustação decorre de decisão judicial (art. 17, Lei n.º 9.492/97). Se o protesto foi cancelado ou suspenso, não se pode presumir que o devedor está insolvente, pressuposto do requerimento da falência com base no inciso I do art. 94. Se foi cancelado, não pode o credor requerer a falência também porque não teria como cumprir a exigência do § 3º do artigo em liça.

No sentido do texto, vejamos:

“RECURSO ESPECIAL. FALÊNCIA. MEDIDA CAUTELAR DE SUSTAÇÃO DO PROCESSO. INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. PEDIDO DE QUEBRA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.1. "Considerando que os protestos dos títulos são imperativos para o ajuizamento da ação de falência, a sustação judicial dos protestos em decorrência de liminar em ação cautelar interrompe o prazo da prescrição, não se podendo aplicar em tal cenário os paradigmas sobre a prescrição quando se trate de ajuizamento de ação de execução. Recurso especial não conhecido." (REsp 674.125/GO, 3ª Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 12/3/2007).2. Impossível, durante o período de sustação do protesto, o pedido de quebra, porquanto ausente o título autorizador da pretensão.3. Recurso conhecido e provido” (45). (Grifo nosso)

No julgado trazido à colação, aduziu o Ministro-relator como razões de seu voto: “Frise-se, ademais, impossível, durante o período de sustação do protesto, o pedido de quebra, porquanto ausente título autorizador da respectiva pretensão”.

Requião, ainda comentando o Decreto-lei n.º 7.661/45, reputara desnecessário o protesto, e mesmo o próprio vencimento do título quando embasassem o pedido de falência a ocorrência de fatos descritos em lei que também caracterizassem a falência (atos de falência) (46). Reputamos persistir verdadeira essa afirmação, ocasião em que teríamos a falência requerida não com base na impontualidade, mas em atos de falência.

Cabe ponderar qual o lugar onde deve ser ultimado o protesto para fim falimentar. Há entendimento jurisprudencial no sentido de que, em relação a essa formalidade, aplica-se o art. 3º da Lei n.º 11.101/05, “o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil”.

Já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

“COMERCIAL. FALÊNCIA. PROTESTO FORA DO DOMICÍLIO DA EMPRESA DEVEDORA.O protesto especial de contrato com cláusula financeira, com o objetivo de constituir o devedor em mora falimentar, deve ser tirado no domicílio da empresa devedora, ainda que outro seja o foro de eleição do contrato” (47).

Nas razões de seu voto no Resp 418371/SP, retro, o Ministro-relator invoca como razões de decidir o voto do Desembargador Ênio Santarelli Zuliani, as quais abaixo transcrevemos em parte:

"O sempre consultado MIRANDA VALVERDE (Comentários à Lei de Falências, Ed. Forense, 1962, I/123), foi, sem dúvida, o pioneiro da doutrina que vincula o protesto com o domicílio comercial do devedor, ao afirmar, citando o art. 7º do Dec. lei 7661/45, que o 'protesto especial deve ser sempre interposto perante o oficial competente do domicílio comercial do devedor, pois que aí é o foro da falência'. O protesto especial é um ato que se pratica 'onde habitualmente o devedor se encontra e está presente de ordinário' (PAULO DE LACERDA, Da Fallencia, Ed. Nacional, São Paulo, 1999, p. 158).

Mesmo após o advento da Lei 9492/97, continua a doutrina sustentando que o protesto especial deve ser tirado no cartório do domicílio do devedor (WALDO FAZZIO JÚNIOR, Lei de Falências e Concordatas Comentada, Ed. Atlas, 1999, p. 112 e JOSÉ DA SILVA PACHECO, Processo de Falência e Concordata, Ed. Forense, 1999, p. 193).

(...)

Falência para ser declarada depende de confirmação da impontualidade do devedor e o protesto especial simboliza o estado de crise patrimonial da empresa ou a insolvência representativa da insuficiência de bens ou 'condição temerária indicativa de grande risco para os credores' (FÁBIO ULHOA COELHO, o futuro do

direito falimentar: o mercado versus o Poder Judiciário, in Revista da Escola Paulista da Magistratura, Ed. Imprensa Oficial, 2001, II/62). O protesto é mais do que uma simples formalidade; expressa uma condição ou a impontualidade do devedor comerciante”. (Grifo da autora)

2.2.6. Sobre a legitimidade ativa ao pedido de falência com base na impontualidade

Ponderemos se a dívida deve advir de relação comercial ou se deve ser apresentado por credor empresário. Já se pronunciou o STJ:

“FALÊNCIA. CHEQUE. PEDIDO FORMULADO POR CREDOR CIVIL. CITAÇÃO. PROTESTO ESPECIAL. PRESCRIÇÃO.1. Tanto o credor civil como o credor comerciante podem requerer a falência do devedor” (48) (49).

Em nosso sistema, é irrelevante à instrução do pedido de falência com base na impontualidade se o credor é comerciante ou não, se a obrigação é de natureza comercial ou não. O que importa é que haja titulo executivo falencial, podendo requerer a quebra qualquer credor civil ou comercial.

2.3. Inciso II – Da execução frustrada

“II – executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal”;

Na execução por quantia certa:

“Art. 652. O executado será citado para, no prazo de 3 (três) dias, efetuar o pagamento da dívida. (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

§ 1o Não efetuado o pagamento, munido da segunda via do mandado, o oficial de justiça procederá de imediato à penhora de bens e a sua avaliação, lavrando-se o respectivo auto e de tais atos intimando, na mesma oportunidade, o executado. (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

§ 2o O credor poderá, na inicial da execução, indicar bens a serem penhorados (art. 655). (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

§ 3o O juiz poderá, de ofício ou a requerimento do exeqüente, determinar, a qualquer tempo, a intimação do executado para indicar bens passíveis de penhora”. (Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006). (Grifo nosso)

O devedor que, citado para a ação executória, não paga a dívida, não deposita e não nomeia bens à penhora encontra-se, presumivelmente, em estado de insolvência, tem passivo maior que o ativo, do contrário, se tivesse bens a garantir a execução, esta não restaria frustrada. Conforme Mamede “Essencialmente, a falência decorrerá da frustração da execução e não da inércia do empresário ou sociedade empresária executado” (50).

Ensina Requião: “a via judicial mais comum de que se vale o credor, sobretudo quando indícios de insolvência não são evidentes, é o processo de execução” (51). Mais à frente: “O que caracteriza o estado de insolvência do empresário comercial [hoje apenas empresário], nessa hipótese, não é propriamente a impontualidade, mas a evidente insuficiência patrimonial para pagar o passivo” (52).

Conforme § 4º do art. 94 da Lei de Falências, deve instruir o pedido de falência com base nesse inciso o título cuja execução restou frustrada e certidão expedida pelo Juízo onde se processava a execução. Maiores considerações a esse respeito quando tratarmos especificamente do § 4º.

Não é possível processarem-se simultaneamente a execução e o processo de falência, em face da litispendência e da suspensão automática das execuções judiciais (o art. 6º da lei em comento prescreve, com grifo nosso: “A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor”). (Grifo nosso)

Falência e a execução frustrada, dois processos distintos que são, processam-se em autos apartados, (53). Anota Amador Paes de Almeida:

“Para que a falência seja proposta, todavia, deve o credor, antes de tudo, renunciar à execução singular, propondo, em separado e, mediante distribuição regular, a ação falimentar, acompanhada de certidão do juízo de execução, atestando que o prazo para pagar ou nomear bens à penhora decorreu em branco” (54).

Para essa hipótese, o protesto não se faz necessário (55). A Lei de Falências o exige apenas ao pedido de falência feito com base na impontualidade. Se considerássemos o protesto necessário nesse caso, teríamos bis in idem. Se tivesse como pagar, não permaneceria inerte quando citado à execução. Protestar o título, a sentença condenatória, serviria apenas para confirmar o que o silencia do devedor já fazia saber.

Em Requião vemos:

“O protesto constitui a prova oficial e pública de que o título líquido não foi pago em seu vencimento. Existem, porém, outros fundamentos para a a caracterização da insolvência que a mora no pagamento da obrigação líquida. Quando ocorre um dos fatos enumerados em lei que também caracterizam a falência (art. 2º) [lei antiga, aqui especificamente ‘executado, não paga, não deposita a importância, ou não nomeia bens à penhora, dentro do prazo legal”], para a instrução do pedido de falência fundado numa daquelas hipóteses, desnecessário é o protesto e, mesmo, o próprio vencimento do título. A insolvência ocorre por fatos do devedor, que se provam pela constatação de sua ocorrência’”.

Como se vê, nessas hipóteses, a desnecessidade do protesto é curial, pois o pedido de falência, não se lastreando na impontualidade, independe da constituição do devedor em mora” (56).

Ensina Ulhoa que não existe valor mínimo para o requerimento de falência nesse caso, podendo se tratar de execução de valor inferior a 40 (quarenta) salários mínimos (57). A lei determina esse valor de alçada apenas para os casos de impontualidade.

2.4. Inciso III – Dos atos de falência

“III – pratica qualquer dos seguintes atos, exceto se fizer parte de plano de recuperação judicial”:

Além da impontualidade e da execução frustrada, existem outros aspectos determinantes da falência à luz da Lei n.º 11.101/2005, como a liquidação desordenada de ativos e a utilização de meios ruinosos ou fraudulentos para a realização de pagamentos. A nova lei permite a apresentação, pelo devedor, de um plano de recuperação, a ser analisado pelos credores. Seu descumprimento também enseja a decretação da falência.

Cada uma das alíneas do inciso em comento traz uma situação fática diversa. Aqui não mais temos presunções, mas sim atos do devedor que exteriorizam a insolvência. Cabe ao requerente prová-los e, portanto, como a si se volta o ônus da prova ( o empresário é solvente até provem o contrário), deve instruir a inicial com documentos idôneos a demonstrar o alegado. Aprofundaremos quando da análise do §5º.

Lembremos que a falência, ou seu simples requerimento, enseja desconfiança no meio empresarial e pode ter repercussões patrimoniais e extrapatrimoniais bastante relevantes ao devedor. Cabe ao requerente da falência agir com cautela, pois, se comprovado o dolo, responderá por perdas e danos.

Comenta Bezerra Filho:

“A parte final do caput diz não haver caracterização de ato de falência, se aquele ato praticado fizer parte do plano de recuperação. No entanto, aqui houve lapso do legislador, pois as situações previstas nas alíneas a a g não podem fazer parte do plano de recuperação, pois são atos ‘ruinosos e fraudulentos’ (letra a), com ‘objetivo de... fraudar credores’ (letra b), atos simulados e/ou para prejudicar terceiros (letras c a e), abandono de estabelecimento (letra f) ou o próprio descumprimento do plano de recuperação (letra g)” (58).

De fato, aproximam-se as condutas ali listadas mais de crimes falimentares (artigos 168 a 178) que de um plano de recuperação. Representam risco de solvabilidade e não interessam ao meio empresário nem à sociedade. Não é sadia a perpetuação de uma empresa cujo escopo é a fraude, a má-fé.

Segundo Mamede,

“A construção da relação de atos falimentares orientou-se, igualmente, pelo princípio da segurança das relações mercantis, princípio que mantém lastros com os princípios da boa-fé e da probidade, bem como o princípio da função social de atos e faculdades jurídicas, do qual é subprincípio o princípio da função social da empresa” (59).

2.4.1. Inciso III, alínea a – Liquidação precipitada de ativos, pagamento ruinoso ou fraudulento

“a) procede à liquidação precipitada de seus ativos ou lança mão de meio ruinoso ou fraudulento para realizar pagamentos”;

Fala-se aqui de três condutas que levam ao pagamento de obrigações. Não se pode permitir a utilização do processo de falência como forma de simples ingerência no patrimônio alheio. Não se pode, irrasoadamente, cercear a liberdade do empresário de exercer sua atividade, isso é certo. Todavia, existem, isso é fato, meios pouco honestos de liquidar ativos ou realizar pagamentos. Não se trata de qualquer liquidação de ativos. Há de ser precipitada, o que, no dizer de Paes de Almeida significa “liquidação ruinosa, a preços vis, abaixo dos custos, em visível prejuízo a credores” (60).

Requião exemplifica a liquidação precipitada

“liquidação apressada do ativo do devedor, ou, mais precisamente, dos bens que constituem seu estabelecimento comercial, com grave abatimento de preço, sem se preocupar com a garantia que eles representam aos credores. No fundo, como observa Miranda Valverde, vê a lei a malícia do comerciante, que pretende apurar o ativo e não pagar o passivo (ob. Cit., vol I, nº 19)” (61).

Já sobre os atos da parte final da alínea, continua: “os meios ruinosos ou fraudulentos de que o empresário lança mão para pagar credores mais impertinentes ou sôfregos, com receio de que lhes requeiram a falência, rompe com o princípio da igualdade dos credores, que no patrimônio do devedor têm garantia comum” (62).

Citando Valverde, aduz o mestre:

“os meios ruinosos consistem geralmente na realização de negócios arriscados ou de puro azar, no abuso da responsabilidade de favor, nos empréstimos a juros excessivos, na alienação de máquinas ou instrumentos indispensáveis ao exercício do comércio. Os meios fraudulentos revelam-se nos artifícios ou expedientes empregados pelo comerciante para conseguir dinheiro ou mercadoria, na apropriação de valores confiados a sua guarda (ob. Cit., vol. I, nº 19)” (63).

Pagar fraudulentamente é se utilizar daquela necessidade de adimplir obrigação para, indo além daquilo, fraudar, enfraquecer seu patrimônio, em prejuízo aos credores, que o têm como garantia.

2.4.2. Inciso III, alínea b – Atos para retardar pagamentos ou fraudar credores

“b) realiza ou, por atos inequívocos, tenta realizar, com o objetivo de retardar pagamentos ou fraudar credores, negócio simulado ou alienação de parte ou da totalidade de seu ativo a terceiro, credor ou não”;

Iniciemos com Requião:

“O comportamento do devedor realizando negócio simulado, ou tentando inequivocamente fazê-lo, para retardar pagamentos, revela a situação difícil em que se encontra sua atividade mercantil, permitindo que disso se presuma a insolvência, suspeitando-o ao mesmo tempo do propósito de fraudar os credores. Com o negócio simulado o devedor arquiteta a transferência aparente de bens ou de todo seu patrimônio para terceiro, de sua confiança, furtando-os da garantia comum dos credores. A transferência simulada, ou a tentativa de fazê-la, ‘a credor ou não’ completa o preceito [ Lei antiga]. Obtendo a declaração da falência, fundamentada em tais atos, sobretudo quando a transferência simulada de bens se consuma, proporciona o credor ao síndico a ação revocatória, tornando-os ineficazes, fazendo-os retornar à massa falida” (64).

No Código Civil, art. 167, haverá simulação nos negócios jurídicos quando: aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem; contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira; e/ou os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados. A Lei de Falências, como ato de falência, agrega a essas hipóteses o objetivo claro e específico de prejudicar credores, de fraudar. Não basta o ato em si: existe teleologia própria, a vontade de fraudar é o animus.

Já a alienação do ativo atenta contra a solvabilidade do devedor: seu patrimônio responde por suas obrigações. Quanto menos patrimônio, maior a possibilidade de alguém não receber o que lhe é devido.

A Lei exige a prática ou a tentativa de praticar os atos ali enumerados, não cabe o pensamento, a elucubração. Aquela finalidade exige que seja exteriorizada para que haja o ato de falência, mesmo se tentado.

O negócio simulado, como antecipado, não produz efeitos contra os credores. Vejamos decisão que, embora versasse sobre fase mais adiantada do processo de falência, nos serve por seus fundamentos:

“Ação: revocatória, ajuizada pelo liquidante de BARROS E BARROS ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIOS LTDA., ora recorrida, então em liquidação extrajudicial (atualmente massa falida), visando à revogação da sentença homologatória da partilha dos bens então pertencentes à recorrente e seu esposo, Francisco Mário de Barros (já falecido e representado nestes autos por seu espólio), bem como a revogação da confissão de dívida celebrada entre eles.Em 12.11.1987, o Banco Central do Brasil decretou a intervenção na empresa, fundada em irregularidades apuradas pela Secretaria da Receita Federal. Confirmada a insolvência da companhia, a medida foi convertida em liquidação extrajudicial. Segundo consta da petição inicial, entre as irregularidades, ‘as mais graves foram o abuso do sócio, FRANCISCO MÁRIO DE BARROS, ao utilizar o dinheiro da empresa – que deveria resguardar o interesse da sociedade - -para fazer aquisições de imóveis em seu próprio nome e de terceiros e atender as despesas pessoais suas e de sua esposa’ (fls. 03, 1° volume). (...)2. No mérito, nega-se provimento a ambos os apelos, porque restou absolutamente claro que o ex-administrador da Massa Falida, valendo-se de que se divorciava de sua mulher, engendrou a possibilidade de subtrair da garantia real dos credores bens de sua propriedade e, para tanto, pactuou acordo, nos autos do processo de divórcio, pelo qual todos os bens imóveis de valor acentuado restariam em poder da mulher, ao passo que, para ele, ficariam imóvel de menor valor e ações e quotas das sociedades que já se encontravam em estado pré-falimentar e, portanto, sem qualquer valor de mercado. Ademais, assinou confissão de dívida em favor da ex-mulher, sem se defender, e teve o único bem imóvel que lhe restara penhorado e levado a leilão. Ora, resultou claro o consilium fraudis e o eventus damni, o que, só por si, daria margem à anulabilidade dos atos, por flagrante fraude aos credores. Todavia, acrescente-se que a perícia também afirma que estes bens imóveis foram adquiridos, não com o salário do ex-administrador, mas com recursos dos próprios consorciados, o que mais ressalta a justiça da anulabilidade dos atos ora atacados ” (65). (Grifo nosso)

2.4.3. Inciso III, alínea c – Da transferência irregular do estabelecimento

“c) transfere estabelecimento a terceiro, credor ou não, sem o consentimento de todos os credores e sem ficar com bens suficientes para solver seu passivo”;

Pratica ato que faz presumir o estado falimentar aquele que transfere o estabelecimento a terceiro sem a anuência dos credores. Para o Código Civil, o estabelecimento (art. 1.142) é “todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária”. Fala-se em conjunto de bens corpóreos e incorpóreos. Bens isoladamente têm um preço; se ordenados de forma especialmente produtiva, agrega-se-lhes valor considerável.

O estabelecimento pode ser em bloco também alienado; há aí o trespasse que, no Código Civil, depende da anuência dos credores, (art. 1.145), “se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação”.

O estabelecimento é garantia da atividade, além de compor-se de bens, tangíveis e intangíveis, como dito, que constituem garantia geral aos credores. A venda, o trespasse, se não restam bens para solver o passivo, não é eficaz se a ela não anuírem os credores, expressa ou tacitamente (66). No âmbito da Lei de Falências, lei específica, é também, ato falimentar.

“É claro que o empresário comercial pode desfazer-se de seu estabelecimento comercial, mas em condições normais. O que a lei pretende coibir, ao admitir a declaração de falência, é que ele, denotando insolvência, transfira a terceiro seu estabelecimento sem ficar com bens suficientes para solver seu passivo” (67).

Ainda no Código Civil observamos:

“Art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento”.

Existe a assunção de obrigações, é disciplina legal. Apesar dessa “garantia”, ou tutela legal, termo mais condizente com a técnica, teve por bem o legislador apenar com a presunção de falência o trespasse irregular. Bem agiu, vez que as obrigações não-contabilizadas estariam, por ordem legal, excluídas da sucessão passiva. Credores diligentes e honestos poderiam ser apenados com o “calote” em caso de transacionarem com empresário cuja contabilidade não era regular, o que, apesar de ilícito, sabe-se

comum, e é também difícil de se auscultar na prática negocial.

Um empresário pode ter diversos estabelecimentos, sede e filiais, cabe gizar. Pode transferi-los para onde quiser no livre exercício de sua atividade de empresa, só não pode fazê-lo com o intuito preordenado de fraudar credores, intuito este que se presume se a venda é realizada em determinadas condições.

2.4.4. Inciso III, alínea d – Da simulação de transferência do estabelecimento

“d) simula a transferência de seu principal estabelecimento com o objetivo de burlar a legislação ou a fiscalização ou para prejudicar credor”;

Aqui, ao contrário da alínea anterior, não temos a transferência ou tentativa de transferência do estabelecimento. Temos simulação. Não quer o devedor transferir quer simular, quer que os outros pensem que o fez. Existe também, em comum a situações já acima estudadas, a necessidade do objetivo de fraudar, de enganar, a legislação ou a fiscalização ou credores. A fraude é elemento primordial da ação, já voltada em si às finalidades espúrias arroladas na alínea.

2.4.5. Inciso III, alínea e – Dação irregular de garantia

“d) dá ou reforça garantia a credor por dívida contraída anteriormente sem ficar com bens livres e desembaraçados suficientes para saldar seu passivo”;

Aqui o credor privilegia, irrasoadamente, credor. A garantia geral do passivo é o patrimônio. Este responde por todas as dívidas. Regra. Há obrigações, todavia, que contam com garantias, seguranças, bens específicos a supedanear a obrigação. Em caso de inadimplemento, não recorre o credor ao patrimônio em geral: vai direto à execução da garantia específica que lhe fora dada.

Nada impede que o devedor, no exercício regular de suas atividades de empresário, reforce garantia já existente ou mesmo dê bem como garantia a obrigação que não a possuía. Entretanto, se aquele negócio de dação ou de reforço a garantia o leva á insolvência, temos prejuízo a credores: resta malbaratado o princípio da igualdade dos credores, pars contitio creditorum. Aquele bem, que era garantia de todos, posto integrante do patrimônio do devedor, vincula-se agora a um credor especificamente, em prejuízo dos demais, que vêem reduzido o acervo geral. Se esse negócio leva o devedor à insolvência, posto, “sem ficar com bens livres para saldar seu passivo”, vislumbramos ato falimentar. A fraude é latente.

2.4.6. Inciso III, alínea f – Abandono de estabelecimento

“f) ausenta-se sem deixar representante habilitado e com recursos suficientes para pagar os credores, abandona estabelecimento ou tenta ocultar-se de seu domicílio, do local de sua sede ou de seu principal estabelecimento”;

O empresário normalmente cuida pessoalmente de suas atividades ou tem alguém de sua confiança, é razoável, à frente de seus negócios. O afastamento destes, sem que deixe pessoa habilitada a sua condução, faz pensar que deseja não mais praticar suas atividades. Das hipóteses da alínea, que são três (ausência sem deixar representante, o abandono do estabelecimento e a tentativa de ocultação), antevemos situação de descaso, de desinteresse por seus negócios, ou, quando da ocultação, de algo “errado” mesmo, no mínimo irregular, o que faz preocupar quem lhe confiou dinheiro, vez que dificulta-se o retorno do crédito. Se não há atividade, não há lucro, não há como pagar.

Ninguém se afasta de negócio bom, lucrativo. O empresário cuja empresa prospera quer sua continuidade, não sua interrupção. As situações dessa alínea fazem transparecer a quebra: ou pretérita ou iminente. Se há prova cabal dessas situações, caracterizado resta o ato de falência.

2.4.7. Inciso III, alínea g – Não cumprimento do plano de recuperação judicial

“g) deixa de cumprir, no prazo estabelecido, obrigação assumida no plano de recuperação judicial”.

A nova Lei de Falência tem por finalidade, como já estudado, evitar a quebra: quer-se, em atenção à finalidade social da empresa, dar continuidade a atividades rentáveis que passam por um momento de crise. Assim, se possível e factível, há que se estabelecer um plano de recuperação da empresa: é última alternativa à “salvação”. Se o plano falha ou não é cumprido, a atividade não é mais interessante à sociedade nem ao Estado, posto ser pretensão também o saneamento do meio negocial, com a eliminação das atividades improdutivas e dispendiosas.

Se o plano restou descumprido, melhor é a alternativa da falência, embora como ultima ratio.

2.5..§1º - Considerações adicionais sobre a possibilidade do litisconsórcio ativo no requerimento de falência

“§ 1o Credores podem reunir-se em litisconsórcio a fim de perfazer o limite mínimo para o pedido de falência com base no inciso I do caput deste artigo”.

O parágrafo em comento possibilita abertamente a formação do litisconsórcio ativo para o requerimento da falência, quando esta baseada na impontualidade, o que pode trazer problemas de ordem processual. Pensemos a hipótese de um dos títulos, sem o qual não se perfaz o piso legal, ser falso: a falência não poderá ser decretada.

Parece improvável a formação do litisconsórcio como previsto pela Lei de Falências, mas é sim juridicamente possível.

Um julgado no qual se ressalta o possível aspecto temporal do piso de 40 (quarenta) salários:

“FALÊNCIA. VALOR MÍNIMO. PROCESSO AJUIZADO SOB A ÉGIDE DO DECRETO-LEI 7.661/45 – INTERPRETAÇÃO DE ACORDO COM OS PRINCÍPIOS DA NOVA LEI DE FALÊNCIAS – ART. 94, 1, DA LEI 11.101/2005 – VALOR MÍNIMO QUE DEVE SER OBSERVADO.I – O artigo 1º do Decreto-lei 7.661/45 não leva em consideração a intenção do credor, para aferir os requisitos necessários à decretação da falência. Precedentes.II – Após a Nova Lei de Falências (Lei 11.101/2005), não se decreta a falência fundada em crédito inferior a 40 (quarenta) salários mínimos da data do pedido de falência, devendo o art. 1° do Decreto-lei 7.661/45 ser interpretado à luz dos critérios que levaram à edição da Nova Lei de Falências, entre os quais o princípio da preservação da empresa. III – Recurso Especial improvido” (68).

Na oportunidade, ponderou o Ministro-relator:

“Com fundamento nesse princípio – da preservação da empresa – deve-se concluir não ser razoável autorizar a quebra de uma empresa com base na impontualidade no pagamento de dívida de pequeno valor, em casos como os dos autos, não incidiria nenhuma regra legal a vedar o deferimento do pedido, mas incidiria um princípio, qual seja o da preservação da empresa.

Considerando, portanto, que o valor da dívida com fundamento no qual se pleiteou a falência da Recorrida, segundo noticiado na petição inicial, era de apenas R$ 983,20, era inferior a 40 salários mínimos não se pode deferir o pedido.16.- Ante o exposto, nega-se provimento ao Recurso Especial”. (Grifo nosso)

2.6. § 2º - Da necessidade de interesse processual para apresentação de títulos no requerimento de falência

“§ 2o Ainda que líquidos, não legitimam o pedido de falência os créditos que nela não se possam reclamar”.

Já tecemos considerações a respeito do acima prescrito. Não se pode apresentar requerimento de falência com base em crédito o qual não se pode habilitar na falência. O processo estaria fadado à extinção sem julgamento de mérito por falta de interesse processual (interesse-adequação).

2.7. §3º - Considerações adicionais ao protesto no requerimento de falência

“§ 3o Na hipótese do inciso I do caput deste artigo, o pedido de falência será instruído com os títulos executivos na forma do parágrafo único do art. 9o desta Lei, acompanhados, em qualquer caso, dos respectivos instrumentos de protesto para fim falimentar nos termos da legislação específica”.

De acordo com a Lei n.º 9.492/97 (art. 1º), “protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida”.

Esse diploma traz a figura dos “protestos para fins especiais”, aqui especificamente o protesto para fins falimentares. Em seu art. 23, temos:

“Os termos dos protestos lavrados, inclusive para fins especiais, por falta de pagamento, de aceite ou de devolução serão registrados em um único livro e conterão as anotações do tipo e do motivo do protesto, além dos requisitos previstos no artigo anterior.

Parágrafo único. Somente poderão ser protestados, para fins falimentares, os títulos ou documentos de dívida de responsabilidade das pessoas sujeitas às conseqüências da legislação falimentar”. (Grifo nosso)

Só pode ser protestado para fim falimentar título de responsabilidade de pessoa sujeita à falência, o que é bem lógico. Cabe ao tabelião, em análise meramente formal, fazer esse exame.

“Fica claro, portanto, que o protesto para fim falimentar é uma situação comum de protesto, mas marcada por finalidade específica, o que implica conter as anotações desse tipo e motivo para o ato, a partir de declaração do apresentante” (69). (Grifo da autora)

2.8. §4º - Necessidade de certidão em caso de execução frustrada

“§ 4o Na hipótese do inciso II do caput deste artigo, o pedido de falência será instruído com certidão expedida pelo juízo em que se processa a execução”.

A instrução da petição inicial varia de acordo com o tipo de insolvência jurídica que se quer ver declarada. Quando fundada na tríplice omissão em ação executiva, deve, por disposição legal expressa, conter certidão expedida pelo cartório do Juízo em que se processara a execução frustrada.

2.9. §5º - Da descrição fática acompanhada de provas no requerimento de falência baseada em ato falimentar.

“§ 5o Na hipótese do inciso III do caput deste artigo, o pedido de falência descreverá os fatos que a caracterizam, juntando-se as provas que houver e especificando-se as que serão produzidas”.

Caso se requeira a falência com base em ato de falência, a prova deste cabe a quem o alega, devendo instruir o pedido os documentos de que dispuser e, apenas nesse caso, especificar quais outras provas serão produzidas.

Deve constar da petição inicial (art. 282, CPC): o juiz ou tribunal, a que é dirigida; os nomes, prenomes, estado civil, profissão, domicílio e residência do autor e do réu; o fato e os fundamentos jurídicos do pedido; o pedido, com as suas especificações; o valor da causa; as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; o requerimento para a citação do réu.

Seria ela indeferida quando inepta, entendida assim quando lhe faltar pedido ou causa de pedir;da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; o pedido for juridicamente impossível; contiver pedidos incompatíveis entre si. No caso, seria inepta se da narração dos fatos não decorresse ato falimentar, por exemplo. Poderia também haver indeferimento quando a parte na tivesse interesse no requerimento, quando lhe faltaria interesse, tese já debatida.

O dispositivo em comento apenas reforça mandamento do Código de Processo Civil insculpido em seu art. 283: “A petição inicial será instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação”.

DA CONCLUSÃO

Falido é quem não tem como pagar o que deve: não tem patrimônio para saldar suas dívidas. Seu passivo supera o ativo, aí o fenômeno da insolvência definido economicamente. De forma gráfica, teríamos:

Passivo > Ativo.

O empresário que tem mais dívidas que ativos falhou em sua tentativa de buscar o lucro, um insucesso que também é experimentado coletivamente, pois lucro é o que primeiro se espera socialmente da empresa, é seu papel produzi-lo. Através dele, do resultado econômico positivo, o empresário pode adimplir outras obrigações sociais.

Sempre que pensamos na empresa na ótica da falência ou da recuperação de empresas, assume papel fundamental a função social que cabe a esta adimplir. Este é princípio que serve de supedâneo a tais institutos jurídicos, sem ela, falência e recuperação adquiririam outra dimensão.

Pelo presente trabalho, concluímos não existir na Lei uma fórmula matemática para a decretação da falência. Difícil passar da insolvência matemática para a insolvência jurídica, posto bem mais tormentosa a definição desta. Existe sim uma série de presunções legais, situações que, quando ocorrem, ou se provadas, no caso dos atos de falência, autorizam a conclusão de encontrar-se falido o empresário.

Fale quem não paga em dia suas obrigações, considerado determinado valor (impontualidade); quem não tem patrimônio para saldar suas dívidas quando este é auscultado na execução (execução frustrada); quem pratica atos os quais deixam transparecer intuito de fraude a credores (atos de falência).

BIBLIOGRAFIA

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NOTAS

(1) REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. vol. 1, 26ª edição atualizada por Rubens Edmundo Requião. São Paulo: Saraiva, 2005. (2) NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa, vol. 1, 3ª edição reformulada, São Paulo, Saraiva, 2003. (3) NEGRÃO, Ricardo. Idem, p. 46/56. (4) Idem, p. 57. (5) COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, vol. 1. 11ª Ed., rev., e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 19.(6) REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial.ob. cit., p. 76. (7) REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial.ob. cit., p. 78. (8) NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa. Saraiva: 2004, p. 5, citado por Andréa MARTINS Ramos Spinelli in MACHADO, Rubens Approbato (coord.). Comentários à nova Lei de Falências

e recuperação de Empresas. São Paulo: Quariter Latin, 2005, p. 194.(9) Órgão Julgador: T1 - PRIMEIRA TURMA, Data do Julgamento: 20/10/2005, Data da Publicação/Fonte: DJ 20/02/2006 p. 205, RDDT vol. 128 p. 147. (10) NEGRÃO, Ricardo. Aspectos objetivos da lei de recuperação de empresas e de falências: lei n. 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. 2ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2008.(11) COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à nova Lei de Falências e de Recuperação de empresas: (Lei n. 11.101, de 9-2-2005). 6ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 192. (12) REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar, volume 1, 11ª. Ed, São Paulo: Saraiva, 1986, p. 27.(13) ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de Falência e Recuperação de Empresa. 23ª. Ed. Ver e atual., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 9-11.(14) BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de Recuperação de Empresas e Falências Comentada/Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, comentário artigo por artigo. 3ª edição, 2ª tir. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 232.(15) MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: falência e recuperação de empresas, volume 4. 2ª Ed, São Paulo: Atlas, 2008, p. 292. (16) Requião, Rubens. Curso de Direito Falimentar. ob., cit., p . 57.(17) Idem, p. 58-77. (18) Ibidem.(19) Ibidem, p. 61(20) Mamede, Gladston. Falência e recuperação de empresas.ob., cit., p. 293-294. (21) Mamede, Gladston, ob., cit., p. 294. (22) Idem, p. 296. (23) ULHOA, Fábio. Comentários a nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas, ob., cit.,p. 253.(24) Bezerra Filho, ob., cit., p. 233.(25) GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, vol. 2. 2ª Ed., rev., e atual. São Paulo, Saraiva, 2005, p. 21.(26) Idem, p. 236(27) Mamede, ob., cit., p.297. (28) CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 15ª Ed., rev., e atual. São Paulo: Lúmen Iuris, 2007, p. 189. (29) WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil, vol. 2: processo de execução/Luiz Rodrigues Wambier, Flávio Renato Correia de Alemeida, Eduardo Talamini; coordenação/Luiz Rodrigues Wambier. 7ª Ed., rev., e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 64. (30) Mamede, ob., cit., p. 297.(31) Definição dada por Alexandre Freitas Câmara, ob., cit., na qual faz referência a Carnelutti, Derecho e Proceso, p. 361 e Theodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, vol. II, p. 33.(32) CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil , ob., cit., idem, p. 50. (33) Idem, ob., cit., p. 191.(34) Mamede, ob., cit., p. 298.(35) Gonçalves, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro, ob., cit., vol. I, p. 291.(36) Idem, ob., cit., p. 299.(37) REsp 287824 / MG, RECURSO ESPECIAL 2000/0119099-7, Relator(a): Ministro FRANCISCO FALCÃO (1116), Órgão Julgador: T1 - PRIMEIRA TURMA, Data do Julgamento: 20/10/2005, Data da Publicação/Fonte: DJ 20/02/2006 p. 205, RDDT vol. 128 p. 147. (38) Ulhoa, Fábio, Curso de Direito Comercial, ob., cit., p. 371. (39) No mesmo sentido do texto, Ulhoa, idem. (40) Idem, ob., cit., p. 300. (41) Bezerra Filho, Manoel Justino. Ob., cit., p. 233.(42) Requião, Rubens. Curso de Direito Falimentar , ob., cit., p. 100.(43) Agravo 2004/0146961-2, Órgão Julgador: T3 - TERCEIRA TURMA, Data do Julgamento: 15/04/2008, Data da Publicação/Fonte DJe 07/05/2008. (44) Rel. Ministro Aldir Passarinho Júnior, Quarta Turma, DJ 13.11.2006 p. 265. (45) STJ - REsp 251678 / SP, RECURSO ESPECIAL 2000/0025381-2, Relator(a) Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA (1127), Órgão Julgador: T4 - QUARTA TURMA, Data do Julgamento: 04/09/2007, Data da Publicação/Fonte: DJ 24/09/2007 p. 310. (46) Requião, Curso de Direito Falimentar,ob., cit., p. 100. (47) REsp 418371 / SP, RECURSO ESPECIAL 2002/0025738-3, Relator(a): Ministro CESAR ASFOR ROCHA (1098), Órgão Julgador: T4 - QUARTA TURMA, Data do Julgamento: 01/10/2002, Data da Publicação/Fonte: DJ 25/11/2002 p. 240. (48) REsp 237419 / PR, RECURSO ESPECIAL 1999/0100556-6, Relator(a): Ministro BARROS MONTEIRO (1089), Órgão Julgador: T4 - QUARTA TURMA, Data do Julgamento: 20/04/2004, Data da Publicação/Fonte: DJ 01/07/2004, p. 199, LEXSTJ vol. 181 p. 129. (49) No mesmo sentido, REsp nº 32.571-SP. (50) Mamede, ob., cit., idem, p. 306.

(51) Requião, Curso de Direito Falimentar , ob., cit., idem, p. 73. (52) Idem. (53) Posicionamento do qual diverge Bezerra Filho, vide ob. cit, p. 236: “...poderá o credor requerer a citação para fins falimentares nos próprios autos da execução, desde que este seja o juiz competente para tanto”. (54) Ob., cit., p. 76.(55) Conforme o entendimento aqui esposado, vide REsp 6782 / RS, ainda sob a égide da antiga Lei de Falências, cujos fundamentos permanecem atuais, todavia: “PROCESSO CIVIL. FALENCIA. INCISO I DO ART. 2. DO DL 7661/45. DESNECESSIDADE DE PROTESTO. INEPCIA DA INICIAL. PREVIO ENCERRAMENTO DA EXECUÇÃO SINGULAR. RECURSO PROVIDO. I- AJUIZADO PEDIDO DE FALENCIA COM ARRIMO NO INCISO I DO ART. 2. DO DL 7661/45, INCUMBE AO AUTOR TÃO-SOMENTE COMPROVAR QUE O DEVEDOR, CITADO PARA REGULAR EXECUÇÃO, NÃO PAGOU, NÃO DEPOSITOU A QUANTIA RECLAMADA E TAMPOUCO NOMEOU BENS A PENHORA. DISPENSAVEL, EM CASOS TAIS, O PROTESTO PREVISTO NO ART. 10 DE REFERIDO DIPLOMA. II- CONSTANDO DA INICIAL POSTULAÇÃO QUE CONSUBSTANCIE, AO FIM E AO CABO, MERA REFERENCIA A POSSIBILIDADE DE EFETIVAÇÃO DO DEPOSITO ELISIVO (ART. 11, PAR-2.), NÃO SE HA CONSIDERA-LA INEPTA. III- AFORADO PELO CREDOR EXEQUENTE O REQUERIMENTO DE FALENCIA, A EXECUÇÃO SINGULAR ANTERIORMENTE AJUIZADA DEVERA PELO MENOS FICAR SUSPENSA, SENDO VICIADOS OS ATOS QUE NELA VIEREM A TER LUGAR A PARTIR DE ENTÃO”.(56) Curso de Direito Falimentar , ob., cit., p. 100.(57) COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à nova Lei de Falências e de Recuperação de empresas, ob., cit., p. 94. (58) Mamede (Direito empresarial brasileiro: falência e recuperação de empresas) não faz essa ressalva quando fala desse inciso da Lei. (59) Ob., cit., p. 309.(60) Obra cit., p. 76. (61) Ob., cit., p. 74. (62) Idem. (63) Idem, p. 74.(64) Requião, Curso de Direito Falimentar , ob., cit., p. 75. (65) Trechos do voto da Ministra-relatora no REsp 518678 / RJ, RECURSO ESPECIAL 2003/0054062-3, Relator(a): Ministra NANCY ANDRIGHI (1118), Órgão Julgador: T3 - TERCEIRA TURMA, Data do Julgamento: 16/10/2007, Data da Publicação/Fonte: DJ 29/10/2007 p. 216. (66) No mesmo sentido, Mamede, ob., cit, p. 317. (67) Requião, ob., cit., p. 76. (68) REsp 805624 / MG, RECURSO ESPECIAL 2005/0211833-9, Relator(a): Ministro SIDNEI BENETI (1137), Órgão Julgador: T3 - TERCEIRA TURMA, Data do Julgamento: 23/06/2009, Data da Publicação/Fonte: DJe 21/08/2009. (69) Mamede, ibidem, p. 303. -----------------------------

NOTA / ADRIANO PINTOTrabahos de alunos são divulgados como estímulo à produção acadêmcia e sem qualquer controle de formato, redação ou conteúdo.